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ÁGIL &
ANTIFRÁGIL
Quais são as bases da vantagem competitiva no cenário de negócios em que
AO ANTIFRÁGIL
“Existem três tipos de clientes da Netflix: um Incontáveis fatores levaram a Netflix a crescer ver-
grupo gosta da conveniência da entrega gratuita em tiginosamente e a Blockbuster a sumir do mapa. Ne-
casa; outro aprecia o acesso a uma ampla seleção de nhum deles, no entanto, foi tão fundamental quan-
filmes da nouvelle vague e de Bollywood; e o terceiro to a capacidade de interpretar um mundo cada vez
curte a barganha de assistir a dez ou mais filmes por mais volátil, incerto, complexo e ambíguo – cenário
US$ 18 ao mês. Precisamos manter os três públicos que, em inglês, é resumido pela sigla VUCA – e a
felizes, porque, quanto mais a pessoa usa a Netflix, adaptação rápida ao que acontece. Cunhado pelo
mais ela quer permanecer conosco.” Exército norte-americano para lidar com conflitos
O ano era 2005, e a Netflix ainda não oferecia no Oriente Médio nos anos 1990, o acrônimo extra-
streaming de vídeo; resumia-se a uma empresa de polou os círculos militares para deixar sua marca no
locação de DVDs pelo correio. Mas, naquele de- meio corporativo.
poimento para a revista Inc., seu fundador, Reed A Netflix soube fazer essa interpretação e se adap-
Hastings, parecia saber exatamente o que fazer tar; a Blockbuster não. Empresas como Google e
para transformar a marca em uma potência do en- Amazon dificilmente chegariam ao nível de exce-
tretenimento mundial. A própria criação da Net- lência que têm hoje se não tivessem líderes com ca-
flix, em 1997, está vinculada à premissa do foco pacidade de interpretar o VUCA e se adaptar.
total no cliente. Enquanto a maioria das organizações insiste em
Hastings vislumbrou o negócio depois de ser planejamentos estratégicos de longo prazo e aposta
obrigado a pagar US$ 40 por devolver com atraso o todas as suas fichas em teorias como as cinco for-
VHS de Appolo 13 em uma Blockbuster. Em apenas ças de Porter ou a matriz SWOT –, Netflix, Goo-
dois anos, a base de usuários da Netflix já contava gle e Amazon aceitaram que a não linearidade dos
com 239 mil pessoas. fatos veio para ficar e vivem plenamente o mundo
O resto da história você conhece. O envio de DVDs VUCA. Fazem isso sendo rápidas para se adaptar
pelo correio ficou obsoleto, mas, antes, a Netflix mi- ao que acontece a sua volta. Fazem isso reduzindo
grou para o streaming. Já a Blockbuster, que chegou a as fragilidades que, ante acontecimentos fortuitos,
ter 9 mil lojas nos Estados Unidos, pediu concordata poderiam levá-las ao colapso.
em 2010. Uma década antes, havia tido a chance de Um número crescente de empresas tem com-
comprar 49% da Netflix por US$ 50 milhões e recu- preendido que viver o mundo VUCA significa
sado. E, quando resolveu criar uma solução própria tomar duas decisões: tornar-se ágil, como o desen-
de filmes online, era tarde. Hoje a Netflix tem mais de volvimento de software, e antifrágil, como prega
100 milhões de assinantes e valor de mercado supe- o ensaísta e matemático libanês-americano Nas-
rior a US$ 60 bilhões, e a Blockbuster é insignificante. sim Taleb, que é professor de engenharia de risco
A ANTIFRAGILIDADE
“A grande diferença dos métodos ágeis é que eu Uma das características do mundo VUCA são os
faço um projeto sem saber qual será o produto final; fatos imprevisíveis, capazes de transformar a socie-
sei meu compromisso com o objetivo final e vou in- dade de um dia para o outro, como foi o ataque
serindo o cliente em cada etapa do projeto para de- terrorista de 11 de setembro de 2001. Eles foram
finir a próxima”, detalha Pedro Waengertner, pro- chamados pelo matemático Taleb de “cisnes ne-
fessor da ESPM-SP e cofundador da aceleradora gros” no best-seller A lógica do cisne negro, que, em
de startups Ace. 2006, profetizou a crise econômica de 2008 tanto
O manifesto dos desenvolvedores explica por do ponto de vista dos estragos nos mercados de de-
que as organizações da área de tecnologia foram as rivativos como da perspectiva da quebradeira no
pioneiras na proliferação dos métodos ágeis e tem mercado imobiliário norte-americano.
