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ESTUDO DE MISTURA ASFÁLTICA MORNA COMO REVESTIMENTO DE

PAVIMENTO: APLICAÇÃO NA RODOVIA PRESIDENTE DUTRA

Rosângela Motta
Liedi Bernucci
Escola Politécnica da Universidade de São Paulo
Departamento de Engenharia de Transportes
Valéria Cristina de Faria
Décio de Rezende Souza
Grupo CCR
José Fernando Leal
Quimigel – Divisão Química

RESUMO
Este trabalho apresenta os resultados de um estudo laboratorial e a aplicação em campo de uma mistura asfáltica
morna, introduzindo assim este novo tipo de tecnologia na Concessionária NovaDutra. Tal técnica permite não
só reduzir o consumo energético, mas também a emissão de poluentes, o que pode ser incluído em projetos para
comercialização de créditos de carbono. A mistura morna foi produzida com diminuição de 25ºC, em relação à
mistura asfáltica em temperatura convencional, com o uso de um aditivo surfactante. No estudo de laboratório
comparou-se o comportamento da mistura morna com a mistura a quente, por meio de ensaios de resistência à
tração por compressão diametral e deformação permanente, além de verificação da habilidade de compactação e
dano por umidade induzida. Os resultados mostraram que a mistura morna apresentou comportamento
satisfatório, comparável à mistura convencional. Já em pista, a mistura morna foi aplicada em um trecho
experimental de 300 metros na Rodovia Presidente Dutra, tendo sido preparada do mesmo modo que uma
mistura a quente, com exceção do uso do aditivo e da redução da temperatura de usinagem, além da
compactação que também foi realizada da maneira convencional. O controle tecnológico indicou valores de
volume de vazios e de espessura dentro das especificações. No mais, foram extraídos corpos de prova de pista
para testes posteriores de resistência à tração por compressão diametral, cujos resultados também se mostraram
satisfatórios. Por fim, foram ainda executados levantamentos das condições funcionais e estruturais do
pavimento, por meio da verificação de irregularidade, macrotextura, microtextura e deflexões, que por sua vez
também apontaram valores dentro do aceitável.

Palavras-chave: misturas asfálticas mornas; estudo laboratorial; trecho experimental.

1. INTRODUÇÃO
Nos últimos anos a preocupação com o meio ambiente tem sido cada vez mais evidente e o
setor rodoviário tem procurado seguir esta mesma tendência, desenvolvendo novas
tecnologias no âmbito da pavimentação com o objetivo de contribuir neste aspecto. Dentro
deste contexto, surgiram as misturas asfálticas mornas (em inglês, Warm Mix(es) Asphalt –
WMA), que visam reduzir as emissões de poluentes e reduzir o consumo energético. As
misturas mornas se referem a um grupo de tecnologias que vêm sendo desenvolvidas desde à
década de 90, com o intuito de diminuir a temperatura de produção e aplicação em cerca de
30°C ou mais, em relação às misturas a quente convencionais, mantendo-se o mesmo
comportamento destas últimas (Prowell e Hurley, 2007).

