Você está na página 1de 146

www.apostilas2010.

com

ECONOMIA E
SOCIOLOGIA DO
TRABALHO

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

-2-

Capitulo I
A Oferta de Trabalho
Em última instância, o tratamento que a teoria neoclássica outorga à quantidade de trabalho que os
indivíduos ou famílias oferecem no mercado é uma adaptação ou aplicação da Teoria do Consumidor ao caso
específico de um determinado aspecto do mercado de trabalho (a oferta de trabalho) 1/. Lembremos que, na
Teoria do Consumidor, o problema central gira em torno da escolha de uma cesta de bens que maximize a
utilidade de um indivíduo (o consumidor) respeitando sua restrição orçamentária. Observemos que essa restrição
é fixa,
está dada, é exógena. Nesse contexto, a partir da especificação de uma função de utilidade, os preços relativos
dos bens e o orçamento, todo o problema do consumidor consiste na escolha de uma cesta de consumo que
atinja a utilidade máxima sem ultrapassar o orçamento. Assim, não é incluída nenhuma variável que contemple a
possibilidade do indivíduo alterar essa restrição orçamentária.Contudo, um indivíduo pode (ainda que nem
sempre) alterar essa restrição. Supondo que tenha rendas oriundas de outras fontes que não seja o trabalho
(capital, por exemplo), o indivíduo pode trabalhar ou não, ou, talvez, possa optar por trabalhar mais ou menos.
Devemos perceber que, nesse contexto, a maximização da utilidade de um indivíduo pode ser mais
abrangente e complexa. Ele pode alterar a demanda de consumo modificando a quantidade de serviços
produtivos que ele oferece no mercado. Dessa forma, demanda de consumo e oferta de trabalho podem estar
vinculadas em um mesmo processo de maximização. Em outros termos: o indivíduo pode, no mesmo processo
de maximização, determinar o nível de consumo e a oferta de trabalho. Implicitamente, a teoria ensinada nos
livros-texto usuais de microeconomia supõe que a oferta de trabalho pelo indivíduo é fixa 2/.
Sofisticar a análise implica em supor que o indivíduo pode obter utilidade a partir do consumo ou da
venda desses recursos. O consumo ou venda desses recursos pode ser hoje ou no tempo. Tomemos o caso do
trabalho. Um indivíduo pode alterar a restrição orçamentária oferecendo mais ou menos trabalho hoje, para dispor
de mais tempo para atividades vinculadas ao lazer, ou decidir não trabalhar hoje, não para desfrutar de mais
ócio, senão para estudar e oferecer trabalho mais qualificado no futuro.
Neste capítulo nos restringiremos a estudar, desde a perspectiva neoclássica, o problema da escolha
entre trabalho e ócio. Em outros termos: a participação ou não no mercado de trabalho e a quantidade de
trabalho oferecido a cada nível de salário real. Nesse estudo da oferta de trabalho não serão incluídas as
dimensões das escolhas intertemporais (como as decisões referentes à escolaridade), cuja análise deixaremos
para um próximo Capítulo 3/. Dado esse objetivo, estruturaremos este Capítulo da seguinte forma. Na próxima
Seção detalharemos as características da função objetivo, a restrição, o processo de maximização e o equilíbrio.
Veremos que a escola neoclássica não consegue atingir generalizações sobre a resposta da oferta de trabalho a
variações do salário real, estando mergulhada em uma indeterminação teórica. A seguir, na
Seção II, nos deteremos em aspectos vinculados com esse marco geral, que sofisticam a análise (atividades
domésticas, oferta de trabalho da família, modelos de procura de emprego, etc.) sem, contudo, reverter essa
indeterminação teórica. Na Seção III desenvolveremos os pontos frágeis e vulnerabilidades desse marco teórico.
Por último, na Seção IV finalizaremos o Capítulo realizando um balanço final dos tópicos abordados ao longo do
mesmo.
I.Função Objetivo, Restrição e o Processo de Maximização.
A análise da oferta de trabalho foi desenvolvida paralelamente aos primeiros fundamentos teóricos da
escola neoclássica. A moderna análise das decisões de participação no mercado de trabalho se encontra na
obra de Jevons 4/. Antes deste autor, a oferta de trabalho, ou seja, a quantidade de trabalho disponível em cada
momento do tempo em uma sociedade, estava dada por fatores demográficos (crescimento da população) e, no
curto prazo, poderia ser considerada fixa. As inter-relações entre essa oferta e variáveis econômicas estavam
mediadas pela teoria malthusiana, que especificava mais tendências de longo prazo que de curto prazo. Para
Malthus, a variação da população era determinada pelos salários de subsistência e tendia a crescer quando
estes se elevavam acima desse nível, gerando penúrias e, assim, inaugurando um ciclo contrário, de queda do
contingente populacional.
Com a consolidação da escola neoclássica, essa perspectiva de análise muda. Nas obras de Jevons,
Knight e, especialmente, Hicks, a modernaabordagem, hoje comumente apresentada nos livro-texto, se
consolida 5/.
Como já afirmamos, a dedução da curva de oferta é uma adaptação, com certas particularidades, da
Teoria do Consumidor no caso específico do mercado de trabalho. A função objetivo a ser maximizada é a

Page 1 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

-3-
utilidade, sendo que seus argumentos são o consumo (ou, os bens e serviços consumidos) e o lazer.
Formalmente temos que:
U = U ( Q; L) (1)
Onde: U = Utilidade; Q= uma cesta de bens e serviços consumidos e L = Lazer e U Q> 0 e U L > 0. Ou
seja, quando aumenta (cai) o consumo ou o lazer eleva-se (reduz-se) a utilidade. Paralelamente, como na
análise microeconômica corriqueira, as utilidades marginais do consumo e lazer são decrescentes. Assim,
quando se incrementa o consumo ou o lazer aumenta a utilidade (primeira derivada positiva) mas esse
incremento é cada vez menor (segunda derivada negativa). Formalmente, temos que U QQ< 0 e U LL < 0. Dados
esses supostos, vamos nos deter um pouco na análise dos argumentos da função de utilidade 6/.
Observamos que, até agora, a variável “trabalho” não foi incluída nos argumentos. A utilidade do indivíduo
advém do consumo de bens e serviços e do lazer. O conjunto de bens e serviços é representado pela variável Q
e deve ser entendida como a cesta ou conjunto de bens e serviços que o indivíduo ou família consomem. Para
simplificar a álgebra, estamos considerando essa cesta ou conjunto de bens composto por um único bem o
serviço 7/. Este argumento (a utilidade como dependente do consumo de bens e serviços) é um tema
amplamente tratado nos cursos usuais de Microeconomia (Teoria do Consumidor).
O aspecto que nós devemos analisar, já que é uma particularidade da Teoria do Consumidor aplicada ao
mercado de trabalho, é: como o consumidor tem acesso a esses bens? Justamente, a compra dessa cesta só é
possível porque o indivíduo possui renda que é produto, exclusivo, de seu trabalho. Assim, podemos desenvolver
a argumentação da seguinte forma. O indivíduo é “dono” de um estoque de horas ou tempo que potencialmente
pode ser utilizado para trabalhar. Esse indivíduo poderia “ficar na sua casa” e essa atitude (oupassividade)
apresentaria um impacto positivo sobre seu nível de utilidade. Em outros termos, “não fazer nada” é uma fonte de
utilidade ou bem-estar. Alternativamente, o indivíduo pode oferecer seu tempo às firmas, fato que reduz sua
utilidade (tem menos tempo para consumir como lazer) mas, como essa oferta de trabalho é remunerada, ele
pode comprar bens e serviços, e o consumo desses últimos apresenta um impacto positivo sobre a utilidade.
Desde essa ótica, a oferta de trabalho no mercado é só um meio através do qual esse “agente” (o indivíduo ou a
família) atinge um outro resultado (consumo) que, como o lazer,tem impacto positivo sobre a utilidade. Vários
são os desdobramentos, na maioria das vezes implícitos, desse tipo de abordagem.
Em primeiro lugar, observamos que é denominado de “lazer” toda atividade que não seja trabalho
mercantil. Nesse contexto, o tempo despendido em atividade domésticas (fazer a comida, limpar a casa, etc.),
por exemplo, que não é trabalho mercantil, é considerado lazer e, portanto, tem um impacto positivo sobre o
nível de bem-estar do indivíduo 8/.
Em segundo lugar, o trabalho (mercantil, no sentido que é uma tarefa pela qual o indivíduo é pago)
apresenta, implicitamente, um impacto negativo sobre a utilidade. O agente só trabalha porque, a partir dessa
atividade, pode consumir, fato que acrescenta utilidade. Em realidade, o salário é o preço que o indivíduo cobra
por abrir mão do “lazer”, ou seja, é o preço do trabalho mercantil. Essa abordagem teórica, que identifica o
trabalho como uma fonte de “desprazer”,contradiz toda uma outra perspectiva, que identifica o trabalho como a
principal fonte de realização ou socialização do indivíduo 9/.
Por último, devemos mencionar que esse “trade-off” ou escolha entre lazer e consumo, pode estar
encobrindo, em realidade, uma certa escolha ou preferência entre bens semelhantes. Por exemplo, o indivíduo
pode estar vendendo seu tempo para comprar certos bens e serviços que poderia obter permanecendo no seu
domicílio (ou seja, não trabalhando fora de casa) 10/.
Dadas essas considerações, o próximo passo consiste em determinar o contexto no qual é realizada
essa maximização, ou seja, os parâmetros e as restrições que o indivíduo ou família enfrenta.
O primeiro fator a ser considerado é uma restrição, que está
vinculada ao tempo que um indivíduo dispõe, que é fixo. Suponhamos que a nossa análise tenha como referência
o dia e, mais especificamente, as horas de um dia. Neste caso, o nosso agente só pode determinar a
distribuição do tempo entre lazer e trabalho limitado pelas horas do dia (24). Assim, a nossa primeira restrição
poderia ser formalizada da seguinte forma:
24 = H T + H L (2)
onde: H T = horas dedicadas ao trabalho por dia e H L = horas de lazer (ou não trabalho mercantil) por dia 11/.
Por outra parte, o consumo depende do nível de renda (rendimentos que surgem da venda de horas no
mercado de trabalho). Se supomos, para simplificar a análise, que o indivíduo não poupa nem pode contrair
dívidas, temos que essa restrição pode ser formalizada da seguinte forma:
P Q = Y = w H T (3)
onde: P = preço da cesta de consumo; Q = cesta de consumo; Y = rendimentos e w = salários por horas
(exógeno).
Acompanhando os supostos que definem uma situação de concorrência perfeita, consideramos que o

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

-4-
poder de mercado do indivíduo ou a família é negligenciável. Dessa forma, o salário de mercado é exógeno
(independe da oferta de trabalho do indivíduo ou da família). Da mesma forma, o preço dessa cesta de bens é
exógena (independe das decisões de compra do indivíduo ou da família).
A partir da equação (3) podemos deduzir que:
HT = (PQ)/ w (4)
Se substituímos essa expressão em (2), temos que
24 = (PQ)/w + H L (5)
Dessa forma, estamos sintetizando em só uma igualdade as restrições (2) (restrição de tempo) e (3)
(restrição de orçamento, o indivíduo só pode consumir o que ganha a partir da venda de horas no mercado de
trabalho).
Assim, o nosso problema de maximização pode ser expresso da seguinte forma:
Max U = U ( Q; H L) (6)
s.a. 24 = (PQ)/w + H L
Os argumentos desse programa de maximização com restrição são Q (consumo) e horas de lazer (H L).
Ele não tem poder de determinar o preço da cesta de consumo (P) nem de influenciar os preços de seu trabalho
(salário). Devemos perceber que, em realidade, ele está fazendo a escolha entre horas de lazer e horas de
trabalho, dado que o consumo (Q) está determinado pelas horas de trabalho vezes o salário. Como este último é
exógeno, o agente fará, em última instância, a distribuição de seu tempo entre lazer e trabalho.
A partir de (6) podemos construir a função de Lagrange:
= U ( Q; H L) - ë { (PQ)/w + H L – 24 } (7)
onde ë é o multiplicador de Lagrange.
As condições de primeira ordem são as derivadas de com respeito a Q e H L mais a restrição:
Q = U Q – ë (P/w) = 0 (8)
HL = U HL – ë = 0 (9)
24 = (PQ)/w + H L (10)
De (8) e (9) temos que:
w U HL
----- = ------ (11)
P UQ
ou, alternativamente,
UQ U HL
----- = ------ (12)
P w
Analisemos, primeiro, esta última expressão. Podemos estabelecer um paralelo entre a igualdade (12) e
a condição de equilíbrio do consumidor 12/.
Lembremos que esta nos diz que, para maximizar sua utilidade, o consumidor tem que se situar em um ponto
no qual as relações entre as utilidades marginais de cada bem com respeito a seu preço devem ser iguais.
Nesse sentido, a igualdade (12) é uma situação particular desse resultado geral. Com efeito, o lado esquerdo é o
cociente entre a utilidade marginal do consumo (U Q) e seu preço (P). No lado direito, a relação entre a utilidade
marginal das horas de lazer e seu “preço”. Devemos perceber que o “preço” do lazer é o salário. Ou seja, qual é
o custo de oportunidade (o que o indivíduo ou a família deixa de ganhar) por ficar fora do mercado de trabalho
(não trabalhar)? É, justamente, o salário. Assim, w (o salário) pode ser interpretado como o preço (custo) que o
indivíduo ou a família paga pelo lazer. Dessa forma, a expressão (12) é a condição de equilíbrio tradicional, isto
é: quando um agente maximiza a utilidade sujeito a uma restrição, no ponto de equilíbrio as relações entre as
utilidades marginais das variáveis a serem escolhidas no processo de maximização e seus respectivos preços
têm que ser iguais.
Estudaremos, agora, a igualdade (11). Observemos que (w/P), o lado direito dessa expressão, não é
outra coisa que o salário real. O lado direito é a relação entre as utilidades marginais do lazer com respeito ao
consumo, ou seja, a taxa marginal de substituição. A igualdade entre (w/P) e a taxa marginal de substituição
nos diz, como na teoria do consumidor, a relação entre os preços relativos dos bens (w preço do lazer e P preço
da cesta) deve ser igual à relação entre as utilidades marginais.
Contudo, devemos avançar na análise, dado que o nosso objetivo é, em última instância, deduzir a curva
de oferta de trabalho. Em outros termos: como o indivíduo ou a família modificarão a distribuição de horas de
trabalho e lazer diante de mudanças no salário real ?
Para iniciar a análise, podemos imaginar que se produz um aumento do salário real. Essa elevação é,
em realidade, um crescimento no preço do lazer (aumenta o custo de ficar em casa). Essa mudança nos preços
relativos gera, como na análise microeconômica tradicional, um efeito-substituição e um efeito-renda. Devido ao

Page 3 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

-5-
efeito substituição, o nosso agente tenderá a consumir mais do outro bem (cesta de bens), ou seja, o agente
que está maximizando tenderá a substituir o bem que agora está mais caro (o lazer) pelo outro (a cesta), que
agora está, relativamente, mais barato. Nesse sentido, ele tenderá a oferecer mais trabalho ou, sob outra ótica, a
reduzir as horas de lazer. Mas, por outro lado, esse indivíduo ou família receberá mais renda pelas horas
trabalhadas. Esse fato induz a aumentar a demanda por lazer, se supomos que este é um bem normal.
Podemos concluir, assim, que temos esses dois efeitos trabalhando, cada um, em direções opostas. Por um
lado um crescimento do salário tende a elevar a oferta de trabalho (reduzir as horas de lazer) mas, por outra
parte, essa mesma elevação induz um aumento na demanda de lazer.
O resultado líquido é, assim, indeterminado. Essa conclusão é importante. Não se pode estabelecer, a
priori, qual será o impacto de uma mudança no salário real sobre a oferta de trabalho. Existe uma
indeterminação teórica sobre esse aspecto. A curva de oferta de trabalho tanto pode ser vertical (os dois efeito
se compensam), crescente (o efeito-substituição é superior ao efeito-renda) ou decrescente (o efeito-substituição
é inferior ao efeito-renda). Abordemos esses aspectos de uma forma mais analítica. No programa de
maximização da expressão (6), a restrição pode ser reescrita da seguinte forma:
24 (w) = (P * Q) + (H L * w) (13)
De (11) ou (12) e (10), podemos expressar a demanda de tempo de lazer (H L) como uma função do
salário real (w/P) e da quantidade consumida (Q). Só que a quantidade consumida é função do salário real.
Para continuar a análise, vamos introduzir, com certas adaptações, a famosa Equação de Slutzky no
estudo da oferta de trabalho. Lembremos que a Equação de Slutzky nos permite perceber que, diante de
variações no preço, as alterações na demanda de um bem podem ser analiticamente separadas em dois efeitos
Efeito-substituição e Efeito-renda. Formalmente, essa equação pode ser descrita da seguinte forma 13/:
??x / ??p = ¦??x / ??p¦ u = cte – x ??x / ??y (14)
onde: x = quantidade do bem x demandada ; p = preço do bem x; u = cte = utilidade constante; y = renda.
Muito sinteticamente, a lógica dessa equação pode ser expressa nos seguintes termos. Quando o preço
de um bem cai (e supondo que os outros permaneçam constantes), a demanda por esse bem deve subir. Esse
aumento é conseqüência de um efeito-substituição (substitui o consumo dos outros bens, agora relativamente
mais caros, por aquele agora mais barato), que gera uma elevação na quantidade demandada. Por outra parte,
como o preço caiu, e supondo que a renda nominal permaneceu constante, esse indivíduo esta mais “rico”, pode
comprar mais bens. Assumindo que esse bem é normal (a demanda aumenta quando a renda se eleva), a
demanda aumenta quando o preço cai, uma vez que gerou uma elevação na renda real do consumidor. O
efeito-substituição pode ser auferido supondo que a utilidade é constante (situando-se na mesma curva de
indiferença que antes da mudança do preço), mas mudando a inclinação da restrição orçamentária (devido à
alteração nos preços relativos). Como o preço ficou relativamente mais barato e a demanda aumentou, o termo ??
x / ??p u = cte
é sempre negativo. Por outra parte, supondo um bem normal, como a demanda aumenta quando a renda
aumenta, o termo ??x / ??y é positivo e, assim, a expressão – x ??x / ??y é sempre negativa. Concluindo, ??x / ??p < 0
como corolário dos sinais do efeito-renda e do efeito-substituição.
Apliquemos esse marco analítico geral para o caso da oferta de trabalho. Em última instância, o que
estamos estudando é a demanda de lazer que surge como resíduo entre o total de horas disponíveis e as horas
de trabalho. Podemos centrar a discussão em termos de horas de lazer, dado que variação do salário real é a
variação do preço do lazer. O único problema consiste em identificar como muda a renda quando se altera o
salário real. Ou seja, como determinar a variável y na Equação de Slutzky. Podemos formalizar esse problema
sob duas perspectivas.
A primeira consiste em supor que as horas de lazer potenciais aumentaram. Isto parece muito irreal,
mas é justificável analiticamente. Vejamos. Suponhamos que, descontadas 8 horas diárias biologicamente
necessárias para dormir e 2 horas para fazer tarefas domésticas, locomoção, etc. , dispomos de 14 horas para
dedicar ao trabalho mercantil ou ao lazer. Imaginemos que o salário factível de ser ganho no mercado por esse
indivíduo seja de R$ 1 por hora. Ele poderia trabalhar 14 horas e ganhar R$ 14, ou ficar na sua casa, não ganhar
nada mas desfrutar de 14 horas diárias de ócio. Assumamos que, dada uma função de utilidade, no processo de
maximização a escolha desse indivíduo seja de 6 horas por dia de trabalho, ganhando R$ 6, e dispor de 8 horas
para dedicar ao ócio (Ponto A no Gráfico 1). Essa combinação maximiza sua utilidade até que a situação mude,
porque o salário passa para R$ 2. Agora o consumidor está diante da seguinte alternativa: continuar trabalhando
6 horas e, na nova situação, ganhar R$ 12 ou mudar sua combinação de trabalho (consumo)-ócio. Porém, em
realidade, os novos limites são: trabalhar 14 horas por dia e ganhar R$ 28 ou ficar em casa e desfrutar de 14
horas de ócio. Imaginemos, sempre acompanhando o Gráfico 1, que o novo ponto de equilíbrio seja B, onde a
nova combinação que maximiza a utilidade seja 8.5 horas de ócio e um rendimento de R$ 11 ( R$ 2 vezes 5.5
horas). Como distinguir o efeito-renda do efeito-substituição? O efeito substituição surge de deslocar a nova
restrição (14 horas de lazer e R$ 28 de salário) até o ponto que tangencia a antiga curva de indiferença. Em

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

-6-
outros termos, conservando a inclinação da nova restrição, encontrar o ponto de tangência com U1.
Suponhamos que esse novo ponto de tangência possa ser representado por C, no Gráfico. O deslocamento de A
para C seria o efeito substituição, onde o indivíduo ficaria com menos horas para o ócio (que está mais caro
porque o salário aumentou) e mais consumo. Suponhamos que os limites da nova restrição (em realidade,
hipotética restrição, dado que só foi construída para diferenciar o efeito renda do efeito-substituição) sejam 10
horas de ócio e R$ 18. O efeito-renda se obtém deslocando essa hipotética restrição até tangenciar com a curva
da indiferença U2, fato que ocorrerá no ponto B. Observemos que esse efeito-renda pode ser interpretado como
dar ao indivíduo 2 horas mais de ócio (de 12 para 14 horas). Em outros termos, como o salário aumentou, uma
das formas de quantificar a influência desse aumento na utilidade, na forma de alocação do tempo entre trabalho
e lazer e diferenciar efeito-renda de efeito-substituição, consiste em supor que o indivíduo tem um hipotético
acréscimo nas suas horas
potenciais de ócio.
Nesse contexto, podemos formalizar a Equação de Slutzky da seguinte forma:
??HT / ??(w/p) = ¦??x / ??(w/p) ¦ u = cte + H T ??HT/ ??HL (15)
onde: ??HL = o incremento (ou variação) nas horas de lazer, (w/p) o salário real e H T a quantidade de trabalho
(horas trabalhadas).
Nessa expressão, o sinal do termo ??HT/ ??(w/p) é sempre positivo (cai a demanda de ócio (aumentam as
horas trabalhadas) devido ao aumento do salário real ou vice-versa). Temos que ter cuidado com o sinal do
segundo termo do segundo membro. Na utilização usual da Equação de Slutzky, esse sinal é negativo, visto que
quedas no preço provocam incrementos na renda (como em (14)) 14/. No caso da oferta de trabalho, o sinal é
positivo haja visto que o incremento no salário real (preço do lazer) provoca um incremento na renda. Explicada a
mudança de sinal com respeito à Equação de Slutzky usual, vam os, agora, analisar o sinal de ??HT / ??HL. A
variação H L, quando o salário real aumenta, em realidade representa um deslocamento da restrição para a direita
(como no exemplo que desenvolvemos no Gráfico ). Se o ócio é um bem normal, um crescimento da renda real
deve redundar em um incremento na sua demanda, ou, sob outra perspectiva, em uma queda na horas
dedicadas ao trabalho. Assim, ??HT / ??HL, quando o lazer é um bem normal, deve ter um sinal negativo.
Nessas circunstâncias, temos que o impacto do salário real sobre as horas trabalhadas é ambíguo. Tanto pode
ser positivo como negativo ou neutro. Depende de qual efeito prevaleça. Se o Efeito-substituição prevalece sobre
o Efeito-renda, a inclinação da oferta de trabalho será positiva. Se ambos os efeitos se compensam (são da
mesma magnitude), a oferta de trabalho será insensível às mudanças no salário real. Por último, se o
Efeito-renda prevalece, a oferta de trabalho terá inclinação negativa (quedas da oferta de trabalho diante de
elevações no salário real).
A segunda possibilidade de abordar os problemas vinculados ao Efeito substituição, Efeito-renda e a
inclinação da oferta de trabalho consiste em introduzir na análise a renda potencial. Definamos essa renda
potencial como o produto do salário vigente no mercado (salário por hora de trabalho) e a quantidade de horas
totais que o indivíduo dispõe para oferecer. Formalmente temos que:
R=w*H (16)
Onde: R = Renda Potencial; H = total de horas que o indivíduo ou família pode oferecer no mercado e w = salário
por hora 15/.
Para fins didáticos e visando tornar o desenvolvimento do argumento mais claro, podemos expressar a
oferta de trabalho em termos de demanda de lazer. Em outros termos: dada a quantidade de horas disponíveis
para alocar ao trabalho e/ou lazer, o total de horas trabalhadas é o resíduo do total de horas menos a quantidade
de horas dedicadas ao ócio. Dessa forma, temos que:
HL = F(w/p, R) (17)
A partir daí é fácil concluir que Ä P = - X / Ä Y. Trabalhando em termos infinitesimais e
substituindo essa expressão na fórmula anterior se obtém a Equação de Slustsky, com o sinal
negativo no segundo termo do segundo membro.
Ou seja, as horas dedicadas ao lazer são uma função F do salário real e da renda potencial. Como o
total de horas disponíveis é fixo, a renda real potencial depende do salário real. Dessa forma, podemos derivar F
totalmente com respeito a w/p:
d H L / d (w/p) = dF/ (d w/p) + (d F/ d R) [d R / d(w/p)] (18)
O primeiro termo do segundo membro ( dF/ (d w/p) ) expressa o impacto de uma mudança no total de
horas alocado ao ócio (ou demanda de lazer) quando o preço (salário real) desse bem (ócio) muda. Aqui nos
encontramos diante de um clássico Efeito-substituição: se o salário real aumenta, a quantidade de horas
alocadas ao lazer deve cair porque o ócio está mais caro. Assim, o primeiro termo do segundo membro terá,
sempre, um sinal negativo. Por outra parte, sempre na hipótese de uma elevação no salário real, o valor real
(poder de compra) de sua renda potencial se eleva d R / (w/p) > 0, na hipótese de o ócio ser um bem

Page 5 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

-7-
normal, sua demanda crescerá (d f/ d R ) >0. Dessa forma, o segundo termo do segundo membro será, se o
lazer for um bem normal, positivo. Considerando que o primeiro termo do segundo membro é negativo e o
segundo termo positivo, o sinal de d H L / d (w/p) fica indefinido.
Se por um lado temos que a inclinação da oferta de trabalho é, em termos teóricos, indeterminada,
podemos imaginar que a mesma tenha diferentes inclinações diante de diferentes níveis de salário real.
Assim, em intervalos de salários reais baixos, a tendência da oferta de trabalho é elevar-se diante de
aumentos nos mesmos (Efeito-Substituição supera o Efeito-Renda). A partir de um certo momento (salário real
w/p* no Gráfico 2) elevações nos salários reais redundam em quedas na oferta de trabalho 16/. Um exemplo
relativamente simples que permite ilustrar essa situação refere-se às negociações dos sindicatos de
trabalhadores em certos países desenvolvidos. Em muitos deles, as barganhas, que antes estavam centradas
nos salários reais, agora têm como eixo a redução da jornada de trabalho. Ou seja, trabalhadores que já têm um
consumo padrão relativamente elevado (alimentação, moradia, assistência médica, etc.) reivindicam mais tempo
livre, necessário até para concretizar ou desfrutar o maior poder de compra. Em países como o Brasil, de menor
desenvolvimento relativo, as negociações continuam tendo como referência os salários reais 17/.
II.Temas Vinculados
II.1. Salário de Reserva: conceito e políticas sociais (combate à pobreza, renda mínima, seguro-desemprego).
Imaginemos que a curva de oferta tenha uma inclinação positiva, ou seja, que quanto maior seja o salário
de mercado maior será a oferta de trabalho. Nesse caso, podemos supor que temos um nível de salário real
mínimo abaixo do qual o indivíduo não participa do mercado de trabalho. Esse salário mínimo a partir do qual o
indivíduo participa do mercado de trabalho se denomina de Salário de Reserva.
O ponto que devemos agora analisar consiste em determinar os fatores que influenciam esse Salário de
Reserva.
A primeira variável que devemos mencionar é, obviamente, como o indivíduo valora o lazer e o consumo.
Em outros termos, dado o salário que ele pode obter no mercado, a função de utilidade será o fator que
determine sua participação ou não no mercado de trabalho.
Outra variável que pode estar influenciando a integração ou não de um indivíduo na força de trabalho são
as rendas oriundas de outras fontes que não o trabalho. Até agora não introduzimos essa variável para que o
desenvolvimento dos argumentos seja mais simples e os principais resultados mais transparentes. Entretanto,
podemos dividir a renda potencial de um indivíduo entre as rendas não-salariais e as provenientes do salário. Em
princípio, é factível supor que, quanto maior o montante das rendas não-salariais maior será o salário de reserva,
ou seja, o patamar mínimo de salário a partir do qual o indivíduo participa do mercado de trabalho.
Esta relação é importante porque pode ultrapassar os limites das puras discussões acadêmicas ou
teóricas e pode balizar a formulação de políticas públicas. Vamos ilustrar essa possibilidade através de um
exemplo. Em termos de combate à pobreza, nos últimos anos temos assistido, tanto no Brasil como no restante
do mundo, a um debate sobre a implementação de um programa de garantia de renda mínima 18/. O mesmo
consistiria em uma transferência de renda para as famílias ou indivíduos situados abaixo de um determinado
patamar de renda, para levar a todo cidadão a um nível mínimo de bem-estar material. Esse tipo de estratégia
para combater a pobreza recebeu um apoio que permeava a quase totalidade do leque de correntes
político/ideológicas. Para aqueles mais identificados com o liberalismo ou, em termos econômicos, com a
corrente neoclássica, esse tipo de programa era bem visto, dado que não interferia na regulação da atividade
econômica através dos mercados 19/. Em outros termos, o combate à pobreza estaria centrado em uma
transferência de renda sem fazer apelo a instrumentos, tipo salário mínimo, que interferem nessa regulação.
Contudo, um dos maiores temores que inspira um programa de garantia de renda mínima consiste, justamente,
inclusive entre aqueles que defendem esse tipo de política, nos potenciais desdobramentos negativos sobre o
incentivo ao trabalho. Imaginemos, exclusivamente para ilustrar o problema, que um indivíduo só pense em
ingressar no mercado de trabalho se o salário que ele poderia receber fosse de R$ 150. Se o salário potencial for
de, por exemplo, R$ 120, essa pessoa preferirá ficar na sua casa. Suponhamos que o governo estabelece uma
renda mínima de R$ 200. Nesse caso, o salário de reserva poderá elevar-se, visto que ele teria uma garantia de
uma renda de R$ 200, independentemente de trabalhar ou não.
Poderíamos desenvolver uma argumento similar para o caso do seguro-desemprego. Na ausência dele,
um desocupado teria mais “incentivos” para aceitar as oportunidades de emprego disponíveis. Na presença de
uma garantia de renda, como o seguro-desemprego, esse desocupado seria mais “seletivo” na hora de avaliar
uma possibilidade de emprego. Esse fato elevaria a taxa de desemprego, já que os desocupados poderiam ficar
nessa situação por um período mais prolongado, tendo em vista que os indivíduos nessa situação teriam uma
renda que, paradoxalmente, advém dessa situação. Suponhamos um caso extremo. Um indivíduo recebe uma
renda (seguro-desemprego) de R$ 100, à qual só tem direito devido a sua situação (desocupado). Suponhamos
que ele encontre um emprego no qual o salário é de R$ 100. Como o ócio ou lazer proporciona utilidade e o
trabalho só é aceito dado que viabiliza, através do salário, oconsumo, esse indivíduo não aceitará essa oferta de

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

-8-
emprego e permanecerá na situação de desemprego.
A lógica que esboçamos no parágrafo anterior sustenta toda um raciocínio, cujas raízes estão no
pensamento econômico neoclássico, que desenvolveu uma perspectiva muito crítica com respeito a benefícios
como o seguro-desemprego, dado que, em última instância, esses programas sociais teriam como corolário uma
elevação na taxa de desemprego. Em geral, para essa escola, quanto maiores forem as rendas não oriundas do
trabalho e garantidas pelo Estado,menores serão os incentivos a participar do mercado de trabalho 20/.
II.2. Oferta de Trabalho Agregada
Observemos que, até agora, apresentamos a oferta individual de trabalho.Nos livros corriqueiros de
microeconomia, a passagem entre os resultados para um indivíduo e os agregados de mercado parece simples e
é apresentada como a soma das ofertas individuais.
Essa passagem, porém, não é tão simples. Com efeito, como a inclinação da curva de oferta está
indeterminada em termos teóricos, parte dos indivíduos pode apresentar uma resposta positiva diante de uma
elevação dos salários, outra parte negativa e outra neutra. Nessas circunstâncias, como saber como será a
curva de oferta agregada ?
Por outro lado, além dos Efeitos Substituição e Renda, quando estamos analisando o oferta agregada
devemos levar em consideração os diferentes salários de reserva. Quando introduzimos na análise essa variável,
introduzimos um fator que tende a elevar a oferta de trabalho na medida em que o salário aumenta, já que, em
princípio, quanto maior o salário maior será a quantidade de pessoas dispostas a trabalhar. Porém, continuamos
com a indeterminação teórica, pois nada garante que esse efeito seja superior aos originados a partir dos Efeitos
Substituição e Renda tradicionais.
Assim, chegamos à conclusão que a sensibi lidade da oferta de trabalho agregada às variações no
salário real deve ser motivo de pesquisa empírica. A relação entre a oferta de trabalho e o salário muda de país a
país e, dentro de cada economia, pode sofrer alterações no tempo. Dessa forma, a relação funcional entre essas
duas variáveis está datada no tempo e no espaço,impossibilitando generalizações.
Todavia, não unicamente variáveis como a escolha entre consumo e lazer ou o salário de reserva
intervém como determinantes da oferta de trabalho. Outras variáveis mais complexas podem estar influenciando
a quantidade de pessoas que em cada momento se encontram no mercado de trabalho. Para ilustrar essa
complexidade vamos mencionar unicamente três variáveis, ainda que a lista possa ser muito maior.
Não obstante ser de importância em períodos de tempo mais longos, não sendo determinante na análise
conjuntural ou de curtíssimo prazo, a cultura pode ser um dos fatores que influenciam a oferta de trabalho. A
modernização das sociedades tem como desdobramento maior participação da mulher no mercado de trabalho.
Esse fato pode afetar a oferta de trabalhadores e gerar diversos problemas de política pública. As elevadas taxas
de desemprego que vigoram nos países do sul da Europa a partir dos anos 80 é, muitas vezes, atribuída à rápida
modernização dessas sociedades após a queda dos regimes ditatoriais (Portugal, Espanha e Grécia) que
produziu uma abrupta elevação na participação da mulher no mercado de trabalho.
Uma segunda variável que afeta a oferta de trabalho, da mesma forma que a cultura, mais no longo prazo
que no curto prazo, está vinculada à demografia. Em geral, a participação no mercado de trabalho tende a ser
menor nas faixas de idade limites (baixas e elevadas). Uma queda na taxa de fecundidade, hoje, gerará, no
futuro, uma redução no número de indivíduos que ingressaram no mercado de trabalho. Por outra parte, uma
elevação na esperança de vida vai redundar, também no futuro, em uma maior importância de indivíduos inativos
(que não mais participam da força de trabalho de um país).
Podemos finalizar os exemplos mencionando uma variável ligada à escolaridade. Se por algum motivo a
formação escolar das novas gerações se eleva (o tempo que passam no sistema educativo aumenta), o número
de indivíduos que participa do mercado de trabalho pode alterar-se. Logicamente, só mencionamos esses três
fatores a título de ilustração, a fim de evidenciar que uma análise empírica, datada no tempo e no espaço, é
insubstituível para especificar uma função de oferta de trabalho agregada e, assim, contornar a indeterminação
teórica sobre o assunto.
II.3. Os Modelos de Procura de Emprego 21/
A partir dos anos 60, mas sobretudo na década de 70, a economia neoclássica passou por um processo
que poderíamos denominar de revolução interna, ao desenvolver e incorporar em seu arcabouço teórico variáveis
relacionadas com a informação. Esse avanço ou sofisticação nessa escola de pensamento permeou todas as
áreas de especialização, sobretudo, ainda que não exclusivamente, a microeconomia 22/. Os campos de
aplicação foram os mais diversos, desde a área financeira até os modelos vinculados ao mercado de trabalho.
Nesta Seção nos limitaremos a estudar como esse desenvolvimento teórico deu origem a uma nova
geração de modelos na área da oferta de trabalho 23/.
Antes de apresentar os argumentos desta perspectiva, devemos perceber que, nos modelos
microeconômicos mais tradicionais, assume-se, na maioria das vezes implicitamente, que existe informação
perfeita e que esta é livre (não tem custo). Essa hipótese de total transparência é muito restritiva e levantá-la

Page 7 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

-9-
introduz uma certa dose de realismo.
Com efeito, a informação não é livre, requer tempo para acumulá-la, tem custo e nunca é completa,
sempre vai persistir uma certa dose de incerteza 24/. Esse fato foi explorado em um primeiro artigo nos anos 60
por Stilger (“Information in the Labor Market”, no Journal of Political Economy de outubro de 1962), que pode ser
considerado o marco inicial deste tipo de perspectiva 25/. Basicamente, o argumento consiste em supor que o
indivíduo que procura emprego não está diante de um mundo com informação perfeita. Contrariamente, ele
enfrenta uma série de oportunidades de emprego que não esgotam o universo de alternativas, fato a partir do qual
podemos deduzir que procurando mais ele poderia encontrar
vagas mais interessantes 26/. Contudo, essa procura envolve custos. Assim, em cada momento do tempo o
indivíduo precisa tomar decisões, que têm benefícios e custos. Se ele aceita a oportunidade de trabalho
disponível, ele ganha os benefícios vinculados a esse posto de trabalho (salário) e poupa os custos de continuar
com sua atividade de procura. Os custos de procura são de várias ordens (compra de jornais, transporte até o
lugar no qual a vaga é oferecida, etc.), incluso, logicamente, o custo de oportunidade (ou seja, o salário que
deixa de ganhar por continuar com sua atividade de procura). Como o leitor já pode imaginar, o ponto no qual ele
maximiza sua atividade de procura é aquele no qual o custo marginal de continuar com a atividade de procura se
torna igual aos ganhos marginais que ele pode obter se continuar nessa atividade.
Vários são os desdobramentos desse tipo de modelos. Vamos mencionar três.
Imaginemos que o desemprego possa ser associado a um investimento, onde, a cada momento, se
avaliam os custos e os benefícios de permanecer nessa situação. Desde essa perspectiva, o desempregado é
voluntário, ou seja, está nessa situação porque “quer”, porque é vantajoso continuar acumulando informação.
Justamente, aqui está uma das limitações deste tipo de modelo. Se esta perspectiva teórica tem como vocação
explicar o desemprego, em realidade chega à conclusão que ele não é um problema sério, já que os
desocupados estão em uma atividade (de procura e avaliação) e, sobretudo, estão nessa situação porque, a
partir de uma comparação custo/benefício, acham conveniente permanecer desocupados. Dessa forma, esta
perspectiva teórica não é útil para explicar situações nas quais os desempregados estão nessa condição porque
não existem postos de trabalho suficientes. Em outros termos, não explica o desemprego involuntário 27/.
Um segundo desdobramento está vinculado com o salário de reserva que já estudamos. A partir deste
modelo podemos ter outra perspectiva desse conceito. Unemployement and the Phillips Curve”, American
Economic Review, Vol. 60, 1970) são de leitura obrigatória para os interessados nesta perspectiva de análise.
Frente a cada vaga encontrada, o indivíduo avalia se prossegue na sua atividade de procura, a fim de encontrar
salários mais elevados, ou pára e aceita o salário da vaga disponível porque imagina que os custos de continuar
a procura são superiores aos ganhos. Justamente, esse salário a partir do qual o indivíduo decide parar na sua
atividade de procura pode ser definido como salário de reserva 28/.
Por último, podemos mencionar um terceiro desdobramento deste tipo de modelos, mas agora
associado à estratégia do próprio desempregado. Como a informação incompleta ou imperfeita permeia tanto a
oferta de trabalho (os indivíduos) como a demanda (as firmas que tentam contratar assalariados), o trabalhador
tentará enviar “sinais” de sua potencial produtividade às firmas. Diante da incapacidade por parte dos
empregadores de conhecer essa potencial produtividade de cada trabalhador (informação imperfeita), as firmas
podem escolher certos “sinais” ou indicadores que reduzam essa incerteza. Parte desses indicadores não estão
sob controle do indivíduo que oferece seu trabalho no mercado (raça, sexo, idade, etc.), mas outros sim. O
indivíduo, por exemplo, pode elevar seu nível de escolaridade se supõe que os anos de estudo sejam tomados
pela firma como um indicador de potencial produtividade e, assim, ser um dos critérios utilizados para fazer a
triagem entre os candidatos 29/.
Como já mencionamos, não obstante certa popularidade na literatura especializada em mercado de
trabalho, a principal limitação destes modelos está vinculada a sua incapacidade de explicar situações de
desemprego elevado por períodos prolongados.
Não obstante serem úteis para abordar certas singularidades do mercado de trabalho, quando o tema é analisar
o desemprego, que seria uma das principais vocações deste tipo de abordagem, sua transcendência fica muito
restrita. Na maioria das situações, os desocupados
poderiam ser classificados de voluntários. Por outra parte, teríamos os desocupados que não participam do
mercado de trabalho (não estão empregados nem procuram empregos) dado que estão desalentados, porque os
custos associados à procura seriam superiores aos ganhos potenciais. Ou seja, a parte visível dos desocupados
estaria composta de desempregados voluntários e outra parte estaria camuflada dentro da população inativa (que
não participa do
mercado de trabalho).
II.4. Considerando as Atividades Domésticas.
Em realidade, o modelo básico esboçado na Seção I é uma simplificação da realidade porque, entre
outras coisas, estabelece uma falsa dicotomia entre trabalho e lazer. O trabalho considerado seria mercantil (o

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 10 -
trabalho realizado por um salário) e o tempo de não-trabalho, dado que é identificado com lazer, proporciona
bem-estar ou utilidade.
A realidade é algo mais complexa, visto que o tempo não trabalhado mercantilmente não
necessariamente pode ser identificado com lazer. A produção doméstica (cuidar dos filhos, preparar a comida,
lavar a roupa, etc.) e outras atividades (tempo de deslocamento entre a casa e o trabalho, etc.) são inevitáveis.
Assim, podemos desagregar o tempo disponível em três segmentos: lazer, atividades domésticas (que incluem
tanto as tarefas do lar como outras, deslocamento de casa ao trabalho, por exemplo) e trabalho mercantil. A
função objetivo continua sendo a mesma, com os argumentos reduzidos ao consumo (seja de bens adquiridos
no mercado seja de bens produzidos domesticamente) e lazer. Contudo, o ponto relevante é que as tarefas
domésticas devem ser feitas, mas não necessariamente devem ser executadas pelo indivíduo em questão: em
lugar de cuidar dos filhos, poderia enviá-los a uma creche ou poderá contratar uma babá; em lugar de lavar a
roupa poderia envia-la a uma lavanderia ou contratar uma empregada doméstica, etc.. Contudo, esses serviços
tem um custo. Dessa forma, podemos formalizar o programa desse indivíduo como sendo:
Max. U = U ( Q M ; Q D ; H L ) (19)
onde as novas variáveis são: Q M = bens mercantis consumidos; Q D = bens domésticos consumidos.
Passemos, agora, a desenvolver a restrição. Para não complicar a álgebra, vamos supor que os bens
mercantis e domésticos têm o mesmo preço que é igual a 1. Assim, a restrição pode ser escrita da seguinte
forma:
QM w H T (20)
Onde: H T = horas alocadas ao trabalho mercantil
Podemos definir H T como sendo o total de horas disponíveis (H) menos as horas de lazer (H L) menos as
horas dedicadas aos afazeres domésticos (H D). Assim, é factível reescrever a restrição anterior da seguinte
forma:
QM w { H - H L - HD } (21)
Reagrupando os termos temos que:
QM + w { H L + H D } w H
ou
QM + w { H L + H D } R
onde: R = renda potencial;
Dessa forma, podemos escrever o programa da seguinte forma:
Max. U = U ( Q M ; Q D ; H L ) (22)
s.a. Q M + w { HL + HD } R
Podemos representar Q D como uma função das horas trabalhadas, de forma não mercantil, no lar.
Assim, Q D (H D) é facilmente associada a uma função de produção normal, com produtividades marginais
positivas (a primeira derivada de QD é maior que zero) mas decrescentes (segunda derivada negativa). Dessa
forma, as variáveis a serem escolhidas no programa de maximização anterior são: Q M , H L e H D.
O Lagrangiano desse programa é:
= U ( Q M ; Q D ; H L ) – ë [ (Q M) + w { H L + H D } – R ] (23)
Derivando com respeito às variáveis QM, HL e HD, obtemos as seguintes expressões:
QM = U QM – ë = 0
HL = U HL – ë w = 0
HD = U QD QD‘ – ë w = 0 (24)
(QM) + w { H L + H D } = R

(Lembremos que Q D‘ é a produtividade marginal das atividades domésticas).


Para simplificar a análise vamos supor que os bens consumidos podem ser tanto produzidos
mercantilmente (ou seja, comprados) ou produzidos domesticamente. Em outros termos: são substitutos
perfeitos. Desse modo, podemos fazer que U QM = U QD = U Q, onde U Q é a utilidade marginal do consumo.
A partir dessa igualdade, temos que U Q = ë e (U QQD‘) / w = ë e é fácil concluir que:
w = Q D‘ (25)
Lembremos que, para simplificar, supusemos que os preços dos bens que integram a cesta de consumo
é igual a 1. Assim, Q D‘ é em realidade o valor da produtividade marginal do trabalho doméstico (preço do bem
vezes a produtividade marginal). No ponto que maximiza a utilidade, o valor dessa produtividade marginal deve
ser igual ao salário que esse indivíduo obteria no mercado se deixa de trabalhar em casa e sai a vender os
serviços de seu trabalho 31/. Talvez, para fins didáticos, seja conveniente alterar o preço de 1 e trocar por um
salário diferente (w d), que seria o preço de produzir os bens domésticos através da contratação de trabalho

Page 9 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 11 -
assalariado no domicílio.
Vamos supor que w d * Q D‘ > w. Isso significa que contratar uma pessoa no mercado para realizar as
tarefas que o indivíduo está executando no domicílio não maximiza a utilidade, dado que o custo é superior.
Imaginemos que uma pessoa lave a sua roupa na sua casa e gasta uma hora. Ela pensa em deixar de lavar e
sair a procurar trabalho pelo mesmo período (uma hora). Se ela pode ganhar R$ 20/hora mas o indivíduo que
contrata cobra R$ 30/hora, seria mais interessante ele continuar lavando a sua roupa. Ele só vai substituir a
produção doméstica pelo trabalho mercantil quando o salário que potencialmente pode receber no mercado é
superior (ou igual) ao que deve pagar pelos afazeres domésticos. Como a produtividade marginal da produção
doméstica é assumida como decrescente, ele pode partir de uma desigualdade (como wd * Q D‘ > w) e continuar
a substituir seu trabalho no lar pela contratação de um indivíduo até a igualdade.
A partir desse raciocínio podemos abordar certas particularidades da divisão do trabalho dentro do lar.
Porém, antes de abordar essa discussão, cabe distinguir o conceito de trabalhador principal e trabalhador
secundário. O trabalhador principal é aquele que nunca realiza atividades domésticas e sempre está no
mercado. Contrariamente, os trabalhadores secundários são aqueles membros da família que participam ou não
do mercado de trabalho segundo a conjuntura.
Esclarecidos esses conceitos, e sem entrar em polêmica com o movimento feminista, a observação
cotidiana nos permite concluir que em muitos lares a divisão do trabalho interna faz do homem o trabalhador
principal e a mulher participa eventualmente do mercado de trabalho. Não considerando fatores culturais, muito
importantes, e reduzindo a perspectiva de análise ao plano estritamente econômico, podemos entender essa
divisão das tarefas por gênero a partir da análise neoclássica exposta em parágrafos anteriores. Devido a
diversos fatores (discriminação, menor educação, tradição, etc.) os salários pagos às mulheres são menores
que os recebidos pelos homens 32/. Nesse caso, a partir do arcabouço teórico que acabamos de desenvolver,
entendemos porque sua participação no mercado de trabalho é menor que no caso dos homens. As mulheres só
participam do mercado e contratam outros assalariados para realizar as tarefas domésticas quando o salário
ganho é superior ao que pagam porrealizar essas atividades. Como os salários dos homens, devido a esses
fatores, são superiores, seu custo de oportunidade (salários que se deixam de ganhar) para realizar as tarefas
domésticas é superior.
II.5. A Família como Unidade de Decisão
Em parte, os temas relacionados com a oferta de trabalho da família e a divisão entre seus membros
podem ser abordados a partir dos temas mencionados anteriormente (produção doméstica versus produção
mercantil). Porém, esse corte não esgota as perspectivas de análise quando a unidade de decisão para a oferta
de trabalho não é mais o indivíduo mas a família. Se as estratégias dos membros são interdependentes, não
podemos analisar cada
membro isoladamente.
Em primeiro lugar, devemos ter presente que a economia neoclássica
encontra uma grande dificuldade para lidar com um agente como a família, dado que a mesma pode subdividir-se
entre diferentes membros, e cada um deles pode ter uma função de utilidade própria a ser maximizada.
Coloquemos um exemplo. Imaginemos que os dois argumentos que dão utilidade a uma família seja consumo e
lazer. O trabalho é uma fonte de desutilidade, mas como através dele se obtém a renda que viabiliza o consumo,
é necessário trabalhar se o indivíduo deseja consumir 33/. Mas suponhamos que cada membro da família tenha
uma função de utilidade com as mesmas características. Nesse caso, todo membro vai
querer não trabalhar, induzir ao outro para procurar trabalho e utilizar essa renda para consumir. Por outro lado,
como tem mais tempo por não trabalhar, ele tem mais chances de realizar esse consumo. Logicamente,
estamos diante de um absurdo, uma vez que a unidade familiar, nessa perspectiva, se inviabilizaria, seria um
espaço de acirrados conflitos e teríamos que introduzir na análise alguma negociação entre os membros da
família.
Suponhamos, agora, que o importante seja o consumo de toda a família, não existem funções individuais
a serem maximizadas. Nessas circunstâncias, e supondo a necessidade de realizar atividades domésticas que
qualquer um dos membros pode desenvolver, a estrutura da oferta familiar privilegiará aqueles membros que
possam obter os maiores salários. Por um lado, essa hipótese tende a introduzir elementos que permitam
visualizar a oferta de trabalho como reagindo positivamente à elevação de salários (a oferta de trabalho agregada
teria mais chances de ser crescente). Se os salários se elevam, trabalhadores secundários se agregam à força
de trabalho.
Contudo, podemos imaginar também um efeito contrário. Se o objetivo é
manter uma consumo familiar mais ou menos estável, uma queda de salário pode induzir uma elevação na oferta
de trabalho, para tentar manter esse patamar de consumo. Quando o salário cresce, esse nível pode ser obtido
com menos assalariados, gerando-se um excedente que se retira da força de trabalho.
Dessa forma, as mesmas incertezas teóricas que encontramos no caso da unidade de decisão ser o

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 12 -
indivíduo permanecem quando o “agente” é a família.
III. A Perspectiva Crítica
III.1. A Dicotomia Lazer-Trabalho- 1
A teoria neoclássica supõe que existe um conflito entre o lazer e o trabalho e, se o indivíduo se integra
no mercado de trabalho para trabalhar é, exclusivamente, a fim de obter rendimentos suscetíveis de viabilizar
consumo, este, como o lazer, são uma fonte de bem-estar ou utilidade.
Na prática, lazer e consumo são atividades que, nas sociedades modernas, estão intrinsecamente
ligados. A crescente mercantilização das atividades torna difícil imaginar espaços nos quais o lazer não seja
obtido através do consumo.
Por outra parte, consumir requer tempo livre, entendido como tempo de não-trabalho. Ou seja, as três
dimensões (consumo-trabalho-lazer) estão intimamente ligados, e são, em não poucas ocasiões,
complementares.
III.2. A Dicotomia Lazer-Trabalho- 2
Não se podem assumir todas as atividades englobadas como trabalho mercantil como não
proporcionando nenhum benefício ou utilidade a não ser o consumo que viabiliza. Na história do pensamento
filosófico, existem inúmeras correntes para as quais o homem se integra socialmente e se realiza
individualmente somente através do trabalho 34/.
Ficar em uma situação de não atividade ou desempregado seria, para o pensamento neoclássico, uma
fonte de bem-estar. No cotidiano, observamos que o desempregado pode ser um indivíduo estigmatizado, com
inúmerasconseqüências sobre sua auto-valoração. Por questões culturais, quando um homem adulto fica em
situação de desemprego, sua imagem diante da mulher, dos filhos, dos amigos, etc. pode deteriorar-se,
induzindo-o à auto -marginalização, à violência, ao alcoolismo, etc. Um dos campos de estudo dos psicólogos
sociais que lidam com o mundo do trabalho é, justamente, analisar os impactos sobre o indivíduo e a família
provenientes de suas dificuldades de integrar-se no mercado de trabalho. Sem entrar em conflito com as
feministas, no caso da mulher, por questões culturais, potenciais dificuldades em integrar-se ao mundo do
trabalho podem ser menos traumáticas, dado que a administração das tarefas do lar ainda é vista como uma das
alternativas de vida do sexo feminino.
Dessa forma, o trabalho outorga bem-estar por outros motivos que não,exclusivamente, os bens e
serviços que viabiliza comprar. O reducionismo do arcabouço teórico neoclássico oculta uma realidade
extremamente mais complexa. Devemos perceber que para o enfoque neoclássico uma pessoa que não trabalha
porque não consegue trabalho (desempregado) e uma pessoa que não trabalha porque não quer estariam, em
termos de bem-estar, na mesma situação.
III.3. A Dicotomia Lazer-Trabalho- 3
As formulações mais corriqueiras nos livros de microeconomia estabelecem a mencionada dicotomia
lazer-trabalho. Ou seja, as horas não trabalhadas são fonte de bem-estar ou utilidade e as trabalhadas são
desutilidade. Como vimos, as horas não-trabalhadas podem não ser uma fonte de utilidade, dado que parte delas
podem ser dedicadas a tarefas domésticas pouco prazenteiras. Necessariamente, o modelo deve contemplar
como alternativa um tempo não-trabalhado mercantilmente que não é fonte de bem-estar, sob pena de um
reducionismo irrealista.
Por outro lado, parte das tarefas domésticas podem outorgar bem-estar, não obstante serem “trabalho”.
Cuidar dos filhos é, certamente, um trabalho (não é lazer). Contudo é uma atividade que é, para muitas pessoas,
gratificante, sendo realizada ainda em situações nas quais seria mais “econômico” substituir esse “trabalho” pela
contratação de serviços no mercado (uma babá, por exemplo) e ser assalariado.
III.4. A Flexibilidade das Escolhas
Em geral, toda a análise neoclássica supõe que existe uma substituição perfeita entre as variáveis a
serem escolhidas. Lembremos que em um curso corriqueiro de microeconomia a curva de indiferença ou a
isoquanta são perfeitamente diferenciáveis. Tomemos o caso de uma isoquanta. Sua diferenciabilidade implica
em supor que as combinações entre os insumos (capital e trabalho) são infinitas. Sabemos que, na realidade, o
capital e o trabalho estão vinculados por coeficientes mais ou menos fixos, dados pela tecnologia.
No caso da oferta de trabalho, estamos supondo que o indivíduo pode escolher a quantidade de tempo
de trabalho (horas, minutos, segundos) que ele deseje. Na realidade não é assim. Especialmente no caso de um
assalariado, não seria irrealista supor que, na maioria das vezes, ou ele trabalha a jornada integral ou ele não
trabalha. Essa jornada de trabalho, por outra parte, pode estar composta por dois intervalos. Um definido pela
jornada legal com o pagamento de um salário horário e outro composto pelas horas extras, com um salário
horário
superior e, ao menos legalmente, a quantidade de horas extras tem limite.
Este fato tem inúmeros desdobramentos. Citemos alguns.
Um trabalhador pode estar trabalhando a tempo parcial (quatro horas diárias em lugar da jornada legal,

Page 11 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 13 -
mais ou menos oito horas/dia) devido a que essa foi a sua opção. Outra vez sem querer entrar em polêmica com
as feministas, em certos países desenvolvidos, onde a participação da mulher no mercado de trabalho é muito
elevada (como nos países Nórdicos), muitas delas estão empregadas em tempo parcial visto que seu objetivo é
combinar inserção no mercado de trabalho com certas atividades domésticas (acompanhar a educação dos
filhos, por exemplo). O mesmo marco explicativo se aplica no caso de jovens estudantes, que, para
compatibilizar estudos com algum rendimento, podem emprega-se a tempo parcial ou temporários (trabalham
nas férias). Contrariamente, podemos ter um assalariado empregado temporariamente (fazendo algum “bico”) ou
parcialmente (trabalhando só algumas horas por dia) em razão de não conseguir um trabalho a tempo integral.
Para evitar colocar esses dois conjuntos de indivíduos, qualitativamente diferentes, dentro de um mesmo
conjunto, os órgãos de estatística dos países centrais tratam de diferenciar o trabalhador temporário ou em
tempo parcial voluntário do involuntário.
Um indivíduo pode estar fora do mercado de trabalho porque a legislação, por exemplo, não contempla a
possibilidade de trabalhar a tempo parcial ou temporário 35/. Neste caso, ele não participa do mercado de
trabalho involuntariamente, é um “passivo involuntário”. Ele gostaria de participar do mercado de trabalho mas as
restrições legais impedem sua integração. Ou seja, temos mais restrições que as contempladas no modelo
exposto na Seção I.
Por último podemos mencionar os impostos, mas especificamente o imposto de renda, variável que pode
ter vários percentuais de tributação segundo o montante ganho e, portanto, pode alterar o modelo. Em geral,
poderíamos modelar cada uma dessas restrições (reduzir as flexibilidades) separadamente. Incorporá-las todas
torna o modelo muito mais complexo de tratar matematicamente e, em última instância, os resultados serão
indefinidos.
III.5. Inclinação da Curva de Oferta de Trabalho e Equilíbrio no Mercado
Vimos que o desenvolvimento do modelo neoclássico de oferta de mão-de-obra nos leva a uma
indeterminação teórica sobre a inclinação da oferta de trabalho. Entretanto, na maioria dos livros supõe-se que a
força de trabalho é fixa, insensível às variações do salário real ou que a mesma tem uma inclinação positiva. Ou
seja, evitam, em geral, contemplar a possibilidade de que a mesma tenha inclinação negativa. Por que ?
O problema que eventualmente pode introduzir a inclinação positiva de curva de oferta de trabalho
consiste na estabilidade do equilíbrio. Lembremos que a escola de pensamento neoclássica tende a outorgar
aos mercados uma notável capacidade de auto-regulação. Para os teóricos dessa corrente de pensamento, na
ausência de falhas de mercado (externalidades, informação assimétrica, etc.), a melhor alternativa para a
alocação dos recursos será o ponto atingido pela interação da oferta e demanda. Se a oferta de trabalho tem
uma inclinação negativa, essa autoregulação fica comprometida dado que não se pode assegurar a estabilidade
do equilíbrio. Entende-se por estabilidade do equilíbrio uma situação na qual se, por algum motivo (choque
exógeno, por exemplo), nos apartamos da igualdade entre oferta e demanda (equilíbrio), esse deslocamento faz
entrar em ação a interação entre ambas de tal forma que, depois de um tempo, se retorna ao ponto inicial (de
equilíbrio). Ou seja, uma situação de desequilíbrio é temporária, justamente, pela autoregulação dos mercados
36/.
Contudo, se a oferta apresenta uma inclinação negativa, a estabilidade não está assegurada. Vamos
rapidamente formalizar essa demonstração, pois é importante para compreender uma das limitações internas ao
próprio modelo. Imaginemos que tenhamos a curva de oferta e demanda de trabalho expressadas da seguinte
forma:
–a
Qd = A w (26)
-b
Qs = B w
Onde: w = salário real; Qd = demanda de trabalho; Qs = oferta de trabalho e A, a, B e b são parâmetros todos
maiores que zero.
Em realidade, a e b são as elasticidades da demanda e oferta, respectivamente. Para simplificar, vamos
linearizar esse modelo. Tomando logaritmos temos que:
Qd = á – a w (27)
Qs = â – b w (28)
onde: á e â s ão parâmetros e as letras minúsculas os logaritmos das variáveis originais.
Vamos supor que o processo de ajustamento tenha a seguinte característica:
w ‘ = ì (q d - q s) (29)
onde w ‘ = d w / d t, a variação dos salários no tempo (o processo de ajustamento) e ì > 0.
Substituindo na expressão anterior (27) e (28), obtemos:
w ‘ = ì (á – a w - â + b w ) (30)
Rearranjando os termos obtemos:
w‘+ì (a-b) w = ì ( á– â ) (31)

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 14 -
A expressão anterior é uma equação diferencial linear, de primeira ordem, cuja solução é:
- ì (a-b) t
w = { w(0) - [ ( á – â ) / (a-b) ] } e + [ ( á – â )/ (a-b) ] (32)
A expressão [ ( á – â )/ (a-b) ] é o salário de equilíbrio 37/. Quando essa expressão tende para o
equilíbrio se ì (a-b) > 0. Como ì é maior que zero, a única alternativa para ser positivo é que a > b. Ou seja, que a
elasticidade da demanda seja maior que a elasticidade da oferta.
Contrariamente, se a curva de oferta de trabalho tem inclinação positiva, a função de oferta de trabalho
pode ser expressa da seguinte forma:
b
Qs = B w (33)
Trabalhando da mesma forma que anteriormente, chegamos a uma equação diferencial na qual o
expoente de e é (- ì (a+b) t), sempre negativo e, por tanto, a estabilidade do equilíbrio está assegurada.
Assim, observamos que quando supomos que a oferta de trabalho tem
inclinação negativa, não podemos generalizar resultados quando o tema é a estabilidade do equilíbrio e, nessas
circunstâncias, qualquer perturbação que desloque o salário do ponto de equilíbrio pode acarretar um processo
no qual a trajetória do salário se distancie cada vez mais do equilíbrio 38/.
III.6. Oferta, Demanda e Equilíbrio
Como afirmamos nos parágrafos anteriores, a noção de equilíbrio tem, para o pensamento neoclássico,
uma singular importância. Justamente, é a necessidade de um ponto de equilíbrio que leva a esse esforço
teórico por desenvolver uma função que expresse uma oferta e, como veremos no Capítulo seguinte, uma
demanda de trabalho. Devemos perceber que se temos só uma oferta ou só uma demanda, as combinações
entre salário real e nível de emprego são infinitas, já que não temos teoria. Para analisar um mercado temos que
ter uma oferta e uma demanda, as duas independentes e que interagem entre elas.
Justamente, na independência das curvas de oferta e demanda está uma das limitações ou
vulnerabilidades do modelo neoclássico. O leitor deve perceber que, no modelo básico e nas suas distintas
versões, a oferta depende de diversas variáveis (preferências, salário real, ,salário cobrado por realizar as
atividades domésticas, etc.) mas nunca da demanda. Contudo, não seria ousado supor que a demanda de
trabalho pode estar influenciando a oferta. Ou seja, o ciclo conjuntural pode ser uma das variáveis que
determinam a oferta de trabalho. Como a procura de trabalho tem custo (hipótese contemplada nos modelos de
procura), quando, devido ao desaquecimento do nível de atividade, a probabilidade de encontrar emprego é muito
reduzida, a avaliação custo/benefício pode induzir a um indivíduo a não procurar emprego. A escolha pode
serpermanecer na inatividade (não participar do mercado de trabalho). Mas neste caso, a oferta depende da
demanda. Ou seja, a oferta não consitui um processo independente da demanda. É a partir da interação entre as
duas que se determina o nível de emprego e o salário real de equilíbrio. Se a deterioração do nível de atividade
tem como resultado uma queda das vagas disponíveis, a oferta pode ser afetada e o modelo fica indeterminado
(que determina que ?).
III.7. Seguro-Desemprego e Eficiência Alocativa.
No modelo neoclássico básico, ou ainda nas suas versões um pouco mais sofisticadas, o
seguro-desemprego tende a aumentar a taxa de desemprego. Além dos problemas sociais e políticos de conviver
com taxas de desemprego elevadas, as mesmas são uma fonte de ineficiência, uma vez que essa mão-de-obra
poderia estar produzindo, se empregada, mais não estaria ociosa. Dessa forma, o mercado de trabalho seria
menos “eficiente” na alocação da mão-de-obra justamente pela existência de um programa como
seguro-desemprego.
Como já analisamos em parágrafos anteriores, o seguro-desemprego eleva a taxa de desemprego devido
a que aumenta o salário de reserva, contribuindo, assim, para que os desempregados sejam mais “seletivos” na
hora de ocupar as vagas disponíveis. O desocupado tem uma renda segura, justamente oriunda de sua condição
de desempregado, que perderá se aceitar ocupar uma vaga e, portanto, teria incentivos para permanecer por
mais tempo dedicado à procura.
Contudo, devemos perceber que o seguro-desemprego pode contribuir para elevar a eficiência na
alocação de recursos na medida em que possibilita que o desempregado encontre um posto de trabalho
condizente com sua qualificação. Na ausência de uma garantia de renda, esse desocupado, especialmente se é
chefe de família (única ou principal fonte de renda familiar), pode ser compelido a aceitar o primeiro posto de
trabalho disponível, ainda que esse indivíduo tenha concretas possibilidades de encontrar, se continuasse suas
buscas, um emprego de maior qualidade. O desempregado poderia estar sobre-qualificado para a vaga, mas as
necessidades financeiras o compelem a se candidatar 39/.
Nesse caso, a presença de um seguro-desemprego poderia elevar a eficiência alocativa, dado que esse
candidato teria condições de continuar acumulando informações sobre as oportunidades de trabalho e
candidatar-se a uma vaga de melhor qualidade.
IV. A Modo de Balanço.
Em geral, os livros-texto dedicam muito mais atenção para analisar a demanda de trabalho que a oferta

Page 13 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 15 -
do mesmo. Essa maior importância dedicada ao estudo da demanda não é casual. Em termos teóricos, depois
de argumentos que podem atingir um grau de sofisticação e dificuldade elevados, as conclusões que pode atingir
a perspectiva neoclássica são parcas.
Existe uma indeterminação teórica sobre as respostas da oferta de trabalho diante de mudanças no
salário real (o preço do trabalho). Essa indeterminação teórica não é contornada ainda quando se incluem as
atividades domésticas, se considera a família como unidade de decisão, etc.. Ou seja, a pergunta que o leitor
pode se colocar é: para que tanto esforço intelectual se não se pode determinar, em termos teóricos, se um
aumento do salário provoca queda, elevação ou não afeta a quantidade de trabalho oferecida.
Esse esforço é, para o arcabouço teórico neoclássico, crucial, Se não existe uma oferta e uma demanda
que interagem, o salário real que equilibra o mercado de trabalho fica indeterminado. Em realidade, se não
houver oferta e demanda não há mercado e, então, não faria sentido a expressão “mercado de trabalho”. Não
obstante uma longa tradição dedicada ao tratamento teórico da resposta da oferta de trabalho às mudanças no
salário real, o arcabouço neoclássico logrou poucos avanços. Diante desse impasse, podemos identificar três
posições.
A primeira consiste em considerar oferta de trabalho fixa no curto prazo. Alterações da mesma só são
significativas no longo prazo e, mesmo assim, outras disciplinas, que não a economia, devem explicar seus
movimentos. Da demografia espera-se que possibilite entender o crescimento da população e sua estrutura
etária e, indiretamente, possa prever as tendências na oferta de trabalho de um país. As mudanças na
participação da mulher e dos jovens seriam matéria de estudo na sociologia. Aqui não estamos querendo negar
as aspirações dos teóricos neoclássicos, que, talvez de forma um pouco arrogante, supõem que seu arcabouço
teórico permite explicar desde a formação de salários até a quantidade de filhos que um casal vai ter. O ponto é
que, quando o tema a ser tratado é a oferta de trabalho, existe uma indeterminação teórica que não conseguiram
reverter e os obriga a fazer apelo a outras disciplinas. Frente a essa indeterminação, considerar a oferta de
trabalho fixa é a alternativa menos “onerosa”, tendo em vista que permite continuar falando em “mercado de
trabalho” e na existência de equilíbrio.
A segunda alternativa, menos “honesta”, consiste em supor que existe indeterminação teórica mas,
contornável pela seguinte frase: ”contudo, vamos supor que a oferta seja crescente”. Daí para frente se esquece
o problema e continua-se trabalhando como se essa hipótese fosse necessariamente certa, na esperança que o
leitor “esqueça” os problemas que indeterminação da inclinação possa introduzir.
Por último, a terceira alternativa é o “empirismo”. Ou seja, como a teoria não nos permite prever,
observamos o que acontece em cada conjuntura e a explicação, como na análise de qualquer comentarista de
um jogo de futebol, é “ex-post”. Suponhamos, por exemplo, que presenciemos uma fase de desaceleração do
ciclo, com salários e emprego caindo. Nós não sabemos, a priori, qual será o comportamento da oferta de
trabalho e, portanto, não sabemos qual será o impacto dessa queda do nível de atividade sobre o desemprego.
Imaginemos que o desemprego não aumente porque as estatísticas estão indicando que, diante da crescente
dificuldade em encontrar emprego, as pessoas pararam de procurar (aumento da inatividade). Nesse caso, os
“teóricos ex-post” dirão que a queda dos salários e custos de procura crescentes afetaram negativamente a
oferta de trabalho. Entretanto, ninguém pode garantir que esse fenômeno se mantenha. Suponhamos que o
processo recessivo se prolongue no tempo. Nos períodos posteriores, a queda dos salários poderá obrigar a
inserção no mercado de trabalho de mais membros da família a fim que o núcleo familiar atinja um mínimo de
bem-estar material, provocando uma elevação na taxa de desemprego. Concluindo: não existe teoria
(generalizações), não se pode prever e, o máximo que se pode oferecer, é uma elegante explicação “ex-post”.
Em geral, todos os estudos que lidam com variáveis vinculadas à oferta (como probabilidade do
desempregado de aceitar uma oferta de emprego, inatividade e ciclo de curto prazo, resposta do trabalho infantil
diante devariações no salário dos adultos, meios de procurar emprego, etc.) têm um embasamento teórico
marginal. A quase totalidade das pesquisas procuram “respostas nos dados”. Só algumas categorias teóricas
(como salário de reserva, custos de procura, desalento, etc.) são mencionadas e utilizadas e, ainda assim, com
muita dificuldade 40/.

Capítulo 2
Indicadores do Mercado de Trabalho e Fontes de Dados no Brasil
Diferentemente do anterior, neste Capítulo só marginalmente abordaremos aspectos teóricos ou de certa
densidade analítica. O nosso objetivo quase exclusivo consiste em apresentar, na Seção I, os principais
indicadores usualmente utilizados para acompanhar o movimento conjuntural e as tendências do mercado de
trabalho. Na Seção II realizaremos uma caracterização das fontes de dados, as distinguindo entre Pesquisas de
Domicílio e Registros Administrativos. Posteriormente, na Seção III, nossa atenção se concentrará na
apresentação dos três principais levantamentos domiciliares: a PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 16 -
Domicílios) e a PME (Pesquisa Mensal de Emprego), ambas produzidas pelo IBGE, e a PED (Pesquisa de
Emprego e Desemprego), uma base de dados cuja metodologia foi desenvolvida pelo DIEESE (Departamento
Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-economicos) e a Fundação SEADE (Sistema Estadual de
Processamento de Dados). Identificaremos a origem da pesquisa, seu marco analítico e seus principais
indicadores. Na Seção IV o nosso objeto de estudo serão os dois principais Registros Administrativos (RAs)
para monitorar e pesquisar o mercado de
trabalho: O CAGED (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) e a RAIS (Relação Anual de
Informações Sociais, ambos registros administrados pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Na Seção V
vamos chamar a atenção do leitor sobre os incontornáveis nexos entre paradigmas teóricos e construção de
indicadores. Veremos que os parâmetros ou as estatísticas em geral são (implícita ou explicitamente) produto
de marcos interpretativos. Na mesma Seção também abordaremos um tema particularmente sensível: a questão
do conflito entre os objetivos do poder e a produção de estatísticas. Veremos que a credibilidade de uma fonte,
além dos aspectos técnicos envolvidos, está vinculada ao grau de independência institucional do órgão produtor
de estatísticas do poder de turno. Por último, finalizamos o Capitulo na Seção VI, com um balanço do
desenvolvido no transcurso do mesmo.
I. Indicadores: conceitos e definições
Acompanhar e avaliar o desempenho e pesquisar o mercado de trabalho requer a construção de
indicadores. A construção de diversos indicadores ou “medidas” está pautado por categorias teóricas 1/.
Contudo, a maioria das vezes existe um relativo consenso sobre certas definições e conceitos que possibilitam a
elaboração de estatísticas. Nos próximos parágrafos apresentaremos a maioria dos indicadores corriqueiramente
utilizados para acompanhar, avaliar ou pesquisar aspectos vinculados ao mercado de trabalho. Como acabamos
de afirmar, a construção de indicadores está pautada em categorias teóricas e, assim, devemos esperar que
indicadores (sua própria construção e/ou interpretação) esteja longe de ser consensual. Quando polêmicas
teóricas desembocarem em divergências sobre a construção dessas estatísticas mencionaremos a origem e
fundamentos das diferentes posições. Em geral, trataremos de ilustrar os diferentes indicadores ou estatísticas
através de referências para o caso brasileiro, a fim de induzir o leitor a uma familiarização com os grandes
números ou agregados que definem o perfil específico do mercado de trabalho no país.
a) População em Idade Ativa (PIA)
A População em Idade Ativa, conhecida como PIA, é a população que, potencialmente, pode integrar a
força de trabalho de um país. Falamos em potencialmente e não efetivamente porque um indivíduo pode ou não
participar do mercado do trabalho. Um jovem de 25 anos, por exemplo, está biologicamente apto e culturalmente
é aceito como factível de fazer parte da força de trabalho. 2/ Contudo, esse determinismo biológico ou ambiente
cultural não implica que ele, necessariamente, participe do mercado de trabalho. Esse jovem pode estar no
sistema escolar e não estar empregado nem à procura emprego. Ou seja, é um estudante em tempo integral e
não faz parte da força de trabalho.
Podemos classificar as variáveis que determinam a população que potencialmente pode participar do
mercado de trabalho, ou seja, a PIA, em três grandes grupos: biológicos, culturais e demográficos.
As biológicas nos dizem sobre os limites físicos para assumir o desenvolvimento de tarefas. Por
exemplo, não podemos imaginar um bebe de 5 meses ou um idoso de 90 anos fazendo parte da PIA.
Poderíamos supor que, em termos biológicos, os limites estejam no intervalo entre 10 e 65 anos.
Não sempre esses limites não são naturais ou óbvios e estão influenciados pela segunda variável que
mencionamos, a cultural. Em países economicamente atrasados, nos quais as populações majoritariamente
habitam nas regiões rurais, por exemplo, os limites mínimos para potencialmente integrar a força de trabalho
podem ser reduzidos. Crianças a partir de 5 anos usualmente já podem ser utilizadas para realizar pequenas
tarefas domésticas ou ajudar os adultos em certos fazeres. Contudo, considerar uma criança de pouco mais de
5 anos como potencialmente apta para integrar a força de trabalho está fora de cogitação na maioria dos países
desenvolvidos e mesmo no Brasil (ao menos no Brasil urbano).
Em muitos países existem limites legais para a contratação de menores. NoBrasil, o limite mínimo é de
16 anos, e mesmo assim sua contratação deve ser feita na condição de aprendiz. Porém, o analista ou
pesquisador deve diferenciar bem os aspectos legais das práticas cotidianas. Não obstante uma hipotética
interdição legal, a contratação de menores pode ser um fato comum e, assim, a legislação não deve ser utilizada
como critério para a construção de estatísticas. Ao contrário, os indicadores pode até serem utilizados para
testar em que medida a legislação é cumprida.
Por último, variáveis demográficas (como crescimento da população e estrutura etária) influênciam,
obviamente, a PIA de um país.
Assim, o critério de PIA é um conceito flexível. Sua definição depende do analista ou pesquisador. Em
geral, devemos prestar muita atenção na PIA que cada fonte de dados está utilizando, dado que pode ser a raiz
de divergências na construção de outros indicadores (taxa de desemprego, por exemplo). O IBGE (Instituto

Page 15 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 17 -
Brasileiro de Geografia e Estatística), por exemplo, quando divulgava sua taxa mensal de desemprego na antiga
pesquisa mensal, considerava só a população de 15 anos e mais. Quando, em 2002, modernizou e alterou esse
levantamento domiciliar, a referência para os indicadores começou a abranger a população com mais de 10
anos. 3/ Já o DIEESE (Departamento Intersindical de Estudos Socio-Economicos) estabeleceu sempre um limite
mínimo 10 anos. Esses são os cortes de idade a partir dos quais os institutos de pesquisa estatística divulgam
os indicadores. Isso não quer dizer que o analista ou pesquisador não possa utiliza outra faixa etária.
Porém, vemos que a PIA não está influênciada por variáveis econômicas. Critérios particulares de cada
pesquisador ou instituto, variáveis demográficas e culturais, etc. são fatores que a partir dos quais são
estabelecidos os limites da população que podem ser considerados como potencialmente fazendo parte da força
de trabalho de um país. Só a título ilustrativo, se consideramos a população que potencialmente pode integrar a
força de trabalho do Brasil como sendo aquela com 10 anos ou mais, segundo os dados da Pesquisa Nacional
por Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE, em 2003 o contingente de indivíduos totalizava 174 milhões ou
82,19% da população total, esta última calculada em 143 milhões de habitantes. 4/
b)População Economicamente Ativa (PEA)
A PEA é um dos iniciadores mais usualmente utilizados, sendo sua menção corriqueira desde as
análises dos especialistas do mercado de trabalho até as reportagens cotidianas dos jornais não-especializados
em economia. A PEA não é outra coisa senão a força de trabalho (quantidade de homens e mulheres) de uma
economia em um determinado momento do tempo. Essa força de trabalho está composta tanto por ocupados
como por desocupados. Os ocupados, por definição, integram a força de trabalho. Os desocupados também,
dado que, em princípio, estão dispostos a trabalhar, mas não encontram emprego.
Os indivíduos que não forem parte da PEA são denominados de Inativos.
Dessa forma, podemos estabelecer as seguintes relações:
PIA = PEA + Inativos (1)
PEA = Ocupados + Desocupados (2)
Como já indicamos em parágrafos anteriores, tanto a PEA como a PIA tem que estar definida em termos
de faixas etárias. Assim, podemos estar estudando um fenômeno a partir da PEA de 10 anos sem limite
superior ou a PEA entre 10 e 65 anos, por exemplo.
No caso do Brasil, para pessoas de 10 anos ou mais, temos, em milhões, os seguintes números
(PNAD/03):
PIA = 143
PEA = 88
Inativos = 55
Ocupados = 79
Desocupados = 8
O leitor pode perceber que a PIA é a soma da PEA mais os inativos e a PEA é a soma dos ocupados
mais os desocupados.
c) Taxa de Participação
A taxa de participação é a relação (em termos percentuais) da PEA com respeito à PIA. Ou seja, que
percentual da população que potencialmente poderia participar do mercado de trabalho realmente o faz. Em
realidade, a Taxa de Participação pode ser interpretada como uma variável que reflete a oferta de trabalho.
Vamos analisar com mais detalhe este aspecto.
Lembremos que a PIA está integrada pelo conjunto da população que, em tese, poderia fazer parte da
força de trabalho. Seus determinantes são de longo prazo (tendências demográficas, cultura, etc.) e, em
princípio, são pouco influênciados por variáveis econômicas, notoriamente, as de curto prazo. 5/
Dessa forma, podemos considerar a PIA como fixa, um parâmetro exógeno e com poucas mudanças de um ano
para outro (exceto no que diz respeito ao crescimento demográfico). Contrariamente, a composição e alterações
da PEA, tanto de curto como de longo prazo, podem ser entendidas, ainda que não exclusivamente, à luz de
variáveis econômicas. Justamente, para diferenciar as alterações na PEA que são produto de variáveis
demográficas ou de longo prazo daquelas de curto prazo se utiliza a taxa de participação. Vamos dar um
hipotético exemplo para ilustrar esses aspectos. Imaginemos que a PIA de um país em um ano seja de 100
pessoas e a PEA de 80. Então, a taxa de participação será de 80%.
Suponhamos que a taxa de crescimento dessa população seja de 2% ao ano. Assim, no ano seguinte a PIA
será de 102 pessoas. Se a PEA é de mais ou menos 82 (aumento de mais ou menos 2% com respeito a 80), a
taxa de participação permaneceu constante e a elevação da força de trabalho pode ser explicada, na sua
totalidade, pelo crescimento demográfico. Contudo, no caso da PEA ter-se elevado para 90, outras variáveis,
muito provavelmente econômicas, devem ser identificadas para explicar um crescimento
da PEA de pouco mais de 12% (90 sobre 80) diante de um aumento demográfico de só 2%.
As variações na taxa de participação devem ser explicadas em função dos aspectos conceituais que já

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 18 -
estudamos no Capítulo I. Por exemplo, imaginemos que estamos em uma recessão. Nesse caso, pode ocorrer
que o chefe de família (a principal fonte de renda do grupo familiar) fique em uma situação de desemprego. Ao
estar comprometida sua renda, a decisão pode ser que outro membro da família que não fazia parte da PEA (um
filho adolescente que só estudava) agora comece a realizar atividades de procura de emprego. Nesse caso, a
PEA aumentou e o mesmo ocorreu com a taxa de participação (dado que esse adolescente não fazia parte da
PIA). Essa elevação na PEA não foi oriunda de variáveis demográficas senão de decisões econômicas no seio
da unidade familiar. Logicamente, esse é só um exemplo hipotético, uma vez que podemos imaginar que, em
uma recessão, dadas as dificuldades em encontrar trabalho, as atividades de procura de emprego de certos
indivíduos cessem e, assim, a PEA e
a taxa de participação é fatível que caiam. No Capítulo anterior vimos que, em termos analíticos, não podemos
estabelecer nenhum vínculo de causalidade a priori e, assim, um ciclo recessivo pode elevar, não influênciar ou
fazer cair a taxa de participação. Só análises empíricas de cada situação em um dado momento do tempo
podem ajudar a entender a relação entre ciclos e participação no mercado de trabalho. Generalizações devem
ser evitadas dado que, como já salientamos em diversas oportunidades, marcos abstratos não permitem
estabelecer nexos inequívocos. Aspectos de tempo e espaço devem ser considerados. Em outros termos: não
se podem estender a outras economias os resultados encontrados em uma delas e, mesmo de um mesmo país,
conjunturas distintas podem dar origem a alterações na taxa de participação de sentido contrário.
d) A Condição de Ocupado.
A caracterização da ocupação, nas pesquisas domiciliares, surge de uma pergunta muito específica: o
indivíduo em tal período (período de referência) estava trabalhando ou não.
Antes de iniciar a discussão sobre essa condição (ocupado ou não), convém nos deter, outra vez, sobre
a necessária referência temporal. Quando se pergunta a um indivíduo se ele estava trabalhando, a questão tem
que estar referênciada temporalmente. Ou seja, não se pode ser perguntar a um indivíduo: Você trabalha ? A
questão não pode ser colocada dessa forma dado que fica em aberto o tempo (você trabalha hoje, neste
momento ?) O normal é realizar a pergunta com alguma referência temporal: você trabalhou na semana de xx a
xx ? Nas duas principais pesquisas mensais domiciliares (na Nova Pesquisa Mensal de Emprego-PME do IBGE)
e na PED (Pesquisa de Emprego e Desemprego, elaborada pela Fundação SEADE e o DIEESE), por exemplo,
os dados sobre ocupação que são divulgados têm como horizonte temporal uma semana de referência. 6/
Dadas essas necessárias aclarações sobre a incontornável referência temporal da condição de ocupado,
devemos agora realizar duas considerações sobre o sentido da condição de ocupado.
Como o leitor poderá ter percebido, o “carimbo” de ocupado será dado a um indivíduo que tenha
trabalhado no período de referência. Em princípio, questões legais ou éticas não podem impedir incluir um
indivíduo na condição de ocupado. Em outros termos: uma pessoa pode declarar-se trabalhando não obstante
suas atividades serem realizadas, por exemplo, no âmbito da prostituição ou tráfico de drogas. Esse indivíduo
integra a força de trabalho de um país e o mesmo deve ser incluído na categoria de ocupado. Considerações
éticas não podem ser levadas em consideração dado que dizem respeito a cada indivíduo. Se os parâmetros
éticos fossem levados em consideração, cada analista ou pesquisador poderia construir sua própria definição de
ocupados, impedindo qualquer possibilidade de comparabilidade. Por outra parte, princípios éticos são datados
no tempo e no espaço. Assim, uma ocupação ou atividade que hoje poderia não ser considerada apta para
categorizar um indivíduo como ocupado, em outro ano ou em outra região a mesma pode ser socialmente aceita.
Dessa forma, tanto um indivíduo que atua no tráfico de drogas ilegais como outro que trabalha em uma ONG
para recuperação de viciados serão considerados ocupados. 7/
Poderíamos realizar as mesmas considerações no tocante à legalidade de da atividade realizada.
Lembremos que uma atividade pode ser ilegal mas não ilícita. Um pequeno empresário que atua no comércio de
alimentos, por exemplo, e não assina a carteira de trabalho de seus empregados e não tem a sua firma
registrada está na ilegalidade não sendo, contudo, ilícita sua atividade. Entretanto, um traficante de armas
realiza uma atividade ilícita e, logicamente, está na ilegalidade.
Assim, em termos da condição de ocupado ou não de um indivíduo em um determinado período de
tempo, a resposta sim (está ocupado) não está de forma alguma correlacionada com o teor, em termos de
legalidade ou licitude, da atividade realizada.
Uma segunda questão está correlacionada com o tempo mínimo necessário que um indivíduo trabalhou
para que o mesmo seja qualificado como ocupado. Essa questão é relevante dado que cada pesquisa pode
considerar um mínimo de horas ou dias trabalhados para considerar um indivíduo como ocupado no período de
referência. Atualmente, na sua pesquisa mensal de emprego, o IBGE considera que o indivíduo deve ter
trabalhado por, o mínimo, 1 hora na semana para ser considerado ocupado.
Vamos a fazer um breve resumo sobre o fluxo de perguntas, possíveis respostas e distintas
classificações que essas respostas geram (ver Fluxograma 1). Vamos desconsiderar o período de referência e
nos concentrar nas perguntas e respostas. A primeira pergunta é sobre a idade e a mesma leva a classificar um

