Você está na página 1de 133

Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Índice
UE e Direito da União Europeia: Terminologia e Enquadramento ................................................ 5
Fundamentos Históricos do Desígnio Europeu .............................................................................. 7
PRÉ-HISTÓRIA da UE: Até à I Guerra Mundial ............................................................................ 7
PROTO-HISTÓRIA da UE: ............................................................................................................ 9
Período entre Guerras Mundiais ........................................................................................... 9
Depois da II Guerra Mundial ................................................................................................ 11
HISTÓRIA da UE ....................................................................................................................... 12
Criação das Comunidades Europeias ........................................................................................... 12
Etapas do Processo da Construção Europeia ............................................................................... 16
Fases da Integração Económica ............................................................................................... 16
Etapa da Transição (1958-1968) .............................................................................................. 17
Etapa da Consolidação/Idade Adulta (1969-1992) .................................................................. 18
Processo de Consolidação e Maturação (1968-1986) ......................................................... 18
Ato Único Europeu (AUE) .................................................................................................... 18
Adesão de Portugal.............................................................................................................. 19
Idade Futura: União Europeia (1993-2009) ............................................................................. 20
Tratado de Maastricht ......................................................................................................... 20
Tratado de Amsterdão ......................................................................................................... 21
Carta dos Direitos Fundamentais da UE .............................................................................. 22
Tratado de Nice ................................................................................................................... 23
Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa ................................................... 24
Tratado de Lisboa ................................................................................................................ 25
Cronologia dos Tratados da UE ............................................................................................ 26
Tratado de Lisboa – Renovado Estatuto Jurídico da UE........................................................... 26
Método Comunitário de Integração ............................................................................................ 29
Ideia de Europa e Matriz Europeia .............................................................................................. 33
Cronologia Principal Detalhada ................................................................................................... 34
Características Comuns Estruturais do Sistema Institucional ...................................................... 38
Quadro Institucional Único ...................................................................................................... 38
Instituições, órgãos e organismos ........................................................................................... 38
Estrutura Institucional e Fontes de Legitimidade .................................................................... 39
Regime Comum de Funcionamento das instituições, órgãos e organismos ............................ 40
Princípios Fundamentais de Vinculação Institucional .................................................................. 43
Princípio do Equilíbrio Institucional ......................................................................................... 43
Princípio do Respeito pelo Acervo Comunitário ...................................................................... 45
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Princípio da Cooperação Leal .................................................................................................. 46


Princípio da Transparência ...................................................................................................... 47
Instituições, Órgãos e Organismos da UE .................................................................................... 49
Parlamento Europeu................................................................................................................ 49
Conselho Europeu ................................................................................................................... 55
Conselho da União ................................................................................................................... 58
Comissão Europeia .................................................................................................................. 62
Tribunal de Justiça da União Europeia ..................................................................................... 67
Banco Central Europeu ............................................................................................................ 73
Tribunal de Contas ................................................................................................................... 77
Órgãos criados pelos Tratados................................................................................................. 78
Alto Representante da UE p/ Negócios Estrangeiros e Política Segurança .......................... 78
Provedor de Justiça Europeu ............................................................................................... 79
Comité Económico e Social .................................................................................................. 79
Comité das Regiões ............................................................................................................. 80
Outros Órgãos...................................................................................................................... 80
Órgãos e Organismos criados pelo Decisor UE ........................................................................ 81
Comités Técnicos ................................................................................................................. 81
Organismos Personalizados ................................................................................................. 83
Sistema de Governo da União Europeia ...................................................................................... 84
Procedimentos de Decisão da União Europeia ............................................................................ 86
Procedimento de Aprovação de Atos Legislativos ................................................................... 87
Procedimento Legislativo Ordinário .................................................................................... 87
Procedimento de Aprovação de Atos Não Legislativos ............................................................ 89
Procedimento relativo aos Atos Delegados ......................................................................... 89
Procedimento de Adoção de Normas de Execução (comitologia) ....................................... 89
Procedimento de Vinculação Internacional UE ....................................................................... 90
Procedimento no âmbito da PESC ........................................................................................... 92
Fontes do DUE ............................................................................................................................. 93
DIREITO PRIMÁRIO .................................................................................................................. 93
DIREITO DERIVADO .................................................................................................................. 95
DIREITO CONVENCIONAL ....................................................................................................... 100
OUTRAS FONTES .................................................................................................................... 101
Articulação da Ordem Jurídica da UE com as Ordens Jurídicas dos Estados-membros ............. 103
Princípio da Autonomia ......................................................................................................... 103
Princípio do Primado do DUE ................................................................................................ 104

2
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Primado e CRP ....................................................................................................................... 106


Princípio da Eficácia Direta .................................................................................................... 108
Princípio da Aplicabilidade Direta ...................................................................................... 108
Princípio do Efeito Direito.................................................................................................. 109
Princípio da Interpretação e Aplicação Uniformes – art. 267º TFUE ..................................... 112
Princípio da Lealdade Comunitária ........................................................................................ 117
Princípio da Responsabilidade patrimonial dos Estados-membros por violação do DUE ...... 121
Contencioso da UE..................................................................................................................... 123
Recurso de Anulação – art. 263º ........................................................................................... 123
Ação por incumprimento – art. 258º, 259º, 260º.................................................................. 125
Direitos Fundamentais – uma “União de Direito” ..................................................................... 128
Cidadania da UE ..................................................................................................................... 131
Competência da UE ................................................................................................................... 132
Princípio da Especialidade – art. 5º/2 TUE............................................................................. 132
Princípio da Subsidiariedade – art. 5º/3 TUE ......................................................................... 133
Princípio da Proporcionalidade – art. 5º/4 TUE ..................................................................... 133

3
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

4
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

UE e Direito da União Europeia: Terminologia e Enquadramento


1950’s: Direito Comunitário – surge com as 3 comunidades europeias e designa o conjunto de
regras e princípios aplicáveis à existência e ao funcionamento da estrutura comunitária de poder.

Nos dias de hoje, a designação obedece a certos critérios metodológicos e abordagens do


modelo jurídico de integração europeia.
• Critério Institucional – Direito Comunitário, Direito das Comunidades Europeias, Direito
da União Europeia
• Critério Finalístico – Direito da Integração Europeia (associado a aspetos jurídicos de
integração económica, não refletindo a pluralidade de fins da ação da UE)1

O Tratado de Lisboa eliminou referência ao termo comunitário e derivados por isso:


MLD: Direito da União Europeia
➢ Conjunto de regras e princípios conformadores do estatuto jurídico da União
Europeia.
➢ Mas ainda é acertado falar-se de Direito Comunitário designando o direito
criado e aplicado segundo o método comunitário (que sobreviveu e se viu
reforçado pelo Tratado de Lisboa)

Direito Eurocomunitário – descreve a singularidade do modelo jurídico da UE, de


génese comunitária e de base europeia – não põe em causa a natureza adquirida da
expressão comunitário no processo de construção da UE mas enfatiza esta nova etapa
encetada com o Tratado de Lisboa.
= Direito da UE: conjunto de regras e princípios que regem a existência e
o funcionamento da União Europeia.
Ordem Jurídica UE
A. Aceção em sentido lato: abrange todas as disposições
aplicáveis à estrutura institucional da UE, incluindo regras e
Áreas de regulação material princípios definidos pelo decisor eurocomunitário com vista à
de fonte comunitária
regulação de aspetos relevantes da vida social, direta ou
indiretamente relacionados com os objetivos de integração.
Inclui os ramos do DUE.

B. Aceção em sentido restrito: identifica o Direito


Institucional, i.e., relativo ao funcionamento da estrutura
Direito Institucional
decisória da UE e o estatuto jurídico do poder da UE, incluindo
as matérias relativas aos meios de tutela judicial e à proteção
dos direitos fundamentais. É o tronco do DUE – objeto do nosso estudo.
Valores fundamentais e
identitários da UE – descritos
pelos Tratados

1
Há outras formulações – Direito Constitucional e Direito Administrativo da União Europeia – que
privilegiam o conteúdo regulador deste Direito. Tem uma abordagem político-ideológica que vê a UE
como uma pré-formação de Estado, imputando-lhe características da fenomenologia estadual
➔ Não são designações sinónimas do Direito institucional geral

5
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Raízes do DUE – Valores Comuns


➔ Princípio do Estado de Direito Democrático
o Primado do Direito: todo o poder está subordinado ao Direito
o Democracia Representativa: princípio da legitimidade democrática do poder
o Proteção dos Direitos Humanos

Tronco do DUE – Normas Materialmente Constitucionais


➔ Direito Institucional
o Estatuto jurídico do poder da UE
o Tutela jurisdicional dos destinatários desse poder
o Proteção dos direitos fundamentais.
➔ Corpo de instituições que compõe a UE, delimitado nos tratados institutivos, que fixam
a arquitetura institucional
o Repartição vertical de poderes – entre Estados-membros e UE
o Repartição horizontal de poderes – entre várias instituições da UE

O Direito da União Europeia NÃO É um ramo do Direito


➔ É um ordenamento jurídico autónomo e pluridimensional2
o Há uma pirâmide normativa de Kelsen para o DUE
o O próprio DUE tem ramos seus – “a robustez da árvore eurocomunitária avalia-
se pela quantidade e vitalidade dos seus ramos, representativos das várias áreas
de regulação material.”

Uma característica identitária do DUE é a sua expansibilidade – há normas comunitárias sobre


os mais variados aspetos da regulação jurídica da vida social.
• Vocação de crescimento normativo tentacular – normatividade de fonte comunitária
insinuou-se em quase todos os espaços típicos de regulamentação jurídica interna.
o Há até uma “comunitarização” dos ordenamentos jurídicos nacionais, apesar de
condicionada pelo princípio da subsidiariedade, que torna inevitável que o
Direito Material da UE passe a integrar os conteúdos específicos de várias
disciplinas jurídicas, de acordo com o princípio da complementaridade funcional
entre o ordenamento comunitário e os ordenamentos nacionais.
o MLD: já não há áreas internas imunes ao vírus da regulamentação
eurocomunitária

2
MLD: Redução do DUE a ramo do Direito parte de uma visão unidimensional e estadocêntrica sobre a
produção normativa e a legitimação das fontes que foi, há muito, substituída pelo paradigma do
pluralismo normativo.
É um ordenamento jurídico autónomo e próprio, caracterizado por:
• Sistema de Fontes – várias formas de revelação da normatividade no espaço de regulação
confiado à União Europeia
• Hierarquia de Normas - critério fundamental de estruturação das relações que se estabelecem
entre as múltiplas regras jurídicas em que se decompõe a ordem jurídica.
• Unidade – numa lógica centrípeta: fundacional, valorativa e lógico-formal
• Plenitude – sistema eurocomunitário garante uma resposta adequada às necessidades de
regulação

6
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

DUE estrutura-se em princípios que assentam em fenómenos de verdadeira integração política


• Princípio da aplicabilidade direta (caso dos Regulamentos)
• Princípio do efeito direto (cado das Diretivas)3
• Princípio do primado do DUE – todo o DUE sobre todo o Nacional4
o Princípios que resolvem os problemas das normas positivas de conflito – DUE é
pragmático e ele é que se aplica

Fundamentos Históricos do Desígnio Europeu


PRÉ-HISTÓRIA da UE: Até à I Guerra Mundial
Foi na Antiguidade Clássica que surgiu o nome Europa5 - associado à mitologia e identificado
como um espaço geográfico assimétrico, indefinido em relação à ásia, do Atlântico aos Montes
Urrais, sendo formado por identidades múltiplas e por um mosaico de paisagens, climas, povos,
línguas e culturas.
➢ Origem exprime uma vontade de autodeterminação cultural e política, face à Ásia
o Apesar da geografia incerta, há paradoxalmente, um código civilizacional
tendencialmente comum, na ascendência cultura (greco-romana) e na
mundividência religiosa (Cristianismo).

o História multi-secular da Europa tem uma constante: procura da unidade


▪ Seja pela força das armas (que engendra impérios) ou pela força das
ideias (visão política e filosófica)
• Na génese da construção europeia prevaleceu a força
motivadora das ideias – com os projetos da utopia europeia.

Período Medieval: valoriza-se o sentido geográfico da Europa


Humanismo Renascentista: Europa como “entidade histórico-cultural e política”

No período pós-medieval, finda a Respublica Christiana, com o advento de numerosos Estados


soberanos, cai o ideal de unidade europeia baseada na tutela política do império.
➢ Perdura uma “nostalgia de unidade” (TRUYOL y SERRA) que se alimentou numa base
religiosa.
o Com a Reforma, há uma divisão religiosa.

3
Não sendo transpostas, qualquer pessoa nacional pode invocar internamente com o argumento do
efeito direto das mesmas.
4
Há também uma subordinação política mas não há um projeto de integração política plena, pois cada
Estado-nação é um estado soberano (pleno sujeito de DIP)
DUE disputa com o Direito Constitucional o lugar cimeiro de Direito superior – o pluralismo
instalou-se no patamar normativo superior, com vários ordenamentos superiores a disputar a
aplicação preferente das respetivas normas.
Lugar do DUE é parâmetro de controlo da legalidade interna.
5
Por volta de 700 a.C. no poema “Teogonia” do grego Hesíodo

7
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

▪ Surge, noutra manifestação reinventada da “nostalgia de unidade”, o


imperativo ético e político de modelos teóricos e idealistas de “paz
perpétua”.

Europa de soberanias nacionais6 cuja referência política e normativa será a nova ordem jurídica
interestadual consagrada pela Paz de Vestefália (1648)
• Enquadra-se o aparecimento duma pluralidade de Estados soberanos e a igualdade
entre eles7
• Dos visionários precursores do movimento europeu destacam-se: Antoine Marini;
Duque de Sully; William Penn; Abade Saint-Pierre; Rousseau; Bentham;
o Kant, que sustenta um princípio de paz que não depende apenas de um pacto
de federação entre os Estados europeus (como a “Sociedade Europeia” de
Saint-Pierre) nem a associação de pequenos Estados para contrabalançar a
hegemonia dos grandes (de Rousseau) mas é mesmo uma “Federação de
Estados livres” de acordo com o modelo de constituição republicana baseada
na separação de poderes e igualdade perante a lei, ênfase na forma de poder
democrático e garantia de paz – advoga a aplicação de um Direito
Cosmopolítico, baseado no contrato de livre e permanente associação entre os
Estados, tendo como pressuposto o respeito do Estado de direito; (antevisão do
Direito Comunitário).
▪ Equilíbrio de Forças, orientado para impedir a prevalência hegemónica
de um ou vários Estados, foi responsável pela insegurança permanente
das relações dos Estados europeus.
▪ Estratégia de alianças entre Nações poderosas reduziu os Estados
pequenos à condição de submisso face a desígnios e interesses alheios.

Revolução Francesa: trouxe o 1desígnio expansionista de Napoleão Bonaparte + 2novas ideias


sobre igualdade e liberdade como princípios fundamentais da sociedade humana = perigo para
as monarquias europeias

4 potências vencedoras (Áustria, Inglaterra, Prússia e Rússia) estabeleceram, após o


Congresso de Viena (1814-1815), a Santa Aliança. Projeto do Concerto Europeu (a que
a França se juntou em 1818) consagra a nova estratégia de coexistência das soberanias
nacionais.

No séc. XIX, período de democracia liberal na Europa, há vários pensadores da unidade europeia
que se destacam8:
• Conde Saint-Simon (1814, estudo de uma Europa federal em torno da França, Grã-
Bretanha e futura Alemanha); percursor da tendência institucionalista que vingará no
séc. XX sob a forma dos Tratados Institutivos das Comunidades Europeias);
• Benjamin Constant (1815) federalismo assente na União pacífica dos povos europeus e
no respeito da liberdade das nações federadas);

6
À exceção dos planos de Pierre Dubois (1304) e de Dante Alighieri (1308), por exemplo.
7
Inscreveu-se no Direito das Gentes o princípio de plena soberania dos Estados, que atuam nas relações
internacionais como titulares exclusivos do poder e o exercem de modo livre e unilateral.
8
São as elites intelectuais que perspetivam uma abertura do Estado (absoluto e fechado sobre si) de
forma a que se consiga garantir a paz entre os Estados europeus.

8
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Ernest Renan (1870, plena guerra franco-prussiana, formação de federação europeia


como meio de aproximar duas nações tradicionalmente antagónicas9; Europa seria uma
“confederação de Estados reunidos por uma ideia comum de civilização”- respeitando
a individualidade de cada nação o elemento fundamental de legitimação de qualquer
comunidade política é o consentimento dos cidadãos, no seio dos seus Estados,
consentimento dos Estados, de todos os Estados, em relação ao ato fundador da
Federação)
o Vários Congressos de Paz foram realizados com intenção de aplicação de um
projeto federalista10

▪ Em 1889 inicia-se um novo ciclo de “Congressos Universais da Paz” –


legatários diretos do ideal de Paz Perpétua e dos Congressos anteriores
– além da divulgação alargada das diferentes correntes europeístas e
pacifistas, criou-se a União Interparlamentar11 (promovia a cooperação
entre os parlamentos como veículos privilegiados da ideologia pacifista)

PROTO-HISTÓRIA da UE:
Período entre Guerras Mundiais
Desde o Tratado de Versalhes à década de 40.

A I Grande Guerra levou a que os Europeístas clamassem “Unir-se ou morrer” (Gaston Riou,
1928).
➢ Apressou o declínio da Europa face aos EUA
➢ Germinava o pessimismo europeu.

Sociedade das Nações (Genebra, 10/2/1920) nasceu e viveu enfraquecida pelo paradoxo de
uma época de transição: impulsionada pelo presidente dos EUA Woodrow Wilson (que não
convenceu o Senado), apesar de ter vocação mundial, acabou dominado por potências
europeias como a Grã-Bretanha e a França.

Algumas iniciativas tentavam contrariar a atitude do pessimismo e desenvolver as teses da


unidade europeia. Destacou-se a obra de:
• Conde Coudenhove-Kalergi – propunha a criação de uma nova entidade, a União
“Paneuropa” (título do seu livro12 de 1923, publicado em Viena), sem a Rússia e a Grã-
Bretanha, de forma a garantir a paz nas relações europeias e assegurando a defesa
comum da Europa contra a política hegemónica russa e o poderio económico dos EUA.
o Seria sediada em Viena e possuiria um parlamento com 2 câmaras (Conselho
Federal com delegados de cada Estado e Assembleia com delegados dos

9
Antecipação de linhas de força que serão apresentadas, 80 anos depois, na Declaração Schuman
10
No Congresso de Paris, de 1850, Vítor Hugo previa os Estados Unidos da Europa (expressão de Cattaneo
e Gioberti e com muita aceitação da elite intelectual) mas não resistiu ao nacionalismo e visionava Paris
como a capital.
11
Ainda existe. Sede em Genebra e com 155 parlamentos nacionais (entre eles a AR) e 9 membros
associados.
12
Que teve um movimento fulgurante de divulgação com imensas traduções e apoio da fina-flor da cultura
europeias: Freud, Ortega y Gasset, Einstein.
Em 1926, reúnem-se mais de 2000 delegados de 24 países em Viena para o I Congresso da União
Paneuropeia (cuja a abertura foi com o atual hino da UE, “Ode à Alegria” de Bethoven).

9
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

parlamentos nacionais), um tribunal federal e uma chancelaria controlada pelas


2 câmaras.
o Cidadania europeia vinculada à cidadania nacional em que se respeitava a
identidade cultural e nacional dos seus povos.13
• Aristide Briand – em 5/9/1929 propôs uma federação chamada União Europeia num
discurso14 à SDN, sendo formalmente apresentado a 8/9/1930.
o Sem tocar nas soberanias das nações15, dever-se-ia configurar uma associação
comum no âmbito económico, político e social criando-se uma “espécie de
vínculo federal” (concretização seria num pacto constituinte da “União
Europeia”).
o Maior realismo da proposta foi na vertente económica da União em que se
propunha aproximar as economias dos Estados europeus (e já desde 192516 que
tinha surgido a “União Aduaneira Europeia” com a intenção de criar um grande
mercado livre europeu aberto à circulação de pessoas, mercadorias e capitais.).

Propostas dos anos 20 traduziam um certo idealismo político sem expressão fora do círculo
intelectual e diplomático, mas, lançam determinadas ideias que mais tarde estarão na base da
criação e aprofundamento das Comunidades Europeias.

Crise económica dos anos 30 e o triunfo dos regimes autoritários de inspiração nacionalista
impediu a realização de qualquer proposta de união.

Entre 1939 e 1945 ainda se fazem ouvir vozes favoráveis a uma Federação Europeia17.
➢ Triunfa um projeto de unificação entre os países do BENELUX – assinam em 1944 o
Tratado da União Aduaneira, que começa a funcionar em 1948 e ainda se mantém.
➢ Ainda se tentou (Winston Churchill e Jean Monet) a união política entre França e o Reino
Unido. A hipótese não é aceite e quando se consuma a libertação da França em 1945, o
projeto é abandonado definitivamente.

13
Obra quase profética que ainda não esclarecia, como acontece hoje, qual a natureza da soberania dos
Estados e o seu papel na União.
14
Teve apoio do seu homólogo MNE alemão, Gustav Streseman, que com ele celebrou em 1925 o Tratado
de Locarno em que se regulava questões pendentes entre os dois Estados.
15
Acalmava os ânimos dos defensores da causa nacional (muitos deles franceses) mas era uma
contradição insanável, pois qualquer fórmula de união federal pressupõe e implica uma limitação de
parcelas da soberania. Impulso do projeto estava intrinsecamente ligado à sinergia positiva das relações
de Briand e Streseman e, aquando das mortes destes, começou a definhar.
16
1926: Associação para a União Económica Europeia – Charles Gide.
Conselho Económico Paneuropeu franco-alemão – Coudenhove-Kalergi
➢ A união económica sempre foi uma preocupação com duplo objetivo: proteger a economia
europeia e garantir maior competitividade face ao crescente poderio económico dos EUA.
➢ Ideia entroncava-se na experiência histórica alemã da união aduaneira (Zollverein) de 1834
17
Coudenhove-Kalergi em 1939 publica “Europe Must Unite” como um apelo desesperado e indicação
profética de um destino a cumprir.

10
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Depois da II Guerra Mundial


Retórica europeísta é retomada no discurso de Churchil de 19/9/1946, apelando à criação de
uma estrutura que permita a Europa “crescer e viver em paz”.18

Acontecimentos antes de 1951 que culminariam no Tratado de Paris (1951):


• 5/6/1947 – Plano Marshall de ajuda económica dos EUA à reconstrução europeia
condicionado com a existência de um acordo entre Estados europeus sobre a
necessidade de desenvolvimento e com um plano adequado de aplicação e repartição
dos fundos financeiros, bem como a reconciliação franco alemã.
o EUA já não se isolaram como na I Guerra Mundial e intervêm com receio de que
os países cedessem ao bloco de leste.
▪ Com a perda de hegemonia europeia e destruição de recursos, os
Estados europeus eram “presas fáceis” para o bloco socialista.
o O plano Marshal veio acompanhado da exigência de que os Estados europeus,
reerguidos com o apoio dos EUA, teriam que impor uma política de comércio
livre.19

o Proposta aceite por 16 Estados reunidos em Paris, um mês depois20 –


Organização Europeia de Cooperação Económica (OECE) foi fundada (em 1948)
para administrar o plano21
o Gestão europeia do Plano criou novos laços institucionais de cooperação e
solidariedade política entre os Estados europeus.
Março 194722 – Tratado de Dunquerque corporiza a primeira iniciativa de cooperação
militar europeia do pós-guerra. França com Reino Unido, estendido depois ao BENELUX
(Tratado de Bruxelas, 194823) para fazer face à ameaça soviética.
o Em 1954 daria origem à União da Europa Ocidental

• 7 e 11/4/1948 – Congresso da Europa, em Haia, com mais de 700 delegados,


representantes das múltiplas correntes do movimento pró-europeu (unionistas
britânicos vs. federalistas franceses, italianos, belgas e etc.).
o Aprovou-se moção final com a convocação de uma 1)Assembleia Europeia, eleita
pelos parlamentos nacionais, que deveria analisar as medidas adequadas para
a criação de uma União (confederação) ou de uma Federação; da 2)instituição
de um Tribunal (para assegurar respeito Direitos do Homem); da necessidade

18
Apela à reconciliação da Alemanha e da França mas afasta o Reino Unido de um plano de integração
política, sendo apenas um “amigo e protetor da nova Europa”. Desde sempre que as relações do Reino
Unido com a Europa continental resumem-se a uma frase de Churchill: “We are with them, but we are no
tone of them…”
Churchill propunha inclusive os Estados Unidos da Europa para “eles” – potenciado pelo receio do
comunismo da URSS
19
Preço que os EUA pagaram para haver um “tampão” do comunismo. O receio da ideologia da URSS
levou a que se criasse a NATO, em 1949, como um exército de defesa comum contra qualquer expansão
soviética (nos países de leste forma-se uma entidade semelhante com o Pacto de Varsóvia).
20
Muitos presentes. Entre os ausentes nota-se a Alemanha, Espanha, União Soviética e restantes países
de Leste.
21
Substituída em 1960 pela OCDE, acolhendo também Estados não europeus. Hoje tem o papel de fazer
rankings dos Estados-membros.
22
Ano em que Coudenhove-Kalergi promovia a criação da União Parlamentar Europeia.
23
MNE francês oficializou a mensagem do Congresso de Haia ao propor criação de uma união económica
e monetária e convocação de um parlamento europeu.

11
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

de criar-se uma 3)união aduaneira com livre circulação de capitais e unificação


monetária.
24

1949 – aspirações da ala unionista, do método intergovernamental, levou a que


se criasse o Conselho da Europa
➢ Criada pelo Tratado de Londres
➢ Sede em Estrasburgo – é uma organização de cooperação política
que centrou a sua atuação na promoção e defesa dos valores
relacionados com a democracia representativa, princípios da DPH,
liberdade política e primado do Direito.
o Proclamação da CEDH e instituição do TEDH
o Antecâmara de adesão às Comunidades Europeias –
controlo para autenticar se há uma “verdadeira
democracia” e respeito pelos Direitos Humanos (uma vez
que se estarão a vincular à CEDH)
➢ Tem 47 Estados – Grande Europa – representação comum de
valores e herança cultural.
o Garantiu enquadramento político às Comunidades
Europeias e desde 1993 que facilita a articulação entre os
espaços europeus parcialmente sobrepostos, de
conformação da vertente política das soberanias dos
Estados europeus – a Grande Europa e a Pequena Europa.
1951 – ao encontro da corrente federalista, convertido ao método
funcionalista, levou a que se criasse a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço
(CECA)

HISTÓRIA da UE
Desde a Declaração Schuman (9/5/1950) em diante.

Criação das Comunidades Europeias


Em Setembro de 1949 fora proclamada a República Federal da Alemanha – recuperação da sua
economia e da sua estrutura jurídico-institucional (com a Lei Fundamental de Bona). Renasce na
cena internacional a Alemanha Ocidental, com apoio dos EUA.

A 9/5/195025, na Sala do Relógio do Quai d’Orsay, Robert Schuman, MNE Francês anunciou um
plano26 que pôs em marcha o processo de integração europeia.
➔ Declaração Schuman (Aliança entre antagonistas tradicionais)

24
Multilateralidade regional (do DIP) com 2 orientações face às linhas de institucionalização:
I. Unionista/Intergovernamental – método de cooperação internacional; desde 1949 com o Conselho da Europa em que
o caráter vanguardista é só na proteção do indivíduo (aprovam CEDH e criam TEDH).
II. Federalista/Supraestadual – método comunitário ou de integração; desde 1951 com a criação do CECA -> CEE -> UE
25
Assinalado hoje como o Dia da Europa (desde a sua adoção na Cimeira de Milão em 1985)
26
Concebido por Jean Monet e com a ajuda de Etienne Hirsh, Pierre Uni e Paul Reuter (redator) – apenas
anunciado após a França já ter conseguido, nos bastidores, a aprovação da Alemanha.
Na Declaração faz-se menção que já há “20 anos” a França tenta – referência a Aristide Briand.

12
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• 1º caminho, curto-prazo: reconciliação franco-alemã com a gestão em comum do


carvão e do aço.
o Subordina a gestão destes dois produtos, que tradicionalmente alimentavam o
esforço de guerra a uma Alta Autoridade, comum, que controlasse e regulasse
a produção, o comércio e a circulação dessas duas matérias
▪ Leva à instituição da CECA
o Plano Schuman retoma ideias de 1943, a que Jean Monet se referiu como
modelo de gestão conjunta da indústria pesada franco-alemã, mediante a
transferência de poderes de soberania e criação de um grande mercado.
• 2º caminho, longo-prazo: criação de uma federação europeia – entidade política que
congregasse Estados europeus.
o Advento dum novo método de integração: “A Europa não se fará de um golpe,
nem numa construção de conjunto: far-se-á por meio de realizações concretas
que criem em primeiro lugar uma solidariedade de facto”
▪ Aberta à adesão de outros Estados, havia uma proposta de
“comunitarização de produções de base e da instituição de uma nova
Alta Autoridade cujas decisões vincularão a França e a Alemanha”27
▪ Bases concretas indispensáveis à paz.
▪ Método de Integração Funcionalista – método dos pequenos
passados ou do gradualismo de points of no return – atribuição de
poderes de soberania a um órgão de autoridade comum e
independente (Alta Autoridade) havendo uma fusão de interesses, com
o desenvolvimento de relações de vinculação e subordinação jurídica.
➢ Aposta-se na integração dos mercados (sectorial e
progressivamente), não sendo possível avançar pela união
política.28
➢ “Com a organização conjunta da produção de base e a
instituição de uma nova Alta Autoridade, cujas decisões
vinculam a França, a Alemanha e os países que venham a
aderir, esta proposta lançará os alicerces de uma
Federação Europeia, indispensável à preservação da paz.”
o Ingredientes fundamentais e distintivos do modelo de
integração comunitária.

Com a Alta Autoridade temos aqui o 1º esboço da Comissão Europeia – a marca principal é a
independência dos comissários face aos interesses nacionais, pois há uma ação por interesses
comuns, de razões comunitárias.

27
Pragmatismo na decisão – objetivo é a paz, logo escolhe-se o setor que mais ameaçaria esse objetivo.
Apresentação dum novo e fluido conceito: Supranacionalidade
• Não de modo expresso, mas estabelece as condições de existência e funcionamento da Alta
Autoridade como as de um órgão supranacional – decisões vinculativas para os aderentes com o
objetivo da gestão do interesse comum; composição independente e designadas paritariamente
o Projeto vanguardista do método comunitário de integração funcionalista europeia,
conferindo caráter supraestadual a uma entidade que terá poderes sobre domínios
tipicamente conferidos aos Estados.
28
Instituindo uma zona onde se abolem as barreiras alfandegárias para o comércio – Zona de Comércio
Livre

13
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Além da Alta Autoridade, com a CECA forma-se uma Assembleia de Delegados dos
Parlamentos Nacionais (génese do Parlamento Europeu) e um Conselho dos
Representantes dos Estados.29

Reação positiva à Declaração Schuman, cujo plano avança com fulgor e dinamismo.
• Konrad Adeneur discursa no Parlamento de Bona vendo na proposta o “ponto de partida
para a realização de uma estrutura federativa da Europa”
• Países do BENELUX e a Itália aceitam convite francês de participar na iniciativa
o 6 membros originários30 cuja manifestação pública de vontade comum ocorreu
a 3/7/1950

18/4/1951 – Tratado de Paris31


➔ Cria-se a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA)
o Destinado a vigorar por 50 anos (até 23/7/02)32
o Jean Monet foi o primeiro presidente da Alta Autoridade

Art. 9º referia já expressamente a supranacionalidade – conceito esbatido pois não se referia à


Comunidade em si, mas à natureza das funções da Alta Autoridade e o Conselho de Ministros
incarnava o princípio oposto da legitimidade intergovernamental.
• Tratados de Roma de 1954, institutivos da CEE e da CEEA, omitiram qualquer menção à
supranacionalidade.
• O artigo foi revogado em 1965 pelo Tratado de Fusão – devido à inadequação do termo,
associado a uma ideia de hierarquia ou de tutela das nações por um poder que estaria
acima dos Estados.

Guerra da Coreia em Junho de 1950 leva a que EUA pressionem Europa Ocidental a equacionar
o problema da sua defesa face ao expansionismo ideológico e militar dos regimes comunistas.
• Europeístas convictos (Jean Monet e René Pleven) avançam para a ideia de um exército
comum germano-francófono.33
➔ Outubro de 1950 – proposta da Comunidade Europeia de Defesa (CED)
➔ 28/5/1952 – Tratado que institui CED
➔ 1954 – Assembleia Nacional Francesa não ratificou, abortando todo o
processo.34

29
A Declaração Schuman lança um plano moderado e não radicalmente federalista, havendo também a
necessidade de conjugar a legitimidade intergovernamental.
30
Processo pensado em função de um espaço aberto a outros Estados europeus desde este “ano zero da
integração europeia” (MLD).
Dinamismo de alargamento comunitário com a consequência duma transformação profunda da UE, na
sua estrutura orgânico-decisória e nas suas relações com os Estados-membros.
31
Entra em vigor a 10/8/1952 após última ratificação da Itália
32
Se bem que já desde 1958, com as outras Comunidades Europeias, sendo a CEE a verdadeira locomotiva
do processo de integração, sofre um definhamento institucional. A indústria siderúrgica e carbonífera
sofrem também uma crise.
Em 2002, todo o ativo e passivo da CECA foi transferido para a Comunidade Europeia, mas destinado à
criação dum Fundo de Investigação do Carvão e do Aço.
33
Impulsionado, também, pelos receios franceses do renascimento dum exército alemão sem controlo
europeu.
34
MLD: “as nações, mais que a Guerra, temem a perda da soberania”

14
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

o Recusa francesa fez, também, ruir a projetada Comunidade Política


Europeia (CPE) que instituiria laços de vinculação federal com vista à
união política.

Obrigou-se a mudar a estratégia da integração política: por atalhos e não pela estrada aberta
da federação.
• Retorna-se ao “realismo” do método ensaiado pelo Tratado de Paris – método
funcionalista anunciado pela Declaração Schuman.
o Em Messina, em 1955, numa conferência dos 6 aposta-se no desenvolvimento
duma fusão progressiva de economias e criação de mercado comum,
harmonizando políticas sociais.35

Ambiente pragmático, de não diluição dos Estados-nação e de integração económica, que


proporciona a preparação dos 2 Tratados de Roma
25/3/1957 – Tratados de Roma36
➔ Institui-se a Comunidade Económica Europeia (CEE) – estabelecimento de mercado
comum geral, com regras aplicáveis a todos os domínios da atividade económica.
➔ Institui-se a Comunidade Europeia da Energia Atómica (CEEA ou EURÁTOMO) –
solidariedade sectorial no setor específico da energia atómica.
➔ Assina-se convenção relativa a certas instituições comuns às 3 Comunidades Europeias:
Assembleia e Tribunal de Justiça.

Triunfo de um projeto de unidade europeia que, sem deixar de ser político e visionário, se
alimenta e renova a partir da força motriz que resulta da unidade sinérgica dos mercados.
➢ Entra-se num trajeto comum com 30 anos de estabilidade do estatuto jurídico das
comunidades.37

35
Volta-se ao caminho da solidariedade de facto
36
Entram em vigor a 1/1/1958
37
Havendo uma complementaridade entre organizações europeias de cooperação intergovernamental e as de
integração supranacionais.
• Plano económico – Organização Europeia de Cooperação Económia (OECE), 1948. Que em 1960 integrou
Estados não europeus e passou a Organização de Cooperação para o Desenvolvimento (OCDE). Associação
Europeia de Comércio Livre (EFTA), 1960, ligada à UE desde Maio de 1992 instituindo Espaço Económico
Europeu. A Leste surgiu a COMECOM
• Plano político – diálogo entre UE e restante Europa é assegurado pelo Conselho da Europa
• Plano militar – desde o fracasso da CED que procuram projetos de cooperação e não comunitários. NATO,
1949, apesar de não ter só Estados europeus foi fundamental na estratégia geopolítica e militar de defesa
da Europa ocidental. União da Europa Ocidental (UEO), 1954, extinta formalmente desde 2011.

15
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Etapas do Processo da Construção Europeia


Periodificação acompanha o processo de construção tal como definido e enquadrado pelos Tratados de Roma.

Fases da Integração Económica


Objetivos e natureza do projeto de construção eurocomunitária assentaram no método
funcionalista, esboçado pela Declaração Schuman, com um grande foco na integração
económica.
Quatro fases da integração económica, surgidas de forma sequencial e com um pressuposto de
irreversibilidade:
1) Zona de Comércio Livre – desde 1957 com a CEE
a. Estados acordam, por Tratado, a eliminação dos entraves tradicionais nas
relações comerciais entre Estados.
b. Eliminam-se as barreiras comerciais e garante-se a livre circulação de
mercadorias nas relações entre os Estados participantes.
c. Com Estados terceiros, cada país aplica a sua pauta aduaneira.
d. Teoria postula a experiência – é transitória – ou evolui para estádio superior ou
não resiste às tensões dos interesses nacionais e se extingue
e. Ex: EFTA em 1960 – Mega acordos comerciais com vista à liberalização das
relações comerciais (caso atual do CETA)
2) União Aduaneira
a. Livre circulação de mercadorias é alargada a todos os produtos (incluindo os
agrícolas)
b. Aplicação de uma pauta aduaneira comum na relação com Estados terceiros –
política comercial comum com os mesmos direitos de importação e exportação
na relação com o mundo exterior
3) Mercado Comum – desde 1987 com o Ato Único Europeu
a. Modalidade mais avançada de integração que acrescenta ao regime da união
aduaneira a livre circulação dos fatores produtivos (capital e mão-de-obra)
i. Quatro liberdades: livre circulação de mercadorias, pessoas, serviços e
capitais
b. Políticas comuns – harmonização das legislações nacionais com o derrube ao
protecionismo38
i. Objetivo de realização do mercado interno/único que pode ser
entendido como uma fase última de acabamento dos fins subjacentes
à forma do mercado comum (art. 26º TFUE)
4) União Económica e Monetária – preparado desde o Tratado de Maastricht com o
objetivo de ser realizado por fases (sendo o mais importante o alcançar uma moeda
única)
a. Modalidade mais completa de integração – coordenação das políticas
económicas, sociais, financeiras e monetárias
b. Aprofundamento do processo de harmonização ou uniformização das
legislações nacionais direta ou indiretamente relacionadas com o
funcionamento económico
c. União monetária

38
Art. 114º e ss. acabaria com os tradicionais entraves

16
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

No estádio atual de evolução da integração económica europeia, a UE ainda combina


elementos típicos de união aduaneira, mercado comum e união económica e monetária.
➢ No domínio da política monetária a moeda única, o euro, concretiza o objetivo último e
mais ambicioso.
➢ Nos outros domínios (livre circulação de pessoas e harmonização da legislação fiscal)
ainda estão por realizar pressupostos básicos de funcionamento do mercado comum.

Vejamos como chegámos à configuração atual da UE.

Etapa da Transição (1958-1968)


O primeiro objetivo do Tratado da CEE era a realização da União Aduaneira – período de
transição de 12 anos para se chegar ao Mercado Comum, que visava assegurar a liberdade de
circulação de mercadorias, pessoas, serviços e capitais, bem como um certo número de políticas comuns
e um mecanismo de harmonização das legislações internas.39
• Economia dos 6 Estados-membros teve grande prosperidade e desenvolvimento que
antecipou-se o fim do período transitório da União Aduaneira para 1/7/196840

Sofreram 2 períodos de discordância política, protagonizados pela França41:


1963 – Recusa francesa ao pedido de adesão do Reino Unido42
1965 – “Política da Cadeira Vazia” – quando o Presidente da Comissão (Hallstein) propõe sistema
de recursos financeiros próprios da Comunidade, França exige a retirada da proposta; Comissão
recusa e França não comparece às reuniões do Conselho de Ministros (que presidia), paralisando
o funcionamento das Comunidades, que decidia por unanimidade
• Este embate de conceções metodológicas de construção europeia (supranacional-
comunitária vs. intergovernamental) dura 6 meses e soluciona-se com o “Acordo do
Luxemburgo” que garantiu o poder de veto sobre decisões importantes
o Acordos de Luxemburgo – reforço da componente intergovernamental (poder
isolado dos Estados) – reconhecia direito de veto aos Estados quando eles
invocassem a proteção de interesses nacionais.43
▪ Encarados como compromissos políticos que formaram um costume
contra legem (em relação aso Tratados de Roma que regulavam o
funcionamento do Conselho de Ministros)

39
Transição para uma nova etapa de integração económica do Mercado Comum (cujos conceitos chaves
são: ideia da livre circulação pela abolição das taxas alfandegárias, pauta aduaneira comum,
harmonização de legislações nacionais, políticas comuns.)
40
Nos outros domínios o período de transição expirou a 1/1/1970
41
Liderada por De Gaulle, que considerava que qualquer entidade supranacional era uma quimera em
que não havia “outra Europa possível que não seja a dos Estados”
➢ Planos Fouchet – França tentava encaminhar as Comunidades Europeias no sentido de
cooperação intergovernamental e duma “Europa das Pátrias” (visão soberanista – 1960)
o Depois dum arranque a todo o gás da CECA para a CEE e a EURÁTOMO há um travar
da euforia europeia pelos Planos Fouchet (planos de evolução económica da França)
do General De Gaulle.
42
Que só consegue em 1969 com a saída de cena do General Charles De Gaulle
43
Alteração da regra de deliberação por maioria para a regra do consenso. Projeto europeu de génese
comunitária reforça a componente intergovernamental (dualidade metodológica que faz deste projeto
europeu um OPNI)

17
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Tratado de Fusão/Tratado de Bruxelas


1965
➢ Estabelece Conselho único e Comissão única para as 3 comunidades;
o Antes de 1965 cada comunidade tinha a sua estrutura institucional e com o
Tratado de Bruxelas criou-se uma estrutura institucional comum/quadro
institucional único passando a falar-se apenas de Comunidades.

