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UNICON – apostilas – Reprodução Proibida, Direitos Reservados – (21) 3107 - 3072

Toda a sociedade elabora modelos e ideais,


PROJETO
que por mais ideológicos que sejam se tomam
POLÍTICO-PEDAGÓGICO
elementos importantes da realidade social, uma
vez que são os homens que os invocam para
O problema é, portanto, saber se a escola justificar ou denunciar a sociedade existente.
pode servir de instrumento para outra classe que
não a burguesia e se pode preencher uma Não se pode compreender o funcionamento
finalidade educativa em outro quadro que não o de uma sociedade sem conhecer esses modelos
da dominação de classe. Será que essa alquimia e esses ideais. Melhor: todos os esforços de
no término da qual a ideologia se toma cultura transformação da sociedade pressupõe
escolar pode ser posta desde já a serviço do necessariamente que nos refiramos a eles. Não
proletariado? E deveria inevitavelmente subsidir se transforma a sociedade para fazer dela
numa sociedade sem classes? qualquer coisa, mas para aproximar a realidade
O papel da escola é estabelecer uma social de certos ideais. Denunciar a opressão, a
mediação entre a criança e o mundo adulto. Essa injustiça, a desigualdade, é ainda referir-se a
mediação é de inicio de ordem técnica. O simples ideais. Não se deve cair no idealismo, modo de
contato da criança com o mundo adulto não lhe pensar gerador de ideologias, considerando que
permite adquirir as técnicas de base (leitura, as idéias conduzem o mundo. Os ideais não são
escrita, cálculo, mas também técnicas musicais, o objeto de escolas abstratas e intemporais por
estéticas, corporais) e os acontecimentos fun- parte de uma única pessoa. Traduzem a tomada
damentais que lhe serão necessários em toda a de consciência de certa situação de classe. Mas
vida social, mesmo liberada da dominação de essa tomada de consciência não é um
classe. epifenômeno sem eficácia social. Lutando por
Era essa a tarefa destinada à escola quando ideais, os homens se batem para transformar
ainda era concebida apenas como um lugar de sua situação de classe.
instrução e não como um meio que visava à Mas, para transformar essa situação de
educação integral da criança. Existe aí, uma classe, é preciso ainda que tomem consciência e
função cultural não-ideológica da escola. A que traduzam esta tomada de consciência em
escola, nesse sentido, tem valor liberador, pois a ideais.
ignorância das técnicas e dos conhecimentos de Nenhuma educação pode, portanto, abster-se
base é uma importância social que se volta da referência a ideais. Mesmo as sociedades
sempre em proveito dos exploradores - operários ditas primitivas, nas quais a educação se faz por
imigrados, por exemplo, bem o sabem. contato direto com a sociedade, organizam
Deve-se, portanto, considerar que a escola é cerimônias de iniciação que têm por objetivo
liberadora, enquanto lugar de instrução alienante inculcar os ideais sociais, confundidos com os
enquanto meio educativo, de restringir o papel ideais religiosos, aos adolescentes do sexo
da escola à instrução? Essa solução é tentadora masculino. Com efeito, os ideais não se
e não é inconcebível. Numa sociedade onde encontram diretamente na sociedade. No contato
reinaria o que se pode chamar uma educação da vida social, a criança pode perceber
política permanente, onde os próprios adultos realidades que sofrem ai a influência dos ideais
estariam engajados numa constante revolução da sociedade, ou de uma classe social, mas não
cultural, as crianças se educariam participando pode tomar consciência desses próprios ideais,
da vida social. com sua exigência de absoluto e sua coerência.
A ação pedagógica seria então, substituída A reflexão sobre os ideais e os modelos de uma
pela ação política, tomada a cargo pela sociedade pressupões uma mediação.
comunidade inteira, que não excluiria a É essa mediação que a escola tradicional ou
juventude dos debates políticos. Aproximar-nos- nova põe em ação quando se institui como meio
íamos, assim, de um meio social em si educativo de educação integral Não podemos reprovar a
que, como vimos, poderia justificar a supressão escola por propor modelos à criança, a não ser
da escola. Entretanto, nossas sociedade não que em nome de uma pseudo-espontaneidade da
estariam ainda aí. Além disso, mesmo nesse criança: ao contrário, uma de suas tarefas
caso, ainda seria necessário que os adultos, fundamentas está em saber se deve ajudar à
especializados ou não, explicassem claramente criança a integrar-se no mundo adulto. Quer
aos jovens as verdades dos conceito políticos transmita modelos à criança ou procure fazê-la
utilizados. Mesmo que a ação pedagógica viver uma vida social modelo na classe, a escola
investindo dela a própria sociedade, uma desempenha seu papel de mediação cultural.
mediação pedagógica continuaria necessária
para que a juventude pudesse participar da vida Mas a escola atual propõe modelos sócio-
política. políticos que camufla em modelos éticos: é nisso
que é ideologia, e não enquanto veicula modelos.
Mas abandonemos a utopia e retomemos à Os modelos culturais e escolares têm uma signi-
realidade de nossas sociedades. A mediação ficação social; mas a ideologia cultural
técnica entre a criança e o adulto não basta. transforma-os em modelos de vida individual, de
Uma mediação sócio-política é também elevação em direção ao Absoluto, de atualização
necessária. da natureza humana, e realização do Homem, de

