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Capitulo 148 Fernao Opes
Capitulo 148 Fernao Opes
João I'
🔺 Título: sintetiza o conteúdo temático do capítulo:
- os factos ocorridos durante o cerco a Lisboa (a falta de mantimentos dos sitiados);
- as consequências psicológicas e sociais decorrentes desses factos (o sofrimento da população).
🔺 Estrutura interna
🔼Introdução (do início até "vieram na frota do Porto."): Cerco da cidade → fome → escassez de
mantimentos, motivado pela quantidade de pessoas existentes na cidade.
Os mantimentos existentes na cidade gastam-se cada vez mais depressa, tornando-se
escassos, devido ao facto de o número de habitantes da cidade aumentar cada vez mais,
porque a ela se recolheu muita gente (lá estavam os habitantes de Lisboa, pessoas que vieram
dos arredores, famílias inteiras e os que vieram numa frota do Porto para socorrer a capital).
1.1. Procura de trigo no Ribatejo (desde "E alguns..." até "... cinco mil homens.").
a) Motivos da procura:
- o cerco à cidade;
- a presença de muita gente na cidade;
- a falta de alimentos.
Durante a noite, os sitiados embarcam em batéis e vão buscar trigo ao Ribatejo para
abastecer a cidade, correndo enorme perigo, pois são atacados pelos castelhanos. Sempre que
os sinos repicam e tocam a rebate, a população vai em socorro das galés. Esta recolha de
mantimentos obedece, aparentemente, a um plano prévio, dado que parece existir uma
partilha de tarefas e funções distribuídas: há aqueles que vão recolher mantimentos que já
estavam prontos (“… ali carregavom de trigo que já achavom prestes, per recados que ante
mandavom…”), através do Rio Tejo; há sinais combinados para alertar para os perigos,
nomeadamente os decorrentes da presença dos castelhanos, etc.: “ali carregavom”; “Os que
esperavam…”; “… repicavom logo por lhe acorrerem.”; “… aguardando quando veesse, e os
que velavom, se viiam as galees remar contra lá, repicavom logo por lhe acorrerem…”.
Apenas uma vez os galés foram tomadas, graças à denúncia de um “homem natural
d’Almadãa”, cujo castigo pela traição foi terrível: “el foi depois tomado e preso e arrastado, e
decepado e enforcado.” (enumeração, polissíndeto e gradação).
No entanto, o trigo é tão pouco e raro que não supre as necessidades (atente-se na
comparação com o milagre da multiplicação dos pães).
1.2. Expulsão da cidade da gente incapaz, fraca e pobre [("não pertencentes pera defensão",
prostitutas, judeus") – desde "Em esto gastou-se..." até "... mester sobrelo conselho."].
b) Motivos:
- não podiam lutar / não podiam contribuir para a defesa da cidade;
- consumiam os mantimentos aos defensores.
d) O Mestre ordena que se faça o levantamento do pão existente em Lisboa, tendo-se concluído
que é muito escasso.
2) Fome da população: carência de pão e carne (desde "Na cidade não havia trigo..." até "...tam
presentes tinham?").
De facto, apesar de famintos e extenuados, são solidários uns com os outros e
corajosos contra os castelhanos, continuando a manifestar uma identidade coletiva que os une
num propósito comum.
Mais uma vez, a cidade é apresentada como uma personagem coletiva, um ser só:
“Toda a cidade era dada a nojo” (isto é, toda a cidade sofria, tanto os pobres como os ricos –
“grandes pessoas da cidade”). Assim, Lisboa é apresentada como um grande corpo coletivo
que sofre.
A população reza, devota e desesperadamente, pedindo a Deus que a ajude, mas,
vendo que as suas preces não são atendidas e que a sua dor é cada vez maior, chega a pedir a
morte.
o Mestre e os seus, sabendo que nada podem fazer, sentem-se impotentes e ignoram
os lamentos da população.
Neste passo, aparentemente Fernão Lopes critica a ação de D. João e do seu
Conselho, dado que “çarravom suas orelhas do rumor do poboo”, parecendo assim o cronista
cumprir a imparcialidade e a neutralidade enunciadas no “Prólogo” à crónica.
