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Fatores específicos e distribuição de renda – Prof.

Allexandro Mori Coelho

De acordo com a Teoria das Vantagens Comparativas de Ricardo, a liberalização comercial


(plena) induzirá cada país a: (1) se especializar na produção das mercadorias para as quais
apresenta vantagens comparativas e (2) importar as mercadorias em cuja produção não
apresenta vantagens comparativas ou apresenta desvantagens comparativas.

Além disto, devido à especialização produtiva induzida pela liberalização comercial, em cada
país haverá aumento da produção e, por consequência, aumento do consumo e do bem-estar.

Observação: a liberalização comercial não afeta a distribuição de renda porque na Teoria das
Vantagens Comparativas há apenas um fator de produção, o trabalho, que pode mover-se
livremente entre os setores da economia; assim, o trabalho desempregado nos setores com
desvantagens comparativas, em declínio por causa da liberalização, pode encontrar emprego
nos setores com vantagens comparativas, em expansão por causa da liberalização comercial;
como só há um fator de produção, toda renda nacional permanece com o fator trabalho, não
havendo efeitos distributivos de renda.

Questão: se a liberalização comercial gera ganhos para todos e não efeitos distributivos, por que
os países adotam políticas comerciai protecionistas?

Resposta: porque a Teoria das Vantagens Comparativas, por considerar apenas um fator de
produção (trabalho), identifica que há ganhos agregados, mas não é capaz de identificar o fato
de que a liberalização comercial causa redistribuição da renda nacional, por gerar efeitos
desiguais (em termos de renda e emprego) para diferentes fatores de produção, havendo
fatores de produção que ganham mais que outros e mesmo fatores de produção que perdem
devido à liberalização comercial. Sendo assim, a liberalização comercial gera ganhadores e
perdedores, fazendo com que os potenciais perdedores com a liberalização se oponham a ela,
mediante demanda de medidas de proteção comercial (tarifas sobre importações, por exemplo).

Se considerarmos que existem mais fatores de produção na economia e que alguns fatores são
de uso específico (no sentido de exclusivo) em alguns setores, pode-se mostrar que a
liberalização comercial provoca efeitos distributivos, ou seja, redistribuição da renda nacional
entre os fatores de produção.

Modelo de fatores específicos (Samuelson e Jones)

Caracterização da economia mundial

 2 países: C e D
 Em cada país há 2 setores de produção que produzem uma mercadoria cada: tecido e
alimentos (cada mercadoria, tecido ou alimento, é homogênea (idêntica)
independentemente do país em que foi produzida)
 3 fatores de produção em cada país: trabalho, capital e terra
o Trabalho: fator de produção com perfeita mobilidade entre os setores (usado
na produção dos 2 setores e pode mover-se de um setor para o outro)
o Capital: fator de produção específico do setor de tecidos (usado somente na
produção de tecidos; não pode ser usado na produção de alimentos)
o Terra: fator de produção específico do setor de alimentos (usado somente na
produção de alimentos; não pode ser usado na produção de tecidos)
 Tecnologias de produção dos setores em cada país: uso de fatores de produção
o Produção de tecido usa somente capital e trabalho (não usa terra)
o Produção de alimentos usa somente terra e trabalho (não usa capital)
Fatores específicos e distribuição de renda – Prof. Allexandro Mori Coelho

Em cada economia (país), se houver aumento do preço relativo da mercadoria de um setor em


relação à mercadoria do outro setor, então:

 O fator de produção específico do setor cujo preço relativo aumentou, tem aumento de
remuneração e, por isto, fica em situação melhor em relação à situação anterior ao
aumento do preço relativo → este fator de produção aumenta sua participação na
distribuição da renda nacional, ou seja, de forma agregada, os donos deste fator de
produção enriquecem
 O fator de produção específico do setor cujo preço relativo diminuiu, tem diminuição de
remuneração e, por isto, fica em situação pior em relação à situação anterior à
diminuição do preço relativo
 O efeito sobre a remuneração do fator de produção que pode mover-se entre os setores
é ambíguo e, por isto, a situação deste fator de produção em relação à situação anterior
à mudança do preço relativo também é ambígua (depende de informações mais precisas
sobre a mudança de preços relativos e do deslocamento deste fator entre os setores da
economia)

Exemplo: Em cada economia (país), se houver aumento do preço relativo do tecido em relação
ao alimento (preço do tecido aumenta em relação ao preço do alimento) ou, o que é
equivalente, diminuição do preço relativo do alimento em relação ao tecido, então:

 O fator de produção específico do setor de tecido (cujo preço relativo aumentou), o


capital, tem aumento de remuneração e, por isto, fica em situação melhor em relação à
situação anterior ao aumento do preço relativo
 O fator de produção específico do setor de alimento (cujo preço relativo diminuiu), a
terra, tem diminuição de remuneração e, por isto, fica em situação pior em relação à
situação anterior à diminuição do preço relativo
 O efeito sobre a remuneração do fator de produção que pode mover-se entre os
setores, o trabalho, é ambíguo e, por isto, a situação deste fator de produção em relação
à situação anterior à mudança do preço relativo também é ambígua (depende de
informações mais precisas sobre a mudança de preços relativos e do deslocamento
deste fator entre os setores da economia)

Condição de ocorrência de comércio internacional (exportação e importação): a liberalização


comercial entre os países somente induzirá comércio internacional somente se o preço da
mercadoria importada for inferior ao da mercadoria produzida no país.