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luta contra a corrupção, de combate contra si numa perspectiva cultural que é a da classe
mesmo. A solidariedade entre burgueses, ou dominante: fazer a criança compreender a
entre proletários, toma-se fraternidade humana necessidade da disciplina (pedagogia tradicional)
universal; a liberação em relação à opressão, ou da solidariedade humana (pedagogia nova).
liberdade absoluta de um ego tão inefável
quanto profundo; o trabalho humano, Quer a greve seja explicitada pela ação de
criatividade fundamental das pessoas. De lideres subversivos, como na maioria dos
maneira geral, a luta contra as formas sociais de manuais e leitura, quer ilustre a solidariedade
opressão e injustiça é transmudada em luta dos pobres, acaba sempre por servir de pretexto
contra a corrupção da natureza humana. para uma lição de moral, reacionária ou
Desembaraçar-se da ideologia não é rejeitar todo progressista.
modelo educativo, é sair da ética para devolver
seu sentido sócio-político aos modelos. Fazer a escola sair da ideologia será repensá-
la na perspectiva da luta de classes, fazer dela
A pedagogia ideológica não é rejeitar todo um meio de mediação entre a criança e um
modelo educativo, é sair da ética para devolver mundo social adulto em que reina a dominação
seu sentido sócio-político aos modelos. de classe, mas em que também se desenvolvem
lutas de classe.
A pedagogia ideológica é uma pedagogia da
essência humana ameaçada pela corrupção. E Não se trata apenas de modificar os
preciso ela orar uma pedagogia não-ideológica, conteúdos transmitidos pela escola; não é
concebida como uma pedagogia da luta de somente por seus conteúdos mas também por
homens concretos contra formas sociais sua organização e por seu modo de relação com
determinadas de opressão. Os modelos a sociedade que a escola é ideológica. Vimos que
transmitidos à criança, ou melhor, elaborados esses três elementos estão ligados: isolada da
pela criança, com a ajuda indispensável do sociedade, a escola organiza-se, reinterpretando
adulto, não devem mais visar à pureza de uma em termos institucionais a cultura ideológica
natureza humana, fato inexistente, mas à que, alem disso, transmite.
liberação concreta do homem confrontado com o
mal-social gerado pela dominação de classe. A Mas não bastará repensar a escola. Será
escolarização é alienação quando o sentido social preciso também elaborar uma concepção de
dos modelos propostos à criança é camuflado por cultura e da criança que rompa com a da
trás de uma significação ética. Nessas condições, pedagogia ideológica.
os modelos, quer os da pedagogia tradicional,
quer os da pedagogia nova, abrem caminho para São essas grandes linhas de uma pedagogia
uma ascese pessoal e não para uma luta social. não-ideológica.
A mediação cultural entre a criança e o mundo
adulto, toma a forma ideológica da clausura O homem é um ser coletivo, mesmo sendo
escolar: sob pretexto de organizar um mundo na sozinho, pois como coloca GROSSI, o homem é
medida da criança, a escola isola a juventude mais de um, pensa “com seus botões”, fala
das realidades sociais e cria um meio que está, consigo mesmo, interage com ele mesmo. Possui
de fato, em continuidade com as normas da um ânsia de participação que remonta a própria
classe dominante. A mediação é liberação; a história, movido pela necessidade e pelo desejo
clausura é alienação. de ser parte integrante de um grupo.
Hoje, a participação, reconhecidamente, é
Quando a escola deixa de ser meio de direito de todos, a fim de tomadas de decisões
mediação para tornar-se meio fechado, toma-se que envolvam o aspecto coletivo-reflexivo,
imediatamente ideológica. Ela nunca o é porém nem sempre é voluntária e democrática,
totalmente, pois o funcionamento ideológico da estando à mercê de pressões, ideologias,
escola não é absolutamente sem falha. imposições e concessões.
A criança é um ser social, que não se deixa A educação também nasceu da necessidade
reduzir sem resistência a uma pessoa ética. humana de continuidade à vida social das
Acontece-lhe, as vezes, e mesmo bastante comunidades e grupos, efetivando a participação
freqüentemente na nova escola, a qual lhe deixa de novos elementos à vida comunitária. Como
grandes possibilidades de expressão, utilizar a educação comunitária, o processo de
escola como meio de mediação, isto é, nela aprendizagem era vital e significativo, girando
exprimir o que para ela socialmente é importante em tomo das necessidades fundamentais,
e nela coloca-se questões concementes à inerentes à sobrevivência e à prática social
realidade social. Nesse sentido, as idéias concreta.
proletárias aparecem ocasionalmente na escola.
A seguir trechos em que os renomados
A escola é organizada para servir à ideologia autores por nós pesquisados tratam do assunto
dominante, mas a luta de classes, não deixa de em tela:
ter ecos escolares. Entretanto, as questões
sociais da criança são quase sempre recuperadas