6) O desespero da população (desde “Como nom quereis…” até “… per duas guisas.”) – dois
inimigos: a fome e o rei de Castela levam ao desejo de morte.
7) Tentativa de superar a fome: corre o boato de que o Mestre irá expulsar da cidade todos os
que não tenham alimentos, o que intensifica o desespero das pessoas, transformado em alívio
ao saberem que tal não é verdade.
Fernão Lopes congratula os que viverão no futuro, porque não passarão pelos
sofrimentos que Lisboa tem de passar durante o cero.
1. Sociais:
- expulsão dos fracos e não aptos para a defesa da cidade por falta de alimentos;
- a preferência pelo cativeiro dos castelhanos, em detrimento de morrer à fome.
2. Económicas:
- a diminuição / ausência de esmolas;
- a escassez e o preço elevado dos alimentos;
- a impossibilidade de comprar mantimentos, por causa do seu preço elevado.
3. Psicológicas:
- a coragem;
- o choro;
- o desespero;
- o conforto e a solidariedade mútuos.
🔺 Linguagem e estilo
-» o tom coloquial:
- uso da segunda pessoa do plural: "ouvistes"; "esguardae";
- uso da interrogação retórica: "Como nom querees que maldissessem sa vida e desejassem
morrer... da vida aa morte?"; "veede que fariam aquelles que as continuadamente tam
presentes tinham?"; “Pera que é dizer mais de taes falecimentos?”;
- uso da exclamação: "Oo quantas vezes... não eram compridas!";
-» a interpelação do leitor:
- uso da interrogação retórica;
- uso da apóstrofe: “Ó geeraçom que depois veo […] de taes padecimentos!”;
- uso da frase imperativa: “Ora esguardae como se fosses presente”;
- uso da interjeição “Ó”;
-» o realismo descritivo:
. "No lugar u costumavom vender o trigo, andavom homees e moços esgravatando a terra e se
achavom alguus grãos de trigo, metiam-nos na boca, sem tendo outro mantimento. Outros se
fartavom de ervas e bebiam tanta água, que achavom mortos homees e cachopos jazer
inchados nas praças e em outros lugares.";
. "Andavom os moços de três e de quatro anos pedindo pão pela cidade por amor de Deus, como
lhes ensinavom suas madres; e muitos não tinham outra cousa que lhe dar senão lágrimas que
com eles choravom, que eram triste cousa de ver; e se lhes davom pão como uma noz,
haviam-no por grande bem.";
. "... ficados os geolhos, beijando a terra, bradavom a Deus que lhes acorresse...";
. "Os padres e madres viam estalar de fame os filhos que muito amavom, rompiam as faces e
peitos sobreles, não tendo com que lhe acorrer senom pranto e espargimento de lágrimas".
-» objetividade:
. os pormenores de caráter económico (“ca valia o alqueire quatro livras; e o alqueire do milho
quarenta soldos…”);
. o realismo descritivo relativo à luta pela sobrevivência (“Das carnes, isso meeesmo, havia em
ela […] bem mostravom seus encubertos padecimentos.”);
-» alternância entre
. planos gerais: o grande plano da cidade e dos atores coletivos que nela intervêm (linhas 1 a 5,
por exemplo);
. planos de pormenor: a incidência em grupos de personagens e/ou situações particulares (por
exemplo, a procura de grãos de trigo, por “homees e moços”);
. Outros recursos
- A elegia comovida.
- As funções da linguagem:
. informativa;
. expressiva;
. apelativa.
- Enumeração, polissíndeto e gradação (“… e forom descobertos per huu homem natural
dAlmadãa, e tomados per os Castellaãos; e el foi depois tomado e preso e arrastado, e
deçepado e enforcao.”): traduz os castigos infligidos ao homem de Almada que encontrou
barcos com trigo, evidenciando a crueldade e a brutalidade da punição.
ü intensidade dramática
multiplicaçãoo do clímax þ ¯
estrutura trágica
- Os tipos de frase:
- Arcaísmos: "pero", "ca" (pois, porque), "uus", "nenhuus", "antre", "nojo", "departir", "guisas".