Page 17 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 19 -
indivíduo como PIA ou não. No caso de integrar a PIA, a seguinte pergunta é se o indivíduo trabalhou ou não.
Não caso de ter trabalhado, o mesmo é classificado como ocupado. Não caso da resposta ser negativa (não
trabalhou), a seguinte pergunta é: procurou trabalho ? No caso da resposta ser positiva, esse indivíduo é
classificado como desocupado. Quando a resposta é negativa (não tomou nenhuma iniciativa para encontrar um
trabalho) integra o contingente de inativos.
e)Condição da Ocupação ou Tipo de Inserção no Mercado de Trabalho.
Excluída qualquer consideração que dize respeito à ética, ilegalidade ou ilícitos, as pesquisas tendem a
categorizar o ocupado segundo seu tipo de inserção no mercado de trabalho (ver Fluxograma 1). Em geral,
temos quatro grandes categorias: assalariado com carteira, estatutário, assalariado sem carteira, conta-própria
ou autônomo e empregador. Analisemos cada um desses possíveis tipos de inserção no mercado de trabalho.
Assalariados com Carteira: são aqueles ocupados cujo rendimento é um salário
pago pelo empregador. 8/ Essa relação assalariada está legalizada através da carteira de trabalho, estando a
relação trabalhista regulada pela CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) e pelas cláusulas constitucionais;
Estatutários: são aqueles assalariados cujo empregador é o setor público, não tem carteira de trabalho
assinada, entraram por concurso e tem certas garantias de estabilidade no emprego. Deve-se perceber que no
todo empregado público é estatutário, visto que pode estar contratado através da CLT (tem carteira de trabalho
assinada);
Conta-Própria ou Autônomo: é aquele ocupado que não tem uma relação de dependência assalariada nem
emprega outras pessoas. Sua remuneração não pode ser definida como um salário e deve ser toda categorizada
como rendimento;
Empregador: é aquele indivíduo que está ocupado e emprega assalariados. Sua remuneração, como no caso do
autônomo, não pode ser classificada como salário e, como no caso dos autônomos, deve ser qualificada como
um rendimento. 9/
Essas são as quatro grandes categorias usualmente utilizadas para classificar os ocupados.
Logicamente, existem múltiplas alternativas e muitas classificações podem ser imaginadas em função dos
objetivos do pesquisador ouanalista e do marco teórico de referência. A Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (PNAD-IBGE), por exemplo, apresenta uma abertura muito maior que as quatro categorias que antes
mencionamos. A posição na ocupação que pode ser encontrada nessa fonte é: empregado com carteira,
funcionário público estatutário, militar, outros empregados sem carteira, empregados sem declaração de carteira,
trabalhador doméstico com carteira, trabalhador doméstico sem carteira, trabalhador doméstico sem declaração
de carteira, conta-própria, empregador, trabalhador na produção para o próprio consumo, trabalhador na
construção para o próprio uso, não remunerado.
A importância dessas categorias não pode ser negligenciada, dado que influência uma série de
indicadores muito sensíveis à opinião pública (como taxa de desemprego) e nas conclusões de trabalhos de
pesquisa e análise. Mencionemos, a título ilustrativo, só dois exemplos.
O Trabalhador na Construção para o Próprio Uso é, na perspectiva dos técnicos responsáveis pela
PNAD, uma das possíveis opções de ocupação no mercado de trabalho. Contudo, não seria ousado supor que
muitos dos ocupados nessas atividades são, em realidade, desocupados que, na falta de perspectivas, deixam
de procurar emprego e se dedicam a realizar melhorias na sua vivenda. Não é o nosso objetivo entrar nessa
polêmica, mas é plausível que um pesquisador adote essa possibilidade e, nesse sentido, os ocupados na
Construção para seu Próprio Uso serem classificados como desocupados. 10/
O leque de alternativas para categorizar a posição da ocupação do trabalhador pode ser crucial quando o
tema de análise é o setor formal e informal. Nesse caso, as agregações podem ser um divisor de águas na
determinação dos resultados a serem obtidos. Em geral, são classificados como integrantes do segmento formal
os assalariados com carteira e estatutários. Os assalariados sem carteira são, por definição, informais. Os
contra-própria são também incluídos, em geral, na categoria de informais. Contudo, muitos pesquisadores
diferenciam os autônomos entre aqueles que pagam a previdência social (que fariam parte do segmento formal) e
aqueles que não contribuem para o sistema
previdenciário (que seriam agregados ao contingente de informais). 11/
Ainda que não esgotem as possibilidades de agrupamentos, os exemplos dados servem de exemplo
para ilustrar a importância das categorias a serem contempladas na posição da ocupação.
e)Ocupados: trabalho principal e outros trabalhos.
È comum que um ocupado tenha vários empregos. . Na PNAD/03, por exemplo, dos 79 milhões de
ocupados, 95% tinham só um emprego, 4,4% tinham dois empregos e 0,37% tinham três empregos. Portanto,
as considerações que realizamos nos parágrafos anteriores podemos estendê-las para os vários
empregos que um ocupado possa ter. O mais usual, no caso que um indivíduo possua mais de um emprego,
consiste em subdividir os empregos em dois grandes subconjuntos: o emprego principal e os restantes. Em
geral, o emprego principal é o mais pesquisado pelos analistas. Não necessariamente o trabalho principal é

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 20 -
aquele que tem as qualificações que o analista ou pesquisador outorgaria a esse vínculo. Suponhamos que um
indivíduo tenha dois trabalhos, um com carteira e outro sem carteira de trabalho assinada. Não necessariamente
aquele no qual tem carteira de trabalho assinada é o trabalho principal. Na PNAD, por exemplo, trabalho principal
é aquele que teve maior permanência (seja pela
duração do vinculo empregatício seja pelas horas trabalhadas) e, no caso de dois empregos com a mesmo
tempo, o critério para definir o trabalho principal é o de maior rendimento. Vemos, assim, que a carteira de
trabalho assinada não define o caráter de principal ou não do emprego, nem sequer o rendimento, que só serve
para definir em caso de “empate” nos critérios principais. Dessa forma, o pesquisador sempre tem que se
remeter às Notas Metodológicas da fonte de dados que está utilizando para conferir o critério de definição do
trabalho principal.
O subconjunto formado pelos outros trabalhos também pode se subdividido em trabalho secundário e
outros trabalhos. Em geral, podem existir limites para a quantidade de empregos pesquisados, e a medida em
que a importância do emprego vai relegando-se, as perguntas sobre ele vão mermando. Por exemplo, dificilmente
o entrevistado será perguntado sobre a quantidade de empregados que tinha o estabelecimento do terceiro
emprego. Contudo, a quantidade de empregados que compartilhavam o mesmo local de trabalho (um dado muito
importante para determinar a importância do tamanho da firma nas pesquisas sobre formação de salários, por
exemplo) no emprego principal seguramente toda pesquisa de domicílio contemplará.
f)Ocupados: horas trabalhadas.
A variável horas trabalhadas é de singular importância por, pelos menos, três motivos.
O primeiro diz respeito à própria condição de ocupado. Observemos que a classificação de ocupado
advém, nas pesquisas de domicílio, da resposta a uma pergunta sobre se o indivíduo entrevistado tinha trabalho
ou não em um determinado período (uma determinada semana, por exemplo). A classificação na condição de
ocupado gera, nessas circunstâncias, polêmica, dado que, se a pessoa trabalhou, por exemplo, uma hora nos
sete dias, pode ser considerada como ocupada? Duas alternativas são possíveis. A primeira consiste em incluir
na condição de ocupados todos os indivíduos que tenham trabalhado em determinado período, não importando o
tempo no qual exerceram alguma atividade. A segunda alternativa consiste em só considerar como ocupadas as
pessoas que trabalharam um mínimo de horas pré-estabelecido. Nas pesquisas do IBGE (PME e PNAD), por
exemplo, são consideradas ocupadas as pessoas que trabalharam um mínimo de uma hora na semana de
referência da pesquisa . No caso da PED, a condição de ocupado está vinculada à continuidade do trabalho. As
opções de classificação dos indivíduos que trabalharam menos que esse mínimo de horas são várias. Por
exemplo, como não são classificados de ocupados, se os mesmos não exerceram atividades de procura de
emprego podem ser considerados inativos. Contrariamente, poderiam integrar o contingente de pessoas que
fazem parte do desemprego oculto, oculto, justamente, pelo trabalho precário.12/ Assim, uma das variáveis
susceptíveis de definir o que é um trabalho precário e, justamente, a quantidade de horas trabalhadas.
A variável horas trabalhadas também pode ser utilizada para definir os trabalhadores a tempo parcial.
Esse tipo de inserção no mercado de trabalho pode ter duas características. A primeira é uma opção não
desejada pelo indivíduo e, portanto, o emprego a tempo parcial pode ser associado ou a um trabalho precário ou
a uma desocupação oculta pelo trabalho precário e, nesse sentido, voltamos ao ponto tratado no parágrafo
anterior. A segunda alternativa está associada à possibilidade do trabalho a tempo parcial ser uma opção
escolhida pelo indivíduo (um estudante que procura combinar estudos com trabalho, por exemplo). Nas
estatísticas de muitos países, os trabalhadores a tempo parcial são subdivididos entre voluntários e involuntários.
A condição de voluntário ou não, logicamente, não está em função da variável horas senão na escolha ou não de
empregos com um nível de horas trabalhadas inferior à jornada de trabalho normal ou usual em uma determinada
sociedade. Uma alternativa para contornar esta questão consiste em perguntar ao entrevistado se gostaria de
trabalhar além do número de horas que efetivamente trabalhou e se estaria disponível para trabalhar essas horas
a mais. 13/
Por último, a variável horas trabalhadas também é útil para “homogeneizar” os rendimentos mensais e,
assim, possibilitar um comparação entre os rendimentos pessoais. Em geral, as pesquisas de domicílios
contemplam algum quesito para levantar questões relativas ao número de horas normalmente trabalhadas, em
cada emprego, em uma unidade de tempo (semana ou mês). Vamos ilustrar o caso com dois exemplos.
Suponhamos que, para determinar se existe discriminação contra a mulher, se compara o salário médio mensal
das mulheres e dos homens. 14/ Imaginemos que o salário mensal médio dos homens é superior ao das
mulheres. Desse resultado podemos concluir que existe discriminação? Não, porque as horas médias
trabalhadas pelas mulheres podem ser inferiores aos homens. Assim, deveríamos calcular o salário horário e, a
partir dele, realizar uma comparação. Ao “homogeneizar” os rendimentos, é factível uma comparação e, tendo
como referência esse resultado, é possível tirar as conclusões pertinentes. 15/ O segundo exemplo diz respeito
à singular importância quando se pretende calcular o salário recebido pelo ocupado. Por exemplo, uma pessoa
que trabalhou uma hora/mês e recebe o salário mensal de R$ 300 tem um rendimento superior a outra que

Page 19 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 21 -
trabalha oito horas/dia e tem um rendimento mensal de R$ 300. Ou seja, a informação sobre rendimentos deve
ser, incontornavelmente, homogeneizada pelas horas trabalhadas. 16/
g) Desocupados: importância da definição.
Desocupados ou desocupação é um termo cuja definição tem uma importância que transcende a
dimensão estritamente econômica e, talvez por isso, gere tanta polêmica entre os economistas e estatísticos
que lidam com essa categoria e fazem esforços para quantificar a extensão desse fenômeno.
Transcende a dimensão estritamente econômica porque o nível de desemprego de um país é, muitas
vezes, utilizado como um “indicador síntese” da situação econômica e social de uma sociedade. A taxa de
desemprego constitui um parâmetro que, para parte da população, sintetiza uma série de aspectos que podem ir
desde a sensibilidade social dos governantes (quando o nível de desemprego se eleva seria a manifestação de
deterioro na situação social) até a performance macroeconômica (o desemprego serve para monitorar a
conjuntura e se os índices de desemprego se elevam esse comportamento é interpretado como a manifestação
de um nível de atividade em desaceleração).
Em realidade, o mundo é muito mais complexo. Tomemos como exemplo a situação social de um país.
É factível imaginar uma conjuntura na qual o nível de desemprego pode estar caindo, mas a pobreza
aumentando. A concentração de renda pode, também, apresentar uma tendência diferente dos níveis de
desemprego (concentração de renda aumenta e desemprego cai). A situação social de um país está dada por
um complexo número de indicadores (pobreza, concentração de renda, esperança de vida, alfabetização, etc.).
Contudo, usualmente, na conjuntura, a taxa de desemprego é um parâmetro corriqueiramente identificado como
sendo uma manifestação das condições de vida da população. 17/ Devido a esse fato, o desemprego adquire,
muitas vezes, uma dimensão política, sendo utilizado pelos governos ou pelas oposições como a manifestação
de êxitos ou fracassos nas políticas públicas.
h)Desocupados: definição de desocupação aberta. .
Em termos técnicos e desde uma perspectiva muito geral, um indivíduo é definido como desocupado se
não está trabalhando e, simultaneamente, está realizando alguma atividade para encontrar algum emprego. Uma
pessoa que não está trabalhando mas também não está procurando trabalho é classificado como fazendo parte
da população inativa (não faz parte da força de trabalho de um país, ou seja, da PEA). O Fluxograma 2 sintetiza
o conceito de desocupação.
A pergunta realizada a uma pessoa é mais ou menos a seguinte: no período X, estava trabalhando ? Se a
resposta é sim ela é classificada como ocupada. Se a resposta é não, passa-se à seguinte pergunta: estava
procurando trabalho ? Se a resposta é não (ou seja, não trabalhava nem estava procurando trabalho) esse
indivíduo é classificado como inativo. Sendo a resposta sim (não trabalhava mas estava procurando trabalho), a
pessoa é classificada como desocupada. Em termos gerais, essa metodologia é a adotada pelas pesquisas
domiciliares do IBGE (PME e PNAD).
Fluxograma II
Esse tipo de desemprego se denomina como “aberto” dado que a situação é mais ou menos
transparente. Na medida em que não está trabalhando e está procurando trabalho o indivíduo está,
evidentemente, desocupado.
j) Desemprego Oculto: objetivos e origens.
Entretanto, esse tipo de medição do desemprego não está isento de críticas. Como já mencionamos, a
taxa de desemprego é considerada, em muitas ocasiões, um indicador síntese sobre a situação social de um
país. Os números obtidos pelo cálculo do desemprego aberto podem gerar um certo desconforto, ainda em
pessoas que consideram pertinente utilizar o nível de desemprego aberto como um parâmetro de bem-estar
social.
Vamos utilizar dois exemplos, que consideramos particularmente ilustrativos.
Imagine o leitor os países que integram a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento?),
o “clube” de países mais ricos. Além dos já clássicos (EUA, Canadá, França, Alemanha, etc.), ultimamente
pleitearam e foram admitidos nesse seleto grupo países um tanto “estranhos” (Turquia, México e, inclusive o
Brasil está na lista dos candidatos a serem admitidos). A pergunta é: dentro desse amplo conjunto de países,
qual é aquele que o leitor imagina ter a Noruega (0.963). O pior Índice foi atribuído a Nigér (0.281) O Brasil
apresentou um IDH de 0.792.
menor taxa de desemprego ? Se lembramos que muitos indivíduos assumem onível de desemprego como sendo
“o indicador” da situação social de um país e sabendo que a intuição nos diz que as nações com a melhor
qualidade de vida são Canadá, Finlândia, etc., iríamos supor que a menor taxa de desemprego seria encontrada
entre esse subconjunto de economias. Pois não. A menor taxa de desemprego aberto vamos a encontrá-la no
México. 18/
Passemos ao segundo exemplo. Os grandes aglomerados urbanos pesquisados mensalmente pela
PME são seis: Salvador, Recife, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre. Perguntamos ao

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 22 -
leitor: qual dessas seis regiões metropolitanas terá a menor taxa de desemprego?. Continuando com o nosso
raciocínio anterior, se esse é “o indicador” da situação social, deveríamos imaginar Porto Alegre, ou talvez, São
Paulo ou Belo Horizonte. Pois não. A menor taxa de desemprego vamos a encontrá-la no Rio de Janeiro, uma
região marcada pela violência, com amplos espaços dominados pelo narcotráfico, etc..19/
Esses exemplos permitem visualizar porque certos pesquisadores e analistas sempre se sentiram um
tanto desconfortados com o indicador de desemprego aberto, especialmente se esse parâmetro deveria ter
alguma correlação com a situação social (ou, ao menos, com a percepção intuitiva da situação social).
Paralelamente a esse desconforto produto da percepção cotidiana das condições sociais de parcela
significativa da população, existem duas razões mais objetivas que alimentaram os diagnósticos sobre as
limitações do desemprego aberto como indicador.
Nos países desenvolvidos, existiu, especialmente a partir dos anos 30 e particularmente depois da
segunda guerra, um amplo sistema de proteção social, sistema que ficou conhecido como Estado de
Bem-Estar. 20 / Esse Estado de Bem-Estar engloba um diverso conjunto de políticas na área social (educação,
saúde, aposentadoria, etc.) dentro do qual estão incluídos os programas de assistência, financeira ou não
(seguro-desemprego, treinamento, reciclagem, recolocação no mercado, etc.) ao trabalhador desempregado.
Contrariamente, nos países em desenvolvimento esse sistema de proteção social ou não existia ou era muito
limitado e, nesse contexto, o trabalhador desempregado tinha pouca assistência, fato que ou o obrigava a
trabalhar, não importa o tipo de ocupação, sob pena de não sobreviver, ou o desestimulava, dado que não
contava com a ajuda para financiar ou reduzir os custos de procura de emprego.
O segundo fator objetivo que alimentava o desconforto com a utilização do desemprego aberto como
parâmetro para avaliar a situação no mercado de trabalho está vinculado às características desses mercados
nos países em desenvolvimento. Estes estariam caracterizados pela sua heterogeneidade. Em
lugar de um mercado de trabalho que se singularizaria pelo assalariamento regulado por um marco legal, como
nos países desenvolvidos, as nações sub-desenvolvidas apresentavam formas muito diversas de inserção no
mercado de trabalho. Os assalariados cuja relação trabalhista estava regulada pelo marco
legal (assalariados com carteira de trabalho assinada, no caso do Brasil) sempre foi um percentual mínimo da
força de trabalho ocupada. Os assalariados contratados ilegalmente (assalariados sem carteira de trabalho
assinada, no caso do Brasil), os conta-própria também fora dos circuitos legais, os ocupados não
remunerados ou trabalhando para o auto-consumo, etc. são usualmente formas de inserção no mercado de
trabalho predominantes no mundo em desenvolvimento. Nesse contexto, deveriam criar-se indicadores
apropriados para refletir uma realidade mais complexa, no qual a dicotomia assalariado legal/desocupado (ou se
era assalariado com uma relação formalizada ou se estava em uma situação de desemprego aberto), típica dos
países desenvolvidos, dava lugar a múltiplas situações (assalariado formal, assalariado informal, conta própria,
auto-consumo, etc.). A essa diversidade de formas de inserção agregava-se um outro fator. Diante da ausência
de um sistema de proteção social, os assalariados desligados devem, imperativamente, procurar alternativas de
sobrevivência, devido à impossibilidade de permanecer em uma situação de desemprego aberto por muito tempo,
sob pena de comprometer sua própria sobrevivência. Dessa forma, certos tipos de inserção seriam
extremamente precários e instáveis. Com efeito, mas que postos de trabalho se estaria diante de estratégias de
sobrevivência, através de bicos, trabalho irregular, trabalho para o próprio consumo, etc.. Estar inserido no
mercado de trabalho nessa situação seria um imperativo de sobrevivência e, nesse sentido, esse tipo de
situação seria melhor caracterizada como desemprego oculto que como ocupação.
Paralelamente a essa ocupação induzida pela necessidade de sobrevivência, a ausência de proteção
social poderia induzir aos desempregados a desistir de procurar trabalho em períodos recessivos, em razão dos
custos que deve incorrer nas atividades de procura sendo as vagas disponíveis escassas. Como bem analisam
os modelos de procura de emprego, já estudados no Capítulo I, um indivíduo poderia integrar a força de trabalho
de um pais, mas desistir de procurar trabalho devido ao fato da probabilidade de encontrar uma oferta de
emprego compatível com seu perfil ser reduzida e os custos elevados diante de suas disponibilidades
financeiras. Neste caso estaríamos diante de um desemprego oculto pelo desalento.21/
Assim, face a essa realidade mais complexa que a caricaturizada na dicotomia assalariado
registrado/desocupado, a alternativa metodológica seria subdividir o desemprego em dois tipos. O aberto, já
definido é comum a todas as economias, e o oculto, particularmente relevante nos mercados de trabalho dos
países em desenvolvimento. Esse desemprego oculto, por sua vez, poderia subdividir-se no desemprego oculto
pelo trabalho precário e o desemprego oculto pelo desalento (ver Fluxograma 3).
Fluxograma 3
Em geral, essas definições tal vez hoje gozem de um amplo consenso, quando o crescimento do emprego
“atípico” nos países centrais a partir dos anos 80 tornou os mercados de trabalho dessas economias mais
heterogêneos, com múltiplas formas de inserção (assalariado a tempo parcial, assalariado temporário,
contra-própria, etc.). Ou seja, nas últimas duas décadas os mercados de trabalho nas nações mais

Page 21 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 23 -
desenvolvidas se teriam tornado mais próximo aos historicamente observados nas regiões sub-desenvolvidas e,
assim, as categorias que antes serviam exclusivamente a estes últimos se universalizaram. 22/
j) As Dificuldades de Medição do Desemprego Oculto.
Entretanto, as maiores polêmicas surgem quando se pretende implementar, nas pesquisas de domicílio,
quesitos que visem captar essa complexidade. Por exemplo: que perguntas se devem formular ao indivíduo para
saber se ele é realmente um inativo (não faz parte da força de trabalho) ou é um inativo induzido pelas
dificuldades de encontrar um emprego ? Que significa (ou como pode ser definido) trabalho precário ? Se um
estudante trabalha somente quatro horas por opção para compatibilizar estudo e alguma atividade mercantil,
será que podemos de classificá-lo como um desempregado oculto ? Se um indivíduo é a principal fonte de renda
de uma família e trabalha somente quatro horas ainda que deseje
trabalhar mais, será que pode ser classificado como ocupado ?
Com respeito ao trabalho precário, em muitos países, diante de um trabalhador a tempo parcial ou
temporário, as perguntas são complementadas com quesitos que demandam se esse tipo de inserção é
voluntário ou não.
No caso específico do Brasil, historicamente só a PED inclui quesitos para detectar o desemprego
oculto, seja pelo trabalho precário seja pelo desalento. Atualmente, a Nova PME diversifica as perguntas sobre a
condição de ocupado e desocupado a fim de poder mensurar fenômenos tais como sub-ocupação e desemprego
oculto. Devido à complexidade dessa realidade, os critérios utilizados para definir essa situação são, muitas
vezes, polêmicos, fato que alimenta a controvérsia na hora da comparação entre os resultados com outras
pesquisas. O que é trabalho irregular ou excepcional, que levam a considerar um indivíduo como desocupado
oculto pelo trabalho precário ? Como saber se uma pessoa está inativa pelo desalento ?
Só vamos dar dois exemplos para ilustrar a complexidade do fenômeno que se pretende quantificar e da
natural fragilidade dos critérios utilizados par a sua mensuração. Na PED, um indivíduo será classificado como
estando em uma situação de desemprego oculto pelo desalento se não teve trabalho na semana de referência,
não teve procura nos últimos trinta dias, mas procurou nos últimos doze meses. Não é difícil imaginar inúmeras
situações nas quais um indivíduo nessa situação não é um desocupado oculto pelo desalento. O segundo
exemplo diz respeito à pergunta que poderia ser formulada para poder classificar um indivíduo como desocupado
oculto pelo desalento. Imaginemos que um entrevistado não está empregado e não está procurando trabalho.
Nessa situação, que pergunta realizar para saber se ele não procura emprego porque considera que as chances
de encontrar trabalho são remotas e as atividades de procura demanda recursos financeiros ? Suponha o leitor
que é colocada esta pergunta: se lhe é oferecido um emprego, você aceitaria ? Se a resposta é sim, poderia ser
classificado como desempregado oculto pelo desalento e não seria um inativo. Contudo, dificilmente alguém vai
responder a uma pergunta como essa com um “sim”. Muito provavelmente o entrevistado vai responder a essa
pergunta com outra pergunta: que tipo de trabalho ? que salário ? Ou seja, uma pergunta como a anterior (se lhe
é oferecido um emprego, você aceitaria ?) é questionável, tecnicamente frágil e dificilmente vai conseguir uma
resposta adequada.
Dessa forma, a probabilidade de situações nas quais a condição de desempregado esteja oculta pelo
desalento ou pelo trabalho precário são válidas, teoricamente pertinentes. Contudo, produzir questionários que,
nas pesquisas de domiciliares, sejam capazes de quantificar esse fenômeno é tecnicamente complexo e os
resultados são sempre polêmicos e questionáveis. Vemos assim que, não obstante o extenso consenso sobre
as múltiplas facetas que pode adquirir o desemprego, as dificuldades para construir indicadores que reflitam
essa complexidade levam, a maioria das vezes, a produzir só um indicador: o desemprego aberto.
k) Taxa de Desemprego
A taxa de desemprego é, em termos percentuais, a relação entre os desocupados e a PEA (ocupados +
desocucpados) ou os desocupados sobre os ocupados mais os desocupados. Em outros termos: que
percentual da força de trabalho está desempregada.
Logicamente, o numerador e denominador muda segundo estejamos medindo a taxa de desemprego
aberto, oculto ou total (total = aberto + oculto). A taxa de desemprego aberto será a relação, em termos
percentuais, entre os desocupados abertos e a PEA (ocupados + desocupados de forma aberta). Da mesma
forma, a taxa de desemprego oculto será a relação entre o número de desempregados na condição de ocultos
sobre a PEA (esta última definida como a soma dos ocupados mais a desocupação oculta). Por último, a taxa
de desemprego total será a relação entre o número total de desempregados (número de desempregados de
forma aberta + oculta) e a PEA (nesta caso PEA = ocupados + total de desocupados ou, alternativamente, PEA
= ocupados + desocupação aberta + desocupação oculta).
É importante considerar tão somente as taxas e não os números absolutos visto que realizar
comparações o valor pertinente é o relativo e não o absoluto. Nos EUA, por exemplo, o número de desocupados
(desocupação aberta) era, no final dos anos 90, de 6 milhões de pessoas. Na França de, “somente”, três
milhões. Contudo, a taxa de desemprego era de 11% na França e de 4% nos EUA, em função da PEA ser de

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 24 -
mais ou menos 138 milhões nesse último país e de 26 milhões na França. Tendo como referência esses
números, a questão do desemprego é mais relevante na França que nos EUA, não obstante o número de
desempregados ser largamente superior nos EUA.
Segundo os dados da PNAD/03, no caso brasileiro, dado que a PEA é de 88 milhões de pessoas e o
número absoluto de desocupados de 8 milhões, a taxa de desemprego aberto seria de 9,72 %.
l)Rendimentos: Conceitos.
Além do valor em si, os quesitos referentes aos rendimentos são de relativa importância tendo em vista
que a partir deles se calculam indicadores de indigência, pobreza e distribuição de renda, por exemplo.
As polêmicas em torno à forma de quantificar os rendimentos são bem menos amplas que no caso do
desemprego. Contudo, os indicadores de rendimentos, por outros motivos, não deixam de gerar opiniões
conflitantes. Devemos, dessa forma, analisar com uma certa atenção esses parâmetros, a fim
de tentar delimitar suas vulnerabilidades e potencialidades.
Em primeiro lugar é necessário perceber que o parâmetro referente ao rendimento tem que ter alguma
referência a sua origem. Por exemplo, o rendimento é proveniente de uma aposentadoria ou do trabalho? Em
geral, podemos classificar os rendimentos em três grandes fontes: do trabalho, dos ganhos de capital ou
aplicações financeiras e as oriundas de transferências (aposentadoria, seguro-desemprego, pensões, etc.).
Devemos perceber que um indivíduo pode acumular várias fontes de rendimentos (receber aposentadoria e ter
rendimentos do trabalho, por exemplo).
Os rendimentos cuja origem é o trabalho, em geral, são divididos entre aqueles que têm como origem o
trabalho principal e aqueles provenientes de outros trabalhos. Comumente, a referência é o rendimento mensal,
ainda que se deva ter um certo cuidado (checar em cada fonte de dados) sobre essa referência temporal. Por
outra parte, também se deve pesquisar se o rendimento refere-se exclusivamente ao salário ou estão incluídos
outros ganhos (percentual sobre as vendas, horas extras, etc.). Em geral, nos dados contidos nas pesquisas de
domicílio, a variável rendimento do trabalho (seja do principal ou dos outros) inclui o total recebido pelo
assalariado (salário contratual mais outros ganhos, como percentual sobre as vendas), sem fazer distinção.
Outro item a ser pesquisado está vinculado à inclusão ou não de certos benefícios como décimo terceiro.
Quando a coleta de informações está centrada em certos meses (dezembro, por exemplo) é conveniente que o
analista procure determinar se esses adicionais foram incluídos ou não. Por último, é necessário informar-se se
a variável se refere ao salário, ao rendimento bruto ou à remuneração líquida.
m) Rendimentos. Limitações-1.
Em geral, no caso do rendimento do trabalho, especialmente do trabalho principal, os dados apresentam
uma qualidade razoável. Todo assalariado sabe, mais ou menos, qual é o montante que recebe. Talvez, os
dados sejam mais confiáveis quando a referência é o rendimento líquido (aquele que o indivíduo realmente
recebe) e não bruto.23/
Quando a referência são as transferências, também a qualidade da informação é, em geral, razoável.
Todo indivíduo beneficiário de uma transferência (aposentadoria, por exemplo) sabe seu valor.
Contudo, nos dois casos (rendimentos do trabalho ou transferências) sempre existe a tendência (ou a
“tentação”) do indivíduo subdeclarar (declarar um rendimento inferior ao realmente percebido). Dúvidas quanto à
utilização das informações que o declarante ofereça ao entrevistador (vazamentos à receita federal, por exemplo)
ou, simplesmente, preservar a privacidade nesse tipo de dados, pode estar na origem desta tendência a
subdeclarar rendimentos. Contudo, à margem desses fatores, muito subjetivos, as declarações referentes aos
rendimentos oriundos do trabalho são, no caso dos assalariados, ou
beneficiários de transferências, no caso dos aposentados, pensionistas, etc. um dado relativamente confiável e
amplamente utilizados.
Quando as informações das pesquisas de domicílio referem-se aos ganhos financeiros ou aos
rendimentos do capital, os levantamentos são tão questionáveis que podemos sustentar que não devem ser
utilizados. O problema não surge de alguma restrição em torno aos questionários das pesquisas, com a
capacidade técnica dos órgãos que desenvolvem a pesquisa ou com os entrevistadores. Basicamente
encontramos duas origens nas limitações destas variáveis.
O primeiro consiste no próprio conhecimento do indivíduo que é entrevistado com respeito a seus ganhos
financeiros. Assim como todo assalariado tem uma noção mais ou menos exata sobre seu salário ou todo
aposentado sabe qual é o valor de sua aposentadoria, são poucas as pessoas que tem conhecimento sobre
quais foram os juros ganhos pelas aplicações da poupança ou quais seus rendimentos no mercado de ações.
Esse fato era mais notório no período de inflação elevada, quando a própria unidade de medida (a moeda
nacional) tinha seu valor rapidamente depreciado e as taxas de juros nominais eram uma somatória da correção
monetária mais os rendimentos reais.
O segundo problema vinculado aos ganhos de capital surge da própria noção de ganhos de capital.
Imaginemos um empresário que trabalha na própria firma. Ele é tanto um capitalista (proprietário de um capital e,

Page 23 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 25 -
portanto, com potenciais ganhos oriundos dessa propriedade) como um trabalhador (devido a suas tarefas de
gerenciamento e administração de sua firma). Suponhamos que os lucros líquidos dessa firma sejam de R$100
mil/mês. O nosso empresário pode fazer uma retirada de R$ 10 mil/mês e os restantes R$ 90 mil serem
reinvestidos na própria empresa. Quando perguntado qual é seu rendimento mensal ele provavelmente
responderá R$ 10 mil. Ou seja, estaremos diante de uma
importante sub-estimação dos ganhos de capital. Por outra parte, esses R$ 10 mil que ele retira podem ser
conceitualmente atribuídos a suas tarefas de administrador de sua própria empresa e não oriundos de sua
condição de capitalista. Assim, é difícil distinguir entre os ganhos provenientes da remuneração de seu trabalho
daqueles cuja origem surge de sua condição de dono da firma (capitalista).
Resumindo, podemos concluir que os ganhos de capital, seja por desconhecimento do entrevistado seja
por problema conceituais, são subestimados. Em geral, existe um procedimento, um tanto complexo
tecnicamente, que visa corrigir os rendimentos do capital das pesquisas de domicílio mediante a utilização das
informações contidas na contas nacionais.
Esse problema (subestimação dos ganhos de capital nas pesquisas de domicílio) é de relativa
importância. Todos os exercícios sobre distribuição de renda que se realizam tendo como referência os
levantamentos domiciliares devem ser olhados com um certo cuidado. Na maioria das vezes, só são
considerados os ganhos provenientes do trabalho que, pelas razões expostas nos parágrafos anteriores,
apresentam um elevado grau de confiabilidade. Nesse caso estamos diante de exercícios sobre distribuição de
renda oriunda do trabalho. Ou seja, como é distribuída a renda do trabalho entre os indivíduos que estão
ocupados. No caso de serem levadas em consideração todas as fontes (rendimentos do trabalho, transferências,
ganhos de capital, etc.) os resultados podem estar viesados dado que é nítida a subestimação dos ganhos de
capital nas pesquisas de domicílio.
n) Rendimentos. Limitações-2.
Outra limitação que pode ser relativamente importante em certos levantamentos diz respeito aos
rendimentos não monetários. Em geral, com todas as restrições já assinaladas nos parágrafos anteriores, os
rendimentos monetários, com exceção dos ganhos financeiros, são mais ou menos fáceis de serem declarados.
O problema surge quando parte desses rendimentos são em espécie. O caso mais eloqüente surge nas
populações residentes em áreas rurais, onde parte dos bens materiais que são consumidos não tem uma
mediação mercantil ou monetária e são diretamente produzidos e apropriados na própria
unidade de produção. Nesse caso, comparar os rendimentos em moeda de uma família que habita em um
grande aglomerado urbano, onde todo consumo deve ser mediado pela moeda, com outra que habita em uma
propriedade rural, na qual parte de seu consumo é auto-produção, não faz sentido, estaremos comparando
coisas incomparáveis.
Assim, ao estabelecer padrões monetários para os análises de pobreza ou distribuição de renda
podemos incorrer em sérios erros (sobre-estimação da pobreza). Tomemos um exemplo da linha de pobreza, um
divisor de águas monetário entre pobres e não pobres Logicamente, o percentual da população pobre será,
necessariamente, maior nas áreas rurais. Pode ser que esse resultado seja uma mistura de uma real situação
de privações materiais com dados de rendimentos não mediados por renda (produção para auto-consumo).
Assim, é muito provável que reduzir o divisor de águas a uma linha monetária sem contabilizar a produção para o
auto-consumo certamente levará a uma sobre- estimação do número de pobres nas áreas rurais.
As alternativas para superar ambas as limitações (sub-declaração dos rendimentos oriundos de fontes
que não sejam o trabalho e transferências e auto-consumo) consistem em pesquisas de orçamentos familiares,
onde são realizadas verdadeiras contabilidades do fluxo de rendimentos, variações patrimoniais em um período
(geralmente um ano) e consumo. Dessa forma, as pesquisas de domicílio são as fontes de dados mais
utilizadas e devemos ser conscientes das limitações assinaladas a fim de não tirar mais conclusões que as
permitidas pelas
características das fontes.
o) Rendimentos. Limitações-3.
Um terceiro elemento que limita a variável rendimento nas pesquisas de domicílio diz respeito à
não-declaração. Por diversas razões que já mencionamos em parágrafos anteriores (temor diante da
possibilidade de vazamento dos dados a órgãos de fiscalização, não conhecimento dos ganhos de capital, etc.)
indivíduos podem não declarar seus rendimentos. Se a distribuição dos não declarantes é aleatória não haveria
maiores problemas. Contudo, a ausência de declaração de certos indivíduos pode estar introduzindo um
determinado viés. Por exemplo, podem não querer declarar seus rendimentos os indivíduos de ganhos elevados
e, assim, a não declaração não terá um viés aleatório.
Neste caso, existem técnicas estatísticas de maior ou menor sofisticação que outorgam ou atribuem
rendimento a esses indivíduos que não declararam.
p) Rendimento Familiar

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 26 -
Em muitos estudos, pobreza, por exemplo, a unidade de análise relevante não é o indivíduo senão a
família. Imaginemos um adulto que ganhe R$ 500 por mês. Sua situação social e econômica será radicalmente
diferente se ele mora sozinho ou se essa pessoa integra um grupo familiar no qual ele é o chefe da família, os
R$ 500 são o único rendimento e tem, por exemplo, cinco filhos menores. Ou seja, o parâmetro relevante é o
rendimento familiar per-cápita e não o rendimento individual.
Quando se requer esse parâmetro (rendimento familiar) devemos contabilizar o somatório de todos os
rendimentos de todas as fontes de todos os membros da família e dividir esse somatório pela quantidade de
membros. A partir desse dado, é factível construir o rendimento familiar per-cápita dividindo o rendimento total da
unidade familiar (os rendimentos de todas as fontes de todos os indivíduos que integram o núcleo familiar) pelo
número de membros da família, devendo ser atribuído a cada membro esse rendimento. 24/
II.Classificação das Fontes de Dados: Registros Administrativos e Pesquisas de Domicílios.
As fontes de dados usualmente utilizadas para analisar e monitorar o mercado de trabalho podem ser
divididas em dois grandes grupos: Registros Administrativos (RAs) e Pesquisas de Domicílios.
II.1. Os Registros Administrativos.
Os RAs fazem parte dos controles e da contabilidade necessária aos órgãos para implementar ou
administrar programas ou projetos governamentais. A implementação, monitoramento e avaliação desses
programas requer uma série de informações sobre o indivíduo beneficiado (idade, sexo, etc.) que podem ser
utilizados como bases estatísticas. Entretanto, os RAs são fontes de dados que não foram imaginadas (ou, não
têm como vocação principal) disponibilizar estatísticas que possam ser utilizadas por analistas (ao menos,
analistas do mercado de trabalho). O objetivo central de um RA consiste em viabilizar a
implementação, controle e avaliação de um programa governamental. Por exemplo, os registros administrativos
do seguro-desemprego terão informações sobre sexo, idade, número do PIS ou PASEP, antigüidade no
emprego, etc. de cada beneficiado. Todas essas informações são úteis para que o Ministério do Trabalho e
Emprego possa checar a pertinência ou não de um requerente ter direito ao benefício. A partir desse conjunto de
informações, é factível imaginar a sua disponibilização a fim de ser utilizado por pesquisadores e analistas do
mercado de trabalho. Como exemplos de RAs mais usuais nos estudos sobre o mercado de trabalho podemos
citar o CAGED (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados-Lei 4923/65) e a RAIS (Relação Anual de
Informações Sociais). 25 /
Entretanto, como toda fonte de informação, os RAs têm suas vantagens e fragilidades.
A principal vantagem é, em geral, sua cobertura. Como é um verdadeiro censo (contabiliza todos os
beneficiários do programa), possibilita ter uma base de dados ampla, tanto em termos de população como de
cobertura geográfica. Assim, um RA permite que a desagregação espacial atinja o nível de Municípios, uma
alternativa que, como veremos, não é possível nos levantamentos domiciliares, dado que são amostrais e o
tamanho da amostra limita as possibilidades de desagregação.
Contudo, como base estatística para ser utilizada por um amplo publico, as desvantagens de um RA são
múltiplas, fato que os torna, em geral, secundários diante das pesquisas de domicílio. Vamos citar algumas
dessas limitações para ilustrar sobre as restrições que pesam sobre eles.
Na medida em que não foi imaginado para ser uma fonte de dados, com todos os critérios de
rigorosidade estatística que uma fonte de dados se supõe preencher, um RA pode induzir conclusões pouco
robustas. Ainda que se levem em consideração suas características ou, em outros termos, que se tenha uma
noção dos possíveis vieses da fonte, as correções das mesmas podem não estar ao alcance do usuário.
Tomemos o caso da RAIS (Relação Anual de Informações Sociais), elaborada anualmente pelo Ministério do
Trabalho e Emprego. Em tese, é um censo anual do segmento formal do mercado de trabalho (assalariados com
carteira e estatutários). Inicialmente foi concebida como instrumento para controlar os trabalhadores migrantes
internacionais. Com o tempo, foi sendo aprimorada, e hoje é tida como uma das principais fontes de informações
do mercado formal de trabalho. Contudo, não obstante ser, em tese, de caráter obrigatório para a totalidade das
firmas com vínculos formais, algumas delas não respondem. 26/ Dessa forma, se a partir dos dados da RAIS de
dois anos se pretende determinar a geração ou perda de empregos, podemos estar incorrendo em um sério erro,
dado que não sabemos em que medida esse diferencial é produto da mudança no universo que respondeu
(variação da cobertura) ou é resultado de uma verdadeira variação do emprego. Ou seja, se o objetivo do
pesquisador é quantificar a variação do emprego formal no tempo, a RAIS tal vez não seja a melhor fonte de
informação. 27/
Um segundo exemplo das limitações dos RAs está vinculado à situação econômica e social dos
indivíduos registrados. Tomemos o caso do seguro-desemprego. A partir dos dados coletados pelo Ministério de
Trabalho e Emprego, podemos ter acesso a um banco de dados que cobre todos os
requerentes e os beneficiados e variáveis sobre suas principais características (idade, sexo, faixa salarial,
escolaridade, setor de atividade, etc.). Contudo, não obstante a riqueza desse banco de dados, se o objetivo da
pesquisa requer informações sobre o entorno social de beneficiário (rendimento familiar, número de membros da

Page 25 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 27 -
família, etc.), essa fonte de dados carece de utilidade ou seus dados podem não ser confiáveis. Assim, a partir
dos RAs do seguro-desemprego não podemos determinar em que medida esse benefício social atinge a
população mais pobre ou como contribui para a redução das desigualdades. Também não podemos quantificar
em que proporção os segurados estão trabalhando ou não no mercado informal ou se estão procurando emprego
ou não.
II.2. As Pesquisas de Domicílios.
Contrariamente aos RAs, as pesquisas de domicílio são instrumentos que foram imaginados e
desenhados para serem utilizados com fins estatísticos. Dessa forma, em geral têm comparabilidade
inter-temporal (de um ano para outro) e os quesitos que são contemplados no questionário foram considerados
relevantes para estudar amplos fenômenos (ligados ao mercado de trabalho e outras áreas de estudo, como
demografia e migração, por exemplo). Os questionários, a amostra, a forma de perguntar, etc. apresentam uma
rigorosidade estatística que, em geral, gera resultados muito mais robustos, estatisticamente, que os obtidos
através dos RAs.
Inclusive, as estruturas burocráticas e o perfil dos recursos humanos que gerenciam os RAs e os
levantamentos domiciliares são qualitativamente diferentes. O perfil das instituições, e seus recursos humanos,
que desenham e implementam uma pesquisa de domicílio tem uma especialização na construção e
disponibilização de series estatísticas, visto que esse é seu objetivo principal e quase exclusivo. Contrariamente,
os RAs são desenhados e implementados em estruturas institucionais e possuem um perfil de recursos
humanos com uma formação que não necessariamente tem como objetivo primordial a construção de bases de
dados robustas estatisticamente. Tomemos como exemplo, para ilustrar essas afirmações, a RAIS. Essa é uma
fonte de dados elaborada no âmbito do Ministério de Trabalho e Emprego. A maior parte da estrutura burocrática
desse Ministério não tem como objetivo nem apresenta a formação necessária para construir bases de dados. A
Secretaria de Fiscalização, por exemplo, que tem influência no desenho do questionário da RAIS, possui como
principal tarefa zelar para que a legislação trabalhista seja cumprida. Seus recursos humanos nem tem interesse
(visto que não é seu objetivo) nem tem o perfil adequado para gerar bases estatísticas robustas. Por outro lado,
seus objetivos podem estar em conflito com a produção de bases de dados consistente. Se a RAIS é utilizada
para fins de fiscalização e as firmas possuem essa informação, muito provavelmente os empregadores não
proporcionarão informações que, ex-post, possam ser utilizadas contra si próprio. Em outros termos, ao ser
conscientes que estão transmitindo dados a um dos agentes fiscalizadores, não necessariamente as
informações terão uma aderência total com os parâmetros reais.
Como afirmamos em parágrafos anteriores, toda fonte de dados tem vantagens fragilidades e, nesse
sentido, os levantamentos domiciliares também apresentam limitações de diversas ordens. Só para fins
ilustrativos vamos a mencionar três exemplos.
Como é uma amostra, a desagregação geográfica é muito limitada, estando, em geral, restrita a grandes
divisões, como Estados, Regiões Metropolitanas, área rural/urbana, etc. As informações com nível de
desagregação municipal não são possíveis, devido ao tamanho da amostra. Ou seja, a partir das pesquisas de
domicílio não é possível desenvolver diagnósticos sobre os municípios.
Uma segunda limitação está relacionada aos quesitos contidos nas pesquisas de domicílios. Nestes,
geralmente são contempladas as variáveis mais usuais (se a pessoa trabalha ou não, se procurou emprego ou
não, o rendimento, etc.). Questões mais específicas não estão contidas seja porque é preciso por limites aos
quesitos incluídos no questionário seja porque as questões são muito recentes. Por exemplo, perguntas
vinculadas a programas sociais muito específicos, como o Abono Salarial, não estão contempladas nos
questionários. Assim, hoje, um indivíduo que tenha como objetivo pesquisar o impacto econômico e social (sobre
a pobreza ou a distribuição de renda) do programa Abono Salarial só deve contar com o RA do Ministério de
Trabalho e Emprego. 28/
Um terceiro exemplo das limitações das pesquisas de domicílio está vinculada à especificidade de
certas áreas. Tomemos o exemplo dos indicadores de saúde. Se o nosso objetivo consiste em correlacionar
aspectos da saúde da população com variáveis socioeconômicas (rendimento familiar, tipo de inserção no
mercado de trabalho, etc.) certamente o candidato natural são as pesquisas de domicílio e não os RAs do
Ministério da Saúde. Contudo, não é factível demandar aos institutos de estatística que os questionários das
pesquisas de domicílio incluam todos os anos (quando a pesquisa é anual) as perguntas
necessárias para levantar perfil sanitário da população. Estenderia muito o questionário e tem outros temas
específicos tão importantes como a saúde (migração, demografia, trabalho infantil, etc.). Ou seja, só em
intervalos de tempo prolongados (quase uma década) é possível demandar que uma pesquisa de
domicílio inclua, além das perguntas habituais, um levantamento completo para caracterizar o perfil de saúde da
população. 29/
Em resumo, cada fonte de dados tem suas potencialidades e limitações. A escolha depende dos
objetivos de cada pesquisa. Nesse sentido, o analista deverá ter um profundo conhecimento de cada base de

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 28 -
informações, as características, órgãos que as produzem e divulgam, alternativas de disponibilizarão (micro
dados, programas de computação que possibilitem seus tratamento. etc.). 30/
Dadas essas considerações, dedicaremos as próximas Seções a apresentar as principais fontes de
dados do Brasil, suas origens e características.
III. As Pesquisas de Domicílios.
III.1. A PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios).
a) As Origens.
A PNAD é uma pesquisa de domicílio implementada pelo IBGE, cuja origem remonta ao ano de 1967.
Foi idealizada sob a cobertura do Projeto Atlântida, do Bureau do Censo dos EUA, dependente do Departamento
de Comércio desse país, no marco da cooperação entre países latinoamericanos e os EUA dentro das
inter-relações propiciadas do projeto “Aliança para o Progresso”. A idéia original foi aproveitar a experiência dos
EUA e Canadá e, sob os auspícios das autoridades norte-americanas e em conformidade das recomendações
da ONU referentes à produção de estatísticas, desenvolver um fluxo de dados, nacionalmente representativo, que
possibilitasse ter informações demográficas e sócio-econômicas sobre a população e a força de trabalho entre
os censos. Ou seja, partia-se da premissa que o intervalo entre os censos (dez anos) era longo demais e, nesse
sentido, tornava-se necessário disponibilizar um fluxo contínuo (anual) de informações. Os objetivos de uma fonte
com essas características eram vários e iam desde induzir pesquisas até proporcionar uma base de dados a fim
de subsidiar as tarefas de planejamento, discurso comum aos projetos desenvolvidos nos anos 60 sob a filosofia
da “Aliança para o Progresso”.
Na sua origem, a implementação da PNAD foi um desfio metodológico visto que se pretendia
disponibilizar um conjunto de dados demográficos e sócio- econômicos a partir de levantamentos amostrais. O
objetivo original foi produzir, além desse levantamento corriqueiro sobre quesitos demográficos, de emprego e
desemprego, etc., um suplemento que cobrisse um tema específico (educação, previdência, saúde, etc.).
Nos seus inícios, a PNAD tinha uma periodicidade trimestral (iniciou-se no segundo trimestre de 1967).
Foi interrompia pelo na ocasião do Censo de 1970 e, quando retomada (quarto trimestre de 1971), sua
periodicidade tornou-se anual. O IBGE volta a suspender a PNAD nos anos de 1974 e 1975, devido às tarefas
requeridas para a implementação do ENDEF (Estudo Nacional de Despesa Familiar), uma pesquisa também
domiciliar mas que, além dos quesitos já
contemplados na PNAD, incorpora questões relativas ao orçamento e consumo das famílias. A partir daí
reinicia-se o levantamento, com interrupções nos anos dos censos (1980, 1991 e 2000) e, por falta de orçamento
do IBGE, não foi a campo no ano de 1994.
b) Cobertura.
Desde sua idealização, a vocação da PNAD foi ser uma fonte de dados que cobrisse a totalidade do
país. Inicialmente, o espaço pesquisado limitou-se ao Estado de Rio de Janeiro e, paulatinamente, a cobertura
foi ampliada até que, hoje, exceto as áreas rurais da Região Norte, os dados têm uma abrangência nacional. 31/
Nas suas origens, anos 60, foi imaginado que uma amostra de 10 mil domicílios seria suficiente para produzir
indicadores confiáveis para a totalidade do território. Contudo, as crescentes demandas por desagregações e o
aumento na agrangência territorial rapidamente resultaram na necessidade de uma elevação da amostra, que
passou de 30 mil domicílios (no plano amostral original) para 110 mil domicílios em 1982 (550 mil pessoas)
chegando a 116 mil domicílios em 1999 (352 mil pessoas). Contudo, não obstante esse crescimento, hoje, só é
possível realizar uma desagregação que permite obter dados a nível de Estado, Regiões Metropolitanas e Áreas
Rural/Urbana. O tamanho da amostra não permite que a desagregação atinja o nível de Municípios. 32/
c) Estrutura da Pesquisa.
Basicamente, a PNAD pode ser dividida em dois grandes blocos: um sobre questões referentes aos
domicílios e outro que abrange os indivíduos.
As questões referentes aos domicílios têm como unidade de pesquisa a unidade domiciliar e os quesitos
levantados visam caracterizá-la em aspectos tais como: tipo de domicílio (casa, apartamento, cômodo, etc.);
material predominante nas paredes externas; número do cômodos, se o domicílio é próprio, alugado, etc.; se o
domicílio tem água canalizada; se tem banheiro ou sanitário; se tem esgoto, se tem telefone, etc.
O outro bloco está constituído pelos dados referentes às pessoas. Nele são pesquisadas questões
vinculadas às características do indivíduo (sexo, idade, condição na família, raça, etc.), sua inserção no núcleo
familiar (chefe ou pessoa de referência, conjugue, filho, etc.), educação (se sabe ler ou não, se freqüenta escola
ou creche, etc.), ocupação e rendimentos oriundos do trabalho (se está ocupado, se procurou trabalho,
rendimentos, tipo de inserção no mercado de trabalho, etc.), outros rendimentos (aposentadoria, juros, etc.). 33/
Esses dois blocos constituem a pesquisa básica que, periodicamente, é complementada com um
questionário especial ou suplemento, que trata de temas especiais. Esses suplementos são de singular
importância para acompanhar no tempo a trajetória de certos aspectos vinculados a questões demográficas,
mercado de trabalho, políticas públicas, etc.. 34/ Os suplementos foram os seguintes: 1981 (saúde); 1982

Page 27 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 29 -
(educação); 1983 (mão-de-obra e previdência; 1984 (fecundidade); 1985 (situação do menor); 1986
(anticoncepção, acesso a serviços de saúde, suplementação alimentar e associativismo); 1988 (participação
político-social); 1989 (trabalho); 1990 (trabalho); 1992/93/95 (migração,
nupcialidade e fecundidade); 1994 (mobilidade social); 1997 (nenhum suplemento); 1998 (saúde); 1999 (nenhum
suplemento); 2001 (trabalho infantil); 2001 (nenhum suplemento) e 2003 (saúde e programas sociais vinculados á
educação).
d) Vocação da PNAD, análises estruturais e as pesquisas mensais.
A PNAD é uma pesquisa cuja vocação é subsidiar diagnósticos que tenham um caráter mais estrutural
que conjuntural. Um levantamento domiciliar, de abrangência nacional e com uma leque amplo de questões, que
vão desde dados de domicílio, passam por uma pormenorizada pesquisa dos indivíduos e chega a considerar
temas muito específicos e diversos em cada ano, constitui um ferramenta extremamente relevante para o
sistema estatístico de um país mais dificilmente possa ser imaginada para ser um instrumento de
monitoramento de curtíssimo prazo do mercado de trabalho. 35/ Em um país com características continentais
como o Brasil, um levantamento da abrangência territorial como a PNAD e a diversidade de dimensões que são
pesquisadas requer tantos recursos humanos e financeiros que dificilmente possa ser imaginada para avaliar o
desempenho do mercado de trabalho no curtíssimo prazo. Assim, convivem com um levantamento como a
PNAD outras fontes, inclusive produzidas pelo próprio
IBGE, que também são pesquisas domiciliares, de natureza amostral, contínuas mas que são mensais. Esta
periodicidade (mês) possibilita um monitoramento conjuntural (de curtíssimo prazo). Logicamente, a abrangência
espacial e os quesitos levantados são de muita menor abrangência que na PNAD, o que implica em menores
custos e maior agilidade na sua divulgação.
Contudo, não obstante essa vocação da PNAD por ser uma fonte com perfil para subsidiar estudos e
diagnósticos de caráter estrutural, a comparabilidade inter-temporal de seus dados deve realizar-se de forma
muito criteriosa. Dois aspectos tendem a reduzir as possibilidades de comparação dos indicadores no tempo. O
primeiro diz respeito às mudanças no questionário no tempo. Inclusive alterações na abrangência das perguntas
ou a ordem das mesmas podem originar resultados pouco propícios para comparação. O segundo aspecto está
vinculado aos coeficientes utilizados para expandir a amostra. Como já mencionamos, a PNAD é uma amostra
e, para obter valores absolutos, o IBGE proporciona fatores de expansão. Esses parâmetros que possibilitam
encontrar valores absolutos a partir de dados amostrais surgem dos valores dos censos e das projeções de
população. Como essas projeções nunca são exatas, na ocasião de um censo se faz uma revisão da projeção,
corrigindo-a, e, assim, esses fatores são corrigidos. Sucede que o IBGE nem sempre corrige os fatores de
expansão para todos os anos entre os censos. Dessa forma fica comprometida a comparabilidade em longos
período (10 anos, por exemplo). 36/
Dentro desses levantamentos com periodicidade mensal, caráter amostral e levantamento domiciliar, as
mais importantes são a PME (Pesquisa Mensal de Emprego), produzida pelo IBGE e a PED (Pesquisa de
Emprego e Desemprego), realizada pela Fundação SEADE (Sistema estadual de Análise de Dados), de São
Paulo, o DIEESE (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio- Economicos). Nas duas próximas
Seções vamos nos deter a analisar com um certo cuidado ambas bases de dados. Justificar essa eleição não é
relativamente complexo. Tanto a PME como a PED são as pesquisas que normalmente (mensalmente, para ser
mais exatos) divulgam as taxas de desemprego que são referência tanto para avaliar o mercado de trabalho
como a própria política macroeconômica. Sua utilização tanto pelo grande público como por especialistas é
enorme sem que, muitas vezes, se entenda bem o significado e alcance dos parâmetros que são divulgados. As
comparações entre os indicadores da PME e a PED deixa a desejar e alimenta polêmicas que, na maioria dos
casos, são estéreis. Por outra parte, a PME e a PED foram vistas, por muitos anos, como pesquisas “rivais”,
que concorriam entre si. História, formas de interpretação sobre o funcionamento do mercado de trabalho e, até,
disputas políticas e ideológicas alimentaram essa “concorrência”. Esses fatores tornam necessário que,
qualquer pesquisador ou analista do mercado de trabalho no Brasil , entenda a singularidade de cada uma
dessas pesquisas, os principais indicadores que produz, sua história e as limitações dos indicadores. Na
análise que desenvolveremos nos próximos parágrafos nosso objetivo é tratar esses temas sem, contudo,
pretender esgotá-los. O leitor deve interpretar sua leitura como uma primeira aproximação a um tema
relativamente complexo e especializado. 37/
III.2. PME (Pesquisa Mensal de Emprego).
a) As Origens e Mudanças no Tempo.
A PME foi implementada pelo IBGE em 1980 em seis das mais importantes regiões metropolitanas
(Belo Horizonte, Porto Alegre , Salvador, São Paulo, Recife e Rio de Janeiro). 38/ No ano de 2001/02 foram
introduzidas grandes alterações metodológicas que levaram a uma ruptura da série. 39/ Assim, hoje temos duas
séries da PME que, pela amplitude das mudanças metodológicas, produzem indicadores que, na maioria das
vezes, são incomparáveis. A Antiga PME (APME) abrange o período desde o início do levantamento até

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 30 -
dezembro de 2002. A Nova PME (NPME) tem indicadores desde outubro de 2001 até hoje. Existe um período de
transição (de outubro de 2001 a dezembro de 2002) no qual o IBGE produziu indicadores para ambas as séries a
fim de permitir aos usuários comparar os resultados de uma e outra metodologia e tratar de identificar a origem
da distância entre ambos.
Tanto a NPME como a APME tentam realizar um levantamento, mensal, dos principais indicadores do
mercado de trabalho. A abrangência delas é bem mais limitada que a PNAD em termos de quesitos a serem
pesquisados e o centro ou objeto principal (quase exclusivo) da pesquisa é o trabalho e todos os temas que têm
vinculação com ele ou que se definem a partir dele: características individuais que exercem influência no tipo de
inserção (sexo, idade, educação, etc.), inatividade, rendimento, setor de atividade, etc..
Um aspecto relativamente importante está correlacionado com a abrangência geográfica da PME (tanto
da antiga como da nova). O levantamento está restrito às principais aglomerações urbanas e, portanto, é uma
pesquisa que subsidia o monitoramento do mercado de trabalho nos grandes centros urbanos. Por que essa
menção a sua cobertura espacial é de crucial importância ? Porque podem existir diferenças entre a evolução
dos indicadores nessas áreas metropolitanas e no “interior”. Vamos dar um exemplo. No transcurso de 2003, a
taxa de desemprego tendia a aumentar. Essa trajetória foi explicada pelo baixíssimo desempenho do PIB, que
acabou esse ano com aumento de só 0,5%. Contudo, não obstante um dinamismo médio muito modesto, certos
ramos de atividade, como o agro-negócios, evidenciavam uma performance relativamente destacável, devido ao
valor adquirido por um conjunto limitado de variáveis externas (preço das commodities) e internas (taxa de
câmbio muito desvalorizada). Nessas circunstâncias, um perfil setorial particular poderia estar tendo
desdobramentos espaciais e o Governo sustentava que os dados da PME não podiam ser interpretados como
representativos da média nacional, dado que não chegavam a captar o dinamismo do interior do Brasil. Não
vamos entrar no mérito da pertinência das argumentações governamentais. O ponto que desejaríamos destacar é
que sempre o pesquisador ou analista tem que ser consciente da referência espacial de uma pesquisa. Se o
levantamento não é nacional, realizar extrapolações para a integralidade do território a partir de amostras
restringidas no espaço pode não ser plausível, dado que dinâmicas geográficas diferentes podem singularizar
uma conjuntura, possibilidade particularmente válida em países com extensos territórios como é o caso do
Brasil. Nesse sentido, quando, por exemplo, se estuda a taxa de desemprego proporcionada pela PME, deve
ficar bem claro que o indicador está restrito à taxa de desemprego do Brasil Metropolitano. 40/
b)Principais Características da Antiga PME (APME).
A antiga PME continha 28 perguntas em seu questionário. Poucas estavam relacionadas com o
domicílio (quantidade de total de pessoas, quantidade total de pessoas com 10 anos ou mais, espécie do
domicílio (particular ou coletivo)) e poucas, também, sobre as características individuais das pessoas (sexo,
idade, condição no domicílio (chefe, conjugue, etc.), escolaridade). Depois dessa identificação, a principal
questão estava associada a distinguir aqueles que faziam parte do mercado de trabalho (PEA) daqueles que não
faziam parte (inativos). Todas essas questões eram pesquisadas para os indivíduos com 10 anos ou mais, ainda
que os indicadores proporcionados na hora da divulgação se restringia a indivíduos com 15 anos e mais. 41/
A referência temporal de todas as questões era a semana. Se a pessoa estava exercendo algum
trabalho era classificada como ocupada. 42/ Se a pessoa não estava exercendo nenhum trabalho mas tomou
algum tipo de iniciativa para encontrar algum era incluída dentro dos desocupados. 43/ Em caso contrário (não
trabalhou nem procurou de trabalho) a classificação era de inativo. No tocante aos ocupados, a APME levantava
dados sobre o setor de atividade, o tipo de ocupação (por exemplo cozinheiro, garçom, motorista, etc.), posição
na ocupaçãoempregado, conta própria, empregador, não remunerado), no caso de ser empregado se tinha ou
não carteira de trabalho assinada, horas efetivamente trabalhadas na semana, rendimento em dinheiro, etc.
c) A polêmica em Torno à APME.
Os resultados obtidos a partir da metodologia da APME foram motivo da polêmica. A taxa de
desemprego era o principal parâmetro que gerava as divergências. Segundo a APME, o percentual da PEA que
procurava trabalho era reduzido. Tomemos vários exemplos. O ano de 1983 foi recessivo, resultado de um
profundo ajuste macroeconômico diante das severas restrições externas,com um saldo de -2,93% no PIB.
Nesse contexto, a taxa de desemprego segundo a APME atingiu 6,70 %, um percentual que seria
extremamente baixo quando levamos em consideração o ambiente recessivo. Contrariamente, em 1985, quando
a fase do ciclo já era ascendente (+7,85% de aumento do PIB), o percentual de desempregados chega a 5,25%
e cai mais ainda em 1986 (Plano Cruzado), chegando a 3,59%. Devemos perceber que uma taxa de desemprego
com a observada em 1986 pela APME indica uma situação de escassez de mão-de-obra. Em 1990 o Brasil viveu
outro grande processo recessivo, produto do Plano Collor I, que congelou a maioria dos ativos financeiros. O PIB
chegou a cair -4,36%. O percentual de desemprego calculado pela APME registrou um patamar de 4,28 %. Em
termos gerais, a taxa de desocupação era relativamente baixa (ver Gráfico I), especialmente quando a referência
é a situação dos países Europeus na época. 44/ Parecia existir uma contradição entre a percepção cotidiana em
torno à situação social do país e as taxas de desemprego divulgadas pelo IBGE.

Page 29 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 31 -
Gráfico I
Taxa de Desemprego na Antiga Pesquisa Mensal de Emprego
(1982/2002)
A principal crítica centrava seus argumentos na suposta inadequada opção metodológica quando a
referência são os mercados de trabalho dos países subdesenvolvidos. 45/ Teoricamente, em um país com uma
proteção social muito restrita, como é o caso do Brasil, permanecer em uma situação de desemprego
aberto seria um “privilégio” do qual só poderiam usufruir aqueles com recursos suficientes para “auto-financiar-se”
a sobrevivência e os custos associados à procura de emprego. Contrariamente, nos países desenvolvidos, com
uma proteção social ampla, o desempregado poderia permanecer nessa situação dado
que contaria com um generoso seguro-desemprego. Nesse caso, a alternativa era ou assalariado ou
desempregado. Em economias como a brasileira, a ausência de uma proteção financeira (seguro-desemprego)
levaria ao individuo desocupado a aceitar empregos precários para sobreviver até encontrar um posto de trabalho
estável ou a desistir de procurar emprego dado que não teria os recursos capazes
de financiar as atividades vinculadas à procura de emprego.
Dessa forma, o desemprego aberto seria só “parte” do desemprego. Dentro dessa perspectiva crítica, os
países sub-desenvolvidos deveriam criar categorias teóricas próprias e as correspondentes formas estatísticas
de quantificá-las, que refletissem a sua singularidade. Esta polêmica permeou toda a década de 80 e 90. A PED
foi fruto dessa tentativa de gerar bases de dados com categorias particularmente adaptadas ao contexto das
regiões em desenvolvimento. 46/ O IBGE, amparado nas diretrizes e práticas dos países mais avançados e em
certas diretrizes de organismos internacionais, continuou com sua metodologia não obstante as periódicas
críticas (especialmente em períodos de desaquecimento do nível de atividade) direcionadas aos resultados que
divulgava.
O contexto mundial ou, mais especificamente, o funcionamento do mercado de trabalho nas regiões
mais desenvolvidas, começou a verificar imperceptíveis mudanças já nos anos 80 e que na década posterior se
tornariam evidentes ou incontestáveis. A dicotomia excludente assalariado/desocupado perde importância.
Formas de inserção denominadas de precárias (trabalho autônomo, trabalho não-registrado, emprego a tempo
parcial, emprego temporário, etc.) ganham crescente importância na geração de novos postos de trabalho.
Poderíamos dizer que o mercado de trabalho nas nações desenvolvidas vai adquirindo um perfil mais semelhante
ao historicamente verificado nas áreas subdesenvolvidas do planeta. Essa alteração do ambiente gerou uma
série de esforços que visavam identificar novas formas de inserção e tratar de quantificá-las mediante adequadas
categorias estatísticas. 47/ As recomendações dos organismos internacionais tendem a sugerir a produção de
estatísticas que visem definir e quantificar o sub-emprego e suas variantes (sub-emprego vinculado à duração do
trabalho, sub-emprego por trabalho inadequado com o perfil do indivíduo, etc.) e o desemprego oculto. Nessas
circunstâncias, o IBGE inicia um projeto a fim de alterar a metodologia da PME e, em 2001, leva a campo um
novo questionário que dará origem á denominada Nova PME (NPME).
d) A Transição.
A forma de transição entre a APME e a NPME realizada pelo IBGE foi um exemplo de como deve ser
administrada uma alteração metodológica que, posteriormente, impossibilitará a comparabilidade. O IBGE
começou a levantar dados com a nova metodologia, de forma experimental, em setembro de 2001, e de forma
sistemática em outubro de 2001, primeiro em 5 áreas (exceto Salvador) e, a partir de março de 2002, a mesma
cobre os seis grandes aglomerados urbanos historicamente pesquisados. No transcurso dessa implementação
continuaram sendo levantados e publicados dados segundo a antiga metodologia.
Aliás, só eram divulgados os resultados obtidos pela antiga metodologia, dado que a nova estava em fase de
desenvolvimento e só os técnicos do IBGE conheciam os indicadores. Em janeiro de 2003, finalmente, o IBGE
divulga a série com a nova metodologia e seus resultados puderam ser comparados com a APME, dado que
agora o público possuía as duas séries e seus indicadores entre outubro de 2001 e dezembro de 2002. O IBGE
fez uma ampla divulgação das duas séries (APME e NPME) e esforçou-se por identificar as fontes das
discrepâncias. Ao escolher esse procedimento ficou transparente a impossibilidade de comparar os parâmetros
produzidos pelas duas metodologias. 48/ A alternativa escolhida de divulgação enfatizou a transparência e inibiu,
especialmente por parte do público não especializado, realizar comparações entre parâmetros que, vista a
alteração metodológica, são incomparáveis. 49/
e) A NPME.
Assim, o novo dado mensal que tenta monitorar as flutuações e tendências do mercado de trabalho a
partir de dezembro de 2002 é a NPME. Esta pesquisa vai ao encontro da metodologia adotada pela PED, das
críticas que eram direcionadas a seus conceitos, às recentes recomendações emanadas de
organismos internacionais (como a OIT) e às próprias opções nos levantamentos realizados nos países mais
desenvolvidos.
A NPME, ao tratar de adequar sua metodologia a um mercado de trabalho que se imagina muito mais

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 32 -
complexo que o sugerido pela dicotomia excludente ocupado/desocupado, necessariamente se tornou mais
complexa. Das 28 questões encontradas no antigo questionário agora se passa para 68.
Podemos dividir as alterações em dois grandes grupos. O primeiro é quase de forma ou de divulgação e
outras mudanças são de conteúdo.
As modificações de forma ou divulgação dizem respeito, por exemplo, à idade mínima utilizada para
calcular os parâmetros a serem divulgados, que passou de 15 anos e mais (na APME) para 10 anos e mais (na
NPME). Outro quesito diz respeito ao período de referência para a procura de emprego, que antes era de 7 dias
e agora é de 30 dias. Mas, também neste caso, a questão é de divulgação, dado que na APME também era
pesquisado o período de 30 dias.
Outras mudanças são de conteúdo e foram incorporadas tentando sofisticar a pesquisa. O desemprego
oculto pelo desalento que antes não era pesquisado agora é tratado de ser quantificado. O indivíduo que realiza
trabalho voluntário antes era considerado como ocupado já não o é mais. Na APME, tanto o trabalho não
remunerado como o remunerado exigia um tempo mínimo de 15 horas por semana para ser considerado
atividade econômica. Na NPME esse mínimo caiu para 1 hora. Antes, as horas trabalhadas e os rendimentos
eram considerados unicamente os efetivamente verificados, sendo que agora se faz uma diferenciação entre o
efetivo e o habitual. A disponibilidade para exercer um trabalho na pessoa desocupada que antes não era
pesquisado agora é. Um trabalhador voluntário antes era considerado ocupado e na NPME não. 50/
Seja por alterações na forma de divulgação seja por mudanças no conteúdo, o certo é que as taxas
mensais de desemprego disponibilizadas ao público sofrera uma notória alteração, passando de patamares de
6/7%, na APME, para níveis em torno a 11/12% (ver Gráfico II). 51/
Gráfico II
Taxas de Desemprego na Antiga e na Nova PME
III.3. A PED (Pesquisa de Emprego e Desemprego).
a) As Origens.
A PED, a semelhança da PME, é um levantamento domiciliar por amostra probabilística. A sua
metodologia é fruto de uma cooperação entre o DIEESE (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos
Sócio-Economicos) e a Fundação-Seade (Fundação Sistema Estadual de Análises de Dados) e sua
implementação nas UFs surge de parcerias com distintas instituições estaduais. 52/ Iniciou-se na região
metropolitana de São Paulo em 1985 e hoje (2005), além desse grande aglomerado urbano, ela é implementada
em Brasília (1992), Porto Alegre (1992), Belo Horizonte (1995), Salvador (1996) e Recife
(1997). 53 /
Quando teve início a PED (1985), a PME já estava mais ou menos consolidada como fonte de pesquisa
para monitorar a flutuação e tendência, no curto prazo, dos principais indicadores do mercado de trabalho. Como
as duas são levantamentos muito similares, a pergunta é mais ou menos natural: porque
foi imaginada a PED se já existia uma outra pesquisa com quase idêntica vocação ?
Basicamente, as causas são duas.
A primeira se nutre de uma discordância conceitual com respeito à APME. Como já afirmamos na
Seção II deste Capitulo, existia uma corrente teórica que identificava nos mercados de trabalho dos países
subdesenvolvidos uma dinâmica peculiar, que os diferenciava daquela verificada nas regiões economicamente
mais avançadas. 54/ Em países como o Brasil, as formas de inserção no mercado
de trabalho seriam mais complexas e diversificadas que nas regiões desenvolvidas e, nesse sentido, supor que a
dicotomia fosse assalariado formal/desocupado seria um reducionismo inadequado. Nesse sentido, deveriam ser
realizados levantamentos a partir dos quais seria factível construir indicadores que refletissem essa diversidade.
O ponto central da divergência estava relacionado com as formas de medição do desemprego. O desemprego
aberto, indivíduos não ocupados e procurando trabalho, seria uma das formas que poderia adquirir a falta de
oportunidades de emprego. Na ausência de fontes de
ajuda financeira a trabalhadores desempregados certos trabalhadores seriam obrigados a procurar formas
mínimas de renda em empregos precários (temporários, a tempo parcial, etc.) ou, no limite, a inibir qualquer
atividade de busca dada a pouca probabilidade de encontrar uma ocupação diante dos
recursos que essas atividades de procura demandam.
Dessa forma, teríamos duas formas de desemprego: o aberto e o oculto. O desemprego oculto estaria
dado pelo desalento (indivíduos que desistiram de procurar trabalho por ser uma tarefas com remotos resultados
positivos) ou oculto pelo trabalho precário. O desemprego total seria a soma do desemprego aberto e do
desemprego oculto.
A segunda causa que alimentou o desenvolvimento de uma pesquisa paralela à PME foi de cunho mais
político. Nos anos da ditadura, o IBGE foi em diversas ocasiões acusado de manipular suas estatísticas,
especialmente as referidas à inflação. Essa relação quase simbiótica entre o IBGE e o poder de turno alimentava
lógicas suspicácias sobre a isenção das estatísticas por ele produzidas. Por outra parte, como não existiam

Page 31 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 33 -
outras instituições produtoras de estatísticas além do IBGE, não se dispunha de parâmetros de controle.
Nesse contexto, tanto por aspectos conceituais ou teóricos como por razões vinculadas à questões
democráticas da sociedade nessa época, setores oriundos do mundo sindical junto com a Fundação SEADE
tiveram a iniciativa de criar e implementar uma outra pesquisa, que veio a ser “concorrente” com a “oficial”.
Quando os resultados começaram a ser publicados, as suposições sobre uma suposta inadequação conceitual
e/ou suposta manipulação dos dados por parte do IBGE pareciam ter-se confirmado. Em 1986, por exemplo, a
taxa média de desemprego da APME foi de 3,59%, sendo o percentual da população desocupada calculada pelo
DIEESE de (6,1% taxa de desemprego aberto e 9,8%
a taxa de desemprego total). Contudo, a partir dessa distância não seria prudente sustentar uma imaginária
manipulação dos dados pelo IBGE e/ou uma suposta fragilidade conceitual, visto que essa comparação não é
sustentável devido, principalmente, a três motivos.
Em primeiro lugar, existiam profundas diferenças metodológicas entre a APME e a PED que
inviabilizavam qualquer comparação. Para citar só algumas, os dados publicados pelo IBGE tinham em
consideração os indivíduos com 15 anos e mais sendo o universo de referência da PED as pessoas com 10
anos e mais. O período de referência da PED eram os 30 dias e a semana no caso da APME. Ou seja,
comparar os indicadores que surgem de ambas as fontes é mais ou menos o mesmo que pretender comparar a
temperatura de uma cidade cuja unidade de medida é graus Celsius e com outra cujas medições são realizados
em graus Fahrenheit. Carece de qualquer sentido.
O segundo fator que impossibilitava uma comparação diz respeito ao tipo de desemprego que cada fonte
divulgava. Os dados publicados pelo IBGE se referiam ao desemprego aberto (aliás, só podia se referir a esse
tipo de desemprego porque era o único que calculava). Os dados da Fundação SEADE/DIEESE, usualmente
utilizados na comparação, continham o desemprego oculto. Não obstante poder ser desagregado esse
percentual entre desemprego aberto e oculto e a comparação entre ambas as pesquisas restringir-se à forma
aberta de desocupação, normalmente se comparava o desemprego aberto da APME com o desemprego total da
PED. Ou seja, se voltavam a comparar indicadores incomparáveis.
Por último, a terceira fonte que tornava os esforços de comparabilidade estéreis e improcedentes está
centrada na cobertura geográfica. Por uma questão de peso natural, a PED mais difundida era a relativa à região
metropolitana de São Paulo, cujos indicadores que eram comparados com a média das seis regiões da APME.
A PED nunca produziu uma média para todas as regiões metropolitanas nas quais era desenvolvido o
levantamento e a de maior peso “gravitacional” sempre foi, na divulgação pelos grandes meios de comunicação,
a PED/São Paulo. Mesmo que fosse tentada uma média para todos os grandes aglomerados urbanos
pesquisados pela PED, dado que a base geográfica do levantamento não coincidia com aqueles cobertos pela
pesquisa mensal do IBGE, ainda nessa hipótese a incomparabilidade permanecia.
b) Benefícios e Custos de Pesquisas Concorrentes.
Vemos, assim, que no país conviviam duas pesquisas com características muito semelhantes (ambas
são levantamentos domiciliares, a periodicidade é mensal, a técnica é amostral, etc.) que divulgavam dados que
visavam representar ou mesurar fenômenos vinculados ao mercado de trabalho. Essa convivência ou
concorrência tinha custos e benefícios.
Em termos de custos, o principal sempre foi a desorientação que induzia na população a divulgação de
dois dados sobre desemprego que pareciam representar universos diferentes. Assim, em um dia, os jornais
divulgavam que a taxa de desemprego foi, em tal mês, de, imaginemos, 7%. Esse era a divulgação realizada
pelo IBGE. Nos próximos dias, o mesmos jornais, informavam que a taxa de desemprego, nesse mesmo mês,
tinha sido de, suponhamos, 16%. Ainda que ambos indicadores não fossem comparáveis pelas razões que já
mencionamos em parágrafos anteriores, o público, em geral, comparava e ficava naturalmente confuso. Qual
seria a “verdadeira” taxa de desemprego ? Como o percentual de desocupação era largamente superior na
metodologia SEADE/DIEESE, não era inusual atribuir ao IBGE uma metodologia “incorreta” ou, simplesmente,
supor uma manipulação dos dados. Nesse sentido, a convivência de dois indicadores com tamanha diferença,
como era a taxa de desemprego na APME e na PED, tinha custos, em termos de desorientação do público e de
desqualificação de alguma das duas instituições que geravam os resultados dessas fontes.
O aspecto benéfico está correlacionado com a existência de um parâmetro produzido por um órgão
não-estatal para monitorar a conjuntura. Existe um latente conflito entre os objetivos daqueles que
transitoriamente ocupam o poder e a produção de estatísticas. Sempre vai existir uma natural tendência, por
parte dos governos de turno, a apresentar as estatísticas de forma a beneficiá-los ou a denegrir seus opositores.
No limite, a produção de indicadores pode até ser manipulada. A influência do poder político sobre a produção
das estatísticas desenvolvidas no âmbito estatal vai depender do grau de democratização do poder, do controle
por parte da sociedade civil, da independência institucional e legal dos órgãos produtores de estatísticas, etc..
Esses fatores ampliam ou restringem a influência dos governos sobre os produtores de indicadores. Justamente,
um dos elementos para reduzir o poder discricionário dos governos é a existência de entidades autônomas que

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 34 -
gerem indicadores que “concorram” com as séries oficiais. Nesse sentido, a implementação da PED em meados
dos anos 80 pode ser interpretada como mais uma manifestação do movimento de democratização do país ou
da multiplicação de entidades autônomas no seio da sociedade civil que contribuíram para o controle das ações
no âmbito do estado.
c) Principais Características da PED.
Metodologicamente, a PED é uma pesquisa domiciliar amostral cujos resultados divulgados para um
determinado mês são, em realidade, médias móveis trimestrais. A PIA é definida a partir das pessoas com 10
anos e mais (como passou a ser considerada nos dados divulgados na NPME).
O principal indicador da PED (ou, ao menos, o que gerou mais polêmicas com a APME) é o referente ao
desemprego. O desemprego aberto é considerado a partir da efetiva procura de trabalho no últimos 30 dias
daqueles indivíduos que não tinham nenhuma ocupação.
Se agrega a esse cálculo de desemprego aberto o desemprego oculto. Este tipo de desemprego é a
soma do desemprego oculto pelo desalento (o indivíduo que não teve trabalho na semana nem nos últimos trinta
dias mas realizou atividades de procura nos últimos doze meses) e do desemprego oculto pelo trabalho precário
(indivíduos que estavam auto-ocupados ou não remunerados em empreendimentos de parentes ou família de
forma descontinua e irregular e tomaram efetivas providencias para procurar empregos nos 30 dias ou nos 12
meses anteriores á pesquisa). 55/
Podemos concluir, assim, que a PED constitui uma tentativa de materializar uma perspectiva teórica que
visualiza formas de inserção que estão associadas a estratégias de sobrevivência e não podem ser classificadas
como sendo um emprego no sentido intuitivo do termo. O desemprego tona-se, dessa forma, um fenômeno mais
complexo que vai além de uma situação de não-trabalho e da simultânea procura do mesmo. Em realidade, hoje,
diferentemente do período anterior aos anos 90, dificilmente alguém vai questionar essa perspectiva. Depois da
elevação dos patamares de desemprego na maioria dos países a partir dos anos 80, inclusive dentro das regiões
mais desenvolvidas, existe uma tendência em demandar às pesquisas domiciliares um perfil que permita
qualificar melhor a situação de emprego, sub-emprego e desemprego. A grande questão não está mais nessa
perspectiva abstrata ou conceitual senão na forma de mensurar esses fenômenos. Vamos dar um exemplo.
Imaginemos um indivíduo que esteja trabalhando de forma temporária, por dois meses. Esse indivíduo, poderia
ser classificado como desocupado oculto pelo trabalho precário ou um sub-empregado devido a uma inserção
precária ? Depende. Poderia ser factível que essa pessoa seja um chefe de família e esteja desejando um
trabalho por tempo completo. Nesse caso, um emprego temporário pode ser classificado como uma situação de
desocupação oculta ou de sub-emprego. Contudo, se esse indivíduo é um estudante que procurou um emprego
por um período determinado (suas férias) a fim de poupar dinheiro, a situação certamente não será de
desemprego oculto ou de inserção precária. Assim, a pergunta sobre a situação deveria ser complementada por
outra a fim de saber se a situação é desejável ou não ou se esse indivíduo estaria disposto a aceitar outro tipo
de trabalho. 56/ Logicamente, a pergunta sobre os desejos do entrevistado envolve um grau de subjetividade não
desprezível. O leitor deve perceber que é extremamente distinto um quesito que coloque uma questão objetiva
(teve algum trabalho na semana x?) que demandar uma opinião ou desejo (desejaria trabalhar além das horas
trabalhadas ?). Ante a impossibilidade de encontrar uma ocupação como a desejada, um indivíduo, por uma
questão de defesa subjetiva, pode responder que não deseja essa alternativa.
Esse é um exemplo da complexidade de transpor a distância que vai de um marco conceitual a uma
pesquisa que quantifique categorias que surgem desse paradigma analítico. A dificuldade dessa transição é
particularmente válida para certas categorias, como desemprego oculto e sub-emprego. Justamente, por essa
dificuldade muitas instituições e analistas tendem a utilizar só o indicador “desemprego aberto”. Mesmo o IBGE,
com a NPME, não obstante a mesma possibilitar a construção de estatísticas que levem em consideração o
desemprego oculto, a divulgação está centrada no desemprego aberto.
d) A Convergência entre a NPME e a PED.
Com as modificações introduzidas na NPME (idade mínima, período de referência, etc.) as distâncias
entre o desemprego aberto da NPME e da PED foi reduzido dramaticamente. Tomando como referência a região
metropolitana de São Paulo, por exemplo, no ano de 2003 a taxa de desemprego aberto foi de 14,1% na NPME
e de 12,7% na PED. Paradoxalmente, dado que antes (na comparação entre a APME e a PED) o percentual de
desocupados (desocupação aberta) era largamente superior na PED, agora seus resultados são inferiores aos
obtidos na NPME.
Entretanto, continuam válidas as mesmas considerações que mencionamos anteriormente. Não
obstante as metodologias entre a NPME e a PED se aproximarem, a comparabilidade entre ambas deve ser
muito criteriosa. Não é válido comparar o desemprego total da PED com o desemprego divulgado pela NPME. A
média dos seis grandes aglomerados urbanos da NPME não pode ter como parâmetro de comparação a PED de
uma região metropolitana ou a média das regiões metropolitanas pesquisadas por esta última, dado que as
coberturas geográficas são diferentes. 57/

Page 33 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 35 -
Vale mencionar, porém, que as grandes polêmicas que se observaram no transcurso dos anos 90
arrefeceram muito a partir da adoção, pelo IBGE, da uma nova metodologia para a PME em 2002.
IV. Os Dois Principais Registros Administrativos: RAIS e CAGED. 58/
Nos próximos parágrafos analisaremos com particular atenção os dois principais RAs que permitem
monitorar o mercado de trabalho: a Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) e o Cadastro Geral de
Empregados e Desempregados (CAGED). 59 / Em ambos os casos, identificaremos suas origens, mudanças no
tempo, potencialidades e limitações. Tanto a RAIS como o CAGED são RAs gerenciados pelo Ministério do
Trabalho e Emprego (MTE) e a cobertura está restrita ao mercado formal de trabalho (assalariados celetistas, no
caso do CAGED e estatutários e celetistas, no caso da RAIS). 60/
IV.1. Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED-Lei 4923/65).
a) As Origens.
Em 23 de dezembro de 1965, mediante a Lei Nº 4923, todos os estabelecimentos com assalariados
cujos contratos de trabalho fossem regidos pela CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) ficaram obrigados a
informar ao Ministério do Trabalho, de forma mensal, toda movimentação (admissões e/ou desligamentos) de seu
quadro de pessoal. 61/ O prazo limite para informar seria até o dia 15 do mês subseqüente. Observemos que
esse registro tem um caráter censitário do fluxo, dado que toda e qualquer movimentação deveria ser informada.
Basicamente, o objetivo deste RA era, além de subsidiar o desenvolvimento de medidas contra o desemprego,
viabilizar a implementação de um seguro-desemprego ou auxílio aos desempregados. 62/
As informações que as firmas deveriam proporcionar eram relativas ao estabelecimento (localização,
setor de atividade e, logicamente, identificação) e aos assalariados que foram admitidos e/ou desligados. Esses
dados sobre os indivíduos eram tanto sobre sua identificação (nome, PIS, etc.) como outros de suma utilidade a
fins estatísticos (salário contratual e função etc.). 63/
A história do levantamento e da divulgação dos dados do CAGED apresenta diversas mudanças ao longo
do tempo. Até 1975, uma publicação trimestral do Ministério do Trabalho denominada “Mercado de Trabalho
-Flutuação” era o meio de atingir o grande público, sendo a disponibilização mais restrita a partir de 1976,
limitando-se a certos UFs e regiões, não existindo agregação em nível nacional. 64/ Em 1977, continuando com
a tentativa de utilizar a base de dados do CAGED para construir séries estatísticas, o Ministério criou uma
amostra de estabelecimentos (um painel de estabelecimentos que responderia mês a mês, ou seja, um painel
fixo) que, totalizando 7 mil e representativos de 4 grandes setores e diversos aglomerados urbanos,
responderiam mensalmente a fim de construir uma base de dados. 65/
Esse sistema foi muito precário, fato que limitava a sua utilização, tanto em termos de RA que visava
viabilizar a implementação de auxílio aos desempregados como também como fonte de dados. Em termos de
RA, não existia controle ou fiscalização sobre os estabelecimentos. Esse fato restringia a potencialidade do
CAGED como registro para desenvolver um programa de ajuda dos desempregados, além de tornar
extremamente frágil qualquer base de dados que a partir dele pudesse ser construída. Por outro lado, como fonte
par monitorar o mercado de trabalho formal era limitada dado que não continha variáveis cruciais, especialmente
para os empregados (escolaridade, sexo, etc.).
Uma inflexão foi dada no ano de 1982 quando o CAGED foi inteiramente reformulado. 66 / Essa
reformulação entrou em vigência 1 de outubro de 1983 e a principal mudança ocorreu em nível de formulário. 67 /
O conteúdo dos novos dados foi dividido entre aqueles referentes ao estabelecimento (identificação, localização,
atividades econômica segundo o código de atividades do IBGE, estoque de assalariados no início e fim do mês,
admissões e desligamentos no mês e causa da movimentação, etc.) e o indivíduo (identificação, número de
PIS/PASEP, sexo, idade, grau de instrução, características ocupacionais-CBO, remuneração, horas de trabalho
por semana, data de admissão e desligamento, etc.). Em termos de RA como fonte estatística contínua,
abrangente e com um mínimo grau de confiabilidade, podemos afirmar que o CAGED teve início em 1983. Em
1986, na ocasião do Plano Cruzado, a implantação de um programa de seguro-desemprego elevou a relevância
desse RA, dado que seria de consulta obrigatória para a concessão e controle dos beneficiários desse
programa.
A sofisticação do formulário, que agora conteria variáveis de crucial importância para monitorar o
mercado de trabalho (idade, grau de instrução, etc. dos assalariados) foi um passo importante par tornar o
registro administrativo CAGED um instrumento plausível de constituir em uma base de dados útil para
acompanhar o movimento conjuntural de certas variáveis do mercado de trabalho. Nesse sentido, era o início da
possibilidade de gerar cruzamento factíveis de serem utilizados, basicamente, pelos formuladores de políticas,
como as DRTs, os SINEs, etc. Esses dados, em razão da característica da própria fonte, estavam referidos ao
fluxo e não ao estoque. Visto o estágio tecnológico da época, existia um plano tabular de out-puts ou lay-out fixo
e cruzamentos específicos só poderiam ser realizados a partir de demandas especiais.
Basicamente, o formulário do CAGED era dividido em duas partes. A primeira (conhecida como Módulo
I), tinha informações sobre o estabelecimento (área geográfica, atividade econômica, etc.) e sobre o estoque de