A literatura em geral indica que tal redução de temperatura com as misturas mornas pode
trazer importantes benefícios como:
 Menor emissão de poluentes atmosféricos: As temperaturas mais baixas geram
menores quantidades de poluentes lançados ao ar, não só porque são emitidos menos vapores
e fumos de asfalto durante a mistura em usina e a aplicação em campo, mas também porque
parte do combustível que seria utilizado na usinagem deixa de ser queimado (Prowell e
Hurley, 2007). Dentro deste contexto, a iniciativa de se diminuir as emissões de poluentes
poderia então ser inserida em projetos para a obtenção de créditos de carbono, e a venda
destes passaria ser um atrativo competitivo para as misturas mornas (Olard, 2008);
 Melhoria do ambiente de trabalho na pavimentação: Com o uso de misturas mornas
os operários de pavimentação ficam menos expostos às emissões asfálticas, sendo este um
fator positivo para a sua saúde. Além disso, os trabalhadores passam a ter um ambiente de
trabalho com temperatura mais amena e com redução de odores (Newcomb, 2006; Prowell e
Hurley, 2007);
 Diminuição do consumo energético: Como a temperatura de produção das misturas
mornas é mais baixa que as misturas a quente, há uma redução da quantidade de combustível
necessário no processo usinagem (Newcomb, 2006; Prowell e Hurley, 2007);
 Menor envelhecimento do asfalto: A usinagem é uma fase onde ocorre grande parte do
envelhecimento do ligante (Bernucci et al., 2008) e, deste modo, a diminuição da temperatura
nesta etapa pode levar a uma menor oxidação do asfalto, reduzindo o endurecimento da
mistura, aumentando a resistência à fadiga e elevando a durabilidade do pavimento em longo
prazo (Newcomb, 2006; Prowell e Hurley, 2007);
 Uso de maiores quantidades de material fresado: Como a quantidade de material
fresado em uma mistura reciclada normalmente é limitado (até cerca de 25%) devido à
questão da temperatura, o emprego de misturas mornas pode favorecer a adição de maiores
percentuais (Olard, 2008; Prowell e Hurley, 2007).
 Menor dificuldade de aplicação em épocas ou locais de clima muito frio e Maior
habilidade de transporte por longas distâncias: O emprego de misturas mornas pode ser
favorável nas situações em que há grande preocupação com a queda significativa de
temperatura da mistura, que acarretam em dificuldades de compactação e em perda de
material, uma vez que a taxa de esfriamento é dada pela diferença de temperatura entre a
mistura asfáltica e o meio ambiente. Neste caso, a mistura produzida em temperatura mais
baixa esfria sob uma taxa menor, possuindo menor gradiente térmico que uma mistura mais
quente (Newcomb, 2006; Prowell e Hurley, 2007).

Para que seja possível fabricar misturas asfálticas em temperaturas mais baixas que aquelas
convencionais a quente, normalmente empregam-se aditivos químicos, que são inseridos no
ligante ou na mistura, e/ou faz-se uma alteração do processo de usinagem para a produção de
asfalto espumado com água (Prowell e Hurley, 2007).

Como se trata de um tipo de técnica de pavimentação relativamente recente, diversos estudos


vêm sendo desenvolvidos em escala laboratorial, além da aplicação em trechos experimentais.
Dentro deste contexto, esta pesquisa tem o objetivo de avaliar, em laboratório e em campo,
uma mistura asfáltica morna produzida com aditivo químico surfactante, introduzindo este
novo tipo de tecnologia na Concessionária NovaDutra. No estudo de laboratório compara-se o
comportamento da mistura morna com a mistura em temperatura quente convencional, por
meio de ensaios de resistência à tração por compressão diametral e deformação permanente,
além de verificação da habilidade de compactação e do dano por umidade induzida. Já em
pista, tem-se a aplicação da mistura morna em um trecho experimental na Rodovia Presidente
Dutra, com o acompanhamento da produção em usina, da execução e do controle tecnológico
(compactação). No mais, têm-se ainda testes em laboratório de resistência à tração por
compressão diametral realizados com corpos de prova extraídos de pista, além de
levantamentos das condições funcionais e estruturais do pavimento (irregularidade, macro e
microtextura e deflexões) antes e após a execução do trecho experimental com mistura morna.
Cabe mencionar que esta pesquisa se insere em um estudo mais amplo com misturas mornas,
em comparação com misturas a quente convencionais, apresentado por Motta (2011).

2. ESTUDO LABORATORIAL: MATERIAIS E MÉTODOS

2.1. Materiais

Os agregados foram obtidos na pedreira Serveng Barueri (origem granito/gnaisse),


proprietária da usina de asfalto em que seria produzida a mistura morna do trecho
experimental. Para a composição da curva granulométrica (Figura 1) foram utilizados 14% de
brita 1, 45% de pedrisco, 39,5% de pó-de-pedra e 1,5% de cal CH-I (mistura seca), com
enquadramento na Faixa C do DNIT (DNIT ES031, 2006).

