Você está na página 1de 7

UM OLHAR SOBRE O ETNOCENTRISMO A LUZ DO FILME: O

MENINO DO PIJAMA LISTRADO

Avaliação final

Bruno Lovera Marostega


Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
Antropologia Social

Proposta

Selecione UMA produção cultural na qual seja possível identificar a representação de relações
sociais etnocêntricas e/ou seus efeitos. Descreva a produção selecionada e justifique sua
escolha a partir de DOIS parágrafos argumentativos, explicando a relação estabelecida com o
conceito antropológico de etnocentrismo, trabalhado no Módulo 9 (Etnocentrismo).
Introdução

Neste breve relato pretendemos abordar os conceitos de Etnocentrismo a partir da


Antropologia Social, ou seja, da ciência que estuda o ser humano em todos os seus aspectos.
Para tanto, escolhemos um elemento estético da vida humana (arte), mais específico da sétima
arte o cinema, com o filme dirigido por Mark Herman “O Menino do Pijama Listrado”, uma
adaptação da obra literária (2008) de mesmo nome, do escritor John Boyne (Irlanda 1971-
atual). Nossa justificativa se debruça sobre dois pilares: i) A estética, o estudo da arte que lida
com as necessidades, é o reabastecimento da consciência humana (Rand, 1966), a arte está a
serviço da dignidade do ser humano, conforme o maestro espanhol Íñigo Pírfano “existem
coisas na vida que deveriam ser melhores, as obras de arte tem a capacidade de relembrar
quem somos realmente” (BRASIL PARALELO). ii) o retrato da mais elevada celebração da
irracionalidade humana (a Segunda Guerra Mundial), em prol da justificativa ou melhor, de
que é certo, prático ou necessário que os homens atinjam seus objetivos por meio da força
física (RAND, 1966); exposto no filme, que aborda o Etnocentrismo elevado a sua maior
potência irracional.

Em busca de uma definição

Antropologia dos vocabulários gregos anthropos (ser humano) e logia (estudo), ou seja, o
estudo do ser humano em sua totalidade, abordando suas dimensões biológicas, sociais e
culturais. Assim o antropólogo estuda tanto grupos semelhantes em suas ações culturais,
quanto por grupos culturalmente diferentes, e observa o olhar que um grupo faz sobre o outro
(diferente), denominado etnocentrismo.

Etnocentrismo é a visão de mundo onde nosso próprio grupo é tomado como centro de tudo,
assim todos os outros são pensados sobre nossos valores e concepções, havendo uma
dificuldade de pensar e compreender a diferença (ROCHA, 1993). Nesse sentido, na lógica
etnocêntrica, consideramos nós mesmos e nossos semelhantes como parâmetros para dizer o
que é inferior ou superior, feio ou belo, moral ou imoral, evoluído ou atrasado, selvagem ou
civilizado.
A arte em: O Menino do pijama listrado

O filme se passa na Alemanha, no período do Nazismo (1939-1945).A dramaturgia se passa


sobre um menino chamado Bruno, que teve que se mudar da capital Berlim para outra cidade,
devido seu pai ter sido promovido para comandar um campo de concentração e extermínio de
judeus. Bom, não haveria melhor escolha para tratar de etnocentrismo do que descrever toda
a arquitetura que a Alemanha sob comando de Adolf Hitler forjou para alimentar um
darwinismo social, onde a raça ariana deveria se impor sobre outras para alcançar uma nação
forte, evoluída, civilizada.

Bruno um menino de apenas oito anos de idade na sua nova casa, descobre o que ele acredita
ser uma fazenda, na verdade é o campo de concentração, mas ao questionar seu pai e sua mãe
sobre os “fazendeiros” (judeus) de lá serem diferentes, seu pai diz: “aquelas pessoas não são
consideradas como gente” (mín. 17’). Bruno, escondido acaba indo até a cerca da fazenda
onde descobre Shmuel, o menino judeu no campo de concentração. Em alguns diálogos fica
notória a incapacidade de Bruno compreender a realidade da vida de Shmuel e do que se
passa em um campo de concentração: vejamos alguns diálogos: (mín. 39’ ao 42’)

- Bruno: Porque vocês usam pijamas o dia todo?