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 36 -
empregados no início e fim do mês. A segunda parte do formulário (conhecida como Módulo II), continha dados
sobre os assalariados movimentados (admitidos ou desligados), como nome, número de PIS/PASEP, sexo,
idade, grau de instrução, ocupação, etc.
b) A Consolidação (1985-1997).
Até março de 1985 se utilizavam as informações que constavam no Módulo I. Para não desprezar
totalmente os dados contidos no Módulo II, em março de 1985 se realizou um balanço recomendando-se que, se
por alguma circunstância não era possível utilizar o Módulo I, as variáveis que constavam do Módulo II
alimentariam o sistema. Adotada essa nova sistemática, rapidamente se chega à conclusão que a série
sobre-estima a geração de novos postos de trabalho e, em setembro de 1985, a nova série é paralisada. Se volta
ao Módulo I e o Módulo II só é utilizado como parâmetro em caso de dúvida ou inconsistência dos dados do
primeiro. Esse viés a favor da geração de empregos levou aos quadros técnicos do Ministério a adotar as
informações contidas no Módulo I (estoque do primeiro dia do mês versus estoque no final do mês) como mais
consistentes para calcular a variação mensal do emprego. Em fevereiro de 1986, o Ministério do Trabalho divulga
um caderno (Retrospectiva 85) no qual a evolução do emprego entre 1980 e 1984 é calculado a partir das
informações da RAIS e no tocante ao ano de 1985
tem como referência os dados contidos somente no Módulo I do CAGED.
Em realidade, já entre os anos de 1983 e 1985 (fevereiro de 1985) se tinham detectado indícios sobre
uma tendência a sobre-estimar a geração de novos postos de trabalho quando a referência é o Módulo II.
Basicamente o problema seria de omissão de desligamentos e, nesse sentido, o balanço entre admissões e
desligamentos tenderia a sobre-estimar, na fase ascendente do ciclo, a geração de postos de trabalho e, na fase
descendente do mesmo, sub-estimar as perdas. Dado esse viés, o Ministério do Trabalho resolve dar um
tratamento estatístico à base de dados do CAGED. Esta é uma prática válida, dado que, como já afirmamos, um
RA não necessariamente proporciona séries robustas estatisticamente. O procedimento adotado pelo Ministério
do Trabalho consistiu em adotar um Painel Fixo (PF) que, basicamente, consiste em não contabilizar, para fins
de variação do emprego, a primeira declaração da um estabelecimento. Somente a partir da segunda declaração
se começa a contabilizar a movimentação. Qual é a lógica deste procedimento ? Simplesmente corrigir o viés
pro-geração de empregos que era o corolário natural da omissão dos desligamentos. Na medida em que não é
contabilizada a primeira declaração, em última instância não são contabilizados os postos de trabalho que são
gerados na abertura de um estabelecimento. Este fato compensaria a omissão dos desligamentos.
Este tipo de tratamento estatístico dado ao RA CAGED merece dois comentários.
O primeiro está vinculado ao caráter arbitrário da variável escolhida para compensar a omissão na
declaração dos desligamentos. Ou seja, se compensa dado que se retiram postos de trabalho criados na hora
da abertura de uma firma, mas não existe nenhum elemento que nos sinale que uma variável guarde algum tipo
de relação com a outra. Em outros termos, que os postos de trabalho criados na hora da abertura de uma firma
tenham algum tipo de nexo com os desligamentos omitidos. Dessa forma, se pode estar introduzindo um viés
sobre cuja aleatoriedade pouco sabemos e, nesse sentido, a relação custo/beneficio da correção de uma
limitação não necessariamente contribui para outorgar mais robustez à série estatística.
O segundo comentário está vinculado a um viés que sim podemos identificar. Não seria ousado imaginar
que parte significativa dos vínculos dos desligamentos omitidos se origina no momento do fechamento de um
estabelecimento. Quando uma firma fecha por falência, por exemplo, dificilmente podemos supor que os
gerentes privilegiam informar ao CAGED em um ambiente das cobranças e conflitos que a maioria dos
fechamentos geram. Contrariamente, na hora da abertura de um empresa ou estabelecimento, muito
provavelmente se tenha um maior zelo pelo cumprimento dos requisitos legais (entre eles informar ao CAGED).
Passemos, agora, a analisar a abertura e o fechamento de firmas em função do ciclo macroeconômico. Na fase
ascendente do mesmo podemos assumir que a abertura de empresas é superior ao fechamento das mesmas.
Nesse sentido, não contabilizar a primeira declaração tende a sub-estimar a geração de empregos nas etapas
economicamente dinâmicas. Na fase descendente, contrariamente, quando os desligamentos prevalecem e a
abertura das firmas tende a arrefecer, a omissão de desligamentos muito provavelmente gerará uma
sub-estimação das perdas de emprego. Ou seja, não contabilizar as primeiras declarações paralelamente a uma
tendência a omitir os desligamentos tenderia a tornar às estatísticas geradas a partir desse RA mais suaves, o
nível de emprego seria menos sensível ao ciclo. Na fase ascendente se gerariam menos postos de trabalho (pelo
escolha de não contabilizar as primeiras declarações) mas, como contrapartida, na fase descendente se
contabilizariam menos perdas (este fato por uma idiosincracia do RA e não por um tratamento estatístico).
c) A Mudança de 1997.
Este tratamento estatístico dado ao CAGED se prolongou ao longo dos anos 90 e só foi abandonado em
janeiro de 2002. Contudo, ante de analisar esse mudança, cabe mencionar uma alteração menor que ocorreu em
1997. No ano de 1996 foi detectada uma sobre-estimação do estoque de assalariados que constavam no
CAGED. O CAGED, como já mencionamos, é um registro de fluxo e não de estoque. Contudo, quando se

Page 35 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 37 -
pretende calcular uma variação relativa a variável de fluxo tem que ser comparada com o estoque. Sabemos que
uma análise econômica privilegia a variações relativas (percentuais) e não as mudanças absolutas. Nesse
sentido, é lógico que a divulgação dos resultados do CAGED tentem calcular o estoque para que o fluxo possa
ter uma dimensão relativa. A divulgação do CAGED era realizada em termos absolutos e relativos. Para o calculo
dos percentuais de variação se utilizavam os estoques da RAIS e os estabelecimentos eram também checados
com os registros do CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica), um registro administrado pela Receita
Federal. Ou seja, cada começo de ano se tentava realizar uma atualização do estoque em função da última
RAIS e com cruzamentos com as bases do CNPJ. Contudo, no ano de 1996, devido a diversos fatores, entre
eles a atualização dos dados do registros constantes no CNPJ, os técnicos do Ministério do Trabalho
perceberam que o estoque a partir do qual se calculavam as variações relativas estava sobre-estimado. Tendo
como referência a PNAD de 1995 atualizada pela movimentação do CAGED, em meados de 1996, se teriam em
torno de 19 milhões de empregos celetistas, quando o estoque de referência do CAGED situava esse total em
mais de 24 milhões. A alternativa foi fazer um reajuste e foi iniciada, em 1997, uma nova série, oportunidade na
qual também se introduziu a nova CNAE (CNAE/95). 68/ Contudo, e aqui estamos diante de um ponto muito
relevante, a nova série foi retrotraida até 1992. Essa opção permitiu a comparabilidade intertemporal entre 1992 e
1997. A não adoção desse procedimento co o saldo uma nova série (cuja base seria o ano de 1997) sem
possibilidades de comparabilidade, dado que os procedimentos metodológicos adotados não permitiriam utilizar
as variações relativas anteriores como parâmetros de comparação.
Com essa nova série, o CAGED continuou sendo uma fonte usual e cada vez mais popular de
acompanhamento conjuntural do mercado de trabalho. Em termos qualitativos, seu desenvolvimento era
constante. As respostas por meios magnéticos cobriam uma parcela cada vez maior das respostas e a
divulgação ia incorporando as mais modernas tecnologias (CDs, por exemplo). Contudo, os resultados eram
constantemente vistos com suspicácia dado que era percebido um viés para sub-estimar a geração de novos
postos de trabalho. Por exemplo, no ano de 1994, o PIB apresentou crescimento de 4,22% e o CAGED registrou
variação de -0.60%. A elasticidade emprego-produto parecia muito reduzida e, não obstante as diversas
justificativas que poderiam apresentar-se (introdução de novas tecnologias, abertura econômica, etc.), os dados
dos CAGED eram frágeis porque o patamar de geração de empregos desse registro era inferior ao observado na
RAIS e em pesquisas de domicílio como a PNAD. 69/
Essa subestimação era atribuída à metodologia adotada de só contabilizar a variação do emprego a
partir da segunda declaração. Como já mencionamos, este tratamento estatístico era uma alternativa para
compensar a certa omissão dos desligamentos.
d) A Mudança Metodológica de 2002 ou como Não deve ser Administrada uma Alteração Metodológica.
Não é o caso de avaliar a metodologia adotada até 2001. Todo tratamento estatístico dado a um RA tem
suas vantagens e seus custos. Não dar um tratamento estatístico também tem seus benefícios e aspectos
críticos. Concretamente, no caso do CAGED, não outorgar nenhum tratamento estatístico tende a sobre-estimar
a geração de empregos. 70/ Este viés pode ser bem visto pelas instâncias políticas. No começo de 2002, e
desconfortável com a subestimação na geração de empregos que vinha observando o CAGED, o Ministério do
Trabalho altera a metodologia ou, para ser mais rigorosos, não adota nenhuma metodologia para tratar
estatisticamente as informações do CAGED. Assim, a série começa a ser divulgada segundo os dados
proporcionados pelos estabelecimentos.
Como mencionamos no parágrafo anterior, não é este o lugar para avaliar as opções metodológicas que
pautaram a divulgação dos dados do CAGED. A escolha de dar tratamento estatístico à base de dados tem
seus custos e benefícios é pode ser, tal vez, uma alternativa superior á opção escolhida até 2001. Contudo, um
questão é clara: a comparabilidade inter-temporal entre a velha série e a nova fica impossibilitada. Ou seja, não
se podem comprar os resultados produto de uma metodologia que tende a sub-estimar a geração de empregos
com outra que tende a sobre-estimar os saldos. Se poderia polemizar sobre qual metodologia é mais
consistente mas não existe polêmica sobre a não comparabilidade dos dados. O ponto é que as boas práticas e
o senso comum indicam que uma série deve ser interrompida quando a metodologia é alterada. Este aspecto
sobre as restrições que impõem mudanças metodológicas na comparabilidade inter-temporal das séries foi um
tema que já abordamos quando analisamos a transição entre a APME e a NPME. Diante de alterações
metodológicas, manter uma série histórica requer refazer para atrás os indicadores, um procedimento realizado
no próprio CAGED em 1997. Outra alternativa consiste em, por um período de tempo, produzir resultados com
ambas metodologias (a antiga e a nova) a fim que os usuários comparem os distintos indicadores e avaliem a
origem de possíveis diferenças. A forma de gerenciamento, por parte do IBGE, da transição entre a APME e a
NPME, que já analisamos neste Capítulo, é um exemplo de rigorosidade técnica e transparência metodológica.
Lamentavelmente, o Ministério do Trabalho e Emprego adotou uma estratégia que, além de contrariar
qualquer critério técnico, alimentou uma polêmica sobre a qualidade dos dados do CAGED e a utilização política
na construção de indicadores. Os resultados obtidos com a nova metodologia são comparados com a velha e,

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 38 -
logicamente, não é incomum observar que divulgações do tipo “no mês x foi um recorde em termos de postos
de trabalho desde 1992”. 71/
Escolher uma metodologia que tende a sobre-estimar os empregos gerados e comparar seus resultados
com uma alternativa escolhida no passado que sub- estimava a geração de empregos gerou, no país, uma
polêmica sobre a produção de estatísticas que já parecia superada e que pode ser assumida como sendo àquela
dos anos 80/90, quando se desconfiavam dos resultados divulgados pelo IBGE sobre a taxa mensal de
desemprego. 72/ Como a inconsistência técnica de comparar coisas incomparáveis tendia a beneficiar os
governantes de turno, logicamente que essa opção foi interpretada como uma manipulação de dados.
Toda essa polêmica gerada a partir da mudança metodológica do CAGED no começo de 2002 e a
lamentável forma de administração da transição por parte do Ministério do Trabalho e Emprego nos levam a
questões como as interrelações entre a competência e independência (independência diante do poder de turno)
que devem ter os órgãos produtores de estatísticas. Esse tema é recorrente na história recente do Brasil e os
debates entre a PME e a PED, nos anos 80 e 90, e os fundamentados questionamentos à utilização política
com que foi administrada a transição entre a antiga e a nova série do CAGED, devem induzir uma profunda
reflexão sobre a necessária independência institucional dos produtores de estatísticas a fim de aprofundar a
democratização de uma sociedade.
IV.2. A RAIS (Relação Anual de Informações Sociais).
a) Origens e Características.
A RAIS (Relação Anual de Informações Sociais) é um registro administrativo criado em 1975 (Decreto Nº
76.900) que tinha diversos fins operativos, entre eles ser usado para o cálculo das quotas (contas individuais) do
PIS/PASEP, servir para o controle do recolhimento do FGTS e monitorar o grau de nacionalização do trabalho
(mão-de-obra estrangeira) por estabelecimento e ocupação. Hoje é essencialmente utilizada para o pagamento
do Abono Salarial, benefício contemplado no Art..239 § 3 da Constituição Federal. 73/ Secundariamente, os
dados contidos na RAIS servem para o controle de certos programas, como a Previdência Social.
A RAIS é um verdadeiro censo anual do mercado formal de trabalho dado que devem responder todos os
estabelecimentos que tenham vínculos trabalhistas formalizados (celetistas ou estatutários), inclusive aqueles
estabelecimentos que, nesse ano, não tenham vínculos empregatícios (RAIS Negativa).
O conjunto de informações da RAIS pode ser sub-dividido em dois sub- conjuntos. O primeiro contém
dados do estabelecimento (localização geográfica, tamanho, atividade econômica, etc.) e o segundo possui
informações sobre os vínculos (idade, remuneração, ocupação, grau de instrução, etc.). Essas informações
podem ser cruzadas de forma a gerar tabulações com desagregação geográfica até nível de municípios.
Realmente, podem ser obtidos dois tipos de informações. A primeira é o estoque ao 31/12 do ano de referência e
a segunda diz respeito à movimentação (admissões e desligamentos) no ano. Ou seja, temos uma informação
de estoque e outra de fluxo. Esta última teria as mesmas características que no caso do CAGED. Em termos de
qualidade, a melhor informação é a de estoque no dia 31/12, que é a usualmente utilizada. 74/
Na RAIS encontramos a mesma restrição que encontramos, em geral, nos
RAs (inclusive no CAGED). Como a declaração deve ser preenchida pelo estabelecimento, imperfeições
vinculadas à formação técnica dos indivíduos que realizam o preenchimento, omissão e sonegação proposital ou
involuntária, etc. são usuais. Contudo, com o tempo, a qualidade das informações foi-se elevando e a cobertura
se ampliando. 75/ A questão da cobertura tem, como já mencionamos, duas facetas. Uma positiva vinculada a
sua maior representatividade. A negativa surge da restrição a qualquer tipo de comparação intertemporal, visto
que é necessário diferenciar entre mudanças na cobertura e alterações reais das variáveis pesquisadas.
b) Exemplo de Tratamento Estatístico de um RA: o Painel Fixo da Rais.
Justamente, para contornar esse problema de comparabilidade inter-temporal originado em mudanças do
universo oriundas de não-declarações, os técnicos do Ministério do Trabalho, nos anos 80, fizeram apelo a um
Painel Fixo que, basicamente, consistia em tomar a variação do emprego entre dois anos considerando,
unicamente, os estabelecimentos que responderam nesses dois anos. Dessa forma, todo crescimento do
emprego originado na abertura de novos estabelecimentos não era considerado.
Devemos perceber que, basicamente, era um procedimento similar ao já descrito no caso do CAGED antes de
2002. Como no caso anterior, este tipo de alternativa metodológica sub-estimava a criação de empregos,
especialmente em período de recuperação econômica quando, se supõe que a abertura de novos
estabelecimentos é mais intensa. Contudo, como contrapartida, compensava, também, a perda de empregos
devido ao fechamento de estabelecimentos (supondo que existe uma tendência a não responder no caso da
morte de um estabelecimento). Implicitamente, se estava supondo que ambos os efeitos, na medida em que
corriam em direções opostas, acabariam por compensar-se. Em princípio, não obstante o imaginativo do
procedimento, não existem, a priori, elementos que nos induzam a pensar que ambos os vieses se compensem.
A comparação entre as variações do RAIS Painel Fixo (RAISPF) e a RAIS normal servem para ilustrar as
diferenças. Em 1989, a variação da RAISPF foi quase insignificante enquanto na RAIS comum o nível de

Page 37 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 39 -
emprego verificou elevação de 3,49%. Em 1990, os percentuais foram de -15% (RAISPF) e -5,26% (RAIS
Normal). Finalmente, em 1991, o último ano no qual a RAISPF foi calculada, os percentuais foram de -6,26% no
caso da RAISPF e de -0,81% no caso da RAIS normal. Vemos, assim, que as distâncias são muito
significativas. A conclusão é: se a RAISPF tinha consistência estatística no sentido de refletir a real variação do
emprego formal, obviamente a RAIS sem nenhum tratamento estatístico não era uma fonte de dados confiável.
Contudo, dado que a RAIS foi ampliando sua cobertura, o Ministério do Trabalho e Emprego considerou
que os erros que poderiam incorrer-se devido a comparações no tempo eram marginais e o painel Fixo da RAIS
deixou de ser calculado a começo dos anos 90. 76/
IV.3. Os Desafios para os RAs no Brasil
Tanto a experiência histórica da RAIS e do CAGED como de outros RÃS (como a GFIP) sugere que,
para ampliar seu público, elevar a confiabilidade e melhorar a qualidade das informações, essas fontes de dados
tem vários desafios pela frente.
Não obstante sua superioridade em certos aspectos (como as possibilidade de desagregação geográfica
e de constituir verdadeiros censos), os RAs encontram uma restrição para a ampliação de seu público alvo que
surge da não disponibilização dos micro-dados. No caso das pesquisas de domicílios,
sendo a PNAD o exemplo mais estendido, qualquer usuário pode comprar os micro-dados no IBGE e realizar
suas pesquisas e análise em seu computador pessoal. Contrariamente, nos RAs, dois fatores limitam essa
estratégia de divulgação. Primeiro, uma questão de sigilo garantido pela legislação. Distribuir os micro-dados
com informações individuais por vínculo e/ou empresa implica em
distribuir dados privados. Restringe também a divulgação dos micro-dados o caráter censal dos RAs. Ao serem
enormes bases de dados, contendo até milhões de informações, sua disponibilização para ser utilizada em
computadores pessoais se torna quase impossível. A alternativa para contornar esta limitação
consiste na construção de amostras que evitem tanto a identificação de indivíduos e/ou empresas como
possibilitem o gerenciamento em computadores individuais.
O segundo aspecto que deve ser repensado é o tratamento estatístico dos RAs. A origem de um RA,
devemos lembrar, não é ser uma base estatística robusta senão constituir a contabilidade de um programa ou
política pública ou a contabilidade de um público que possibilite implementar ou controlar um programa ou
política pública. Dessa forma, o desafio consiste em transformar essa enorme base de dados em uma base
estatística confiável. Hoje, inclusive antigos RAs, como a RAIS e o CAGED, contêm inconsistências e como os
mesmos são distribuídos sem corrigir essas inconsistências, o leitor fica na insegurança sobre a robustez dos
resultados a serem encontrados. Este é um enorme limitador na expansão do público usuário dos RAs.
Um terceiro aspecto diz respeito à independência dos gestores da base de dados do poder político.
Dado que, nas sociedades modernas, parte da avaliação de um governo é realizada a partir de indicadores, a
produção de estatísticas naturalmente tenderá a ser acompanhada de perto pelos detentores do poder. As
suspicácias sobre possíveis manipulações das séries serão maiores ou menores em função da credibilidade que
tenha a instituição que as produza. 77/ Quanto mais autonomia e independência do governo tenha essa
instituição maior será a credibilidade. No caso dos RAs, as estruturas burocráticas e técnicas têm uma
dependência muito estreita com do poder político dado que fazem parte dos recursos humanos dos Ministérios.
78/ O caso contrário é o IBGE, com quadros técnicos que gozam de estabilidade no emprego e a produção de
indicadores é mais imune às influências dos interesses de turno. 79/ O quarto aspecto está vinculado à
adequação entre o perfil dos recursos humanos compatíveis com a produção de estatísticas e os quadros
necessários para a implementação e gerenciamento do políticas públicas. Em geral, as estruturas dos
Ministérios a partir das quais são alimentadas as bases de dados
dos RAs, não tem, nem poderiam ter, dado que sua formação e objetivos são outros, preocupação com séries
estatísticas robustas. Em não poucas ocasiões, o existe conflito. Por exemplo, quando os RAs são utilizados
com fins de fiscalização dos vínculos trabalhistas, como é o caso da RAIS e do CAGED, existe
um conflito com a produção de estatísticas confiáveis, dado que, ao saberem que serão utilizados para sua
fiscalização, as empresas terão todo interesse em distorcer suas informações. 80/ Dessa forma, pode existir um
potencial conflito entre as estruturas burocráticas dos Ministérios cuja função seja administrar um programa e
outras instâncias técnicas preocupadas com a produção de séries estatísticas robustas.
Em realidade, todas os aspectos conflitivos mencionados caminham na direção de tratar as bases de dados dos
RAs deveriam ser tratados como insumos para a produção de estatística e não fica claro que as estruturas
burocráticas existentes nos Ministérios apresentam o perfil mais adequado para que essa transição. Nem seus
objetivos nem sua formação nem sua estreita relação com o poder tornam esses recursos humanos os mais
adequados para produzir séries robustas e confiáveis.
V. Além dos Aspectos Técnicos.
V.1. Relações Entre Marcos Teóricos e Produção de Indicadores.
No transcurso deste Capítulo (especialmente na Seção I e II) apresentamos os principais indicadores

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 40 -
que usualmente são utilizados nas pesquisas, análise e monitoramento do mercado de trabalho. Em um
segundo momento (Seções II e IV), apresentamos as principais fontes de dados e os parâmetros que são
produzidos (ou que podem ser construídos) a partir deles.
Esse tipo de apresentação pode induzir ao leitor a concluir que as estatísticas existem
independentemente de um marco analítico. Ou seja, que existem parâmetros “naturais” na “realidade” e que a
função das estatísticas consiste em revelar esses parâmetros. Para ser consistentes, deveríamos dizer que não
existem “indicadores na realidade”. Todo indicador é a manifestação de um marco analítico de referência e de um
contexto histórico determinado e ambos dão sentido a uma estatística. Vamos apresentar vários exemplos.
Iniciemos a discussão com a questão do desemprego. O desemprego é um fenômeno das sociedades
modernas. Em uma sociedade tradicional, cuja produção não estava pautada por unidades de produção que
maximizam o lucro, indivíduos sem trabalho e à procura de emprego podem não existir. Uma pequena unidade
de produção familiar pode estar empregando indivíduos e os remunerando por lógicas distintas daquelas válidas
no caso de uma moderna firma cujo único objetivo seja o lucro.
Essa perspectiva também podemos colocá-la em termos de correntes econômicas do denominado
mainstream ou seja, da economia dominante. Para os teóricos das expectativas racionais, uma versão mais
radical do monetarismo clássico, o desemprego involuntário (que é o relevante) não existe, é uma categoria
“inventada” por Keynes e, portanto, são os keynesianos que devem dar respostas (tanto em termos teóricos
como de alternativas de política). Nessa linha de raciocínio, sempre existirá um salário real ao qual o indivíduo
que procura emprego o encontrará. Na hipótese de um indivíduo não aceitar uma oferta de emprego devido ao
fato do mesmo ter como contrapartida um salário real muito baixo, estaríamos diante de um típico caso de
desemprego voluntário (a pessoa está nessa situação por vontade própria). A questão parece um pouco radical,
mas não o é. Imaginemos a seguinte situação. Suponha o leitor que um engenheiro recém formado só aceita um
emprego que ofereça um salário de 20 mil dólares/mês. Como poucos (se existe algum) postos de trabalho, no
Brasil e no mundo, oferece uma salário dessa magnitude para um recém formado, seguramente o nosso
engenheiro estará desocupado. Nas usuais pesquisas de domicílio, como as que estudamos no transcurso
deste Capítulo, esse indivíduo será “carimbado” como desocupado (não tem emprego e está à procura de um).
Contudo, o leitor concordará que, intuitivamente, esse engenheiro não poderia ser classificado como
desocupado, dado que suas exigências salariais são “absurdas”. Logicamente, a questão está no adjetivo de
“absurda”. Suponhamos,
agora, que esse recém formado demanda um salário de 1 mil dólares/mês como mínimo para aceitar um
emprego. Nesse caso, o leitor seguramente classificaria o desemprego como “involuntário”. Continuemos com a
nossa hipotética situação e agora suponhamos que o dilema é o seguinte: esse engenheiro que aceitaria uma
oferta de emprego cuja remuneração fosse de U$S 1 mil encontraria um emprego se esse mínimo fosse de U$S
100. Se esse indivíduo encontra empregos associados a salários de U$S 100, o desemprego seria voluntário ou
involuntário ? Porque se o salário demandado é de US$ 20 mil/mês o
desemprego seria involuntário e se requer um mínimo de U$S 1000/mês é voluntário ? Se encontra uma oferta de
emprego quando o salário requerido é de U$S 100, não seria um emprego voluntário ? Nessa linha de raciocínio,
se existe um salário no qual qualquer indivíduo consegue emprego o desemprego teria que ser qualificado como
voluntário e carece de sentido calcular a taxa dedesemprego, como sustentam os teóricos das expectativas
racionais.
Logicamente, não pretendemos discutir a pertinência desses argumentos. Simplesmente pretendemos
assinalar que qualquer indicador estatístico tem que ter uma referêncial teórico. Um analista pode muito bem
sustentar que se não se pode distinguir entre o desemprego voluntário e involuntário um parâmetro global como a
taxa de desemprego diz muito pouca coisa. Como essa distinção é, no mínimo, subjetiva, seguindo esse
raciocínio, se deveria deixar de calcular um indicador que gera tanta polêmica.
Um segundo exemplo está vinculado com o contexto histórico. Vimos que parte da polêmica entre a
APME e a PED se nutriu de uma matriz teórica que sustentava que o desemprego aberto não era a única forma
de desemprego. Esse é um cosa típico de diferenciações metodológicas que representam, no
campo da produção de estatísticas, paradigmas analíticos diferentes. Contudo, as mudanças no funcionamento
do mercado de trabalho nos países centrais a partir da década de 80 alteraram as recomendações de
organismos internacionais à forma de quantificações de fenômenos como o desemprego e o sub-emprego e,
hoje, o IBGE desenvolveu um levantamento domiciliar (a NPME) que está muito próximo do historicamente
sustentado pela metodologia PED. Este é um típico caso no qual matrizes teóricas e contexto histórico
interagem dando como resultado a procura de parâmetros cujo conceito muda no tempo.
V.2. Produção de Estatísticas e Democracia.
Em diversas ocasiões mencionamos os potenciais conflitos que existem entre os objetivos dos
ocupantes do poder político e a produção de estatísticas. Estas últimas se tem que pautar por parâmetros
técnicos que não podem estar sujeitos aos circunstanciais interesses do governo de turno. Podem existir , aliás,

Page 39 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 41 -
são naturais que existam, polêmicas sobre aspectos metodológicos e conceituais em torno às formas de
levantamento e construção de indicadores. O que não podem existir são dúvidas sobre a manipulação dos dados
para satisfazer interesses particulares.
Nesse sentido, a reputação das instituições produtoras de estatais estatísticas é um aspecto crucial
para a credibilidade de uma série. Essa credibilidade é uma construção histórica que depende de diversos
fatores, entre eles o status institucional do órgão, a estabilidade de seus quadros técnicos, o grau de
democratização de uma sociedade (liberdade de imprensa, etc.), a transparência na divulgação das
metodologias, etc..
Esse conflito latente entre os objetivos dos governos e a isenção conceitual, técnica e metodológica das
instituições estatais produtores de estatísticas não é uma singularidade do Brasil. A independência dos órgãos
produtores das bases de dados é uma questão que se coloca em qualquer sociedade democrática. Contudo, no
caso do Brasil, dada sua relativamente recente transição de uma
ditadura militar a um regime mais aberto paralelamente a seu histórico de dúvidas sobre a manipulação de
informações na etapa anterior (especialmente no tocante às séries oficiais de inflação), a questão da isenção
das instituições estatais produtoras de estatísticas é mais relevante. A polêmica entre a APME e a PED, nos
anos 80 e 90, é um exemplo. A mais recente discussão sobre a comparabilidade da série do CAGED a partir da
mudança metodológica de começos de 2002 é outra polêmica ilustrativa.
O caso dos RAs talvez seja mais complexo que as pesquisas de domicílio, dado que estas últimas são
desenvolvidas pelo IBGE, uma instituição com maior independência (do poder) que os quadros dos Ministérios,
que, em geral, implementam e administram os RAs. As alternativas para outorgar às séries
estatísticas que surgem dos dados contabilizados pelos RAs maior credibilidade são várias e a formatação
institucional final deve ser uma questão debatida socialmente. Só a fins ilustrativos, podemos imaginar duas. Os
bancos de dados dos RAs seriam passados ao produtor oficial legal (o IBGE) que seria o
responsável pela produção de estatísticas. Outra alternativa que podemos vislumbrar consiste na estruturação,
dentro dos próprios Ministérios, de planos de carreira específicos para produzir estatísticas a partir das bases de
dados dos RAs. Esses quadros burocráticos teriam que ter um perfil técnico e estabilidade tal que outorguem
credibilidade às estatísticas que surgem dos Ministérios.
Essas duas alternativas devem ser interpretadas só como exemplos de múltiplas de opções possíveis. A
formatação final, como já salientamos, deve ser resultado de um amplo processo de discussão na sociedade. A
democratização da sociedade brasileira será consolidada e aprofundada no caso de uma construção institucional
na qual não pairem dúvidas sobre a impossibilidade das séries estatísticas estarem permeadas por projetos de
poder. Esse objetivo geral adquiri maior relevância no caso de estatísticas vinculadas ao mercado de trabalho
(especialmente o desemprego e geração de postos de trabalho), pela sua relevância na avaliação dos governos.
O que não pode perdurar são séries estatísticas produzidas a partir de RAs administradas por quadros técnicos
que tem uma dependência direta com dos ocupantes do poder. Essa relação funcional reduz a credibilidade das
bases de dados e gera polêmicas e energias que deveriam ser direcionadas para interpretar os indicadores e
propor alternativas de política.
VI. Comentários Finais.
Os aspectos teóricos e marcos conceituais que foram desenvolvidos no Capítulo anterior e que
merecerão nossa atenção nos próximos, são de relevância na medida em que possibilitam a interpretação de
fenômenos e propõem alternativas de ação para contornar os desafios que em cada momento do tempo
toda sociedade tem diante de si. Assim, essa relevância ou pertinência não pode ser testada a partir da
coerência interna lógica do paradigma analítico. A relevância ou pertinência de uma marco conceitual deve ser
mensurado a partir da consistência que seus corolários têm com aspectos da “realidade” que se pretende
estudar. As aspas sobre os temos “realidade” não colocamos por acaso. Como se “apreende” a realidade ? Nas
ciências sociais, sobre tudo mais não exclusivamente, não podemos ter um objeto de estudo mais ou menos
definido. O que chamamos de realidade é um conceito construído a partir de parâmetros ou indicadores. Dessa
forma, observamos que a construção de indicadores é uma etapa chave para tudo e qualquer marco analítico
cujo objetivo esteja além de fechar-se sobre si mesmo em termos abstratos.
Contudo, a construção desses parâmetros deve ser pautada por um marco conceitual, dado que a
“realidade” deve ser uma dimensão construída. Assim, o paradigma analítico tanto vai nortear a construção de
séries estatísticas como servir para testar a sua validade. Dessa forma, não é possível imaginar que uma base
de dados possa ser construída de sem um referencial conceitual. Inclusive,
esse marco teórico é mutante, depende do espaço e do tempo. Não obstante essa pertinência de situar no
tempo e no espaço a construção de uma estatística, existem tendências internacionais (geralmente sintetizadas
por organismos multilaterais, especialmente a OIT, no caso do mercado de trabalho) que devem ser respeitadas.
Dados esses incontornáveis referênciais teóricos, todo estudioso do mercado de trabalho deve ter uma
mínima familiaridade com os indicadores usualmente utilizados para monitorar ou analisar as flutuações ou

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 42 -
tendências. Conceitos como PIA, PEA, taxa de desocupação, etc. merecem ser internalizados e seus alcances
e limitações devem ser bem compreendidos. Por exemplo, nunca
pode ser assumido que uma elevação na ocupação representa, necessariamente, queda do desemprego ou, ao
contrário, que quedas no nível de ocupação são sinônimo de aumentos no desemprego. Esse tipo primário de
erros podem ser evitados quando se tem um bom domínio desses indicadores.
A familiaridade com as bases de dados (seus conceitos, limitações, abrangência, etc.) é outro passo
necessário quando o objetivo é analisar empiricamente certos fenômenos. Uma base de dados pode apresentar
comportamentos diferentes de outras pelas suas características. Vamos dar um exemplo. Na PME (seja na
APME como na NPME), a taxa de desocupação tem uma sazonalidade positiva em dezembro (a taxa de
desemprego tende a cair no último mês do ano, independentemente co contexto conjuntural). Esse
comportamento parece compatível com o intuitivamente esperado, dado que a
bolha de consumo de fim de ano induziria uma maior demanda de trabalho. Contrariamente, no CAGED o nível
de emprego apresenta uma sazonalidade pronunciadamente negativa em dezembro. Ambos comportamentos
sazonais parecem contraditórios e pareceria que uma delas deveria estar “errado”.
Contudo, pelas suas intrínsecas características, ambas estão “certas” dado que, em ambos os casos, a bolha
de consumo resulta em resultados com direções opostas. 81/ O aspecto sobre o qual queremos chamar a
atenção está vinculado ao profundo conhecimento que o analista deve ter da base de dados que está utilizando.
No transcurso do Capítulo apresentamos as principais fontes de dados e, sem pretender esgotar o tema,
definimos suas principais características. O leitor deve interpretar essa apresentação como uma primeira
aproximação ou tema. Leituras complementares na bibliografia desenvolvida pelos próprios
produtores de estatísticas são necessárias e, sobre tudo, trabalhar intensamente com as bases de dados. 82/
Por último, mencionamos no Capítulo, ainda sem o intuito de esgotar o tema, a questão da
confiabilidade das séries estatísticas. A credibilidade do órgão produtor é de crucial importância e, nesse
sentido, além de aspectos puramente técnicos, a independência com respeito ao poder adquire particular
importância. O conflito entre os objetivo de quem ocupa o poder e os produtores de estatísticas
está sempre latente. Não existem receitas universais para administrá-lo e cada sociedade deve encontrar seu
caminho. Contudo, essa independência entre poder e produtores de bases de dados é de singular importâncias
nas democratização de qualquer sociedade.

Capítulo III
A Demanda de Trabalho
Um dos principais eixos da teoria economia neoclássica, e não unicamente para os problemas ligados ao mercado
de trabalho, gira em torno dos fatores que determinam o nível de emprego e os salários reais. Dada essa importância, é
fundamental que o leitor compreenda quais são os argumentos desse arcabouço teórico, suas hipóteses, corolários e
limitações. Atingir um amplo domínio sobre esse aspecto da teoria neoclássica possibilitará entender seus argumentos
sobre posições controversas, tanto macroeconômicas quanto macroeconômicas (distribuição de renda, salário mínimo,
origens do desemprego, etc.).
Dado esse objetivo, estruturamos o Capítulo da seguinte forma. Na próxima Seção desenvolveremos as principais
hipótese (função objetivo, produtividades marginais, ponto de equilíbrio, etc.) e conclusões desta abordagem teórica. Na
Seção II apresentaremos temas correlatos e que não são nada além de aplicações do marco teórico desenvolvido na Seção I
a situações menos abstratas (eficiência, distribuição de renda, redução da jornada de trabalho, etc.). Na Seção III
analisaremos, com certo detalhe, os argumentos dos críticos. Finalizaremos o Capítulo com um balanço em torno dos
argumentos deste marco teórico, suas vulnerabilidade, potencialidades e os fatores que induziram novos campos de
pesquisa. O Capítulo é complementado com um Anexo, onde são especificados, para os leitores interessados,
particularidades mais técnicas sobre os sendeiros da expansão dos pontos de equilíbrio.
I. Os Fundamentos: hipóteses, desenvolvimento teórico e ponto de equilíbrio.
Como afirmamos em parágrafos anteriores, a demanda de trabalho está vinculada às firmas que contratam
assalariados a fim de viabilizar seu processo produtivo. Em realidade, o trabalho é só um dos diversos insumos que uma
empresa pode utilizar para obter seu produto. Outros insumos podem ser o capital (máquinas, por exemplo) e os recursos
naturais. A relação entre a produção ou a
oferta e os insumos formaliza-se através do que se denomina função de produção:
Q = F (L; K) (1)
Onde: Q = produto; L = trabalho; K =capital.
Existem certos supostos usualmente assumidos em relação a essa função.
O primeiro diz respeito ao impacto da variação de um fator de produção sobre o produto: todo incremento (queda)
na utilização de um insumo vai se traduzir em uma elevação (redução) da quantidade produzida. Ou seja, as derivadas
parciais de Q com respeito a L e K (os fatores de produção mencionados na função (1) são positivas: QL > 0 e QK > 0.
Essas derivadas parciais não são outra coisa que as produtividades marginais desses fatores. Em outras palavras: quanto
aumentará o produto (Q) diante de mudanças em um fator permanecendo constantes os demais. No caso de QL, temos que
essa derivada representa a produtividade marginal do trabalho, ou seja, as alterações em Q quando se muda a quantidade

Page 41 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 43 -
de trabalho permanecendo constantes os outros fatores.
As relações entre o produto e os fatores, contudo, não se esgota na produtividade marginal positiva. Como é
usual em microeconomia, a segunda derivada é negativa (QLL< 0 e QKK<0). Em outros termos: produtividades marginais
são decrescentes. A medida em que incorporamos mais um fator de produção mantendo constantes os restantes, o
resultado será uma elevação na oferta (Q), mas a elevação do produto será cada vez menor1/.
Dadas essas especificações sobre a função de produção, passemos àfunção objetivo da firma. Esta visa os lucros,
ou mais especificamente, amaximização de lucros. O lucro pode ser definido como a diferença entre a receita total e os
custos totais. Formalmente temos que:
∠ = RT – CT (2)
Onde: ∠ = lucros; RT= receita total; CT = custo total.
A receita total pode ser definida como a quantidade produzida vezes o preço, por unidade produzida, recebido
pela firma. Da mesma forma, os custos totais são constituídos pelos fatores de produção utilizados vezes os preços pagos
pela utilização dos serviços desses fatores. Assim, se mantemos o suposto que a firma utiliza dois fatores no seu processo
produtivo (capital e trabalho), podemos expressar a igualdade (2) da seguinte forma:
∠ = P * Q (L;K) - { w * L + r * K } (3)
Onde: w = salário ou remuneração do fator trabalho; r = rendimento do fator capital; P = preço unitário dos
produtos oferecidos pela firma; Q (L;K) = função de produção.
Se supomos que existe concorrência perfeita no lado da oferta, o preço P recebido pela firma é uma dado, um
parâmetro sobre o qual ela não tem poder e independe do tamanho de sua oferta. Por outro lado, se supomos que a
demanda da firma por fatores de produção é muito pequena diante do tamanho do mercado de fatores, devemos tomar w e r
(respectivamente, as remunerações do trabalho e do capital) como fixas, que independem das contratações da empresa.
Assim, P, w e r são fixos, exógenos às decisões da firma. Nessas circunstâncias, as escolhas se reduzem ao nível de L e K
que maximizam seu lucro. A quantidade de trabalho e de capital são as únicas variáveis sobre as quais a firma tem controle.
Dessa forma, as condições de primeira ordem para maximização são:
∠L = P * Q L – w = 0 (4)
∠K = P * Q K – r = 0
De onde podemos deduzir que:
w/P=QL; r/P=QK (5)
Deduzimos, então, que a firma maximiza lucros quando a produtividademarginal do trabalho (QL) é igual ao salário
real (w/P) e quando a produtividade marginal do capital (QK) é igual a sua remuneração real (r/P). Generalizando, a firma
maximiza lucro quando a remuneração real dos fatores é igual a suasrespectivas produtividades marginais.
Podemos, também, expressar as condições de primeira ordem da seguinte forma:
w = P * Q L ; r = P * QK (6)
O lado esquerdo dessas expressões é a remuneração nominal dos fatores. Também pode ser interpretado como o
custo marginal de contratar um trabalhador ou uma unidade de capital a mais. Como a firma é tomadora de preços no
mercado de fatores (hipótese já mencionada), esse custo marginal é constante. O lado direito das expressões é a receita que
a firma recebe por contratar uma unidade a mais de um fator. Tomemos o exemplo do trabalho. A produtividade marginal é
o incremento na produção oriunda da contratação de um assalariado a mais. Esse incremento de oferta vezes o preço da
como resultado aumento na receita total que a firma obteria a partir da contratação de um assalariado a mais, ou seja, a
receita marginal ou o valor da produtividade marginal. Concluímos, assim, que essas igualdades são, em última instância,
um caso particular (aplicado ao mercado de fatores) das condições de primeira ordem mais gerais (igualdade entre custo
marginal e receita marginal).
É preciso que entendamos bem porque a firma está maximizando lucro quando iguala a remuneração nominal com
o valor da produtividade marginal do trabalho. Lembremos que w e P são constantes. Assim, a única alternativa que a firma
tem para obter essa igualdade é alterar a produtividade marginal do fator. Como altera, dada a função de produção, essa
produtividade? Simplesmentealterando a quantidade de trabalhadores contratados. Imaginemos que w < P*QL. Nesse
caso, a receita adicional que a firma obtém contratando um trabalhador a mais é superior ao custo (salário) que vai pagar
por ele. Dessa forma, essa não é uma situação na qual maximiza lucro, visto que pode aumentá-lo incorporando outro
trabalhador. Porém, dada a hipótese sobre a função de produção (produtividades marginais positivas mas decrescentes),
chegará um ponto no qual essa igualdade ocorrerá 2/.
A utilização de cada fator, por sua vez, estará dada pela relação entre asremunerações relativas.
Essa vinculação entre utilização de fatores eremunerações relativas é fácil de ser visualizada quando lembramos que
aremuneração real de cada fator é igual a sua produtividade marginal. A partir da expressão anterior (6), obtemos as
seguintes igualdades:
w / Q L = P ; r / QK = P e, assim, QL / QK = w / r (7)
Nesta altura de nossa exposição, talvez seja conveniente desenvolver umexemplo numérico para ilustrar o eixo
central da teoria neoclássica de formação dos preços dos fatores. Imaginemos que temos dois fatores de produção(
trabalho, L, e capital, K) e a seguinte função de produção 3/:
0.75 0.50
Q=L K (8)
Dada essa função de produção, as produtividades marginais do trabalho e do capital são:
0.5 - 0.25
Produtividade marginal do trabalho = QL = (0.75) K L (9)

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 44 -
-50 0.75
Produtividade marginal do capital = QK = (0.50) K L
As produtividade marginais são decrescentes (ou seja, na medida em que se agregam trabalhadores, dado o
capital, a contribuição do novo trabalhador ao produto é cada vez menor) /4:
0.5 - 1.25
QLL = (-0.19) K L <0 (10)
-1.5 0.75
QKK = (-0.25) K L < 0
Por outra parte, os fatores são complementares, dado que o incremento em um deles eleva a produtividade
marginal do outro. Formalmente:
-0.5 - 0.25
QLK = (0.375) K L >0 (11)
-0.5 1.75
QKL = (0.375) K L > 0
Suponhamos, agora, que o salário nominal seja de R$ 150 ( w = 150) e a remuneração do capital seja de R$ 75 ( r =
75). Essas duas remunerações são exógenas à firma. Em outros termos, a firma é tomadora de preços no mercado de fatores,
fato que significa que a mesma pode contratar a quantidade que ela deseje de capital e trabalho sem que essa demanda de
fatores tenha impacto sobre os preços dos mesmos.
Por outra parte, o preço do produto Q (ou seja, o preço do bem ou serviço que a firma produz) é também exógeno,
dado para a firma. Suponhamos que esse preço seja de R$ 100 ( P = 100).
Nesse caso, temos que a firma possui a seguinte função (função de lucros) a ser maximizada:
∠ = 100 ( K 0.50 L 0.75 ) – ( 150* L + 50 * K) (12)
0.50 0.75
Onde: 100 ( K L ) = receita total ( preço vezes quantidade ) e ( 150 * L + 75 * K) são os custos totais (o preço
de cada fator vezes a quantidade utilizada). As condições de primeira ordem se obtêm derivando parcialmente com respeito
a K e L:
∠L = 75 (K 0.5 L -0.25 ) – 150 = 0 (13)
∠ K = 50(K 0.5 L -0.25 ) – 75 = 0
Resolvendo essas duas equações temos que o nível de emprego quemaximiza o lucro é de 36 (L* = 36) e a
quantidade de capital é de 12 (K* = 12) 5/. Facilmente podemos observar que essas condições de primeira ordem
estãoigualando o valor da produtividade marginal (preço do output vezes produtividade marginal) com o rendimento
nominal.
É conveniente que o leitor perceba que a relação (cociente) entre asprodutividades marginais (no ponto de
equilíbrio, ou seja, quando L = 36 e K = 12) é igual à relação (cociente) entre os rendimentos:
w / r = 150 / 75 =2 e QL / QK = 2 (14)
Uma vez ilustradas as principais proposições da teoria neoclássica de formação do preço dos fatores, podemos
avançar na análise e deduzir a demanda do fator ou dos fatores de produção. Delimitando a nossa análise ao fator trabalho,
devemos observar que a sua produtividade marginal, dada a função de produção, está determinada pela quantidade.
Assim, QL é uma função de L. Dessa forma podemos expressar a quantidade de trabalho demandada (Ld) pela firma como
uma função de w e de P, ou seja, do salário real. Formalmente:
Ld = F (w,p), com Ld / w < 0 e Ld / P > 0 (15)
Estudemos com um pouco de detalhe essas expressões.
Dado o nível de preços (ou seja, com o nível de preços fixo), quandoaumenta o salário nominal (w), aumenta o
salário real (w/P). Como, para maximizar o lucro, a firma tem que igualar o salário real àprodutividade marginal do trabalho,
uma elevação do salário real implica que a firma tem que aumentar aprodutividade marginal e a única opção é reduzir a
quantidade de trabalhadores empregados 6/. Lembremos que a produtividade marginal é decrescente e, dessa forma, a
única alternativa que a firma tem para elevar a produtividade e manter-se em uma situação na qual o salário real é igual
àprodutividade marginal do trabalho é reduzir o número de trabalhadores.
Outra possibilidade diante de uma elevaçãodo salário nominal é a elevação de preços. Se este aumenta na mesma
magnitude do salário nominal, ou seja, se o salário real se mantém constante, a única conseqüência de uma elevação do
salário nominal será a inflação, sem nenhum desdobramento sobre o emprego. Dessa forma, o preço a pagar para manter o
nível de emprego diante de aumentos no salário nominal seria mudar o patamar, para cima, do nível de preços.
Sob outra perspectiva, observamos que se o objetivo é ampliar o nível de emprego, o salário real tem que se
reduzir. Este corolário da teoria que estamos expondo será particularmente importante quando estudemos a perspectiva
macroeconômica do mercado de trabalho 7/. Toda política que vise elevar o nível de emprego terá que ter como premissa a
possibilidade de reduzir o salário real. Diante de um salário real rígido à baixa, o nível de emprego não poderá se expandir.
A partir da teoria que estamos expondo, a única possibilidade de aumentar o salário real sem custos em termos de
perdas de emprego consiste em conseguir avanços tecnológicos de tal forma que a produtividade marginal do trabalho se
eleve. Devemos ter presente que, dada a função de produção, a cada nível de salário real corresponde um nível de
emprego. Essa relação uniquívoca entre o rendimento real do trabalhador e a quantidade de trabalhadores é a curva de
demanda de demanda de trabalho e surge de maximizar os lucros (a funçãoobjetivo das firmas). Graficamente temos que:
No Gráfico anterior, D0 representa as diferentes combinações entre salário real e nível de emprego que permitem à
firma maximizar lucros. Ou seja, D 0 é uma curva de demanda por trabalho. Ao longo de D 0 tanto a tecnologia como os
outros fatores de produção (capital, por exemplo) permanecem constantes. Imaginemos que se produz um avanço
tecnológico e a produtividade se eleva 8/. Esse fato redundará em um deslocamento da demanda de trabalho e em outro
conjunto de combinações entre salário real e quantidade de trabalhadores demandada. Assim, se o objetivo consiste em

Page 43 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 45 -
atingir um salário real mais elevado sem custos em termos de emprego, a única alternativa viável é produzir um
deslocamento da curva de demanda por trabalho à direita, que se pode obter mediante, por exemplo, uma elevação do
capital por trabalhador ou o avanço tecnológico.
Além desses fatores, choques exógenos podem alterar a posição da curva de demanda por trabalho. Imaginemos
que se produz um choque exógeno negativo (ausência de chuvas no setor agrícola). Nesse caso, dada a tecnologia e o
capital, o “output” da firma se reduzirá a cada nível de trabalho e teremos um deslocamento (à esquerda) da curva de
demanda de trabalho. Nesse caso,manter o nível de emprego requererá uma redução do salário real, que não será outra
coisa que o reflexo da queda da produtividade decorrente da diminuição no volume de chuvas. Podemos exemplificar as
proposições expostas nos parágrafos anteriores a partir de uma função de produção Cobb-Douglas:
á (1-á)
Q (L,K) = A K L (16)
Dada essa função de produção, podemos descrever a função lucros a ser maximizada nos seguintes termos:
∠ = P * A K á L (1-á) -{ w * L + r * K } (17)
Derivando com respeito ao trabalho (L), temos que:
∠L = (1-á) P A K á L (-á) – w = 0 (18)
Colocando em evidencia L:
L = { (1-á) P A/ w } K
(1/ á)
(19)
Essa função é a demanda de trabalho no caso específico de uma função de produção Cobb-Dopuglas. Como já
afirmamos, a demanda de trabalho tem uma relação inversa com o salário nominal e é crescente com respeito a P, A e K.
II. Temas Vinculados
II.1. A Dimensão da Eficiência.
A condição de equilíbrio da firma que logramos estabelecer na Seção anterior surge da maximização de uma função
objetivo (o lucro). Essa condição requer que a firma determine a quantidade de trabalho e capital utilizada de tal forma que
a relação entre suas produtividades marginais seja igual à relação entre o preço pago por esses fatores.
Suponhamos, agora, que a firma, dado um nível de produção predeterminado, procure minimizar os custos. Ou
seja, a função objetivo é a minimização de custos sujeita a uma restrição dada pela quantidade pré-estabelecida.
Formalmente:
Min. CT = w * L + r * K (20)
0
s.a. Q = Q( L, K)
0
Onde: CT = custos totais; Q = quantidade a ser produzida; Q( L, K) = função de produção com as características
já mencionadas (produtividades marginaispositivas, mas decrescentes).
O lagrangiano desse programa de minimização é:
0
= (w * L + r * K ) – ë ( Q( L, K) - Q ) (21)
Considerando que as variáveis sobre as quais a firma tem escolha são K e L, as condições de primeira ordem são:
L = w – ë QL = 0
K = r – ë QK = 0 (22)
0
Q = Q( L, K)
Das duas primeiras igualdades temos que:
w / r = QL / QK (23)
Ou seja, o ponto de eficiência (custo mínimo para atingir um dado nível de produção) requer uma condição de
equilíbrio (a relação entre os preços dosfatores deve ser igual à relação entre as produtividades marginais) que é igual
àquela que encontramos quando o objetivo da firma é maximizar lucros 9/. Em outros termos, dada a tecnologia (que se
cristaliza na função de produção), a combinação ótima dos fatores depende da relação entre os rendimentos relativos.
Assim, quando a firma maximiza os lucros atinge pontos de equilíbrio que são iguais àqueles que atingiria se a decisão
fosse minimizar custos para atingir uma determinada produção 10/.
II.2. Distribuição de Renda.
O leitor terá já seguramente percebido que, segundo esta teoria, cada fator de produção será retribuído (pago)
segundo a sua produtividade marginal.
Sob uma perspectiva mais ampla, para a abordagem neoclássica não existem “classes sociais”, como nos autores
clássicos (Ricardo e Marx). A produção é viabilizada através da combinação (dada na função de produção) dos fatores de
produção. Ou seja, não existem “trabalhadores” e “capitalistas”, como classes separadas e antagônicas. Existe o “fator”
trabalho e o “fator” capital. Um indivíduo pode possuir vários ativos (força de trabalho, capital e recursos naturais, por
exemplo). A oferta de cada um deles dependerá de sua remuneração em um processo de maximização da sua função
objetivo (a utilidade). Nessa perspectiva, não existe “luta de classes”, não faz sentido esse conceito. A remuneração de
cada fator é uma questão “técnica”, determinada pela contribuição marginal de cada fator à produção. Essa contribuição,
por sua vez, estará dada pela função de produção. Suponhamos que um governo queira alterar a relação entre
aremuneração ao trabalho e ao capital favorecendo o primeiro elevando o salário nominal (w) ou, simplesmente, queira
elevar a remuneração ao trabalho. Nesse caso, se incrementaria a relação w/r, incrementando-a e, logicamente, deveria
elevar-se a relação entre as produtividades marginais (QL / QK). O resultado seria uma penalização do trabalho (dado que
seria empregado em menormagnitude) e uma maior utilização do capital. Assim, segundo a perspectivaneoclássica, o
objetivo do governo (favorecer o trabalho através de uma elevação no valor nominal de sua remuneração) acabaria
penalizando os assalariadosatravés de uma menor utilização do fator trabalho. Logicamente, essa queda na utilização do

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 46 -
trabalho não implica em queda na participação do trabalho na renda, já que a distribuição dependerá das respostas das
quantidades relativas diante dessa mudanças das remunerações relativas.
Contudo, a potencialidade da teoria neoclássica ou marginalista em explicar o processo de distribuição de renda
não é tão simples e direto, por limitações e incoerências intrínsecas a essa teoria.
Iniciemos a nossa discussão com o exemplo numérico que utilizamos anteriormente. Lembremos que os valores
encontramos de L e K que maximizarão o lucro eram 36 e 12, respectivamente. Dadas essas quantidades e a função de
0.75 0.50
produção (Q = L K ), concluímos que essa combinação de fatores redundará em um produto de 50,91 (Q = 50,91). Esse
produto vezes o preço ( P = 100) tem como resultado o valor do produto 5091 (100 vezes 50,91). Como temos dois fatores de
produção, seria lógico esperar que a massa de salários (salário nominal vezes a quantidade de trabalho utilizada) somada
àtotalidade dos rendimentos do capital (r vezes K, no nosso caso) coincida com a totalidade do produto nominal. Dessa
forma, a apropriação dos assalariados do produto mais a apropriação pelo fator capital esgotaria o produto. Em termos
formais:
(w * L) + (r * K) = P * Q (24)
Se dividimos a expressão anterior por P * Q, o resultado é:
(w * L)/ (P*Q) + (r * K)/ (P*Q) = 1 (25)
A participação dos salários no produto estaria dada pela expressão (w * L)/ (P*Q) e a do rendimento do capital
por (r * K)/ (P*Q). No exemplo numérico que utilizamos é fácil perceber que essa “contabilidade não fecha”. Se
multiplicamos a quantidade de trabalho utilizada (L = 36) vezes o salário nominal (w = 150) concluímos facilmente que a
massa de salário atinge 5.400. Ou seja, temos uma remuneração nominal total ao fator trabalho que é superior ao produto
nominal total (5.091). A esse fato, que já é pouco consistente, deveríamos agregar a massa nominal de rendimentos do fator
capital, que totaliza 900. Assim, orendimento total nominal dos fatores é 6.300, superior ao valor do produto nominal total
(mais ou menos 5.091).
Essa incoerência surge das características da função de produção. Observemos que a função de produção do
nosso exemplo é homogênea de grau 1.25 11/. Ou seja, estamos diante de uma função de produção com rendimentos
crescentes de escala. Lembremos o Teorema de Euler. Este nos diz que, quando uma função (Q (L;K), por exemplo) é
homogênea, se cumpre a seguinte igualdade:
L QL+ K QK = k [Q(K;L)] (26)
Vamos começar com o caso mais fácil. Imaginemos que a função de produção Q tem rendimentos constantes de escala
(k=1). Como QL e QK são as produtividades marginais do capital e do trabalho, respectivamente, segundo a teoria
marginalista essas serão suas remunerações. Essas remunerações vezes a quantidade de trabalho e capital utilizado resulta
na massa de rendimentos. O corolário direto é que, quando os rendimentos são constantes, a soma da massa de
rendimentos pago a cada fator esgota o produto. Em outros termos, a soma das participações relativas tem como resultado
1 12/. Contudo, se k > 1, rendimentos crescentes, a soma da massa de rendimentos dos fatores é superior ao produto. No
caso de k <1, rendimentos decrescentes, a soma dos rendimentos é menor que o produto. No nosso exemplo, como a
função de produção tinha rendimentos crescentes (k=1,25), a soma dos rendimentos é superior ao produto.
Nesse contexto, sob um ponto de vista econômico, seria interessante trabalhar com funções de produção que
tenham rendimentos constantes (homogênea de grau 1). Imaginemos que estamos diante da seguinte função de produção:
0.25 0.75
Q=K L (27)
Aqui estamos diante de uma função de produção com rendimentos constantes ou homogênea de grau 1 (0.25 +
0.75 = 1). Suponhamos que os demaisparâmetros de nosso exemplo não mudam: P = 100; w = 150 e r = 75. Dados esses
valores, a função de lucro a ser maximizada adquire a seguinte expressão:
∠ = 100 ( K 0.25 L 0.75 ) – ( 150* L + 50 * K) (28)
As condições de primeira ordem (derivadas parciais com respeito ao trabalho e ao capital iguais a zero) são:
∠L = 75 (K 0.5 L -0.25 ) – 150 = 0 (29)
∠ K= 50 (K L ) – 75 = 0
-0.50 0.75

Temos duas equações e duas incógnitas (K e L). Suponhamos que você, leitor, tente resolver esse sistema. Nesse
caso, rapidamente perceberá que não tem solução. Quando a função de produção é homogênea de grau 1, amaximização da
função lucro fica indeterminada. Justamente, aquela função de produção que seria interessante para ser explorada, uma vez
que asremunerações dos fatores exaurem o produto, não pode ser utilizada quando a função objetivo a ser maximiza é o
lucro e a firma é tomadora de preços no mercado de produto e fatores.
Qual é a alternativa? Em termos teóricos o problema pode ser contornado estabelecendo uma restrição.
Continuando com o nosso exemplo numérico,imaginemos que a função de produção e os valores dos parâmetros
0.25 0.75
permaneçam (Q = K L ; P = 100; w = 150 e r = 75) mas agregamos um nível de produção exogenamente determinado
de, por exemplo, 50 (Q=50). Neste caso, considerando o nível de produto já determinado (exogenamente fixado), a função
objetivo é minimizar custos (um problema que consiste em combinar eficientemente os recursos para atingir um dado nível
de produção com um custo mínimo). Formalmente:
Min. CT = 150 L + 75 K (30)
0.25 0.75
s.a. 50 = K L
O lagrangiano desse programa de minimização é:
0.25 0.75
= (150 * L + 75 * K ) – ë (K L - 50 ) (31)
As condições de primeira ordem são:

Page 45 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 47 -
0.25 –0.25
L = 150 – ë [ 0.75 K L ] = 0
–0.75 0.75
K = 75 – ë [ 0.25 K L ]=0 (32)
0.25 0.75
50 = K L
Resolvendo esse sistema, obtemos que L = 55,33 e K = 36,89. Com esses níveis de fatores, a relação entre as
produtividades marginais é igual à relação entre os rendimentos 13/. Ou seja, obtemos a mesma condição de
equilíbrioobservada no caso de maximização de lucros, mas podemos, agora, chegar a um resultado.
A pergunta que temos que responder é: porque essa impossibilidade de encontrar os valores de equilíbrio quando
maximizamos uma função de lucros e a função de produção é homogênea de grau 1?. Para responder a essa pergunta
utilizemos uma função de produção homogênea de grau 1 bem geral:
á (1-á)
Q (L;K) = A K L (33)
onde: A e á são parâmetros, com 0 < á < 1.
Derivemos parcialmente a expressão anterior para encontrar as produtividades marginais do trabalho e do capital:
á (-á)
QL = (1-á) A K L (produtividade marginal do trabalho) (34)
1-á (1-á)
QK = (á) A K L (produtividade marginal do capital) (35)
Notemos que podemos expressar essas produtividades marginais como função da relação entre os fatores
produtivos. Com efeito:
á
QL = (1-á) A [ K/L ] (36)
1-á
QK = (á) [ K/L ] (37)
Ou seja, as produtividades marginais dependem da relação entre asquantidades de fatores (K/L) e não do
montante absoluto. Suponhamos que A = 1 e á= 0.5. Nesse caso, a produtividade marginal do trabalho será de 0,71, seja o
montante de K igual a 4 e do trabalho igual a 2 ou na alternativa de K = 800 e L = 400. Daí surge uma indeterminação do
nível de utilização dos fatores. Se só sabemos que a relação entre as produtividades marginais e o preço dos fatores tem
que ser uma igualdade (como no caso do problema reduzir-se à maximização de lucros), infinitas alternativas são possíveis.
Para determinar a combinação ótima de recursos nos deparamos com duas situações: ou determinamos aquantidade que se
deseja produzir (e o problema consiste em minimizar custos, função objetivo, sujeita a essa restrição de oferta) ou temos
que determinar o orçamento que a firma dispõe (e o problema se reduz a maximizar a produção, função objetivo, sujeita à
restrição orçamentária).
Dessa forma, concentremo-nos em um programa (maximização daprodução sujeita a uma restrição orçamentária) e
função de produção homogênea de grau 1. Formalmente, temos que:
á (1-á)
Max. Q (K;L) = A K L (38)
0
s.a. CT = w * L + r * K
Construindo o lagrangiano obtemos:
á (1-á) 0
=AK L – ë ( w * L + r * K - CT ) (39)
As condições de primeira ordem são:
á (-á)
L = (1-á) A K L - ë w = 0 (40)
á-1 (1-á)
K = (á) A K L – ë r = 0
0
CT = w * L + r * K
A partir das expressões de L por K podemos lograr à seguinte igualdade:
w/r = K (1-á ) / Lá (41)
Rearangando a expressão anterior temos que:
K = [ (w /r) L á ] / (1-á) (42)
No plano K-L, essa igualdade expressa o caminho de expansão da firma. Ou seja, são os pontos nos quais as
produtividades marginais são iguais à relação entre os preços dos fatores. Lembremos que os pontos que maximizam a
produção são combinações entre os insumos nas quais o cociente entre as produtividades marginais dos fatores é igual ao
cociente entre os preços dosfatores de produção. A relação entre as produtividades marginais não é outra coisa que a
inclinação da isoquanta. Com efeito, a isoquanta representa as diferentes combinações de insumos sem alterar o nível de
produto. Na função de produção que estamos utilizando como ilustração (grau de homogeneidade igual a 1), podemos
obter a isoquanta tomando o diferencial total dessa função e igualando a zero (a quantidade de produto não muda).
Formalmente:
á (-á) á-1 (1-á)
d Q = (1-á) A K L dL + (á) A K L dK = 0 (43)
Da igualdade anterior podemos obter:
- dK / dL = K (1-á )/ Lá (44)
que é a inclinação da isoquanta.
Por outro lado, temos que a inclinação da restrição orçamentária no plano K-L está dada pela relação w/r. Com
0
efeito, a partir da restrição CT = w * L + r * K, temos que:
0
K = CT / r - L (w/r) (45)
No caso que estamos analisando, o sendeiro de expansão (os diferentes pontos de equilíbrio, maximização da
produção respeitando a restriçãoorçamentária, que correspondem a distintos níveis de produção) é uma reta. A relação
entre os gastos totais com capital e com trabalho é constante. Suponhamos, como no exemplo que trabalhamos em

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 48 -
parágrafos anteriores, que á = 0.5. Dada a condição de equilíbrio w/r = K (1-á) / Lá (relação entre preço dos fatores igual ao
cociente entre produtividades marginais) temos que o resultado será 2 w L = r K. Ou seja, o gasto com a massa de salários (
w * L) será sempre o dobro do gasto total com o fator capital, independentemente da trajetória da relação w/r. Esse fato
fica mais transparente quando calculamos a participação de cada fator nos rendimentos totais. Sabemos que a remuneração
total de cada fator é igual a seu produto marginal (dado que o mesmo é igual ao rendimento) vezes a quantidade utilizada
dividido pelo produto. Denominando sL e sK á participação do trabalho e do capital no produto, temos que:
SL = L * w / Q = L * QL/ Q ; SK = K * r / Q = K * QK/ Q (46)
á (1-á)
No caso específico da função de produção que estamos analisando (Q (L;K) = A K L ), temos que as
produtividades marginais já calculadas são:
á (-á) á-1 (1-á)
QL =(1-á) A K L ; QK= (á) A K L (47)
Substituindo ambas expressões em (46), concluímos que:
SL = (1-á) ; SK = á (48)
Como á é um parâmetro, o corolário é que a participação do trabalho e do capital no produto é constante. Por
outra parte, a soma das participações é 1 (SL+ SK= 1). Em outros termos, a soma das remunerações totais esgota o produto.
Dessa forma, na função que estamos estudando, essa participação está dada pela potência à qual estão elevados os
insumos na função de produção. Como a mesma é homogênea de grau 1, temos que, obviamente, as remunerações totais
esgotam o produto.
Isso surge da constância entre a relação de K e L (voltamos a frisar que, no nosso exemplo, K = [ (w /r) L á ]/ (1-á),
e com á= 0.5, os rendimentos totais do trabalho serão sempre o dobro dos do capital, não importa a relação w/r). Se a
relação entre as remunerações total dos fatores não se altera diante de mudanças em w/r, significa que variações
percentuais na relação (w/r) geram variações percentuais de sinal contrário mas na mesma magnitude percentual, na relação
(K/L). Ou seja, se o cociente w/r aumenta x%, a relação k/L cai o mesmo x%, de forma a manter a distribuição da renda
constante. Esse tipo de função de produção é conhecida na literatura como CES 14/.
A fim de analisar com maior rigor as conseqüências de mudanças na relação entre o preço dos fatores (no nosso
caso, entre w e r) sobre a utilização desses fatores e a participação na renda, convém deter- nos na definição de
Elasticidade de Substituição. Lembremos que, no plano K-L, a isoquanta representa as distintas combinações de capital (K)
e trabalho (L) que permitem obter um mesmo nível de produto. Assim, se reduzirmos K, quanto teremos que agregar a mais
de trabalho para atingir o mesmo patamar de produção? Essa substituição necessária para nos mantermos sobre a mesma
isoquanta é determinada pela inclinação da mesma em cada ponto 15/. Dados esses conceitos, podemos definir a
Elasticidade Substituição como a variação percentual na relação K/L quando muda a taxa marginal de substituição (ou seja,
a inclinação da isoquanta). Em termos formais:
K;L = K/L, TMS (49)
onde: K;L = elasticidade substituição entre K e L;  TMS, K/L= elasticidade da relação K/L com respeito à Taxa Marginal
de Substituição. Vamos trabalhar com uma função de produção Cobb-Douglas bem geral para ilustrar esses conceitos:
á (1-á)
Q (K;L) = A K L (50)
Lembrando que sobre a isoquanta o produto não muda (dQ=0), temos que a inclinação dessa função no plano K-L
é:
dK / dL = K (1-á )/ Lá = TMS (51)
que é a Taxa Marginal de Substituição (TMS). Como a Elasticidade Substituição se define como a mudança da
relação entre K/L com respeito à Taxa Marginal de Substituição, podemos expressar a relação anterior em termos de uma
função do cociente K/L com respeito à TMS. Ou seja:
K/L = TMS á/(1-á ) (52)
Encontremos, agora, a elasticidade dessa expressão 16/:
 K/L, TMS = [ d(K/L) / d TMS ] [ TMS / (K/L) ] (53)
A derivada de K/L com respeito à TMS é á/ (1-á). Assim, temos que a  K/L, TMS pode ser definida como:
 K/L, TMS = {á/(1-á) } {TMS * (1-á) / á TMS } (54)
Simplificando a expressão anterior obtemos 1. Assim, concluímos que o valor da elasticidade substituição em uma
função Cobb-Douglas é unitário e, portanto, uma mudança de x% na taxa marginal de substituição (ou seja, na inclinação
da isoquanta) gerará uma variação de um percentual similar na relação K/L 17/.
Agora, é lógico esperar que o leitor se pergunte em que medida toda esta discussão sobre a elasticidade
substituição está relacionada com o tema de distribuição de renda. O elo entre a distribuição de renda e a elasticidade
substituição está dado pelas condições de primeira ordem para a maximização da produção sujeita à restrição orçamentária
(ou, o que é similar, a minimização de custos respeitando um nível mínimo de produção exogenamente determinado). Essas
condições de primeira ordem dizem que, no ponto de máximo, a inclinação da isoquanta (taxa marginal de substituição,
TMS) deve ser igual à inclinação da restrição (cociente entre os preços dos fatores). Quando estes mudam, altera-se o
ponto de tangência, ou seja, muda a TMS. Qual é o impacto sobre a demanda de fatores? Esse desdobramento está
determinado pela elasticidade-substituição. Se essa é igual a um implica que x% de alteração na relação entre a
remuneração dos fatores resultará em uma alteração, inversa, de x% no cociente entre a quantidade dos fatores. Dessa
forma, a distribuição de renda permanece constante. Essa estabilidade na distribuição de renda é comum a todas as
funções Cobb-Douglas, por terem, justamente, uma elasticidade substituição constante.
Contrariamente, se a elasticidade-substituição é diferente de 1, diante de mudanças nos preços relativos dos

Page 47 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 49 -
fatores assistimos a alterações na distribuição de renda. Concretamente, além da unidade, temos dois casos possíveis.
Quando a elasticidade-substituição é inferior a 1, uma elevação da relação w/r gera uma redução em menor proporção na
relação K/L, resultando em uma elevação na participação do trabalho na renda. No outro caso, quando a
elasticidade-substituição é superior a 1, uma elevação na relação w/r redunda em uma queda relativa maior na relação K/L,
tendo como corolário uma redução na participação do trabalho na renda 18/.
II.3. Custos Fixos.
Devemos perceber que, em toda a análise desenvolvida até agora, os salários pagos ao indivíduo que oferece os
serviços de seu trabalho são o único custo para a firma. Assim, podemos, indistintamente, utilizar a palavra custo o salário.
Dessa forma, o salário pago a um trabalhador a mais contratado pela
firma pode ser identificado como um custo marginal.
Alternativamente, uma hipótese mais realista deve levar em consideração a existência de outros tipos de custos,
entre os quais podemos mencionar os custos fixos. Estes podem ser de diversas ordens e associados a distintos
fenômenos. Por exemplo, a firma deve procurar novos empregados quando quer admitir alguém e essa procura tem custos
que estão vinculados ao trabalho mas não são salários. Não obstante ser um fato mais ou menos óbvio, a economia de
inspiração neoclássica só incorporou esse fato, no seu arcabouço teórico, na década de 60. Walter Oi, em um artígo
intitulado “Labor as a Quasi-fixed Factor” (O Trabalho como Factor quase-fixo), publicado no Journal of Political
Economy em outubro de 1962, sofistica a análise, ao supor, realisticamente, que os custos não poderiam ser reduzidos,
exclusivamente, aos salários pagos.
Não importa, neste ponto de nossa exposição, assinalar as diversas fontes que podem introduzir uma
diferenciação entre os custos e os salários pagos. As mesmas serão amplamente estudadas em Capítulos posteriores. Aqui
nos cabe salientar em que medida o modelo exposto em parágrafos anteriores muda na presença de custos fixos.
Em primeiro lugar mencionemos, o processo de ajustamento. Se um trabalhador está sendo remunerado segundo
sua produtividade marginal e, por algum motivo, ele deve ser desligado, esse ajuste se dará de forma instantânea.
Suponhamos, agora, que a firma deva incorrer em custos de procura. Diante desses custos, o ajuste pode não ser
instantâneo. Imaginemos uma conjuntura caracterizada por um choque adverso (queda de demanda, por exemplo). A
empresa não ajustará o estoque de assalariados de forma instantânea, tendo em vista que uma reversão do choque
redundará em custos para procurar outro
indivíduo. Contrariamente, se a demanda por bens e serviços dirigida à firma se eleva, esse fato não terá como corolário
imediato maiores contratações. Como o processo de novas contratações implica em custos, a firma tenderá a retardar a
ampliação no estoque de assalariados, mediante a utilização de horas extras, por exemplo, até que a maior demanda se
manifeste como um fenômeno duradouro e não transitório. Esses fatos podem introduzir uma certa defasagem entre a etapa
do ciclo macroeconômico e a demanda de trabalho. Suponhamos que a economia esteja em recessão mas os primeiros
sinais de recuperação já sejam perceptíveis (incrementos nas vendas do Comércio Varejista, por exemplo). Nesse período
de transição, devido à existência de custos fixos, podem não se concretizar maiores oportunidades de emprego, visto que
as firmas poderão utilizar mais intensamente a mão-de-obra já contratada (através de horas extras, por exemplo) sem
necessidade de incorrer em custos de procura em um contexto no qual a recuperação ainda não esteja consolidada,
existindo a possibilidade de uma reversão. No caso oposto, se a economia estiver em um período de crescimento e se
perceberem sinais de desaceleração, devido à presença de custos fixos, as firmas poderão utilizar menos intensamente a
mão-de-obra já contratada, dando férias coletivas a uma parte dela.
Em segundo lugar, devemos ter presente que custos fixos introduzem uma diferenciação entre salário e custo para
a firma. Lembremos que, para maximizar o lucro, o ponto de equilíbrio da firma é aquele no qual a receita marginal é igual ao
custo marginal. A receita marginal é o preço (exógeno, no caso de concorrência perfeita) vezes a variação da quantidade
oriunda da contratação de uma unidade de trabalho a mais (ou seja, preço vezes produtividade marginal). No caso do custo
marginal, ao salário devem ser acrescido os custos não salariais. A análise se torna um pouco mais complexa visto que os
custos fixos podem ocorrer em um momento do tempo (no período de contratação, por exemplo), enquanto o salário é pago
periodicamente (cada semana, mês, etc.). Nesse caso, a avaliação entre custo marginal e receita marginal deve ser feita em
termos de fluxo ou, mais especificamente, em termos de valor presente. Dessa forma, o valor presente dos custos (salários e
outros custos a ser incorridos no transcurso do tempo) com o valor presente do valor da produtividade marginal devem
igualar-se.
Podemos concluir, assim, que a remuneração do trabalhador não é, necessariamente, o valor da sua produtividade
marginal. A existência de custos fixos tem como corolário um rendimento pelo serviços do trabalho que é inferior à
produtividade marginal.
Em realidade, a última proposição (diferenciação entre remuneração e valor da produtividade marginal) pode ter
como origem custos fixos (custos vinculados à procura, necessidade de formação, etc.) ou não (encargos sociais, por
exemplo). Quando o custos estão vinculados ao salário de forma percentual (como o pagamento do INSS, Previdência
Social) estamos na presença de custos que induzem uma diferenciação entre salários e custos para a firma, mas os
problemas de ajustamento antes mencionados não se apresentam. Somente quando os custos são fixos (procura, formação,
multa por desligamento sem justa causa, etc.) o problema do ajustamento aparece.
O caso dos custos fixos é relevante quando o analista está interessado em correlacionar a demanda de trabalho e
mudanças no ambiente no qual a firma está inserida. Esse ambiente pode estar correlacionado com a etapa de um ciclo
macroeconômico (caso utilizado em nossos exemplos dos parágrafos anteriores) ou a outros fatores. Tomemos o caso de
um choque tecnológico. Talvez seja conveniente para uma firma poder contratar trabalhadores mais qualificados (mais

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 50 -
compatíveis com o novo padrão tecnológico). Contudo, a amplitude das novas contratações e a substituição dos
trabalhadores antigos podem estar influenciadas pelos custos fixos.
Em geral, os custos fixos estão associados ao capital. Uma vez comprada uma máquina, em termos de adaptação
às mudanças do contexto no qual está inserida a firma, esta apresenta pouca flexibilidade. Contrariamente, o fator trabalho
tende a ser assumido, erroneamente, como uma variável de flexibilidade infinita. Ao introduzir na análise os custos fixos, o
trabalho reduz essa hipotética flexibilidade infinita, tornando-se, na denominação de Oi, um fator “quase-fixo”.
Observamos que a importância dos custos fixos depende muito, ainda que não exclusivamente, do marco
legal-institucional de cada economia. Existem certos aspectos que podem, logicamente, ser tratados de forma geral (custos
vinculados à procura). Outros, como a formação necessária do trabalhador para torná-lo apto para o serviço depende de
fatores externos à firma, como educação da população. Outro exemplo seriam os pagamentos que a firma deve realizar no
caso de desligamento (multas, avisos prévios, etc.). Em geral, quanto menores são esses custos menores serão os prazos
de ajustamento ou, em outros termos, maior será a sensibilidade da demanda de trabalho a mudanças no ambiente.
II.4. Salário Mínimo.
O estabelecimento de um salário mínimo a ser recebido por todo assalariado é uma prática muito utilizada. A
maioria dos países de maior desenvolvimento relativo estabeleceram patamares mínimos para os rendimentos a serem
pagos aos assalariados. Essa prática é adotada ainda por nações, como os EUA ou a Inglaterra, nas quais os princípios do
liberalismo econômico estão muito ancorados no imaginário da uma parcela significativa da população.
Devemos perceber que estabelecer um salário mínimo pode ser assemelhado a estabelecer um preço mínimo para a
compra de um produto. Essa política introduz uma severa limitação no livre jogo da oferta e da demanda, ao estabelecer
pontos nos quais a oferta pode não se igualar a demanda e esse desequilíbrio permanecer no tempo, na medida em que, ao
limitar o auto-ajuste do mercado, não existem forças (os preços) que permitam superar o excesso de oferta.
No caso de um salário mínimo, o objetivo é reduzir as desigualdades e/ou estabelecer patamares mínimos de
bem-estar social. A justificativa por trás de uma política como essa consiste em supor que o livre funcionamento do
mercado ou gera desigualdades que devem ser reduzidas e/ou que, para certos assalariados, o nível de salário que
estabelece o livre jogo da oferta e da demanda seria incompatível com um nível mínimo de bem-estar material. Nessa
perspectiva, o salário mínimo, por uma questão de lógica, deve ser superior àquele que seria estabelecido pela interação da
oferta e demanda de trabalho.
Desde uma perspectiva de análise neoclássica ou ortodoxa, os impactos da introdução de um salário mínimo
podem ser analisados sob diversos ângulos.
Introduzamos o problema a partir de uma análise gráfica.
No Gráfico anterior sintetizamos uma típica caracterização de um mercado de trabalho. A oferta de trabalho,
crescente em função do salário real, e uma demanda de trabalho que cai na medida em que o salário real se eleva. O ponto
de equilíbrio seria aquele no qual a oferta iguala a demanda e o preço (salário real) que viabiliza essa igualdade é aquele que
denominamos de salário de mercado. Nesse ponto não existe desemprego, dado que a quantidade de assalariados que
“saem” à procura emprego é igual àquela demandada pelas firmas (oferta igual à demanda).
Suponhamos, agora, que o governo caraterize esse salário estabelecido pela interação da oferta e da demanda
como socialmente inaceitável, por não proporcionar condições mínimas de bem-estar material e estabeleça um salário
mínimo superior àquele estabelecido no mercado. Nesse caso, considerando as características das funções de oferta e
demanda, a quantidade de trabalhadores que oferecem seus serviços no mercado vai crescer e a quantidade de
trabalhadores que as firmas empregam vai cair. No gráfico, essas quantidade estão especificadas por Ls e Ld. Como Ls >
Ld, temos um “excesso” de trabalhadores que é, justamente, o desemprego. Ou seja, a quantidade de trabalhadores
desempregados pode ser representado por (Ls – Ld) > 0. Teoricamente, esse “excesso” de trabalhadores poderia ser
automaticamente eliminado através da interação entre a oferta e demanda, dado que, como em todo mercado em
concorrência, o excesso de um produto deveria ter como resultado uma queda no seu preço até o ponto no qual a oferta e
demanda se equilibrem. Contudo, como existe um preço mínimo esse ajuste não operaria e o desequilíbrio (representado
pelo desemprego) seria persistente.
Assim, dentro da perspectiva neoclássica, o desdobramento de introduzir um salário mínimo seria o desemprego.
O salário mínimo pago nesse mercado ter-se-iaa elevado mas o custo seria um contingente de assalariados dispostos a
trabalhar mais para os quais não existem empregos.
Uma segunda perspectiva de análise complementa o enfoque básico que apresentamos nos parágrafos anteriores.
Lembremos que, para a economia neoclássica, os rendimentos dos fatores estão vinculados a sua produtividade. As
questões “técnicas” (produtividades) determinam a remuneração dos fatores.
Para aprofundar a análise imaginemos que existam vários mercados de trabalho. Ou seja, mercados para diferentes
tipos de trabalho. Para simplificar, vamos dividir essas partes do mercado em três: mercado para trabalhadores muito
qualificados, medianamente qualificados e não qualificados. Suponhamos que as produtividades são decrescentes (mais
elevada para os muito qualificados, menor para os medianamente qualificados e mais baixa para os não qualificados) e,
como corolário, os rendimentos são também decrescentes (as produtividades determinam os rendimentos). Nessa lógica, o
menor salário será recebido por aqueles assalariados não qualificados. Assim, se o governo quer introduzir um salário
mínimo, deverá ser superior ao patamar mínimo (rendimentos dos assalariados não qualificados). Contudo, como o salário a
ser pago agora excede a produtividade desses trabalhadores, as firmas não estarão mais dispostas a empregá-los. Ou seja,
a queda da demanda de trabalho está concentrada nos assalariados cujos salários os formuladores de política procurariam
elevar mediante a legislação (salário mínimo).