100
Curva granulométrica do estudo
Porcentagem passante [%]

80 Faixa C DNIT

60

40

20

0
0,0 0,1 1,0 10,0 100,0
abertura das peneiras [mm]
Figura 1 - Curva granulométrica

Já o ligante empregado na pesquisa se tratava de um CAP 30-45, procedente da refinaria


REPLAN/Petrobras (Paulínia – SP), cujos testes em viscosímetro rotacional Brookfield
(ASTM D4402, 2006) indicaram que as temperaturas de usinagem e compactação de misturas
convencionais a quente com este asfalto deveriam ser de 160 e 150°C, respectivamente. No
caso da mistura morna, considerou-se que esta última seria produzida com redução de 25°C
na temperatura de usinagem, em relação à mistura a quente. A Tabela 1 aponta as
temperaturas utilizadas neste estudo (indicadas como T).

Tabela 1 - Temperaturas de usinagem e compactação


T T Tfinal T Tfinal T
ligante agregados usinagem usinagem compactação compactação
[°C] [°C] [°C] [°C] [°C] [°C]
Mistura a quente 160 170 160 150
25 25
Mistura morna 160 135 135 125

No que se refere à dosagem, primeiramente foi feita a da mistura a quente, por método
Marshall (NBR 12891, 1993), tendo sido realizada no laboratório da concessionária. Neste
projeto de mistura, para um volume de vazios de 4,2%, o teor de ligante indicado foi de 5,0%.
A partir da dosagem da mistura a quente, considerou-se que a mistura morna seria produzida
com a mesma configuração de materiais, mas com redução do aquecimento dos agregados
(para diminuição da temperatura de usinagem) e utilização do aditivo para mistura morna.
Nesta pesquisa foi usado o aditivo surfactante líquido Gemul XT14, em uma taxa de 0,3%
(em relação à massa de asfalto), introduzido e misturado ao ligante antes da usinagem.

2.2. Estudo laboratorial

2.2.1. Habilidade de compactação


Segundo Bernucci et al. (2009), para que a compactação de uma mistura asfáltica ocorra de
maneira eficiente é preciso atentar para um aspecto fundamental, que é a temperatura
adequada no momento da densificação, pois se for muito baixa o ligante se torna plástico e
pegajoso, dificultando a compressão da mistura e a obtenção de um estado mais denso.
Tendo-se em vista que a produção e a compactação de misturas mornas ocorrem em
temperaturas mais baixas que o usual, este é um importante parâmetro a ser verificado. Neste
caso, quanto maior a porcentagem de vazios, maior seria a dificuldade de densificação.

A densificação foi avaliada em laboratório por meio do volume de vazios (VV), obtido por
pesagem hidrostática (AASHTO T166, 2007) de corpos de prova das misturas morna e a
quente (moldadas em compactador Marshall com 75 golpes por face), onde em cada caso
foram preparados quatro corpos de prova.

A Tabela 2 apresenta o VV das misturas morna e a quente, juntamente com o desvio padrão
(dp). De modo complementar, foi feita uma análise de variâncias (ANOVA) para determinar
se a mistura morna seria considerada estatisticamente igual ou diferente da mistura de
referência.

Tabela 2 - Resultado de habilidade de compactação (volume de vazios)


VV (± dp)
ANOVA
[%]
Mistura a quente 6,3 (± 0,3) Estatisticamente
Mistura morna 6,6 (± 0,2) iguais

O resultado demonstrou que a mistura morna apresentou comportamento semelhante ao da


mistura a quente quanto à habilidade de compactação (em compactador Marshall).

2.2.2. Resistência à tração por compressão diametral


A resistência à tração (RT) por compressão diametral é um parâmetro muito utilizado no
Brasil para a caracterização de misturas asfálticas e, de acordo com a DNIT ES031 (2006),
deve ser de no mínimo 0,65 MPa (a 25°C) em concretos asfálticos destinados a camadas de
rolamento ou de binder.

Nesta pesquisa a RT foi avaliada por meio de ensaio de carregamento estático a 25°C,
seguindo as recomendações da NBR 15087 (2004), com corpos de prova Marshall das
misturas morna e a quente, sendo que em cada caso foram preparados quatro corpos de prova.

A Tabela 3 apresenta o número de corpos de prova usados, a RT e o VV das misturas morna e


a quente, em conjunto com seus desvios padrão. Cabe mencionar que um problema de
controle de temperatura de moldagem levou a uma diferença significativa de VV de ambas as
misturas e teve impacto sobre a RT.

