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O social em questão

“Classe, Status e Partido” de Weber então não é simplesmente um argumento sobre a estratificação
social, como a maioria dos comentaristas secundários insistem (em particular, Brennan, 1997), mas mas
sim uma análise das interdependencias estruturais e distribuições de poder entre as esferas
econômicas, sociais e políticas. Esta análise, acima de tudo, questiona o que significaria o conceito
basico de o social, e além disso o que é estratificação social ao invés de econômica ou política.

O principal movimento metodológico feito por Weber é analisar grupos de status e partidos em termos
de diferentes tipos de relações sociais. Esse ênfase na relação indica que, para Weber, o social não é
totalmente limitado (como na forma de “sociedade” ou “nação-Estado”) mas sim um processo de
socialização que envolve trocas recíprocas e significativas entre grupos e indivíduos. Isto, por vez,
permite que Wever demarque o conceito de classe (como não-social) daquele de status
(comunitariamente social) e partido (instrumentalmente social), para o anterior é dito que refere-se a
uma situação econômica em vez de uma relação, e enquanto relações de classe podem emergir destas
situações isto "não é de forma alguma um fenômeno universal" (Weber, 1978: 929)

A vista disso, a tendência recente de descartar Weber de debates contemporâneos por conta de sua
conflação de social e sociedade, ou o que Beck (2000) chama de “nacionalismo metodológico”, é
infundado. Este criticismo baseia-se no argumento de que Weber não só tem uma “definição territorial
da sociedade moderna” mas que também vê a nação-estado como o “contetor da sociedade” (Beck,
2000: 24). Em sua palestra "A Política como Vocação", Weber de fato declara que “o estado é uma
comunidade humana que (com sucesso) reivindica o monopólio do uso legítimo da força física dentro de
um determinado território. Note que “território” é uma das características do estado (1970: 78). No
entanto, esta afirmação da conexão entre o poder do Estado e "território", é algo bem diferente de dizer
que o social está contido na sociedade, que, por vez, está contido dentro de limites territoriais da nação-
estado. Em vez disso, o que é diferente e revigorante na abordagem de Weber é que enquanto o
processo geral de racionalização é visto como colocando as comunidades políticas tradicionais cada vez
mais sob o controle de um estado legal-racional (burocrático), ao mesmo tempo é argumentado que os
poderes da comunidade política não estão simplesmente contidos dentro dos limites de uma nação ou
estado. Weber diz, por exemplo, que das três principais divisões de poder dentro de uma comunidade
política – classe, status e partido – que

o fato de pressuporem uma associação maior, especialmente no âmbito de uma política, não
significa que estejam confinados a ela. Pelo contrário, em todos os momentos tem sido a ordem
do dia que tal associação (mesmo quando visa o uso de força militar em comum) alcance além
dos limites do estado (1978: 939)

Seria, portanto, errado igualar o social ou mesmo o político em Weber simplesmente com “sociedade”
ou a nação-estado, pois, na verdade, o contrário é verdadeiro: ambos excedem, em vez de serem
definidos por seus supostos "contetores". Consequentemente, o que achamos nas obras de Weber é um
conjunto de relações sociais comunais e associativas que não podem ser agrupado sob o termo
“sociedade”, e que vai além de limites estaduais. E enquanto é possível que uma relação social seja
fechada em base no interesse ou na identidade nacional, Weber nunca começa a partir desta posição.
Em vez disso, seu esboço de relações sociais abertas e fechadas procede em termos que nunca são
redutíveis a um conceito mais geral de “sociedade” e, assim, pode ser facilmente aplicado à analise de
ações sociais transnacionais ou globais, ou relações que cruzam os limites do estado hoje.
De acordo com isso, uma tipologia básica de mudança social também pode ser extraída de “Classe,
Status e Partido” e ligada com os argumentos mais amplos de Weber sobre a racionalização e
desencantamento contemporâneo do mundo. “Classe, Status e Partido”, por exemplo, pode ser visto
abordando a racionalização e desencantamento do mundo em termos de mudanças gerais da ação
social tradicional e com racional com relação a valores, para formas instrumentalmente racionais de
atividades e organizações sociais e, por extensão, uma mudança de relações sociais comunitárias para
associativas. Bryan Turner (1988: 17-41), um dos poucos comentaristas que reconheceram isto, aborda
esta história do desenvolvimento em termos de mudanças de “Status para Contrato”. A característica
básica desta transição é o fortalecimento de formas sociais associativas, junto da predominância da
racionalidade instrumental em todos os âmbitos da vida. A ilustração mais clara disso vem das escritas
de Weber sobre burocracia monocrática, na qual relações sociais são predominantemente associativas e
instrumentalmente racionais em orientação e estrutura. Mas, como Weber aconselha, deve haver
cuidado em aplicar esta lógica linear aos estudos de relações sociais de grupos de status e partidos
como um todo. Isto é porque partidos, enquanto se tornam cada vez mais instrumentais em relação a
valores, não substituem grupos de status em competição pelo poder. Grupos de status continuam a
existir como o frágil mas encantado outro de estruturas associativas. Isto pode até mesmo ser visto no
caso de relações sociais que surgem de práticas de consumo, que, para Weber, são predominantemente
em forma comunal. George Ritzer (1999), por exemplo, sugere que “os meios de consumo” só podem
sobreviver se eles continuarem a possuir qualidades mágicas ou encantadoras. O argumento básico aqui
é que o consumo nunca pode ser transformado em uma prática ou esfera completamente “racional”, e,
consequentemente, relações sociais comunais nunca são totalmente substituídos por formas
associativas instrumentais. Em outras palavras, o processo de racionalização, enquanto faz um violento
ataque à tradição, é incapaz de atingir um ponto de conclusão, e como consequência, a tensão entre
relações sociais e estruturas comunais (status) e associativas (partidos), para Weber, provavelmente
permanecerá sem solução.

