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HÁVAMÁL

E OS POEMAS RÚNICOS
Autor(es)
Anônimo

Títulos originais
Hávamál / Anglo-Saxon Rune Poem / Icelandic Rune Poem /
Norwegian Rune Poem / Adebecedarium Nordmannicum

Tradução e apresentação
Elton Oliveira Souza de Medeiros

Hávamál e os poemas rúnicos / Elton Oliveira Souza de Medeiros


1ª edição – São Paulo: Wyrd (2021)

ISBN 9798725542134 (KDP)

1. Medeiros, Elton O. S. 2. Runas


3. Inglês Antigo 4. Nórdico Antigo
Sumário
Apresentação
I. Hávamál
a) O Documento
b) O Hávamál
II. Poemas Rúnicos
a) Origens
b) Breve história dos primórdios dos estudos
c) Runas e o mundo contemporâneo
III. Os Muitos Nomes de Odin
IV. Sobre as atuais traduções do Hávamál e os poemas rúnicos
HÁVAMÁL
a) Os ensinamentos de Odin
b) Odin e a filha de Billingr
c) Odin e Gunnlod
d) Loddfáfnismál
e) Rúnatal
f) Ljóðatal
POEMAS RÚNICOS
Poema Rúnico Anglo-Saxão
Poema Rúnico Islandês
Poema Rúnico Norueguês
ABECEDARIUM NORDMANNICUM
Sobre o tradutor
Referências
Apresentação

Em seu ensaio de 1947, intitulado On Fairy-Stories, o


famoso escritor e então professor da Universidade de Oxford, J. R.
R. Tolkien faz uma breve espalhanação sobre os livros que lhe
influenciaram na infância e que de certa forma o marcaram por
toda sua vida e carreira acadêmica. Em certo momento ele escreve:
I had very little desire to look for
buried treasure or fight pirates, and
Treasure Island [1] left me cool. Red
Indians were better: there were bows
and arrows (I had and have a wholly
unsatisfied desire to shoot well with
a bow), and strange languages, and
glimpses of an archaic mode of life,
and above all, forests in such stories.
But the land of Merlin and Arthur
were better than these, and best of all
the nameless North of Sigurd and the
Völsungs, and the prince of all
dragons. Such lands were pre-
eminently desirable[2].
No Brasil, devido a forte influência francesa desde os
primórdios da academia brasileira, formou-se uma sólida produção
medievalística tradicionalmente focada em temas referentes a
países como França, Portugal, Espanha e – em função de diversos
fatores – voltados à Idade Média Central e Baixa Idade Média.
Entretanto, nas últimas décadas vem-se notando o interesse
crescente por parte de pesquisadores que vem buscando por
temáticas que divergem dessa tradição acadêmica nacional.
Visando períodos anteriores aos séculos XII-XV e regiões que
incluem o além-Reno e o norte europeu de forma geral. Como é o
caso da Inglaterra e Escandinávia Alto Medieval, por exemplo, que
têm sido objeto de estudos cada vez em maior número tanto em
nível de graduação quanto pós-gradução. Com certeza uma razão
para tal fato é o de que nesses pesquisadores encontraremos um
mesmo tipo de sentimento que os fazem se identificar com as
palavras de Tolkien e em seu interesse por tal passado da Europa
setentrional.
Voltando-nos ao campo da História e Literatura,
especificamente, em ambas as regiões geográficas há um profícuo
conjunto de fontes escritas que desde finais do século XIX tem
proporcionado uma riquíssima produção de trabalhos em centros
internacionais de pesquisa. Dos tempos da Inglaterra anglo-
saxônica temos, por exemplo, seu corpus literário (tanto em prosa
quanto póetico, onde se destacam textos como as homilías de
Ælfric de Eynsham e poemas como Beowulf); e na Escandinávia a
Edda Poética, as obras de Snorri Sturluson (como a Edda em Prosa
e a Heimskringla), além das sagas e demais textos. E é justamente
na Edda Poética que encontramos um dos textos mais conhecidos
desse conjunto documental, cuja importância e influência em nossa
atualidade ultrapassam os limites do mundo acadêmico: o
Hávamál.
Runas se encontram entre um dos assuntos mais
fascinantes que podemos encontrar ao estudar o norte europeu
medieval. E na atualidade, em nosso imaginário popular ocidental,
estão presente em diversas formas de mídias, parte importante de
novas manifestações religiosas contemporâneas, jogos, livros de
ficção e até mesmo presente como símbolo da tecnologia
“Bluetooth”[3], por exemplo.
Talvez possamos dizer que na verdade as runas nunca
estiveram muito longe de nós, como se pode pensar. E dessa forma,
talvez fosse mais correto dizer que elas não teriam sido
“(re)descobertas” por nossa contemporaneidade, mas “repensadas”
ou “reimaginadas” para atender anseios mais atuais – sejam eles de
fundo religioso, artístico ou mero entretenimento. Apesar de sua
presença marcante na atualidade, suas origens ainda permanecem
com um ar de mistério para o público em geral e gerando debates
dentro do meio acadêmico.
Neste trabalho pretendemos trazer ao público leitor de
língua portuguesa uma contribuição a tais debates e mesmo uma
brevíssima introdução para aqueles que estejam tomando contato
pela primeira vez com o assunto. Justamente para despertar o
interesse pelo assunto. E o mais importante, trazemos aqui, pela
primeira vez, reunidos e traduzidos diretamente a partir de seus
originais ao português, os três textos de origem medieval
conhecidos como “os poemas rúnicos”. Sendo eles,
respectivamente, o Poema Rúnico Anglo-Saxão, o Poema Rúnico
Islandês e o Poema Rúnico Norueguês. Além do curto texto
conhecido como Abecedarium Nordmannicum.
De forma alguma conseguiríamos cobrir todas as
informações disponíveis sobre o assunto, mas tentaremos abordar
alguns pontos principais quanto as runas, as origens da tradição de
estudos e por fim algumas observações sobre seu uso pela
contemporaneidade. Como dissemos, servindo de uma porta de
entrada ao tema acompanhada de fontes históricas literárias
traduzidas e voltadas tanto para o pesquisador já razoavelmente
familiarizado com o tema quanto para aquele que esteja iniciando
na área.
I. Hávamál
a) O Documento

O Hávamál integra o conjunto de poemas compostos em


nórdico antigo que conhecemos hoje como a Edda Poética ou Edda
Antiga[4] ou ainda a Edda Sæmundar[5] existente apenas em um
único exemplar medieval conhecido como Codex Regius (GKS
2365 4to). O poema é o segundo texto do conjunto de autoria
anônima que contém elementos mitológicos e heroicos da tradição
histórico-literária nórdica. Como a Völuspá, o Vafþrúðnismál,
Grímnismál, Skírnismál, Hárbarðsljóð, Hymiskviða, Lokasenna,
Þrymskviða, Völundarkviða e o Alvíssmál, entre outros. Uma vez
que a obra não possui um título original que a identifique, o nome
popular do Codex Regius (“Edda Poética”) se originou nada mais
como uma forma deliberada de diferenciá-la da Edda (a Edda em
Prosa) de Snorri Sturluson (c. 1179 – 1241).
Com base em análises paleográficas, sabemos que o
manuscrito da Edda Poética foi escrito inteiramente por um único
autor na Islândia em meados do século XIII (c. 1270). Talvez a
partir de uma versão original anterior. Entretanto, a história
pregressa do manuscrito antes de sua descoberta no século XVII
nos é praticamente desconhecida. O que sabemos é que já por volta
do ano de 1643 o Codex Regius se encontrava nas mãos do
colecionador e antiquário islandes Brynjólfur Sveinsson, então
bispo de Skálholt, devido à data de sua assinatura que se encontra
na parte inferior da primeira página do manuscrito (a página onde
se encontra o início da Völuspá).
Em 1662 o manuscrito foi enviado como presente ao rei
Frederico III da Dinamarca – dai a origem de sua denominação
(Codex Regius, “o Livro do Rei”, numa tradução livre) – sendo
então preservado na Biblioteca Real da Dinamarca até 1971,
quando foi levado de volta à Islândia. Atualmente ele se encontra
no Instituto de Estudos Islandeses Árni Magnusson (Stofnun Árna
Magnússonar í íslenskum fræðum) em Reykjavik.
É notório que os textos das Eddas sempre atraíram a
atenção aos longos dos séculos tanto de estudiosos quanto de leigos
em geral. Inspirando e influenciando vividamente escritores e
pesquisadores a comporem seus trabalhos desde a descoberta do
manuscrito. Dentre vários outros nomes famosos que podemos citar
como grandes admiradores da literatura nórdica e da Edda Poética
– e exemplo também do grau de influência de tal obra – está o do já
citado no início desta introdução, o filólogo, escritor e professor, J.
R. R. Tolkien.
Durante seus anos de magistério na Universidade de
Oxford, além do curso de inglês antigo, Tolkien também ministrou
aulas a respeito do nórdico antigo e principalmente sobre sua
poesia e consequentemente dos textos da Edda Poética. Sua
admiração por tal obra era tamanha que elementos deste universo
literário podem ser encontrados por toda a obra do autor
(acadêmica e ficcional[6]). Tal admiração chegou ao ponto dele
compor dois poemas em inglês moderno, utilizando a métrica do
nórdico antigo, tendo por inspiração textos da Edda Poética em
paralelo à narrativa da saga dos Volsungs. O que resultou nos
poemas que ele nomeou como Völsungkviða em nýja (“A Nova
Canção dos Volsungs”) e Guðrúnarkviða em nýja (“A Nova
Canção de Gúdrun”).[7]
Para termos uma ideia da visão de Tolkien sobre tais obras
e sobre o passado nórdico, melhor do que apenas tecer conjecturas
baseadas em supostas interpretações e indícios a partir de suas
obras de fantasia é poder ter contato direto com os textos de suas
aulas e conferências. Em seu texto intitulado Introduction to the
‘Elder Edda’ [8], ao falar sobre o contexto histórico-literário da
Edda Poética e as possíveis influências externas que essa sofreu,
ele expõe seu ponto de vista sobre a concepção da obra, sobre esse
passado medieval norte-europeu e ao final se aproxima da
abordagem deste nosso trabalho acerca daquela que é a personagem
principal do Hávamál:

Of course, it is true that however


much we emphasize the Norwegian
character and atmosphere of these
poems it is not free from importation.
Actually imported themes – such as
pre-eminently the Völsung and the
Burgundian and Hun stories – not
only acquired a leading place in the
Edda, but may even be said to have
received in exile their finest
treatment. But this is because they
were so thoroughly naturalized and
Norwegianized: the very uprooting
had set the tales free for artistic
handling unhampered by history or
antiquarianism, for recolouring by
Northern imagination, and
association with the looming figures
of the Northern gods. The only really
important modification one must
make is in favour of the Goths –
difficult as it is to decipher the hints
that survive the ages, it is clear that
these people of Scandinavian origin
but whom fate had marked out for a
special history and tragedy were
followed step by step by the people
of the North, and became with their
enemies the Huns the chief themes of
poets – so much so that in later days
gotar remained as a poetic word for
‘warrior’, when the old tales were
overlaid and mingled with other
matters. From the Goths came the
runes, and from the Goths came (it
would appear) Óðinn (Gautr), the
god of runic wisdom, of kings, of
sacrifice. And he is really important
– for the astonishing fact that he is
clearly un-Scandinavian in origin
cannot alter the fact that he became
the greatest of the Northern gods[9].
b) O Hávamál

Assim como os demais textos do Codex Regius, o


Hávamál – apesar de ser um poema – foi escrito de forma contínua
como um texto em prosa, sendo o início de cada estrofe marcado
por uma letra maiúscula[10]. O primeiro a transcrever o poema
dividindo-o claramente em estrofes separadas e numeradas (usando
como referencial a própria divisão contida no manuscrito) foi o
filólogo e linguista norueguês Sophus Bugge em sua edição da
Edda Poética de 1867, cuja organização do poema quase todas as
demais edições posteriores até a atualidade se baseiam. De forma
geral, dependendo das opções tomadas por cada organizador ao
transcrever e traduzir o texto, o Hávamál teria por volta de 163 a
165 estrofes. A opção por mais ou menos estrofes acaba sendo
extremamente subjetiva. Devido a certas imprecisões do
manuscrito, por vezes tradutores e editores optam por reunir duas
ou mais estrofes como sendo apenas uma ou divididem uma estrofe
em mais partes, seguindo sua interpretação do texto.
O Hávamál, como o conhecemos, só existe na versão
contida no Codex Regius. Entretanto, é possível encontrar
evidências de sua presença em outras obras da época. Indicando
assim que ele seria relativamente conhecido no período medieval
escandinavo. Por exemplo, a primeira estrofe do Hávamál é citada
quase que integralmente na Gylfagining da Edda em Prosa de
Snorri Sturluson, quando a personagem de Gylfi é levada ao salão
do Valhalla. Pouco antes de adentrar no local ele diz: “Gáttir
allar, áðr gangi fram, um skyggnask skyli, því at óvíst er at
vita hvar óvinir sitja á fleti fyrir”. A estrofe 84 do poema pode ser
encontrada na Fóstbræðra saga (capítulo 21), onde um thrall na
Groenlândia desconfia que sua senhora esteja sendo infiel.
Enquanto que os versos iniciais das estrofes 76 e 77 são citados na
última estrofe do poema Hákonarmál de Eyvindr Skáldaspillir[11]:
“Deyr fé, deyja frændr...”. Na literatura nórdica antiga como um
todo existem outras passagens onde podemos encontrar indícios
semelhantes. Como é o caso dos capítulos 6 e 7 da Heimskringla
onde temos ecos do que poderia ser a estrofe 148. Entretanto, em
nenhuma delas o Hávamál é identificado ou nomeado como tal [12].
Apesar das divergências entre pesquisadores sobre a
origem dos poemas do Codex Regius, há certo consenso de que
seus textos são mais antigos que o manuscrito existente e são
provavelmente fruto de uma tradição oral anterior ao seu registro
escrito. Um dos elementos que fundamenta essa hipótese, assim
como a possibilidade da existência de uma versão escrita que
antecedeu o Codex Regius (e do qual ele deriva), são as
inconsistências e erros de continuidade semântica de certas partes
da obra. O que poderia ser explicado como sendo equívocos
cometidos pelo copista do manuscrito a partir de uma versão
anterior[13].
Como veremos, a figura central do Hávamál é o deus
Odin. Contudo, diferente do que o leitor que toma seu primeiro
contato com o poema pode vir a pensar, não há uma
homogeneidade do texto ao desenrolar do poema, apresentando
tanto aforismos e conteúdo muito semelhante aos provérbios
bíblicos do Velho Testamento quanto conhecimentos místicos e
mitológicos. Na verdade, ao invés de um único poema, o melhor
seria dizer que o texto do Hávamál seria composto por diversos
poemas. Podemos identificar ao menos seis partes que podem
inclusive ser lidos de forma idependente das demais, sem que sua
compreensão seja prejudicada. Tais partes seriam: 1) “Os
ensinamentos de Odin” ou ainda Gestaþátr (estrofes 1 – 95), onde
temos incialmente os ensinamentos – muitas vezes enigmáticos –
do deus Odin a respeito de como receber e lidar com um hóspede e
mais tarde outros temas de âmbito mais geral; 2) depois o relato
sobre Odin e a filha de Billing (aproxidamente as estrofes 96 –
103); seguido de 3) o relato sobre Odin e Gunnlod (entre as
estrofes 104 – 110); depois temos 4) o Loddfáfnismál (estrofes 111
– 137), onde Odin se dirige a personagem de Loddfafnir lhe
aconselhando sobre os mais diversos assuntos e lembrando em
certa medida os ensinamentos das estrofes da primeira parte do
Hávamál; por fim temos as duas últimas partes e talvez as mais
conhecidas – principalmente pelos estudiosos da mitologia nórdica
– 5) o Rúnatal (estrofes 112 – 145) onde Odin conta como ele se
ofereceu como sacrifico a si mesmo e após nove noites como ele
retornou à vida trazendo consigo o conhecimento sobrenatural das
runas; e finalmente 6) o Ljóðatal (estrofes 146 – 163) onde o deus
fala a respeito das dezoito canções/encamentos que ele conhece e
sobre seus poderes, encerrando assim o Hávamál. Da mesma forma
como o poema apresenta essa diversidade quanto a sua temática ao
decorrer do texto, há também uma variação quanto à métrica nas
diversas partes que o compõe. Como os outros textos que fazem
parte da Edda Poética, no Hávamál podemos encontrar os três
principais estilos poéticos predominantes da poesia éddica: o estilo
ljódaháttr, málahattr e fornyrðislag. Sendo que a maior parte do
Hávamál se encontra composto no estilo do primeiro, mas
possuindo versos também no estilo dos dois últimos. Não iremos
nos aprofundar nas particularidades de tais estilos poéticos – visto
não ser este o objetivo principal de nosso trabalho – contudo vale
ressaltar que o ljódaháttr seria um estilo muito particular, exclusivo
da poesia islandesa. Apesar disso, ele se aproximaria parcialmente
do estilo fornyrðislag, quanto a sua estrutura. O fornyrðislag por
sua vez se assemelharia com o verso anglo-saxônico (encontrado
em obras como Beowulf, Judite e a Batalha de Maldon, por
exemplo)[14].
É claro que esta divisão das seis partes do Hávamál não é
algo tão rígido e dependende muito da edição e da organização
dada ao texto por parte de cada pesquisador e tradutor da obra.
Sendo a divisão apresentada acima – e utilizada por nós em nossa
tradução – como uma das mais consensuais sobre o assunto.
II. Poemas Rúnicos
a) Origens
Se buscarmos pela palavra “runa” em seus originais em
nórdico antigo (rún) e em inglês antigo (run, rune), encontraremos
seu significado atrelado à ideia de “mistério”, “segredo” ou
“conhecimento secreto”, “algo que não deve ser dito em voz alta”,
mas sussurrado; ou ainda simplesmente “letra”.[15] Em função
disso, devido a essa multiplicidade de significados, muitas teorias
floresceram a respeito da origem das runas. Especialmente sua
possível relação com “mistérios” e práticas mágicas acabou
gerando as hipóteses mais fantásticas e fantasiosas para a origem e
o uso das mesmas. Talvez a razão disso possa ser encontrada no
século IV, quando o missionário, bispo Wulfila, traduziu a Bíblia
do grego para o gótico. Onde ele acabou traduzindo a palavra
mysterion como runa (SPURKLAND, 2005: 3). O uso de runas em
ritos e práticas mágicas na Europa setentrional durante o período
medieval e moderno – e até mesmo contemporâneo, em regiões
como a Islândia – é indubitável (MACLEOD & MEES, 2006).
Entretanto, alegar que suas origens sejam (claramente ou
exclusivamente) em função de tais práticas é algo minimamente
temerário. Fato que desde os anos da década de 60 do século XX já
foi demonstrado como uma teoria que por si só se apresenta como
algo inconsistente. Em outras palavras, runas e práticas
religiosas/mágicas possuem pontos de contatos em diversos
exemplos (como nas sagas escandinavas e na mitologia), mas não
são elementos indissociáveis; muito pelo contrário (PAGE, 1995:
105 – 125). Sendo em muitos casos a alegação de tal associação
uma má interpretação das fontes, especialmente a partir da
literatura, onde construções literárias (mesmo metafóricas) são
compreendidas e traduzidas de forma literal.[16] Por exemplo, na
poesia em inglês antigo, expressões como halige rune (Elena vv.
333, 1168; Juliana vv. 656), não raro os casos, foram interpretadas
como “runas sagradas”, quando na verdade seu significado real
seria “mistérios sagrados”, dentro do contexto da hermenêutica
cristã. Exatamente o mesmo ocorre no poema Heliand, em saxão
antigo:

Manega uuâron, | the sia iro môd gespôn,


................, | that sia bigunnun uuord godes,
reckean that girûni, | that thie rîceo Crist
undar mancunnea | mâriða gifrumida
mid uuordun endi mid uuercun.
[Havia muitos cujos corações lhes disseram
que eles deveriam começar a contar aquele
mistério[17], a palavra de Deus, os famosos
feitos que o poderoso Cristo realizou em
palavras e atos entre a raça dos homens]
Heliand, vv. 01 – 05 (grifo nosso).[18]

Aqui giruni estaria vinculada, como nos exemplos em


inglês antigo, aos mistérios do poder de Cristo, e não exatamente a
“runas secretas”, como uma tradução mais literal poderia sugerir.
[19]
Ainda em inglês antigo, outro exemplo de como a terminologia
– ou o desconhecimento da mesma – pode ser traiçoeira se
descontextualizada encontra-se no uso de “runa” no sentido de
“conselho”, “auxílio”. Por exemplo, temos no poema Beowulf,
versos 171 – 172: Monig oft gesæt rice to rune; ræd eahtedon (...)
[“Por diversas vezes muitos se sentaram, poderosos em conselho,
considerando os planos (...)] (grifo nosso).
Entretanto, tudo isso ainda não esclarece sobre a origem
das runas. Especificamente, perguntas como “quando?”, “onde?”,
“por quem?” e “com qual propósito?”. Essas quatro perguntas estão
tão conectadas umas às outras que seria um erro tentar respondê-las
de forma individual. Sendo muito mais sensato buscar por indícios
e argumentações que forneçam elementos que satisfação todas ao
mesmo tempo, como se fossem uma única e grande pergunta.
Para, então, tentarmos responder a esses questionamentos
é melhor buscarmos por aquilo que já nos é conhecido sobre o
assunto. Entre os estudiosos e especialistas do campo da runologia,
existiriam ao menos quatro pontos de concordância: a) evidências
da existência de runas podem ser encontradas desde o século II
d.C., muitas datadas de por volta de 150 – 200 d.C. Contudo, é
possível encontrarmos indícios na cultura material anteriores a isso.
Estabelecendo, dessa forma, um período de florescimento das runas
entre os séculos I e II da era cristã[20]; b) a região com o maior
número de evidências de atividades rúnicas conhecidas e
registradas é a área que atualmente abrange aproximadamente as
regiões da Dinamarca, sul da Noruega e sul da Suécia. Ainda que
um número menor de indícios – mas tão antigos quanto os
exemplares escandinavos – possa ser encontrado no norte da
Alemanha e leste europeu[21]. Em geral todos correspondem a
artefatos portáteis, o que talvez indique que foram confeccionados
longe de seus locais de origem; c) por mais que isso possa
surpreender a muitos, especialmente o público leigo, runas fazem
parte também da tradição escrita e de inscrições de povos
mediterrânicos (fenícios, gregos, etruscos, romanos e celtiberos),
sendo muitos de seus caracteres são semelhantes ou até mesmo
idênticos entre os alfabetos desses diferentes povos; d) é muito
provável que as runas teriam se desenvolvido como fruto de
contatos ao longo das fronteiras do Império Romano, como uma
mescla de variações do alfabeto latino com formas locais de escrita
existentes ou que começavam a se desenvolver (BARNES, 2012: 9
– 10).
Ainda que esses quatro pontos levantados não sejam
suficientes para compreendermos de forma mais aprofundada o
surgimento das runas, eles nos auxiliam a pensar de forma mais
clara na gênese dessa(s) forma(s) de escrita. Por exemplo, as
similaridades entre as runas do norte-europeu e do mediterrâneo
certamente não são meras coincidências. Na completa falta de
evidências de uma possível influência das runas do norte europeu
nos alfabetos mediterrâneos, é uma consideração plausível a se
fazer de que tais alfabetos no mundo germânico sejam na verdade
(em maior ou menor grau) derivações das formas de escrita da
Europa meridional. E que o contato prolongado com o mundo
romano poderia ter levado os habitantes do norte não apenas a
aprender o idioma latino (ou alguma de suas variantes), mas talvez
o contato com o uso da escrita latina influenciado à imitação e
adaptação e posteriormente a elaboração de um sistema de escrita
próprio.
Desde o século XIX muitos estudiosos já consideravam o
alfabeto latino como a fonte primordial para a gênese das runas no
norte da Europa. Algo plausível se lembrarmos da extensão do
Império Romano entre os séculos I e II d.C. e as regiões com uma
presença mais marcante de um alfabeto rúnico. Evidências
arqueológicas corroboram com isso ao demonstrar um intenso
contato entre parte do mundo germânico e os territórios romanos. O
que daria oportunidade para que tais populações entrassem em
contato com uma sociedade letrada e assim se deixar influenciar
por ela. Ao mesmo tempo, as terras mais ao norte da Germania
estavam distantes suficientemente das fronteiras de Roma para
serem influenciadas por seu alfabeto, mas não copiá-lo exatamente
ipsis litteris; o que poderia explicar o porque das formas do futhark
e futhorc ser relativamente diferentes do alfabeto latino, mas
mantendo certas similaridades.
Apesar de a proximidade geográfica explicar a
oportunidade de contato e “intercâmbio” entre diferentes culturas,
isso não explica a motivação para tal feito. Considerando que
houvesse germânicos com certo conhecimento do idioma e da
escrita latina, capazes de compreender a importância de uma
cultura escrita, mesmo assim não é clara a razão que os levaria a
desenvolver um sistema de escrita para si. Principalmente se
pensarmos que, diferente dos romanos, os primeiros indícios de
escrita rúnica encontrados contém geralmente apenas palavras ou
nomes. Dentre muitas hipóteses, uma explicação seria de que o uso
ou o “aprendizado” de uma forma de escrita servisse como uma
forma de construção identitária, na tentativa de se posicionarem
como independentes do mundo que existia dentro das fronteiras de
Roma. Ou ainda, servisse inicialmente a uma aristocracia ou elite
dominante como uma forma ou símbolo de diferenciá-la de estratos
mais baixos ou populares dessa sociedade germânica. Um exemplo
prático disso, já de um período mais tardio ao surgimento das
runas, são as pedras comemorativas com inscrições já escritas
usando o antigo futhark. Obviamente o alfabeto rúnico, nesse caso
o antigo futhark, não surgiu em função dessas pedras
comemorativas, mas o uso de uma forma escrita em tais pedras
(celebrando eventos importantes ou em memória a alguém de
prestígio) revela o desejo de realçar a importância de algo ou
alguém em relação ao mundo cotidiano e às pessoas “comuns”[22].
b) Breve história dos primórdios dos estudos
A “runologia”, termo utilizado para o campo de estudos
das runas e da escrita rúnica (sendo seus adeptos chamados, por
conseguinte, como “runólogos”), pode ser considerado um “termo
guarda-chuva”, cobrindo uma grande quantidade de práticas,
técnicas e equívocos. A runologia, até o momento em questão, não
é considerada uma ciência, como seu nome pode levar a crer em
função de seu sufixo (-logos). Sendo assim, não é nada espantoso
que muitos runólogos sejam autodidatas; pesquisadores de áreas
das mais diversas que em algum momento de suas carreiras
desenvolveram um interesse especial pelo estudo das runas.
Lidando com este objeto de estudo de diferentes formas, refletindo
sua bagagem acadêmica e formação intelectual (e interesses) em
particular (BARNES, 2012: 7). Linguistas tendem a dar maior
atenção à fonética, formação de palavras, à estrutura de sentenças e
as runas como um sistema de escrita. Arqueólogos estão mais
concentrados na busca por relatos que as runas podem nos trazer,
seu contexto, período e etc. Historiadores tendem a ver as runas
como fontes primárias e a tentativa de distinção entre inscrições em
pedras, madeira, ossos e escritos em papel, numa tentativa de
compreender e identificar quais seriam mais historicamente
“precisas” ou não. Sem contarmos também com os interessados
“amadores”, os diletantes, místicos e correlatos e suas
interpretações subjetivas sobre o assunto.
A tradição de estudos e estudiosos dentro do campo da
runologia remonta, podemos dizer, ao menos até o século XVI –
XVII. Dentre outros, um dos primeiros que podemos citar é o nome
de Johannes Bureus (1568 – 1652) na Suécia. Bureus teria sido um
dos primeiros a realizar publicações dedicadas exclusivamente ao
estudo das runas, causando impacto em sua época com sua obra
runakänslanäs läräspan (“pretensões educacionais sobre as runas”,
numa tradução livre), de 1599.
Outro nome a ser mencionado entre os pioneiros dos
estudos sobre as runas é o do islandês Angrímur Jónsson (1568 –
1648). Contemporâneo de Bureus, Jónsson publicou em 1609 seu
Crymogaea. Diferente da obra de Bureus, em sua publicação as
runas não vinham acompanhadas de provérbios explicativos – para
um entendimento mais fácil das letras – mas eram apresentadas em
sequência, seguindo a ordem do alfabeto latino.
Na Dinamarca, Ole Worm (1588 – 1654) teria então
coletado as informações levantadas por Bureus e teria mantido
contato com estudiosos islandeses, usando-os como sua principal
fonte para os estudos das runas. Dentre outras de suas publicações
destaca-se runeR seu Danica Literatura antiqvissima, de 1636.
Sendo este, em comparação a seus antecessores, um trabalho muito
mais abrangente.
Em 1651, no mesmo ano que a segunda edição do livro de
Ole Worm foi lançada, o islandês Runólfur Jónsson (c. 1620 –
1654) publicava o seu Lingvæ Septentrionalis elementa, com
apenas vinte e cinco páginas. Apesar de pequeno, o livro trazia
inovações. Por exemplo, foi Runólfur Jónsson quem teria, pela
primeira vez, sugerido que as runas poderiam ser agrupadas em
Ætter (“famílias”). Em seu livro, ele diz que as letras (i.e. as runas)
poderiam ser organizadas em em três grupos, e apresenta dezesseis
runas: f, u, þ, o, r, k (I Ordo); h, n, i, a, s (II Ordo); t, b, m, l, y/R
(III Ordo). Esta também seria a primeira vez que as dezesseis runas
futhark teriam sido publicadas seguindo sua ordem “original”, com
a letra “m” antes de “l” e não ao contrário, como em outras
publicações da época até então. Em seu livro, Runólfur Jónsson
também incluiu descrições das runas em forma de estrofes com três
versos – muito semelhantes ao poema rúnico norueguês e o
islandês.
Contudo, apesar da grande contribuição realizada pelos
estudiosos escandinavos ao longo do século XVII, eis que surge
uma grande revelação no início do século XVIII em outra parte do
Mar do Norte. Quando os pesquisadores da época acreditavam ter
uma bela quantidade de informações e materiais referente às runas,
o pesquisador britânico George Hickes (1642 – 1715) apresenta um
documento que era praticamente inédito ao grande público. O mais
longo poema rúnico descoberto até a atualidade: o Poema Rúnico
Anglo-Saxão. Publicado originalmente no primeiro volume do
Linguarum Vett. Septentrionalium Thesaurus Grammatico-Critici
et Archæologici pars prima: seu Institutiones Grammatcæ Anglo-
Saxonicæ, & Moeso-Gothicæ, entre 1703 – 1705, o poema trazia
vinte e nove runas – número muito maior do que encontrado nas
fontes escandinavas – acompanhado de sua explicação na forma de
versos, nem sempre de fácil elucidação. Com a publicação de
Hickes e seu paralelo com as obras como as de Ole Worm e outros,
os estudos sobre as runas ganharam maior impulso ao longo dos
séculos XVIII e XIX. Contando com o auxilio, principalmente, de
indícios oriundos da cultura material. Sendo assim, de forma bem
sucinta, podemos dizer que essas seriam as bases ou ao menos uma
parte importante, do que daria origem aos estudos no campo da
runologia atual[23].
c) Runas e o mundo contemporâneo
Como abordado no início desse artigo, apesar de suas
origens na antiguidade e no medievo europeu, especialmente ao
falarmos das regiões próximas ao Mar do Norte, a presença das
runas ainda se faz presente em nossa atualidade. Muitas vezes
quase desapercebidamente, como o caso da tecnologia Bluetooth. É
possível encontrar as runas desempenhando os mais diversos
papéis e significados em nosso mundo atual; considerando como
“mundo atual” não apenas o início do século XXI, mas também, ao
menos, as influências oriundas da segunda metade do século XX.
No campo mais acadêmico, temos um novo despertar de
interesse pelo tema. Por exemplo, uma maior atenção dada ao
estudo de peças históricas como a famosa Franks Casket: pequena
caixa feita de osso de baleia dos tempos anglo-saxônicos da
Inglaterra do século VIII (possivelmente do reino da Northumbria)
onde estão esculpidas cenas que mesclam lendas do passado
germânico, com passagens bíblicas e a lenda da fundação de Roma.
Tudo isso acompanhado de inscrições rúnicas, engenhosamente
gravadas e posicionadas ao redor das imagens, ora como forma de
“legenda” às imagens, ora como charada.
No campo das artes e entretenimento, temos as runas
passando por releituras, apropriações e adaptações. Usadas em
jogos (sejam eles eletrônicos, de computador, Roleplaying Games)
e na literatura. O caso mais claro e latente se encontra em O Hobbit
de J. R. R. Tolkien, com as runas do misterioso mapa dos anões em
busca da montanha solitária onde se encontra o terrível dragão
Smaug.
Ainda no campo artístico e já adentrando o lado moderno
mais famoso do uso das runas (o misticismo) temos o antigo
alfabeto futhark usado na música. O melhor exemplo é a banda
norueguesa Wardruna, com seu projeto de três álbuns contendo
cada um músicas dedicadas a cada uma das runas do Antigo
Futhark, seguindo a divisão das três Ættir encontrada em Runólfur
Jónsson[24] e uma interpretação pessoal dos membros da banda a
respeito do significado das mesmas. Sendo suas músicas, segundo
os membros do grupo, um tipo de expressão ontológica das
mesmas, com claras tendências espirituais pessoais.
E não podemos deixar de falar do uso das runas por
membros de grupos esotéricos modernos, especialmente os adeptos
da corrente “neopagã”, como os adeptos do Ásatrú. Ou melhor,
grupos de inspiração Ásatrú. Que buscam uma reconstituição do
que acreditam ser a antiga “religião” ou religiosidade dos povos
nórdicos anteriores a cristianização. Tarefa que por si só da
margem a longos e polêmicos debates conceituais e interpretativos,
tanto no campo histórico e arqueológico quanto antropológico. No
quis diz respeito às runas, o principal problema recai no fato de que
a grande maioria das interpretações ou “reinterpretações” do
significado de suas letras não se sustenta à luz de uma pesquisa
acadêmica mais rigorosa. Costumeiramente são elaborações
modernas, fruto muitas vezes ainda de resquícios do romantismo
do século XIX e dos impulsos esotéricos característicos dos anos
1940 – 1970. Como o movimento Wicca[25], iniciado na Inglaterra
dos anos quarenta por Gerald Gardner, que alega uma suposta
reconstrução da religiosidade pagã que remontaria até o neolítico e
(em algumas vertentes) elementos dos povos celtas; mas na
verdade boa parte de suas práticas e ritos tem sua inspiração e/ou
origem nas elaborações oitocentistas de grupos esotéricos como a
Golden Dawn – que por sua vez remete aos ritos maçônicos do
século XVIII – e as ideias do famoso ocultista inglês Aleister
Crowley[26]. De forma similar, no caso das runas, houve uma
reelaboração de seu uso e significados como parte de um suposto
resgate histórico e como uma forma de legitimar as práticas e
crenças neopagãs de seus adeptos. Nesse contexto, um dos nomes
mais conhecidos seria o do pesquisador Stephen Flowers que, sob o
pseudônimo “Edred Thorsson”, escreveu diversos livros de cunho
esotérico e pseudo-histórico; como Futhark: A Handbook of Rune
Magic (1984) entre outros. Flowers/Thorsson, em função disso foi
e é alvo de diversas críticas, tanto por parte do mundo acadêmico
(acusando-o de falta de maior rigor científico em suas obras e
subjetividades diversas) quanto do mundo religioso-esotérico
(especialmente por parte de membros adeptos da própria Ásatrú
europeia, acusando-o de inventar e forjar informações sobre as
runas sob a influência dos diversos grupos místicos dos quais
Flowers/Edred já fez parte, como a Igreja de Satã – criada nos
E.U.A. dos anos 60 por Anton LaVey – e o Templo de Set, uma
dissidência da Igreja de Satã). Portanto, é necessária muita cautela
e um senso crítico apurado ao lidar com o assunto em nossa
contemporaneidade[27].
III. Os Muitos Nomes de Odin