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ROMANELLI(1978: 22), vê a educação concreta às atuações institucionais prioritárias.


como mediadora entre o gesto cultural e a sua Para dar forma à instituição, vai se evidenciar a
continuidade; o homem se educa na medida em participação, ou seja, a expressão das idéias dos
que se transforma, e na medida em que envolvidos na instituição, bem como o seu
comunica os resultados de sua experiência, desejo de realizar coisas para afirmar-se a si
ajuda outros homens a se educarem tomando-se mesmo e dominar as situações que lhe
solidários com eles. aparecem.
SILVA (1986), vem completar essa definição
entendendo a educação como um processo Com a institucionalização da educação,
humano sujeito à determinações sócio-político- vislumbramos o aparecimento da escola. Na sua
econômicas intencionais, e, portanto, deve ter história, a escola, vai demonstrar a necessidade
propósitos bem definidos e explicitados, pois os de preservar, reproduzir/produzir crenças,
projeto educativo é permeado de valores que são valores, conquistas sociais, concepções de vida e
reproduzidos, afirmados, construídos, às vezes do mundo, de grupos ou classes sociais
sem consciência. (RODRIGUES, 1991). E a escola institucional
que vai tratar da educação formal.
GADOTTI(1983), percebe a educação como
um espaço político limitado, no sentido de que Porém, nossa educação brasileira, inserida
não é só na educação que existe a consciência numa sociedade mais moderna e industrializada,
política -outros setores da vida humana também tem se caracterizado por uma profundo atraso
possuem este aspecto, mas de importância em relação ao desenvolvimento da economia,
significativa na superação das contradições da com um sistema educacional arcaico, seletivo, e
sociedade. aristocrático, inadequado ao próprio sistema
econômico (ROMANELLI, 1978). E, ainda, o
FREIRE e NOGUEIRA (1989), sintetizam: cotidiano tem demonstrado que a função da
educação é uma prática política. escola tem sido a manutenção dos privilégios de
classe; e a escola, tem sido um espaço
FRIGOTTO (1989: 33), vê a educação como permeado por ideologias que ora justificam a
“uma prática social contraditória que se define dominação e a inversão do real ocultando as
no interior das relações sociais de produção da contradições e alienando, e ora, necessitando da
existência, que se estabelecem entre as classes formulação de uma contra-ideologia.
sociais, numa determinada formação social. A Entretanto, FRIGOTTO (1989:18), vem
sua especificidade política consiste, exatamente, afirmar que para a escola servir aos interesses
na articulação do saber produzido, elaborado, da classe trabalhadora, não é suficiente
sistematizado e historicamente acumulado, com desenvolver dentro dela a contra-ideologia
os interesses de classe”. proletária, pois a prática educacional está
inserida em relações sociais de produção. Dessa
Para GRÃMSCI, educar é explicitar as maneira, para a economia burguesa, interessa o
relações de produção da sociedade burguesa, homem como conjunto de faculdades a serem
para uma desarticulação estrutural que trabalhadas para que o sistema econômico possa
proporcione a criação de um novo bloco histórico funcionar como um mecanismo desprovido da
onde os homens, mediatizados pela técnica, totalidade e com a racionalidade do com-
produzam sua existência de forma cada vez mais portamento e o egoísmo (Frigotto, 1989:58),
completa (in FRIGOTTO, 1989:196). sendo histórico de abstração genérica, onde se
monta os princípios do liberalismo individual -
Assim a competência da educação arcabouço da teoria econômica neo-clássica.
institucional vai interessar aos trabalhadores Com a estratificação social da sociedade
para construir um espaço de solidariedade e capitalista segundo o mérito individual, as
auto-desenvolvimento, habilitando o estudante a classes passam a se formar pelos indicadores de
operar instrumentos necessários à sua vida riqueza. No trabalho escolar, a Teoria do Capital
profissional, social, política e cultural. Humano, acaba por reforçar esta perspectiva
Primeiro, é necessário que tenhamos uma meritocrática, justificando as desigualdades de
definição mais clara do que é instituição, para classe por aspectos individuais.
entendermos mais facilmente o que chega a ser O autor citado revela, então, que o
uma educação institucionalizada. historicizar dessas relações sociais de produção,
a aproximação ao concreto e ao real, poderão
FREIRE e NOGUEIRA (1989), vêem a constituir num passo à superação da dominação
instituição ligada a um objetivo, sendo idealizada burguesa. Como salientou Marx, “(...) se essa
por uma pessoa ou um grupo, para atender a crítica representa a voz uma classe, só pode ser
seus clientes. Nela, regras administrativas são a da classe cuja missão histórica é derrubar o
desenvolvidas para assegurar a permanência da modo de produção capitalista e bolir, finalmente,
intenção que tende a permanecer entre as todas as classes - o proletariado.” (In
pessoas, chegando muitas vezes a condicionar os FRIGOTTO, 1989:70)
relacionamentos humanos. Serão os seus
profissionais e os seus clientes que darão forma