Exemplo: com a liberalização comercial, os consumidores de um país somente comprarão tecido


importado (produzido no outro país) se o preço do tecido importado for inferior ao preço do
tecido produzido no país, já que o tecido nacional é igual ao tecido importado para estes
consumidores.

Resultado geral da liberalização comercial: a liberalização beneficia o fator de produção


específico do setor de exportação de cada país, mas prejudica o fator de produção específico do
setor que concorre com importações, com efeitos ambíguos para os fatores de produção móveis
entre os setores.
Fatores específicos e distribuição de renda – Prof. Allexandro Mori Coelho

Exemplo: Suponha que:

 2 países: C e D
 Em cada país há 2 setores de produção que produzem uma mercadoria cada: tecido e
alimentos (cada mercadoria, tecido ou alimento, é homogênea (idêntica)
independentemente do país em que foi produzida)
 3 fatores de produção em cada país: trabalho, capital e terra
o Trabalho: fator de produção com perfeita mobilidade entre os setores (usado
na produção dos 2 setores e pode mover-se de um setor para o outro)
o Capital: fator de produção específico do setor de tecidos (usado somente na
produção de tecidos; não pode ser usado na produção de alimentos)
o Terra: fator de produção específico do setor de alimentos (usado somente na
produção de alimentos; não pode ser usado na produção de tecidos)
 Tecnologias de produção dos setores em cada país: uso de fatores de produção
o Produção de tecido usa somente capital e trabalho (não usa terra)
o Produção de alimentos usa somente terra e trabalho (não usa capital)
 Preços:
o no país C:
 Alimento: PAC
 Tecido: PTC
o no país D:
 Alimento: PAD
 Tecido: PTD

Suponha, adicionalmente que: PTC < PTD e que PAC > PAD . Assim, com a liberalização comercial:

 Consumidores do país C:
o Permanecem comprando tecido nacional (mais barato que o importado)
o Passam a comprar alimento importado do país D (mais barato que o nacional)
→ diminui a demanda por alimento de C, reduzindo PAC , e aumenta a demanda
por alimento de D, aumentando PAD → setor de alimento no país C passa a
concorrer com importações (setor que concorre com importações em C) e o
setor de alimento do país D passa a exportar (setor de exportação em D)
 Consumidores do país D:
o Permanecem comprando alimento nacional (mais barato que o importado)
o Passam a comprar tecido importado do país C (mais barato que o nacional) →
diminui a demanda por tecido de D, reduzindo PTD , e aumenta a demanda por
tecido de C, aumentando PTC→ setor de tecido no país D passa a concorrer com
importações (setor que concorre com importações em D) e o setor de tecido do
país C passa a exportar (setor de exportação em C)

Assim, temos que a liberalização comercial:

 aumenta o preço relativo do tecido em relação ao alimento no país C, ou o que é


equivalente, diminui o preço relativo do alimento em relação ao tecido no país C.
 aumenta o preço relativo do alimento em relação tecido ao no país D, ou o que é
equivalente, diminui o preço relativo tecido em relação ao alimento no país D.
Fatores específicos e distribuição de renda – Prof. Allexandro Mori Coelho

Vimos que o resultado geral da liberalização comercial é: a liberalização beneficia o fator de


produção específico do setor de exportação de cada país, mas prejudica o fator de produção
específico do setor que concorre com importações, com efeitos ambíguos para os fatores de
produção móveis entre os setores.

Desta forma, devido à liberalização comercial há efeitos distributivos (mudança na distribuição


da renda nacional):

 no país C:
o o capital, fator de produção específico do setor de exportação (tecido), tem
aumento de remuneração (ganha com a liberalização comercial)
o a terra, fator de produção específico do setor que concorre com importação
(alimento), tem queda de remuneração (perde com a liberalização comercial)
o o efeito sobre a participação do trabalho, fator de produção móvel entre os
setores, é ambíguo
 no país D:
o a terra, fator de produção específico do setor de exportação (alimento), tem
aumento de remuneração (ganha com a liberalização comercial)
o o capital, fator de produção específico do setor que concorre com importação
(tecido), tem queda de remuneração (perde com a liberalização comercial)
o o efeito sobre a participação do trabalho, fator de produção móvel entre os
setores, é ambíguo

Assim, espera-se que:

 no país C:
o os donos do capital sejam favoráveis à liberalização, pois a liberalização lhes
gera ganhos
o os donos da terra sejam contrários à liberalização, pois a liberalização lhes gera
perdas
o o posicionamento dos donos do trabalho é ambígua
 no país D:
o os donos da terra sejam favoráveis à liberalização, pois a liberalização lhes gera
ganhos
o os donos do capital sejam contrários à liberalização, pois a liberalização lhes
gera perdas
o o posicionamento dos donos do trabalho é ambígua

Referência de leitura: capítulo 4 do livro Economia Internacional, de Paul Krugman, Maurice


Obstfeld e Marc Melitz.

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