O islandês Snorri Sturluson (c. 1178 – 1241), em sua obra


Heimskringla – especificamente no primeiro capítulo, a Ynglinga
Saga –, nos descreve que na Ásia, ao leste de Tanakvisl, havia uma
região conhecida como Asaland ou Asaheim e cuja capital seria
conhecida como Asgard. E lá se encontraria o senhor de tal reino,
cercado por doze sacerdotes responsáveis pelos sacrifícios
realizados na cidade e em auxiliar seu soberano a executar a
justiça. Este poderoso líder era um grande guerreiro que havia
viajado por diversas terras, sido tão vitorioso e conquistado tantos
reinos, que acreditavam ser impossível derrota-lo. Era versado em
magia, podia se comunicar com os mortos, entre outros feitos
sobrenaturais. Segundo Sturluson o nome desse líder era Odin, e
dele descenderiam muitas linhagens de casas régias e heróis do
norte europeu.[28]
Odin é personagem central de diversas fontes da Europa
setentrional do período medieval. E sua imagem está
intrinsecamente ligada à cultura e sociedade de origem nórdica até
os dias de hoje. Contando com produções artísticas e outros meios
midiáticos onde a figura da antiga divindade é apropriada e
remodelada, atendendo anseios de públicos diversos.
No campo acadêmico, especialmente a partir do século
XIX, nunca faltaram trabalhos voltados à temática histórico-
literária na qual Odin é representado. Dentre uma gama vasta de
livros e artigos, apenas para citar alguns poucos, podemos lembrar
aqui obras como a de D. E. Martin Clarke, The Hávamál (1923)
[29]
; de Hjalmar Falk, Odensheite (1924) [30]; as consagradas obras
de Hilda R. Ellis Davidson, The Road to Hel (1943) e Gods and
[31]
Myths of the Northern Europe (1964) ; de E. O. G. Turville-
[32]
Petre, Myth and Religion of the North (1964) ; de Georges
Dumézil, Du Mythe au Roman (1970) [33]; isso sem mencionar
muitos outros, inclusive traduções das Eddas e sagas onde o deus
se faz presente. E recentemente tivemos a publicação da obra de
Neil Price – um dos principais nomes na atualidade dentro dos
estudos sobre a Escandinávia medieval – Odin’s Whisper: Death
and the Vikings (2014) [34].
Uma das características de Odin na literatura nórdica
(tanto a de caráter mitológico assim como nas sagas) é a variedade
de nomes pelos quais ele é conhecido e que estão, na maioria dos
casos, atrelados ao seu papel e suas atitudes em tais narrativas. Um
dos mais conhecidos é o nome Alfaðir ou Alfǫðr (“Pai de Todos”).
Além desse podemos encontrar outros que variam conforme ele se
apresenta através de um caráter mais sapiencial, ou por seus feitos
mágicos, ao trapacear e engananar seus inimigos, ao instigar e
auxiliar em batalha e etc. A cada ocasião e dependendo da situação
lhe é atribuído um novo nome ou epíteto. Entretanto, nem sempre é
possível ter uma compreensão clara do nome e ao que ele está se
referindo. O que reflete a dificuldade de interpretação para
possíveis traduções.
Ao longo do Hávamál – onde no título temos um exemplo
de um de seus nomes (Hávamál: “Os Dizeres de Hár/Hávi”) – Odin
também é chamado por sete nomes diferentes: além de Odin e de
Hár/Hávi (“o Altivo”, “Aquele que está no alto”), ele também é
chamado de Bolverk (“o Perpetrador”, “Aquele que faz o Mal”),
Hroptr (“o Sábio”), Thundr (“Trovejante”), Hroptatyr (“o Sábio”
ou ainda “o Sábio Tyr”) e Fimbulthul (“o Poderoso Sábio”).
Para maiores detalhes sobre a profusão de nomes e a
presença do deus nesta cultura literária norte-européia, além dos
nomes que podem ser encontrados na Edda Poética, na Edda em
Prosa de Snorri Sturluson e sua Heimskringla, nas sagas islandesas
e demais fontes do período, um excelente referencial teórico
especifíco sobre esse tema é a obra de Hjalmar Falk, Odensheite,
Kristiania: Jacob Dybwad, 1924.
IV. Sobre as atuais traduções do Hávamál e os
poemas rúnicos

O Hávamál é um dos grandes textos da literatura norte-


europeia medieval e que acabou por ganhar uma grande produção
de pesquisas e críticas desde a descoberta do Codex Regius. Nas
últimas décadas, com a maior facilidade de acesso a tais fontes,
cada vez mais trabalhos vêm proliferando em outros idiomas além
do inglês e das línguas escandinavas, como é o caso do português.
Apesar disso, esses novos trabalhos ainda continuam muito
atrelados às traduções realizadas entre os séculos XIX e XX. No
caso do Brasil, majoritariamente às obras em inglês. Assim o
leitor/pesquisador acaba muitas vezes dependente quase que
exclusivamente das interpretações e da escrita de um dado tradutor,
além de seu domínio pessoal da língua inglesa. E é aí que está a
importância de novas traduções que contribuam com novas
interpretações que possibilitem um maior acesso do leitor ao texto
original.
Contudo, traduções do Hávamál para o português não são
necessariamente uma novidade. Assim como em outras regiões do
globo, o poema foi apropriado por nossa contemporaneidade por
diversas pessoas e grupos para os mais diferentes propósitos,[35]
extrapolando o ambiente do mundo acadêmico. Basta uma rápida
consulta à internet para encontrarmos dúzias de sites com versões
do poema vertidos ao nosso idioma. Todas ou quase todas feitas a
partir de obras inglesas ou norte-americanas, como as já
consagradas de Lee M. Hollander e Carolyne Larrington.
Traduções essas feitas para o português sem um cuidado crítico de
seu conteúdo e sem um maior rigor no tratamento do documento,
visando apenas à divulgação da obra segundo propósitos
particulares de seus idealizadores. Tornando-as assim traduções de
“segunda-mão”, contendo – não raro os casos – equívocos
(linguísticos e contextuais) e deturpações do texto original.
A presente tradução que o leitor aqui encontra surge como
uma forma de suprir uma carência de fontes do gênero em nosso
país. Sendo esta nossa tradução integral do texto do Hávamál a
primeira a ser concebida em língua portuguesa a partir do original
em nórdico antigo, acompanhada da transcrição do mesmo e
principalmente de comentários críticos e explicativos.
Todo ato de tradução é uma tarefa complexa. Nenhuma
tradução, por melhor que seja estará a salvo de críticas e equívocos.
Na atual tradução do Hávamál tentamos atingir um meio termo
entre o texto original e a língua portuguesa. Evitando realizar uma
tradução extremamente literal, o que viria a descaracterizar o texto
ao vertê-lo para o português, tornando-o confuso e de difícil leitura.
Ao mesmo tempo tentamos mantê-lo o mais próximo possível de
seu conteúdo em nórdico antigo, evitando adaptações e arcaísmos
desnecessários e/ou excessivos, o que tornaria o texto uma
reelaboração (ou até mesmo uma paráfrase) do texto original e não
uma tradução.
O Hávamál está longe de ser um texto simples de se
compreender e especialmente traduzir. Devido a seu conteúdo –
com seus aforismos enigmáticos e nem sempre de fácil elucidação
e indícios de trechos corrompidos ou fragmentários – muito da
interpretação do texto se torna subjetiva. O que pode ser visto pelas
diversas interpretações que uma mesma estrofe pode apresentar
para diferentes tradutores, como veremos ao longo dos comentários
de nossa tradução. Nesse sentido, podemos até estabelecer um
paralelo moderno com o Finnegans Wake de James Joyce, que
devido seu contéudo complexo, também possui a característica de
gerar interpretações diversas para cada leitor e a partir do qual uma
tradução corre o grande risco de descaracterizar completamente o
sentido primordial do texto. Levando ao surgimento de algo
completamente diferente da obra original. Incorrendo no perigo de
não se tornar numa transposição semântica do texto para outro
idioma, mas uma mera sombra do que é a obra de fato.
Nem por isso a tarefa de traduzir deve ser repudiada em
prol de uma exaltação exclusiva e monolítica do texto original.
Muito pelo contrário! Traduções, principalmente de textos
complexos e de valor histórico – como é o caso em questão – são
de suma importância tanto para o leigo quanto (e podemos dizer,
principalmente) para o pesquisador e estudioso sobre o tema.
Podemos dizer que traduções de textos como o Hávamál,
indiferentemente para qual idioma, possuem tanto valor quanto a
leitura dos originais. A diferença é a de que enquanto com os textos
originais temos o contato direto com as minúcias e a semântica
original da obra, com o pensamento da época, com as traduções
temos a possibilidade de observar como esses textos são
compreendidos pelo leitor moderno. Com as traduções temos a
chance de acompanhar a interpretação da obra através de escolhas
de palavras, reconstruções de frases e conceitos elaborados por
outros pesquisadores. Em suma, por meio de traduções (no plural,
pois para o estudioso quanto mais traduções ele tiver contato
melhor) podemos ter uma visão mais aprofundada de tais obras
através de diferentes pontos de vistas de diferentes tradutores,
possibilitando o confronto e o debate interpretativo e assim
tirarmos nossas próprias conclusões e interpretações a partir de
nossa própria leitura da obra original.
A leitura do texto em seu original em nórdico antigo é um
elemento fundamental para o pesquisador, enquanto as traduções
são sua ferramenta inicial para o debate e a análise crítica. E claro,
para aqueles que estão tomando seu primeiro contato com a obra e
seu universo literário as traduções se tornam uma porta de entrada
imprescindível.
Como dissemos anteriormente, foi evitada uma tradução
excessivamente literal e alterações desnecessariamente do original.
Porém, foram necessárias algumas mudanças inevitáveis ao verter
o texto para a língua portuguesa. Primeiramente, de forma alguma
tentamos reproduzir a métrica e o estilo poético do nórdico antigo,
e quando essa aconteceu foi por mero acaso[36]. Visto que a
prioridade sempre foi reproduzir o conteúdo semântico da obra.
Para tanto, em alguns momentos foi necessário alterar a ordem de
alguns versos e palavras – e até mesmo a inserção de novas
palavras – para uma melhor compreensão do texto. Em nossa
tradução, contudo, quando isso ocorre há uma observação
indicando o fato.
Nomes próprios foram normatizados para o alfabeto latino.
Letras como ð, þ e ǫ foram transpostos como d, th e o. Assim,
Óðinn se tornou Odin, Gunnlǫð se tornou Gunnlod e Fimbulþulr se
tornou Fimbulthul. Outros nomes, que em nórdico antigo terminam
com o característico “r”, também foram adaptados (seguindo
principalmente as normatizações das traduções feitas para o inglês
moderno): Suttungr tornou-se Suttung, por exemplo.
O texto do Hávamál em nórdico antigo que acompanha
nossa tradução possui como principal referencial as transcrições
das obras de Guðni Jónsson, Eddukvæði: Sæmundar-Edda,
Reykjavík: Islendingasagnaútgáfan, 1956; e de David A. H. Evans,
Hávamál, Londres: Viking Society for Northern Research, 1986.
Uma das evidências documentais escritas mais antigas
contendo runas e suas denominações é justamente o Abecedarium
Nordmannicum, datado de por volta do século IX, contendo nomes
supostamente de origem nórdica. Por volta desta mesma época, o
alfabeto rúnico escandinavo já teria diminuído de vinte e quatro
caracteres para apenas dezesseis; i.e., já havia ocorrido ou estava
ocorrendo a mudança do Antigo Futhark para o Jovem Futhark. Por
sua vez, o manuscrito onde se encontra o Poema Rúnico Anglo-
Saxão pode ser datado como sendo de finais do século X, mas as
evidências mais antigas envolvendo o alfabeto Futhorc se
encontram no Continente e datam de fins do século VIII e início do
IX. Enquanto o Poema Rúnico Norueguês e o Poema Rúnico
Islandês podem ser datados – não com muita precisão – como
sendo respectivamente de finais do século XII e início do XIII e o
último do século XV.
Para esta nossa tradução atual dos poemas, além da
tradução em si, incluímos também as runas (do Jovem Futhark) que
representam os nomes citados, como uma forma de ilustrar e
facilitar a leitura e visualização do texto para o leitor. No caso dos
Poemas Rúnicos Norueguês e Islandês, a identificação de cada
runa e os versos correspondentes foi baseada nas descrições de Ole
Worms, devido as diversas variantes do Jovem Futhark; que,
dependendo do tipo, período e região da Escandinávia, pode
apresentar diferenças (BARNES, 2012: 60).
A respeito do Poema Rúnico Anglo-Saxão, a tradução
mais célebre – não exatamente por sua precisão, mas por sua
originalidade na época – é a de John Kemble, publicada em seu
ensaio “On Anglo-Saxon Runes” em 1840 no periódico
Archaeologia. Outra tradução digna de nota é de Bruce Dickins em
seu livro Runic and Heroic Poems of the Old Teutonic People de
1915. Nesta obra de Dickins se encontra não apenas a tradução do
Poema Rúnico Anglo-Saxão para o inglês moderno, mas também
dos Poema Rúnico Norueguês e do Islandês. Apesar disso, é
necessário cautela. Especificamente sobre o poema anglo-saxão, a
tradução e as interpretações de Dickins estão – como já era de se
esperar – ultrapassadas. Mas o ponto mais grave é que trechos da
tradução em si estão “errados”. Existem inserções de palavras e de
trechos na tradução de Dickins para o inglês moderno que não
existem no original em inglês antigo. Sendo tais inserções não uma
adaptação ou adequação para facilitar a leitura do público leigo,
mas interpretações equivocadas do autor sobre o significado do
texto (sendo que em sua maior parte, tais “adaptações” são
apresentadas no texto sem maiores explicações nem explicitando a
fonte da informação ali presente; o que nos leva a supor que sejam
conjecturas do próprio Dickins). Portanto, apenas reforçando o que
já mencionamos, é necessário cuidado ao se utilizar a edição de
Bruce Dickins para o estudo de tais obras nos dias de hoje[37].
A transcrição do original do Poema Rúnico Anglo-Saxão
presente nesse artigo foi baseada nas edições de John Kemble
(KEMBLE, 1991), Lars Magnar Enoksen (ENOKSEN, 2011) e
Stephen Pollington (POLLINGTON, 1995). A transcrição do
original do Poema Rúnico Islandês foi baseada em dois dos
principais manuscritos existentes da obra, mas especialmente no
manuscrito MS. 687 (o mais completo e maior) e, como referencial,
nas transcrições de R. I. Page (PAGE, 1999) e Stephen Pollington
(POLLINGTON, 1995). Por sua vez, a transcrição do original do
Poema Rúnico Norueguês é baseada em Ole Worm e também nas
edições de Lars Magnar Enoksen (ENOKSEN, 2011), Stephen
Pollington (POLLINGTON, 1995) e Bruce Dickins (DICKINS,
1915). E a transcrição do original do Abedecedarim
Nordmannicum baseada na transcrição de Bruce Dickins
(DICKINS, 1915) e Stephen Pollington (POLLINGTON, 1995).
Assim como em outras traduções de fontes do medievo
norte-europeu, a partir de seus originais, realizadas por nós
anteriormente, tentamos manter o equilíbrio entre uma tradução que
não fosse excessivamente literal e nem uma que deturpasse a
semântica original do texto. Evitando alterações e adaptações
desnecessárias, se limitando a fazê-las quando fosse realmente
necessária para a inteligibilidade de seu conteúdo em português.
Uma sugestão de leitura dos poemas rúnicos, explicitada por Lars
Magnar Enocksen em seu livro (ENOKSEN, 2011: 22) ao falar
sobre os versos rúnicos presentes na obra de Johannes Bureus, seria
de que a verdadeira compreensão do significado ou a simbologia que
uma runa específica possui estaria diretamente ligada ao “enigma”
expresso nos versos que lhe são atribuídos.
Nesse sentido, poderíamos estabelecer um paralelo – ainda
que não tão concreto – entre a estrutura dos poemas rúnicos e o
estilo japonês da poesia haiku. Especificamente no que diz respeito a
seu formato: versos curtos, sucintos, de cunho sapiencial e cujo
significado exige maior reflexão para a verdadeira compreensão do
assunto tratado. Ao mesmo tempo, também aproxima os versos dos
poemas rúnicos – aqui numa hipótese bem mais familiar ao período
e espaço geográfico da região – com a tradição de adivinhações e
charadas da poesia anglo-saxônica. Por exemplo, a inscrição que se
encontra no painel frontal da Franks Casket. Neste painel temos,
inscrito em runas, uma charada em versos aliterativos, cuja resposta
é a matéria prima da qual a caixa foi feita:
fisc flodu ahof on fergenberig
warþ ga:sic grorn þær he on greot giswom.
Hronæsban!

[“O mar ergueu o peixe até um monte


funerário rochoso;
o rei do terror ficou triste quando ele nadou
até a areia.
Osso de baleia!”.]
HÁVAMÁL
Stofnun Árna Magnússonar, ms. Codex Regius - GKS 2365 4to
a) Os ensinamentos de Odin[38]

Gáttir allar 1. Em todas as portas,


áðr gangi fram antes de entrar,
um skoðsk deve-se observar,
skyli deve-se procurar,
um skygnask pois é difícil
skyli saber
því at óvíst onde os inimigos
er at vita se sentam na habitação de
hvar óvinir antemão.
sitja á fleti fyri
Gefendr heilir 2. Saudações aos anfitriões!
gestr er inn Um convidado está vindo:
kominn onde ele deve procurar
hvar skal sitja para se sentar?
sjá? Muito em breve
Mjǫk er bráðr com a espada ele deve
sá er brǫndum testar sua coragem.[39]
skal
síns of freista
frama
Elds er þǫrf 3. O fogo é necessário
þeims inn er para aquele que vem
kominn com os joelhos gelados;
ok á kné kalinn de comida e roupas
matar ok váða o homem precisa,
es manni þǫrf aquele que viajou pela
þeims hefir um montanha.
fjall farit
Vats er þǫrf 4. Água é necessária
þeims til verðar para quem vêm em busca
kømr de descanso,
þerru ok (assim como) secar-se e
þjóðlaðar de boas-vindas;
góðs um œðis de boa disposição,
ef sér geta se ele puder obter,
mætti palavras e silêncio em
orðs ok retribuição.[40]
endrþǫgu

Vits er þǫrf 5. Inteligência é necessária


þeims viða para aquele que viaja
ratar longe,
dælt er heima pois tudo é fácil em casa;
hvat torna-se motivo de riso
at augabragði aquele que não sabe de
verðr nada
sá er ekki kann e senta-se entre os sábios.
ok með
snotrum sitr

At hyggjandi 6. De sua inteligência


sinni o homem não deve se
skylit maðr vangloriar,
hrœsinn vera mas ser cauteloso sobre os
heldr gætinn at pensamentos;
geði quando o sábio e
þá er horskr ok silencioso
þǫgull vem até uma habitação,
kømr raramente o mal recai
heimisgarða til sobre o cuidadoso,
sjaldan verðr pois melhor amigo
viti vǫrum nenhum homem
því at óbrigðra conseguirá
vin do que a grande
fær maðr sabedoria.
aldregi
en manvit mikit

Hinn vari gestr 7. O convidado esperado


er til verðar que vem em busca da
kømr refeição
þunnu hljóði mantém um cauteloso
þegir silêncio,
eyrum hlýðir ouve com os ouvidos,
en augum com os olhos observa;
skoðar assim todo homem sábio
svá nýsisk se porta frente ao perigo.
fróðra hverr
fyrir
Hinn er sæll 8. Dele é a sorte,
er sér of getr aquele que obtém para si
lof ok líknstafi mesmo
ódælla er við glória e palavras
þat agradáveis;
er maðr eiga isto é incerto de
skal encontrar:
annars brjóstum o que deve ter
í no peito de outro homem.
Sá er sæll 9. Ele é afortunado,
er sjalfr of á aquele que por si mesmo
lof ok vit possui
meðan lifir glória e sabedoria
því at ill rǫð enquanto vive;
hefr maðr opt pois maus conselhos
þegit frequentemente são
annars brjóstum recebidos
ór do peito de outro homem.