parte da culpa por empresas como Netflix, Google A maneira de abordar os cisnes negros é a anti-
e Amazon brilharem tanto. “A Amazon vai além: é o fragilidade, como explica Taleb em outro best-seller,
A ANTIFRAGILIDADE E O BRASIL
POR RICHARD RYTENBAND
OS FATORES DE FRAGILIDADE
Quais são as bases da vantagem competitiva na acabamos assistindo a um debate sem fim e a uma
era ágil, o cenário de negócios em que estamos tendência de privilegiar as evidências racionais em
entrando? Muitos analistas afirmam que o fator detrimento da intuição. Desse modo, as empresas
predominante é o poder de reunir e utilizar infor- parecem ficar estacionadas enquanto o mundo em
mações. Erik Brynjolfsson e Andrew McAffee, por volta delas acelera cada vez mais.
exemplo, argumentam se tratar de uma “segunda Alguns executivos, atentos a esse cenário, estão
era das máquinas”, em que a tecnologia da infor- adotando uma abordagem que chamamos de
mação será o motor do progresso humano. Já o Mc- “avanço rápido” (fast forward, no original em inglês):
Kinsey Global Institute considera que o imenso vo- colocar ênfase em ações decisivas, antes mesmo de
lume de dados com potencial para afetar os negó- fazer análises detalhadas. Para tanto, eles se sentem
cios (chamados de big data) é “a próxima fronteira confortáveis em confiar nas convicções emocionais,
da inovação, da competição e da produtividade”. juntamente com os julgamentos mais racionais.
Nós temos uma visão diferente. Acreditamos que Um bom exemplo de abordagem de avanço rápi-
o big data é um aspecto superestimado. À medi- do é a Amazon, que desafiou todas as regras estabe-
da que as informações se tornarem cada vez mais lecidas sobre as organizações se concentrarem em
onipresentes e os custos de busca tenderem a zero, suas competências essenciais. Como o próprio fun-
eles não proporcionarão um diferencial para as- dador da empresa, Jeff Bezos, costuma dizer, “cer-
sumir a dianteira. Além disso, a sobrecarga de in- tas decisões podem ser tomadas com base em aná-
formações sobre as pessoas leva a menor grau de lises, e essas são as melhores decisões! Infelizmente,
atenção, a maior confusão e a um processo de to- há também todo um conjunto de decisões que não
mada de decisão mais precário. Nas organizações, podem ser traduzidas em uma equação matemáti-
ca”. No segundo grupo de decisões estão algumas
de suas grandes apostas em novos negócios, como
Jonas Ridderstrale é autor do best-seller Funky business o Kindle e a Amazon Web Services.
e já foi considerado um dos cinco maiores gurus de Mais do que mergulhar em longas e demoradas
management da Europa. Julian Birkinshaw é professor da
análises, as empresas que praticam o avanço rá-
London Business School e autor de 25 ferramentas de
pido promovem a ação e a experimentação. Seus
gestão (ed. HSM). Juntos, escreveram Fast forward: make
líderes sabem quando devem “ouvir” os dados e
your company fit for the future, no qual se baseia este artigo.
quando decidir com base na intuição.
A EVOLUÇÃO DA ORGANIZAÇÃO
ÊNFASE
AÇÃO ADHOCRACIA
“AÇÃO É
PODER“
CONHECIMENTO
MERITOCRACIA
“CONHECIMENTO
É PODER“
BUROCRACIA
“CARGO É
CARGO
PODER“
Ninguém, exceto Ele (para os crentes), tem con- O anteriormente útil pode ficar inútil, e a chance de
trole sobre tudo. Pense em uma viagem: mesmo no isso ocorrer aumenta em países como o Brasil, em que
verão, você pode até carregar um casaquinho para as empresas são castigadas por insegurança jurídica e
viajar. Mas, se for preciso precaver-se contra todas as descontinuidade de políticas públicas.
variações climáticas possíveis, a carga será tão pesada Só que o mundo do software se rebelou contra
que talvez não valha a pena sair de casa. isso e criou a filosofia ágil, que parte da noção de
Até o início dos anos 2000, era mais ou menos mínimo produto viável – o MVP –, definidor dos re-
assim o gerenciamento de projetos de desenvolvi- quisitos mínimos para uma primeira versão do pro-
mento de software. Mesmo que não soubesse que duto. A partir daí surgem melhorias incrementais,
funcionalidades seriam úteis, o cliente tinha de pre- agregando novas funções. A lógica BDUF (sigla em
ver tudo o que poderia ser necessário um dia (talvez). inglês de grande design desde o início, em tradução
O produto era desenvolvido obedecendo a uma se- livre) deu lugar à EDUF (design suficiente no iní-
quência, que levava meses ou anos, e só era lança- cio). A novidade estabeleceu um antes e um depois
do quando a última etapa estava concluída – e nem na indústria de software.