- Shmuel: Isso não é pijama.
[...]
- Shmuel: Eu não gosto de soldados,você gosta?
- Bruno: Eu gosto muito, meu pai é soldado, mas não é do tipo que leva a roupa das
pessoas.
- Shmuel: De que tipo então?
- Bruno: Ele é muito importante, está cuidando para que tudo fique melhor pra todo
mundo. E seu pai, é fazendeiro:
- Shmuel: Não, é relojoeiro, ou era, mas agora o que ele faz é consertar botas.
- Bruno: É estranho como os adultos não conseguem decidir o que eles querem fazer.
Como Pavel (judeu que trabalha na casa de Bruno) conhece ele? Mora aqui, ele já foi
médico, mas desistiu para descascar batatas.
- Bruno: Eu posso perguntar outra coisa, o que que vocês queimam nas chaminés? Eu vi
eles indo pra lá outro dia. Queimam muito feno, essa coisa?
- Shmuel: Eu não sei, nós não podemos ir pra lá. A mamãe disse que são roupas velhas.
- Bruno: Seja lá o que for, tem um cheiro horrível.
- Bruno: Olha você podia ir jantar conosco um dia desse.
- Shmuel: Não, eu não posso por causa disso (referindo a cerca do campo).
- Bruno: Mas isso é pros animais não fugirem não é?
- Shmuel: Animais, não isso é pras pessoas não fugirem.
- Bruno: Quer dizer que você não pode sair desse lugar. Porque, o que você fez Shmuel?
- Shmuel: Eu sou judeu. (silêncio…)

Nesse diálogo evidenciamos a incompreensão de uma criança aderir valores sociais, que
impostos por uma determinada cultura, separam homens, forjam o etnocentrismo, a
superioridade de uns para com outros, e irracionalmente contemplam a destruição, dos que
consideram inferiores. Bem, para embasar nossa afirmação acima, do que acreditamos ser a
imposição irracional de valores socioculturais, que criam o etnocentrismo, o darwinismo
social, e a destruição da arte, recorremos a outros trechos do filme.

O pai de Bruno, contrata um tutor para ensinar ele e sua irmã Gretel. O tutor pergunta para
eles: (mín. 29’ à 31)

- Tutor: Por acaso se interessam pela história atual.


- Gretel: Sim, bastante.
- Tutor: Então vocês sabem a situação em que nossa grande nação se encontra no
momento?
- Gretel: Sim, eu leio bastante jornais.
- Tutor: E você Bruno, tem lido jornais?
Bruno balança a cabeça em sinal negativo.
- Tutor: Você tem lido alguma coisa?
- Buno: Livro.
- Tutor: Ó timo! Mas que tipo de livros?
- Bruno: De aventuras principalmente. Com cavaleiro em armaduras, explorando terras
estranhas. [...]
- Tutor: Que idade você tem Bruno? Oito?
- Bruno: Huum (Bruno balança a cabeça em sinal positivo).
- Hora de parar de ler esses livros de ficção e começar a aprender fatos. Hora de voltar
sua mente para o mundo real, e eu acredito que esse seria um começo perfeito.
O tutor entrega para Bruno um livro ( Deutscher Almanach III: 1924-1937) o livro apresenta
figuras heróicas e garndes eventos da história da Alemanha, incluindo desfiles e discursos de
líderes nazista. até trechos do proprio Adolf Hitler (JÚLIA, 2021).

Esse relato demonstra, uma educação que corrói valores fundamentais da ética, para a
manutenção da vida. A ética segundo Ayn Rand é a capacidade racional de criar valores que
corroboram com a vida, baseados em uma metafísica e epistemologia interligadas (RAND,
1966). A definição de Ayn Rand para uma ética objetivista que seja corolário da vida:

“Em uma ilha deserta um homem precisa de um código moral, um conhecimento do


que é certo e errado fazer” (JÚNIOR).
“A ética não se aplica a tudo que existe, apenas ao homem, porém se aplica a todos
os aspectos da vida do homem: seu caráter, suas ações, seus valores, sua relação com
toda a existência. A ética ou moralidade, define um código de valores para guiar as
escolhas e ações do homem” (RAND, 1974).

A consequência dessa educação, baseada em um ética deturpada, vai sendo exposta ao longo
do filme, em uma leitura de Bruno, sobre o livro que citamos diz: (mín. 37’ a 38':10")

- Bruno: O destinto do meu povo é o meu destinto.