- Comparação:
. "... assi dos que se colherem dentro do termo de homees aldeãos com mulheres e filhos, como
dos que vierom na frota do Porto...";
. "... tamanho pão como uma noz...";
. "E assi como é natural cousa a mão ir amiúde onde sêe a dor, assi uns homees falando com
outros não podiam em al departir senão em na míngua que cada um padecia": evidencia a
necessidade de os habitantes de Lisboa lidarem com a sua dor, através do diálogo com quem
comungava do seu sofrimento, tal como a mão o faz através do contacto físico, no caso de
padecimentos dessa natureza;
. "... tanta diferença há de ouvir estas cousas àqueles que as então passaram, como há da vida à
morte?";
. mester de o multiplicar como fez Jesu Christo aos pães”: reforça o dramatismo, uma vez que só
um milagre poderia salvar a cidade.
- Personificações:
- da cidade de Lisboa;
- “as pubricas esmolas começarom desfalecer”.
- Pleonasmos:
. "colherom dentro";
. "deitar fora";
. "lançarem fora";
. "os a morte privasse da vida".
- Metáforas:
. "rogavam a morte que os levasse";
. "cerravom suas orelhas do rumor do povo.";
. "padeciam duas grandes guerras" (…) sse defender da morte per duas guisas…”: os habitantes
de Lisboa enfrentam duas guerras – a guerra (o cerco) contra os castelhanos e a fome
resultante do cerco – que impedia que se defendessem quer da morte, quer, por falta de
forças, do inimigo;
. "ondas de tais aflições?";
. “Os padres e madres viam estalar de fome os filhos…”: explicita a desgraça das crianças, tal
como o que estala parte, morre, também as crianças morriam, privadas de alimentos;
. “… andavom homees e moços esgaravatando a terra”: a metáfora evidencia o desespero das
pessoas por causa da fome. Tal como as galinhas esgaravatam a terra em busca dos grãos de
milho, também as pessoas, levadas pelo desespero da fome, remexiam a terra como aquelas à
procura de algum grão perdido.
- Adjectivação expressiva.
- Eufemismo: “Assim que rogavam a morte que os levasse…” – explicita o desejo de morte, pois é preferível
esta aos padecimentos que sofrem.
1. Pelo conteúdo:
- contexto histórico:
. o cerco da cidade de Lisboa pelos castelhanos.
2. Pela forma:
- o texto como exemplo da fase arcaica da língua:
. grande número de hiatos (encontro de vogais ásperas): doo, veede, door, seer, Meestre, etc.;
. a terminação -om nos nomes (razom, coraçom, etc.), nos advérbios (nom) e na terceira pessoa
do plural do imperfeito do indicativo dos verbos da primeira conjugação (esforçavom-se,
repicavom, encomendavom, braadavom, çarravom, etc.);
. o uso de conjugações arcaicas: pero (mas), ca (pois, porque);
. a ocorrência de pronomes arcaicos: all (outra coisa);
. o uso da forma arcaica do determinante indefinido (huus, nenhuu, hua) e da preposição
(antre);
. a dupla negativa: "nenhuu nom mostrava";
. o uso de arcaísmos: nojo, departir, guisas.
Estilo e arte narrativa de Fernão Lopes
. As crónicas de Fernão Lopes enquadram-se numa fase da língua portuguesa
normalmente conhecida como português antigo e exibem construções sintáticas,
expressões e vocabulário com marcas da língua de um período de
amadurecimento. Apesar dos arcaísmos (“talente”, “aadur”, “açalmamento”) e
de construções arcaicas (“Ca nenhuu por estonce podia outra cousa cuidar”), é
claro que a língua portuguesa já sofreu uma evolução que a distingue dos seus
primórdios.
. Coloquialismo:
. Visualismo e dinamismo:
- Articulação entre planos gerais (focalização da cidade e dos atores coletivos aque
nela intervêm) e planos de pormenor (incidência em grupos de personagens e /
ou em situações particulares);
. Fernão Lopes foi um dos mais fecundos e poderosos criadores de caracteres tanto
individuais como coletivos, vindo, por este motivo, a influenciar poetas,
romancistas e dramaturgos de épocas posteriores.
1. Atores individuais
2. Atores coletivos
. Com efeito, sempre que é narrado um evento importantes, o cronista faz questão
de expor o que pensava dele a opinião pública, como sucede aquando do cerco
de Lisboa, momento em que a população da cidade oscila entre a esperança de
que a frota castelhana fosse derrotada e o receio de que os castelhanos saíssem
vitoriosos, exercendo uma vingança cruel sobre os sitiados.