Byrði betri 10. Melhor fardo


berrat maðr homem nenhum carrega
brautu at no caminho
en sé manvit do que muito bom senso;
mikit melhor do que riqueza
auði betra isto lhe parece em um
þykkir þat í lugar que lhe é estranho,
ókunnum stað tal é o modo de ser do
slíkt er válaðs empobrecido.[41]
vera
Byrði betri 11. Melhor fardo
berrat maðr nenhum homem carrega
brautu at no caminho
en sé manvit do que muito bom senso;
mikit pior provisão
vegnest verra para ele levar pelo
vegra hann caminho
velli at é a bebedeira de cerveja.
an sé ofdrykkja
ǫls
Era svá gótt 12. Não é assim tão boa,
sem gótt kveða como dizem ser boa,
ǫl alda sonum a cerveja para os filhos
því at færa veit dos homens;
er fleira drekkr pois menos o homem sabe
síns til geðs – quanto mais ele bebe –
gumi de seus pensamentos.

Óminnishegri 13. Um pássaro chamado


heitir Esquecimento:[42]
sá er yfir ele paira sobre
ǫlðrum þrumir celebrações de cerveja,
hann stelr geði ele rouba os pensamentos
guma dos homens.
þess fugls Pelas penas desse pássaro
fjǫðrum eu fui preso
ek fjǫtraðr vask no lar de Gunnlod.[43]
í garði
Gunnlaðar
Ǫlr ek varð 14. Eu fiquei bêbado,
varð ofrǫlvi fiquei muito bêbado
at hins fróða junto com o sábio Fjalar;
[44]
Fjalars
því er ǫlðr bazt por isso que a melhor das
at aptr of bebedeiras
heimtir é aquela da qual
hverr sitt geð posteriormente
gumi todo homem recupera
seus pensamentos.
Þagalt ok 15. Silencioso e pensativo
hugalt deve ser o filho de um
skyli þjóðans líder
barn e ameaçador em batalha;
ok vígdjarft feliz e generoso
vera deve ser todo homem
glaðr ok reifr até o momento de sua
skyli gumna morte.
hverr
unz sínn bíðr
bana
Ósnjallr maðr 16. O homem tolo
hyggsk munu acredita que viverá para
ey lifa sempre
ef hann við víg se ele evitar a batalha;
varask mas a velhice não lhe dará
en elli gefr nenhuma paz,
honum engi ainda que as lanças o
frið poupem.
þótt honum
geirar gefi
Kópir afglapi 17. O tolo boceja
er til kynnis quando vai até os
kømr parentes,
þylsk hann ele resmunga ou então
umbeða þrumir fica em silêncio.
alt er senn Tudo acontece de uma
ef hann sylg um vez
getr se ele consegue bebida:
uppi er þá geð libertos estão os
guma pensamentos do homem.
[45]

Sá einn veit 18. Apenas ele sabe,


er víða ratar aquele que vagou por
ok hefr fjǫlð diversos lugares
um farit e tem viajado para longe,
hverju geði qual é o pensamento
stýrir gumna que impulsiona todo
hverr homem;
sá er vitandi er é inteligente aquele que
vits sabe disso.[46]

Haldit maðr á 19. Que o homem não segure


keri a caneca,[47]
drekki þó at beba o hidromel com
hófi mjǫð moderação,
mæli þarft eða fale de forma sensata ou
þegi fique em silêncio;
ókynnis þess por sua falta de gentileza
var þik engi nenhum homem irá
maðr criticá-lo
at þú gangir se você for buscar pela
snemma at sofa cama cedo.

Grǫðugr halr 20. O homem guloso,


nema geðs viti a não ser que tenha
etr sér aldrtrega sensatez,
opt fær hlœgis come para sua própria
er með tristeza;
horskum kømr frequentemente desperta
manni risos
heimskum magi quando vem entre homens
sábios:
a barriga do homem tolo.

Hjarðir þat vitu 21. O rebanho sabe


nær þær heim quando deve ir para casa,
skulu e assim parte do pasto;
ok ganga þá af mas o homem tolo
grasi nunca sabe
en ósviðr maðr o tamanho de seu
kann ævagi estômago.
síns um mál
maga
Vesall maðr 22. O homem desprezível
ok illa skapi e de temperamento ruim
hlær at ri de todas as coisas;
hvívetna ele desconhece
hitki hann veit aquilo que ele deveria
er hann vita saber:
þyrpti que ele não está isento de
at hann era falhas.
vamma vanr
Ósviðr maðr 23. O homem tolo
vakir um allar fica acordado à noite toda
nætr e pensando sobre todo
ok hyggr at tipo de coisa;
hvívetna então está cansado
þá er móðr quando a manhã vem,
er at morni tudo ainda são problemas
kømr como eram antes.
alt er vil sem
var
Ósnotr maðr 24. O homem tolo
hyggr sér alla acredita que todos são
vera amigos, os que riem com
viðhlæjendr ele;
vini ele não percebe,
hitki hann fiðr mesmo que eles lhe
þótt þeir um dirijam zombarias,
hann fár lesi quando ele se senta entre
ef hann með homens sábios.
snotrum sitr
Ósnotr maðr 25. O homem tolo
hyggr sér alla acredita que todos são
vera amigos, os que riem com
viðhlæjendr ele;
vini então ele percebe,
þá þat fiðr quando vai à assembleia,
er at þingi kømr que ele possui poucos
at hann á defensores.
formælendr fá
Ósnotr maðr 26. O homem tolo
þykkisk alt vita pensa que sabe de tudo
ef hann á sér í se ele se encontrar
vá veru encurralado;
hitki hann veit mas ele não sabe
hvat hann skal o que ele deve dizer em
við kveða resposta
ef hans freista se os homens o puserem à
firar prova.[48]

Ósnotr maðr 27. O homem tolo,


er með aldir quando vem entre os
kømr homens,
þat er bazt at é melhor que ele fique em
hann þegi silêncio.
engi þat veit Ninguém sabe
at hann ekki que ele nada sabe,
kann a não ser que ele fale
name hann demais;
mæli til mart o homem não sabe,
veita maðr ele que nada sabe,
hinn er vætki já que ele fala demais.
veit
þótt hann mæli
til mart
Fróðr sá 28. Ele parece sábio,
þykkisk aquele que sabe perguntar
er fregna kann e do mesmo modo
ok segja hit responder;
sama nada podem esconder,
eyvitu leyna os filhos dos homens,
megu ýta synir do que se passa entre os
því er gengr of homens.[49]
guma
Œrna mælir 29. Fala demais
sá er eva þegir aquele que nunca se cala.
staðlausu stafi Palavras infundadas.
hraðmælt tunga A língua tagarela,
nema haldendr a menos que tenha quem a
eigi controle,
opt sér ógótt frequentemente canta o
um gelr mal para si.

At augabragði 30. Um homem não


skala maðr deve zombar de outro[50]
anna hafa quando ele vem visitar
þótt til kynnis parentes;
komi muitos homens parecem
margr þá fróðr sábios,
þykkisk se ele não é questionado
ef hann freginn e se mantém em silêncio,
erat seco da viagem.[51]
ok nái hann
þurrfjallr þruma
Fróðr þykkisk 31. Parece sábio
sá er flótta tekr aquele que foge,
gestr at gest o convidado do convidado
hæðinn zombador;
veita gǫrla não sabe com certeza,
sá er of verði ele que zomba na
glissir refeição,
þótt hann með se ele fala alto em meio a
grǫmum glami inimigos.[52]

Gunnar margir 32. Muitos homens


erusk são muito amistosos entre
gagnhollir si,
en at virði mas ainda lutam na
vrekask refeição;
aldar róg embate entre os homens
þat mun æ vera sempre haverá:
órir gestr við convidado hostil contra
gest convidado.

Árliga verðar 33. O homem deve


skyli maðr opt frequentemente
fá fazer uma refeição cedo,
[53]
nema til kynnis
komi a não ser que venha
sitr ok snópir visitar parentes;
lætr sem senta-se e procura,
solginn sé olha como se estivesse
ok kann fregna faminto
at fá e consegue falar sobre
pouco.

Afhvart mikit 34. É um grande caminho


er til ills vinar tortuoso
þótt á brautu até um mau amigo,
búi apesar dele se encontrar
en til góðs no caminho;
vinar mas até um bom amigo
liggja conduz rotas diretas,
gagnvegir mesmo que ele esteja bem
þótt hann sé firr longe.[54]
farinn
Ganga skal 35. Deve ir,
skala gestr vera o convidado não deve
ey í einum stað ficar
ljúfr verðr leiðr sempre no mesmo lugar;
ef lengi sitr os queridos se tornam
annars fletjum detestáveis
á se permanecem por muito
tempo
no salão de outro.

Bú er betra 36. O lar é o melhor,


þótt lítit sé ainda que seja pequeno;
halr er heima cada homem é livre em
hverr casa;
þótt tvær geitr mesmo que possua duas
eigi ok cabras
taugreptan sal e um salão coberto de
þat er þó betra salgueiros,
an bœn isto ainda é melhor do que
mendigar.

Bú er betra 37. O lar é o melhor,


þótt lítit sé ainda que seja pequeno;
halr er heima cada homem é livre em
hverr casa;
blóðugt er é um coração que
hjarta sangra[55]
þeims biðja aquele que deve mendigar
skal comida para si em todas
sér í mál hvert as refeições.
matar
Vápnum sínum 38. De sua arma
skala maðr velli um homem em campo
á aberto não deve
feti ganga se afastar um passo;
framar porque não se pode ter
því at óvist er certeza
at vita quando, fora das estradas,
nær verðr á uma lança é necessária
vegum úti para o guerreiro.
geirs um þǫrf
guma
Fanka ek 39. Eu não encontrei um
mildan mann homem tão gentil
eða svá matar ou tão benevolente com
góðan comida
at værit þiggja que rejeitasse um
þegit presente,[56]
eða síns féar ou de seu dinheiro
svá gjǫflan tão desprendido
at leið sé laun que uma recompensa
ef þiggr fosse indesejada se a
conseguisse.

Féar síns 40. Com seu dinheiro,


er fengit hefir quando ele o ganha,
skylit maðr um homem não deve
þǫrf þola passar por necessidade;
opt sparir frequentemente poupa
leiðum para os inimigos
þats hefir o que pretendia para os
ljúfum hugat amigos;
mart gengr verr muito ocorre pior do que
en varir o esperado.

Vápnum ok 41. Com armas e roupas


váðum os amigos devem agradar
skulu vinir uns aos outros,
gleðjask as quais sejam mais
þat er á sjalfum adequadas para eles
sýnst mesmos. Aqueles que dão
viðr gefendr ok e os que recebem
endrgefendr são amigos por muito
erusk vinir tempo
lengst, se continuar ocorrendo
ef þat bíðr at tudo bem.
verða vel
Vin sínum 42. Para seu amigo
skal maðr vinr um homem deve ser um
vera amigo
ok gjalda gjǫf e retribuir um presente
við gjǫf com um presente.
hlátr við hlátri Um riso com um riso
skyli hǫlðar os homens devem se valer
taka e falsidade por uma
en lausung við mentira.
lygi
Vin sínum 43. Para seu amigo
skal maðr vinr um homem deve ser
vera amigo
þeim ok þess dele e de seu amigo;
vinr mas de seu inimigo
en óvinar síns nenhum homem deve
skyli engi maðr ser amigo do amigo.[57]
vinar vinr vera
Veiztu ef þú 44. Saiba, se você possui um
vin átt amigo
þanns þú vel no qual você realmente
trúir confia,
ok vill þú af e que você deseja ter algo
honum gótt de bom dele:
geta com ele você deve seus
geði skalt við pensamentos
þann compartilhar e trocar
blanda ok presentes,
gjǫfum skipta ir visita-lo com
fara at finna opt frequência.

Ef þú át annan 45. Se você tem outro


þanns þú illa no qual você não confia,
trúir mas você quer algo de
vildu af honum bom dele,
þó gótt geta você deve falar de forma
fagrt skalt við gentil com ele,
þann mæla mas pense de forma
en flátt hyggja enganosa
ok gjalda e conceda falsidade em
lausung við troca de mentira.
lygi
Þat er enn of 46. Há mais sobre aquele em
þann quem
er þú illa trúir você não confia
ok þér er grunr e de cujo temperamento
at hans geði você suspeita:
hlæja skaltu við você deve rir com ele
þeim e falar ao contrário de teu
ok um hug pensamento.
mæla Deve retribuir tais
glík skulu gjǫld presentes.
gjǫfum
Ungr var ek 47. Há muito tempo eu era
forðum jovem,
fór ek einn eu viajei sozinho,
saman então acabei me
þá varð ek villr perderndo no caminho:
vega me considerei rico
auðigr þóttumk quando eu encontrei
er ek annan outro,
fann o homem é o deleite do
maðr er manns homem.
gaman
Mildir frœknir 48. Generosos, valentes,
menn bazt lifa os homens vivem melhor,
sjaldan sút ala raramente cultivam a
en ósnjallr tristeza;
maðr mas o homem covarde
uggir hotvetna teme todo tipo de coisas,
sýtir æ gløggr o avarento sempre
við gjǫfum preocupa-se com
presentes.[58]
Váðir mínar 49. Minhas vestimentas
gaf ek velli at eu dei em um campo para
tveim dois homens de madeira;
[59]
trémǫnnum
rekkar þat acreditaram que eram
þóttusk guerreiros
er þeir ript quando eles tinham
hǫfðu roupas:
neiss er envergonhado é o homem
nøkkviðr halr nu.[60]

Hrørnar þǫll 50. O abeto definha,


sú er stendr aquele que se encontra no
þorpi á campo:[61]
hlýrat henni nem casca nem folhagem
bǫrkr né barr o protege.
svá er maðr Assim é o homem,
sá er mangi ann aquele que não é amado
hvat skal hann por ninguém:
lengi lifa? como ele poderia viver
por tanto tempo?

Eldi heitari 51. Mais quente que o fogo


brinn með entre maus amigos
illum vinum queima
friðr fimm a afeição por cinco dias;
daga, mas então se extingue
en þá sloknar quando o sexto vem
es hinn sétti e toda a amizade piora.[62]
kømr
ok versnar allr
vinskapr
Mikit eitt 52. Algo grandioso
skala manni não se deve dar a um
gefa homem
opt kaupir sér í que frequentemente se
lítlu lof obtém com pouca glória:
með hálfum com metade de um pão
hleifi e com um copo
ok með hǫllu inclinado[63]
keri eu consigo um camarada
fekk ek mér para mim.
félaga
Lítilla sanda 53. Pouca areia,
lítilla sæva pouco mar,
lítil eru geð poucas são as mentes dos
guma homens,
því at allir porque todos os homens
menn não são sábios de forma
urðut jafnspakir igual:
hálf er ǫld hvar todos os homens estão
divididos.[64]

Meðalsnotr 54. Moderadamente sábio


skyli manna todo homem deve ser,
hverr mas nunca muito sábio;
æva til snotr sé para aquelas pessoas
þeim er fyrða é mais prazeroso de se
fegrst at lifa viver
er vel mart vitu quando se sabe o
suficiente.[65]
Meðalsnotr 55. Moderadamente sábio
skyli manna todo homem deve ser,
hverr mas nunca muito sábio;
æva til snotr sé porque o coração do
því at snotrs homem sábio
manns hjarta está raramente contente,
verðr sjaldan se aquele que o possui é
glatt, completamente sábio.
ef sá er alsnotr
er á
Meðalsnotr 56. Moderadamente sábio
skyli manna todo homem deve ser,
hverr mas nunca muito sábio;
æva til snotr sé de seu destino
ørlǫg sín ninguém deve saber de
viti engi fyrir antemão,
þeim er sua mente fica livre de
sorgalausastr preocupação.
sefi
Brandr af 57. A lenha queima a partir
brandi da lenha,
brinn unz até que ela esteja
brunninn er queimada;
funi kveykisk a chama se acende a partir
af funa da chama;
maðr af manni o homem a partir do
verðr at máli homem
kuðr se torna sábio ao falar,[66]
en til dœlskr af mas muito tolo a partir da
dul estupidez.

Ár skal rísa 58. Deve levantar cedo,


sá er annars vill aquele que deseja ter de
fé eða fjǫr hafa outro
sjaldan as posses ou a vida;[67]
liggjandi úlfr raramente um lobo
lær um getr preguiçoso
né sofandi consegue comida
maðr sigr ou um homem
dorminhoco a vitória.

Ár skal rísa 59. Deve levantar cedo,


sá er á yrkendr aquele que possui poucos
fá trabalhadores
ok ganga síns e vai saber de seu
verka á vit trabalho;
mart um dvelr muito atrasado
þann er um está aquele que dorme
morgin sefr durante a manhã:
hálfr er auðr metade da riqueza está na
und hvǫtum iniciativa.

Þurra skíða 60. De tábuas secas


ok þakinna e de telhas para o telhado,
næfra disto o homem sabe a
þess kann maðr medida;
mjǫt e disto: de lenha
ok þess viðar o suficiente que dure
er vinnask megi ao tempo e à estação.
mál ok misseri
Þveginn ok 61. Banhado e alimentado
mettr o homem cavalga para a
ríði maðr þingi assembléia,
at apesar de seus trajes não
þótt hann sét serem muito bons;
væddr til vel de seus sapatos e calças
skúa ok bróka nenhum homem deve se
skammisk engi envergonhar,
maðr nem mesmo de seu
né hests in cavalo,
heldr mesmo que ele não tenha
þótt hann hafit um bom.
góðan
Snapir ok 62. Se estica e agarra
gnapir quando vem até o oceano,
er til sævar a águia ao antigo mar;
kømr assim é o homem
ǫrn á aldinn que vem em meio à
mar multidão
svá er maðr e possui poucos aliados.
er með mǫrgum
kømr
ok á
formælendr fá
Fregna ok segja 63. Perguntar e responder
skal fróðra todo sábio deve,
hverr se assim deseja ser
sá er vill chamado de sábio.
heitinn horskr Apenas um sabe,
einn vita outro não deve.
né annarr skal O povo sabe se existem
þjóð veit ef þrír três.[68]
ro
Ríki sitt 64. Seu poder
skyli ráðsnotra os sagazes devem
hverr í hófi manter, cada um deles,
hafa com prudência;
þá hann þat então ele descobre,
finnr quando vem entre os
er með bravos,
frœknum kømr que nenhum é o mais
at engi er einna astuto de todos.
hvatastr
Orða þeira 65. Por aquelas palavras[69]
er maðr ǫðrum que o homem disse para
segir outro
opt hann gjǫld frequentemente ele obtém
um getr pagamento.

Mikilsti 66. Muito cedo


snemma eu venho a muitos
kom ek í marga lugares,
staði mas muito tarde a alguns;
en til síð í suma a cerveja havia sido
ǫl var drukkit bebida,
sumt var ólagat às vezes não estava
sjaldan hittir pronta:
leiðr í lið o indesejável[70] raramente
acerta o momento.
Hér ok hvar 67. Aqui e lá
myndi mér me convidariam nos lares
heim of boðit se eu não precisasse de
ef þyrftak at comida nas refeições;
málungi mat ou dois presuntos
eða tvau lær estariam pendurados
hengi no lar de um amigo leal
at ins tryggva onde eu tivesse comido
vinar um.
þars ek hafða
eitt etit
Eldr er beztr 68. O fogo é melhor
með ýta sonum entre os filhos dos
ok sólar sýn homens
heilyndi sitt e a visão do sol;
ef maðr hafa sua saúde,
náir se o homem puder mantê-
án við lǫst at la,
lifa e uma vida sem mácula.

Erat maðr alls 69. Um homem não está


vesall totalmente infeliz,
þótt hann sé illa ainda que sua saúde seja
heill péssima;
sumr er af alguns são agraciados
sonum sæll com filhos,
sumr af alguns com parentes,
frændum alguns com muito
sumr af fé œrnu dinheiro,
sumr af verkum alguns com boas obras.
vel
Betra er lifðum 70. É melhor estar vivo
en sé ólifðum do que estar morto;[71]
ey getr kvikr kú o homem vivo sempre
eld sá ek upp consegue uma vaca.
brenna Eu vi o fogo queimar
auðgum manni perante o homem rico,
fyrir quando estava morto do
en úti var dauðr lado de fora da porta.[72]
fyr durum
Haltr ríðr hrossi 71. O aleijado cavalga o
hjǫrð rekr cavalo,
handarvanr o maneta conduz o
daufr vegr ok rebanho,
dugir o surdo luta e é útil;
blindr er betri é melhor ser cego
en brenndr sé do que ser cremado:
nýtr manngi um cadáver não pode ser
nás útil a ninguém.

Sonr er betri 72. É melhor um filho,


þótt sé síð of ainda que nasça
alinn tardiamente,
eptir genginn depois que um homem se
guma vai;
sjaldan pedras funerárias
bautarsteinar raramente
standa brautu se mantêm pelo caminho
nær a menos que o parente as
nema reisi niðr ergua para outro.
at nið
Tveir ro eins 73. Dois fazem guerra contra
herjar um:
tunga er hǫfuðs a língua é a destruidora da
bani cabeça;
er mér í heðin em cada manto eu
hvern espero por um punho.[73]
handar væni
Nótt verðr 74. Feliz durante a noite fica
feginn aquele que confia em suas
sá er nesti trúir provisões;
skammar ro curtas são as áreas de um
skips rár barco;
hverf er mutável é a noite de
haustgríma outono.
fjǫlð um viðrir Muitas são as mudanças
á fimm dǫgum do tempo
en meira á em cinco dias,
mánuði mas ainda mais em um
mês.

Veita hinn 75. Ele não sabe,


er vættki veit aquele que não sabe nada:
margr verðr af muitos se tornam tolos
aurum api através do dinheiro;
maðr er auðigr um homem é rico,
annarr óauðigr outro pobre:
skylit þann não deve se culpar por seu
vítka vár infortúnio.
Deyr fé 76. O gado morre,
deyja frændr parentes morrem,
deyr sjálfr it do mesmo modo eu
sama mesmo morrerei;
en orðstírr mas o renome
deyr aldregi nunca morre
hveim er sér daquele que obtém boa
góðan getr fama.

Deyr fé 77. O gado morre,


deyja frændr parentes morrem,
deyr sjálfr it do mesmo modo eu
sama mesmo morrerei;
ek veit einn eu sei de uma coisa
at aldri deyr que nunca morre:
dómr um a reputação de cada
dauðan hvern morto.

Fullar grindr 78. Os currais cheios


sá ek fyr dos filhos de Fitjung[74] eu
Fitjungs sonum vi,
nú bera þeir agora eles portam cajados
vánarvǫl de mendigo:
svá er auðr assim é a riqueza,
sem augabragð como o piscar de um
hann er valtastr olho;
vina ela é a mais falsa dos
amigos.
Ósnotr maðr 79. O homem tolo,
ef eignask getr se consegue obter
fé eða fljóðs dinheiro ou o amor de
munuð uma mulher,
metnaðr honum o orgulho cresce nele,
þróask mas nunca o bom senso;
en mannvit ele se deixa levar pela
aldregi arrogância.
fram gengr
hann drjúgt í
dul
Þat er þá reynt 80. Assim está comprovado
er þú at rúnum que você, ao consultar as
spyrr runas
inum – de origem divina,[75]
reginkunnum aquelas que os deuses
þeim er gerðu fizeram
ginnregin e que foram pintadas por
ok fáði Fimbulthul[76] –
fimbulþulr que é melhor fazê-lo se
þá hefir hann estiver em silêncio.[77]
bazt ef hann
þegir
At kveldi skal 81. O dia deve ser louvado ao
dag leyfa anoitecer,
konu er brennd a esposa quando ela é
er cremada,
mæki er reyndr a espada quando é testada,
er a donzela quando ela é
mey er gefin er entregue (em casamento)
ís er yfir kømr o gelo quando veio sobre
ǫl er drukkit er (ele),
a cerveja quando é
bebida.

Í vindi skal við 82. A madeira deve ser


hǫggva cortada ao vento;
veðri á sjó róa deve-se remar pelo mar
myrkri við man com tempo bom,
spjalla e falar com damas no
mǫrg eru dags escuro
augu – muitos são os olhos do
á skip skal dia.
skriðar orka Um barco deve ser usado
en á skjǫld til para navegar,
hlífar um escudo para proteger,
mæki hǫggs uma espada para golpear
en mey til e uma dama para beijar.
kossa
Við eld skal ǫl 83. Junto ao fogo a cerveja
drekka deve ser bebida,
en á ísi skríða deve-se deslizar sobre o
magran mar gelo,
kaupa comprar um cavalo magro
en mæki e uma espada suja,[78]
saurgan engorde o cavalo em casa
heima hest feita e a um cão na fazenda.
en hund á búi
Meyjar orðum 84. Nas palavras de uma
skyli manngi donzela
trúa ninguém deve confiar;
né því er kveðr nem no que uma mulher
kona diz,
því at á pois num torno de
hverfanda hvéli oleiro[79]
váru þeim seus corações foram
hjǫrtu skǫpuð moldados
brigð í brjóst de natureza volúvel
um lagit dentro de seus peitos.

Brestanda boga 85. Um arco que range,


brennanda loga uma chama que queima,
gínanda úlfi um lobo que uiva,
galandi kráku um corvo que grasna,
rýtanda svíni uma porco que grunhe,
rótlausum viði uma árvore sem raízes,
vaxanda vági as ondas que se erguem,
vellanda katli a chaleira que ferve,

fljúganda fleini 86. uma lança que voa,


fallandi báru uma onda que cai,
ísi einnættum o gelo de uma noite,
ormi uma serpente enrolada,
hringlegnum a conversa da esposa na
brúðar cama
beðmálum ou a espada quebrada,
eða brotnu o competir dos ursos
sverði ou o filho de um rei,
bjarnar leiki
eða barni
konungs
sjúkum kálfi 87. um bezerro doente,
sjálfráða þræli um escravo com vontade
vǫlu vilmæli própria,
val nýfeldum o bom augúrio de uma
profetisa,
aquele que acabou de ser
morto,

akri ársánum 88. um campo recém


trúi engi maðr semeado,
né til snemma nenhum homem confia
syni tão prematuramente em
veðr ræðr akri seu filho;
en vit syni o tempo governa o campo
hætt er þeira e o raciocínio do filho;
hvárt cada um desses é
perigoso.

Bróðurbana 89. No assassino de seu


sínum irmão,
þótt á brautu ainda que o encontre pela
mœti estrada;
húsi hálfbrunnu numa casa parcialmente
hesti alskjótum queimada,
þá er jór ónýtr em um cavalo veloz
ef einn fótr – um cavalo é inútil
brotnar se ele quebra uma pata –
verðit maðr svá um homem não é tão
tryggr crédulo
at þessu trúi a confiar em tudo isso.
ǫllu
Svá er friðr 90. Tal é o amor de uma
kvenna mulher
þeira er flátt que é de temperamento
hyggja traiçoeiro:
sem aki jó é como guiar um cavalo
óbryddum sem ferradura
á ísi hálum pelo gelo escorregadio,
teitum – intrépido de dois anos
tvévetrum e mal domado –
ok sé tamr illa ou numa ventania furiosa
eða í byr óðum um barco descontrolado
beiti stjórnlausu ou como o aleijado pegar
eða skyli haltr a rena no degelo.
henda
hrein í þáfjalli
Bert ek nú mæli 91. Agora eu falarei
því at ek bæði abertamente,
veit pois eu conheço ambos:
brigðr er karla volúvel são os corações
hugr konum dos homens pelas
mulheres;
þá vér fegrst quando nós falamos de
mælum forma mais gentil
er vér flást então nós pensamos de
hyggjum forma mais falsa.
þat tælir horska Isto engana a mente até da
hugi mais sábia.

Fagrt skal mæla 92. De forma agradável deve


ok fé bjóða falar
sá er vill fljóðs e oferecer presentes
ást fá aquele que deseja ganhar
líki leyfa o amor de uma mulher;
ins ljósa mans reverencie a aparência
sá fær er fríar da bela dama:
ganha aquele que a
cortejar.

Ástar firna 93. Nenhum homem


skyli engi maðr deve criticar o amor
annan aldregi de outro, nunca.[80]
opt fá á horskan Frequentemente captura o
er á heimskan sábio
ne fá quando não captura o
lostfagrir litir tolo:
uma belíssima aparência.