- Tutor: É o meu destino. (corrigindo Bruno).
- Bruno: Suas lutas e tristezas, suas alegrias e felicidades são minhas, eu devo trabalhar
e criar pela ressurreição da minha pátria mãe. A história do meu povo é grandiosa e
gloriosa.
[...] leitura de Bretel: (mín. 44’ à 45’: 15”)
- Bretel: Os judeus nos massacrou e incitou nossos inimigos, corrompeu-nos com livros
ruins, escarneceu da nossa literatura e da nossa música. Por todo lugar sua influência
foi destrutiva, cujo resultado final foi a ruína da nossa nação.
- Bruno: Não estou entendendo, a ruína de uma nação foi culpa de um só homem?
- Tutor: O judeu aqui significa a raça judia inteira. Se fosse apenas um homem, sem
dúvida alguma coisa teria sido feita.
- Bruno: Mas existem judeus que são bonzinhos, não é?
- Tutor: Eu acho Bruno, que se voce encontar um judeu bonzinho, voce sera o melhor
explorador do mundo.
Enquanto Gretchen continua lendo, Bruno pensa em seu amigo Shmuel.
Ainda no mín. 41’ a 42’, demonstra o quanto a irmã de Bruno, Gretel foi persuadida pela
ensino de uma cultura superior a outra, em seu quarto, quando antes havia inúmeras bonecas,
visto que ela tem apenas quatorze anos, agora está completo de figuras nas paredes de
imagens sobre Hitler e suas propagandas ideológicas. A arte, que como afirmamos ser o
conbustível de abastecimento da consciencia humana, e deveria estar a serviço da vida ética,
agora deturpada e engendrada por uma filosofia irracional, na qual Hitler e Joseph Goebbels
(ministro da propaganda da Alemanha nazista) dissolvem nas artes e na cultura, criando na
menina Gretel um codigo de valor moral baseado no etinocentrismo de uma nação e de uma
raça pura.

Bem, o final é comovente e triste. Bruno um menino que incapaz de compreender a


irracionalidade, o etnocentrismo, e a perversidade humana, acaba sendo morto junto com seu
amigo Shmuel, devido a Bruno ter entrado no campo de concentração para ajudar a procurar o
pai de seu amigo, vestindo-se com roupas listradas, e sendo levados, junto com outros para
uma Câmara de Gás.

Por fim, queremos concluir que o filme trata em primeiro plano da ótica de Bruno sobre o
nazismo na Alemanha, e assim questionar a afirmativa de José Carlos Rodrigues, quando este
diz: “o etnocentrismo é uma condição universal da humanidade” (RODRIGUES, 1989). É
notável que o autor demonstra através da inocência de Bruno, uma incompreensão de certos
valores culturais, e o etnocentrismo sendo persuadidos pelo tutor, que não foram incorporados
por Bruno, porém absorvidos por Bretel.

Apesar de sim, a maioria das pessoas viverem sob uma ótica etnocêntrica, afinal até o século
XVI acreditamos a terra ser o centro do universo, olhávamos para o céu e as estrelas giravam
enquanto estávamos na inércia, Nicolau Copérnico descreveu a teoria heliocêntrica em sua
obra De revolutionibus orbium coelestium (Da revolução de esferas celestes). A luz de uma
filosofia integrada, como o Objetivismo de Ayn Rand, podemos compreender as diferenças
culturais, sem impor qualquer valor a outra cultura (conforme estudado no módulo 3),
aprender com as particularidades de cada sociedade sem estar no centro da visão
(etnocentrismo) que subjuga outras visões de mundo.
Referencial Teórico

BRASIL PARALELO. O convidado do Contraponto, Íñigo Pirfano. Disponível


em:<https://www.instagram.com/tv/CZIW7-TgPcj/?igshid=MDJmNzVkMjY=>. Acesso em:
25 de junho, 2022.
JÚLIA. Q2AMX. 2021. Disponível em:
<https://q2a.mx/de-que-va-el-libro-quotdeutscher-almanach-iii-1924-1937quot.html>. Acesso
em: 24 de junho, 2022.

JUNIOR, Willian. Objetivismo Brasil. Ayn Rand: A Natureza dos Direitos. Disponível
em:<https://objetivismo.com.br/video/ayn-rand-a-natureza-dos-direitos/>. Acesso em: 24 de
junho de 2022.

MOODLE, Pucrs. Antropologia Social. Modalidade Online, 2022.

RAND, Ayn. Capitalismo: The Unknown Ideal, 1966.

RAND, Ayn. Filosofia: quem precisa dela, 1974. Objetivismo Brasil. Disponível em:
<https://objetivismo.com.br/artigo/filosofia-quem-precisa-dela/>. Acesso em: 24 de junho,
2022.

ROCHA, Everardo P. Guimarães. O que é etnocentrismo. são Paulo. Editora Brasiliense, 1993
(Col. Primeiros Passos).

RODRIGUES, José Carlos. Antropologia e Comunicação: princípios radicais. Rio de Janeiro,


Espaço e Tempo, 1989.

SUPERFLIX. O Menino do Pijama Listrado. Disponível em:


<https://www.superflix.rip/assistir-filme-o-menino-do-pijama-listrado-online-dublado/>.
Acesso em: 22 de junho, 2022.

Você também pode gostar