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Projeto gráfico, diagramação e capa


ZAP Design
A escola do trabalho na fase de transição
Ilustração da Capa
Ilustração Estudo (1911), óleo sobre papelão. Arte moderna -
"vibracionismo" - mostra a relação entre a arte radical e política
revolucionária, influenciada pelas revoluções russa e mexicana,
promovendo a idéia de uma arte para o povo.
Autor: Rafael Barradas (1890-1929 - Uruguai).

Tradução
que é a escola do trabalho?
Daniel Aarão Reis Filho
O O que deve ser atualmente, durante a fase revolu-
Impressão
cionária da ditadura do proletariado cercada pela dita-
Cromosete Gráfica e Editora dura imperialista? Esta é a única maneira possível de co-
locar a questão pedagógica.
ISBN 85-87394-10-x Na medida em que a escola não é um fim absoluto,
também não pode ter finalidades educacionais abso-
Todos os direitos reservados.
Nenhuma parte sem
ou reproduzida destea livro pode ser
autorização dautilizada
editora. lutas, e por isso mesmo não teria condições de criar
uma individualidade harmônica abstrata, baseando-se
em métodos invariáveis ditados pela ciência da crian-
I a edição: maio de 2000
ça (psicologia e pedologia) para realizar seus objeti-
vos;/A_fiscola refletiu sempre o seu tempo e não podia
EDITORA EXPRESSÃO POPULAR LTDA
deixar de refleti-lo; sempre esteve a serviço das neces-
Rua Bernardo da Veiga, 14
CEP 01252-020 - São Paulo-SP sidades de um regime social determinado e, se não fos-
Fone/Fax: (11) 262.4921 se capaz disso, teria sido eliminada como um corpo
e-mail: editorapopular@cidadanet.org.br estranho inútil.

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Fundamentos da escola do trabalho
Pistrak

A escola sempre foi uma arma nas mãos das classes ila mesma forma que o novo regime nasce do antigo gra-
dirigentes. Mas estas não tinham nenhum interesse em ças às suas contradições internas.
revelar o caráter de classe da escola: as classes dirigentes Certas concepções, certa terminologia, certas formas
não passavam de uma minoria, uma pequena minoria, exteriores e secundárias podem transmitir-se da antiga
subordinando a maioria a seus interesses, e é por isso que para a nova escola; mas o objeto da educação, sua organi-
se esforçavam para mascarar a natureza de classe da es- zação, seus objetivos devem ser novos; as idéias e os mé-
cola, evitando colaborar na destruição de sua própria todos relativos ao trabalho, à autodireção, que a nova es-
dominação. cola herda da pedagogia burguesa, devem ser esclareci-
dos, comentados e interpretados sob uma nova luz que se
Ao contrário, um dos problemas da revolução social
enraíza nos novos objetivos da educação, que, por sua vez,
é exatamente o de mostrar a natureza de classe da escola
dependem inteiramente dos problemas e dos objetivos da
no contexto de uma sociedade de classes.
construção revolucionária considerada em seu conjunto.
Desenvolver a educação das massas, condição da con-
solidação das conquistas e das realizações revolucioná- A essência destes objetivos é a formação de um ho-
rias, significa fazê-las compreender seus interesses de clas- mem que se considere como membro da coletividade in-
se, as questões vitais e urgentes que derivam da luta de ternacional constituída pela classe operária em luta con-
classes, significa dar-lhes uma consciência mais clara e tra o regime agonizante e por uma vida nova, por um
mais exata dos objetivos sociais da classe vitoriosa. novo regime social em que as classes sociais não existam
mais. Em termos mais c o n c r e t o s , p r e c i s o que a nova
A revolução e a escola devem agir paralelamente, por-
geração compreenda, em primeiro lugar, qual é a nature-
que a escola é a arma ideológica da revolução.
za da luta travada atualmente pela humanidade; 'em se-
A questão de saber o que deve ser a escola do traba-
gundo lugar, qual o espaço ocupado pela classe explora-
lho deve então ser formulada da forma como o fizemos.
da nesta luta) èm terceiro lugar,'qual o espaço que deve
Mas como procurar resposta a esta questão? Nos em-
ser ocupado por cada adolescente^ e, finalmente/é que
briões de escola do trabalho que se formaram na Europa
cada um saiba, em seus respectivos espaços, travar a luta
ocidental ou na América? Haverá uma relação de conti-
pela destruição das formas inúteis, substituindo-as por
nuidade entre o ideal dos melhores pedagogos reformis-
um novo edifício.
tas da burguesia e a escola do trabalho soviética? Na rea-
lidade, só se pode falar de continuidade, do ponto de vista A educação comunista deve orientar a escola em fun-
que nos interessa, na medida em que se estabeleça uma ção destes objetivos, coloçando-os na base do seu traba-
continuidade entre o regime burguês e a revolução pro- lho pedagógico.
letária. Entre a nova escola e as melhores escolas antigas Portanto, na base da escola do trabalho da atual fase
há apenas uma continuidade dialética e revolucionária, devem encontrar-se os seguintes princípios:

