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Psicomotricidade

Texto 2

Prof. Dra. Denise Dias Almeida

Petrolina
2022
Organização Psicomotora de Base
(FONSECA, 2008,p.181-2)

• Organização psicomotora da criança (Ajuriaguerra) - âmbito


neuropsicológico e motor:
• organização psicomotora de base (postura);
– organização da planificação motora (somatognosia);
– automatização (praxia)

• Primeira fase: estrutura tônica de fundo, que se processa por


intermédio da organização proprioceptiva (tônica, vestibular, tátil,
cinestésica, etc.) e pelo desaparecimento das reações primitivas, que
ilustram, no seu conjunto mais funcional, a aquisição progressiva do
sistema postural;

• Lembrem-se que o recém nascido vem equipado com componentes


anátomo-fisiológicos e sensório-neuro-motores complexos: manifestam
por reflexos, entendidos como memória da espécie;
Organização Psicomotora de Base
(FONSECA, 2008 p.182)

• O reflexo é adaptativo e tem sua importância evolutiva;

• O meio exterior, incluindo os vários ecossistemas (mãe, pai, outros,


objetos, espaço, tempo, etc.) constitui a situação que vai solicitar todo
o potencial motor do bebê por um processo de resposta e por
adaptações sucessivas necessárias e decisivas para o seu
desenvolvimento global e realizador;

• Rey (1966) refere a seguinte cadeia de organização: a atividade motora


provoca e origina os reflexos condicionados, e estes, por sua vez,
condicionam a atividade motora postural, isto é, organizam-na,
facilitando-a;

• Os reflexos acabam por gerar atos, a partir do momento em que a


criança experimenta uma resistência gravitacional do meio ambiente
sobre a forma de estimulações diversas dele provenientes, que rompem
a imobilidade da sua organização postural.
Bebê e o reflexo

• O bebê assimila o que acontece ao meio e se acomoda por meio


de possibilidades posturais e motoras sucessivas do seu
desenvolvimento psicomotor;

Reflexo primitivo de Moro

Imagem:

https://paisefilhos.uol.com.br/beb
e/reflexo-de-moro-entenda-por-
que-o-bebe-leva-sustos-e-saiba-
quanto-tempo-dura/
Idades (YABE, 2020, p.10-11)

• Morfológica: determina o peso e a altura atingidos pelo indivíduo


segundo padrões normativos.

• Óssea: determinada analisando-se o esqueleto em desenvolvimento.


Pé, tornozelo, joelho e quadril também podem ser utilizados para a
avaliação da maturação esquelética, porém mão e punho ainda são mais
comuns. A maturidade esquelética é o melhor método para a avaliação
da idade biológica ou do status de maturidade.

• Dental: fornece a mensuração da idade de erupção e da calcificação


dos dentes desde a aparição das pontas até o fechamento das raízes.

• Sexual: determinada pela maturação sexual, um processo continuo que


se inicia com a diferenciação sexual no período embrionário, passando
pela puberdade até a maturidade sexual completa e a fertilidade.
Estudo do desenvolvimento
motor (YABE, 2020)

• O estudo do desenvolvimento motor surgiu no século XX;

• Principais teorias: maturacional (Gessel e Mcgraw), ambiental


(Havighurst), processamento de informação (Schmidt e Wrisberg),
ecológica* (Urie Bronfenbrenner), da montanha (Clark e Metcalf),
e da ampulheta de Gallahue;
• A ampulheta de Gallahue considera a perspectiva de fases e estágios
de desenvolvimento, atribui referências cronológicas a cada fase de
desenvolvimento. Essa subdivisão em faixas etárias é uma tentativa de
divisão de um processo contínuo que não acontece de forma
estanque, mas progressiva e fluida.
• Quatro fases propostas por Gallahue do desenvolvimento ao longo da
infância e da adolescência: movimentos reflexo, rudimentar,
fundamental e especializado.

• *Teoria do Ambiente Comportamental: Kurt Lewin; Roger Baker.


Fases do desenvolvimento motor
de Gallahue (YABE, 2020, p.23)
Fases do desenvolvimento motor de
Gallahue (Fonte: google imagens)
Movimentos (YABE, 2020, p.24-29)

• Movimento reflexo: involuntário;

• Movimento rudimentar: 1 a 2 anos de idade; variabilidade de


movimentos observáveis; inibição de reflexos e pré-controle;
deslocamento pelo ambiente, lida ativamente com os objetos;
controle do tronco, sentar, ficar em pé; arrasta-se, engatinha e
caminha; alcança, segura e solta objetos e pessoas.

• Movimento fundamental: equilíbrio em um pé só, rolamento e giro,


corre, pula, arremessa e pega uma bola. Tentativa de realizar
movimentos mais complexos. Controle do espaço e do tempo do
movimento.