. Fernão Lopes, na sua obra, apresenta uma conceção original de História, tanto
em relação à tradição historiográfica como aos autores contemporâneos.
. No prólogo da Crónica de D. João I, o cronista expõe o seu ponto de vista sobre o
trabalho do historiador, descrevendo o método utilizado para tentar manter
a imparcialidade:
🔺 Estrutura interna
🔼Introdução (do início até "vieram na frota do Porto."): Cerco da cidade → fome → escassez de
mantimentos, motivado pela quantidade de pessoas existentes na cidade.
Os mantimentos existentes na cidade gastam-se cada vez mais depressa, tornando-se
escassos, devido ao facto de o número de habitantes da cidade aumentar cada vez mais,
porque a ela se recolheu muita gente (lá estavam os habitantes de Lisboa, pessoas que vieram
dos arredores, famílias inteiras e os que vieram numa frota do Porto para socorrer a capital).
🔼 Desenvolvimento (desde "E alguns se tremetiam..." até ao antepenúltimo parágrafo, inclusive).
1.1. Procura de trigo no Ribatejo (desde "E alguns..." até "... cinco mil homens.").
a) Motivos da procura:
- o cerco à cidade;
- a presença de muita gente na cidade;
- a falta de alimentos.
Durante a noite, os sitiados embarcam em batéis e vão buscar trigo ao Ribatejo para
abastecer a cidade, correndo enorme perigo, pois são atacados pelos castelhanos. Sempre que
os sinos repicam e tocam a rebate, a população vai em socorro das galés. Esta recolha de
mantimentos obedece, aparentemente, a um plano prévio, dado que parece existir uma
partilha de tarefas e funções distribuídas: há aqueles que vão recolher mantimentos que já
estavam prontos (“… ali carregavom de trigo que já achavom prestes, per recados que ante
mandavom…”), através do Rio Tejo; há sinais combinados para alertar para os perigos,
nomeadamente os decorrentes da presença dos castelhanos, etc.: “ali carregavom”; “Os que
esperavam…”; “… repicavom logo por lhe acorrerem.”; “… aguardando quando veesse, e os
que velavom, se viiam as galees remar contra lá, repicavom logo por lhe acorrerem…”.
Apenas uma vez os galés foram tomadas, graças à denúncia de um “homem natural
d’Almadãa”, cujo castigo pela traição foi terrível: “el foi depois tomado e preso e arrastado, e
decepado e enforcado.” (enumeração, polissíndeto e gradação).
No entanto, o trigo é tão pouco e raro que não supre as necessidades (atente-se na
comparação com o milagre da multiplicação dos pães).
1.2. Expulsão da cidade da gente incapaz, fraca e pobre [("não pertencentes pera defensão",
prostitutas, judeus") – desde "Em esto gastou-se..." até "... mester sobrelo conselho."].
b) Motivos:
- não podiam lutar / não podiam contribuir para a defesa da cidade;
- consumiam os mantimentos aos defensores.
d) O Mestre ordena que se faça o levantamento do pão existente em Lisboa, tendo-se concluído
que é muito escasso.
2) Fome da população: carência de pão e carne (desde "Na cidade não havia trigo..." até "...tam
presentes tinham?").
De facto, apesar de famintos e extenuados, são solidários uns com os outros e
corajosos contra os castelhanos, continuando a manifestar uma identidade coletiva que os une
num propósito comum.
Mais uma vez, a cidade é apresentada como uma personagem coletiva, um ser só:
“Toda a cidade era dada a nojo” (isto é, toda a cidade sofria, tanto os pobres como os ricos –
“grandes pessoas da cidade”). Assim, Lisboa é apresentada como um grande corpo coletivo
que sofre.
A população reza, devota e desesperadamente, pedindo a Deus que a ajude, mas,
vendo que as suas preces não são atendidas e que a sua dor é cada vez maior, chega a pedir a
morte.
5) A incapacidade do Mestre resolver a situação (desde “Sabia, porém…” até “… rumor do
povo.”)
o Mestre e os seus, sabendo que nada podem fazer, sentem-se impotentes e ignoram
os lamentos da população.