Eyvitar firna 94. De forma alguma


er maðr annan um homem deve criticar o
skal outro,
þess er um pelo que acontece com
margan gengr muitos homens;
guma
heimska ór do sábio um tolo
horskum faz dos filhos dos
gørir hǫlða homens:
sonu este é o poder do coração.
sá inn mátki
munr
Hugr einn þat 95. Apenas a mente sabe
veit o que está junto ao
er býr hjarta coração;
nær o homem está só consigo
einn er hann sér mesmo.
um sefa Não há pior enfermidade
øng er sótt verri para qualquer homem
hveim snotrum sábio
manni do que não estar satisfeito
en sér øngu at com nada.
uma
b) Odin e a filha de Billingr[81]

Þat ek þá reynda 96. Isto eu então experimentei


er ek í reyri sat quando eu sentei entre os juncos
ok vættak míns e esperei por meu amor;
munar corpo e alma
hold ok hjarta para mim era a sábia dama,
var mér in horska embora eu ainda não a tivesse.[82]
mær
þeygi ek hana at
heldr hefik
Billings mey 97. A filha de Billing,
ek fann beðjum á eu a encontrei na cama,
sólhvíta sofa branca como o sol, adormecida;
jarls ynði os prazeres de um nobre
þótti mér ekki vera não eram nada para mim,
nema við þat lík at a não ser que eu pudesse viver
lifa com aquele corpo.

Auk nær apni 98. “Assim durante a noite,


skaltu Óðinn koma Odin, deve vir,
ef þú vilt þér mæla se você quiser ganhar a dama para
man si;[83]
alt eru óskǫp tudo está perdido,
nema einir viti a não ser que apenas nós saibamos
slíkan lǫst saman de tal vergonha”.

Aptr ek hvarf 99. Eu então voltei


ok unna þóttumk e pensei no amor,
vísum vilja frá guiado pelo desejo;
hitt ek hugða eu então pensei
at ek hafa mynda que eu poderia ter
geð hennar alt ok todo seu coração e seu prazer.
gaman
Svá kom ek næst 100. Quando eu me aproximei
at in nýta var estavam os hábeis
vígdrótt ǫll um guerreiros todos despertos;
vakin com luzes incandescentes
með brennandum e pedaços de madeira erguidos,
ljósum assim estava marcado meu
ok bornum viði malfadado caminho.
svá var mér vílstígr
of vitaðr
Ok nær morni 101. E próximo da manhã,
er ek var enn um quando eu novamente retornei,
kominn os habitantes do salão estavam
þá var saldrótt um adormecidos.
sofin Então eu encontrei apenas o cão
grey eitt ek þá fann da boa mulher
innar góðu konu preso à sua cama.[84]
bundit beðjum á
Mǫrg er góð mær 102. Em muito uma boa donzela é,
ef gǫrva kannar se olhar com atenção,
hugbrigð við hali imprevisível em relação aos
þá ek þat reynda homens;
er it ráðspaka eu então aprendi isso
teygða ek á flærðir quando a sábia
fljóð mulher para a devassidão eu tentei
háðungar hverrar seduzir;
leitaði mér it horska todo desprezo
man sobre mim a engenhosa dama
ok hafða ek þess buscou trazer,
vættki vífs e eu nada consegui dessa mulher.

Heima glaðr gumi 103. O homem em casa, alegre


ok við gesti reifr e amistoso com os convidados
sviðr skal um sik deve ser, sagaz consigo,
vera de boa memória e fluente,
minnigr ok málugr se ele quiser estar bem instruído;
ef hann vill frequentemente ele deve falar de
margfróðr vera coisas boas.
opt skal góðs geta Será chamado de um grande tolo
fimbulfambi heitir aquele que não sabe falar de nada:
sá er fátt kann segja este é o caráter do estúpido.
þat er ósnotrs aðal
c) Odin e Gunnlod [85]
Inn aldna jǫtum ek 104. Eu busquei o velho gigante,
sótta e agora eu voltei novamente.
nú em ek aptr um Pouco consegui permanecendo lá
kominn calado.
fátt gat ek þegjandi Muitas palavras
þar eu usei em meu proveito
mǫrgum orðum no salão de Suttung.
mælta ek í minn
frama
í Suttungs sǫlum
Gunnlǫð mér um 105. Gunnlod me deu
gaf de beber de um precioso hidromel
gullnum stóli á em seu trono dourado;
drykk ins dýra uma má recompensa
mjaðar eu lhe dei mais tarde
ill iðgjǫld em troca de todo o seu coração,
lét ek hana eptir em troca de seu espírito
hafa amargurado.
síns ins heila hugar
síns ins svára sefa
Rata munn 106. A ponta da verruma[86]
létumk rúms um fá deixei que abrisse espaço
ok um grjót gnaga e perfurasse através da pedra;
yfir ok undir sobre e sob
stóðumk jǫtna vegir mim se encontrava o caminho dos
svá hætta ek hǫfði gigantes:
til assim arrisquei minha cabeça.
Vel keypts litar 107. Da boa aparência adquirida[87]
hefi ek vel notit eu fiz bom uso;
fás er fróðum vant pouco falta para o sábio,
því at Óðrerir pois assim Odrerir[88]
er nú upp kominn agora veio para
á alda vés jarðar o local sagrado do senhor dos
homens.[89]

Ifi er mér á 108. É-me pouco provável


at ek væra enn que eu pudesse ter saído de novo
kominn da corte do gigante
jǫtna gǫrðum ór se eu não tivesse utilizado de
ef ek Gunnlaðar ne Gunnlod,
nytak a boa mulher,
innar góðu konu sobre a qual deitei meu braço.
þeirar er lǫgðumk
arm yfir
Ins hindra dags 109. No dia seguinte
gengu hrímþursar os gigantes de gelo foram
Háva ráðs at fregna buscar pelo conselho de Hár
Háva hǫllu í no salão de Hár:
at Bǫlverki þeir eles perguntaram sobre Bolverk,
spurðu se ele havia retornado para junto
ef hann væri með dos deuses ou se Suttung o havia
bǫndum kominn sacrificado.[90]
eða hefði honum
Suttungr of sóit
Baugeið Óðinn 110. Sobre o anel sagrado Odin,
hygg ek at unnit creio eu, fez um juramento
hafi – quem poderia acreditar em sua
hvat skal hans palavra?
tryggðum trúa? Enganou Suttung,
Suttung svikinn então tomou sua bebida
hann lét sumbli frá e fez Gunnlod sofrer.
ok grœtta
Gunnlǫðu
d) Loddfáfnismál [91]
Mál er at þylja 111. É hora de cantar,
þular stóli á do trono do sábio[92]
Urðar brunni at na fonte de Urd![93]
sá ek ok þagðak Eu vi e fiquei em silêncio.
sá ek ok hugðak Eu vi e refleti.
hlýdda ek á manna Eu ouvi os dizeres dos homens.
mál Eu ouvi e aprendi sobre as runas.
of rúnar heyrða ek Não se calaram
dœma no salão de Hár,
né um ráðum þǫgþu dentro do salão de Hár,
Háva hǫllu at assim como ouvi dizer.
Háva hǫllu í
heyrða ek segja svá
Ráðumk þér 112. Eu lhe recomendo Loddfafnir,
Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr não se levante à noite,
nótt þú rísat a menos que você esteja de guarda
nema á njósn sér ou esteja procurando por um lugar
eða þú leitir þér lá fora para si.
innan út staðar
Ráðumk þér 113. Eu lhe recomendo Loddfafnir,
Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr com uma mulher versada em
fjǫlkunnigri konu magia
skalattu í faðmi você não deve dormir em seu
sofa abraço,
svá at hon lyki þik pois assim ela o aprisiona nos
liðum braços dela:

Hon svá gørir 114. Assim ela garantirá


at þú gáir eigi que você não dê importância
þings né þjóðans tanto ao discurso na assembleia
máls quanto ao do rei;
mat þú villat você não desejará comida
né mannskis gaman nem o prazer dos homens;
ferr þú sorgafullr at você irá entristecido dormir.
sofa
Ráðumk þér 115. Eu lhe recomendo Loddfafnir,
Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr a mulher de outro
annars konu você nunca seduza
teygðu þér aldregi como sua amante.
eyrarúnu at
Ráðumk þér 116. Eu lhe recomendo Loddfafnir,
Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr pela montanha ou fiorde,
á fjalli eða firði se for fazer uma viagem longa
ef þik fara tíðir esteja certo de que tenha comida o
fásktu at virði vel bastante.

Ráðumk þér 117. Eu lhe recomendo Loddfafnir,


Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr a um homem mau
illan mann nunca permita
láttu aldregi saber de teu infortúnio,
óhǫpp at þér vita pois de um homem mau
því at af illum você nunca obtém
manni uma boa recompensa por tua boa
fær þú aldregi vontade.
gjǫld ins góða
hugar
Ofarla bíta 118. Profundamente atingido
ek sá einum hal eu vi um homem,
orð illrar konu; pela palavra de uma mulher má;
fláráð tunga sua língua trapaceira
varð honum at foi a morte para ele,
fjǫrlagi e apesar da acusação ser falsa.
ok þeygi um sanna
sǫk
Ráðumk þér 119. Eu lhe recomendo Loddfafnir,
Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr saiba disso – se você tem um
veiztu ef þú vin átt amigo
þanns þú vel trúir em quem você realmente confia,
farðu at finna opt vá visita-lo frequentemente,
því at hrísi vex pois cresce arbustos
ok hávu grasi e grama alta
vegr er vættki trøðr no caminho que ninguém percorre.

Ráðumk þér 120. Eu lhe recomendo Loddfafnir,


Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr um bom homem
góðan mann encontre para si com palavras
teygðu þér at agradáveis
gamanrúnum e aprenda encantamentos de cura
ok nem líknargaldr enquanto viver.
meðan þú lifir

Ráðumk þér 121. Eu lhe recomendo Loddfafnir,


Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr com seu amigo
vin þínum nunca seja você
ver þú aldregi o primeiro a romper.
fyrri at flaumslitum A mágoa devora o coração
sorg etr hjarta se você não puder contar
ef þú segja ne náir a alguém todos os seus
einhverjum allan pensamentos.
hug
Ráðumk þér 122. Eu lhe recomendo Loddfafnir,
Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr trocar palavras
orðum skipta você nunca deve
þú skalt aldregi com um tolo estúpido:
við ósvinna apa
því at af illum 123. Pois de um homem mau
manni nunca se pode
mundu aldregi obter uma boa recompensa,
góðs laun um geta mas um homem bom
en góðr maðr pode fazê-lo
mun þik gørva querido exaltando-o.[94]
mega
líknfastan at lofi
Sifjum er þá 124. Confiança[95] é então trocada
blandat quando alguém pode dizer
hverr er segja ræðr para outro todos os seus
einum allan hug pensamentos.
alt er betra Tudo é melhor
en sé brigðum at do que ser enganado:
vera não é amigo de outro
era sá vinr ǫðrum aquele que diz apenas o que o
er vilt eitt segir outro quer.

Ráðumk þér 125. Eu lhe recomendo Loddfafnir,


Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr mesmo três palavras
þrimr orðum senna você não deve trocar com um
skalattu þér við homem inferior:
verra mann frequentemente o melhor é
opt inn betri bilar derrotado
þá er inn verri vegr quando o pior ataca.

Ráðumk þér 126. Eu lhe recomendo Loddfafnir,


Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr não seja sapateiro
skósmiðr þú verir nem armeiro,
né skeptismiðr a não ser para você mesmo;
nema þú sjálfum se o sapato é mal feito
þér sér ou a lança falhar,
skór er skapaðr illa então infortúnios reacaem sobre
eða skapt sé rangt você.
þá er þér bǫls beðit
Ráðumk þér 127. Eu lhe recomendo Loddfafnir,
Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr toda vez que você souber sobre o
hvars þú bǫl kannt mal
kveðu þat bǫlvi at fale sobre tais infortúnios[96]
ok gefat þínum e não dê paz a seus inimigos.
fjándum frið
Ráðumk þér 128. Eu lhe recomendo Loddfafnir,
Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr contente com o mal
illu feginn nunca fique,
verðu aldregi mas que você se satisfaça com o
en lát þér at góðu bem.
getit
Ráðumk þér 129. Eu lhe recomendo Loddfafnir,
Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr olhar para cima
upp líta você não deve em batalha
skalattu í orrostu – como tomados de terror
gjalti glíkir ficam os filhos dos homens–
verða gumna synir para que não lancem feitiços sobre
síðr þitt um heilli você.[97]
halir
Ráðumk þér 130. Eu lhe recomendo Loddfafnir,
Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr se você quiser a boa mulher
ef þú vilt þér góða atrair com uma conversa agradável
konu e se deleitar com ela,
kveðja at deve fazer uma bela promessa
gamanrúnum e se mantenha firme a ela;
ok fá fǫgnuð af ninguém se cansa do que é bom se
fǫgru skaltu heita o consegue.
ok láta fast vera
leiðisk manngi gott
ef getr
Ráðumk þér 131. Eu lhe recomendo Loddfafnir,
Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr eu ordeno que você seja cauteloso,
varan bið ek þik mas não tão cauteloso;
vera seja mais cauteloso com a cerveja
ok eigi ofvaran e com a mulher dos outros
ver þú við ǫl e com uma terceira coisa,
varastr que ladrões não o trapaceiem.
ok við annars konu
ok við þat it þriðja
at þjófar ne leiki
Ráðumk þér 132. Eu lhe recomendo Loddfafnir,
Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr com zombaria ou riso
at háði né hlátri nunca receba
hafðu aldregi nem um convidado nem um
gest né ganganda viajante.

Opt vitu ógǫrla 133. Às vezes não se sabe ao certo


þeir er sitja inni aqueles que se sentam primeiro no
fyrir interior (da casa),
hvers þeir ro kyns de quem são os parentes daqueles
er koma que chegam:
erat maðr svá góðr nenhum homem é tão bom
at galli ne fylgi que falhas não o acompanhem,
né svá illr at einugi nem tão mau que não sirva para
dugi nada.
Ráðumk þér 134. Eu lhe recomendo Loddfafnir,
Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr de um sábio grisalho
at hárum þul nunca ria.
hlæðu aldregi Frequentemente o que o homem
opt er gott þat er velho diz é bom,
gamlir kveða frequentemente de uma pele
opt ór skǫrpum enrugada
belg vêm palavras de sabedoria,
skilin orð koma aquela[98] que se dependura entre o
þeim er hangir með couro
hám e balança entre a pele curtida
ok skollir með e se move entre as entranhas.[99]
skrám
ok váfir með
vílmǫgum
Ráðumk þér 135. Eu lhe recomendo Loddfafnir,
Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr não insulte um convidado
gest þú ne geyja nem o expulse de seus portões;
né á grind hrekir trate o desafortunado bem.
get þú váluðum vel
Rammt er þat tré 136. Poderosa é aquela trava
er ríða skal que deve se mover
ǫllum at upploki para abrir para todos;
baug þú gef lhe dê um anel
eða þat biðja mun ou ele lembrará de orar
þér læs hvers á liðu para paralisar cada um de seus
membros.[100]

Ráðumk þér 137. Eu lhe recomendo Loddfafnir,


Loddfáfnir para seguir o conselho;
en þú ráð nemir você irá se beneficiar se você
njóta mundu ef þú segui-lo,
nemr o bem virá a você se você aceitá-
þér munu góð ef þú lo:
getr quando você bebe cerveja,
hvars þú ǫl drekkr busque para si a força da terra,
kjós þú þér jarðar pois a terra luta contra a cerveja,
megin e fogo contra doença,
því at jǫrð tekr við carvalho contra desinteria,
ǫlðri a espiga contra feitiçaria,
en eldr við sóttum sabugueiro contra conflito
eik við abbindi doméstico,[101]
ax við fjǫlkynngi para atos de ira deve invocar a lua,
hǫll við hýrógi pasto contra picadas,
heiptum skal mána e runas contra maldições;
kveðja a terra deve resistir contra o mar.
beiti við bitsóttum
en við bǫlvi rúnar
fold skal við flóð
taka
e) Rúnatal [102]
Veit ek at ek hekk 138. Eu sei que eu pendi
vindga meiði á numa árvore[103] balançada pelo
nætr allar níu vento
geiri undaðr por nove noites inteiras,
ok gefinn Óðni ferido por uma lança,
sjálfr sjálfum mér e dedicado a Odin,
á þeim meiði eu mesmo a mim mesmo;
er manngi veit naquela árvore
hvers hann af rótum que não sei
renn de onde suas raízes vêm.

Við hleifi mik 139. Eles não me consagraram com pão


sældu nem com qualquer chifre;[104]
né við hornigi eu contemplei lá embaixo,
nýsta ek niðr eu peguei as runas,
nam ek upp rúnar gritando as peguei
œpandi nam e de lá eu cai.
fell ek aptr þaðan
Fimbulljóð níu 140. Nove poderosas canções
nam ek af inum eu aprendi do famoso filho
frægja syni de Bolthor, o pai de Bestla,[105]
Bǫlþórs Bestlu e eu também bebi
fǫður do precioso hidromel,
ok ek drykk of gat servido de Odrerir.
ins dýra mjaðar
ausinn Óðreri
Þá nam ek frævask 141. Então eu comecei a entender
ok fróðr vera e fiquei sábio
ok vaxa ok vel e cresci e prosperei muito bem,
hafask minhas palavras a partir de
orð mér af orði palavras
orðs leitaði e palavras encontrei,
verk mér af verki minhas proezas a partir de proezas
verks leitaði e proezas encontrei.

Rúnar munt þú 142. Runas você pode encontrar


finna e letras auxiliadoras,
ok ráðna stafi letras muito poderosas,
mjǫk stóra stafi letras muito fortes,
mjǫk stinna stafi as quais o sábio poderoso[106]
er fáði fimbulþulr pintou
ok gørðu ginnregin e os deuses fizeram
ok reist Hroptr e que Hroptr[107] dos deuses
rǫgna gravou.

Óðinn með ásum 143. Odin entre os deuses,[108]


en fyr álfum Dáinn e Dainn diante dos elfos
ok Dvalinn e Dvalinn diante dos anões,
dvergum fyrir Asvid diante dos gigantes:
Ásviðr jǫtnum fyrir eu mesmo gravei algumas.
ek reist sjálfr sumar
Veiztu hvé rísta 144. Você sabe como deve gravar?[109]
skal? Você sabe como deve interpretar?
Veiztu hvé ráða Você sabe como deve pintar?
skal? Você sabe como deve testar[110]?
Veiztu hvé fá skal? Você sabe como deve invocar?
Veiztu hvé freista Você sabe como deve sacrificar?
skal? Você sabe como deve enviar?
Veiztu hvé biðja Você sabe como deve matar?
skal?
Veiztu hvé blóta
skal?
Veiztu hvé senda
skal?
Veiztu hvé sóa
skal?
Betra er óbeðit 145. Melhor não pedir
en sé ofblótit do que sacrificar em demasia,
ey sér til gildis gjǫf a dádiva sempre busca pelo
betra er ósent pagamento;
en sé ofsóit melhor não enviar
svá Þundr um reist do que desperdiçar em demasia.
fyr þjóða rǫk Assim Thundr[111] gravou
þar hann upp um antes da história dos povos;
reis de lá ele se ergueu
er hann aptr of kom e voltou de onde veio.[112]
f) Ljóðatal [113]
Ljóð ek þau kann 146. Eu conheço tais canções
er kannat þjóðans que esposa de rei não conhece
kona e nem os filho dos homens:
ok mannskis mǫgr a primeira se chama “Ajuda”,
hjálp heitir eitt e ela o ajudará
en þat þér hjálpa contra disputas e mágoas
mun e todo tipo de infortúnio.
við sǫkum ok
sorgum
ok sútum
gǫrvǫllum
Þat kann ek annat 147. Eu conheço uma segunda
er þurfu ýta synir da qual os filhos dos homens
þeir er vilja læknar precisam,
lifa aqueles que desejam viver como
curandeiros.

Þat kann ek it 148. Eu conheço uma terceira:


þriðja se uma grande necessidade recair
ef mér verðr þǫrf sobre mim
mikil de deter meu inimigo,
hapts við mína eu emboto as lâminas
heiptmǫgu de meu inimigo,
eggjar ek deyfi suas armas nem seus bastões irão
minna andskota ferir.
bítat þeim vápn né
velir
Þat kann ek it 149. Eu conheço uma quarta:
fjórða se o inimigo me impor
ef mér fyrðar bera grilhões em meus membros,
bǫnd at bóglimum então eu canto
svá ek gel e eu posso ir;
at ek ganga má as correntes se soltam de meus pés
sprettr mér af e os grilhões de minhas mãos.
fótum fjǫturr
en af hǫndum hapt
Þat kann ek it 150. Eu conheço uma quinta:
fimmta se eu vir atirada com malignidade
ef ek sé af fári uma lança passar em meio à hoste,
skotinn ela não voa tão forte
flein í fólki vaða que eu não possa pará-la,
flýgra hann svá se eu vir sinal dela.
stinnt
at ek stǫðvigak
ef ek hann sjónum
of sék
Þat kann ek it sétta 151. Eu conheço uma sexta:
ef mik særir þegn se um guerreiro me ferir
á rótum rams viðar com a raiz de uma árvore forte
ok þann hal e esse homem
er mik heipta kveðr proferir o mal a mim,
þann eta mein este devora o homem ao invés de
heldr en mik mim.[114]

Þat kann ek it 152. Eu conheço uma sétima:


sjaunda se eu vejo em chamas um altivo
ef ek sé hávan loga salão ao redor de meus
sal um sessmǫgum campanheiros de banco,
brennrat svá breitt ele não queima tão intenso
at ek honum que eu não possa apagá-lo
bjargigak quando eu posso cantar o
þann kann ek galdr encantamento.
at gala
Þat kann ek it átta 153. Eu conheço uma oitava:
er ǫllum er que para todos é
nytsamligt at nema útil em aprender;
hvars hatr vex onde quer que cresça o ódio
með hildings entre os filhos dos heróis
sonum eu posso logo apaziguá-lo.
þat má ek bœta
brátt
Þat kann ek it 154. Eu conheço uma nona:
níunda se me encontrar em dificuldade
ef mik nauðr um para salvar meu barco à deriva,
stendr eu acalmo o vento
at bjarga fari mínu nas ondas
á floti e aquieto todo o mar.
vind ek kyrri
vági á
ok svæfik allan sæ
Þat kann ek it 155. Eu conheço uma décima:
tíunda se eu vir bruxas[115]
ef ek sé túnriðir divertindo-se no céu,
leika lopti á eu então posso fazer
ek svá vinnk com que elas se percam
at þeir villir fara de suas formas originais
sinna heimhama e de seus próprios pensamentos.
sinna heimhuga
Þat kann ek it 156. Eu conheço uma décima primeira:
ellipta se eu dever para a batalha
ef ek skal til liderar amigos de longa data
orrostu eu canto sob o escudo
leiða langvini e eles vão vitoriosos;
undir randir ek gel seguros para a batalha,
en þeir með ríki salvos da batalha,
fara eles vêm salvos de qualquer lugar.
heilir hildar til
heilir hildi frá
koma þeir heilir
hvaðan
Þat kann ek it 157. Eu conheço uma décima segunda:
tólpta se eu vejo em cima de uma árvore
ef ek sé á tré uppi um cadáver enforcado balançando
váfa virgilná então eu gravo
svá ek ríst e pinto uma runa
ok í rúnum fák de modo que o homem se mova
at sá gengr gumi e fale comigo.[116]
ok mælir við mik
Þat kann ek it 158. Eu conheço uma décima terceira:
þrettánda se eu em um jovem guerreiro tiver
ef ek skal þegn aspergido água[117]
ungan ele não poderá cair;
verpa vatni á ainda que ele venha à batalha,
munat hann falla o homem não cairá frente as
þótt hann í fólk espadas.
komi
hnígra sá halr fyr
hjǫrum
Þat kann ek it 159. Eu conheço uma décima quarta:
fjórtánda se diante de uma tropa de homens
ef ek skal fyrða liði eu tiver
telja tíva fyrir de reconhecer os deuses,
ása ok álfa os aesires e os elfos,
ek kann allra skil eu posso distinguir todos;
fár kann ósnotr svá o tolo pouco sabe disso.

Þat kann ek it 160. Eu conheço uma décima quinta:


fimmtánda a qual Thjodreyrir[118] cantou,
er gól Þjóðreyrir o anão, diante das portas de
dvergr fyr Dellings Delling;[119]
durum ele cantou poder para os deuses,
afl gól hann ásum coragem para os elfos,
en álfum frama entendimento para Hroptatyr.[120]
hyggju Hroptatý
Þat kann ek it 161. Eu conheço uma décima sexta:
sextánda se de uma donzela astuta eu quiser
ef ek vil ins svinna ter todo o seu carinho e prazer
mans eu transformo os sentimentos
hafa geð alt ok da mulher de braços brancos,
gaman e eu mudo todos os seus
hugi ek hverfi pensamentos.
hvítarmri konu
ok sný ek hennar
ǫllum sefa
Þat kann ek it 162. Eu conheço uma décima sétima:
sjautjánda nunca irá me evitar
at mik mun seint a jovem donzela;
firrask esses encamentos
it manunga man você se lembrará, Loddfafnir;[121]
ljóða þessa que por longo tempo lhe faltaram,
mun þú Loddfáfnir uma vez que são bons para você se
lengi vanr vera você os tiver,
þó sé þér góð ef þú úteis se você os obtiver,
getr úteis se você os receber.
nýt ef þú nemr
þǫrf ef þú þiggr
Þat kann ek it 163. Eu conheço uma décima oitava:
átjánda a qual eu nunca ensino
er ek æva kennik para donzelas ou esposas de
mey né manns homens
konu – tudo é melhor
alt er betra quando apenas uma pessoa
er einn um kann entende;
þat fylgir ljóða ela pertence ao término dos
lokum encamentos –
nema þeiri einni a ninguém a não ser apenas
er mik armi verr àquela que está em meus braços
eða mín systir sé ou que é minha irmã.

Nú era Háva mál 164. Agora os dizeres de Har estão


kveðin Háva hǫllu ditos no salão de Har,
í muito úteis aos filhos dos homens,
allþǫrf ýta sonum inúteis aos filhos dos gigantes.
óþǫrf jǫtna sonum Saudações àquele que falou!
heill sá er kvað Saudações àquele que entende!
heill sá er kann Aproveite aquele que
njóti sá er nam compreendeu!
heilir þeirs hlýddu Saudações àqueles que ouviram!
POEMAS RÚNICOS
Poema Rúnico Anglo-Saxão
MS. Cotton Otho B.X.165
F [Feoh] byþ F [Riqueza][122] é
frofur fira um conforto para
gehwylcum; todos os homens;
sceal ðeah manna contudo cada
gehwylc miclun homem deve
hyt dælan gif he partilhá-la
wile for drihtne largamente, se ele
domes hleotan. deseja receber a
aprovação do
Senhor.
U [Ur] byþ U [O Auroque]
anmod ond [123] é feroz e de

oferhyrned, grandes chifres,


felafrecne deor, uma fera
feohteþ mid selvagem que luta
hornum com os seus
mære morstapa; chifres, grandioso
þæt is modig habitante dos
wuht. charcos; este é
um animal
valente!
Ð [Ðorn] byþ Ð [O Espinho]
ðearle scearp; [124] é

ðegna gehwylcum amargamente


anfeng ys yfyl, afiado; terrível
ungemetum reþe para todo
manna guerreiro ao
gehwelcum, ðe agarrá-lo,
him mid resteð. imensamente
feroz a todos os
homens que
descansam em
meio a ele.

O [Os] byþ O [Deus][125] é


ordfruma ælere fonte de toda
spræce, palavra falada, a
wisdomes wraþu base da sabedoria
ond witena frofur e conforto do
and eorla gehwam sábio e a benção
eadnys ond e o regozijo de
tohiht. todo nobre.

R [Rad] byþ on R [Cavalgar],


recyde rinca em casa, para
gehwylcum todo guerreiro é
sefte ond tranquilo, e
swiþhwæt, ðamðe grandioso para
sitteþ on ufan aquele sentado
meare em um poderoso
mægenheardum cavalo por sobre
ofer milpaþas. as estradas[126].

C [Cen] byþ C [A Tocha][127]


cwicera gehwam, é conhecida por
cuþ on fyre todos os seres
blac ond viventes por sua
beorhtlic, byrneþ chama pálida e
oftust brilhante; sempre
ðær hi æþelingas arde onde os
inne restaþ. príncipes
descansam[128].

G [Gyfu] gumena G
byþ gleng and [Generosidade]
herenys, [129] é para os

wraþu and homens honra e


wyrþscype and louvor, suporte e
wræcna gehwam dignidade; e
ar and ætwist, ðe auxílio e sustento
byþ oþra leas. para o
desafortunado
quando está
privado dela.