Tabela 3 - Resultado de resistência à tração por compressão diametral


RT (± dp) VV (± dp)
[MPa] [%]
Mistura a quente 1,90 (± 0,05) 4,8 (± 0,3)
Mistura morna 1,39 (± 0,02) 6,3 (± 0,2)

Com efeito, o resultado demonstrou que a RT da mistura morna foi inferior ao da mistura a
quente devido à diferença de VV (gerada na moldagem). Contudo, caso o VV de ambas fosse
semelhante, a RT também seria análoga.

Por outro lado, quando há a comparação com a RT mínima apontada em DNIT ES031 (2006),
verifica-se que a mistura morna apresentou valor bastante acima daquela, indicando bom
comportamento nesta propriedade mecânica.

2.2.3. Deformação permanente em trilha de roda


Como a deformação permanente é um dos defeitos mais comuns da pavimentação asfáltica
(Bernucci et al., 2008), se fez pertinente a avaliação deste parâmetro mecânico neste estudo,
com o ensaio de afundamento em trilha de roda realizado em simulador de tráfego francês,
conforme a norma europeia EN 12697-22 (2003a).

Para cada mistura asfáltica (morna e a quente) foi utilizado um par de corpos de prova em
forma de placas (cada qual com 5 cm de espessura × 18 cm de largura × 50 cm de
comprimento), que foram moldadas em mesa compactadora francesa, segundo descrito na
especificação EN 12697-33 (2003b).

No Brasil se tem procurado estabelecer valores máximos de afundamento em trilha de roda


em torno de 5% (aos 30.000 ciclos), devido às condições prevalecentes no país, já que o clima
e o tráfego são desfavoráveis quanto à deformação permanente. Este limite vem sendo
utilizado desde 1994 no LTP/EPUSP, ano este em que foram feitos os primeiros testes com
este simulador no país.

A Figura 2 apresenta a evolução da deformação permanente das misturas morna e a quente


(valor médio do par de placas) até 30.000 ciclos.
10%

Deformação permanente [%]


Mistura morna
Mistura a quente

5%

0%
100 1000 10000 100000
Ciclos

Ciclos
100 300 1.000 3.000 10.000 30.000
Deformação permanente [%]
Mistura a quente 1,6 2,1 2,6 3,2 3,9 4,7
Mistura morna 1,3 1,7 2,3 3,0 4,0 5,3
Figura 2 - Resultado de deformação permanente em trilha de roda

O resultado demonstrou que a mistura morna apresentou comportamento similar ao da


mistura a quente quanto ao potencial para afundamento em trilha de roda. No mais, o valor da
deformação permanente após 30.000 ciclos se mostrou próximo ao recomendável.

2.2.4. Dano por umidade induzida


O dano por umidade induzida é um importante parâmetro a ser verificado em estudos com
misturas mornas, já que estas podem estar mais sujeitas ao efeito stripping, devido à secagem
menos efetiva dos agregados (pela redução de temperatura).

Nesta pesquisa a resistência ao dano por umidade induzida das misturas morna e a quente foi
avaliada por meio da AASHTO T283 (2007), tendo-se optado pela condição de ensaio mais
severa, onde os corpos de prova condicionados à água são submetidos a uma etapa de
congelamento.

Com a realização deste teste, a norma DNIT ES031 (2006) determina que a resistência retida
à tração (RRT) mínima deve ser de 0,7 (ou seja, a perda máxima de resistência deve ser de
30% após o condicionamento, em relação ao valor de referência).

Na ocasião do trecho experimental, havia receio de que a redução de temperatura somada à


pavimentação noturna pudesse eventualmente dificultar a compactação em campo. Deste
modo, indicou-se a princípio que a mistura morna fosse preparada com um acréscimo de 0,4%
de ligante, acreditando-se que isto pudesse favorecer a lubrificação da mistura e melhorar a
densificação naquele caso. Com isto, o ensaio de dano por umidade induzida foi realizado
somente com a mistura morna usinada com 5,4% de ligante (ao invés de 5,0% de projeto).