Page 49 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 51 -
Nesse sentido, concluímos que, no arcabouço teórico neo-clássico, o paradoxo de introduzir um salário mínimo é
múltiplo. Em primeiro lugar se está trocando um mal (salário de mercado muito reduzido) por outro (desemprego). Esse fato,
por si só, não permitiria concluir que o salário mínimo seja um bom instrumento de política social, dado que não se pode
estabelecer o balanço (relação custo/benefício). Em segundo lugar, o paradoxo total surge das características ou estrutura
do desemprego. Este estaria concentrado nos assalariados de menores rendimentos, justamente naqueles que se queria
beneficiar com a elevação do salário mínimo. Nessas perspectiva, o balanço seria negativo, uma vez que esses assalariados
teriam trocado o salário exíguo que se queria elevar por nada (desemprego ou sem salário).
Em realidade, as conclusões surgem das próprias premissas. Como os salários estariam estreitamente atrelados à
produtividade, medidas legais ou institucionais seriam inócuas para elevar os rendimentos dos assalariados, gerando
desemprego e reduzindo a capacidade de ajuste dos mercados. Na perspectiva neoclássica, aumentar os salários requer
incrementar a produtividade dos assalariados, seja mediante educação, seja elevando o capital por trabalhador, seja
mediante o desenvolvimento tecnológico 19/. Isso não que dizer que, para um neo-clássico, não se deva ter uma política
social que eleve o nível de vida das populações com rendimentos reduzidos. Simplesmente os teóricos dessa corrente
sustentam que não é por meio da intervenção no funcionamento dos mercados (como no caso do salário mínimo no
mercado de trabalho) que esses objetivos sociais vão ser atingidos.
Nessa perspectiva teórica, duas possibilidades de política social são vislumbradas.
A primeira visa elevar o bem-estar das populações de menores rendimentos com auxílio de políticas de
transferência de renda (via sistema tributário, por exemplo). Essas políticas seriam de efeito imediato e, sem alterar o
funcionamento dos mercados, teriam como objetivo aumentar o nível de vida das populações de menores rendimentos.
Sinteticamente, a mensagem é: deixem os mercados funcionarem e, se considerarem o perfil distributivo inaceitável ou o
nível de vida de certas camadas inumano, alterem essa situação utilizando políticas de transferencia de renda.
A segunda possibilidade está vinculada ao longo prazo. A estratégia consistiria em elevar a produtividade dos
fatores e/ou mudar as distribuição dos estoques (de capital ou terra, por exemplo). No caso de uma elevação da
produtividade, esse objetivo poderia ser logrado através da educação ou, em geral, aumentando o capital humano
(educação, saúde, por exemplo) da população que se considera vivendo abaixo de um patamar mínimo do bem-estar. Ao
mudar a distribuição dos estoques (beneficiando, logicamente, as populações mais desfavorecidas), elevaria seus
rendimentos. Um exemplo clássico desse tipo de política distributivista é a reforma agrária (redistribuir os estoques de
terra).
Um exemplo nítido da perspectiva neoclássica pode ser ilustrada nas proposições de política do Banco Mundial.
Radicalmente contra todo tipo de instituição ou aspecto legal que reduza ou limite o funcionamento dos mercados (salário
mínimo, sindicatos, etc.), essa instituição financeira incentiva políticas de reforma agrária. Assim, se no mercado de
trabalho pode ser considerada de “direita”, no mercado de fatores compartilharia as posições da “esquerda”.
II.5. Horas Trabalhadas e Nível de Emprego.
A elevação dos patamares de desemprego a partir dos anos 80 gerou uma série de propostas para sua redução,
todas, como é lógico, corolários de arcabouços teóricos mais gerais.
As alternativas de política de inspiração neoclássica, sustentavam que os problemas vinculados ao desemprego
tinham sua origem na inflexibilidade dos salários reais. Como já estudamos na Introdução desta Parte (Introdução à
Perspectiva Macroeconômica), para esta corrente de pensamento um excesso de oferta de trabalho (desemprego) é a
manifestação de um salário real muito elevado, redundando em uma oferta superior à demanda. Na medida em que o salário
real não era sensível a esse excesso de oferta de trabalho (sensível à queda), o desemprego persistia e podia tornar-se
estrutural. Logicamente, o corolário em termos de política era a remoção de todos os fatores que tornavam o salário real
rígido, como, por exemplo, o salário mínimo, os sindicatos, etc.
Contudo, essa análise era contestada por correntes situadas mais à esquerda do espectro teórico. Segundo estas,
o incremento de produtividade, possibilitado pelas novas tecnologias, era de tal magnitude que os requerimentos de
trabalho para gerar um determinado produto eram cada vez menores. Assim, ainda em contextos de elevação do produto, o
impacto desses aumentos sobre o nível de emprego eram cada vez menores, não sendo suficientes para absorver o
crescimento vegetativo (demográfico) da oferta de trabalho tendo como corolário natural o incremento no patamar de
desemprego 20/. A proposta de política que se deduz deste diagnóstico consiste em “compartilhar” o trabalho disponível.
Em outros termos: dado um nível de produto a ser atingido pela sociedade, a tecnologia determina a quantidade de
trabalho necessário para ser gerado. Nessa perspectiva, em lugar de alguns indivíduos trabalharem e outros ficarem no
desemprego, uma alternativa consistiria em compartilhar o trabalho socialmente necessário. A variável que permite esse
ajuste seriam as horas trabalhadas. Uma redução na quantidade de horas trabalhadas por assalariado possibilitaria a
geração de mais postos de trabalho. Assim, todo mundo seria empregado trabalhando menos horas. Em termos de
experiência histórica, o caso mais notório na utilização da jornada de trabalho como forma de gerar novos empregos é a
França. Em 1982, após o triunfo eleitoral (1981) de uma coalizão de esquerda encabeçada pelo Partido Socialista Francês, a
jornada de trabalho de 40 horas, que vigorava desde os anos 30, foi reduzida para 39 horas. O atual governo de esquerda,
liderado pelo Primeiro Ministro Jospin, tomou uma medida mais agressiva, induzindo uma queda nas horas semanais de
trabalho de 39 para 35, sendo o argumento para tal medida o combate ao desemprego 21/. No caso específico do Brasil, a
Constituição de 1988 reduziu a jornada de trabalho, que passou de 48 horas semanais para 44.
Essa alternativa de política para a geração de empregos, contudo, não é um ponto consensual. Tendo como
referência o arcabouço teórico que desenvolvemos nas Seções anteriores deste Capítulo, vários são os problemas
implícitos nesse tipo de proposta. Em geral, combater o desemprego através da redução da jornada de trabalho, na medida

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 52 -
em que consiste em uma opção que se colocava como alternativa à flexibilização dos mercados de trabalho defendida pela
perspectiva neoclássica, foi contestada pelos teóricos desta última corrente. As críticas podem ser melhor visualizadas
incorporando o problema das horas de trabalho no arcabouço teórico esboçado na Seção I.
Nesse sentido, a função de produção, em lugar de ser expressa em capital e trabalho pode ser definida por três
variáveis: capital, trabalhadores e horas trabalhadas por trabalhador. Formalmente, temos que:
Q = F (K, L, h) (55)
Onde: K = capital; L = quantidade de trabalhadores e h = horas trabalhadas por trabalhador.
A proposta daqueles que sugerem a redução da jornada de trabalho como instrumento para diminuir o
desemprego é relativamente simples. Imaginemos que, para produzir uma mesa, seja preciso (dado um determinado estoque
de ferramentas e madeira) um homem trabalhando oito horas. Se a jornada de trabalho é de oito horas, a produção de uma
mesa gerará, por dia, um posto de trabalho. Se a jornada de trabalho se reduz a quatro horas, por exemplo, a produção de
uma mesa viabilizará a geração de dois postos de trabalho.
O primeiro problema evocado pelos neo-clássicos consiste em supor que indivíduos e horas são duas variáveis
perfeitamente substituíveis. Em outros termos: temos que a produtividade por hora independe das horas trabalhadas.
Assim, em nosso exemplo do parágrafo anterior, se um homem produz uma mesa em oito horas, deveria produzir duas
mesas trabalhando 16 horas em um dia e três meses trabalhando as 24 horas do dia. Os teóricos neo-clássico sustentam
que essa associação direta é muito primária, argumentando que um indivíduo trabalhando oito horas poderia produzir uma
mesa mas, com certeza, trabalhando as 24 horas do dia não iria produzir três mesas. Deveria, então, ser estabelecida
alguma relação entre produtividade e horas trabalhadas. Essa relação entre horas trabalhadas e produtividade poderia,
sempre segundo os neo-clássicos, adotar uma forma parecida com a função de produção. Na presença de poucas horas de
trabalho a produtividade por hora poderia ser crescente até um ponto de inflexão a partir do qual a mesma tende a
decrescer.
Para estabelecer essas relações, poderíamos expressar a função de produção da seguinte forma:
Q = F [ K; L * e(h) ] (56)
Onde: L = quantidade de trabalhadores; e = produtividade, que depende das horas trabalhadas.
Observamos, assim, que, desde a perspectiva neoclássica, dado um nível de produto, a redução da jornada de
trabalho não redundará, de forma direta, em maiores postos de trabalho, uma vez que a própria produtividade poderá ser
afetada, fato que deveria ser introduzida na análise.
Essa vulnerabilidade das propostas alternativas se vê potencializada por outro fator. Em geral, na quase totalidade
dos países, existem normas legais a respeito da duração máxima da jornada de trabalho, ou seja, uma jornada máxima legal
22/. Jornadas superiores são legalmente possíveis (horas extras), mas são contemplados custos (salários) maiores. Por
último, devido a amparos legais, existem limites a essas horas suplementares da jornada.
Nessa perspectiva, dados dois fatores de produção (capital e trabalho), o custo total da firma poderá apresentar
duas possibilidades:
CT1 = r * K + w * L * h, quando h δh L
onde: hL= jornada, em horas, legal de trabalho
h = horas efetivas de trabalho
CT2 = r * K + w * L * h L + (1+t) * w * L * (h - hL), quando hM εh εhL
Onde: t = incremento, em termos percentuais, no pagamento das horas extras e hM = quantidade máxima de horas
a ser trabalhada por período.
Nesse caso, o problema da firma consiste em escolher três variáveis: K, quantidade de capital, L, quantidade de
trabalho e h, horas trabalhadas por trabalhador.
Esse problema pode ser abordado de várias formas. Talvez, a mais simples consista em raciocinar a partir de uma
igualdade já estudada e que supõe que a firma, para maximizar lucros, deve assegurar a equivalência entre o valor da
produtividade marginal e o custo marginal 23/. Quando temos vários fatores de produção, a relação entre o valor das
produtividades marginais deve ser igual à relação entre os custos marginais, um ponto já estudado 24/. No nosso problema
atual, deveríamos determinar o custo marginal do capital, o custo marginal das horas trabalhadas e o custo marginal do
emprego, no caso das duas alternativas possíveis (quando a jornada de trabalho é igual ou inferior à jornada padrão
estabelecida legalmente e quando é superior a ela e a firma paga horas extra). Para simplificar a álgebra e centrar as nossas
atenções no ponto central em discussão (a redução da jornada de trabalho como forma de gerar empregos), vamos
introduzir duas suposições. A primeira que o capital é fixo, está dado. Ou seja, não vamos colocar o problema da
substituição entre trabalho e capital ou horas trabalhadas e capital. A segunda simplificação consiste em supor que os
assalariados trabalham, no mínimo, a jornada padrão estabelecida legalmente, não menos. Esta simplificação é válida pois a
redução da jornada só tem algum
impacto na estratégia das firmas se estas contratam seus trabalhadores na jornada legal.
Dadas essas simplificações, temos que os custos marginais do trabalho e das horas trabalhadas são:
Cma L= w * hL quando h = hL (57)
Cma h = w * L
Cma L = w * hL + (1+t) * w * (h - hL), quando hM εh εh L
Cma h = w * L + (1+t) * w * L
Vamos analisar detidamente essas expressões. No ponto de equilíbrio, a relação entre os custos marginais é igual

Page 51 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 53 -
à relação entre as produtividades marginais ou o valor das produtividades marginais 25/. As produtividades marginais dos
assalariados e das horas trabalhadas são determinadas pela tecnologia, ou seja, estão dadas na função de produção, são
exógenas. Tomando como referência esses supostos, estudemos primeiro o caso no qual a firma utiliza seus trabalhadores
no horário legal padrão (h = hL). Nesse caso, uma redução na jornada de trabalho não altera o custo marginal das horas
(Cma h = w * L, as horas não são um argumento no custo marginal das horas), mas reduz o custo marginal do trabalho
(dado que Cma L= w * hL). Assim, a relação entre o custo marginal das horas com respeito ao custo marginal do trabalho
(Cma h/ CmaL) se reduz e, dessa forma, a relação entre as produtividades marginais das horas com respeito ao trabalho
também tem que cair. Lembrando a hipótese sobre a trajetória decrescente da produtividade marginal, na qual a relação
entre os custos marginais implica em uma tenência à substituição de horas de trabalho por trabalhadores. Ou seja, quando
a jornada efetiva coincide com a jornada padrão legal, uma redução desta última teria como resultado uma a geração de
mais postos de trabalho.
Analisemos, agora, o caso cuja jornada de trabalho efetiva é maior que a padrão estabelecido legalmente (a firma
paga horas extra). O custo marginal das horas (Cma h) continua não dependendo das horas trabalhadas. Contudo, neste
caso, o custo marginal do trabalho (ver a expressão de Cma L) tem uma relação inversa com o padrão legal (ver com
atenção a expressão de Cma L). Ou seja, estamos diante de uma alternativa na qual uma queda na jornada legal de trabalho
vai implicar em crescimento no custo marginal do trabalho e, assim, deveriamos presenciar uma tendência à substituição
de trabalho por horas trabalhadas.
O enfoque que apresentamos nos parágrafos anteriores poderia ser sofisticado, tornando-o mais realista. Por
exemplo, seria factível incluir custos fixos (custos oriundos da relação salarial não associados diretamente aos salários,
como custos de contratação, treinamento, etc.), sem que as conclusões, na sua essência, mudassem. Outro exercício
poderia relacionar-se com o impacto nos diferentes componentes dos custos sobre a duração da jornada de trabalho. Por
exemplo, como uma elevação nos custos fixos ou no custo da hora extra tem desdobramentos sobre o emprego e sobre a
jornada de trabalho. Esses exercícios poderiam se complementar introduzindo o efeito-volume ou efeito-escala. Em outros
termos: consideraríamos o caso no qual o volume ou quantidades produzidas são influenciadas por alterações nas horas
padrão legalmente estabelecidas 26/. Por último, a análise poderia ser enriquecida se, além de considerar a potencial
substituição entre horas de trabalho e trabalhadores, a possível substituição entre trabalho em geral (horas e assalariados)
e capital fosse introduzida. Hipoteticamente, em uma determinada situação, uma alteração entre a combinação de horas e
assalariados poderia gerar uma substituição entre trabalho e capital, lembrando que o trabalho (sejam horas sejam
trabalhadores ou ambos) ficou relativamente mais caro.
Podemos concluir dizendo que o efeito de uma redução da jornada de trabalho sobre o emprego é, sob a
perspectiva teórica neoclássica, complexa. Sempre tendo como referência esse arcabouço de análise, seria uma
simplificação grosseira supor que, reduzindo-se a jornada legal de trabalho, seriam imediatamente criados postos de
trabalho em quantidade suficiente como para substituir a produção perdida pela menor quantidade de horas trabalhadas
por cada assalariado.
Como assinalamos em parágrafos anteriores, a teoria neoclássica constitui um paradigma teórico cuja vocação
original foi constituir um marco de interpretação alternativo à visão clássica (Ricardo e Marx). Para esta última, o principal
objetivo de estudo da economia seria estabelecer as leis que regulam a distribuição de renda em uma sociedade 27/. O
paradigma teórico neo-clássico mudou o enfoque ou eixo principal do estudo da economia para concentrar-se na eficiência
alocativa e apresentar uma “neutralidade” técnica em termos de distribuição de renda. Em outros termos: o objeto de
estudo da economia seria a identificação das combinações mais eficientes dos recursos disponíveis (atingir o máximo de
produto com a força de trabalho, o capital, os recursos naturais e a tecnologia ou conhecimentos disponíveis). Os
aspectos vinculados à remuneração dos fatores e distribuição de renda seriam abordados, pelos neo-clássicos, a partir de
três dimensões, todas sob um manto de neutralidade, em termos de valor, e/ou inexorabilidade, em termos técnicos.
Analisemos com algum detalhe essas dimensões.
Como já adiantamos na Seção I, os neo-clássicos substituíram as classes sociais pelos fatores de produção. Não
existem “capitalistas”, como nos clássicos, senão “o capital”, como fator de produção. Não existem os proprietários de
recursos naturais, senão os recursos naturais (terra, por exemplo). Também não existem os trabalhadores, senão o trabalho
como fator de produção. Nessa linha de raciocínio, um indivíduo pode ser assalariado (um vez que oferece sua força de
trabalho no mercado) e capitalista (já que pode, simultaneamente, possuir capital). Um exemplo nos permite ilustrar essa
simultaneidade. Imaginemos um pequeno agricultor, que trabalha sua terra e possui um trator. Ele será, simultaneamente,
um trabalhador, um capitalista e o proprietário de um recurso natural. Ele terá um rendimento global que, ainda que ele não
saiba distinguir, será a soma do rendimento produto de seu trabalho, do rendimento oriundo de seu capital e do
rendimento proveniente do recurso natural que ele possui.
A segunda dimensão da análise neoclássica está associada à remuneração desses fatores. Segundo vimos, cada
fator é remunerado pela sua produtividade marginal e esse é o pilar de toda a teoria da distribuição neoclássica. Por sua
vez, o determinante dessa produtividade marginal é técnico, é a tecnologia que está implícita na função de produção.
Assim, como é uma questão técnica, a remuneração não pode ser alterada por meio de lutas sindicais ou legislação. A
remuneração não é um fato social ou político, é uma questão técnica. Se o objetivo de uma sociedade é alterar o rendimento
de um fator deve modificar a sua produtividade marginal.
Por último, a terceira dimensão está centrada na “neutralidade” da economia se complementa com o conhecido
critério de Pareto 28/. O critério de Pareto diz que uma situação A é superior (na literatura se conhece como
Pareto-Superior) a outra B se em B alguém está melhor e ninguém está pior. Tomemos um exemplo para que esta

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 54 -
perspectiva fique bem clara. Imaginemos que a sociedade está composta por dois indivíduos: um ganha R$ 50 por mês e
outro R$ 10.000/mês. Suponhamos que podemos alterar esta situação para que o indivíduo que ganhava R$ 10.000 receba,
agora, R$ 10.001 e o indivíduo que ganhava R$ 50 continue ganhando a mesma quantidade. Esta última situação seria
Pareto-Superio, em virtude de um indivíduo está melhor (o rendimento passou de R$ 10.000 para R$ 10.001) e o outro não
está pior (continua ganhando R$ 50). Imaginemos que, em lugar de mudar a situação para que o indivíduo que ganhava
mais eleve seus rendimentos e o que ganhava menos continue ganhando a mesma quantia, modifiquemos o perfil de
rendimentos e a pessoa que ganhava R$10.000 passe a receber R$ 9.999 e o indivíduo cujos rendimentos eram de R$ 50
agora recebe R$ 51. Nesse caso, segundo critério de Pareto, a economia não pode opinar, porque alguém está melhor e
outro está pior. Ou seja, para manter a neutralidade a economia neoclássica se recusa a realizar comparações interpessoais.
Dessa forma, a economia neoclássica trata de conservar uma neutralidade evitando juízos de valor, que seria, no caso,
comparar utilidade interpessoais (não é objetivo da economia comparar bem-estar ou utilidades entre indivíduos).
II.6. Discriminação.
Um dos temas que mereceram amplo tratamento na literatura neoclássica foram os aspectos ligados à
discriminação, uma das variáveis que essa corrente utiliza para explicar fenômenos vinculados à desigualdade 29/.
Antes de analisar com um certo detalhe a abordagem e tratamento da discriminação, é necessário que
apresentemos o conceito neoclássico de discriminação. Lembremos que, para esta corrente, os salários são determinados
pela produtividade. Nessa perspectiva, se um grupo social (negros, mulheres, imigrantes, etc.) ganha menos que outros
segmentos sociais (brancos, homens, etc.) em função de sua produtividade ser menor, esse diferencial não teria nenhuma
particularidade, visto que o próprio arcabouço teórico explicaria a distância entre rendimentos. O problema surge diante da
presença de diferenciais de rendimentos não explicados pela diferenças de produtividade. Sob outro ângulo: o problema se
coloca quando duas pessoas ganham diferentes não obstante terem a mesma produtividade. Assim, a discriminação seria o
diferencial não explicado pelas distâncias entre as produtividades. Suponhamos que os negros ou as mulheres ganham
menos que os brancos ou os homens em razão
de sua produtividade ser menor, esse diferencial não deveria ser conceituado, segundo os neoclássicos, como
discriminação 30/.
Definido o conceito neoclássico de discriminação (salários diferentes para produtividade iguais), o desafio teórico
consiste em demôstrar o porque (as causas) desse diferencial. Em termos do arcabouço teórico que desenvolvemos no
transcurso deste Capítulo, essa distância entre as remunerações não faria
sentido, tendo em vista que a firma não estaria maximizando lucros. Com efeito, imaginemos dois trabalhadores, um branco
e outro negro, os dois com produtividades iguais e perfeitamente substitutos. Se a firma paga mais ao branco que ao negro,
ela não maximiza lucros, dado que poderia substituir o trabalhador branco por um negro, o produto permaneceria igual e os
custos cairiam. Então, porque a discriminação, porque pagar mais a um branco que a um negro se as produtividades são
iguais e o objetivo da firma é maximizar lucros?
O esforço teórico para dar sustentabilidade às explicações dos fenômenos associados à discriminação foram
realizados por dois Prêmios Nobel. Garu Becker (The Economics of Discrimination, University os Checago Press, 1971) e
Kenneth Arrow (“Theory os Discrimination”, in Ashebfelter, O. e Reeds, A.(Editores), Discrimination in Labor Markets,
Princeton University Press, 1974) são, talvez, citações incontornáveis quando o tema é discriminação sob a perspectiva
neoclássica.
Basicamente, esses esforços teóricos dependem da introdução de uma variável que possibilite compatibilizar o
modelo neoclássico de demanda de trabalho com uma explicação convincente das origens dos diferenciais de salários, não
oriundos de diferenciais de produtividade, entre diferentes grupos sociais. Devido ao individualismo metodológico que
norteia toda a perspectiva teórica neoclássica, necessariamente esse esforço parte para as motivações individuais dos
agentes. Nesse sentido, temos três alternativas, não excludentes.
A primeira consiste em supor que o empregador, paralelamente ao objetivo de maximizar seu lucro, obtém algum
tipo de utilidade pelo fato de empregar ou pagar salários maiores a um determinado grupo social. Ou seja, teria uma
preferência pela discriminação que deveria ser considerado no processo de maximização da função objetivo.
A segunda alternativa agrupa os modelos nos quais aqueles que apresentam alguma preferência por discriminar
são os empregados e não os empregadores. Trabalhadores brancos, por exemplo, se recusariam a trabalhar com
trabalhadores de outras raças e/ou pediriam um adicional para compartilhar o lugar de trabalho. Outra forma que pode
assumir este tipo de modelos consiste em considerar que certos grupos de trabalhadores, amalgamados a partir de sua
raça, sexo, etc., monopolizam certo tipo de postos do mercado de trabalho, que são melhor remunerados, oferecem
melhores perspectivas profissionais, etc. Este tipo de discriminação pode ser observado em diferentes países, nos quais a
população de uma mesma raça ou etnia monopoliza certas ocupações ou ramos de atividade.
Por último, a terceira alternativa consiste na discriminação oriunda do consumidor. Tomemos o caso do cliente de
um bar ou restaurante que prefere ser atendido por uma pessoa de determinada raça ou sexo. Se o empregador contrata
indivíduos de outra raça ou sexo, tal fato redundará em uma redução na quantidade produzida e, portanto, na sua
rentabilidade. Contudo, devemos ter cuidado na análise deste caso, visto que a produtividade das pessoas que são
discriminadas seria menor, justamente, devido à discriminação que sofrem por parte do consumidor. Sob esse ângulo, não
estaríamos, a rigor, na presença de discriminação no sentido neoclássico, devido a que a definição da mesma supõe
diferenciais de salários não explicados por diferenciais de produtividade.
Logicamente, a discriminação (especialmente aquela oriunda das preferências dos empregadores e empregados), é,
na perspectiva neoclássica, uma fonte de ineficiência, já que a firma poderia reduzir custos (sem alterar o produto, em

Page 53 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 55 -
virtude dos trabalhadores terem a mesma produtividade) contratando os assalariados que são discriminados (apresentam
os menores salários) e substituindo os de maior salário.
Á margem desse entendimento ou caracterização do conceito de discriminação, o pensamento neoclássico se
aventura por areias que dizem respeito às tendências mais gerais das sociedades contemporâneas. A discriminação,
segundo os teóricos neoclássicos, iria decrescendo com o tempo, devido à modernização das sociedades, à
industrialização, à abertura comercial e a conseqüente maior concorrência internacional, etc. Os requerimentos de crescente
eficiência que caracterizam as economias de mercado introduziriam elementos que, no longo prazo, seriam incompatíveis
com as práticas de discriminação e levariam a sua superação ou atenuação 31/.
II.7. Segmentação.
A segmentação é um conceito vinculado à discriminação que mereceu e merece amplo tratamento teórico e
empírico na literatura. Um mercado de trabalho seria segmentado quando diferenciais de salários não seriam explicados por
diferenciais de produtividade. Contudo, em lugar de trabalhar com grupos sociais (sexo, raça, etnia, etc.), no caso da
segmentação estamos lidando com ramos de atividade, regiões, etc. Assim, se na Indústria de Transformação um
assalariados recebe um rendimento superior a outro empregado no Comércio, não obstante terem a mesma produtividade,
estaríamos diante de um mercado de trabalho segmentado. No caso específico do Brasil, a segmentação regional seria um
fator que, potencialmente, poderia ajudar a explicar os diferenciais de salários. Um trabalhador, pelo fato de morar no
Nordeste, apresentaria um rendimento menor que outro empregado em áreas mais desenvolvidas (como o Sudeste), não
obstante ter uma produtividade igual.
Similarmente à discriminação, a segmentação seria, para o pensamento neoclássico, uma fonte de ineficiência na
alocação de recursos. Em outros termos: eliminar ou reduzir a segmentação elevaria a eficiência alocativa de um mercado
de trabalho.
Logicamente, a discriminação (ou discriminações) e a segmentação (ou segmentações) são fenômenos que podem
estar superpostos. Por exemplo, um assalariado seria “penalizado” em um mercado de trabalho se ele fosse negro, de sexo
feminino, morasse no Nordeste e fosse ocupado em um setor de atividade que, a igual produtividade, pagasse salários
inferiores demais setores 32/.
III. A Perspectiva Crítica.
III.1. As Origens Históricas do Teoria Neoclássica da Remuneração dos Fatores.
A teoria da distribuição que tem como eixo a produtividade marginal é, em realidade, uma adaptação da teoria
ricardiana da renda da terra. Lembremos que Davi Ricardo sustentava que na medida em que se acumulava capital e a
população crescia, a dinâmica desse processo levava a utilizar, na agricultura, terras cada vez menos férteis. Ou seja, em
termos marginais, a produtividade da terra caía na medida em que se utilizava cada vez mais esse fator 33/
A transição entre a teoria ricardiana e a teoria da remuneração dos fatores neoclássica foi imaginada por J.B. Clark,
no início do século passado, no seu
famoso livro The Distribution of Wealth: a theory of wages, interest an profits (1900). Clark, em realidade, estabelece dois
princípios básicos. O primeiro é uma generalização da hipótese sobre a queda da produtividade marginal que, na
perspectiva Ricardiana, estava limitada à terra, para todo fator variável que se associa a outro fixo. O segundo argumento
estende à remuneração do capital os mesmos princípios que determinam o rendimento do trabalho, iguala todos sob o
manto da produtividade marginal e, dessa forma, possibilita passar de classes sociais (capitalistas, assalariados, etc.) para
fatores de produção (capital, trabalho, etc.).
III.2. Vulnerabilidades.
Muitas são as críticas que o arcabouço neo-clássico de remuneração dos fatores e da distribuição de renda
recebeu e evidentes as suas diversas vulnerabilidades. Algumas dessas críticas e vulnerabilidades não afetam a essência
da teoria. Outras são mais radicais, chegando a uma desqualificação total dessa perspectiva teórica. Nos próximos
parágrafos não pretendemos esgotar o elenco das críticas e vulnerabilidades. Contudo, ao apresentarmos algumas delas,
pretendemos que o leitor perceba que essa não é uma construção teórica livre de contestação, contradições ou
fragilidades.
i) A Função de Produção e o Problema da Agregação ou Heterogeneidade do Capital.
Geralmente, os livros-textos de economia mais usuais apresentam a função de produção como sendo a relação
entre um produto e os fatores de produção utilizados, como nos mesmo fizemos na Seção I. Contornam-se suas
fragilidades, transmitindo a impressão que essa relação funcional é livre de qualquer
contestação.
Em efeito, essa robustez é aparente. O principal problema surge da agregação do capital. Quando se utiliza uma
variável K, em realidade nela se estão “somando” diversos bens: tratores, tornos, etc. Contudo, como não pode somar-se
um trator + um torno, esses bens devem ser valorizados. Ou seja, a soma é viável se ambos são expressos em um
denominador comum, dinheiro, por exemplo. Porém, qual é o valor de um trator, ou em geral, de um bem de capital?
Depende de seu lucro. O quanto um indivíduo está disposto a pagar por um bem de capital depende de seus rendimentos
futuros. Mas, para a teoria neoclássica, esse rendimento depende da produtividade marginal. O leitor terá percebido que
entramos em um círculo vicioso: para determinar o valor precisamos do rendimento, mas para determinar o rendimento
(produtividade marginal) precisamos do valor. Ou seja, estamos diante de uma armadilha teórica. Mas, estando
indeterminada a produtividade marginal do capital ou do estoque de capital fica indeterminada a produtividade marginal do
trabalho e, assim, toda a construção teórica neoclássica referente à remuneração dos fatores e distribuição de renda 34/.
ii) A Questão dos Postos de Trabalho.

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 56 -
Nós observamos que, na perspectiva neoclássica, a quantidade de trabalhadores ou horas de trabalho tem uma
relação inversa com o salário real. Podem-se ampliar os postos de trabalho ou as horas trabalhadas por meio de quedas no
salário real. Em outros termos, não existem postos de trabalho, entendidos como vagas que são criadas no processo de
investimento. Na realidade observamos que, na maioria dos casos, um posto de trabalho é criado a partir de, por exemplo, a
abertura de uma empresa. A criação de um posto de trabalho tem um custo (de infra-estrutura, equipamentos, etc.).
Geralmente, existem exercícios sobre o custo de geração de um posto de trabalho. Para a teoria neoclássica isso não se
coloca. Desde esse arcabouço teórico, é possível, dado um estoque de capital e recursos naturais, gerar postos de trabalho
reduzindo os salários reais. Qualquer economia poderia solucionar o problema do emprego simplesmente provocando ou
aceitando a redução dos salários reais.
iii) Ciclo de Curto Prazo e Salários Reais.
Antes de iniciar a discussão sobre o movimento dos salários reais no curto prazo, faz-se necessário realizar
algumas considerações sobre a metodologia científica utilizada pela abordagem neoclássica.
Os teóricos neo-clássicos sustentam que a pertinência de uma teoria deve ser avaliada segundo a sua capacidade
de explicar os fatos e não tendo como referência o realismo das hipóteses. Um dos pontos que com maior ênfase contestam
os críticos desse marco teórico consiste em questionar o realismo das hipótese. Como sabemos, todo o arcabouço teórico
neo-clássico é construído a partir do individualismo metodológico, ou seja, o movimento da totalidade é entendido a partir
da conduta das partes. Por exemplo, os grandes agregados e sua evolução (consumo, investimento, poupança, etc.) são
explicados a partir da conduta das firmas e dos indivíduos ou das famílias (os “agentes”). Sobre esses supostos, os
teóricos adotam uma série de fortes hipótese (maximização de uma função objetivo sujeita a uma restrição, etc.). Muitos
críticos sustentam que essas hipóteses são irrealistas e, assim, todo o modelo carece de validade 35/. Os neo-clássicos não
aceitam esse tipo de crítica. Eles sustentam que não se testam as hipóteses e sim os resultados. Nesse sentido, por
exemplo, não faz sentido analisar em que medida a racionalidade do consumidor (mais exatamente, a racionalidade implícita
no modelo neo-clássico) é uma hipótese verdadeira ou não.
Contudo, essa perspectiva neoclássica apresenta uma incoerência quando o objeto de estudo são os salários
reais no curto prazo. Como vimos, dados os outros fatores de produção (capital, recursos naturais, etc.) e a tecnologia, a
produtividade marginal do trabalho é decrescente e, assim, os salários reais deveriam cair na medida em que se eleva o
nível de emprego. Em termos das etapas conjunturais, como no curto prazo a tecnologia, o capital, etc. são constantes, o
crescimento econômico deveria provocar quedas nos salários reais. Porém, todas as economias, na fase ascendente do
ciclo, tanto o emprego como os salários reais se elevam e, simetricamente, na fase descendentes, caem tanto os salários
reais como o emprego.
Em síntese, ainda nos fixando nos resultados e não nas hipótese, o modelo neo-clássico parece pouco compatível
com os reais movimentos de salários e empregos. Esse fato torna esse modelo pouco útil para explicar as fases cíclicas de
curto prazo.
iv) O Problema da Estimação.
Como todo modelo teórico, a vocação do modelo neo-clássico é servir de referência para estimar a demanda de
fatores de produção. Entretanto, essa passagem, que serviria para validar o modelo, não é simples.
A maior dificuldade está na especificação da função de produção. Nos livros-texto, a função de produção
Cobb-Douglas é geralmente utilizada pela sua fácil maleabilidade matemática, sendo útil didaticamente, e por apresentar
certos resultados interessantes, porém restritivos. A elasticidade-substituição entre os fatores, por exemplo, é sempre igual
a um. É simples, útil para utilizar didaticamente nos cursos de microeconomia, mas pouco realista ou útil para realizar
estimações. Se substituirmos essa função por uma CES (Elasticidade Substituição Constante), como seu próprio nome
indica, a elasticidade substituição é constante e idêntica para a substituição entre os fatores de produção considerados
(tomados de a dois). Quando se pretende utilizar uma expressão na qual a elasticidade substituição varie ou mude a cada
par de fatores, a expressão pode ser matematicamente complexa.
Para contornar esse problema, as pesquisas empíricas têm que fazer apelo a funções de custo e estimar, a partir
delas a demanda de fatores e as elasticidades.
v) As Limitações da Análise Neoclássica sobre Discriminação e Segmentação.
Para qualquer indivíduo, a sua prática cotidiana lhe permite concluir que não existe “um mercado de trabalho”,
suas possibilidades de encontrar emprego, os setores com maior probabilidade de ser contratado, os salários que
potencialmente poderia ganhar, etc. dependem de muitas variáveis, como sexo,
educação, raça, setor de atividade no qual consiga empregar-se, etc. Muitas delas estão vinculadas, positiva ou
negativamente. É muito provável que esse indivíduo possa ganhar mais pelo fato de, suponhamos, ser homem e branco.
Em certos setores de atividade, o padrão mais usual de empregado pode ser homem e branco. Contudo, além dessas
características individuais que o possam favorecer, ele pode ter a chance de encontrar emprego em um setor de atividade
que paga mais que a média.
Dessa forma, o mercado de trabalho parece um espaço que dista muito de caracterizar-se como algo transparente,
homogêneo, sem barreiras, no qual a única variável que determina os rendimentos seja a produtividade individual.
Pertencer a um grupo social ou habitar uma determinada área pode favorecer ou penalizar um indivíduo,
independentemente de sua produtividade. Na literatura, essa heterogeneidade do mercado de trabalho recebeu muitas
vezes a palavra de “balcanização”, em uma referência aos Balcãs, a região no Sudeste da Europa dividida por inúmeras
religiões, raças, culturas, etc., com pouco diálogo entre elas e com lógicas sociais diferentes 36/.
Diante dessa evidente e, portanto, inegável heterogeneidade do mercado de trabalho, a economia neoclássica

Page 55 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 57 -
sempre teve duas posições, segundo os teóricos.
A primeira consiste em ignorá-la. Como teoricamente não posso explicar o fenômeno, logo não existe (o ignoro).
Esta posição tem, logicamente, um custo, dado que reduz a potencial “clientela” de um arcabouço teórico 37/.
Contudo, a segunda opção dos neoclássicos consistiu em tratar de estudar esses fenômenos. Quando o tema é
discriminação, não obstante as limitações que possamos identificar na sua abordagem (excesso de economicismo,
especialmente na explicação das tendências de longo prazo, falta de explicação quando a discriminação é institucional,
pouca plausibilidade em testar empiricamente suas explicações, etc.) é um esforço meritório de tentar compatibilizar o
modelo geral com fenômenos mais específicos ou particulares.
Notemos que, quando o problema é a segmentação, o modelo neoclássico não é capaz de oferecer uma explicação
coerente. Em realidade, os teóricos se limitaram a definir o conceito de segmentação e testar empiricamente, a sua
existência. Os motivos ficam obscuros ou são identificados em variáveis exógenas (falta de mobilidade geográfica, barreiras
à entrada devido aos sindicatos, etc.). Em outros termos: porque um trabalhador no Nordeste ganharia menos que um
similar (igual produtividade) no Sudeste e essa situação tenderia a perpetuar-se no tempo? Porque não se produziria um
fluxo migratório do Nordeste ao Sudeste de tal magnitude que os diferenciais desapareçam? Quando a segmentação é
setorial: porque um empregador pagaria salários maiorespodendo pagar, por trabalhadores com a mesma produtividade,
salários menores? A única alternativa dos neoclássicos era apelar para fatores extra-econômicos e que não podiam ou
deviam ser explicados pela teoria econômica (sindicatos, barreiras à migração, variáveis culturais, etc.?
Porém, os avanços teóricos dos neoclássicos a partir dos anos 80 possibilitaram desenvolver modelos teóricos
mais robustos, nos quais não se limitavam a definir segmentação, senão que tratavam de explicá-la a partir de sofisticações
do modelo original 38/.
IV. A Modo de Balanço.
Verificamos, assim, que o ponto nevrálgico de todo o arcabouço neo-clássico de determinação do preço dos fatores e da
distribuição é a função de produção. Em última instância, o marco teórico neo-clássico seduz pela sua elegância e
“comodidade” analítica. A possibilidade de expressar matematicamente as relações entre variáveis e as proposições tornam
atraente o “gerenciamento” dos modelos. Essa procura por elegância levam, em não poucas ocasiões, a adotar hipóteses já
que as mesmas possibilitam o tratamento matemático de um problema. Ao tornar-se maleáveis matematicamente, os
modelos podem transmitir a impressão que os resultados obtidos são verdadeiros porque foram “demonstrados
matematicamente”. Em realidade, esses resultados são verdadeiros tendo como referência as hipóteses que foram
adotadas. Nessa perspectiva, o modelo neo-clássico apresenta três fragilidades. A primeira é a inconsistência interna.
Nesse sentido, a principal limitação é a falta de generalização. A escolha da função de produção é, como vimos, crucial.
Uma função de produção, por exemplo, pode determinar que a remuneração dos fatores utilizados não esgote o produto. A
segunda está associada à dificuldade de realizar a transição entre os modelos teóricos abstratos e as pesquisas empíricas.
O caso da especificação da função de produção é ilustrativa. Por último, a terceira fragilidade está na fundamentação lógica
da função de produção e das proposições em torno à remuneração dos fatores e distribuição de renda. A crítica da escola
de Cambridge-Inglaterra ao problema da agregação do capital é, nesse sentido, exemplar.
Essas colocações devem induzir ao leitor à cautela. O paradigma neo-clássico, não obstante ser hoje o dominante e, como
tal, necessário de ser estudado em profundidade, não deixa de ser uma construção teórica frágil. Os livros-texto,
especialmente de microeconomia, transmitem uma idéia falsa, no
sentido de apresentar a função de produção e a teoria neoclássica da determinação do preço dos fatores e distribuição de
renda como uma etapa no progresso da ciência econômica já consolidada e, portanto, só restaria transmitir esse
conhecimento consolidado às novas gerações e avançar a partir dele. Esperamos ter demostrado, no transcurso do
Capítulo, que essa imagem dista de ser real.

Capítulo IV
Modernos Modelos do Mercado de Trabalho
No começos dos anos 80, a interpretação da escola neoclássica dos fenômenos vinculados ao mercado de
trabalho estava mergulhada em um período de transição. O marco de referência básico, que já abordamos nos capítulos I e
II, continuava sendo o desenvolvido nos primeiros anos desse Século. Contudo, nos anos 60, se tinha verificado uma
revolução interna, com a consolidação da Teoria do Capital Humano, que estudaremos no Capítulo V. Esse novo escopo
teórico (a Teoria do Capital Humano) era particularmente importante para tentar entender aspectos vinculados à pobreza e
distribuição de renda (especialmente da renda do trabalho). Não obstante essa ampliação do leque de fenômenos
susceptíveis de serem entendidos a partir de suas proposição básicas (produtividade determina salário, por exemplo), ainda
ficavam amplas lacunas. Tomemos dois exemplos.
Nos anos 80, o mundo assistiu a um crescimento generalizado do desemprego. Qual era a explicação neoclássica
para esse descompasso no mercado de trabalho? A resposta era que, simplesmente, os salários reais eram rígidos à baixa
(não se ajustavam ao novo contexto mundial) devido a fatores extra econômicos (sindicatos, políticos populistas que
propugnavam salários mínimos elevados e indexação, etc.). Como a origem desse desajuste no mercado de trabalho era
extra-economico (sistema político, sindicatos, etc.), a contribuição da economia era marginal. O modelo (e as receitas de
política que dele se deduziam) estava correto, o “problema” era a realidade, que não se ajustava ao modelo.
Um segundo exemplo está associado à segmentação, que já estudamos no Capítulo II. Não precisamos de ser
economistas ou estatísticos para perceber que existem diferentes qualidades de postos de trabalho. A experiência do
cotidiano ensina a qualquer pessoa que seu salário depende da educação, mas também do setor, firma ou região na qual

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 58 -
consegue trabalho. Qual era a explicação neoclássica a essa diferenciação que não estava associada a diferenciais de
educação (produtividade)? A resposta era que o mercado de trabalho não era “eficiente”, que tinha segmentação. E porque
tinha segmentação ? Aí essa escola tinha pouca coisa a argumentar. Podia mencionar, outra vez !, a existência de
sindicatos que reduziam a mobilidade, os gostos dos indivíduos (que reduziam a mobilidade geográfica), etc.
Em ambos os casos (desemprego e a diferenciação de salários não explicados por diferenciais de produtividade),
apesar a extensão e importância desses fenômenos, a escola neoclássica disponibilizava poucas argumentações de
explicação. A atitude adotada era quase de indiferença. Para o “modelo”, essas singularidades que caracterizam quase
todos os mercados de trabalho não eram “lógicas” 1/.
Uma conjugação de fatores levaram a uma “revolução interna” na forma como a teoria neoclássica abordara o
funcionamento do mercado de trabalho. A cristalização dessa modernização foi o surgimento de três famílias de modelos
(Salários de Eficiência, Contratos Implícitos e Insiders-Outsiders) que iriam explicar vários fenômenos (desemprego,
segmentação, contratos de longo prazo, etc.) que pareciam ser ignorados ou atribuídos a variáveis fora de campo de
estudo da economia. O nosso objetivo neste Capítulo é, justamente, estudar esses novos modelos. Na próxima Seção, será
analisado o contexto histórico e teórico que deram origem a essa “revolução interna”. Na Seção II desenvolveremos os
vários modelos de Salários de Eficiência. Na Seção III o marco de referência que apresentaremos será o denominado de
Contratos Implícitos. Na Seção IV, direcionaremos a nossa atenção aos modelos chamados de “Insiders-Outsiders”. Pela
sua importância para explicar o desemprego e o
dualismo, dedicaremos uma Seção (Seção V) a estudar como a segmentação pode ser entendida à luz desses novos
modelos (especialmente os modelos de Salários de Eficiência). Uma perspectiva crítica dessa renovação teórica será o tema
da Seção VI. Por último, finalizaremos o Capítulo na Seção VII, com um balanço dos avanços e limitações deste
“rejuvenescimento” do pensamento neoclássico.
I. O Contexto Histórico e Teórico.
Como já afirmamos, vários foram os fatores que se conjugaram e tiveram como resultado essa renovação teórica.
Vamos analisar cada um deles, sem que a ordem no qual os abordaremos reflita a sua ordem de importância.
I.1. O Desafio dos NeoKeynesianos.
Uma obra da importância da Teoria Geral de Keynes gera múltiplas interpretações ou correntes, todas
autotitulando-se as “verdadeiras” herdeiras dessa obra ou pensamento. Essa diversidade e conflito entre os seguidores
não é uma singularidade da Teoria Geral, senão que caracteriza todas as obras que representaram rupturas na história das
idéias, como em Smith, Ricardo e Marx.
No caso específico do pensamento keynesiano, a interpretação que, em termos teóricos e de política econômica,
ganhou hegemonia a partir dos anos 40 foi uma pretendida síntese entre a escola pre-keynesiana (escola clássica, como era
denominada por Keynes) e as novas idéias contidas na Teoria Geral. Essa interpretação do pensamento keynesiano não
representava uma ruptura radical com a escola clássica, já que respeitava a quase totalidade de sua abordagem
micro-econômica e sua inovação consistia, basicamente, na incorporação de novos princípios, tipicamente keynesianos, na
análise macroeconômica (como equilíbrio com sub-emprego, princípio da demanda agregada, investimento como gerador
da poupança, etc.). Os economistas identificados com essa síntese foram denominados de neo-keynesianos. Eles foram
capazes de construir um conjunto de técnicas que, entre 1940 e os anos 70, foi extremamente útil para administrar o ciclo
conjuntural e situar as economias em pontos muito próximos do pleno emprego. Esse êxito em termos de gestão
macroeconômica de curto prazo ocultou uma certa “esquizofrenia” no pensamento então dominante. Na perspectiva
macroeconômica assistia-se a um reinado absoluto dos princípios keynesianos e, na dimensão microeconômica,
continuava prevalecendo o arcabouço teórico consolidado antes de Keynes. Em realidade, essa convivência entre a
perspectiva microeconômica e macroeconômica era “esquizofrênica” devido à inexistência de comunicação entre elas e, em
não poucos pontos, as análise eram contraditórias.
No caso específico do mercado de trabalho, os neo-keynesianos, a partir de certas afirmações do próprio Keynes,
sustentavam que o equilíbrio de sub-emprego era possível porque os salários nominais eram rígidos à baixa. Os
assalariados não aceitavam reduções nos salários nominais, ainda que não ofereciam resistência à queda nos salários reais.
Em outros termos: os assalariados teriam “ilusão monetária” (confundem ou não distinguem entre o real e o nominal). Essa
hipótese de ilusão monetária era (ainda é) incompatível com a usual análise microeconômica. Outra hipótese de Keynes
sustentava que os assalariados não estavam preocupados com seus salários reais senão com os salários relativos. Esta
proposição voltava a ser incompatível com a análise microeconômica que acompanhava a síntese keynesiana 2/.
Devido a diversos fatores (inércia, falta de espírito crítico, etc.) mas, sobretudo, ao êxito na administração do ciclo
conjuntural, essa “esquizofrenia” não ”atrapalhava”. Durante 30 anos essa síntese entre a corrente de pensamento
pre-keynesiano e keynesiano reinou com poucas contestações nos meios acadêmicos e de política econômica 3/.
Contudo, na década de 70, assistimos a um paulatino declínio da hegemonia dessa corrente. A combinação de
recessão com inflação a partir dos choques de petróleo (1973-79), entre outros fatores (como a crescente
internacionalização das economias) ruiu as bases sobre as que se assentava o ativismo dos neo-keynesianos. Políticas
monetárias ou fiscais ativas começaram a ter mais efeitos sobre o nível de preços que sobre o nível de atividade.
O vácuo deixado pelo declínio do pensamento neo-keynesiano foi ocupado pela retorno das escolas mais
conservadoras. Para estas, a crise da macroeconomia keynesiana (sua crescente incapacidade em alterar as variáveis reais,
gerando só inflação) seria a conseqüência de uma construção teórica errada e confusa, devido a sua falta de
fundamentação microeconômica. Por que os assalariados resistiam a quedas nos salários nominais e não dos reais ? Que

Page 57 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 59 -
linha de raciocínio levava aos keynesianos a sustentar essa argumentação ? Por que a preocupação dos sindicatos era
mais sensível aos salários relativos que aos absolutos ? Qual era a fundamentação dessa proposição ?
Em um contexto de crescente perda de hegemonia no debate, os neo-keynesianos ficaram, de alguma forma,
acuados. A denominada “contra-revolução conservadora” dos anos 80 adquiriu tal impulso que colocava os termos do
debate. Como essa “contra-revolução” situava o problema do desemprego fora do campo a ser estudado pela economia (
salários mínimos, sindicatos, políticos populistas, etc.), uma fundamentação microeconômica não era necessária.
Contrariamente, como os neo-keynesianos colocavam o problema em termos econômicos (salários nominais rígidos, etc.)
tinham a obrigação de encontrar os fundamentos macroeconômicos de suas proposições.
Entretanto, sustentar a existência de salários nominais rígidos mais salários reais flexíveis era incompatível, como
já afirmamos, com os fundamentos microeconomias usuais. Romper com essa microeconomia e desenvolver um novo
paradigma microeconômico não estava na agenda dos neo-keynesianos 4/. A alternativa escolhida por estes foi manter o
paradigma tradicional, distanciar-se de Keynes mas diferenciar-se dos mais ortodoxos. A saída foi sustentar que, realmente,
a proposição keynesiana de salários nominais rígidos mas salários reais flexíveis não era sustentável. O desemprego era, na
realidade, produto de salários reais rígidos. Contudo, a origem dessa rigidez não estava nas instituições que regulavam o
mercado de trabalho (salário mínimo, indexação, sindicatos, etc.) senão em mecanismos estritamente econômicos e, tão
importante como isso, poderia ser fundamentada (a inflexibilidade à baixa) microeconomicamente.
Assim, encontramos um paradoxo. A diferença da Teoria do Capital Humano, uma revolução interna da teoria
neoclássica que foi desenvolvida pela corrente mais ortodoxa dessa escola, dos modernos modelos de mercado de
trabalho foram, na sua totalidade, desenvolvidos por economistas de origem keynesiana (ou neo-keynesiana). Seu objetivo
foi justificar rigidezes reais nos mercados de trabalho, que seriam a origem dos desequilíbrios, e justificar essa
inflexibilidades reais em termos microeconômicos. Ou seja, um dos grandes movimentos de renovação da escola
neoclássica teve como berço quadros acadêmicos de origem heterodoxa.
II.2. Desenvolvimento Teórico da Economias dos Incentivos ou Informação Imperfeita.
No enfoque tradicional neoclássico, todo seu modelo teórico é construído a partir da hipótese de informação
perfeita e sem custos. Nos modelos mais sofisticados, como os de equilíbrio geral (a la Arrow-Debreu), se supõe que, no
período zero, é estabelecido o equilíbrio que para todos os períodos, presente e futuro ou futuros 5/. Ou seja, o equilíbrio
geral é obtido, hoje, através de mercados
futuros para todos os bens dessa economia. Se assume que o desconhecimento do futuro é administrado associando
probabilidades a cada cenário plausível e os preços, únicos e iguais para todos os agentes, constituem a única informação.
A partir dos anos 60, começam os primeiros desenvolvimentos teóricos que, dentro da própria escola neoclássica,
tentavam incorporar, nas suas hipóteses, um mundo no qual essa informação não é perfeita, é diferentemente distribuída
entre os agentes e pode ter custo 6/. As citações bibliográficas obrigatórias são o artigo de Arrow, K.J., de 1973 (
“Unceretainty and Welfare Economics of Medical care”, American Economic Review, Vol. 53) e de Akerlof, G.a., de 1970
(“Quality, Uncertainty and the Market Mechanism”, Quartely Journal of Economics, Vol 84) 7/.
Esses modelos de informação imperfeita normalmente têm como referência os problemas vinculados ao mercado
de seguros. Hoje, esse marco analítico é aplicado a uma multiplicidade de campos, desde os mercados financeiros,
passando pela saúde, até o mercado de trabalho.
A seguir, vamos definir algumas categorias que são usualmente utilizadas nestes modelos de informação
imperfeita para, depois, ver como os mesmos são aplicados ao mercado de trabalho.
Talvez, a melhor forma de introduzir esse tipo de perspectiva seja partindo da definição dos atores envolvidos. Em
termos da terminologia mais corriqueira, a informação imperfeita pode ser analisada em termos da interação de dois atores:
“principal” e “agente”. O “principal” seria aquela parte que tem a iniciativa, os recursos e dele partem as ações para motivar
o outro ator, “o agente”. No caso do mercado de trabalho, por exemplo, o “principal” seria a firma ou o empregador e o
“agente” o assalariado. O “principal” é um ator que não possui todas as informações sobre o “agente”. Este,
contrariamente, dispõe de um nível de informação (sobre sua idiossincrasia e/ou sobre suas próprias ações) que pode ou
não “revelar” ao “principal”. Justamente, o marco teórico desenvolvido para lidar com situações de informação assimétrica
ou imperfeita tenta formalizar essas situações através de modelos nos quais o “principal” vai propor ao “agente” contratos
para a fim de que este revele a maior informação possível ou adote atitudes favoráveis ao “principal” 8/.
Como estamos em um mundo de informação imperfeita ou assimétrica (ou seja, a informação não é completa e/ou
não está distribuída de forma igual entre os dois atores), podem apresentar-se dois problemas.
O principal não conhece todas as características do agente. Aqui estamos na presença de um problema
denominado de “Seleção Adversa”. Tomemos o exemplo do mercado de trabalho. Como a oferta de trabalho não é
homogênea (todos os trabalhadores não têm as mesmas habilidades, conhecimentos, disciplina, etc.) a contratação de um
assalariado tem risco. O empregador pode tratar de reduzir esse risco mediante testes psicológicos e de conhecimentos e
habilidades, pesquisa de antecedentes laborais, análise sobre seu currículo escolar (anos de estudo, escolas que
freqüentou o candidato, etc.), etc.. Ou seja, no caso da categoria de risco englobado sob a denominação de “Seleção
Adversa”, a informação imperfeita versa sobre variáveis exógenas, que independem das ações tomadas pelo “principal”.
Na medida em que o “agente” é detentor de informação sobre o contexto (no caso do mercado de trabalho,
informações sobre ele mesmo, sobre suas características produtivas, por exemplo) que não é conhecida pelo “principal” (o
empregador, no caso do mercado de trabalho), este terá que propor um leque de contratos para que o “agente” revele sua
informação. Os contratos ótimos serão escolhidos entre o leque desses contratos reveladores.
Paralelamente a esse risco associado às características do agente, o “principal” enfrenta outro tipo de risco, este

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 60 -
vinculado ao comportamento ou conduta desse agente. Aqui estamos na presença do chamado “Risco Moral” , o qual é
definido como uma informação não proporcionada por um dos atores mas que não versa sobre o contexto senão por uma
ação desenvolvida por ele 9/. No caso específico do mercado de trabalho, o “Risco Moral” está geralmente associado ao
“esforço” ou “dedicação” com o qual o assalariado (”agente”) realiza seu trabalho. Supondo-se um contexto de informação
imperfeita, o empregador não controla ou não tem informações sobre o grau de empenho do assalariado nas suas tarefas.
Nessas circunstâncias, o problema para o empregador consiste em propor ao trabalhador um contrato que o incentive
realizar suas tarefas com o melhor empenho ou dedicação possível.
II.3. Relações de Causalidade entre Salários e Produtividade.
Como já afirmamos em diversas oportunidades, no modelo neoclássico básico, a produtividade determina os
salários. A produtividade, por sua vez, seria uma questão “técnica”, dada pela função de produção. Considerando que a
função objetivo da firma é maximizar o lucro, em um contexto de concorrência perfeita, o salário real deve ser igual à
produtividade marginal do trabalho e esta última é determinada pela tecnologia.
Em realidade, o trabalho (ou seja, o assalariado ou trabalhador) é considerado como uma máquina. Devemos
perceber que o tratamento dispensado a ele é exatamente igual ao dado ao capital ou, em geral, a qualquer outro fator de
produção. Contudo, o assalariado, como ser humano, merece certas
particularidades que o singularizam com respeito aos recursos naturais ou às máquinas.
Essas particularidades de “fator trabalho” já tinham sido identificadas na teoria econômica em diversas
oportunidades e, até, nos primórdios da moderna teoria econômica. Alfred Marsahall é usualmente mencionado como
sendo o precursor das abordagens que tentam estabelecer, na relação assalariada, uma maior complexidade quando a
referência são os outros fatores de produção.
Mais recentemente, a referência tida como a precursora dos modelos modernos está na relação entre salário e
produtividade que observaram os estudiosos nos países subdesenvolvidos. Em um primeiro momento, a relação entre os
salários e a produtividade estava mediada por fatores biológicos. Em níveis de renda muito reduzidos, um crescimento de
salário tende a redundar em elevações na produtividade devido à melhor alimentação do trabalhador. Ou seja, sustentar
que a produtividade determina o salário seria uma visão reducionista, na medida em que a produtividade pode estar sendo
influenciada pelos salários 10/.
II.4. Custos do Trabalho e Salários.
A partir do clássico artigo de Oi, de 1962, (“Labor as a Quasi-Fixed Factor”, Journal of Political Economy, Vol.
70), a percepção de que os custos do trabalho não podem ser reduzidos aos custos salariais foi ganhando força nos meios
acadêmicos 11/. A ausência de uma proporcionalidade estrita entre salários e custos (com custos superiores aos salários)
teve diversos desdobramentos em termos teóricos, que vão desde a defasagem entre os ajustamentos do estoque de
emprego e o nível de atividade até as estratégias das firmas para reduzir esses custos fixos. Justamente, as tentativas de
diminuir os custos vinculados às contratações (custos de procura, testes, treinamento, etc.) e aos desligamentos por parte
das firmas pode introduzir mudanças substanciais no modelo neoclássico tradicional. Alguns dos modernos modelos de
mercado de trabalho, sem romper com o arcabouço neoclássico, incorporam essas hipóteses e resultaram em formas de
ajustamento e estratégias dos atores (firmas e assalariados) que tentam explicar inflexibilidades nos salários reais.
Resumindo: a rotatividade de assalariados pode traduzir-se em maiores custos e, assim, para a firma pode ser interessante
adotar estratégias que reduzam essa rotatividade,
ainda que as mesmas apresentem custos.
II. Os Modelos.
Concluímos, assim, que ao menos quatro fatores confluíram para provocar uma revolução interna no modelo
neoclássico de referência. Por um lado, o contexto histórico que, com taxas de desemprego elevadas e persistentes,
colocava um desafio teórico aos economistas, especialmente aos que tentavam compatibilizar o enfoque keynesiano como
o paradigma clássico. As possibilidades de desenvolver modelos de rigidez dos salários reais dentro do arcabouço teórico
neoclássico se viram possibilitadas pelos avanços no tratamento de aspectos vinculados à informação imperfeita e
assimétrica. A relação entre salários e produtividade começa a receber um tratamento mais complexo e menos pautado pela
relação tecnológica. Por último, a possibilidade de distanciamentos entre salários e custos (descolamento oriundo de
diversos fatores, desde institucionais, como multas por desligamento não justificado, até variáveis vinculadas à informação
imperfeita, como os testes necessários para saber a qualificação de um candidato) possibilita tornar as estratégias das
partes (firmas e assalariados) mais complexa, com resultados que se distanciam dos obtidos pelo modelo neoclássico
básico.
Na literatura, esses modelos podem ser agrupados em três grandes conjuntos: salários de eficiência, contratos
implícitos e insiders-outsiders. Nos próximos parágrafos, vamos a analisar as características essenciais de cada um deles,
para só depois, na próxima Seção, identificar suas fragilidades e as críticas que mereceram.
II.1. Salários de Eficiência.
a) O Modelo de Referência
No modelo neoclássico mais simples, que apresentamos com um certo detalhe no Capítulo anterior, o trabalho era
homogêneo. Ou seja, a firma “saía ao mercado” a procurar trabalhadores e estes eram todos iguais, existia “o trabalho”.
Em realidade, podemos ter muitas qualidades de trabalhadores. Ainda que consideremos ou incorporemos várias
características dos candidatos (sexo, idade, escolaridade, etc.), é muito simplista, ainda que fosse válido em certas
circunstâncias, considerar o trabalho como sendo um fator homogêneo. Podemos ter um mercado de engenheiros mas
sabemos, pela nossa prática, que temos “engenheiros” e “engenheiros”. Ou seja, temos englobando, sob uma mesma

Page 59 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 61 -
denominação (o fator trabalho) duas dimensões: uma quantitativa (o número de assalariados que a firma contrata) e outra
qualitativa (a “qualidade” desse contingente de assalariados).
A dimensão qualidade pode, por sua vez, ser subdividida em duas. A qualidade associada ao próprio trabalhador
(sua qualificação técnica, por exemplo) e a dedicação, esforço ou empenho que ele dedica a seu trabalho. Fica claro, para o
leitor, que estamos diante de problemas de informação associados ao contexto (Seleção Adversa) e ao comportamento do
“agente” (Risco Moral).
Em ambos os casos, a firma tem a alternativa de fixar o salário que oferece para administrar ambos os riscos.
Vejamos esse mecanismo com um pouco de detalhe.
Quando a firma quer preencher uma vaga, ela oferece um emprego ao salário de mercado e tem uma “fila” de
candidatos entre os quais escolherá o futuro empregado. Essa “fila” está integrada por assalariados de distintas
“qualidades”, bons e ruins. O empregador, através de testes, pesquisa de antecedentes, etc. tratará de escolher os
melhores. Logicamente, essa série de procedimentos tentará reduzir as chances de escolher um assalariado “ruim”.
Contudo, o risco não se reduz a zero. Sempre existirá a probabilidade de “erro”. Se a firma oferece um salário que, para o
tipo de trabalhador que está procurando, é superior ao pago no mercado, muito provavelmente a “qualidade” média dos
que oferecem seu trabalho se elevará. Em geral, existirá uma relação positiva entre a “qualidade” dos candidatos e o salário
oferecido ela firma. Assim, a firma vai poder reduzir as chances de contratar um trabalhador “ruim” na medida em que
aumenta o salário oferecido. Essa estratégia tem um custo e um benefício. O
custo, logicamente, surge do maior salário que tem que oferecer e pagar. O benefício é a “qualidade” do estoque de
assalariados e, conseqüentemente, a melhor produtividade 12/.
No caso do risco associado ao comportamento do “agente”, as considerações são similares. Vamos supor que,
quanto maior seja o esforço que o assalariado dedica ao trabalho menor seja sua utilidade. Nessa linha de raciocínio, o
trabalhador tentará dedicar-se o mínimo possível a suas tarefas. A firma, devido ao problema de Risco Moral, tem
informação imperfeita sobre as iniciativas do “agente” (o trabalhador). Aleatoriamente, talvez ela possa identificar uma
ocasião na qual o assalariado não esteja dedicando o esforço esperado e, nesse caso, a firma tem a possibilidade de
desligar o assalariado. Se ela paga o salário de mercado, quando esse trabalhador for desligado vai encontrar um trabalho
com remuneração similar 13/. Nesse caso, os indivíduos sempre tratarão de realizar o esforço mínimo, dado que se é
“flagrado” é desligado mas tem outras chances de emprego com o mesmo salário. Justamente, a firma pode elevar o salário
para que esse custo de oportunidade (o salário que ele ganharia fora da firma) seja inferior ao rendimento na própria
empresa. Ou seja, elevar o custo de ser “flagrado” não realizando o esforço esperado. Existiria, assim, uma relação positiva
entre o salário pago e o esforço. Maiores salários pagos (um custo para a firma) se traduziriam em maiores produtividades
(maiores benefícios).
Formalmente, podemos representar o modelo da seguinte forma.
O objetivo da firma continua sendo, como no modelo neoclássico tradicional, a maximização de lucros.
Suponhamos uma firma em concorrência perfeita, sendo, por tanto, tomadora de preços, mas sua função de produção vai
sofrer certas mudanças. Imaginemos, para simplificar a álgebra e sem perder generalidade, que o único insumo utilizado seja
o trabalho (L). Mas esse fator L pode ter distintas “qualidades” (seja pela qualidade da fila seja pelo nível de esforço do
assalariado contratado). Imaginemos que essa qualidade, que denominaremos de e, dependa do salário pago pela firma
(e(w)), sendo a relação positiva (quanto maior o salário maior será a “qualidade” do trabalho). Fieis a suas raízes
neoclássicas, nos modelos dos salários de eficiência se supõe, como no caso da função de produção tradicional, que e(w)
tem dois intervalos. No
primeiro a função é crescente mais convexa (o efeito marginal do salário sobre e é positivo e crescente) e, a partir de um
determinado ponto continua a trajetória sendo ascendente mais côncava (o efeito marginal do salário sobre e é positivo
mas decrescente) (Ver Gráfico 1).
Dada essas especificações sobre a função e, podemos representar a função de produção da seguinte forma:
Q = F [ L · e(w) ] (1)
Onde: Q = produto; L = trabalho; e = qualidade ou intensidade do esforço nas tarefas; w = salário
Ou seja, temos que (L · e) é em realidade uma variável de “qualidade/quantidade” de trabalho 14/.
Dado que a natureza da firma continua sendo similar à suposta no modelo neoclássico tradicional, podemos
representar a função objetivo da firma como sendo a maximização de lucros:
ð = P · F [ e(w) · L ] – ( w · L ) (2)
Contudo, estamos diante de um problema radicalmente distinto ao enfrentado no modelo neoclássico tradicional.
Neste, assumindo a firma em concorrência perfeita no mercado de fatores e de produto (tomadora de w e de P), a única
variável de escolha era L (a quantidade de trabalho a ser utilizado). Agora, ainda assumindo a firma em concorrência no
mercado de fatores e de produto, ela vai escolher um salário a ser pago que independe daquele pago pelo mercado. Ou
seja, para maximizar lucros a firma terá que escolher, no processo de maximização, uma combinação de duas variáveis: L e
w.
Resumindo: a firma deve identificar o par w-L que maximize seus lucros e esse processo de maximização será
realizado em duas etapas. Primeiro se determinará w e depois L. Vejamos essas etapas 15/.
O programa de maximização pode ser expresso da seguinte forma:
Max. ð = P · F [ e(w) · L ] – ( w · L ) (3)
w, L
As condições de primeira ordem são:

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 62 -
ð w = P · e’ · F ‘· L – L = 0 (4)
ðL = P · e · F ‘ – w = 0 (5)
Dado que L é sempre positivo, podemos rescrever a equação (4) da seguinte forma:
ð w = P · e’ · F ‘· – 1 = 0 (6)
De (5) temos que F ‘ = (w / Pe). Substituindo essa igualdade em (6), temos que:
(e ‘ w) / e = 1 (7)
O salário w que satisfaz a igualdade anterior é denominado Salário de Eficiência. Pela sua importância para
entender os modelos de Salários de Eficiência, devemos nos deter com um certo cuidado na sua análise 16/. Vamos estudar
essa condição sob três perspectivas, todas complementares, mas que servem para que o leitor possa perceber e internalizar
o real significado dessa condição de equilíbrio.
Antes de desenvolver a primeira perspectiva, vamos fazer uma breve retrospectiva de certas relações seguramente
já estudadas nos cursos de microeconomia. Lembremos que, quando são apresentadas as funções de custos, estes podem
ser expressos como dependendo da quantidade produzida (Q). Por outra parte, os Custos Médios (CMe) são obtidos a
partir dos custos totais (CT) divididos pela quantidade produzida. Assim:
CMe(Q) = CT(Q) / Q (8)
O Custo Marginal (CMa) pode ser definido como a derivada dos Custos Totais (CT’) quando varia a quantidade.
É muito comum realizar um exercício para ver a relação entre o CMe e o CMa. Essa relação pode ser visualizada a
partir da determinação do ponto no qual o CMe é minimizado. A condição de primeira ordem seria:
–1 -2
d CMe / dq = d [CT(Q) / Q] / dq = CT’ Q – CT Q = 1/Q [CMa - CT(Q) / Q] = 1/Q [CMa - CMe] (9)
Como 1/Q é sempre positivo (não faz sentido uma quantidade negativa), a condição de primeira ordem (CMe’ = 0)
se cumpre quando CMa = CMe. Ou seja, o ponto de mínimo será atingido quando o Custo Médio for igual ao Custo
Marginal 17/.
Vamos fazer, agora, um paralelo entre as categorias e variáveis utilizadas pelos modelos de Salários de Eficiência e
as relações entre Custos Médios e Custos Marginais que elencamos no parágrafo anterior. O Custo Médio por “unidade”
de esforço pode ser representado pela relação (w/e). Dado um custo total de w, o custo marginal pode ser representado por
1/e’ 18/. Assim, a forma que adotará (9) no caso dos Salários de Eficiência será:
(w/e)’ = (1/e) [ (1/e’) – (w/e) ] (10)
Trabalhando a expressão anterior e lembrando que 1/e não pode ser igual a zero, a condição de primeira ordem é:
-1 -2
e – w e e ‘ = 0 = [ (1/e’) – (w/e) ] (11)
Desenvolvendo essas expressões chegamos à Condição de Solow(w e’ / e = 1). Ou seja, essa condição pode ser
vista como sendo o ponto no qual a firma paga um salário que minimiza o custo (em termos de salário pago por “unidade”
de esforço) 19/.
A segunda perspectiva para entender a Condição de Solow procura ver nessa igualdade de equilíbrio a
elasticidade da função de esforço (e(w)) com respeito ao salário. Se lembramos que a definição de elasticidade de uma
função f(x) é (f’/f) · x, a Condição de Solowé simplesmente a elasticidade da função e(w). Suponhamos que a elasticidade
seja maior que 1, isso significa que um crescimento de x% no salário pago provocará uma elevação superior a x% no
esforço. Em outros termos, os ganhos marginais da firma serão superiores aos custos (tudo em termos percentuais) e,
certamente, a firma prosseguirá nos seus esforços para, mediante o pagamento de maiores salários, conseguir uma maior
dedicação. Supondo que a elasticidade é decrescente, o ponto a ser atingido, e no qual permanecerá, será quando a
elasticidade é igual a 1 20/.
Por último, a terceira perspectiva de análise é Gráfica. Voltemos ao Gráfico 1, no qual está representada a Função
de Esforço e(w). Suponhamos, agora, que a firma maximize a relação e(w)/w (que é simétrico a supor que minimize w/e(w)).
Em cada ponto de e(w) no Gráfico, a relação e(w)/w vem dada pela inclinação da reta que une esse ponto ao origem. Essa
inclinação é máxima quando a reta que une o ponto é tangente com a função e(w). Ou seja, quando e’ (inclinação da função
e(w)) é igual à tangente nesse ponto (e/w). Assim, a firma maximiza a relação e(w)/w quando esse cociente é igual a e’, que
é a Condição de Solow).
Contudo, o problema não acaba nesse ponto, visto que, lembremos, a firma tem que escolher, para maximizar seus
lucros, o valor de duas variáveis w e L (salários e emprego). Dado o nível ótimo de salário (w que satisfaz a Condição de
Solowe que se denomina de Salário de Eficiência), fica agora por determinar L ( a segunda etapa do processo de
maximização). Porém, fixar a dimensão do estoque de assalariados é relativamente fácil, já que uma vez estabelecido w
ótimo, a equação de lucros se reduz à forma tradicional:
Max. ð = P · F [ e*(w*) · L ] – ( w* · L ) (12)
L
onde: w* = Salário de Eficiência, já determinado na etapa anterior e e* = qualidade do trabalho que surge desse
Salário de Eficiência.
A condição de primeira ordem será:
ð' = P ·F’· e *– w* = 0 (13)
e o resultado será o clássico: a produtividade marginal do trabalho deve ser igual ao salário real (mas desta vez o
salário não é exógeno, é o determinado na primeira etapa do processo de maximização, ou seja, o Salário de Eficiência).
b) Os Corolários.
A importância desses desenvolvimentos teóricos reside nos resultados obtidos e na sua interpretação. Portanto,

Page 61 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 63 -
o leitor deve estar muito atento e internalizar os corolários que apresentaremos nos próximos parágrafos.
O salário escolhido pela firma independe das condições do mercado de trabalho. Ainda que suponhamos
desocupação, o excesso de oferta de trabalho não terá nenhuma influência no salário que a firma está disposta a pagar (ou
seja, o salário que maximiza seu lucro). Dessa forma, o mercado de trabalho não terá mecanismos endógenos que o
auto-regulem. A existência de desempregados não exercerá pressão para uma queda nos salários reais e, dessa forma, essa
situação pode perdurar no tempo.
O salário escolhido pela firma (Salário de Eficiência) independe da quantidade produzida. A quantidade a ser
produzida será uma variável determinada na segunda etapa do processo de maximização, quando a firma escolhe a
quantidade de trabalho. Assim, a determinação do salário que maximiza lucro precede a determinação do montante a ser
oferecido no mercado.
O salário escolhido não tem porque coincidir com aquele que igualaria a oferta e demanda no mercado de trabalho.
Se supomos que todas as firmas são iguais, pode obter-se um ponto de equilíbrio no qual o próprio processo de
maximização de lucros das firmas gera como conseqüência desemprego, dado que o nível de salário real de equilíbrio pode
ser superior ao que iguala a oferta e demanda e, tão importante quanto isso, essa situação tenderá a perdurar no tempo.
Ainda que exista uma “fila” de desempregados dispostos a trabalhar por um salário inferior ao fixado pela firma,
para esta não será interessante contratar esses trabalhadores, uma vez que a qualidade dessa mão-de-obra e o esforço que
dedicarão a suas tarefas (ou seja, sua menor produtividade) não
compensarão os benefícios (menores custos).
O salário pago pela firma independe do preço recebido pelo seu produto e dos preços de outros insumos ou de
outros fatores de produção 21/.
Resumindo: a determinação dos salários reais é endógena ao processo de maximização de lucros da firma. Ela
escolhe o salário a ser pago independentemente da situação do mercado de trabalho, do preço do produto, do preço dos
outros insumos e do nível de produção. Os salários reais fixados para maximizar os lucros podem ser superiores àqueles
que igualariam a oferta e demanda de trabalho, são rígidos à baixa e essa situação não pode ser atribuída à existência de
sindicatos, salário mínimo, etc. Ou seja, o próprio processo de maximização de lucros, na presença de informação
assimétrica, pode ter como resultado uma inflexibilidade à baixa nos salários reais, que seriam insensíveis ao excesso de
oferta ainda na ausência de sindicatos, salário mínimo, etc.
Justamente, a grande contribuição dos teóricos dos Salários de Eficiência consiste em ter identificado fatores
endógenos de inflexibilidade dos salários reais, sem ter que apelar ao contexto institucional como a causa última da
insensibilidade dos salários aos ajustes de mercado.
c) As Cinco Vertentes.
Em realidade, a denominação de Salários de Eficiência engloba uma família de modelos que, não obstante
compartilhar a essência do modelo de referência que expusemos item a) da presente Seção (uma relação positiva entre
salários e produtividade), se singularizam pelos distintos fatores que induzem às firmas a pagarem Salários de Eficiência.
Nos próximos parágrafos, apresentaremos cada uma deles e faremos uma exposição de suas principais linhas de raciocínio.
i) Os Modelos de Seleção Adversa.
Esta perspectiva centra a análise em torno à impossibilidade da firma obter informação perfeita sobre as
características dos assalariados. Supondo que existe uma relação positiva entre preço e qualidade, um maior salário
oferecido pela firma elevará a qualidade da oferta de trabalho. Podemos supor, por exemplo, que quanto mais qualificada ou
produtiva seja uma pessoa maior será seu salário de reserva 22/.
Entretanto, existe uma fragilidade neste tipo de abordagem. Uma firma, ainda que não tenha informação perfeita
sobre os candidatos, poderia tentar contornar o problema e não pagar salários mais elevados contratando os indivíduos,
observando sua produtividade ou desempenho no cargo e, depois, desligá-los ou não. Essa alternativa seria inviável ou
muito custosa no caso de existir informação imperfeita sobre a produtividade no próprio posto de trabalho e/ou existir
custos vinculados à rotatividade (custos de admissão, desligamento, etc.). Assim, esta abordagem que identifica a origem
dos Salários de Eficiência nos problemas de Seleção Adversa devem ser complementada ou substituída pelos que
apresentaremos nos dois itens seguintes.
ii) Os Modelos de Risco Moral.
Aqui estamos diante de modelos nos quais se assume que a informação imperfeita está vinculada a um controle
imperfeito, por parte do empregador, do esforço ou dedicação do trabalhador no posto de trabalho. Como se parte da
hipótese de que a utilidade do assalariado guarda uma relação inversa com o
esforço, ele tentará realizar um esforço mínimo 23/.
Os maiores salários pagos pela firma seriam uma forma de “incitar” ao trabalhador a realizar o esforço esperado.
Assim, o nível de esforço (ou, em outros termos, a produtividade) seria uma decisão racional do assalariado. O maior
salário seria um “incentivo” já que seu custo de oportunidade (o salário a ser ganho em um emprego alternativo) em caso
de ser flagrado não realizando o esforço esperado seria menor. Se todas as firmas estão diante de um processo semelhante
(controle imperfeito da dedicação do indivíduo contratado e, como conseqüência, necessidade de outorgar incentivos
através de salários mais elevados), o resultado pode ser o desemprego. Essa situação tenderia a perdurar e, em última
instância, o trabalhador flagrado não realizando o esforço esperado teria como custo o desemprego. Nessa perspectiva, o
desemprego não seria um objetivo “maquiavelicamente” procurado por um hipotético “bureau central dos empregadores”
mas, ex-post, atuaria como um meio para “disciplinar” os trabalhadores.

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 64 -
iii) Os Modelos de Custos de Rotatividade.
Esta perspectiva teórico identifica como fonte dos Salários de Eficiência os custos vinculados à contratação e
dispensa de trabalhadores. Esses custos podem ser oriundos de diversos fatores. Alguns podem depender do marco
institucional/legal de cada país 24/. Outros são exclusivamente econômicos.
Tomemos como exemplo a formação que o assalariado recebe na própria firma. Ainda que o perfil profissional do
contratado se adapte perfeitamente à vaga, sempre a firma terá custos (em tempo e/ou dinheiro) para adequar o indivíduo à
firma, devido às particularidades desta 25/. Logicamente, quanto maior a rotatividade maiores serão os custos. Assim, reter
o pessoal implica em redução de custos. Uma das formas de retenção é o pagamento de Salários de Eficiência. Assim,
salários mais elevados teriam um custo direto mas um benefício indireto, na medida em que os vínculos empregatícios
apresentariam maior duração.
iv) Modelos “Sociológicos”.
Esta abordagem se deve a Akerlof, um economista e não um sociólogo, tanto no artigo de 1982 (“Labor Contracts
as Partial Gift Exchange”, Quartely Journal of Economics, Vol. 87, november ) como de 1984 (Gift Exchange and Efficiency
Wage Theory”, American Economic Review, Vol. 74, mai).
A idéia central de Akerlof relaciona o esforço e dedicação de um assalariado à percepção de como é “tratado” pela
firma. O termos “tratado” é, logicamente, muito vago. Poderia ser associado à “norma” de um grupo social. Entre os
assalariados e a firma existiria uma troca de “favores” ou “presentes” 26/. Salários mais elevados induziriam os assalariados
a serem mais atenciosos, mais comprometidos com as metas da firma, que seriam internalizadas pelos assalariados. Essa
maior produtividade seria decorrente da atitude do assalariado, quem se sentiria “bem tratado” pela firma, gerando uma
obrigação, que deveria “retribuir” através de uma maior dedicação.
Não obstante ser nitidamente “heterodoxo”, dado que está muito distante do marco de referência neoclássico
(maximização das utilidades individuais, por exemplo), a abordagem de Akerlof é relativamente popular e bem aceita entre
os economistas, mesmo aqueles de inspiração mais ortodoxa ou neoclássica.
II.2. Contratos Implícitos.