• Movimento especializado: refinamento do controle motor permite


atividades combinadas com precisão como correr e chutar. Aumento
da capacidade cognitiva. Treinamento de habilidades esportivas que
propiciam efeitos fisiológicos nas capacidades de força, resistência
muscular e capacidade cardiorrespiratória.
Organização psicomotora
(FONSECA, 2008 p.182)
Córtices motor

(BECKER, 2021, n.p)


Segunda fase (FONSECA, 2008
p.182)

• Segunda fase da organização psicomotora da criança: no seu


processo, pela passagem da integração sucessiva das aquisições
motoras posturais para a sua integração simultânea, o que
subentende um sistema somatognósico recheado dos
acontecimentos vivenciados, experienciados e incorporalizados. A
motricidade passa a ser uma melodia cinética, uma mobilidade
equilibrada autorregulada psiquicamente, flexível e ajustada no
espaço e no tempo, o que pressupõe uma elaborada integração
somatognósica.

• Os movimentos já são ajustados porque já são autocontrolados e


autorregulados psicologicamente (mais dependentes de funções
de atenção, de processamento de dados dentro e fora do corpo,
de planificação e de sequência efetora, etc.);
Segunda e Terceira fase
(FONSECA, 2008 p.183)

• A plasticidade do sistema nervoso começa a ser


significativa e iniciam-se a descoberta e a conquista
transcendente dos planos gnósicos, práxicos e sociais da
motricidade;

• A terceira fase da organização psicomotora da criança


caracteriza-se, no seu processo, pela automatização das
aquisições motoras. A automatização torna-se possível
pela interiorização dessas aquisições, as quais, por isso,
se interorganizam neuro-maturacionalmente em redes
tônico-motoras posturais como sistemas adaptativos. A
automatização constitui o arsenal de engramas;
Psicomotricidade e criança
(FONSECA, 2008 p.183)

• Tais automatismos integram ainda outros tantos planos de organização


interna, como o plano corporal ou somatognósico, o construtivo-
espacial, o perceptivo-gnósico, o gnósico-construtivo, o visuovestibular,
o rítmico, etc., que, no seu todo, caracterizam a motricidade lúdica,
social e ideacional (macro e micro) da criança e do jovem. É, pois, a
fase em que se assiste a um enriquecimento psicomotor e a uma
expressão corporal e motora mais ajustada e segura, ou seja, a uma
motricidade aprendida, mais inteligente, eficaz, precisa, perfeita, isto
é, práxica;

• Com a psicomotricidade, a criança vai descobrindo o mundo dos objetos


e dos outros. Manipulando-os, vai reconhecendo as suas propriedades e
atributos, relacionando-os com outras facetas mentais e sociais mais
diferenciadas e distanciadas;
Motricidade e ato (FONSECA,
2008 p.183)

• A motricidade vai, então, aperfeiçoando-se à medida que se opera


simultaneamente uma evolução da estruturação espaço-temporal,
primeiro livre e desorganizada, depois orientada e lateralizada, para
passar a ser finalmente representada, onde é impossível separar a
somatognosia da gnosopraxia.

• Entre a execução do ato e a sua representação há toda uma transição


simbólica, de onde resulta uma diferenciação entre o significante e o
significado. É essa diferenciação cognitiva que distingue os dois
aspectos componenciais da psicomotricidade; por um lado, o aspecto
figurativo, mais do domínio do psíquico, e, por outro, o aspecto
operativo, mais do domínio do motor, consubstanciando a síntese
funcional ou a simbiose da própria praxia.
Organização da tonicidade
(FONSECA, 2008 p.183-184)

• O valor clínico da psicomotricidade está em revelar a importância das


relações do sistema postural, da somatognosia e da organização
práxica na gênese do pensamento ou na ontogênese do potencial de
aprendizagem. A energética da psicomotricidade é de natureza
afetiva, pois visa à satisfação de necessidades, enquanto a sua
estrutura é de natureza cognitiva, pois implica uma organização
neuropsicológica complexa.

• O tônus apresenta-se como uma tensão ligeira e permanente do


músculo esquelético no seu estado de repouso;

• Tônus como uma função que assegura a preparação da musculatura


para as múltiplas e variadas formas de atividade motora, desde a
postura e as diversas formas de locomoção e de atividade até às
praxias mais complexas;

• A tonicidade envolve simultânea e dialeticamente um plano fisiológico


e um plano psicológico, não uma mera cadeia de reflexos encaixados.
Organização da tonicidade
(FONSECA, 2008 p.184-185)

• Reflexo miotático (fisiológico): responsável pela regulação da postura;