A Tabela 4 apresenta a RT e o VV de cada grupo (condicionado e não condicionado à água)


das misturas morna e a quente, em conjunto com os desvios padrão, e seus valores de RRT.
Tabela 4 - Resultado de resistência ao dano por umidade induzida
RT (± dp) VV (± dp) RT (± dp) VV (± dp)
[MPa] [%] [MPa] [%] RRT
Grupo não condicionado* Grupo condicionado*
Mistura a quente 1,65 (± 0,03) 6,4 (± 0,2) 1,49(± 0,08) 6,9 (± 0,3) 0,90
Mistura morna* 1,18 (± 0,14) 6,9 (± 0,6) 1,05 (± 0,04) 6,5 (± 0,3) 0,89
* Cada grupo continha 4 corpos de prova
** Com teor de ligante de 5,4%

O resultado demonstrou que a mistura morna apresentou comportamento semelhante ao da


mistura a quente quanto à resistência ao dano por umidade induzida. Além disso, seu valor de
RRT foi considerado satisfatório quando comparado ao limite mínimo especificado na norma
do DNIT supracitada.

3. TRECHO EXPERIMENTAL NA RODOVIA PRESIDENTE DUTRA


O trecho experimental de mistura morna foi executado no km 225 da Rodovia Presidente
Dutra (altura da cidade de Guarulhos, Grande São Paulo), na faixa 1 da pista expressa sul
(sentido São Paulo), cabendo mencionar que esta via se caracteriza por tráfego muito pesado.

3.1. Condição inicial


Antes da obra, a concessionária NovaDutra realizou levantamentos das condições superficiais,
estruturais e funcionais do pavimento, por meio da observação de defeitos, deflexões e
irregularidade longitudinal, respectivamente.

Entre os km 225 e 226, na faixa 1 em questão, os defeitos verificados se tratavam de trincas


(fissuras) longitudinais e transversais longas.

Já quanto às deflexões, estas foram obtidas com equipamento Falling Weight Deflectometer
(FWD) e indicaram valores entre cerca de 10 e 35 × 10-2 mm (considerados baixos), que
foram inferiores à deflexão máxima admissível calculada de 41,3 × 10-2 mm.

Por fim, a irregularidade longitudinal foi levantada com perfilômetro laser para a
determinação dos índices QI (Quociente de Irregularidade) e IRI (International Roughness
Index). Segundo o Manual de Restauração de Pavimentos Asfálticos do DNIT (2006), o
pavimento deve apresentar um QI e um IRI de, no máximo, 35 cont/km e 2,7 m/km,
respectivamente, para ter um conceito bom quanto à irregularidade longitudinal. Nesta
pesquisa, os valores de QI e de IRI se situaram aproximadamente entre 25 e 100 cont/km e
entre 2,0 e 7,5 m/km, nesta ordem.

Dentro deste contexto, o projeto de restauração indicou uma fresagem e recomposição de


6 cm naquele local.

3.2. Produção em usina e aplicação da mistura morna em pista


O trecho experimental foi executado na Rodovia Presidente Dutra de forma noturna, em
novembro de 2009.

A mistura morna foi preparada na usina de asfalto Serveng Barueri (gravimétrica), tendo sido
fabricada do mesmo modo que uma mistura convencional, com exceção da temperatura e da
introdução do aditivo surfactante no tanque de ligante previamente à usinagem (sendo
mantido sob agitação até o momento da utilização).

A usinagem da mistura morna pôde ser efetuada a 135°C, com redução de temperatura de
25°C m relação a uma mistura a quente (como em laboratório). Ao final, os agregados
aparentavam estar bem envolvidos pelo ligante.

Como se comentou no item anterior, em se tratando de uma primeira experiência de campo


com mistura morna na Rodovia Presidente Dutra, receava-se que houvesse uma eventual
dificuldade de compactação em pista e, assim, por fim indicou-se que houvesse um pequeno
incremento da quantidade de ligante na mistura morna, em relação ao projeto original. Neste
caso, o controle tecnológico de obra apontou que a quantidade de asfalto efetivamente
empregada na mistura morna foi de 5,2% (verificada por extração e recuperação do ligante
pelo método Abson).

Em pista, a execução do trecho experimental com a mistura morna se deu sob uma
temperatura ambiente de cerca de 15°C, ao longo de pouco mais de 300 m. Da Figura 3 à
Figura 5 têm-se algumas imagens desta obra, cuja compactação foi realizada do mesmo modo
que seria com uma mistura convencional a quente (método executivo), mas com temperatura
de aproximadamente 120°C.