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Pistrak Fundamentos da escola do trabalho

1. Relações com a realidade atual; nas do passado^não, deve estudá-las e assim será feito,
2. Auto-organização dos alunos. mas com a compreensão de que são apenas ruínas do
Nos últimos anos, o pensamento pedagógico comu- passado e de que seu estudo deve ser iluminado à luz da
nista afirmou várias vezes o que se deveria entender por realidade atual no sentido já indicado acima, à luz da luta
realidade atual. Repitamo-lo rapidamente mais uma vez. travada contra o passado e da transformação da vida que
A realidade atual é tudo o que, na vida social da nossa deve levar à sua liquidarão.
época, está destinado a viver e a se desenvolver, tudo o Mas não basta estudar a realidade atual; o leitor dirá
que se agrupa em torno da revolução social vitoriosa e que toda e qualquer escola faz isto: a escola deve educar
que serve à organização da vida nova. A realidade atual as crianças de acordo com as concepções, o espírito da
é também a fortaleza capitalista assediada pela revolu- realidade atual; esta deve invadir a escola, mas invadi-la
ção mundial. Em resumo, a realidade atual é o imperia- de uma forma organizada; a escola deve viver no seio da
lismo em sua última fase e o poder soviético considerado realidade atual, adaptando-se a ela e reorganizando-a
enquanto ruptura da frente imperialista, enquanto bre- ativamente - isto nos permite formular certas deduções
cha na fortaleza do capitalismo mundial (definição de a respeito do caráter do ensino compreendido como um
Schulguine). estudo da realidade atual.
Os dois fenômenos devem ser estudados como cons- A primeira dedução relaciona-se com o objeto da edu-
tituindo os dois pólos da realidade atual; mas esta deve cação: nossa concepção da realildade atual obriga-nos a
ser ainda compreendida sob a forma de uma luta em tor- rever o objeto do ensino tradicional, herdado da antiga
no da brecha, uma luta cada vez mais ampla, cada vez escola, e nos capacita a abandonar impiedosamente toda
mais profunda e cada vez mais áspera até a vitória da uma série de disciplinas, ou aspectos do curso, sempre
Revolução. Tudo o mais só pode ser qualificado como e quando tornem difícil a compreensão da realidade atu-
resquícios no seio da realidade atual. São as ruínas do al, afastando-se das noções essenciais sem as quais não
passado no presente. O telégrafo sem fio e a cooperação, se poderia compreender a realidade atual. Isto não se
a eletrificação e a Internacional Comunista, as comunica- refere apenas à história em geral ou à história da litera-
ções aéreas Moscou-China, os acontecimentos na China, tura: todo o mundo compreende a necessidade de mo-
tudo isto é a realidade atual. A religião, o trabalho rural dificar completamente estas disciplinas; não se trata tam-
baseado no arado manual, a rotação trienal, significam bém de negar simplesmente as tendências "clássicas"
as ruínas do passado. de nosso antigo liceu. Trata-se agora de uma revisão
O objetivo fundamental da escola é, portanto, estudar completa do próprio objeto do ensino, da introdução no
a realidade atual, penetrá-la, viver nelaj Isto não quer programa dos estudos necessários à boa compreensão
dizer, certamente, que a escola não deva estudar as ruí- da realidade atual, da introdução de novas disciplinas