Etapa da Consolidação/Idade Adulta (1969-1992)


Sucessor de De Gaulle, Georges Pompidou, toma a iniciativa de convocar Cimeira de Chefes de
Estado e de Governo: Cimeira de Haia (Dezembro de1969)
• Acabamento – concluir a realização do Mercado Comum e financiamento das políticas
comuns através de recursos próprios (reforma das finanças comunitárias, consagrando
em 1975 um sistema de recursos próprios e reconhecidos poderes de decisão
orçamental ao Parlamento Europeu – legitimidade Parlamento Europeu por sufrágio
universal e direto)
• Aprofundamento – desenvolvimento de políticas comuns e lançamento das primeiras
bases da união económica e monetária (1972 – instituição da “serpente monetária”;
1978 – criação do sistema monetário europeu)
• Alargamento – abertura das negociações com vista à admissão de outros candidatos a
Estados-membros
o 1/1/74 – entrada do Reino Unido. Dinamarca e Irlanda. Noruega na sequência
de referendo não chegou a ratificar o tratado de adesão
o Sucessivos alargamentos cumpriram o desiderato de 1969 de criar um grande
espaço de integração económica – em 2 décadas, UE passou de 12 para 28 Estados

Processo de Consolidação e Maturação (1968-1986)


Duplicação dos membros e aperfeiçoamento dos modos de decisão, atualizando a matriz
comunitária de integração:
• Eleição do Parlamento Europeu por sufrágio direito e universal (1979)
• Institucionalização das Cimeiras de Chefes de Estado e de Governo – desde 1974 como
Conselho Europeu
• Iniciativas político-institucionais de relançamento do projeto europeu: Relatório
Tindemans (1975), Três Sábios (1979), Genscher-Colombo (1981), Projeto Spinelli
(Parlamento projeta tratado da união europeia – 1984)
• Aprovação da primeira revisão dos tratados institutivos das Comunidades Europeias com
o Ato Único Europeu – assinado em Fevereiro de 198644

Ato Único Europeu (AUE)


Assinado em fevereiro 1986 -> em vigor a partir de 1/7/1987.

44
Conselho Europeu de Milão em junho de 1985, convoca a Conferência Intergovernamental que
aprovaria o projeto de tratado. Processo de ratificação, após assinatura, foi atribulado devido a
referendos e revisões constitucionais nos vários Estados-membros (dificuldades que se tornariam uma
constante no processo de ratificação de tratados institutivos da UE)

18
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Um único instrumento com um leque vasto e heterogéneo de disposições que aprofundam o


projeto de integração comunitária existente e lançam as bases da futura UE.
Consagra-se no texto dos tratados:
• Existência do Conselho Europeu – emissor de normas que passa a poder deliberar por
maioria qualificada e não por unanimidade (evolução num sentido comunitário45 – pois
já é possível passar deliberações contra a vontade de um Estado; os Estados perdem o
poder de veto)
• Alargou poderes do Parlamento Europeu – aumento de poderes de cooperação na
elaboração legislativa por parte do Conselho – pela primeira vez, devido ao reforço da
legitimidade democrática, participa no processo legislativo (e deixa de ter apenas
controlo político do poder executivo – a Comissão) mas continua sem poder decisório
normativo isolado.
• Clarificou função executiva da Comissão Europeia
• Previu a criação do Tribunal de Primeira Instância, associado ao Tribunal de Justiça

Reforçou políticas comunitárias e atribuiu novos poderes às Comunidades Europeias com o


intuito de facilitar a realização dum verdadeiro mercado interno (a ser concretizado até 1992).

Prevê-se um modelo comunitário de desenvolvimento baseado na coesão económica e


social46, tendo como instrumento fundamental a coordenação dos fundos estruturais e de
outros mecanismos financeiros complementares.

Consagra cooperação intergovernamental em matéria de política externa – Cooperação


Política Europeia para a “convergência de posições e realização de ações comuns”.

AUE exprimia a vontade dos Estados-membros de criar e por em funcionamento a UE (já se


preparava Maasctricht)

Adesão de Portugal
Pedido português de adesão foi formulado em 28/3/1977 – perspetiva de longa e gradual
aproximação de Portugal às Comunidades Europeias que só poderia, contudo, culminar na
adesão depois da instauração de um regime verdadeiramente democrático.

Com um parecer favorável da Comissão em 19/5/1978, o Conselho exprimiu uma posição


favorável em 5/6/1978.
➢ Seguiram-se 7 anos de negociações entre Portugal e a Comissão, dificultadas pela
turbulência da vida política portuguesa e pelo receio dos Estados-membros do
alargamento à Europa do Sul.

Sob o impulso de uma declaração política do Parlamento Europeu, negociações foram


concluídas e os tratados de adesão de Portugal e Espanha assinaram-se a 12/6/1985 (no
Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa e, horas depois, em Madrid).
➢ Portugal entra como Estado-membro nas Comunidades Europeias a 1/1/1986.

45
Avanços do projeto europeu foi um constante equilibrar do método intergovernamental e comunitário.
46
Já se preparava a integração política ao considerar-se o cidadão europeu – já não e só a Europa dos
mercados. Europa dos direitos cujo caminho foi trilhado pelo Tribunal de Justiça – começa-se a falar de
matérias extraeconómicas.

19
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Idade Futura: União Europeia (1993-2009)


Acontecimentos políticos de 1989-1990 e a perspetiva de uma adesão futura dos Estados recém
saídos da esfera soviética estiveram na base de uma enérgica iniciativa franco-alemã (Eixo
Paris-Bona entre Miterrand e Kohl) que juntamente da estratégia voluntarista de Jacques Delors
à frente da Comissão Europeia funcionava como um “acelerador intracomunitário”.

Desde a Cimeira de Paris (1972) que a criação de uma verdadeira união europeia era um
objetivo assumido pelos Estados-membros – “Declaração Solene sobre a União Europeia”
(1983) feita pelo Conselho Europeu de Estugarda firmou um compromisso de democratizar e
aprofundar o acervo comunitário com o fim de estabelecer as bases duma união europeia.

Plano Delors – submetido ao Conselho Europeu de Madrid (junho de 1989) – preconizava a


realização da união monetária e a união económica.
• Em dezembro de 1989, o Conselho Europeu de Estrasburgo determinou a convocação
formal de:
o Conferência Intergovernamental (CIG) sobre a União Económica e Monetária
(UEM)
o CIG sobre União Política – debatidas questões sobre o princípio da
subsidiariedade, Comunidades Europeias e atuação nas relações internacionais,
proteção direitos fundamentais, estatuto da cidadania europeia e etc.
o Resultado das 2 CIG: apresentação de um tratado de revisão ao Conselho
Europeu de Maastricht (1991)

Tratado de Maastricht
Assinado a 7/2/1992 -> em vigor a partir de 1/11/199347

Marca o virar do projeto europeu dum projeto de integração económica para uma verdadeira
integração política.

Alargada reforma dos Tratados fundacionais (modificou 160 dos 248 artigos do Tratado de
Roma) incorporando as seguintes principais alterações:
• Criação da União Europeia48 e mudança do nome da CEE para Comunidade Europeia
• A par do método de integração comunitária, políticas de cooperação governamental nos
domínios da Política Externa e Segurança Comum (PESC) e Justiça e Assuntos Internos
(JAI) – arquitetura institucional de pilares – em que a maneira da UE atuar é diferente
em cada pilar (1 pilar comunitário e os outros 2 de cooperação intergovernamental -
característica inicial de dualidade metodológica; projeto iminentemente comunitário
que mantém características intergovernamentais a contrabalançar)
• Referência expressa ao objetivo de proteção dos Direitos Fundamentais
• Reconhecimento dum estatuto de cidadania da União

47
Atrasou de Janeiro para Novembro pois houve a necessidade de se cumprir exigências constitucionais
de consulta referendária (Dinamarca, Irlanda, França) ou proceder mesmo a revisões constitucionais
(França, Espanha, Alemanha e Portugal)
48
TUE = novo tratado que institui a UE; Mantendo o Tratado de Roma que passa a ser o Tratado da
Comunidade Europeia (TCE) -> atual TFUE

20
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Afirmação dos princípios fundamentais de delimitação de competências entre as


Comunidades Europeias e os Estados-membros (competência de atribuição;
subsidiariedade49 e proporcionalidade)
• Previsão da realização da UEM em 3 fases, culminando na moeda única; instituíram-se
órgãos de competência específica e de natureza decisória (SEBEC, BCE)
• Parlamento Europeu tem reforço significativo dos seus poderes – participação no
processo comunitário de decisão em pé de igualdade com o Conselho; passa a
codecisor.
• Aceitação, em derrogação dos princípios de igualdade e do adquirido comunitário, de
cláusulas de “opting-out” que garantiram ao Reino Unido o direito de não ficar
vinculado pelo Acordo Social e também ao Reino Unido e à Dinamarca o direito de, se e
enquanto quisessem, não aderirem à moeda única

Em 2/5/1992 foi assinado na cidade do Porto o tratado que regulou a associação entre as
Comunidades Europeias e a Associação Europeia de Comércio Livre (EFTA) do qual nasceu o
Espaço Economico Europeu.

Artigo N, nº2 do Tratado de Maastrich agendava para 1996 uma nova CIG, reconhecendo que
era necessário ir mais longe no processo iniciado de realização de uma união cada vez mais
estreita entre os povos da Europa.
➢ Revisão de 1996 deveria permitir a comunitarização das matérias de cooperação
intergovernamental, alargamento do processo de codecisão, reconhecimento de
princípio de hierarquia das normas e atos comunitários e, com a perspetiva de novas
adesões, adaptação da estrutura orgânico-decisória da UE e das Comunidades.
o Cláusula de “rendez-vouz”

Tratado de Amsterdão
Assinado em 2/10/1997 -> em vigor a partir de 1/5/1999

Cláusula de rendez-vouz do Tratado de Maastricht foi respeitada e em Março de 1996, em Turim,


CIG iniciou trabalhos de preparação de um novo tratado.

Ficou aquém dos objetivos enunciados pela cláusula rendez-vouz, aquém das finalidades
impostas pelo funcionamento da UE e aquém das exigências de adaptação institucional
pressupostas pelo alargamento da UE.
➢ Resultado foi reforma minimalista que adiou para momento posterior a revisão
necessária

Enumerou os artigos do TUE e aprovou modificações nas seguintes áreas:


• PESC – reforço do caráter operacional e da visibilidade externa da UE através da criação
dum Alto Representante da PESC, na figura do Secretário Geral do Conselho e da
previsão da capacidade operacional a disponibilizar pela União da Europa Acidental
(UEO)

49
Princípio segundo o qual quem deve agir são os mais próximos da realidade (Estados-membros).
Comunidade europeia é subsidiária aos Estados-membros (apesar de ter competência para agir, vai
preferir que quem haja sejam os mais próximos e só age na falta deste ou quando é necessário a
harmonização) – art. 5º/3 TUE – princípio que estrutura toda a lógica de atuação das instituições da UE.

21
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• UE e cidadania – com o objetivo de aproximar a UE do cidadão inscreveram-se no


Tratado da Comunidade Europeia novos títulos sobre: Emprego; integração do Acordo
Social de Maastricht no texto do próprio Tratado; aprofundamento de políticas
comunitárias de coesão económica e social; direito de acesso dos cidadãos aos
documentos do Conselho, Parlamento e Comissão; extensão do princípio da proibição
da discriminação
• Liberdade, segurança e justiça – institui mecanismos de decisão comunitária sobre
matérias que eram de cooperação intergovernamental e avançou com a realização
plena da livre circulação de pessoas no contexto europeu de liberdade, segurança e
justiça e com a incorporação no Tratado do acervo dos acordos elaborados no quadro
do Acordo Schengen (1985)
• Direitos fundamentais – institui procedimento de tutela política que, no caso de
violação grave e persistente dos princípios da liberdade, democracia e direitos
fundamentais, pode conduzir à aplicação de sanções ao Estado-membro infrator
(incluindo, se chegar a isso, a suspensão do direito de voto no Conselho)
• Cooperação reforçada e flexibilidade – reconhecimento de modalidades de integração
diferenciada passa a enquadrar a opção dum grupo restrito de Estados-membros por
um modelo mais aprofundado ou acelerado de realização dos objetivos da União e das
Comunidades (exceção da PESC)

Não levantou a onda de indignação e polémica que acompanharam o processo de ratificação do


primeiro Tratado da União Europeia e, do ponto vista político, limitou-se a aprofundar os
pressupostos de um funcionamento mais eficaz da UE.

Juridicamente, o Tratado de Amsterdão alargou o âmbito de limitação da soberania dos Estados


às matérias do asilo, imigração, vistos e outras relacionadas com a livre circulação de pessoas

Leftovers – aspetos controvertidos da reforma institucional exigida pelo processo de


alargamento que ficaram por resolver.
➢ Vieram a dar origem ao Tratado de Nice, que veio alterar disposições para acomodar o
mega alargamento de 2004.
➢ Conselho Europeu de Colónia, um mês depois do Tratado de Amsterdão estar em vigor
já anunciava uma nova revisão no início de 2000.
o Trouxe para a discussão, além da reforma institucional, o problema do
financiamento.
▪ No Conselho Europeu de Berlim, a Agenda 2000 merecia acordo global
desse estudo (apresentado em 1997) que traçava um programa de ação
em particular quanto ao quadro financeiro da UE.
▪ Euro – moeda única estabelecida a 1/1/1999

Carta dos Direitos Fundamentais da UE


7/12/2000
Decisão conjunta de proclamação pelos presidentes do Parlamento, Conselho e Comissão, a
Carta, adotada sob a forma de acordo interinstitucional, nasceu sob a incerteza do seu valor
jurídico e da sua relação com os Tratados institutivos.
➢ Com o Tratado de Lisboa adquiriu a mesma força que os restantes tratados (art. 6º TUE)

22
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Tratado de Nice
Assinado a 26/1/2001 -> em vigor a partir de 1/2/200350
1º semestre de 2000, uma nova CIG retomou as questões fundamentais da adaptação dos
Tratados e preparou um projeto de tratado que veio a ser aprovado pelo Conselho Europeu de
Nice.

Concretizou um objetivo de acabamento da reforma institucional assinalada no Tratado de


Amsterdão como necessária – pelo maior número de Estados-membros e pela abrangência e
natureza das matérias integradas na sua esfera de atribuições (política monetária, política
externa, espaço de liberdade, segurança e justiça)

Principais modificações
• Ao nível da estrutura institucional
o Parlamento Europeu: extensão para um máximo de 732 deputados; reforço dos
poderes no âmbito da codecisão e do reconhecimento de efetivos poderes de
iniciativa no processo de controlo da legalidade dos atos comunitários pelo
Tribunal de Justiça
o Comissão Europeia: limitação do número de membros e escolha com base num
princípio de rotação paritária; alteração no procedimento de nomeação dos
comissários e reforço dos poderes do Presidente
o Tribunal de Justiça e Tribunal de Primeira Instância – garantias de composição
igual entre os Estados-membros; alargamento de competências e criação de
“secção especial”
• Ao nível do processo de decisão
o Extensão dos procedimentos por maioria qualificada – 27 disposições foram
alteradas no sentido de substituir a unanimidade pela maioria qualificada
(reforça a componente comunitária)
o Extensão do âmbito do procedimento de codecisão à maior parte das matérias
o Cooperações reforçadas – reformulação das disposições no sentido de alargar
o seu âmbito e de facilitar o estabelecimento duma cooperação reforçada
• A outros níveis
o Direitos fundamentais – adaptação da cláusula sancionatória do art. 7º TUE em
função da experiência com a “questão austríaca”51
o Segurança e defesa – previsão de procedimentos e mecanismos para
desenvolvimento das capacidades militares e operacionais da UE
o Cooperação judiciária em matéria penal – criação do EUROJUST (unidade de
magistrados com a missão de contribuir para coordenação eficaz das
autoridades nacionais face aos procedimentos criminais)
▪ Em consonância com o Tratado de Amsterdão, pega-se em muitas
matérias do 3º pilar (justiça e assuntos internos) e comunitarizam-nas;
estreitam o 3º pilar que passa a ser o pilar da cooperação penal e policial
em matéria judiciária.
o Comité da proteção social – previsão no Tratado da CE deste órgão

50
Demora da Irlanda que teve um primeiro referendo em sentido contrário.
51
14 Estados-membros ameaçaram a Áustria com sanções políticas se ela permitisse a formação de
governo, derivado das eleições, com programa xenófobo e nacionalista

23
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

o Consequências financeiras do termo de vigência do Tratado da CECA


(23/7/2002) – protocolo anexo que define as condições de transferência dos
fundos da CECA para a Comunidade Europeia

CIG 2000 exorta aos Estados-membros a debater para no Conselho Europeu de Laeken (2001)
se pudesse aprovar declaração sobre: estabelecimento e controlo de delimitação de
competências mais precisa entre UE e Estados-membros que reflita o princípio da
subsidiariedade; estatuto da Carta dos Direitos Fundamentais da UE; simplificação dos Tratados;
papel dos parlamentos nacionais na arquitetura institucional europeia.
➢ Aprovou-se Convenção sobre o Futuro da Europa (com o mesmo modelo que a Carta)

Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa


Assinado a 29/10/200452 -> nunca chegou a vigorar

Empurrado pela visão messiânica de Valéry Giscard d’Estaing, presidente da Convenção Sobre
o Futuro da Europa (2001) que entendia não ser a indicada para decidir quanto à questão de
uma Constituição, virou costas à “prudência semântica” (P. Magnette)
➢ Exercício de imprudência semântica em que o nome matou a coisa53

Dividia-se em 4 partes e fundia todos os tratados institutivos num só:


• Parte I – função introdutória que definia princípios e critérios basilares relativos à existência,
estrutura institucional e funcionamento da UE (grande rol de matérias)
• Parte II – incorporava a Carta dos Direitos Fundamentais da UE, proclamada em Nice
• Parte III – mais longa e com cariz regulador, dedicada às Políticas e Funcionamento da União
• Parte IV – disposições gerais e finais

Estabelecia determinadas soluções extraídas de uma forçada homologia entre a UE e o


Estado54
➢ Alimentou movimento anti-constituição
o Referendos negativos em França e nos Países Baixos em 2005 mergulharam a
Europa numa crise política – exemplo dos riscos do projeto europeu com
soluções de puro voluntarismo político (como a CED em 1945), esvaziadas de
músculo democrático, reduzidas à estética do nominalismo conceitual.
▪ Os Estados-membros é que decidem unanimemente vincular-se ao
Direito Primário (dos Tratados – de onde advém todo o poder decisório
da UE) – para ser um tratado constitutivo exigia-se a unanimidade
• A UE é a criatura e os Estados são os criadores

52
MLD: Tratado de Roma 2, pois foi assinado em Roma
53
Pois a maior parte do texto foi aprimorado e integrado no Tratado de Lisboa
54
Disposições sobre os símbolos da União; designação de atos jurídicos como leis e leis-quadro; criação
da figura do Ministro dos Negócios Estrangeiros; enunciação do primado do DUE - além do próprio nome
“Constituição”, que é um instrumento jurídico típico dos Estados (estadualizaria e aproximaria a UE à
figura dum Estado federal)

24
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Crise transformou-se numa oportunidade de avaliação das soluções alternativas – que o


Tratado de Lisboa vem consagrar como o regresso ao caminho seguro e conhecido do método
comunitário, exprimindo uma doutrina renovada do contratualismo como base de sustentação
da UE, que emerge da vontade soberana dos Estados

Conselho Europeu de junho de 2005, na reação ao resultado dos referendos, acorda-se uma
pausa de um ano para se refletir. Em 2006 prorrogou-se mais um ano.

Na Cimeira de Berlim, para celebrar os 50 anos da assinatura dos Tratados de Roma, aponta-se
uma nova saída da crise e o Conselho europeu de junho 2007 anuncia o óbito da Constituição
Europeia55.

Portugal segue-se à Alemanha na Presidência do Conselho Europeu e incumbe-se uma nova CIG
de preparar um “Tratado Reformador” do tratados em vigor.

Tratado de Lisboa
Assinado a 13/12/2007 -> em vigor a partir de 1/12/2009
Sob presidência portuguesa, os trabalhos foram céleres e com 3 reuniões da CIG chegou-se à
versão definitiva do Tratado Reformador – solução pragmática que mantém os 3 tratados
constitutivos e cria um novo ente jurídico regulado pelos 3 (TUE, TFUE, CDFUE)

Mantém, em larga medida as soluções da Constituição Europeia mas sob uma forma
“desconstitucionalizada” em que se suprime as disposições de analogia estadual ou federal.
Recupera o significado pactício do estatuto jurídico da União, atualizando-o ao estádio atual de
evolução do processo de integração europeia.
De destacar:
• Extingue-se a CE (último parágrafo art. 1º TUE) e já não há coexistência entre a
Comunidade Europeia e a União Europeia;
• Elimina a estrutura de pilares56 e em todos os domínios passa a aplicar-se o método
comunitário (em todos os domínios, o Tratado confere às instituições da UE poderes de
vinculação/subordinação jurídica)

Aprovação seguiu formato simplificado de voto parlamentar (com exceção da Irlanda que, por
imposição constitucional, levou a referendo e houve 53% de votos negativos mas apenas 53%
de participação do eleitorado57)

Curiosamente, a crise de 2008 vincou a premência de uma Europa unida e politicamente ativa,
que dependia da entrada em vigor do novo estatuto jurídico das instituições da UE.

55
Havendo um grupo de Estados-membros, em que se incluíam Portugal, Espanha e Irlanda, que
continuavam a insistir na viabilidade da opção constitucional: “Amigos do Tratado Constitucional”
56
MLD: despilarização é aparente (ex: art. 31º, já não há comunitarização absoluta e as decisões são por
unanimidade havendo poder de veto de cada Estado – interesses próprios e sem integração de
soberanias)
57
Resultado que gerou debate europeu com radicalização de argumentos

25
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

➢ A Irlanda e a Comissão negociaram e houve um asseguramento de garantias.58

Cronologia dos Tratados59 da UE


1951: Tratado de Paris – CECA
1957/58: Tratados de Roma – CEE e EURATOM = atual TFUE, com as alterações que
subsequentemente foram introduzidas:
1965: Tratado de Bruxelas/Fusão
1986: Ato Único Europeu
1992/93: Tratado Maastricht
1997/99: Tratado Amsterdão
2000: Carta dos Direitos Fundamentais da UE
2001/03: Tratado Nice
(2004: Constituição para a Europa)
2007/09: Tratado Lisboa = TUE (Maastricht e alterações) + TFUE (Roma e alterações) +
Carta DFUE (Roma 2000)

Tratado de Lisboa – Renovado Estatuto Jurídico da UE


Período 1992 – 2009: Processo de Revisão em Curso (PREC)
Após a estabilidade da CEE, o PREC foi motivado pelo objetivo de institucionalização de uma
comunidade política – obrigou a que se reformasse a estrutura de decisão.
➢ Não se fez tudo logo de uma vez (havia uma necessidade de maturidade e vontade
política) e ficaram muitos “leftovers” e logo se iniciava um rendez-vouz que se
concretizaria noutro tratado.

Reformou os tratados institutivos em vigor – herdando a forma jurídica do Tratado de Roma,


na versão resultante do Tratado de Nice.
• Enunciado dos novos artigos resulta da conjugação das disposições dos tratados com o
conteúdo inovador da Constituição Europeia.
• Na sua estrutura formal o Tratado de Lisboa só tem 7 artigos: 2 que alteram os tratados
e 5 sobre disposições finais.

Versão consolidada do Tratado de Lisboa tem 467 artigos, 37 protocolos e 65 declarações.


• Sacrificou-se o objetivo da Declaração de Laeken (2001) de maior transparência e
simplificação do estatuto jurídico da UE.
• Gerou-se situações de sobreposição reguladora – labirinto normativo com maiores
consequências na configuração dos órgãos e dos procedimentos de decisão.

58
Removeu-se um obstáculo mas ainda se teve de lidar com o Presidente da República Checa que
condicionou a sua assinatura à garantia da inaplicabilidade da Carta dos Direitos Fundamentais da UE.
59
Conjunto de normas que têm a força hierárquica máxima no DUE (direito fundamental da UE que está
no topo da pirâmide normativa) – direito constitutivo/institutivo – estabelece o estatuto jurídico
fundamental do poder da UE
➢ Qualquer ato normativo da UE que esteja num patamar normativo hierarquicamente inferior
tem de respeitar os tratados institutivos da UE.

26
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Será um novo estatuto ou apenas um estatuto reformado ou revisto?


Resposta não é clara.
• Visão ideológica sobre a teleologia federal do processo de construção europeia (plano
político) limitou-se a reformar e adaptar o regime jurídico e vigor desde o Tratado de
Nice.
• Visão mais objetiva conclui que a UE não se dota dum estatuto radicalmente diferente,
mas, as alterações previstas correspondem a uma renovação de largo significado para a
evolução futura do processo de integração europeia.

Importantes alterações:
• UE sucedeu à CE, que deixou de existir (art. 1º, §3º, TUE)
• TFUE E TUE têm o mesmo valor jurídico e sobre ambos se funda a UE sob o princípio de
“uma União, dois Tratados”
• Lógica dos pilares de Maastricht foi substituída por uma abordagem uniformizadora e
comunitária dos poderes da UE nas diversas áreas de atuação.
• UE adquire personalidade jurídica – é sujeito de DIP, sendo mais eficaz nas relações
externas60 e não apenas órgão político
• Direitos fundamentais – UE passa a estar formalmente vinculada pela Carta Europeia
dos Direitos Fundamentais que tem força jurídica equivalente à dos Tratados61
o UE é uma União de direitos – nos tratados compreendem-se as 2 vertentes dum
Estado de Direito
▪ Substantiva: garantia da separação de poderes (bipartição inglesa do
matters of law e matters of policy – sindicabilidade dos poderes pelo
Tribunal) e direitos fundamentais (art. 2º TUE – pauta axiomática que
rege UE62; art. 6º - concretiza as fontes desses direitos dando força
jurídica à Carta)
▪ Processual: princípio da tutela jurisdicional efetiva. Sistema judicial da
UE funda-se na competência dos tribunais nacionais63
• Regras de delimitação de competências entre UE e Estados-membros estão
claramente enunciadas em disposições expressas dos Tratados – já não têm só
formulação jurisprudencial ou doutrinária
o Princípio da competência por atribuição (art. 4º/1 e 5º/1 TUE)
o Princípio da subsidiariedade (art. 5º/3 TUE) – que veio reforçar poderes de
intervenção dos Parlamentos nacionais no processo comunitário de adoção de
atos legislativos que poderiam ser travados ou anulados pelo TJUE
o Princípio da proporcionalidade (art. 5º/4 TUE)
o Definição de várias categorias de competência (exclusiva, partilhada,
complementar) contribuiu para clarificação da linha de fronteira que separa a
esfera de atuação própria e genérica dos Estados-membros e da esfera da UE

60
Além de ius tractum também adquire ius legatione (art. 27º/3 TUE e art. 221º TFUE)
61
Possibilidade futura da própria UE aderir à CEDH e ficar vinculada à jurisdição do TEDH
62
Quando um Estado viola a pauta axiomática (art. 58º e 259º TFUE) pode haver sanção política (art. 7º
TUE) o que exige a unanimidade e a acusação de violação grave e persistente do art. 2º
63
Exceção no art. 14º/2 dos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do BCE. MLD: exceção
errada pois levante desconfiança sobre os tribunais nacionais

27
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Expansão do âmbito de decisão a novas matérias – art. 194º, 189º, 214º, 195º, 165º/2,
196º, 197º TFUE
o Reforço de poderes no domínio da PESC e no domínio da cooperação judiciária
e policial em matéria penal (Justiça e Assuntos Internos foram comunitarizados
– título V do TFUE)
• Novas regras aplicáveis aos procedimentos de decisão – alargamento da codecisão do
Parlamento a mais matérias sob a forma de processo legislativo ordinário (art. 289º/1
TFUE)
o Natureza dos atos jurídicos depende do processo de decisão – preserva-se a
tipologia dos atos comunitários (art. 288º TFUE) embora se abra a porta a novas
classificações com a lógica de “ato legislativo” e “ato não legislativo”

Revisão formal dos Tratados é processo longo e de conclusão incerta.


O novo estatuto jurídico da União, embora protegido nas suas regras fundamentais pela
exigência do processo de revisão ordinário (art. 48º/2 e 6 TUE) permite uma adaptação mais
expedita através das “cláusulas para o futuro” de cooperação reforçada, cooperação
estruturada permanente, cláusulas-passarela e processo simplificado de revisão.

28
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Método Comunitário de Integração


A primeira concretização do método de integração funcionalista, depois convertido em método
comunitário, foi representada com a criação da CECA e poderá captar-se com a ideia da
Declaração Schuman de que “A Europa não se fará de um golpe, nem numa construção de
conjunto: far-se-á por meio de realizações concretas que criem em primeiro lugar uma
solidariedade de facto”.

O caso do falhanço da criação da Comunidade Europeia de Defesa (1954) foi o triunfo do método
funcionalista sobre o método federal e o mesmo aconteceu com o Tratado que cria uma
Constituição para a Europa – prevalecem as visões pragmáticas, da experiência frutuosa dos
pequenos passos.
➢ MLD: O caminho do aprofundamento da integração entre os Estados-membros faz-se
pelas rotas conhecidas e uma rota radicalmente diferente geraria receios e paralisava a
caminhada.

Método funcionalista – teoria clássica de integração regional que interpreta o interesse comum
relativo à definição integrada de políticas económicas e sociais como o fundamento de criação
de órgãos de autoridade supranacional, investidos de poderes regulatórios dos mercados.
➢ Teoria funcionalista orientou a opção europeia pela integração económica e com a
criação das comunidades europeias consagrou o método dos pequenos passos cujas
características principais são:
1. Limitação de soberania pelos Estados – sob a forma de delegação de
competências vs. transferência de competências64 - Estabelecimento de
relações jurídicas de subordinação dos Estados-membros a entidade
supraestadual com a integração de poderes (exercício em comum dos poderes
soberanos dos Estados, em função de um interesse comum).
2. Irreversibilidade (point of no return)65
3. Gradualismo em que há suscetibilidade de recuos tácticos (stop and go);
4. Incrementalismo em que ao se estabelecerem solidariedades de facto entre
Estados-membros, as competências comunitárias têm uma vocação expansiva
que que deveriam incidir sobre a generalidade das atividades económicas,
criando efeito de engrenagem ou incrementalismo (spill-over).

➢ Construção Europeia apropriou-se do método e conferiu-lhe traços próprios,


resultantes da praxis, cuja evolução depende da sucessão de etapas
o Avanços são expressão da limitação da soberania dos Estados-membros –
devidamente negociadas e contratualizadas;
o Contratualização pode não obter ao cânone da formalização pactícia e podem
alcançar-se pela decisão política qualificada (ao mais alto nível, no Conselho
Europeu)
o Outra modalidade de limitação informal da soberania dos Estados-membros foi
assumida pelo TJUE no exercício da sua função de interpretação e aplicação das
normas comunitárias

64
Podem sempre vir a recuperá-las, avocando-as vs. irreversibilidade
65
Prende-se com a questão anterior. Defendido por Cruz Vilaça e Nuno Piçarra – MLD discorda e hoje o
art. 48º/2 TUE prevê a possibilidade de se rever os tratados para se retirarem competências (não há o
adquirido comunitário)

29
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

➢ Resposta dos Estados aos desafios da integração depende dos objetivos propostos –
manter a construção comunitária em constante processo de realização pressupõe novos
objetivos numa lógica de progressividade e expansão contínua do espaço de decisão
própria.

Antes do Tratado de Lisboa, a UE e as Comunidades Europeias davam corpo a uma estrutura


assimétrica, baseada na dualidade metodológica entre a opção comunitária e a opção
intergovernamental – por um lado a integração de soberanias, e por outro a cooperação de
soberanias.
➔ Resultante do Tratado de Maastricht tínhamos uma arquitetura europeia a 3 pilares66

Tratado de Lisboa manteve-se fiel à lógica do método comunitário agora alargado à dimensão
política de integração.

66
Tradução de como se exercia o poder, tendo em conta as soberanias, que, essencialmente, manteve-se
com os aprofundamentos de Amsterdão e Nice embora com algumas alterações nos próprios pilares em
si.

30
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

➔ No art. 1º/§3 a UE incorpora a Comunidade Europeia e adota, em relação à generalidade


das matérias a abordagem comunitária – desaparecem as Comunidades67 para sair
fortalecido o método comunitário68
➔ Reflexo do método comunitário encontra-se no facto de várias instituições da UE
exigirem maioria qualificada, da UE poder adotar atos legislativos e do TJUE dispor de
competência e poder sindicar as opções da UE
o A contrario sensu: o que exclui estes pressupostos tem ainda uma lógica
intergovernamental
o Ver art. 24º/1/§2

1. UE ganha Personalidade Jurídica – os Estados limitam prerrogativas de soberania com a


criação da UE como ente jurídico e não só uma realidade política – no âmbito do 1º pilar
extingue-se a CE e as matérias são todas entregues à UE
2. “Despilarização” – no plano estrutural prevalece este novo objetivo
➔ Queria acabar-se com a Europa assimétrica – 1 só entidade, 1 só método

Apesar disso, há manifestações do método dos pilares


• caso da política externa (mantém as características intergovernamentais pois tem um
peso importante naquilo que define um Estado soberano; art. 275º TFUE exclui da
competência do TJUE as de política externa69);
• outras matérias do 2º e 3º Pilar têm regras de deliberação de unanimidade (art. 31º/1,
42º/4 TUE e art. 87º/3, 89º TFUE) ou maioria qualificada em que há mecanismos de
bloqueio (art. 82º/3 e 83º/3 TFUE).
• Moderna arquitetura de pilares invisíveis

O que é a UE pós-Tratado de Lisboa?


Corrente intergovernamental – vê associação de Estados
Corrente federalista – vê federação suis generis
Corrente que não aceita uma nem outra; corrente OPNI – problema de falta de coragem e
problema metodológico que não dá resposta a nada (MLD)

MLD:
União de Estados soberanos que, por via pactícia e com fundamento nas
respetivas Constituições, decidiram exercer em comum os respetivos
poderes de soberania.

67
Dada a natureza setorial específica a EURATOM continua
68
Embora o nome de muitos preceitos tenha mudado de “comunitário” para “da união” – ver notas
introdutórias à coletânea
69
O art. 276º também impõe limitações ao poder de controlo jurisdicional nas matérias acerca do espaço
de liberdade, segurança e justiça. No entanto, o Tratado de Lisboa tornou a competência do Tribunal
obrigatória (até aí os Estados tinham de reconhecer a jurisdição do Tribunal) sobre as matérias do antigo
3º pilar – jurisdição de natureza comunitária.

31
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

UE ainda é associação de Estados soberanos (com soberania limitada devido a uma


autolimitação feita através de pactos e respeitando as Constituições nacionais).
➢ Integração de soberanias europeias não se faz contra as Constituições, a federação não
se faz apesar das Constituições e sim com elas – vai ao encontro da Visão
Contratualista70

Contratualismo não é uma moda – é a doutrina que se encontra nos Tratados, acolhida
e expandida com o Tratado de Lisboa. Ao reforçar a componente contratualista
fragilizou a componente integracionista.
Indícios: Conselho Europeu como superinstituição; art. 352º; art. 49º TUE; art. 50º TUE
71
(direito unilateral de retirada – DIP reconhece-o aos Estados e Tratado de Lisboa veio
consagrar nos Tratados Institutivos)72

Outro sinal de contratualismo são as cooperações reforçadas – manifestação do princípio da


flexibilidade; geometria variada; diferentes velocidades. Ex: Euro, Schengen
• Tratados possibilitam esta modalidade aplicável a quase todas as matérias (art. 20º TUE;
art. 326º e 334º TFUE).73
• MLD: as cooperações reforçadas não são o caminho; nunca se irão aplicar a muitas áreas
e constituem fragilização do adquirido comunitário; o projeto está alicerçado em
objetivos e tarefas comuns que a todos diz respeito.

Seguiu-se a opção do método comunitário apesar de haver ainda vestígios da soberania dos
Estados – demonstrações do princípio contratualista nos art. 48º, 49º e 50º

Consagraram-se soluções que visam robustecer a UE através da via do dualismo metodológico –


mais poderes para a UE, cedidos pelos Estados-membros mediante a garantia de controlar o
exercício de tais poderes ou, mesmo, de os recuperar (freios intergovernamentais).

70
Visão metodológica de como aprofundar processo de integração europeia; vs. Visão Federalista que
acredita que a UE já se autonomizou e tem dinâmica própria que arrasta os Estados mesmo contra a
vontade deles e é irreversível (completamente contrariada com o Brexit)
71
Art. 50º é o da desvinculação. Se bem que já houve formas de sair sem este artigo: caso da Gronelândia,
em 1982, que queria abandonar a UE dada as políticas de pescas. Dinamarca negociou e Gronelândia saiu.
Hoje temos o oposto, Reino Unido quer sair e Escócia quer ficar.
72
É possível Reino Unido fazer marcha atrás? Após ativação do art. 50º é possível que o Reino Unido pare
esse processo de saída? Sim; MLD faz interpretação do art. 50º à luz do DIP; houve declaração unilateral
com a notificação de querer sair e que pode ser retirada a todo o tempo – poderia haver uma prorrogação
também. Solução de considerar que é notificação de intenção que pode ser retirada por vontade do
Estado notificante que os outros podem aceitar (pode é haver indemnização aos outros)
73
Atualmente existem cooperações reforçadas stricto sensu só em 3 domínios: patentes, normas sobre
divórcios, normas sobre transações

32
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Ideia de Europa e Matriz Europeia


Raízes cristãs da Europa são evidência histórica que não requer confirmação literal (em
preâmbulos) e cujos valores constituem filamentos perenes no código social que conforma a
identidade europeia.
Os aspetos culturais (língua, tradições, sistemas jurídicos, gastronomia) são muito diversos e
profundamente diferentes.
➢ Capek: “O criador da Europa fê-la pequena e dividiu-a em pequenas partes para que os
nossos corações se alegrassem, não com a dimensão, mas com a pluralidade”.

Heterogeneidade ao longo dos séculos deu lugar à rivalidade mas na segunda metade do séc.
XX, a Declaração Schuman preconiza uma certa ideia de Europa: “A contribuição que uma Europa
organizada e viva pode dar à civilização é indispensável para a manutenção de relações
pacíficas”

Método dos pequenos passos da Declaração Schuman concluía sobre a inevitabilidade da


federação como modelo derradeiro de finalização político-funcional do processo de construção
europeia.
➢ Mas, a ideia de Europa segue na versão de especificidade comunitária – protelamento
da solução federal através do recurso aos mecanismos de decisão comunitários.
➢ Podem existir fatores objetivos que aceleram o processo em curso de criação gradual
da federação: necessidade de UE ter voz própria no plano externo com relevância
política internacional e apoiada por meios de ação militar; medidas integradas de
governo económico; afirmação da autoridade nos problemas comuns e etc.

Modelo comunitário de exercício conjunto da soberania conheceu vários desafios. Para o futuro,
Maria Luísa Duarte usa as palavras de Lampedusa: “Se queremos que as coisas continuem como
estão, as coisas vão ter de mudar”

Sucesso de integração europeia mobilizou iniciativas de regionalismo económico noutros


espaços geográficos – apostou-se na criação de novos blocos económicos (como reação ao
poderio da UE ou como meio de aproveitar o bom exemplo)
➢ Maior parte são estruturas de tipo societário

Na América do Sul não tem funcionado bem pois não são motivados pelos motivos da Europa
dos anos 50: solução para se alcançar a paz (vindos de grandes guerras) e desenvolvimento do
sistema económico com elevado grau de confiança entre parceiros económicos com a abdicação
de tradicionais mecanismos protecionistas das respetivas economias.

De destacar: NAFTA (América do Norte – Tratado de Livre Comércio); CARICOM (Comunidade


do Mercado Comum das Caraíbas); Mercado Comum da América Central; Comunidade Andina
das Nações; Mercosul (Mercado Comum do Sul)74; ASEAN (Associação de Nações do Sudeste
Asiático); SAARC (Associação Sudeste Asiático para a Cooperação Regional); ECCAS (Comunidade
Económica dos Estados da África Central); CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da
África Ocidental); AEC (Comunidade Económica Africana) e etc.

74
Evidenciam uma configuração jurídico-institucional e assumem no plano político uma declarada
influência da matriz europeia.