Figura 3 - Aparência da mistura morna Figura 4 - Espalhamento da mistura morna

Figura 5 - Compactação da mistura morna (rolos de pneus e metálico, respectivamente)


3.3. Controle tecnológico de compactação e espessura
O controle tecnológico de compactação e espessura do trecho experimental com mistura
morna foi realizado por meio de corpos de prova extraídos de pista logo após a obra (quatro
amostras). Neste caso, foram avaliados os parâmetros de grau de compactação (GC), volume
de vazios (VV) e espessura (e), cujos valores médios e desvios padrão estão indicados na
Tabela 5.

Tabela 5 - Resultado de controle tecnológico de compactação e espessura


GC (± dp) VV (± dp) e
[%] [%] [cm]
99,7 (± 1,2) 4,2 (± 1,2) 6,7 (± 0,5)

Com relação ao GC, a norma DNIT ES031 (2006) determina que este deve se situar entre 97 e
101%. Com isto, nota-se que a mistura morna alcançou tal objetivo.

Já segundo as especificações de projeto, o VV deveria se situar entre 2,5 e 7,5%, enquanto a


camada deveria ter uma espessura acima de 5,7 cm (95% de 6 cm). Deste modo, verifica-se
que a mistura morna atendeu tais limites, levando o trecho a ser aprovado por compactação e
espessura.

3.4. Resistência à tração de corpos de prova extraídos de pista


Após um mês da obra, bem como depois de onze meses desta, foram extraídos corpos de
prova do trecho experimental de mistura morna para determinação de sua RT. Os resultados
desta propriedade mecânica, bem como o VV em cada situação são apresentados na Tabela 6,
juntamente com obtido nos estudos em laboratório. Cabe mencionar que cada valor se refere a
uma média de quatro corpos de prova.

Tabela 6 - Resultado de resistência à tração por compressão diametral de corpos de prova


extraídos do trecho experimental e dos estudos laboratoriais
RT (± dp) VV (± dp)
[MPa] [%]
Corpos de prova extraídos após um mês 1,74 (± 0,13) 4,3 (± 1,4)
Corpos de prova extraídos após onze meses 1,71 (± 0,12) 4,4 (± 0,9)
Mistura morna em laboratório 1,39 (± 0,02) 6,3 (± 0,2)
Mistura a quente em laboratório 1,90 (± 0,05) 4,8 (± 0,3)

Ainda que, devido a um problema de controle de temperatura de moldagem, a mistura morna


em laboratório tenha apresentado maior VV e, por consequência, sofrido redução da RT, os
resultados de pista demonstraram ser equiparáveis àqueles laboratoriais da mistura a quente,
além de estarem notavelmente acima do mínimo requerido na especificação do DNIT
(0,65 MPa, como mencionado no item 2.2.2).

Por fim, verificou-se também que a RT se manteve em um mesmo patamar até após quase um
ano da execução do trecho experimental.

3.5. Irregularidade longitudinal


Após sete meses da execução do trecho experimental, fez-se um novo levantamento da
irregularidade do pavimento, com perfilômetro laser, para a determinação dos índices QI e
IRI. Os resultados estão ilustrados na Figura 6, juntamente com os valores obtidos antes da
obra e com os admissíveis, recomendados pelo Manual de Restauração de Pavimentos
Asfálticos do DNIT (2006).

100
TRECHO QI antes da obra
90 EXPERIMENTAL QI depois da obra
80 QI admissível
70 IRI antes da obra
QI [cont/km]

IRI [m/km]
60 IRI depois da obra
50 IRI admissível
40
30
20
10
0
225,000

225,100

225,200

225,300

225,400

225,500

225,600

225,700

225,800

225,900

226,000
Local [km]
Figura 6 - Resultado de QI e IRI antes e após a execução do trecho experimental

Observa-se que o novo revestimento trouxe melhoria das condições de irregularidade, que
apresentava pontos acima do admissível antes da obra, tanto de QI quanto de IRI.