Capítulo 5
Teoria do Capital Humano
Toda a Teoria Neoclássica de determinação de salários desenvolvida no Capítulo 3 tem como referência uma
relação de causalidade entre produtividade e rendimento. Ou seja, a produtividade (ou, mais especificamente, a
produtividade marginal) determina os salários reais. Esse tipo de abordagem, à margem de suas fragilidades intrínsecas, já
apresentadas no próprio Capítulo 3, sempre deixou uma certa dose de insatisfação, visto que o modelo, em última instância,
está supondo “um” mercado de trabalho. Esse tipo de perspectiva até pode ser útil quando nos situamos dentro de um
modelo macroeconômico 1/
Na medida em que se tratava de um arcabouço teórico que não tinha como vocação explicar os diferenciais de
salários, qualquer tentativa de compreender ou explicar as distâncias entre os rendimentos oriundos do trabalho devia ter
como referência outra construção analítica. Pode ser paradoxal, mas os primeiros pensadores do liberalismo, corrente
analítica que é a matriz teórica da escola neoclássica, ensaiaram explicações sobre os diferenciais. Adam Smith, na sua
Riqueza das Nações, de 1776, tentou entender os diferenciais de rendimentos apelando às características das tarefas a
serem realizadas. Quanto mais penosas estas, maiores deveriam ser os salários oferecidos, sendo o diferencial a
“compensação” por exercer essas tarefas. Logicamente, sem necessidade de apelar a sofisticações estatísticas, a simples
observação do cotidiano permite concluir que, ao contrário, os trabalhadores ocupados nas atividades mais penosas ou
mais insalubres são aqueles que recebem os menores salários.
Contudo, Adam Simith já contemplava outra fonte de diferenciação dos salários que, não obstante ser muito
pouco citada hoje em dia, podemos, sem dúvida, considerá-la como o berço da Teoria do Capital Humano contemporânea.
O pai do liberalismo sustentava que um homem educado podia ser comparado a uma máquina sofisticada, de elevado
custo. Como a educação ou formação desse trabalhador requeriu custos, esperava-se que os salários a ele pagos fossem
superiores, a fim de remunerar esses maiores investimentos.
A tradição liberal adquiriu maior notoriedade, especialmente na sua vertente filosófica e política, mediante os
escritos de John Stuart Mill 2/. Este teórico foi a maior referência do liberalismo inglês até o surgimento de Marshall. John
Stuart Mill deu continuidade à importância que as correntes liberais outorgavam à educação, chegando a defender a
educação pública, financiada pelo Estado, uma proposta que, hoje, parece estar mais identificada com as correntes de
esquerda que com o liberalismo moderno. Em seus Principles of Political Economy with some of their Applications to
Social Philosophy, sua principal obra, de 1848, Stuart Mill via a educação como a principal necessidade das classes
trabalhadoras, sendo conveniente para a sociedade uma educação mínima de seus habitantes.
Alfred Marshall, o economista inglês responsável pelo transição entre o liberalismo original (Smith e Ricardo) e a
moderna teória neoclássica, em seus Principles os Economics, de 1890 (primeira edição), sofistica os antecedentes dessa
matriz teórica. Por um lado, identifica a educação como uma das fontes de crescimento, uma perspectiva que só na última
década do Século XX será retomada com os modernos modelos de crescimento (modelos de crescimento endógeno). Na
visão de Marshall, as externalidades proporcionadas pela educação justificavam sua provisão pública. Paralelamente à
identificação dessa correlação entre educação e crescimento, Marshall observa as dificuldades que os pais das famílias
pobres enfrentam para educar seus filhos, antecedente da hoje popular armadilha da pobreza, uma explicação comum nos

Page 63 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 65 -
modelos de perpetuação inter-generacional da pobreza. Por último, Marshall diferenciava, no mercado de trabalho, dois
subconjuntos, um integrado por assalariados pouco ou não qualificados e outro por trabalhadores com maior qualificação,
contemplando a possibilidade da passagem de um segmento ao outro mediante qualificação. Ou seja, nos primórdios da
economia neoclássica já se identificam esforços para desagregar o conjunto que engloba o termo “mercado de trabalho” e,
de mais relevância ainda, a possibilidade da mudar de segmento mediante qualificação 3/.
Não obstante todos esses antecedentes, o paradigma neo-clássico que foi consolidando-se no transcurso da
primeira metade do Século XX não incorpora a variável educação na maioria dos seus modelos. O crescimento econômico é
entendido a partir do crescimento populacional, do crescimento no estoque de capital e de um progresso tecnológico
exógeno, não explicado pela teoria econômica. O trabalho é agrupado em um conjunto denominado “mercado de trabalho”,
não sendo um tema relevante a explicação do diferencial de salários.
Só nos anos 60, através dos trabalhos de Gary Becker (especialmente Human Capital, Columbia University Press,
1975, originalmente publicado pelo National Bureau of Economic Research, em 1964) e Theodore Schultz (“Capital
Formation by Education”, Journal of Political Economy, Vol. 68 (6), dezember, 1960 e “Investiment in Human Capital”,
American Economic Review, Vol. 51 (1),
march, 1961), a economia neoclássica apresenta o que podemos denominar uma revolução interna 4/. Os desdobramentos
dessa renovação são múltiplos, atingindo temas vinculados à dispersão de salários, distribuição pessoal de renda, pobreza
e crescimento econômico.
Nesse contexto, nosso objetivo neste Capítulo consiste em apresentar os fundamentos da Teoria do Capital
Humano e sua abordagem acerca dos fenômenos vinculados à determinação de salários, distribuição de renda e ao
combate à pobreza 5/. Dado esse objetivo, estruturamos o Capítulo da seguinte forma. Na próxima Seção, apresentaremos
seus fundamentos e principais argumentos. Particularidades desse marco teórico serão o tema da Seção II. Trataremos os
aspectos mais abstratos na Seção III, na qual serão analisados os dois conjuntos nos quais é subdividido o Capital
Humano (Capital Humano Geral e Capital Humano Específico). Começaremos a abordar temas mais específicos, como a
armadilha da pobreza na Seção IV, a distribuição de renda na Seção V e as explicações da dispersão nos rendimentos do
trabalho na Seção VI, que subdividiremos em dois, uma dedicada às tendências mundiais (Seção VI.1.) e outra específica
para o caso brasileiro (Seção VI.2.). As perspectivas críticas da Teoria do Capital Humano serão nosso tema na Seção VII.
Basicamente, estudaremos três questionamentos: i) a educação vista como “filtro”, ii) a teoria da concorrência sobre o
posto (“job competition”), na qual quem determina a produtividade é o posto de trabalho e não a oferta de trabalho e iii) a
Teoria do Credencialismo. Na Seção VII, apresentaremos os grandes números para o caso brasileiro (relação entre
rendimentos do trabalho e anos de estudo, crescimento dos rendimentos segundo a idade, grau de concentração de renda
e de educação, etc.), a fim de familiarizar o leitor com a polêmica no país. Por último, o Capítulo é finalizado na Seção IX,
onde realizaremos um balanço geral deste marco de interpretação.
I. Os Fundamentos.
A Teoria do Capital Humano conserva os principais argumentos do arcabouço teórico neo-clássico da
remuneração dos fatores. Conforme já estudamos no Capítulo 3, para essa matriz teórica, a produtividade determina os
salários. Contudo, em um processo de adensamento analítico, a Teoria do Capital Humano divide a fonte dessa
produtividade em dois conjuntos.
O primeiro diz respeito às qualidades ou às características naturais dos indivíduos. Uma pessoa pode ser mais ou
menos inteligente, mais ou menos habilidosa para a realização de certas atividades, mais ou menos sadia, etc. Como essas
características são naturais ou genéticas, a economia não tem muitas considerações a realizar. Essa maior ou menor
produtividade está determinada por fatores naturais que, junto com os aleatórios (“sorte na vida”), podem ser importantes
mas estão fora de uma teorização econômica.
O segundo conjunto está vinculado às habilidades adquiridas. Devido a que são adquiridas, como seu próprio
nome indica, teve que ser precedida de uma decisão prévia voluntária. Ou seja, a pessoa realizou um processo consciente
para adquirir mais habilidades ou técnicas. A pergunta que deve ser colocada é: por que a pessoa tomou essa decisão ?
Que fatores levaram a essa escolha ?
Devido a fato da adquisição dessas habilidades ter um custo (seja financeiro seja de esforço físico ou intelectual
ou ambos), incorrer no custo deve implicar em algum benefício. Assim, estamos diante de um clássico processo de
viabilidade de investimentos, quando o fluxo de custos se compara com o fluxo de benefícios (tudo em termos de valor
presente) e só se realiza a ação ou investimento se os benefícios superarem os custos. Os benefícios, como o leitor já pode
imaginar, estão correlacionados com maiores rendimentos. Contudo, por que o indivíduo vai perceber maiores rendimentos,
se as firmas remuneram os fatores segundo sua produtividade ? Simplesmente, porque as maiores habilidades geram maior
produtividade.
Assim, estamos diante de duas perspectivas que se complementam. Pelo lado da oferta de trabalho (indivíduos),
educar-se implica em elevar sua produtividade. Pelo lado da demanda de trabalho (firmas), essa maior produtividade é
“paga” através de maiores salários.
Em cada momento do tempo, todo indivíduo enfrenta duas alternativas. Aperfeiçoar-se (elevar seu capital humano
através da educação, por exemplo) e incorrer em custos supondo rendimentos futuros, ou não aperfeiçoar-se, não incorrer
em custos mantendo seus rendimentos. Essas duas alternativas são avaliadas e, racionalmente, o indivíduo escolhe aquela
que tem maior valor presente.
Tomemos um exemplo. Um indivíduo acabou o segundo grau e está diante da alternativa de parar de estudar e

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 66 -
ingressar no mercado de trabalho ou, contrariamente, não trabalhar, continuar estudando na universidade e elevar os
rendimentos futuros 6/. São duas alternativas que a pessoa em questão avalia economicamente e, supondo o indivíduo
racional, faz sua escolha 7/.
II. Particularidades Teóricas.
Várias são as particularidades, implícitas ou explícitas, do marco teórico que apresentamos na Seção anterior e que
o leitor precisa perceber. Nos próximos parágrafos apresentaremos as que consideramos mais importantes.
a) As Características da Oferta Determina a Produtividade.
Para a Teoria do Capital Humano, as características da oferta (sejam elas naturais ou adquiridas) determinam a
produtividade. As características da demanda de trabalho (tipo de firma, tecnologia, etc.) não são incorporadas na análise.
Acumular capital humano implica maior produtividade e maiores
rendimentos. Não existem mediações. Por exemplo, tipo de posto de trabalho que possibilite aproveitar o capital humano
acumulado.
b) Continuidade
Todo incremento de educação se deve traduzir em um incremento de produtividade e, consequentemente, em
maiores salários. Não deveriam existir “saltos” ou “rupturas”. Nessa perspectiva, não poderia caber um fenômeno como
“Efeito-Diploma”, onde sem um diploma (finalização de um curso) não existem ganhos salariais (ou os ganhos são
menores)
c) Todo Indivíduo é um “Capitalista de si mesmo”
Coerente com os princípios neo-clássicos de individualismo metodológico (toda a construção teórica é
desenvolvida a partir da conduta maximizadora de um agente), a Teoria do Capital Humano supõe que o indivíduo se
auto-gerencia como um capital. Ele vai investir em “si mesmo” seguindo os mesmo princípios de viabilidade que utiliza
qualquer investidor para desenvolver um projeto.
d) A Pessoa e seu Capital Humano não são “separáveis”
Não obstante ser abordado como um processo de investimento qualquer, o capital humano acumulado por uma
pessoa não pode ser separado de seu próprio corpo. O capital humano acumulado por uma pessoa não pode ser “vendido”
ou “cedido”, esta indissoluvelmente ligado ao próprio indivíduo. Este fato, que parece um truísmo, é de crucial importância,
tanto teoricamente como em termos de formulação de política pública. Um exemplo possibilitará ilustrar essa importância.
Imaginemos que um empregador cogite investir na formação de indivíduos por ele empregados. Suponhamos que, ao
elevar a produtividade de seus assalariados, a comparação entre custos de treinamento e os benefícios (maior
produtividade) evidencia a conveniência de implementar esse “projeto”. Ou seja, esse projeto de
investimento em formação de recursos humanos é assumido, pelo empregador, como qualquer outro investimento (compra
de máquinas, por exemplo). Contudo, ao investir em um equipamento, ele torna-se proprietário do mesmo. Contrariamente,
investir no treinamento de seus empregados implica em risco,
dado que o indivíduo pode deixar esse emprego e, nessas circunstâncias, leva consigo o capital humano pago pelo
empregador 8/.
e) Componentes do Capital Humano
Em geral, o capital humano é muitas vezes vinculado à educação formal (anos de estudo no sistema escolar).
Contudo, ainda que essa possa ser uma das principais fontes de acumulação de capital humano, este pode ser acrescido
por outras variáveis, como formação profissional, reciclagem, experiência no próprio emprego (acumulação de técnicas e
habilidades conhecida na literatura como on-the-job-training) e mesmo saúde. A partir desses diversos componentes se
explica que, dado um nível de escolaridade, as séries estatísticas para todos os países indicam que na medida em que
transcorrem os anos, os rendimentos médios dos indivíduos crescem. Esse fato se explicaria pela acumulação de capital
humano pela experiência, além de, logicamente, possíveis cursos de formação e reciclagem que um indivíduo possa
realizar.
O ambiente familiar, especialmente na primeira infância, pode ser outro dos componentes de acumulação de capital
humano. Os psicólogos e pedagogos continuamente enfatizam a importância que os estímulos, carinho, segurança,
alimentação, etc. que uma criança recebe nos seus primeiros anos possui sobre o caracter, a flexibilidade de adaptação às
mudanças no contexto e até a capacidade cognitiva na vida adulta 9/.
f) Reversibilidade do Capital Humano Acumulado
Ainda que muitos autores sustentem que o capital humano acumulado é irreversível, uma vez que está
indissoluvelmente ligado à própria pessoa, em realidade, o mesmo está sujeito a decréscimos. Duas alternativas são
possíveis.
A primeira está associada à perda de habilidades e técnicas apreendidas se elas não são utilizadas
corriqueiramente. Com o transcorrer do tempo, o capital humano acumulado e não utilizado pode entrar em um processo de
“depreciação” 10/.
A segunda alternativa que explica a possibilidade de uma depreciação do capital humano de um indivíduo diz
respeito às mudanças no ambiente, que tornam suas habilidades e conhecimentos obsoletos. Podemos imaginar duas
possibilidades. A primeira tem como origem uma possível mudança nos gostos dos consumidores, que tem como corolário
que os bens ou serviços vinculados a um tipo específico de habilidades e técnicas caiam em desuso 11/. A segunda
possibilidade está vinculada a uma mudança tecnológica, que torna vetusto o capital acumulado por um indivíduo 12/.
Podemos concluir que, não obstante ser indissociável de seu detentor, existe a possibilidade de uma reversão no

Page 65 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 67 -
capital humano acumulado 13/.
g) Financiamento do Capital Humano
Se o investimento em educação e capacitação pode ser olhado sob um prisma válido para qualquer processo de
investimento, é factível imaginar a possibilidade de uma pessoa recorrer a uma linha de crédito para financiar sua educação.
Assim como o sistema financeiro viabiliza um empreendimento cuja taxa de retorno seja superior à taxa de juros a ser paga
pelo crédito, uma pessoa sem recursos poderia recorrer a esse sistema para viabilizar sua formação.
Esse suposto pode ser muito relevante em certas ocasiões. Tomemos o caso da armadilha da pobreza. Em geral, a
superação da pobreza está cercada de uma série de restrições porque o indivíduo não teria os recursos necessários para
sua formação e os imperativos de sobrevivência no curto prazo o impeliria a participar no mercado de trabalho. Sob a
perspectiva da Teoria do Capital Humano, esse indivíduo poderia requerer uma linha de crédito para financiar seus estudos
e, a partir do fluxo de caixa, o órgão de financiamento (que poderia ser até um banco privado) determinaria a variabilidade
ou não desse “projeto”.
Existem poucas experiências no mundo onde esse cenário é observado. Em geral, quando existem linhas de crédito
(como o crédito educativo, no caso brasileiro), os mesmos têm como origem políticas públicas e não linhas de
financiamento por parte do sistema financeiro privado. Muitas são as variáveis que não permitem traçar paralelos estreitos
entre um investimento clássico e a educação como projeto de investimento. Mencionemos, a título de exemplo, apenas
duas.
Em primeiro lugar, o investimento na formação de uma pessoa é um processo de longo prazo, submetido a
inúmeros fatores de risco. Ainda que, em média, a educação apresente elevadas taxas de retorno, no caso de um indivíduo
em particular os áleas que cercam esse projeto são inúmeros (risco de desemprego por crise econômicas, possibilidade de
uma inadequação entre a formação recebida e os requerimentos tecnológicos futuros, possibilidade de morte, migração a
outros países, etc.).
Em segundo lugar, podemos mencionar as restrições legais ou, em geral, a ausência de um ambiente institucional
propício para uma linha de crédito com essas características. Por exemplo, o problema das garantias, particularmente
importante no caso da população jovem, que seria, normalmente, o principal público.
III. Classificação do Capital Humano: geral e específico
Geralmente, os adeptos da Teoria do Capital Humano dividem este último em dois grandes subconjuntos.
Denominam o primeiro de capital humano geral (ou formação geral). Este está vinculado às habilidades,
qualificações e técnicas necessárias ou básicas para a realização da quase totalidade das atividades. Poderíamos
mencionar, entre outras, alfabetização e as operações matemáticas básicas 14/. O capital humano geral é, na maioria das
vezes, obtido no sistema escolar.
Complementa esse capital humano geral o capital humano específico (formação específica), que está vinculado a
uma determinada atividade ou tarefa ou mesmo a uma determinada firma. Poderíamos dizer que existem diversos graus de
“especificidade”. Por exemplo, um engenheiro elétrico apresenta um capital humano geral paralelamente a uma formação
específica. Contudo, quando é contratado por uma firma, seguramente requererá alguma formação que é decorrente do tipo
de tecnologia, processos, produtos, cultura interna, etc. que essa empresa adota. Assim, para ocupar esse hipotético posto
de trabalho, esse engenheiro precisará de uma formação geral (alfabetização, normas sociais de convivência, disciplina nos
horários, etc.), de uma formação mais específica vinculada a sua profissão (engenheiro elétrico) e outra mais específica
ainda associada ao ambiente de trabalho.
Essa diferenciação analítica entre capital humano geral e específico, este último com diversas intensidades de
especificidade, apresenta inúmeros desdobramentos, muitos com singular importância teórica e prática. Mencionaremos
alguns deles.
As possibilidades de acrescentar capital humano específico pode estar condicionada pelo estoque de capital
humano geral previamente acumulado. Esse pré-requisito é fácil de perceber, dado que é difícil imaginar que um indivíduo
possa adquirir certas formações específicas (programar em uma determinada linguagem de computador, por exemplo)
quando não se possui um domínio total da linguagem escrita (o indivíduo é semi-analfabeto).
Essa incapacidade de acumular capital humano específico devido ao limitado capital humano geral pode gerar
sérias restrições em termos de combate à pobreza. Para os teóricos da Teoria do Capital Humano, a pobreza é explicada por
uma sub-acumulação de capital humano. Baixo capital humano geral baixa produtividade e, dentro da lógica da escola
neoclássica, baixos rendimentos. Reverter essa situação requer elevar o capital humano do contingente populacional que
vive abaixo da linha de pobreza. Contudo, quando estamos lidando com população adulta, sua capacidade de adquirir
capital humano geral pode ter diminuído dramaticamente com o transcorrer dos anos, fato que limita as possibilidade de
incorporar tanto capital humano geral como específico. Dessa forma, cursos de formação profissional ou reciclagem podem
ter um impacto desprezível ou marginal no combate à pobreza. Nesse contexto, reverter essa situação pode requerer
transferências de renda permanente a favor da população adulta e limitar o público alvo das políticas públicas destinadas à
elevar o capital humano à população mais jovem.
Um problema vinculado com o anterior diz respeito às políticas públicas nos casos de choques tecnológicos.
Mudanças no paradigma tecnológico pode redundar na inadequação do perfil de formação da mão-de-obra já empregada
em razão de novos requerimentos em termos de habilidades e conhecimentos. Essa incompatibilidade pode gerar
desemprego e, como veremos no Capítulo XV, a formação e reciclagem pode ser uma das alternativas de políticas
públicas.Contudo, em populações adultas, devido a velhos e arraigados hábitos, da resistência a mudanças e restrições
próprias da idade e da formação geral, os resultados dessas políticas de reciclagem podem se limitados.

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 68 -
Um terceiro exemplo, vinculado com os anteriores, diz respeito às possibilidades de acumular capital específico no
transcurso da vida ativa. Em geral, se supõe que a experiência adquirida no trabalho é uma das formas de adquirir capital
humano específico e, nesse sentido, dado um nível de escolaridade, os rendimentos deveriam apresentar uma trajetória de
crescimento a medida em que transcorre o tempo 15/. Entretanto, a capacidade de acumular capital humano específico
através da experiência pode depender do capital humano geral. Assim, nos casos de baixo nível de capital humano geral, a
idade (experiência) pode ter um impacto negligenciável sobre os rendimentos. Estes permanecem relativamente constantes
no transcurso da vida ativa. Contrariamente, quanto maior for o nível de educação maior a capacidade de acumular capital
humano (os rendimentos apresentam forte crescimento na medida em que transcorre o tempo do indivíduo no mercado de
trabalho).
O último exemplo está relacionado às políticas públicas de educação, ou, mais especificamente, a
complementariedade e divisão entre as esferas pública e privada em matéria de educação. Em razão do capital humano estar
indissoluvelmente ligado ao indivíduo, as firmas tenderão a formar seu pessoal o mais especificamente possível, para que
sejam mínimas as chances do indivíduo beneficiado pela formação dada pela empresa utilizar esse investimento em outras
firmas. Assim, cabe ao estado (ou às decisões do próprio indivíduo) as tarefas de formação geral. Sob essa perspectiva,
não se pode esperar que as firmas, através das ações na formação de seu próprio pessoal, possam cumprir um papel
relevante na educação básica ou geral da população de um país.
IV. Capital Humano, a Armadilha da Pobreza e Políticas Públicas.
Da leitura dos parágrafos anteriores deve ficar mais ou menos claro que, para os adeptos da Teoria do Capital
Humano, a pobreza tem que ser explicada pela baixa produtividade que, por sua vez, é determinada por um baixo
investimento em capital humano 16/. A primeira pergunta diz respeito às causas desse “sub-investimento” em capital
humano. Ou seja, por que esse indivíduo não passou mais anos no sistema escolar ? Por que ele não sabia das
possibilidades que a educação abria em termos de ganhos salariais ? Ou ele sabia desses retornos e não podia continuar ?
17/.
Em geral, se assume que os indivíduos conhecem os benefícios que, em termos salariais ou econômicos, a
educação oferece. Dada essa hipótese, cabe colocar a pergunta sobre as causas que impelem os indivíduos a não
estudarem. A resposta usualmente apresentada pelos teóricos do Capital Humano está vinculada com a reprodução da
pobreza entre gerações. A linha de raciocínio é mais ou menos a seguinte. Famílias cuja somatória de renda não atinge a
linha de pobreza precisam dos potenciais rendimentos de qualquer membro da família que esteja apto para trabalhar. Dessa
forma, as crianças oriundas dessas famílias são compelidas a ingressar em idade precoce para o mercado de trabalho.
Ainda que essas crianças obtenham exíguos rendimentos de sua incorporação na população ativa, em virtude da situação
de pobreza de seu entorno familiar, essa renda seria importante no orçamento do conjunto. Ingressar cedo (em termos de
idade) no mercado de trabalho implica, na maioria das vezes, em abandonar o sistema escolar e/ou comprometer a
qualidade de sua formação. Esse fato irá pautar os rendimentos futuros (rendimentos na vida adulta), perpetuando a
situação original de pobreza. Contudo, esse ciclo não fica restrito a essa geração. Na medida em que essa criança terá uma
vida adulta pautada por uma situação econômica e social precária, seus filhos terão um destino similar, perpetuando a
pobreza entre gerações. Em outros termos, a pobreza das gerações atuais pode ser entendida ou explicada pela pobreza de
seus antepassados.
Nesse contexto, reverter essa situação está além da divulgação, entre a população pobre, dos benefícios da
educação ou do aumento na oferta de vagas no sistema de ensino, ainda que este seja público e gratuito. Os filhos das
famílias pobres não freqüentariam o sistema escolar pelas restrições que o presente impõe, não por falta de conhecimento
sobre os retornos desse investimento 18/. Uma forma de romper esse círculo vicioso que transmite a pobreza de uma
geração a outra seria articular maior oferta de vagas com transferências monetárias que “compensassem” a família pela
renda proveniente do trabalho infantil e que a freqüência escolar restringe. Este é, em termos de formulação teórica, a
fundamentação das políticas denominadas de “Bolsa Escola”, hoje tão em voga.
Esse tipo de alternativa de política social consiste, primeiro, na identificação do público alvo, que estaria
constituído por famílias pobres com filhos em idade escolar 19/. Uma vez escolhida, a família receberia uma transferência
mensal sujeita á freqüência escolar dos filhos 20/.
Os programas sociais tipo “Bolsa-Escola” têm um certo grau de parodoxismo. Como o leitor já deve ter observado,
seu embasamento teórico está extremamente enraizado no pensamento liberal e na sua vertente econômica contemporânea,
a escola neoclássica. Desde seus primórdios, o liberalismo identificou na educação a forma de reverter a pobreza, reduzir as
desigualdades e promover a mobilidade social, premiando os que por ventura fossem os mais inteligentes ou os mais
voluntariosos. Coerente com o individualismo que permeia todo seu pensamento, o liberalismo identificava no esforço
pessoal, individual, as raízes últimas do destino das pessoas. O Estado deveria-se limitar, no máximo, a igualar as
oportunidades (as condições iniciais), mediante o ensino público, podendo, até, privilegiar os indivíduos (especialmente as
crianças) oriundos de famílias desfavorecidas, para, justamente, reduzir a desigualdade nas oportunidades.
Curiosamente, não obstante os programas “Bolsa-Escola” serem uma coroação ou cristalização do pensamento
liberal, hoje o mesmo é compartilhado por todo o espectro político e ideológico. Chegamos, mesmo, a observar uma disputa
entre o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido pela Social Democracia Brasileiro (PSDB) a paternidade desse tipo de
programa 21/.
V. Distribuição de Renda.
Na media em que, para a teoria neoclássica, a remuneração dos fatores está estreitamente vinculada a sua
produtividade, o perfil da distribuição de renda (a renda é uma variável fluxo) está determinado pelo perfil distributivo dos

Page 67 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 69 -
estoques de riqueza. Ou seja, a distribuição dos estoques determina o perfil distributivo do fluxo.
Essa perspectiva, já estudada no Capítulo III, pode ser aplicada à teoria do Capital Humano de forma mais ou
menos linear. O fluxo de rendimentos do trabalho (lembremos que a Teoria do Capital Humano está vinculada,
exclusivamente, à renda obtida mediante os ganhos provenientes dos pagamentos pelos serviços do trabalho) e seu perfil
distributivo estão determinados pela distribuição do capital humano. Uma sociedade na qual observemos uma elevada
concentração do capital humano (muitos analfabetos e poucos indivíduos com formação superior, por exemplo)
apresentará um perfil distributivo muito mais concentrado quando comparada a outra que verifica a maioria de seus
indivíduos
em torno da média dos anos de estudo.
Para a escola neoclássica, esse perfil de distribuição de renda produto do grau de concentração do capital humano
pode ser ampliada ou reduzida pelo funcionamento do mercado de trabalho. Discriminação e segmentação (conceitos
analisados no Capítulo III), podem, por exemplo, ampliar o grau de concentração. Em geral, quanto maior o grau de
concorrência no mercado de trabalho (menor o grau de discriminação e segmentação) menor será a distância entre o perfil
distributivo que determina o grau de concentração do capital humano e o efetivo.
Dessa forma, nos casos em que os governos tenham como objetivo reduzir a concentração de renda, duas
alternativas são imaginadas.
A primeira consiste em elevar o grau de concorrência no mercado de trabalho. Reduzir o poder dos sindicatos,
combater práticas discriminatórias, etc. integrariam a agenda de propostas.
A segunda deveria visar a redução do grau de desigualdade na distribuição do estoque de capital humano
acumulado por uma sociedade. Sob esse ângulo, podem ser entendidas as políticas públicas propostas para o Brasil por
organismos internacionais como o Banco Mundial. Estes propugnam a concentração dos recursos financeiros públicos na
educação básica, deixando para o mercado a satisfação da demanda em matéria de educação superior. Esta proposta de
política se sustenta em um diagnóstico que podemos resumir da seguinte forma.
A educação pública (e gratuita) brasileira se caracterizaria por apresentar uma duvidosa qualidade na sua base
(ciclo primário) e uma boa qualidade no seu topo (ensino de terceiro grau ou universitário). Essa polarização seria nefasta
em termos distributivos por dois aspectos. Em primeiro lugar, para ter acesso ao ensino superior de qualidade (que estaria
concentrado na esfera pública e gratuita), é necessário ter freqüentado os ciclos anteriores na esfera privada e paga, dadas
as exigências de entrada (vestibular). Como os indivíduos oriundos de famílias de menores recursos freqüentaram, pelas
suas restrições financeiras, um ensino básico publico de duvidosa qualidade, as chances de ingressar no
segmento público e gratuito de terceiro grau são mínimas. Nessas circunstâncias, se pretendem continuar sua formação em
alguma universidade, a alternativa será o segmento privado, que, além de ser de baixa qualidade, é pago. Segundo esse
diagnóstico, estamos diante uma situação paradoxal: a juventude pertencente às famílias de menores rendimentos
freqüentam o estabelecimentos universitários privados, que são pagos e de baixa qualidade. Contrariamente, os recursos
públicos estariam financiando um complexo de universidades gratuitas e de boa qualidade, mas que seu público é
composto, majoritariamente, por jovens menbros de famílias abastadas. Nesta linha de raciocínio, o sistema de ensino
brasileiro e a articulação entre eles reproduziria um perfil de distribuição de renda extremamente concentrado 22/.
Ainda que possa parecer contraditório, esse diagnóstico tem como corolário uma proposta de política educacional
que tende a concentrar os recursos públicos no ensino básico e o sistema universitário poderia ser até público, mas pago,
ou diretamente privado. Dizemos que paradoxalmente, visto que, historicamente, o próprio pensamento liberal (ver as
propostas de John Stuart Mill, por exemplo), sustentava que a educação pública e gratuita deveria ser uma das
principaisformas de reduzir a pobreza e desigualdades. Para as principais correntes do liberalismo contemporâneo, o foco
da estratégia governamental seria a “desconcentração” do capital humano acumulado por uma sociedade e, nesse
sentido, só se justificaria a intervenção do estado quando dirigida ou focalizada nas famílias de menores rendimentos.
Nesse sentido, a educação pública e gratuita para toda a sociedade, como propugnam as correntes de esquerda, tenderia a
reproduzir o padrão de desigualdade.
VI. Dispersão dos Rendimentos.
VI.1. Tendências Mundiais.
Em termos muito simplificados, podemos afirmar que, entre os anos 30 e fins dos anos 70, existiu uma tendência
mundial à redução das desigualdades, fenômeno mais acentuado entre os países centrais que nos periféricos. A origem
dessa trajetória foi muitas vezes identificada, pela esquerda, como sendo produto do fortalecimento dos sindicatos, do
estabelecimento de pisos salariais (salário mínimo) e, em geral, do denominado Welfare-State ou Estado de Proteção Social
(seguro-desemprego, aposentadoria pública, educação, saúde, etc.).
A partir dos anos 80, essa tendência à redução das desigualdades sofre um ponto de inflexão e, em maior ou
menor medida, se começa a observar uma crescente dispersão nos salários em quase todos os países do mundo. As
correntes de esquerda, coerentes com seu discurso anterior, atribuíram essa ruptura à ascensão do denominado
neo-liberalismo e suas políticas de enfraquecimento dos sindicatos, redução do valor real do salário mínimo, reformulação
do Welfare-State (sistema de proteção social menos extensos), etc.
A escola neoclássica tinha que tentar um marco interpretativo a essa novo quadro de crescente dispersão de
salários. Como, para essa corrente, o papel dos sindicatos, do salário mínimo, da proteção social, etc. nunca esteve na sua
agenda de propostas para redução das desigualdades, ela nunca colocou essas variáveis como as determinantes na queda
da concentração de renda entre os anos 30 e 70. Ou contrário, para os teóricos neo-clássicos, se os sindicatos, o salário
mínimo, a proteção social, etc. tinham alguma influência na distribuição de renda, essa era oposta à sugerida pelas

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 70 -
correntes de esquerda. O aumento do poder dos sindicatos, do salário mínimo, etc. deveria acentuar as desigualdades,
especialmente, ainda que não exclusivamente, através do aumento do desemprego.
Dessa forma, como evitar a natural associação entre crescimento da desigualdade e políticas de cunho
pró-mercado (abertura externa da maior parte das economias, redução do poder sindical, privatizações, diminuição dos
benefícios sociais, etc.) a partir dos anos 80 ? Que marco interpretativo alternativo a escola neoclássica poderia
disponibilizar ?
A resposta neoclássica veria em termos de um simples modelo de mercado. Os teóricos dessa corrente sustentam
que, a partir dos anos 80, o mundo assistiu a um choque tecnológico. As novas tecnologias requeriam indivíduos com um
maior capital humano, especialmente capital humano geral particularmente desenvolvido (capacidade cognitiva).
Paralelamente, esse novo padrão tecnológico dispensaria a força de trabalho desqualificada. Analisemos os efeitos desse
choque a partir dos Gráficos 1 e 2. Vamos supor, para simplificar mas sem perder generalidade, que temos dois tipos de
trabalho, o qualificado (Lq) e o não qualificado (Lnq), com seus respectivos salários (Wq e Wnq). A situação inicial pode
ser representada pelo Gráfico 1, no qual temos os dois mercados (de força de trabalho qualificada e não-qualificada) em
equilíbrio (oferta igual a demanda). O salário dos qualificados é superior ao dos não qualificados e a distância é dada por Ä
0 = Wq – Wnq.
Suponhamos, agora, a presença de um choque tecnológico cujo padrão de necessidades de mão-de-obra
requereria indivíduos mais qualificados. Essa mudança pode ser representada por um deslocamento da demanda de
trabalho à direita no mercado de trabalho qualificado e um deslocamento à esquerda no caso do mercado de trabalho dos
não qualificados (ver Gráfico 2). Os rendimentos dos assalariados qualificados vão se elevar e, supondo flexibilidade de
salários, os dos não qualificados vão se reduzir. Na hipótese de salários reais rígidos à baixa, o deslocamento da demanda
de trabalho no mercado dos não-qualificados vai gerar desemprego. A intuição induz a pensar que o mais realista e
provável seria uma combinação de ambos fenômenos (elevação do desemprego e queda dos salários) no segmento dos
não-qualificados.
Dessa forma, um choque tecnológico poderia explicar vários fenômenos. O primeiro, a crescente dispersão de
salários. A distância Ä 1 = Wq 1 – Wnq 1 é superior à distância inicial Ä 0. O segundo fenômeno seria o desemprego entre a
população de menor qualificação que, ao resistir à queda dos salários reais, não poderia encontrar emprego. Por último, o
terceiro fenômeno que poderia ser explicado está vinculado com o aparente paradoxo de situações nas quais existe
desemprego e os empresários se queixam de dificuldades em preencher as vagas disponíveis. Neste caso, temos uma
incompatibilidade entre a formação requerida pelos postos de trabalho que são criados e a oferta de trabalho, e um
fenômeno de penúria de mão-de-obra por partes das firmas poderia conviver com elevadas taxas de desemprego 23/.
Em termos de política pública, o principal corolário deste diagnóstico diz respeito à necessidade de educação, de
formação e de reciclagem para que os deslocamentos da demanda sejam compensados por deslocamentos na oferta (queda
na oferta de mão-de-obra não qualificada e elevação na quantidade de
força de trabalho qualificado). Assim, um perfil de oferta mais compatível com o perfil de demanda poderia reduzir a
tendência a uma maior diferenciação salarial.
Contudo, vários são os fatores que limitam a potencialidade de uma política pública nos marcos antes assinalados.
Mencionemos dois, ambos relacionados com as dificuldades em atingir uma rápida mudança na composição da oferta de
trabalho.
O primeiro exemplo está vinculado ao longo intervalo de tempo entre uma política na área de educação formal e
seu impacto na composição da oferta de trabalho. Ainda que se realizem consideráveis investimentos visando elevar a
escolaridade da população, em geral estes se concentram nas menores faixas etárias. Os ganhos em termos de anos de
estudo da população adulta, já participando do mercado de trabalho, são mínimos. Nessas circunstâncias, a mudança no
perfil de escolarização do estoque da força de trabalho é residual e está determinado pelo perfil educacional dos que
entram no mercado e dos que saem. Assim, mudanças perceptíveis só podem ser obtidas tendo como referência o médio e
longo prazo. Revoluções tecnológicas que redundem em alterações no perfil da mão-de-obra requerida devem enfrentar um
estoque de assalariados herdado com possibilidades de mudança no nível educacional que, no curto prazo, são marginais.
O segundo exemplo está relacionado com a possibilidade de mudar o perfil da mão-de-obra não por meio de uma
maior escolarização formal, senão mediante reciclagem ou curtos cursos de formação profissional. Não existe um
diagnóstico claro sobre a efetividade desse tipo de política (formação e reciclagem). Várias são as possibilidades e só um
estudo caso a caso permitirá avaliar a eficiência e eficácia dos recursos assim alocados 24/. Podemos imaginar, por exemplo,
o caso no qual o nível de educação geral de uma população é tão baixo que os ganhos em conhecimentos e habilidades
através de cursos de formação e reciclagem são mínimos. Outro caso está associado à idade da população afetada pelo
choque tecnológico. Em princípio, quanto maior for a idade menor será a flexibilidade ou capacidade de adaptação do
indivíduo a um novo padrão tecnológico.
Esses argumentos permitem concluir que, se as causas da maior dispersão no leque de remunerações a partir dos
anos 80 é a mudança no padrão tecnológico, as possibilidade de reverter ou atenuar essa tendência através de políticas no
campo da oferta (educação, formação e reciclagem) seriam reduzidas.
VI.2. O Caso Brasileiro
Esse rápido deslocamento nas curvas de demanda como sendo a origem da tendência mundial à elevação das
desigualdades a partir dos anos 80 foi utilizado, por diversos analistas, para explicar os processos de concentração de
renda, não unicamente os mais recentes. Um dos exemplos foi o caso do Brasil durante o período denominado de “milagre”
(segunda metade dos anos 60 e começo dos 70).

Page 69 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 71 -
Nesse período, o rápido crescimento (o PIB chegou a crescer a taxas superiores a 10% ao ano) foi acompanhado
por uma maior desigualdade 25/. Em geral, as correntes de esquerda atribuem esse fato à repressão ao sindicalismo,
achatamento do salário mínimo e, em geral, à impossibilidade de consolidação de movimentos populares de reivindicação,
devido ao clima autoritário do período. Logicamente, para os teóricos neo-clássicos esse tipo de explicação sempre foi
pouco convincente. Sua explicação para o crescimento da desigualdade foi realizada nos termos que, quase vinte anos
depois, seria utilizada para explicar a maior polarização mundial.
Diferentemente do choque tecnológico de hoje, os pesquisadores neo-clássicos argumentavam que o rápido
desenvolvimento gerava um crescimento na demanda de mão-de-obra qualificada que elevava o diferencial de salários.
Como se tratava de um processo de transição entre uma sociedade predominantemente agrícola para outra
urbano-industrial, a oferta de mão-de-obra que surgia das regiões rurais não era compatível (em termos de qualificação e,
até, de cultura) com os requerimentos do setor industrial emergente. Os processos de adaptação, através dos cursos de
formação profissional e educação,
eram lentos e de resultados duvidosos, devido ao passado dos indivíduos sobre os que operavam. Nesse contexto, o
diferencial de salários tendia a aprofundar-se, beneficiando os indivíduos com maior educação e qualificação. Contudo,
esse seria um fenômeno passageiro. Com o transcorrer do tempo, os filhos desses migrantes rurais, criados em ambientes
urbanos, somado à uma política pública de educação e formação técnica, redundariam em maior oferta de mão-de-obra
qualificada e a tendência seria uma redução no leque de rendimentos 26/.
Em realidade, toda essa interpretação era relativamente comum nos cursos de desenvolvimento, quando a
trajetória na distribuição de renda era representada por um U invertido: nas primeiras etapas o grau de concentração de
renda cresce e, depois de atingir um máximo, inicia um processo de desconcentração 27/. Assim, o próprio processo de
desenvolvimento reverteria, quase que automaticamente, esse processo. A experiência histórica tem mostrado, ao menos
para o caso brasileiro, que essa automaticidade não foi registrada.
VII. As Perspectivas Críticas.
As críticas à Teoria do Capital Humano foram elaboradas desde diversos marcos teóricos e envolvem diversos
gruas de radicalidade. Vamos mencionar as três que, consideramos, gozam de maior tratamento na literatura 28/.
VII.1. A Teoria do Filtro.
Este marco teórico (a Teoria da Educação como um filtro) foi desenvolvido pelo Prêmio Nobel (1972) Kenneth
Arrow, em um artigo de julho de 1973 (“Higher Education as a Filter”, Journal of Public Economics, Vol. 2 Nº 3).
Para Arrow, seguindo a tradição neoclássica, as características da oferta (do indivíduo) determinam a
produtividade. Porém, e aqui está o cerne da crítica, os conhecimentos adquiridos no sistema escolar não determinam essa
produtividade. Contudo, como se explicaria a generalizada associação entre nível de educação e rendimento (quanto mais
elevados fossem os anos de estudo maior os salários ganhos ) ?
Na Teoria do Filtro se argumenta que o sistema escolar serve, quase que exclusivamente, para “peneirar” as
pessoas. Aqueles que atingem certas metas (segundo grau, formação universitária, doutorado, etc.) apresentam certos
atributos, como inteligência, disciplina, persistência para superar obstáculos, etc. Os fatores que determinam a
produtividade são, justamente, esses, e as firmas, obviamente, pagam por eles. Em um mundo de informação imperfeita,
como nos modelos que apresentamos no Capítulo anterior, os indivíduos tendem a estudar para enviar “sinais” ao
empregador sobre sua potencialidade em termos dos atributos antes mencionados. Assim, o indivíduo estuda, em última
instância, para adquirir “credenciais” a fim de se posicionar no mercado de trabalho de forma vantajosa, enviando “sinais”
sobre suas qualidades.
Nesse contexto, pode ser importante tanto o “sinal” dado pelo nível de educação como a escola na qual foi
formado. Graduar-se em uma universidade mais exigente requereria inteligência maior, mínima dose de disciplina,
perseverança, etc. Os empregadores não valorizariam os conhecimentos adquiridos nessa universidade, estando
interessadas nos mencionados atributos e, logicamente, “pagando” pelas qualidades dos indivíduos que se formam nessa
universidade. Se o indivíduo é inteligente, perseverante, etc., rapidamente adquirirá, na firma, os conhecimentos
específicos necessários para desenvolver suas tarefas.
Os atributos que são valorizadas podem ter tanto uma origem genética como poderiam ser adquiridos na primeira
infância (alimentação, saúde, estímulos, carinho, etc.). A progressão no sistema escolar seria um modo eficiente de
“revelar” ao empregador essas virtudes ou qualidades, não para adquirir conhecimentos específicos 29/. Dessa forma, é
possível explicar porque maiores anos de estudo se traduzem em maiores salários (como evidenciam todas as séries
estatísticas).
Em termos práticos, os desdobramentos desta perspectiva teórica são pessimistas se o objetivo de uma sociedade
consiste em reduzir as desigualdades. Os diferenciais de renda do trabalho estariam refletindo as diferenças genéticas, de
forma que só poderiam ajustar-se na margem (primeira infância, por exemplo).
Contudo, entender a educação como a procura por “credenciais” para aumentar a competitividade no mercado de
trabalho não deixa de ser uma perspectiva de análise interessante, que os professores tendem a observar no seu cotidiano.
Uma parcela não desprezível dos alunos tende a freqüentar o sistema escolar mais pela procura do “diploma” que pela
adquisição de conhecimentos ou habilidades. Pareceria ser que conhecimentos e habilidades só são validados através do
“diploma”. Em princípio, se esse “credencialismo” pode ser explicado em termos econômicos (custos-fixos, informação
imperfeita, etc.), o contrário, contudo, é mais complexo. Ou seja, em princípio, “diploma” sem conhecimentos ou habilidades
não deveria ser procurado, dado que o “mercado” só remuneraria produtividade (conhecimentos e habilidades) e não
“carimbos” 30/.

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 72 -
VII.2. A Teoria da “Fila” ou a Concorrência sobre os Postos de Trabalho.
A Teoria do Filtro, que apresentamos nos parágrafos anteriores, não obstante seu distanciamento da Teoria do
Capital Humano no que concerne ao papel da educação na determinação dos salários, conserva um pressuposto básico da
escola neo-classica: as características da oferta (sejam genéticas ou
adquiridas) determinam a produtividade.
Lester Thurow popularizou, no começo dos anos 70, uma teoria que pretende se diferenciar de forma mais radical
da corrente neoclássica 31/. Para esta corrente, os fatores determinantes da produtividade estão associados à demanda e
não à oferta de trabalho. Cada posto de trabalho gerado tem uma característica (salário, perspectivas de progressão
funcional, benefícios indiretos, etc.) e os trabalhadores concorrem para esses postos. Ou seja, notemos a diferença radical
com respeito à corrente neoclássica: a concorrência entre os trabalhadores não altera os salários. A concorrência é sobre
os postos de trabalho criados. Logicamente, quanto “melhor” o posto (salários diretos e indiretos mais elevados,
estabilidade, prestígio, etc.) maior será a concorrência.
Mas, a pergunta é natural: se a produtividade é determinada pelo posto de trabalho (a demanda) e não pelo
trabalhador (a oferta), porque existe uma estreita correlação, na quase totalidade dos países, entre salários e educação ?
Segundo esta linha de raciocínio, a concorrência pode ser representada por uma, imaginária, “fila”. O nível de
educação é o “carimbo” ou sinal de cada trabalhador que determinará seu “lugar” na fila. Quanto melhor o “carimbo”
melhor será seu lugar na fila. Deste marco teórico dois corolários adquirem relativa importância.
O primeiro refere-se ao papel da educação e formação. Para a Teoria do Capital Humano duas alternativas de
aquisição de conhecimentos e habilidades são imaginadas: o capital humano geral, obtido, preponderantemente, no
sistema escolar, e as habilidades específicas, adquiridas, principalmente, no posto de trabalho (on-the-job training). Para
os adeptos do “job competition” (concorrência pelo posto de trabalho), a educação serve para elevar a probabilidade de
ocupar um posto, uma vez que transmite certas qualidades do indivíduo que a firma julga compatíveis com as requeridas
pela função a ocupar (pode ser inteligência, capacidade cognitiva, disciplina, etc.). Dado esse perfil, transmitido a partir do
sinal “educação”, os conhecimentos e habilidades requeridas serão adquiridas no próprio posto de trabalho (
on-the-job-learning). Ou seja, tudo gira em torno das características do posto de trabalho e as caracterísicas da oferta,
transmitidas através do “sinal educação”, só serviriam para balizar a “treinabilidade” de um indivíduo (ou, os custos de seu
treinamento).
O segundo corolário está vinculado à importância do nível de educação. Se a educação de um indivíduo determina
seu lugar na “fila”, o relevante não é a educação absoluta senão a educação relativa. Nesse sentido, a concorrência para
ocupar os melhores empregos induzirá a uma “inflação” de diplomas, que, naturalmente, desvalorizará os menores níveis.
Um exemplo, talvez um pouco prosaico, permite ilustrar a situação. Em um país subdesenvolvido, cuja população apresente
uma reduzida escolaridade, um indivíduo com segundo grau completo talvez seja a “elite” do mercado de trabalho,
ocupando os melhores postos de trabalho. Em um país com elevado grau de desenvolvimento, esse mesmo indivíduo, com
a mesma qualificação e habilidades, seguramente concorrerá para ocupar os piores empregos. No Brasil, por exemplo, nos
anos 50 e 60, possuir segundo grau completo era um passaporte para emprego de boa qualidade (empregos de Bancos
Estatais, por exemplo, que além de elevados salários ofereciam perspetivas de progressão funcional, estabilidade, etc.).
Hoje, a concorrência por esses mesmos postos de trabalho é travada por indivíduos com curso superior completo, sem
que, na maioria das vezes, as habilidades requeridas pela função justifique os conhecimentos adquiridos durante o terceiro
grau.
O terceiro corolário diz respeito a políticas públicas. Para os adeptos à Teoria do Capital Humano, o estado, em
caso de intervenção, deve fazê-lo por meio da educação. A maior qualificação, natural e automaticamente, redundará em
maior produtividade e crescimento. As características da oferta determinam a produtividade. Não se deve implementar, por
exemplo, uma política industrial. A
intervenção do Estado deve limitar-se à educação e, posteriormente, deixar o mercado finalizar a tarefa.
Quando se assume que quem determina a produtividade é o posto de trabalho e não a oferta, a ação do estado tem que
estar dirigida a elevar a qualidade dos postos de trabalho oferecidos, mediante, por exemplo, uma política industrial. Nesse
sentido, a ausência de uma estratégia pode dar como resultado uma mão-de-obra sobrequalificada para os postos de
trabalho que são criados 32/.
Por último, um quarto corolário diz respeito à segmentação. Em geral, a concorrência se daria entre os
trabalhadores, disputando entre eles o preenchimento de uma vaga. Os salários não seriam a variável de ajuste. Contudo,
na medida em que os postos de trabalho de melhor qualidade vão sendo ocupados, o excedente de força de trabalho vai
deslocando-se para ocupar postos de trabalho de menor qualidade (menores salários, menor estabilidade, etc.). Nos piores
postos de trabalho admite-se a concorrência via salários Assim, estaríamos na presença de uma segmentação ou
dualização do mercado de trabalho. Em um pólo estariam os postos de trabalho de boa qualidade, ocupados pelos
indivíduos de melhor educação (os primeiros na fila, aqueles que seriam os mais facilmente adaptáveis às tarefas e funções
requeridas pelas vagas). No outro pólo estaríamos na presença de postos de trabalho de baixa qualidade (baixos salários,
elevada rotatividade, etc.) ocupados pelos indivíduos de menor educação relativa. Dessa forma, estamos diante de um
arcabouço teórico que explica a segmentação pela qualidade dos próprios postos de trabalho, diferentemente das
explicação dadas pela teoria neoclássicas de Salários de Eficiência, por exemplo (Capítulo IV).
VII.3. O Credencialismo.
Essas credenciais que mencionamos na Seção anterior como um produto da informação imperfeita (uma forma
eficiente de “revelar” aos empregadores certas características inatas e, dessa forma, diminuir o risco ou incerteza na relação

Page 71 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 73 -
trabalhista) são motivo de uma interpretação crítica mais radical de todo o processo educativo.
Para esta perspectiva, que engloba desde pensadores da esquerda marxista até sociólogos institucionalistas
americanos, o sistema educativo tem como objetivo, em última instância, a reprodução da ordem social existente. Nesse
arcabouço teórico, nem a produtividade determina salários nem a educação determina produtividade.
O sistema escolar tenderia a educar as pessoas de forma multidimensional e não unicamente técnica, como
pretende a Teoria do Capital Humano. Simultaneamente à dimensão estritamente técnica (habilidades e conhecimentos),
nas escolas e universidades os indivíduos assumem formas de auto-representação, cultura, relações pessoais, etc., que
determinariam sua futura inserção no mercado de trabalho.
Nessa perspectiva, o sistema educacional formaria os indivíduos para os distintos papeis que virão a ocupar no
sistema de reprodução social. A cultura (visão do mundo) de cada classe ou grupo social seria transmitida, de geração a
geração, através do sistema de ensino. De forma algo caricatural, cada posto de trabalho teria duas componentes, uma
técnica e outra cultural. A dimensão cultural seria dada pelo ambiente familiar e o grupo social, fato que induziria a escolha
de certas escolas compatíveis com esse perfil de valores e normas. Os futuros postos de trabalho, por sua vez, seriam
ocupados por indivíduos com um perfil cultural compatível com os requerimentos nesses aspectos. As elites, por exemplo,
tenderiam a formar seus filhos (técnica e culturalmente) para ocupar as posições de direção e comando, reproduzindo,
geração trás geração, sua posição na pirâmide social. Os valores transmitidos nas classes menos abastadas tenderiam a
inculcar em seus filhos as virtudes vinculadas a normas de obediência, submissão, resignação, etc..
Para esta abordagem, quando a educação se populariza, sempre são gerados mecanismos de diferenciação. O caso
da França seria, para esta teoria, um bom exemplo. Após as revoltas de 1968, em resposta as demandas da época, a
educação superior experimentou um movimento de crescente popularização. Foram criadas inúmeras universidades que
começaram a abrigar a juventude cuja origem eram as classes médias e, até, populares. Contudo, as escolas tradicionais
(Écoles Polytechniques, Sciences Politiques, etc.) continuaram tão elitizadas como antes. Seus egressos continuam
alimentado os quadros de elite, seja no setor privado seja no setor público. O contingente de jovens que freqüenta esse
segmento do ensino superior continua compartilhando um perfil cultural que o diferencia do restante da população
universitária.
Em geral, o maior empecilho para avaliar esta teoria está na reduzida possibilidade de verificação empírica. A partir
dos agregados usualmente disponíveis (PNAD, RAIS, etc.) não é fácil validar empiricamente a pertinência deste modelo.
Os testes empíricos requerem dados sobre, por exemplo, amobilidade social, só disponível em certas ocasiões muito
específicas 33/. Talvez
essa reduzida capacidade em receber validação através dos dados tenha contribuído (além, logicamente, de restrições
conceituais e até dos aspectos ideológicos) para que este marco teórico, hoje, não goze de muita popularidade 34/.
VIII. As Evidências.
Nosso objetivo nesta Seção será mostrar as correlações mais comumente realizadas sobre utilizar a Teoria do
Capital Humano na explicação de fenômenos vinculados ao mercado de trabalho. Ou seja, nosso objetivo não é testar
empiricamente essa abordagem mas, simplesmente, prover ao leitor ilustrações
das relações entre variáveis cotidianamente utilizadas no Brasil.
Logicamente, a primeira relação, talvez a mais óbvia em termos da Teoria do Capital Humano, é aquela que vincula
os anos de estudo com o rendimento obtido do trabalho. No Gráfico 3 podemos observar que essa relação parece
plausível. Contudo, a inclinação na curva que vincula anos de estudo com rendimentos do trabalho principal tende a ser
mais acentuada nos intervalos posteriores (a partir de 10 anos). Esse fato, usualmente identificado em todos os estudos
que pesquisam os retornos da educação, pode ter um desdobramento importante em termos das estratégias individuais.
Como os maiores retornos se situam nas fases mais avançadas da vida escolar, os indivíduos que estruturalmente não
podem (por problemas individuais ou por restrições econômicas) atingir essa fase tem incentivos para abandonar
rapidamente o sistema escolar em troca de um participação no mercado de trabalho. Mais diretamente: o indivíduo sabe da
impossibilidade de atingir a finalização do segundo grau e continuar os estudos na universidade, por exemplo, depois de
dominar minimamente a leitura e as quatro operações básicas pode não ter nenhum incentivo a permanecer no sistema
educativo. O retorno de um ano a mais de estudo não compensa os ganhos que deixa de perceber no mercado de trabalho.
No Gráfico 4, podemos observar uma estreita correlação entre idade e rendimento no trabalho principal, uma
correlação também prevista pela Teoria do Capital Humano (acumulação de capital humano específico). Neste caso, a
relação tem uma forma côncava, dado que o crescimento desses ganhos é decrescente, chegando inclusive a decrescer a
partir de, mais ou menos, os 50 anos.
Contudo, essa acumulação de capital humano específico parece estar influenciada pelos anos de estudo. Ou seja,
quanto maior o capital humano geral maior é a capacidade de incorporar capital humano no transcurso da vida ativa
(Gráfico 5). Duas interpretações são possíveis. A primeira, estreitamente
vinculada à própria Teoria do Capital Humano, estabelece uma estreita relação entre a capacidade de incorporar habilidades
específicas com os conhecimentos gerais previamente adquiridos. A segunda, mais vinculada à Teoria da “Fila”, sustenta
que aqueles indivíduos que tem maior nível de escolaridade ocupam os melhores postos de trabalho. Estes se caracterizam
por oferecer a seus ocupantes progressão funcional no transcurso de sua vida ativa. Assim, não seria a capacidade do
indivíduo em incorporar capital humano específico, como sugere a Teoria do Capital Humano, senão a qualidade do posto
de trabalho que viabiliza essa progressão funcional. De toda forma, independentemente do marco interpretativo, o certo é
que, como em quase todos os países, no caso do Brasil parece existir uma estreita correlação entre os ganhos salariais na
vida ativa e os anos de estudo.

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 74 -
Uma nítida segmentação parece poder diagnosticar-se no caso dos rendimentos por sexo 35/. Maiores anos de
estudo influenciam os rendimentos tanto em homens como em mulheres, sempre, contudo, podendo ser identificado um
diferencial a favor dos homens (Gráfico 6). Ou seja, a Teoria do Capital Humano parece explicar a trajetória dos rendimentos
de cada sexo, mas não esclarece as causas do diferencial.
Porém, cruzamos a taxa de desemprego segundo os anos de estudos (ver Gráfico 7), as relações podem adquirir
maior complexidade. Em princípio, o quase “lugar-comum” sobre as novas tecnologias e seus impactos sobre a demanda
de trabalho (os novos postos de trabalho requereriam uma mão-de-obra mais especializada), o corolário esperado seria uma
taxa de desempregocorrelacionada, positivamente, com os anos de estudo. Os dados não confirmam essa hipótese. A
relação entre anos de estudo e taxa de desemprego pode ser representada por um Curva U invertida. Desde um nível
mínimo, a taxa de
desemprego inicia uma trajetória de crescimento até atingir um máximo em 9 anos de estudo e iniciar, a partir daí, um
movimento descendente. Ou seja, a acumulação de capital humano não protegeria os indivíduos do desemprego ? A
resposta a essa pergunta não parece simples. Vejamos duas possíveis
interpretações para o formato dessa curva.
Na primeira, o ambiente social e, mais particularmente, o entorno familiar, pode estar influenciando essa taxa. Os
níveis inferiores de escolaridade estão associados com uma extrema precariedade econômica, o que pode tornar imperativo
a aceitação de qualquer oferta de emprego. Contrariamente, os níveis médios de escolaridade podem estar vinculados a
setores sociais médios, para os quais não é socialmente aceitável qualquer emprego e, o mais importante, existe um entorno
familiar que permite permanecer no desemprego até que ocupe um posto de trabalho compatível com o meio social e as
aspirações dodesempregado.
Uma segunda explicação está vinculada com a faixa etária. No caso do Brasil, quanto maior a idade menor será a
taxa de desemprego. Como as novas gerações que entram no mercado de trabalho são melhor instruídas (em termos de
anos de estudo), maiores taxas de desemprego nas faixas de escolariadade médias podem estar ocultando um problema de
desemprego nas menores faixas etárias.
Logicamente, o nosso objetivo não foi esgotar esses temas tratados senão, mais modestamente, ilustrar os
diferentes cruzamentos que podem ser realizados entre variáveis “proxy” do capital humano (anos de estudo e idade) e
outros indicadores do mercado de trabalho.
IX. A Guisa de Conclusão.
A Teoria do Capital Humano constitui, hoje, um dos paradigmas mais consolidados dentro do arcabouço da
escola neoclássica. Sua importância é tal que hoje pauta todas as discussões em termos de políticas de combate à pobreza
e distribuição de renda. Ainda as correntes de esquerda, normalmente críticas com respeito a certos supostos e conclusões
do pensamento neo-clássico, quando o tema é educação tendem a se render às propostas de política que surgem dos
maiores centros de pensamento liberal (como o Banco Mundial).
Em realidade, além dos aspectos vinculados à coerência do modelo, aspectos de pouca relevância no debate
não-acadêmico, a Teoria do Capital Humano parece encontrar evidências fortes quando confrontada com as estatísticas.
Poderíamos argumentar que as evidências são fortes, ainda que não muito fortes, devido a dois motivos.
O primeiro diz respeito à discriminação e segmentação, variáveis também importantes que, como já analisamos no
Capitulo III e IV, não evidenciam, no marco do pensamento neo-clássico, uma explicação convincente.
O segundo motivo está vinculado ao caráter explicativo desse conjunto de variáveis (capital humano geral, capital
humano específico, discriminação, segmentação, etc.). As regressões, incorporando todas essas variáveis (anos de estudo,
idade, idade ao quadrado, sexo, raça, região, setor de atividade, etc.) dificilmente explica 50% dos diferenciais de salários.
Logicamente, a escolaridade é a variável que mais explica porém, em seu conjunto, o modelo não pareceria ser meritório da
hegemonia que ocupa no debate.
Em realidade, essa hegemonia vem da fraqueza de paradigmas concorrentes. Os paradigmas alternativos, de
esquerda, geralmente colocam os problemas ligados à pobreza e distribuição de renda em termos de conflito distributivo,
controle social, etc., fato que gera marcos de interpretação difíceis de serem testados. Esse fato, vinculado ao enorme
tratamento empírico que os adeptos da Teoria do Capital Humano deram aos fenômenos relacionados com a pobreza e
distribuição de renda, resultou em hegemonia indiscutível, que, como afirmamos, hoje pauta todo o debate no Brasil.
Como já afirmamos, o mais paradigmático é observar como as propostas da esquerda em termos de políticas de
combate à pobreza, como os programas tipo “Bolsa Escola”, estão fundamentados em argumentos que, em última instância,
se confundem com os primórdios do pensamento liberal. Dada essa hegemonia, que está longe de ser contestada, qualquer
analista ou pesquisador deve ter presente os fundamentos, limitações e alcances da Teoria do Capital Humano. Esse foi,
justamente, o nosso objetivo no presente Capítulo.

Capítulo VII
O Modelo Clássico
Antes de desenvolver o que se conhece como “Modelo Clássico” devemos tentar, primeiro, definir o mesmo. Em
realidade, essa denominação se originou com Keynes, que classificou o pensamento dominante da sua época como
“clássico” 1/. Sob essa denominação, Keynes englobou uma série de autores e correntes extremamente diversas, que vão
desde Ricardo que, com sua teoria do valor-trabalho foi a referência teórica de Marx, até Marshall e Pigou, ícones do
pensamento neoclássico moderno. A pergunta que devemos nos colocar é: o que tinham em comum autores tão diversos
como Pigou e Ricardo?

Page 73 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 75 -
Para Keynes, o denominador comum nessa heterogeneidade era que todos partiam do suposto da existência de
pleno emprego dos recursos. Colocado em outros termos: como atingir a plena utilização de recursos não era o eixo central
das preocupações. No caso de Ricardo, suas reflexões giravam em torno de
questões vinculadas à identificação das leis que regulam a distribuição do produto. No caso dos neoclássicos (Marshall e
Pigou, por exemplo), o aspecto central a ser estudado estaria vinculado à eficiência (como combinar os recursos de forma
tal a atingir o nível máximo de produção).
Contrariamente, as reflexões de Keynes concentravam-se em torno a uma característica que, estruturalmente,
afetaria as modernas economias de mercado: a sub-utilização dos recursos disponíveis (desemprego da força de trabalho,
por exemplo). Dessa forma, apesar de não negligenciar os aspectos vinculados à distribuição de renda, a preocupação
central de sua revolução teórica baseou-se na identificação das causas que possibilitam equilíbrios fora do pleno emprego
e a persistência dos mesmos no tempo 2/.
Assim, o Modelo Macroeconômico Clássico pode ser definido como aquele que, inspirado nos pressupostos
neoclássicos (produtividade marginal do trabalho igual ao valor do produto marginal, a poupança depende da taxa de juros
e determina os investimentos, etc.), supõe que a flexibilidade de preços e salários assegura, sempre e em qualquer
circunstâncias, o pleno emprego. Nesse contexto, o nível de produto é determinado pelas condições de oferta (oferta de
mão-de-obra, tecnologia, etc.) e não pela demanda. Nesse sentido, o Modelo Macroeconômico Clássico só compartilha
com Ricardo a questão do equilíbrio no pleno emprego, mas abandona qualquer aspecto vinculado à teoria do valor-
trabalho 3/.
Dada essa definição, o nosso objetivo no Capítulo será apresentar esse modelo macroeconômico, suas hipóteses,
fundamentos, estrutura lógica e limitações. Estruturaremos o Capítulo da seguinte forma. Na próxima Seção serão
apresentadas as principais hipóteses e características desse marco teórico. Na Seção II desenvolveremos uma “caricatura”
do Modelo Clássico, uma das diversas formas através das quais podem ser representadas as principais idéias desse
arcabouço. Na Seção III analisaremos as aspectos qualitativos dos resultados encontrados na Seção anterior. Uma
perspectiva crítica, que não
esgota o tema mas serve para ilustrar pontos de fragilidade, será o tema que abordaremos na Seção IV. Na Seção V
finalizamos o Capítulo com um balanço dos principais argumentos e corolários que encontramos.
I. Características.
Nesta Seção apresentaremos os princípios que singularizam o Modelo Clássico e que, em última instância,
determinam seu equilíbrio macroeconômico. A ordem na qual apresentaremos esses princípios não obedecem a sua
importância. Por outra parte, considerando que o nosso objetivo consiste em
analisar com detenção o mercado de trabalho e seu lugar na resolução do modelo, daremos certa ênfase às variáveis
vinculadas à determinação dos salários e do emprego.
a) O Salário Real é igual à Produtividade Marginal do Trabalho.
Como não podia deixar de ser, o Modelo Clássico conserva a hipótese (já estudada no Capítulo III) segundo a
qual, em um contexto de concorrência perfeita, a firma maximizadora de lucros iguala o salário nominal ao valor da
produtividade marginal do trabalho ou, sob outra perspectiva, o salário real à
produtividade marginal do trabalho.
b) No Mercado de Trabalho, Oferta e Demanda determinam o Salário Real e o Nível de Emprego.
Esse fato é de relativa importância. Tanto a oferta de trabalho como a demanda são funções dos salários reais e o
corolário natural é: no mercado de trabalho se determinam os salários reais. Logicamente, em termos de quantidades,
também se determina o nível de emprego. Como a oferta de trabalho está em função dos salários reais, não existe “ilusão
monetária”. Os assalariados sabem distinguir entre uma variável real e outra nominal.
c) No Equilíbrio, Oferta de Trabalho é igual à Demanda de Trabalho.
O equilíbrio entre oferta e demanda se caracteriza pela eficiência produtiva. O salário real é igual à produtividade
marginal do trabalho que, por sua vez, é igual à taxa de substituição entre consumo e lazer (ou à relação entre a utilidade
marginal do consumo e a utilidade marginal do lazer) 4/.
d)A Função de Produção.
O Modelo Clássico conserva as características essenciais da função de produção neoclássica: produtividades
marginais positivas mas decrescentes.
e)Função Poupança e Investimento.
O nível de poupança e o investimento são função da taxa de juros. A relação entre poupança e taxa de juros é
positiva (aumenta a taxa de juros aumenta a poupança) e negativa no caso do investimento (se a taxa de juros se eleva cai
o investimento) 5/.
f)A Oferta de Moeda é Exógena.
O Modelo Clássico assume que, quem determina a quantidade de moeda da economia, é o Banco Central ou, em,
geral, as autoridades monetárias. A oferta de moeda é obtida a partir da base monetária, sob controle do Banco Central, e
do multiplicador, produto tanto de aspectos institucionais (alguns sob influência do próprio Banco Central) quanto de
condutas da população (quantidade de depósitos, etc.).
Contudo, o importante é reter que a Banco Central determina o nível nominal de moeda e não o real. Essa
instituição pode fixar a quantidade de papel moeda em mãos do público mas o poder de compra desse montante está em
função da resolução do modelo, como veremos na próxima Seção.

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 76 -
g) Demanda de Dinheiro.
Suponhamos que a demanda de dinheiro do público dependa de seu nível de renda real. Ou seja, o público não
apresenta ilusão monetária. A função de demanda por dinheiro estabelece uma relação positiva entre quantidade de
dinheiro demandada e o nível de renda (quanto maior for este maior será a quantidade de dinheiro em poder do público).
II. O Modelo.
Para sermos didáticos, dividiremos esta Seção em duas partes. Na primeira, nos limitaremos a expressar, em termos
formais, as relações definidas na Seção I. Essa tarefa nos permitirá ver, em II.2., como o modelo se resolve para, já na
próxima Seção, analisar aspectos mais qualitativos dos resultados que encontraremos aqui.
II.1. A Formalização.
Vamos dividir o modelo em “blocos”, alternativa que, acreditamos, permitirá visualizar melhor o modo de
resolução.
a)Mercado de Trabalho.
Ld = Ld (w/p) ; Ld ‘ < 0; (1)
Ls = L0 (2)
Ld = Ls (3)
Na equação (1), a demanda de trabalho (Ld) depende do salário real ( w = salário nominal; p = nível de preços). A
relação entre essas variáveis é a já mencionada e comum a toda a perspectiva neoclássica: maior o salário real menor a
demanda de trabalho.
Na equação (2) consideramos que a oferta de trabalho (L0) é exógena. Poderíamos supor, também, que ela depende
do salário real e tem uma relação positiva com ele (maior o salário real maior a oferta de trabalho) 6/.
O equilíbrio no mercado de trabalho se determina na equação (3), onde a oferta e demanda de trabalho se igualam
e são obtidos os valores de equilíbrio (nível de emprego e salários reais).
b) Mercado de Bens.
K = K0 (4)
Q = Q ( L; K 0) Q L > 0 ; Q LL < 0 (5)
Como estamos lidando com um modelo macroeconômico, ou seja, um modelo de curto prazo, é necessário assumir
o estoque de capital como fixo. Devemos lembrar que, diferentemente de um modelo de crescimento, um modelo
macroeconômico tem como vocação explicar as flutuações do produto em torno de seu nível potencial e as alternativas de
política para situá-lo o mais próximo do pleno emprego. Um modelo macroeconômico não deve ser visto como uma
ferramenta útil para explicar as trajetórias de crescimento do produto potencial. A evolução deste depende de variáveis
(educação, pesquisa científica e tecnológica, investimento em infra-estrutura, etc.) que merecem tratamento nos modelos de
crescimento.
Dado o nível de emprego, determinado através da equação (3), no mercado de trabalho, e o capital (dado
exogenamente), através da função de produção (equação (5)), se determina o nível de produto. A produtividade marginal
do trabalho é positiva (Q L>0 ) mas decrescente (Q LL <0), como é usualmente assumido nos modelos de inspiração
neoclássica.
c) Mercado de Bens.
I (i) = S(i); I’ < 0; S’ > 0; (6)
O investimento depende, negativamente, da taxa de juros e a poupança tem uma relação positiva com essa
variável. A partir de (6) se determina a taxa de juros de equilíbrio. Esse equilíbrio no mercado de poupança-investimento
possibilita o equilíbrio no mercado de bens. Ou seja, toda o produto gerado por
(6) (ou ainda, todo produto gerado pelos ocupados através da função de produção) encontra mercado (demanda) 7/.
Estamos diante da Lei de Say: toda oferta gera sua própria demanda.
d) Mercado de Dinheiro.
Ms = M 0 (7)
Md = k P Q (8)
Ms = Md (9)
Como afirmamos em parágrafos anteriores, a oferta de dinheiro (a oferta nominal de dinheiro) é exógena,
determinada pelo Banco Central (Equação (7)). A demanda de moeda é uma proporção k da renda monetária (P Q). A
expressão (8) é outra forma de expressar a conhecida igualdade M V = P Q, onde V representa a velocidade de circulação e
poderia ser definida como 1/k. Dado Q (determinado a partir do mercado de trabalho via função de produção), k (exógeno)
e Ms (também exógeno), o equilíbrio entre oferta e demanda de moeda determina P.
e) As Dimensões Nominais.
Y = P ·Q (10)
W = w ·P (11)
O nível de produto (Q) em termos monetários (Y) se determina uma vez estabelecido P. Por sua vez, W (salário
nominal) é, também, estabelecido a partir da determinação do nível de preços. Assim, as equações (10) e (11) fixam,
exclusivamente, os valores nominais, dado que os reais já foram estabelecidos.
II.2. Resolução do Modelo.
Esse modelo macroeconômico tem seis variáveis endógenas (w, W, Q, P, Y, i), três variáveis exógenas (Ms, a
oferta nominal de moeda, L0, a oferta de mão-de-obra e K0 = o capital) e o parâmetro k (o inverso da velocidade de

Page 75 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 77 -
circulação). Para determinar o valor dessas seis variáveis exógenas contamos com seis equações: (3), ( 5), (6), (9), (10) e
(11).
Dois valores das variáveis endógenas podem ser determinados simultaneamente, porque são independentes: o
valor do salário real e a taxa de juros.
No caso do salário real, este surge da interação entre oferta e demanda de trabalho e seu valor deve possibilitar o
pleno emprego. A partir desse equilíbrio no mercado de trabalho se determina o nível de produto real. Dada a oferta de
moeda e a velocidade de circulação, a partir desse nível de produto real se obtém o nível de preços. Uma vez estabelecido o
nível de preços, são fixados, simultaneamente, os valores nominais dos salários e o produto.
A taxa de juros fica estabelecida pela interação entre a oferta e demanda de fundos (função poupança e
investimento) e independe do equilíbrio nos outros mercados. A Figura 1 sintetiza esta hierarquia.
III. Aspectos Qualitativos do Modelo.
a) Pleno Emprego.
No Modelo Clássico, a economia sempre trabalha no pleno emprego. Admitindo flexibilidade de salários reais,
estes sempre encontrarão um valor capaz de igualar oferta e demanda. Na hipótese de existir desemprego, este se originaria
em uma rigidez, à baixa, dos salários reais, devido a fatores “extra-
econômicos” (salário mínimo, sindicatos, etc.).
b) A Oferta Determina o Nível de Produto.
A partir da oferta factível de ser determinada pelo emprego atingido no mercado de trabalho, o produto (real)
dessa economia está automaticamente fixado. A principal característica do Modelo Clássico consiste justamente nisso: as
condições de oferta determinam o nível de atividade. Esta singularidade é tão importante que muitos autores englobam sob
a denominação de clássicos todos os modelos que fixam o produto, exclusivamente, a partirdas condições de oferta.
c) No Mercado de Trabalho se determinam os Salários Reais.
No mercado de trabalho, além do nível de emprego, se obtém os salários reais. O leitor deve perceber que se
estabelecem os salários reais antes (independentemente) do nível de preços. A lógica (ou a ordem de causalidade) é
contrária à intuição: são os salários reais que determinarão, uma vez conhecido o nível de preços, os salários nominais. Na
medida em que todas as variáveis do mercado de trabalho estão em função de magnitudes reais, não existe ilusão
monetária. Tanto as firmas como os assalariados sabem distinguir entre real e nominal e suas ações serão pautadas pelos
valores reais.
c) A Taxa de Juros é um fenômeno do Setor Real.
Como o leitor já terá percebido, a taxa de juros se determina na esfera real do modelo. A oferta de moeda não tem
influência no seu nível.
d) Dicotomia Setor Real/Setor Nominal.
O Modelo Clássico tem uma segmentação nítida. De um lado as variáveis reais. A oferta de moeda só serve para
estabelecer a unidade de medida e não os valores reais. Mudanças na oferta (nominal) de moeda só influenciam o nível de
preços, mas não o equilíbrio atingido no setor real.
d) A Política Econômica Associada ao Modelo Clássico.
Em última instância, no modelo clássico não existe política econômica. Aliás, a pergunta que se coloca é: para que
deveria existir se o modelo sempre trabalha no pleno emprego ou, se trabalha fora do pleno emprego, é devido a variáveis
fora do controle dos gestores da política econômica (como sindicatos, supostos políticos populistas que desejam
estabelecer salários mínimos, etc.).
Em realidade, a única autoridade factível de ser vislumbrada nesse modelo é uma autoridade monetária que,
pautada pela “responsabilidade”, deveria outorgar liquidez ao sistema, sem deixa-se levar pela “tentação” de aumentar a
oferta de moeda para alterar o produto. Sua função (a da autoridade monetária) seria de fixar a oferta nominal de moeda (a
nominal, dado que a oferta real é endógena) a qual, por sua vez, determinaria o valor das variáveis nominais.
e)A Questão do Crescimento.
No Modelo Clássico a questão do crescimento se coloca quando o objetivo é elevar o nível de renda. Como se
trabalha no pleno emprego, não faz sentido a colocar a seguinte questão: devemos crescer para gerar empregos ?. Para que
vamos gerar empregos se todos os que desejam trabalhar ao salário vigente encontram trabalho ?
A questão do crescimento está vinculada à elevação do nível de renda. Como esta (a renda) é determinada pela
oferta (emprego e função de produção), quatro alternativas podem ser imaginadas: a) aumentar a quantidade de
trabalhadores (deslocar a oferta de trabalho); b) aumentar a qualidade dos trabalhadores (aumentar sua produtividade,
através da educação, por exemplo); c) aumentar o estoque de capital e d) desenvolver tecnologicamente o país. Á margem
da primeira possibilidade (aumentar a oferta de trabalhadores, mediante a abertura das fronteiras), nas outras três
alternativas se possibilita um deslocamento da função de produção (das produtividades marginais), aumentando-se, assim,
os salários.
Resumindo: a questão do crescimento está vinculada ao crescimento do produto (seja total seja per-capita) e não
à questão de gerar empregos. Como a quase totalidade das variáveis que determinam o crescimento não está vinculada à
política econômica (educação, infra-estrutura, pesquisa tecnológica, etc.), realmente a única função dos gestores de
política é administrar de forma “responsável” a oferta de moeda.
IV. A Perspectiva Crítica.
Apresentar as múltiplas fragilidades e limitações que podem identificar-se no Modelo Clássico é uma tarefa que

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 78 -
ultrapassa aos objetivos que nos propusemos no presente Capítulo. Várias delas já foram estudadas no Capítulo III
(quando apresentamos as críticas à função de produção) e outras serão
desenvolvidas no próximo Capítulo, quando analisaremos com certo detalhe o Modelo Keynesiano.
Contudo, algumas considerações são necessárias. Assim, sem o intuito de esgotar o tema, nos próximos
parágrafos estudaremos alguns, não todos, aspectos relevantes, especialmente no tocante ao mercado de trabalho.
a) A Autoregulação de uma Economia de Mercado.
No Modelo Clássico, na presença de mercados flexíveis, a economia sempre estaria trabalhando no pleno
emprego. Essa autoregulação das economias de mercado em torno de pontos próximos do pleno emprego beira os limites
da ideologia ou apologia do mercado.
Em nenhum período histórico as economias de mercado atingiram longos períodos próximas do pleno emprego
sem intervenção (através da política econômica) pública. Poderia argumentar-se que, no Século XX, as grandes crises
(como a de 1930) originaram-se devido à presencia de agentes (como os sindicatos) que não permitiam a flexibilidade de
preços e salários. Contudo, os movimentos cíclicos, alguns extremamente violentos, foram a característica do capitalismo
concorrencial da segunda metade do Século XIX. Ou seja, não existe evidência histórica que uma política econômica neutra
(limitada a administrar de forma responsável a oferta de moeda) redunde em um equilíbrio de pleno emprego. A
autoregulação de uma economia de mercado não parece ter sido sua principal característica na história.
b) Flexibilidade de Preços e Salários.
Um dos argumentos que podem ser esgrimidos, desde o ângulo dos defensores do Modelo Clássico, para
justificar a instabilidade que caracteriza as economias de mercado é a inflexibilidade de preços e salários.
Aqui várias opções são possíveis.
A primeira consiste em supor inflexibilidade, incorporar essa característica nos modelos, trabalha-los teoricamente
e, a partir daí, tirar as conclusões pertinentes em termos de política econômica. Ou seja, não se explica a inflexibilidade. Se
assume esse fato. Como veremos no próximo Capítulo, essa foi a estratégia adotada por Keynes em muitas de suas críticas
ao Modelo Clássico. Por exemplo, assumia inflexibilidade nos salários nominais e, a partir daí, identificava as
conseqüências e as margens de ação para os formuladores de política. Não se explicava porque os trabalhadores resistiam
a quedas nos salários nominais (mas não nos reais). A observação do cotidiano induzia a concluir sobre essa
inflexibilidade e era incorporada no arcabouço teórico.
A segunda alternativa consiste em supor que essa inflexibilidade advém de variáveis extra-econômicas, fora do
campo de estudo da economia e, portanto, esta disciplina só poderia levantar considerações marginais sobre o tema. Como
exemplo podemos citar a existência de sindicatos, ou políticas de salário mínimo, etc. Nesse sentido, o desemprego seria
originado em fatores institucionais e, se retirados esses “entraves” a economia teria capacidade de autoregular-se em torno
do pleno emprego.
Por ultimo,uma terceira alternativa consiste em não desqualificar o modelo devido aos fatos. Em outros termos: se
o modelo está bem fundamentado em termos teóricos, “fatos não desqualificam uma teoria”. Esta perspectiva “autista”, na
qual a teoria é incapaz de estabelecer diálogo com o objeto que pretensamente estuda, não é excepcional no mundo
clássico (ou neoclássico), especialmente na sua vertente mais acadêmica 8/. Nos anos 30, por exemplo, não obstante a
dramática distância entre a realidade e as prescrições dos modelos, os economistas continuavam sustentando que o
desemprego desse período estava originado na inflexibilidade do mercado de trabalho e, nessas circunstâncias, pouca
coisa restava por fazer. Parecia que era válida a frase: “Se a realidade não acompanhava o modelo, pior para a realidade”.
c) Dicotomia Setor Real/Setor Nominal.
O Modelo Clássico imagina uma economia de mercado como uma economia de troca, na qual a única e exclusiva
função da moeda é determinar a unidade de medida das trocas. As variáveis relevantes (reais) se determinam no setor real
(emprego, salários reais, nível de produto, etc.) restando como função
da moeda estabelecer a unidade de medida. Esta neutralidade, parece contraintuitiva. Como veremos no próximo Capítulo,
coisas tão óbvias como impactos reais de decisões na esfera monetária só poderão ser percebidas através de uma
revolução no paradigma.
V. A Guisa de Conclusão.
As questões que podem (e devem) ser colocadas podem ser: porque estudar o Modelo Clássico ? Qual é hoje sua
relevância ? Depois de Keynes, o Modelo Clássico não deveria fazer parte de tópicos a serem estudados em um curso de
História do Pensamento Econômico ?
Se essas questões fossem colocada nos anos 60, seriam pertinentes. Hoje, em realidade, a partir do começo dos
anos 80, esse arcabouço teórico voltou a centrar o debate em termos de política econômica. Não obstante a enorme
distância que parece existir entre sua concepção, hipótese e corolários de política e a percepção do cotidiano, como antes
dos anos 30, ele voltou a pautar as discussões.
Por exemplo, quando se discute, no caso do Brasil, mudanças na legislação trabalhista ou redução nos encargos
sociais para elevar os níveis de emprego se está tendo como referência, em última instância, o Modelo Clássico. Com efeito:
são variáveis do mercado de trabalho que estão restringindo as possibilidades da economia em gerar empregos. Quando se
postula, como já foi sustentado por um Ministro de Trabalho oriundo de uma universidade, que o problema dos
desempregados está na sua escassa formação (nas suas palavras, sua falta de “empregabilidade”), se está sendo, em última
instância, “clássico” 9/. Ou seja,o Modelo Clássico não pode ser, hoje, classificado como fazendo parte de uma etapa na
história do pensamento econômico. O retorno da hegemonia do pensamento mais ortodoxo a partir dos anos 80 fez

Page 77 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 79 -
retornar, ao centro do debate, as principais proposições desse arcabouço. Uma leitura rápida na mudança nos termos das
discussões em torno da geração de empregos confirma essa reviravolta. Se nos anos 60 e 70 o principal instrumento
identificado para gerar empregos era o crescimento econômico, a partir dos anos 80 o debate sobre as alternativas para
aumentar as oportunidades de trabalho passa pelo salário mínimo, o poder dos sindicatos, a flexibilidade dos mercados de
trabalho em geral, a formação profissional, etc.
Contudo, um outro ângulo para olhar o Modelo Clássico diz respeito a sua ênfase na oferta. No longo prazo, é
hoje um consenso que o produto potencial (ou seja, as possibilidades de oferta da economia) passa pela infra-estrutura, a
educação de sua força de trabalho, a tecnologia, etc. As possibilidades de aumentar o nível de vida da população passa,
necessariamente, por essas variáveis.
Como já mencionamos, porém, um modelo macroeconômico tem como vocação principal explicar o nível de
emprego e, em geral, a utilização dos fatores no curto prazo. Ou seja, dado o produto potencial, qual será o nível de renda ?
Se, como no Modelo Clássico, o nível de renda sempre coincide com o produto potencial, o mesmo deixa de ser uma
alternativa teórica para os interessados em explicar os movimentos em torno desse produto potencial. Mais ainda, quando
essas flutuações ou são ignoradas ou são atribuídas a fatores exógenos, alheios ao campo de análise de um economista.
Contraramente, a obra de Keynes, nos anos 30, terá como objeto quase exclusivo de análise a determinação do
nível de renda no curto prazo, com considerações marginais no longo prazo. Esse será o nosso objeto de estudo no
próximo Capítulo.

Capítulo VIII
O Modelo Keynesiano
As leituras que uma obra como a de J.M. Keynes possibilita são diversas e, até, contraditórias. Como todo autor
que produz uma ruptura na forma como são abordados ou olhados certos fenômenos, sejam eles naturais ou sociais, não
seria ousado afirmar que, depois da Teoria Geral, de 1936, a forma de perceber a realidade econômica mudou. Nos anos 30,
com a crise e a generalizada falta de emprego, a distância entre o modelo dominante na época e o cotidiano era tão abismal
que só uma substituição no paradigma, no sentido Kuhntiano, possibilitaria desenhar alternativas de política 1/.
Contudo, a extensão dessa ruptura foi interpretada de diversas formas. Aqueles que compartilhavam as principais
proposições do paradigma anterior (o Modelo Clássico, já analisado no Capítulo anterior) argumentavam que o caso
Keynesiano poderia facilmente ser incorporado pelo marco interpretativo anterior. Era só supor rigidez nos salários que o
paradigma anterior poderia gerar como resultado equilíbrios macroeconômicos com desemprego 2/. Uma leitura mais radical
da obra de Keynes poderia induzir uma conclusão oposta: suas proposições desqualificavam todo o arcabouço conceitual
anterior e só a herança teórica e cultural do próprio Keynes, que tinha se formado e ensinado no berço dessa escola,
restringiu a abrangência da revolução contida nos seus próprios escritos.
Nesse contexto, o objetivo do Capítulo será apresentar uma “caricatura” do que se pode denominar de Modelo
Keynesiano. Dado que estamos lidando em com assuntos que suscitam de ampla polêmica, antes de apresentar essa
caricatura do modelo listaremos os espaços de ruptura e mencionaremos aquelas proposições que estavam intrinsecamente
identificadas com o Modelo Clássico e
que Keynes conservou. Esses aspectos merecerão a nossa atenção na Seção I. A formalização dessa “caricatura” de
modelo será o nosso objeto de estudo na Seção II, onde também, voltaremos a assinalar os pontos de contato com o
modelo clássico e as inovações. Na Seção III apresentaremos as críticas, tanto as
provenientes da perspectiva ortodoxa, ou seja, as oriundas dos seguidores do paradigma que o próprio Keynes queria
combater, como as originadas no campo que cobrou de Keynes uma ruptura mais radical e que, posteriormente, daria
origem ao Modelo Pós-Keynesiano. Finalizamos o Capítulo com um balanço da perspectiva keynesiana do mercado de
trabalho, seu lugar no modelo macroeconômico, suas limitações e campos de novos desenvolvimentos intelectuais que
viabilizou.
I. Heranças e Rupturas.
Como assinalamos no parágrafo anterior, a obra de Keynes esteve permeada por rupturas e traços conservadores.
As rupturas sempre prevaleceram sobre as heranças respeitadas, fato que permite caracterizar seu pensamento como uma
revolução, um novo paradigma. Dado que é particularmente
importante para analisar o lugar do mercado de trabalho no modelo macroeconômico, listaremos e realizaremos uma
pequena análise de cada uma dessas heranças conservadas e das rupturas.
I.1. As Heranças Conservadas.
a) A Determinação do Preço dos Fatores.
Keynes conservou o que ele mesmo denominou de “primeiro postulado da economia clássica”: os salários reais
são iguais à produtividade marginal do trabalho 3/.
b) As Características da Função de Produção.
As produtividades marginais positivas mas decrescentes, hipótese comum a todos os modelos de inspiração
neoclássica (ou clássica, na terminologia de Keynes) é aceita. Dessa forma, crescimento no nível de emprego requer
quedas no salário real. Esse ponto é de relativa importância e, nesse sentido, convém reproduzir textualmente Keynes: “..se
o emprego aumenta, isso quer dizer que em períodos curtos a remuneração por unidade de trabalho, expressa em bens de
consumo dos assalariados, deve, em geral, diminuir e os lucros devem aumentar.....Portanto, à medida que se considerar
válida esta proposição, qualquer meio destinado a aumentar o emprego conduzirá, inevitavelmente, a uma

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 80 -
diminuição paralela do produto marginal e, portanto, do nível dos salários medido em termos desse produto” 4/.
I.2. As Rupturas.
a) No Mercado de Trabalho se determinam Salários Nominais e não Reais.
Keynes contesta a forma pela qual o Modelo Clássico aborda o Mercado de Trabalho. O salário real surge da
interação entre o salário nominal e o nível de preços. Um trabalhador ou um sindicato pode negociar o salário nominal.
Contudo, o poder de compra desse valor nominal depende do nível de preços.
Como o trabalhador ou o sindicato não têm capacidade de fixar o nível de preços, seu poder de negociação se limita ao
salário nominal.
b) Os Trabalhadores são insensíveis a mudanças nos Salário Reais.
Segundo Keynes, quedas nos salários reais não determinarão alterações na oferta de trabalho. Os assalariados
teriam ilusão monetária: resistiriam a quedas nos salários nominais mas seriam relativamente passivos diante de quedas nos
salários reais 5/.
Como já estudamos no Capítulo IV, supor ilusão monetária implica romper com todo o arcabouço teórico da
microeconomia corriqueira. São poucas as fundamentações microeconômicas que Keynes realiza de suas proposições. A
intuição e a observação do cotidiano parecem ser o bússola de Keynes em muitas de suas argumentações. No caso da
ilusão monetária, acaba dizendo: “Todavia, lógica ou ilógica, a experiência prova ser este, de fato, o comportamento do
trabalhador” 6/.
Durante anos, os seguidores de Keynes que desejavam unificar os dois paradigmas (denominados de
neo-keynesianos) viveram uma situação esquizofrênica. A resistência à queda dos salários nominais e a passividade diante
de reduções nos valores reais é incompatível com qualquer postulado da microeconomia usual. Nos anos 80, quando esses
neo-keynesianos, acompanhando o novo pensamento hegemônico, tiveram que dar fundamentação microeconômica aos
argumentos macroeconômicos, acabaram gerando modelos (salários de eficiência, contratos implícitos, etc.) que explicavam
o desemprego pela inflexibilidade dos salários reais e não nominais (ver Capítulo IV). Esses
modelos foram uma pequena revolução (ou uma revolução interna) dentro do pensamento neoclássico, dado que o excesso
de oferta (desemprego) não se traduzia em pressões para a queda dos preços (salários reais). Explicava-se a persistência do
desemprego por salários reais elevados sem apelar a fatores extra-econômicos (salário mínimo, sindicatos, etc.) Contudo, a
fundamentação microeconômica da resistência à queda nos salários nominais e não reais, como postulou Keynes, ainda
está por ser desenvolvida. Essa lacuna talvez se deva ao fato que, introduzir ilusão monetária na perspectiva
microeconômica, requereria
fundar uma nova microeconomia, um novo paradigma.
c) Rechaço ao Segundo Postulado.
Assim como Keynes aceitou o que ele denominou o primeiro postulado da economia clássica (salário real igual à
produtividade marginal do trabalho), ele não aceitou o que denominou o segundo postulado: igualdade do salário real à
desutilidade marginal do trabalho.
Lembremos (ver Capítulo I) que, no equilíbrio (oferta igual a demanda de trabalho), o salário real é igual à
produtividade marginal do trabalho que, por sua vez, é igual à taxa de substituição entre consumo e lazer (relação entre as
utilidades marginais do consumo e do lazer).
As rupturas que analisamos em a) e b) (no mercado de trabalho se determinam salários nominais e não reais e a
insensibilidade à queda nos salários reais) estão intrinsecamente associados à não aceitação do segundo postulado que,
por sua vez, está vinculado à existência de desemprego involuntário. Vejamos com um certo detalhe essas associações.
Se uma redução dos salários reais não se traduz em quedas na oferta de trabalho significa que o salário real não
era igual à desutilidade do trabalho. Por outra parte, se os trabalhadores não têm capacidade de fixar os preços, eles não
têm capacidade em determinar uma situação na qual exista equivalência entre o salário real e a desutilidade marginal do
trabalho.
Contrariamente, podemos imaginar, e freqüentemente estamos em, situações nas quais o salário real é superior à
desutilidade marginal do trabalho. Ou seja, ao salário vigente outras pessoas estão dispostas a trabalhar mas não
encontram emprego (desemprego involuntário). Essa situação pode ser visualizada a partir do Gráfico 1.
Imaginemos uma situação onde o salário real seja w 0. A demanda de trabalho (Ld) seria inferior à oferta (Ls) e
estaríamos diante de desemprego (Ls-Ld). Contudo, se o salário real caísse, a quantidade de pessoas que se ofereceriam no
mercado seria ainda superior à demanda. Cairia o salário real e o nível de emprego aumentaria. Em Ld, o salário real é
superior à desutilidade marginal do trabalho para diversos contingentes de assalariados.
A pergunta que cabe colocar-se é: porque o nível de salário real é esse ? Responderemos mais na frente a essa
questão. O ponto que devemos reter agora é: Keynes não aceita o segundo postulado, a desutilidade marginal do trabalho
não é necessariamente igual ao salário real e, portanto, existe desemprego involuntário (trabalhadores estariam dispostos a
trabalhar ainda que o salário real caia ou, sob outra perspectiva, a oferta de trabalho poderia elevar-se ainda na presença de
quedas no salário real).
d) Inflexibilidades no Salário Nominal não são Impecilhos paraCrescimento no Emprego.
Dado que os assalariados podem resistir a quedas no salário nominal mas não têm poder para fixar o salário real
(visto que não têm capacidade de fixar o preço dos bens), um crescimento do produto pode ser viável nesse contexto.
Considerando que elevações do produto requerem quedas dos salários reais (devido à hipótese sobre a igualdade dos
salários reais com a produtividade marginal do trabalho e a tendência decrescente desta), um aquecimento do nível de

Page 79 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 81 -
atividade gera aumentos no emprego e quedas nos salários reais se o crescimento do produto for acompanhado de
aumentos nos preços (provocando quedas no salário real).
Em outros termos: para Keynes, ainda aceitando o primeiro postulado (produtividade marginal igual ao salário
real) e produtividades marginais decrescentes, o desemprego não pode ser atribuído à inflexibilidade nos mercados de
trabalho. Estes sempre se ajustam, dado que os assalariados não têm poder de fixar preços 7/.
e) O Nível de Emprego depende do Nível de Atividade.
O produto, por meio dos requerimentos de trabalho para sua viabilização, determinará a demanda de trabalho. O
salário real se ajusta. Não é o nível de emprego que determina o produto, como no Modelo Clássico.
Aqui estamos diante de um ponto fundamental da Revolução Keynesiana. A ordem de causalidade é invertida: o
emprego depende do produto e não o produto do emprego. O Modelo Clássico é virado de cabeça para baixo.
f) Os Salários Reais dependem do Nível de Atividade.
Para um Clássico, se existe desemprego é devido a que o salário real está muito elevado. Caindo o salário real
aumentariam as ofertas de novos postos de trabalho.
Contrariamente, Keynes sustenta que os salários reais estão altos porque o nível de atividade (a demanda
agregada) está deprimida. Como a demanda de trabalho tem inclinação negativa (produtividades marginais decrescentes),
poucas possibilidades de emprego implicam em salários reais elevados.
Dessa forma, estamos diante, outra vez, de uma inversão na ordem de causalidade: é o nível de atividade reduzido
que gera salários reais elevados (Keynes) e não os salários reais elevados que redundam em níveis de emprego e produto
reduzidos (Clássicos).
g) Os Trabalhadores negociam Salários Relativos e não Salários Reais.
Este é outro exemplo de uma proposição keynesiana pouco compatível com os postulados microeconômicos
usuais 8/. Na análise tradicional, os agentes são maximizadores de uma função objetivo tendo como referência os preços
relativos, seus recursos e suas preferências. São, nesse sentido, “míopes”, não olham para o “lado”. Quando seu bem-estar
depende da situação de outro agente estamos
diante de externalidades que, para muitos economistas, são exemplos de situações nas quais as “falhas de mercado”
requerem algum tipo de regulamentação ou intervenção do estado.
No caso de Keynes, ele não fundamentou microeconomicamente essa proposição, constituindo um aspecto ainda
hoje em aberto. Contudo, sob um ponto de vista macroeconômico, sua relevância é marginal 9/. Na realidade, Keynes fez
essas considerações sobre os salários relativos na sua defesa da relevância dos salários nominais e não reais. Para
justificar essa fixação nos aspectos nominais dos rendimentos, ele argumentou que os assalariados negociavam em torno
dos salários nominais dado que, em última instância, estavam negociando sobre salários relativos. Como o nível de preços
é uniforme para todos os trabalhadores, fixar-se nos salários relativos implica concentrar-se nos salários nominais.
De qualquer forma, seja desde a perspectiva dos salários relativos seja assumindo ilusão monetária, o certo é que
Keynes não fundamentou microeconomicamente essas proposições. Essa fragilidade seria explorada nos anos 80 pelos
seus críticos, que aí identificavam a incapacidade das políticas keynesianas em assegurar o pleno emprego com baixa
inflação e uma suposta vulnerabilidade do marco conceitual de Keynes.
h) Nível de Emprego e Flexibilidade dos Salários Nominais.
Aqui estamos diante de um ponto extremamente polêmico. Suponhamos que, por causas ainda “desconhecidas”,
os salários nominais sejam inflexíveis (mas os reais flexíveis).
Uma corrente, mais identificada com o Modelo Clássico, sustenta que, se existe flexibilidade dos salários reais e
nominais, o Modelo Keynesiano se reduz ao Modelo Clássico. Para eles, o Modelo Keynesiano não seria nada além do
Modelo Clássico com alguma inflexibilidade à baixa.
Contrariamente, os keynesianos mais radicais sustentam que, ainda com a total flexibilidade de preços e salários
(reais e nominais), nas economias capitalistas maduras prevaleceriam as tendências à sub-utilização da mão-de-obra. A
hipótese de salários nominais rígidos à baixa não seria fundamental para a Revolução Keynesiana. Se os salários nominais
caíssem, pela presença do desemprego, por exemplo, o nível de preços cairia em uma proporção similar e a situação, de
desemprego, permaneceria inalterada.
Este aspecto (a relevância da rigidez dos salários nominais no marco conceitual keynesiano) é um ponto de fricção
muito antigo. A relevância deste tema é tal que Keynes dedicou um Capítulo (Capítulo 19) de sua Teoria Geral para tratar
o tema. Este debate por outra parte, é relevante dado que é um campo no qual os vasos comunicantes entre o setor real e o
setor monetário (uma dicotomia tão cara ao Modelo Clássico, como vimos no Capítulo anterior) tornam-se concretos.
Desde uma perspectiva clássica, quedas nos salários nominais teriam como corolário quedas nos preços e, dada a
oferta nominal de moeda, um crescimento no estoque real de moeda. Esse fato teria um impacto positivo sobre o nível de
atividade e, assim, o sistema tenderia ao equilíbrio de pleno emprego 10/. Dessa forma, a flexibilidade dos salários nominais
seria uma dos mecanismos capazes de regular automaticamente o sistema em torno da plena utilização da mão-de-obra.
Keynes, contrariamente, sustentava que quedas nos salários nominais ou eram neutras (dado que provocavam queda, da
mesma magnitude, nos preços ou até podiam gerar transferências de renda para as classes não assalariadas. Como a
propensão a poupar destas era superior, o resultado final poderia até ser um resultado perverso: um aprofundamento do
desemprego.
Por outra parte, o “Efetio-Pigou” (aumentos no nível de atividade devido a quedas nos salários nominais e nos
preços, com a conseqüente elevação na quantidade real de moeda) poderia não se realizar devido à “armadilha da liquidez”.