33
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Cronologia Principal Detalhada

34
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

35
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

36
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

37
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Características Comuns Estruturais do Sistema Institucional


Quadro Institucional Único
Evolução do quadro institucional foi encaminhada por dois vetores programáticos:
• Unificação dos órgãos – que conduziria à definição dum quadro institucional único
o Na formação inicial das comunidades estabeleceu-se em cada tratado
institutivo um sistema institucional próprio com órgãos dotados de
competências diferentes e com designações distintas
o Ex: Alta Autoridade da CECA; no âmbito da CEE e CEEA surge a Comissão, que
se impôs
o Reconheceu-se a identidade própria de cada comunidade no plano das
respetivas políticas e competências mas promoveu-se a unificação orgânica
o Ex: 25/3/1957 garantiu-se a existência de uma só Assembleia e um só Tribunal
de Justiça e unificou-se Comité Económico e Social da CEE e CEEA; Tratado de
Fusão
• Criação de novos órgãos – dada a necessidade de adequar o suporte institucional ao
incremento de poderes e funções confiados ao decisor eurocomunitário
o Composição e competências diferenciadas tornou a arquitetura institucional
mais complexa.
o Com a criação da UE por Maastricht: art. 3º TUE consagra “quadro institucional
único”, completado pelo art. 5º - pretendeu garantir-se a unidade de
funcionamento entre a componente comunitária e a intergovernamental da
UE: os mesmos órgãos com competências diferentes.
▪ Estrutura de pilares não era contrária à ideia do quadro institucional
único mas refletia-se no estatuto e poderes de instituições como a
Comissão e o Tribunal de Justiça. Ex: no domínio da PESC a comissão
tinha poderes residuais num palco dominado pelo Conselho e o Tribunal
não tinha jurisdição

Art. 13º TUE


Previsão geral – especificada no art. 223º e ss. TFUE – da estrutura plural, complexa e opaca da
UE.
➢ Com o Tratado de Lisboa despareceu o termo único, pois o quadro de atuação da UE é
plural e flexível, sendo que a garantia da unidade e coerência da ação da UE depende
da intervenção das principais instituições políticas e da função fiscalizadora exercida
pelo TJUE.

Instituições, órgãos e organismos


3 níveis diferenciados de atuação institucional – estrutura atípica
Na versão anterior ao Tratado de Lisboa, não se falava em organismos (ex-art. 7º/1 TCE)
Critério de distinção entre instituição e órgão não era claro e residia num aspeto mais político
que jurídico – atual art. 13º/1 TUE tornou claro a motivação política que inspira a opção de
destacar no conjunto dos órgãos da UE aqueles que ocupam um lugar de maior saliência, no
quadro da decisão política ou do controlo político, jurisdicional e financeiro75 – a chancela de

75
Órgãos mais importantes que correspondem aos “órgãos de soberania”

38
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

instituição foi reservada para os órgãos mais relevantes, seja na ótica da sua competência
juridicamente vinculativa, seja na ótica da sua função.
• BCE está presente dada a reconhecida importância no funcionamento da união
monetária e garantia de estabilidade do euro
• Conselho Europeu está presente dado o seu redesenho
• Tribunal de Contas está presente pela sua função
• Tribunal de Justiça da União Europeia está presente como uma instituição mas
corresponde a vários tribunais (art. 19º TUE)

Art. 2º do Tratado de Lisboa mandou alterar todos os artigos que continham “instituições e
órgãos” para “instituições, órgãos e organismos”.
➢ Organismos – correspondem às agências/institutos/observatórios/centros europeias
(fenómeno de Administração Indireta) com função e competências importantes76
o Não estão expressamente previstos no texto dos Tratados e são criados por
decisão das instituições e órgãos da UE, beneficiando, em geral, de
personalidade jurídica
➢ Surgem como resposta da UE à expansão do controlo técnico e da atividade regulatória
a novos domínios

Estrutura Institucional e Fontes de Legitimidade


O modo de designação dos membros de cada instituição e a repartição de poderes entre eles
combinam diferentes fontes de legitimidade.
• Legitimidade democrática – Parlamento Europeu, eleito por sufrágio universal e direto dos
cidadãos dos Estados-membros desde 1979
• Legitimidade intergovernamental – Conselho Europeu
• Legitimidade comunitária/supranacional – Comissão, cujos membros são escolhidos pela
sua competência e estão vinculados a dever de independência e de velar pelo interesse geral da
União (art. 17º/1 TUE)

O que sustenta a atuação do Tribunal de Justiça da União Europeia é o princípio de autoridade


do controlo jurisdicional, caracterizado pela independência e reclamado por um modelo de
produção e aplicação das normas jurídicas segundo o paradigma da “Comunidade de Direito”.
Quanto às outras instituições, a sua criação obedeceu a objetivos específicos de ordem técnica
ou de representação orgânica de interesses – próximos de uma lógica funcional de legitimidade
democrática

Qualquer passo de reforma institucional deve ser equacionado e justificado na perspetiva do


modelo existente ou futuro da UE, que os Estados-membros (e os povos dos Estados membros)
estarão dispostos a aceitar, de modo transparente e democrático.

Alterações do Tratado de Lisboa redefiniram o equilíbrio de poderes e a linha de coabitação das


3 fontes de legitimidade – mudou o sistema de governo da União Europeia.

76
Veio resolver a questão de, com o alargamento da UE, os Estados-membros reivindicarem a sede de
instituições. Várias cidades tornaram-se, assim, sede destas agências (que estão distribuídas)

39
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Regime Comum de Funcionamento das instituições, órgãos e organismos


Autonomia
• Externa – grau de independência da própria UE na relação com os Estados-membros e
outros sujeitos de DIP; tem regime tradicionalmente associado às organizações
internacionais relativamente a privilégios e imunidades.
• Interna – poder de auto-organização
o Várias instituições e órgãos aprovam os respetivos regulamentos internos (art.
232º, 249º/1, 240º/3, 303º TFUE)
o BCE chega mesmo a ter personalidade jurídica, reforçando o seu estatuto de
independência (art. 282º/3 TFUE)
o Parlamento Europeu estabelece estatuto e condições gerais dos membros (art.
223º/2 TFUE)
o Prerrogativa de organização dos serviços – incluindo a criação de órgãos
subsidiários77
▪ Acórdão 16/12/196478 Müller – TJCE conclui que da competência
exclusiva dos órgãos ressalta uma “medida geral de organização dos
serviços”
▪ Caso Meroni (13/6/1958) – TJCE clarificou a função limitadora dos
Tratados institutivos como fundamento do poder de criar órgãos
subsidiários.

Tribunal de Justiça consagrou a autonomia como princípio geral não escrito, sujeito a certos
limites.
➢ Aresto 15/9/81 Lord Bruce of Donnington – concluiu que Parlamento Europeu tem de definir as
regras aplicáveis ao reembolso das despesas de viagens dos deputados, devendo os Estados-
membros não interferir no exercício das suas competências de natureza fiscal
➢ Limite do princípio do equilíbrio institucional e da competência por atribuição.
➢ O Tribunal decidiu que o Parlamento, no quadro do equilíbrio de poderes entre as
instituições previsto pelos Tratados, subtrair às outras instituições uma prerrogativa que
lhes pertence por força dos próprios Tratados”

Função Pública da UE
Já desde o Tratado de Fusão que o estatuto dos funcionários das três Comunidades Europeias
foi definido por um corpo único de regras.

Função pública eurocomunitária, pelo número de efetivos e pelo regime contratual aplicável,
está mais próxima do funcionalismo público nacional que o típico das OI.
➢ Beneficiam do estatuto de funcionários de uma administração pública cujos direitos e
deveres resultam de um estatuto único, independente da instituição ou órgão que os
recrutou.

77
Ao contrário do que acontece com a CNU, que autoriza expressamente os órgãos principais a criar
órgãos subsidiários (art. 7º, 22º, 29º CNU), os Tratados só de modo implícito fundamentam esse poder,
como expressão tradicionalmente reconhecida dum princípio de auto-organização. Na prática
institucional os órgãos subsidiários têm natureza de comités técnicos, criados em regra pelo Conselho,
com o propósito de associar os Estados-membros, representados por peritos, ao processo de execução
das normas comunitárias – funcionam à luz do princípio teórico da implicação de poderes.
78
Criação de órgãos subsidiários começou a ter relevância a partir dos finais de 1961 devido às decisões
das estruturas das primeiras organizações comuns de mercado no âmbito da PAC.

40
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Comissão tem a maior parte dos efetivos do pessoal e é o órgão superior da administração
pública eurocomunitária.
Nos organismos (com personalidade jurídica) o pessoal é contratado de acordo com as
modalidades previstas no ato institutivo ou determinadas por ato interno de gestão dos recursos
humanos.

Funcionários são admitidos por via de concurso por ato unilateral – regras de admissibilidade
ao concurso são reguladas exclusivamente pelo estatuto (que é um regulamento passível de ser
unilateralmente modificado).

Mesmo cessando as funções os funcionários não podem divulgar as informações abrangidas por
segredo profissional (art. 339º TFUE).

Art. 270º TFUE – TJUE é competente para decidir litígios entre UE e seus funcionários.
Trabalhadores locais contratados têm foro judicial competente nos tribunais nacionais.
➢ Em 2004 criou-se o Tribunal da Função Pública da União Europeia – primeiro tribunal
especializado instituído ao abrigo do art. 257º TFUE.

Tratado de Lisboa consagra novas designações no art. 336º TFUE e a aprovação do respetivo
regulamento segue o processo legislativo ordinário.

Privilégios e Imunidades
Art. 342º TFUE – UE goza nos Estados-membros de privilégios e imunidades necessários ao
cumprimento da sua missão.
➢ Protocolo nº 7, anexo aos Tratados – regula o regime aplicável à UE, funcionários e
agentes, deputados europeus e outros responsáveis pelas instituições no território dos
Estados-membros e define a situação jurídica dos representantes dos Estados-membros
que participam nos trabalhos das instituições.

UE não beneficia de imunidade de jurisdição (art. 274º) pelo que pode ser demandada (bem
como a CEEA) junto do TJUE, no quadro da competência atribuída pelos Tratados, ou junto dos
tribunais nacionais que, como órgãos comuns da justiça eurocomunitária, têm competência
para dirimir os restantes litígios em que sejam parte.

Regime Linguístico
Tratado da CECA foi redigido em francês e só essa versão era considerada autêntica.
Tratados de Roma e os posteriores, de revisão, foram adotados em todas as línguas oficiais das
Comunidades sendo qualquer um deles a versão autêntica.

Art. 342º TFUE – Conselho pode aprovar por unanimidade o regime linguístico das instituições
da UE (exceção das disposições do Estatuto do TJUE, art. 281º TFUE)

Art. 55º TUE – 24 línguas oficiais


• Jornal Oficial da UE é publicada nas 24 línguas – no caso de ato normativo é requerida a
sua publicação para conferir eficácia ao ato.

41
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Atos dirigidos pelas instituições a um Estado-membro só é autêntica a versão na língua


oficial desse Estado.
• Correspondência endereçada às instituições – art. 24º/§4 TFUE e art. 41º/4 CDFUE

Documentos oficiais devem ser divulgados nas 24 versões e as reuniões devem ser levadas a cabo
nas línguas originais havendo tradução simultânea – corrente que defende a igualdade.
OU
Corrente que defende a eficácia propõe línguas de trabalho (inglês, francês e alemão),
➢ A prática institucional tornou o inglês uma espécie de língua franca no espaço
multilinguístico da UE.
➢ A língua de comunicação dos juízes dos tribunais da União mantém-se exclusivamente
o francês.

Questiona-se a igualdade entre as 24 línguas oficiais – a língua é importante no plano político


de igualdade de Estados, pois assegura o respeito pela identidade nacional (art. 4º/2 TUE)79 e é
uma exigência de transparência democrática e segurança jurídica.
➢ É fundamental petrificar o art. 342º TFUE, fazendo do regime linguístico um limite
material de revisão dos tratados e uma garantia de cidadania da UE.

Solução recente tem sido a da flexibilização do regime linguístico80 e utilização do inglês ou do


francês, embora seja inaceitável a limitação do número de línguas oficiais no que se refere à
publicação do Jornal Oficial.

Sedes
Tratados não estabelecem a sede das instituições, remetendo para os governos dos Estados-
membros a sua escolha de comum acordo (art. 341º TFUE)
A decisão do Tratado de Fusão de 1965 foi:
• Bruxelas – Comissão, Conselho, Comité Económico, reuniões do Conselho de Ministros
(com 3 anuais no Luxemburgo), reuniões das comissões e grupos políticos do
Parlamento Europeu
• Luxemburgo – TJUE, Tribunal de Contas, Serviço de publicações, secretariado geral do
Parlamento Europeu
• Estrasburgo – sessões plenárias do Parlamento Europeu

Parlamento Europeu tem um regular funcionamento que se reparte pelos 3 locais de trabalho81
Conselho Europeu com um novo modelo de presidência permanente facilita a regra de reunir
em Bruxelas.
Nada nos Tratados impede que se reúnam extraordinariamente ou em cimeiras informais no
território do Estado-membro que no semestre em causa assegura a presidência do Conselho da
União.

79
Art. 22º CDFUE reconhece como direito que vincula a UE a diversidade cultural e linguística.
80
Questão linguística contribuiu para cooperação reforçada (art. 20º TUE e art. 325º e ss. TFUE) em
relação à patente europeia – unificada para o registo de propriedade intelectual.
81
Após contenciosos nos anos 80, o Conselho Europeu de Edimburgo de 1992 confirmou os 3 locais de
sede acordados em 1965 e as regras de auto-organização entretanto seguidas pelo Parlamento Europeu.

42
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Tratado de Amsterdão trouxe um protocolo anexo aos tratados institutivos o acordo sobre as
sedes.
➢ Passou a exigir procedimento de revisão do art. 48º e hoje mantém-se anexo ao Tratado
de Lisboa – Protocolo nº 6 – que rejeita a solução de sede única de “capital europeia”
e distribui as sedes das instituições e de alguns organismos82.

Princípios Fundamentais de Vinculação Institucional


As normas regulam e os princípios estruturam
Princípios têm relevância fundamental de enquadramento e superação de insuficiências ao
nível do sistema jurídico da UE.
Contribui para o bloco de legalidade eurocomunitária que constitui, no seu todo, fundamento e
limite para a ação desenvolvida pelas estruturas orgânicas de decisão.

Princípios que apresentam conexão mais direta com o modelo orgânico-decisório da UE:

Princípio do Equilíbrio Institucional


A estrutura orgânica da UE e a repartição dos diversos órgãos de decisão não correspondem ao
modelo clássico da separação tripartida de poderes83.

Heterodoxia do modelo comunitário de separação e de equilíbrio de poderes resulta da


coexistência de dois princípios construtivos do sistema comunitário de competências:
• repartição horizontal de poderes entre as diferentes instituições de decisão política;
• repartição vertical de poderes entre os Estados-membros e a UE.

Função judicial de interpretação e aplicação do DUE cabe aos tribunais dos Estados-membros
como órgãos judiciais comuns e aos tribunais da UE, criados ou previstos pelos Tratados no
quadro de uma jurisdição expressamente tipificada – sem hierarquia entre eles e a função
judicial é partilhada numa natureza de cooperação.

Só de modo aproximado se pode considerar reproduzido o princípio estatal da separação de


poderes acolhido pelo modelo comunitário – o sistema conserva a arquitetura funcionalmente
ajustada (sobrevivente desde o Tratado de Roma) ao exercício do poder por uma entidade não-
estadual, de propulsão comunitária, como é a União Europeia.

Princípio não está consagrado expressamente – pressuposto no art. 13º/2 TUE que se deve
considerar como aplicável aos órgãos e organismos da União.

82
A sede dos organismos não está prevista no Protocolo e pode ser fixada por decisão de comum acordo
entre os governos dos Estados-membros. Repartição deve ser equilibrada e equitativa. Em Lisboa temos
o Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência e a Agência Europeia de Segurança Marítima.
83
A existir separação orgânico-funcional de poderes, só pode ser na base de um modelo dicotómico:
função político-decisória (PE, Conselho Europeu, Conselho e Comissão) e função judicial (Tribunais da UE).
➢ Modelo próximo do paradigma inglês entre poder governativo (matters of policy) e poder judicial
(matters of law)

43
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Pode considerar-se uma extensão do princípio da legalidade da competência e para o TJUE


implica “que cada órgão exerça as suas competências no respeito das competências dos outros
(…) no quadro de um sistema de repartição de competências entre os diferentes órgãos da
comunidade e, no caso de se verificar uma violação, esta deve ser devidamente sancionada”
(Acórdão TJCE, 22/5/1990)
➢ Esta ideia tem a ver com a estática dos poderes – ideia de atuação limitada aos meios
jurídicos de ação previstos pelos tratados.
o Mas o princípio do equilíbrio institucional implica a dinâmica dos poderes –
ideia de respeito das relações interinstitucionais.

Não basta à instituição reivindicar a titularidade de um poder com fundamento no Tratado,


ela deve exercê-lo de modo a que não afete as prerrogativas das restantes instituições
comunitárias. Ex: Conselho quer aprovar diretiva e o Tratado tem mais que uma base jurídica
para a fundamentar – Conselho deverá escolher a disposição que do ponto de vista
procedimental seja mais favorável à intervenção decisória do PE, como a seleção de base jurídica
que preveja o procedimento legislativo ordinário em detrimento do procedimento legislativo
especial.84

A jurisprudência comunitária85 determinou que este princípio funciona como uma garantia das
prerrogativas de participação de cada instituição no processo de decisão, mas, serve também
como garantia dos direitos dos particulares.
• Caso Meroni: TJUE apelou ao princípio para excluir a legalidade de um ato de delegação
de poderes discricionários em favor de entidades diferentes das previstas no Tratado
para o efeito de exercer tais poderes – serviu como garantia fundamental reconhecida
pelo Tratado
• Caso Köster: TJUE voltou a analisar o problema da delegação de poderes
• Decidiu que apesar de ser garantia fundamental dos particulares, também já rejeitou
que uma alegada violação deste princípio seria justificação suficiente de legitimidade
processual do particular no quadro do recurso de anulação.

Uma alteração significativa do equilíbrio de poderes, por via de revisão dos Tratados, tem
relevância que ultrapassa a recomposição dos conflitos interinstitucionais.
• Modelo de repartição horizontal de poderes funciona na dependência do modelo de
repartição vertical de poderes.
• Rutura terá consequências sobre o traçado incerto da linha que delimita o nível
eurocomunitário de competência relativamente ao nível nacional de decisão.
• Redefinição de equilíbrios deve ter como limite o respeito do modelo especificamente
comunitário de exercício dos poderes delegados pelos Estados-membros.

Equilíbrio institucional, interpretado e garantido pelo Tribunal de Justiça é que resulta do


previsto nos Tratados.

84
Manifestação deste princípio que não funciona só como orientação de conduta e tem um conteúdo
jurídico sindicável pelo TJUE (art. 263º TFUE)
85
Que foi quem desenvolveu o princípio mesmo quando este não tinha afloramento positivado.

44
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Pela via informal dos acordos interinstitucionais, o PE e a Comissão estabeleceram bases gerais
de entendimento nas estratégias políticas de competição pelo poder86.
➢ Base jurídica do art. 295º TFUE

o Acordos interinstitucionais podem, dependendo da vontade das instituições,


revestir caráter vinculativo ou manter natureza de instrumento de soft law com
caráter indicativo;
o Respeito pelo disposto nos Tratados nomeadamente no que diz respeito às
regras quanto à repartição horizontal de competências87

Princípio do Respeito pelo Acervo Comunitário


Nasceu no contexto da abertura das negociações que precederam o primeiro alargamento (em
1970)
➢ Comissão no parecer de 1972 face a este primeiro alargamento delimitou que “ao
tornarem-se membros das Comunidades, os Estados aderentes aceitam, sem reserva,
os Tratados e as suas finalidades políticas, as decisões de qualquer natureza tomadas
depois da entrada em vigor dos Tratados e as opções feitas no domínio do
desenvolvimento e do reforço das Comunidades”.

Sucessivos tratados de adesão acolheram sempre uma cláusula de receção expressa do acervo
comunitário.
➢ O Estado que pretende aderir é obrigado a aceitar o património jurídico e político88.
➢ Tem natureza de diretriz política e constitui critério de orientação institucional.

Preservação da integralidade do acervo comunitário é incompatível com uma opção


inconstitucional de desregulamentação, ditadas por exigências relativas à devida consideração
do princípio da subsidiariedade.
• Há áreas de regulamentação jurídica que podem dar lugar a medidas de abandono do
espaço normativo e pode ser o próprio princípio do adquirido comunitário que, numa
aceção dinâmica de integração e de acordo com critérios de eficiência política e
económica, pode rever políticas e ações comunitárias no sentido da sua limitação a um
conjunto fundamental de objetivos e princípios de identidade da UE.89

Tratado de Lisboa eliminou a referência expressa a este artigo que hoje tem uma única
referência no art. 20º/4 TUE90 mas é, fundamentalmente, um principio não escrito.
• Esta opção resulta do reforço do espírito contratualista resultante do Tratado de Lisboa
(art. 48º/2 TUE) – apenas a vontade soberana e unanimemente expressa por todos os
Estados-membros através do processo de revisão não está subordinada ao respeito
estrito do princípio do acervo.

86
Erodindo poderes do Conselho e, por conseguinte, prerrogativas dos Estados-membros
87
Sendo, portanto, contrários aos Tratados e suscetíveis de impugnação contenciosa os acordos que
alterem o equilíbrio institucional.
88
Princípio forjado na ideia fundamental do gradualismo da integração que evolui por etapas que lógica
e irreversivelmente se sucedem.
89
Aliás, este é um dos cenários que a Comissão Europeia prevê no seu Livro Branco.
90
Para dizer que as cooperações reforçadas não são acervo.

45
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Mas nos procedimentos comuns de decisão político-normativa, vigora o princípio do


adquirido, de incidência subordinante tanto para o decisor da UE como para o decisor
nacional.

Princípio da Cooperação Leal


Princípio da fidelidade comunitária – manifestação de boa fé e do princípio geral do pacta sunt
servanda.

Exigência básica de não contradição – coerência de atuação no sentido de adotar-se o


comportamento que se mostre mais favorável ao cumprimento das obrigações previstas nos
Tratados.

Vincula tanto os Estados-membros como a UE – art- 4º/3 TUE91


• Nível Vertical – UE e Estados-membros
• Nível Horizontal – Estados-membros entre si e relação entre instituições da UE

Jurisprudência constante do TJUE – obrigação geral dos Estados-membros cujo conteúdo


concreto depende, em cada caso particular, das disposições do Tratado e das regras que
resultam do seu sistema geral.
➢ Caso Zwartveld: TJUE definiu que “este princípio não obriga apenas os Estados-
membros a tomar medidas capazes de garantir a eficácia do direito comunitário mas
impõe igualmente às Instituições comunitárias deveres recíprocos de cooperação leal
com os Estados-membros”
➢ Acórdão de 6/3/01: TJUE defende a extensão ao domínio das relações entre as
instituições comunitárias e os particulares.

Certa doutrina enxerga nesta orientação jurisprudencial a transposição para o DUE do princípio
da “fidelidade federal”, revelado pelo Tribunal Constitucional Alemão.
➢ Não constitui fator federalizante e está associado ao funcionamento equilibrado e eficaz
de qualquer estrutura descentralizada de decisão, repartida por vários níveis de decisão
– tendo particular relevância nestes casos em que não existe relação hierárquica (como
no caso UE e Estados-membros)

Várias disposições dos Tratados regulam de modo pormenorizado os procedimentos de decisão


que envolvem uma cooperação interinstitucional – art. 218º, 294º, 314º TFUE
➢ Para os casos não regulados ou insuficientemente regulados considera-se o princípio
geral da cooperação leal como exigência às instituições eurocomunitárias de um
comportamento que facilite a tomada de decisões e torne, por isso, mais eficaz a sua
atuação em ordem a garantir o cumprimento do DUE.
o Afloramento no art. 13º/2 TUE em que se considera que este princípio geral é
aplicado a todos os patamares de decisão da UE.

91
Fundamental conciliar-se uma interpretação sistemática com o art. 40º TFUE.
• Nº2 refreia o ímpeto federalista da UE ao se dizer que tem de se respeitar a Constituição de cada
Estado

46
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Na prática, o diálogo interinstitucional92 inspirado pelo dever de cooperação leal tem estado na
origem de declarações e acordos entre as Insituições.
• Art. 295º TFUE codificou a jurisprudência do TJUE sobre o possível carácter vinculativo
dos acordos interinstitucionais e reitera o respeito pelos Tratados como limite à
liberdade negocial das instituições93
o Pressupõe o concurso ativo das três principais instituições, seja na fase de
negociação seja na fase de conclusão.

Princípio da Transparência
Vetor jurídico importante, embora recente no DUE. Surgiu no plano das intenções políticas e
foi depois incorporado no texto do Tratado – exprime um paralelismo assumido entre os
procedimentos inerentes ao Estado de Direito nos ordenamentos estaduais e os procedimentos
de uma União de Direito.

Ele exprime a vontade dos Estados-membros vertida no texto dos Tratados.


• Declaração nº 17 anexa ao Tratado de Maastricht registava que “a transparência do
processo decisório reforça o caráter democrático das Instituições e a confiança do
público na Administração” – por força desta Declaração a Comissão foi convidada a
apresentar ao Conselho um relatório sobre medidas destinadas a facilitar o acesso do
público à informação de que as Instituições dispõem.
o Declaração 25/10/93 – Sobre a Democracia e a Subsidiariedade – cada
instituição comprometeu-se a adotar medidas apropriadas
▪ Código de conduta a 16/12/93 aprovado pelo Conselho e Comissão.
Com base no código adotaram decisões específicas e adaptaram os
respetivos regulamentos internos em ordem a garantir o acesso do
público aos documentos.
o Outras instituições seguiram este movimento e regularam as condições de
acesso do público aos seus documentos.

Tratado de Amsterdão trouxe o objetivo de tornar o processo decisório o mais transparente e


aberto possível.

Direito fundamental de acesso aos documentos – enunciado no art. 42º CDFUE


Limitado por:
• Proteção do interesse público (questões de segurança e etc. da Comissão ou de cada
Estado-membro) ou tutela de outros interesses (como privacidade das pessoas, segredo
comercial, industrial, interesse financeiro da UE, confidencialidade e etc.)

92
Prática Institucional Codificada – PE, Conselho e Comissão, sob a forma de declarações comuns,
acordos interinstitucionais ou códigos de conduta estabelecem entre si regras de convivência (e
conveniência) institucional que completam os mecanismos de decisão instituídos nos Tratados.
• Procuram introduzir formas inovadoras de equilíbrio institucional.
• Natureza destes atos é admitida pelas instituições como tendo apenas relevância política e
remetem para o TJUE a apreciação do seu (eventual) alcance jurídico.
o TJUE nunca se pronunciou, expressa e especificamente, sobre o valor jurídico em geral
das declarações e acordos interinstitucionais, mas já proferiu decisões que se apoiam
na existência destes instrumentos.
93
Devido à forte oposição do Conselho à celebração de acordos entre o PE e a Comissão

47
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

o Limitações obrigatórias do direito de acesso


• Interesse próprio da instância solicitada por um pedido de acesso de manter o segredo
das suas deliberações, que se poderá justificar no caso que a divulgação prejudique
gravemente o processo decisório da instituição
o Exceção de invocação facultativa que deve ceder “quando um interesse público
superior imponha a divulgação”

Caso Rothmans: Tribunal Primeira Instância reconheceu princípio geral de transparência


Caso Interporc: Tribunal Primeira Instância afirmou que os cidadãos têm um direito de acesso
aos documentos detidos pela Comissão;
➢ Recusa só pode ser fundamentada na especificação das circunstâncias que justificam a
invocação legítima das exceções e quando se demonstra que q divulgação dos
documentos é “efetivamente suscetível de afetar um dos interesses protegidos” – no
fundo a jurisprudência, para se justificar o indeferimento94, exige uma análise concreta
e incidente sobre cada um dos documentos indicados no pedido.

A expressão deste princípio não é absoluta e seria inadequada qualquer solução jurídica assente
sobre a premissa errada da correspondência absoluta e apriorística entre o modelo institucional
do Estado e o modelo institucional da UE.

Tratado de Lisboa refere este princípio e alia-o ao princípio da abertura – mais abrangente no
que respeita ao parâmetro de orientação política e mais amplo no tocante ao âmbito de
aplicação – art. 15º/1 TFUE + art. 16º/8 TUE + art. 298º/1 TFUE

Evolução desde o Tratado de Maastricht, do regime da confidencialidade para um modelo de


transparência e abertura.

Permanece a dúvida sobre as regras aplicáveis ao domínio da PESC – art. 40º UE mantém
separados os procedimentos entre TUE e TFUE pelo que o art. 15º TFUE não abrange os
procedimentos de decisão relativos à PESC.
➢ Há este princípio em matéria de PESC?
o Art. 11º/3 TUE postula objetivo geral de coerência e transparência das ações da
União
o Art. 42º CDFUE consagra em geral o direito de acesso aos documentos da União
(embora o seu exercício dependa das condições definidas pelos Tratados – art.
52º/2 Carta)

94
Que pode ser impugnado pelo art. 263º TFUE

48
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Instituições, Órgãos e Organismos da UE


Parlamento Europeu
Composição
Composto pelos representantes dos cidadãos da UE, eleitos por sufrágio universal, direto, livre
e secreto por um mandato de 5 anos (art. 14º/2 e 3 TUE).

Passou por uma série de mutações, passando e um mero órgão de consulta para o atual órgão
de decisão política.
Sempre inconformado com o papel que os Tratados lhe reservaram:
• Resolução 30/3/1962 – autodenominou-se Parlamento Europeu, em vez de
Assembleia95
o Aprovação e incorporação nos Tratados só aconteceu em 1987 com o AUE – que
também deu ao PE o poder de participar no processo de decisão do Conselho
(poderes de cooperação do PE nos processos de decisão normativa do
Conselho)
• Ato relativo à Eleição dos Representantes à Assembleia por sufrágio direto de
8/10/1976 – acordou o número de representantes de cada Estado-membro.
o Mandato representativo em que os deputados não podem receber ordens nem
estar vinculados a instruções.
o Proíbe-se a acumulação de funções parlamentares com o exercício de funções
governativas (seja no Executivo comunitário ou nacional).
o Não impede deputado europeu de exercer outra atividade profissional
remunerada.
o Com a revisão de 2002 proibiu-se o acumular do mandato de deputado europeu
e o mandato de deputado nacional.
o Não foi possível, e até hoje ainda não se conseguiu96, aprovar um processo
eleitoral uniforme ou convergente (art. 223º/1 TFUE) pelo que as eleições para
o PE realizam-se de acordo com os princípios e regras do direito eleitoral vigente
em cada Estado-membro.

Atualmente conta com 750 deputados e o presidente (751)


Composição numérica sempre foi objeto de difíceis negociações políticas entre os Estados-
membros e a discussão gira em torno de dois critérios:
➢ Equidade demográfica
➢ Equilíbrio entre pequenos e grandes Estados-membros

Tratado de Amsterdão: 700 deputados – tinha em vista o alargamento e impunha este limite
para não por em causa a representação equilibrada dos cidadãos mas garantir a
operacionalidade da Instituição.

95
Tendo começado como Assembleia de Representantes dos Estados com a CECA e sendo alargada pelo
Tratado da CEE às 3 comunidades como Assembleia Parlamentar Europeia – possuindo controlo político
e consultivo
96
Estando na agenda desde 1982. Depois do Tratado de Lisboa o deputado inglês Andrew Duff apresentou
um ambicioso projeto de revisão da lei eleitoral (criando circunscrições de âmbito pan-europeu com listas
transnacionais que elegeriam 25 deputados; alargar e fomentar a participação). Embora o que afete mais
a legitimidade representativa são os elevados graus de abstenção nestas eleições.

49
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Tratado de Nice: 732 deputados – consagrou nova grelha de repartição e todos os Estados
sofreram redução do número de deputados (exceto Alemanha com 99, pelo critério demográfico e
Luxemburgo com 6, pela quota mínima)
2004-2009: 785 deputados
Ato de Adesão da Bulgária e da Roménia: 736 deputados

Tratado de Lisboa97: máximo de 750+1, remetendo a concreta composição para decisão do


Conselho Europeu que só aplicou a partir da legislatura 2014-2019
Vinculou-se aos seguintes critérios:
• Representação dos cidadãos é degressivamente proporcional – fórmula que combina
o critério da proporcionalidade na representação dos cidadãos com o critério do
equilíbrio entre Estados-membros – à medida que número de cidadãos de um Estado-
membro aumenta, a sua representatividade diminui.
o Solução tradicional para os problemas de representação institucional dos
Estados-membros no seio da UE, com a garantia de uma certa equidependência
em função da dimensão demográfica, económica ou territorial dos países.
o Compensa os Estados-membros menos populosos no quadro dum
compromisso que lhes é desfavorável no novo sistema de ponderação de votos
no Conselho, baseado no critério da população.
▪ Tribunal Constitucional Alemão declarou parcialmente inconstitucional
este princípio representativo que alegadamente engendraria um défice
democrático estrutural (30/6/2009)
▪ Itália ameaçou bloquear o acordo por ter representação inferior ao
Reino Unido e à França – Declaração nº4 sobre composição do PE –
obteve mais um lugar98
• Há quota mínima e máxima

Estatuto de deputado europeu – combina disposições dos Tratados e instrumentos avulsos


(Protocolo Relativo a Privilégios e Imunidades da UE99) com as disposições nacionais do estatuto
de parlamentar nacional
• Estabelecido pelo próprio PE (art. 223º/2)
• Decisão compromissória do PE e do Conselho sobre as remunerações dos deputados
(sujeição ao regime fiscal nacional ou sujeição a imposto comunitário) foi formalizada a
28/9/05
• Goza de regime incondicional de livre circulação nas deslocações aos locais de trabalho
do PE – fora destas deslocações poderia ser negada a entrada ou permanência por
razões de ordem pública (art. 21º/1, 45º/3, 52º, 62º TFUE)100

97
Reforça papel normativo do PE tornando a codecisão (consagrada no Tratado de Maastricht) como o
procedimento regra
98
Redação dos artigos aponta que o que releva é o sentido do critério político (cidadania) e não o
demográfico (população) – o que poderia favorecer países como Itália e Portugal com tradição de
emigração.
99
Que não é uniforme e só funciona fora do Estado-membro, pois dentro do Estado-membro pelo qual o
deputado foi eleito, o regime aplicável é o que resulta do direito nacional desse Estado (criando-se um
risco de tratamento desigual entre os membros do PE)
100
TEDH considerou como contrário à CEDH pois não se pode abranger um indivíduo na dupla qualidade
de cidadão da UE e deputado europeu – em 27/4/1995, Sentença TEDH Piermont

50
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Organização e Funcionamento
Parlamento Europeu estabelece o seu regulamento interno – art. 232º TFUE
➢ Regimento Interno.

Deputados agrupam-se por ideologias e afinidades políticas, não em função da nacionalidade.


• Regimento fixa as condições de constituição dos grupos políticos – mínimo de 25
deputados.
o Cada deputado só pode pertencer a um grupo político ou a nenhum
(desenvolvendo a sua atividade como deputado não-inscrito).
• Existem 7 grupos políticos e um grupo residual de não-inscritos.
• Art. 10º/4 TUE prevê partidos políticos a nível europeu sendo que as regras aplicáveis
são definidas pelo Conselho e PE (art. 224º TFUE) – grupos políticos são considerados
embriões destes partidos políticos europeus, mas, atualmente são apenas coligações de
partidos de base nacional.

Papel fundamental dos grupos políticos:


• Eleição do presidente (na base de um compromisso entre grupo socialista e grupo
popular europeu);
• Conferência de presidentes, órgão responsável pela organização dos trabalhos, é
formada pelo Presidente e presidentes dos grupos políticos;
• Composição e presidência das comissões permanentes e temporárias deve refletir, por
indicação dos grupos, uma representação equitativa dos Estados-membros e das
tendências políticas;
• Ordem de trabalhos, apresentação de questões e tempo da palavra depende da
expressão numérica das diversas famílias políticas.101

Mesa do PE é formada pelo Presidente, 14 Vice-presidentes e 5 Questores – compete regular


todas as questões financeiras e administrativas diretamente relacionadas com a aplicação do
estatuto dos deputados.
➢ Nomeia Secretário-Geral e estabelece o organigrama desse órgão que dirige os serviços
administrativos do PE.

Presidente dirige as atividades parlamentares e desempenha importantes funções


protocolares e de representação.
➢ Art. 314º/9
➢ Art. 297º/1 – Presidente assina os atos legislativos adotados conjuntamente pelo PE e
Conselho.

PE tem o poder de criar comissões permanentes (art. 183º Regimento) cuja competência se
reparte pelas principais áreas de intervenção do PE. Pode criar comissões de inquérito
temporárias sobre assuntos que exijam posição do PE (art. 226º TFUE).

Sessão – art. 229º TFUE

Quórum – 1/3 dos membros do PE (art. 155º Regimento)

101
Atuação externa dos grupos políticos ou deputados que os compõe não vincula PE (Acórdão TJCE
20/3/1990, Le Pen et Front National/Pulh)

51
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Regra geral de deliberação – maioria dos votos expressos (art. 231º TFUE).
➢ Os Tratados e o Regimento podem prever outras maiorias: menos exigentes (eleição
Presidente); mais exigentes (rejeição de propostas do Conselho – art. 294º/7/b TFUE;
aprovação moção de censura – art. 234º TFUE).

Competências
Art. 14º/1 TUE – principais áreas de atuação do Parlamento Europeu
Sucessivas revisões dos Tratados consolidaram prerrogativas já exercidas e reconheceram novos
poderes no domínio do controlo político e da participação no processo normativo.
Parlamento Europeu não pode aspirar a um estatuto político e funcional equivalente ao dos
parlamentos nacionais pela singela razão de que a União não é um Estado.102
➢ Legitimidade democrática que influi na delimitação de competências entre os órgãos
que garantem o exercício em comum dos poderes de soberania cujos titulares são os
Estados-membros.

Por detrás da questão do défice democrático e do apregoar “mais poderes” para o Parlamento
está a subtração de poderes ao Conselho.
➢ Na perspetiva da repartição vertical de poderes, o objetivo de colmatar um eventual
défice democrático reclama mais o funcionamento efetivo de sistema decisório que
garanta a participação dos parlamentos nacionais do que a atribuição de mais e
alargados poderes ao PE, com o consequente esvaziamento da sede natural desses
poderes que são as assembleias parlamentares dos Estados-membros.
o Protocolo 13 (com a revisão de Amsterdão) inscreveu nos Tratados modalidades
de cooperação entre o PE e os Parlamentos nacionais – previa-se a existência
de COSAC (Conferência das Comissões de Assuntos Europeus e dos Parlamentos dos Estados-
membros).
o Renovado pelo Protocolo 1 (anexo ao Tratado de Lisboa) a função dos COSAC
constitui a expressão institucional do modelo de cooperação interparlamentar
(muito importante, sobretudo nos domínios da PESC)103
➢ Problema do estatuto do PE não pode ser equacionado unilateralmente desligado da
questão fundamental sobre a forma jurídica da UE e das suas relações com os Estados-
membros.

Dispõe de um conjunto de poderes amplo, cuja efetividade política o privilegia no tradicional


triângulo institucional que forma com o Conselho e Comissão.
➢ Mas no que respeita à função política, a sua relação com o Conselho Europeu é mais
favorável a este.

102
O exercício de poderes efetivos de participação no processo orçamental, legislativo e de vinculação
internacional, aliado à condição de órgão representativo justificam o atual estatuto do PE no
funcionamento das vias judiciais de controlo da legalidade pelo TJUE (art. 263º/§2 TFUE; 265º/§1 TFUE;
art. 218º/11 TFUE; art. 267º TFUE e art. 23º, 24º Estatuto TJUE; art. 40º Estatuto TJUE; art. 268º e 340º
TFUE)
103
Outra modalidade de cooperação intergovernamental é a Conferência dos Presidentes dos
Parlamentos Nacionais da UE – desde 1963

52
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Tratado de Lisboa generalizou o procedimento de codecisão (função legislativa)


• Nos mais diversos domínios de regulação material aplica-se o procedimento legislativo
ordinário através de decisão conjunta PE e Conselho.
• Além do reforço dos poderes no procedimento orçamental, PE passou a exercer
competência deliberativa sobre matérias importantes como a aprovação de Tratados
pelo processo simplificado (art. 48º/7/§4 TUE), aprovação de retirada dum Estado-
membro (art. 50º/2 TUE), aprovação do exercício de poderes novos pela UE (art. 352º/1
TFUE), aprovação de acordos internacionais (art. 218º/6 TFUE).
• Alteração no processo de nomeação do Presidente da Comissão foi no sentido de
acentuar a importância da intervenção do PE, agora competente para eleger o
candidato proposto pelo Conselho Europeu (art. 17º/7 TUE).