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NUNES (1992), salienta que a escola pública, A desqualificação do trabalho escolar vem
fugindo de 5 sua função social, tem se tomado transvestida pela correlata perspectiva
numa “máquina de expulsar crianças”, um pedagógica da tecnologia educacional, ou por
poderoso veículo de exclusão social. teorias educacionais não-criticas, postas como
modernas e inovadoras; é uma desqualificação
SEVERINO (1986:97), imprime à Educação a orgânica necessária à manutenção da divisão
característica de gestação de uma nova social do trabalho, e à manutenção da sociedade
consciência social, que parta da consciência de classes, visto que atinge a escola freqüentada
natural para a consciência reflexiva, de uma pela classe trabalhadora (FRIGOTTO,
consciência dogmática para uma consciência 1989:164).
crítica; e, assim, que a educação possa Não se nega a organização e a racionalização
mediatizar, através de um discurso critico, a do trabalho escolar, e que avanços tecnológicos
consciência que se impõe com discurso contra- não possam ser apropriados para a educação. O
ideológico que mascara a realidade e a sua que se ressalta é que a forma da organização
dogmaticidade. escolar e o uso das próprias técnicas já vêm
Portanto, mesmo que a educação no Brasil, articulados a determinações e a interesses de
hoje, se mostre como um instrumento de classe - eletrização do processo escolar “como
reprodução das relações sociais, econômicas mecanismo de reprodução das relações econômi-
políticas e culturais, através de uma reprodução co-sociais que perpetuam a desigualdade
ideológica de dominante, não podemos afastar (FRIGOTTO, 1989:171).
dela o seu potencial transformador, por ser o A escola possui, também, a responsabilidade
palco das contradições da sociedade, onde és de de profissionalizar, mas a maneira como a
ações dialéticas é possível superar a função profissionalização vem sendo trabalhada, acaba
discriminatória que exerce. No interior da escola por não profissionalizar, diante de toda a
pode surgir um processo de resistência a essa elaboração e o avanço do mundo do trabalho. A
dominação; fica claro, porém, que ela não é a sua idéia deformada do processo produtivo,
alavanca de transformação social, mas é um desvia a escola de sua “função precipua:
mecanismo que pode desenvolver um discurso fornecimento de uma estrutura básica de pensa-
contra-ideológico, como mostra SEVERINO mento e uma qualificação politécnica no sentido
(1986:97), partindo de um esforço crítico de da tradição marxista”, e mantém a divisão social
uma consciência reflexiva, e que, historicizando entre trabalho manual e o intelectual, teoria e
as relações sociais de produção, as leve a uma prática, organização e execução.
transformação, como aponta FRIGOTTO (1989).
O fracasso da escola possui uma
LITIERI (In FRIGOTTO, 1989), analisa que determinação histórica, que condiciona a escola
o capitalismo de hoje, de fato, não recusa o a esse fracasso (FRIGOTTO, 1989:173).
direito à escola, “o que ele recusa é mudar a
função social da escola”. Cabe à escola o resgate da dimensão do
trabalho como principio educativo, preparando o
Assim, a improdutividade dentro da escola, indivíduo para o trabalho mediante uma
dentro do processo capitalista é uma mediação formação critica que impeça a alienação sobre as
necessária e produtiva à manutenção das relações de produção da sociedade capitalista.
relações capitalistas de produção (FRIGOTTO, Essa formação profissional exige um projeto que
E, a educação vai aparecer como mediadora dos vise a unilateralidade e que trabalhe com as
interesses dominadores. contradições que a história oferece.
Através da análise de Frigotto, percebemos
que, historicamente, a escola vem cumprindo Nada mais claro do que a afirmação a seguir,
funções de caráter geral, ou seja: sobre a produtividade da escola:
“A sua produtividade para a manutenção das
 desenvolvimento de um saber que não é relações sociais de produção se materializa,
especifico; a formação de profissionais de alto então, na sua improdutividade, isto é na sua
nível; uma escolaridade elementar e o abstratividade e em seu caráter anacrônico”.
desenvolvimento de traços sócio-culturais FRIGOTTO, 1989.-173
políticos e ideológicos, para funcionalidade das
empresas produtivas e instauração de uma A dimensão política da ação pedagógica na
mentalidade consumista; linha dos interesses da classe trabalhadora se
 prolongamento desqualificado da concretiza na medida que viabiliza um escola que
escolaridade que vai constituir-se num se organiza para o acesso efetivo do saber que
mecanismo de gestão do próprio Estado lhe é negado e expropriado pela classe
intervencionista, que busca viabilizar a dominante. Viabilizar os interesses da classe
manutenção e o desenvolvimento das relações trabalhadora tem ponto de partida e ponto de
sociais de produção capitalistas (FRIGOTTO, chegada e é político. Mas, não lhe basta, é
1989:162). necessário a dimensão técnica. A mediação da
competência técnica e dos instrumentos
materiais é que será capaz de oferecer um saber