sempre atendia às necessidades iniciais de quem o Como quase tudo virou projeto nas empresas, es-
encomendara. Era um modelo em cascata, no qual palhou-se por elas. “Em vez de nos concentrarmos
se desperdiçava cerca de 40% do orçamento. no produto, olhamos para a engenharia de valor”,
Algo similar acontece com os negócios hoje, e a explica Carlos Tristacci, gerente de agile services
prova são os ciclos orçamentários: em um ano se pro- da Meta, desenvolvedora de soluções de tecnologia
grama o que será executado no próximo exercício. da informação com operações em vários estados do
País. Exemplos de organizações que adotam méto-
dos ágeis no Brasil vão da TV Globo ao Ministério
da Justiça.
“PEDIMOS DESCULPAS, Por isso, ajustes e erros viraram parte do processo.
“Costumamos dizer que pedimos desculpas, não pe-
NÃO PEDIMOS PERMISSÃO” dimos permissão”, afirma Alexei Villas Boas, diretor
de tecnologia da ThoughtWorks Brasil, consultoria
ALEXEI VILLAS BOAS,
norte-americana de TI que opera há sete anos no País
DA THOUGHTWORKS BRASIL
e segue a filosofia ágil em todas as suas áreas. Por isso,
colaboração é a palavra-chave. “Falamos mais em
LEAN Conhecido como Sistema Toyota de Produção, o lean foi criado no Japão com o objetivo
central de maximizar o valor para o cliente e minimizar desperdícios. Isso é feito, por
exemplo, com uma produção just-in-time, em que se fabrica apenas o que o cliente quer
e se controla a produção por meio do kanban. Isso significa promover o fluxo contínuo
de produção, buscar erro zero, implementar processos de análise em todas as etapas e
corrigir os problemas já em sua origem. E o estoque é reduzido. Seus métodos inspiraram
metodologias como o scrum e o extreme programming.
KANBAN Também criado nas fábricas da Toyota, o kanban (cartão, em japonês) foi incorporado
nos métodos ágeis por permitir uma gestão eficiente dos recursos. O método faz uso de
quadros ou murais (geralmente com post-its) para que todos possam visualizar o fluxo
de trabalho da equipe, permitindo que os bloqueadores e as pendências de cada tarefa
sejam facilmente identificados e resolvidos. Essencialmente, o quadro é dividido em três
partes: to do, in progress e done (a fazer, em andamento e feito). No entanto, dependendo
da complexidade de um negócio ou projeto, o fluxo de trabalho pode ser adaptado, com a
inclusão de outras etapas. Há ferramentas virtuais que imitam o kanban, como o Trello.
O método é usado frequentemente em conjunto com o scrum, já que ambos pregam a
transparência nos processos, concentram-se na entrega de valor, exigem a divisão dos
projetos em etapas e se baseiam em equipes auto-organizáveis.
FAMÍLIA DE Criada por Alistair Cockburn, a metodologia Crystal é, na verdade, uma família de
METODOLOGIAS metodologias, que abarca Crystal Clear, Crystal Yellow, Crystal Orange, Crystal Red
CRYSTAL e Crystal Maroon, variando de acordo com a complexidade do projeto. Trata-se de
uma abordagem mais voltada para a gestão de pessoas, e seu foco é a interação entre
os membros da equipe, que têm diferentes talentos e habilidades – e, portanto, são
necessários processos específicos para cada um. Cockburn desenvolveu a metodologia
com base em alguns princípios, como efetividade e otimização do tempo da comunicação
cara a cara, perda de desempenho das pessoas ao longo do tempo e variação de
produtividade de acordo com o dia e o ambiente. Enquanto o scrum prega a organização
em times com uma média de seis pessoas (podendo chegar a nove), as metodologias
Crystal apoiam times com até cem membros.
GROWTH HACKING Essa versão da filosofia ágil foi criada por Sean Ellis para o marketing, uma das áreas das
empresas que mais têm sofrido com a complexidade reinante e que mais precisam se
adaptar às mudanças no entorno. Adaptações do growth hacking pululam na gestão de
marketing, como Startup Pyramid, Pirate Metrics (ou AARRR) e Lean Analytics Stages.