1. Poderes de Controlo Político – originalmente o PE foi concebido como órgão de controlo


político da Comissão. Hoje esse controlo estende-se também ao Conselho e é intermediado
por vários meios de fiscalização
A. Nomeação da Comissão: art. 17º/7 TUE
• Conselho Europeu indica candidato a Presidente da Comissão tendo em conta
o resultado das eleições para o PE e após desenvolver as necessárias diligências
de acerto de posições entre as duas instituições (art. 17º/7 e Declaração 11)
• PE impôs a prática de audição prévia das personalidades nomeadas como
futuros membros da Comissão – poder informal, mas politicamente relevante
B. Nomeação do Provedor de Justiça: art. 228º/2 TFUE
C. Outras nomeações: PE é consultado na nomeação dos membros do Tribunal de Contas
(art. 286º/2 TFUE); Presidente, Vice e vogais da Comissão Executiva do BCE (art. 283º/2
TFUE e art. 11º Protocolo SEBC); propõe uma das 7 personalidades que compõe o comité
de audição dos candidatos ao exercício das funções de juiz ou de advogado-geral (art.
255º TFUE)
D. Moção de Censura: art. 234º TFUE ex vi art. 17º/8 TUE
• Mecanismo raramente acionado e apenas 6 moções foram propostas desde
1979 e nunca se chegou à fase da votação e do consequente derrube da
Comissão.
i. Em Março de 1999 a moção de censura contra a Comissão presidida por
Jacques Santer foi rejeitada por escassa maioria mas a Comissão deixou de ter
condições políticas para continuar e pediu demissão
E. Questões e Debates: responsabilidade politica da Comissão efetiva-se no dia a dia da
sua atuação, proporcionando um controlo efetivo.
• Art. 230º TFUE – não existe a mesma obrigação de resposta para o Conselho
mas desde 1959 que este aceita responder às questões (para alguns surgiu um
Costume Comunitário)
i. Codificado com a Declaração de Estugarda sobre a UE (19/6/1983)
• Art. 36º TUE
• Art. 233º TUE

53
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

F. Direito de Petição e Inquérito: art. 226º e 227º TFUE


• Desde o Tratado de Maastricht e em que se admitida, a petição será objeto de
competente instrução e pode dar lugar a propostas de reforma normativa
adequada (art. 202º Regimento)
• PE pode criar comissões de inquérito que se extinguem com a apresentação de
relatório ao PE

2. Poderes Orçamentais – desde 1970 e dos recursos próprios da Comunidade e dos Tratados
Orçamentais dos anos 70 que o PE se converteu numa instituição de decisão orçamental.
Art. 314º/§1 TFUE: procedimento orçamental enquadra a participação do PE como verdadeiro
titular de um poder de codecisão que partilha com o Conselho.
➢ Pode alterar projeto de Orçamento adotado pelo Conselho (art. 314º/4/c)
➢ Declarar verificada a aprovação do Orçamento (art. 314º/4/a)
➢ Rejeitar a aprovação do projeto comum (art. 314º/7/b)
Na ausência de acordo imediato entre Conselho e PE há um conjunto de diligências para que as
duas instituições participem na construção do texto orçamental da UE (no seio do Comité de
Conciliação).
Art. 319º

3. Poderes de Decisão no Processo Normativo – desde o QUE que o PE é órgão da tríade


institucional responsável pelo processo comunitário de decisão normativa. Com Maastricht, o
PE adquiriu poder de deliberação sobre determinadas matérias.
A. Participação do PE no processo legislativo: Tratado de Lisboa generalizou o processo
de codecisão (art. 289º/1 TFUE) como o processo legislativo ordinário – confirmou-se o
PE como órgão decisor em parceria com o Conselho.
• Nos processos legislativos especiais a participação do PE pode ser uma
deliberação (art. 233º/2 TFUE) ou mera consulta (art. 21º/3 TFUE)
i. Participação consultiva reduzida a 5 casos previstos no TUE e 50 no
TFUE
• Apenas em 3 situações pode deliberar como autor do ato:
i. Definição do estatuto e condições gerais do exercício dos deputados
europeus, condicionado pela aprovação prévia do Conselho (art. 223º/2
TFUE)
ii. Determinação das regras de exercício do direito de inquérito, precedida
de aprovação do Conselho e Comissão (art. 226º/§3 TFUE)
iii. Definição do estatuto e condições gerais de exercício das funções de
provedor de justiça (art. 228º/4 TFUE)
B. Participação do PE no processo de execução das normas: PE sempre defendeu o direito
de controlar e de influenciar, a jusante, o processo de execução.
• Art. 291º TFUE não confere poderes de execução mas prevê a sua participação
no processo de regulação prévia das condições de exercício pela Comissão das
competências executivas (comitologia)
i. Art. 291º/3
• Art. 290º TFUE, em relação aos atos delegados o PE goza de poderes decisórios
equivalentes aos do Conselho – PE pode revogar a delegação e de formular
objeções que impedem a entrada em vigor do ato delegado.

54
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

C. Participação do PE no processo de vinculação internacional da UE: art. 218º/6/a TFUE


• Restantes acordos, com exceção dos que incidam sobre PESC (art. 218º/6/§2),
o Parlamento é consultado (art. 218º/6/b)
• Aprovação do PE corresponde a ato de autorização para celebrar o acordo –
pronuncia-se sobre o texto definitivo.
D. Poder de Aprovação Prévia: PE dispõe de poder de veto sobre leque significativo de
matérias de elevada densidade política, exercido sob forma de aprovação prévia.
• Tratado de Lisboa: aprovação (antes era chamado parecer favorável) em várias
áreas
i. Art. 48º/7/§4 TUE
ii. Art. 48º/§1 TUE
iii. Art. 50º/2 TUE
iv. Art. 352º/1 TFUE
v. Art. 25º TFUE
vi. Art. 329º/1 TFUE
vii. Art. 14º/2 TUE
viii. Art. 7º/2 TUE
➢ Aprovar ou rejeitar mas não pode propor alterações – sob a
forma de veto

Conselho Europeu
Das cimeiras ao estatuto de superinstituição
Os Planos Fouchet (índole intergovernamental – 1961 e 1962) apoiados pelo França gaullista
destinava às Cimeiras de Chefes de Estado ou de Governo um lugar central, relegando para
segundo plano as instituições comunitárias.
• Oposição da corrente integracionista a transformar as Cimeiras numa estrutura própria.
• Jean Monnet (depois da Cimeira de Paris de 1972) reconheceu que se devia reforçar e
renovar a autoridade comunitária – faltava uma instituição de impulsão política,
dotada de verdadeiros poderes de decisão, coordenando posições assumidas pelos
Estados-membros

• Cimeira de Paris (1974) propôs a institucionalização dos encontros regulares dos


Chefes de Estado ou de Governo – comunicado final é considerado o ato institutivo do
Conselho Europeu104
o Nasce de um ato informal (Resolução dos Chefes de Estado e de Governo),
testemunho da vontade política dos Estados-membros
o Consagração formal com o AUE e complementado pelo Tratado de Maastricht
(art. 4º dessa versão) mas não reconhecido como instituição

Institucionalização das cimeiras intergovernamentais clarificou o lugar do Conselho Europeu na


estrutura orgânica das Comunidades Europeias mas abriu um debate sobre a natureza jurídica
desta instância decisória.

104
Embora sem este nome, que só surgiu mais tarde. O pendor intergovernamental da decisão
institucional foi compensado por duas importantes resoluções de intuito integracionista – uma relativa à
eleição do PE por sufrágio universal e outra quanto ao compromisso de renunciar ao uso sistemático da
unanimidade nas deliberações do Conselho de Ministros.

55
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

➢ Estava em causa o seguinte: será um órgão comunitário? Qual o âmbito das suas
competências, especialmente na função normativa? Qual a forma dos seus atos e regras
aplicáveis ao eventual controlo jurisdicional?
o MLD (antes de 2007): defendia a dupla natureza do Conselho Europeu (órgão
supremo de impulsão do processo de integração comunitária correspondente
ao nível político mais elevado de formação do Conselho + instância superior de
cooperação política entre os Estados-membros)
▪ Desdobramento funcional entre conferência diplomática para as
matérias da cooperação política e a atuação como órgão comunitário
na resolução de questões bloqueadas no Conselho.

Tratado de Lisboa vem alterar radicalmente o enquadramento normativo e institucional do


Conselho Europeu encerrando a polémica.105
• Art. 13º TUE – junta o Conselho Europeu ao rol das Instituições
• Surge como uma superinstituição – devido aos poderes que lhe foram confiados está
num patamar superior às outras instituições, em especial os que se referem ao controlo
das outras instituições e à decisão no processo de revisão do estatuto jurídico da UE
o Não é inesperado: desde a criação da UE que a influência do Conselho Europeu
cresceu de modo continuado (ex: aumento do número de reuniões, natureza
precisa da ordem de trabalhos, publicidade assegurada às Conclusões)
o Não é definitivo/fechado: tem um grau de precisão elevado mas o papel que
pode vir a desempenhar depende de outros fatores.106

Hoje a natureza jurídica do Conselho Europeu convoca 3 planos de análise:


1. Político – valorização ou não o seu papel na estrutura decisória da UE
2. Jurídico-fundacional – busca nos Tratados o fundamento adequado ao seu
funcionamento
3. Jurídico-institucional – enquadra a sua natureza funcional e identifica os procedimentos
de decisão e natureza dos atos

Composição
Chefes de Estado ou de Governo – por uns ou por outros consoante o previsto na Constituição
de cada Estado-membro sobre a condução da política externa ao mais alto nível (ao mais alto
nível hierárquico=; Presidente da Comissão; Presidente do Conselho Europeu (que carece de
estatuto de membro – art. 235º/1 TFUE); Alto Representante da UE para os Negócios
Estrangeiros (que só participa nos trabalhos, mas não é membro do Conselho Europeu)
➢ Art. 15º/2 TUE

Adquiriu presidência permanente e autónoma107 – reforça a sua autoridade e melhora a resposta


em situações de crise.
• Eleito nos termos do art. 15º/5 TUE

105
Contrabalanço da opção comunitária com esta superinstituição caracterizadora do método
intergovernamental.
106
Se houver uma afirmação crescente do papel do Conselho Europeu isso pode constituir uma ameaça
de perversão intergovernamental do modelo comunitário de decisão com um diretório restrito.
107
Com o Tratado de Lisboa deixa de ser presidido pelo

56
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Desempenha um papel de acentuado relevo político – plano interno da dinamização


das políticas da União e no plano externo de representação da UE (art. 15º/6 TUE)

Organização e Funcionamento
Art. 15º/3 TUE codifica a prática de reunião do Conselho Europeu 2 vezes por semestre.
➢ Tradicional flexibilidade deu lugar a um regime de maior exigência formal, adequada ao
exercício de poderes decisórios sob a forma de atos jurídicos vinculativos.

Art. 15º/4 TUE – regra de deliberação é o consenso, sem recurso à votação108

Competências
Art. 15º/1 TUE: dar à UE os “impulsos necessários ao seu desenvolvimento” e definição das
orientações e prioridades políticas gerais (escolha das grandes opções de direção política109).

Não exerce a função legislativa – nem adota atos normativos – e tem sim uma missão de
natureza exclusivamente política cujas principais funções são:
• Estatutária – Tratado de Lisboa ampliou e robusteceu os poderes do Conselho Europeu
fazendo muitas questões depender da sua decisão.
o Modificação de disposições e procedimentos de decisão inscritos nos tratados
(art. 48º/6 e 7 TUE)110
▪ Cláusulas de Passerele – mecanismos que permitem, no futuro, sem
revisão formal dos tratados, desenvolver soluções para aprofundar a
integração europeia. Poder do Conselho Europeu utilizar as cláusulas
para alterar uma disposição dos tratados que vai afetar a prática do
Conselho – permite que haja soluções de índole mais comunitária se o
Conselho Europeu quiser acelerar a integração de forma mais
explícita.
➢ Art. 48º/7 TUE – cláusula de passerelle geral, inserida num
artigo sobre os processos de alterações dos Tratados – processo
de revisão ultrassimplifficado.
➢ Cláusula geral tem dois aspetos e prevê duas situações:
alteração das regras de deliberação + alteração do processo
legislativo especial do Conselho
❖ Dá mais poder ao PE, pois exige ato legislativo ordinário
(que funciona em codecisão – maior legitimidade
democrática)
➢ Art. 31º/3 TUE tem cláusula de passerele específica em matéria
de PESC
o Condições de adesão dos Estados (art. 49º TUE)
o Condições de retirada dos Estados-membros (art. 50º TUE)
o Nomeação de responsáveis importantes na estrutura institucional da UE –
próprio presidente (art. 15º/5); Alto Representante (art 18º/1); proposta para

108
Não se confunde com a unanimidade que exige a votação e está prevista em várias situações nos
tratados
109
Que vão ser concretizadas pelo legislador europeu (cuja iniciativa parte da Comissão)
110
Caráter de superinstituição, substituindo CIG nalgumas revisões de Tratados.

57
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Presidente da Comissão (art. 17º/7); presidente, vice e vogais da comissão


executiva do BCE (art. 283º/2)
o Delibera sobre as formações do Conselho (art. 236º) e sobre a eventual adoção
de sistema de rotação na composição da Comissão (art. 17º/5)
o Recomendações sobre política comum de defesa (art. 42º/2 TUE); ampliação da
linha de competência da UE sobre segurança social (art. 48º TFUE); cooperação
judiciária em matéria penal e cooperação policial (art. 83º e 87º TFUE)

o Prerrogativa do Conselho Europeu é a intervenção nas outras instituições: no


Parlamento na sua composição (art. 14º/2); na Comissão (art. 17º/5 TUE -> art.
244º TFUE)111 escolhendo os comissários com base num sistema de rotação
estabelecido por unanimidade112.

• Impulsão Política – desenvolvida através de uma ação de orientação geral que se


manifesta, sobretudo, no domínio da governação económica (art. 121º/2/§2 e art.
148º/1 TFUE)113 e no domínio das relações externas (art. 22º/1 e art. 24º/1/§2 TUE)

Tratados não fixam tipologia de atos do Conselho Europeu e a prática trouxe-nos as conclusões,
declarações, orientações, comunicados – não correspondem à tipologia dos atos jurídicos da UE
nem se ajustam à nomenclatura do DIP.
➢ Com o Tratado de Lisboa114 o resultado dos trabalhos do Conselho Europeu é divulgado
sob a designação de Conclusões e é publicado no Jornal Oficial da União Europeia.

Conselho da União
Composição
Por um representante de cada Estado (art. 16º/2 TUE) – cabendo a cada Estado-membro
escolher o seu representante, podendo recair sobre qualquer membro do Governo desde que
capaz de “vincular o Governo do respetivo Estado-membro e exercer direito de voto”.
• Art. 239º TFUE – pode delegar noutro Estado-membro o exercício do direito de voto,
desde que representado a nível ministerial.

Tem formações ministeriais diferentes, consoante as matérias em discussão.115

111
Conselho Europeu escolhe o candidato a presidente da comissão (art. 17º/7) sendo ele depois eleito
pelo PE (transfere para esse presidente um pouco da sua legitimidade democrática).
112
Ainda não está em vigor e funciona ainda o art. 17º/4).
113
Grande expressão aquando da crise financeira e orçamental da eurozona em 2010 – constitui
mecanismo europeu de apoio financeiro (FEEF); enquadrou novo procedimento de controlo designado
por “semestre europeu” com a missão de reforma estrutural das políticas económicas dos Estados-
membros; aprovação de relatórios; aditamento do nº3 do art. 136º TFUE.
114
Antes havia as Conclusões da Presidência com: Declarações (posições de especial importância);
Orientações; Resoluções (toma posição sobre questões específicas); Decisões
115
Representação de Portugal no Conselho da União é feita pelo Ministro competente na matéria ou
Secretário de Estado (mediante prévio ato de delegação de competências do Ministro). Preparação é feita
pelo Conselho de Ministros e pela Comissão Interministerial para os Assuntos Europeus.
➢ Resolução do Conselho de Ministros nº 32/86

58
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Formações obrigatórias: Conselho dos Assuntos Gerais e Conselho dos Negócios


Estrangeiros (art. 16º/6 TUE)
• As outras formações são escolhidas pelo Conselho Europeu no âmbito do art. 236º TFUE

Mais relevantes:
• Conselho dos Assuntos Gerais – assegura a coordenação e a coerência dos trabalhos
das diferentes formações; prepara as reuniões com o Conselho Europeu e articulando-
se com o Presidente do Conselho Europeu e da Comissão garante a continuidade dos
trabalhos – composto pelos Ministros dos Negócios Estrangeiros ou dos Assuntos
Europeus
• Conselho dos Negócios Estrangeiros – elabora a ação externa da UE, de acordo com
linhas estratégicas definidas pelo Conselho Europeu, assegurando a coerência da ação
externa da UE – composto pelos Ministros dos Negócios Estrangeiros e presidido pelo
Alto Representante (art. 18º/3 TUE)
• ECOFIN / Assuntos Económicos e Financeiros – instância de debate, preparação e
decisão sobre a resposta que se espera da UE em matéria de governação económica e
auxílio financeiro aos Estados-membros – composto pelos Ministros das Finanças ou
Economia

Organização e Funcionamento
PRESIDÊNCIA
Art. 16º/9 TUE – Sistema de Rotação Igualitária
Conselho Europeu, pelo art. 236º/b TFUE definiu:
• Conselho é presidido por grupos pré-determinados de 3 Estados-membros durante um
período de 18 meses, tendo em conta a sua diversidade e os equilíbrios geográficos da
UE – sistema de troika (associa 3 presidências: atual, passada e futura)116
o Formato triangular permite uma articulação mãos eficiente e previsível das
atividades do Conselho, especialmente no domínio legislativo e no da definição
de prioridades de política externa da UE.
o Programação plurianual acordada entre os 3 Estados-membros em função de
diretrizes estratégicas de médio prazo.
• Cada membro do Grupo preside, sucessivamente, durante 6 meses, a todas as
formações do Conselho (exceto a dos Negócios Estrangeiros), ao Comité de
Representantes Permanentes (COREPER), bem como todos os grupos e comités de
natureza intergovernamental que dependam do Conselho.

Deve respeitar uma obrigação de neutralidade no tratamento das várias delegações117 e


privilegiar a formação de consensos e formular propostas que possam superar ou mesmo
prevenir bloqueios.

COREPER

116
A atual presidência é de Malta (Janeiro-Junho 2017) sendo a anterior da Eslováquia e a seguinte do
Reino Unido
117
Mas não neutralidade política, pois há que definir estratégias, divulga-las e atuar de modo a alcançar
um grau de realização elevado de realização do programa definido.

59
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Art. 16º/7 TUE – composto pelos representantes permanentes dos Governos dos Estados-
membros em Bruxelas118, desempenha a função de preparar os trabalhos do Conselho e de
exercer os mandatos que este lhe confia – art. 240º TFUE
• Mero órgão auxiliar, desprovido de poderes de decisão – prática institucional deu-lhe
um papel relevante no diálogo interinstitucional de conteúdo técnico com a Comissão.
o Vocação burocrática e técnica
o Podem mesmo constituir ou dar acordo à constituição de comités e grupos de
trabalho para aprofundar o debate técnico em torno das propostas da
Comissão.
▪ Estados-membros estão representados nos grupos de trabalho através
de funcionários da sua representação permanente (REPER) ou
funcionários da Administração nacional, enviados pelas respetivas
capitais.
• Assegura a ligação constante entre os Estados-membros e a Comissão, a propósito de
projetos e iniciativas desta.

COREPER I – representantes permanentes adjuntos que preparam os trabalhos das restantes


formações do Conselho em que é dominante a componente técnica das propostas em discussão
COREPER II – chefes de representações permanentes que preparam os trabalhos sobre as
matérias de maior relevo político.

Examina todos os pontos da ordem de trabalhos do Conselho, elaborada pela Presidência.


Comités mais importantes: Agricultura, Transportes, Económico e Financeiro, Emprego, Justiça
e Assuntos Internos.

Órgão auxiliar do Conselho da União (art. 71º TFUE) com exceção do COPS – Comité Político e
de Segurança – que pode, por autorização expressa do Conselho, tomar decisões no quadro de
uma operação de gestão de crises (art. 38º/§3 TUE)

SECRETARIADO-GERAL
Órgão de natureza burocrática que assiste o Conselho – nomeado por este por maioria
qualificada (art. 240º/2 TFUE). Compete-lhe:
• Elaboração do projeto de atas das reuniões
• Providenciar a publicação dos atos no Jornal Oficial
• Notificação dos atos aos seus destinatários
• Elaboração de um projeto de mapa previsional das despesas do Conselho, a incluir no
projeto orçamental
• Função de depositário de acordos e convenções internacionais

É fundamental o seu apoio à Presidência e constitui o elemento de continuidade e suporte técnico


dos trabalhos.
➢ Dispõe de estrutura administrativa que inclui o Serviço Jurídico119 e várias direções
gerais cujas competências se repartem pelas diferentes áreas de intervenção da UE.

118
Devidamente mandatados pelos Governos nacionais e orientados por diretrizes políticas a seguir sobre
as questões em análise.
119
Com uma unidade específica de juristas linguistas, pois ao Secretariado-Geral incumbe o zelo pela
qualidade de redação dos atos normativos adotados pelo Conselho e, de acordo com o multilinguismo

60
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Regras de Deliberação
Maioria Qualificada – regra; art. 16º/3 TUE – alcançada através dum modelo de ponderação do
peso relativo dos Estados-membros. Critério do número de votos/Estados-membros aliado ao
critério da representatividade democrática.120
➢ Art. 16º/4 TUE – Deliberação sob proposta da Comissão: sistema de dupla maioria
(percentagem de Estados e percentagem da população)
➢ Art. 238º/2 TFUE – Deliberação não sob proposta da Comissão
• Desvios Intergovernamentais
o Acordo do Luxemburgo – 1966; encerrou a política da “cadeira vazia” mas abriu
a porta a uma prática que transmutou o princípio de deliberação no seio do
Conselho – garantiu aos Estados a substituição da regra da maioria pela
exigência do consenso sempre que estiverem em causa “interesses muito
importantes de um ou vários Estados-membros”.
▪ Em nome dos interesses nacionais, os Estados-membros readquiriam
pela via da revisão informal dos Tratados o direito de veto – reforço do
fator intergovernamental121.
▪ Compromisso político contrário aos Tratados122 – ato fundador de uma
prática que adquiriu força de costume, com eficácia derrogatória em
relação ao sistema de deliberação previsto nos Tratados.
▪ Tratado de Lisboa generalizou o princípio maioritário de decisão no seio
do Conselho mas ainda consagrou um desvio intergovernamental no
art. 31º/2/§2 TUE, art. 48º/§2, 86º/1/§2, 87º/3/§2 TFUE)

o Declaração de Ioanina I – 1994; quando se deu o alargamento a 16 com a


entrada da Áustria, Finlândia, Noruega e Suécia – Reino Unido ameaçava vetar
a entrada de novos membros se não fosse consagrado a possibilidade de um
certo número de Estados opor-se às tomadas de decisão por maioria
qualificada.
o Declaração de Ioanina II – Tratado de Lisboa; Declaração nº 7

Maioria Simples – art. 238º/1 TFUE – previsto em questões de procedimento e organizativas


Unanimidade – ainda é imposta para decisões sobre matérias de particular sensibilidade política
ou decisões com incidência estrutural e “constituinte”. Qualquer Estado-membro possui, então,
direito de veto.
➢ O Conselho Europeu, com exceção das decisões que tenham implicações no domínio
militar ou da defesa, pode tomar uma decisão que autoriza o Conselho de Ministros a
deliberar por maioria qualificada (cláusula-passarela), embora o parlamento de

como princípio organizativo da UE, garantir a versão rigorosa e equivalente em todas as línguas oficiais
da UE.
120
Está em causa um problema de partilha e equilíbrio no exercício do poder.
121
Minou a estrutura de decisão comunitária com a admissão do direito de veto como instrumento de
interesses vitais dos Estados-membros e pela subalternização do papel da Comissão relativamente ao
Conselho no quadro do procedimento de decisão fixado no Tratado de Roma.
122
Não são verdadeiros Tratados. É um compromisso que serviu de base à formação dum costume contra
legem na regulação do funcionamento do Conselho de Ministros (que os Tratados de Paris e Tratados de
Roma consagravam de forma diferente).

61
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

qualquer Estado-membro pode travar essa substituição da unanimidade pela maioria


qualificada (art. 48º/7 TUE).

Competências
1. Poderes de Decisão – art. 16º/1 TUE – no âmbito da função legislativa e orçamental que
partilha com o Parlamento Europeu.
• Não há reservas para a função orçamental.
• Quanto à função legislativa pode tomar a forma de ato unilateral, quando é de natureza
exclusiva do Conselho no âmbito de um processo legislativo especial (art. 289º/2 TFUE).
o Sujeito ao princípio da transparência (art. 16º/8 TUE).
• No âmbito de PESC o Conselho também pode adotar decisões, desde que respeitados
os objetivos e orientações gerais definidos pelo Conselho Europeu (art. 24º/1/§2, 26º/1,
27ª/1 TUE)

2. Poderes de Vinculação Internacional


• Fase da Negociação: Conselho autoriza a abertura das negociações e controla o seu
desenrolar sob a forma de diretrizes dirigidas ao negociado (Comissão ou Alto
Representante) – art. 218º/2, 3 e 4 TFUE.
• Fase da Assinatura: Conselho adota a decisão que autoriza a assinatura do acordo – art.
218º/5 TFUE
• Fase da Conclusão: Conselho adota a decisão de celebração – art. 218º/6 TFUE

3. Poderes de Execução – a competência executiva dos atos juridicamente vinculativos da UE


pertence aos Estados-membros (art. 291º/2 TFUE).
• Se, de acordo com o princípio da subsidiariedade se justificar a adoção de atos de
execução pela UE, a competência é da Comissão sob a forma de atos delegados (art.
290º/1 TFUE) ou de atos de execução e, em casos específicos devidamente justificados,
ao Conselho (art. 291º/2 TFUE).
• Conselho exerce competência executiva com fundamento em bases jurídicas avulsas

4. Poderes de Coordenação – art. 16º/1 TUE – função primordial que se desdobra em dois
planos
• Plano das Políticas da UE sob a direção do Conselho de Assuntos Gerais
• Plano das Políticas definidas pelos Estados-membros – art. 119º a 126º TFUE; as bases
de coordenação das políticas económicas são definidas pelo Conselho, tendo a
formação ECOFIN o centro principal de decisão.

Comissão Europeia
Composição
Art. 17º/4 TUE – pois o art. 17º/5 ainda não está em vigor
➢ MLD: uma Comissão mais pequena seria, teoricamente, uma Comissão adequada à
função, mais ágil e mais coesa, tendo em conta que se trata do órgão executivo da UE.

62
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Duas teses se defrontaram: defensores de Comissão de base igualitária (representados todos os


Estados-membros); defensores de Comissão de composição restrita (cujos membros seriam
nacionais de Estados-membros com base no sistema de rotação rigorosamente igualitária)123

Na sequência do primeiro referendo negativo, a Irlanda reclamou várias garantias e uma delas
foi a da Comissão continuar a ser constituída por um nacional de cada Estado-membro.
• Compromisso assumido por todos os Estados-membros por estar em causa um princípio
tradicional de representação igualitária dos Estados-membros ao nível da Comissão
que garante uma articulação efetiva entre eles, tendo em conta as realidades políticas,
sociais e económicas de todos os Estados-membros.
o Membros da comissão não representam os Estados-membros mas
transportam para o Executivo da UE o conhecimento objetivo das realidades
específicas de cada Estado-membro.

Art. 17º/3/§3 TUE e art. 245º TFUE postulam os deveres dos Comissários.
➢ Muito importante a absoluta independência dos Comissários
o Os Governos têm de a respeitar mas não deixam de sensibilizar os seus
comissários em relação aos problemas que mais diretamente afetam os
interesses nacionais. Por vezes, é o próprio comissário que procura obter das
autoridades do “seu” Estado-membro de nacionalidade os esclarecimentos que
poderão ditar o respetivo sentido de voto no momento crucial da deliberação
no colégio de 28 comissários.

Art. 17º/3 TUE – mandato de 5 anos que várias disposições visam garantir que coincidam com
a legislatura do PE (ex: art. 234º, 246º TFUE)
• Já não está prevista a possibilidade de renovação do mandato – silêncio dos Tratados
não deve ser interpretado no sentido de excluir decisões de recondução das funções.

No exercício do seu mandato os Comissários gozam do regime de privilégios e imunidades


reconhecidos aos agentes e funcionários da UE.
PRESIDENTE DA COMISSÃO
Art. 17º/7 TUE – Parlamento Europeu e Conselho Europeu têm de entender-se sobre o perfil do
candidato a Presidente da Comissão: ambas estas instituição são conjuntamente responsáveis
(Declaração 11).
• Ter em consideração as eleições para o PE sublinha a carga política, de feição
parlamentar, da escolha do Presidente da Comissão, cujo mandato fica assim muito mais
dependente da maioria política do hemiciclo de Estrasburgo.
• O Presidente eleito consulta com os Governos dos Estados-membros e o Conselho
adota, de comum acordo com o presidente eleito, uma lista de comissários propostos
pelos Estados-membros (art. 17º/7/§2 TUE).
• Sujeitos a voto do Parlamento Europeu 124 e nomeados pelo Conselho Europeu por
maioria qualificada (art. 17º/7/§3 TUE).

123
Solução adotada no texto do Tratado (art. 17º/5 TUE e 244º TFUE) mas que, por circunstâncias
supervenientes, foi abandonada.
124
Que se arroga o direito de proceder a audições individuais – mecanismo prévio de controlo que se
inspira nos “hearings” do Senado dos EUA. Poderá fazer depender o seu voto de aprovação da
disponibilidade dos Governos dos Estados-membros para substituir uma personalidade non grata por
outra que esteja em condições de passar no teste parlamentar. Ex: Comissão Barroso I: proposta da Itália

63
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Art. 17º/6 TUE – tem no plano político e organizativo os instrumentos de direção efetiva da
Comissão.

Art. 246º TFUE – causas de cessação individual das funções de comissário

Art. 234º - destituição coletiva da Comissão na sequência de uma moção de censura do PE, no
quadro da responsabilidade política que subordina a atuação da Comissão ao veredicto do órgão
Parlamentar.
➢ Em 1999 a Comissão Jacques Santer demitiu-se na sequência de conturbado processo
parlamentar com acusações de fraude e má gestão – não caiu devido a moção de
censura e introduziu uma nova modalidade de afastamento da Comissão: destituição
coletiva voluntária.

Organização e Funcionamento
Comissão dispõe, para preparar e executar as suas ações, de um conjunto complexo de serviços,
organizados em direções-gerais e serviços equiparados. Para dar resposta a necessidades
especiais, a Comissão pode ainda criar estruturas específicas incumbidas de missões precisas.

Dupla dimensão: política e administrativa.


➢ Dimensão política – Presidente, Vice-Presidentes e Comissários – orienta, dirige e atua
através dos serviços constituindo estes a dimensão administrativa.

Secretário-geral tem a função primordial de garantir uma abordagem comum e coordenada a


propósito de qualquer iniciativa da responsabilidade de um serviço específico.
• Assiste o Presidente na preparação dos trabalhos e das reuniões do colégio dos
comissários – mais alto funcionário da Comissão, conferindo estabilidade e
continuidade ao funcionamento interno da Comissão.
Serviço jurídico tem de ser consultado obrigatoriamente sobre qualquer proposta de ato jurídico
articulando os serviços.

Membros da Comissão formam colégio no seio do qual o Presidente tem um voto como os
restantes membros – maioria no art. 250º TFUE.
➢ Decide sob proposta de um ou vários dos seus membros.

Presidente além das funções típicas de um órgão colegial, personifica uma função de relevante
envergadura política: participa nas reuniões do Conselho Europeu, comparece perante o
Parlamento Europeu e distribui pelos comissários domínios específicos de atividade (os
“pelouros”125 – art. 248º TFUE – que apesar de existirem, é o princípio da colegialidade que
subordina toda a lógica de funcionamento da Comissão)

Princípio da colegialidade – todas as decisões adotadas são imputadas à Comissão no seu


conjunto e assumidas coletivamente por todos os seus membros.

não passava devido a declarações homofóbicas; Comissão Barroso II: proposta da Bulgária não passava
por suspeita de prática de irregularidades financeiras
125
A repartição dos pelouros não é alheia a pressões exercidas pelos Estados-membros que jogam para
garantir as pastas mais importantes.

64
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

➢ Confirmado pelo Caso Akzo (Comissão c. Alemanha, 1985)

Alguns desvios destes princípios:


• Atribuição aos comissários de responsabilidade política que podem instruir os serviços
administrativo no âmbito desse domínio (art. 19º/2 RI)
• Reuniões preparatórias de chefes de gabinete dos Comissários – importância crescente
da estrutura auxiliar
• Procedimento escrito de decisão – que não obsta a que se solicite que a proposta seja
discutida em reunião (art. 12º/3 RI)
• Delegação de Poderes – art. 13º RI, podendo ainda haver subdelegações.
o Tribunal aceita-o como competência de auto-organização da Comissão desde
que limitado a simples medidas de gestão (Acórdão Akzo) e poderes claramente
delimitados de órgãos subsidiários com o poder de execução das decisões
(Acórdão Meroni).

O princípio da colegialidade é considerado pelo Tribunal como um fator de segurança jurídica,


garantia fundamental para os destinatários dos atos adotados e se for violada pode ser motivo
de impugnação ou conduzir à declaração de inexistência jurídica da medida adotada (Acórdão
TJCE de 15/6/1994)
➢ No plano político implica uma responsabilidade coletiva, especialmente perante o
Parlamento Europeu.
o PE não pode exigir “a cabeça de um comissário” mas pode pressionar o
Presidente da Comissão para acionar o “Procedimento Prodi” e solicitar a
demissão de um ou mais comissários.

Competências
Art. 17º/1 TUE – objetivo de promover o “interesse geral da União”
• Guardiã dos Tratados – vela pela sua aplicação bem como das medidas adotadas pelas
Instituições por força destes
• Controlar a aplicação do direito da UE – sob fiscalização do TJUE
• Executa orçamento e gere programas
• Exerce funções de coordenação, execução e gestão – conforme o estabelecido nos
Tratados
• Assegura representação externa da UE – exceção de PESC
• Toma iniciativa de programação anual e plurianual

Áreas de Competência:
1. Competência de Iniciativa – art. 17º/2 TUE - monopólio de iniciativa de atos legislativos.
➢ Exceção no art. 223º/2, art. 289º/4 TFUE
Conselho só pode alterar uma proposta da Comissão por unanimidade (art. 293º/1 TFUE) e
nunca se pode substituir a ela.
• Comissão pode alterar a proposta enquanto o Conselho ainda não tiver deliberado (art.
293º/2 TFUE).

65
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Poder jurídico de impulsão faz da Comissão o motor da integração, responsável pelos saltos
qualitativos no processo de realização do desígnio comunitário.126
• Eventual inércia da Comissão na apresentação de propostas pode gerar iniciativas de
natureza política – art. 11º/§4 TUE; art. 225º e 241º TFUE
• No caso de não apresentar a proposta solicitada pelo PE ou pelo Conselho, a Comissão
além do dever de informar sobre as razões porque não avança com uma proposta, pode
ser demandada perante o TJUE e condenada por omissão (art. 265º TFUE).

2. Competências de Controlo – Comissão é guardiã dos Tratados. Mas não tem direito
exclusivo nem preferencial de controlo – tem competência genérica e subsidiária de controlo
e vigilância.
• Tribunal de Justiça e os restantes exercem controlo judicial.
• Tribunal de Contas exerce controlo financeiro.
Tem amplas prerrogativas para recolher as informações e proceder às verificações necessárias
(art. 96º/2; art. 103º/2/a; art. 106º/3; art. 108º/2; art. 260º; art. 337º TFUE)

3. Competências de Execução – Comissão é executivo da UE, fragilizada pelo Tratado de


Lisboa (art. 291º/3 TFUE127)
Competência-regra de adoção de atos de execução pertence aos Estados-membros (art.
291º/1 TFUE e art. 4º/3 TUE) – competência da Comissão é limitada pelo princípio da
subsidiariedade (art. 291º/2 TFUE).
➢ Na prática assegura a função executiva de âmbito genérico, dependente, contudo, de
atribuição expressa no ato legislativo, com fundamento em critérios objetivos de
execução uniforme, e sujeita ao controlo remoto exercido pelos Estados-membros
através dos comités técnicos compostos por representantes nacionais.

Comissão detém poderes importantes de gestão e execução direta noutros domínios: gestão de
fundos comunitários (art. 317º TFUE); execução do orçamento (art. 317º TFUE); gestão de
cláusulas de salvaguarda (art. 114º/10; 191º/2 TFUE)
Sob a forma de atos delegados, Comissão exerce poder de complementar e desenvolver o
regime jurídico do ato legislativo, se o PE e Conselho lhe confiarem a missão – art. 290º/1

4. Competências em Matéria de Relações Externas – art. 218º TFUE – pode recomendar a


abertura de negociações que conduzem às diretrizes formuladas pelo Conselho e em consulta
com os comités especiais.
• Desempenha papel relevante na fase aplicativa dos acordos internacionais celebrados
pela UE – art. 218º/9 TFUE.
• Comissão perdeu para o Alto Representante os seus poderes de representação da UE –
art. 221º TFUE.

5. Competência de Representação – art. 335º TFUE

126
Ex: Publicação do Livro Branco mobiliza vontades políticas
127
Obrigação explicita da sujeição a regras e princípios gerais do exercício da competência de execução
pela Comissão – garante o controlo por parte dos Estados-membros da Comissão.

66
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Tribunal de Justiça da União Europeia


Estrutura – uma instituição, vários Tribunais
Criado com o primeiro tratado comunitário – integração europeia concebida como uma
estrutura política de direito, preeminência do Direito, assegurada, quando necessário, pelas
vias jurisdicionais adequadas
➢ Comunidades Europeias funcionam como uma “Comunidade de Direito”

Com o Tratado de Fusão determinou-se que um único Tribunal exerceria as competências que
os dois Tratados atribuíam ao órgão jurisdicional previsto em cada um deles. Esse Tribunal único
também substituiria o Tribunal criado pelo Tratado CECA.

Com o AUE associa-se ao Tribunal de Justiça o Tribunal de Primeira Instância encarregado com
uma jurisdição de conhecer, em primeira instância, certas categorias de ações determinadas.
➢ Rebatizado com o Tratado de Lisboa para Tribunal Geral.
Com o Tratado de Nice foi possível que uma decisão unânime do Conselho criasse câmaras
jurisdicionais encarregadas de conhecer certas categorias de recursos em matérias específicas
➢ Rebatizado com o Tratado de Lisboa para Tribunais Especializados, clarificando-se a sua
natureza de órgãos jurisdicionais128

Instituição é o Tribunal de Justiça da União Europeia (art. 13º/1 TUE) que alberga o Tribunal de
Justiça, o Tribunal Geral e tribunais especializados (art. 19º/1 TUE).
• Princípio basilar de unidade institucional no sistema eurocomunitário de aplicação
judicial do Direito.
• Saber qual dos tribunais, em concreto, deve ser demandado depende da aplicação das
normas dos Tratados e do Estatuto de repartição de competências entre Tribunais.

Das decisões proferidas pelos Tribunais Especializados cabe recurso para o Tribunal Geral (art.
257º/§3 TFUE), e destas cabe recurso para o Tribunal de Justiça limitado às questões de direito
(art. 256º/1/§2 TFUE).
➢ Sistema de recursos regulado nos termos do Estatuto do TJUE (Protocolo 3) pressupõe
relação hierárquica entre os Tribunais que compõe a instância judicial da UE

Fontes normativas de regulação da composição, funcionamento e competências do TJUE


encontram-se: nos Tratados institutivos; Protocolo relativo ao Estatuto do TJUE; Regulamento
de Processo; Regulamento Adicional; Instruções ao Secretário.

Composição
Art. 19º/2 – 1 juiz por Estado-membro assistido por 8 advogados-gerais
• Prática institucional tem garantido um advogado-geral por cada um dos 5 grandes
Estados-membros (Alemanha, Reino Unido, França, Itália, Espanha) e os outros 3 por
rotação entre os restantes.
• Declaração 38 prevê que o TJ pode solicitar o aumento de 8 advogados-gerais para 11
(em que a Polónia ganharia o direito a um advogado-geral permanente).

128
Único até agora é o Tribunal da Função Pública, criado por decisão do Conselho em 2004

67
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Composição do Tribunal é fixada pelo regulamento que o institui129

Haver 1 juiz por cada Estado-membro nunca prejudicou a vocação integracionista do Tribunal e
favorece a autoridade da jurisprudência ao garantir o conhecimento das particularidades do
sistema jurídico e legal de cada Estado-membro.
➢ Juízes não representam o Estado-membro de nacionalidade, do qual não pode receber
instruções

Nomeados, de comum acordo, pelos Governos dos Estados-membros por um período de 6 anos
(art. 253º e 254º TFUE)
• Tribunal Geral (art. 254º TFUE) e Tribunal da Função Pública (art. 257º TFUE) – requisitos
curriculares menos exigentes e aponta-se para um perfil mais técnico do candidato.
• Nomeação sujeita a parecer de um comité (art. 255º TFUE)130

Secretário é escolhido pelo próprio Tribunal (art. 253º/§5 e 254º/§4 TFUE) e estabelece o seu
Estatuto – funções relevantes de ordem processual e administrativa.

Presidente é escolhido por período de 3 anos (art. 253º/§3 e art. 254º/§3 TFUE)

Estatuto dos juízes e advogados assenta sobre um conjunto alargado de direitos e obrigações
que visam tutelar o atributo primordial da independência e imparcialidade.
➢ Art. 3º e 4º ETJUE (Protocolo 3)

Secretismo das deliberações (art. 35º ETJUE) para garantir a independência dos juízes face a
possíveis “interferências” externas – língua de comunicação entre os juízes é o francês.
➢ Advogado-geral131 analisa o litígio sub judice e propõe determinada solução jurídica para
o mesmo, devidamente fundamentada no adquirido jurisprudencial sobre a matéria ou
numa interpretação divergente que tenha da questão (art. 252º/§2 TFUE)

Natureza da Jurisdição
TJ exerce poderes de “interpretação e aplicação” do DUE no âmbito de uma jurisdição:
1. De Atribuição – Tribunais têm competência de atribuição (art. 5º/1 TUE) mas funcionam
numa lógica de descentralização da função jurisdicional – art. 274º
a. Tribunais nacionais convertem-se em tribunais comunitários quando são
chamados a dirimir litígios que envolvem a aplicação do normativo da UE – que
se relacionam com o TJUE com base no princípio da cooperação (art. 267º)
i. Não existe relação hierárquica entre os Tribunais nacionais e o TJ – das
sentenças proferidas pelo Juiz nacional não cabe recurso para o TJ e TG.
➢ Juiz da União carece em absoluto do poder de reformar as
decisões dos tribunais nacionais e do poder de anular atos
adotados pelas autoridades nacionais contrários ao DUE.