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mais instrumentalizado, específico e do trabalho e este se tenha convertido não só


contextualizado (FRIGOTTO, 1989:184,185). em um meio de vida, mas na primeira
necessidade da vida - luta por uma escola que
Ianni coloca que “os limites da atenda às camadas trabalhadoras. Torna-se
democratização da escola coincidem com os indispensável a postura política e a mediação
limites da democracia na sociedade de clas- técnica, que vão propor uma escola única e
se”( In FRIGOTTO, 1989: 185). O controle da pública, e do trabalho como principio educativo,
organização da escola implica com o próprio como já citado.
avanço mais global da democratização da Na construção do saber, produzido
sociedade em seu conjunto. historicamente e sistematizado, para a
apropriação pelas classes populares, o vetor que
Portanto, resgatar uma escola de qualidade é norteia a organização técnica e política é a
fazer dela um espaço que reforça e amplia os “realidade complexa vivida pela classe
interesses da classe trabalhadora; o que trabalhadora nas relações sociais de produção de
demanda organização, disciplina, qualificação sua existência, historicamente determinadas -
técnica e direção política, necessitando escola ligada à vida”. A formulação da
intelectuais que reúnam capacidade técnica e possibilidade dessa escola organizada a partir
opção política na direção do interesse dos das práticas sociais concretas - existentes nas
dominados (FRIGOTTO, 1989:185). relações de produção da existência dos
trabalhadores -‘ resulta da colocação histórica de
Para Gramsci, o processo de transição para o sua necessidade (FRIGOTTO, 1989:196).
socialismo abrange uma conquista do Estado: Nessa análise, a escola pública e única,
uma prática ativa, organizada, de criação da eliminaria o privilégio; o trabalho, como principio
consciência coletiva (dos trabalhadores). Entram educativo, levaria o homem a encontrar sua
em cena o intelectual - organizador e crítico da forma própria de produzir-se em relação aos ou-
consciência da classe - o intelectual coletivo” tros homens.
(FRIGOTTO, 1989:194).
Assim, a escola que Frigotto apresenta não se
A necessidade da “formação de quadros de divide em escola e trabalho, mas e uma escola
quadros de intelectuais progressistas, cujo “vetor de organização política e técnica são
politicamente compromissados com a luta e o as próprias relações sociais de produção vividas
interesse da classe trabalhadora, teórica e concretamente pela classe trabalhadora e onde o
tecnicamente instrumentalizados, não apenas trabalho se constitui no principio educativo
para entender a realidade na sua complexidade e fundamental” (FRIGOTTO, 1989:226). Dessa
diversidade, mas principalmente para forma, o caráter contraditório da prática
transformá-la”, é evidente (FRIGOTTO, educativa consiste em que, nem sempre, os seu
1989:227). saber está articulado com os interesses do
capital (FRIGOTTO, 1989:205).
Pensar a escola fora das relações sociais de
produção é dar-lhe o sentido de formação do As reflexões de Frigotto, foram básicas no
cidadão para a democracia (abstrata) caindo na prosseguimento e aprofundamento do nosso
armadilha de preservá-la às elites. trabalho, cuja a pretensão é desvelar a função
social da escola, por se constituírem numa
Frigotto propõe uma volta à proposta discussão pioneira da relação produtiva e
pedagógica de Marx, desenvolvida por Lenine e improdutiva da escola, hoje.
Gramsci:
Foi procurando uma escola cidadã, que
 Unidade entre o ensino e o trabalho GADOTTI vai evidenciar que, essa escola tão
produtivo com uma luta de reconquista pela desejada, precisa romper com o
classe trabalhadora, das condições objetivas de autoritarismo e com a burocracia que lhe são
sua produção. Resgate do poder de apropriar-se, imprimidos, e partir para a conquista da sua
como proprietário coletivo das condições de sua autonomia e autogestão.
produção física epsíco-social (FRIGOITO,
1989:188). A Constituição Brasileira (1988) dá suporte à