3.6. Macro e microtextura superficial


Após três meses da execução do trecho experimental, foram feitos ensaios em pista para
observar as condições superficiais do revestimento asfáltico em termos de macro e
microtextura, por meio de ensaios de mancha de areia (ASTM E965-06) e de pêndulo
britânico (ASTM E303-08).

Segundo Bernucci et al. (2008), tem-se recomendado que a macrotextura de pavimentos


asfálticos se situe entre 0,6 mm e 1,2 mm de altura média de mancha de areia (HS), enquanto
que o valor de resistência à derrapagem (VRD) mínimo recomendado é de 47 no pêndulo
britânico, a fim de garantir ao menos uma microtextura medianamente rugosa relativa à
aderência.

Nesta pesquisa os levantamentos foram feitos em alguns pontos do trecho experimental, bem
como no revestimento antigo (localizado antes do segmento de mistura morna) para
comparação, cujos resultados médios são apresentados na Tabela 7.

Tabela 7 - Resultado de macro e microtextura no trecho experimental


HS (± dp)
Classificação VRD (± dp) Classificação
[mm]
Revestimento antigo 0,41 (± 0,03) Média 39 (± 4) Lisa
Insuficientemente
Trecho experimental 0,52 (± 0,06) Média 40 (± 6)
rugosa

Nota-se que a macro e a microtextura do trecho experimental foi classificada como média, o
que decorre da graduação densa usada, não havendo relação com o tipo de asfalto empregado.
Neste caso, o uso de uma granulometria com alguma descontinuidade seria interessante para
aumentar a rugosidade do pavimento e, por consequência, a aderência.

3.7. Deflexões
Após oito meses da execução do trecho experimental foi feito um novo levantamento de
deflexões com equipamento FWD, cujos resultados são apresentados na Figura 7, juntamente
com os valores obtidos antes da obra.

100 TRECHO
EXPERIMENTAL
80
Deflexão antes da obra
Deflexão [0,01mm]

60 Deflexão após a obra


Deflexão admissível
40

20

0
225,000

225,100

225,200

225,300

225,400

225,500

225,600

225,700

225,800

225,900

226,000
Local [km]
Figura 7 - Resultado de deflexões com FWD antes e após a execução do trecho
experimental

Os resultados demonstraram que as deflexões após a execução do trecho experimental se


mantiveram com um perfil de certa forma semelhante àquele observado antes da obra, com
valores dentro do admissível.

4. CONCLUSÕES E COMENTÁRIOS FINAIS


Esta pesquisa avaliou, inicialmente em escala laboratorial, uma mistura asfáltica morna
produzida com aditivo surfactante, em comparação com uma mistura a quente (convencional),
sendo ambas preparadas com agregados com distribuição granulométrica contínua (Faixa C
DNIT) e CAP 30-45.

Os ensaios laboratoriais indicaram que a mistura morna apresentou, no geral, comportamento


semelhante ao da mistura a quente, em termos de habilidade de compactação, resistência à
tração por compressão diametral, deformação permanente e dano por umidade induzida. Os
resultados foram considerados satisfatórios.

Por outro lado, de modo a introduzir esta nova tecnologia de pavimentação na Concessionária
NovaDutra, esta mistura morna foi então aplicada em campo, na Rodovia Presidente Dutra. A
produção da mistura em usina e a execução em pista não indicaram dificuldades executivas
adicionais e ocorreram do mesmo modo que seria com uma mistura convencional.

Os resultados de testes posteriores com corpos de prova extraídos de pista no controle


tecnológico apontaram valores satisfatórios. Ademais, os ensaios para avaliação funcional e
estrutural do pavimento, antes e após a obra, também indicaram resultados aceitáveis.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem à CAPES (pela bolsa de Doutorado da primeira autora), à CCR, à ANTT e à Quimigel –
Divisão Química.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMERICAN ASSOCIATION OF STATE HIGHWAY AND TRANSPORTATION OFFICIALS. AASHTO
T166: Standard method of test for bulk specific gravity of compacted hot mix asphalt (HMA) using
saturated surface-dry specimens. Washington, 2007.
______. AASHTO T283: Standard method of test for resistance of hot mix asphalt (HMA) to moisture-induced
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Rosângela Motta (rosangela.motta@usp.br)


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