129
No caso do Tribunal da Função Pública há 7 juízes, podendo esse número aumentar a pedido do
Tribunal de Justiça em função do volume de contencioso.
130
Escrutínio prévio da idoneidade funcional do candidato.
131
Figura inspirada nos modelos do “comissário do governo” Francês e Holandês – não se confunde com
o Ministério Público e não estão encarregados da defesa de qualquer interesse (Caso Emesa, TJCE, 2000).
As conclusões apresentadas são encaradas como opiniões individuais e fundamentadas de um membro
da própria Instituição.

68
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

ii. TJ pode ser chamado a pronunciar-se sobre aplicação de norma


comunitária mas tem de ser chamado pelo juiz nacional a quo.
b. TJ e TG são tribunais organicamente comunitários – jurisdição depende sempre
de uma norma do Tratado que defina o âmbito da sua competência e a via de
direito adequada ao seu exercício.
2. Obrigatória – jurisdição obrigatória pelo que os Estados a ela estão submetidos em
virtude da sua condição de Estados-membros da UE.
a. Dirime conflitos entre Estados-membros (art. 259º TFUE)
b. Dirime conflitos entre a Comissão e Estados-membros (art. 258º TFUE)
c. Dirime conflitos entre Instituições da UE (art. 263º e 265º TFUE)
d. Dirime conflitos entre Estados-membros e Instituições (art. 263º, 265º e 268º
TFUE)
e. Dirime conflitos entre particulares e Instituições (art. 263º, 265º e 268º TFUE)
f. Não dirime conflitos entre particulares e Estados-membros cuja sede judicial
própria são os tribunais nacionais.
3. Exclusiva – monopólio da jurisdição (art. 344º TFUE)
a. Afasta-se o recurso aos tribunais internacionais e tribunais arbitrais
b. Justifica-se esta solução devido à especificidade do modelo da UE como modelo
de associação de Estados no quadro global de relações geridas pelo DIP.
i. Objetivo de garantir interpretação e aplicação uniformes do DUE.
c. Referência a Tratados abrange qualquer norma ou ato adotado com base neles.
4. De Pronúncia Definitiva – decisões proferidas pelo TJ não são passíveis de recurso,
ressalvadas as hipóteses de recurso extraordinário132.
a. Seja nos casos em que o TJ julga em primeira e última instância, seja nos casos
em que aprecia recursos instaurados das decisões do TG, as sentenças (ou
despachos) do TJ revestem caráter definitivo e irrecorrível.

Função integradora da jurisprudência Eurocomunitária


Juiz comunitário assumiu uma função que não se esgota no papel típico do Tribunal – por ter
autoridade de intérprete máximo dos Tratados institutivos e das normas e atos adotados em
sua aplicação, o TJUE aderiu a uma conceção voluntarista sobre o seu lugar no sistema
institucional da UE
➢ Representam uma “certa ideia da Europa” (Juiz Pescatore) e têm uma empenhada
atividade interpretativa ao espírito dos Tratados em detrimento da sua letra

Ativismo judicial que tornou possível ao TJUE extrair o “espírito do sistema”

A partir dos finais dos anos 80 e em especial depois do Tratado de Maastricht, o TJUE moderou
a sua pré-compreensão voluntarista e acentuou a preocupação em consolidar e desenvolver os
pressupostos jurídico-institucionais de uma “Comunidade de Direito”.

132
Decididos por reapreciação com várias modalidades: oposição ao acórdão proferido à revelia; oposição
de terceiros; recurso de interpretação de acórdãos; retificação de erro material ou de omissão de
pronúncia; revisão.

69
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

As sucessivas revisões dos Tratados devolveram aos Estados-membros a responsabilidade pelas


opções fundamentais do processo de integração e subtraíram ao TJUE um espaço de
determinação normativa que outrora ocupou, para compensar a inércia do decisor político.

Competências
Art. 19º/3 TUE – 3 áreas fundamentais da competência do TJUE.
➢ Amplas competências como forma de assegurar uma interpretação e aplicação
uniformes dos Tratados, potenciada por uma interpretação jurisprudencial que favorece
a reserva de jurisdição eurocomunitária como um corolário da autonomia e
especificidade da ordem jurídica da UE.

Dois critérios de construção de uma tipologia das vias processuais eurocomunitárias:


1. Critério que atende à relação (direta ou indireta) com base jurídica nos Tratados
2. Critério que privilegia a função inerente à via de direito
A. Função declarativa: função de declaração (interpretação/identificação/apreciação da
validade) do DUE aplicável a um cenário processual que se caracteriza por ausência de
litigio entre partes – compete ao juiz da UE identificar e interpretar o Direito aplicável a um
litígio concreto pendente nos tribunais judiciais (art. 267º) ou interpretar os Tratados na
perspetiva de fundamentar um juízo de (in)compatibilidade de um projeto de acordo
internacional (art. 218º/11)

B. Função contenciosa: abre o TJUE aos conflitos de interesses e direitos, cuja tutela é
reclamada pelas partes no processo – desdobra-se em 4 modalidades.
i. Contencioso da Legalidade – apreciação da questão da legalidade de atos ou
omissões das instituições, órgãos e organismos da UE, por via principal ou via
da exceção, em que o Juiz comunitário só pode anular (ou não) o ato jurídico da
UE, declarar (ou não) a sua invalidade ou, no caso de omissão, declarar (ou não)
a sua ilegalidade;
ii. Contencioso do Incumprimento – limita a pronúncia do TJ a eventual declaração
de incumprimento imputável a Estado-membro demandado. Não estão em
apreciação comportamentos dos Estados-membros e o TJ pode aplicar sanções
pecuniárias ao acusado, mas, em caso algum pode anular direito nacional
iii. Contencioso de Plena Jurisdição – exorbita-se a pronúncia de anulação e podem
condenar a UE e etc.
iv. Providências Cautelares – Juiz assegura composição provisória de interesses em
jogo, de modo a evitar a produção de efeitos irreversíveis, que esvaziariam de
contudo a decisão final

Âmbito da competência do TJUE pode ser alargado por via da cláusula compromissória,
compromisso com Estado-membro, ato unilateral do Conselho.
Na prática as extensões ocorreram por: ato unilateral do Conselho (Regulamento 20/12/93);
convenções internacionais com terceiros (Espaço Económico Europeu – 2/5/92) ou entre
Estados-membros.

70
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

No exercício dos seus poderes, TJUE tem jurisdição pluri-funcional. Pode funcionar,
dependendo da natureza dos litígios a dirimir e atos de DUE a aplicar como:
• Jurisdição constitucional – velando pela inviolabilidade dos Tratados e em especial no
garante dos Direitos Fundamentais, dirime os litígios entre a repartição de competências
entre a UE e os Estados-membros.
• Jurisdição administrativa – além do contencioso em matéria de função pública (Tribunal
da Função Pública), TJUE está investido de poderes de controlo e de condenação da
autoridade administrativa da UE (pode anular decisões da Comissão, ou impor-lhe certo
comportamento)
• Jurisdição internacional – competente ara apreciar litígios entre Estados-membros que
não perderam a sua qualidade de sujeitos de DIP
• Jurisdição reguladora – em resposta às questões de interpretação e validade suscitadas
pelos tribunais nacionais.
o Não se trata de “uniformizar” a jurisprudência nacional mas antes estabelecer
parâmetros ou critérios aferidores do grau admissível de flutuação decisória por
parte do tribunal nacional (art. 256º/3/§3 TFUE)

Com o Tratado de Lisboa houve alargamento do controlo jurisdicional a outros domínios –


consequência da “despilarização” em que se alarga a matérias de outros pilares.
• Art. 275º TFUE – TJUE não dispõe de competências no que respeita à PESC mas pode
controlar a observância com o art. 40º TUE; pronunciar-se sobre os recursos de anulação
instaurados por particulares com fundamento na alegada violação de direitos resultante
de medidas restritivas.

71
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Art. 276º TFUE – matérias do Espaço de liberdade, segurança e justiça em que a


competência do TJUE não pode ser exercida em relação a operações policiais nos
Estados-membros nem incidir sobre segurança interna.

Organização e Funcionamento
TJUE dispõe do poder de se auto-organizar – embora o Regulamento de Processo esteja
condicionado à aprovação do Conselho (art. 253º/§6 TFUE).
• Nomeia o seu secretário e estabelece, por decisão própria, o respetivo estatuto (art.
253º/§5 TFUE).

Tem uma complexa organização administrativa que se estrutura em torno de 3 funções


principais: Apoio aos trabalhos dos membros do Tribunal de Justiça; Secretaria judicial dirigida
pelo secretário adjunto que depende hierarquicamente do Secretário; Apoio administrativo
geral.

Reúne-se em secções ou em grande secção (13 juízes).


• Nos casos previstos no Estatuto (art. 16º) reúne como tribunal pleno – 28 juízes (art.
17º)
• Na generalidade dos processos o Tribunal julga através das secções – modo de
funcionamento facilitado pelo aumento do número de juízes que permitiu contrariar o
alongamento do tempo de instância.

Tribunal Geral
Desde os anos 70 que se falava da importância de acrescentar um novo tribunal à estrutura
judicial das Comunidades Europeias tendo “uma jurisdição encarregada de conhecer em primeira
instância certas categorias de ações propostas por pessoas singulares ou coletivas” – devido a
crescente afluxo processual que levava a um tempo muito prolongado de espera na obtenção
das decisões finais (risco de bloqueio da justiça Administrada pelo Tribunal de Justiça).

Novo tribunal – Tribunal de Primeira Instância – foi instruído pela Decisão 88/591/CE, CECA,
Euratom, do Conselho em 1988 e oficialmente instalou-se em Outubro de 1989 (com o primeiro
acórdão em Fevereiro de 1990)
➢ Com o Tratado de Lisboa passou a ser Tribunal Geral tendo funções de instância
intermédia da estrutura jurisdicional, competente para julgar a generalidade dos
litígios em primeira instância e os recursos instaurados das decisões proferidos pelos
tribunais especializados.

Art. 19º/2 TUE e art. 254º TFUE

Funciona por secções (3 a 5 juízes) podendo reunir em plenário ou em juiz singular (art. 50º
ETJUE)

Estabelece o seu regulamento processual, nomeia o seu secretário e estabelece respetivo


estatuto.
• Há funcionários e agentes para apoio administrativo.

72
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Art. 256º TFUE – competência para reconhecer em primeira instância certos recursos
• Exclui-se o contencioso do incumprimento que se mantém na esfera reservada ao TJ.
• Exclui-se o contencioso da função pública que passa a ter tribunal próprio – apenas pode
apreciar as decisões em sede de recurso (art. 256º/2)
• No ETJUE estão as matérias específicas sobre as questões prejudiciais que os tribunais
podem solicitar (art. 256º/3)

Decisões proferidas pelo Tribunal Geral podem ser objeto de recurso para o Tribunal de Justiça
que incide unicamente sobre as questões de direito (art. 256º/1/§2). Critérios específicos de
forma a garantir-se a uniformidade da jurisprudência quanto à intervenção do TJ nas decisões
do TG:
• Quando existir risco grave de lesão da unidade ou coerência do direito da União na
reapreciação pelo TG dos recursos dos tribunais especializados (triplo grau de
jurisdição);
• Quando está em causa decisão que pode afetar a unidade ou coerência do direito da
União;
• Quando estiver em perigo a unidade ou coerência do direito da União nas decisões do
TG sobre questões prejudiciais.

Tribunal da Função Pública


Foi criado devido ao aumento do contencioso gerado pela aplicação de normas comunitárias.
➢ Possibilidade dada pelo art. 257º TFUE

Instituído por Decisão do Conselho de 2/11/2004 – é a única modalidade de tribunal


especializado.
• Iniciou a sua atividade a 1/1/06 e os litígios que dirime incidem sobre questões
relativamente ao estatuto laboral e à aplicação do regime da segurança social.

Exerce em primeira instância a competência para decidir dos litígios entre a UE e os seus
agentes, nos termos do art. 270º TFUE
• Cabe recurso para o TG (art. 257º/§3 TFUE) e excecionalmente para o TJ (art. 256º/2
TFUE).

Banco Central Europeu


Com a entrada em vigor do Tratado de Maastricht, o estabelecimento da União Económica e
Monetária tornou-se um objetivo irreversível do renovado projeto de integração europeia.

Desde os finais dos anos 60 que se tenta implementar uma política monetária e o AUE veio
instituir um reforçado mecanismo de cooperação monetária – Sistema Monetário Europeu
com o ECU (European Currency Unit), unidade monetária composta pelas moedas dos vários
Estados-membros, sistema de câmbios estáveis mas ajustáveis a certas margens de flutuações
e mecanismos de créditos (máxime o financiamento a curto prazo dos bancos centrais).

Conselho Europeu de Madrid (1990) elaborou a realização da UEM em três fases.

73
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

A realização e funcionamento da UEM reclamou uma estrutura orgânica que pudesse responder
com saber técnico e eficácia política às exigências inerentes à programação e execução de uma
política monetária comum.
• Na 2ª fase UEM (1994) a cooperação monetária entre os Estados-membros foi confiada
ao Instituo Monetário Europeu (IME).
o Preparou os instrumentos e procedimentos necessários para a execução de uma
política monetária única na terceira fase (1999) – preparou a entrada em
funcionamento da estrutura orgânica da 3ª fase constituída pelo Banco Central
Europeu, Sistema Europeu dos Bancos Centrais e Comité Económico e
Financeiro.

Estrutura
BCE – 1 de junho de 1998
Art. 282º a 284º TFUE + Protocolo 4 (Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do
BCE)133

Goza de personalidade jurídica (art. 282º/3 TFUE) – situação única de instituição (art. 13º/1
TUE) dotada de personalidade jurídica.
➢ Especificidade que resulta da vontade dos Estados de o dotar de plena independência.
➢ Exonera a UE de responsabilidade pelos prejuízos resultantes do exercício das suas
funções (art. 340º/§3 TFUE).

Composição – art. 283º TFUE


• Conselho reúne pelo menos 10 vezes por ano e determina a organização interna do BCE
e dos seus órgãos de decisão (art. 12º Estatutos)
• Membros da Comissão Executiva estão sujeitos a deveres de exclusividade funcional e
beneficiam de certas garantias (art. 11º Estatutos)
• Comissão executiva é responsável pela gestão de atividades correntes do BCE e dá
cumprimento às orientações e decisões estabelecidas pelo Conselho.
Enquanto ainda houver Estados-membros fora do Eurosistema, existe um terceiro órgão na
estrutura de decisão do BCE – Conselho Geral (art. 44º Estatutos)134´

Objetivos e Funções
Princípio vetorial da sua atividade é a garantia da estabilidade de preços na zona euro (art.
127º/1 TFUE)

Objetivos e funções do SEBC – art. 2º e 3º Estatutos;


Atribuições SEBC – art. 127º/2 TFUE

Princípios orientadores da política monetária – art. 119º/3 TFUE

133
Que faz parte integrante do Tratado e com este partilha a força jurídica do DUE primário – revisão dos
Estatutos deve obedecer ao procedimento formal de revisão do art. 48º TUE. Simplificação pode ocorrer
pelo art. 129º/3 TFUE e art. 40º Estatutos.
134
Extensão do IME – tem os governadores dos bancos centrais de todos os Estados-membros e pretende
ser um foro de coordenação em matéria de política monetária entre os Estados-membros da moeda única
e os outros.

74
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

BCE também tem função consultiva, exercida por iniciativa própria a pedido das instituições
comunitárias ou a pedido das autoridades nacionais (art. 127º/4 TFUE + art. 4º Estatutos)

Poderes – competência normativa e sancionatória


Art. 132º TFUE – tem poder próprio de decisão de caráter normativo e administrativo.
• BCE, limitado pelo princípio da competência atribuída (art. 13º/2 TUE), exerce os seus
poderes por recurso à panóplia de atos jurídicos da UE tipificados no art. 288º TFUE (não
pode é aprovar diretivas).
o Não são atos legislativos e sim atos administrativos.
• BCE também manifesta a sua vontade através de atos jurídicos de natureza distinta que
melhor se adequam à especificidade da sua intervenção reguladora – orientações e
instruções aos bancos centrais nacionais (art. 14º/3 Estatutos); decisões suis generis
(art. 32º/3 Estatutos); outras medidas necessárias (art. 29º/4 Estatutos).

Art. 132º/3 TFUE – tem poder sancionatório

Estatuto de Independência do BCE e Enquadramento no Modelo Institucional da UE


Art. 130º TFUE especifica as consequências do estatuto de independência do BCE e dos bancos
centrais na relação com o decisor político da UE e dos Estados-membros.
• BCE beneficia de um regime singular de autonomia que lhe permite controlar sem ser
controlado – art. 284º é insuficiente como mecanismo de fiscalização da ação do BCE
pois não tem repercussões diretas na forma como o BCE continuará a exercer os seus
poderes e nem há responsabilidade política.
o Independência do BCE tem o significado de uma espécie de “blindagem jurídica”
que neutraliza as eventuais tentativas de interferência externa, mormente dos
decisores públicos, tanto da UE como dos Estados-membros.

A independência do BCE não pode ser exercida à margem da lei e dos mecanismos
institucionais do controlo da legalidade – está sujeito aos poderes de fiscalização comunitária
pois está inserido no quadro comunitário e a sua independência não tem como consequência
subtraí-lo à aplicação das normas de direito comunitário (Acórdão TJCE, 10/7/2000, Comissão c.
BCE)

Estatuto pluridimensional de independência (art. 130º TFUE) com manifestações em 5 principais


áreas:
1. Independência institucional – personalidade jurídica e capacidade de decisão própria
2. Independência operacional – exercício autónomo dos seus poderes, sem qualquer
forma de tutela de aprovação ou revogação
3. Independência pessoal – garantida pela execução do mandato
4. Independência financeira – obtenção e gestão de recursos próprios, não dependendo
do orçamento da UE
5. Independência de gestão interna – especial incidência na gestão do pessoal

Relaciona-se diretamente com a exigência de independência dos bancos centrais nacionais


que, como parte do SEBC, não podem receber instruções dos Governos dos respetivos Estados-
membros.

75
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Art. 35º Estatutos – diversas vias do contencioso da UE são aplicáveis, mutatis mutandi, ao BCE.

BCE é novo guardião dos tratados no domínio da política económica e monetária quando está
em causa o comportamento dos bancos centrais.
➢ Funcionamento da UEM esteve na base de opções de ordem institucional que reduziram
a soberania dos Estados-membros à expressão meramente formal do consentimento
inicial. O BCE – com os seus alargados poderes de decisão e subordinação dos bancos
centrais nacionais, combinados com o um estatuto de estrita independência – gerou
uma dinâmica inegável de aspiração federalista.

BCE e SEBC
Sistema Europeu de Bancos Centrais é constituído pelo BCE e por todos os bancos centrais dos
Estados-membros e tem a função de implementar política monetária comum.
➢ Eurosistema é versão restrita do SEBC formado pelo BCE e pelos bancos centrais dos
Estados-membros cuja moeda é o Euro.135 A estrutura de relações que se estabelece
ente o BCE e os bancos centrais nacionais obedece a 2 princípios:
o Hierarquia: BCE dirige e controla o Eurosistema, a ele competindo a definição
das orientações e instruções que regulam, com caráter imperativo, a atuação
dos bancos centrais nacionais nas matérias que relevam do âmbito atual de
competência do BCE (art. 12º/1 Estatutos).
▪ BCE pode agir contenciosamente sobre os bancos centrais nacionais
(art. 271º/d TFUE + art. 35º/6 Estatutos)
o Descentralização: art. 12º/1/§ Estatutos – repartição de competências entre
BCE e bancos centrais nacionais (art. 128º/1 TFUE).
▪ Não põe em perigo o caráter unitário da política monetária porque se
trata de partilha de competências quanto à função de execução.
▪ Atuação dos bancos centrais deve observar o princípio estrito da
independência que esconjura qualquer risco de prevalência do
interesse nacional sobre o interesse comum.

SEBC carece de autonomia jurídica – é formado por 29 entidades com personalidade jurídica e
atua através delas, dirigido pelos órgãos de decisão do BCE (art. 129º/1 TFUE) que garante a
necessária unidade e coerência de ação através da estrutura fortemente hierarquizada que
regula as relações entre o BCE e os bancos centrais nacionais.

BCE e CEF
Comité Económico e Financeiro substituiu o Comité Monetário, no início da 3ª fase que teve um
papel decisivo na gestão do SME e na progressiva liberalização dos movimentos de capitais no
mercado comum.
Art. 134º TFUE – não faz parte do SEBC e é um órgão consultivo.
• Coordenação das políticas de todos os Estados-membros na medida do necessário ao
funcionamento do mercado interno.

135
Diferente do Eurogrupo – outra instância de decisão de política monetária (art. 137º TFUE) cujo
Protocolo 14 define como a reunião informal dos ministros das Finanças dos Estados-membros cuja
moeda é o euro.

76
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Além das funções de natureza consultiva sobre matérias relacionadas com a situação
económica, financeira e monetária, o Comité ainda é responsável pela preparação dos
trabalhos do ECOFIN.

Tribunal de Contas
Criado pelo Tratado de Bruxelas de 1975, visou dar resposta institucional adequada à
necessidade de garantir um controlo financeiro eficaz do novo sistema de recursos próprios
das Comunidades (aprovado por Decisão do Conselho em 1970) que substituía o sistema de
contribuições diretas dos Estados-membros.
➢ Controlo do aumento das receitas e despesas do orçamento comunitário reclamava
meios jurídicos de controlo e garantias de independência.

Elevação a Instituição é mais simbólica que efetiva, pois o Tribunal de Contas não tem poderes
equivalentes aos de um verdadeiro tribunal nem exerce poderes de decisão – é de natureza
administrativa, não judicial nem política.

Composição e Funcionamento
Art. 285º + 286º TFUE
É uma instância colegial pelo que as suas deliberações são, em regra, adotadas por maioria dos
28 membros, sendo que a cada membro é confiada uma área específica de verificação e de
controlo sobre a qual deve manter o colégio dos membros informados (relatórios sectoriais).
Sob proposta do Presidente, podem ser criados grupos de fiscalização que assistem os membros
do Tribunal de Contas no exercício das respetivas funções.

Competências
1. Função de Controlo Financeiro – muito ampla (art. 287º/1 TFUE) – controlo sobre a
legalidade e a boa gestão financeira (art. 287º/2). Conclusões apresentadas num
relatório (art. 287º/4).
➢ Controlo externo, sendo o interno feito pela estrutura competente de cada
instituição.
➢ Controlo a posteriori pois incide sobre contas. Instituição carece de poderes
sancionatórios, mas pode socorrer-se dos art. 263º e 265º TFUE.
➢ Conselho da União e Parlamento Europeu solicitam com frequência pareceres
ao Tribunal de Contas havendo uma cumplicidade entre eles (art. 287º/4 TFUE)
2. Função Consultiva – exercida a pedido de outras instituições sob a forma de pareceres.
➢ Pode ser obrigatória – art. 322º, 325º/4 TFUE.
➢ Pode ser facultativa – 287º/4/§2 TFUE

77
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Órgãos criados pelos Tratados


Alto Representante da UE p/ Negócios Estrangeiros e Política Segurança
Tratado de Lisboa conservou o estatuto funcional do que na Constituição Europeia era chamado
de Ministro dos Negócios Estrangeiros.

É nomeado pelo Conselho Europeu, mas com o acordo da Comissão (art. 18º/1 TUE)
• Função – art. 18º/2 TUE

Art. 18º/3 e 4 – tem um pé assente no Conselho e outro na Comissão, cabendo-lhe não só a


coordenação da ação externa da União mas, sobretudo, a articulação de políticas destas duas
instituição (que juntamente com o Conselho Europeu partilham a responsabilidade principal
pela atuação externa da UE, incluindo a política de segurança).
• Alto Representante é elemento estranho no seio da Comissão pois foi escolhido pelo
Conselho Europeu e obedece às orientações definidas por ele em matéria de política
externa – reflete conflito entre legitimidade intergovernamental (mais relevante),
democrática e comunitária.
• Caráter bifronte tem resposta em soluções de recorte jurídico-procedimental (art. 18º/4
TUE) – num possível confronto de fidelidades, o espírito do modelo institucional faz o
Alto Representante pender para o lado do Conselho Europeu (ex: caso de moção de
censura, deve demitir-se apenas das funções que exerce na Comissão, continuando
como Presidente do Conselho dos Negócios Estrangeiros – art. 234º TFUE)

Há sobreposição de poderes entre Conselho Europeu, Conselho e Comissão que podem fazer o
Alto Representante falhar nas suas incumbências (art. 26º/2).
• Ausência de interlocutor único e forte nas relações externas.
• MLD: Alto Representante, perdido no seu labirinto interno, tem elevadas probabilidades
de manter a Política Externa no registo de irrelevância que tem caracterizado a ação da
UE no cenário cada vez mais disputado do protagonismo internacional.

Art. 27º/3 TUE prevê a criação de um serviço europeu para a ação externa, destinado a assistir
o Alto Representante no cumprimento das suas missões. No plano jurídico e operacional, o ato
instituidor teria de consagrar a existência autónoma do novo serviço diplomático da UE.
• Serviço Europeu para a Ação Externa (SEAE / EEAS), após vencida a oposição do PE e
longos meses de negociações complexas, foi criado por aprovação do Conselho em
26/7/2010.
o Implicou a alteração de legislação aplicável ao Estatuto dos funcionários.
o Pontos mais complicados da negociação foram: grau de autonomia do SEAE,
com salvaguarda das competências da Comissão; necessidade de conciliar o seu
funcionamento eficaz com um certo equilíbrio entre os Estados-membros.
• Tem uma estrutura Administrativa central (em Bruxelas) e conta com vários
representantes (chefes de delegação que correspondem a Embaixadores) nas 130
delegações da UE junto de países terceiros e de Organizações Internacionais.

78
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Provedor de Justiça Europeu


Criado pelo Tratado de Maastricht e inspirado por instituições congéneres existentes no direito
dos Estados-membros. Primeiro Provedor foi o finlandês Jacob Söderman136.

Objetivo de: proporcionar aos cidadãos da UE uma instância específica de receção das suas
queixas (art. 24º/§3 TFUE); submeter o funcionamento da administração eurocomunitária a
um controlo por parte dos administrados, como instrumento idóneo de garantia dos princípios
fundamentais da legalidade e da transparência e, em última análise, de aproximação dos
particulares à ação administrativa do decisor da UE (art. 228º TFUE).

Art. 228º TFUE

Só pode admitir queixas relativas à atuação administrativa das instituições, órgãos e organismos
da UE – é inadmissível queixas de factos que se reportem às autoridades administrativas dos
Estados-membros.
➢ Direito de queixa no âmbito do art. 40º TUE exclui matérias de PESC.

Por iniciativa própria ou na sequência de queixa ele procede a todos os inquéritos que considere
justificados.
Uma vez terminado e verificando-se a má administração, o Provedor deverá promover uma
solução amigável entre o queixoso e a administração ou pode exortar o órgão em causa para
modificar o funcionamento dos respetivos serviços.
Se não seguir a recomendação o Provedor apresenta relatório que será transmitido ao PE.
➢ MLD: justificar-se-ia que o Provedor tivesse direito de iniciativa contenciosa (art. 263º e
265º TFUE)

Comité Económico e Social


Art. 300º + 301º e ss. TFUE

Art. 13º/4 UE atribui ao Comité Económico e Social a função específica de assistir o Parlamento
Europeu – competência consultiva
Art. 300º/4 – há alguma dificuldade em conciliar o dever de independência funcional com a
natureza de “representantes” das forças vivas, económicas e sociais dos Estados-membros, pois
há profundas clivagens de desenvolvimento económico e social no mosaico complexo dos 28
Estados-membros da UE.

No caso de parecer necessário (art. 304º), se o Comité não foi consultado, a ausência de
consulta constitui uma violação da formalidade essencial e fundamenta a declaração de
ilegalidade do ato adotado – Acórdão TJ, Julho 1987, Alemanha e outros c. Conselho

136
Pois foi nos países nórdicos que nasceu a instituição do Provedor (“Ombudsman”).

79
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Comité das Regiões


Art. 300º + 305º e ss. TFUE
Inovação trazida pelo Tratado de Maastricht – representação das entidades territoriais
infraestaduais (autarquias locais e regionais)

Art. 307º/§3 – abordagem eurocomunitária das matérias a regular deve conjugar e alinhar a
perspetiva socioeconómica com a perspetiva regional, inseparáveis e co-dependentes.

3 diferenças importantes:
➢ Membros são representantes das autarquias regionais ou locais
➢ Tem legitimidade processual para impugnar atos jurídicos da UE
➢ Pode impugnar atos legislativos sobre os quais deve ser consultado, com fundamento
em violação do princípio da subsidiariedade (art. 8º, Protocolo 2)

Outros Órgãos
Estatutos estabelecidos pelo Conselho (art. 242º):
➢ Comité dos Transportes (art. 99º); Comité Económico e Financeiro (art. 134º); “Comité
113” (art. 207º/3); Comité Fundo Social Europeu (art. 163º); Comité do Emprego (art.
150º); Comité Permanente (art. 71º); Comité Político e de Segurança (art. 38º TUE)

Agência de Aprovisionamento da Eurátomo – art. 52º e ss. Tratado CEEA. Dotado de


personalidade jurídica atua sob o controlo da Comissão.
Banco Europeu de Investimento (BEI) – art. 308º e 309º TFUE + Protocolo 5. Ação de ser
instrumento privilegiado, em articulação com os fundos estruturais, de promoção do objetivo
da coesão económica e social no espaço da UE.

80
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Órgãos e Organismos criados pelo Decisor UE


Comités Técnicos
Criados por iniciativa do Conselho ou da Comissão, têm origem na necessidade de enquadrar
do ponto de vista técnico a definição e a gestão de políticas comunitárias nas mais diversas
áreas.
• 1962 – contexto de PAC – primeiros comités de gestão: cada categoria de produto dava
lugar à criação de um comité específico
• 1968 – primeiros comités de regulamentação: competência de acompanhamento das
medidas de execução nas áreas da legislação aduaneira, política comercial,
regulamentação veterinária e alimentar, adaptação das normas técnicas.

Comitologia – designa a forma como a Comissão exerce as competências de execução que lhe
são atribuídas pelo legislador da UE, com a ajuda de comités de representantes dos países da
UE.137
A. Sentido estrito: permitia-se ao Conselho submeter o exercício as competências de
execução delegadas na Comissão “a certas modalidades”, a Decisão Comitologia (1987)
procedeu a uma sistematização da prática institucional anterior.
• Constituída por representantes dos Estados-membros e presididos por um
representante da Comissão138, estes comités podiam ser de tipo (dependendo
da modalidade de procedimento que subordinava a sua intervenção no
processo de execução) consultivo, de gestão ou de regulamentação.
B. Sentido amplo: abrange a multiplicidade de comités que integra o sistema institucional
da UE.
• Além dos comités da comitologia, muitos outros foram criados e funcionam
como elemento orgânico ancilar da função de execução das normas
comunitárias.
• Situação mais comum é a criação pelo Conselho ou Comissão tendo origem
expressa nos Tratados (art. 99º TFUE) ou, resultar de modo implícito, do
princípio da auto-organização, conjugado com o critério da adequação técnica.
C. Sentido impróprio: utilizada equivalente a “grupologia”, mas que não deve ser com ela
confundida - grupos de trabalho, ad hoc e temporários, são estruturas de apoio técnico,
incumbidos de estudar ou acompanhar uma questão específica (nos casos de
complexidade técnica das matérias em que a vocação tentacular eurocomunitária induz
a criação desses grupos de trabalho).
• Podem ser instituídos pela Comissão, Conselho e até pelos próprios comités.

137
Estes «comités de comitologia» discutem os projetos de atos de execução que lhes são apresentados
pelos serviços da Comissão.
138
Os comités de comitologia são criados pelo legislador da UE, com base em regulamentos, diretivas ou
decisões («atos jurídicos de base»), para apoiar a Comissão no exercício das suas competências de
execução.
➢ O "ato jurídico de base" define o conteúdo e o âmbito das competências de execução e
estabelece o tipo de procedimento de comitologia a aplicar consoante os casos.

81
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Proliferação de Comités
Em 1998 havia 430 comités regulados pela Decisão Comitologia que dependiam de
financiamento por conta do orçamento. Eram mais de 1000 se se juntar os outros comités e os
grupos de trabalho.
➢ Inflação burocrática tem custos negativos – plano financeiro e plano político-
institucional, ao transmitir a imagem de uma administração eurocomunitária pesada
que promove a adesão dos técnicos das administrações nacionais.
Em 2009 já só havia 266 comités.

A existência de comités técnicos é particularmente relevante no processo de execução


normativa nas áreas da agricultura, indústria, assuntos sociais, saúde e consumidores,
ambiente, fiscalidade, comércio, energia e transportes, justiça, liberdade e segurança, mercado
interno.
➢ O seu trabalho pode ser acompanhado pela consulta dos pareceres técnicos emitidos
ou em curso de preparação

Com o Tratado de Lisboa foi aprovada uma nova disciplina reguladora da comitologia que dá
continuidade ao objetivo de simplificar o formato dos comités técnicos e de lhe garantir maior
transparência na forma como participam no processo de execução das normas.
Controlo e Transparência do seu Funcionamento
Decisão Comitologia 1987 foi uma primeira resposta ao problema da falta de transparência à
medida que o número de comités crescia – definiu as modalidades de intervenção dos comités
no procedimento de execução das normas confiado à Comissão.

Própria natureza destes comités é avessa a controlo externo: criados pelo Conselho ou Comissão
no exercício, por delegação, da competência de Execução, os comités eram uma espécie de
extensões do Conselho, enquanto constituídos por representantes dos Estados-membros,
mas, em contrapartida, a presidência atribuída à Comissão garantia a este órgão um controlo
efetivo sobre o trabalho e orientação dos comités.
• Caso Rothmmans, TPI concluiu pela sujeição dos comités a uma exigência elementar de
transparência, cabendo à Comissão a decisão sobre os pedidos de acesso a documentos
dos comités.
o Assenta no pressuposto que os comités não têm autonomia face à Comissão.
• Caso TJCE (19/11/1998) – República Portuguesa c. Comissão.
o Comissão refugiava-se no “informalismo” da sua iniciativa (através da
apresentação de propostas verbais ao comité dos têxteis relativo ao aumento
dos limites previstos em acordos internacionais para tornar possível a
introdução no mercado de têxteis oriundos da China) para afastar o controlo
jurisdicional de uma prática à muito contestado pelos Estados-membros.
o Tribunal de Justiça concluiu que a decisão “informal” da Comissão era passível
de recurso.

82
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Organismos Personalizados
Criação de organismos dotados de personalidade jurídica e de autonomia financeira tornou-se
uma opção frequente para viabilizar uma aplicação funcionalmente descentralizada dos
objetivos políticos das Comunidades.
• Designação não é uniforme (agência, instituto, observatório, fundo, centro) como não é
o respetivo grau de autonomia.
• Nos anos 90 o Conselho apostou fortemente nesta solução de organização
administrativa autónoma – gerou inquietação no PE quanto ao problema do controlo e
da desorçamentação decorrente da sua autonomia financeira.

Agências europeias têm a forma de organismos de direito público europeu, dotados de


personalidade jurídica, criados por ato de direito derivado que, para realizar uma tarefa
específica de caráter técnico, científico, de regulação ou de gestão atuam com autonomia
financeira e administrativa.
• Agências Independentes – entidades jurídicas que atuam com autonomia administrativa
e financeira. Na base das suas competências está um ato de delegação, que não pode
envolver autorização para o exercício de poderes discricionários (Acórdão Meroni).
o Participam ativamente no exercício da função executiva adotando atos que
contribuem para a regulação de certo setor – natureza técnica de assistência à
tomada de decisão; podem mesmo exercer competência de decisão que vincula
decisor da UE (ex: Agência Europeia para a Segurança Aérea); podem ter missão
de coordenação e acompanhamento.
o Controlo de legalidade dos atos jurídicos das agências é feito pelos art. 263º e
265º TFUE.
• Agências Executivas – definidas pelo Regulamento 58/2003.
o Criadas pela Comissão e, sob o seu controlo, prosseguem tarefas relativas à
gestão de programas financeiros da UE (ex: Agência de Execução para a Saúde
e os Consumidores).
o Tem personalidade jurídica por razões operacionais, mas a sua existência,
incluindo a nomeação do diretor e o controlo dos atos adotados, depende da
Comissão.

83
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Sistema de Governo da União Europeia


Atipicidade – traço distintivo da configuração jurídica da UE que se traduz nos princípios que
estruturam as formas de exercício e as modalidades de repartição do poder pelas quatro
instituições de decisão política.

Caracterização do sistema de governo da UE resulta da conjugação de três vetores de análise:


1. Coexistência de fontes distintas de legitimação do poder – que deviam funcionar
numa lógica de equivalência tendencial da qual dependeria o equilíbrio do sistema.
Todas as instituições têm competência decisória mas não têm todas o mesmo peso,
função e significado.
A. Legitimidade Democrática – Parlamento Europeu – eleitos por sufrágio
universal e direto dos cidadãos da UE; competências são compatíveis com essa
legitimidade (política, legislativa, vinculação internacional)
B. Legitimidade Intergovernamental – Conselho Europeu e Conselho – compostos
por representantes dos Estados-membros
C. Legitimidade Comunitária/Integrativa – Comissão – tem estatuto de
independência em relação aos Estados e promove o interesse geral da União (os
interesses comuns)

2. Tratado de Lisboa introduziu alterações importantes no desenho institucional e no


equilíbrio de poderes.
A. Trio institucional (Conselho, Comissão e Parlamento) passou a quarteto
institucional (com o Conselho Europeu a aparecer como superinstituição com
um rol alargado de poderes qualificados de configuração político-institucional)
B. Revigoramento da legitimidade intergovernamental e democrática em
detrimento da comunitária – interpretação do modelo de equilíbrio de poderes
depende da clara identificação da fonte de legitimidade que condiciona a
existência, funcionamento e esfera de atuação de cada instituição.
i. Instituição mais beneficiada foi o Conselho Europeu.
ii. Contraponto dado pelo aumento de matérias cuja decisão é por maioria
qualificada em substituição da unanimidade e a regra ser a do
Parlamento Europeu como codecisor na função legislativa, em pé de
igualdade com o Conselho.
iii. No plano formal a Comissão não perde competências, o seu
enfraquecimento é devido ao fortalecimento do Conselho Europeu e
criação do Alto Representante, que desloca o eixo central do poder para
a suprema instituição representativa dos Estados-membros.
➢ Riscos do intergovernamentalismo – decisões por diretório, em
que um conjunto restrito de Estados-membros ditam a
autoridade. Política de diretório dos Estados-membros que se
arrogam a ser “os grandes” afastam das decisões fundamentais
os Estados-membros mais pequenos que não veem os seus
interesses acautelados.
➢ No plano político, as decisões de diretório minam o elemento
fundamental que, ao longo de décadas de integração europeia,

84
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

tem mantido unidos os Estados-membros, baseado na


igualdade e confiança política139.
C. Multiplicação de presidências e potencial conflitualidade140 – 6 presidências das
quais 4 são permanentes;
i. Pode haver um atropelamento mútuo tendo competências
sobrepostas.
ii. Dificuldade nas relações externas pois não há 1 Europa que fale a 1 só
voz.
D. Imprecisão/insuficiência dos critérios de delimitação de funções que se
intersectam – imprecisão na linha de fronteira entre os poderes das várias
instituições

3. Prática política é decisiva na modelação – aproveitando alguma indefinição dos


Tratados sobre o traçado exato dos poderes de instituições como o Conselho Europeu e
insuficiente garantia dos poderes da Comissão

Sistema de Governo da UE encontra o seu preciso ajustamento na confluência das três


fontes de legitimação – intergovernamental, comunitária e democrática – e sob forte
condição personalista.141

139
Caso atual das Cimeiras de Estado com poucos Estados-membros – prática institucional que se for
mantida pode consuetudinariamente derrogar o que está previsto nos Tratados (que expressamente não
preveem a política de diretório e qualquer tentativa de a prosseguir é violação das regras
eurocomunitárias)
140
Presidente Conselho Europeu; Presidente da Comissão; Presidente do Conselho pelo Estado-membro
que a exerce no período do semestre; troika da Presidência do Conselho; Alto Representante, presidente
do Conselho dos Negócios Estrangeiros; Presidente do Eurogrupo; Presidente do Parlamento Europeu.
141
MLD: Fator “Fulanista” é determinante quanto ao peso que cada instituição tem no equilíbrio entre o
poder dos Estados-membros e o poder da UE.

85
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Procedimentos de Decisão da União Europeia


UE distingue-se pela amplitude material das suas atribuições, cujo exercício é assegurado
através de um conjunto vasto e complexo de procedimentos142.