antonomia da escola, quando estabelece como
 A escola politécnica e o trabalho como princípios “o pluralismo de idéias e concepções
principio educativo: com o desenvolvimento total pedagógicas” e a “gestão democrática do ensino
das possibilidades humanas - “criação histórica público.
de uma sociedade onde o homem total e todo
homem se humanize pelo trabalho” (FRIGOTTO, Para GADOTTI, a autonomia da escola é parte
1989:189). intrínseca do processo da educação. Quando a
escola perde a sua autonomia, perde, também,
Essa escola com a inseparabilidade do ensino sua capacidade de educar para a liberdade.
e do trabalho produtivo, é a escola da sociedade
futura onde se tenha superado a divisão social

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O autor citado acredita na luta cotidiana, caminho irreversível da atualidade (GADOTTI,


mudando passo a passo, porque a quantidade de 1992:43).
pequenas mudanças numa certa direção, oferece
a possibilidade de operar a grande mudança. Ela A luta pela autonomia da escola insere-se
poderá acontecer como resultado de um esforço numa luta maior pela autonomia social; e,
continuo, solidário e paciente. depende da ousadia da escola em experimentar
o novo e não apenas pensá-lo. A autonomia se
A participação e a democratização da gestão refere à criação de novas relações sociais que se
da educação, têm sido os temas de muitos oponham às relações autoritárias existentes.
debates promovidos no pais, a partir de 1964.
A partir da década de 80, sem acreditar mais Escola autônoma significa constante
nas propostas alternativas de educação, intercâmbio com a sociedade, lutar por ela é
“impostas pelo Estado, os educadores tentam lutar por uma escola que projete unia outra
adaptar a escola ao aluno, trabalhando com a sociedade, dando sentido novo à função social da
palavra, criando canais de participação, pois só escola e do educador, responsável por um futuro
uma população organizada será capaz de possível, com eqüidade (GADOTTI, 1992:47,48).
derrotar a impostura e a prepotência que ainda Porém nosso ensino centralizador contrapõe-
dominam a sociedade brasileira” (GADOTTI, se como principio constitucional da
1983). democratização e da gestão.
A participação e a democratização, para
O discurso da “administração participativa” e Gadottí, num sistema público de ensino, é a
do “planejamento participativo” foi adotado pelo forma mais pratica de formação pari a cidadania.
próprio governo, e a participação chegava com a A educação para a cidadania dá-se na
“distensão” política e a democracia “relativa”. participação e no processo de tomada de
decisão. A criação dos Conselhos de Escola
Numa contextualização aos pacotes representa uma parte desse processo. Mas, eles
educacionais do regime autoritário, surge a fracassam se forem instituídos como uma
pedagogia alternativa - da resistência -com medida isolada e burocrática.
escolas alternativas, escolas cooperativas ou
comunitárias. Esta instituição poderá ser entendida se
levarmos em conta todos os fundamentos e
Com a promulgação da Constituinte de 1988, estruturas determinantes do processo social,
O princípio da “gestão democrática do ensino político e escolar, como vimos até então.
público” é consagrado, e vários, e vários projetos
de gestão democrática foram implantados com a Portanto, a escola enquanto uma instituição
chegada dos partidos populares ao poder social especializada, estando ao mesmo tempo
municipal (eleições diretas): Conselho de Escola, em ruptura e em continuidade veiculando em
Administração Colegiada, Eleições para Diretor seu interior ideologias e contradições, sem duvi-
de Escola (GADOTTI, 1992:30). da alguma, funcional. O seu caráter social
decorre do seu vinculo à sociedade; e se
Só em 1990, que os debates pedagógicos e apresenta especializada, por suas finalidades
reformas educacionais cogitam o tema da culturais e educativas, dando forma especifica a
autonomia da escola, mediando a participação e uma ideologia que não criou, a ideologia cultural
a autogestão. burguesa (CHARLOT,1983:213),