Neste passo, aparentemente Fernão Lopes critica a ação de D. João e do seu
Conselho, dado que “çarravom suas orelhas do rumor do poboo”, parecendo assim o cronista
cumprir a imparcialidade e a neutralidade enunciadas no “Prólogo” à crónica.
6) O desespero da população (desde “Como nom quereis…” até “… per duas guisas.”) – dois
inimigos: a fome e o rei de Castela levam ao desejo de morte.
7) Tentativa de superar a fome: corre o boato de que o Mestre irá expulsar da cidade todos os
que não tenham alimentos, o que intensifica o desespero das pessoas, transformado em alívio
ao saberem que tal não é verdade.
Fernão Lopes congratula os que viverão no futuro, porque não passarão pelos
sofrimentos que Lisboa tem de passar durante o cero.
1. Sociais:
- expulsão dos fracos e não aptos para a defesa da cidade por falta de alimentos;
- a preferência pelo cativeiro dos castelhanos, em detrimento de morrer à fome.
2. Económicas:
- a diminuição / ausência de esmolas;
- a escassez e o preço elevado dos alimentos;
- a impossibilidade de comprar mantimentos, por causa do seu preço elevado.
3. Psicológicas:
- a coragem;
- o choro;
- o desespero;
- o conforto e a solidariedade mútuos.
🔺 Caracterização das personagens
- o medo da vingança do rei de Castela, caso a cidade caísse nas suas mães
- disponibilidade total, "quando repicavom os sinos";
- coragem: a procura empenhada de alimentos (as idas de homens ao Ribatejo e a sua defesa
por parte dos que esperavam), colocando a vida em risco
- defesa corajosa da cidade, ultrapassando a fraqueza humana e revelando um esforço
sobrenatural;
- luta pela sobrevivência, procurando comida de forma degradante e bebendo água até à morte
e pedindo esmola pela cidade;
- crueldade: a punição do traidor;
- pedido de ajuda a Deus, face à situação de desespero reinante;
¯
- população unida, solidária na desgraça, consciente no risco, sofre no presente e receia o
futuro, mas não desiste de lutar e tenciona resistir até ao fim;
🔺 Linguagem e estilo
-» o tom coloquial:
- uso da segunda pessoa do plural: "ouvistes"; "esguardae";
- uso da interrogação retórica: "Como nom querees que maldissessem sa vida e desejassem
morrer... da vida aa morte?"; "veede que fariam aquelles que as continuadamente tam
presentes tinham?"; “Pera que é dizer mais de taes falecimentos?”;
- uso da exclamação: "Oo quantas vezes... não eram compridas!";
-» a interpelação do leitor:
- uso da interrogação retórica;
- uso da apóstrofe: “Ó geeraçom que depois veo […] de taes padecimentos!”;
- uso da frase imperativa: “Ora esguardae como se fosses presente”;
- uso da interjeição “Ó”;
-» o realismo descritivo:
. "No lugar u costumavom vender o trigo, andavom homees e moços esgravatando a terra e se
achavom alguus grãos de trigo, metiam-nos na boca, sem tendo outro mantimento. Outros se
fartavom de ervas e bebiam tanta água, que achavom mortos homees e cachopos jazer
inchados nas praças e em outros lugares.";
. "Andavom os moços de três e de quatro anos pedindo pão pela cidade por amor de Deus, como
lhes ensinavom suas madres; e muitos não tinham outra cousa que lhe dar senão lágrimas que
com eles choravom, que eram triste cousa de ver; e se lhes davom pão como uma noz,
haviam-no por grande bem.";
. "... ficados os geolhos, beijando a terra, bradavom a Deus que lhes acorresse...";
. "Os padres e madres viam estalar de fame os filhos que muito amavom, rompiam as faces e
peitos sobreles, não tendo com que lhe acorrer senom pranto e espargimento de lágrimas".