Além disso, surgiram outros frameworks, focados na gestão de diferentes canais: The ICE
Store, The Bullseye Framework, The Hook Model e STEPPS. Cada um prega diferentes
métodos para gerenciar projetos, mas a lógica é a mesma: dividir para conquistar.
OBAMA NÃO É BOM Em Skin in the game, que tem rascunhos disponíveis
na internet, o especialista lembra que as religiões
MODELO DE LÍDER já impunham esse engajamento de seus fiéis havia
muito tempo – essa era a função dos sacrifícios. Taleb
A edição 2017 da pesquisa Carreira dos
mostra a foto de um altar que viu ao visitar um templo
sonhos, publicada na HSM Management n. 123
extra, revela que o ex-presidente dos Estados da cidade síria de Maalula, em que há um resquício
Unidos Barack Obama é um dos líderes mais de sangue, para dizer que até os cristãos (primitivos)
admirados pela comunidade empresarial exigiam sacrifícios de animais, não só os pagãos
brasileira. Obama aparece como o segundo
O problema das empresas, em sua visão, é que
líder mais citado pela alta liderança do País
(perdendo só para Jorge Paulo Lemann) e como quem cuida dos riscos nelas são os gestores de risco,
o terceiro pela média gerência (atrás de Lemann não os tomadores de risco. Estes, que arriscam a pró-
e Silvio Santos). pria pele, têm a vantagem da assimetria informacio-
No entanto, Nassim Taleb desaprova o
nal, ou seja, têm muito mais informações sobre aquilo
modelo, citando quatro razões principais:
(1) a tendência a fazer intervenções – no caso, nos em que se envolvem do que os outros. De todo modo,
assuntos internacionais, (2) o fato de proteger funcionários em geral costumam arriscar mais a pele
bancos e outros empresários em dificuldades do que, por exemplo, fornecedores terceirizados.
em vez de fazê-los responder por seus atos,
Com o livro, Taleb quer mudar a noção de risco
(3) as tentativas de centralização e (4) o excesso
de regulamentação no mercado doméstico. que a maioria das pessoas tem. “Há muita confusão”,
As intervenções fariam de Obama um líder escreve ele. “Coisas voláteis não são necessariamente
irresponsável, segundo Taleb. “Eu culpo Obama arriscadas, assim como cair nem sempre é arriscado:
pela guerra na Síria, por exemplo”, diz.
cair da cadeira pode ser algo bom; cair do 22º andar
Já a prática de proteção constituiria um
desserviço à sociedade, por enfraquecer o é que não é. O que importa no risco é evitar a ruína.”
princípio de arriscar a pele, e também seria
questionável eticamente, uma vez que
beneficiou de advogados ricos a banqueiros
do Goldman Sachs. Quanto à centralização,
o Medicaid foi uma tentativa de promovê-la,
ESTRATÉGIA CONVEXA
desrespeitando o princípio de independência
dos estados que rege a federação dos A estratégia que as empresas devem adotar para se
Estados Unidos e que é tão importante
beneficiar da desordem, na visão de Taleb, é a conve-
para a antifragilidade. Por fim, o excesso
de leis e regulamentações só dificultaria xa. O nome vem do gráfico que cruza investimento e
o empreendedorismo das pessoas, que é o retorno em cada projeto [veja página ao lado]; a curva
melhor caminho para um país antifrágil. convexa é a que tem menos investimento e retorno ili-
Isso significa que Donald Trump é um bom
mitado, enquanto a côncava, “retranqueira” no risco,
modelo de líder? “Não necessariamente.” O
matemático pede que se ignore o “Trump do corresponde a mais investimentos e limita o retorno.
Twitter” e aponta os fatores que justificaram A convexidade existe quando se corre maior risco
sua eleição como uma busca de antifragilidade: ao investir, apostando em um retorno muito maior. In-
a propensão a desregular e a simplificar, a
vestimentos de pesquisa e desenvolvimento e de ven-
disposição de evitar intervencionismo e uma
atmosfera mais amigável aos negócios. ture capital são tipicamente convexos. Como Taleb
Para Taleb, o líder antifrágil ideal é o escreve, “as propostas convexas devem ser abraçadas,
presidente da Suíça. “Você pode perguntar e as côncavas, evitadas como se fossem pragas”.
o nome dele nas ruas de Genebra ou Zurique
É preciso haver ainda a opcionalidade, ou seja,
que ninguém saberá .” Ele faz os líderes locais
funcionarem; aliás, um time de liderança muitas opções disponíveis em relação aos negócios,
coeso, em que uns confiem nos outros, é em quantidade e em qualidade. A opcionalidade é
fator de antifragilidade, bem como a clareza que viabiliza outra prática de antifragilidade reco-
da comunicação deles. Já de trabalho em
mendada: atuar com base em tentativa e erro.