W [Wen] ne W [Alegria] [130]


bruceþ, ðe can não partilha
weana lyt aquele que
sares and sorge conhece um
and him sylfa pouco de tristeza
hæfþ e sofrimento; mas
blæd and blysse aquele que possui
and eac byrga prosperidade e
geniht. felicidade e
também uma
fortaleza
abastada.

H [Hægl] byþ H [O Granizo]


hwitust corna; [131] é o mais

hwyrft hit of branco dos grãos;


heofones lyfte, ele cai das alturas
wealcaþ hit do céu, atirado
windes scura; em rajadas pelo
weorþeþ hit to vento; e então ele
wætere syððan. se transforma em
água.

N [Nyd] byþ N [A
nearu on Necessidade][132]
breostan; é opressiva para o
weorþeþ hi ðeah peito; ainda
oft niþa bearnum assim, às vezes
to helpe and to ela se torna
hæle ge hwæþre, auxílio e salvação
gif hi his hlystaþ aos filhos dos
æror. homens se ela for
atendida com
antecedência.

I [Is] byþ ofer I [O Gelo] é


cealdunge metum extremamente
slidor, frio, muito
glisnaþ glæs escorregadio,
hluttur gimmum brilhante, claro
gelicust, como vidro,
flor forste ge como uma joia;
woruht, fæger um solo coberto
ansyne. pela geada,
agradável de ver.

G [Ger] byþ G [133] [O Ano] é


gumena hiht, ðon alegria dos
God læteþ, homens, quando
halig heofones Deus, o sagrado
cyning, hrusan Rei celeste,
syllan permite que o
beorhte bleda solo conceda
beornum ond excelentes frutos
ðearfum. aos nobres e aos
necessitados.

EO [Eoh] byþ EO [O Teixo][134]


utan unsmeþe é uma árvore de
treow, casca áspera,
heard hrusan fæst, fortemente presa
hyrde fyres, ao solo, apoiada
wyrtrumun por suas raízes,
underwreþyd, guardiã do fogo,
wyn on eþle. alegria no lar.

P [Peorð] byþ P [Peorth][135] é a


symble plega and comemoração
hlehter contínua e o riso
wlancum, ðar do valoroso; onde
wigan sittaþ os guerreiros se
on beor sele bliþe sentam no salão
æt somne. de cerveja,
alegremente
reunidos.

X [Eolhx] X [O Junco][136]
seccard hæfþ é muitas vezes
oftust on fenne encontrado no
wexeð on wature, brejo; cresce na
wundaþ grimme, água; provoca
blode breneð graves
beorna gehwylcne ferimentos,
ðe him ænigne manchando de
onfeng gedeð. sangue todo
guerreiro que
tenta pegá-lo.
S [Sigel] S [O Sol] é
semannum constante alegria
symble biþ on para os
hihte, marinheiros,
ðonn hi hine quando eles
feriaþ ofer viajam por sobre
fiscesbeþ, o banho dos
oþ hi brimhengest peixes[137],
bringeþ to lande. quando eles
trazem o cavalo
das ondas[138]
para a terra.

T [Tir] biþ tacna T [Tir][139] é um


sum, healdeð sinal guia,
trywa wel mantém a boa fé
wiþ æþelingas; a com os príncipes,
biþ on færylde está sempre em
ofer nihta genipu, seu caminho
næfre swiceþ. sobre as nuvens
da noite, nunca
falhando.

B [Beorc] byþ B [A Bétula] é


bleda leas, bereþ desprovida de
efne swa ðeah frutos, entretanto
tanas butan produz galhos
tudder, biþ on apesar da
telgum wlitig, (ausência) de
þeah on helme sementes; mesmo
hrysted fægere, assim,
geloden leafum, esplêndidos são
lyfte getenge. seus ramos,
belamente
decorando através
de sua copa,
adoravelmente
crescendo junto
às alturas.

E [Eh] byþ for E [O Cavalo] é


eorlum æþelinga felicidade para
wyn, nobres frente aos
hors hofum príncipes;
wlanc, ðær him valoroso em seus
hæleþ ymb cascos, quando
welege on sobre ele os
wicgum wrixlaþ heróis a cavalo
spræce trocam
and biþ unstyllum palavras[140]; e é
æfre frofur. sempre um
conforto ao
fatigado.

M [Man] byþ on M [O Homem] é


myrgþe his a alegria de seus
magan leof: entes queridos;
sceal þeah anra contudo, cada um
gehwylc oðrum deve faltar ao
swican, outro, pois a
forðum drihten vontade do
wyle dome sine Senhor decretou
þæt earme flæsc que a terra tome a
eorþan betæcan. carne efêmera.

L [Lagu] byþ L [O Oceano][141]


leodum langsum parece sem fim
geþuht, para as pessoas,
gif hi sculun se elas devem se
neþun on nacan aventurar em um
tealtum barco que
and hi sæ yþa chacoalha e as
swyþe bregaþ ondas do mar as
and se amedrontam e
brimhengest não controlam os
bridles ne gym. arreios do cavalo
das ondas.

ING [Ing] wæs ING [Ing][142] foi


ærest mid East- visto
Denum primeiramente
gesewen secgun, pelos homens
oþ he siððan est entre os
ofer wæg gewat; Dinamarqueses
wæn æfter ran; do leste, até que
ðus Heardingas ele então para o
ðone hæle oriente, sobre as
nemdun. ondas, rumou;
seguido de sua
carruagem.
Assim, os
Heardingas o
chamaram de
herói.

Œ[Eþel] byþ Œ [A Terra


oferleof Natal] é preciosa
æghwylcum men, para cada um dos
gif he mot ðær homens, se lá ele
rihtes and puder aproveitar
gerysena on do que é correto e
brucan on blode apropriado à
bleadum oftast. prosperidade
frequentemente
atrelada ao
sangue[143].

D [Dæg] byþ D [O Dia] é


drihtnes sond, enviado pelo
deore mannum, Senhor, querido
mære metodes pelos homens,
leoht, myrgþ and gloriosa luz do
tohiht Criador, alegria e
eadgum and esperança ao
earmum, eallum próspero e ao
brice. desafortunado,
útil a todos.

A [Ac] byþ on A [O Carvalho]


eorþan elda é o que na terra
bearnum alimenta com
flæsces fodor, carne[144]
fereþ gelome todos[145] os filhos
ofer ganotes bæþ; dos homens; às
garsecg fandaþ vezes viaja sobre
hwæþer ac hæbbe o banho dos
æþele treowe. pássaros[146], o
oceano testa o
carvalho a fim de
se manter a nobre
confiança (nele).

Æ [Æsc] biþ Æ [O Freixo] é


oferheah, eldum muito alto,
dyre querido por
stiþ on staþule, todos; fixo em
stede rihte hylt, sua base, o tronco
ðeah him feohtan se mantém firme
on firas monige. apesar dele ser
atacado por
muitos homens.

Y [Yr] byþ Y [Yr][147] é para


æþelinga and todo príncipe e
eorla gehwæs nobre alegria e
wyn and honra; em um
wyrþmynd, byþ cavalo, firme na
on wicge fæger, jornada, é um
fæstlic on belo utensílio de
færelde, batalha.
fyrdgeatewa sum.

IO [Io/Iar] byþ IO [Io/Iar][148] é


ea fixa and ðeah a um peixe de rio e
bruceþ mesmo assim ele
fodres on foldan, aproveita do
hafaþ fægerne alimento em
eard terra, possui uma
wætre beworpen, bela morada
ðær he wynnum cercada pela
leofaþ. água, onde ele
vive com alegria.

EAR [Ear] byþ EAR [A


egle eorla Sepultura][149] é
gehwylcun, maligna para
ðonn fæstlice todos os nobres,
flæsc onginneþ, quando a carne
hraw colian, rija do pálido
hrusan ceosan cadáver começa a
blac to gebeddan; esfriar,
bleda gedreosaþ, escolhendo a
wynna gewitaþ, terra como
wera geswicaþ. consorte; a
prosperidade
definha, a alegria
desaparece,
acordos se
desfazem.
Poema Rúnico Islandês
Stofnun Árna Magnússonar, MS. AM 687d 4º & MS. AM 486 12º
F [Fé] er frænda róg F [Riqueza] é
ok flæðar viti ok desavença entre
grafseiðs gata. parentes e o
sinal de maré e
o caminho da
serpente.

U [Úr] er skýja grátr U [Chuva] é o


ok skára þverrir ok pranto do céu e
hirðis hatr. a colheita não
feita e o ódio
do pastor.

Þ [Þurs] er kvenna Þ [Gigante] é o


kvǫl ok kletta ibúi ok tormento da
Varðrúnar verr. mulher e o
habitante no
penhasco e o
marido de
Vardrun[150].

O [Óss] er aldingautr O [Deus] é o


ok Ásgarðs jǫfurr, ok velho
Valhallar vísi. criador[151] e o
senhor de
Asgard e o
sábio do
Valhalla.

R [Reið] er sitjandi R [Cavalgar] é


sæla ok snúðig ferð o prazer do que
ok jórs erfiði. está sentado e a
jornada
tranquila e o
trabalho do
cavalo.

K [Kaun] er barna K [Ferida] é o


bǫl ok bardaga [fǫr] tormento da
ok holdfúa hús. criança e fruto
de embate e lar
da putrefação.

H [Hagall] er H [Granizo] é
kaldakorn ok o grão gelado e
krapadrífa ok snáka o caminho
sótt. imundo e a
enfermidade da
cobra.

N [Nauð] er þýjar þrá N


ok þungr kostr ok [Necessidade]
vássamlig verk. é a aflição do
servo e a
situação difícil
e o trabalho
árduo.

I [Íss] er árbǫrkr ok I [Gelo] é a


unnar þekja ok feigra casca do rio e
manna fár. teto das ondas e
o infortúnio[152]
do homem
condenado.

A [Ár] er gumna A [Ano][153] é a


góði ok gott sumar benesse dos
algróinn akr. homens e um
bom verão, o
campo bem
cultivado.

S [Sól] er skýja S [Sol] é o


skjǫldr ok skínandi escudo das
rǫðull ok ísa nuvens e um
aldrtregi. halo brilhante e
o destruidor do
gelo[154].

T [Týr] er einhendr T [Tyr] é o


áss ok ulfs leifar ok deus de uma
hofa hilmir. mão e a sobra
do lobo[155] e o
guardião dos
templos[156].

B [Bjarkan] er B [Bétula] é o
laugat lim ok lítit tré ramo com
ok ungsamligr viðr. folhagem e a
pequena árvore
e a madeira
jovial[157].

M [Maðr] er manns M [Homem] é


gaman ok moldar a alegria do
auki ok skipa homem[158] e o
skreytir. produto da terra
e o adorno do
barco.

L [Lǫgr] er vellanda L [Água][159] é


vatn ok viðr ketill ok a água
glǫmmunga grund. ondulante e a
grande caldeira
e o campo dos
peixes.

Y [Ýr] er bendr bogi Y [Arco] é um


ok brotgjarnt járn ok arco curvado e
fífu fárbauti. delicado
utensílio e
arremessador
de flechas[160].
Poema Rúnico Norueguês[161]
F [Fé] vældr frænda F [Riqueza] causa
róge; desavença de
føðesk ulfr í skóge. parentes; o lobo se
alimenta na
floresta.

U [Úr] er af illu U [Escória] é do


járne; ferro ruim; às
opt løypr ræinn á vezes a rena corre
hjarne. sobre a neve
congelada.

Þ [Þurs] vældr Þ [Gigante] causa


kvinna kvillu; tormento à
kátr værðr fár af mulher; poucos
illu. são felizes com o
infortúnio.
O [Óss] er flæstra O [Estuário[162]] é
færða o caminho de
fǫr; en skalpr er várias jornadas;
sværða. mas para espadas
é a bainha.
R [Ræið] kveða R [Cavalgar] diz
rossom væsta; ser o pior para os
Reginn sló sværðet cavalos; Regin
bæzta. forjou as melhores
espadas.[163]
K [Kaun] er barna K [Ferida] é o
bǫlvan; tormento da
bǫl gørver nán criança; a morte
fǫlvan. torna o corpo
pálido.
H [Hagall] er H [Granizo] é o
kaldastr korna; mais gelado dos
Kristr skóp grãos; Cristo
hæimenn forna. moldou o mundo
no passado.[164]
N [Nauðr] gerer N [Necessidade]
næppa koste; oferecesse poucas
nøktan kælr í froste. oportunidades;
aquele que está nu
congela no frio.
I [Ís] kǫllum brú I [Gelo] se chama
bræiða; uma ponte larga; o
blindan þarf at cego precisa ser
læiða. guiado.
A [Ár] er gumna A [Ano] é a
góðe; benesse dos
get ek at ǫrr var homens; eu soube
Fróðe. que Frodi era
generoso.
S [Sól] er landa S [Sol] é a luz das
ljóme; terras; eu me
lúti ek helgum curvo para o
dóme. sagrado
julgamento.
T [Týr] er æinendr T [Tyr] é o deus
ása; de uma mão; às
opt værðr smiðr vezes o ferreiro
blása. está malhando (o
ferro).
B [Bjarkan] er B [Bétula] é o
laufgrønstr líma; ramo com a
Loki bar flærða folhagem mais
tíma. verde; Loki tinha
sorte ao enganar.
M [Maðr] er M [Homem] é
moldar auki; produto da terra;
mikil er græip á poderosa é a garra
hauki. do falcão.

L [Lǫgr] er, fællr ór L [Água] é a


fjalle fonte que cai da
foss; en gull ero montanha; mas
nosser. ornamentos são do
ouro.
Y [Ýr] er Y [Teixo] é a
vetrgrønstr viða; madeira mais
vænt er, er brennr, verde do inverno;
at sviða. às vezes ela
crepita ao
queimar.
ABECEDARIUM NORDMANNICUM[165]
Codex Sangallensis 878, fol. 321
feu forman Feu
primeiro,
ur after Ur depois,

thuris thritten stabu Thuris a


terceira letra,
os is themo oboro Os é a
seguinte;
rat endos uuritan Rat escreva
no final.
chaon thanne cliuot Chaon então
separa;
hagal naut habet Hagal tem
necessidade
is ar sol de Is, Ar e
endi Sol;
tiu brica man Tiu, Brica e
endi midi Man no
meio,
lago the leohto a brilhante
Lago,

yr al bihabet Yr conclui
tudo.
Sobre o tradutor

Elton Oliveira Souza de Medeiros graduou-se em História


pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da
Universidade de São Paulo. Em 2006, defendeu dissertação de
mestrado a respeito do poema Beowulf e sua relação histórica e
literária com o mundo norte-europeu medieval. Em 2011, defendeu
sua tese de doutorado - na área de História Social, também na USP
-, voltada à análise da literatura religiosa anglo-saxônica e sua
importância para a sociedade da Inglaterra dos séculos IX-X. Entre
2013 e 2014 fez um estágio pós-doutoral de um ano na Faculdade
de Humanidades e Ciências Sociais da Universidade de
Winchester, na Inglaterra, com apoio da CAPES, e lá desenvolveu
um projeto de pesquisa sobre a produção intelectual e literária na
Alta Idade Média e suas implicações nas práticas de poder e
religiosidade para a concepção do ideal de realeza cristã na
Inglaterra anglo-saxônica.
Atualmente, continua a desenvolver estudos voltados ao
norte da Europa medieval e a dedicar-se à tradução de textos da
época para a língua portuguesa. Atua também em grupos de
pesquisa nacionais e internacionais como o BRATHAIR (Grupo de
Estudos Celtas e Germânicos), a ISSEME (International Society for
the Study of Early Medieval England), a SOCIETAS MAGICA
(Communication and Exchange Among Scholars on the Study of
Magic) e o INSULÆ (Grupo de Estudos sobre a Britânia, Irlanda e
as Ilhas do Arquipélago Norte na Antiguidade e Medievo).
Referências

Fontes
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(Acessado em 08/04/2013).
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Agora os dizeres de Har estão
ditos no salão de Har,
muito úteis aos filhos dos homens,
inúteis aos filhos dos gigantes.
Saudações àquele que falou!
Saudações àquele que entende!
Aproveite aquele que compreendeu!
Saudações àqueles que ouviram!