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Pistrak Fundamentos da escola do trabalho

desconhecidas da escola até então;,ja. concepção marxis- tórico geral.té preciso demonstrar a essência dialética de
ta dos fenômenos sociais, o programa de história neces- tudo o qüè existe, mas uma demonstração deste tipo só é
sário à compreensão e à explicação da realidade atual, possível na medida em que o ensino se concentre em tor-
as ciências econômicas, as bases da técnica, os elemen- no de grupos de fenômenos constituídos em objetos de
tos da organização do trabalho, tudo isto deve começar estudo: assim, a questão do ensino unificado, da concen-
imediatamente a fazer parte da escola; o ensino das ci- tração do ensino por complexos, torna-se, uma questão
ências naturais, da física, da química, deve ser concebi- candente; a questão do método que agora se coloca não é
do de uma forma completamente diferente, visando a simplesmente a questão de uma assimilação melhor e
novos objetivos; o estudo dos fenômenos naturais pas- mais completa destes ou daqueles estudos; trata-se de
sará a ter como objetivo principal sua utilização pelo uma questão que se relaciona com a essência do proble-
homem na indústria e na produção)jA antiga atitude ma pedagógico, com o conhecimento dos fenômenos atu-
contemplativa adotada para estudar as ciências natu- ais em suas relações e dinâmica recíprocas, isto é, com a
rais deve ser superada. concepção marxista da pedagogia.
As próprias matemáticas podem desfazer-se de tudo A pesquisa dos métodos de ensino unificado, a ques-
o que servia, segundo os antigos metodólogos, para po- tão da concentração do ensino, apaixonaram os pedagogos
lir o cérebro e amolecer o pensamento (o que as matemá- nos últimos anos. É um sinal dos tempos. Mas é preciso
ticas elementares da escola antiga eram precisamente in- que as pesquisas tenham uma base teórica; é preciso saber
capazes de fazer); por outro lado, elas recolherão nas al- claramente por que se realizam, quais são os objetivos do
tas matemáticas tudo o que é essencial a qualquer estudo ensino unificado, por que ele é necessário. Respondemos
das ciências naturais contemporâneas que, por sua vez, que é necessário para poder educar os combatentes a ser-
assumem na nova escola: como já afirmei, um caráter pro- viço dos ideais da classe operária, dos construtores da nova
dutivo. sociedade.
A segunda dedução refere-se aos métodos de trabalho. O estudo do dinamismo, das mudanças e da ação re-
O objetivo que os alunos devem atingir é não somen- cíproca dos fenômenos leva ao problema do ensino ativo
te estudar a realidade atual, mas também se deixar im- ou passivo, à necessidade de aplicar o princípio de pes-
pregnar por ela.IÍA conseqüência é que os antigos méto- quisa ao trabalho escolar. Aqui também a escola procura
dos de ensino não podem mais servir, é preciso estudar arduamente caminhos novos.
os fenômenos em suas relações, sua áção e dinâmica recí- Nossa concepção de base indica-nos a direção a se-
procas, é preciso demonstrar que os fenômenos que es- guir nas pesquisas, e também na questão do objeto do
tão acontecendo na realidade atual são simplesmente ensino; nossa concepção, aqui também, permite-nos co-
partes de um processo inerente ao desenvolvimento his- locar fundamentos sólidos, impedindo erros.