As sucessivas revisões aos Tratados aumentaram a complexidade e a pluralidade dos


procedimentos. Além da complexidade, a evolução do estatuto jurídico da UE quanto aos
procedimentos de decisão tem 2 outras orientações:
• Reforço dos poderes do PE;
• Autonomização da função legislativa – Tratado de Lisboa foge à analogia da
Constituição Europeia com a nomenclatura dos atos jurídicos dos Estados e, em vez de
atos, consagra tipos de procedimentos legislativos que aprovam “atos legislativos”
(art. 289º/3 TFUE); procedimentos de execução que aprovam atos normativos não
legislativos delegados (art. 290º/3 TFUE) ou de execução (art. 291º/4 TFUE).
o Antes do Tratado de Lisboa já era possível uma diferenciação: distinção entre a
função normativa primária e a função normativa secundária – prática
institucional já adotava esta distinção funcional143
o Função normativa primária, correspondente à adoção de atos normativos de
conteúdo inovatório e de incidência subordinante, deu lugar, com o Tratado de
Lisboa à função legislativa da UE exercida sob a forma de procedimento
legislativo ordinário e especial.

Art. 290º/1/§2 TFUE – aceção material/funcional de Ato Legislativo da UE – ao qual se reserva


a definição dos elementos essenciais de cada domínio.
➢ Subordinados aos atos legislativos estão os:
o Atos Delegados – alteram ou completam certos elementos não essenciais do
ato legislativo (art. 290º/1 TFUE);
o Atos de Execução – art. 291º/2 e 3 TFUE

O critério orgânico, relativo à autoria do ato, é elemento acessório e não principal da


caracterização do ato legislativo. O mesmo para os atos não legislativos.

Princípio da Tipicidade
Procedimentos de decisão existem na medida em que estejam previstos nos Tratados.
• Não é incompatível com a aprovação de atos que não estão expressamente previstos
nos Tratados mas que neles encontram o seu fundamento jurídico – ex: comitologia
• Rigidez do princípio pode ser compensada com a ativação das cláusulas-passarela.

Além da distinção entre atos legislativos e atos não legislativos, o Tratado de Lisboa simplificou
os procedimentos.
• Desde Maastricht que se procurava essa simplificação.
• Criou-se um procedimento-padrão / procedimento-regra (art. 294º TFUE) – matriz
para os procedimentos da UE.

142
Os Tratados usam o termo processo para designar o encadeamento ordenado de fases e de
formalidades que precedem a adoção de atos pelo decisor político e administrativo da UE – designação da
tramitação típica da decisão dos tribunais pelo que se prefere a expressão procedimento
143
Tribunal de Justiça já se referia à função legislativa – Acórdão caso Simmenthal (9/3/1979); caso
Alemanha c. Comissão (27/10/1992)

86
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Matérias de PESC e do III Pilar têm alguns procedimentos avulsos – visam a aprovação de atos
não legislativos (art. 24º/1 TUE) sem caráter geral e abstrato (art. 329º/2/§2 TFUE)

As várias fases dos procedimentos de decisão e suas exatas configurações deram lugar a várias
práticas institucionais concertadas.
• Tratado de Fusão – aceitava declarações comuns e acordos interinstitucionais
• Tratado de Nice – CIG, em declaração anexa, refere que os acordos interinstitucionais
só podem ser celebrados com o consentimento das 3 instituições
• Tratado de Lisboa – art. 295º TFUE – base jurídica para a celebração de acordos
interinstitucionais, observando-se o princípio da cooperação leal, celebrados entre as
3 instituições e respeitando os Tratados (não é compatível com disposições de âmbito
inovador ou derrogatório do regime procedimental instituído pelos Tratados).
o Natureza pode ser, ou não, vinculativa144
o Ajusta as formas de cooperação e associa o princípio da tipicidade a um critério
pragmático de flexibilidade e eficiência institucional.
o TJUE pode ter que dirimir conflitos interinstitucionais e convocar argumentos
jurídicos para uma questão que tem recortes políticos.

Procedimento de Aprovação de Atos Legislativos


Procedimento Legislativo Ordinário
Não é um modelo de decisão simplificada e rápida. Tendo em conta a natureza das matérias e o
seu impacto subordinante nas ordens jurídicas da UE e dos Estados-membros, compreende-se
a complexidade do processo legislativo.
Art. 288º: Atos Legislativos – sabemos que estamos perante um ato legislativo pois foi originado
por um procedimento legislativo (critério do procedimento = definição procedimental)
Previsto no art. 294º TFUE
1. Proposta da Comissão – impulso legiferante da Comissão que não pode ser substituída
na elaboração da proposta (art. 17º/2 TUE)
• Justificação sobre a necessidade de legislar sobre a matéria (atendendo ao princípio
da subsidiariedade – art. 5º/3 TUE)
• Justificação sobre a adequação das medidas propostas e do próprio ato jurídico a
adotar (princípio da proporcionalidade – art. 5º/4 TUE)
• Compete-lhe a escolha do tipo de ato quando os Tratados não o preveem (art.
296º/§2 TFUE)
• Competência da UE só pode ser exercida na medida em que possa ser identificada
nos Tratados a respetiva norma de habilitação, a base jurídica145 (art. 5º/2 TUE –
princípio da competência de atribuição)
• Proposta limitada pelo critério do travão orçamental (art. 310º/4 TFUE)
• Enquanto Conselho não tiver deliberado, Comissão pode alterar a proposta (art.
293º/2 TFUE), desde que essas alterações ainda estejam no âmbito da proposta
inicial

144
MLD + Rui Lanceiro: Sendo que a sua vinculatividade é interna, entre os intervenientes do acordo.
145
Escolha juridicamente enquadrada por critérios objetivos, como a finalidade e o conteúdo do ato
proposto.

87
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Alteração pelo Conselho da proposta da Comissão exige unanimidade (art. 293º/1


TFUE)
• Comissão pode decidir pela retirada da proposta – Tratados não o preveem mas não
o excluem – enquadra-se no direito de iniciativa e avaliação das circunstâncias
negociais (implícito no art. 293º/2 TFUE)
• Se Comissão não apresentar proposta – art. 225º e 241º TFUE – pode haver recurso
jurisdicional por omissão (art. 265º TFUE).
i. Comissão terá de dar execução à sentença/acórdão e apresentar proposta
(art. 266º TFUE)
ii. Se disser não, houve um ato, logo a impugnação não pode ser pelo art. 265º
e sim pelo art. 263º TFUE

2. Primeira Leitura – proposta é enviada para apreciação ao Parlamento Europeu e ao


Conselho. PE estabelece a sua posição e transmite ao Conselho.
• Se PE não introduzir qualquer alteração o Conselho pode aprovar o ato
• Se PE introduzir emendas, Conselho pode também aprovar o ato – por unanimidade
(art. 293º/1 TFUE)
• Se Conselho não aprovar a posição do PE, adota a sua posição em primeira leitura e
transmite ao PE (art 294º/5 TFUE) – pode rejeitar na totalidade ou rejeitar as
alterações (fundamentando pelo art. 294º/6 TFUE)
• Elevado número de propostas são aprovados em Primeira Leitura – Declaração de
13 junho 2007: “instituições cooperam lealmente no sentido de aproximar ao
máximo as suas posições, de modo que, sempre que possível, o ato possa ser
aprovado em primeira leitura”

3. Segunda Leitura – no prazo de 3 meses, prorrogável por mais 1 mês a pedido do PE (art.
294º/7 e 17 TFUE) o PE pode fazer o disposto no art. 294º/7 e 8 TFUE.

4. Conciliação e Terceira Leitura – durante 6 semanas, prorrogáveis por mais 2 (art. 294º/12
e 14 TFUE) o Comité de Conciliação trabalha o objetivo de chegar a um projeto comum.
• Ausência de acordo implica a não adoção do ato e devolução da proposta à
Comissão.
• Art. 294º/12, 13 e 14.
• Ato legislativo aprovado através do procedimento do art. 294º TFUE requer
assinatura do Presidente do PE e do Presidente do Conselho (art. 297º/1 TFUE)

Os Parlamentos Nacionais podem intervir no procedimento legislativo à luz dos mecanismos de


participação institucional previstos no Protocolo nº1 e Protocolo nº2.
➢ Em Portugal, art. 161º/n CRP dá à AR um direito de pronúncia que deveria traduzir um
mandato de negociação que vincularia o Governo Português nas posições que viesse a
adotar no Conselho (MLD).
➢ Art. 163º/f e art. 197º/1/i CRP

Pode haver iniciativa legislativa popular na UE – art. 11º/4/§1 TUE e art. 24º TFUE – convite à
Comissão (pré-iniciativa legislativa), não há forma de ela estar vinculada

88
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

➢ Comissão pronuncia-se sobre a admissibilidade prévia da iniciativa, aprecia a versão


final e toma posição (conclusão jurídico-política) com menção das medidas que tenciona
tomar.
Procedimento de Aprovação de Atos Não Legislativos
Procedimento relativo aos Atos Delegados
Art. 290º TFUE: Atos Delegados
➢ Poder normativo secundário146
➢ Não há uma clara distinção nos Tratados entre atos delegados e atos de execução.

Atos delegados desenvolvem os atos legislativos e são aprovados pela Comissão por
delegações do PE e Conselho.
• Subordinados a ato legislativo anterior – onde expressamente se delega na Comissão o
poder normativo regulamentar
o Conteúdo do ato legislativo tem que ser veículo para atribuição de competência
normativa secundária
• Parâmetro de legalidade do ato delegado é o ato legislativo

Procedimento de Adoção de Normas de Execução (comitologia)


Art. 291º TFUE: Atos de Execução
➢ Função de regulamentar o DUE – ato normativo secundário que não pode tomar
decisões normativas primárias (quem o faz é o legislador); apenas densificam as opções
ex novo do legislador
Princípio funcional da aplicação descentralizada do DUE coloca o decisor nacional na primeira
linha de exercício da competência de execução – os Estados-membros quando executam o DUE
executam por medidas de direito interno
➢ Princípio da Subsidiariedade (art. 5º/3 TUE) – princípio segundo o qual quem deve agir
são os mais próximos da realidade (Estados-membros) – relevo dado pelo Tratado de
Lisboa.
o UE é subsidiária aos Estados-membros (apesar de ter competência para agir, vai
preferir que quem haja sejam os mais próximos e só agirá na falta deste ou
quando é necessário a harmonização
o Princípio que estrutura toda a lógica de atuação das instituições da UE.

Art. 291º/2 TFUE – atuação da UE só se justifica quando for necessária, o que envolve uma
extensão do campo funcional de aplicação do princípio da subsidiariedade que inclui tanto as

146
Atos normativos mas não legislativos.
Cecília Anacoreta Correia: “meio caminho entre ato puramente regulamentar e ato legislativo”

89
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

matérias da competência exclusiva como as da competência partilhada – exigência de atuação


supletiva por parte da UE.

Como se exerce a competência de execução da UE? Função Normativa Secundária


Comissão é titular da competência de execução e o Conselho apenas a tem nos casos previstos
pelos Tratados (art. 291º/2 TFUE)

Art. 291º/3 TFUE – Procedimentos de Comitologia previamente fixados e definidos através de


regulamento adotado pelo Conselho e PE.
• Mecanismos de controlo que os Estados-membros podem aplicar ao exercício das
competências de execução pela Comissão.
o Comitologia, em sentido estrito, é controlo da Comissão no seu exercício de atos
de execução pelos Estados-membros. Esse controlo é feito através de Comités.
• Estados-membros asseguram diretamente a execução do DUE, ou, no caso de tal
execução ser conferida à Comissão, por exigência de aplicação uniforme, garantem o
controlo da respetiva função regulamentar através dos procedimentos da
comitologia:
o Atuação da Comissão conjuntamente com comités intergovernamentais,
compostos por representantes das administrações nacionais dos Estados-
membros e criados para cooperar ou colaborar com a Comissão.

Regulamento Comitologia institui regime baseado em dois procedimentos147:


• Procedimento de exame – aprovação de medidas de execução em domínios
considerados mais importantes.
o Sempre que o comité emitir, por maioria qualificada, um parecer negativo sobre
um projeto de medidas, a Comissão não pode adotar as medidas.148
• Procedimento consultivo - comité adota um parecer que a Comissão deve ter em conta
ao adotar medidas.

Procedimento de Vinculação Internacional UE


UE tem personalidade jurídica (art. 47º TUE) pelo que pode celebrar acordos internacionais com
Estados terceiros e OI, desde que sobre matérias no seu âmbito de competência.
➢ UE pode aprovar acordos sobre as matérias sobre as quais tem competência – está no
patamar de uma OI pois tem apenas competências de atribuição.

Art. 217º TFUE – competência de vinculação internacional em relação aos acordos de


associação, mais exigentes de procedimento.
Art. 219º TFUE – regula o procedimento especial de vinculação em matéria de acordos cambiais
entre a UE e Estados terceiros

147
Nova abordagem da comitologia, insuflada pela ideia de maior autonomia decisória da Comissão como
responsável pela execução normativa. PE e Conselho participam nos procedimentos de comitologia,
condicionados a direito de informação e acompanhamento.
148
Fragiliza a ação da Comissão com o controlo da sua ação como órgão de execução por outro órgão
(comité) de natureza intergovernamental. A decisão da Comissão fica bloqueada.

90
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Art. 218º TFUE – base jurídica procedimental quanto aos procedimentos de vinculação
internacional.
• Mas, a competência relativa à celebração dos acordos internacionais deve resultar, de
modo expresso ou implícito, de outras disposições dos Tratados – bases jurídicas
materiais.
• Se a base jurídica material não estabelecer regras específicas de procedimento149, o art.
218º TFUE é disposição procedimental genérica e subsidiária quanto à competência de
vinculação internacional da UE.

Segue-se o esquema da CVDT com as 3 fases típicas de manifestação de vontade pactícia:


1. Fase da Negociação: início formal de negociações depende de autorização do Conselho,
concedida sob recomendações da Comissão.
➢ Decisão de autorizar início das negociações pode, e geralmente é,
acompanhada por diretrizes de negociação.
➢ Pode ainda designar comité especial a ser consultado pelo negociador150
2. Fase da Assinatura: Conselho, sob proposta do negociador, decide sobre a assinatura
do acordo e eventual aplicação a título provisório.
3. Fase da Conclusão: Conselho decide sobre a manifestação do consentimento de ficar
vinculado (art. 218º/6 TFUE).
➢ Não é especificada a forma jurídica do ato de aprovação – geralmente é decisão.
➢ Art. 218º/7, 8 e 9 TFUE

Participação Parlamento Europeu


Art. 218º/10 TFUE.
O PE participa sob a forma de parecer na generalidade dos casos (art. 218º/6/b TFUE) ou, nos
casos previstos, é exigida a sua aprovação (art. 218º/6/a TFUE).

PE é co-celebrante, tendo poder de veto, nos seguintes acordos:


• Acordos de associação;
• Acordos que criem quadro institucional específico;
• Acordos com consequências orçamentais significativas para a UE;
• Acordos que impliquem alteração de ato adotado segundo procedimento legislativo
ordinário ou especial com obrigatoriedade de aprovação do PE;
• Acordo de adesão da UE à CEDH.

Intervenção TJUE
Art. 218º/11 TFUE – a pedido do Parlamento Europeu, Conselho, Comissão ou de qualquer
Estado-membro, TJUE pode dar parecer sobre a compatibilidade de um projeto de acordo com
os Tratados.
• Mecanismo de controlo prévio da legalidade dos projetos de acordos internacionais a
celebrar pela UE – pedido antes do ato de celebração do acordo.151

149
Ao contrário do que acontece com os acordos comerciais – art. 207º/3 TFUE
150
A Comissão só é negociadora nos casos do art. 207º/3 TFUE; nos outros casos pode não o ser havendo
nomeação de chefe de delegação diretamente dependente do Presidente do Conselho.
151
Parecer 1/94 TJ esclareceu que ainda se podia pronunciar sobre projeto de acordo já assinado mas
ainda não aprovado pelo Conselho. Também pode solicitar-se o escrutínio do Tribunal quando ainda há
só vontade de negociar e não existe projeto de acordo.

91
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

o Pode incidir sobre o grau de conformidade do projeto de acordo com as


disposições materiais constantes do Tratado.
▪ Parecer negativo impede a celebração do acordo – que só será possível
mediante revisão dos Tratados ou renegociação do acordo.
o Pode incidir sobre a questão de saber se a UE tem competência para se vincular
internacionalmente sobre a matéria versada nas cláusulas do acordo.

Acordos Mistos
Requer adaptações do art. 218º TFUE.
Suscita problemas difíceis de articulação política entre UE e Estados-membros devendo todas as
partes e guiarem pelo princípio da cooperação leal.

Parte contratante com terceiro é a UE e outra parte são os Estados membros. Há matérias que
ainda permanecem na esfera reservada ou residual da competência dos Estados-membros, pelo
que a vinculação é complexa e envolve ius tractum da UE e dos Estados-membros segundo as
suas normas constitucionais.
• Apesar da CRP não prever a aplicação provisória do acordo ou que a assinatura tenha
efeito de vinculação, tal cai na margem de decisão do Governo como órgão de condução
da política geral do país informando a AR.
• Se estiver em causa assuntos de relevante interesse político ou económico (ex: CETA),
relativos a competências de reserva nacional, a posição portuguesa deve ser
salvaguardada através de uma declaração a anexar à ata da reunião do Conselho
dizendo que apesar da aplicação provisória do acordo, Portugal só se vincula após
procedimentos internos de vinculação em conformidade com CRP. Europeização do
procedimento de celebração que reforça o Executivo.
• Isto não prejudica objetivo eurocomunitário de decisão célere e preserva liberdade de
vinculação do Estado Português.152 Não há interpretação do art. 7º/6 que obrigue à
aprovação de acordos mistos

Procedimento no âmbito da PESC


O Tratado de Lisboa suprimiu formalmente a estrutura de pilares mas foi mantida a
especificidade de decisão nos domínios da PESC – art. 24º/1 TUE.
• Estabelece-se que está sujeita a regras e procedimentos específicos cuja definição e
execução compete ao Conselho Europeu e ao Conselho, que deliberam por
unanimidade salvo disposição em contrário.
• Exclui-se a adoção de atos legislativos e os atos vinculativos aprovados no domínio de
PESC revestem a forma de decisões (art. 31º/1 TUE).
• TJUE não dispõe de competência de controlo ou de interpretação de atos adotados,
salvo o caso do art. 40º TUE e 275º TFUE.

Comissão não tem direito de iniciativa e tal é exercido pelos Estados-membros (art. 30º/1 TUE)
PE não é consultado a propósito de cada decisão – tendo apenas o direito de colocar questões e
aprovar recomendações dirigidas ao Conselho e Alto Representante (art. 36º TUE)
Negociações é por grupos especializados de trabalho – art. 38º/§3 TUE
Art. 31º/1 TUE – mecanismos da abstenção construtiva, que não impede a deliberação

152
MLD: princípio da cooperação leal (art. 4º/3 TUE) mas como todos os Estados são soberanos e agem
ao abrigo do DIP, podem-se vincular ou não (ratificação é livre segundo CVDT)

92
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Fontes do DUE
Fonte – metáfora para designar fenómeno de revelação de normas jurídicas

DIREITO PRIMÁRIO
Direito regulado através dos Tratados institutivos.
• Não se esgota no TUE e no TFUE (que têm também protocolos e declarações), inclui
também os tratados de adesão dos Estados, as revisões aos Tratados e etc.
• Pode incluir decisões (atos unilaterais, como o de 1979 que introduziu o sufrágio
universal e direto para o PE) que alterem a Constituição da UE.
• O que o distingue do direito derivado é a Intenção e a Hierarquia – Tratados são a fonte
primária de Direito da UE sendo convenções internacionais de tipo clássico, produto
exclusivo da vontade soberana dos Estados contratantes, que foram concluídas na
conformidade das regras do direito internacional e das respetivas normas
constitucionais.

É direito que enquadra, fundamenta e limita todo o restante.


• Direito derivado nunca o pode contrariar e há mecanismos de controlo se tal acontece
– art. 263º, 267º e 277º TFUE.
• A violação deste Direito é objeto de sindicabilidade contenciosa (art. 258º), podendo ser
verificada jurisdicionalmente – culminando em sanções para os Estados (art. 260º) que
não dão execução aos acórdãos.

Mota de Campos: Tratados enunciam os objetivos fundamentais da UE e definem os


instrumentos para a respetiva realização; definem a estrutura institucional da UE (em que
se especifica atribuições e poderes das instituições bem como a definição das relações
entre elas e o controlo político e jurisdicional a que a sua ação está sujeita); relação entre
UE e Estados-membros; organizam o sistema jurisdicional de salvaguarda da ordem
jurídica instituída no quadro da UE; têm disposições de Direito Económico e Financeiro.

Tratados são Constituição153?


Doutrina diverge: há uma pré-compreensão política adjacente a esta caracterização que se
prende com uma visão mais ou menos federalista da UE – mas a diferença no plano político é
muito importante pois levanta questões sobre quem detém o poder constituinte e se a UE já se
autonomizou dos Estados
• Corrente federalista: querem ver os Tratados como uma Constituição e procuram
encontrar pontos de apoio em que a criatura se autonomizou dos criadores, tendo a UE
já poder constituinte próprio e pode andar por si.
o Falava-se da irreversibilidade do acervo comunitário (argumentação destruída
com o Tratado de Lisboa que preveu no art. 48º e 50º TUE a reversibilidade do
adquirido)
• Corrente não federalista: vêm os Tratados como Tratados de DIP, estando sujeitos à
CVDT.

153
Tribunal Constitucional alemão reconheceu, na decisão 18/10/67 que os Tratados representam “de
certo modo” a Constituição da comunidade – são a base de toda a ordem jurídica da UE.

93
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

o Não possui a competência das competências154 e a competência da UE é


definida pelos Estados – Estados são os senhores dos Tratados (Estados são
criadores e UE a criatura)
• MLD: Tratados são tratados internacionais mas funcionalmente têm uma função
análoga à de uma Constituição em sentido material155. Mas também se podem
encarar como uma Constituição em sentido estrutural (na aceção da pirâmide normativa
de Kelsen).

Âmbito de aplicação dos Tratados:


I. Material – aplicáveis no quadro das competências que os Estados atribuíram à UE (ex:
art. 18º TFUE)
II. Subjetivo – aplicáveis às instituições, órgãos e organismos da UE, Estados-membros,
pessoas
o Art. 20º e ss. para cidadãos da UE; mas não só a estes – quando os tratados não
especificam aplicam-se a todos (art. 263º TFUE)
o Na CDFUE também as disposições valem para todos embora hajam algumas
específicas para os cidadãos da UE
III. Territorial – aplicáveis no território dos Estados-membros (art. 52º TUE que remete para
o art. 355º e art. 349º TFUE)
o Há casos de territórios onde não se aplicam os Tratados em virtude do
negociado pelos Estados-membros e a UE.
o Há estatuto especial nas regiões ultraperiféricas (art. 349º; caso Mayotte C-
132/14)

Processos de Revisão (art. 48º TUE)


Regime do art. 48º TUE distingue o processo de revisão ordinário e o processo de revisão
simplificado – distinção que se baseia na tramitação.

Processo de Revisão Ordinário: vem desde a versão originária dos Tratados e foi alterado
aquando das negociações da CDFUE (com a introdução da “convenção”)
• Fase da Iniciativa
• Fase da Convenção – expressão que historicamente está associada a uma Assembleia
com poderes constituintes.
o É uma assembleia com Estados, representantes do PE (há a participação do
Parlamento Europeu no exercício do “poder constituinte”), Comissão e representantes
dos parlamentos nacionais.
• Fase da Conferência Intergovernamental – CIG que reúne os representantes dos
Estados.
o Regra de deliberação é sempre o acordo de todos (elemento que caracteriza a
natureza de Tratado de DIP; as Constituições é por maioria)
o Negociado e aprovado e depois sujeito a ratificação de todos os Estados-
membros.

154
Competência fundamental para definir a própria competência – paradigma dum ente soberano como
o Estado, que define a sua própria Constituição
155
Art. 16º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão lança as bases para se construir uma
Constituição material: separação de poderes e tutela de direitos

94
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Art. 48º/5 – o que significa analisar?


➢ Conselho Europeu não se pode substituir à vontade dos Estados, mas, dá-se-lhe o
mandato para conceder concessões e exceções (para facilitar que os Estados ratifiquem)

Processo de Revisão Simplificado: revisão mais expedita


• Art. 48º/6 – só em relação à parte III do TFUE; disposições sobre políticas e ações da UE.
o Ato unilateral do Conselho Europeu que tem de ser aprovado por unanimidade
e na mesma ratificado (ex: novo nº3 do art. 136º)
o Não se podem aumentar competências
• Art. 48º/7 – para se passar de unanimidade a maiorias qualificadas (há substração de
competências aos Parlamentos Nacionais pois está a usar-se uma via mais comunitária)

Estes dois procedimentos são análogos no acordo de todos os Estados e na exigência de


ratificação por todos.

Art. 48º é elucidativo do caráter da UE e seus Tratados como Tratados – os Estados (criadores)
ainda controlam a criatura.

Características dos Tratados de Direito Primário


Primado DUE, Aplicabilidade Direta, Efeito Direito (apenas aplicável a normas que atribuam
aos particulares posições jurídicas de vantagem; clareza – não suscitarem dúvidas de
interpretação, precisão, incondicionalidade – não sujeitas a intervenção do legislador nacional
no sentido de as completarem), Rigidez dos Processos de Revisão

DIREITO DERIVADO
Todas as normas e atos jurídicos adotados pela UE e que resultam da vontade das instituições,
órgãos e organismos da UE.
➢ Atos unilaterais emanados das Instituições, adotados para aplicação daqueles
Tratados e na sua conformidade – que, por isso, neles encontram o seu
fundamento jurídico e deles derivam.

Típico: art. 288º TFUE 156


Atos Não Vinculativos – não são juridicamente irrelevantes pois pode conter diretrizes de
interpretação (num exercício de autovinculação. Não está obrigado a fazer, mas ao fazer
autovincula-se) e/ou serem necessários (para a validade formal da atuação – se pareces
necessários não forem dados, inquina-se a legalidade)
1. Recomendações – adotadas por iniciativas do órgão – Atos do Conselho dirigidos aos
Estados-membros (art. 121º e 126º/7), ou atos da Comissão dirigidos quer ao Conselho
(art. 207º/3, 218º/3) quer aos Estados-membros (art. 117º)
• Exprimindo-lhes o respetivo ponto de vista sobre determinadas questões,
apontando-lhes as medidas ou soluções reclamadas pelo interesse da UE,
sugerindo ou prescrevendo os comportamentos a adotar.
• Instrumento de ação indireta da UE, visando a aproximação das legislações
nacionais ou adaptação de uma dada regulamentação interna ao regime da UE

156
Que ainda tem a redação de há 60 anos

95
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

2. Pareceres – elaborado a pedido de outro órgão - não constituem só por si os respetivos


destinatários em qualquer obrigação jurídica.

TJUE não atende ao nome e sim ao conteúdo – pois sob um nome errado às vezes há atos que
são criadores de direitos e deveres.
➢ A natureza jurídica dos atos da UE não está limitada pela sua designação oficial,
antes se deve ter em conta o seu objeto e o seu conteúdo.

Atos vinculativos157
1. Regulamento – ato normativo por excelência (lei); instrumento de uniformização
jurídica – ato geral e abstrato que vincula todos os sujeitos de Direito, como fonte
direta de obrigações, sendo aplicável em todos os Estados-membros.
• Caráter geral – âmbito subjetivo – estabelecem regras, impõe obrigações ou
conferem direitos que a todos os que se incluam ou possam vir no futuro a
incluir-se na categoria de destinatários que o regulamento define em abstrato e
segundo critérios objetivos, afetando todas as pessoas de direito da UE.
i. Generalidade: quanto aos destinatários
ii. Abstração: quanto ao objeto da provisão legislativa (proibição ou
permissão de comportamentos ou situações jurídicas emergentes da
norma)
➢ Um ato não perde o seu caráter regulamentar pelo facto de,
num dado momento, ser possível identificar as pessoas sujeitas
à aplicação das normas que nele se contêm (TJUE, 5/5/1977,
proc. 101/76). Ex: regulamento que dado o caráter técnico,
económico ou social visa pequenas empresas. Não perde o
caráter geral e abstrato desde que as normas estabelecidas
sejam igualmente aplicáveis a qualquer outra empresa que, no
futuro, venha a preencher as condições definidas no
regulamento.
• Obrigatório em todos os seus elementos – âmbito objetivo – poder normativo
perfeito que permite às Instituições da UE impor autonomamente (prescindindo
das instituições nacionais) a observância da totalidade das disposições desse ato
aos Estados-membros, seus órgãos e autoridades, e a todos os particulares
sujeitos à jurisdição da UE – o conteúdo esgota o âmbito de regulamentação em
termos das opções políticas primárias
i. Diversamente da diretiva pode impor quaisquer modalidades de
aplicação e de execução julgadas necessárias ou úteis pelas
instituições da UE.
ii. Estados-membros não podem adotar atos que dissimulem a natureza
comunitária do regulamento (TJUE, Caso Variola de 2/2/1977, proc.
50/76)

157
Art. 288º e ss. são fusão de 2 formulações entre o Clássico e os novos aspetos trazidos pela tentativa
da Constituição Europeia de chamar atos legislativos.

96
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

iii. Estados-membros não podem acrescentar nada (TJUE, 18/2/1970, proc.


40/69)
iv. Estados-membros não podem aplicar de forma incompleta ou seletiva
as disposições de um regulamento por discordarem de algumas delas
(TJUE, 7/2/1973, proc. 39/72)

• Diretamente aplicável em todos os Estados-membros – âmbito da


operabilidade nas ordens jurídicas dos Estados-membros – uma vez publicadas
no JO e decorrida a vacatio legis (art. 297º TFUE), entram em vigor em todo o
espaço da UE e ficam de pleno direito (automaticamente) incorporados no
ordenamento jurídico interno dos Estados, sendo aí aplicáveis a qualquer pessoa
– quando nasce na UE, nasce nos Estados membros.
i. Não é necessário intervenção de órgãos estatais para que o
regulamento seja suscetível de invocação e aplicação a quantos possam
fundar nas suas disposições qualquer direito merecedor de tutela
jurisdicional – não é necessária, nem sequer admissível, qualquer
receção explícita ou implícita do regulamento nas ordens jurídicas
internas para que esse ato normativo entre a fazer parte do corpo de
normas que ao juiz nacional cumpre aplicar (“regulamentos obrigam
como DUE e não como direito nacional”)
➢ Aplicabilidade direta – entra em vigor em todos e para todos
os Estados, produzindo imediatamente efeitos sem estar
sujeito a medidas de receção – mas não são autossuficientes e
podem necessitar de atos de execução pelos Estados (portarias
e despachos).
➢ Mesmo em Estados com o modelo dualista (de transposição)
proíbe-se a transposição – não se deve mascarar o
Regulamento como norma de direito interna. Cidadãos devem
saber da natureza comunitária da norma.

• A forma do regulamento é sempre a mesma, seja qual for a instituição que o


emane.
• Regulamentos do Conselho distinguem-se em:
i. Regulamentos de base – estabelecem as bases gerais do regime jurídico
a adotar e são utilizados para aplicar disposições de direito originário.
ii. Regulamentos de execução – subordinados aos de base, destinam-se a
dar execução aos mesmos, cujos regimes pormenorizam e desenvolvem,
estabelecendo as condições e os meios da sua aplicação. Em regra esta
competência é da Comissão – art. 290º TFUE
• Regulamentos do Parlamento e do Conselho
• Regulamentos do Parlamento
• Regulamentos da Comissão – só podem ser adotados no exercício de um poder
autónomo, em casos específicos e limitados – art. 290º TFUE

2. Diretiva – instrumento de harmonização de legislação (lei-quadro) – atos pelos quais


uma instituição competente fixa aos destinatários um resultado que no interesse
comum deve ser alcançado, permitindo que cada um deles escolha os meios e as
formas mais adequadas, do ponto de vista do direito interno, da realidade nacional ou
dos seus interesses próprios, para alcançar o objetivo visado.

97
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Não é ato de alcance geral – destinatários são exclusivamente os Estados:


todos os Estados-membros, alguns deles ou um único.158
i. Tem caráter individual e os seus destinatários são certos e
determinados (ainda que sejam todos os Estados-membros)
ii. Embora acabe por produzir um irrecusável efeito normativo geral
• Vincula o destinatário quanto ao resultado a atingir – compatibilização da
legislação interna com o conteúdo da diretiva, dando aos Estados a hipótese de
escolher a forma e os meios.
i. Obriga os seus destinatários quanto aos fins, resultados ou objetivos a
atingir – impõe aos Estados uma obrigação de resultados, que se
conjuga com a obrigação de comportamento do art. 4º/3 TUE (em que
os Estados-membros devem abster-se de adotar medidas suscetíveis de
comprometer os resultados prescritos pela diretiva)
ii. Regime jurídico da diretiva não se torna obrigatório logo no dia seguinte
à sua criação – cria é logo a obrigação de transposição para os Estados-
membros.

• Federalismo vertical com dois níveis na regulamentação:


i. Fixação, em termos vinculativos, do resultado a atingir é da
responsabilidade das instituições da UE;
ii. Determinação e adoção das medidas destinadas a alcançar tal
resultado incumbem aos Estados-membros destinatários da diretiva.

• Têm sempre de ser transpostas – medidas de transposição são atos internos


mediante os quais as diretivas são recebidas no Direito interno – liberdade
quanto à forma tendo em conta a ordem jurídica interna de cada Estado-
membro159
i. Art. 112º/8 CRP – em Portugal exige ato legislativo (cujo órgão emissor
depende da matéria em questão).
➢ Mas TJUE diz que não tinha de ser assim, é opção Constitucional
dos Estados-membros.
➢ Tratados dão liberdade aos Estados de escolherem forma e
meios de transpor as diretivas – prerrogativa dos Estados.
o Pode ser até por Remissão, quando o Direito interno já
acomoda o conteúdo da diretiva.
o Pode ser Transcrição e/ou Adaptação.

• Não tem aplicabilidade direta pois a diretiva não pode modificar, por si própria,
o direito nacional e alterar as situações jurídicas que ela teve em vista – tal
efeito só haveria de resultar das novas regras jurídicas que, para dar execução
à diretiva, o Estado-membro destinatário acabasse por adotar na respetiva
ordem interna.160
• Por força da jurisprudência do TJUE admite-se que as diretivas podem ter efeito
direto (interpretação criativa do TJUE do art. 288º) – apenas chamado após
terminar o prazo de transposição.

158
Normalmente são todos e é raro haver para países específicos, salvo algumas matérias típicas – ex:
mar, nem todos os Estados-membros têm costa marítima
159
Apologia do princípio da subsidiariedade.
160
Interpretação abalada pelo Caso Van Duyn, proc. 41/74, 4/12/1974

98
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

3. Decisão – corresponde ao ato administrativo161 – É individual e concreta162 pelo que


obriga apenas os destinatários que ela própria designar, individualizando-os.
• Tais destinatários – diversamente do que sucede com as diretivas que apenas
podem ser dirigidas a Estados-membros – tanto podem ser Estados-membros
(um, vários ou todos) como pessoas coletivas de direito público ou mesmo
simples particulares.
• Tem normalmente a finalidade de aplicar as regras do DUE a casos particulares.
• À semelhança da diretiva, a decisão impõe o resultado a atingir; mas,
diversamente daquela, obriga igualmente quanto às modalidades de execução
(é obrigatória em todos os seus elementos como o regulamento)
i. Decisões dirigidas pelas instituições da UE aos Estados-membros: não
modifica por si própria a ordem jurídica interna dos Estados-membros
em causa nem as situações jurídicas individuais, cuja modificação só
ocorrerá após a aplicação, pelos Estados-membros destinatários da
decisão, das medidas que a decisão lhes impõe que adotem.
• Decisões dirigidas pelas instituições da UE a particulares: originam, por si
próprias, direta e imediatamente, direitos e obrigações para os respetivos
destinatários e eventualmente para terceiros (tem inopobilidade erga omnes)

Atípico: fora do art. 288º


• Estão nos tratados – art. 234º, 232º
• Fora dos tratados – atos que resultam da prática institucional cuja natureza não está
prevista nos Tratados mas a competência do mesmo tem de se reconduzir aos Tratados

Existe hierarquia dentro do Direito Derivado?


Art. 288º não estabelece um critério expresso e apenas enumera certa ordem (que não é
relevante)
Decisões – devem respeitar a legislação base
Regulamento e Diretiva
Produzem atos que podem ser atos legislativos, atos delegados e atos de execução.
➢ Quando não há designação expressa é ato legislativo, conforme resulta do art. 289º/4,
290º/3, 291º/4 TFUE
➢ Pode haver regulamentos legislativos, delegados e de execução. O mesmo com as
diretivas.
o Os delegados só podem completar ou alterar elementos não necessários dos
legislativos (art. 290º) – são subordinados aos legislativos. Tal como os de
execução.

161
Instrumento que as instituições podem utilizar para a aplicação do DUE por via administrativa.
162
Salvo se for atípica: decisões suis generis como atos políticos e até normativos que são atos gerais sem
designar destinatários – ex: no âmbito do Conselho e Conselho Europeu há decisões dos membros. Essas
decisões são atos intergovernamentais sobre matérias comunitárias pelo que estão fora dos tratados e
estão no quadro da cooperação intergovernamental.

99
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

MLD: entre Regulamento e Diretiva (legislativa, delegada, execução) não há hierarquia e sim
paridade.
Jurisprudência do efeito direto levou a que Diretiva se aplicasse a todos – tornando-a geral e
abstrata como regulamento
• A partir dos anos 80 as diretivas foram sendo cada vez mais pormenorizadas – “diretivas
regulamentares” – pelo que se aproximaram ao regulamento (reduzindo a zero a
margem de apreciação dos Estados que apenas podem transpô-las).
o MLD: subversão da diretiva

Por tudo isto, estes atos são paritários e atenta-se ao critério cronológico.
Art. 296º e 297º - Regime Jurídico Comum
Todos os atos da UE, normativos ou não, têm de ter base jurídica (norma de habilitação) que
estão nos Tratados.
• Têm de invocar a disposição dos Tratados em que fundam a decisão – TJUE pode admitir
remissão genérica se dela se puder inferir a base jurídica
o Se não há uma invalidade formal por falta de base)
• Por vezes indica-se nos Tratados o tipo de ato, quando não acontece, o art. 296º deixa
a Instituição escolher o ato, segundo o princípio da proporcionalidade (exigências de
adequação, necessidade e proibição do excesso) articulado com o princípio da subsidiariedade –
se UE conseguir realizar os seus objetivos enquadrando os Estados-membros, deve fazê-
lo.

Art. 296º/§2 exigência de fundamentação – violação é ilegalidade impugnável (art. 263º)

Assinatura e publicação no Jornal Oficial


• série L (para os de publicação obrigatória);
• série C (para os de publicação facultativa).
Vacatio legis supletiva é de 20 dias.

Diretivas para poucos Estados ou decisões – o que conta não é a publicação e sim a notificação
(importante para o prazo de impugnação)

DIREITO CONVENCIONAL
DIP entra por várias portas.

Acordos Internacionais – 3 tipos que consagram regimes jurídicos diferentes


• Acordos Eurocomunitários: art. 218º e 216º - acordos celebrados pela UE em
matéria que tem competência; vinculam as Instituições e os Estados-membros (art.
16º/2), que não podem colocar reservas pois não são parte contratante.
• Acordos celebrados pelos Estados-membros: conservam a sua personalidade
jurídica internacional pelo que podem celebrar tratados163 em qualquer matéria que não
seja da competência exclusiva da UE. Ex: Tratado Orçamental.

163 Convenções entre os Estados-membros entre si


• Anteriores aos Tratados: subsistem na estrita medida de compatibilidade com os Tratados. Se forem
contrários às disposições dos Tratados então estes ab-rogam implicitamente os acordos anteriores
(TJCE, proc. 278/82, 14/2/1984 – em que até as disposições de direito derivado têm primazia,

100
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

o Estes Tratados acabam por vincular a UE, pelo princípio da cooperação leal
(art. 4º/3), uma vez que a UE não pode agir para esvaziar o conteúdo desses
acordos.
• Acordos Mistos: acordos celebrados pela UE e pelos Estados-membros com Estados
terceiros (art. 216º e Constituições). Ex: acordos comerciais com matéria atrelada da
competência exclusiva dos Estados-membros
o Só entra em vigor após celebrado, assinado e ratificado por todos os Estados-
membros e pela UE. Se todos ratificam tem efeitos do art. 216º (distinguindo-
se as matérias comunitárias das outras) tendo em conta a cooperação leal. Se
nem todos ratificam, a doutrina discute a amplitude do acordo.