~ Hávamál §164
[1]Se referindo ao livro A Ilha do Tesouro de 1883, do escritor Robert Louis
Stevenson (autor também do aclamado O Médico e o Monstro, de 1886).
[2]TOLKIEN, J. R. R. The Legend of Sigurd and Gudrún. Londres:
HarperCollins, 2009, p. 3.
[3] A tecnologia “Bluetooth” foi assim chamada por seus criadores em
homenagem ao rei Harald Dente-Azul (i.e. “Bluetooth”) da Dinamarca por
volta de 958 – 986; que por sua vez era o avô de Cnut o Grande que veio a
ser rei da Inglaterra, Dinamarca, Noruega e de parte da Suécia no início do
século XI. O logotipo da tecnologia Bluetooth é a combinação das runas
Hagall (“H”) e Bjarkan (“B”) do alfabeto Jovem Futhark, como o utilizado
no poema rúnico islandês e norueguês apresentados aqui neste trabalho.
Como o nome indica, o Antigo Futhark precede cronologicamente o Jovem
Futhark, possuindo um total de vinte e quatro runas. Já o Jovem Futhark,
poderíamos dizer, seria uma simplificação do Antigo Futhark, possuindo
cerca de dezesseis runas (e diversas variantes ao longo do tempo e espaço
geográfico escandinavo). Para maiores informações ver BARNES, 2012.
[4]
Edda Antiga devido à antiga hipótese que o manuscrito seria anterior a
Edda de Snorri Sturluson, o que não é verdade.
[5]
Devido à outra antiga hipótese de que sua autoria seria do islandês
Sæmundr Sigfússon (c. 1056 – 1133).
[6] Um exemplo disso pode ser visto em sua primeira obra ficcional
publicada, O Hobbit, onde os nomes dos personagens anões da história são
derivados da Völuspá, como ele disse em uma carta de 1937: “I don’t much
aprove of The Hobbit myself, preferring my own mythology (which is just
touched on) with its consistente nomenclature... to this rabble of Eddaic-
named dwarves out of Völuspá, newfangled hobbits and gollums (invented in
an idle hour) and Anglo-Saxon runes” (cf. TOLKIEN, 2009, p. 4).
[7]Desde sua gênese, ambos os textos permaneceram desconhecidos do
grande público. Sendo citados brevemente pelo autor apenas a familiares e
em uma carta ao amigo W. H. Auden na década de 1960; e mais tarde
considerados perdidos pelo próprio Tolkien. Com a organização do espólio
do autor por seu filho, Christopher Tolkien, os dois poemas foram
recuperados e finalmente publicados no ano de 2009 em um único volume
sob o título The Legend of Sigurd and Gudrún pela editora HarperCollins (cf.
TOLKIEN, 2009).
[8] Segundo seu filho, Christopher, esse texto provavelmente teria sido
concebido como parte de uma apresentação a alguma conferência ou mesmo
parte das aulas de Tolkien (cf. TOLKIEN, 2009, p. 13-15).
[9] Cf. TOLKIEN, 2009, p. 22-23.
[10] O mesmo ocorre também com os textos poéticos anglo-saxônicos, como
Beowulf.
[11] Eyvindr Finnsson “Skáldaspillir”, poeta norueguês do século X, possui
entre as obras atribuídas à sua autoria os poemas Hákonarmál e Háleygjatal.
O Hákonarmál narra a morte e a chegada ao Valhalla do rei norueguês Hakon
o Bom (c. 920-961) – também conhecido como Aðalsteinfóstri (“filho
adotivo de Athelstan”) por ter sido criado na corte de Athelstan, rei da
Inglaterra (c. 893-934) – filho do rei Harald I da Noruega (c. 850-932) na
batalha de Fitjar. A obra narra sua morte e como ele é conduzido por valkírias
até a presença de Odin no Valhalla. A última estrofe do poema, onde
podemos encontrar a referência aos versos do Hávamál, diz: “Deyr fé, deyja
frændr, eyðisk land ok láð; síts Hákon fór með heiðin goð, mörg es þjóð of
þéuð [“O gado morre, parentes morrem, o campo e a terra estão devastados;
desde que Hakon se foi com os deuses pagãos, muitas pessoas estão
arrasadas”]; cf. JÓNSSON, 1929 (tradução nossa).
[12]EVANS, David A. H. (ed). Hávamál. Londres: Viking Society for
Northern Research, 1986, p. 22-23.
[13] Exemplos que serão tratados nos comentários ao longo da tradução.
[14]Para maiores detalhes e uma introdução quanto à versificação dos poemas
éddicos, e em particular do Hávamál, indicamos o artigo de Théo de Borba
Moosburger (cf. MOOSBURGER, Théo de Borba. “O verso aliterativo
nórdico antigo: duas traduções do Rúnatal (Hávamál 138-145)”. In-
Traduções, vol. 2, nº 3, 2010, p. 40-55). Para maiores detalhes a respeito das
particularidades das partes e das estrofes do Hávamál – sua organização,
edição e etc – recomendamos a obra de David A. H. Evans (cf. EVANS,
1986, p. 1-38) e Lee M. Hollander (cf. HOLLANDER, Lee M. The Poetic
Edda. Austin: University of Texas Press, 2000, p. 13).
[15]
Para maiores informações ver BOSWORTH & TOLLER, 1898;
CLEASBY & VIGFUSSON, 1874.
[16]Refletindo, por vezes, uma predisposição teleológica (tendenciosa) do
estudioso. Algo típico dos pesquisadores mais “românticos” do século XIX,
por exemplo.
[17] giruni (runas).
[18] A não ser quando indicado de outra forma, todas as traduções feitas a
partir de idiomas arcaicos (i.e. inglês antigo, saxão antigo, nórdico antigo e
etc.) são de nossa autoria.
[19] G. Ronald Murphy, entre outros, traduziu para o inglês moderno a palavra
giruni como “secret runes” (i.e. “runas secretas”), com a justificativa de que
o termo sugeriria uma ligação com práticas mágicas, encantamentos e
escritos mágicos que se utilizavam de runas e sua relação com a oração do
Pai Nosso, introduzida mais à frente na mesma obra (MURPHY, 1992: 3).
Como já dissemos ainda a pouco, tal relação entre runas e escritos e fórmulas
mágicas existe e há todo um campo de estudo a respeito. Assim como sua
relação e seu “sincretismo” com elementos da cristandade como o Pai Nosso
(cf. MEDEIROS, 2013b; MEDEIROS, 2015b). Contudo, no caso de Murphy,
esta visão é baseada numa abordagem de uma suposta “germanização do
cristianismo”. Ideia que pode ser considerada agora, em meados da primeira
metade do século XXI, datada e ultrapassada. Mas que ainda assim foi
brevemente resgatada no início dos anos 2000 por Murphy e outros, para ser
novamente rechaçada por pesquisadores como Dennis H. Green (cf. GREEN,
2003). E antes disso, R. I. Page falava das inconsistências desse tipo de
argumentação e sua relação com o uso mágico e religioso das runas no norte
europeu. Page alega que fora da Escandinávia – mesmo na Inglaterra – as
evidências de runas sendo usadas em ritos e encantamentos são
extremamente circunstanciais e examinadas muitas vezes de forma
inadequada. Tomando como referência fontes escandinavas e ignorando as
particularidades inerentes à região nórdica e seu contexto histórico e cultural
para analisar indícios no restante do Continente e nas Ilhas Britânicas, como
se houvesse um tipo de modelo pré-estabelecido “pan-norte-europeu” na
utilização das runas. Como Page alega, é possível que a magia rúnica de fato
tenha sido um fenômeno germânico, mas que sobreviveu apenas (de forma
mais evidente) na região nórdica; ou ainda, que tenha se desenvolvido apenas
no norte após uma maior definição das diferentes “tradições” rúnicas em
relação às demais do continente europeu (cf. PAGE, 1995: 106). Para termos
uma ideia mais clara, enquanto tanto em fontes escandinavas quanto anglo-
saxônicas pode-se facilmente encontrar sinais de práticas mágicas como o
galdr (nórdico antigo) e galdor (inglês antigo) que funcionam de forma
praticamente idêntica (MEDEIROS, 2013b: 250 – 251), o mesmo não ocorre
com o uso de runas para os mesmos propósitos. Sendo, na Inglaterra, seu uso
– apesar de em alguns casos se assemelharem muito com práticas mágicas –
muito mais atrelado à cultura literária anglo-saxônica (seja em manuscritos
ou inscrições) do que como parte de ritos e fórmulas encantatórias. Para uma
visão mais abrangente do cenário escandinavo de práticas mágicas (incluindo
as runas) ver RAUDVERE, 2002: 73 – 171; MITCHELL, 2011.
[20]Como, por exemplo, artefatos do norte da atual Alemanha que possuem
indícios do que poderiam ser elementos rúnicos ou mesmo romanos
(BARNES, 2012: 9).
[21]
Como por exemplo em regiões como Pietroassa na Romênia, Dahmsdorf
na Alemanha, e ainda Kowel na Ucrânia (SPURKLAND, 2005: 3).
[22]Para maiores informações quanto às origens, a forma e a fonologia da
runas, assim como as primeiras inscrições em antigo futhark, ver BARNES,
2012: 9 – 15; SPURKLAND, 2005: 3 – 53.
[23] Para maiores informações ver ENOKSEN, 2011.
[24]
O projeto da banda Wardruna, chamado Runaljöd, até o momento conta
com dois dos três álbuns idealizados: Gap var Ginnunga (2009) e Yggdrasil
(2013).
[25] “Wicca” diferentemente do que se pode pensar, é um substantivo
masculino oriundo do Inglês Antigo e significa “mago”, “feiticeiros” e
correlatos. Sendo sua forma feminina “wicce” ou “wiccena”; o que viria a dar
origem à palavra em inglês moderno “witch”.
[26] Para maiores informações ver DRURY, 2011: 175 – 203.
[27]
Para maiores informações ver DRURY, 2011: 43 – 224; ASPREM &
GRANHOLM, 2013: 25 – 48 e 72 – 90.
[28] STURLUSON, Snorri. Heimskringla or The Lives of the Norse Kings,
Nova York: Dover, 1990, p. 1 – 35. Ver também STURLUSON, Snorri.
Edda, Londres: Everyman, 1987, p. 1 – 5.
[29]
CLARKE, D. R. Martin (trad. org.). The Hávamál. Cambridge:
Cambridge University Press, 1923.
[30] FALK, Hjalmar. Odensheite. Kristiania: Jacob Dybwad, 1924.
[31]DAVIDSON, H. R. Ellis. The Road to Hel, Cambridge: Cambridge
University Press, 1943; DAVIDSON, H. R. Ellis. Gods and Myths of the
Northern Europe. Londres: Penguin, 1964.
[32]
TURVILLE-PETRE, E. O. G. Myth and Religion of the North. Londres:
Weindenfeld & Nicolson, 1964.
[33]DUMÉZIL, George. Du Mythe au Roman, Paris: Presses Universitaires
de France, 1970.
[34]
PRICE, Neil. Odin’s Whisper: Death and the Vikings, Londres: Reaktion
books, 2014.
[35]Dentre alguns exemplos podemos citar organizações de religiosidade
neopagã, grupos esotéricos, entusiastas de reconstituição histórica, fãs de
gêneros musicais como o “folk metal”, jogadores de Roleplaying Games
(RPG), entre muitos outros; até mesmo grupos de intolerância de inspiração
neonazista.
[36]Um ótimo exemplo de uma possibilidade de tradução do Hávamál
visando sua sonoridade poética e a estética do texto pode ser encontrada em
MOOSBURGER, 2010, p. 45-53.
[37]
A última tradução completa do Poema Rúnico Anglo-Saxão para o inglês
moderno é a de Maureen Hassal, The Old English Rune Poem: a Critical
Edition. Toronto: University of Toronto Press (1982); sem sombra de dúvida,
superior a de Bruce Dickins.
[38]Dividimos nossa tradução em seis partes, seguindo a tradição de estudos
sobre a obra, e acrescentamos a elas títulos (que não constam no texto
original) com a única intenção de servir como um referencial ao leitor.
[39]A primeira parte da estrofe não apresenta grandes problemas quanto a sua
interpretação, deixando clara a referência da saudação do convidado ou
viajante que chega à residência de outro buscando por abrigo. Contudo, a
segunda parte da estrofe não é clara e deixa margem para múltiplas
interpretações. Para maiores detalhes cf. EVANS, 1986, p. 75-77.
[40]A interpretação dessa estrofe é a de que um convidado necessita de
conversa, palavras (orðs), de seu anfitrião e então silêncio em retorno
(endrþǫgu) para que ele – o convidado – também possa falar. Cf. EVANS,
1986, p. 78.
[41] A interpretação dessa estrofe pode ser um pouco confusa, mas uma
interpretação possível é a de que para o homem desprovido de tudo e que se
encontra em um lugar que não conhece – que lhe é estranho – a melhor
riqueza que ele pode ter é o bom senso, uma vez que ele não sabe o que pode
vir a acontecer ou o que lhe espera.
[42] O pássaro a que a palavra óminnishegri estaria se refererindo seria a
garça. Este tipo de referência à garça e ao esquecimento e entorpecimento
aparece apenas neste trecho da literatura em nórdico antigo. Lee M.
Hollander sugere que isso poderia estar relacionado a um estado alterado de
consciência causado pelo consumo de penas de garça em práticas mágicas
(cf. HOLLANDER, 2000, p. 16). Outras interpretações variam desde o
formato das jarras usadas para se servir a cerveja (que lembrariam o formato
de uma garça), passando pela comparação do comportamento do pássaro ao
ficar inerte por muito tempo, até uma comparação com o fato de a garça
regurgitar alimento e aquele que bebe demais (cf. EVANS, 1986, p. 80). É
possível também que haja aqui apenas uma construção poética metafórica
relacionada não exatamente à figura da garça em si, mas apenas ao fato dela
ser um pássaro e assim poder voar sobre salões onde estejam ocorrendo
banquetes e festas, e por se chamar Esquecimento “roubaria” os pensamentos
daqueles que se embriagam.
[43]Esta é a primeira menção a Gunnlod no poema. Na mitologia ela é a filha
do gigante Suttung, que adquire o “hidromel da poesia” dos anões Fjallar e
Gjallar. Mais tarde, Odin consegue roubar o hidromel seduzindo Gunnlod.
Esta história será abordada nas estrofes 104 a 110. Maiores detalhes sobre a
história de Gunnlod, o hidromel da poesia e como Odin o obtém podem ser
encontrados no Skáldskaparmal na Edda em Prosa de Snorri Sturluson.
[44]Há o questionamento se aqui não existe uma confusão entre personagens
e na verdade ao se mencionar Fjallar o poema esteja de fato se referindo ao
gigante Suttung (cf. EVANS, 1986, p. 80-81; cf. HOLLANDER, 2000, p.
17).
[45] Com a bebida, mesmo o mais ranzinza ou introspecto se torna um
falastrão.
[46]Esta estrofe, especialmente o último verso (sá er vitandi er vits), é fonte
de divergências entre os tradutores quanto a seu verdadeiro significado. Entre
as possibilidades a mais consensual é a de que se trata de uma pessoa sábia
aquele já viajou o suficiente, pois sabe com conhecimento de causa o que
impulsiona os homens. Cf. EVANS, 1986, p. 82.
[47]Esta passagem também é controversa em seu significado. Não é claro
exatamente qual seria a verdadeira lição a ser passada. Uma das
possibilidades, oriundas de estudiosos do século XIX, seria de que o poema
estaria implicitamente dizendo para se abster da bebida ou beber com
moderação. Contudo, essa interpretação não faz sentido com o restante da
estrofe numa leitura mais detalhada. Outra interpretação seria a de que o
poema alerta para uma conduta educada de se servir, não segurar a caneca (ou
a jarra) de bebida por muito tempo e compartilhá-lha com os demais.
Partindo dessa suposição, pelo contexto geral de toda a estrofe a interpretação
poderia ser de que o individuo deve se servir de forma satisfatória – mesmo
sendo apenas uma “quantia moderada”, o que é melhor do que nada – da
bebida e então a compartilhar com os demais presentes. E não exatamente
uma lição de conduta para se beber pouco, como pode ser interpretado numa
primeira leitura. Isso (o fato de beber pouco ou nada) poderia ser visto, na
verdade, como uma má conduta de comportamento para com um anfitrião e
os demais presentes; chamada de drekka sleituliga ou við sleitur. Cf.
EVANS, 1986, p. 83-84.
[48]Essa estrofe, juntamente com a estrofe 79, pode encontar um paralelo
muito semelhante na Saga do Rei Hrolf Kraki (Hrólfs Saga) quando o pai de
Svipdag aconselha o filho quando este decide partir para a corte do rei Adils
da Suécia: “Não inveje outros e evite a arrogância, pois tais comportamentos
diminuem a fama da pessoa. Defenda-se caso seja atacado. Torne-se
humilde, mas ao mesmo tempo você deve se mostrar valente se for posto à
prova” (op. cit. BYOCK, 1998, p. 26; tradução nossa).
[49] Existem suspeitas de que as duas partes desta estrofe não estavam
originalmente unidas, fazendo com que não fique muito clara a linha de
raciocínio que as associa. Cf. EVANS, 1986, p. 86.
[50] Na tradução tivemos que romper com o texto original, mesclando o
primeiro e o segundo verso, visando uma leitura de mais fácil compreensão.
O mesmo ocorrerá em outras estrofes mais à frente – como foi explicitado na
introdução – quando for extritamente necessessário para a inteligibilidade da
estrofe.
[51] Exatamente o mesmo caso da estrofe 28.
[52] Acredita-se que esta estrofe esteja corrompida, o que torna sua
interpretação dúbia. Principalmente em relação à primeira parte. Nela, tanto
se pode interpretar que quem foje é o convidado que foi vítima da zombaria
(e que aquele que zomba deve ser cauteloso, pois ele não sabe quem ali é
inimigo ou amigo), quanto também que aquele que zomba de outro é quem
deve fugir (pelas mesmas razões). Cf. EVANS, 1986, p. 87-88.
[53] Mescla dos versos, exatamente como no caso da estrofe 30.
[54]
Em outras palavras, o caminho até um mau amigo, mesmo que ele more
próximo, sempre parecerá muito mais longo e tortuoso do que realmente é.
Por outro lado, o caminho até um bom amigo, ainda que ele more longe,
sempre será mais agradável e parecerá menos desgastante.
[55]
Podemos interpretar que o homem que deve mendigar sofre (seu “coração
sangra”) por estar sujeito a tal condição de pedir por comida a outros.
[56]Este verso já foi interpretado como dizendo que o homem benevolente e
gentil se recusaria a receber um presente. Entretanto, essa não parece ser a
melhor interpretação levando-se em consideração a leitura geral da estrofe. O
mais provável é que uma interpretação mais correta seria de que “Eu não
encontrei um homem tão gentil ou tão benevolente com comida que ao
aceitar (þiggja) não fosse (considerado) aceito (þegit)”; i.e., que ao aceitarem
(sua hospitalidade) não fosse (para ele) um presente (e sendo assim algo que
devesse ser retribuído). Cf. EVANS, 1986, p. 91.
[57]
O homem deve ser amigo de seu amigo e também do amigo desse seu
amigo, mas nunca ser amigo do amigo de um inimigo seu.
[58] A primeira parte da estrofe não apresenta nenhum grande problema
interpretativo, sendo de fácil compreensão. Contudo, os três últimos versos
podem não ser muito esclacedores, inclusive levando a uma leitura errônea,
onde poderia ser considerada a existência de duas personagens diferentes (o
covarde e o avarento). Na segunda parte dessa estrofe há apenas uma
personagem, que se opõe à da primeira (gentil e valente). A ideia aqui é a de
que aquele que é covarde, aquele que teme tudo, teme inclusive receber
qualquer coisa de outros, que o obrigaria a também ser gentil e retribuir. Cf.
EVANS, 1986, p. 93.
[59]
Trémǫnnum, literalmente: “homens de madeira”. Não se tem certeza a
exatamente o que o poema se refere. Uma possibilidade seriam postes ou
marcadores em estradas, mas não há qualquer tipo de evidência material disso
na Antiguidade e Alta Idade Média escandinava. Contudo, teríamos o termo
trémaðr, que possui o mesmo significado e que está relacionado a elementos
mágicos e religiosos. Na Þorleifs þáttr jarlsskálds temos o exemplo de jarl
Hakon que constrói um homem esculpido em madeira (trémaðr) e coloca
nele um coração humano, o que faz com que o trémað ganhe vida como um
tipo de autômato, o que – com as devidas ressalvas – pode lembrar o mito
judaico do golem (cf. KIECKHEFER, 1989, p. 43; cf. SCHOLEM, 1994, p.
89-96). Temos também indícios de trémað na saga do rei Olaf Tryggvason e
também na saga de Ragnar Lodbrok (Cf. EVANS, 1986, p. 93-94). No relato
do árabe Ibn Fadlan sobre os vikings no Volga (c. 922), ele descreve algo que
poderia ser compreendido como trémaðr: “(...) se direcionam a uma longa e
alta peça de madeira que possui a face de um homem rodeada por pequenas
figuras (...) os rus se prostam diante da imagem maior e dizem: ‘Ó, meu
Senhor, eu vim de terras distantes e tenho comigo este número de jovens
escravas e este tanto de peles de marta’, e então enumeram tudo o que
trouxeram consigo de seus outros bens. Então dizem: ‘Eu lhe trago estas
oferendas’, e depositam o que trouxeram e continuam, ‘E desejo que você me
envie mercadores com muitos dinares e dirhems, que irão comprar de mim
qualquer coisa que eu queira e não irão argumentar nada que eu disser’.
Então vão embora (…)” (op. cit. FADLAN, 1988, p. 74-75; tradução nossa).
[60]Pode-se entender que a mensagem desta estrofe seria de que “a roupa faz
o homem”; um pedaço de madeira vestido como um guerreiro pareceria um
guerreiro, enquanto um homem nu está destituído de seu status. Contudo, este
trecho da margem para diversas interpretações, para maiores detalhes cf.
EVANS, 1986, p. 94-95.
[61]Há problemas quanto ao significado exato de þorpi á no poema. Dentre as
opções mais utilizadas, decidimos por traduzir como “no campo” por estar de
acordo com o restante das referências a respeito da árvore que definha isolada
e a metáfora com o homem solitário que não possui entes queridos (sendo
como um abeto solitário no campo). Para outras interpretações cf. EVANS,
1986, p. 96.
[62]A amizade entre maus (ou falsos) amigos não é duradoura e apesar de
parecer forte, se extingue rapidamente em poucos dias.
[63]Apesar das diversas possibilidades de tradução para esta passagem (cf.
EVANS, 1986, p. 98), o que o poema quer dizer é que não é necessário nada
muito grandioso, de grande valor ou até muito esforço para se conseguir algo
corriqueiro e comum; i. e. partilhando de seu pão e de sua cerveja com outra
pessoa já seria o suficiente para conseguir um novo amigo.
[64]Outra passagem de difícil tradução. A dificuldade envolve principalmente
o significado das palavras hálf e hvar. Dentre algumas possibilidades, a
interpretação pode ser a de que todos os homens estariam divididos entre
aqueles que possuem sabedoria e aqueles que não, ou que as pessoas são
diferentes entre si e não possuem o mesmo grau de sabedoria, ou ainda que
ninguém esteja completo, sendo um ser pela metade (sendo ao mesmo tempo
sábio e tolo). É muito provável que na verdade esta passagem do poema – da
maneira como chegou até a atualidade por meio do manuscrito – esteja
corrompida e trechos do texto original tenham se perdido. Cf. EVANS, 1986,
p. 100.
[65] O problema aqui se dá com vel mart vitu. Baseamo-nos aqui na
interpretação de “sabem muito bem (sobre algo)” ou ainda “sabem o
suficiente”. Ao invés de mart virtut (“não sabem muito bem”) o que não faria
sentido no contexto da estrofe. Cf. EVANS, 1986, p. 100; cf. JÓNSSON,
1956.
[66]É senso comum que a intenção dessa estrofe é alertar sobre os malefícios
da solidão e o incentivo à sociabilidade. Entretanto há problemas quanto à
tradução das duas últimas linhas. É possível entender a palavra kuðr no
sentido do verbo “conhecer” e assim proporcionar uma tradução no sentido
de que o homem se torna conhecido através do discurso de outro, ou ainda
que através da conversação os homens tornan-se conhecidos entre si e se
aproximam. Contudo, tais interpretações rompem com a lógica do início da
estrofe, onde a partir de uma coisa outra é gerada numa relação de certa
dependência (e. g. “A lenha queima a partir da lenha”). Uma solução nesse
caso seria interpretar kuðr no sentido de “saber” ou “sabedoria”, o que, além
de manter a lógica da estrofe, auxilia na compreensão do último verso (cf.
EVANS, 1986, p. 101). Onde se pode interpretar que, diferentemente daquele
que interage com outras pessoas, o homem que não sociabiliza com outros
acabaria recluso em suas próprias convicções errôneas. O que poderia ser
solucionado se ele partilhasse de seus pensamentos e opiniões com outros.
Ideal que também está presente em outras estrofes do Hávamál.
[67] A compreensão da estrofe não apresenta grandes problemas
interpretativos, mas cabe uma rápida explanação. A ideia é a de que aquele
que cobiça as posses e tomar a vida de outro homem deve acordar cedo para
conseguí-los. Assim como o lobo e o homem preguiçoso não conseguem
obter aquilo que desejam. Em suma, que é necessário se esforçar para obter
aquilo que se deseja.
[68]O significado do final da estrofe seria de que se três pessoas ficam
sabendo de algo, isso já não será mais segredo para ninguém e logo todos
saberão. Para maiores detalhes sobre esta passagem cf. EVANS, 1986, p.
103.
[69] Muito provavelmente metade da estrofe está perdida.
[70] A pessoa indesejada, impopular.
[71] O manuscrito traz ok sel lifðum, o que não faz sentido. Seguimos a
adaptação de Finnur Jónsson (op. cit. JÓNSSON, 1924, p. 75) para en sé
ólifðum.
[72]Aqui há um grande problema de interpretação. Não é claro o que seria o
fogo citado: uma pira furnerária, um incêndio ou o fogo da lareira? E o morto
em questão seria o homem rico ou outra pessoa? Adotamos aqui a
interpretação de Finnur Jónsson de que o fogo se trata de uma pira funerária e
assim traduzimos a passagem como sendo o próprio homem rico o morto a
ser cremado. Para outras possibilidades cf. EVANS, 1986, p. 106-107.
[73]As estrofes 73 e 74 são consideradas como possíveis interpolações
posteriores, em função de seu contéudo obscuro e por romperem com a
sequência do modelo métrico ljóðahátrr (cf. EVANS, 1986, p. 109).
[74]Este nome não aparece em nenhum outro texto do período e não há uma
explicação satisfatória para sua origem e significado. Existem duas hipóteses
principais a esse respeito. A primeira seria de que o nome viria de fit (algo
como “prado d‘água”) ou no plural fitjar. Esta palavra estaria relacionada ao
nome de uma fazenda na ilha de Stord em Hordaland, Noruega. A qual teria
chegado a pertencer a Harald I (o Louro). Os “fitjungar” teriam sido ricos
proprietários dessa fazenda que se viram reduzidos à pobreza quando Harald
os atacou. Por outro lado, a outra hipótese seria de que Fitjung seria um nome
fictício criado apenas para poder realizar a aliteração com a palavra fullar. Cf.
EVANS, 1986, p. 112-113.
[75]O termo reginkunnum seria um tipo de epíteto para as runas e a presença
em outras fontes seria singular, podendo ser traduzido de duas maneiras
diferentes. Composto por -kundr no sentido de “descendente de”, “filho de”;
logo “de origem divina”. Outra possibilidade seria entender reginkunnum a
partir de -kunna ou -kunnr no sentido de “do conhecimento de”, “conhecidas
por”; logo “conhecidas pelos deuses”. Cf. EVANS, 1986, p. 114.
[76] Odin.
[77] i. e. que ao consultar as runas é melhor estar em silêncio.
[78]Aqui en mæki saurgan se refere literalemente a “uma espada suja”.
Podemos interpretar que esta passagem queira dizer a respeito de uma espada
usada apropriadamente, de qualidade, que provou seu valor, que não ficou
tempo demais sem uso e tenha se embotado.
[79]O sentido literal de á hverfanda hvéli é “numa roda que gira”, por isso a
tradução referente ao torno de oleiro. No Alvísmál temos hverfanda hvél
relacionado à lua e, assim como no Hávamál, com a ideia de como o coração
das mulheres é volúvel (nesse caso, como as fases da lua). Segundo David A.
H. Evans a expressão á hverfanda hvéli ainda é utilizada na Islândia moderna
para se referir a algo instável, incerto (cf. EVANS, 1986, p. 116).
[80] Mesclamos o conteúdo dos três primeiros versos para melhor
inteligibilidade em português.
[81]A história contada entre as estrofes 96-102 se diferencia completamente
das que as antecederam até agora.
[82]Uma possivel interpretação é de que essa estrofe na verdade ocorre depois
das 97-98.
[83]
Mæla man: possivelmente “ganhar uma mulher através da conversa”; cf.
EVANS, 1986, p. 118.
[84]
Este trecho muitas vezes é traduzido dando a ideia de que havia um cão
ou uma cadela preso à cama da filha de Billing quando Odin chega para
encontra-la. O que frustra os planos do deus. Entretanto, David A. H. Evans
nos chama a atenção para outra interpretação. Na frase bundit beðjum á –
assim como ocorre na estrofe 97 – beðjum á indicaria que o animal (cão ou
cadela) não estaria preso à cama, mas na própria cama. E bundit (binda:
“prender”, “atar”, “aprisionar”) estaria sendo usado em um sentido figurado,
reforçando o fato do animal se encontrar na cama. Sendo assim, outra
tradução possível seria “... encontrei apenas o cão/a cadela da boa mulher em
sua cama” (cf. EVANS, 1986, p. 119). Outra hipótese seria uma variante de
bundit como uma derivação equivocada de bruðr (“noiva”), o que daria um
tom jocoso à passagem fazendo do animal a única noiva e amante que Odin
iria conseguir naquele dia. Contudo esta última hipótese não parece muito
plausível. De qualquer maneira, a ideia da estrofe 101 é clara: Odin vai ao
encontro da filha de Billing e quando chega a sua cama encontra apenas um
cão ou cadela aguardando no lugar dela, demonstrando assim o desprezo da
mulher por ele; o que acaba sendo confirmado pela estrofe 102.
[85]Os versos 104-110 tratam dos eventos em torno do episódio de quando
Odin roubou o hidromel da poesia do gigante Suttung ao seduzir sua filha,
Gunnlod. O relato deste episódio pode ser encontrado no Skáldskaparmál
(capítulos 5-6) da Edda em Prosa (cf. STURLUSON, 1998, p. 59-72; cf.
STURLUSON, 1931, p. 82-85; cf. EVANS, 1986, p. 120).
[86]Em sua Edda, Snorri Sturluson conta que Odin consegue entrar no lar de
Suttung se transformando numa serpente e utilizando uma verruma chamada
Rati para abrir uma passagem através da pedra.
[87] Não é claro o verdadeiro significado desse trecho, especialmente da
palavra litar. A opinião entre alguns pesquisadores é a de que este verso
esteja corrompido, dificultando ou até mesmo tornando impossível sua
compreensão (cf. EVANS, 1986, p. 121). Ainda assim, podemos estabelecer
uma hipótese a partir do que temos e levando-se em consideração o que é
narrado nas demais estrofes deste trecho do Hávamál e a história de Odin e o
hidromel da poesia na Edda em Prosa. A palavra litar pode estar relacionada
à litr (“cor”, “coloração”, “compleição”, “aparência”) e desta forma ligada ao
fato da metamorfose de Odin em uma serpente para poder entrar no lar de
Suttung e roubar seu hidromel.
[88]Segundo Snorri Sturluson (em sua Edda em Prosa), este é um dos três
jarros ou recipientes onde estava guardado o hidromel da poesia.
[89] Assim como no caso da primeira linha dessa estrofe, acredita-se que esta
também esteja corrompida, sendo um dos principais problemas a palavra
jarðar. Alguns tradutores e estudiosos interpretam o termo como algo
semelhante a “círculo”, “lar”, “habitação” ou simplesmente “terra”. Contudo
isso não resolve o problema, pois o que viria a ser o “círculo
(lar/habitação/terra) do local sagrado dos homens”? Uma primeira
possibilidade seria Midgard, a “Terra-Média”, onde vive a humanidade. O
que estaria em desacordo com o relato de Snorri Sturluson, uma vez que na
Edda em Prosa é dito que Odin leva o hidromel para Asgard (cf. EVANS,
1986, p. 121-122). Seguindo a interpretação de Finnur Jónsson (cf.
JÓNSSON, 1934, p. 39-40) jarðar poderia ser interpretado como uma
