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Apropriação
Fernanda Pequeno
Esse legado foi tamanho que, nos anos 1950, Robert Rauschenberg
realizou suas Combine paintings, que são assemblages realizadas pelo acúmulo
de diversos materiais de diferentes procedências. Enquanto isso, seus colegas
da Pop Art, desejando estabelecer uma comunicação direta com o público,
utilizaram elementos retirados diretamente da cultura de massa e da vida
cotidiana. Para tal, se apropriaram usualmente de imagens da publicidade e
do mundo comercial, como fez Andy Warhol, e de histórias em quadrinhos,
como fez Liechtenstein.
No Brasil, Hélio Oiticica desenvolveu sua Mesa de bilhar, d’après O café
noturno de Van Gogh em 1966 e a apresentou na mostra Opinião 66, no Museu
de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Além do referido ambiente, o artista
carioca utilizou o princípio da apropriação em seus bólides, caracterizados
por ele como transobjetos: objetos e materiais de uso cotidiano – cubas de
vidro, bacias, garrafas, latas, luminárias, caixas d’água – deslocados para o
campo da arte. Ainda no país, o mecanismo foi largamente aplicado por
Nelson Leirner, Farnese de Andrade e outros.
Ao enviar seu ready-made para a Exposição dos Independentes (Nova
Iorque, 1917), embora Marcel Duchamp não esperasse a aceitação do
mictório como obra e desejasse polemizar, não poderia prever o amplo alcance
que sua manobra alcançaria. Dessa maneira, não foi em vão que os editores
da revista October lançaram o livro O efeito Duchamp (Buskirk e Nixon,
1996),1 nem que o teórico Thierry De Duve (1989) indagou, anteriormente,
sobre as ressonâncias do ready-made. Assim, as modificações causadas pelo
procedimento da apropriação foram extremamente profundas, já que essa,
enquanto operação artística, coloca indagações quanto à originalidade, à
autenticidade e à autoria da obra de arte, questionando, a um só tempo, a
instituição-arte e a própria dificuldade enfrentada na tentativa de definição
do que viria a ser a própria arte.
Referências
BUSKIRK, Martha e NIXON, Mignon. The Duchamp effect. Cambridge: MIT Press,
1996.
DE DUVE, Thierry. Resonances du readymade. Nîmes: Jacqueline Chambon, 1989.
WOLLHEIM, Richard. A pintura como arte. São Paulo: CosacNaify, 2002.
1
O livro foi editado na tentativa de mapear o legado de Marcel Duchamp e sua recepção por
parte dos artistas a partir dos anos 1950. Incluindo ensaios e entrevistas de Benjamin Buchloh,
Hal Foster e outros, investiga, inclusive, o efeito Duchamp na arte conceitual.