A autonomia tem um aspecto qualitativo Mas, estabelecendo uma mediação entre a


importante com relação ao pedagógico. Esse criança e o mundo, a escola cria, também, um
debate ocorre no momento em que as espaço de instrumentalização para a ação
convicções históricas em relação ao papel do emancipatória das classes populares.
Estado, dos partidos políticos e sindicatos, foram
abalados pela revolução democrática no Leste Dessa forma, a mediação escolar tem se
Europeu. Alguns educadores criticam a mostrado relevante em seus dois aspecto: ora
autonomia com sendo “privatista” ou “ingênua”, reproduzindo e legitimando os interesses sociais
desobrigando o estado pela Educação (GADOTTI, políticos e econômicos dominantes, ora criando
1992:35). espaços de expressão dos interesses das
camadas populares.
Mas a idéia de autonomia é intrínseca à idéia
de democracia e cidadania. Cidadão é aquele que Sem dúvida, o cotidiano demonstra
participa do governo e só pode participar do claramente tais conflitos, possibilitando-nos
governo quem tiver poder, liberdade e auto- explicitar as relações sociais, políticas e
nomia para exercê-lo (GADOTTI, 1992:38). econômicas que permeiam a atuação da escola
no sentido da sua relação com as necessidades
A autonomia da escola não se opões à do grupo social mais próximo a si, à comunidade
unidade do sistema. Descentralização e que ela atende e com quem faz vizinhança.
autonomia caminham juntos e parece ser o

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Ao analisarmos essa mediação escolar,


confrontando-a com o seu discurso democrático,
percebemos que a escola teria que ser tão
democrática quanto a sociedade tem procurado
ser. Prega-se que a voz de todos os segmentos
escolares necessita ser ouvida. Passo a passo a
escola caminha para a sua emancipação através
das conquistas comunitárias onde se percebe
claramente a atuação dos elementos da escola e
da comunidade na construção de uma escola
voltada às suas necessidades; das leis
regulamentadas, resultado do trabalho de
intelectuais compromissados com as camadas
populares; da autonomia e autogestão que
muitas escolas conquistaram para a efetivação
do processo ensino-aprendizagem e de suas
finalidades institucionais. De outro lado, porém,
ela está:

 reproduzindo e legitimando toda uma


ideologia burguesa, encrustada de valores de
classe que não é os da classe com que trabalha;
 selecionando através de seus mecanismos
classificatórios e excludentes, que nada mais
poderiam ser do que uma exclusão social;
 levando os alunos a repetências em nome
da qualidade de ensino, veiculando conteúdos
anacrônicos e completamente distanciados da
realidade dos alunos;
 massacrando comunidades criando
estereótipos de que ela ainda comanda porque
detém o saber;
 eliminando a comunidade e os pais do
circulo de debates em torno das melhoria
educacionais(RODRIGUES, ROMANELLI,
CHARLOT).

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