Conclusão

Considerando o exposto acima, haveriam bons motivos para reler Weber como um teórico social, e para
observar minuciosamente a conceituação do social deste, ao invés de começar com uma ideia de
estratificação social, que pressupõe em vez de explicar o que significa pelo termo “social”. Na face do
contínuo declínio da teoria Marxista (a qual tende a tratar o social como emergindo das relações de
produção, deste modo unido social à classe), seria um momento oportuno para reconsiderar o
argumento básico de “Classe, Status e Partido”, pois este texto define tanto classe social e em termos
radicalmente não-Marxistas e não-sociais. Contudo, estranhamente, dentro dos círculos Weberianos e
da sociologia Mainstream/dominante, há pouco reconhecimento ou desenvolvimento da definição de
classe como não social de Weber, ou de sua ideia de que a socialização comunal ocorre através do
consumo. Geralmente, enquanto houveram tentativas isoladas e desenvolver definições alternativas do
social pelo trabalho de Durkheim (por exemplo, Maffesoli, 1996), poucos voltaram-se para Weber na
pergunta básica de o social (apesar de verem ele como um teórico social). Em resposta a esta lacuna,
partes de “Economia e Sociedade” de Weber, e talvez até mesmo outros seus textos, poderiam ser
usados para iniciar novos métodos da teoria social ainda não explorados completamente. Qualquer
tentativa de repensar o social hoje, especialmente sobre a luz dos processos globalizadores
contemporâneos, sem dúvida requer a criação de novas abordagens, métodos e conceitos. Mas, ao
mesmo tempo, antigos recursos teóricos que continuam negligenciados poderiam também serem
utilizados. É o argumento do artigo presente que as escrituras de Max Weber em particular que eles
abordando classe status e partido e as relações sociais em geral, são alguns destes recursos.

Notas

1. Houveram, é claro, muitas tentativas de utilizar o conceito de ação social abordado por Weber
no Capítulo 1 de Economia e Sociedade, enquanto ao mesmo tempo debates intensos e
discussões ocorreram devido sua declaração que a ação só é social se é significativa de alguma
maneira. Mas houveram poucas, ou se quer alguma, tentativas de ir além dos princípios
metodológicos básicos de Weber para mostrar como o conceito do social é operacionalizado nos
últimos capítulos de Economía e Sociedade. Mais especificamente, pouca atenção tem sido dada
à maneira na qual Wrber demarca a ordem social das outras ordens politicas e econômicas. Isto,
em minha visão, é o principal objetivo de seu texto “Classe, Status e Partido”
2. Brennan acredita que “Classe, Status e Partido” tem origem mais tardia: “A data exata deste
ensaio é incerto. Mas sem dúvidas deriva do período entre 1915 e 1919, isto é, cerca de cinco
anos antes da morte de Weber em 1920” (Brennan, 1997: 2). Roth, em sua introdução de
Economía e Sociedade, no entanto, apresenta um olhar diferente, e argumenta que a Parte Dois
de seu trabalho (que inclui a seção “Classe Status e Partido) foi escrita (mesmo que apenas em
forma de esboço) entre 1910 e 1914, enquanto a Parte Um foi escrita “anos depois” (ver Roth,
1978: lxv). Em outro lugar, Roth (1978: c) afirma que a única seção da Parte Dois de Weber
revisada após 1918 foi a abordando burocracia. Para uma visão geral da estrutura de Economía
e Sociedade, ver Baier et al. (2000), mas mesmo aqui a relação trabalhada entre “Status, Grupos
e Classes” (1978: 302-7) e “A distribuição de Poder Dentro da Comunidade Política” (1978: 926-
39) está longe de clara.
3. Por esta razão eu argumentaria que Brennan (1997: 2) está errada em sua observação que esta
obra simplesmente redefine e extende os argumentos anteriored de “Classe, Status e Partido”.
O que é de interesse aqui é a troca nessas duas partes da análise da classe para a de classe
social. Como foi dito, Weber define classe social como “a classe social é a totalidade daquelas
situações de classe entre as quais uma mudança individual e na sucessão das gerações ocorre
facilmente e tipicamente “ (1978: 302). Neste sentido, classe social poderia ser lida como a
totalidade de situações que não são verdadeiramente sociais em si (por exemplo, não são
relações sociais), mas isto é meramente advinhação considerando que o texto desta parte de
Economia e Sociedade está longe de completo.
4. Bryan Turner é uma exceção à regra. Em seu livro sobre Status, ele observa com razão:

Por comparação com classe econômica, grupos de status são característicamente coletividades
sociais de natureza comunal que requer a reprodução de um estilo de vida típico e de herança
cultural. Por contraste, classes econômicas são meramente agregação de individuos ligados pela
troca ou outras relações econômicas. (1988: 7)

Turner, no entanto, considera apenas brevemente “Classe, Status e Partido “ no curso de sua
introdução geral em teorias clássicas de estratificação social, e falha em perseguir esta distinção
entre o social (status) e o não-social (classe) em qualquer detalhe. Isto leva ele, por vez, a
negligenciar o significado do termo social na explicação de Weber sobre a estratificação social
(Turnee, 1988: 26-9), que diz lidar com “três dimensões separadas, isto é classe, status e poder”
(1988: 27). Consequentemente, Turner volta atrás em sua posição prévia (junto com a tirada por
Weber) por tratar classe posteriormente como uma forma do social ao invés de uma estratificação
econômica.

5. Eu gostaria de agradecer Sam Whimster por seu conselho na tradução destes dois termos
6. Esta situação é ainda mais confusa quando o termo Verband é traduzido como grupo ao invés
de associação (ver, por exemplo, Aron, 1964: 101). Cuidado é necessário, pois o termo “grupo”
significa “comunidade” en algumas traduções enquanto em outras significa associação, com o
contraste entre estes dois conceitos perdidos em ambos os casos.
7. Isto pode ser entendido como parte do argumento de Weber sobre a rotinização da autoridade
carismática. No assunto de partidos controlados por líderes carismáticos Weber diz:
Quase todos os partidos originam-se de seguidores carismáticos de pretendentes legítimos ou
cesaristas, de demagogos no estilo de Péricles, Cleon ou Lassalle. Se os partidos se
desenvolverem em organizações rotineiras permanentes, eles geralmente são transformados
em estruturas controladas por honoratiores. (1978: 1130)
Mas na política moderna, particularmente após a Revolução Francesa, Weber observa que
partidos assumem uma forma burocrática crescente, então que “nas últimas décadas do Século
19 . . . Organizações burocráticas ganham vantagem em todos os lugares” (1978: 1131). Weber
resume o resultado deste processo a seguir:
A oscilação entre subordinação para carisma e obediência para honoratiores foi sucedido pela
luta da organização burocrática com liderança carismática. Quanto mais a burocratização avança
e mais substanciais se tornam os interesses em benefícios e outras oportunidades, mais
certamente a organização partidária cai nas mãos de especialistas, quer estes apareçam
imediatamente como oficiais partidários ou primeiramente como empreendedores
independentes. (1978: 1131)
Isto não quer dizer que lideranças carismáticas desaparecem sem vestígios com o
desenvolvimento de partidos modernos, como o próprio Weber adverte contra colocar formas
de dominações carismáticas, tradicionais e legal-racional como “uma linha evolutiva simples”
(1978: 1133), mas que partidos tornam-se cada vez mais legal-racional (ou burocráticas) em
orientação de valores e estrutura (e assim tornam-se caracterizados por relações sociais
associativas em vez de comunais).
8. Interessantemente, não há referência explícita a “o cultural” aqui. Faria sentido ver grupos de
status como formas sociais que coalescem por afiliação com conjuntos específicos de valores
culturais em vez de como resultado da situação de mercado. Esta interdependencia e interação
entre as esferas social, cultural e econômica, entretanto, são complexas e não podem ser
discutidas em qualquer comprimento aqui.
9. Este ponto chave é ausente da literatura Marx-Webee, incluindo Löwith (1993), Sayee (1991), e
Dahms (1997)

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