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 82 -
Sinteticamente, a “armadilha da liquidez” keynesiana consiste em um patamar mínimo para quedas nas taxas de juros 11/. A
existência da “armadilha da liquidez” imporia limites ao “Efeito Pigou” e, em geral, à política monetária 12/.
Resumindo. Os economistas de inspiração clássica tinham uma posição favorável ao impacto da flexibilidade dos
salário nominais sobre o nível de emprego. Contrariamente, na obra de Keynes prevaleceu o pessimismo.
i) A Relação de causalidade entre Poupança e Investimento.
Como já analisamos no Capítulo anterior, na perspectiva clássica a taxa de juros é a variável que permite a
compatibilização entre a poupança e o investimento. A interação entre a demanda de fundos para investir e a oferta acaba
gerando uma situação de equilíbrio no mercado de bens.
Por trás desse raciocínio, existe uma certa fundamentação microeconômica. No caso da poupança, a “espera” pelo
consumo futuro seria remunerada através da taxa de juros, que seria o preço cobrado por pospor o consumo 13/. No caso
do investimento, os juros seriam o custo de oportunidade (quanto deixa de ser ganho no mercado financeiro, por exemplo,
devido a execução do projeto) ao qual deveria ser descontado o fluxo de caixa. Quando esse fluxo apresenta um valor
presente positivo o investimento é viável. Na medida em que a taxa de juros se reduz e, projetos antes inviáveis, se tornam
factíveis de serem implementados. Nesse marco teórico, se um país quer elevar seu investimento deve elevar a poupança,
uma vez que esta disponibilizará os fundos requeridos pelos investimentos.
Aqui nos encontramos diante de outro aspecto no qual Keynes “inverte” a ordem de causalidade. O investimento
determina a poupança. A igualdade entre poupança e investimento seria, sempre verdadeira, ex-post. Ex-ante, o
investimento inicia um processo capaz de gerar, ex-post, a poupança necessária para financiá-lo. Esse resultado, como é
exposto nos usuais manuais de macroeconomia, se atinge através do impacto que esse investimento tem sobre o nível de
renda (produto). Uma elevação no investimento gera, via multiplicador, um aumento maior no nível de renda. Como esse
incremento de renda não é todo consumido (a propensão a consumir é menor que a unidade), no processo gera-se
poupança.
Dessa forma, a geração de poupança é um processo endógeno. Está vinculado à propensão a consumir menor que
a unidade e não guardaria, sempre segundo Keynes, relações com a maximização intertemporal do consumo.
Contudo, devemos chamar a atenção para um aspecto dessa dinâmica que induz a muitos erros, especialmente,
ainda que não unicamente, entre estudantes. Fixar, ex-ante, o nível de investimento e supor que, ex-post gere a poupança
necessária para financiá-lo significa trabalhar no âmbito de um modelo macroeconômico de curo prazo. Nele, como já
afirmamos, o produto potencial é fixo. O investimento é visto na perspectiva de gerar demanda agregada, não como uma
fonte de expansão desse produto potencial. Ou seja, um modelo macroeconômico não é um modelo de crescimento. Sob o
ângulo da macroeconomia (curto prazo), terá o mesmo impacto sobre a demanda agregada um gasto realizado na ampliação
de uma firma (que eleva o produto potencial) que um gasto em bens correntes.
Nesse sentido, a ampliação do investimento (nível de demanda agregada) sempre terá como restrição o produto
potencial. Seria um erro supor que se poderia estabelecer um nível de investimento arbitrário ex-ante que, sempre, ex-post,
se geraria a poupança necessária para financiá-lo. Nessa perspectiva, um país pobre seria pobre porque desejaria estar
nessa situação, dado que é só fixar o nível de investimento que o processo de ajuste macroeconômico resultaria na geração
da poupança que o financie. Sempre devemos ter presente que um modelo macroeconômico visa entender os mecanismos
que resultam em flutuações do nível de atividade em torno do pleno emprego (produto potencial) e, logicamente, identificar
as políticas que reduzam essas flutuações e situem os indicadores sempre próximos da plena utilização dos recursos. A
vocação de um modelo macroeconômico não é explicar o crescimento de longo prazo.
Esse contexto se vê potencializado, no caso de Keynes, pelo ambiente histórico no qual foi gerada sua revolução
teórica. O drama das economias capitalistas nos anos 30 não era como elevar a renda através do crescimento da capacidade
instalada. Ao contrário, o desafio era como utilizar plenamente a capacidade instalada. Mais ainda, Keynes supunha que,
na medida em que se eleva o produto potencial, maiores seriam as dificuldades em encontrar situações de equilíbrio macro
próximas do pleno emprego. Como a propensão a poupar crescia na medida em que a renda se elevava, o multiplicador
cairia e a demanda autônoma (investimento, gasto público, exportações, etc.) necessária para atingir o pleno emprego seria
cada vez maior. Nesse sentido, Keynes compartilhava as perspectivas pessimistas que, para o longo prazo, eram comuns a
grandes economistas (Ricardo, Malthus, Marx, Schumpeter, etc.).
j) A Ruptura da Dicotomia Setor Real/Setor Monetário.
Para Keynes, a dicotomia Setor Real/Setor Monetário, tão cara aos clássicos, era falsa. A moeda não seria neutra
devido a diversos vasos comunicantes entre a esfera real e a monetária. Nas economias capitalistas, a moeda não teria
como única função servir de unidade de conta para contabilizar as magnitudes quantitativas que foram geradas no setor
real da economia.
A taxa de juros, por exemplo, não seria uma variável que, como sustentavam os clássicos, se determinava no setor
real da economia. Ela era sensível à oferta e demanda de dinheiro e era um fator que podia ser fundamental na determinação
do nível de renda devido a sua influência sobre o investimento.
Tratar essas inter-relações foge a nossos objetivos neste livro. Convém reter, contudo, que o nível de emprego
está vinculado, para a perspectiva keynesiana, à dimensão monetária na medida em que esta influencia o nível de produto e
este é o fator crucial para determinar o nível de emprego.
II. O Modelo
O nosso objetivo nesta Seção será apresentar uma “caricatura” do modelo keynesiano. Essa “caricatura” está
definida a partir de certas características que, à margem dos quase infinitos matizes, definem um modelo
macroeconômicocomo keynesiano. Esses pontos em comum seriam: a) a demanda agregada determina a oferta; b) o nível

Page 81 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 83 -
de emprego é determinado pelo nível de produto, que, por sua vez, como acabamos de mencionar, é fixado pela demanda;
c) o mercado de trabalho se ajusta e d) a igualdade entre poupança e investimento se realiza ex-post. .
II.1. As Equações.
a) Mercado de Trabalho.
Vamos começar a nossa caricatura de modelo através do mercado de trabalho. Contudo, não se deve interpretar
esta forma de expor o Modelo Keynesiano como uma manifestação de hierarquia do mercado de trabalho. Como já
afirmamos, um dos rasgos que permitem definir um modelo macroeconômico como keynesiano é, justamente, o caráter
subordinado das variáveis que se determinam no mercado de trabalho.
Esclarecido esse ponto, passemos à formalização. Temos que o salário real é igual à produtividade marginal do
trabalho (o primeiro postulado aceito explicitamente por Keynes):
(wr) = QL (1)
onde: Q L = a produtividade marginal do trabalho; w r = salário real.
Podemos considerar fixa a oferta de trabalho:
Ls = L0 (2)
b) Função de Produção.
Como já afirmamos, Keynes conservou as características da função de produção dos clássicos:
Q = Q(L) ; Q L>0 e Q LL <0 (3)
(produtividades marginais positivas mas decrescentes).
c) Poupança-Investimento.
Vamos supor que a poupança dependa do nível de renda e o investimento é exógeno:
S (Q) = I (4)
Onde: S = poupança; I = investimento; i = taxa de juros. As relações entre as variáveis são:
SQ > 0 e I, como já afirmamos, é exógeno.
d) Mercado Monetário.
A demanda de dinheiro tem que ser igual à oferta real:
Md (Q;i) = Ms/P (5)
Onde: Md = demanda de moeda; e Ms = oferta de moeda; P = nível de preços.
A demanda de moeda guarda uma relação positiva com o nível de renda ( Md / Q >0) e uma relação negativa com a
taxa de juros ( Md / i <0). A oferta nominal de moeda é exógena.
e) Dimensão Nominal.
O valor nominal do produto pode ser definido como:
Y=P·Q (6)
Por sua vez, os salários nominais são:
W = wr · P (7)
II.2. A Resolução.
O sistema tem sete equações e sete variáveis endógenas (P; Q; Y; W; wr; L e i) e duas variáveis exógenas (Ms e
I).
Observemos que a partir de (4), igualdade ex-post entre poupança e investimento, se determina Q. Contudo, a
interação entre oferta e demanda de trabalho se determina wr e L que, mediante a função de produção (equação (3))
determina Q. Contudo, nada garante que o Q determinado em (4) seja igual ao que é obtido no equilíbrio no mercado de
trabalho. Assim, podemos atingir um equilíbrio no mercado de bens que não necessariamente é igual ao que corresponde
ao equilíbrio no mercado de trabalho. A demanda de trabalho pode estar restringida pelo equilíbrio atingido no mercado de
bens.
Nesse contexto, a elevação na demanda de trabalho só poderá realizar-se através de um incremento no nível de
investimento que, no modelo proposto, é exógeno.
Contudo, esse crescimento do nível de emprego, conseqüência do aumento do produto, deve gerar quedas nos
salários reais (devido às hipóteses de produtividades marginais decrescentes). Na suposição de salários nominais rígidos à
baixa (como Keynes supunha), a alternativa para reduzir o poder de compra dos salário é através do crescimento do nível
de preços. Ou seja, toda política de aquecimento do nível de atividade, na presença de salários nominais rígidos à baixa,
será acompanhada de um incremento do nível de preços para tornar compatível salário real e produtividade marginal do
trabalho. Esse processo de ajuste, no qual o mercado de trabalho ocupa uma posição subordinada (se ajusta) pode ser
visualizado na Figura 1.
II.3. Comparação Clássicos/Keynesianos.
A fim de que o leitor possa visualizar melhor as diferenças entre o Modelo Clássico e o Modelo Keynesiano talvez
seja interessante analisar como a mudança de variáveis impactam em um e outro modelo. Vamos nos deter em algumas
delas.
a) Incremento do Investimento Autônomo.
- Modelo Clássico: o equilíbrio não muda, uma vez que está trabalhando no pleno emprego;
- Modelo Keynesiano: crescimento do produto, do emprego e, na presença de salários nominais rígidos, aumento
dos preços e queda dos salários reais;
b) Crescimento da Propensão a Poupar

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 84 -
- Modelo Clássico: quedas nas taxas de juros sem impacto sobre o nível de atividade;
- Modelo Keynesiano: queda do produto, devido à queda no valor do multiplicador, com a conseqüente queda no
emprego e crescimento dos salários reais14/;
c) Crescimento da Oferta de Trabalho 15/.
- Modelo Clássico: aumento do produto, queda dos salários reais, quedas nas taxas de juros (para equilibrar o
mercado de bens), queda no nível de preços (supondo constante a oferta de dinheiro);
- Modelo Keynesiano: se a economia estava em uma situação de desemprego keynesiano (falta de oferta de
postos de trabalho por limitação na demanda agregada), um crescimento da oferta de trabalho não teria impacto
sobre o equilíbrio de sub-emprego;
d) Choque Tecnológico Positivo.
- Modelo Clássico: crescimento do salário real, do produto, queda nos juros e no nível de preços;
- Modelo Keynesiano: se a economia estiver em uma situação de desemprego keynesiano, queda do emprego,
elevação do salário real dos que permanecem ocupados;
e) Aumento da Quantidade Nominal de dinheiro.
- Modelo Clássico: crescimento do nível de preços;
- Modelo Keynesiano: depende de como esteja especificado o modelo.
Em geral, em um modelo keynesiano, uma elevação da oferta de moeda eleva o nível de atividade, dado que
provoca queda nas taxas de juros (se não estamos na “armadilha da liquidez”) e elevação do investimento (se este
é sensível à quedas na taxa de juros) que, por sua vez, possibilitará, via multiplicador, um crescimento do produto,
do emprego e quedas nos salários reais (via elevação nos preços na hipótese de salários nominais inflexíveis à
baixa).
Os exemplos poderiam se estender. Contudo, os que apresentamos servem para ilustrar as radicais diferenças
entre o modelo clássico e o keynesiano.
III. Uma Perspectiva Crítica.
O pensamento keynesiano sempre disputou espaço tanto com a “direita” como com as correntes mais
heterodoxas. Vamos nos concentrar com certo detalhe em ambas.
III.1. A Crítica Ortodoxa.
Como já analisamos no Capítulo IV (A Renovação do Pensamento Neoclássico: os modelos modernos), o
pensamento keynesiano foi hegemônico, tanto no mundo acadêmico como entre os gestores de política, desde seu
surgimento, meados dos anos 30, até a década de 70. As políticas econômicas inspiradas no pensamento keynesiano
(especialmente no bem sucedido esquema IS-LM) pautavam a administração do ciclo conjuntural através do mundo. Uma
situação de pleno emprego nas principais economias mundiais, paralelamente a uma inflação sob controle, testemunhava a
validade desse marco
teórico de referência 16/.
As críticas, sempre existentes, estavam restritas a certos acadêmicos. Confinados nas universidades e com pouca
influência sobre o desenho de política, o principal argumento da ortodoxia referia-se à falta de fundamentação
microeconômica dos principais supostos que singularizavam o pensamento keynesiano (salários nominais rígidos,
importância dos salários relativos nas negociações capital/trabalho, armadilha da liquidez, etc.). O keynesianismo
hegemônico na época não pareceria outorgar muita importância a essa esquizofrenia. Aceitava a análise microeconômica
corriqueira mas, quando o assunto era macroeconomia, utilizavam os pressupostos de Keynes, ainda que
estes fossem incompatíveis com a primeira. A coerência exigida pelos ortodoxos era pertinente. Contudo, como a gestão da
política econômica construída a partir da macroeconomia keynesiana dava resultados, a coerência era uma “questão
acadêmica”.
O quadro mudou nos anos 70 17/. As políticas ativas (política monetária e fiscal) destinadas a aquecer o nível de
atividade durante a fase declinante do ciclo geravam maiores efeitos sobre o nível de preços (taxas de inflação) que sobre
as variáveis reais. A perda de eficácia das políticas keynesianas abriu espaço para o que se convencionou chamar de
“Contra-revolução Conservadora” 18/. Além de propor outras políticas (ou nenhuma política, dado que se alimentava a
esperança quase mítica na auto-regulação dos mercados), a ortodoxia retornava ao pensamento clássico e, em termos
teóricos, uma de suas fundamentações a essa desqualificação do pensamento keynesiano girava em torno à falta de
fundamentação microeconômica. Sinteticamente: a “Revolução Keynesiana” não tinha fundamento. Não passaria de uma
série de suposições sem base no raciocínio econômico e, nessas circunstâncias, não poderia redundar em receitas de
política corretas. O fracasso das políticas (de inspiração keynesiana) era esperado, quase natural. Logicamente, a questão,
lamentavelmente pouco levantada pelos keynesianos é: como é possível que um marco teórico desprovisto de
fundamentação (ou, na pior das hipótese, com fundamentos errados) tenha balizado um gerenciamento macroeconômico
cujo resultado foi um dos períodos (1940-1970) mais florescentes do capitalismo, com emprego, salários reais e
produtividade em crescimento (aliás, com percentuais de crescimento nunca antes atingidos na história do capitalismo)
paralelamente a uma distribuição da renda que tendia a reduzir a segmentação social ? Em realidade, o que tinha mudado
era o contexto histórico que tinha viabilizado a implementação das políticas keynesianas 19/.
A agenda dessa “Contra-revolução Conservadora” não foi reconstruir o pensamento macroeconômico senão,
simplesmente, restaurar a vigência do modelo clássico que, 40 anos atrás, parecia destinado, por Keynes, a integrar os
programas das disciplinas de História do Pensamento Econômico. Além dessa restauração, as idéias na época registraram

Page 83 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 85 -
certas pretensões mais ousadas, como a escola das Expectativas Racionais, que acentuavam, até limites quase caricaturais,
certos aspectos do Modelo Clássico. Entretanto, a mensagem comum era: o funcionamento de uma economia capitalista
tendia, naturalmente, ao pleno emprego dos recursos, sempre que uma “correta” (entenda-se conservadora e responsável)
política monetária permitisse essa performance. Sob outra perspectiva: só “erros” na política monetária seriam os
responsáveis pelo desvio das economias do pleno emprego, as economias de mercado teriam uma estabilidade intrínseca.
Diante da crescente incapacidade das ferramentas fiscais e monetárias em ter impactos nas variáveis reais (ou seja,
o esgotamento das receitas de política keynesianas), os seguidores de Keynes que tranqüilamente conviveram 30 anos
com a “esquizofrenia” micro-macro concentraram seus esforços em procurar fundamentar, microeconomicamente, o
pensamento keynesiano 20/. O contexto mudou. O keynesianismo já não era hegemônico, nem em termos de idéias nem
para balizar políticas de curto prazo. O novo conservadorismo impunha os termos do debate e, nesse sentido, ou se
fundamentava microeconomicamente ou uma proposição não passava de uma possibilidade que, talvez, merecesse ser
explorada. Os resultados desses esforços foram mistos. Por exemplo, procurando fundamentação microeconômica para a
rigidez no mercado de trabalho, os keynesianos construíram relevantes e elegantes modelos. Porém, esses modelos
explicavam a rigidez dos salários reais e não dos salários nominais. Keynes sempre sustentou que os problemas de
desemprego nas economias modernas não estavam vinculados a inflexibilidades nos salários reais, aliás, não estavam
associados a inflexibilidades no mercado de trabalho em geral. Essa era, justamente, sua crítica ao modelo clássico. Os
keynesianos modernos, procurando uma coisa encontraram outra. Tentando justificar a rigidez dos salários nominais
encontraram explicações econômicas, e não institucionais (como legislação, sindicatos, etc.), para a rigidez dos salários
reais. Concluíram então, como os seus “adversários” teóricos, que, realmente, o desemprego pode ser explicado por
salários reais muito elevados e insensíveis ao desemprego. Se diferenciavam dos mais conservadores (não tinha porque
identificar-se no salário mínimo, nos sindicatos, etc., as origens do desemprego) mas as proposições de Keynes foram
ficando cada vez mais descaracterizadas 21/.
Todavia, certos aspectos do retorno do pensamento conservador seguramente serão considerados, por diferentes
escolas, como sendo um catalisador de certas discussões que o domínio quase absoluto por mais de 30 anos da
macroeconomia keynesiana coibiu.
Estamos nos referindo, especificamente, ao problema de crescimento de médio e longo prazo. Todo o esforço
teórico de Keynes esteve centrado, dado o contexto histórico no qual viveu (crises dos anos 30), na identificação das
causas que não permitem que uma economia de mercado se situe no pleno emprego. Esse seria, justamente, o maior desafio
das economias de mercado maduras: a plena utilização de seus recursos. Suas preocupações não eram como ampliar o
produto potencial senão como utilizá-lo na sua plenitude. Para ele, existiam forças que tendiam a uma sub-utilização
estrutural e só uma correta política econômica possibilitaria sair dessa armadilha. Mais ainda: com o passar do tempo, esse
produto potencial se expandiria e as tendências à sub-utilização dos recursos seriam reforçadas. O problema era de
administração de curto prazo e não de longo prazo 22/.
Para as economias sub-desenvolvidas, a questão do crescimento (elevação do nível de renda) é relevante. Muitas
delas ainda enfrentam situações de penúrias elementares (comida, saneamento básico, educação elementar, etc.) e a
questão do desenvolvimento integra sua agenda. Nesse contexto, as questões levantadas por Keynes podem levar a uma
certa confusão. Elevar o produto potencial requer políticas específicas (de infra-estrutura, tecnologia, educação, etc.), que
não se devem confundir com aquelas de demanda agregada. Se para aquecer o nível de atividade, no curto prazo, é
indiferente entre gastar um real na construção de uma estradada ou gastar um real para abrir um buraco para depois
tampá-lo, sob uma perspectiva de longo prazo construir uma estrada eleva o produto potencial e abrir um buraco e depois
tampá-lo pode assemelhar-se a um gasto em consumo e não a um investimento. Ou seja, se o objetivo do governo, além de
utilizar plenamente os recursos disponíveis, está vinculado à ampliação desses recursos, a qualidade do investimento
importa. Nesse sentido, o Modelo Clássico é relevante. Lembremos que, nessa abordagem, como se está trabalhando
sempre no pleno emprego, elevar o nível de renda implica em deslocar a função de produção. Esse deslocamento se atinge
seja através de crescimento de produtividade seja por crescimento no estoque de capital ou de recursos naturais.
Nesse contexto, as política fiscal e monetária devem ser bem qualificadas. Ou seja, se no curto prazo emitir moeda
pode ser considerada uma alternativa de política para aquecer a economia, no longo prazo, é difícil imaginar que um país
possa aumentar seu grau de desenvolvimento através da emissão de moeda. Políticas específicas voltadas para o
desenvolvimento, como educação, pesquisa científica, infra-estrutura física, etc. são insubstituíveis.
Esta perspectiva pode ser ilustrada com uma frase muito comum: no curto prazo somos keynesianos mas no longo
prazo somos clássicos. Ou seja, no curto prazo o nível de atividade está determinado pela demanda porém, no longo prazo,
o nível de atividade vai estar determinado pela oferta.
III.2. A Crítica Radical.
Paralelamente a esse crítica vinda do pensamento mais identificado com o Modelo Clássico, Keynes recebeu
críticas devido a que sua ruptura não foi total, conservando hipóteses desse modelo que são muito caras para o
pensamento ortodoxo.
Mais especificamente, estamos nos referindo aos aspectos vinculados à função de produção e remuneração dos
fatores.
Como vimos no Capítulo III, a função de produção neoclássica foi um dos aspectos do paradigma neoclássico (ou
clássico, na perspectiva keynesiana) que foi objetivo de maior crítica por parte dos heterodoxos, tendo em vista que a
mesma é frágil em termos de sua lógica interna. Como toda a teoria distributiva dessa escola é construída a partir dessa
função (e de seus corolários, como as produtividades marginais positivas mas decrescentes), a totalidade do arcabouço

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 86 -
teórico sofre um sério questionamento se um ponto tão central como a função de produção é questionado.
Keynes, conservou todos os aspectos vinculados a essa função: produtividades marginais positivas mas
decrescentes e salários reais iguais à produtividade marginal do trabalho. Assim, sua ruptura com o paradigma clássico foi
parcial. Sua “Revolução” não foi total. Não é nosso objetivo neste texto identificar as causas (intelectuais, pessoais,
políticas, etc.) que não permitiram essa ruptura total. Lembremos, contudo, que Keynes recebeu sua formação em
Cambridge (Inglaterra), berço do pensamento neoclássico moderno (Marshall, Pigou, etc.). No começo do Século XX,
paradigmas alternativos “disponíveis” só na esquerda marxista, corrente à qual Keynes, por sua origem e formação, não
poderia aderir 23/.
Dessa forma, a parcialidade da ruptura de Keynes é visível e, em não poucas oportunidades, contraditória.
Tomemos um exemplo. Keynes sempre foi um homem prático. As observações do cotidiano se sobrepunham sobre as
considerações de ordem teórica. Por exemplo, no caso da rigidez dos salários nominais ou a relevância dos salários
relativos, ele não encontrava fundamentação, poderia até parecer ilógico, mas era a “realidade”. Contudo, ele sustentou
que, devido às produtividades marginais decrescentes e a igualdade entre salário real e produtividade marginal do trabalho
, quando a economia crescia os salários reais deveriam cair. Contudo, a “realidade” é incompatível com esse suposto:
quando o nível de atividade se eleva, emprego e salários reais sobem. Nesse sentido, a experiência de todos os países em
todos os momentos históricos é similar. Isso desqualifica a teoria (não encontra validação empírica). Um neoclássico, com
certo ranço acadêmico, poderia argumentar que “dados não desqualificam teorias fundamentadas”. Keynes, certamente,
não utilizaria esse argumento. Em múltiplas ocasiões Keynes inverteu a lógica: “dados são argumentos”.
A ruptura total do paradigma keynesiano com seus antecessores será realizada pelos seus seguidores em
Cambridge. Joan Robinson, Kaldor, Eatwell, etc. que desqualificam a função de produção e a teoria da distribuição a ela
associada 24/. Tentam realizar uma aproximação com o marxismo e, sem aderir à teoria do valor-trabalho, tornam a
distribuição de renda endógena ao modelo. Essa perspectiva receberá contribuições, ao longo do tempo, de autores muito
próximos de correntes bem mais à esquerda, como Amit Bhaduri, Lance Taylor, etc. Estes foram, em geral, conhecidos
como pós-keynesianos, para se
diferenciarem dos seguidores de Keynes que sempre trataram de estabelecer diálogos com o modelo clássico
(denominados de neo-keynesianos) 25/.
IV. A Guisa de Balanço.
A essência da Revolução Keynesiana consistiu em “subordinar” as variáveis vinculadas ao mercado de trabalho
(emprego e salário real) ao desempenho macroeconômico. “Vira” de cabeça para abaixo o Modelo Clássico. Por um lado,
coloca como centro das preocupações das modernas economias de mercado o problema do desemprego mas,
paradoxalmente, não situa no mercado de trabalho as restrições para atingir a plena ocupação da mão-de-obra.
Nesse sentido, o nível de emprego depende do nível de atividade e não o contrário. Os trabalhadores não podem
ser acusados de gerar desemprego por estabelecer salários reais elevados simplesmente porque são incapazes de fixar um
salário real. Eles negociam o que se determina no mercado de trabalho, o que tem capacidade de influenciar, ou seja, o
salário nominal, não o real.
A tendência ao desemprego seria uma idiossincrasia das economias de mercado, independentemente da legislação
trabalhista, do poder dos sindicatos, etc. Se o nível de emprego origina-se no desempenho macroeconômico, só através de
ferramentas macroeconômicas pode-se reverter a tendência à desocupação.
Não obstante o transcorrer do tempo, com suas naturais mudanças no contexto, e a forte contra-revolução dos
anos 80, hoje o pensamento keynesiano marca o pensamento político popular. Pode-se ser mais ou menos conservador, ser
mais ou menos clássico, mas dificilmente alguém vai questionar a frase: para gerar empregos devemos crescer. Essa
proposição, hoje mais ou menos óbvia, deve-se ao pensamento Keynesiano. Pode ser complementada com outras, como
para gerar mais empregos devemos flexibilizar o mercado de trabalho, que complementam mas não substituem os laços
entre nível de emprego e nível de atividade.
A ruptura de Keynes não foi total. Foi um novo paradigma que “conservou pontes” com o antigo. Pontes, diga-se
de passagem, desnecessárias, que mais atrapalharam que contribuíram para consolidar a revolução keynesiana. Essas
pontes foram, sobretudo, no mercado de trabalho, justamente o principal campo de ruptura. A função de produção e a
igualdade entre salários reais e produtividade foi uma herança, na obra de Keynes, que só seus pupilos imediatos em
Cambridge seriam capazes de reverter. Longe das amarras intelectuais e pessoais desse autor, a tentativa de construir um
novo paradigma, concorrente tanto do ortodoxo e como do marxista, irá monopolizar suas energias. Esse modelo receberá a
nossa atenção no Capítulo X. Contudo, antes de abordá-lo, vamos nos concentrar em apresentar uma tentativa de síntese
entre o Modelo Clássico e o Keynesiano que foi desenvolvida nos anos 70. Esse será o nosso tema no próximo Capítulo.

Capítulo IX
A Tentativa de Síntese
A partir da leitura dos dois Capítulos anteriores fica configurado um aparente conflito entre paradigmas. De um
lado teríamos o Modelo Clássico, atribuindo a toda e qualquer situação de desemprego a mesma origem: salários reais
elevados, superiores ao de equilíbrio, e inflexíveis à baixa quando o desemprego perdura no tempo. Contrariamente, o
Modelo Keynesiano atribui qualquer situação de desemprego a uma insuficiência no nível de atividade e, nessa linha de
raciocínio, o mercado de trabalho nunca será a origem dos desequilíbrios nele observados.
Como Keynes nunca rompeu totalmente “as pontes” com o paradigma anterior (conservou hipóteses
fundamentais, como as características da função de produção e a igualdade entre os salários reais e a produtividade

Page 85 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 87 -
marginal do trabalho), nos anos 70 foram realizadas tentativas de “compatibilizar” ambos paradigmas. Esses esforços
resultaram em modelos que, na época, representaram algum interesse teórico mas com o tempo foram perdendo relevância.
Podemos identificar como sendo duas as causas desse declínio.
Em primeiro lugar, essa tentativa de síntese não se cristalizou em um novo paradigma. Em lugar de visualizar uma
dicotomia conflitiva (ou clássico ou keynesiano), a síntese procurava datar no tempo e no espaço o problema do
desemprego. Como esses esforços não viam conflitos indissolúveis nas bases teóricas, procuraram fundamentar uma
perspectiva na qual em certas circunstâncias o desemprego poderia ser clássico (salários reais elevados) e em outras
keynesiano (insuficiência de demanda agregada). Na medida em que não se cristalizou em um novo paradigma (sua
vocação nunca foi desenvolver “um outro olhar” sobre os fenômenos econômicos), essas tentativas não foram bem vistas
nem pelos clássicos nem pelos keynesianos.
Esse fato foi potencializado pela ascensão de um pensamento mais conservador a partir da década de 80. O
paradigma dominante a partir desses anos, nos seus esforços por voltar a colocar no centro do debate o Modelo Clássico
que tinha sido marginalizado por 30 anos de hegemonia keynesiana, não admitia nenhum tipo de questionamento a suas
premissas e a resistência à perspectiva keynesiana era total. O debate atingiu tal nível de dogmatismo que não foi admitido
nenhum “meio termo”. Ou se era clássico (sinônimo de responsabilidade na administração da política monetária e fiscal,
fundamentação microeconômica nas suas proposições, etc.) ou se era keynesiano (que, para o pensamento dominante, era
sinônimo da proposição ad-hoc, ativismo e irresponsabilidade fiscal e monetária, etc.).
Assim, o contexto histórico não foi propício para essas tentativas de síntese. A pergunta é mais ou menos óbvia:
para que estudar ou dedicar um Capítulo para uma perspectiva que não prosperou? Esses esforços deveriam merecer um
Capítulo em um livro de história do pensamento econômico mas que em um livro sobre os debates atuais no mundo do
trabalho? Consideramos que não e as justificativas para dedicar um Capítulo para expor essa tentativa de síntese são de
duas ordens.
A primeira de ordem didática. Esperamos que, após a leitura e estudo do presente Capítulo, o leitor domine e tenha
internalizado muito mais o Modelo Clássico e o Modelo Keynesiano. Ou seja, o presente Capítulo pode ser visto, também,
como um complemento dos dois anteriores e seu objetivo seria consolidar, no leitor, a perspectiva clássica e keynesiana.
A segunda justificativa para incluir este Capítulo está vinculada ao debate sobre o desemprego, especialmente no
Brasil. Ainda que, nos espaços acadêmicos, a tentativa de síntese entre a perspectiva clássica e keynesiana tenha perdido
espaço, sendo substituída pela hegemonia do pensamento pré-keynesiano, no cotidiano, a convivência entre essas duas
correntes é corriqueira, ainda que os debatedores não tenham consciência dessa dupla perspectiva. Por exemplo, é comum
escutar que o Brasil precisa crescer para gerar empregos (perspectiva keynesiana) e, paralelamente, defender reformas na
institucionalidade do mercado de trabalho (reformas da CLT, por exemplo) porque essa seria uma das causas do
desemprego. Ou seja, um indivíduo que propugna ambas receitas de política é keynesiano e clássico, ainda que ele se
identifique com um desses dois modelos.
Dado esse contexto, o nosso objetivo no presente Capítulo é apresentar, de forma
muito resumida, um modelo que represente esses esforços de síntese entre as perspectivas clássica e keynesiana. Na
próxima Seção enumeraremos as hipóteses que sustentam o novo modelo.
Na Seção II desenvolveremos o modelo, os equilíbrios possíveis e as receitas de políticas que deles se deduzem. Na Seção
III o nosso objeto de análise são os flancos mais frágeis, em termos teóricos, da tentativa de síntese. Por último, na Seção
IV, finalizaremos o Capítulo com um balanço dos argumentos
apresentados.
I. As Hipóteses.
As tentativas de síntese, obviamente, mantiveram “as pontes” que o próprio Keynes não rompeu e, em
complemento, agregaram restrições tipicamente keynesinas ao Modelo Clássico. Essa é, em realidade, uma forma de resumir
esses esforços: como agregar as restrições keynesianas no Modelo Clássico. Vamos deter-nos nas hipótese a seguir.
a) A Função de Produção.
A relação entre as quantidades produzidas e os fatores de produção utilizados continua sendo a usual, aceita por
clássicos e keynesianos: produtividades marginais positivas mas decrescentes.
b)Igualdade entre Salário Real e Produtividade Marginal do Trabalho.
Em um ambiente de concorrência perfeita, as firmas igualam o salário real à produtividade marginal do trabalho,
hipótese comum aos Modelos Clássico e Keynesiano. Dada a hipótese de produtividades marginais decrescentes,
elevações no nível de emprego devem ser acompanhadas de quedas no salário real, a fim de conservar a mencionada
igualdade.
c) Abandono da Lei de Say.
O leitor deve lembrar que, segundo a Lei de Say, tão cara ao Modelo Clássico, toda oferta cria sua própria
demanda. Ou seja, segundo essa perspectiva, estariam em um mundo sem restrições de demanda. As tentativas de síntese
incorporam essa possibilidade. Assim, um mercado pode estar trabalhando “limitado” por alguma restrição. Vamos dar dois
exemplos.
A oferta de bens pode ter duas restrições. A oferta de trabalho (ou seja, a quantidade de produtos oferecidos está
limitada pela disponibilidade de mão-de-obra) ou o salário real (dado um salário real, as firma não elevam a produção dado
que a produtividade marginal é decrescente e elas deveriam pagar um salário real menor, se este é fixo, introduz um limite na
quantidade oferecida).
O segundo exemplo pode estar vinculado à demanda de trabalho. Esta pode estar limitada pelo salário real (a firma

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 88 -
não produz mais porque o salário real é rígido à baixa) ou pela demanda (ainda que possa reduzir o salário, o crescimento da
produção oriundo das novas contratações que viabiliza o pagamento de um salário real menor não encontram mercado).
II. O Modelo.
Nesta Seção vamos desenvolver um pequeno modelo formal que sintetize as idéias já expostas.
a) Demanda Agregada
A demanda agregada (Q d) pode ser considerada exógena, dependente, por exemplo, o investimento ou os gastos
públicos, ambos um dado para o modelo:
Qd= exógena (1)
b) A Oferta Agregada
Como já afirmamos, a oferta pode estar limitada seja pela disponibilidade de
trabalho (Ls, uma variável que, a fim de simplificar a álgebra, podemos, sem perda de generalidade, considerar exógena no
modelo) ou pela demanda de trabalho, que depende do salário real. Assim, temos que a oferta agregada (Qs) pode ser
representada pela seguinte expressão:
Qs = Min [Ld(w/p) ; Qd ] (2)
Onde: Ld = demanda de trabalho que depende, negativamente, do salário real.
c) Equilíbrio no Mercado de Bens.
Q* = Min [Qs ; Qd ] (3)
Ou seja, a quantidade que for oferecida será o mínimo entre a restrição da oferta ou a restrição da demanda.
d) Oferta de Trabalho.
Como já afirmamos, para simplificar sem perder generalidade, podemos considerar exógena:
Ls = exógena. (4)
e) Demanda de Trabalho.
Vai depender do salário real e do equilíbrio no mercado de bens. Ou seja, pode ser que o equilíbrio seja uma
restrição oriunda do mercado de trabalho (o salário real poderia baixar e, assim, viabilizar o crescimento do emprego mas,
para que a firma vai contratar mais se não tem mercado para esse crescimento da produção?) ou do próprio mercado de
trabalho (a firma tem mercado para colocar um potencial aumento da produção mas, como não pode baixar o salário real,
essa inflexibilidade impossibilita a elevação na oferta).
Formalmente, temos que:
Ld = Min [G(w/p); F(Q*) ] (5)
onde: F (Q*) = a quantidade de trabalhadores que essa economia requer para satisfazer o equilíbrio no mercado de
bens (Q*), que surge da função de produção (seria a função inversa); G(w/p) = seria a demanda de trabalho a cada nível de
salário real (que não é outra coisa que a função de produtividade marginal).
f) Equilíbrio no Mercado de Trabalho.
Seguindo a mesma lógica exposta nos equilíbrios anteriores, no caso do Mercado de Trabalho teríamos que:
L* = Min [Ls; Ld ] (6)
Por exemplo, se o salário real ou a demanda agregada determinam que podem empregar-se 100 assalariados mas
esse país só tem 90 pessoas na PEA, o nível de emprego será de 90. Contrariamente, não obstante ter 100 indivíduos
potencialmente dispostos a trabalhar, se a demanda agregada só requer o produto que pode obter-se a partir do emprego
de 80, o nível de emprego dessa economia será de 80.
g) O Equilíbrio do Modelo (ou Possíveis Equilíbrios).
O Modelo está composto por seis variáveis endógenas: Ls, Ld, L*, Qs, Qd e Q*. As expressões (1) a (6) nos
permitem resolver o modelo. O leitor já terá percebido que o salário real é um parâmetro, ele não se determina no modelo.
Nesse sentido, este tipo de abordagem, que pretende compatibilizar a perspectiva clássica e a keynesiana, não é, nesse
sentido, nem clássico nem keynesiano. Lembremos que, em ambos os casos, o salário real é uma variável endógena.
Observemos que, em termos hierárquicos, primeiro se determina o equilíbrio no Mercado de Bens e depois, via
função de produção, se determina o equilíbrio no Mercado de Trabalho 1/. Essa situação pode levar a quatro cenários.
i) Excesso de Oferta no Mercado de Bens e Excesso de Oferta no Mercado de Trabalho (Desemprego Keynesinao).
Imaginemos a primeira possibilidade. No mercado de bens, as possibilidades de produção (seja pela oferta de
trabalho seja pelo salário real vigente) são superiores à demanda. Em termos das nossas expressões Qs > Qd. Como o nível
de produto está dado pelo mínimo dessas duas expressões, temos que o produto estará dado por Qd. Em outros termos, as
firmas poderiam produzir mais. Contudo, como não tem mercado para realizar essa oferta, só produzem a quantidade que o
mercado pode absorver, que, voltamos a frisar, é menor que o que elas poderiam produzir.
Essa quantidade produzida, por sua vez,gera uma demanda de mão-de-obra que é inferior à oferta (Ls > Ld).
Estamos, neste caso, diante do desemprego keynesiano tradicional. Uma demanda agregada insuficiente gera um nível de
emprego que é inferior à oferta de trabalho, resultando em desemprego.
Vamos visualizar esta possibilidade através do Gráfico 1. A função G(w/p) representa os diferentes níveis de
emprego que correspondem aos distintos salários reais. Ou seja, é a nossa conhecida demanda de trabalho e é decrescente
devido à hipótese de produtividades marginais decrescentes. Contrariamente, F(Q*) é a demanda de trabalho vinculada à
demanda agregada. Ou seja, o nível de produto de equilíbrio que, via função de produção, requer um determinado
contingente de trabalho para ser gerado. O nível de emprego será determinado pela função F(Q*) e o salário real será
(w/p)1. Ainda que o salário real caia, o nível de emprego não poderá expandir-se devido ao fato de estar limitado pela

Page 87 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 89 -
demanda. A oferta viabilizada por um maior contingente de assalariados não encontraria mercado. Nesse sentido, o salário
vigente é mais elevado que aquele que geraria o pleno emprego ((w/p)1 > (w/p)0) devido a que o nível de emprego que a
demanda agregada possibilita é inferior ao pleno emprego. Em outros termos: uma demanda agregada insuficiente gera
desemprego e um salário real elevado. A ordem de causalidade é invertida: um salário real elevado não é a origem do
desemprego.
Este é o típico caso keynesiano. As possibilidades de elevar o nível de emprego (reduzir o desemprego) estão
limitadas pela demanda agregada. Uma estratégia que vise reduzir os salários reais será ineficaz. Neste caso, a política para
a geração de novos postos de trabalho passa por deslocar a função F(Q*) à direita mediante um crescimento da demanda.
Os salários reais se ajustariam (reduziriam) para possibilitar esse crescimento no emprego.
ii) Excesso de Demanda no Mercado de Bens e Excesso de Oferta no Mercado de Trabalho (Desemprego Clássico).
Imaginemos, agora, um caso no qual existe excesso de demanda no mercado de bens. Ou seja, Qd > Qs. Neste
caso, o equilíbrio no mercado de bens estará dado por Qs. Assumamos que as firmas possam produzir mais, dado que tem
mercado. Contudo, esse produto potencial não poderia ser atingido devido a que não existe mão-de-obra suficiente para a
geração dessa oferta.
Contudo, esse excesso de demanda não necessariamente implica em pleno emprego. Com efeito, poder-se-ia
empregar a totalidade da mão-de-obra mas é factível supor que uma limitação cuja fonte são os salários reais. Ou seja, a
demanda de trabalho será o mínimo entre a função G(w/p) e F(Q*) (ver (5)). Segundo F(Q*) teríamos que estar no pleno
emprego. Contudo, por G(w/p) podemos estar aquém do pleno emprego. Nesse caso, existe desemprego e este seria um
desemprego clássico, originado em salários reais elevados.
Voltemos a utilizar um Gráfico (Gráfico 2) para ilustrar esta situação. A demanda de trabalho que, potencialmente,
poderia ser gerada pela demanda agregada (F(Q*)) é superior à oferta(L
s). Dessa forma, não existe restrição, para o emprego, oriunda do nível de atividade. Contudo, os salários reais dessa
economia estão dados por (w/p)1, fato que gera uma demanda de trabalho que é inferior à oferta. Neste caso, estamos
diante de um ambiente tipicamente clássico: o desemprego é produto de salários reais elevados.
Em termos de política pública, é óbvio que o emprego não será sensível a deslocamentos, à direita, de F, dado que
a expansão do emprego está limitada por salários reais elevados. A alternativa para o crescimento do emprego seria a
redução nos salários reais.
iii) Excesso de Demanda no Mercado de Bens e Excesso de Demanda no Mercado de Trabalho (Desemprego Clássico).
Esta situação foge ao escopo de nossa análise dado que não existiria desemprego. Os salários reais são muito
baixos e determinam uma demanda de trabalho que está além da oferta. Simultaneamente, o nível de emprego produto da
demanda também está além da oferta de trabalho. Neste caso existiria uma tendência à inflação e não se colocaria o
problema do desemprego.
iv) Excesso de Oferta no Mercado de Bens e Excesso de Demanda no Mercado de Trabalho (Impossibilidade Teórica).
Aqui estamos diante de uma impossibilidade teórica. Com efeito, se temos excesso de demanda no mercado de
trabalho, produto de salários reais muito baixos, não podemos ter, simultaneamente, excesso de oferta no mercado de bens.
Se a expansão do emprego está limitada pela demanda e existe desemprego, o salário real é mais elevado que aquele que
geraria pleno emprego.
Ilustramos esta situação no Gráfico 3. Os salários reais muito baixos ((w/p)1) determinariam uma demanda de
trabalho Ld1, que é superior ao pleno emprego e, assim, existiria um suposto excesso de demanda no Mercado de Trabalho
. Por outra parte, a demanda de mão-de-obra gerada pela demanda agregada determinaria um nível de ocupação dado por
Ld2 que corresponderia a uma salário real de (w/p)2. Se o salário real determinado pela demanda agregada é (w/p)2 não se
pode configurar, simultaneamente, outro salário real, mais baixo, em (w/p)1.
v) Desemprego Misto (Clássico e Keynesiano).
Podemos vislumbrar uma situação particular quando uma conjuntura engloba os dois tipos de desemprego
(clássico e keynesiano), ainda que um seja o dominante e o outro só é relevante quando o primeiro é superado.
Utilizemos o Gráfico 4 para analisar esta possibilidade. Suponhamos que o salário real vigente nessa economia
seja (w/p)1, superior ao salário real de pleno emprego, que é (w/p)3. Aumentar o nível de emprego requer uma redução dos
salários reais, dado que a expansão da ocupação não está limitada pela demanda agregada. A utilização de uma política de
redução dos salários reais tem um limite. Ao atingir o patamar (w/p)2, a política de redução dos salários reais não é mais
eficaz para elevar o nível de emprego, dado que a restrição dada pela demanda agregada se torna relevante. A partir desse
ponto, se requer uma gestão econômica que eleve a demanda agregada.
Assim, o desemprego total pode ser subdividido em dois componentes: um clássico e outro keynesiano. A
política de geração de emprego envolve duas etapas: a primeira de redução dos salários reais e, superada a parte clássica
do desemprego, a segunda de ativismo (política monetária/fiscal) na demanda agregada.
III. Uma Perspectiva Crítica.
Como já afirmamos nos primeiros parágrafos deste Capítulo, esta tentativa de síntese, não obstante seus méritos,
não conseguiu construir um novo paradigma que compatibilizasse o Modelo Clássico e Keynesiano. Ao contrário, foi
questionado tanto pelos clássicos como pelos keynesianos. Estas duas correntes viram no Modelo Síntese aspectos que
não eram compatíveis com proposições fundamentais de seus arcabouços teóricos. Vamos dar dois exemplo.
No caso dos clássicos, estes ficaram pouco confortáveis em um modelo que pretendia preservar suas proposições
mas considerava que os salários reais poderiam ser resistentes à queda em contextos de desemprego. Ou seja: si temos um
equilíbrio tipicamente clássico (desemprego provocado por salários reais excessivamenteelevados), porque esse excesso

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 90 -
de oferta de trabalho não se traduz em ajustes (quedas) nos salários reais de forma a viabilizar uma elevação no estoque de
ocupados? Quais são as justificativas e argumentações que fundamentam uma inflexibilidade à baixa nos salários reais na
presença de desemprego? Aqui a crítica seria similar à dirigida aos keynesianos, que postulavam salários nominais
inflexíveis à baixa, mas não fundamentavam essa argumentação 2/.
Complementando com o argumento anterior. Se o desemprego era keynesiano (insuficiência da demanda
agregada), uma expansão do nível de atividade geraria um crescimento do emprego, possibilitado pela queda nos salários
reais. Um clássico poderia perguntar-se: porque os salários reais cairiam nesse caso (quando a demanda de trabalho se
aquece) e não quando se tem desemprego?
No caso dos Keynesianos, eles nunca consideravam que os salários reais fossem rígidos. Dessa forma, por
definição, o desemprego clássico não existe. Supondo-se que o poder de compra dos salários reais seja rígido à baixa, isso
implica em assumir que algum mecanismo institucional ou legal (sindicatos, salário mínimo, etc.) tem poder sobre o salário
real. Para um keynesiano, os mecanismos institucionais e legais têm poder de atuar sobre o salário nominal e não sobre o
real. Dessa forma, esses mecanismos não têm influência sobre o poder de compra, que depende do nível de preços. Assim,
se desemprego clássico não existe, por definição, só fica o keynesiano e, nessas circunstâncias, as tentativas de síntese
são desnecessárias ou inúteis.
Em realidade, o ponto central da discussão é: porque existem preços fixos que, no caso específico do mercado de
trabalho, quer dizer salários reais fixos? Em que circunstâncias esses salários rígidos devem ser flexíveis?
Em última instância, esse tipo de pergunta poderia ser colocado da seguinte forma: qual é a fundamentação
microeconômica do principal argumento do modelo? Observemos que é o principal argumento dado que o desemprego por
insuficiência de demanda agregada já tinha sido longamente tratado por Keynes e seus seguidores e, em última instância,
pode ser explicado por fatores exógenos (política econômica) Então, o problema central é: porque temos preços fixos?
Em realidade, esse tipo de crítica é coerente com a perspectiva clássica, especialmente na sua versão moderna. Os
keynesianos “não tem moral” para esgrimir esse tipo de questionamento, devido a que eles foram muito generosos na
utilização de proposições sem fundamentação microeconômica. Assim, um partidário da síntese poderia argumentar: a
hipótese de salários reais rígidos é congruente com a observação do cotidiano, assim como a hipótese de salários nominais
inflexíveis.
Até aí, a critica dos keynesianos seria neutralizada. Contudo, a questão permanece, dado que os partidários da
síntese as vezes supõem salários reais rígidos e outras não. Assim, quando o desemprego é keynesiano políticas ativas
são requeridas. Contudo, o incremento do nível de emprego só é possível se quedas nos salários reais são verificadas.
Porque estes seriam sensíveis (negativamente sensíveis) ao aquecimento do nível de atividade? Os keynesianos, nesse
sentido, apresentam uma maior coerência: os salários nominais são rígidos, sempre, não importa o contexto.. Essas
incongruências teóricas, somadas a outros aspectos que já assinalamos e que estão vinculados a um contexto histórico
desfavorável a toda e qualquer proposição keynesinana, determinou que estes modelos, desenvolvidos no fim dos anos 60
e 70, não ganhassem um espaço permanente no debate das idéias.
IV. A Modo de Balanço.
Como já afirmamos, este tipo de modelo teve como principal objetivo superar a dicotomia clássicos-keynesianos
mediante um arcabouço teórico que sintetiza ambos paradigmas. Em termos gerais, seu desafio teórico não esteve coroado
pelo êxito. Quase trinta anos depois dos primeiros “papers” e livros, o fosso entre as interpretações clássicas e
keynesianas permanece. Se hoje o debate é menos intenso que nos anos 70, isso deve-se ao fato que a corrente clássica
tornou-se hegemônica, deslocando os keynesianos a certas “ilhas” no mundo acadêmico.
Contudo, ainda que isso pareça paradoxal, esse fracasso no mundo das idéias não tem como contrapartida um
paralelo nos aspectos vinculados à formulação de políticas. Vejamos isso com mais cuidado.
Para os clássicos, o desemprego, em qualquer circunstâncias, é um problema vinculado a salários reais elevados.
Para os keynesianos o problema é, sempre, um problema de demanda agregada. Os teóricos da síntese imaginaram que o
problema pode ser de salários elevados ou de demanda agregada, depende do momento do tempo e de cada economia. Em
outros termos, introduziram a variável tempo/espaço na explicação de fenômenos vinculados ao mercado de trabalho, um
tema tão caro para os institucionalistas 3/. Assim, a explicação do desemprego depende de uma análise particular. As
causas do mesmo podem ser diferentes em cada país e, dentro dele próprio, variar com o transcorrer do tempo.
Vamos ilustrar essa potencial diversidade através de um exemplo concreto, muito utilizado anos atrás. Na Europa,
após os choques do petróleo dos anos 80, o desemprego seria produto da resistência à queda dos salários reais. Um forte
movimento sindical e sistemas institucionais ou informais de indexação tornaram os salários reais relativamente rígidos à
baixa. Diante de um choque externo adverso (os Europeus, como importadores de petróleo, seriam mais “pobres” após a
mudança dos preços relativos a favor dos hidrocarburos), os salários reais deveriam cair ou sua inflexibilidade se traduziria
em
maior desemprego. Ou seja, nessa conjuntura, o desemprego na Europa seriam tipicamente “clássico”.
Contudo, após o contra-choque petroleiro de 1986 (queda acentuada dos preços), o desemprego permaneceu. Essa
segunda etapa, que se prolonga até fins dos anos 90, o desemprego seria resultado de insuficiência de crescimento.
Problemas na Alemanha (“locomotiva” da economia Européia),
especialmente após 1989 (gastos públicos oriundos da unificação) obrigaram a manter taxas de juros elevados,
comprometendo as possibilidades de geração de empregos. Nessas circunstâncias, o desemprego seria uma conseqüência
de taxas de crescimento do produto medíocres. Dessa forma, no mesmo espaço econômico (Europa), as causas do
desemprego teriam mudado com o transcorrer do tempo, passando de “clássicas” a “keynesianas”.

Page 89 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 91 -
Contudo, devemos ser muito cuidadosos com a aplicação desse tipo de abordagem. Como deve ter ficado claro no
transcurso deste Capítulo, os idealizadores de um modelo síntese entre os clássicos e keynesianos sustentaram que, em um
cada momento do tempo, a geração de empregos pode ser atingida seja a partir da receita clássica (redução dos salários
reais) seja através da receita keynesiana (aquecimento do nível de atividade), segundo o diagnóstico. A totalidade do
desemprego pode ter duas origens, parte é clássico e parte é keynesiana, uma das duas é prioritária (ver Seção II).
Ilustremos esse fato a partir de um exemplo do Brasil. É comum escutar que, para reduzir o desemprego, o Brasil precisa
crescer e mudar o marco regulatório para tornar o mercado de trabalho mais flexível. Nesse sentido, esse diagnóstico
parece ser compatível com o modelo que tenta sintetizar os princípios clássicos (flexibilizar o mercado de trabalho) e
keynesianos (crescimento). Contudo, essa aderência entre esse arcabouço teórico e o diagnóstico é aparente quando
verificamos que este último é acompanhado por recomendações de política que tentam induzir o crescimento e mudar,
simultaneamente, a legislação trabalhista. A geração de novos empregos enfrenta, porém, uma restrição dominante.
Imaginemos que a principal restrição seja de crescimento, porque o país está em recessão. Nesse caso, o impacto de uma
mudança na legislação trabalhista teria resultados duvidosos sobre a abertura de novas vagas. Contrariamente, se o país
verifica uma trajetória de desenvolvimento estável (a restrição não é o nível de atividade), uma alteração no marco
regulatório poderia elevar a potencialidade desse crescimento em termos da geração de empregos. Em outros termos: as
receitas clássicas e keynesianas não são substitutas. A pertinência de cada uma delas depende da restrição que está
impedindo a geração de novos empregos.
Assim, estamos diante de uma situação paradoxal. Por um lado, em termos de relevância teórica, existe um certo
consenso sobre o fracasso da tentativa de síntese entre ambas abordagens. Os esforços não prosperaram por
inconsistências teóricas internas e por um contexto histórico pouco favorável. Contudo, em termos de debate público
sobre políticas favoráveis à geração de empregos, ainda que utilizado, a maioria das vezes de forma pouco rigorosa, a
alternativa que goza do maior apelo salienta a conveniência de realizar um “mix” entre políticas que flexibilizem o mercado
de trabalho e com outras que viabilizem o crescimento.

Capítulo XI
O Mercado de Trabalho nas Regiões Subdesenvolvidas
Da Economia do Desenvolvimento ao Mercado Informal
Existem conceitos nos quais observamos que sua popularidade, tanto no debate cotidiano como na
literatura especializada, vai em paralelo com sua ambigüidade. Talvez, justamente, a sua popularidade surja de
sua ambigüidade. Esse conjunto de conceitos parece não precisar definição, ou, para ser menos radical, sua
definição parece simplista, quase trivial, dado que tem um natural apelo intuitivo. Por exemplo, parece poder-se
estabelecer um diálogo ou debate no qual seja utilizado o termo “setor informal” sem que as partes requeiram
uma
definição prévia.1/ Porém, transitar desse apelo intuitivo à uma definição rigorosa evidencia a complexidade do
tema e a flexibilidade conceitual pode ocultar a complexidade do tema.
A definição e a relevância como categoria teórica do que vagamente se denomina de “setor informal”
mudou no tempo e, em não poucas ocasiões, só faz sentido em marcos teóricos mais abrangentes. Em
realidade, a denominação de “setor informal” é relativamente recente, visto que surge no início dos anos 70 em
artigos produzidos pela OIT (Organização Internacional do Trabalho) no marco do Programa Mundial de
Emprego, principalmente em estudos levados a cabo pelo antropólogo-economista Keith Hart na África.2/ O
conceito original foiextremamente vago, sem maiores ambições teóricas e simplesmente visava qualificar uma
realidade que era muito distante daquela observada no cotidiano dos países centrais. Contudo, essa categoria se
consolidou na literatura, sendo rapidamente incorporada nos mais diversos paradigmas teóricos, ainda que o
conceito de “setor informal” permaneça, até hoje, estreitamente associado a esforços analíticos que tentam
construir marcos de referência particulares para os países em desenvolvimento.
Dessa forma, deve ficar mais ou menos claro que a denominação de “setor informal” carece de
transcendência no caso do mesmo não transpor uma mera e vaga qualificação para certos segmentos produtivos
ou tipos de inserção no mercado de trabalho senão é integrada como uma categoria analítica a um paradigma
teórico de maior densidade. Nesse sentido, nossa opção foi situar aquilo que muito vagamente se denomina de
informalidade dentro das correntes que tenderam a identificar nos mercados de trabalho nas regiões
sub-desenvolvidas particularidades que impediam, e impedem ainda hoje, que os paradigmas teóricos
construídos a partir da realidade dos países desenvolvidos fossem mecanicamente transpostos ao resto do
mundo. Esse caráter não universal da dinâmica do mercado de trabalho nos países economicamente mais
avançados permeia as correntes teóricas que tentaram realizar esforços analíticos para interpretar os processos
de crescimento e desenvolvimento econômico. Em
realidade, a “economia do desenvolvimento” foi um ramo da economia que teve uma relativa relevância entre os
anos 40 e 70. Foi nesse berço analítico que o mercado de trabalho das nações subdesenvolvidas foi tratado
com particular atenção, dado que ocupava uma posição chave nas tentativas de explicação dos processos de
transição entre o subdesenvolvimento e o desenvolvimento. Nos anos 70, dois fatores confluem para alimentar os

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 92 -
esforços por construir novos paradigmas. O primeiro é a consolidação de marcos analíticos que tendem a não
identificar o subdesenvolvimento como uma etapa dentro de um longo caminho cujo final seria, imperativamente,
o desenvolvimento ou o modelo de sociedade vigente nos países economicamente mais avançados. O segundo
fator, mais diretamente vinculado ao mercado de trabalho, está pautado pelos dois documentos da OIT que já
referenciamos e nos quais o conceito de “setor informal” é pela primeira vez mencionado. Assim, se tentou
estudar com particular atenção o real funcionamento do mercado de trabalho nos países subdesenvolvidos e
identificar neles idiossincrasias que tornariam pouco adequados marcos interpretativos surgidos em outros
contextos históricos.
Dessa forma, nossa opção foi abordar a questão da informalidade no mercado de trabalho dentro de
marcos analíticos que transcendem uma simples definição. Nessa perspectiva, na Seção Iapresentaremos o
Modelo de Lewis, uma abordagem que foi fundamental nas explicações do rol do mercado de trabalho no
processo de desenvolvimento. Na Seção II, nossa atenção será dirigida a outro paradigma que, concorrente da
perspectiva de Lewis, tentou criar, também, um olhar do mercado de trabalho próprio às regiões da periferia, a
abordagem do PREALC (Programa Regional para América Latina e o Caribe-OIT). Tanto os Modelos a la Lewis
como aqueles de inspiração mais próxima ao PREALC sempre tiveram como vocação construir visões dos
mercados de trabalho que fugissem de marcos analíticos bem sedimentados no mundo acadêmico. Nesse
sentido, não obstante a popularidade atingida em certos momentos, sempre tiveram como concorrente formas de
interpretação que se nutriam das grandes escolas do pensamento, como o liberalismo (ou o paradigma
neoclássico) e o marxismo. Na Seção III, estudaremos essas perspectivas, especialmente a renovação que o
pensamento ortodoxo (neoclássico) teve a partir dos anos 80. Na Seção IV, nossa análise será direcionada a um
olhar que ganhou certa aceitação nos anos 90 e está vinculado aos benefícios (econômicos e sociais) que teriam
as pequenas unidades de produção e a melhor adequação das mesmas à nova base tecnológica (novas
tecnologias) e ao ambiente de
incerteza macroeconômica. Veremos as fragilidades deste enfoque quando o mesmo pretende ser associado,
sem nenhuma mediação, à informalidade. A questão do desemprego sempre foi um ponto frágil nos modelos que
lidavam com o setor informal, visto que, se ele era considerado de livre entrada, todo desemprego deveria ser
classificado de voluntário. Na Seção V, abordaremos o Modelo de Harris e Todaro e sua tentativa de explicar
tanto a ocupação no setor tradicional como a convivência deste com a informalidade, o setor formal e o
desemprego. Nessa mesma Seção estudaremos os modelos que, inspirados na perspectiva de Harris e Todaro,
pretendem explicar, a partir de um marco axiomático neoclássico, a segmentação ou dualidade dos mercados
de trabalho nos países centrais. Na Seção VI finalizaremos o Capítulo com um balanço das perspectivas
teóricas explicadas e refletiremos sobre a pertinência de um conceito ou categoria (o setor informal) tão popular
quanto frágil.
I. O Modelo de Lewis ou a Oferta Infinitamente Elástica de Mão-de-Obra.
I.1. A Economia Dual.
Nos primórdios da Economia do Desenvolvimento, a trajetória das economias (de todas as economias)
era assumida como mais ou menos linear, sendo o resultado do processo sociedades espelhadas nas nações
que no momento observavam os maiores indicadores de bem-estar econômico. Nessa perspectiva, o
subdesenvolvimento seria uma etapa no processo de desenvolvimento e os países, segundo seus indicadores,
estavam situados em algum dos distintos estágios. 3/ Nesse marco analítico geral, um economista britânico, Sir
W. Arthur Lewis (1915-1991), que em 1979 seria agraciado, junto com Theodore W. Schultz, com o Prêmio
Nobel de Economia, propõe um modelo de crescimento que ficou conhecido na literatura como Modelo de Lewis
ou Modelo de Desenvolvimento com Oferta Ilimitada de Mão-de-Obra. 4/ Esse artigo de 1954 se converteu,
rapidamente, em uma referência incontornável em toda e qualquer literatura sobre desenvolvimento econômico,
seja para elogiá-lo, seja para complementá-lo, seja para criticá-lo.
O Modelo de Lewis se inscreve no corpo conhecido como Economia do Desenvolvimento e, mais
especificamente, dentro das correntes que viam as sociedades subdesenvolvidas como economias duais. 5/ Em
um mesmo espaço econômico conviveriam um setor atrasado ou arcaico (geralmente identificado com o setor
rural) e um setor moderno (comumente associado ao segmento urbano-industrial). As sociedades
subdesenvolvidas seriam sociedades duais, nas quais o crescimento e a transição teria como eixo a
acumulação do setor moderno que, com o transcorrer do tempo, acabaria atingindo toda a sociedade, na medida
em que uma das singularidades do setor arcaico seria sua estagnação. Com efeito, o
setor atrasado teria poucas possibilidades de acumulação devido a sua reduzida produtividade. Inclusive, sua
racionalidade não seria capitalista e prevaleceriam pequenas unidades de produção, que utilizariam
preponderantemente mão-de-obra familiar, com reduzido acesso a inovações tecnológicas, aos circuitos
comerciais do setor moderno e ao crédito, etc. Contrariamente, o setor moderno se caracterizaria por um perfil
diametralmente oposto: elevada produtividade, inovação tecnológica, relações de trabalho assalariadas, acesso
ao crédito, etc. Em última instância, o setor moderno seria uma “xerox” das sociedades

Page 91 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 93 -
desenvolvidas que, com o tempo, devido a seu dinamismo, acabaria tomando conta de todo o país. Quando a
sociedade conseguisse superar sua dualidade devido ao monopólio absoluto do setor moderno teria atingido o
sonhado “desenvolvimento”. O setor arcaico era identificado com a herança da “velha sociedade” que não teria
chances de ser uma alternativa ao segmento moderno em contínua expansão.
I.2. Os Mercados de Trabalho como Nexo entre os Dois Setores.
A articulação entre os dois espaços (setor arcaico e setor moderno) se daria, basicamente, pelos
mercados de trabalho.
No setor arcaico a produtividade marginal do trabalho seria nula ou, inclusive, negativa. Logicamente, a
pergunta pertinente é: como é possível assumir essa hipótese? Assumir uma produtividade marginal nula ou
negativa não seria uma suposição tão “heróica” quando lembramos que a unidade de produção no setor arcaico
seria uma unidade econômica familiar ou não capitalista, cujo objetivo não seria o lucro. Nessas circunstâncias,
a remuneração de cada indivíduo pode não ser realizada tendo como referência a produtividade marginal. A
remuneração de cada trabalhador ou residente na unidade familiar pode surgir
de uma simples divisão da produção obtida entre eles. O objetivo não seria maximizar o lucro, a racionalidade
seria outra.
Contrariamente, no setor moderno, o objetivo das firmas seria o lucro e os recursos humanos utilizados
teriam uma relação trabalhista assalariada. Contudo, a acumulação de capital neste setor requereria
contingentes adicionais de mão-de-obra. De onde proviria essa mão-de-obra? Simplesmente do setor arcaico.
Mas por que os trabalhadores migrariam de um setor para outro? Pelos maiores salários pagos no setor
moderno. Contudo, aqui estamos diante de um ponto complexo do modelo. Sob a hipótese do setor arcaico ser
um “depósito” quase inesgotável de indivíduos, na margem (no limite), os salários pagos no setor moderno
deveriam ser muito próximos daquela remuneração factível de ser obtida no setor arcaico. Aqui podemos
introduzir alguma outra hipótese. Suponhamos que no setor moderno vigore um salário mínimo que é superior à
remuneração obtida no setor arcaico ou existam sindicatos que tornam os salários mais elevados que no espaço
que expulsa mão-de-obra. Em todo caso, como a produtividade do setor moderno é mais elevada que no setor
tradicional, é factível
a existência de remunerações mais elevadas que no setor arcaico.
Se para o setor moderno a existência dessa oferta é necessária para sua expansão, para as unidades
de produção do setor arcaico o benefício é mais ou menos óbvio. Como a produtividade marginal é nula ou
negativa, a disponibilidade de renda para os que restam na unidade de produção é maior, dado que existem
menos indivíduos competindo com um fluxo de rendimentos similar (produtividade marginal nula) ou maior
(produtividade marginal negativa). Em outros termos: ao expulsar população, a renda média por indivíduo no setor
arcaico se eleva.
Dessa forma, o setor moderno teria uma oferta de mão-de-obra infinitamente elástica ao rendimento
vigente no setor arcaico, que seria muito próximo ao de subsistência. Essa realocação de mão-de-obra de um
setor de baixa produtividade (setor arcaico) para outro de elevada produtividade (setor moderno) caracterizaria ou
seria a essência do progresso econômico e se daria, essencialmente, pela migração, que seria sensível ao
diferencial de rendimento entre ambos setores. 6/
No Modelo de Lewis vemos, assim, que o mercado de trabalho é bi-setorial (convivem dois setores)
mas não está segmentado, se entendemos por segmentado doIs espaços sem comunicação entre si. Existe um
fluxo migratório unidirecional (do setor arcaico que é o “provedor” de mão-de-obra para o setor moderno) e sem
essa oferta de recursos humanos o setor moderno encontraria dificuldades para seu desenvolvimento. Contudo,
essa convivência é transitória, visto que, no longo prazo, o setor arcaico vai perdendo importância até
desaparecer. 7/
Dados nossos objetivos, a partir deste modelo podemos tirar dois corolários.
O primeiro diz respeito à transitoriedade do dualismo. Podemos ser até repetitivos, mas este aspecto é
de singular importância para compreender a posterior polêmica em torno do setor informal. No Modelo de Lewis
e, em geral, em quase toda a literatura da Economia do Desenvolvimento, o setor arcaico está, no longo prazo,
condenado a desaparecer. O processo de crescimento, cujas raízes estão, exclusivamente, situadas no setor
moderno, visto que é o único capaz de acumular, acabará por tornar a economia uni-setorial.
O segundo aspecto está vinculado à distribuição de renda. Na medida em que existe uma oferta de
mão-de-obra infinitamente elástica ao rendimento de subsistência que vigora no setor arcaico, as possibilidades
de elevar os salários no setor moderno são mínimas. Nesse sentido, a concentração de renda, uma
característica que acompanha a maioria das economias em rápidos processos de crescimento, seria natural e
só poderia ser revertida quando a sociedade atinge sua “maturidade”. Na transição, não obstante a rápida
elevação da demanda de trabalho, os salários do setor moderno estarão pautados pelos rendimentos no setor
de subsistência.
II. Do Modelo de Lewis ao Setor Informal.

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 94 -
II.1. As Origens do Conceito de Informal.
Na ocasião da publicação dos artigos da OIT no início dos anos 70, a introdução de uma categoria
ambígua como “setor informal” tinha como intuito refletir uma realidade que parecia persistente.
Na sua definição inicial, o setor informal era visto como um espaço econômico muito similar ao setor
arcaico no Modelo de Lewis. O setor informal era visto como sendo integrado por pequenas unidades de
produção, que empregavam majoritariamente mão-de-obra familiar, utilizavam tecnologias modernas de forma
marginal, não tinham acesso aos circuitos de crédito, não cumpriam as disposições legais e operavam à
margem da regulação do Estado, etc. Observamos, assim, uma caracterização muito próxima do setor
tradicional ou de subsistência do modelo anterior.
Porém, dois elementos tornavam a nova perspectiva radicalmente diferente
da anterior.
Em primeiro lugar, o Setor Informal era visto como sendo uma característica permanente e não
transitória. Justamente, o que induziu a introdução desse conceito foi a constatação da persistência de espaços
econômicos com modus operandis que não eram típicos do que comumente se denominava de setor moderno.
O Modelo de Lewis, na sua forma mais pura, sustentava que esses espaços teriam que perder paulatinamente
importância. Contrariamente, na experiência dos países em desenvolvimento, ainda em contextos de elevadas
taxas de crescimento, segmentos com as características similares ao setor arcaico
lewisiano permaneciam, quando não aumentavam sua importância.
Por outra parte, as inter-relações entre o setor dito moderno e esse outro setor agora denominado muito
vagamente de informal eram complexas. Os vínculos não estavam reduzidos a uma oferta de mão-de-obra,
barata e infinita, oriunda da “setor não-moderno” a favor do moderno. Existiam fluxos de indivíduos, mas também
as pequenas unidades de produção da periferia do sistema complementavam e/ou competiam com o setor
moderno. O crescimento do setor moderno podia chegar até induzir esse setor “não-moderno”. 8/
Contudo, essa maior complexidade tinha um custo, visto que requeria um marco conceitual de muito
maior densidade. Com efeito, devemos admitir que o Modelo de Lewis tinha um grande apelo intuitivo. Toda
sociedade em processo de desenvolvimento partia de uma situação na qual a herança (em termos de sociedade
tradicional) devia ser paulatinamente marginalizada pelo próprio dinamismo que seria intrínseco ao setor
moderno.
9/ Era mais ou menos óbvio chegar a um corolário como esse, dado que o contínuo crescimento do segmento
urbano-industrial deveria acabar por esgotar, em algum momento do tempo, as fontes de recursos humanos
situadas no setor arcaico. Contrariamente, não é
uma resposta natural supor que um segmento um ”pouco usual”, como seria o setor informal, perdurasse e se
recriasse no próprio processo de modernização.
Antes de entrar na nossa discussão sobre o problema teórico que esta perspectiva introduz, seria
interessante deter-nos, muito brevemente, no conceito de “moderno”. A definição de uma “sociedade moderna”
pode merecer muitas leituras, que vão desde perspectivas sociológicas, culturais, políticas e, logicamente,
econômicas. Aprofundar os diferentes conceitos de modernidade ultrapassa longamente aos nossos objetivos.
Para não nos levar por essa polêmica, poderíamos argumentar que a modernidade, desde um ponto de vista
estritamente econômico, era sinônimo de grandes unidades de produção, que produziam uma oferta
relativamente uniforme, com elevada produtividade e que nucleava grandes contingentes de assalariados cujas
relações trabalhistas estavam pautadas pelas normas legais. Nessa perspectiva, como já mencionamos, toda
forma de organização da produção que fugisse dessa norma, especialmente quando se tratava de pequenas
unidades, com mão-de-obra familiar ou assalariada não legalizada, com baixa produtividade, etc. era assumida
como algo que não se enquadrava no modelo de organização social ao qual tinha que se direcionar toda
sociedade.
Seria factível argüir que esse denominado setor informal tem poucos pontos de contato com o setor
arcaico nos modelos dualistas ou, em geral, nos modelos a la Lewis. Realmente, não se pode realizar essa
transposição mecânica, mas devemos convir que certas similitudes são pertinentes. Em geral, no Modelo de
Lewis, o setor arcaico está umbilicalmente vinculado à agricultura e a regiões “atrasadas”. O caso do Nordeste
brasileiro (especialmente o interior desse espaço) é um exemplo mais que ilustrativo. No caso do setor informal,
sua situação não estava associada nem a um setor nem a uma região. Contudo, a essência da unidade de
produção do Modelo de Lewis estava muito próxima daquela caracterização que começa a ser realizada nos
anos 70 do talvez confusamente denominado de setor informal. Não seriamos ousados se caracterizássemos as
conceituações sobre o setor informal como sendo herdeiras
de Lewis, ainda que esta relação possa não ser bem vista por muitos dos teóricos (que depois mencionaremos)
que tentavam sentar bases conceituais sobre as causas da permanência do setor informal no processo de
modernização. Por que poderiam não ser bem vistas? Simplesmente porque, e este é um ponto de relativa
importância, todos os que realizam esforços para entender o setor informal tendem a rechaçar qualquer

Page 93 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 95 -
associação com o dualismo. Em outros termos, o papel do setor informal não está restrito a ser um espaço no
qual se situa uma oferta infinitamente elástica de mão-de-obra para o setor formal e que com o
tempo tende a desaparecer. As relações, além de serem mais complexas, não estão restritas ao mercado de
trabalho. Em outros termos, as sociedades não seriam dualistas, no sentido de terem dois segmentos que
convivem e no qual um (o arcaico) vai desaparecer no tempo.
A questão que agora deve ser respondida é: que idiossincrasias teriam as sociedades do mundo
subdesenvolvido que tendem a produzir e a reproduzir espaços informais? Responder a essa questão requer um
esforço teórico que ultrapassa as fronteiras das teorias do mercado de trabalho. Nos próximos parágrafos
nossos esforços serão direcionados a apresentar esses marcos analíticos.
II.2. O Estruturalismos Latino-americano: da Escola da CEPAL (Comissão Econômica para América
Latina) ao PREALC/OIT (Programa Econômico para América Latina e o Caribe/Organização
Internacional do Trabalho).
a) A Informalidade na Economia do Desenvolvimento.
A partir dos anos 50, no âmbito da CEPAL, foram-se agrupando uma série de economistas
latino-americanos com um ambicioso programa de pesquisa. 10/ Seus objetivos iam desde contribuições no
âmbito da teoria econômica, passavam por uma reinterpretarão do processo de desenvolvimento da América
Latina e atingiam propostas concretas de política econômica. Basicamente, sua aspiração era criar as bases de
um pensamento econômico alternativo aos paradigmas dominantes que eram gerados a partir dos grandes
centros econômicos. Seus argumentos pressupunham que os marcos analíticos construídos a partir da
experiência histórica das hoje nações desenvolvidas não eram universais, estavam datados no tempo e no
espaço. Em todo caso, a aplicação mecânica de muitas dessas teses e seus correlatos em termos de política
econômica teriam como subproduto a perpetuação da condição de subdesenvolvimento da região. Nesses
esforços, as contribuições foram diversas e iam desde a concepção centro-periferia, passavam pela deterioração
dos termos de troca, oferecendo alternativas de interpretação dos processos inflacionários que, nessa
perspectiva,
não teriam raízes monetárias, e tentavam uma interpretação original da industrialização da América Latina e das
restrições estruturais que os países dessa área teriam para atingir o desenvolvimento. Em termos de política
econômica, as principais recomendações giravam em torno da necessidade de proteger o mercado interno, do
papel do Estado tanto no planejamento como na implementação de atividades produtivas e da integração da
América Latina, a reforma agrária, etc.
Dentro desse novo paradigma, um conceito chave diz respeito à heterogeneidade estrutural que
caracterizaria a região. Ou seja, os sistemas econômicos não tenderiam a uma estrutura econômica mais ou
menos homogênea (moderna, com tecnologias capital-intensivas, de elevada produtividade, etc.). A questão é:
quais são as explicações teóricas dessa
heterogeneidade? A explicação dada não parece de todo convincente. Em última instância, o problema central
está vinculado à inadequação da tecnologia incorporada, que seria gerada nos centros a partir de suas
necessidades, preços relativos e dotação relativa de recursos. Intensivas em capital (poupadoras de
mão-de-obra), essas tecnologias gerariam uma incapacidade estrutural em gerar novas oportunidades de
emprego. O desemprego seria uma singularidade dos sistemas econômicos periféricos que, por sua vez,
reduziria o mercado e colocaria problemas de escala. Mercados internos deprimidos seriam uma restrição a
elevações de produtividade, fato que redundaria em taxas de crescimento baixas e acentuariam o já crônico
problema da oferta de novas oportunidades de emprego. 11/.
No tocante ao mercado de trabalho, o paradigma cepalino sustenta que as economias periféricas
observam uma incapacidade estrutural em dinamizar a demanda de trabalho no setor moderno, induzindo o
desemprego crônico e elevado e um setor atrasado ou não moderno com características semelhantes ao Modelo
de Lewis, ainda que em um contexto teórico bem distante. Como o paradigma da CEPAL tinha como vocação
explicar todo o processo de desenvolvimento (ou de subdesenvolvimento) da América Latina), o mercado de
trabalho merecia uma atenção marginal.
b) O Excedente Estrutural e Conjuntural de Trabalho nas Periferias.
Esse esforço teórico, mas desta vez com um eixo quase exclusivo no mercado de trabalho, foi
retomado nos anos 70 pelo Programa Regional para América Latina e o Caribe (PREALC), um programa da OIT
para a região. No âmbito do PREALC convergiram duas linhas: as primeiras menções ao setor informal nos
documentos da OIT referentes à África e à tradição cepalina na América Latina. O mérito do PREALC foi tratar
de tornar mais denso
analiticamente a conceito do setor informal. Lembremos que o documento da OIT de 1972 visava caracterizar um
amplo conjunto disperso de atividades que parecia ser particular e não transitório nas economias
subdesenvolvidas. Não tinha maiores pretensões teóricas (por que surgia, por que perdurava, quais eram seus
nexos com o setor moderno e seu rol no processo de acumulação, etc.). Incluir essa simples caracterização em

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 96 -
um paradigma teórico em construção e que especificamente diagnosticaria as causas de uma heterogeneidade
estrutural
parecia promissor.
O PREALC foi, durante quase duas décadas (até sua desativação na década de 90), uma das principais
usinas de documentos nos quais os esforços teóricos e trabalhos empíricos se combinavam. Em termos de
definição, o PREALC não fez grandes mudanças com respeito às prévias definições encontradas nos trabalhos
anteriores da OIT. O setor informal estaria integrado por pequenas unidades de produção, que empregam
mão-de-obra familiar e/ou pequenos contingentes de assalariados com relações trabalhistas não legalizadas,
apresentam baixa produtividade, tanto pela utilização de tecnologias tradicionais como por apresentarem um
baixo coeficiente de capital por trabalhador, atuam em mercados competitivos e, portanto, não têm capacidade
de determinar preços, não têm acesso aos circuitos tradicionais de crédito, etc. Realmente, no tocante à
definição ou caracterização do setor informal, o PREALC trouxe poucas rupturas com respeito à literatura
pré-existente.
A grande contribuição foi no tocante a uma hipótese mais sofisticada sobre as origens do setor informal.
Este seria um “depósito” estrutural e conjuntural do excedente de trabalho. Acompanhando o marco de
referência cepalino, o PREALC identifica no desenvolvimento da América Latina uma incapacidade estrutural em
gerar empregos no setor moderno. As oportunidades de trabalho nesse núcleo dinâmico seriam empregos com
elevada produtividade, salários elevados, uma relativa estabilidade, relações trabalhistas que cumpririam os
requisitos legais, etc. Diante da incapacidade estrutural das economias em
oferecer empregos com essas características, existiria um excedente estrutural de mão-de-obra. Essa
singularidade dos mercados de trabalho na região seria complementada por outra: a ausência de mecanismos
de proteção social (Estado de Bem-Estar) abrangentes. Diante da ausência de oportunidades de emprego
(emprego de qualidade, no setor moderno) em quantidades suficientes e dada a mencionada ausência de
proteção social generalizada, a alternativa, certamente, não seria que o excedente de mão-de-obra
permanecesse no desemprego aberto.12/ O emprego nos espaços informais seria uma natural estratégia de
sobrevivência diante da falta de “genuínas” oportunidades de trabalho. Como este é um ponto de crucial
importância, vamos deter-nos com particular atenção na sua análise.
Tradicionalmente, a geração de um posto de trabalho é assumida como sendo uma questão de
demanda de trabalho por parte de uma firma. 13/ Em outros termos: as firmas requereriam um indivíduo a fim de
viabilizar uma oferta de bens ou serviços. Nesse sentido, gerar um posto de trabalho requer investimento e
demanda pela oferta gerada. No caso dos empregos criados no setor informal, a origem do posto de trabalho
seria a oferta de emprego (a procura de trabalho por parte dos indivíduos) e não a demanda de trabalho. Diante
da necessidade de sobrevivência e na ausência de demanda de trabalho por parte das firmas do setor moderno,
os indivíduos procurariam alternativas de gerar renda (procurariam alternativas de sobrevivência). Esses postos
de trabalho não seriam um “mérito” do desenvolvimento senão, ao contrário, a manifestação da incapacidade de
gerar empregos via demanda de trabalho por parte do setor moderno. Na sua incontornável necessidade de
obter algum tipo de rendimento, as famílias ou os indivíduos procurariam imperativamente atividades que
possibilitassem sua sobrevivência. Vemos que esses empregos seriam uma questão de oferta
(excesso de oferta de trabalho) e não de demanda por parte das firmas. Como são pautados pelos imperativos
de sobrevivência, essas ocupações requereriam escasso capital e teriam como corolário natural reduzida
produtividade e rendimentos e, logicamente, não poderiam preencher os requisitos legais, etc.. Temos, assim,
um marco interpretativo que acompanha de perto a abordagem cepalina. O setor informal seria a manifestação,
no mercado de trabalho, da heterogeneidade estrutural que já mencionamos. Nos documentos da CEPAL, essa
heterogeneidade estrutural teria uma de suas manifestações no desemprego. No caso do PREALC, sob uma
suposição extremamente realista, se assume que o desemprego não pode ser alternativa diante da ausência
proteção social e, assim, o setor informal seria o espaço no qual os excluídos ou não integrados do processo de
desenvolvimento gerariam suas atividades para atingir um patamar mínimo de rendimentos.
c) As inter-relações Formal-Informal no Ciclo Conjuntural.
As explicações que mencionamos no parágrafo anterior dizem respeito ao excesso estrutural de oferta.
O setor informal também seria o depositário do excesso conjuntural. Com efeito, poderíamos apresentar
argumentos similares no tocante ao ciclo de curto prazo. Na fase recessiva, os desligados do setormoderno
teriam que procurar seus meios de sobrevivência (devido à ausência de seguro-desemprego ou de garantias de
renda). A oferta de trabalho excedente geraria atividades capazes de prover esses mínimos.
Assim, teríamos um setor informal cujo tamanho acompanharia o ciclo. Cresce na recessão (ao
incorporar os desligados do setor formal) e se reduz na recuperação (dado que seria o espaço no qual o setor
formal encontra a mão-de-obra que requer).
Além desses vínculos via mercado de trabalho, as inter-relações entre os setores formal e informal se
produziriam via mercado de bens. As atividades de sobrevivência daqueles não incorporados pelo setor formal

Page 95 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 97 -
gerariam uma oferta que seria, em parte, colocada no setor formal. Dados os baixos coeficientes de capital
utilizados, a predominância de tecnologias obsoletas, o não acesso a circuitos de comercialização com o setor
moderno, etc. grande parte dessa oferta é realizada na periferia do núcleo duro de acumulação e demandada
pelos
assalariados do setor moderno ou do próprio setor informal (especialmente aqueles de menores
rendimentos).14/.
Temos, assim, um comportamento conjuntural de ampla variabilidade e que adquire o seguinte
movimento estilizado. Na recessão, existe uma tendência a desligar trabalhadores do setor formal e os que
continuam em seus empregos vêem seus rendimentos com tendência de queda. No setor informal, eleva-se o
contingente de ocupados (dado que recebem a maior parte dos demitidos do núcleo moderno) e cai a demanda
(visto que cai a renda dos indivíduos que eram a principal fonte de sua demanda no setor moderno). Assim,
temos um movimento
duplo que acentua o efeito depressivo sobre os espaços informais: um contingente maior de ocupados disputa
uma renda menor. O setor informal, assim, tende a aumentar na recessão e apresentar acentuada queda nos
seu nível de renda. Na recuperação o processo seria inverso: queda no contingente de empregados (dada a
maior demanda por parte das firmas no setor moderno) e elevação da renda. Uma renda maior disputada por um
estoque menor gera como resultado um nível de rendimentos em acentuada elevação.
d) Principais Características do Modelo do PREALC.
Vamos salientar várias características desse marco analítico que depois nos serão de particular utilidade
tanto quando as confrontarmos com outros paradigmas teóricos como na tentativa de identificar suas
fragilidades.
Em primeiro lugar vemos que o setor informal é assumido como de livre entrada. Ou seja, ele recebe
todo o contingente estrutural e conjuntural de mão-de-obra. Um indivíduo que não encontra ocupação nos
espaços formais pode realizar ou empreender alguma atividade à margem do núcleo dinâmico. Se classificarmos
essas atividades como setor informal, concluímos que este sempre será capaz de absorver um contingente
quase infinito de indivíduos.15/ Qual é a variável de ajuste? Simplesmente o rendimento per capta. Quanto maior
a entrada maior será a disputa por uma dada renda. Lembremos que, nesta
perspectiva, o núcleo dinâmico é o setor moderno, é nesse espaço que a renda é gerada. O setor informal tem
uma produtividade reduzida e é periférico (subordinado) ao ciclo do setor formal. A renda obtida pelo setor
informal não é outra coisa que a renda gerada no setor moderno e a ele dirigida. Assim, quanto maior o
contingente no setor informal menor será a renda per capta. O que nos faz lembrar toda esta caracterização do
setor informal? Simplesmente um mercado de trabalho concorrencial: livre entrada, ajuste via preços
(rendimentos, neste caso), flexibilidade de preços, igualdade entre oferta e demanda, etc.
Um segundo aspecto diz respeito ao marco legal e à presença de instituições. No espaço formal existe
uma legislação a ser cumprida (salário mínimo, por exemplo) e instituições estatais (justiça do trabalho, por
exemplo) ou não (sindicatos, por exemplo) que regulam as relações e introduzem custos de ajuste ou, em todo
caso, impedem uma flexibilidade total de salários. 16/
Dessa forma, temos dois espaços mais ou menos definidos e com inter-relações (via fluxo de
mão-de-obra e de bens e serviços) mais ou menos definidas. O primeiro é um mercado de trabalho vinculado ao
setor mais moderno e cujas relações trabalhistas estão reguladas pelo marco legal e instituições (estatais ou
não). O segundo espaço é um mercado de trabalho no qual não existe legislação nem instituições e impera a
livre entrada e saída.
17/ Essas características dão ao setor informal as singularidades próprias de um mercado
concorrencial. Um terceiro aspecto está associado à ruptura com respeito ao Modelo de Lewis que já
apresentamos. O setor informal não está restrito a ser um provedor de mão-de-obra ao setor formal e, com o
tempo, o mesmo tenderia a desaparecer. As inter-relações são mais complexas, não estão restritas ao mercado
de trabalho e tendem a perdurar no tempo. Dessa forma, devemos evitar imaginar qualquer identificação
mecânica entre o Modelo de Lewis e a interpretação do setor informal segundo o PREALC. Podemos até
sustentar que são paradigmas concorrentes. No Modelo de Lewis, o setor de subsistência tende a desaparecer,
constitui a “herança” de uma sociedade arcaica que a modernização vai acabar por superar com sua continua
dinâmica de acumulação e infinita expansão. Na abordagem do PREALC, contrariamente, o setor informal é um
corolário não desejado da modernização, e evidencia as limitações na modernização total das sociedades. Sua
presença não é transitória, senão permanente e só políticas adequadas poderão reverter essa dinâmica
excludente.18/
e) As Fundamentações Teóricas da Abordagem do PREALC.
Contudo, se o esforço interpretativo do PREALC avança com respeito aos primeiros documentos da OIT
e, de alguma forma, os complementa, além de poder ser interpretado como uma extensão do paradigma
cepalino tentando adequar seu marco analítico às especificidades do mercado de trabalho, fica, ainda, uma

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 98 -
pergunta não respondida: quais são as razões desse excedente estrutural de mão-de-obra? 19/
Aqui as fundamentações são mais dispersas e a sua consistência questionável.
Dado sua relação umbilical com a interpretação cepalina do desenvolvimento latino-americano, a menção
a uma suposta “inadequação” tecnológica é inevitável. A incorporação de tecnologias capital-intensivas
(poupadoras de mão-de-obra) redundaria em uma baixa elasticidade emprego-produto e, assim, não obstante
taxas de crescimento elevadas, os impactos sobre a oferta de novos empregos seria modesto.
Uma segunda raiz estaria na concentração da riqueza e dos mercados. Em realidade, ambos os
aspectos estariam relacionados. A concentração inicial da riqueza geraria atividades oligopólicas, com elevado
poder de mercado. Essa oligopolização da estrutura produtiva teria várias conseqüências, todas no sentido de
dificultar a geração de postos de trabalho. Por um lado, induziria a adoção de tecnologias capital-intensivas. O
mercado de crédito, muitas vezes subsidiado, também estaria restrito a este segmento oligpolizado. A
concentração também
colocaria barreira à entrada. As pautas de consumo (geralmente induzidas pelas pautas de consumo
prevalecentes nos países mais desenvolvidos), especialmente das classes altas e médias, também tendem a
reforçar o poder deste setor oligopolizado. O perfil de consumo (o desing, as marcas e patentes, as formas de
comercialização, a permanente mudança das modas, etc.) desse segmento da população só poderia ser
satisfeito a partir da oferta do setor mais concentrado e internacionalizado.
Ou seja, teríamos todo um processo de desenvolvimento construído a partir de uma concentração inicial
de riqueza, que, por sua vez, gera uma estrutura produtiva oligopolizada, que, a seguir, gera um fluxo de renda
concentrado que, a conseqüentemente, reforça a concentração inicial de riqueza, tendendo a prejudicar a
geração de postos de trabalho nesse núcleo moderno, alimentando a concentração de renda. Seria o próprio
estilo de desenvolvimento o responsável pelo excedente estrutural de mão-de-obra e, deixado a sua própria
dinâmica, tenderia a perpetuar essa situação. 20/
f) As Fragilidades do Modelo.
Logicamente, como todo paradigma, a perspectiva do PREALC teve seus concorrentes. Esses
concorrentes, não obstante não alcançarem a popularidade e aceitação (especialmente nos anos 70 e 80) desse
paradigma, têm sua relevância e foram construídos a partir de manifestas debilidades do pensamento que
acabamos de sintetizar. Nesse sentido, antes de nos deter na análise desses marcos analíticos concorrentes,
devemos identificar as fragilidades no corpo de idéias do PREALC.
f.1) Tecnologias Inadequadas.
A adoção de tecnologias que seriam inadequadas à configuração da dotação de recursos das
economias subdesenvolvidas cumpre um rol crucial, tanto no pensamento cepalino como nas propostas do
PREALC. Basicamente, o argumento consiste em supor que existiria uma contradição entre o perfil tecnológico
que deveria ser adotado em economias cujo recurso abundante é o trabalho, como em todo o mundo
subdesenvolvido, e a incorporação de
tecnologias capital-intensivas.
A pergunta óbvia é: porque são adotadas tecnologias que poupam mão-de-obra (capital intensivas)
quando o recurso abundante é, justamente, a mão-de-obra? Aqui temos, basicamente, duas possíveis
respostas. Uma, que na maioria dos documentos não está explícita, poderia provir da própria matriz teórica
cepalina ou do PREALC. A segunda tem um marco analítico diferente, concorrente com o paradigma cepalino, e
tem como referência o pensamento liberal. Dado que nesta Seção estamos tratando as raízes conceituais do
PREALC, nos limitaremos ao estudo de sua possível explicação à contradição entre o viés pró-capital das
tecnologias adotadas e o recurso abundante na região. Deixaremos o desenvolvimento da crítica de cunho mais
liberal para ser tratada nas próximas Seções, quando avaliaremos com detalhe esse corpo de idéias.
A adoção de tecnologias capital-intensivas pode ser sustentada se partimos do suposto que essas são
as únicas tecnologias disponíveis. 21/ Como os centros de pesquisa estão situados nas regiões desenvolvidas, o
viés tecnológico seria o economicamente eficiente tendo como parâmetro a dotação relativas de fatores nessas
economias. Visto que, justamente, nas áreas de maior desenvolvimento, o fator escasso é a mão-de-obra (desde
a perspectiva do Modelo de Lewis, por definição, uma economia deixa de ser subdesenvolvida no momento em
que a oferta infinitamente elástica de mão-de-obra deixa de existir), as tecnologias
economicamente viáveis são aquelas que poupam mão-de-obra. Nessa perspectiva, um dos desafios da região
seria criar bases próprias para a criação de ciência e tecnologia capaz de levar em consideração a dotação de
recursos locais. Em outros termos: além de não contar com centros tecnológicos próprios, a mimetização
tecnológica se daria pelo fato dos centros de pesquisa e desenvolvimento das empresas multinacionais estarem
situados nas suas matrizes, ou seja, nas economias desenvolvidas e, logicamente, o perfil de sua combinação
de fatores tem como referência esse contexto. Por outra parte, as pautas de consumo, especialmente das
classes médias e altas, não contribuiriam, visto que a demanda de seus bens e serviços seria satisfeita pelas
firmas multinacionais e, portanto, intensivos em capital.