corruptela de jaðarr no sentido metafórico poético de “o melhor”, “o mais
poderoso”, “nobre” e até mesmo “senhor”, “príncipe”. Tornando-se assim
uma referencia ao deus Odin. Desta forma, lendo esse trecho então como á
alda vés jaðars (grifo nosso), teríamos “o local sagrado do senhor dos
homens” sendo então uma referencia a Asgard (ou até mesmo ao Valhalla).
[90] “Hár” e “Bolverk” são outros nomes referentes à Odin.
[91]Aqui se inicia os conselhos e ensinamentos de Odin a Loddfafnir. A
personagem de Loddfafnir é um tanto enigmática uma vez que ele não surge
em nenhum outro texto do período, abrindo margem para conjecturas sobre
quem seria ele de fato, se estaria relacionado a algum outro documento que
não chegou à atualidade ou se ele seria uma mera construção para o texto do
Hávamál.
[92]O real significado de þular (þulr) não é claro dentro do texto, mas estaria
relacionado a “sábio”, “orador” ou ainda “bardo”, “poeta”. O termo é usado
na estrofe 134 como þul ao dizer a Loddfafnir para que não zombe do “sábio
grisalho” e também nas estrofes 80 e 142 ao se referir a Fimbulthul
(Fimbulþulr: “o podeoroso sábio”; se referindo a Odin). Em inglês antigo seu
equivalente é þyle (“orador”) e da qual deriva þelcræft ou þylcræft
(“eloquência”, “retórica”). No poema Beowulf (verso 1165) a palavra é
aplicada à personagem de Unferth como o orador sentado aos pés do rei
Hrothgar (“Swylce þær Unferþ þyle æt fotum sæt frean Scyldinga”). Em
nórdico antigo ainda há o verbo þylja (“dizer”, “ler”, “cantar”). Na estrofe
111 a menção sobre “o trono do sábio” possivelmente é uma referência ao
deus Odin. Principalmente ao levarmos em consideração o restante da estrofe,
que cita claramente a figura do deus sob um de seus nomes: Hár.
[93] Urd pode ser encontrada também em outros poemas da Edda Poética,
como na Voluspá e no Grímnismál (e na Helgakviða Hundingsbana I,
acompanhada de suas irmãs). Juntamente com Verdandi e Skuld, na
mitologia nórdica Urd é uma das três Norns responsáveis pelo destino dos
homens e dos deuses. Em nórdico antigo a palavra que compõe seu nome
(urðr) significaria literalmente “destino”; encontrando seu equivalente em
inglês antigo na palavra wyrd. As três poderiam ser encontradas sob a raíz da
Yggdrasil em Asgard, na “fonte de Urd”, onde os deuses se reuniriam
diariamente em assembleia. Com Urd representando o passado, Verdandi o
presente e Skuld o futuro, as Nornes eram responsáveis por fiar (literalmente)
o destino das pessoas. Essa representação das Norns se aproxima muito das
Parcas (Parcae) da mitologia romana assim como das Moiras (Μοῖραι)
gregas. Segundo Lee M. Hollander tal similaridade não seria uma simples
coincidência, mas fruto de uma apropriação e adaptação das personagens do
mito grego-latino para o contexto nórdico pela Escandinávia do século XII
(cf. HOLLANDER, 2000, p. 4).
[94] Uma passagem controversa que, assim como outras, não é de fácil
compreensão e tradução. As palavras são usadas de forma semelhante na
estrofe 8. Não há um consenso sobre como traduzir essa passagem, a não ser
que seu significado fosse de que alguém que, por meio de uma pessoa
benevolente, pudesse ser amado e glorificado. Cf. EVANS, 1986, p. 126.
[95]
Sifjum: “parentesco”; usado aqui em um sentido metafórico de estima e
confiança para com outra pessoa, e não exatamente a do parentesco
consanguíneo (cf. JÓNSSON, 1932, p. 43).
[96]Acredita-se que o manuscrito esteja corrompido nesse trecho, dando
margem para mais de uma interpretação como kveðu þat bǫlvi at ou kveðu
þer bǫlvi at ou ainda kveð þu þér bǫlvi at. Cf. EVANS, 1986, p. 127.
[97] Em síðr þitt um heilli halir seguimos a interpretação de Guðni Jónsson
(cf. JÓNSSON, 1956) em usar þitt ao invés de þik como em Finnur Jónsson
(cf. JÓNSSON, 1924, p. 128). O significado de “olhar para cima” –
relacionado ao pânico e ao furor da batalha – é abordado de forma detalhada
em EVANS, 1986, p. 127-128. Lee M. Hollander, ao abordar tal passagem do
Hávamál, faz menção da obra Speculum Regale. De autoria anônima,
composta na Noruega por volta de 1250, o Speculum Regale (“Espelho do
Rei”) faz menção ao terror que toma conta dos jovens e guerreiros
inexperientes no campo de batalha (cf. HOLLANDER, 2000, p. 34).
[98] A boca
[99]O verdadeiro sentido dos últimos três versos é extremamente obscuro e há
muita divergência em como traduzí-los. Sendo a palavra vílmǫgum o
principal problema, pois não é claro seu verdadeiro significado. O que dá
margem para a suposição de uma palavra corrompida pelo copista. As
possibilidades de tradução variam muito, sendo esse último verso
interpretado também como “e se move/balança entre os miseráveis”,
sugerindo que estes seriam corpos humanos numa hipótese de que a estrofe
estaria se referindo à cena de um sacrifício, onde se encontraria o “sábio
grisalho” como uma referência a Odin. Contudo tal interpretação é altamente
especulativa. Outras possibilidades seriam de que vílmǫgum seria uma
derivação de vilmagi (vil, “entranhas” e magi, “estômago”), originando uma
tradução como a que se encontra em nossa tradução. Ainda assim, nenhuma
delas parece esclarecer o sentido geral da estrofe 134. Para um debate mais
aprofundado sobre algumas possibilidades cf. EVANS, 1986, p. 129.
[100]Uma explicação para essa estrofe é a de que ela esteja falando sobre
pedintes e mendigos e que se deve doar algo (dinheiro, uma esmola) para
evitar que lhe roguem uma praga ou maldição. Contudo, essa é apenas uma
entre outras possibilidades para se entender a estrofe 136. Para outras
possibilidades cf. EVANS, 1986, p. 130-131.
[101]A compreensão de toda essa linha é obscura. Se a palavra estiver correta,
hýrógi significaria “conflito” ou mais especificamente “conflito doméstico”
(cf. EVANS, 1986, p. 132; cf. HOLLANDER, 2000, p. 35). Hǫll por sua vez
poderia ser a princípio entendido como “salão”. Outra possibilibade seria a
palavra ser uma derivação de haull que significa “ruptura” ou mesmo
“hérnia” (cf. CLEASBY & VIGUSSON, 1874, p. 241), mas em qualquer um
dos casos não faria o menor sentido dentro da frase. Podemos suspeitar de
que há um erro no manuscrito e ao invés de hǫll a palavra correta seria høll
ou høllr, referente à árvore do sabugueiro. Equivalente à palavra moderna
hyll em norueguês e a hyld em dinamarquês. O sabugueiro teria um papel
importante no folclore europeu, mas como ele poderia interferir em conflitos
não é claro. Uma sugestão (cf. EVANS, 1986, p. 133) envolveria a ligação do
sabugueiro com “espíritos domésticos”, espíritos guardiões (cf. DAVIDSON,
1988, p. 102-133; cf. TURVILLE-PETRE, 1964, p. 221-235). Mesmo assim,
essa talvez não seja uma explicação totalmente satisfatória.
[102] Como dissemos na introdução o Runatál e o Ljóðatál talvez sejam as
partes mais conhecidas do Hávamál, devido aos elementos mitológicos e
mágicos presentes. No Runatál, a imagem de Odin se sacrificando a si
mesmo e voltando a vida pode levar a interpretações que poderiam
demonstrar indícios de uma possível influência externa cristã. Existem de
fato alguns elementos que podem corroborar com essa hipótese. Se
observarmos, por exemplo, os anglo-saxões, poderemos compreender um
pouco melhor como isso teria acontecido. Os anglo-saxões, cristianizados
séculos antes que os escandinavos, tinham consciência de sua ancestralidade
no continente e de seu passado lendário. Nas linhagens de seus reis,
principalmente do período mais tardio da Inglaterra anglo-saxônica, podemos
encontrar nas genealogias régias tanto nomes que remontam ao mundo
veterotestamentário quanto ao passado germânico, tanto os nomes dos
patriarcas bíblicos quanto os antigos heróis das lendas norte-europeias. E em
meio a tais nomes encontramos o nome de Woden/Odin. Inicialmente como
fundador das linhagens dos reis anglos e saxões, e mais tarde humanizado e
mesclado à tradição cristã: “The evidence of the West-Saxon genealogy shows
that the Danish invasions and settlements did not lead Englishmen to
dissociate themselves from the Scandinavian heroic age. On the contrary, the
heroic North attracted them, and their interest in it permitted them to
establish a commom background for comtemporary political and ethic
relations” (cf. MURRAY, 1997, p. 105). Construção genealógica muito
semelhante a dos anglo-saxões pode ser encontrada na introdução da Edda
em Prosa de Snorri Sturluson, onde ele descreve a linhagem de Odin como
oriunda da antiga Tróia e mais tarde seus descendentes como reis do norte
europeu (além de referências bíblicas à Criação, a Adão e Eva, Noé e ao
Dilúvio logo do início da mesma introdução). Outro elemento importante está
relacionado à imagem de Woden/Odin como o Alfödr (Pai de Todos), que
também pode ter contribuído para certa similaridade com a imagem do Deus
cristão durante o processo de cristianização. O que teríamos seria a união da
figura divina cristã (especialmente a do Velho Testamento) com a divindade
germânica. Desta forma, uma apropriação do aspecto aristocrático, régio e
patriarcal da divindade para o universo cristão, enquanto a divindade em si
como entidade é demonizada (cf. MEDEIROS, 2006, p. 69 – 111). No caso
da Edda Poética, tal aproximação entre a divindade cristã e o deus Odin
também poderia se dar pelo modelo de morte/ressurreição: o deus nórdico
morto e ressurecto numa árvore e o deus cristão morto na cruz e mais tarde
ressurecto. Estabelecendo assim um paralelo ou um arquétipo da figura de
Cristo, que dentro da tradição cristã medieval acaba por deter todo um
aspecto de autoridade régia, muito semelhante ao deus nórdico (paralelo
semelhante também poderia ser estabelecido com a figura mítica do deus
Balder, filho de Odin, cujo nome também aparece nas genealogias régias
citadas). Abordagens mais recentes sobre a ligação da imagem de Odin e o
cristianismo tem se aprofundado e levantado questionamentos muito
interessantes. Um exemplo é o trabalho da pesquisadora Annette Lassen, da
Universidade de Copenhagen. Em suas pesquisas Lassen não apenas
estabelece paralelos da divindade nórdica com o cristianismo, como vai além;
evidenciando-nos que a partir da documentação escrita existente é quase
impossível termos uma visão clara do deus Odin dos tempos pré-cristãos. Em
sua argumentação ela expõe que a maior parte do que sabemos sobre o deus é
fruto da produção escrita medieval escandinava a partir dos séculos XI e XII.
E que em função disso, a imagem de Odin (assim como outros elementos da
mitologia nórdica) em tais obras está intrinsecamente influenciada pela
tradição cristã da época. Em outras palavras, a imagem que nós conhecemos
hoje do deus Odin, a partir de tais fontes escritas – a personagem que vemos
na literatura nórdica antiga – estaria sendo apresentada sob uma “lente” da
tradição cristã do período (para maiores detalhes, cf. LASSEN, 2011). A
nosso ver, isso não tornaria tais obras cristãs no sentido estrito da palavra ou
– partindo para o outro extremo – que elas sejam narrativas pagãs
“sobreviventes”, que resistiram à cristianização. Acreditamos que a exemplo
de outras obras do norte europeu, esta figura de Odin conhecida por nós na
atualidade não seria nem a divindade existente no período pagão e nem uma
mera adaptação medieval sob um verniz de cristianização, mas um amálgama
das duas tradições. O que faria o Odin das Eddas e demais textos do período
ser uma personagem singular, existindo em uma região fronteiriça entre o
antigo mundo pagão e a nova fé que havia se instaurado.
Um indício disso é o de que, apesar das similaridades com a tradição cristã e
sua influência na produção literária em nórdico antigo (cf. HILL, 1986, p. 79-
89), acreditamos que algumas das caraterísticas da figura de Odin no
Hávamál – concentradas nas duas últimas partes do poema – podem remontar
a uma tradição muito mais antiga. Acreditamos que ao menos parte da
caracterização do deus Odin retratada no Runatál e no Ljóðatál tenha suas
raízes não apenas em mitos do passado pagão norte-europeu como seria
detentor de resquícios do que poderíamos entender como práticas xamanicas.
Principalmente se pensarmos nos aspectos de Odin relacionados à magia. Em
diversas partes do mundo, a imagem da árvore sagrada como um axis mundi
se faz presente. E assim como Odin, nessas tradições xamanicas, o iniciado
busca por essa árvore para obter seus poderes, se nutrindo dela, utilizando de
sua madeira para confeccionar seus utilensílios mágicos e etc. É comum a
essas diversas tradições o rito de iniciação do pretenso xamã por meio do rito
de morte e ressureição do indivíduo. Ao “morrer”, comumente numa jornada
individual ao mundo espiritual, o iniciado entra em contato com espíritos
(geralmente animais) que dilaceram seu corpo e mais tarde o reconstituem,
devolvendo-lhe à vida. Contudo, uma vez ressurecto traz consigo também
algo a mais dentro de si, que antes não existia e lhe foi concedido pelas
entidades espirituais. O que se reflete como poder e conhecimentos que não
são comuns aos homens em geral. Além disso, o xamã traz consigo também
uma afinidade intrínseca com a natureza e com os espíritos animais –
manipulando-os e tendo alguns como seus companheiros – e com o mundo
espiritual humano de forma geral, servindo frequentemente como um
intercessor entre os mortos e os vivos (cf. CAMPBELL, 2000, p. 191 – 231).
Ao tomar contato com tais paralelos presentes em outras culturas do planeta
onde a figura do xamã ainda é presente (mesmo que ele possua outras
denominações) e uma nova leitura do Runatál e do Ljóðatál, ficam claras
certas similaridades entre a imagem de Odin e tais elementos característicos
do xamanismo e de práticas pagãs em geral. Isso explicaria certas
particularidades da personagem do deus que seriam claramente contraditórias
à mentalidade cristã medieval (como veremos mais adiante). Se justificando
não como deturpações da ortodoxia católica, mas reminiscências de um
passado que foram desnaturadas de seu contexto original e integradas a uma
mentalidade popular, folclórica, com o fenômeno da cristianização (cf. LE
GOFF, 1980, p. 207-219). Resultando nas imagens contidas na Edda Poética.
[103]Apesar de não ser explícita a informação, supõe-se que o poema esteja se
referindo à Yggdrasil, a “árvore da vida”, o eixo do universo dentro da
cosmogonia nórdica.
[104] Chifre de beber, guampa.
[105]No Gylfaginning (capítulo 5), na Edda em Prosa, Snorri Sturluson fala
sobre a genealogia do deus Odin. Ele fala sobre Buri, que teria nascido do
gelo, retirado pelas lambidas da vaca Audhumla. Buri então teve um filho
chamado Bor. Ele, Bor, mais tarde se casou com Bestla, filha do gigante
Bolthorn (Bolthor), e tiveram três filhos: Odin, Vili e Ve. Contudo, Sturluson
não faz qualquer referência a este filho de Bolthorn, irmão de Bestla, que o
Hávamál fala. Lee M. Hollander argumenta sobre a hipótese de que este
“filho de Bolthor” poderia ser o gigante Mimir. No capítulo 14 da
Gylfaginning é descrito o gigante Mimir como guardião da fonte da sabedoria
e como Odin, para poder beber de sua água, sacrificou um de seus olhos
como pagamento: “O freixo é a maior de todas as árvores e a melhor. Seus
galhos se espalham sobre todo o mundo e se estendem através do céu. Três
das raízes da árvore a suportam e se extendem para muito, muito longe. Uma
está entre os æsir, a segunda entre os gigantes de gelo, onde uma vez estava
Ginnungagap. A terceira se estende até Niflheim, e sob aquela raíz está
Hvergelmir, e Nidhogg roe a base da raíz. Mas sob a raíz que chega até os
gigantes de gelo, lá é onde a fonte de Mimir está, a qual possui sabedoria e
inteligência, e o senhor da fonte é chamado Mimir. Ele é cheio de
conhecimento porque ele bebe da fonte do chifre Gjallarhorn. O Pai de
Todos foi lá e pediu por um único gole da fonte, mas ele não conseguiu um
até que ele depositou seu olho como um pagamento” (op. cit. STURLUSON,
1998, p. 17; tradução nossa). Seguindo essa hipótese, a sabedoria de Odin
viria então de três fontes: seu autosacrifício, a fonte de Mimir e do hidromel
de Odrerir (cf. HOLLANDER, 2000, p. 36).
[106] Fimbulþulr (Fimbulthur, literalmente “sábio poderoso”), i. e. Odin.
[107] Odin.
[108] Ásum: referente aos deuses aesires.
[109] Toda essa estrofe trata sobre como proceder com as runas.
[110]
Freista (“testar”, “por à prova”), talvez no sentido de como consultar as
runas.
[111] Odin.
[112]O significado das duas últimas linhas não é claro. O mais provável é que
estejam retomando o inicio do Runatál, se referindo ao que é narrado nas
estrofes 138 e 139.
[113]
Esta última parte do Hávamál, assim como o Runatál, faz referência aos
poderes mágicos de Odin. Aqui, especificamente aos dezoito encantamentos
que ele conhece para diversos fins. Na Edda Poética encontraremos
passagens a práticas muito semelhantes ao Ljóðatál em poemas como o
Sigrdrífumal e o Grógaldr.
[114]Esta estrofe é de fácil compreensão, deixando claro que se refere sobre o
uso de runas a serem gravadas numa peça de madeira com a intenção de
prejudicar outros, como ocorre na Grettis saga, capítulos 79-81. Entretanto,
um trecho extremamente problemático desta estrofe se encontra na frase que
no original do manuscrito está como á rótum rás viðar – sendo o problema a
palavra rás. Como em outros casos, é possível que haja aqui um erro de
grafia, o que faz alguns etmólogos acreditarem que na verdade a palavra
correta seria hrás. Na estrofe 32 do Skírnismál (que também trata do uso de
magia) temos a expressão hrás viðar como “madeira fresca”. Mas essa não
parece ser a melhor solução para essa estrofe no Hávamál, pois não parece
fazer muito sentido. Uma vez que uma madeira fresca e úmida não seria um
bom material para gravar runas. Uma opção (talvez a melhor) seja entender
rás como uma corruptela de rams no sentido de “forte”, “poderoso”. Cf.
EVANS, 1986, p. 138-139.
[115] Esta estrofe retrata como Odin tem poder para confundir as túnriðir,
impedido-as de retornarem às suas formas verdadeiras. Túnriður: pode ser
entendido como “bruxas”, na falta de um termo mais apropriado, assim como
outras criaturas do folclore norte-europeu como as kveldriða, mirkriða,
trollriða, que também podem ser interpretadas como “bruxas” (cf. EVANS,
1986, p. 139-140; cf. LARRINGTON, 2008, p. 36). O que as aproxima do
conceito de “bruxa” são suas habilidades, como a transformação em animais
(o que pode também ocorrer por meio do abandono do corpo), voo noturno,
etc. A mudança de corpo e a habilidade de se transformar em animais é um
tema recorrente na literatura nórdica. Essas riður seriam então bruxas que
atuariam através de corpos temporários, voando através da noite (cf.
RAUDVERE, 2002, p. 103-106), tanto nas narrativas mitológicas quanto nas
sagas. Seu equivalente na Inglaterra anglo-saxônica são as hægtesse. Existe,
por exemplo, uma fórmula de bênção em inglês antigo de nome Wiþ færstice
(“Contra dor Penetrante”), na quel aquele que estava promovendo a cura
primeiramente falava sobre uma grande hoste de criaturas que corriam por
sobre um monte funerário, e então ele anunciava sua intenção de enviar de
volta os dardos de “poderosas mulheres”, as quais ele mais tarde chama de
hægtessan (“bruxas”), que andam na companhia de elfos, todos carregando
dardos (cf. JOLLY, 1996, p. 139). Por meio deste tipo de prática, o objetivo
seria curar uma doença misteriosa que teria sido lançada por tais criaturas.
Durante todo o período tardio da Inglaterra anglo-saxônica (séculos IX ao XI,
principalmente a partir do governo de Alfred o Grande) poderemos encontrar
uma série de leis e punições contra a existência de bruxas e feiticeiras e suas
práticas (cf. MEDEIROS, 2010, p. 54-66). Talvez valha a pena aqui uma
breve explicação acerca da natureza de tais bruxas e feiticeiras, dentro do
contexto geral da Idade Média, para auxiliar na compreensão da estrofe 155
do Hávamál. A feitiçaria, remontando ao mundo greco-romano, estaria
vinculada principalmente à figura feminina nas esferas dos desejos e paixões
amorosas. A feiticeira, além de ter conhecimento do uso da magia, atua como
intermediadora de casos amorosos; mas também intervem como perfumista e
envenenadora (a clássica imagem do período medieval e do Renascimento da
feiticeira produzindo tanto venenos quanto filtros mágicos em seu
“laboratório”). Exemplos de feiticeiras no mundo clássico seriam as mulheres
da Tessália e as filhas de Hécate: Circe e Medéa. Durante a Idade Média,
devido às transformações mentais junto às práticas mágicas, a feitiçaria fica
exclusivamente relegada à esfera do maligno. A feiticeira não é mais apenas
aquela contrária à ordem e aos desígnios do coletivo, mas também passa a
estar vinculada agora ao Mal cósmico que envolve toda a tradição cristã. Ela
é aquela que está contra a ordem divina. Sobre a bruxaria, podemos dizer que
esta estaria ligada especialmente às práticas mágicas rurais e coletivas, que
assumem junto ao imaginário de uma coletividade uma atitude passiva, pois a
opinião da comunidade é o mais importante para a comprovação de sua
existência do que a ideia que faz de si mesma a personagem deste cenário
mágico, a bruxa propriamente dita: “uma bruxa não cumpre ritual algum,
não pronuncia encantamentos e não utiliza poções. Um ato de bruxaria é um
ato psíquico. (...) Feiticeiras causam dano aos homens através de rituais
mágicos e drogas malignas” (cf. NOGUEIRA, 2004, p. 41 – 63). Podemos
dizer que, grosso modo, a bruxaria seria uma qualidade inata (o que se
encaixa ao perfil das túrinðir), enquanto a feitiçaria envolveria certo esforço,
certa “ação”. Mais tarde, as definições de feitiçaria e bruxaria ganharão um
maior detalhamento de suas características, em especial a partir das ações dos
processos inquisitoriais.
[116]A relação de Odin com a morte e os mortos é uma de suas principais
características como divindade. Tanto que na atualidade é quase impossível
não se lembrar dele sem relacioná-lo às valkírias levando as almas dos
guerreiros mortos em batalha para o famoso Valhalla (o “salão dos mortos”),
onde eles se juntam aos seus antepassados, compondo assim o poderoso
exército de Odin que lutará com ele no Ragnarok. Contudo, mais do que
simplesmente desempenhar um papel de guardião ou “aliciador” de mortos, a
influência de Odin sobre aqueles que não se encontram mais entre os vivos é
mais complexa e de certa forma sombria, isso, diga-se, do ponto de vista da
teologia cristã. Principalmente por tal influência estar relacionada com suas
habilidades mágicas. Na Ynglinga saga (capítulo 7) Snorri Sturluson
descreve alguns dos poderes de Odin. Além de ter a capacidade de mudar de
forma, abandonar seu corpo durante o sono e assumir formas animais
(lembremos aqui das estrofes 104-110 e como Odin conseguiu obter o
hidromel da poesia da filha de Suttung), como ele consegue controlar os
ventos, como ele tem conhecimento das runas e da magia galdrar e seiðr;
Sturluson diz sobre os poderes do deus sobre os mortos: “(...) e às vezes ele
despertava os mortos da terra e se sentava sob homens que haviam sido
enforcados; e assim ele era chamado de Senhor dos Mortos (draugradróttin)
ou Senhor dos Enforcados (hangadróttin)” (cf. STURLUSON, 1990, p. 5;
tradução nossa). Como podemos ver, esta passagem está plenamente de
acordo com a estrofe 157 e o poder que Odin possui sobre os mortos.
Entretanto, não podemos deixar de ressaltar que este caráter da figura de
Odin seria algo incomum dentro da prática cristã, o que nos faz pensar que o
conteúdo dessa estrofe de fato remonta a uma tradição pré-cristã (ver
conteúdo da nota 82). Voltando-nos ao contexto cristão europeu do período,
diferentemente de práticas mágicas populares (voltadas principalmente à cura
de enfermidades, bênçãos, entre outras) que eram toleradas pela Igreja, a
prática de comunicação ou evocação dos mortos era condenada e considerada
algo maligno (devemos alertar, contudo, que as relações de terminologias e
conceitos como magia, bruxaria, bruxa e etc., no contexto da Escandinávia
medieval por vezes se tornam confusas devido a suas particularidades e a
natureza das fontes; para maiores detalhes uma boa referência introdutória a
esse debate é RAUDVERE, 2002, p. 75-171). A condenação de tais práticas
remonta a Isidoro de Sevilha, ao relatar a existência daqueles com a
capacidade de controlar os elementos, perturbar a mente dos homens e até
mesmo matar através de um encantamento, identificando tais pessoas como
os malifici, os quais fariam uso de sacrifícios, sangue e cadáveres. Por conta
de seus encantamentos, pra evocar os mortos, eles seriam identificados como
“necromantes” (cf. FLINT, 1994, p. 52-53). Os necromantes estariam entre
os primeiros a ser condenados por Isidoro dentro da tradição cristã e podemos
encontrar práticas legais de repressão contra eles tanto na documentação
carolíngia quanto anglo-saxônica, assim como contra aqueles que realizam
outras práticas mágicas (maleficium), sortilégios e a profanação de túmulos
(especialmente para a obtenção de materiais para tais práticas). Uma das
principais razões para o combate a tais práticas estaria na dicotomia entre a
necromancia e a ideia de ressurreição: a primeira implicaria na manipulação
de cadáveres e evocação de espíritos sob a vontade do mago por intermédio
de feitiços e encantamentos, enquanto a segunda restauraria a vida por
completo no indivíduo. A ressureição seria um poder divino (uma vez que se
trata de dar a vida novamente a alguém), só podendo ser realizado por
intermédio do Senhor. E não é esse o caso da necromancia. Contudo, isso
significaria que certas pessoas (como os santos) poderiam ressuscitar os
mortos pelo intermédio de Deus? Segundo Santo Agostinho e Rabano Mauro,
não, pois esse é um poder exclusivo de Deus. Mesmo assim, não haveria um
verdadeiro consenso quanto a isso, principalmente levando-se em
consideração algumas hagiografias onde podemos encontrar casos de
ressurreição praticados pelos santos biografados. Tanto que Aldhelm de
Malmesbury, em seus escritos, reconhecia a diferença entre a prática da
necromancia e a habilidade que os santos possuíam em ressucitar os mortos
por meio de Deus (cf. FLINT, 1994, p. 213-216 e 271-273).
De qualquer forma, como podemos observar, é curioso vermos que os
poderes de Odin sobre os mortos estariam – do ponto de vista do debate
cristão – muito mais alinhados às práticas necromânticas. O que, tanto no
caso da estrofe 157 quanto na passagem da Ynglinga saga, também o
aproximaria do mito do draugr (e dai seu nome Draugradóttin). O draugr é
uma criatura folclórica do norte europeu, presente em diversas sagas, como
na Grettir saga (sendo dreag seu equivalente em inglês antigo e algo
próximo ao mito do revenant, ainda durante a Idade Média, mas já em um
período posterior). O draugr se enquadraria entre os diversos tipos de
“mortos-vivos” das tradições folclóricas europeias, como fantasmas e
aparições, e poderia ser definido de forma sucinta da seguinte forma no
contexto da Escandinávia medieval: “Aí são inúmeros os mortos ou draugr a
voltar, mutilando e matando os que encontram, devastando regiões inteiras,
forçando os homens e os animais a abandonar suas moradas. Diferentemente
dos fantasmas da Antiguidade clássica, estes mortos não são descritos como
‘imagens’. Eles parecem dotados de um verdadeiro corpo, como se o próprio
cadáver, retornado à vida, houvesse saído do túmulo” (op. cit. SCHIMITT,
1999, p. 29).
[117] Provavelmente se referindo a um tipo de prática de “batismo”. Tal
prática pode ser encontrada nas sagas, como na Egils saga (capítulo 31) e na
Laxdæla saga (capítulo 25), por exemplo, onde a expressão usada é ausa
vatni (diferindo nesse ponto de verpa vatni, utilizada no Hávamál). Na falta
de indícios satisfatórios desta prática pelo paganismo germânico fora da
Escandinávia, é possível pensar que tal costume se deva em função de
influências cristãs. Interpretado pela época – como se dá a entender pela
estrofe do Hávamál – como um ato de benção e prática mágica.
[118] Þjóðreyrir (Thjodreyrir) não é mencionado em nenhuma outra fonte.
[119]
Delling aparece em outras fontes, se referindo ao nome de um anão (cf.
EVANS, 1986, p. 143).
[120] Odin.
[121]
O reaparecimento de Loddfafnir neste trecho do poema talvez indique
que essa estrofe ou esse e o verso seguinte pertençam originalmente ao
Loddfáfnismál.
[122] Nos poemas islandês e norueguês temos o termo fé enquanto no
Abecedarium temos feu, i.e. “riqueza”, “fortuna”, “propriedade” e outras
palavras relacionadas. Confirmando assim o sentido no poema anglo-saxão,
como conceito comum ao norte europeu. Analisarmos a etimologia da
palavra pode nos ajudar a compreender melhor o conceito por trás dessa runa.
Originalmente tanto a palavra em inglês antigo “feoh” quanto em nórdico
antigo “fé” possui exatamente o mesmo significado: “gado”, animais de
criação (ovelhas, porcos e etc). O que joga uma luz sobre o sentido
primordial da palavra: a riqueza e prosperidade de uma pessoa estar
vinculada a suas posses, aos recursos que ela possui para seu sustento e
manutenção de seu padrão de vida dentro dessas sociedades específicas. O
que posteriormente torna-se uma palavra associada à ideia de “dinheiro”
propriamente dito (como é atualmente no islandês moderno).
[123]O poema islandês e o norueguês, assim como o Abecedarium, mantém o
nome da runa, ainda que com significado diverso. No texto norueguês úr
possui o sentido de “escória”: úr er af illu jarne (“escória é do ferro ruim”) e
no islandês úr possui o sentido de “chuva”, “garoa”: úr er skýja grátr ok
skára þverrir ok hirðis hatr (“é o pranto do céu e a colheita não feita e o ódio
do pastor”). No caso do poema anglo-saxão – diferentemente de seus
paralelos escandinavos – úr significa “auroque”. O auroque (Bos
primigenius) era uma espécie bovina natural da Europa, Ásia e norte da
África, mas que encontrou-se extinta em meados do século XVII. O auroque
era caracterizado por possuir grande porte físico, força e por seu instinto
selvagem. Uma das descrições históricas mais conhecidas do auroque aparece
na De Bello Gallico (livro VI, cap. 28) de Julio César: “Tertium est genus
eorum, qui uri appellantur. Hi sunt magnitudine paulo infra elephantos,