OUTRAS FONTES
Costume – tem expressão residual.
• MLD: discorda de alguns autores e admite que tem lugar no DUE, pois, desde logo o
TJUE já reconheceu os costumes do DIP, e há costumes no seio comunitário. Ex: Acordos
Luxemburgo e deliberação por consenso.
• Tem pouca importância pois a Ordem Juridica eurocomunitária é muito estruturada e
tem um decisor normativo para colmatar falhas, bem como um controlo jurisdicional
(em que qualquer desviante pode ser controlada – muito diferente do DIP)

Princípios Gerais de Direito – ordens jurídicas assentam sobre esses princípios, que revelam
normas jurídicas e o TJUE resolve problemas a partir deles.
• Poder revelador e consolidador enquanto elemento sistematizador do DUE.
• Expressão de uma exigência de justiça e de respeito de certos valores superiores do
indivíduo e da sociedade civilizada em que este se integra.
• A UE também é regida por um direito não-escrito constituído pelos princípios gerais de
direito e pelos princípios resultantes da elaboração jurisprudencial do TJUE.
o TJUE recorre aos princípios do DIP164 quando é oportuno reafirmar o caráter
obrigatório dos Tratados em que a União se funda; quando se trata de resolver
conflito entre os Tratados que regem a UE e outro tratado ligando Estados-
membros entre si ou a terceiros; quando é necessário para interpretar os
Tratados.
o Pode também aplicar princípios captados do direito interno dos Estados-
membros.
o Aplica também os princípios fundamentais decorrentes da natureza específica
da UE: princípio da igualdade de tratamento, da não discriminação e da
liberdade, da solidariedade, da coesão económica e da preferência comunitária,

quanto às matérias que regulam, sobre as convenções anteriormente concluídas entre os Estados-
membros)
• Posteriores aos Tratados: compatibilidade deve ser aferida pelo TJUE tendo em conta o art. 4º/3
TUE
Convenções entre os Estados-membros e países terceiros
• Anteriores aos Tratados: art. 351º TFUE
• Posteriores aos Tratados: se houvesse compromissos incompatíveis com as obrigações dos Estados-
membros, tais compromissos, por força do DIP, seriam inoponíveis à UE
164
Direito internacional geral e comum – o TJUE reconhece os princípios de fonte jusinternacional

101
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

do equilíbrio institucional, da aplicabilidade direta, da primazia do DUE, do


efeito útil das disposições dos Tratados e etc.
▪ Princípios Relativos à Garantia da Eficácia do DUE na ordem interna dos
Estados-membros

Jurisprudência – papel muito vincado no DUE. Do Tribunal de Justiça não há recurso e a


pronúncia é vinculativa – além de ter efeito inter partes vincula erga omnes e tem uma eficácia
de precedente. Papel próximo do supremo tribunal EUA.
• Efeito de precedente atípico – não há uma vinculação de natureza hierárquica (como
num Estado Federal) mas sim de natureza funcional. Tem que ser acatada para julgar
casos futuros.

• Art. 267º a partir do qual o Tribunal de Justiça criou a sua obra jurisprudencial (tendo
em conta o art. 19º em que o Tribunal não se limita a interpretar e aplicar o Direito)
o Há ativismo judicial (cria e recria Direito através da interpretação extensiva)165

“Golden Age” da jurisprudência: anos 60 e 70 (com o AUE os Estados ganharam poder de rever
os Tratados saindo do escopo do juiz a sua adaptação)
• Desde 1958 que os Tratados se foram adaptando pela interpretação do Tribunal de
justiça (pois não houve revisões dos mesmos Tratados).
o Ativismo judicial consentido
• Tribunais viram oportunidade de identificar características próprias da ordem jurídica
da UE.
o Decisões constitucionais sobre princípios que enformam o DUE – vêm da
jurisprudência e alguns nem têm consagração nos Tratados.
▪ Através de uma jurisprudência ousada, iniciada e prosseguida ao
longo dos anos 60 e 70, o Tribunal de Justiça elaborou e
conseguiu impor ao ordenamento jurídico comunitário certos
princípios.
▪ Isto porque a prossecução dos objetivos enunciados nos Tratados
exigia a aplicação uniforme do DUE como direito comum a um
conjunto de Estados-membros que pretendem realizar a sua
integração económica.

165
Expressão do constitucionalismo dos EUA que considera que a aplicação da lei, tendo por base uma
interpretação, já tem alguma valoração.

102
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Articulação da Ordem Jurídica da UE com as Ordens Jurídicas dos


Estados-membros
O que está em causa é o funcionamento em rede de ordens jurídicas diferentes, num espaço
de internormatividade.
➢ MLD: não se fala em hierarquia, nem em constitucionalismo multi-nível.
➢ Há apenas uma articulação com base no princípio da competência.

A perspetiva é a de uma relação funcional com ordens jurídicas paritárias – relação de


Internormatividade.
➢ Não pelo critério da hierarquia, sim pelo princípio da competência.
➢ Tribunal de Justiça dirime litígios quando há conflito de normas mas não atende ao
critério hierárquico e sim ao critério da competência – a norma aplicável é a que se
reconduz à competência, que decorre dos Tratados, por vontade dos Estados.

A obra jurisprudencial dos anos 60 e 70 consagrou vários princípios do DUE

Princípio da Autonomia
Característica das ordens jurídicas
TJUE afirmou desde muito cedo a autonomia da Ordem Jurídica comunitária, tanto em relação
ao DIP como em relação ao Direito Interno de cada Estado-membro.
• Autonomia recíproca – eurocomunitária e nacional – são autónomas uma em relação à
outra.

Acórdão Costa c. Enel + Acórdão Van Gend en Loos – Tribunal afirma a independência da
ordem jurídica da UE – “Tratado CEE institui uma ordem jurídica própria que é integrada no
sistema jurídico dos Estados-membros a partir da entrada em vigor do Tratado e que se impõe
aos seus órgãos jurisdicionais nacionais”
• Faz valer a autonomia dessa ordem jurídica em relação aos Estados (autonomia interna)
e em relação ao DIP (autonomia externa)

TJ considerou que o então TCEE, ao contrário de todos os outros tratados internacionais, criou
o seu próprio sistema jurídico – novo e autónomo – o qual se baseava:
• Num sistema de fontes próprio;
• Num quadro institucional independente;
• Num sistema de fiscalização judicial eficaz;
• Em princípios específicos;
• Na especificidade dos objetivos do Tratado.

Art. 344º - pedra angular da autonomia da ordem jurídica eurocomunitária e jurisdição do


Tribunal como garante dessa autonomia – monopólio jurisdição na origem de jurisprudência
reiterada, constante e consistente166
• Tribunal é cioso da autonomia e vê-se a si próprio como garante dos Tratados, estando
no topo e com papel fundamental.
o Pode até haver conflito com Tribunais Constitucionais nacionais pois o TJUE considera
que a norma comunitária prevalece sobre a interna.

166
Ex: parecer 2/13 sobre compatibilidade da UE aderir ao TEDH; poderia por em causa o art. 344º

103
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Tribunal descobre o seu espaço de manobra e o seu lugar – qualquer litígio é dirimido
neste Tribunal, a não ser que o Tratado permita uma solução diferente.

Princípio do Primado do DUE


A autonomia da ordem jurídica da UE implica que ela não é tributária das ordens jurídicas dos
Estados-membros e que, portanto, define as suas relações com estas últimas segundo os seus
próprios princípios e critérios – ou seja, sem subordinação às leis ordinárias ou constitucionais
dos Estados-membros.

Mota Campos: Os Tratados não contêm uma regra de conflitos explícita, a determinar ao
juiz interno que resolva a favor do DUE qualquer eventual oposição entre este e o direito
nacional.

Pescatore: o DUE “contém em si uma exigência existencial de primazia; se ele não consegue
em todas as circunstâncias superiorizar-se ao direito nacional, é ineficaz e, portanto,
inexistente”.
• Sem primado não há DUE, pois o DUE ficaria à mercê do legislador e decisor nacional.
o Ou DUE era aceite como hierarquicamente superior ao direito interno ou
estaria condenado a não sobreviver senão como categoria residual – tolerado
pela ordem jurídica nacional na medida em que se lhe não opusesse, mas
incapaz de desempenhar a função, que deveria ser a sua, de instrumento
jurídico do processo de integração.

Não precisa de uma consagração nos Tratados, tendo sido originalmente consagrado pela
jurisprudência dos anos 60.
• Primado do DUE, corolário da sua vigência na ordem interna, era, de resto, uma
consequência inevitável da atribuição pelos Estados-membros de amplas
competências à UE.
• Primado do DUE aparece como corolário do seu caráter de direito comum a uma
coletividade de Estados.
• Este princípio fundamental foi declarado pelo TJUE – princípio do primado e
determinação progressiva das suas implicações são o resultado de um esforço
pretoriano.

Acórdão Costa c. Enel (15 julho de 1964)


Contém toda uma teoria geral das relações entre o DUE e o Direito Interno, bem como a
justificação da superioridade da ordem jurídica da UE sobre as ordens jurídicas nacionais,
deduzida em termos que, embora esclarecidos e desenvolvidos em acórdãos posteriores, jamais
foram ultrapassados.

Tribunal fornece o princípio que fundamenta a aplicabilidade do DUE em 2 pontos:


• Natureza específica da ordem jurídica comunitária – Tratado CEE institui uma ordem
jurídica própria, integrada na ordem jurídica dos Estados-membros e que se impõe às
suas jurisdições, pois limitaram-se os direitos soberanos dos Estados-membros,
transferindo-os para a UE, criando assim um corpo de direito aplicável aos seus cidadãos
e a eles próprios.
• Exigências próprias da ordem jurídica comunitária – força executiva do Direito
Comunitário não poderia variar de um Estado-membro para outro, ao sabor das

104
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

legislações internas, sem pôr em perigo a realização das finalidades do Tratado ou


provocar uma discriminação proibida pelos mesmos.

Uma vez proclamado o princípio, o TJUE não cessou de o confirmar e explicitar, sublinhando que
o primado se manifesta em relação a todas as normas nacionais, quaisquer que elas sejam,
anteriores ou posteriores, tornando inaplicáveis de pleno direito todas as disposições nacionais
existentes.

Acórdão Simmenthal (9 de março de 1978)


Sendo as normas de direito comunitário diretamente aplicáveis, são fonte imediata de direitos
e obrigações para todos aqueles a quem dizem respeito, que se trate de Estados-membros quer
dos particulares que são sujeitos das relações jurídicas reguladas pelo direito comunitário, pelo
que o juiz nacional, enquanto órgão dos Estados-membros que tem por missão proteger os
direitos conferidos aos particulares pelo direito comunitário, está diretamente vinculado à
observância dos princípios da aplicabilidade direta e do primado.
➢ Incumbe-lhe, pois, uma vez chamado a julgar no âmbito da sua competência, a
obrigação de aplicar integralmente o direito comunitário, deixando inaplicada qualquer
disposição eventualmente contrária da lei nacional, que esta seja anterior quer posterior
à regra comunitária.

Existindo um conflito167, a norma interna não pode ser aplicada e prevalece o DUE, quando não
é possível conciliar normas.
Administração em geral tem o dever de afastar a aplicação de qualquer disposição nacional,
ainda que de natureza constitucional, quando esta obste à aplicação efetiva do direito
comunitário – normas internas devem ser desaplicadas pela Administração pública ex oficio
(sem ter que ir a Tribunal, a Administração pública pode desaplicar por si) se violarem qualquer
tipo de norma de DUE – Acórdão Internationale Handelsgesellschaft (17/12/1970)

Única referência atual é na Declaração 17


• MLD: declaração inútil – pois é claro que os Estados reconhecem o primado e tal já é
invocado há 50 anos.
• Estava previsto no art. 6º da Constituição Europeia168
• Indícios do primado: art. 4º/3; ação por incumprimento; art. 267º

Consequência/Função do primado:
• Em situação de litígios, e apenas em situações de litígios (pois o primado é uma solução
de conflitos entre normas e só deve ser invocado nessa sede – tem uma função

167
Que tem de existir e não pode ser ultrapassável, por interpretação conforme ao DUE pelo juiz nacional
– 1º procura-se responder pela interpretação, na medida do possível – Acórdão Marleasing
168
Daí que CRP tenha no art. 8º a referência ao primado; hoje inútil mas na altura era necessário para
acomodar a Constituição Europeia, que Portugal ratificou.
• Primado dos princípios e normas de direito internacional sobre a lei interna ordinária resulta do
próprio art. 8º CRP.
o Primado do DUE: art. 8º/4 CRP – em que o constituinte português, sabido dos termos
em que o DUE impõe aos Estados-membros os princípios da aplicabilidade direta e da
primazia das suas normas, aceitou respeitá-los na ordem jurídica interna.

105
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

pragmática), garante-se a aplicação da norma comunitária em vez da interna existente


sobre a matéria.
o Princípio de competência material – normas de DUE primam pois são elas que
são praticadas no âmbito das competências sobre essa matéria dada à UE e
nenhum Estado tem competência isolada para afastar normas de DUE, pois
isso destruiria o caráter comunitário do DUE.
o O que justifica a ideia de primado é a existência de domínios em que a UE é
materialmente competente, pelo que um Estado isoladamente não pode
dispor em sentido divergente.
o Para haver aplicabilidade prática do DUE tem que se consagrar este princípio.
o DUE é materialmente competente para regular o caso concreto e por isso é
que primam sobre as do direito nacional.
• Primado apenas tem uma solução pragmática de desaplicação da norma contrária.
o Primado não ilegaliza norma interna que lhe seja contrária – não estabelece
relação de invalidação do direito interno face ao DUE. Ilegalidade pressuporia
realidade de subordinação hierárquica.

Extensão/limites do primado:
• Não é nem incondicional nem absoluto.
o Condicionado, relativo e materialmente justificado

Primado e CRP
Jurisprudência do TJUE é que o Primado era geral e não admitia exceções
➢ TC Alemão e TC Italiano tinham perspetivas diferentes
o Avançaram com a Teoria dos Contra-Limites: primado não se poderia aplicar
de forma absoluta e incondicional ignorando a natureza da norma interna
contrária; ideia de normas constitucionais internas (sobre Direitos
Fundamentais) que seriam invioláveis e nessa medida eram contra-limite ao
primado.
o TJUE incorporou essas objeções e respondeu-lhes indiretamente emitindo
jurisprudência em relação a Direitos Fundamentais, dizendo-se vinculados ao
respeito desses direitos que resultam das Constituições dos Estados,
Convenções e Princípios = bloco de fundamentalidade, que vincula o juiz
constitucional é o mesmo que vincula o TJUE.
▪ Apesar deste entendimento jurisprudencial, que esvaziou as questões
mais esquinadas, ainda vão aparecendo questões controvertidas em
relação ao primado supraconstitucional.

Não há jurisprudência una sobre isso e TJUE apresenta respostas algo distintas – natureza
flutuante/casuística dessa jurisprudência:
• Omega – TJUE conciliou-se com a posição de TC Alemão;
• Michaniki – TJUE não atendeu ao padrão constitucional;
• Kreil (C 285/98) – TJUE não atendeu ao padrão constitucional e decidiu que a
Constituição violava uma diretiva;

106
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Melloni (C 399/11) – estava em causa art. 53º CDFUE169; esvaziou o artigo e


interpretou-o estando mais preocupado com o primado do DUE do que com a
proteção dos direitos fundamentais)

Próprio Tratado tem hoje disposição que limita TJUE face a um exercício incondicional do
primado – art. 4º/2.
➢ Princípio de respeito da identidade nacional (= identidade constitucional)

Limitação não é exógena e sim endógena. TJUE quando tem de limitar o primado está a
respeitar uma disposição do TUE (e TJUE está obrigado a fazer uma interpretação sistemática).
TJUE não pode ignorar os limites da sua própria jurisdição (e se o fizer, TC Alemão avisa que
ele, como guardião da Lei Fundamental de Bona, fará esse controlo)

Tribunal Constitucional Alemão só aceita primado na medida que (doutrina do primado limitado
– primado enquanto) a norma em conflito esteja na competência dada pelos Estados. Rejeita a
ideia do mandato sem controlo – primado sim, se a UE não ultrapassar as suas competências,
TC alemão arroga-se ao direito de ver se a norma comunitária não está a extravasar essas
competências.
➢ Considerou-se, também, competente para declarar uma disposição do direito
comunitário inaplicável pelas autoridades administrativas ou pelos órgãos jurisdicionais
alemães se ela ofendesse um direito fundamental, garantido pela Lei Fundamental ou
que afetasse a “estrutura fundamental da Constituição, que confere a esta a sua
identidade”.170

Mesma ideia está no art. 8º/4 CRP – prevalecem na medida do exercício legítimo das
competências que os Tratados dão à UE + têm de respeitar os princípios do Estado de Direito
Democrático (positivação da jurisprudência do TC Alemão)

Art. 8º/4 CRP – não há uma aceitação da primazia absoluta do DUE, tal como definido pelo
TJUE, pois tem de se salvaguardar “o respeito pelos princípios fundamentais do Estado de
Direito democrático”
• Reconhece de forma expressa o primado do DUE, mas estabelece-lhes limites (adota,
em certa medida, a doutrina dos contra-limites).
o CRP consagra uma reserva à primazia do DUE equiparável à que por via
jurisprudencial foi formulada pelos tribunais constitucionais alemão e italiano.

Art. 7º/6 CRP – cláusula de limitação da soberania


• É o que legitima limitações de soberania por via convencional.
• Plantou na CRP um fundamento de autolimitação da própria CRP.

169
Nível de Proteção – existindo um potencial conflito entre norma interna e norma DUE sobre
o âmbito de garantia de determinado direito, prevalece a norma que garante o nível mais
elevado de proteção – artigo acolhe o princípio do nível mais elevado de proteção.
Ex: art. 28º CDFUE incluir-se-ia o lock-out como adição à greve; em Portugal o art. 57º
CRP proíbe-se o lock-out. qual seria o nível mais elevado de proteção? MLD: seria a CRP
e deveria prevalecer (porque protege a parte mais fraca – os trabalhadores)
170
Que é admitida na UE pelo art. 4º/2 TUE

107
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

o Não é limitação irrestrita, tem-se em conta princípio da reciprocidade, da


subsidiariedade e respeito pelas competências da UE e Estado de Direito
Democrático.

Se houver conflito de normas constitucionais e DUE, tem que haver uma interpretação em
conformidade, na medida do possível, do DUE. 171
➢ Se não for possível então atendendo ao primado, prevalece a norma DUE, se não violar
o art. 8º/4.
➢ Papel dos tribunais é muito importante e perante conflito iminente de normas deve
colocar-se a questão ao TJUE.

Princípio da Eficácia Direta


MLD: defende conceito unitário que engloba dois princípios que nasceram separados mas que
se podem identificar à luz deste conceito unitário – eficácia direta nas normas
eurocomunitárias.

Todas as disposições do DUE, independentemente da sua fonte, da sua natureza e do


seu nível hierárquico, a partir do momento que entram em vigor na UE inserem-se
automaticamente, de pleno direito, na ordem jurídica interna dos Estados-membros,
passando consequentemente a fazer parte, em posição de primazia, do corpos iuris que
todos os órgãos do Estado, nomeadamente os jurisdicionais, são obrigados a acatar e a
fazer valer.
• Toda a norma produz um efeito imediato traduzido na atribuição de um direito e na
imposição a outrem da correspondente obrigação.
• Pode ser alegada por quem tenha interesse legítimo em invocá-la (invocabilidade em
juízo perante as jurisdições nacionais).

Princípio da Aplicabilidade Direta


TJUE considerou a Aplicabilidade Direta um princípio essencial da ordem jurídica comunitária
com o fundamento de que a plena eficácia (efeito útil) dos Tratados exigia que os agentes
económicos do mercado interno se vissem possibilitados de invocar perante as jurisdições
nacionais as disposições dos Tratados e dos atos normativos da UE, fazendo valer os direitos
que nesses textos jurídicos se pudessem fundar.

Acórdão Van Gend en Loos (5/2/1963)


Afirmou a autonomia do DUE estabelecendo que as normas dos Tratados têm uma
aplicabilidade direta pois dizem respeito não só aos Estados-membros do mercado comum, mas
também aos operadores desse mercado; ao associar povos europeus no funcionamento dos órgãos
confirma-se que eles são diretamente interessados nas atividades da Comunidade; direito comunitário
está vocacionado para conferir direitos e impor obrigações não apenas aos Estados-membros
mas igualmente aos seus cidadãos; atual art. 267º confia ao TJUE a interpretação das regras
comunitárias invocadas pelos litigantes perante as jurisdições nacionais, o que não faria

171
Problema do primado supraconstitucional tem interesse dogmático, mas, na prática, tem uma
expressão muito residual. MLD: Problema mais complicado de resolver não é o normativo mas sim o
conflito político.

108
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

sentido se de tais regras não pudessem resultar, para os litigantes, direitos suscetíveis de
serem invocados nos tribunais internos.
➢ Normas dos Tratados produzem efeito imediato e originam, na esfera dos litigantes,
direitos individuais que às jurisdições nacionais incumbe salvaguardar.
➢ Particulares podem invocar diretamente normas europeias perante jurisdições
nacionais e europeias.

Acórdão Simmenthal (9/3/1978)


Primeira noção de aplicabilidade direta: “normas de direito comunitário produzem a
plenitude dos seus efeitos, de modo uniforme em todos os Estados-membros, a partir da
sua entrada em vigor e durante todo o período da respetiva vigência, constituindo uma
fonte imediata de direitos e obrigações para todos os seus destinatários, quer se trate
de Estados-membros ou de particulares, que sejam titulares de relações jurídicas às
quais se aplique o direito comunitário. Vale igualmente para o juiz que tem por missão
proteger os direitos conferidos aos particulares pelo direito comunitário.”

Pressupostos de:
• Vigência automática de pleno direito das normas de DUE.
o Não se confunde com self-executing – pode precisar de normas jurídicas
internas que acomodem as normas de DUE.
• Produção de efeito imediato na esfera jurídica dos sujeitos de direito comunitário.
• Salvaguarda, pelo juiz nacional, dos direitos conferidos aos particulares por uma
norma comunitária.

Aplicabilidade direta dos Regulamentos


Art. 288º dispõe que o regulamento é diretamente aplicável e todos os Estados-membros.
Condicionado à publicação no JOUE e à sua entrada em vigor (art. 297º/1 TFUE).
➢ Não é aplicabilidade imediata: regulamento pode subordinar a aplicação das suas
disposições à intervenção de medidas ulteriores de execução a adotar pelas instituições
ou pelos Estados-membros.

Aplicabilidade direta das Decisões


Resultam diretamente em direitos ou obrigações a favor ou a cargo dos destinatários a que se
dirigem – o que determina a sua aplicabilidade direta na ordem interna.
➢ Podem ser Decisões dirigidas a Estados-membros nos termos que foi definido pela
jurisprudência Franz Grad (6/10/1970)

Aplicabilidade direta dos Acordos Internacionais


Deve ser considerada diretamente aplicável sempre que, atendendo ao objeto e à natureza do
acordo, este contêm uma obrigação clara e precisa que não esteja dependente, na sua execução
ou nos seus efeitos, da intervenção de qualquer ato posterior.

Princípio do Efeito Direito


Não está previsto nos Tratados e é criação jurisprudencial.

Vem responder a questões relacionadas com a possível Aplicabilidade direta das Diretivas

109
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Parece que só se impunha uma obrigação de resultados (obriga apenas quanto ao


resultado a atingir) e que direitos para os particulares apenas resultariam das
disposições nacionais adotadas na ordem interna do Estado destinatário, para
implementar a diretiva.
• Na jurisprudência do Tribunal foi-se consolidando que a diretiva poderia produzir efeitos
imediatos, suscetíveis de tutela jurisdicional, na esfera dos particulares.

Acórdão Van Duyn (4/12/1974)


Uma vez que [uma diretiva] se trata de uma obrigação imposta aos Estados-membros, a
segurança jurídica dos interessados exige que essa obrigação possa ser por eles
invocada, mesmo tendo sido consagrada num ato normativo que, no seu todo, não tem
aplicabilidade direta.

Tribunal invoca o princípio do efeito direito para assegurar garantias de direitos aos
particulares e punir o infrator (Estado-membro que não transpôs) retirando-lhe o benefício da
infração – não se pode socorrer da infração da não transposição para negar o direito a um
particular.
➢ Isto porque o efeito direto é mecanismo de substituição de algo que devia existir (norma
interna transpondo uma diretiva) mas que não existe.
➢ Estado-membro quando não transpõe incorre em incumprimento (art. 258º) e pode
sofrer sanções (art. 260º), mas, tal não vai impedir os particulares de invocarem as
normas DUE pelo seu efeito direito e demandar os Estados-membros em
responsabilidade.

Efeito direito não é automático e as normas das diretivas PODEM ter efeito direito se cumprirem
os requisitos:
Positividade da norma – tem de ser regra de direito positivo.
1. Clareza – em que TJUE tem competência para interpretar a regra em questão tornando
claro o seu sentido e alcance
2. Precisão da norma – precisão das obrigações impostas pela norma
3. Incondicionalidade da norma – exclusão de qualquer margem de apreciação e
intervenção por parte dos Estados-membros, não têm poder de mediação.
• Tem de conter todos os elementos necessários para ser efetivamente aplicada pelos
tribunais nacionais à situação concreta subjudice.
4. Perfeição Jurídica da norma – vocação ou aptidão da norma para conferir direitos
subjetivos, criando na esfera jurídica dos particulares direitos e obrigações individuais
que os tribunais nacionais podem ser chamados a salvaguardar ou impor.
• Norma tem de permitir aos particulares o exercício concreto desse suposto
direito

No decurso do prazo de transposição não há efeito direito pois norma não é incondicional –
isto é uma garantia para os Estados-membros.
• Segundo jurisprudência assente, uma diretiva só pode ter efeito direito após expirar o
prazo fixado para a sua transposição na ordem jurídica dos Estados-membros.

110
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Também não é incondicional se houver opção do legislador sobre a medida jurídica a


aplicar.

Particular pode socorrer-se das diretivas para arguir em Tribunal os direitos que lhe são
conferidos e pode contestar quando não haja correta aplicação do DUE.
• Suscetibilidade de invocação da norma eurocomunitária pelos particulares, no âmbito
de um litígio em que sejam partes, nos Tribunais nacionais.

Efeito direto vertical – litígio que opõe particulares e poderes públicos


Efeito direto horizontal – litígio que opõe os particulares entre si

Norma da diretiva pode ser invocada na vertical mas não na horizontal, pois deve evitar-se que
o Estado tire proveito da sua inobservância do direito comunitário mas, uma diretiva não cria
por si só obrigações na esfera jurídica de um particular – Acórdão Marshal (1986)
Impacto restritivo da doutrina Marshal inibiu os direitos dos particulares, mas posteriormente
a jurisprudência definiu que os particulares não podem invocar na horizontal mas têm
garantias:
• Acórdão Marleasing (1990) – Aplicação conforme: interpretação do direito interno
nacional, na medida do possível, conforme a diretiva, pois o Estado está vinculado ao
fim da diretiva.
o A diretiva serve de parâmetro de interpretação do direito nacional, dentro da
margem de apreciação (nunca habilita que o Direito nacional seja interpretado
contra legem – Tribunais nunca o podem invocar para interpretar o direito
num sentido contrário ao da letra da lei – violaria a separação de poderes
(MLD))
o Pode ser invocado num litígio entre particulares – tem que se interpretar o
direito nacional conforme o que diz a norma, se isso couber no que a norma
preveja (ex: a norma não disser taxativamente e ser exemplificativamente e o
elenco da diretiva vem por novos casos)
o Aplicação conforme tem o efeito de esgotar a interpretação da norma nacional
de forma a que tal esteja de acordo com o DUE e o direito nacional.
• Acórdão Medicine Control Agency (1996) – Efeito incidental das diretivas: nas
relações triangulares, admite-se que um particular invoque uma Diretiva contra uma
entidade pública de modo a retirar efeitos jurídicos para as relações jurídico-
administrativas que esta tenha com outros particulares
• Acórdão Wallonie (1997): Estados devem de se abster de adotar atos contrários que
prejudiquem ou inviabilizem a aplicação do resultado da diretiva (quando a diretiva
está em vigor e decorre o prazo de transposição).
• Acórdão Kucukdevici (1997) - Diretiva que concretiza principio geral do DUE e que tem
assento na CDFUE pode ser invocada porque o que está na CDFUE tem aplicabilidade
direta.
o Não reconhece efeitos horizontais das diretivas e apenas reconhece que se as
diretivas exprimir princípios de outros instrumentos normativos que têm
aplicabilidade direta, esses princípios vinculam as relações jurídico-privadas.

111
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Se tudo isto falhar e o particular não tiver forma de beneficiar, direta ou indiretamente
dos efeitos normativos de uma Diretica, resta a tutela secundária de tipo
indemnizatório:
o Acórdão Francovich (1991) – Responsabilidade Extra-contratual: particular
tinha certo direito dado por uma diretiva; por ela não ser incondicional viu
esse direito frustrado, pelo que pode demandar o Estado-membro a
indemnizá-lo pelo prejuízo que sofreu de ver o seu direito suprido.

Efeito Direito nasceu para ser invocado junto dos Tribunais Nacionais, mas, agora evoluiu para
vincular a Administração Pública se o administrado invocar a norma da diretiva – Administração
teria que desaplicar norma interna e utilizar a diretiva.
➢ MLD: discorda desta situação.
o Há requisitos para se usar o efeito direito, que têm de ser apreciados pelos
Tribunais – aqui punha-se em causa a separação de poderes, pois a
Administração interpretava algo que cabia aos Tribunais.
o Administração só está vinculada à diretiva e tem de a utilizar se houver
jurisprudência consolidada (do TJUE ou Tribunais Superiores) em relação ao
efeito direto da diretiva.

Princípio da Interpretação e Aplicação Uniformes – art. 267º TFUE


Art. 267º está inalterado desde a versão inicial dos Tratados

Não é uma invenção puramente comunitária pois já existia nos direitos nacionais – havendo
reenvio entre os tribunais das várias áreas.
➢ O que o distingue dos contenciosos nacionais é que este é um mecanismo ativado pelo
juiz e não invocado pelas partes – cooperação judicial (diálogo juiz a juiz – entre 2
ordens jurídicas separada mas com um elevado grau de integração = mecanismo de
ponte) em que há ideia de horizontalidade e de cooperação entre partes/entre iguais
(não há hierarquia).

Questão prejudicial – aquela cuja resposta ou resolução é necessária e condiciona, como


etapa prévia ou antecedente, a solução do litígio concreto.
• No caso do art. 267º, surgem questões de interpretação ou validade da norma DUE
cuja resposta vai influenciar a forma como o tribunal nacional decide o caso em apreço
(onde surge a invocação da norma).
• O TJ pode ser instado a pronunciar-se a título interpretativo em questões de Direito
primário, Direito secundário, Acordos internacionais celebrados pela UE, Normas de
DUE indiretamente aplicáveis, Princípios gerais de DUE, Acórdãos do TJUE (Tribunal
nacional pode recolocar a questão sobre o alcance do acórdão proferido a título
prejudicial).

Competência regra é de que o juiz nacional é quem interpreta a norma DUE.


• Juiz nacional pode resolver uma apreciação de validade, ele próprio, dispensando-se de
a submeter ao TJ, se considerar que deve considerar válido o ato; mas, segundo a
jurisprudência do TJUE, é obrigado a proceder ao reenvio sempre que, em seu entender,

112
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

a resolução da questão implique a declaração de invalidade do ato em causa. Pode


também requerer ao TJUE que a interprete.

Pode ser qualquer norma de qualquer ato de DUE quanto à interpretação172 (determinar qual
o exato sentido e alcance das disposições em causa)
➢ Só se pode questionar a validade (comporta não só a legalidade intrínseca resultante
da observância das condições de fundo como, igualmente, a satisfação das exigências
de forma – validade formal dos atos) de atos de direito derivado – não se questiona a
validade dos Tratados.

1. Sempre que no âmbito dos Tratados um tribunal nacional de instância se vir confrontado
com uma questão de interpretação ou de apreciação da validade de um ato das instituições,
esse tribunal pode:
• resolver ele próprio a questão;
• submeter a sua resolução ao TJUE, mediante devolução ou reenvio, a título prejudicial
da questão suscitada.
2. Quando num processo que suba até um tribunal supremo haja lugar à aplicação do DUE, esse
tribunal deve:
• devolver ao TJUE o julgamento da questão prejudicial de interpretação ou apreciação
de validade perante ele suscitada.

Tem de haver questão pertinente – relevante para resolver o caso concreto – link entre a
proposição da questão e a resolução do caso específico (sem isto, TJUE emana despacho com a
inadmissibilidade)
• Princípio geral é o da presunção de pertinência: TJ aceita como certa e suficiente a
apreciação realizada pelo juiz nacional a respeito da necessidade da questão.
o Há jurisprudência do TJ a afastar essa presunção de pertinência
Questão tem de levantar dúvidas.
• Se não existirem dúvidas e a resposta for evidente, adota-se a Teoria do Ato Claro
o Acórdão CLIFIT – TJUE aceita que há normas de DUE tão claras no seu sentido
que não podem suscitar dúvidas; o que exige ao juiz nacional que verifique uma
serie de condições para que a norma esteja ao abrigo da teoria do ato claro.
o Total clareza da norma em causa – caso em que não há qualquer questão e em
que não há dúvida.
o Norma aplicável é perfeitamente clara e não suscita a mínima dificuldade de
interpretação – “in claris non fit interpretatio” – aplicação correta do direito
comunitário impõe-se com tal evidência que não deixa lugar a qualquer
dúvida razoável.

Obrigatoriedade de Reenvio
A. Entendimento maximalista: todos os tribunais que julgam como última instância173
devem suscitar questões
B. Entendimento MLD – não há obrigação de reenvio e sim o dever prudencial de reenvio.

172
Processo das questões prejudiciais é a via privilegiada de solicitação do TJ para efeitos de interpretação
das normas eurocomunitárias, mas, com idêntico objetivo, a questão interpretativa pode emergir, por
exemplo, no quadro de uma ação por incumprimento (Acórdão Hungria c. República Eslovaca, 16/10/12)
173
Que não são necessariamente os tribunais superiores, uma vez que há o sistema de alçadas.

113
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Não é automático e deve compaginar-se com a prudência desse dever.


• Juiz pode não ter dúvidas e só com a dúvida é que colocaria a questão.
• Tudo feito segundo a cooperação leal e não por objeção ao reenvio, sendo que
aí o Estado-juiz pode ter sanções e ser demandado por responsabilidade
extracontratual por não ter feito o reenvio.

Acórdão Silva e Brito – Tribunal superior deve colocar a questão ao TJUE salvo se houver
alguma das exceções à obrigação de reenvio:
1. Falta de pertinência da questão – quando o tribunal nacional considerar que o litígio
subjudice não deve ser decidido de acordo com normas de DUE, mas tão-somente na
conformidade das disposições do direito interno;
• Existência de interpretação já anteriormente fornecida pelo TJUE174 – apesar disto, o
Tribunal nacional pode não se dar por satisfeito com a interpretação anteriormente
fornecida ou considerar que não é suficientemente explícito pelo que o pode solicitar
de novo;
• Não existem dúvidas – aplica-se a teoria do ato claro

Acórdão Foto-Frost, (27/10/1987) – TJUE assumiu que só ele tem a competência de declarar
a invalidade de uma norma de DUE
• Juiz nacional tem competência para determinar se a questão é necessária ao julgamento
em causa – existe uma obrigação de reenvio por parte do órgão jurisdicional nacional,
mas no quadro de um dever prudencial de avaliação sobre a necessidade e a pertinência
da questão.
• Se juiz nacional verificar que uma norma eurocomunitária é potencialmente ilegal,
havendo dúvidas sobre a validade de uma norma eurocomunitária, o juiz tem
obrigatoriamente que colocar a questão, se pretender declarar a invalidade da norma
eurocomunitária.
o Monopólio do TJUE para declarar a invalidade (em linha com os seus poderes
no quadro do recurso de anulação)
o Juiz nacional tem competência para analisar a validade e concluir que é válida
mas não tem competência para analisar e concluir que não é válida.

Se houver incumprimento do dever de reenvio pode haver ação por incumprimento contra o
Estado-membro; ação de indemnização por responsabilidade do Estado-membro175; recurso
extraordinário de revisão; queixa ao TEDH (nunca ocorreu).

Órgãos Jurisdicionais
Qualquer órgão designado por tribunal na estrutura judiciária interna de cada Estado-
membro, em conformidade com o princípio da autonomia processual.
• Há outras entidades, com outras denominações, mas que constituem um órgão que,
num certo litígio concreto, é titular de competência jurisdicional (e, nesse sentido, um
interlocutor legítimo no diálogo juiz a juiz)

174
Se já houver jurisprudência sobre a matéria, o TJUE faz despacho para esses casos.
175
Particular lesado pode recorrer aos tribunais nacionais acionando o Estado por prejuízos imputáveis
ao juiz/função judicial (Pt: Lei 67/2007)

114
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Na dúvida o TJ aceita a questão colocada, mesmo que o autor da questão não


corresponda, prima facie, à qualificação de órgão jurisidicional

Analisar a natureza jurisdicional do órgão é através de 5 critérios cumulativos definidos no caso


Vaassens-Göbbels (30/6/1996):
1. Origem legal – órgão criado por lei, de forma direta (ato formalmente legislativo) ou
indireto (ato da função regulamentar)
2. Permanência e caracter obrigatório da sua jurisdição – duplo alcance: as partes são
obrigadas a recorrer àquele órgão para resolver o litígio e há vinculatividade nas
decisões proferidas pelo órgão
➢ Podem ser ad-hoc mas têm que ter jurisprudência vinculativa (o que afasta
alguma dos arbitrais)
3. Processo com respeito do princípio do contraditório – partes têm de ter oportunidade
de, com igualdade de armas, expor e debater as respetivas pretensões processuais
4. Independência – duplo alcance: resistência a pressões externas, imparcialidade dos
membros
➢ Estabelece distinção clara com os órgãos administrativos (que existem num
quadro de tutela), dai que TJUE tem afastado as autoridades reguladoras pois
ao verificar os estatutos dessas autoridades constatam ue podem depender dos
governos
5. Julgar segundo o Direito – serviria para excluir o julgamento pela equidade e teriam de
aplica normas de direito; no entanto, em virtude do primado e do efeito direito, as
instâncias jurisdicionais, mesmo que habilitadas a decidir segundo critérios de equidade,
estão obrigadas a respeitar DUE
6. Do art. 267º infere-se um 6º critério: ser um órgão jurisdicional de um dos Estados-
membros (aqueles que se localizam no seu território, art. 355º TFUE), excluindo
tribunais internacionais e tribunais de países terceiros.

Tem ficado mais flexível, nomeadamente em relação aos tribunais arbitrais – 2014, Acórdão
Merek Canada (C-555/13), Ascendi (C-377/13)
• TJUE chegou à conclusão que estes tribunais arbitrais portugueses podiam colocar
questões prejudiciais – art. 209º/2 CRP inclui os tribunais arbitrais entre as entidades
que podem exercer a função jurisidicional.
• São permanentes e a competência não depende unicamente da vontade das partes
– decisiva a distinção entre jurisdição facultativa e obrigatória, estes tribunais
arbitrais portugueses tinham jurisdição necessária)

Tem-se admitido também os Julgados de Paz, órgãos de ordens profissionais, autoridades


reguladoras (dependendo de como estão configuradas nacionalmente) e Tribunais
constitucionais

Naqueles que devem enviar questões prejudiciais encontram-se os tribunais que, no caso
concreto, em virtude da aplicação de regras processuais de restrição da admissibilidade do
direito de recurso, julgam em última instância (teoria do litígio concreto).

Juiz nacional coloca a questão ao TJUE sob a forma de Despacho.

115
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Suspende-se a instância nacional (direito processual português fica parado)

Processo das questões prejudiciais é tramitado como processo especial enquadrado pelo art.
267º, art. 23º e 23º-A do ETJ e art. 93º a 114º RP.

Art. 23º ETJUE – pedidos de questões prejudiciais são notificados às partes no processo
nacional, a todos os Estados-membros, à Comissão e ao Conselho e PE se forem autores do
ato.
• Os interessados são notificados para, querendo, apresentar observações escritas (2
meses – prazo perentório).
• Prerrogativa dos advogados das partes no processo nacional conhecerem as
potencialidades desta janela aberta e apresentarem o entendimento da parte sobre
a validade ou interpretação da norma.
o Não é processo contencioso pois não é acionado pela vontade das partes
mas elas podem intervir.
o Portugal, sempre que a questões são suscitadas por Tribunal português, o
Estado faz observações.

Quem responde é sempre e só o TJ – embora o art. 256º/3 admita que se pode abrir para
o TG (o que ainda não foi feito)

Em seguidas apresentam-se as Conclusões do Advogado-geral

Prevê-se no art. 267º uma tramitação urgente que reduz os 14/15 meses de resposta do TJUE
para semanas – existe muito nos casos penais e nos de regulação do poder paternal.

Acórdão
Efeitos do Acórdão sobre a Interpretação – posição do TJUE é sempre vinculativa para o juiz que
colocou a questão e o acórdão tem força desde o dia da sua prolação.

Acórdão é vinculativo para o juiz que colocou as questões, para os juízes de recurso desse
processo (no direito interno). Além deste quadro inter partes, a jurisprudência do TJUE produz
efeitos num modelo de efeito de Precedente Atípico.
• Efeito de caso julgado análogo – mas não se esta num quadro contencioso;
• Acórdão tem autoridade a título prejudicial em relação a questões futuras
materialmente idênticas – vinculatividade de raiz funcional que exclui qualquer relação
hierárquica.
o Essa autoridade interpretativa justifica-se à luz do objetivo primordial da
garantia da uniformidade da interpretação e aplicação do DUE no conjunto das
ordens jurídicas dos Estados-membros.176

176
Mais importante mecanismo através do qual o TJUE firma a sua jurisprudência dizendo qual é o direito.
Mitiga-se o risco de uma jurisprudência díspar pelos 28 membros com as questões prejudiciais – forma
de uniformizar a aplicação do DUE nos Estados-membros.
• Acórdão CLIFIT – este mecanismo do reenvio visa, particularmente, evitar que se estabeleçam
divergências de jurisprudência no interior da Comunidade sobre questões de direito
comunitário.