• Plano psicológico: inclui a substância reticulada, responsável pela


ativação dos canais semicirculares no equilíbrio e pela ativação dos
músculos dos olhos na coordenação, para além da vigilância e da
regulação de condutas humanas automáticas, desde as emocionais e
não-verbais, passando pelas várias dimensões verbais da linguagem
falada e da escrita, até, obviamente, às multifacetadas posturas e
praxias do patrimônio cognitivo e cultural da espécie humana;

• O músculo tem duas funções diferentes: executiva (a contração


muscular fásica) e a receptiva (sensível e tônica). Como diz
Ajuriaguerra (1974), “o tônus, que prepara e guia o
gesto, é simultaneamente a expressão da realização ou da frustração
(malaise) do indivíduo”;
Organização da tonicidade
(FONSECA, 2008 p.184)
Organização da tonicidade
(FONSECA, 2008 p.185)

• Gesto: não há apenas uma parte física, fisiológica ou


muscular, mas também uma parte mental do vivido e do
experienciado pessoalmente;

• A função tônica confere à motricidade uma dimensão


coerente, plástica e sinergética e, igualmente, uma
convergência multissensorial, uma integração emocional e
uma função de antecipação e de modulação psíquica;

• No plano restrito ou específico, o tônus apresenta-se como


uma tensão que regula e controla a atividade postural como
suporte da motricidade, consubstanciando a sua componente
córtico-descendente;
Organização da tonicidade
(FONSECA, 2008 p.185)

• A postura pode ser estudada segundo duas hipóteses que se


completam: uma top-down (de cima para baixo), que envolve a
seleção e regulação de processos psíquicos de antecipação, tendo em
conta o plano global da ação e o seu contexto, e outra down-top (de
baixo para cima), que envolve o encadeamento mecânico de
reflexos.;

• Atitude: isto é, a criação de um estado interno de preparação e de


concentração para desencadear a ação ou a resposta adaptativa para
uma dada situação ou conjunto de estímulos;

• A atitude subentende estar pronto para o movimento (readiness to


move), é o sentido de sombra que acompanha o movimento;
Organização da tonicidade
(FONSECA, 2008 p.185)

• A atitude é algo que sugere uma dimensão teleocinética, uma vez que
se conjugam dois submecanismos de repartição da tonicidade; um que
assegura o suporte antigravítico (ativação-inibição) do movimento e
outro que produz as sinergias do movimento nos membros e nas
extremidades;

• O tônus agrega a si todos os aspectos da atividade neurológica,


consubstanciando o seu componente córtico-ascendente,
especialmente integrados na organização funcional dos processos
psíquicos básicos e superiores;

• Pode-se constatar no chamado mal-estar, na doença ou em


determinadas perturbações orgânicas, que não são mais
do que o reflexo e a resultante de eventuais tensões (estresse) e
agressões da vida cotidiana não superadas no espaço e no tempo. Será?
Função tônica (FONSECA, 2008
p.185)

• Em termos simples, a função tônica distribui-se por várias


facetas:

– a que participa na regulação da atividade neuro-vegetativa;


– a que garante os estados de atenção, de vigilância e de alerta;
– a que regula a função do sono;
– a que emerge da fenomenologia das emoções e das motivações;
– a que estabelece e é estabelecida pelo equilíbrio psíquico e
miocinestésico;
– a que orienta a experiência e a ação;
– a que, em suma, constitui o verdadeiro indicador crítico da
personalidade humana.
Agressão e tensões
(FONSECA, 2008 p.185)

• A agressão produzida pelos estímulos e pelas situações do nosso dia-a-


dia provoca, como todos bem o sabemos e sentimos, um estado de
tensão psíquica e anímica, com ou sem ansiedade, cujos efeitos
tendem a acumular-se no âmbito do tônus muscular, mais
concentradamente nos músculos de relação, ditos também
periféricos, pluriarticulares e altamente energéticos.

• Tais tensões psicoexistenciais são materializadas em tensões


musculares onerosas, isto é, em uma ansiedade concreta e
concomitante. Repare-se, por exemplo, determinadas frases
populares tão nossas conhecidas: ”Ele é um contraído”; “Ele
é nervoso”; “Descontrai-te”; “Ele ferve em pouca água”; “Não
admira, ele decidiu sob tensão”; “Não respondeu no exame, porque
estava muito ansioso e tenso”; etc.
Referências

• BECKER, J. Sistemas Sensitivo e motor. In NUNES, M. L; COSTA,


J. C; SOUZA, D. G. Entendendo o funcionamento do cérebro
ao longo da vida. Porto Alegre: EdiPUCRS, 2021. Epub.
Disponível em: https://plataforma.bvirtual.com.br/.

• FONSECA, V. Desenvolvimento psicomotor e aprendizagem.


Porto Alegre: Artmed, 2008.

• YABE, I. G. Crescimento e desenvolvimento motor. Curitiba:


Contentus, 2020.

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