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A terceira dedução refere-se à educação em geral. O proletariado mundial se arma para a luta, o traba-
Todo o mundo está de acordo que é impossível separar lhador russo segura com um braço o fuzil que serve para
a educação primária da educação em geral. Entretanto, defender suas conquistas, ou seja, em última análise, as
não pensamos que estas duas partes do trabalho peda- conquistas da revolução mundial, e com o outro braço se-
gógico tenham a mesma base sociopedagógica, que o gura a foice e o martelo que servem para a reedificação
conjunto dos objetivos sociais seja claro para o pensa- lenta e obstinada do que foi destruído e também para a
mento pedagógico. Nosso ponto de vista determina cla- edificação do que nunca foi ainda tentado. Luta e constrói
ramente este trabalho. ao mesmo tempo: lutar e construir - isto deveria ser apren-
Referindo-nos à realidade atual, acima, dizíamos que dido por cada um de nossos alunos; a escola deve explicar
era o imperialismo e a URSS. Mas a escola pode enfren- a cada um os objetivos da luta, contra o que lutar e por que
tar o estudo da realidade atual de duas formas: ou a es- meios, o que cada aluno deve criar e construir, e como. Se
tuda como um objetivo exterior, sem determinar a pró- resumíssemos agora as deduções que formulamos a res-
pria posição em relação a ela - e então teremos uma es- peito do ensino, diremos que o conteúdo do ensino deve
cola de ensino livresco; ou então a escola tomará posi- servir para armar a criança para a luta e para a criação da
ção frente à realidade atual - e então o presente será nova ordem, que os métodos de trabalho devem permitir
estudado de um ponto de vista bem determinado; en- a utilização prática destas armas e que os objetivos do en-
tão, e só então, ela será capaz de educar a criança, por- sino e da educação consistem numa transformação dos
que - em vez de dar simplesmente a cada aluno a possi- conhecimentos em concepções ativas. Tais deduções per-
bilidade de responder à questão: "Mas, eu, aluno, que mitem resolver toda uma série de outros problemas esco-
espaço devo ocupar na realidade atual, na luta que se lares. Assim, e em particular, podem ser justificadas/1) a
trava entre reação e revolução, entre passado e presen- assimilação das noções fundamentais da filosofia marxis-
te?" - é preciso, de fato, levando o estudo da realidade ta, mas esta assimilação, longe de ser abstrata e dogmática,
atual até este ponto, inculcar na nova geração que cada deve consistir num exercício ativo, diríamos mesmo que
adolescente deve ser, ou melhor, já é, um soldado deve consistir numa transformação do mundo - e esta con-
engajado na luta, devendo assumir o objetivo de se ar- cepção se acha na base de nossos programas escolares; 2)
mar dos conhecimentos necessários para apoiar a luta, a necessidade da educação ativa que concretize a ciência,
estudando convenientemente as armas do adversário e permitindo assimilar o método científico de acordo com
aprendendo a empregá-las no interesse da revolução, e os objetivos fixados - e isto introduz o trabalho na escola;
sabendo também, ao mesmo tempo, utilizar praticamen- 3) a formação e a direção das preocupações infantis - ou
te suas próprias armas: em outras palavras, seu objeti- seja, o que chamamos de organização da apropriação da
vo deve ser adquirir a ciência. vida pelas crianças.