116
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Se Tribunal nacional não quiser aplicar essa jurisprudência tem de recolocar a questão – TJUE
ou altera a sua jurisprudência ou emite despacho fundamentado dizendo que já existe
jurisprudência sobre essa matéria.

Efeito do Acórdão sobre a Validade – se for reconhecida a invalidade da norma eurocomunitária


ela não pode ser aplicada (há um dever de desaplicação ao TJ e, por maioria de razão, ao TG).
• Não equivale a certidão de invalidade para o futuro – a sua eliminação definitiva da
ordem jurídica eurocomunitária depende de um ato de revogação (que concretiza um
dever cujo fundamento é o princípio da cooperação leal).
o Norma não deixa de existir na ordem jurídica DUE – norma não está morta, está
moribunda (debilitada na sua viabilidade jurídica pois a norma não deve ser
aplicada, paralisando a sua aplicação para o futuro, juízes não a devem utilizar).
o MLD: Comissão deve exercer a sua competência propondo a revogação da
norma a outra instituição (art. 4º/3 e art. 17º TUE), se for da Comissão, deve
revogar.

Tem efeitos retroativos (salvo se TJ considerar necessário manter os efeitos do ato – analogia
com art. 264º/§2 TFUE)

Jurisprudência portuguesa era avessa a este art. 267º, mas, nos últimos anos a média de
colocação de questões prejudiciais é superior a muitos Estados-membros com a mesma
população (cerca de 12 por ano, sendo que em 2016 foram 21).

Há um sistema completo e coerente de vias processuais que permite aplicação e interpretação


do DUE
• Questões prejudiciais – competência declarativa TJUE
• Tribunal instado a dar parecer quanto a acordos internacionais e a UE, parecer
facultativo quanto à sua obtenção, depois de proverido é vinculativo art. 218º –
competência consultiva TJUE
• Competência contenciosa – recurso de anulação e ação por incumprimento (e recurso
por omissão) – vias processuais em que se permite o controlo da legalidade face ao
decisor da UE e permite-se controlo de contabilidade face aos Estados-membros.

Princípio da Lealdade Comunitária


Princípio da Cooperação Leal – princípio base para regular estruturas complexas onde não
existem relações de hierarquia entre os entes que as compõem – art. 4º/3 TUE
• Regulação das relações de entidades que compõem um sistema complexo com vários
níveis de atuação e sem uma relação hierárquica entre eles.
• Obriga a que os diversos intervenientes adotem comportamentos compatíveis com as
obrigações decorrentes dos tratados e que sejam os que melhor asseguram o
cumprimento dessas obrigações e dos objetivos da UE e da sua ordem jurídica.
o As obrigações que derivam deste princípio dependem, em cada caso concreto,
das disposições dos Tratados ou das regras que resultam do sistema geral do
DUE.
• “Leal” – lógica de reforço da dimensão da cooperação aliado à boa fé.

117
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Princípio da cooperação leal serve como grande diretriz de interpretação do bloco de legalidade.

Conteúdo material abrangente servindo este princípio para justificar a aplicação de outros
princípios – tendo um conteúdo aberto e que necessita de concretização

Coube à jurisprudência do TJUE construir o conteúdo do princípio geral de cooperação leal e


dos deveres gerais e específicos de cooperação que dele decorrem para os diversos
intervenientes.
• Conteúdo normativo do princípio da cooperação leal, jurisprudencialmente
desenvolvido, encontra-se em evolução sendo extremamente complexa a atividade de
mapeamento ou elenco dos vários deveres concretos que dele derivam no que diz
respeito às atuações das entidades vinculadas.

Inspiração do Princípio
• DIP: expressão do pacto sunt servanda extra fortalecido – alguns comparam-no ao art.
26º CVDT e ao art. 2º/2 CNU.
o Tem um conteúdo mais aprofundado que no DIP devido a desenvolvimento e
construção jurisprudencial (que levou a que dele se extraíssem mais princípios).
• Federalistas: regime normativo instituído pelos Tratados recorreu, com frequência, a
institutos típicos do constitucionalismo federal – inspiração no Bundestreue alemão,
noção de federalismo corporativo.
o Mas UE não é Estado federal e o princípio da cooperação leal deve ser entendido
na medida em que a UE é estrutura complexa que envolve processos de tomada
de decisão descentralizada e a vários níveis, sendo este princípio essencial ao
seu funcionamento.

Inserção Sistemática:
• Art. 4º/1 – princípio de que cabem aos Estados-membros as competências que não
sejam atribuídas à UE
• Art. 4º/2 – componentes da soberania dos Estados e que ainda permaneceram neles,
em que a UE não pode tocar – respeito pelas identidades nacionais
• Art. 4º/3 – aditamento pelo Tratado de Lisboa, vinculando a UE face aos Estados-
membros. Embora o princípio já tivesse sido consagrado pelo TJUE em 1971.
o Tem um âmbito subjetivo abrangente e aplica-se a todas as entidades
nacionais bem como à atuação da UE e das suas instituições.
o Regime que se aplica a toda a UE, de forma global e mesmo em todos os pilares
(embora para a PESC há específico: art. 24º/3)
o Estabeleceu-se uma cooperação vertical e uma cooperação horizontal.

Relação Vertical
• Dever de respeito177 e abstenção de comportamentos entre UE e Estados-membros:
predominantemente obrigações de conteúdo negativo.
o Final §3.

177
Não afetação das áreas de competência reservadas ao outro

118
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Dever de assistência mútua entre UE e Estados-membros178: predominantemente


obrigações positivas. Pode relacionar-se com o princípio da solidariedade.
o §2, de resultado; §3, de meios.
Princípio da cooperação leal vincula os Estados-membros na sua globalidade incluindo as
instituições políticas e legislativas, a Administração Pública e os tribunais.

Relação Horizontal
Art. 13º/2
• MLD: Princípio do Equilíbrio Institucional179 – equilíbrio de poderes característicos
da estrutura institucional da UE – instituições devem respeitar as respetivas
atribuições e competências não atuando além da sua esfera legal de ação; repartição de
poderes no quadro da UE deve ser rigorosamente respeitada por cada Instituição
o Nenhum órgão ou instituição pode utilizar as suas competências de forma a que
prime outro de exercer as suas.
o Ideia de potenciar ao máximo as competências que vários órgãos da UE têm
para agir. Ex: entre escolher processo legislativo especial e ordinário (quando os
tratados dão essa hipótese), deve escolher-se o ordinário, uma vez que serão
mais as instituições a participar nesse procedimento – deve ir-se pela base
jurídica que potencia ao máximo a ação legal das competências de cada
instituição
o Equivalente ao princípio da separação de poderes da CRP

Execução180 do DUE
Assegurada pelos órgãos da UE e pelos Estados-membros, nos termos do art. 291º TFUE
• Quem executa o DUE, à partida, são os Estados-membros.
o Administrações Públicas dos Estados-membros são incumbidas de assegurar a
execução administrativa do DUE em cooperação com as instituições da UE e são
elas que o fazem em primeira linha.
o Pelas vias administrativas, judiciais e legislativas181
• É possível a própria UE executar os seus atos legislativos quando a adoção de condições
uniformes de execução seja necessária – através da Comissão (funcionando, aí, a
comitologia182)

Sistema baseado num “federalismo executivo” com algumas adaptações.


➢ UE legisla e Estados-membros aplicam

Aplicação DUE envolve a complexidade da Administração Pública dos Estados-membros, que


está vinculada, pelo art. 4º/3, aos princípios do DUE – Acórdão Fratelli Constanzo

178
Auxílio e solidariedade nos objetivos da UE
179
Autonomizado por parte da doutrina
180
Execução = diversos tipos de aplicação e concretização do DUE; garantia que há aplicação
efetiva e uniforma do DUE.
181
Ex: transpor diretivas; obrigação de revogar direito interno desconforme a DUE
182
Procedimentos de comitologia – situações em que a legislação da UE determina que a Comissão, na
execução do DUE, tem de atuar conjuntamente com comités intergovernamentais, compostos por
representantes das administrações nacionais dos Estados-membros e criados para cooperar ou colaborar
com a Comissão. Art. 291º/3 TFUE

119
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

• Execução direta – realizada pelas entidades da administração da própria UE, que


assumem uma função administrativa
• Execução indireta – realizada pelas entidades administrativas dos Estados-membros
encarregadas de executar as políticas europeias e o DUE.
o Rui Lanceiro: Administração dos Estados-membros é a espinha dorsal da
aplicação administrativa do DUE

O art. 4º/3 implica


• Dever de interpretação da legislação nacional conforme ao DUE – limites e forma de aplicar
no Acórdão von Colson e Kamann
• Dever de desaplicação de legislação nacional desconforme ao DUE – Acórdão Fratelli
Constanzo

Há liberdade (autonomia) dos Estados-membros em estabelecer o enquadramento orgânico-


institucional e jurídico-processual e procedimental nos termos dos quais cumprem a obrigação
de resultados que é a execução e a garantia do cumprimento das disposições do DUE.
Princípio da autonomia organizativa dos Estados-membros não é absoluto e, pelo art. 4º/3, deve
assegurar a correta execução do DUE:
1. Só se aplica na ausência de regulação da UE – se houver indicação da UE as
Administrações dos Estados-membros executam DUE segundo o direito adjetivo dos
Estados-membros183;
2. Sujeito a limites
A. Princípio da Equivalência – tratamento não discriminatório do DUE face ao
Direito Nacional, em termos de efetivade de aplicação e execução, bem como
em termos de garantia de cumprimento.
• Os procedimentos usados para executar DUE não podem ser menos
favoráveis que os procedimentos relativos a ações análogas de natureza
interna ou nacional.
• Objetivo é evitar que a aplicação do DUE seja descurada ou
negligenciada
B. Princípio da Efetividade – estabelece que as regras adjetivas nacionais não
devem impossibilitar ou dificultar excessivamente a aplicação do DUE.
• Direito adjetivo nacional não pode ser de tal modo gravoso que na
prática torne impossível aplicar DUE
• Assegura que o DUE, pelo exercício de direitos de cidadãos europeus e
pela aplicação dos objetivos da UE pelos atos das instituições, seja
devidamente executado pelas autoridades nacionais dos Estados-
membros.
Pode haver conflito entre estes princípios.
TJUE inicialmente resolvia a tensão pendendo a favor do princípio da
equivalência.
Hoje em dia parece que esse princípio só pode ser invocado na
medida em que a aplicação do Direito Administrativo nacional
não dificulte ou impossibilite a aplicação do DUE.

183
Não há um CPA ou CPC europeu. O Direito processual português acaba por ser DUE.

120
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Princípio da Responsabilidade patrimonial dos Estados-membros por


violação do DUE
Art. 340º TFUE – reconhece o direito à indemnização quando o autor do dano é o decisor da
UE, cabendo ao TJUE o julgamento da respetiva ação.

Acórdão Francovich (19/11/1991)


Identificação de novo princípio geral de direito comunitário.
➢ O princípio da responsabilidade extracontratual do Estado por prejuízos causados aos
particulares por violação do DUE que lhe sejam imputáveis é inerente ao sistema do
Tratado.
o TJUE afirma que é inerente à lógica dos Tratados que se um Estado-membro
violar DUE e ofender direitos dos cidadãos causando-lhes prejuízo deve
responder por isso.

Responsabilidade do Estado-membro por violação da norma comunitária depende:


1. No que respeita às condições, da natureza da violação tal como caracterizada pelo TJUE
2. No que respeita à concretização do direito de indemnização, é no âmbito do direito
nacional de cada Estado-membro que incumbe ao Estado reparar as consequências do
prejuízo infligido – cabe à ordem jurídica interna designar os órgãos jurisdicionais
competentes e regulamentar as modalidades das ações judiciais destinadas à
assegurara a plena proteção do direito à reparação
➢ Só paralelamente é que esta responsabilidade extracontratual é contencioso da
UE, pois a ação é intentada junto dos Tribunais nacionais.184
Princípio da autonomia institucional e processual dos Estados-membros conhece
limitações:
• Princípio/Critério da Equivalência – condições materiais e formais fixadas pelas
diversas legislações nacionais em matéria de reparação de danos não podem
ser menos favoráveis do que as que dizem respeito a reclamações semelhantes
de natureza interna.
• Princípio/Critério da Efetividade – as condições materiais e formais não podem
estar organizadas de forma a tornar praticamente impossível ou
excessivamente difícil a obtenção de reparação.

Jurisprudência Francovich – só há lugar à responsabilidade quando:


• O resultado prescrito pela diretiva implica atribuição de direitos a favor de particulares;
• Conteúdo desses direitos identifica-se nas disposições relevantes da diretiva;
• Existe um nexo de causalidade entre a violação da obrigação que impende sobre o
Estado-membro e o prejuízo invocado pelo particular lesado.

Jurisprudência Francovich deixou algumas dúvidas – direito de reparação era apenas quanto à não
transposição de diretivas? Deveria haver exigência de violação grave e manifesta de DUE? Direito à reparação estaria
dependente da impossibilidade de invocar judicialmente a norma eurocomunitária violada por carecer de efeito
direto?

Acórdão Brasserie du Pêcheur/Factortame – garante que os Estados-membros são


obrigados a reparar os prejuízos invocados pelos particulares em virtude de violação do direito

184
Quando está em causa responsabilidade das instituições da UE, essa ação será feita no TJUE

121
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

comunitário que sejam imputáveis ao legislador nacional (podem demandar os Estados-


membros no caso de violação de normas dotadas de efeito direto). Só pode haver
responsabilidade nesses casos se:
• Regra de direito violada tinha por objeto conferir direitos aos particulares;
• Violação é suficientemente caracterizada – desrespeito grave e manifesto;
• Existe nexo de causalidade direto entre violação e prejuízo sofrido.

Aplica-se independentemente de qual o órgão da Administração que cometeu a violação – é o


Estado central que responde.

Também se aplica ao poder judicial?


Acórdão Köbler (30/9/2003)
Sim. Cumpre o requisito da “violação suficientemente caracterizada” se for violação da regra
de DUE por decisão imputável ao juiz nacional, em especial o que julga em última instância.
• Pode incluir a violação da obrigação de reenvio do art. 267º TFUE ou desconsideração
de jurisprudência assente do TJUE sobre a matéria – Acórdão Tomásová
• Pode incorrer em responsabilidade o Estado-juiz que viola o dever de interpretar e
aplicar a norma de DUE, omitindo o dever de garantir a sua aplicação no litígio concreto.

Acórdão Silva e Brito (9/9/2015)


STJ não colocou questão prejudicial obrigatória a TJUE
➢ Tribunal supremo está obrigado a suscitar uma questão prejudicial de interpretação
a propósito do sentido controvertido de um determinado conceito jurídico constante
de legislação eurocomunitária, sobre o qual existe jurisprudência divergente por parte
das instâncias jurisdicionais inferiores bem como a dificuldade de interpretação do
conceito noutros Estados-membros.

Querendo uma indemnização por violação da obrigação de reenvio, Portugal violou princípio da
efetividade ao não facilitar indemnização185.
➢ Por força do princípio do precedente atípico (aquilo que caracteriza a autoridade da
coisa interpretada pelos acórdãos proferidos a título prejudicial) desde o caso Silva e
Brito que os Tribunais portugueses estão impedidos de aplicar a exigência processual
do art. 13º/2 RRCEE (Lei 67/2007), sempre que esse fundamento é violação do DUE.

Danos causados aos particulares em virtude de uma violação do DUE, cometida por órgão jurisdicional
nacional que decide em última instância, obsta à aplicação de uma norma nacional que exige como
fundamento do pedido de indemnização contra o Estado a prévia revogação da decisão danosa? Acórdão
Silva e Brito equipara a sentença do TJ à revogação da decisão danosa quando se constata a violação da
obrigação de reenvio por parte do tribunal nacional, cujas decisões não são passíveis de recurso interno.
A tutela através da reparação financeira funcionará como medida compensatória para o lesado
que já não pode, no quadro das vias internas de recurso, obter uma revisão da decisão danosa.

185
Não há violação da autonomia judiciária pois o problema é o enquadramento legal em que o juiz atuou
(juiz atua mal porque legislador agiu mal).

122
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Contencioso da UE
Recurso de Anulação – art. 263º
Tribunal competente – Tribunal Geral (art. 256º + art. 51º ETJUE)
• Tribunal Geral é competente em 1ª instância para conhecer dos recursos de anulação.
o TJ só pode ser chamado em sede de recurso (limitado apenas às questões de
direito; TG decide definitivamente quanto à matéria de facto);
o Funciona como Tribunal Supremo e respeita-se o duplo grau de jurisdição (o que
não acontece sempre porque o TJ, em relação a certas vias processuais é a 1ª e
última instância186 – como na ação por incumprimento; e também nas questões
prejudiciais embora isso não seja contencioso; Estados escolheram isto porque há
uma dignidade equiparável ao facto de serem Estados soberanos na situação de
ser o TJ a julgar)

Prazo de impugnação – art. 263º


• 2 meses; na prática são 3 meses (prazo curto) – fora de prazo não é admissível, é
extemporâneo

Objeto do ato – São passíveis de impugnação todos os atos provenientes das instituições, órgãos
ou organismos da UE, seja com fundamento na sua forma (“atos legislativos”) ou com
fundamento nos seus efeitos (“atos destinados a produzir efeitos jurídicos”).
o Excluem-se os atos no âmbito da PESC, pelo art. 40º TUE
o Excluem-se também os atos impugnáveis ao decisor nacional, não se abrange o
controlo de legalidade do direito estadual.
• O acordo internacional não é suscetível de impugnação contenciosa junto do TJUE mas
o ato unilateral do Conselho de aprovação do acordo em nome da UE, à luz do art.
218º/6, é passível de constituir-se como objeto do recurso de anulação. Desde 1988 há
casos destes na jurisprudência.

Conteúdo do ato – deve ser um ato vinculativo, no sentido de ser apto a produzir efeitos
jurídicos que se projetam na esfera de terceiros.
• Acórdão AETR – forma, natureza e designação podem não ser, por si só, determinantes.
Deve atender-se ao conteúdo. Depende da sua aptidão para, por si, de modo auto-
suficiente, reconhecer e restringir direitos ou impor deveres.
• Atos puramente internos, cujos efeitos se esgotam na esfera interna da instituição,
órgão ou organismos que os adotou não podem ser impugnados. Mas as “guidelines”
que a Comissão aprova no âmbito da sua competência sobre auxílios de Estado, são
passíveis de invocação (Acórdão Dansk; Acórdão Gosselin)

Quem pode impugnar um ato187?


1. Recorrentes de legitimidade plena: Estados-membros, PE, Conselho e Comissão.
o Estão dispensados de demonstrar interesse em agir (têm um interesse objetivo)
2. Recorrentes de legitimidade condicionada: Tribunal de Contas, BCE e Comité das
Regiões.

186
Nos casos em que não estão em causa direitos dos particulares e sim direitos dos Estados
187
Tem de ser um ato (se for Omissão é pelo art. 265º) mas pode ser ato negativo (Comissão dizer que
não vai fazer algo é um ato, só no silêncio é omissão)

123
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

o Têm direito de recurso limitado pelo objetivo de salvaguardar as respetivas


prerrogativas.
3. Recorrentes ordinários: particulares
o Têm de fazer prova do interesse em agir simples (quando é destinatário do ato)
ou qualificado (não é formalmente destinatário do ato, mas ele diz-lhe direta e
individualmente respeito.) – tem de provar interesse subjetivo e objetivo.
i. Acórdão Plaumann – são requisitos cumulativos e se a decisão não diz
individualmente respeito ao recorrente, é inútil procurar saber se a
atinge de forma direta – em 1963 fixou-se o teste Plaumann na
verificação da afetação individual.
• Fórmula Plauman – só há afetação individual se o recorrente
provar que o ato o afeta em função de características que lhe
são próprias e o individualizam em relação aos demais188, e
assim os individualiza de maneira análoga à do destinatário.
• Tem que provar que é destinatário material do ato.
• Quanto à afetação direta, o ato impugnado tem de projetar os
seus efeitos na esfera jurídica do demandante e tais efeitos têm
de resultar diretamente do ato – há afetação direta sempre que
ato produz efeitos na esfera jurídica do recorrente sem
necessidade de atos de intermediação ou aplicação.
o Fundamentos do recurso estão no art. 263º/§2:
i. Incompetência – externa/absoluta (quando a UE não tem poderes
jurídicos de atuação sobre a matéria), interna/relativa (quando a UE
tem competência de decisão mas esta foi exercida pela instituição,
órgão ou organismo que não está habilitado para tal)
ii. Violação de formalidades essenciais – desconformidade com
exigências de forma e de procedimento que enquadram, de modo
vinculativo, a adoção do ato.
iii. Violação dos Tratados ou de qualquer norma jurídica relativa à sua
aplicação / Violação de lei – fundamento jurídico de ilegalidade ampla,
que é definido residualmente e pela negativa, existindo quando se
verifica uma ilegalidade insuscetível de qualificar como os outros.
iv. Desvio de poder – se o decisor exerceu os seus poderes para prosseguir
um fim diferente do previsto na norma de habilitação como
fundamento desses mesmos poderes que lhe são conferidos.

Fica de fora do controlo do TJUE as questões de oportunidade, mérito e conveniência do ato.

Consequência do ato recorrido não é a anulabilidade e sim a nulidade.


➢ Competência do TJUE é a da declaração de nulidade.

188
Muito difícil de provar que ato geral e abstrato, sem o deixar de ser, afeta um indivíduo com
características particulares que os individualizem. Muito raro TJUE admitir recurso de anulação quanto a
regulamentos, pelos particulares. Tratado de Lisboa na parte final do parágrafo 4, alterou o texto para se
admitir que particulares possam impugnar regulamentos sem medidas de aplicação que afetem
diretamente os particulares (mas só para atos regulamentares) – Estados e TJUE consideram que
particulares devem ser arredados do contencioso de atos legislativos; controlo da legalidade deve ser
feito através das medidas de execução

124
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Essa declaração de nulidade tem efeito inter partes e em relação a qualquer situação jurídica
futura, com um alcance geral – elimina, com efeitos ex tunc o ato em causa da ordem jurídica
da UE
➢ Ato deixa de existir, é como se nunca tivesse existido, retroage à data em que o ato
entrou em vigor.
➢ O acórdão deve ser executado pelo que as instituições devem tomar medidas para
eliminar os efeitos.

Ação por incumprimento – art. 258º, 259º, 260º


Tribunal Competente – Tribunal de Justiça
• Permite-se que o TJ aprecie situações imputáveis aos Estados que alegadamente são
contrárias ao DUE.189
• Não é controlo de legalidade porque não há hierarquia entre UE e Estados-membros. É
um controlo de compatibilidade.

As decisões dos representantes dos Estados-membros reunidos no seio do Conselho e outros


atos de natureza intergovernamental, como a celebração de convenções internacionais entre
Estados-membros não suscetíveis de invocação em sede de incumprimento imputável aos
Estados-membros.

Os princípios gerais de direito podem ser invocados nos casos de ação por incumprimento e
têm uma função paramétrica que foi expressamente reconhecida na jurisprudência Stauder e
no caso Internationale Handelsgesellschaft.

Tem que se tratar de uma obrigação (incumprida) cuja interpretação e tutela integram o
perímetro de jurisdição do TJUE.

O adquirido jurisprudencial ampara a qualificação a título de incumprimento de qualquer


comportamento, por ação ou por omissão, adotado por qualquer órgão interno ou instância
política de poder dum Estado-membro.
1. Violação por ação – adota legislação contrária ao DUE ou adota medidas opostas à que
a diretiva veicula (Acórdão Wallonie – durante o prazo de transposição os Estados-
membros devem abster-se de adotar disposições suscetíveis de comprometer
seriamente o resultado prescrito pela diretiva)
2. Violação por omissão – pode resultar da inércia legislativa como da inércia judicial,
incluindo ainda as práticas administrativas que consubstanciam uma abstenção
reiterada ou generalizada.
3. Violação por inobservância dos prazos de execução das obrigações – pode ser
declarado pelo TJ em relação a um Estado-membro que já adotou as medidas exigidas,
mas fazendo-o fora do prazo. Execução extemporânea das medidas é considerada

189
Incumprimento = não cumprimento por um Estado-membro de qualquer uma das obrigações
que lhe incumbem por força dos Tratados.
➢ Verifica-se sempre que haja violação de uma norma ou princípio de conteúdo
vinculativo, constante dos Tratados ou das regras adotadas pelo decisor da UE.

125
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

contrária à exigência de uniformidade na aplicação do DUE e ofensiva dos deveres de


solidariedade entre Estados-membros (Comissão c. Itália, 39/72)

A ação por incumprimento pode ser instaurada sem se atender à natureza e à importância da
infração.

No silêncio dos Tratados, considera-se que o representante do Estado-membros é o Governo

Qualquer Estado pode ser demandado pelo Comissão (258º) ou por outro Estado-membro
(259º).

Procedimento pré-contencioso
Comissão, no uso de poderes discricionários de apreciação, tendo na sua origem uma
informação obtida oficiosamente ou recolhida através de queixa, decide abrir esta fase com uma
carta de notificação de incumprimento (após tentar apurar junto do Estado-membro mais
informações satisfatórias e conclusivas)
• Deve adotar também um parecer fundamentado que contem uma descrição detalhada
da acusação e seus fundamentos, de facto e de direito.
• Ao Estado-membro notificado é dado um prazo para por em prática as medida
pressupostas pelo dever de conformação com o DUE.
• Comissão procura conduzir o Estado ao reconhecimento que está a violar DUE e a
adoção de medidas que terminem com essa violação – se o Estado-membro não adotar
medidas pode recorrer-se ao TJUE para declarar o incumprimento.

Se for um Estado-membro a acionar outro, tem de submeter a questão à apreciação da


Comissão e ambos são notificados para apresentar observações à Comissão.
• Comissão tem 3 meses para elaborar parecer fundamentado, no fim desse prazo o
Estado-membro denunciante pode avançar para o recurso judicial.
• Proferido o parecer, o Estado-membro denunciante pode seguir com a instauração da
ação por incumprimento ou não, seja qual for o conteúdo do parecer da Comissão (o
monopólio de determinação e consequente declaração do incumprimento é apenas do
TJUE).

Para depois ser admissível tem de haver uma boa tramitação da fase pré-contenciosa pela
Comissão.

Contencioso
São raras as hipóteses em que se afasta o veredicto de incumprimento – podem é ter alguma
razão se a Comissão alegar mais argumentos que não alegou na fase pré-contenciosa. É difícil
Estado defender-se da acusação.190
➢ Estado é absolvido mas por uma questão de forma.
o Comissão pode voltar atrás e de novo ir para Tribunal mas desta vez com todos
os argumentos.

190
Processo 101/84 – atentado em Itália que explodiu edifício com documentos, daí Itália não puder transpor. TJUE
diz que passados 7 anos o Estado já devia ter procurado saber se havia diretivas a transpor.
Muitos dos argumentos são irrelevantes.

126
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Imputação é sempre feita à pessoa coletiva Estado – embora o comportamento pode ser feito
a qualquer um dos seus órgãos.

TJUE tem um entendimento objetivo e sem a ideia da culpa.


➢ O incumprimento é verificado objetivamente.

Efeitos se se verificar declarado o incumprimento


Art. 260º/1 – Estado tem de acatar a decisão e adotar as medidas necessária (não se diz quais
são)
• Aplica-se prazo supletivo de prazo razoável (Comissão verifica esse prazo se não for
notificada das medidas).
Acórdão que declara verificado o incumprimento goza da autoridade de caso julgado: é
definitivo e obrigatório para o Estado-membro condenado.

Incumprimento qualificado – quanto há inexecução de um acórdão declarativo de


incumprimento. Viola art. 260º TFUE
• Leva a sanções pecuniárias apenas se a Comissão exercer essa iniciativa – art. 260º/3

O art. 260º/2 autoriza a aplicação de dois tipos de sanção pecuniária a pagar pelo Estado-
membro demandado em sede de incumprimento sobre incumprimento:
• Quantia fixa / lump sum – condenação a pagamento de multa, de montante fixo, sob a
modalidade de quantia fixa mínima. Sanciona o incumprimento consumado
• Sanção pecuniária compulsória ou periódica – soma variável, calculada por cada dia de
atraso ou outros períodos temporais. Função de persuadir o Estado-membro a por fim,
de forma rápida e completa, ao incumprimento.

127
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Direitos Fundamentais – uma “União de Direito”


Tratado explicita quais os valores fundamentais que sustentam a UE e que os Estados-membros
são obrigados a respeitar (art. 2º TUE)
➢ São equivalentes ao Estatuto do Conselho da Europa que tem 3 pilares axiomáticos:
democracia, direitos do Homem e Estado de Direito

Valores fundamentais da UE são aqueles agregados em torno do paradigma


axiológico do Estado de Direito.

Enquadramento jurídico: Fontes dos Direitos fundamentais


Art. 2º TUE + art. 6º TUE
UE está vinculada aos direitos fundamenais.
• Para se saber se a UE está ou não vinculada a um direito fundamental específico não
basta ver a CDFUE, temos também de ter em conta os princípios – na UE vigora um
princípio de atipicidade dos direitos e de cláusula aberta
o Bloco de Fundamentalidade = CDFUE191 + princípios gerais de Direito (aqueles
que resultam de disposições normativas que estão no DIP, nas Constituições dos
Estados-membros e na CEDH)

Evolução Histórica
Na versão originária dos Tratados não se falava de Direitos Fundamentais – de forma
intencional, pois evocava algo que era prerrogativa de soberania dos Estados.
• Não se achava necessário falar deles pois os 6 Estados-membros originários eram já
Estados de Direito – mas não seria redundante a positivação devido à exigência do
primado de DUE

Fase do Agnosticismo Valorativo


TJUE não negava a relevância dos Direitos fundamentais, mas não se julgava competente para
os aplicar.
• TJUE estava focado no desenvolvimento do princípio do primado e isso suscitou
preocupações junto dos Tribunais Constitucionais nacionais – jurisprudência e doutrina
ameaçavam por em causa o primado do DUE se não fossem reconhecidos Direitos
Fundamentais

Fase do Reconhecimento Jurisprudencial dos Direitos Fundamentais


No Acórdão Stauder, TJUE acolheu sugestão de Advogado-geral e implementa o Método dos
Princípios Gerais
• Admitiu-se que os Direitos Fundamentais das Constituições dos Estados-membros e das
convenções internacionais que os vinculam, também vinculavam a UE, como expressão
de princípios gerais de Direito.192
• TJUE vincula-se pelo dever de aplicar estes Direitos Fundamentais.

191
Que contém muitas disposições iguais às da CEDH, embora contenha mais disposições, como as
relativas à cidadania da UE
192
Princípios gerais fazem parte da lógica do sistema do ordenamento jurídico. Fazem parte do direito
material e não necessitam de estar escritos, ex: responsabilidade extracontratual dos Estados.

128
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

A partir dos anos 70 que Comissão (e depois PE) queriam positivar estes direitos para dar
certeza e segurança jurídica aos cidadãos.
• Várias propostas para se criar texto sobre Direitos Fundamentais – resistência por
preconceito político, uma vez que se ligam Direitos Fundamentais à existência de uma
Constituição e dum Estado, o que não acontecia na UE (não era uma federação e queria
afastar-se esse conceito de federalismo das Comunidades Europeias)

Só em 2000 surge um catálogo de Direitos Fundamentais.


• Reino Unido e Dinamarca participaram na formação dessa Carta mas depois não a
queriam aplicar juridicamente.
• Solução foi a proclamação conjunta dos presidentes das instituições UE.
o Até 2009 era mera diretriz de interpretação e estava num “limbo jurídico” –
situação ultrapassada com o Tratado de Lisboa e introdução do art. 6º TUE
conferindo à CDFUE o mesmo valor jurídico dos Tratados

Na matéria de direitos fundamentais há realidade pluri-normativa em que os direitos provêm


de várias fontes.

Método Judicial de Proteção dos Direitos Fundamentais


Típico de uma “União de Direito”

CDFUE
Carta dividida em várias partes para abranger os diversos direitos, de forma a que se constitua
um catálogo completo de fundamentalidade.

CDFUE tem um âmbito de aplicação apenas no domínio da competência exclusiva da UE.


Não há obrigatoriedade de aplicar a CDFUE nos outros domínios.
Relembrado no Protocolo 30.

Elementos debilitadores da CDFUE:


1. Protocolo 30 – garante ao Reino Unido e à Polónia (posteriormente à República Checa)
a desobrigação de reconhecer e aplicar a Carta.
➢ Protocolo tem um valor simbólico e político e não tanto jurídico, pois a maior
parte da CDFUE são princípios ou disposições patentes na CEDH, a que esses
Estados estão vinculados193
2. Redação condicionada das disposições e com remissões para as legislações nacionais
– resulta numa proteção sem conteúdo e que acaba por não dar garantias. Ex: art. 30º
CDFUE remete para a lei nacional pelo que não protege efetivamente os trabalhadores
3. Não se aplica a todas as situações em que o Direito Fundamental é invocado – art. 51º
(e 52º) só pode ser invocado num Tribunal Nacional ou no TJUE quanto ao decisor
nacional ou quanto à UE se estiver em causa uma situação em que se aplica DUE.
➢ Só se aplica em matérias que sejam da competência da UE.

193193
MLD: Direitos Fundamentais não entram nessas ordens jurídicas pela porta principal, mas entram
na mesma

129
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Tratado de Lisboa preocupou-se com os Direitos Fundamentais também com o objetivo de levar
UE a aderir à CEDH
• 1ª tentativa em 1994 – TJUE foi questionado se UE teria competência para aderir. No
Parecer 2/94 o TJUE diz que não, pois os Tratados não o preveem.

Com o Tratado de Lisboa, art. 6º/2 TUE estatui que a UE tem o dever de aderir194.
• Parecer 2/13 – TJUE já não pode invocar a incompetência da UE, pois já há uma base
jurídica; invoca agora o art. 344º TFUE (monopólio de jurisdição do TJUE) dizendo que
adesão da UE à CEDH iria desfigurar a especificidade da ordem jurídica da UE, pois em
matéria de Direitos Fundamentais haveria outro tribunal a julgar em última instância,
com critérios diversos daqueles do TJUE (num espaço geográfico diferente e com
relações diferente).

MLD: critica quanto à utilidade desta adesão.


• Já há triângulo jurisdicional europeu que garante Direitos Fundamentais aos cidadãos.
o Já se pode questionar no TEDH questões que o TJUE apreciou como questões
prejudiciais.
o No TEDH podem demandar-se todos os Estados, pois eles é que respondem pela
estrutura política que criaram (a UE).
▪ Não se compreende os receios do TJUE

Método Político de Proteção dos Direitos Fundamentais


Hoje em dia a prioridade é garantir que os Direitos Fundamentais são respeitados nos próprios Estados-
membros.

Art. 7º TUE
Introduzido com o Tratado de Amsterdão e depois aperfeiçoado.
Com a constatação de violação do art. 2º - que é necessário para a aplicação do art. 7º - por um
Estado-membro, que viola Direitos Fundamentais dá-se aso a existirem Sanções Políticas
➢ Sendo a mais grave a suspensão do direito de voto no Conselho

Para que hajam sanções políticas é preciso uma declaração do Conselho Europeu, que exige a
unanimidade.
➢ O que não funciona, pois há aliados do Estado infrator que vetam.

Comissão Europeia, em 2014, anunciou um “Mecanismo de Enquadramento do Estado de


Direito”
➢ Propunha um novo mecanismo que entra em ação antes do art. 7º e funciona em 3
fases: Constatação, Recomendação, Acompanhamento dos Estados visados.
o Este mecanismo só funciona se houver uma cooperação leal dos Estados.

Grande fragilidade dos mecanismos de controlo político.

MLD: art. 7º TUE é uma entorse ao Estado de Direito pois não intervém o TJUE e o Estado-
membro visado não tem hipótese jurídica de se defender.

194
MLD: sendo essa uma obrigação de resultados

130
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

➢ O Estado-membro destinatário das sanções políticas não pode contestar a legalidade


das decisões do Conselho Europeu e do Conselho por razões de legalidade substantiva,
mas pode impugnar essas decisões por violação de requisitos procedimentais.

Cidadania da UE
No caso da CEDH, os beneficiários dos Direitos fundamentais são todas as pessoas e o art. 1º
reporta-se aos cidadãos do Estado em causa, mas também a todos os outros cidadãos de países
terceiros sob jurisdição desse Estado195.
➢ Direitos do Homem têm como destinatários todas as pessoas e não só os cidadãos dos
Estados.

Mesma regra se aplica na UE.


CDFUE – art. 15º, 19º, 20º - aplica-se a todos.
➢ Mas CDFUE tem capítulo dedicado à cidadania (art. 39º e ss.) – direitos cuja
titularidade só é reconhecida a cidadãos da UE.

Inspirado nas disposições dos Tratados (art. 20º-25º TFUE).


• Art. 20º TFUE – define o que é ser cidadão da UE e quais os direitos associados a esse
estatuto; vínculo jurídico que liga o indivíduo à associação de Estados (UE)196
o É cidadão da UE quem for cidadão de um Estado-membro e essa cidadania
acresce à do Estado-membro, não a substitui.197
o Cidadania ainda é competência reservada dos Estados e a atribuição de
cidadania é prerrogativa de soberania dos Estados e são eles que definem nos
termos das suas constituições.
o São os Estados no seu conjunto que definem quem é cidadão da UE (daí que
essas matérias estejam nos Tratados198).

O direito de recurso aos Tribunais da UE não é só para cidadãos da UE e pode ser para cidadãos
de outro Estado, tendo igualmente os mesmos direitos e exercendo-os nas mesmas condições.

195
Discussão na doutrina e jurisprudência se abrangeria pessoas ilegais.
196
Elemento novo, pois cidadania liga indivíduo a um Estado e é esse Estado que define as condições de
se ser cidadão. Aqui não há Estado e sim associações de Estados
197
UE não pode atribuir a sua cidadania a refugiados e/ou apátridas. Primeiro estão os Estados.
198
Com Brexit os Europeus que lá vivem ficam sujeitos às leis dos Estrangeiros e não a direito comunitário
de permanência (que é o que existe atualmente e está previsto nos Tratados).

131
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Competência da UE
UE é entidade jurídica de fins amplos e de poderes limitados.

Princípio da Especialidade – art. 5º/2 TUE


UE não dispõe de competência geral e goza apenas da competências que, pelos Tratados, lhe
foram atribuídas.
➢ Competência de atribuição
➢ Competências da UE são atribuídas pelos Estados-membros numa lógica de integração
de soberanias típicas do método comunitário

As atribuições e fins podem aplicar-se a qualquer área de ação jurídica.


➢ Expandiu-se no sentido de ocupar todo o espaço normativo, mas isto na medida que os
Tratados o permitam.

É uma entidade com poderes sob justificação – só pode fazer aquilo que o Estatuto jurídico
permitir; embora possam haver gradações diferentes (competência exclusiva, partilhada,
coordenada e etc.)
• É necessário que a UE, ao legislar, invoque sempre norma de habilitação, a base
jurídica.
• Se não for competente para tal, a norma não prevalece – DUE prevalece na medida que
é Direito materialmente competente, na medida em que é respeitada a delimitação
de competências entre UE e Estados-membros.

Competências comunitárias têm beneficiado de uma constante expansão graças à utilização do


art. 352º TFUE
• Norma expressa sobre poderes implícitos: permite à UE assumir poderes, com o objetivo
de aprofundar o mercado interno, que não estão previstos no Tratados, mas que são
necessários para prosseguir objetivos do mesmo.
o Expressão do princípio contratualista pois exige a unanimidade no seio do
Conselho.

Outra forma de estender competências é através da Teoria dos Poderes Implícitos199 – é a


jurisprudência que faz essa extrapolação.

Tratado de Lisboa pretendeu ordenar sistema eurocomunitário de competências que era difuso,
complexo e descosido (construído ao longo dos anos pela jurisprudência do TJUE).
• Art. 2º-6º TFUE – matérias em relação à competência; suporte do sistema
eurocomunitário de competências.
• Art. 5º TUE – disposição pivot com os 3 princípios basilares do sistema de competências
da UE, a que qualquer órgão da UE está sujeito. Princípios que respondem a questões
fundamentais: como se tem competência? Quem tem a competência? Como deve
exercer a competência?

199
Entendimento não rígido da legalidade da competência – UE pode invocar tais poderes para prosseguir
os seus objetivos, porque são faculdades abrangidas nos poderes explícitos ou poderes conexos novos

132
Sebenta DUE – DNB 2016/2017

Princípio da Subsidiariedade – art. 5º/3 TUE


Responde à pergunta “quem tem competência?”

Surge, como princípio essencial, estabelecendo o critério da repartição de competências entre


os diferentes níveis de poder na UE.
• Apenas se aplica nas competências partilhadas.
• A violação deste princípio pode ser impugnada judicialmente (não dá é resultados)

Princípio da Proporcionalidade – art. 5º/4 TUE


Responde à pergunta “como deve ser exercida a competência?”

O conteúdo e formas de ação da UE não devem exceder o necessário para alcançar os objetivos
dos Tratados.
• Legislação comunitária (no caso de competência exclusiva ou comunitária) não pode ir
além daquilo que é considerado equilibrado. Ex típico: se for possível emitir diretiva,
deve fazê-lo em vez de regulamento.

TJUE tem uma interpretação pró-integracionista mas não pode ultrapassar os limites do que é
justificável em termos de hermenêutica jurídica, sob pena de os Tribunais nacionais não a
seguirem por ter um grande ativismo e com uma intromissão ultra vires.

133

Você também pode gostar