specie et colore et figura tauri. Magna vis eorum est et magna velocitas,
neque homini neque ferae quam conspexerunt parcunt (...)” [“O terceiro
gênero é dos que se chamam uros. São na grandeza pouco inferiores ao
elefante; têm a aparência, cor e figura do touro. Grande é sua força e
velocidade. Nem a homem, nem a fera, vistos, poupam (...)”]. Entretanto, o
nome da runa Úr ligada ao animal real e seu verdadeiro convívio com as
populações anglo-saxônicas pode ser algo questionável, cf. PAGE, 1973: 67-
68.
[124] No poema norueguês e no poema islandês essa runa é chamada de
“Þurs”, algo que podemos traduzir como “gigante” ou até mesmo “demônio”,
em frases como Þurs vældr kvinna kvillu (“Gigante/Demônio causa tormento
à mulher”) e Þurs er kvenna kvǫl ok kletta ibúi ok varðrúnar verr (“Gigante é
o tormento da mulher e o habitante no penhasco e o marido de Vardrun”).
Enquanto no Abecedarium essa runa é chamada de “Thuris”, cujo significado
preciso permanece desconhecido até os dias de hoje. As três runas que
iniciam o poema rúnico anglo-saxão (Feoh, Úr e Ðorn), assim como seus
equivalentes no poema rúnico norueguês e islandês, apresentam uma
problemática muito importante. Problemática que pode ser perfeitamente
aplicada para a análise das demais runas desses mesmos textos: o nome
atribuído a cada uma delas. Como vimos anteriormente na introdução, a
evidência mais antiga em fontes escritas contendo o nome de runas se
encontra no Abecedarium Nordmannicum, do século IX. O que podemos
considerar uma evidência “tardia” para se compreender a origem da
denominação das runas, sejam anglo-saxônicas ou escandinavas. Uma vez
que haveria todo um período anterior de formulação e adequação de tais
nomes, até que fossem registradas – de forma não muito clara – no
manuscrito de São Gall e demais textos. Uma das hipóteses mais recorrentes
seria de que os nomes das runas estariam de alguma forma ligada a palavras
que remontariam ao passado pagão de tais populações. Assim, tais nomes
poderiam estar atrelados às experiências e manifestações da religiosidade
norte-europeia. Esta hipótese foi trabalhada de diversas formas, com maior ou
menor grau de exageros e proselitismos e mesmo um posicionamento mais
cético, que rejeita tal hipótese (relegando assim teorias sobre a origem
religiosa pagã da nomenclatura das runas como algum parte de pura fantasia;
cf. PAGE, 1973: 66-67). Contudo, obviamente, se os nomes das runas de
alguma forma estavam originalmente ligados a esse passado pagão, a
introdução do cristianismo iria atuar para uma nova adequação das runas
dentro do universo das mentalidades do medievo europeu setentrional. Os
nomes das runas anglo-saxônicas como nós conhecemos datam de um
momento já pós-cristianização. Por outro lado, os nomes do Abecedarium
Nordmannicum parecem oriundos de uma Escandinávia que até então
permanecia, em sua maior parte, ainda pagã. E isso se torna de suma
importância para se estabelecer um paralelo. Supõe-se, com certo grau de
confiabilidade, que o significado da runa Thuris, presente no Abecedarium,
seja o mesmo da runa escandinava Þurs (“Gigante”/”Demônio”).
Remontando assim a uma origem germânica comum. Por outro lado, em
anglo-saxão, a mesma runa teria sofrido algum tipo de adequação a um
ambiente mais cristianizado. Onde o termo “gigante” e/ou “demônio” sai de
cena e em seu lugar temos a ideia do “espinho” como fonte de malefício.
Outra razão para a alteração de um nome seria o fato de que uma palavra
relacionada a uma ideia ou objeto perdesse seu significado original ou sua
“utilidade” original. Tornando-a desprovida de significado para seus
contemporâneos e necessitando sua alteração para uma nova palavra mais
pertinente. Um excelente exemplo é a runa Úr. Enquanto para os anglo-
saxões ela estava relacionada ao auroque, para noruegueses e – certamente –
para islandeses tal associação não faria qualquer sentido. Logo sua alteração
para “escória” provinda da fundição do ferro e à “chuva”; cf. PAGE, 1973:
67-68; KEMBLE, 1991: 26-35. Para uma discussão mais aprofundada do uso
de Þurs no contexto nórdico ver FROG, 2013.
[125]O poema norueguês interpreta “Óss” como “Estuário”, enquanto no
poema islandês “Óss” é uma clara referência ao deus Odin. No poema anglo-
saxônico “Os” permanece uma palavra controversa. Segundo alguns
primeiros pesquisadores, “Os” seria uma apropriação feita do latim para a
palavra “boca”. O que iria desvincular a runa de qualquer possível influência
pré-cristã (KEMBLE, 1991: 27; PAGE, 1973: 68). Todavia, apesar de
plausível, não nos parece uma explicação totalmente satisfatória. Parecendo-
nos, na verdade, até mesmo uma construção um tanto artificial ao levarmos
em consideração essa estrofe como um todo, não se restringindo apenas a
“Os” apenas como “fonte de toda palavra falada”. Para isso seria necessário
ignorar todo o contexto cultural existente na Inglaterra da época. A
associação de Os com a ideia de um “deus” fonte de toda palavra falada,
sabedoria e etc., não é destoante da conceptualização do deus cristão dentro
na Inglaterra anglo-saxônica e da hermenêutica cristã. Por exemplo, no
poema Beowulf (versos 1724 – 1727) temos: Wundor is to secganne hu
mihtig god manna cynne þurh sidne sefan snyttru bryttað eard ond eorlscipe
[“É uma maravilha dizer como para a raça dos homens o poderoso Deus, por
meio de Seu grande espírito, distribui sabedoria, terras e nobreza”]. Ideia
praticamente idêntica a que aparece, no mesmo período, na versão em inglês
antigo da Consolatio Philosophiae de Boécio. Na versão anglo-saxônica de
Boécio, a sabedoria (wisdom, em inglês antigo) é descrita como a mais alta
das virtudes (hehsta cræft), uma manifestação divina e, diferentemente do
simples poder mundano, possui a capacidade de conceder méritos e
qualidades àqueles que a buscar e a amar. Desta forma, a Sabedoria (neste
caso com “S” maiúsculo) estaria identificada com Deus, e ligada à ideia de
uma divindade que é o governante supremo, detentor de um poder que está
além da completa compreensão humana. Tal Sabedoria representaria o poder
de Deus de governar a Criação, o verdadeiro poder dos reis, dos homens e de
todos aqueles que detêm algum tipo de autoridade e bem a administram.
Conceito que remontaria a Santo Agostinho, ao dizer que “Cristo é a
Sabedoria de Deus” (Civitate Dei, XVII, 20) e ao Velho Testamento (“Eu sou
a Sabedoria, moro com a sagacidade, e possuo o conhecimento da reflexão
(...) É por mim que reinam os reis, e que os príncipes decretam a justiça; por
mim governam os governadores, e os nobres dão sentenças justas” -
Provérbios 8: 12-16). Além disso, tais associações cristãs com Os poderiam
ter sido “facilitadas” justamente em função de suas possíveis similaridades
pré-cristãs. Isto pode ser realizado ao observarmos seu desenvolvimento
fonético e o paralelo que pode ser estabelecido entre a ideia em torno da runa
Os, da Óss islandesa e da runa Ansuz do antigo futhark e sua ligação com a
figura do deus Woden/Odin. De forma sucinta, do antigo contexto germânico
teríamos inicialmente o som a /a/ referente à runa Ansuz (i.e. “deus”), um
cognato no nórdico antigo a Áss/Óss. Com desenvolvimento dos idiomas
germânicos ocidentais, teremos o surgimento de variantes deste mesmo som.
Em inglês antigo e no frísio a antiga Ansuz se desenvolverá nas runas Os, Ac
e Æsc (por exemplo, em nomes próprios, o som de Os se faz presente em
“Ōswald” e Æsc em “Æþelred”), cf. PAGE, 1973: 42-44. Do ponto de vista
“mitológico”, Ansuz – e consequentemente Áss/Óss e Os – estaria ligada a
figura do antigo deus Woden dos anglo-saxões e Odin dos escandinavos. O
antigo Woden permanece ainda uma figura complexa, uma vez que muito
pouco chegou até nós, nos deixando ainda no campo das conjecturas.
Contudo, a divindade ao que se pode imaginar desempenharia funções muito
semelhantes ao Odin nórdico. No caso de Odin, temos uma gama muito
maior de informações, onde a divindade desempenharia atividades ligadas à
guerra, morte, poesia, sabedoria e magia. Em uma das melhores fontes a
demonstrar a relação de Odin com as runas, o Hávamál, ao relatar o processo
ritualístico realizado pelo deus para obter o conhecimento das runas, entre
outros poderes místicos, temos: “Veit ek at ek hekk vindga meiði á nætr allar
níu geiri undaðr ok gefinn Óðni sjálfr sjálfum mér á þeim meiði er manngi
veit hvers hann af rótum renn. Við hleifi mik sældu né við hornigi nýsta ek
niðr nam ek upp rúnar œpandi nam fell ek aptr þaðan” [“Eu sei que eu pendi
numa árvore balançada pelo vento por nove noites inteiras, ferido por uma
lança, e dedicado a Odin, eu mesmo a mim mesmo; naquela árvore que não
sei de onde suas raízes vêm. Eles não me consagraram com pão nem com
qualquer chifre; eu contemplei lá embaixo, eu peguei as runas, gritando as
peguei e de lá eu cai.”]; e mais tarde, no mesmo trecho do Hávamál, uma
nova referência muito clara às runas e a utilização das mesmas, quando Odin
pergunta (talvez ao próprio leitor/ouvinte): “Rúnar munt þú finna ok ráðna
stafi mjǫk stóra stafi mjǫk stinna stafi er fáði fimbulþulr ok gørðu ginnregin
ok reist Hroptr rǫgna (...) Veiztu hvé rísta skal? Veiztu hvé ráða skal? Veiztu
hvé fá skal? Veiztu hvé freista skal? Veiztu hvé biðja skal? Veiztu hvé blóta
skal? Veiztu hvé senda skal? Veiztu hvé sóa skal?” [“Runas você pode
encontrar e letras auxiliadoras, letras muito poderosas, letras muito fortes, as
quais o sábio poderoso pintou e os deuses fizeram e que Hroptr dos deuses
gravou (...) Você sabe como deve entalhar? Você sabe como deve interpretar?
Você sabe como deve pintar? Você sabe como deve testar? Você sabe como
deve perguntar? Você sabe como deve sacrificar? Você sabe como deve
enviar? Você sabe como deve cessar?”]; cf. MEDEIROS, 2013a: 592 – 593.
[126]A ideia expressa no poema rúnico anglo-saxâo parece ser de simples
compreensão: cavalgar parece algo fácil e prazeroso quando ainda se está no
conforto de seu lar, mas algo grandioso e árduo quando de fato se está em
uma jornada.
[127]A palavra desta runa, Cen, não surge em nenhuma outra fonte em inglês
antigo; o que nos leva a supor que seja uma palavra específica para a runa.
Sua tradução como “tocha” pode ser deduzida a partir da leitura dos versos e
também pelos seus cognatos em alto alemão antigo chien, chen, ken (cf.
PAGE, 1973: 69). No poema rúnico norueguês e no islandês temos a palavra
Kaun para essa runa, i.e. “ferida”, “úlcera”. Enquanto no Abecedarium
encontramos a palavra Chaon, cujo significado é claro o que, de forma geral,
torna o entendimento original desta runa ainda obscuro devido sua
multiplicidade de significados e interpretações.
[128]
ðær hi æþelingas inne restaþ: numa tradução mais literal, “no interior
onde os príncipes se sentam/descançam”, i.e. uma alusão aos salões.
[129] Gyfu corresponde à letra “G” no inglês antigo como em “game” em
inglês moderno ou o g em “galo”, em português, quando no início ou no meio
da palavra. Ex.: god (bom), gamol (velho, idoso), fugol (pássaro), frumgar
(líder). Como fica claro pela leitura dos demais poemas rúnicos, Gyfu existe
apenas no poema anglo-saxônico. Gyfu, originalmente em inglês antigo
significa “presente”, “dádiva”. Mas no poema ele vem acompanhado da
palavra no plural genitivo gumena (“homens”, “humanidade”) passando a
significar “generosidade”, “ato de doação”.
[130]O texto traz a palavra Wen (“esperança”) que poderia ter sua origem na
palavra em frísio com a mesma grafia para “alegria”. “Alegria” em inglês
antigo seria Wynn, contudo Stephen Pollington possui a teoria de que talvez
de fato o texto queira dizer “alegria”, mas numa variante no dialeto
(possivelmente) do sudoeste da Inglaterra, (cf. PAGE, 1973: 69;
POLLINGTON, 1995: 45). O sentido dos versos é de simples compreensão:
aquele que conhece a tristeza e sofrimento não pode partilhar da alegria,
diferentemente daquele que é feliz por ser contente em possuir prosperidade e
um fortaleza abastada.
[131]
Hægl encontra exatamente o mesmo significado nos textos escandinavos
na palavra Hagall: “granizo”.
[132]Nyd, assim como seus cognatos em norueguês (Nauðr) e islandês (Nauð)
trazem a mesma ideia de “necessidade”, “sofrimento”, “aflição”, “opressão”.
[133]
Ger corresponde à letra “G” no inglês antigo quando está adjacente às
vogais e, i e æ possuindo assim o som de y como em “year” no inglês
moderno ou próximo o i em “Iemanjá” no português. Por exemplo.: gif (se),
geong (jovem), dæg (dia). Se assemelhando – mas não sendo o mesmo – que
o som da letra j no nórdico antigo em palavras como Jörmungandr, por
exemplo. Ger viria originalmente de jēra, do qual teria vindo também no
nórdico antigo Ár (presente tanto no poema norueguês quanto no islandês) e
cujo significado é o mesmo: “Ano”; ainda que haja a diferença do caractere
rúnico. Enquanto no poema rúnico Ger corresponda a um dos fonemas da
letra g em inglês antigo, nos poemas escandinavos Ár corresponde à letra a.
Cujo significado, em geral, está relacionado a algo benéfico e não exatamente
ao mero “ano” cronológico: “ano/período próspero”, “abundante” e etc.
Alguns tradutores optam por usarem termos como “estação” (o que não
estaria de todo distante do sentido original das palavras) ou ainda atribuindo
Ger ou Ár como equivalente a “verão (o que está equivocado). Sendo assim,
uma tradução alternativa a essa runa anglo-saxônica seria “O Ano
próspero/frutífero/farto/produtivo é alegria dos homens, quando Deus, o
sagrado Rei celeste, permite que o solo conceda excelentes frutos aos nobres
e aos necessitados”; e o mesmo se aplica aos poemas escandinavos (cf.
POLLINGTON, 1995: 47).
[134]Como em outros casos aqui já mencionados, Eoh referente a árvore do
teixo aparece em outras fontes grafada como eow ou iw. Esta runa não
aparece em outras formas nas variantes em futhark, apesar de se poder
estabelecer um com Ýr, como no poema norueguês. O que poderia ser um
indício de que esta seria uma runa vinculada ao teixo remontaria a uma
tradição mais antiga, mais ai estaríamos meramente no campo das
conjecturas.
[135]Peorð aparece unicamente no texto do poema rúnico anglo-saxônico, o
que torna seu significado e origem um completo mistério. Fazendo com que –
apesar de várias opiniões por parte de diversos pesquisadores (desde que o
texto estaria fazendo menção a algum tipo de jogo, à bebida, festas,
cerimônia e etc.) – qualquer suposição e/ou sugestão de seu significado não
avance além do campo das hipóteses (cf. POLLINGTON, 1995: 48; PAGE,
1973: 70-71).
[136]Assim como a runa anterior, não é claro ao que se refere Eolhx. Seu
significado parece se relacionar com Eoh e encontra seu equivalente pictórico
nos poemas escandinavos na runa Ýr. A principio é possível que a runa estive
ligada à palavra eolh (“cervo”). Entretanto, ainda nos primeiros estudos sobre
o poema que se notou a ligação entre Eolhx e seccard, como aparecem no
manuscrito. Em outros textos em inglês antigo temos a palavra eolhxsecg
referente a planta do junco, usada para se fazer papiro (PAGE, 1973: 71).
[137] Fiscesbeþ: “o banho dos peixes” (i.e. o mar, o oceano).
[138] Brimhengest: “cavalo das ondas” (i.e. barco).
[139]A runa Tir é mais uma que apresenta problemas quanto seu significado e
origem. Baseado no contexto da época e no que podemos encontrar nos
poemas rúnicos escandinavos, a origem dessa runa está atrelada à figura do
deus Tyr (para os escandinavos, Tiw entre os anglo-saxões). Um exemplo de
sua importância (tanto da runa quanto do deus Tyr) no contexto escandinavo
pode ser visto, por exemplo, na Edda Poética, no poema Sigrdrífumál
(estrofe 6) ao falar como gravar “runas vitoriosas” no punho de uma espada
se você anseia obter a vitoria e ao mesmo tempo evocar o deus Tyr (cf.
ORCHARD, 2011: 170). Entretanto, a forma como Tir se apresenta no texto
em inglês antigo não parece estar fazendo menção ao antigo deus de uma
única mão. Existe em inglês antigo a palavra tir, que está relacionada à ideia
de honra e/ou glória. Ainda assim, isso não ajuda a esclarece quem ou o que
seria Tir no poema. Independente ou não de sua ligação com a divindade
pagã, o mais provável é que Tir no poema rúnico anglo-saxônico esteja
fazendo menção a algum tipo de estrela ou constelação conhecida na época
(talvez até mesmo vinculada previamente ao deus Tiw/Tyr); cf. PAGE, 1973:
72.
[140] wrixlaþ spræce: literalmente “trocar falas”.
[141]Em uma tradução mais literal, Lagu seria “água”. Contudo, utilizamos a
palavra “oceano” de forma a concordar com a ideia geral apresentada pelo
poema.
[142] Ing, ao que podemos supor inicialmente, faz menção a uma personagem
germânica lendária. Não encontrando paralelos nos outros dois poemas
rúnicos escandinavos e nem mesmo no Abecedarium. Até onde podemos
apurar, não há qualquer personagem chamada “Ing” na tradição sócio-cultural
e literária da Inglaterra anglo-saxônica. O mais próximo disso é a personagem
de Ingeld, que surge nos poemas Widsith (versos 45 – 49) e em Beowulf
(versos 2063 – 2069), mas vinculando-o ao povo dos Headobardos. E ainda
na carta de Alcuíno de York ao mosteiro de Lindisfarne, em c. 797, onde
surge a célebre pergunta: Quid enim Hinieldus cum Christo? [“O que Ingeld
tem a ver com Cristo?”]. Entretanto, ainda no poema Beowulf temos o termo
Ingwine [“amigos de Ing”], utilizado por duas vezes (versos 1043 e depois
em 1321), ao se referir ao povo dinamarquês. Os Ingwine poderiam estar
relacionados aos Ingaevones que Tácito menciona na Germania (TACITO,
Germania, II), como um povo que vivia próximo ao mar. E mais tarde, Tácito
também menciona um povo que vive numa ilha e que cultua a deusa Nerthus,
que possuía uma carruagem (TACITO, Germania, XL). Posteriormente na
tradição escandinava, o deus Frey é representado como possuindo um tipo de
carro/carruagem (PAGE, 1973: 73 – 74). No século XIII, Snorri Sturluson em
sua Edda, no Skaldskaparmál, identifica outro nome para ele: Yngvi-Freyr,
filho de Odin. E antes disso, na mesma obra, Sturluson nos fala sobre Yngvi,
filho de Odin, que se tornou rei da Suécia e dele veio a linhagem dos
Ynglings (STURLUSON, 1987: 5 e 156); o mesmo se repetindo em outra de
suas obras, a Heimskringla, no início da Ynglinga saga (STURLUSON,
1990: 1 – 35). Na Edda Poética ele também surge nos poemas Helgakvida
Hundingsbana in fyrri (estrofe 55), no Reginsmál (estrofe 14) e Lokasenna
(estrofe 43); e no poema Hyndluljód – que não faz parte do manuscrito
original da Edda Poética – temos na estrofe 16 a menção aos Ynglings,
juntamente com os Skjöldungs como tendo uma ascendência em comum.
Sendo assim, ainda que a partir de indícios circunstanciais, todos esses
elementos podem sugerir que Ing presente no poema rúnico anglo-saxônico
estaria se referindo a uma divindade do passado (possivelmente o deus Frey)
que se valia de uma carruagem, mas que acabou passando por um processo
evemerista e transformado em um herói, atendendo as estruturas mentais
presentes no momento de concepção do poema (vide nossos comentários
anteriores na nota de rodapé sobre a runa Ðorn). Algo que ocorre de forma
semelhante no prólogo de Snorri Sturluson de sua Edda e na Ynglinga saga
ao tornar os deuses nórdicos em antigos heróis provindos do oriente e
conquistadores do norte-europeu. Ver também NORTH, 1997: 44 – 48.
[143]Eþel, em inglês antigo, está ligada à ideia de “terra natal”, “lar”, “local
de origem” e mesmo “propriedade” no sentido de terra. Apesar de não
encontrar paralelo nos poemas escandinavos e no Abecedarium, Eþel possui
grande similaridade – tanto gráfica quanto semântica – com a runa
Oþala/Oþila (“propriedade”, “posse herdada”) do antigo futhark; cf.
BARNES, 2012: 21-22 e 163. O manuscrito, segundo a transcrição de
George Hickes (cf. KEMBLE, 1991: 31; ENOKSEN, 2011: 45), traz um
texto exatamente como apresentado por nós nesse trabalho. Entretanto, outros
pesquisadores acreditam que na última linha dessa estrofe possa ter ocorrido
um erro (cf. POLLINGTON, 1995: 50; PAGE, 1973: 74; DICKINS, 1915:
20). Segundo eles, ao invés de “...brucan on blode bleadum oftast”, teríamos
na verdade “…brucan on bolde bleadum oftast” (grifo nosso). Alterando o
sentido do poema para “Terra Natal é preciosa para cada um dos homens, se
lá ele puder aproveitar do que é correto e apropriado à prosperidade
frequentemente atrelada ao lar”.
[144]Ainda que sua estrutura se apresente na forma de uma charada a respeito
da utilidade do carvalho para os homens – o que pode gerar dúvidas quanto a
seu real significado – a primeira parte da estrofe da runa Ac é muito simples:
“Ac byþ on eorþan elda bearnum flæsces fodor...” i.e. “O Carvalho é o que
na terra alimenta com carne todos os filhos dos homens...”. Claramente
podemos interpretar aqui que o fato do carvalho alimentar com carne, quem
quer que seja, está em sentido figurado. Que em função do uso do carvalho –
das mais diversas maneiras e propósitos – é possível aos homens se
alimentarem. Contudo, em algumas traduções é possível encontrar textos
fazendo menção à “carne de porco” (cf. DICKINS, 1915: 21; PAGE, 1973:
74), sem maiores explicações por parte de seus autores. Apenas insinuando
que o carvalho forneceria carne de porco aos homens ou alimentaria a carne
dos porcos. Fato que não está presente em nenhum momento na estrofe da
runa Ac. Não há neste trecho do poema qualquer palavra ou terminologia
relacionada a porcos, suínos ou qualquer outro animal. O que, ao que parece,
seria uma ação deliberada, a partir de pura conjectura, de enxertar
informações novas que não fazem parte do texto original. Tornando-o uma
recriação do texto anglo-saxônico e não uma tradução e/ou adaptação para
um idioma moderno.
[145] Há um problema aqui com a palavra elda. Em inglês antigo, uma
possível tradução seria “velho”, ou algo relacionado à idade. Mas ainda assim
não faria sentido com o restante do verso. Principalmente se compararmos
com a palavra eldum nos versos da runa seguinte. Uma possível solução seria
a de que talvez elda e eldum tenham sido copiados de forma errada e talvez o
correto seria algo referente a palavra eall (“tudo”, “todos”) o que faria mais
sentido na estrutura do texto.
[146] ganotes bæþ: “banho dos pássaros” (i.e. o mar, o oceano).
[147]Assim como outras runas anglo-saxônicas, Yr apresenta o problema de
não ser claro ao que ela se refere. Sabe-se que, segundo seus próprios versos,
a referência seria a algum tipo de arma. Mas a qual exatamente é fruto de
conjecturas. A hipótese mais aceita é de que o objeto em questão seria um
arco, principalmente pelo paralelo com o poema islandês, onde temos a runa
Ýr descrita como um “arco curvado”.
[148]Io ou Iar é mais uma runa problemática. Aqui também não sabemos a
que o termo se refere e qualquer análise etimológica se mostrou
absolutamente infrutífera. Além também de não encontrarmos paralelos nos
demais poemas rúnicos, a natureza do texto anglo-saxônico de se apresentar
como uma charada contribui ainda mais para o mistério. Alguns
pesquisadores tentaram interpretar a palavra e traduzi-la como “peixe”,
“enguia” ou ainda “castor”, mas novamente não passam de meras conjecturas
sem um embasamento concreto. O único consenso é de que se trata de algo
ou alguma coisa aquática. Portanto, a tradução de Io/Iar como sendo qualquer
um desses animais citados, ou até mesmo outros, representa simplesmente
uma escolha pessoal do tradutor e não algo significativamente conclusivo
dentro dos estudos sobre o poema até a atualidade; cf. POLLINGTON, 1995:
51; PAGE, 1973: 75; KEMBLE: 1991: 33; DICKINS, 1915: 23.
[149]O fato de o poema rúnico anglo-saxônico terminar com a runa Ear é no
mínimo interessante, e na verdade não seria um absurdo pensarmos que isso
tenha sido intencional por parte de seu compilador. Não há grandes
dificuldades interpretativas desta estrofe, não deixando qualquer dúvida de
que o assunto principal aqui é a morte e suas conseqüências aos seres
humanos. Para uma análise mais aprofundada da runa Ear do poema rúnico
anglo-saxônico ver PAGE, 1995: 71 – 85.
[150]Este trecho é de difícil compreensão. Devido a natureza da runa Þurs e
sua tradução como “gigante”, em diversas fontes “Varðrun(a)” é identificado
como sendo o nome de uma giganta. Contudo, isso não chega a ser um
consenso entre as próprias fontes e os pesquisadores, dando margem a outras
interpretações; cf. PAGE, 1999: 27.
[151] Outra tradução para aldingautr poderia ser “o velho Gautr”.
[152]O poema é de fácil compreensão. No que se refere a sua parte final, outra
possibilidade de tradução seria interpretar fár (“perigo”, “infortúnio”) como
far (“caminho”, “trajeto”), o que parece plausível e manteria o sentido geral
da runa Íss; cf. PAGE, 1999: 28.
[153]Ver nota de rodapé da runa Ger no poema rúnico anglo-saxônico; sobre
a parte final desta estrofe (“... algróinn akr”) ver também PAGE, 1999: 29.
[154]A parte final dessa estrofe pode ser uma adição posterior. Adição essa
que ao invés de “... ísa aldrtregi” é possível encontrarmos também “...
hverfandi hvel”; a mesma expressão encontrada no Hávamál (estrofe 84)
onde temos á hverfanda hvéli (“uma roda que gira”). No Alvísmál temos
hverfanda hvél relacionado à lua e, assim como no Hávamál, com a ideia de
como o coração das mulheres é volúvel (nesse último caso, como as fases da
lua). Ver PAGE, 1999: 29; MEDEIROS, 2013a: 575.
[155]A menção ao deus Tyr como “a sobra do lobo” faz referência à mitologia
nórdica, ao aprisionamento do lobo Fenrir; como descrito na Edda de Snorri
Sturluson (no Gylfaginning, capítulo 25) e na Edda Poética (no poema
Lokasenna, estrofes 38 – 40), por exemplo. Segundo o mito, temerosos pela
ameaça que representava, os deuses teriam tentado enganar e aprisionar
Fenrir, apostando se ele seria forte o bastante para se livrar da corrente
Gleipnir. Mesmo desconfiando da intenção dos deuses, Fenrir aceita o
desafio. Entretanto, exige que para que fosse acorrentado um deles, dos
deuses, deveria ter coragem o bastante para deixar a mão em sua boca,
enquanto os demais o prendiam. Tyr, o mais valente entre eles, se voluntariou
para o desafio. Fenrir foi preso e, por mais que tentasse, não conseguiu se
libertar de Gleipnir. Assim que o desafio terminou e os deuses se recusaram a
libertá-lo, percebendo a trapaça, Fenrir abocanhou e arrancou a mão direita
de Tyr; cf. STURLUSON, 1975: 44 – 45; STURLUSON, 1987: 24 – 25;
ORCHARD, 2011: 90 – 91. Ver também a nota sobre a runa Tir no poema
rúnico anglo-saxônico.
[156]Como no caso de Sól, aqui também é possível que a última parte da
estrofe da runa Tyr (“...ok hofa hilmir”) seja uma inserção posterior; cf.
PAGE, 1999: 29.
[157]
Existem muitas variantes entre as possibilidades de como seria composto
os versos dessa runa. Para nossa tradução utilizamos a transcrição baseada
essencialmente no manuscrito AM 687d 4º. Para maiores informações das
demais possibilidades ver PAGE, 1999: 29.
[158]A primeira parte dessa estrofe (“Maðr er manns gaman...”) pode ser
encontrada também no Hávamál, estrofe 47: Ungr var ek forðum fór ek einn
saman þá varð ek villr vega auðigr þóttumk er ek annan fann maðr er manns
gaman [“Há muito tempo eu era jovem, eu viajei sozinho, então acabei me
perdendo no caminho: me considerei rico quando eu encontrei outro, o
homem é o deleite do homem”], cf. MEDEIROS, 2013a: 567.
[159]Ver poema rúnico anglo-saxônico sobre a runa Lagu para maiores
informações; assim como para variações deste trecho do poema islandês ver
PAGE, 1999: 30.
[160]
A transcrição dessa runa é extremamente controversa devido ao estado
de conservação dos manuscritos e as divergências encontradas entre eles
(PAGE, 1999: 30). Para nossa tradução, nos baseamos nas transcrições de
POLLINGTON, 1995: 55; e também em DICKINS, 1915: 32.
[161] Ver DICKINS, Bruce. Runic and Heroic Poems of the Old Teutonic
People. Cambridge: Cambridge University Press, 1915.
[162]
Óss: Literalmente “boca” e pelo restante dos versos conclui-se que é a
“boca do rio”, i.e. o “estuário”.
[163]Na versão dessa mesma estrofe por Ole Worm em sua Danica Literatura
antiquissima (1636), ele identifica o nome da runa como Ridhr ao invés de
Ræið, e na segunda parte do verso lê-se: “... Raghn er sverdit bradesta”
[“Amaldiçoar/Maldizer é a melhor espada”], o que não parece ser mais
esclarecedor (ENOKSEN, 2011: 28). Não maiores explicações sobre quem
seria Regin mencionado no poema. Entretanto, em função do período e de
outras referências mitológicas em outras estrofes de outros runas, não seria
um erro supormos que esta também fosse uma referência ao universo
mitológico escandinavo. Sendo assim, podemos levantar a hipótese de que
Regin em questão fosse o mesmo que surge no mito envolvendo a história do
herói Sigurd, do dragão Fafnir e o tesouro dos Volsungos. A personagem
aparece, por exemplo, na Edda Poética (no Grípisspá, no Reginsmál e no
Fáfnismál), na Edda em Prosa (no Skáldskaparmál, capítulos 46 – 50) e
principalmente na Saga dos Volsungos. Regin é descrito como filho de
Hreidmar e pai adotivo do herói Sigurd e responsável por ter forjado para este
último a espada chamada Gram. Com ela Sigurd mata Fafnir e obtém para si
o tesouro do dragão. Para maiores detalhes sobre a história de Regin, Sigurd e
do tesouro de Fafnir ver STURLUSON, 1975: 164 – 168; STURLUSON,
1987: 99 – 103; ORCHARD, 2011; MOOSBURGER, 2009.
[164] Aqui o significado de Hagall talvez se aproxime mais ao sentido
encontrado no poema rúnico anglo-saxônico com a runa Hægl, associado à
ideia do granizo com um símbolo de “criação”, transformação, mudança.
[165] No manuscrito original, além das runas e seus nomes existem outros
elementos. Sob a runa feu temos a reprodução da mesma runa e sob as
palavras feu forman temos – escritos em estilo futhorc – “WREAT”; sobre a
runa hagal temos a runa Hægl; sobre naut temos a reprodução da mesma
runa; sobre a runa ar temos a runa anglo-saxônica Ac; sobre a runa man
temos Man anglo-saxônico; e sobre a runa yr temos a runa Yr do futhorc.
Claramente parecendo uma tentativa, por parte do responsável pelo
manuscrito, de estabelecer paralelos entre as diferentes formas de escritas
rúnicas; cf. DICKINS, 1915: 34

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