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O marxismo nos dá não apenas a análise das relações dar toda uma série de preconceitos "científicos" ainda
sociais, não somente o método de análise para compre- profundamente enraizados na pedagogia. Sempre rece-
ender a essência dos fenômenos sociais em suas relações bemos as seguintes críticas: "Vocês violentam a criança,
recíprocas, mas também o método de ação eficaz para vocês não levam em consideração as coisas que interes-
transformar a ordem existente no sentido determinado sam a u m a idade d e t e r m i n a d a , vocês i g n o r a m a
pela análise. biogênese, a ciência demonstra que uma criança numa
É por isso que a escola deve educar a criança no espí- idade determinada interessa-se por isto ou por aquilo e
rito marxista, devendo fazer o necessário para que o alu- vocês querem forçá-la a se interessar pela política e pela
no perceba organicamente o método marxista e também Revolução. Este é um assunto de adultos. Só mais tarde a
o sentido de sua ação. criança o aprenderá".
Claro, é evidente que a escola não poderá ensinar uma Seria ridículo negar que, em idades diferentes, a
completa e sólida concepção do marxismo científico e fi- criança reage diferentemente aos fenômenos exteriores,
losófico, não podendo também transformar num siste- concebendo-os diferentemente. É evidente que cada ida-
ma completo e sólido as idéias materialistas acumuladas de tem suas particularidades e isto deve ser seriamente
pelos alunos através de suas experiências e hábitos coti- considerado pela escola. Mas há uma distância entre esta
dianos, mas, se a própria escola do 2 o grau não é capaz verdade e a determinação das preocupações da criança
de chegar a este resultado, pode e deve ao menos educar de acordo com sua idade. As formas de intelecto infan-
os alunos no espírito marxista, com o objetivo de lhes dar til são simplesmente as formas assumidas pelas preo-
o sentido marxista, a "intuição" marxista indispensável cupações da criança, mas estas preocupações, em si
para analisar e estudar todos os fenômenos sociais. mesmas, são alimentadas pela vida exterior, pelo meio
O trabalho na escola, enquanto base da educação, deve social da criança; trata-se simplesmente das formas nas
estar ligado ao trabalho social, à produção real, a uma quais se processa um certo conteúdo, mas de modo al-
atividade concreta socialmente útil, sem o que perderia gum o conteúdo depende das propriedades do cérebro
seu valor essencial, seu aspecto social, reduzindo-se, de em desenvolvimento; depende completamente dos fe-
um lado, à aquisição de algumas normas técnicas, e, de nômenos exteriores da existência e, antes de tudo, dos
outro a procedimentos metodológicos capazes de ilus- que resultam das relações sociais estabelecidas entre os
trar este ou aquele detalhe de um curso sistemático. As- homens.
sim, o trabalho se tornaria anêmico, perderia sua base A escola tem o direito de falar da formação e da dire-
ideológica. ção das preocupações da criança num sentido determi-
Analisaremos um pouco mais o sentido das preocu- nado, se é que deseja educar a criança.
pações da criança. É preciso, de uma vez por todas, liqui- Não vemos por que a escola deva tomàr a psicologia

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atual da criança e suas preocupações eventuais como base A auto-organização dos alunos nas escolas ocidentais
e ponto de partida de seu trabalho; esta psicologia e estas v norte-americanas pretende alcançar objetivos específi-
eventuais preocupações são simplesmente produtos de ros da educação de classe, embora os negue. A afirmação
muitas influências desorganizadas e freqüentemente con- i|ue fazemos aqui é exata, suficientemente reconhecida
traditórias entre si. Pensamos que a escola deve assumir o, do ponto de vista marxista, trata-se de uma coisa intei-
o controle da maior parte destas influências, organizan- ramente natural 1 .
do-as num sentido determinado e fazendo seu trabalho Para facilitar nossa exposição, pensamos que é preci-
numa base que ela passou a dominar. so formular esta questão da forma mais clara possível,
Tomando, mais uma vez, a realidade atual como refe- determinando seu aspecto social e também os objetivos
rência, encontramos a direção perfeitamente determina- da escola soviética.
da com base na qual devemos conformar as preocupa- Que tipo de homens a fase revolucionária em que vive-
ções da criança. mos atualmente (e que será provavelmente muito longa)
Tudo o que foi dito permite compreender nossa atitu- exige de nós? À pergunta podemos dar a seguinte resposta:
de em relação à Juventude Comunista e ao movimento A fase em que vivemos é uma fase de luta e de constru-
comunista de crianças, que nós consideramos como fato- ção, construção que se faz por baixo, de baixo para cima,
res pedagógicos muito poderosos com tamanha evidên- o que só será possível e benéfica na condição em que cada
cia que não voltaremos ao assunto. membro da sociedade compreenda claramente o^jque^é
preciso construir (e isto exige a educação na realidade atual)
e como é preciso construir. A solução do problema exige a
A questão da realidade atual está intimamente ligada presença e o desenvolvimento das três seguintes quali-
à da auto-organização das crianças (ou autodireção); a dades: 1) aptidão para trabalhar coletivamente e para
concepção de auto-organização em si mesma não tem encontrar espaço num trabalho coletivo; 2) aptidão para
nada de novo, mas, em relação a isto, como em relação à analisar cada problema novo como organizador; 3) apti-
questão anterior, o problema dos objetivos desempenha dão para criar as formas eficazes de organização.
um papel primordial. A aptidão para trabalhar coletivamente só se adquire
Quando a pedagogia burguesa imaginava a questão no trabalho coletivo; trata-se, portanto, de um problema
da auto-organização das crianças, pretendia basear-se que a escola terá de enfrentar. Mas a aptidão para traba-
somente nas particularidades psicológicas das crianças lhar coletivamente significa também que se sabe dirigir
e, em conseqüência, excluir a política da escola, mas, na quando é necessário e obedecer quando é preciso. Para
prática, ela apenas se adaptava às exigências de um regi-
me social determinado. 1 Schulguine. Questões fundamentais da educaçao social.