equipe esse líder não precisa cuidar. “Não
existe teamwork; é só buzzword. Há talentos Taleb compartilha as regras básicas da estratégia
individuais atuando com coordenação. As antifrágil: (1) minimizar dívidas; (2) garantir que ne-
pesquisas sobre isso não têm validez científica.” nhum produto ou mercado concentre mais de 10%
INVESTIMENTO
ESTRATÉGIA
CÔNCAVA
ESTRATÉGIA
CONVEXA
RETORNO
RETORNO
da receita total; (3) assegurar que nenhum negócio entendem bem o que é risco. O problema é outro: o fra-
imponha sozinho mais do que 10% das perdas; (4) casso não é socialmente aceito; isso é que tem de mudar.”
garantir que nenhum contrato seja uma prisão no Para Taleb, o Brasil tem uma veia empreendedora
longo prazo – é obrigatório haver saídas; (5) ter um similar à que se vê no sul da Itália, região que pode
planejamento de longo prazo com comprometimen- ser descrita como antifrágil. “As raízes latinas fazem
to de curto prazo; (6) possuir sempre um plano B; e com que o Brasil esteja menos longe da antifragilidade
(7) ter muitos subcontratados, produzindo em casa do que imagina.” O governo brasileiro pode acelerar
só o mínimo necessário. “Isso faz a empresa ter mais isso promovendo descentralização; o benchmark é a
a ganhar do que a perder com a aleatoriedade”, diz. Suíça, que decide tudo no nível local – apenas o exér-
Um dos conceitos mais contraintuitivos da antifra- cito, o banco central, o sistema legal e algumas ques-
gilidade é a redundância, que muitos gestores veem tões constitucionais são federais. “Já Brasília é o maior
como desperdício. Não é preciso ter dois funcionários experimento de centralização que o mundo já viveu.”
para a mesma função, mas é aconselhável que duas ou As grandes organizações – mais frágeis, mais su-
mais pessoas saibam desempenhá-la (o que pode ser jeitas a catástrofes – foram impostas ao Brasil, mas,
obtido, por exemplo, com job rotation ou um tercei- culturalmente, o País é muito mais afeito às peque-
rizado). O mesmo vale para a redundância de ativos. nas empresas e ao empreendedorismo. “Agora que
A via negativa se destaca: saber o que é falso é mais os produtos são mais software que hardware – no
valioso do que saber o que é verdadeiro, já que ele não carro elétrico, o número de peças despencou de 30
voltará a ser verdadeiro; da mesma forma, é mais im- mil para 3 mil –, acabou a vantagem de tamanho das
portante saber o que não fazer do que aquilo a fazer. empresas.” Mas, para o empreendedorismo voltar
Kent Beck, coautor do Agile Manifesto, tem abor- a prevalecer aqui, talvez leve uma geração, estima.
dado a antifragilidade. E o que Taleb acha da filoso- Taleb não se preocupa com nossa economia de
fia ágil? Ele se exime de responder por não ter expe- commodities – “commodities sempre serão necessá-
rimentos científicos sobre a agilidade. rias e agregar valor é possível”. Nem acha que a inte-
ligência artificial nos prejudicará especialmente. “A
IA vai atingir em cheio os países que oferecem mão de
obra barata ao mundo, como a China”, diz. Para ele,
O BRASIL E O FUTURO o risco da IA não é o do aumento de desempregados
– “vão inventar novas funções” –, e sim a crescente
“Correr riscos, opcionalidade, tentativa e erro são o desigualdade entre os que têm ideias e os que não têm.
que fazem os EUA serem líderes em inovação e influen-
ciarem o mundo”, diz o matemático, mas isso estaria
concentrado em polos tech como o Vale do Silício.
Taleb não é particularmente otimista em relação aos
VIDA PESSOAL
EUA. “Sou pessimista mesmo sobre o Japão e a Europa
em geral, exceto a Suíça e os países mediterrâneos. Sou Taleb busca a antifragilidade até no nível pessoal
otimista em relação a países que convivem bem com o – por exemplo, faz jejuns eventuais para estressar o
caos, como a Rússia e o Brasil”, afirma. Mas e o risco, tão corpo e prepará-lo para crises. Sua maior lição nessa
necessário à antifragilidade? O que ele faria para os bra- área? Não depender das opiniões alheias. “Lutei a vida
sileiros correrem mais riscos? “Acho que os brasileiros toda para ser dono de mim mesmo; vale a pena.”