Page 97 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 99 -
f.2.) A Questão do Desemprego
Já podemos adiantar certos aspectos que serão tratados com muito maior detalhe na Seção V deste
Capítulo. Observemos que, no enforque do PREALC, temos dois espaços (um denominado formal e outro
informal) e os nexos entre eles se dão tanto em termos de fluxo de mão-de-obra como de bens e serviços. O
emprego no espaço formal se dá pela demanda de trabalho no ciclo e, no longo prazo, pelas taxas de
crescimento e pelas tecnologias adotadas. O espaço informal é o depósito conjuntural e estrutural de
mão-de-obra (os indivíduos que não podem ser incorporados ao segmento informal devido ao ciclo de curto prazo
e os excluídos de forma permanente). Observemos que, em última instância, o mercado informal seria um
mercado muito próximo do que comumente se conhece como mercado de trabalho concorrencial, no qual
prevaleceria a livre entrada e a flexibilidade de salários. 22/ Mas, nessas circunstâncias, uma pergunta é
incontornável: por que existe desemprego nessas economias? A resposta seria: todo desempregado é voluntário,
dado que poderia encontrar algum tipo de
ocupação no setor informal (livre entrada e rendimentos flexíveis). Se, no contexto de mercados de trabalho nos
quais convive um setor formal e outro informal, resistimos a considerar todo e qualquer tipo de desemprego como
voluntário, temos que sofisticar o modelo, visto que temos que imaginar uma resposta a essa pergunta (por que
existe desemprego involuntário quando se pode encontrar alguma ocupação no setor informal?). Nessa
perspectiva, a contribuição das teses do PREALC é quase inexistente. No esboço de seu paradigma cabe um
setor formal, um setor informal, nexos entre eles, mas por que existem desempregados (involuntários,
logicamente) resta uma incógnita. Aliás, essa pergunta não é
colocada pelo PREALC. Justamente, serão os herdeiros de Lewis e as contribuições dadas por economistas
dos paises centrais que possibilitarão dar uma resposta a esse desafio teórico. Voltaremos sobre estes
aspectos nas próximas Seções.
f.3.) Os Nexos entre o Setor Formal e o Informal.
Realmente, o PREALC sofistica o Modelo de Lewis. Sua matriz teórica rechaça tanto as teses dualistas
mais radicais (duas economias que convivem sem comunicação entre elas) ou as hipóteses que restringem o
papel do setor não-moderno a ser um provedor de mão-de-obra para o setor formal. Contudo, uma pergunta
persiste: qual é o papel do setor informal no processo de acumulação do setor moderno? Em princípio, seguindo
as teses do PREALC,
nenhum. Por que existiria o setor informal? Simplesmente porque existe um “excedente” de indivíduos, pessoas
que não são incorporados pelo setor formal. Realizemos um exercício hipotético. Suponhamos que todos os
ocupados do setor informal desapareçam. Quais seriam as conseqüências sobre o processo de acumulação do
setor moderno? Em princípio nenhuma. Em todo caso, talvez o único desdobramento que possa ser vislumbrado
na perspectiva do PREALC seria uma elevação dos salários no setor moderno e uma distribuição funcional
(distribuição entre capital e trabalho) menos concentrada. Se o setor informal é identificado como um
“excedente” estrutural e conjuntural de mão-de-obra podemos fazer uma paralelo com o “exército de reserva”, na
tradição marxista. Nesse sentido, as contribuições teóricas do PREALC seriam marginais, dado que o setor
informal seria uma denominação nova a um conceito já bem sedimentado na literatura de tradição marxista. Nas
economias periféricas, por motivos que podem ser os cepalinos ou outros, não importa, esse “exército de
reserva”
adquiriria uma magnitude elevada. Permanecer longos períodos de tempo (inclusive a maior parte de sua vida)
em situação de desemprego aberto seria pouco plausível e induziria a procurar formas “pouco tradicionais” de
sobrevivência. Nesse sentido, o setor informal seria a forma concreta que adotaria o “exército de reserva” nas
economias periféricas, economias que se caracterizam por não poder incorporar econômica e socialmente
amplos segmentos da
população e, simultaneamente, carecem de sistemas de proteção social abrangentes.
Nessa perspectiva, todas as tentativas de definição e conceituação do setor informal seriam estéreis,
pouco agregariam em termos teóricos e de compreensão de aspectos como determinação de salários reais,
distribuição e pobreza, etc. aos clássicos trabalhos marxistas sobre o “exército de reserva”. Justamente, esse é
um dos paradigmas alternativos que serão motivo de análise na próxima Seção.
III. Paradigmas Alternativos.
III.1. A Crítica Marxista.
As correntes marxistas nunca ficaram muito “entusiasmadas ou esperançosas” com a introdução de um
conceito tão eclético como o setorinformal. Basicamente, consideravam que uma agregação de assalariados
sem carteira, autônomos, pequenas unidades de produção familiares, etc. não têm muita consistência analítica.
Para este arcabouço analítico, não ficava claro porque são agregadas essas formas de inserção e unidades
produtivas e qual seria o denominador comum entre elas. Ou, talvez, o único denominador comum fosse a baixa
produtividade, mas essa não seria uma variável capaz de dar sentido a uma agregação um tanto esdrúxula de
setores, unidades de produção e formas de inserção no mercado de trabalho.

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 100 -
Além dessa crítica de caráter muito geral, as correntes marxistas tinham duas linhas básicas de
questionamento.
a) O Setor Informal: uma nova denominação ao velho conceito de “exército de reserva”.
Já antecipamos este tipo de crítica quando analisamos a fragilidade do enfoque do PREALC em outorgar
algum tipo de função ao setor informal no processo de acumulação do setor moderno. Uma das críticas
marxistas vislumbrava no setor informal uma forma peculiar do “exército de reserva”. Se essa era uma
característica dos mercados de trabalho nas economias periféricas era simplesmente porque, no processo de
acumulação em escala mundial, o exército de reserva se tinha concentrado na periferia do sistema. Quando
Marx
tinha estudado o “exército de reserva”, a função do mesmo no ciclo de curto e longo prazo tinha como referência
um modo de produção capitalista fechado. A partir da internacionalização das economias (especialmente depois
da fase que Lênin identificou como imperialista), a acumulação teria que ser analisada em escala mundial e esse
“exército de reserva” se situava, espacialmente, na periferia do sistema.23/ Desde esta perspectiva, maiores
teorizações sobre o suposto setor informal seriam estéreis, dado que se cairia em discussões sobre sua
definição
que não levariam a nenhum lado. O máximo que se poderia realizar seria uma elegante análise descritiva, a partir
da qual só se poderia concluir sobre a estratégia de sobrevivência que um determinado conjunto da população
adota. Contudo, quando se pretende analisar as causas de sua existência e função no processo de acumulação
do setor moderno, as explicações seriam pouco consistentes.
Em realidade, esta crítica de certas correntes marxistas tem um aspecto um tanto injusto e outro
pertinente.
O aspecto injusto diz respeito à caracterização, dado que o PREALC e a própria CEPAL, ao considerar
o setor informal como um excedente estrutural e conjuntural de mão-de-obra, está denominando, de outra forma
que não a clássica terminologia marxista, o “exército de reserva”. Ou seja, seria uma questão semântica e não
de essência. Realmente, o enfoque da CEPAL/PREALC identifica um excesso estrutural de mão-de-obra na
periferia e, devido à necessidade de sobrevivência, esse contingente populacional sobrevive em atividades muito
heterogêneas que se convencionou em denominar de setor informal. O aspecto pertinente da crítica diz respeito
a uma certa fragilidade teórica nas explicações sobre as causas e funcionalidade do setor informal. A escolha de
tecnologias inadequadas (versão cepalina) ou o caráter oligopolizado da estrutura produtiva (versão mais próxima
do próprio PREALC) parecem explicações um pouco ad hoc. A estrutura produtiva nos centros desenvolvidos,
onde não existe setor informal, ao menos em seu núcleo mais dinâmico, não é também um setor
oligopolizado? Acreditar que nos países centrais reina o mundo da concorrência perfeita dos manuais de
microeconomia é uma suposição infantil e irrealista. Por que uma estrutura oligopólica gera um setor informal na
periferia e não no centro? Realmente, o esforço teórico ou analítico para compreender o setor informal nas suas
raízes e no seu rol no processo de acumulação tem um déficit conceitual nas abordagens a la PREALC e, nesse
sentido, a crítica marxista parece pertinente. Os estudos desenvolvidos no âmbito desse programa da OIT são
mais descritivos que analíticos. Os esforços conceituais são, em última instância, tentativas de
classificação e reclassificação de atividades, unidades de produção, formas de inserção no mercado de
trabalho não-convencionais, etc. Não encontramos o que comumente se denomina de uma teoria (hipótese,
categorias, etc.). Em realidade, os trabalhos tanto da CEPAL como do PREALC visam constituir uma alternativa
de interpretação à abordagem mais liberal ou neoclássica como também se auto-imagina como uma opção às
correntes marxistas. Voltamos a salientar que, no caso do déficit analítico, as críticas marxistas parecem
pertinentes.
b)O Setor Informal ou modos de produção particulares articulados com o núcleo moderno.
Uma segunda crítica de inspiração marxista questiona o suposto dualismo implícito na abordagem do
PREALC. Não obstante a diferenciação que os modelos do setor informal se esforçam em transmitir com
respeito aos modelos a la Lewis, ao caráter dualista da sociedade permaneceria ou ainda se acentuaria. Com
efeito, no Modelo de Lewis existem duas sociedades, mas com nexos entre elas. O setor arcaico teria uma
função bem definida no caminho da modernização: abastecer de mão-de-obra barata o setor moderno a um
preço (salário) bem próximo da subsistência. No enfoque do PREALC existem dois mercados de
trabalho e sem nexos entre eles. Qual seria a função do setor informal? Nenhuma. Já propusemos um exercício
um tanto hipotético, mas bem didático: se o setor informal pudesse desaparecer, quais seriam as
conseqüências sobre o setor formal? Nenhuma. No Modelo de Lewis o hipotético desaparecimento do setor
arcaico privaria o setor moderno de uma oferta infinitamente elástica de mão-de-obra e a capacidade de
acumulação cairia, além de induzir a adoção de tecnologias capital-intensivas.
Para a corrente crítica marxista, supor que o setor informal não tem nenhum nexo com o setor moderno
acentuaria a caracterização dualista de nossas sociedades. Segundo esta linha de argumentação, exceto em
casos de tribos indígenas isoladas, todos os setores teriam algum tipo de vínculo com o setor moderno.

Page 99 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 101 -
Pequenas unidades de produção, com mão-de-obra familiar e ocasionalmente assalariada, não seriam,
necessariamente, sinais de uma
sociedade arcaica ou de estratégias de sobrevivência do exército de reserva. Esta corrente identifica nessas
organizações produtivas modos de produção que se distanciam do capitalista clássico. Nos centros
desenvolvidos, o modo de produção capitalista (relação assalariada) seria além de hegemônico exclusivo na
formação social. 24/ Na periferia, as formações sociais tenderiam a apresentar maior heterogeneidade de modos
de produção, sendo o setor capitalista (a grande empresa com relações assalariadas de produção) o
hegemônico. Contudo, outras formas de organização da produção se organizariam em torno dele e com ele
estabeleceriam nexos funcionais. Vamos dar um exemplo muito mencionado na literatura. No setor agrícola, a
grande unidade produtiva é hegemônica. Contudo, convivem com ela pequenas unidades de produção familiares.
Elas geram um mínimo de sobrevivência que é complementado, na ocasião da colheita, com a participação
dessa mão-de-obra familiar, de forma sazonal, na grande unidade de produção. Nesse sentido, estas últimas não
poderiam ser classificadas como um resquício do passado (como no Modelo de Lewis) ou como estratégias de
sobrevivência adotadas pelo excedente estrutural sem nenhum nexo funcional com o setor moderno (como na
abordagem do PREALC). Com exceção de setores verdadeiramente isolados (que teriam um peso demográfico e
econômico extremamente marginal), todas as outras formas de organização de produção estariam articuladas ao
núcleo mais moderno e dinâmico e teriam algum rol no processo de acumulação. Nos termos mais abstratos
que já apresentamos, nas sociedades periféricas, a diferença do capitalismo nos centros, conviveriam e
estabeleceriam nexos funcionais, distintas formas de organização da produção, com um setor hegemônico, que
seria a grande firma com capacidade para fixar preços, mão-de-obra assalariada, tecnologias de ponta, etc.
Colocado nesses termos, o próprio conceito de setor informal careceria de sentido, dado que ao ser o
somatório de um conjunto tão heterogêneo de formas de organização da produção, o resultado pouco ou nada
agregaria em termos analíticos. Como os marxistas tendem a privilegiar, na hora da classificação, as relações
de propriedade e controle dos meios de produção e as relações entre esses proprietários e os recursos
humanos, diferenciar entre uma empresa que emprega assalariados legalizados e outra que emprega
assalariados não
legalizados careceria de rigor. Em ambas, as relações seriam de assalariamento e o modo de produção
capitalista. A questão da legalidade nas contratações não seria relevante na hora da desagregação ou
classificação. Assim, a heterogeneidade que singulariza a periferia seria, em termos analíticos e práticos, melhor
representada por categorias cujo eixo fossem as relações de produção. Nesse sentido, o que comumente se
denomina de setor informal seria mais bem
caracterizado analiticamente como pequena produção mercantil, um conceito bem ancorado na literatura
marxista. Por outra parte, supor uma convivência sem nexos (como no caso do PREALC) entre os distintos
modos de produção ou com uma articulação que se limita ao suprimento de mão-de-obra no caminho ao
desenvolvimento (como no caso dos Modelos a la Lewis), careceria de realismo. A acumulação nos países
periféricos tenderia a tornar perene a convivência funcional entre modos de produção qualitativamente distintos.
III.2. A Crítica Ortodoxa.
a) A Explicação Original.
As correntes mais identificadas com o pensamento de raiz neoclássica tendem a reconhecer a
existência de uma setor informal nos moldes definidos pelo PREALC. Contudo, a explicação sobre as causas
que o engendram mudam radicalmente e, sempre, giram em torno ao excesso de intervenção
estatal,especialmente no mercado de trabalho.
No caso da adoção das tecnologias capital-intensivas em países com excedente estrutural de
mão-de-obra, a viabilização desse viés tecnológico derivaria do fato de os preços relativos dos fatores não
expressarem as escassezes relativas. E por que o vetor de preços relativos dos fatores não representa as
dotações relativas? Simplesmente porque existiria intervenção estatal fixando, por exemplo, um salário mínimo
além do que seria estabelecido se
as forças da oferta e demanda atuassem livremente. 25/ Ao elevar “artificialmente” o preço de um fator se
induziria um viés tecnológico que não guarda correspondência com a dotação relativa dessa economia.
A adoção de tecnologias capital-intensivas também poderia estar na origem de subsídios que tornam
economicamente rentável um viés tecnológico que não corresponde ao perfil de escassezes relativas. Subsídios
ao capital, por exemplo, redundariam nesse tipo de efeito.
No caso de relações assalariadas não legalizadas, o raciocínio é similar. Um salário mínimo muito
elevado em relação à produtividade e/ou encargos trabalhistas que elevam o custo do trabalho seriam as
causas dessa não legalização de vínculos.
Em última instância, podemos sintetizar esta abordagem da seguinte forma: se o mercado atuasse
livremente, não existiria a informalidade.
b) As Interpretações Recentes I: a informalidade como “solução”.

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 102 -
As críticas que mencionamos nos parágrafos anteriores dizem respeito à interpretação de cunho mais
liberal à questão da informalidade levantada pelos trabalhos do PREALC. Contudo, a partir dos anos 80, com a
renovação do pensamento mais ortodoxo, sua predominância no meio acadêmico (a contra-revolução
conservadora) e a sua crescente importância em termos de formulação de políticas, esse questionamento ganha
em importância e abrangência. 26/
Basicamente, a explicação continua não sendo muito sofisticada: excesso
de intervenção estatal. Contudo, certas nuances introduzem perspectivas analíticas ainda mais radicais.
Sempre, desde sua concepção no começo dos anos 70, o setor informal foi assumido como “um
problema”, uma questão que merece ser objeto de políticas e revertida. Seja porque concentra a pobreza, seja
porque não cumpre a legislação, seja porque representa o excedente estrutural e conjuntural de trabalho, etc.,
a questão da presença do setor informal foi um desafio para os gestores de política. O tamanho da informalidade
podia ser, inclusive, um parâmetro para avaliar um governo. Assim como a taxa de desemprego, o percentual da
força de trabalho ocupada na informalidade era um parâmetro revestido de negatividade. Um
aumento do percentual da mão-de-obra ocupada nos espaços informais era um resultado negativo, a ser
explicado e revertido.
c) As Interpretações Ortodoxas Recentes II: a informalidade como uma escolha individual.
A partir das crises dos anos 80, do impasse estrutural no modelo de desenvolvimento baseado na
substituição de importações, as taxas de crescimento do PIB começam a declinar, quando não são negativas, e
a elevação da informalidade na América Latina foi interpretada da forma tradicional: menos crescimento redunda
em mais informalidade, dado que aumenta o excedente de mão-de-obra. Ou seja, a interpretação clássica, que
tem como referência o
enfoque cepalino/PREALC, prevalecia. Contudo, as correntes liberais lançam um outro olhar. O crescimento do
setor informal seria a manifestação do dinamismo que uma economia poderia atingir no caso dos marcos
regulatórios do Estado desaparecerem. Dado o diferencial no desempenho entre a economia formal (em crise
estrutural) e a informal (em rápido crescimento), poder-se-ia concluir que a crise está circunscrita ao espaço
formal. Sem subsídios, crédito, instituições, marcos regulatórios, direitos de propriedade a maior parte das vezes
não adequadamente documentados, etc. a parte não formal da economia e do
mercado de trabalho evidenciavam a potencialidade de crescimento dos países quando as mesmas ficavam fora
das “amarras” da intervenção estatal. A questão que os teóricos do pensamento mais ortodoxo colocavam era:
imagine qual teria sido o tamanho da crise se não tivesse existido o setor informal? Como o impasse do
desenvolvimento poderia ser revertido? A resposta seria simples: estendendo a desregulamentação, toda a
economia atingiria o dinamismo observado nos espaços informais. 27/
A segunda perspectiva analítica está vinculada com a primeira. Historicamente, desde sua origem, a
questão do setor não-moderno (seja nas diferentes versões do Modelo de Lewis ou na perspectiva da
CEPAL/PREALC) era um “problema”, uma herança que tinha e ia ser superada (Modelo de Lewis) ou um
excedente estrutural de trabalho que tinha que ser resolvido (perspectiva cepalina/PREALC), mas, certamente
era um “problema”. No setor não-moderno se concentrava a pobreza, o atraso em termos tecnológicos, a baixa
produtividade, a
ilegalidade, etc. Contudo, se o setor informal evidencia dinamismo não unicamente deixa de ser um “problema”,
senão que passa a constituir uma “solução”. Essa perspectiva se viu reforçada ou complementada por resultados
oriundos de novos quesitos em certas pesquisas domiciliares. Já tratamos este ponto no Capítulo II, quando
abordamos a questão dos indicadores do mercado de trabalho e as fontes de dados, mas voltamos sobre ele
dado que está estreitamente associado com o tema que estamos analisando. Em geral, existia uma tendência a
(des)qualificar certas formas de inserção no mercado de trabalho como precárias. Por exemplo, assalariado
sem carteira de trabalho, auto-emprego, empregado não-remunerado, etc. Por definição, essas seriam formas
de inserção socialmente não desejáveis,
motivo de preocupação e intervenção dos gestores de políticas. Essas formas precárias de inserção eram típicas
dos países sub-desenvolvidos e vinculadas, como estamos estudando, a perspectivas teóricas mais amplas.
Contudo, nos países centrais, o assalariamento tradicional, regulado pelas normativas estatais, que era o status
social exclusivamente aceito até os anos 70, abre espaço para formas de inserção que na literatura se
denominam como “atípicas”. O emprego a tempo parcial, o emprego temporário, o trabalho autônomo no
domicílio, etc. foram
ocupações que ganharam espaço e, em certos países, foram as principais geradoras de emprego a partir dos
anos 80. Na mesma linha de raciocínio da aplicada aos países periféricos, nas economias centrais começa-se a
falar de uma “precarização” dos vínculos trabalhistas. Conviveriam dois espaços, um tradicional (assalariamento
legalizado ou o setor formal, na denominação dada nas economias periféricas) e outro “precarizado” (formas
“atípicas” de emprego ou setor informal na classificação utilizada para o caso dos países sub-desenvolvidos).
Logicamente, o termo “precarização” tem implícita uma qualificação pejorativa. Lá como aqui, as correntes mais

Page 101 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 103 -
liberais começam a tratar de identificar as raízes das formas “atípicas” de emprego e as interpretações são
similares às que estamos expondo para o caso do setor informal nos países periféricos: excesso de intervenção
do Estado ou de instituições (especialmente sindicatos) que elevam os custos do fator trabalho. 28/
Contudo, outra possibilidade pode ser vislumbrada. Os indivíduos escolhem esses tipos de inserção
porque os consideram mais adequados a estratégias ou preferências familiares e/ou individuais. Assim, uma
mulher pode escolher um emprego a tempo parcial visando combinar diversos aspectos: fonte de renda, cuidado
dos filhos pequenos, reconhecimento social, etc.. Um jovem estudante pode procurar empregos temporários em
épocas de férias a fim de poupar e complementar o financiamento de seus estudos. Nessa perspectiva,
pesquisas
começam a serem desenvolvidas para tentar quantificar que parte dessas formas “atípicas” de emprego não são
desejadas pelos indivíduos que as possuem. Os resultados são muito heterogêneos entre países, mas, em
geral, induzem a pensar que essas formas atípicas não são sempre e em qualquer circunstância alternativas de
inserção precárias ou não desejadas. Em não poucas ocasiões são procuradas. Vamos dar, a título de
ilustração, vários exemplos. Em 1994, em uma pesquisa levada adiante pela Comissão Européia, em 11 países
(todos
europeus), só 31% dos empregados a tempo parcial desejariam ter um emprego a tempo integral. 29/ Contudo,
como afirmamos, a variabilidade é muito grande. Na Holanda, por exemplo, unicamente 8% dos empregados a
tempo parcial desejariam ter um emprego a tempo integral, enquanto em Portugal esse percentual se eleva para
62%. Assim, esse diferencial induz a pensar que neste último país o trabalho a tempo parcial mereceria ser
qualificado como “precário”, enquanto na Holanda parece ser, majoritariamente, uma opção. As distâncias
entre homens e mulheres são, também, acentuadas, o que leva a considerar que a opção (quando existe) é uma
decisão familiar e não individual. Em Portugal, por exemplo, 100% dos homens que trabalham a tempo parcial
desejariam ter um emprego a tempo integral. No caso das mulheres, o percentual cai para 40%. Na Holanda, só
7% das mulheres que têm um emprego a tempo parcial prefeririam possuir um outro a tempo integral. Na
Dinamarca, esse percentual é também muito reduzido (8%). Ou seja, nestes dois últimos países existem
indícios que sugerem que o trabalho a tempo parcial é uma opção, especialmente entre as mulheres.
No caso do Brasil, a polêmica foi alimentada por um quesito contido nas PNADs de 1989 e 1990. 30/
Essa pesquisa de domicílio pergunta aos indivíduos ocupados que não eram nem estatutários nem possuíam
carteira de trabalho assinada, se desejariam mudar para um emprego que proporcionasse carteira de trabalho
e o resultado (PNAD/89) foi: 48% não tinham interesse. 31/ No caso dos autônomos, 60% não tinham interesse
em alterar sua inserção trabalhista por uma relação assalariada com carteira. No caso das mulheres, quase 54%
das que não tinham interesse em mudar seu status argumentavam que estavam satisfeitas com o trabalho que
tinham e 24% sustentavam que não tinham interesse porque
tinham que cuidar dos afazeres domésticos. Em geral, o percentual de indivíduos que por uma ou outra razão se
sentiam satisfeitos com seu status ou, ao menos, não trocariam o mesmo por uma inserção formal, era
suficientemente elevado para dar sustentação empírica às teses argüindo que o mercado informal ou, no mínimo,
uma parte majoritária dele, era uma opção dos indivíduos ou das famílias. A flexibilidade, especialmente em
termos de horário, seria particularmente valorizada no caso das mulheres e a inserção “atípica” seria funcional às
estratégias familiares, onde a divisão do trabalho (entre atividades mercantis e domésticas) adquiria (por
questões culturais) um viés por gênero.
d) As Interpretações Ortodoxas Recentes III: fundamentações analíticas da informalidade como uma escolha
individual.
Esses resultados reforçariam os argumentos que inibem a qualificação de “precário” a todo e qualquer
emprego que não seja assalariado a tempo integral e por uma duração de tempo indefinida. Nesse sentido,
poder-se-iam generalizar esses argumentos para o setor informal dos países periféricos e os dados que já
apresentamos para o caso brasileiro estão aí para se supor esse paralelo. Os teóricos mais ortodoxos se
perguntaram se formas de inserção não-formais (ou seja, outras formas de ocupação que não assalariado com
carteira de trabalho
assinada) não constituiriam uma opção dos indivíduos, a exemplo dos resultados encontrados em países da
OCDE. Quais são as justificativas teóricas para formas de inserção que a intuição consideraria como não
desejadas? As possíveis respostas são diversas e vamos só a título de ilustração, apresentar quatro.
Poder-se-ia situar uma das origens da informalidade na atitude diante do risco. Um indivíduo, com muita
aversão ao risco, poderia concentrar ou direcionar a sua carreira profissional no setor público estatutário, que
apresenta risco quase
nulo. Outra pessoa, com preferência pelo risco, poderia escolher ou uma atividade autônoma ou tornar-se um
empregador. 32/
Uma segunda justificativa também tem como referência modelos rotineiros em finanças. Uma alternativa
que pode otimizar as aplicações nos mercados financeiros é a diversificação, combinando ativos com diversos

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 104 -
graus de risco. Se considerarmos que o “agente” que aloca trabalho em diversas formas de inserção é a família,
esta pode escolher combinações entre atividades com diferentes graus de risco. Um indivíduo pode optar por
empregos com risco muito elevado (autônomo ou empregador) e outro com risco mínimo (empregado público
estatutário). Ou seja, diversificar-se-ia, mas, em todo caso, o corolário seria o mesmo: formas de inserção no
mercado de trabalho que comumente se classificam como de informais seriam opções racionais,
voluntariamente escolhidas pelos indivíduos. 33/
Uma terceira alternativa está vinculada a uma escolha que tem como referência os ganhos decorrentes
dos dribles às normas legais. O caso mais representativo é o assalariado que opta, em negociação com seu
empregador, por não declarar o vínculo (não assinar a carteira de trabalho). Nesse caso, seu salário líquido
pode aumentar e o custo para o empresário diminuir. Ou seja, ambas as partes podem sair beneficiadas. 34/
Voltamos, neste caso, a ter uma raiz similar à que mencionamos nos dois casos anteriores: a informalidade é
uma opção, livre e racionalmente escolhida.
Por último, uma quarta justificativa pode fazer apelo aos argumentos que situam a condição de informal
em uma escolha feita exclusivamente em preferências individuais. Por exemplo, a escolha de uma ocupação
autônoma devido a não se desejar “ter um chefe”.
Em todos os casos, os tipos de inserção no mercado de trabalho caracterizados corriqueiramente
informais não seriam outra coisa que opções escolhidas pelos indivíduos ou famílias como forma de maximizar
seu bem-estar. Olhado desde essa perspectiva, o setor informal não mereceria ser adjetivado de forma negativa
ou pejorativa nem, logicamente, ser alvo de políticas públicas. Coibir a informalidade seria reduzir o leque de
escolhas dos indivíduos e famílias, com conseqüências negativas sobre o bem-estar.
e) Do setor Informal à Economia Subterrânea ou Economia Negra: o viés ideológico das interpretações
liberais.
Observamos que as explicações mais ortodoxas sobre a origem do setor informal giram em torno de
dois eixos: a intervenção do Estado e as escolhas individuais. A ênfase dada ao papel do Estado na geração da
informalidade talvez tenha sido uma das causas de transfigurar o conceito original do setor informal em um leque
muito mais amplo de atividades cujo denominador comum é, tão somente, o não cumprimento das normas
legais.
Esse alargamento da informalidade ocorreu em paralelo com uma certa popularização das teses mais
ortodoxas a partir dos anos 80. Nessa linha de argumentação, informalidade era o conceito tradicional do setor
informal, mas também das transações econômicas não contabilizadas do setor moderno e, em não poucas
ocasiões, também eram incluídas as atividades ilícitas (como tráfico de drogas, tráfico de armas, etc.). Ou seja,
em um mesmo espaço eram incluídas desde as pequenas firmas de fundo de quintal que empregavam
exclusivamente mão-de-obra familiar até parte da oferta e transações das grandes firmas, passando pela
produção e comercialização de toda gama de ilícitos. Logicamente, essa agregação fugiu radicalmente do
“espírito” original com que foi introduzida a caracterização do setor informal. Se este já mereceu críticas pela sua
ambigüidade e heterogeneidade, ao ser ampliado de forma radical a partir do único critério de contornar o marco
legal, essa extensão transmite um claro viés ideológico. A questão era agregar um conjunto de setores cujo
único e exclusivo denominador comum era fugir das normas legais. Definido dessa forma, as causas do mesmo
seria o excesso de intervenção estatal. Não é necessária muita sofisticação analítica para concluir que estamos
diante de uma transparente tautologia. Define-se um setor a partir da agregação de atividades que não cumprem
as normativas legais para depois situar o suposto excesso de normativas legais como origem do setor que foi
assim definido.
Em termos analíticos, este tipo de interpretação, que mistura, de forma pouco criteriosa, o setor informal
clássico com a economia negra ou subterrânea do setor moderno e pode até incluir as atividades ilícitas,
carece de qualquer sustentabilidade conceitual. É difícil não ver, na raiz desta perspectiva, a tradicional
desconfiança das correntes mais ortodoxas a qualquer tipo de intervenção do Estado. As normas legais e as
instituições, exceto em casos
concretos e muito circunscritos (externalidades ou as falhas de mercado em geral), gerariam mercados negros,
tecnologias pouco compatíveis com a dotação relativa de fatores, contratações de forma não legal, etc. que
seria, justamente, o denominador comum dessa nova definição de setor informal. Um viés ideológico parece ser
a única possibilidade de justificar este tipo de abordagem.
IV. O Determinismo Tecnológico na Explicação da Informalidade.
IV.1. O Small is Beautiful dos anos 90.
Se o viés ideológico parece ser a única variável capaz de entender uma agregação cujo único
denominador comum é o não cumprimento das normas legais, nos anos 90 uma outra interpretação também
tentou renovar as reflexões sobre o setor informal. Neste caso, o denominador comum seria o tamanho da
unidade de produção e a base tecnológica prevalecente em cada momento do tempo.
Em termos de antecedentes intelectuais, este marco interpretativo tem como antecedente um livro

Page 103 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 105 -
publicado originalmente em 1973 e que gozou de uma certa popularidade entre o público não especializado.
Nesse ano, E.F. Schumacher publica Small is Beautiful. Economics as if People Mattered, onde se fazia
uma apologia das pequenas unidades de produção, das tecnologias leves, etc. visando uma humanização dos
processos produtivos e do mundo em geral. 35/ Realmente, a proposta de Schumacher foi uma tentativa de criar
um novo
paradigma, no qual seriam sintetizadas diversas correntes de pensamento, quase todas elas sumamente
ecléticas (budismo, Ganhdi, etc.). Não obstante a sua popularidade, o texto esteve bem longe de gerar um novo
paradigma e ficou caracterizado como uma obra “alternativa”, condenada a ser mencionada como um dado
curioso na história das idéias.
Contudo, nos anos 90, as propostas centrando esperanças nas pequenas unidades de produção
ganham um novo fôlego. Nesta ocasião, contudo, os argumentos já não são tão ecléticos, os autores gozam de
certa aceitabilidade nos meios acadêmicos e, sobretudo, os objetivos são bem mais modestos e estão bem
longe de pretender gerar um novo paradigma.
Em 1984, M.J. Piore e C.F. Sabel publicam um livro que se tornaria um divisor de águas nas discussões
sobre formas de organização da produção, flexibilidade e mercado de trabalho. 36/ Basicamente, a proposta de
Piore e Sabel coloca as pequenas unidades de produção como uma alternativa viável e, até, preferível, de
desenvolvimento econômico. Realmente, eles resgatam uma tradição que tinha sido marginalizada no debate
sobre as alternativas eficientes de organizar os processos produtivos e que tinham uma referência incontornável
em Alfred Marshall e seus estudos, de fins do Século XIX na Inglaterra, sobre o que ele denominou de distritos
industriais. 37/ Em última instância, a nova perspectiva enfatizava a possibilidade de pequenas unidades de
produção pudessem não unicamente ser viáveis economicamente senão constituir o centro de dinamismo de
regiões modernas, bem integradas aos mercados mundiais. 38/
Em geral, o apoio às micro, pequenas e médias empresas goza, hoje, de um consenso pouco usual.
Contudo, a esse consenso convergem correntes cuja interpretação do processo histórico dista de ser
consensual. Vamos sintetizar essas distintas perspectivas.
A primeira corrente, cujas raízes talvez estejam nas primeiras formulações dos Distritos Industriais de
Marshall, sustenta que as pequenas e médias empresas sempre tiveram relevância e fizeram parte do núcleo
dinâmico das economias modernas.
Uma segunda corrente estabelece um nexo entre o ambiente (especialmente, ainda que não
exclusivamente, à tecnologia) e as formas de organização das firmas. A grande firma, que nucleava grandes
contingentes de assalariados e produzia uma oferta uniforme, foi funcional para um período histórico
(especialmente desde o início do Século XX até os anos 80) que, na literatura, se denomina de fordismo. 39/
Grandes contingentes de trabalhadores
com pouca qualificação, realizando tarefas mecânicas na linha de produção, etc. teriam sido a base dos ganhos
de produtividade a partir das primeiras décadas do Século XX. Essa funcionalidade da grande firma não seria
intrínseca à mesma, ou, em outros termos, seria datada no tempo. 40/ Com o advento de novas tecnologias, a
rapidez nas mudanças tecnológicas e um ambiente macroeconômico muito mais incerto, as grandes firmas
deixaram de ser funcionais ou a forma mais eficiente de organizar a produção. As pequenas firmas gozariam de
uma flexibilidade que as tornaria muito mais adaptadas ao novo contexto. Em realidade, tanto a organização em
pequenas unidades de produção como formas novas de
interações entre firmas (sub-contratações, terceirização, etc.) seriam o exemplo de formas de organização
flexível mais adequadas à nova base tecnológica e ao ambiente macroeconômico.
Assim, seja porque historicamente nunca a grande firma teria monopolizado o setor mais dinâmico e
moderno das economias, seja porque a demanda por flexibilidade as teria tornado mais funcionais à nova etapa
histórica aberta em meados dos anos 80, o certo é que as correntes confluem para um diagnóstico: as
pequenas unidades de produção seriam, hoje, muito mais adequadas que a grande firma para liderar a
modernização das economias.
Além dessa maior compatibilidade entre a nova base tecnológica e oambiente macroeconômico e as
pequenas unidades de produção, estas últimas teriam, no mínimo, mais duas vantagens. Por um lado seriam
mais intensivas em trabalho, singularidade que teria como resultado uma elevação do impacto do crescimento
na demanda de trabalho (uma elasticidade emprego-produto mais elevada) e, nesse sentido, contribuiria para
reduzir o desemprego. 41/ Por outro lado, na medida em que pequenas firmas representam uma
desconcentração do estoque de riqueza (capital, por exemplo), o fluxo de renda tenderia a ser menos
concentrado. 42/
Nesse sentido, as vantagens da pequena firma seriam tanto em termos econômicos (uma melhor
adequação à nova base tecnológica e ao ambiente macroeconômico) como em termos sociais (maior geração de
empregos por unidade de produto e um fluxo de renda menos concentrado).
A funcionalidade das pequenas firmas não unicamente estaria reduzida à unidade de produção em si,

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 106 -
senão, em geral, às novas formas de organização de produção. As sub-contratações, a desverticalização, etc.,
inclusive por parte das antigas grandes firmas, seriam estratégias para adequar-se ao novo contexto. Ou seja,
existiria uma tendência para realçar a nova relevância histórica das pequenas unidades de produção.
Contudo, o leitor pode, neste momento, levantar uma questão pertinente: que relação tem essa
discussão com a nossa análise sobre as distintas interpretações do setor informal ? A questão é que, nos anos
90, paralelamente ao entendimento do setor informal como toda atividade ou vínculo trabalhista que fugisse da
legislação, uma outra linha argumentativa ganhou espaço no debate. Esta identificava, a maioria das vezes
implicitamente, que todo trabalho autônomo era sinônimo de informalidade e que toda pequena unidade de
produção (da qual o emprego por conta-própria é o limite) merece ser associado, sem mediações, com a
informalidade. Realmente, o único ponto em comum entre os marcos analíticos originais (a la PREALC) e a nova
versão do small is beautiful gira em torno da questão da pequena unidade de produção, que era mencionada
como sendo hegemônica tanto nas interpretações clássicas da informalidade como nos novos marcos analíticos.
Porém, aí acaba o ponto em comum. Em realidade, poderíamos até argumentar que não existe ponto em
comum, dado que nas interpretações mais corriqueiras do setor informal sempre se identificava a informalidade
como tendo base produtiva usual na micro e na pequena unidade de produção, mas nunca se sustentou que
toda e qualquer pequena unidade de produção deveria, necessariamente, integrar o setor informal.
Aqui voltamos a encontrar uma agregação pouco rigorosa, na mesma linha daquela que agrega como
“informal” toda a economia subterrânea ou negra, inclusive a levada a cabo por empresas do setor formal ou a
realizada no marco de atividades ilícitas. Agora, toda e qualquer pequena unidade de produção ou trabalho
autônomo seria qualificado como informal.
IV.2. Uma Nova Informalidade ou o Aumento da Heterogeneidade da Informalidade?
a) Uma Estilização dos Movimentos Conjunturais nos anos 90.
Em realidade, essa agregação de duvidoso rigor que surge nos anos 90 não estava ancorada unicamente
na popularização da literatura que outorgava um papel de crescente importância às pequenas unidades de
produção. Os dados no Brasil sugeriam que mudanças qualitativas no universo daquele que historicamente se
denominou de setor informal podiam estar ocorrendo. Com efeito, que nos diziam as interpretações
cepalinas/PREALC do setor informal? Simplesmente que, ao concentrar o excedente estrutural e conjuntural de
mão-de-
obra, na fase macroeconômica ascendente, o mesmo deveria reduzir-se e, na fase descendente, aumentar. A
partir do começo dos anos 90, esse movimento estilizado não parece compatível com os dados (ver Gráfico I)
(Gráfico I)
Trajetória da Ocupação.
1989-2002.
(Assalariados com Carteira, Sem Carteira e Autônomos)
PME
Base 1989 = 100
Para não entrar em polêmicas, vamos assumir uma classificação corriqueira e que é relativamente aceita
no Brasil. O setor formal está constituído pelos assalariados com carteira de trabalho assinada. Os
assalariados sem carteira de trabalho assinada fazem parte do espaço informal. No caso dos autônomos, sua
inclusão em um ou outro setor é mais complexa, dado que sua heterogeneidade é grande, ao incluir desde o
consultor do mercado financeiro até o indivíduo que ganha seu sustento mediante a venda de algum bem em um
ponto de ônibus em uma grande aglomeração urbana. Existe um consenso sobre a pertinência de
incluir o primeiro (o consultor do mercado financeiro) no mercado formal e o segundo no mercado informal. 43/
Dividir os autônomos em dois sub-conjuntos requer definir alguma (ou algumas) variável a fim de serem utilizadas
como parâmetros para realizar essa diferenciação. Nas pesquisas mais específicas as rotineiramente
mencionadas são: contribuição ou não para a previdência social, nível de educação, nível de renda. 44/ Porém, o
mais usual (ainda que possa ter questionado o seu rigor analítico) consiste em qualificar todos os autônomos
como
fazendo parte do setor informal, dado que aqueles que estão ligados ao setor moderno são residuais. 45/
O período entre os anos de 1990 a 1992 foi de notório e inesquecível desaquecimento. A variação do PIB
foi de -4,35% (1990), -1,03% (1991) e -0,54% (1992). O saldo desses três anos foi de -5,66% no nível do produto.
Nessa conjuntura, como nos sugerem os modelos clássicos, o estoque de assalariados com carteira tende a
cair e os espaços informais a se incharem. Isso foi o que efetivamente ocorreu. Entre janeiro de1991 e igual mês
de 1993,o nível de assalariados com carteira no Brasil Metropolitano caiu 7,11% e, simultaneamente,
elevou-se o número de assalariados sem carteira de trabalho assinada (+14,83%) e o estoque de ocupados por
conta-própria (+6,73%). 46/ Esse movimento do nível de emprego por formas de inserção parece corresponder às
expectativas quando a referência são os modelos tradicionais. Os rendimentos também parecem guardar
correlação com os corriqueiros marcos de interpretação (ver Gráfico II). Caem em todos os casos, mas a queda

Page 105 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 107 -
é mais acentuada nos assalariados sem carteira e nos autônomos, devido tanto a menores proteções legais
(como o
salário mínimo ou os mecanismos de indexação garantidos por Lei e muito importantes em conjunturas de
elevadas taxas de inflação como a vigente naquela época) como a um maior contingente de ocupados que
disputa uma renda menor.
Gráfico II
Rendimentos Reais Assalariados com Carteira, Sem carteira e
Autônomos
1989-2002.
PME
Base 1989 = 100
Contudo, a partir de 1993, uma ruptura com os paradigmas teóricos parece evidente. Superada a crise
de 1990-92, a economia evidência sinais de aquecimento. O PIB apresentou crescimento em 1993 (+4,93%) e,
sob o impulso da estabilização de preços originada pelo Plano Real, o percentual de aumento atinge 5,9% em
1994. A estratégia de estabilização adotada nesse ano, que tinha como âncora nominal a taxa de câmbio,
somada a uma abertura da economia local à concorrência internacional, tornou o Brasil muito vulnerável aos
choques externos. Em um ambiente internacional de sucessivas crises em importantes países (México, em
1995, Sudeste Asiático, em 1997, Rússia, em 1998), entre 1995 e 1998, o Brasil apresenta ciclos espasmódicos
de crescimento e a conjuntura se singulariza por um movimento de stop-and-go. De toda forma, ainda que o
desempenho nesse período possa ser classificado de modesto, entre 1993 e 1998 a taxa média anual de
crescimento do PIB foi de 3,49%. Em uma
conjuntura de aquecimento do nível de atividade, ainda que, voltamos a salientar, a mesma venha a ser
caracterizada de medíocre, esperava-se um movimento das variáveis do mercado de trabalho que
acompanhasse o perfil estilizado pelos principais modelos: queda do emprego no setor informal, aumento do
estoque de assalariados formais e elevação no rendimento em todos os setores.
Contrariamente, a retomada do nível de atividade posterior à crise de 1990-92 registra um forte aumento
da ocupação entre os assalariados sem carteira de trabalho assim como entre os autônomos. Paradoxalmente,
o número de assalariados com carteira parece estagnado (ver Gráfico I). Entre 1993 e 1998, as taxas de variação
na ocupação foram de: assalariados com carteira (-2,89%), assalariados sem carteira (17,80%) e conta-própria
(20,43%). Evidentemente, essas trajetórias relativas não se enquadravam nos modelos tradicionais. Em um
contexto de crescimento, por mais modesto que este fosse, não se podia esperar que os espaços mais
dinâmicos fossem os que comumente são identificados como sendo os que abrigam em seu seio as formas de
inserção informais. Essa dinâmica, já de por si chamativa, aprofundava os interrogantes quando a referência era
a evolução dos rendimentos. Não obstante a elevação no contingente de indivíduos ocupados, fato que deveria
induzir ou uma queda ou uma elevação extremamente modesta nos ganhos, os rendimentos nos espaços
informais ultrapassam em dinamismo a trajetória observada no mercado formal
(ver Gráfico II). Em termos reais, entre 1993 e 1998, a elevação do poder de compra nos rendimentos foi de:
assalariados com carteira (23,80%), assalariados sem carteira (47,08%) e autônomos (63,49%).
Logicamente, algum esforço interpretativo devia ser realizado, visto que essa dinâmica parecia pouco
compatível com os movimentos estilizados pelos modelos tradicionais. Basicamente, foram três as respostas
ensaiadas.
As interpretações mais liberais ou ortodoxas, aquelas que identificavam no excesso de intervenção
Estatal a origem do setor informal e lembremos que, nessa abordagem, o setor informal englobava todo e
qualquer coisa que não fosse legalizada, o crescimento e o dinamismo dos espaços informais surgia da
elevação nos custos das novas normas legais. Como esse era o primeiro ciclo de crescimento posterior à
Constituição de 1998 que, em princípio, tinha elevado os custos da legalização dos vínculos trabalhistas, parecia
“evidente” que a origem da crescente informalização em um contexto de nível de atividade em expansão era a
excessiva intervenção Estatal. Em termos de projeção e recomendações de política, a questão estaria centrada
na redução dessa presença, fato que propiciaria que esse dinamismo circunscrito aos espaços que não
cumpriam a legislação se estendesse a toda a economia. Inclusive, a queda na intervenção do aparelho estatal
possibilitaria que o setor formal aumenta-se quase automaticamente, visto que a informalidade era uma forma de
contornar a carga
tributária, os encargos sociais e os custos vinculados ao cumprimento da legislação tão elevados que não
tornariam as atividades atraentes economicamente.
Uma segunda interpretação está vinculada às abordagens que faziam um nexo entre o ambiente
macroeconômico e, especialmente, tecnológico e as formas de organização das firmas. O Brasil estaria vivendo
um ambiente de incerteza radical, com uma enorme variabilidade no nível de atividade (representado pelo
mencionado movimento de stop-and-go) fato que induziria uma demanda por flexibilidade. 47/ Esta pode ser

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 108 -
definida como uma forma de reduzir custos diante de alterações bruscas e não previstas do ambiente. Nesse
sentido, as contratações informais (assalariados sem carteira de trabalho assinada) reduziriam custos, dado
que, por exemplo, diante de um desligamento, não seria necessário o pagamento do mês de aviso prévio.
Poder-se-ia desenvolver os mesmos argumentos no caso das contratações de autônomos. As firmas estariam
substituindo um contrato trabalhista por outro comercial (desligam assalariados com carteira e contratam
mão-de-obra com outros vínculos, como consultores, autônomos, cooperativas, etc. podendo até ser os mesmos
empregados
desligados). Os custos do ajuste de um contrato comercial tende a ser menos oneroso que um contrato
trabalhista. Assim, poder-se-ia argüir que o crescimento da informalidade nos anos 90 está vinculado, em parte,
a novas formas de organização das firmas cuja origem está na procura de flexibilidade devido ao contexto de
incerteza. Observemos que estamos diante de um espaço de informalidade que é qualitativamente diferente do
tradicional. Este espaço teria
uma relação simbiótica com o núcleo dinâmico. Aliás, seria uma parte do tradicional espaço formal que, devido à
uma mudança no ambiente macroeconômico, passou à não legalidade (assalariados sem carteira) ou a novos
status (de assalariados formais para autônomos).
Uma terceira linha de argumentação, que também vincula o dinamismo do setor informal ao ambiente,
está associada a novas formas de organização das firmas devido a alterações da base tecnológica. Como já
salientamos, toda uma corrente interpretativa estabelece uma estreita correlação entre as formas de organização
das firmas e a base tecnológica e, nesse sentido, as novas tecnologias estariam beneficiando as pequenas
unidades de produção. As grandes firmas estar-se-iam reorganizando (a reengenharia administrativa),
desagregando-se, sub-contratando, etc.. O corolário, neste caso, é similar ao caso anterior, sendo a única
diferença que, agora, a origem das novas formas de organização obedecem a questões ligadas à base
tecnológica.
Contudo, seja por uma demanda de flexibilidade oriunda da incerteza do ambiente seja pela maior
necessidade de adequar a estrutura das firmas à nova base tecnológica, o ponto central é: o surgimento de um
novo espaço, com características aparentemente similares ao setor informal clássico (primam as pequenas
unidades de produção, os ocupados por conta-própria, assalariamento não legalizado, etc.) mas com diferenças
qualitativas com respeito à informalidade tradicional. Agora, o nível de ocupação não estaria determinado pelo
“excesso
conjuntural ou estrutural” de mão-de-obra senão por uma genuína demanda das empresas do setor moderno.
Compreende-se, assim, como a “informalidade” pode estar aumentando em um contexto de crescimento, um
aspecto que, como diversas vezes salientamos, não parece compatível com as correlações usualmente
estilizadas nos modelos tradicionais.
b) A Crescente Heterogeneidade.
Essa interpretação da informalidade dos anos 90, em realidade, merece uma caracterização particular.
Já não poderíamos nos referir a um excedente estrutural e conjuntural de mão-de-obra (versão PREALC) ou a um
setor arcaico provedor de recursos humanos para o setor moderno (versão Lewis). Englobar, dentro de um
mesmo conceito ou definição, o trabalhador autônomo que exerce alguma atividade (em realidade, qualquer
atividade) para assegurar sua sobrevivência e o consultor cujas funções estão diretamente ligadas ao setor mais
moderno, carece de sentido. Se nas interpretações tradicionais os espaços informais tinham alguma lógica, este
surgia devido ao fato de existir um denominador comum que consistia na origem última de suas atividades (a
procura de uma renda mínima para a sua sobrevivência). A “nova” informalidade surgiria das novas formas de
organização das firmas do setor moderno diante de mudanças no entorno tecnológico e macroeconômico.
Esse aumento da heterogeneidade de classificações estatísticas antes mais ou menos aceitas (como
assalariados sem carteira de trabalho assinada e autônomos) como sendo sinônimos de setor informal hoje já
não teriam essa identificação imediata. Por exemplo, o crescimento dos ocupados por conta-própria nos anos 90
não necessariamente significaria mais ocupados em atividades de baixíssima produtividade, cuja única função é
assegurar um nível mínimo de renda para quem a exerce. Cortes (por nível de educação, rendimento, etc.) em
agrupamentos deveriam se tornar imprescindíveis.
Poderíamos imaginar um paralelo com a polêmica que sintetizamos em parágrafos anteriores sobre a
precarização do mercado de trabalho nos países centrais. Se, nessas economias, um trabalho a tempo
parcial ou temporário não necessariamente é sinônimo de inserção precária, um emprego autônomo nos países
periféricos já não mais poderia ser identificado como sendo a manifestação de um excedente estrutural ou
conjuntural de mão-de-obra.
V. Informalidade e Desemprego.
Já mencionamos que a existência de desemprego voluntário é um fenômeno difícil de explicar quando as
causas últimas da informalidade são atribuídas à inexistência de proteção social abrangente e um excedente de
trabalho. Sendo o setor informal assumido como um espaço que abriga aqueles que não podem ser

Page 107 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 109 -
incorporados ao setor moderno, todo desocupado poderia ingressar no setor informal e aí encontrar algum tipo de
atividade que lhe
assegurasse uma renda mínima. Nessa linha de argumentação, todo desempregado está nessa situação de
forma voluntária.
O impasse teórico é claro e não dá muitas margens a controvérsias. Tanto os Modelos a la Lewis ou nas
abordagens do PREALC esta questão é deixada em aberto, não foi mencionada. Nessas abordagens não existe
espaço para o desemprego.
Não obstante, os enfoques do PREALC não fizeram face aos desafios teóricos que impunha a questão
da convivência do desemprego aberto paralelamente à existência de um setor informal de livre entrada. Existem
vários artigos que, no fim dos anos 60 e 70, ou seja, antes mesmo dos primeiros artigos produzidos no âmbito
da OIT para África, introduziram um novo paradigma (um “novo olhar”) nas análises dos mercados de trabalho
nos países periféricos. Esses novos modelos eram herdeiros naturais do Modelo de Lewis, mas
incorporando uma sofisticação cujas conseqüências em termos teóricos vão além do próprio mercado de
trabalho nas economias subdesenvolvidas, chegam aos esforços interpretativos dos fluxos migratórios e, já na
década de 80, inspiram modelos que tentam explicar os fenômenos de segmentação do mercado de trabalho
nos países centrais. Vamos analisar com particular detalhe este conjunto de modelos.
V.1. O Modelo de Harris e Todaro.
O Modelo original de Lewis, não obstante suas contribuições em termos de compreender a dinâmica do
mercado de trabalho em países subdesenvolvidos, deixava várias insatisfações. Pela sua importância,
mencionaremos duas.
Em geral, os fluxos de mão-de-obra do setor tradicional ao setor moderno (um movimento crucial nos
Modelos à la Lewis) são produto de um excedente de trabalho no setor identificado como “arcaico”. Na medida
em que o setor moderno precisa de mão-de-obra o mesmo a encontra nos espaços nos quais a produtividade
marginal do trabalho é próxima de zero. Todavia, o desemprego aberto é uma característica das regiões mais
desenvolvidas dentro dos países periféricos. Aqui estamos diante de uma aparente contradição entre essa
afirmação e o intuitivamente esperado. Tomemos, para ilustrar, o caso do Brasil. O Nordeste do país é uma
região que nitidamente expulsa mão-de-obra em direção aos centros desenvolvidos do centro-sul do país. Porém,
quais são as UFs que apresentam as maiores taxas de desemprego? A intuição diria que seriam encontradas no
Nordeste. Contudo, a taxa média de desemprego dessa região é de 8,69%, largamente inferior à verificada, por
exemplo, em São Paulo (12,37%). O Distrito Federal, outro espaço que recebe grandes fluxos migratórios do
Nordeste, apresenta, também, uma taxa de desemprego (13,78%) manifestamente superior à média nacional
(9,72%). Observemos que existe uma aparente contradição uma vez que, se supomos, realisticamente, que
quanto maior for a taxa de desemprego menor será a probabilidade de um indivíduo vir a conseguir um posto de
trabalho, os fluxos migratórios se dirigem justamente às regiões onde as possibilidades de encontrar um
emprego são menores.
A segunda questão diz respeito ao emprego, renda e qualidade de vida nos espaços que recebem esses
fluxos migratórios (regiões mais ricas ou as grandes aglomerações urbanas). Em geral, o migrante, inicialmente,
só logra uma inserção muito instável no mercado de trabalho e a qualidade de vida (violência, falta de acesso
aos serviços básicos, déficit habitacional, etc.) é muitas vezes inferior daquela que tinha em seu lugar de
origem.
Essas duas características são pouco compatíveis com o Modelo de Lewis. Os migrantes, em lugar de
se dirigir a espaços que precisam imediatamente de seu trabalho e serem integrados rapidamente ao setor
mais dinâmico e moderno, encontram probabilidades de encontrar emprego em espaços que são, em qualidade,
inferiores às verificadas nas áreas de origem e com rendimentos e nível de vida que também não justificariam o
fluxo migratório.
O Modelo conhecido na literatura como de Harris e Todaro foi desenvolvido no fim dos anos 60 e começo
dos 70 por esses dois economistas em artigos que hoje já são clássicos. 48/ Podemos resumir esse tipo de
abordagens da seguinte forma.
No setor moderno, muitas vezes identificado como setor formal, os salários são mais elevados que no
setor tradicional ou setor rural. Esse diferencial de rendimentos origina um fluxo migratório de tal magnitude que,
no limite ou na margem, deveria provocar quedas na renda do setor urbano até que ambos os rendimentos (do
setor formal e informal) se igualassem. Suponhamos que essa convergência não se produz e aqui podemos
“apelar” a alguma variável (como salário mínimo ou sindicatos) que torne os salários do setor moderno ou formal
inflexíveis ao fluxo migratório. Ou seja, existirá um diferencial permanente de renda entre o setor moderno
(destino final de todo migrante) e o setor tradicional (setor de origem do fluxo migratório).
Como é tomada a decisão de migrar? Dado que não existe certeza de encontrar um emprego no setor
moderno ou formal, estamos diante de uma decisão tomada em um ambiente de risco e no qual temos que
introduzir a questão da probabilidade. Logicamente, estamos diante de um rendimento no lugar de destino (o

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 110 -
salário do setor moderno) que deve ser ponderado pela probabilidade de auferir o mesmo (a esperança do ganho,
em termos estatísticos) e o candidato ideal para ser assumido como a probabilidade de ocupar um posto
de trabalho no setor formal é a taxa de desemprego. Quanto maior esta menor será a probabilidade e, assim, a
taxa de desemprego vai regular o fluxo migratório. Quando a taxa de desemprego aumenta reduz-se a esperança
de ganho no setor formal (que é o salário do setor formal ponderado pela probabilidade de ser obtido) e o
contingente de indivíduos que se dirige aos espaços modernos se reduz. Quando o setor moderno cresce,
demanda mais trabalhadores, cai a taxa de desemprego, aumenta a esperança dos ganhos, se eleva o fluxo
migratório, aumenta a taxa de desemprego, cai a esperança e cai o fluxo. Assim, teríamos
uma taxa de desemprego de equilíbrio que iguala os ganhos (sempre em termos de esperança) dos setores
moderno e tradicional. Quanto maior o diferencial de ganhos maior terá que ser a taxa de desemprego de
equilíbrio, de tal forma a igualar as esperanças dos ganhos.
Porém, o problema é mais complexo, dado que não existem três situações possíveis (estar empregado
no setor tradicional, ser desempregado nos espaços modernos ou ser ocupado no setor moderno) senão quatro,
visto que o migrante pode estar empregado no setor informal, este situado nos espaços modernos. Em princípio,
o objetivo de todo migrante, como já salientamos, consiste em estar ocupado no setor moderno (que,
lembremos, é sinônimo de setor formal). A questão é: quando migra, porque ficar desempregado se ele tem
possibilidades de encontrar trabalho no mercado informal? Aqui podemos imaginar duas possibilidades, ambas
muito tratadas na literatura. Ficar na situação de desemprego eleva as chances de ocupar uma vaga no setor
formal, dado que se tem mais tempo para procurar trabalho. Outra hipótese consiste em supor que permanecer
trabalhando na informalidade reduz as chances de ser contratado no setor formal, visto que uma vida profissional
muito concentrada no setor informal estigmatiza o indivíduo (constitui um mal “sinal” para o potencial
empregador). Seja uma ou outra alternativa, o concreto é que é plausível supor que estar empregado na
informalidade reduz as probabilidades de vir a ocupar uma vaga no setor formal. Dessa forma, um indivíduo tem
três possibilidades concretas, que dependem de uma decisão sua: estar empregado no setor tradicional
(identificado com o setor rural, na maioria das vezes), migrar e conseguir algum tipo de ocupação no setor
informal ou migrar e ficar desempregado à procura de uma vaga no setor formal. Outra possibilidade consiste
estar empregado no setor formal, mas essa é uma alternativa que não depende dele senão da demanda de
trabalho das firmas.
Devemos observar que se depende de uma decisão do indivíduo escolher entre três alternativas (ocupado
no setor tradicional, ocupado no setor informal ou desempregado), em termos de esperança de ganhos, no
equilíbrio as três possibilidades tem que ter o mesmo valor. Vamos analisar uma situação hipotética.
Suponhamos que as contratações das firmas se elevam e estas, pelas razões que já expusemos, só contratam
desempregados. A taxa de desemprego cai, as chances dos desempregados de virem a ser contratados no
setor formal se
elevam e, conseqüentemente, a esperança de seus ganhos (o salário do setor formal ponderado pela
probabilidade de encontrar emprego) aumenta, fato que provocará um fluxo de indivíduos desde o setor informal
e/ou desde o setor tradicional ao desemprego. 49/ O certo é que, na medida em que existe livre entrada e saída
entre essas três situações, as esperanças dos ganhos terão que se igualar.
Vários são os pontos interessantes deste enfoque.
Em primeiro lugar, procuraremos dar uma explicação consistente sobre a existência simultânea de
desemprego e setor informal. Lembremos que esta era uma questão em aberto, dado que não podia explicar
porque um indivíduo ia permanecer no desemprego quando era factível encontrar trabalho no setor informal.
Um segundo ponto está vinculado à explicação sobre as causas do destino dos fluxos migratórios em
direção a regiões com elevadas taxas de desemprego (baixas probabilidades de encontrar emprego). Na medida
em que os salários do setor formal (por razões institucionais) são mais elevados que no setor tradicional e no
setor informal, o desemprego funciona como um regulador do fluxo de indivíduos.
Contudo, fica por qualificar o desemprego neste modelo. O mesmo seria voluntário ou involuntário?
Realmente, é difícil caracterizar essa situação. Por uma parte, pode ser caracterizado de voluntário, visto que o
indivíduo nessa situação poderia encontrar trabalho tanto no setor informal como no setor tradicional. Sob outra
perspectiva, também poderia ser identificado como um desemprego involuntário, dado que ele desejaria estar
empregado no setor formal ao salário vigente ou ainda a um salário menor.
V.2. Do Modelo de Harris e Todaro ao Dualismo do Mercado de Trabalho.
Basicamente, o modelo que acabamos de sintetizar sempre esteve muito vinculado ao funcionamento do
mercado de trabalho nas economias em desenvolvimento. Sua vocação foi explicar mercados de trabalho que
eram muito mais complexos que a dicotômica situação assalariado formal/desempregado, que parecia ser a
norma nos países desenvolvidos. Fluxos migratórios, inter-relação entre distintas formas de inserção, a
coexistência de desemprego com um setor do mercado de livre entrada, etc. eram aspectos do funcionamento
do mercado de trabalho nas nações subdesenvolvidas que pareciam não ter um adequado tratamento à luz das

Page 109 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 111 -
abordagens que tinham tido como berço a realidade de outro espaço econômico.
Contudo, esta última afirmação é só parcialmente correta. Com efeito, sustentar que o modelo que
contemplava uma situação excludente de emprego assalariado formal ou desemprego era a norma nos mercados
de trabalho dos países desenvolvidos não parece uma generalização adequada. Em termos da teoria
neoclássica, o mercado de trabalho “normal” era um espaço no qual vigoravam as corriqueiras hipóteses de
concorrência perfeita (informação livre, perfeito ajuste de preços, etc.). Como já estudamos com detalhe nos
Capítulos III e IV, explicar o desemprego sob essas hipóteses requeria introduzir variáveis
(como salários mínimos, sindicatos, instituições, etc.) que a tradição mais ortodoxa sugeria não ser plausível de
merecer um tratamento econômico. Em outros termos: o desemprego teria sua origem, por exemplo, nas
atitudes populistas da classe política, que insistiria em introduzir salários mínimos elevados, que geravam
desemprego ou na racionalidade dos sindicatos, que pleiteava elevados salários para os trabalhadores
sindicalizados sem outorgar importância às
conseqüências sobre a demanda de trabalho. Em outros termos, a análise tradicional introduzia variáveis
“exógenas” e nelas depositava as raízes do desemprego.
A renovação do pensamento neoclássico, especialmente nos anos 70 e 80, possibilitou desenvolver
modelos de salários reais rígidos ainda na presença de desemprego sem fazer apelo a variáveis “exógenas”,
como políticos, sindicalistas, etc. São exemplos dessa renovação os modelos de salários de eficiência,
contratos implícitos, etc. que estudamos no Capítulo IV. A própria racionalidade econômica gerava, sob certas
hipóteses (informação imperfeita, por exemplo), um nível de salários reais de equilíbrio que se situava por sobre o
pleno emprego,
gerando um excesso de oferta que não redundava em um ajuste. A situação de desemprego perdurava.
Temos, assim, duas possibilidades que pareciam excludentes: por um lado um mercado concorrencial,
e nesse caso, por definição, não poderia existir desemprego, ou um mercado de trabalho que, assumindo
certas hipóteses, mas sem violar o raciocínio lógico do modelo tradicional, gerava como resultado salários reais
rígidos à baixa e ao desemprego.
Contudo, correndo em paralelo com essa tradição do pensamento mais ortodoxo, uma corrente mais
heterodoxa sempre identificou no mercado de trabalho uma situação na qual conviviam diferentes espaços, com
lógicas de funcionamento diferenciadas. Concretamente, esse pensamento heterodoxo, conhecido como
institucionalista, denominava esses espaços de segmentos do mercado de trabalho. Este último estaria
“partido” ou “balcanizado”, inclusive seria pouco adequado presumir a existência de “um mercado” de trabalho.
Existiriam muitos mercados, cada qual com sua lógica e racionalidades próprias. Se a tradição institucionalista
está relativamente bem ancorada nos meios acadêmicos dos EUA e tem uma tradição de longa data, um livro de
Doering e Piore de 1971 foi um divisor de águas no debate sobre o tema. 50/ Segundo este enfoque, os
mercados de trabalho nos países centrais estariam constituídos por dois espaços qualitativamente diferentes.
51/ Por um lado teríamos um setor do mercado
denominado de primário, no qual se situariam os “bons postos de trabalho”, ou seja, postos de trabalho com
elevada produtividade e altos níveis de salários, que oferecem uma certa estabilidade no emprego e perspectivas
de ascensão
profissional na própria firma, que outorgam a seus empregados salários indiretos (previdência privada,
seguro-saúde, etc.). Neste segmento não seria predominante a flexibilidade de salários ou, em outros termos,
elevações no desemprego (maior disponibilidade de mão-de-obra) não levariam a um ajuste descendente dos
salários. Entre outros motivos, essa inflexibilidade seria o resultado de uma administração dos recursos
humanos por parte das firmas no qual prevaleceriam os denominados “mercados internos”. Este termo
(mercados internos) pretende refletir uma estratégia na qual as firmas tentam procurar seus recursos humanos,
primordialmente, dentro da própria firma. Nesse sentido, os empregados seriam
contratados pela empresa na juventude e, em um processo de seleção interna, com o tempo passariam a ocupar
seus cargos de comando. 52/
Conviveria com este segmento um outro, denominado de mercado de trabalho secundário. Neste
vigorariam os clássicos pressupostos de modelos neoclássicos, com flexibilidade de salários ou, em outros
termos, com salários sensíveis ao desemprego. Neste segmento os postos de trabalho seriam de “baixa
qualidade”, caracterizados pela reduzida produtividade e salários, elevada rotatividade, poucas perspectivas de
ascensão profissional na firma, inexistentes salários indiretos, etc..
O leitor terá percebido que estamos, agora, utilizando o termo “segmentação”. Antes, quando
apresentamos os modelos tradicionais de mercado informal empregávamos o termo “setor informal” e não
“segmento informal”. Para sermos rigorosos, o termo “segmento” deve ser empregado quando o mercado de
trabalho está “compartimentalizado” em diferentes conjuntos sem comunicação entre si. Dessa forma, é
inadequado utilizar “setor” e “segmento” de forma indistinta, como se fossem sinônimos. Se existem vasos
comunicantes entre os

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 112 -
sub-conjuntos, com fluxos de mão-de-obra ou influências entre eles, o mercado de trabalho não estaria
“segmentado”, estaríamos na presença de setores. Como nos modelos de informalidade está explícito esse
fluxo, seria pouco adequado utilizar a denominação “segmento informal”. Contudo, no caso da abordagem dos
mercados primários e secundários, dado que estão compartimentalizados, a palavra adequada seria
segmentação. 53/ A segmentação, nos moldes propostos por Doeringer e Piore, não era fácil de ser explicada à
luz do paradigma neoclássico tradicional. Várias questões tornavam incompatível essa descrição do mercado de
trabalho em termos de segmentos primário e secundário e a racionalidade que permeia o mercado de trabalho
neoclássico. Vamos mencionar, a título de exemplo, só duas questões.
Se as firmas são maximizadoras de lucro, porque as empresas do segmento primário não procuram
trabalhadores no segmento secundário, onde os salários são menores? Qual é a racionalidade de procurar
preencher os cargos de chefia e comando entre os quadros inferiores quando existe a possibilidade de recrutar
recursos humanos nos mercados externos, a salários menores?
A segunda questão está vinculada à existência de desemprego. Em realidade, não teríamos duas
possibilidades: segmento primário e secundário. Na prática temos uma terceira alternativa, o desemprego.
Contudo, se o mercado secundário pode ser assemelhado a um mercado de trabalho concorrencial, com livre
entrada e ajuste perfeito de salários, porque os desempregados não se dirigem ao segmento secundário para
encontrar ocupação. Ficar na condição de desempregado diante da possibilidade de estar ocupado no segmento
secundário
torna todo desempregado um desempregado voluntário. Ou seja, o desemprego nas economias centrais seria
voluntário.
Aqui estamos diante de um problema em certa medida epistemológico. Um economista neoclássico até
poderia concordar que a descrição realizada por Doeringer e Piore tinha fundamentos na observação cotidiana.
Contudo, seu paradigma teórico era incapaz de brindar uma explicação compatível com seus axiomas. Duas
alternativas são possíveis. A primeira, não levar em consideração as análises descritivas, ainda que as mesmas
pareçam compatíveis com a observação cotidiana. 54/ A segunda, abandonar o paradigma e procurar (construir)
um outro que permita interpretar a nova situação.
No fim dos anos 70 e, especialmente, nos anos 80, o surgimento de novos modelos (salários de
eficiência, custos associados à rotatividade, etc.) permite sua utilização para explicar a existência de um
mercado de trabalho nos moldes do proposto por Doeringer e Piore. Resumiremos este esforço interpretativo
dentro da corrente neoclássica nos próximos parágrafos.
Podemos iniciar as argumentações colocando uma pergunta: por que existiria uma parte do mercado de
trabalho que apresenta uma lógica ou racionalidade diferente da proposta pelo modelo tradicional neoclássico?
Aqui os modelos propostos podem ser vários e, de uma certa forma, estão ligados aos modernos modelos que já
apresentamos no Capítulo IV. Por exemplo, existiriam firmas nas quais o controle do esforço de seus
trabalhadores é imperfeito e pagam salários de eficiência. Outra alternativa, seriam firmas com custos de
treinamento muito elevados (precisam de muito capital humano específico) e pagam salários
de eficiência (acima do salário estabelecido no mercado concorrencial) para reduzir a rotatividade. Poderíamos
imaginar, também, empregadores que dependem de indivíduos com certas características sobre as quais não se
tem uma informação perfeita e pagam salários de eficiência a fim de elevar a probabilidade de contratar
assalariados com o perfil requerido. Em todos os casos, as firmas com essas características poderiam adotar
uma administração dos
recursos humanos onde a procura para preencher vagas para os níveis superiores se realize dentro do próprio
quadro de funcionários da firma, a fim de reduzir as incertezas sobre as características dos indivíduos (o
empregador já conhece as singularidades de seus empregados), ou não precisa de um treinamento específico
muito acurado (dado que a “cultura” da firma já está internalizada no candidato), etc. Todo esse contexto leva a
três corolários: a) a firma paga salários elevados, acima dos vigentes no mercado externo; b) os mesmos (os
salários) são insensíveis ao desemprego (insensíveis ao excesso de oferta); ainda que a firma possa encontrar
assalariados no mercado dispostos a trabalhar por um salário
menor, sua maximização de lucros é atingida em um patamar de salários sobre aquele que equilibraria o
mercado 55/; c) podem existir mercados internos, esta forma de administração dos recursos humanos, sob
certas hipóteses, por exemplo, de informação assimétrica, não viola o marco axiomático dos modelos de
inspiração neoclássica e d) podem existir mercados que funcionem de forma mais próxima do modelo
neoclássico tradicional (salários flexíveis e sensíveis ao desemprego, etc.).
A grande revolução interna do pensamento neoclássico foi entender ou explicar o funcionamento de um
setor primário, à la Doeringer e Piore, sem fugir de seu paradigma analítico. Por outro lado, estaria explicada a
segmentação, dado que podem conviver mercados com racionalidades diferentes. Um segmento estaria
integrado por firmas cuja maximização de lucros, na presença, por exemplo, de informação imperfeita, as leva a
pagar salários de eficiência e outras que funcionam dentro de uma racionalidade compatível com o modelo

Page 111 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 113 -
neoclássico corriqueiro. 56/
Explicada a segmentação resta por entender o desemprego. Com efeito, estamos no mesmo problema
que já levantamos no caso da dicotomia mercado formal/informal. Se um dos segmentos, especificamente o
mercado secundário, tem um tipo de funcionamento muito próximo ao do modelo neoclássico tradicional, o
mesmo apresenta como uma de suas característica a livre entrada. Se todo desocupado poderia encontrar
trabalho no segmento secundário, a totalidade do desemprego teria que ser rotulado de voluntário.
Na realidade, estaríamos diante de um tipo de funcionamento do mercado de trabalho no qual existem
dois segmentos e três alternativas situacionais: um indivíduo pode estar empregado no segmento primário, no
segmento secundário ou estar (voluntariamente?) desempregado. Qual é a racionalidade de um indivíduo estar
desempregado? Aqui nos encontramos muito próximos das explicações dos modelos migratório a la Harris e
Todadro. Em geral, na literatura, se adota uma hipótese que tem certo realismo: as firmas do setor primário só
contratam trabalhadores que estão desempregados. Como já mencionamos na
oportunidade que apresentamos o Modelo de Harris e Todaro, esta hipótese pode ser sustentada mediante dois
argumentos. Estando desempregado, as chances de vir a ocupar uma vaga no segmento primário aumentam,
dado que se tem mais disponibilidade de levar adiante atividades de procura de emprego vis-à-vis aqueles
indivíduos que permanecem ocupados no setor secundário. Outro argumento pode fazer apelo às influências dos
antecedentes sobre as probabilidades de preencher uma vaga no setor primário. Uma vida profissional muito
concentrada em empregos do setor secundário (que, lembremos, são
empregos de baixa qualidade) pode reduzir as chances de vir a ser contratado pelas firmas do segmento
primário. Em outros termos: o “sinal” que um candidato a um bom posto de trabalho emite quando seu histórico
profissional está concentrado em empregos de baixa qualidade constitui um handicap (posição desvantajosa).
Temos, assim, um funcionamento do mercado de trabalho que pode ser estilizado da seguinte forma. 57/ O
desejo último de todo indivíduo é vir a ser contratado por uma firma do segmento primário. Nesse caso, gozará
de uma relativa estabilidade no emprego, salários diretos e indiretos elevados, perspectivas de progresso
profissional na própria empresa, etc. As contratações por parte dessas firmas dependem de parâmetros
exógenos ao mercado de trabalho (por exemplo, crescimento econômico). Se um indivíduo pretende vir a ser
admitido em um “bom emprego” deve estar desempregado. Como estar desempregado é uma opção, dado que
se pode encontrar emprego no setor
secundário, as esperanças de utilidade dos desempregados e dos empregados no setor secundário têm que ser
iguais. 58/ Essa igualdade nas esperanças de utilidade dá lugar a um equilíbrio no fluxo entre o desemprego e o
setor secundário. Imaginemos que a economia se aquece e o setor primário eleva as contratações. Nesse
caso, as esperanças de utilidade dos desempregados se elevam (dado que aumenta a probabilidade de ser
contratado) e teremos um fluxo de trabalhadores do setor secundário em direção ao desemprego. Essa
migração
reduz as probabilidades dos desempregados serem contratados e aumenta o salário no setor secundário.
Ambas as mudanças vão na direção de voltar igualar as esperanças de utilidade intertemporal nas duas
alternativas (desemprego ou ocupação no setor secundário).
Temos, assim, um resultado no qual, no equilíbrio, convivem três possibilidades: empregado no setor
primário, desempregado e empregado no setor secundário. Contudo, é necessário caracterizar o desemprego.
Ele é voluntário ou involuntário? Voltamos, agora, a uma situação similar à que descrevemos no caso do Modelo
de Harris e Todaro e a situação de desemprego no setor moderno. O desemprego é, desde uma perspectiva,
voluntário, dado que todo desocupado poderia encontrar emprego no segmento secundário. Por outra parte, as
esperanças intertemporais de utilidade são similares nos dois casos (desemprego ou ocupado no mercado
secundário). Contudo, também poderia ser caracterizado como voluntário, visto que os desempregados estariam
dispostos a trabalhar por salários inferiores aos vigentes no setor primário, mas as firmas não reduzem os
mesmos, dado que esse nível salarial maximiza seus lucros.
VI. Comentários Finais.
Da leitura do Capítulo podemos tirar duas grandes linhas de reflexão.
A primeira está vinculada a um itinerário do pensamento extremamente particular. O artigo de Lewis de
1954 foi um esforço por modelar uma situação particular e singular: o funcionamento do mercado de trabalho
nas economias em desenvolvimento. Implicitamente, existia um desconforto em universalizar uma característica
do mercado de trabalho que era típica das economias maduras: ou a população ativa estava ocupada de forma
assalariada e legalizada ou estava desempregada. Certamente, não era esse o caso dos mercados de trabalho
nos países periféricos. Logicamente, permeava o Modelo de Lewis toda uma
perspectiva mais ampla. Os mercados de trabalho nos países em desenvolvimento não podiam ser
mecanicamente igualados à experiência das economias já maduras. Contudo, o modelo de mercado de
trabalho destas últimas era o espelho de nosso futuro. A dualidade entre um setor tradicional ou arcaico era
transitório e, de forma inexorável, todos chegaríamos “lá”.