-» objetividade:
. os pormenores de caráter económico (“ca valia o alqueire quatro livras; e o alqueire do milho
quarenta soldos…”);
. o realismo descritivo relativo à luta pela sobrevivência (“Das carnes, isso meeesmo, havia em
ela […] bem mostravom seus encubertos padecimentos.”);
-» alternância entre
. planos gerais: o grande plano da cidade e dos atores coletivos que nela intervêm (linhas 1 a 5,
por exemplo);
. planos de pormenor: a incidência em grupos de personagens e/ou situações particulares (por
exemplo, a procura de grãos de trigo, por “homees e moços”);
. Outros recursos
- A elegia comovida.
- As funções da linguagem:
. informativa;
. expressiva;
. apelativa.
- Enumeração, polissíndeto e gradação (“… e forom descobertos per huu homem natural
dAlmadãa, e tomados per os Castellaãos; e el foi depois tomado e preso e arrastado, e
deçepado e enforcao.”): traduz os castigos infligidos ao homem de Almada que encontrou
barcos com trigo, evidenciando a crueldade e a brutalidade da punição.
- Os tipos de frase:
- exclamativas ü sublinham a gravidade e o dramatismo da situação em que a
- interrogativas þ população se encontrava.
- Arcaísmos: "pero", "ca" (pois, porque), "uus", "nenhuus", "antre", "nojo", "departir",
"guisas".
- Comparação:
. "... assi dos que se colherem dentro do termo de homees aldeãos com mulheres e filhos, como
dos que vierom na frota do Porto...";
. "... tamanho pão como uma noz...";
. "E assi como é natural cousa a mão ir amiúde onde sêe a dor, assi uns homees falando com
outros não podiam em al departir senão em na míngua que cada um padecia": evidencia a
necessidade de os habitantes de Lisboa lidarem com a sua dor, através do diálogo com quem
comungava do seu sofrimento, tal como a mão o faz através do contacto físico, no caso de
padecimentos dessa natureza;
. "... tanta diferença há de ouvir estas cousas àqueles que as então passaram, como há da vida à
morte?";
. mester de o multiplicar como fez Jesu Christo aos pães”: reforça o dramatismo, uma vez que só
um milagre poderia salvar a cidade.
- Pleonasmos:
. "colherom dentro";
. "deitar fora";
. "lançarem fora";
. "os a morte privasse da vida".
- Metáforas:
. "rogavam a morte que os levasse";
. "cerravom suas orelhas do rumor do povo.";
. "padeciam duas grandes guerras" (…) sse defender da morte per duas guisas…”: os habitantes
de Lisboa enfrentam duas guerras – a guerra (o cerco) contra os castelhanos e a fome
resultante do cerco – que impedia que se defendessem quer da morte, quer, por falta de
forças, do inimigo;
. "ondas de tais aflições?";
. “Os padres e madres viam estalar de fome os filhos…”: explicita a desgraça das crianças, tal
como o que estala parte, morre, também as crianças morriam, privadas de alimentos;
. “… andavom homees e moços esgaravatando a terra”: a metáfora evidencia o desespero das
pessoas por causa da fome. Tal como as galinhas esgaravatam a terra em busca dos grãos de
milho, também as pessoas, levadas pelo desespero da fome, remexiam a terra como aquelas à
procura de algum grão perdido.
- Adjectivação expressiva.
- Eufemismo: “Assim que rogavam a morte que os levasse…” – explicita o desejo de morte, pois é preferível
esta aos padecimentos que sofrem.
- Tempos verbais: pretérito perfeito e imperfeito.
1. Pelo conteúdo:
- contexto histórico:
. o cerco da cidade de Lisboa pelos castelhanos.
2. Pela forma:
- o texto como exemplo da fase arcaica da língua:
. grande número de hiatos (encontro de vogais ásperas): doo, veede, door, seer, Meestre, etc.;
. a terminação -om nos nomes (razom, coraçom, etc.), nos advérbios (nom) e na terceira pessoa
do plural do imperfeito do indicativo dos verbos da primeira conjugação (esforçavom-se,
repicavom, encomendavom, braadavom, çarravom, etc.);
. o uso de conjugações arcaicas: pero (mas), ca (pois, porque);
. a ocorrência de pronomes arcaicos: all (outra coisa);
. o uso da forma arcaica do determinante indefinido (huus, nenhuu, hua) e da preposição
(antre);
. a dupla negativa: "nenhuu nom mostrava";
. o uso de arcaísmos: nojo, departir, guisas.