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atingir este objetivo é preciso, na auto-organização das ila sociedade, mas já o são, tendo já seus problemas, inte-
crianças, que todos, na medida do possível, ocupem su- resses, objetivos, ideais, já estando ligadas à vida dos adul-
cessivamente todos os lugares, tanto as funções dirigen- tos e do conjunto da sociedade.
tes como as funções subordinadas. A conseqüência de tudo o que foi dito é que, para nós,
A aptidão para analisar cada problema novo como a auto-organização tem uma importância fundamental
organizador pressupõe hábitos de organização adquiridos do ponto de vista da pedagogia social, pretendendo ob-
durante o desempenho de diversas funções exercidas pela jetivos determinados, e é isto que define a posição da es-
criança no contexto de diferentes organismos. Este resul- cola a seu respeito.
tado só será atingido numa auto-organização de formas
muito flexíveis, adaptando-se incessantemente a novos
problemas e a novos objetivos, o que é possível quando a Acabamos de indicar em grandes linhas as considera-
escola não é uma redoma, mas viva, ao contrário, em con- ções nas quais se deve basear o trabalho da escola na fase
tato com a realidade, que está sempre colocando novos de transição. Mais adiante desenvolvemos os diferentes
problemas de uma diversidade muito grande. aspectos do problema escolar, mas a questão que coloca-
É inútil insistir muito tempo sobre a importância que mos no início do capítulo está respondida.
conferimos a aptidão para criar formas eficazes de orga- Os dois fatores: realidade atual e auto-organização,
nização.fôuas características só poderão ser desenvolvi- que determinam o caráter da escola soviética do traba-
das em nossas crianças na medida em que elas gozem de lho, baseiam-se no mesmo princípio: a concepção mar-
uma liberdade e de uma iniciativa suficientes para todas xista e revolucionária dos objetivos da escola durante
as questões relativas a sua organização: nossa fase histórica de desenvolvimento tão rápido.
De fato, todos estes resultados só serão atingidos se a A organização da escola nesta base oferece às crianças
auto-organização é admitida sem reservas. É preciso reco- um meio sólido e são no qual se desenvolverá um espírito
nhecer de uma vez por todas que a criança e, sobretudo, o social forte, alegre e capaz de criar a nova geração.
adolescente, não se preparam apenas para viver, mas já "Mas onde está o trabalho?", perguntará o leitor. Foi
vivem uma verdadeira vida. Devem consequentemente intencionalmente que tratamos apenas ligeiramente da
organizar esta vida. A auto-organização deve ser para eles questão (que parece tão importante) das "relações entre
um trabalho sério, compreendendo obrigações e sérias res- trabalho e ciência", questão tão discutida no mundo pe-
ponsabilidades. Se quisermos que as crianças conservem dagógico e cuja resposta se depreende de tudo o que dis-
o interesse pela escola, considerando-a como seu centro semos acima. Abstrair o problema do trabalho na escola
vital, como sua organização, é preciso nunca perder de vista de todo o programa de estudos escolares, isolando a ques-
que as crianças não se preparam para se tornar membros tão das relações entre trabalho e ciência, significa renunciar

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Pistrak

a encontrar uma solução minimamente aceitável para o


problema. Em função da forma com que colocamos o pro-
blema geral, o trabalho ocupa um lugar essencial na ques-
tão da realidade atual. No fundo, poderíamos definir a
realidade atual da seguinte forma: luta pelas formas sociais
novas do trabalho. A partir daí o trabalho se encontra no
centro da questão, introduzindo-se na escola como um ele-
mento de importância social e sociopedagógica destinado
a unificar em torno de si todo o processo de educação e de
formação.

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