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 114 -
A contribuição do pensamento cepalino (e sua extensão para o mercado de trabalho, o enfoque do
PREALC) rompe com a perspectiva de Lewis em um ponto crucial: a existência de uma parte do mercado de
trabalho que não apresenta o perfil verificado nas economias desenvolvidas não é transitório. A oferta
infinitamente elástica de mão-de-obra oriunda do setor não moderno tinha um traço de permanente, de
excedente estrutural de trabalho. Este fato tinha várias conseqüências, entre elas as restrições a construir
sociedades menos desiguais.
Contudo, esta perspectiva, entre outros aspectos, deixou de considerar a questão do desemprego aberto.
O Modelo de Harris e Todaro sofistica e tornam mais realista o esforço de interpretação. Nas economias
subdesenvolvidas convivem quatro alternativas: o setor tradicional ou arcaico, a informalidade, o desemprego e o
setor moderno ou formal. Na observação do cotidiano nos grandes aglomerados urbanos dos países do terceiro
mundo é transparente que os migrantes das áreas rurais se dirigem às periferias e sobrevivem precariamente em
transitórias ocupações com a esperança de, algum dia, encontrar sua oportunidade e integrar-se no setor
moderno ou formal. Contudo, o desemprego aberto é um fato e, na possibilidade de encontrar alguma ocupação
na periferia das regiões metropolitanas, o mesmo devia era difícil de ser rotulado nos moldes usuais (voluntário
ou involuntário).
Identificar o desemprego como a variável que regula os fluxos de trabalhadores entre setores e concluir que
existe um nível de desocupação de equilíbrio foi um resultado que revolucionou a forma de entender o
funcionamento dos mercados de trabalho nas economias periféricas.
Contudo, paralelamente a esses esforços de interpretação que tinham como referência o mundo em
desenvolvimento, a partir dos anos 80 os mercados de trabalho nos centros parecem caminhar em uma direção
contrária à imaginada. O surgimento do que na literatura se denominou de “formas atípicas de emprego”, talvez
porque a forma “típica” suposta fosse o assalariamento regulado pelas normas legais, induz a pensar em uma
“terceirmundização” dos mercados de trabalho nos centros. Emprego assalariado não legalizado, ocupação
autônoma,
assalariados a tempo parcial ou temporários, etc. ganham espaço e, em certos países, são as principais formas
de geração de novos empregos nas últimas décadas. Os mercados de trabalho duais ou segmentados em dois
espaços bem diferenciados (um “bom”, o mercado de trabalho primário, e outro que oferece postos de trabalho
“precários”, o mercado secundário) começa a merecer atenção O resultado desta tendência é um crescente
desafio e interesse por parte dos economistas neoclássicos dos centros desenvolvidos em formalizar, a partir de
seu paradigma, modelos que permitam interpretar o funcionamento de mercados de trabalho segmentados ou
duais. Em última instância, temos uma realidade que aproximou (ou universalizou) as características e
funcionamento dos mercados de trabalho. Hoje, os modelos de inspiração neoclássica que lidam com
mercados dualistas ou segmentados parecem ter respondido ao desafio que surgiu no ambiente dos países
desenvolvidos e foi estabelecido um diálogo com aquelas perspectivas teóricas que tentavam criar marcos
teóricos próprios às sociedades em desenvolvimento. Atualmente, parece existir uma matriz teórica mais ou
menos compartilhada e o suficientemente flexível para incorporar as singularidades de determinados mercados
de trabalho. Desde outra perspectiva: hoje não podemos mais afirmar que existem marcos analíticos próprios
para os mercados de trabalho das economias desenvolvidas e outros para as economias em desenvolvimento.
Mas que um processo de convergência produto de esforços teóricos generalistas, o concreto foi que,
diferentemente do esperado nos anos 50 e 60, quando se imaginava que o destino final de toda economia era
possuir os vínculos trabalhistas que vigoravam nas nações mais avançadas, a partir dos anos
80 os mercados de trabalho nos centros tenderam a ter um perfil mais próximo à caricatura imaginada para o
mundo em desenvolvimento. Obviamente, essa uniformização contribuiu para construir paradigmas mais
universais.
Contudo, deve-se reconhecer que essa universalização girou em torno à atualização do paradigma
neoclássico. O PREALC, que tinha sido o berço de uma tentativa de criar um “pensamento próprio” para o
mercado de trabalho, acabou. Como programa que era, foi desativado pela própria OIT. A CEPAL, que foi criada
com o intuito de criar um paradigma alternativo ao ortodoxo em matéria de desenvolvimento, hoje abandonou
toda pretensão nesse sentido. Não obstante sua ambição em torno da conservação de um certo ar de
heterodoxia, hoje seus quadros provém cada vez mais das grandes escolas dos EUA e dificilmente
comungam com as principais idéias dos idealizadores da CEPAL (Raúl Prebish, Aníbal Pinto, Celso Furtado,
Osvaldo Sunkel, etc.). Em realidade, toda a denominada Teoria do Desenvolvimento, que atingiu seu auge entre
os anos 40 e 70, entrou em declínio nas décadas posteriores. O Modelo de Lewis é corriqueiramente incluído
dentro desse pensamento desenvolvimentista, sendo seu artigo de 1954 talvez o mais representativo. O PREALC
tentou radicalizar o Modelo de Lewis, mas, em conjunto com a CEPAL, como já afirmamos, fracassou
na tentativa de construir um paradigma alternativo.
O segundo eixo de reflexão diz respeito ao próprio conceito de setor informal. Duas características,
talvez vinculadas entre sim, singularizam esse conceito.

Page 113 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 115 -
A primeira é sua ambigüidade e empirismo. A denominação de informal surge, nos trabalhos da OIT para
a África, a partir da observação da “realidade” e da necessidade de classificar formas de inserção que não eram
comuns no mundo desenvolvido. A partir daí o denominado setor informal pode incluir quase tudo, desde a
pequena unidade de produção familiar não legalizada no fundo de quintal até o fluxo de caixa não declarado de
uma firma multinacional. Antes de começar a leitura de um artigo sobre setor informal, a primeira atitude de um
prudente leitor seria tratar de identificar o conceito que o autor outorga à denominação de setor informal. Muitas
das polêmicas sobre a extensão, funcionamento e funcionalidade
do setor informal se nutrem de diferentes definições do mesmo. Nenhuma definição é superior a outra, dado que,
diferentemente do conceito de pobreza, por exemplo, sobre o qual se podem imaginar marcos axiomáticos que
tornem sua definição minimamente rigorosa, no caso da informalidade qualquer interpretação pode ser válida.
Contudo, essa ambigüidade segue em paralelo a sua popularidade. Existem certas argumentações
sustentando que todo conceito ambíguo é potencialmente popular, dado que a popularidade se nutre da
ambigüidade. O concreto é que o conceito de informalidade é tão popular quanto ambíguo. A pergunta que
merece ser colocada é: um conceito do qual se faz uso de forma tão arbitrária, que utilidade possui em termos
analíticos? Esta é uma discussão que merece ser levantada. Contudo, nenhum indivíduo que pretenda estudar
os mercados de
trabalho nos países em desenvolvimento poderá fugir de abordar a questão. A informalidade, um termo que
surge nos anos 70, foi imediatamente associado (ou se fez um paralelo) com o setor arcaico do Modelo de
Lewis. Posteriormente, foi identificado como uma forma de desemprego oculto (excedente de mão-de-obra),
depois passou a ser sinônimo de economia negra ou subterrânea e finalmente foi assumido como uma opção
dos indivíduos, segundo sua aversão ao risco e suas preferências. Foi visto tanto como a manifestação do
fracasso do desenvolvimento, que não lograva incorporar a integralidade da população ativa ao setor moderno,
como correlacionado com o dinamismo dos mercados quando o Estado não atua. Ou seja, o conceito de setor
informal parece ser útil para justificar qualquer posição, cabe em paradigmas analíticos concorrentes.
Essa ambigüidade e sua funcionalidade em marcos de interpretação diversos não deixam de alimentar a
pergunta sobre a pertinência de sua utilização como conceito ou categoria. A resposta a essa pergunta é válida,
mas, como já sustentamos, está condicionada pela sua popularidade, visto que cabe indagar-se se uma
resposta negativa (a sua irrelevância como categoria de análise) épossível.

Capítulo XI
Anexo
As Múltiplas Institucionalidades do Salário Mínimo no Brasil
O salário mínimo (SM) é uma instituição? Se definirmos instituições como “as regras do jogo”,
evidentemente o SM é uma instituição. Um empregador que pretende contratar um trabalhador no marco das
instituições formais (as “regras do jogo” estabelecidas pelos marcos legais e de cumprimento obrigatório e
coercitivo que, no mercado de trabalho, implicam em vínculos pautados pela legislação e a Constituição) deve
oferecer um salário que não pode ser inferior ao salário mínimo. Este seria de tal transcendência que foi matéria
de tratamento constitucional (Art. 7º, IV).
Assumir o SM como uma instituição não parece ser objeto de debates. Contudo, no caso específico do
Brasil, esse patamar mínimo de remuneração tem outras singularidades que servem para exemplificar o
complexo mundo das instituições especialmente as informais, permeadas de valores, cultura, talvez
racionalidades econômicas de difícil percepção, etc. Vamos, desta forma, tomar o SM para ilustrar essa
complexidade e colocar em evidência a possível multidimensionalidade que uma variável pode adquirir para
explicar (ou, simplesmente, descrever) comportamento ou interação entre atores sociais.1/
Logicamente, o SM é uma instituição formal, pauta as “regras do jogo” entre capital e trabalho nos
vínculos legalizados, mas tem ou pode ter desdobramentos sobre o setor informal. Por exemplo, elevar o custo
mínimo do trabalho no segmento formal pode ter como corolário uma queda no emprego dos assalariados com
carteira e impactos no desemprego, na inatividade ou na ocupação informal.2/ Segundo o marco teórico e
referências empíricas, é comum associar elevações do salário mínimo à queda da ocupação formal e elevação
da ocupação informal. Assim, existiriam nexos entre ambos os segmentos (o formal e o informal) e o impacto de
variações no salário mínimo se daria via os vasos comunicantes no emprego. A elevação do emprego informal se
verificaria uma vez que parte dos empregadores não estaria disposta a acompanhar o patamar mínimo de
remuneração estabelecido pela legislação e informalizaria a relação trabalhista.
Este raciocínio é linear, pode-se concordar ou não, mas está relativamente amparado no paradigma
analítico da escola neoclássica. Porém, uma das particularidades do Brasil consiste em evidenciar rendimentos
dos segmentos informais influenciados pelos aumentos do SM.3/ Por que motivo salários pagos no segmento
que não está regulamentado poderiam estar pautados pelo SM? Em princípio, essa correlação parece não fazer

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com
- 116 -
muito sentido, visto que uma das tentativas de explicar a informalidade é, justamente, fugir da regulamentação
estatal. Se um aumento do SM gera informalidade, já que os empregadores resistem a pagar este patamar, por
que toda vez que aumenta o valor nominal do SM estes mesmos empregadores reajustariam os valores nominais
dos assalariados sem vínculos legais? Por que empregadores que estão à margem da legislação nas suas
relações trabalhistas cumprem esta mesma legislação no tocante ao SM? Em geral, a literatura tem um viés
empiricista, dado que estabelece essa relação - aumento do salário mínimo aumento dos rendimentos dos
empregados informais - mas não a explica. Temos, aqui, um primeiro indício que torna o SM uma instituição
complexa, não unicamente formal (amparada na legislação, de cumprimento obrigatório e coercitivo), mas
também informal (não escrita, amparada em valores, códigos, etc.). Uma parte das “regras do jogo” formais seria
válida para vínculos trabalhistas que, em quase todos os outros aspectos, não respeitam essas “regras do jogo”.
Este tipo de perspectiva é sintetizado por uma denominação que na literatura do Brasil se conhece
como “efeito farol”, devido a um conhecido artigo publicado em fim dos anos 70.4/ O SM seria o parâmetro de
referência que pautaria a determinação dos menores rendimentos (aqueles da mão-de-obra não qualificada) tanto
no mercado formal como no segmento informal. A pergunta continua sendo: por quê?
Responder a esta pergunta talvez requeresse fazer apelo a códigos, valores, regras e convenções não
escritas, etc. Esta singularidade do SM como uma instituição complexa fica evidente quando percebemos que o
mesmo está referenciado, na legislação, como um valor capaz de sustentar o trabalhador e de sua família.5/
Assim, se para um neoclássico o salário está vinculado à produtividade (esfera da produção), supondo que a
Constituição de um país (sua lei maior) sintetiza um conjunto de valores, crenças, expectativas, etc., o valor do
SM deveria estar vinculado à esfera do consumo e ser um instrumento de luta contra a pobreza.6 /
Porém, o SM como instituição não se esgota nestas inter-relações com o mercado de trabalho e nem
mesmo com o consumo de uma família teórica. As aposentadorias e os valores dos benefícios da assistência
social não podem ser inferiores a um SM. 7 / Ou seja, um parâmetro que estabelece o menor patamar para as
remunerações dos vínculos trabalhistas também determina o nível mínimo para outros benefícios. Assim, o SM
constitui, no Brasil, uma instituição que pauta pagamentos que vão além do mercado de trabalho. Aqui estamos,
mais uma vez, diante de códigos e valores que devem ser assumidos como uma restrição e talvez não se deva
avaliar sua racionalidade. Qualquer proposta que pretenda dissociar os valores dos benefícios da previdência e
assistência social dos reajustes do SM enfrentará uma séria resistência e dificilmente logrará aglutinar uma
maioria política que a torne viável.
O SM, também, constitui uma instituição que pauta as “regras do jogo” em contratos fora do mercado de
trabalho, ainda que este tipo de relação esteja explicitamente proibido na legislação.8/ Nos contratos informais,
especialmente no interior do Brasil, o valor de referência é o SM e assim, é usual estabelecer o valor de um
aluguel em termos de SM.
Por último, mas não menos importante, o SM pauta a avaliação dos ganhos ou perdas ao constituir uma
referência para estabelecer em que medida o bem-estar foi mudando no tempo. Nesse sentido, é usual
fundamentar a queda do bem-estar com argumentos do tipo “... eu, quando estava na ativa, ganhava 5 salários
mínimos e hoje só 2.......” Ou seja, o bem-estar não é fixado em termos de um poder de compra senão em
termos de um valor (o SM) cujo poder de compra varia no tempo. Em termos de racionalidade econômica, ou, ao
menos, da usual racionalidade econômica, este tipo de “cálculo” é de difícil sustentação.
Nos parágrafos anteriores sintetizamos os “diferentes usos” do SM e, o leitor atento terá percebido, a
contradição entre eles. Por exemplo, se assumimos como certa a hipótese de um SM que constitui um “farol”
para pautar a remuneração da mão-de-obra de menor qualificação, inclusive nos segmentos informais, e não tem
impactos negativos sobre o desemprego ou a inatividade, seu valor pode ser utilizado como forma de redução no
leque de salários e vir a ser um instrumento de redistribuição de renda. Contudo, se o mesmo é paralelamente
assumido como um “deflator” para calcular o valor real de certos rendimentos, elevações substantivas do mesmo
serão vistas, por parte de população, como uma forma de “empobrecimento”, ao menos “empobrecimento
relativo”.
Esta “múltipla-institucionalidade” do SM talvez explique o enorme debate que observamos em torno dele
no Brasil e a perplexidade de encontrar, usando rigorosas técnicas econométricas, resultados que satisfazem as
mais diversas leituras. Podem existir muitas dúvidas sobre os desdobramentos do SM sobre o mercado de
trabalho e a pobreza, mas certamente estamos diante de um valor que está no imaginário popular e cuja
significância não pode estar restrita unicamente à dimensão econômica.

Capítulo XII
Políticas de Emprego
Anexo I
A Questão da Avaliação das Políticas de Emprego

Page 115 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 117 -
Os problemas enfrentados e as técnicas utilizadas na avaliação das PE´s podem ser vistos como
fazendo parte de um conjunto mais amplo e que diz respeito à avaliação das Políticas Públicas na área social.
Em todos os casos os desafios são similares e a forma de enfrentá-los quase idêntica, dado que os
desafios, em termos de avaliação, são quase idênticos.
A questão da avaliação tem muitas dimensões e esgotar o tema foge aos objetivos deste livro. Muitas
estão amplamente sedimentadas na literatura, têm certo apelo ao senso comum e já está fora de debate
contemporâneo. Como exemplo desse consenso podemos mencionar a relação custo/benefício.1/ Contudo,
existe um aspecto que, não obstante ter merecido certa atenção nos países centrais faz algum tempo
(especialmente nos EUA, como veremos nos próximos parágrafos), o tema só recentemente adquiriu uma certa
popularidade e, mesmo assim, em nichos acadêmicos e técnicos todavia restritos. No caso do Brasil, o déficit
em matéria de avaliação, que assinalamos no corpo do Capítulo, é de uma evidente falta de familiaridade com o
assunto, mesmo entre gestores de política com sofisticada formação para desenhar, implementar e monitorar
programas na área social.
Nesse contexto, o nosso objetivo neste Anexo será, simplesmentel, apresentar os problemas e
sintetizar as diferentes respostas técnicas que têm sido desenvolvidas. Voltamos a repetir que tratar o tema de
forma aprofundada está fora de nossos propósitos e, nesse sentido, remetemos o leitor à bibliografia que
mencionaremos no transcurso deste Anexo.
I. A Questão da Medição do Impacto.
Na sua essência, a questão principal se reduz à forma de quantificar em que medida um programa
afetou a trajetória de certas variáveis. Imaginemos que estamos avaliando um programa de formação profissional
e assumimos que o mesmo, aplicado sobre um conjunto de desocupados, vai elevar as chances desses
trabalhadores encontrarem um emprego. A questão é: o programa elevou, realmente, as chances de emprego de
seus beneficiários? Responder a essa pergunta requer saber se João, que foi beneficiário e encontrou emprego
depois de finalizado um curso, teria ou não ocupado uma vaga na ausência do programa. Responder a essa
pergunta é, em última instância, um non sense, visto que se João foi beneficiário não pode ser,
simultaneamente, um não beneficiário e vice-versa. Essa metodologia é denominada, na linguagem mais técnica,
de contra-factual e consiste em supor que “o que teria acontecido se o que ocorreu não tivesse ocorrido”.
Diante dessa complexidade, uma resposta intuitiva (e metodologicamente incorreta) consiste em
comparar o estado do beneficiário antes e depois do programa e outorgar toda a mudança aos benefícios (ou
ausência de benefícios) das atividades realizadas. Assim, se João estava desempregado e após o curso
encontrou emprego, o resultado da avaliação consistiria em atribuir ao curso o êxito de conseguir o emprego.
Esta metodologia é, em última instância, incorreta, uma vez que não sabemos se João teria encontrado emprego
mesmo no caso de não ser beneficiário do curso de formação. Não obstante esta evidente inconsistência nesta
forma de avaliação, a quase totalidade das
avaliações realizadas no âmbito das PE´s no Brasil segue este tipo de procedimento.
II. O Método Experimental.
Outras áreas (como a biologia e a medicina), não obstante a distância com respeito às ciências sociais,
enfrentam um problema similar. Imaginemos que um indivíduo tem uma determinada doença e lhe é administrado
um medicamento que está em fase experimental. Na hipótese da pessoa sarar, a mudança no seu estado de
saúde não pode ser atribuída ao medicamento em fase de teste, dado que não sabemos se esse indivíduo não
teria sarado ainda na ausência da droga administrada.
Diversas disciplinas contornaram este problema mediante a formação de dois conjuntos de pessoas,
com as mesmas características: a um é outorgado o medicamento (grupo de tratamento) e ao outro grupo (grupo
de controle) não. 2 / Partindo da mesma situação se observa em que medida a evolução dos dois grupos difere e
o diferencial pode ser atribuído ao efeito do medicamento testado.
Em todo esse processo, denominado de Método Experimental (ME), a questão chave, e para nada
trivial, como mais na frente veremos, consiste em formar dois grupos com as mesmas características. Para
certas áreas den pesquisa, essa tarefa pode não envolver grandes desafios. Por exemplo, dentro de um conjunto
de portadores da mesma doença, escolhe-se aleatoriamente o grupo que será tratado e aquele não submetido
ao tratamento. Dado que a escolha é aleatória (uma loteria) cada conjunto (o submetido ao tratamento e o grupo
de controle) não deve apresentar diferenças (que não sejam aleatórias) e, em média, os dois conjuntos não
deveriam apresentar nenhum viés.3 /
Em princípio, esta metodologia poderia ser aplicada às políticas públicas.4 / Contudo, uma série de
restrições impedem, na maioria das vezes, a sua utilização. Sem pretender esgotar o tema, vamos dar vários
exemplos que restringem optar pelo ME que, em princípio, seria o ideal.
Muitas vezes o problema é ético. Imaginemos que se pretende avaliar o impacto de um programa de
combate à desnutrição infantil e o impacto que uma determinada distribuição de bens ou de renda entre as
famílias tem sobre o desenvolvimento físico e intelectual das crianças. O ME requererá que parte do potencial

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 118 -
público beneficiário fique fora do programa (se perpetue o estado de desnutrição das crianças) para que sirvam
de grupo de controle e o programa possa ser avaliado. Logicamente, este tipo de alternativa de avaliação, não
obstante seu rigor técnico, é impensável em termos éticos. Um programa desses ou é universal (no sentido de
atingir todas as crianças com sinais de desnutrição) ou é restrito por questões financeiras mas, certamente, não
pode ser limitado simplesmente para que o programa possa ser avaliado mediante metodologias tecnicamente
rigorosas.
Um segundo problema diz respeito à trajetória de certas variáveis chaves no grupo de controle. Vamos
ilustrar este potencial problema. Suponhamos que exista um conjunto de desempregados e, a fim de testar o
impacto de um curso de formação profissional sobre as chances de reverter a situação de desocupação, se
realize uma escolha aleatória (entre os desocupados) dos futuros beneficiários do curso. O ME nos diz que se
devem comparar as trajetórias dos dois grupos, para avaliar o impacto da formação. Contudo, ninguém pode
garantir que, o fato de não serem beneficiados na hora do sorteio, parte dos desempregados do grupo de
controle não tenham realizado outros cursos de formação. Ou seja, o grupo de controle foi alterado,
qualitativamente, por vontade própria de seus integrantes, em um aspecto crucial para a avaliação do programa,
fato que compromete os resultados. Logicamente, não se pode proibir aos não beneficiários do programa
procurar um benefício similar em outros espaços.
Um terceiro problema, similar (porém inverso) do tratado no parágrafo anterior, consiste no abandono do
programa por parte dos contemplados. Neste caso, assim como não se pode obrigar a um não beneficiário
procurar políticas similares em outros âmbitos, não se pode obrigar aos contemplados no
programa a permanecer neles até o fim.
Um quarto problema surge de um efeito psicológico por parte do beneficiário, pelo simples fato de estar
contemplado no programa.5/ Na literatura, este efeito é conhecido como “Efeito Hawthorne”, e identificado, nos
EUA, nos anos 30, em um programa da General Eletric em um estabelecimento em Hawthorne.
Uma quinta restrição está vinculada aos custos. Em geral, aplicar o ME em programas sociais requer
mobilizar indivíduos e recursos financeiros que, na maioria dos casos, os tornam inviáveis. Restrições de ordem
financeira induzem a restringir a amplitude dos grupos (tanto o de beneficiado como o de controle), fato que pode
comprometer a consistência dos resultados.
Por último, podemos mencionar um sexto inconveniente que está associado à impossibilidade de,
mediante uma avaliação pautada pelo ME, quantificar o impacto sobre o conjunto da economia de um
determinado programa. A avaliação mediante o ME seria muito cara e, não obstante seu rigor em termos de
equilíbrio parcial (se encontra um resultado robusto para um certo conjunto de variáveis) não se chega a ter uma
dimensão sobre o real desdobramento da política sobre a totalidade da economia.
III. A Questão do Viés de Seleção ou Porque dois Indivíduos que parecem Iguais podem Não Sê-lo.
Qualquer das restrições mencionadas na Seção anterior pode inviabilizar a construção de um grupo de
“tratamento” e outro de controle. Fica, então, a questão de como identificar um conjunto da população que sirva
de controle para identificar os efeitos líquidos do programa. Em outros termos: como construir ou identificar um
conjunto de indivíduos que tenha as mesmas características, nas variáveis que podem afetar os resultados,
logicamente, daquele sobre o qual se vão a efetuar as ações. 6 / Contudo, essa tarefa não é
trivial não tanto pelas variáveis que devem ser incluídas (neste aspecto existe um certo consenso e as mesmas
estão relacionadas com a faixa etária, sexo, grau de instrução, etc.) como pelas variáveis ou características não
observáveis. Como este é um ponto de crucial importância, vamos ilustrar o problema com dois exemplos.
Imaginemos que estamos realizando uma pesquisa sobre migração e tentamos avaliar como o fato de
ter migrado pode ter mudado os rendimentos ganhos no transcurso da vida ativa. 7 / Ou seja, trata-se de estudar
os retornos da migração. Nesse caso, podemos estimar uma equação de salários para a população que migrou
e outra para a população que permaneceu em sua região ou país de origem. 8 / Contudo, nessa equação que
incorporaria as variáveis usuais podemos deixar de considerar características não observáveis (viés de seleção).
Assim, os migrantes podem ser indivíduos mais ousados, com maior iniciativa, etc. que os não migrantes e
seriam essas características (não observáveis, lembremos) os que justificam os maiores rendimentos. 9 / Nesse
caso, todos os coeficientes obtidos pela equação de rendimentos podem estar comprometidos visto que captam
essas variáveis omitidas. 10 /
O segundo exemplo diz respeito a uma PE específica. Suponhamos que o grupo de impacto esteja
constituído por indivíduos desocupados que procuraram um escritório do SPE (Sistema Público de Emprego) a
fim de realizar um curso de reciclagem para elevar a sua probabilidade de encontrar um emprego. Suponhamos
que os técnicos do SPE pretendem avaliar em que medida os cursos proporcionados têm um impacto positivo
sobre as chances de preencher uma vaga. A metodologia seria o ME e, para esse fim, constituem um grupo de
controle com desocupados que não fizeram um curso. Assim, temos dois grupos. O do tratamento procurou o
SPE e freqüentou um curso. O segundo não procurou o SPE e não realizou nenhum curso. Em realidade, esse
grupo de controle está erroneamente constituído porque os indivíduos que procuraram o SPE podem ter uma

Page 117 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 119 -
característica (ter mais iniciativa, procurar emprego com maior seriedade, etc.) que os outros e, ao serem
“positivamente selecionados”, ou apresentarem um viés positivo, as comparações podem ser inválidas. Nesse
sentido, se os que freqüentarem o curso apresentarem uma chance de preencherem uma vaga maior que o do
grupo de controle pode ser que, mesmo sem o curso, a probabilidade de ser contratado seja superior aos
restantes, por causa das variáveis não observadas (iniciativa, etc.). O procedimento correto, a fins de
comparação, deveria ser a seleção dos dois grupos considerados. Essa forma de construir um par de conjuntos
de indivíduos implicaria em não outorgar a chance de certos candidatos não serem beneficiados por um curso
(não integrarem o púbico alvo) simplesmente para constituir um grupo de controle, fato que poderia inviabilizar,
por questões éticas, a utilização do ME. 11 /
IV. A Metodologia Quase-Experimental (MQE).
Diante da (freqüente, no caso das ciências sociais) impossibilidade de construir um grupo de controle de
forma rigorosa, foram se desenvolvendo técnicas para identificar um conjunto da população que possa servir de
parâmetro de comparação ainda que sua construção não tenha as vantagens estatísticas de um grupo escolhido
de forma aleatória.
Aqui, a menção de James J. Heckman é inevitável. Prêmio Nobel de economia no ano de 2000 (que
compartilhou com Daniel L McFadden, ainda que o campo de pesquisa deste último não coincida com o
primeiro), o Prof. Heckman foi o principal teórico de uma série de técnicas econométricas hoje usuais e que
revolucionaram (propiciando um avanço qualitativo) nas técnicas de avaliação. 12/ Basicamente, a MQE tenta
utilizar um instrumento que evite a correlação entre variáveis explicativas e características não observáveis e,
assim, estaríamos muito próximos dos resultados do esperados no caso do ME.
Sem recorrer a desenvolvimentos muito técnicos, a proposta de Heckman, em seu artigo de 1999,
consiste na solução do viés de seletividade com um procedimento em dois estágios. No primeiro se estima um
Modelo Probit ou Logit (estimar a probabilidade de um indivíduo participar ou não do programa em
função de certas características individuais ou socioeconômicas) para depois calcular-se o que se denomina de
inverso da razão de Mill, um parâmetro que será utilizado na estimação da equação de rendimentos.
As vantagens desta metodologia são diversas. Por exemplo, os custos são sensivelmente menores,
dado que podem ser utilizadas pesquisas de domicílio que contenham as variáveis necessárias. Por outra parte,
e este é um ponto de relativa importância, não se estão infligindo princípios éticos, visto que não se está
marginalizando um indivíduo de um programa simplesmente para que integre o grupo de controle. Entre as
limitações, que também são de diversas ordens, certas já estavam presentes no caso da avaliação ser norteada
pelo ME. Por exemplo, não são levados em consideração possíveis efeitos sobre o
conjunto da economia ou não se tem controle se os não participantes não seguiram, por exemplo, outros cursos
de formação.

Cap. 1:
1/ Esse fato fica evidente na leitura de qualquer livro-texto de microeconomia. Na maioria das
vezes, na parte dedicada à Teoria do Consumidor, encontramos uma Seção ou um Capítulo no
qual se utiliza todo o instrumental desenvolvido para deduzir a demanda de um bem qualquer na dedução da
oferta de trabalho de um indivíduo ou família.
2/ Em realidade, a suposição é um pouco mais complexa. O indivíduo pode possuir vários ativos (trabalho,
capital, recursos naturais, etc.) e, eventualmente, oferecer seus serviços no mercado de fatores. Assumir uma
restrição orçamentária fixa equivale a supor que a oferta desse conjunto de ativos no mercado é fixa e/ou que o
indivíduo não pode consumi-los diretamente. A única forma de obter utilidade consistiria em vender os serviços
(não dos ativos em si mesmos, senão seus serviços) e o montante obtido por essa venda seria fixo.
3/ Ver Capitulo IV, sobre a Teoria do Capital Humano.
4/ William Stanely Jevons foi um dos primeiros teóricos que tentaram explicar a formação dos
preços e os mecanismos de mercado (troca) a partir da escolha de indivíduos que tratam de
maximizar sua utilidade a partir da dotação de um conjunto de bens e de suas preferencias. Em
1871, Jevons publica seu livro Theory of Political Economy, que é tido hoje, junto com as obras
de Menger e Walras, como um dos pilares da economia neoclássica.
5/ Em Kinght, suas considerações sobre a oferta de trabalho foram apresentadas no seu livro mais conhecido
Risk, Uncertainty and Profit, de 1921. Em Hicks, esse tema é abordado em The
Theory of Wages, de 1932, e em Value and Capital, de 1939. Este último livro é considerado o
marco fundamental da moderna teoria econômica neoclássica. Gary Becker, em “A Theory of the Allocation of
Time” (Economic Journal, Vol. 75, N º 299, Pags. 493-517, 1965), sofistica a análise para várias atividades e hoje
é um clássico sobre o tema da alocação do tempo.
6/ Nos próximos parágrafos estaremos supondo que a única fonte de renda do indivíduo é o

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 120 -
salário que surge da venda de sua oferta de trabalho no mercado. Esta é uma simplificação para fins didáticos.
Poderíamos incluir outra variável, que representaria a renda que o indivíduo poderia obter de outras fontes que
não sejam o trabalho (capital, por exemplo) sem alterar a essência dos resultados.
7/ Essa opção é valida quando assumimos que os preços relativos dessa cesta não mudam. Ao considerar fixos
os preços relativos, uma cesta de bens pode ser analiticamente estudada como se fosse um só bem. Na
literatura, essa fato é conhecido sob a denominação de Teorema do Bem Composto e seu desenvolvimento pode
encontrar-se em Hicks, Valor e Capital, Abril Cultural, 1982 (Esse libro, obra seminal da moderna teoria
neoclássica foi originalmente publicado em 1939). Para o Teorema do Bem Composto ver o Apêndice
Matemático.
8/ Na Seção II.4. sofisticaremos o modelo que estamos apresentando agora e ampliaremos o
eventual de possibilidades para três: trabalho mercantil, trabalho doméstico e lazer.
9/ Em realidade, em última instância estamos polemizando sobre o próprio conceito de trabalho, que muda na
história e a forma como o mesmo é visto socialmente. Hoje, o desemprego pode ser identificado como uma
situação com inúmeros desdobramentos (negativos) sobre o indivíduo. A condição de desempregado, por
exemplo, pode denegrir o indivíduo perante a sua família e seu ambiente social (e, sem querer polemizar com o
movimento feminista, essa fato é potencializado no caso dos homens em idade adulta e chefes de família). Na
perspectiva neoclássica, se o indivíduo está desempregado e recebe uma fonte de renda alternativa
(seguro-desemprego, por exemplo) equivalente à que obteria se estivesse ocupado, seu nível de utilidade
aumentaria, uma vez que pode consumir tanto como no caso de estar empregado e aumentam as horas de
“lazer”. Voltaremos sobre este tema nas próximas Seções, particularmente na Seção III.2.
10/ Esse fato é relativamente importante quando o âmbito no qual se determina a quantidade de trabalho a ser
oferecida é a família e não o indivíduo. Com efeito, as tarefas domésticas podem ser realizadas por um membro
da família ou, alternativamente, podem ser “compradas” no mercado, através de um assalariado/a que realize as
tarefas domésticas. Na Seção II.4.
estudaremos o processo de substituição entre trabalho mercantil e trabalho doméstico com mais detalhe.
11/ A crítica mais ou menos óbvia consiste em afirmar que o indivíduo não é “dono” de 24 horas, visto que parte
delas deve ser destinada a consumir certos mínimos biológicos (como dormir). Em nome do realismo
poderíamos substituir 24 por 16. A essência dos resultados, porém, não mudariam. O importante vai ser
determinar como o indivíduo reage diante de alterações no salário real. Esse é o ponto central de todo o
desenvolvimento teórico. Nesse sentido, 24 horas ou 16 horas não vão alterar o modelo.
12/ No transcurso dos próximos parágrafos estaremos supondo que as condições de equilíbrio,
como no caso da Teoria de Consumidor, são necessárias e suficientes. Por exemplo, a taxa
marginal de substituição é decrescente.
13/ Não vamos deduzir a Equação de Slutzky, uma vez que a mesma pode ser encontrada em
qualquer livro de introdução à Microeconomia e supomos que o leitor está familiarizado com ela.
14/ Lembremos que o efeito total sobre a demanda de um bem devido a uma mudança no preço seria: ??x / ?p =
¦ (??x / ?p) ¦ utilidade constante + ¦??x / ?p) ¦ renda constante (Efeito-
Renda mais Efeito-Substituição). Lembremos, também, que o Efeito-substituição é, em última
instância, o impacto que a variação do preço teve sobre o bem-estar (utilidade) do consumidor
devido ao seu impacto sobre a renda real, dados os novos preços relativos. A mudança no poder de compra
decorrente, exclusivamente, da variação da renda provocada pelo preço é:
Y = - P X.
15/ Em última instância, H é o “banco” de horas que o indivíduo deverá alocar entre trabalho e
lazer. Assim, H = H T + H L (horas de trabalho mais horas de lazer). Essa quantidade é fixa.
16/ Na literatura de anglo-saxão, essa curva (a partir de um dado nível de salário real uma
elevação do mesmo produz uma redução da oferta de trabalho), éconhecida como “backward
bending”,
17/ Não estamos considerando as negociações que estão pautadas pela manutenção dos postos de trabalho em
épocas de crises ou na negociação entre redução de salários reais e/ou emprego diante de garantias de
conservação do estoque de assalariados quando o nível de atividade cai. Em geral, nos países em
desenvolvimento os ganhos salariais são percebidos como maisimportantes que os ganhos de horas extras de
lazer, até porque, em não poucas oportunidades, não se tem poder de compra suficiente para traduzir essas
horas não trabalhadas em lazer.
18/ No Brasil, esse debate foi introduzido pelo Senador Eduardo Suplicy, através de um projeto de Lei aprovado
pelo Senado em 1991. Posteriormente, essa proposta evolui para uma formulação de política diferente, hoje
conhecida como Bolsa Escola, programa no qual a transferência de renda está condicionada à freqüência
escolar dos filhos da família beneficiada. Neste momento, não podemos aprofundar a análise dos programas tipo
Bolsa Escola dado que nos falta embasamento teórico para isso. No Capítulo IV, depois de desenvolver a Teoria

Page 119 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 121 -
do Capital Humano, essa política será abordada com um certo detalhe.
19/ Em certa literatura, esse tipo de programa ficou conhecido como Imposto de Renda Negativo e um de seus
idealizadores foi, justamente, Milton Friedmam, um dos maiores teóricos do liberalismo. Ver, por exemplo,
Friedmam, M., Capitalismo e Liberdade, Abril Cultural, Coleção os Economistas, 1982.
20/ Deve ficar bem claro para o leitor que a linha de argumentação desenvolvida nesses
parágrafos, de inspiração neoclássica, surge de um arcabouço teórico cuja matriz é a oferta de
trabalho que apresentamos na Seção I. Mais na frente (Seção III), apresentaremos os pontos
frágeis dessa argumentação.
21/ Na literatura anglo-saxão, esses são denominados de Modelos de “Job Search”.
22/ Na Macroeconomia, os problemas vinculados à informação deram origem ao que se convencionou denominar
de revolução das expectativas racionais.
23/ Aspectos vinculados à demanda, como a perspectiva que assume o trabalho como fator quase-fixo, serão
tema do próximo Capitulo. Contudo, no Capitulo III serão detalhadas as abordagens mais modernas e que
atingiram maior popularidade, como os modelos de salários de eficiência.
24/ Ainda que de forma um pouco rigorosa, utilizaremos risco e incerteza como sinônimos. Em
realidade, ambos podem ser categorias diferentes, visto que, na literatura especializada, o risco
está vinculado à possibilidade de associar probabil idades a cada estado futuro da natureza,
entretanto uma situação de incerteza se define como a impossibilidade de correlacionar
probabilidades (ao menos probabilidades objetivas). Porém, como o nosso objetivo não é abordar com detalhe
essa perspectiva mais especializada, utilizaremos indistintamente risco e incerteza.
25/ Podemos mencionar outro artigo, já dos anos 70, que marcou este tipo de literatura. O
laureado em 2001 com o Prêmio Nobel escreveu, em 1973 ao artigo “Job Market Signalling”, no Quarterly Jornal
of Economics, agosto desse ano, que também constitui uma referência
bibliográfica incontornável para o interessado neste tipo de abordagem. Também escritos na
década de 70, os artigos de McCall,J. (!”Economics of Information and Job Search, Quartely
Journal of Economics, Vol. 84, 1970) e Mortensen, D. (“Job Search, the Duration os
26/ Esses modelos assumem, na maioria das vezes, que os indivíduos conhecem uma certa
distribuição de probabilidade sobre os salários pagos, com um valores centrais (os mais prováveis). Assim,
aumentando seu tempo de procura ele eleva as chances de encontrar e ocupar um posto que ofereça salários
acima desses valores centrais.
27/ No Capítulo II nos deteremos na definição e explicação de conceitos como desemprego,
desemprego voluntário, etc. Contudo, intuitivamente, é fácil perceber que uma situação de
desemprego voluntário é aquela na qual o indivíduo não trabalha, está procurando emprego, mas não aceita
vagas disponíveis (porque considera o salário baixo, porque as condições de trabalho não o satisfazem, etc.).
Contrariamente, o desemprego involuntário se caracteriza por uma situação na qual o desempregado aceitaria
trabalhar aos salários vigentes, mas não existemvagas.
28/ Como na perspectiva anterior sobre o salário de reserva, neste caso as rendas não salariais podem elevar
esse patamar mínimo. Suponhamos que o desocupado esteja recebendo um seguro-desemprego. Nesse caso,
seguramente sua atividade de procura se prolongará mais tempo e será mais exigente que na alternativa de não
existir esse benefício.
29/ O tema dos sinais vão ser abordado em diversas oportunidades nas Capítulos seguintes
(especialmente no Capítulo III, quando tratemos dos modelos de Salários de Eficiência e no
Capítulo V, quando mencionemos as críticas à Teoria do Capital Humano). Ou seja, com esta
menção aos temas vinculados aos “sinais” não estamos esgotando o tema.
30/ Vamos supor que o ponto de maximização é uma solução interior, assim trabalhamos com
Lagrange. Mantendo as desigualdades (menor ou igual que a renda potencial), teríamos que
utilizar Kuhn-Tucker. Dados os nossos objetivos no texto, as conclusões que desejamos
demonstrar ficam algebricamente mais fáceis com Lagrange, sem que se perda generalidade.
31/ Não estamos mencionando a outra condição de maximização porque é similar à já estudada (Seção I)
quando a escolha era entre consumo e lazer. O leitor pode perceber que U HL / w = U QM , que é a condição
clássica (a relação entre a utilidade marginal dos bens e seus respectivos preços deve ser igual para todos eles).
No caso específico nosso, o preço de Q M é 1 e o preço do lazer é o salário (custo de oportunidade).
32/ O conceito neoclássico de discriminação será estudado com mais detalhe no próximo Capitulo. Podemos
adiantar, contudo, que para essa perspectiva teórica estamos lidando com o fenômeno de discriminação quando,
a produtividades iguais, se pagam salários diferentes. Não existiria discriminação contra um grupo social se este
recebe salários mais baixos em razão de sua produtividade ser mais baixa.
33/ Para simplificar a análise, estamos supondo que a única fonte de renda é o trabalho.
34/ André Gorz, um intelectual de origem marxista, sustenta que: “É através do trabalho

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 122 -
remunerado (e mas particularmente, pelo trabalho assalariado) que nos pertencemos à esfera
pública, adquirimos existência e identidade sociais (ou seja, uma profissão), nós inserimos em uma rede de
relações e intercâmbios onde nos comparamos aos outros e nos vemos conferidos de direitos sobre eles a troca
de nossos deveres com eles”. (O itálico é do original e a tradução é nossa). Essa citação de Groz está contida
no livro Métamorphoses du Travail. Quête du Sens. Critique de la Raison Économique. (Galilée, Paris, 1991,
Pág. 25). Essa obra é referência para todos aqueles que desejam estudar o conceito do trabalho desde uma
perspectiva histórica e o debate atual sobre o desemprego e a redução de horas de trabalho, desde,
logicamente, umaabordagem de esquerda.
35/ Em países como o Brasil, onde o setor informal do mercado de trabalho ocupa espaço não
negligenciável, as restrições legais facilmente são contornadas por contratações à margem da
legislação. Os aspectos vinculados ao segmento informal serão tratados no Capítulo X. Aqui
estamos supondo que a legislação é cumprida.
36/ Estamos fazendo uma simplificação para não nos distanciarmos de nossos objetivos. Em
realidade, deveríamos distinguir entre estabilidade estática (o ajustamento em termos de taxas de variação) e
estabilidade dinâmica (trajetória do processo temporal de ajustamento). Por outraparte, estamos considerando
só a condição de estabilidade Walrasiana (o preço tende a subir quando existe excesso de demanda ou,
inversamente, a cair quando estamos diante de um excesso de oferta).
37/ É fácil perceber que esse é o salário de equilíbrio igualando oferta e demanda de trabalho (as expressões
(27) e (28)).
38/ O tratamento que desenvolvemos é só um caso entre muitos. Poderíamos ter trabalhado com ajustes
discretos (defasados um período), oscilantes ou não, etc. Contudo, o exemplo serve para mostrar que nada
garante a estabilidade quando supomos que as curvas de oferta e demanda de trabalho têm ambas inclinação
negativa.
39/ Não nos deteremos no exemplo, mas essa alocação ineficiente poderia se aprofundar no
tempo. Ao ocupar um posto de trabalho não condizente com sua formação, esse indivíduo pode reduzir as
probabilidades de, no futuro, candidatar-se a um posto de trabalho de melhor qualidade. Por outra parte, também
com o transcorrer do tempo, as qualificações e habilidades podem ir deteriorando-se, perdendo a economia
capital humano (ver Capítulo IV).
40/ No Capítulo seguinte, por exemplo, veremos a dificuldade em determinar se um indivíduo está ou não na
inatividade por desalento. Em outros termos: se é um desocupado oculto (oculto pelo desalento devido ás
dificuldades de encontrar emprego).

Cap. 2:
1/ Voltaremos sobre este ponto com mais detalhe na Seção V deste Capítulo.
2/ Falamos que culturalmente aceito porque considerar que um indivíduo possa integrar, potencialmente, a força
de trabalho de um país depende de questões culturais. Por exemplo, lembremos o caso do trabalho feminino.
Em certos países, as mulheres não estão autorizadas, legalmente, a participar do mercado de trabalho. Outro
exemplo poderiam ser as crianças. A idade limite mínima aceita para considerar uma criança como podendo
integrar a força de trabalho depende de questões culturais, inclusive dentro de um mesmo país segundo seja
uma área rural ou urbana. Voltaremos sobre esse ponto nos próximos parágrafos.
3/ Esse levantamento do IBGE é a Pesquisa Mensal de Emprego-PME. Trataremos desta pesquisa com
particular detalhe na Seção ??? deste Capítulo.
4/ Durante todos os exemplos utilizaremos a PNAD do ano de 2003 (PNAD/03) dado que é a última disponível.
5/ Estamos falando que, em princípio, pouco influênciadas por variáveis econômicas dado que os
economistas neoclássicos tem tendência a explicar todo e qualquer fenômeno social (casamento, número de
filhos, escolaridade, etc..) a partir do mesmo arcabouço teórico que explicam a demanda de tomates. Por isso, o
número de filhos por família, por exemplo, também seria um fenômeno capaz de ser classificado como objeto de
estudo por um economista neoclássico. Contudo, como esses fatores são mais de longo prazo que de curto
prazo, essa vocação dos economistas neoclássicos não invalida a nossa afirmação e, assim, a PIA pode ser
considerada fixa no curto prazo e insensível ao ciclo de conjuntural ou a decisões econômicas.
6/ Em geral, a situação de ocupado tem como referência a semana, mas a procura de emprego pode ser
diferente (semana, mês ou ano). A situação seria a seguinte. Se pergunta ao indivíduo se em tal semana estava
ocupado ou não. Se a resposta é sim essa pessoa é caracterizada como ocupada. No caso da resposta ser
negativa, a pergunta seguinte é: procurou emprego ? Contudo, essa questão sobre a procura de emprego tem
que estar datada e, nesse sentido, pode ser: tomou alguma providência concreta para procurar emprego na
semana que vai de xx a xx ? ou tomou alguma providência efetiva para procurar emprego nos últimos 30 dias ?
ou tomou alguma providência concreta para procurar emprego nos últimos 360 dias ?
7/ Na maioria das pesquisas, contudo, atividades ou ocupações ilícitas não são incluídas no elenco de setores

Page 121 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 123 -
de atividade possíveis. Assim, um traficante de drogas seguramente será incluído dentro do setor de atividade
“Comércio Varejista”.
8/ Esse salário pode estar complementado por outros rendimentos como, por exemplo, um percentual sobre as
vendas.
9/ Para ser rigorosos, esta definição da remuneração de um empresário como sendo integralmente qualificada
como rendimento é frágil. Com efeito, um empregador por estar realizando tarefas na própria empresa e parte de
seu rendimento pode ser classificado como oriundo de seu trabalho. Outra parte de sua remuneração total pode
estar originada na remuneração ao capital de sua propriedade e, dessa forma, é tipicamente um rendimento.
Realizar essa diferenciação é possível ainda que complexa.
10/ Voltaremos a tratar este ponto quando analisemos conceitos mais amplos de desocupação (desocupação
oculta) e sub-emprego.
11 / Como a PNAD possui um quesito relativo à contribuição ou não de um indivíduo à previdência social, se
podem diferenciar os autônomos entre aqueles que contribuem para a previdência e aqueles que não contribuem.
12/ Estamos utilizando indistintamente, trabalho precário ou sub-emprego.
13/ Essas perguntas estão contempladas na Nova Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE.
14/ No Capítulo III vamos estudar com mais detalhe a perspectiva neoclássica de discriminação, a definição e
explicações. Neste momento, o entendimento corriqueiro e intuitivo sobre o conceito de discriminação, ainda que
não seja muito rigoroso, nos é suficiente.
15/ O ponto central nesta hipotética situação é: as mulheres trabalham menos horas por opção ou porque são
discriminadas nos trabalhos a tempo integral ? Para definir se a mulher é ou não discriminada no mercado de
trabalho são necessários dois passos: a) calcular o salário por hora nas mulheres e nos homens e b) determinar
se o diferencial nas horas trabalhadas surgem de opções individuais ou não.
16/ Este ponto é um tanto complexo dado que deveríamos definir se o indivíduo está trabalhando um número
reduzido de horas devido a uma opção própria ou está forçado dada a ausência de oportunidades de emprego.
Voltaremos sobre este ponto nos próximos parágrafos quando abordaremos aspectos vinculados à desocupação
oculta e ao sub-emprego.
17/ Justamente, devido a essa complexidade para retratar as condições de vida da população ou a situação
social de um país, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) elabora um Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH) para a comparabilidade internacional entre nações. Ás variáveis consideradas
nesse Índice são: expectativa de vida, escolarização e renda per capita, esta última deflacionada pela PPA
(Paridade do Poder de Compra). Como vemos, a taxa de desemprego não está incluída entre as variáveis que
são contempladas para quantificar as condições de vida de um país. O IDH toma valores entre 0 e 1, quanto
mais próximo de 1 maior melhore seria a qualidade de vida de um país. O Brasil apresentou, em 2003 (último
dado disponível), a 63º posição no relatório de 2005 (dados de 2003). O melhor IDH foi obtido pela
18/ A taxa de desemprego no México é de mais ou menos 4%. Na França e na Alemanha, países grau de
desenvolvimento e qualidade muito superiores a México, a taxa de desemprego se situa em patamares próximos
a 11%.
19/ Por dados
20/ Welfare-State, na literatura anglo-saxã
21/ O referencial teórico para este tipo de abordagem foi um subproduto das análise desenvolvidas em
um programa da OIT (Organização Internacional do Trabalho) denominado de PREALC (Programa Regional de
Emprego para a América Latina e o Caribe), cujo propósito foi adequar os marcos interpretativos do mercado de
trabalho oriundos dos países desenvolvidos a fim de torná- los compatíveis com particularidades dos países
subdesenvolvidos, especialmente os da América Latina. Voltaremos sobre o tema no Capítulo ??, no qual
abordaremos o mercado de trabalho nas regiões subdesenvolvidas.
22/ Vamos a abordar esse crescimento da heterogeneidade do mercado de trabalho nos países centrais no
Capítulo XII, quando analisaremos as especificidades do desemprego observado a partir dos anos 70.
23/ Em geral, nas pesquisas de domicílios as perguntas estão vinculadas ao rendimento bruto. Contudo, as
respostas podem estar centradas no rendimento líquido e não o bruto, não devido a uma relutância em informar o
rendimento bruto senão, simplesmente, no pouco conhecimento sobre a remuneração bruta.
24/ Em certo casos a análise pode ser sofisticada considerando que cada membro não “requer” o mesmo
consumo. Ou seja, um bebê de cinco meses não vai requerer, em termos monetários, uma cesta de bens similar
a um adulto em idade ativa. Dessa forma, se pode “homogeneizar” os membros da família. Por exemplo, uma
criança de até 14 anos pode ser equivalente a meio adulto. Em geral, essa padronização deve ser realizada por
cada analista ou pesquisador e ficar bem explícita. Na literatura esta questão de tentar homogeneizar os
membros da família se conhece como escalas de equivalência e são usuais nos estudos de pobreza.
25/ Realizaremos uma apresentação e avaliação desses dois RÁs na próxima Seção do presente Capítulo.
26/ Realmente, essa afirmação não é exata dado que também deveriam responder os estabelecimento que em

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 124 -
um ano não empregaram nenhum assalariado. Essa informação é conhecida como RAIS-Negativa.
27/ Com o transcorrer dos anos, a cobertura da RAIS foi-se ampliando e a partir da presente década a
comparabilidade intertemporal (comparação de números absolutos entre dois anos) é mais consistente.
28/ O Abono Salarial é um programa (contemplado no Art..239 § 3º da Constituição Federal) que outorga um
salário mínimo a todo assalariado do mercado formal que tenha, em média mensal, um rendimento máximo em
um ano calendário de dois salários mínimos. Em realidade, no caso específico do Abono Salarial, se poderia
fazer algum tipo de aproximação mediante uma pesquisa domiciliar supondo que o salário recebido por um
indivíduo em um momento do tempo (referência temporal do levantamento) é igual à média salarial do ano
calendário.
29/ O IBGE, por exemplo, contemplou um suplemento com perguntas sobre as saúde dos indivíduos em 2003. O
anterior suplemento saúde tinha sido em 1998. Voltaremos sobre os suplementos da PNAD na próxima Seção.
30/ A disponibilização da base de informações através dos micro-dados é um ponto muito relevante para a
“popularização” de uma fonte de informações. Entende-se por micro-dados as informações primárias, que
permitem que o pesquisador ou analista possa realizar as tabulações, cruzamentos ou exercícios estatísticos
que considere pertinente. Em geral, o IBGE realizou, nos últimos anos, um meritório trabalho de ampla
divulgação dos micro dados da PNAD. Essa tarefa possibilitou que essa pesquisa seja hoje a fonte de dados
mais utilizada por pesquisadores e analistas do mercado de trabalho. Não obstante ser uma fonte de dados com
enorme potencial, a RAIS não se beneficiou de uma atitude semelhante do Ministério de Trabalho e Emprego.
Assim, o interessado nessa fonte de dados tem a sua disposição um excelente sistema de tabulação (o
SGT-Sistema Gerenciador de Tabelas), que permite a realização de múltiplos cruzamentos entre varáveis.
Contudo, o pesquisador está restrito às tabelas que possibilita o SGT.
Em geral, paradoxalmente, outra limitação dos RÁs surge de uma vantagem. Na medida em que são censos
sobre um determinado programa ou política, seus micro-dados atingem proporções que não permitem ser
manipuladas em um computador pessoal. Por outra parte, questões vinculadas ao sigilo das informações
também restringe as possibilidades de divulgação dos micro-dados. Voltaremos sobre este ponto quando
tratemos especificamente da RAIS.
31/ Essa cobertura nacional, que só não contempla as áreas rurais da Região Norte (Estados de Rondônia,
Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá), atingiu-se desde a pesquisa de 1981 e perdura até hoje.
32/ Por exemplo, a partir da PNAD não podemos calcular a taxa de desemprego de um determinado Município.
Esse indicador (taxa de desemprego) só pode ser calculado para os Estados, Áreas Metropolitanas (São Paulo,
por exemplo) ou a Área Rural e Urbana.
33/ Algumas dessas questões foram incorporadas ao longo do tempo e já fazem parte do corpo permanente da
PNAD. Por exemplo, o quesito sobre raça é levantado desde 1987. No tocante a domicílios, a existência de
rádio e televisão foi contemplado a partir de 1988 e hoje já estão incluídos quesitos referentes a telefone celular,
freezer, microcomputador e acesso à Internet. Ou seja, demandas sociais (como a questão da raça) ou
desenvolvimentos tecnológicos e de consumo levam a mudanças no corpo principal, seja na parte referente a
domicílios como a indivíduos.
34/ Alguns desses suplementos já tratam temas abordados usualmente na PNAD mas de forma diferenciada ou
mais aprofundada.
35/ Existe, também, uma questão vinculada à divulgação. A abrangência geográfica e a extensão dos temas
levantados na PNAD demandam um tratamento e crítica dos dados relativamente intenso. Dessa forma, os
resultados da pesquisa são divulgados, normalmente, com pouco mais de um ano depois de finalizado o
levantamento. Como a PNAD vai a campo na última semana de setembro, os dados só são disponibilizados em
outubro do ano posterior. Uma base com essa defasagem temporal entre a coleta e a divulgação dificilmente
pode ter como vocação ser um instrumento para monitorar as movimentações conjunturais do mercado de
trabalho.
36/ As limitações associadas aos fatores de expansão da amostra só introduzem problemas quando se trabalha
com dados absolutos (número de desempregados, por exemplo). No caso de utilizar-se relações (como a taxa
de desemprego) os problemas de mudanças nos fatores de expansão não se colocam. Contudo, as alterações
do formulário afetam, sim, as relações.
37/ O leitor interessado pode consultar referências das metodologias do IBGE e do DIEESE nos respectivos
sites na Internet. No caso da PME ver http://www.ibge.gov.br/ e informações sobre a metodologia da PED pode
ser encontrada em http://www.dieese.org.br/ped/pedmet.xml ou em
http://www.seade.gov.br/produtos/ped/index.php.
38/ Em realidade, a implementação da PME não obstante iniciada de forma experimental em 1980 verificou uma
modificação substantiva dois anos mais tarde, sendo definitivamente implementada em 1982. Assim, este último
ano pode ser identificado com o início da série. Alterações menores (na amostra) e que não comprometeram a
comparabilidade dos indicadores produzidos foram realizadas em 1988 e 1993.

Page 123 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 125 -
39/ Essa ruptura deve ser interpretada como incomparabilidade (a impossibilidade de comparar) os
indicadores da antiga e a nova série. Voltaremos sobre essa questão da comparabilidade em séries que foram
metodologicamente modificadas em diversas ocasiões no transcurso das próximas Seções do presente
Capítulo.
40/ É, inclusive, poderíamos argüir que essa qualificação não é rigorosa, dado que a PME não cobre a totalidade
das regiões metropolitanas senão, tão somente seis delas.
41 / Esse era um caso típico da estéril polêmica entre a PED e a PME que surgia não da própria pesquisa
senão das tabulações que eram geradas para sua divulgação. A PED, como mais adiante veremos, construía
seus indicadores tendo como referência a população com 10 anos e mais. Na APME poderia adotá-se esse
corte sem maiores inconvenientes, mas a escolha do IBGE, para divulgação, era de 15 anos ou mais. Ou seja, a
comparabilidade entre os resultados divulgados das duas pesquisas ficava comprometido. Contudo, era
perfeitamente factível que um usuário, tendo os micro-dados da APME, pudesse construir indicadores com um
público mais amplo (para os indivíduos de 10 anos e mais). Aqui estamos diante de uma clássica questão entre
a forma ou cortes na hora da divulgação e o conteúdo de uma pesquisa. Ou seja, seria um erro afirmar que a
APME levantava dados de pessoas com 15 anos e mais. O correto seria dizer que o IBGE divulgava os dados
tendo como referência esse mínimo. A qualificação deveria realizar-se em torno à divulgação e não da pesquisa.
Nesse sentido, a NPME, como veremos, não inovou no
quesito de idade mínima a partir da qual os dados são levantados. Mudou a divulgação do IBGE,
que agora distribui indicadores construídos a partir de uma idade mínima de 10 anos. Ou seja,
seria inexato considerar essa alteração no idade mínima nos indicadores divulgados pelo IBGE
como uma alteração metodológica entre a APME e a NPME.
42/ Esse trabalho poderia ser remunerado ou não. O relevante era o número de horas mínimo trabalho por
semana (15 hs.).
43/ As perguntas sobre o tempo de procura vão além da semana e chegam a menos de 30 dias, mais de 30 dias
(cuidado, olhar questionário)
44/ Na Espanha dos anos 80, por exemplo, o percentual de desemprego verificou picos de quase 25% (uma em
cada quatro indivíduos economicamente ativos estava desocupado).
45/ Com essa crítica convivia uma outra, especialmente entre franjas da população leigas no assunto. Esse
questionamento assinalava uma suposta manipulação dos dados por parte do governo (do IBGE). Essa
suspicácia é totalmente improcedente. A questão foi basicamente metodológica, como a seguir veremos.
46/ Na próxima Seção analisaremos com particular detalhe a PED e as bases conceituais que as geraram.
47/ Ver, por exemplo, a Resolução da OIT (Organização Internacional do Trabalho) Nº 160, de 1985. Ou seja, foi
já nos anos 80 que a maior diversidade ns formas de inserção começa a gerar preocupações sobre as opções
estatísticas de captá-la. Essa Resolução, não obstante de forma ainda tímida, traz preocupações com o
sub-emprego. A mesma diz que “todo membro que ratifique a presente convenção se compromete a
regularmente levantar, compilar e publicar estatísticas do trabalho que deverão, tendo em conta seus recursos,
progressivamente se estender a os seguintes campos: a) população ativa, desocupação, se existe, e, si
possível, sub-emprego visível.......” (A tradução é nossa. A resolução se pode encontrar em um interessante
artigo da OIT sobre o tema: “Du Nouveau por les statistiques du travail” Reveu International du Travail. Vol. 138, N
1. 1999. O leitor pode consultar o artigo no seguinte endereço:
http://www.ilo.org/public/french/support/publ/revue/download/pdf/persp99.pdf).
48/ A impossibilidade de comparação é um custo que se coloca toda vez que ser pretende alterar a metodologia
de uma série. Toda alteração envolve custos e benefícios. Os benefícios estariam associados a uma alteração
metodológica que aperfeiçoa a estatística ou a torna mais adequada a um contexto mutante. Os custos surgem,
basicamente, da impossibilidade de comparar com a série histórica. Assim, por exemplo, se temos como
referência a PME, hoje não se sabe se a recuperação de 1993/95 teve maior ou menor impacto sobre a queda do
desemprego que o aquecimento de 2004/05. No site do IBGE (www.ibge.gov.br) o leitor pode encontrar Notas
Metodológicas nas quais se tenta determinar a origem dos diferenciais entre ambas metodologias.
49/ Cabe aqui mencionar uma anedota que evidencia muito bem os problemas associados a mudanças
metodológicas de séries estatísticas. Historicamente, os analistas e políticos situados mais à esquerda do leque
ideológico, privilegiavam os indicadores da PED. Os indicadores do IBGE, especialmente aqueles oriundos da
PME, eram ora criticados pela metodologia adotada ora suspeitos de manipulação pelas autoridades. A
polêmica entre a PED e a PME permeou os anos 80 e 90. Em certas ocasiões, geralmente baixo os auspícios
do Ministério do Trabalho e Emprego, se tentou uma confluência metodológica, tentativas sempre fracassadas.
No ano de 2000/2001 o IBGE começa os trabalhos de revisão que dão origem á NPME. Em realidade, a NPME é
um passo dado em direção à metodologia da PED. Contudo, quando o IBGE publica os resultados de
desemprego obtidos pela PME, em janeiro de 2003, com o PT já no Governo Federal, muitos dos antigos críticos
da APME agora criticam a NPME, dado que a taxa de desemprego a ser publicada é maior que aquela obtida

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 126 -
pela antiga metodologia. O Senador Aloizio Mercadante, do PT, tenta, felizmente de forma infrutuosa, que o
IBGE abandone a nova metodologia, dado que ao continuar com a antiga as taxas de desemprego seriam mais
baixas, favorecendo o Governo. Essa conduta pode induzir uma série de reflexões que, infelizmente, fogem aos
objetivos deste livro. Podemos mencionar só três. A primeira é a incoerência ou, desde outra perspectiva, a
“flexível” defesa de
opções metodológicas segundo a perspectiva de poder. A segundo reflexão diz respeito à inerente
tendência de qualquer governo em tentar opções metodológicas e/ou formas de divulgação de
estatísticas capazes de favorecê-lo. A terceira, vinculada com a anterior, diz respeito à necessidade das
instituições produtoras de estatísticas de ter um status que as torne independentes do poder de turno.
50/ Tem aspectos muito particulares sobre mudanças metodológicas e que não mencionamos no corpo de texto
devido que só caberiam se o nosso objetivo fosse aprofundarmos neste tópico. Contudo podemos mencionar
algumas. Uma das alterações diz respeito à alteração metodológica produto da mudança na cobertura
geográfica. Com o transcorrer dos anos, as áreas metropolitanas apresentaram uma incorporação de espaços e,
em termos institucionais, foram criados, desmembrados e incorporados municípios. Na APME, a cobertura
geográfica dos últimos anos tinha como referência a especificação legal das áreas metropolitanas vigente em
1991. A NPME tem como parâmetro a delimitação espacial do ano de 2000. Por outra parte, na APME, dentro
dos seis grandes aglomerados pesquisados, eram levantados dados tanto das áreas urbanas como rurais. No
caso da NPME só as áreas urbanas são consideradas no levantamento. Também foi sofisticada, seguindo
recomendação da OIT (16ª Conferência de Estatísticas do Trabalho de 1998), a condição de ocupação para
pessoas que não trabalharam (afastados de longa duração por, por exemplo, doença, maternidade, etc.) mas
tinham trabalho. Na APME toda pessoa que tivesse um trabalho ainda que não tenha trabalhado era considerada
como ocupada. Na NPME é realizada uma análise sobre o motivo de não ter trabalhado para aquelas pessoas
que tinham trabalho com a finalidade de classificá-las como ocupada, desocupada ou inativa.
51/ Esses níveis se referem ao período outubro de 2001 a dezembro de 2002, dado que foi para esse intervalo de
tempo que o IBGE desenvolveu, em forma paralela e com o intuito de comparação, as duas pesquisas. As áreas
metropolitanas consideradas no Gráfico II são cinco, dado que foram esses grandes aglomerados os
considerados pelo IBGE na totalidade desse período. De qualquer forma, mais do 50% da diferença entre os
resultados obtidos para a taxa de desemprego aberta entre a APME e a NPME são de origem difuso, como a
ordem das questões, a forma de levantar as informações, etc. Quesitos que, intuitivamente, parecem relevantes
para explicar o diferencial em realidade são marginais. Vamos apresentar dois exemplos. Para o mês de julho de
2002, o percentual da PEA desocupada foi de 11,9%, segundo a nova metodologia, e de 7,6% na APME. O
período de referência (mês em lugar de semana) só alteraria a taxa de forma marginal, dado que passaria de
7,6% para 8,3%. Na APME, alterando a idade e mantendo o período de procura em 30 dias, a taxa de
desemprego não muda (permanece constante em
8,3%).
52/ A Fundação SEADE está institucionalmente vinculado ao Governo do Estado de São Paulo.
53/ Os anos entre parêntese correspondem à data de início da implementação.
54/ Estudaremos essas matrizes teóricas com mais detalhe no Capítulo ????. Nos próximos parágrafos
circunscreveremos a nossa apresentação a uma análise muito descritiva e extremamente sintética, visto que o
nosso objetivo consiste em apresentar uma pesquisa de domicílio (a PED) e não desenvolver marcos
conceituais, ainda que estes últimos sempre norteiem na construção de estatísticas.
55/ Outros indicadores (diferentes classificações de ocupados, por exemplo) diferem entre PME
(seja da antiga ou da nova) e a PNAD mas são formas de classificação distintas e não envolvem
perspectivas analíticas diferentes, como é o caso da medição do desemprego. Dessa forma, não
as mencionaremos no texto.
56/ Na NPME é contemplada uma questão sobre se o indivíduo gostaria de trabalhar além do
número de horas que trabalhou na semana.
57/ Contudo, é perfeitamente factível elaborar estudos a esse respeito tendo como parâmetro de comparação os
resultados de ambas as pesquisas em universos geográficos similares ou comuns.
58/ Como tanto o CAGED como a RAIS são produzidos pelo Ministério do Trabalho e Emprego, notas
metodológicas, dados e análises podem ser encontrados em www.mte.gov.br.
59/ O CAGED também é conhecido como Lei 4923/65, dado que foi mediante esse instrumento legal que o
mesmo foi implementado, nos idos anos 60.
60/ GFIP (Guia de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social) é outro RA que permitiria
monitorar e analisar o mercado formal de trabalho. Tem algumas características que o diferenciam da RAIS e do
CAGED (por exemplo, inclui trabalhadores autônomos que contribuem para a Previdência Social). Teoricamente,
seria um RA mais amplo que aqueles dois, dado que se aproxima de um censo mensal do mercado formal de
trabalho (seria mais abrangente que a RAIS, dado que esta é um censo anual e superior ao CAGED, visto que

Page 125 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 127 -
este só contabiliza admissões e desligamentos). Contudo, hoje (2005) a GFIP não é divulgada. Foi ensaiada
uma distribuição ao grande público nos anos de 2000 a 2002, mas a qualidade dos dados deixava muito a
desejar. Por exemplo, se observavam quedas do emprego de até 17% em um determinado mês, um percentual
de contração só factível de ser imaginado em circunstâncias extremas (catástrofes naturais, guerras, etc.).
Obviamente, esses resultados são produto da divulgação do RA sem nenhum tratamento estatístico ou correção
de erros. A partir desse último ano (2002), a série da GFIP não foi mais distribuída ao público e o acesso à base
de dados só é factível mediante a solicitação expressa ao Ministério de Previdência Social. Contudo, pelos
antecedentes na época da divulgação, os dados da GFIP parecem de qualidade muito inferior ao CAGED ou a
RAIS. Em
2005, o sistema parece estar sendo reformulado, o que pode, no futuro, elevar a qualidade de sua base.
Contudo, na medida em que não existe divulgação periódica e diante dos antecedentes, a GFIP não parece nem
base de dados confiável para pesquisa nem (dada a falta de divulgação) uma referência para monitorar o mercado
de trabalho.
61/ O leitor deve perceber que as informações de fluxo (admissões ou desligamentos) estão restritas aos
assalariados celetistas, ficando de fora dessa contabilização os estatutários. Por outra parte, só estão obrigados
a proporcionar informação os estabelecimentos que movimentaram pessoas (admitiram ou desligaram). Dessa
formas, as informações mensais têm como referência os fluxos de entrada e saída e não os estoques.
62/ A assistência aos desempregados se daria mediante o Fundo de Assistência ao Desempregado, que deveria
outorgar ajuda financeira aos trabalhadores desempregados na hipótese de uma emergência ou grave situação
social que impedisse seu reemprego imediato (ver Art. 5 § 5 da Lei 4923/65). O financiamento desse Fundo se
daria mediante os 2/3 da conta “Emprego e Salário” do Art. 18 da Lei N 4589/64. Em realidade, até 1986, não
obstante estas louváveis intenções nas disposições legais, nenhum benefício que se assemelhasse ao que
correntemente se conhece como seguro-desemprego existiu.
63/ A definição do formulário padrão foi realizada por portaria Ministerial do 26 de dezembro de 1966.
64/ Nessa época, a periodicidade era esparsa, sendo a defasagem para divulgar os dados de 6 meses.
65/ Essa amostra de estabelecimentos complementava as informações mediante o Anexo II que, adjunto da
declaração comum a todos os estabelecimentos, informava sobre os estoques a começo e fim do mês e não
unicamente s o fluxo.
66/ A necessidade de uma reformulação do CAGED teve um impulso inicial na reunião dos SINÉs em Fortaleza,
em maio de 1982, quando o consenso em torno a mudanças no RA foi quase unânime. A partir daí,as tarefas
ficaram a cargo do Ministério do Trabalho, que finalizou a revisão em julho de 1983, quando foi publicada a
Portaria N 3.081, com os novos dispositivos que entrariam em vigor a partir do 1 de outubro.
67/ Na medida em que entrou em vigência o primeiro de outubro, as informações da nova série correspondem a
setembro de 1983.
68/ A CNAE é a sigla de Classificação Nacional de Atividades Econômicas.
69/ Por exemplo, nesse ano de 1995, quando o CAGED contabilizava uma variação percentual de -0.60%, o
emprego celetista tinha apresentado aumento de 1.76% na RAIS. Para realizar uma comparação entre a RAIS e
o CAGED só devem ser considerados os assalariados celetistas da RAIS, dado que o CAGED só contabiliza
essa movimentação.
70/ Logicamente, este conclusão depende da suposição de uma sub-declaração dos desligamentos. Essa
possibilidade é intuitivamente plausível, dado que, como já afirmamos, na ocasião de uma falência, os
administradores de uma empresa seguramente terão outras prioridades que não a declaração ao CAGED.
Contudo, essa tendência a sub-declarar pode mudar no tempo. Por exemplo, a consolidação do
seguro-desemprego como sistema de benefícios pode estar reduzindo o grau de sub-declaração, visto que os
assalariados desligados podem estar pressionando seus empregadores para declarar esse RA. Exercícios
realizados com os saldos dos últimos anos tendem a sugerir que essa hipótese de sub-declaração reduzi-se nos
últimos anos e, dessa forma, a sobre-estimação dos saldos seria menor.
71/ Aliás, não se precisa um conhecimento estatístico apurado para concluir sobre a incomparabilidade dos
dados do CAGED antes e depois da janeiro de 2002. Se a mudança foi produto de uma sub-estimação dos
saldos, logicamente que não se podem comparar resultados que não sub-estimariam (a atual metodologia) com
dados que claramente sub-estimavam.
72/ Esta afirmação é válida ainda no caso de supor que não existe um viés para sub-declarar desligamentos,
dado que, evidentemente, a metodologia anterior tendia a sub-estimar a geração de empregos.
73/ Esse benefício consiste no pagamento de um salário mínimo anual àqueles trabalhadores com salários
médios mensais de até dois salários mínimos. Esses trabalhadores, logicamente, tem que ter seu vínculo
trabalhista formalizado.
74/ Em termos de fluxo, as informações da RAIS deixam muito a desejar. A evolução das admissões e
desligamentos no ano diferem de forma significativa quando comparada com os balanços mês a mês do

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 128 -
CAGED. Mesmo quando a referência é a própria RAIS, a variação do emprego no ano difere muito se o saldo
anual é calculado mediante as informações sobre admissões e desligamentos contidas na RAIS de um
determinado ano ou quando esse saldo anual é obtido com as informações ponta a ponta (entre o estoque do
31/12 da RAIS de um ano e o estoque da RAIS do 31/12 do ano anterior). Por exemplo, o saldo segundo o
CAGED (admissões e desligamento) foi de 645 mil em 2003. O saldo da RAIS (só universo celetista, para poder
comparar com o CAGED) quando é comparado o estoque do 31/12 de 2003 com similar informação ao 31/12 de
2002 (RAIS/2003 estoque 31/12 versus RAIS/2002 estoque 31/12) é de 659 mil, muito próximo ao CAGED.
Quando se utilizam exclusivamente os dados da RAIS/2003, o saldo entre admissões e desligamento no
transcurso do ano da 1.1 milhão. Ou seja, é um dado que, nitidamente, sobre-estima a geração de empregos
dado que existe uma omissão de desligamentos.
75/ A qualidade das informações deve ser creditado, em grande medida, à introdução de meios magnéticos para
a declaração, procedimento que coibi grande ou a maioria das incoerências ou erros de declaração. A ampliação
da cobertura é resultado tanto de uma maior fiscalização como de uma maior popularização da própria fonte.
76/ Além da maior cobertura que tornava pouco útil a construção de um PF, outro fator contribui para abandonar
essa procedimento metodológico. Com a terceirização das firmas, alteração organizacional que se aprofundou
na década de 90, um estabelecimento poderia reduzir seu nível de emprego devido a que terceirizava suas
atividades. Ao contar só como geração de empregos aqueles gerados a partir da variação do estoque de
assalariados dos estabelecimentos que declaravam dois anos seguidos, a tendência à terceirização tendia a
deprimir a contabilidade dos empregos gerados (ou sobre-estimar os perdidos).
77/ Sobre a credibilidade das estatísticas oficiais e a independência o órgão criador, o leitor interessado deveria
consultar Feijó, C.A., “Estatísticas Oficiais: credibilidade,reputação e coordenação”. Economia Aplicada. Vol. 6,
N º4. Outubro-Dezembro de 2002.
78/ Essa dependência é ainda maior quando parte do quadro do Ministério está composto por consultores ou
pessoal tercierizado, como é o caso do Ministério do Trabalho e Emprego.
79/ Não necessariamente todo corpo técnico que administra os RÁs não goza de estabilidade e é muito sensível
ao poder de turno. Justamente, existem casos nos quais os recursos humanos que gerenciam um RA gozam de
estabilidade, tem um plano de cargos e salários, etc. e, justamente, nesses casos (como o Banco Central ou a
Receita Federal) as séries apresentam uma maior credibilidade. Lamentavelmente, esse é o caso contrário do
Ministério do Trabalho e Emprego, onde não existe um corpo técnico com estabilidade para o gerenciamento dos
RÁs. Justamente, parte da polêmica sobre a série do CAGED a partir de 2002 surge pela influência que os
poderes de turno tem sobre os RÁs produzidos por esse Ministério. De contar-se com quadros com estabilidade
no emprego, dificilmente se duvidaria da série do CAGED e, poderíamos argüir, que, nessa hipóteses,
dificilmente se teria realizado uma mudança da série como foi realizada a começos de 2002 e as comparações
entre dados incomparáveis como se vem fazendo desde então.
80/ Não só destorcer informações, senão tornar compatíveis as informações (ou a distorção das informações)
proporcionadas a um RA com outro. Por exemplo, se os fiscais da Previdência utilizam a RAIS para fins de
fiscalização, como de fato utilizam, as respostas das firmas à RAIS deverá ser compatível com as dadas à
GFIP. Na mesma direção, como os micro-dados da RAIS são disponibilizados à Receita Federal, as
declarações dadas a esta última tem que guardar correspondência com a declaração dada à RAIS.
81/ Logicamente, aqui se impõe uma explicação, dado que seria imperdoável deixar ao leitor com a dúvida sobre
a origem de movimentos sazonais com direções opostas. No caso da PME, a queda na taxa de desocupação
surge tanto da habitual queda da PEA no último mês do ano como da elevação da ocupação devido ao aumento
da demanda, natural nesse período. Como os dados da PME se referem à média do mês, seus indicadores
assinalam quedas na taxa de desemprego tanto pela queda da PEA como pelo aumento da ocupação. No caso
do CAGED, como esse RA contabiliza informações até o último dia de dezembro, logicamente os dados do
último mês do ano incluem já os desligamentos produto do fim da bolha de consumo. Assim, concluímos que
ambos movimentos sazonais estão “corretos”, ainda que tenham direções opostas, devido à idiossincrasia de
cada fonte.
82/ Voltamos a mencionar os sites onde podem ser procuradas as notas metodológicas e os dados: PME e
PNAD em www.IBGE.gov.br; CAGED e RAIS em www.mte.gov.br e PED em www.dieese.org.br ou em
www.seade.gov.br.

Cap. 3:
1/ Um exemplo permitirá que esse conceito, que será fundamental para acompanhar a lógica posterior, fique bem claro.
Suponhamos que com um trabalhador possamos produzir 20 unidades de um bem. Se a firma contrata outro trabalhador, o
total de unidades se eleva para 39. Ou seja, a contratação de um assalariado a mais possibilitou aumentar a produção (de 20
para 39), mais esse trabalhador a mais gerou 19 unidades extra, menor que as 20 que lograva produzir oprimeiro. Se
contratamos um terceiro trabalhador, a oferta pode elevar-se, suponhamos, para 57. A contratação do terceiro assalariado

Page 127 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 129 -
permitiu aumentar a oferta em 18 unidades (menos que as 19 do segundo). Isso significa que a primeira derivada é positiva
(sempre o produto se elevadiante da contratação de um assalariado a mais) porém a contribuição é cada vez menor (a
segunda derivada é negativa).
2/As condições de segunda ordem para a maximização do lucro (expressão (2)), vem dadas por ∠LL= P * QLL ; ∠KK = P *
Q KK ; ∠LK = P * QLK ; ∠KL = P * QKL. Como P > 0, podemos expressar a condição de segunda ordem como ∠LL < 0, ∠
KK < 0 e ∠LL *∠KK – (∠KL) > 0, que está assegurada a partir da hipótese de uma função de produção estritamente
2

côncava em um entorno do ponto de equilíbrio. Lembremos que, se uma função é duplamente diferenciável e estritame ντε
χνχαϖα, εστ〈 ασσεγυραδα α εξιστνχια δε υµ νιχο ποντο δε µαξιµιζαο. 3/ Α σεγυιντε φυνο δε προδυο  υµ
χασο παρτιχυλαρ δα φυνο δενοµιναδα δε Χοββ−∆ουγλασ, χυϕα εξπρεσσο γεραλ, παρα δυασ ϖαρι〈ϖεισ
ινδεπενδεντεσ (ξ ε ψ) ποδε σερ εξπρεσσα δα σεγυιντε φορµα: Φ(ξ;ψ) = Α ξ 〈 y , onde A, 〈 e  são parâmetros.
4/ As produtividades marginais são decrescentes e convexas: QLLL < 0 e QKKK < 0.
5/ Utilizaremos o * ao lado de uma variável para identificar o valor que preenche as condições de primeira ordem ou um
ponto de equilíbrio.
6/ Estamos afirmando é a única alternativa que a firma possui porque está dada a tecnologia (a função de produção) e o
capital utilizado. Em outros termos, considerando uma tecnologia e o capital empregado, a única alternativa da firma para
elevar a produtividade marginal do trabalhoconsiste em reduzir a quantidade de assalariados empregados, devido à
produtividade marginal ser decrescente.
7/ Ver Capítulo ???.
8/ Devemos lembrar que a tecnologia está implícita na função de produção.
9/ O multiplicador de Lagrange, no caso do programa de minimização anterior, é o custo marginal. Lembremos que esse
multiplicador indica qual é a sensibilidade da função objetivo diante de mudanças (infinitesimais) na restrição.
0
10/ O dual do programa de minimização anterior seria: Max. Q(L;K) s.a. CT = w *L + r * K (maximizar a produção sujeita a
uma restrição orçamentária). A condição de equilíbrio,logicamente, seria a mesma (igualdade entre os rendimentos relativos
dos fatores com a razão entre as produtividades marginais). O multiplicador seria, neste caso, o inverso do custo marginal.
11/ Lembremos que uma função (f(x;y), por exemplo) é homogênea quando suas variáveis independentes podem ser
k
multiplicadas por um parâmetro (número real positivo, t) e o resultado é t f(x;y). O grau de homogeneidade será dado pelo
valor de k. Se k = 1, a função de produção tem rendimentos constantes. Quando k > 1, os rendimentos são crescente e se k
< 1 os rendimentos são decrescentes. A título de exemplo, podemos mencionar que, quando k = 1
(rendimentosconstantes), se dobramos os fatores, a produção dobrará.
12/ É fácil observar que, dividindo ambos os lados da expressão (26) por Q, obteremos L QL/ Q + K QK/Q = 1, onde L QL/
Q é a participação dos salários no produto e K QK/Q a participação dos rendimentos do capital. A soma 1 indica que o
produto se exaure com a sua distribuição entre os fatores de produção.
13/ O leitor pode conferir isso substituindo os valores de K e L que minimizam custos nas funções de produtividade
marginal que se obtém derivando a função de produção. A relação é 2 (com um pequeno erro de aproximação quando se
dividem as produtividades marginais).
14/ CES são as siglas em inglês para elasticidade de substituição constante-constant elasticity of substitution.
15/ Essa inclinação é negativa, dado que a inclinação da isoquanta é negativa. Contudo, o importante é a magnitude em
termos absolutos.
16/ Lembremos que, dada uma função y = f(x), a elasticidade de y com respeito a x (  y,x) pode ser definida como:  y,x =
(dy/dx) (x/y).
17/ Na literatura, os economistas neo-clássicos sempre tenderam a utilizar de forma generalizada a Função de Produção
Cobb-Douglas pela sua operacionalidade e simplicidade, entre outras características. Entre estas últimas destaca-se a
elasticidade substituição constante. Contudo, a desvantagem de funções desse tipo está vinculada ao fato que esta
adquire, sempre, o valor unitário. Contudo, certas funções podem ter como elasticidades substituição constantes mais
diferentes de 1. Em geral, uma função CES (Elasticidade-Substituição Constante) tem a seguinte forma:
Q = A {á K + (1-á) L } ∝ 
- - - /

É relativamente fácil provar que essa função tende a uma Cobb-Douglas quando  0. A, 〈, e ∝ são parâmetros.
O parâmetro 〈 está associado à distribuição de renda,  está vinculado à substituição, ∝ é o grau de homogeneidade da
função e A pode ser associado á eficiência ou produtividade da tecnologia. A distribuição de renda depende tanto do
parâmetro distributivo ( 〈) como do grau de substituição .
18/ Um dos argumentos utilizados para a utilização de função de produção Cobb-Douglas está, justamente, associado a
sua elasticidade-substituição unitária. Como a distribuição de renda entre capital e trabalho é um parâmetro relativamente
estável nos diferentes países, essa função de produção seria compatível com as evidências empíricas. Em geral, na
ausência de rupturas
institucionais radicais (como uma revolução, por exemplo), a distribuição de renda é um fenômeno que só é alterado de
forma lenta, sendo tangível só no longo prazo. Voltaremos a abordar este no tema no Capítulo V, quando analisaremos a
Teoria do Capital Humano, principal suporte teórico dos neo-clássicos para explicar a distribuição pessoal (não funcional,
ou seja, entre os fatores de produção) de renda.
19/ Estudaremos as correlações entre educação e produtividade no Capítulo V, quando
abordaremos a teoria do Capital Humano.

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 130 -
20/ Em termos formais, essa conclusão é quase tautológica. Com efeito, a produtividade (Pr) pode
ser definida como o produto (Q) dividido pela quantidade de trabalhadores (L). Ou seja, Pr = Q/L..
Essa seria a definição de produtividade e pode ser expressa da seguinte forma: Q = Pr * L. Em
termos de taxas de variação, temos que q = pr + l (onde a letra minúscula indica a taxa de variação da variável). Em outros
termos, temos que: l = q – pr. Assim, a taxa de crescimento do emprego pode ser deduzida a partir do diferencial entre a taxa
de crescimento do produto e a taxa de crescimento da produtividade. Quanto maior for o percentual de variação desta
última, menor será o impacto sobre o emprego de uma dada taxa de elevação do PIB.
21/ Citamos o caso da França visto que essa política de redução da jornada legal de trabalho teve como fundamento,
especialmente a implementada pelo Governo de Jospin, a geração de emprego. Porém, a tendência à queda nas horas
semanais de trabalho é mais geral. Na Alemanha, por exemplo, a diminuição das horas semanais foi um ponto de discussão
entre as centrais sindicais e as patronais nos acordos coletivos anuais, resultando em reduções da jornada semanal para 35
horas em setores com elevado grau de sindicalização.
22/ Essa jornada máxima pode estar referida a diferentes intervalos de tempo. Ou seja, um máximo por dia, por semana ou
por ano, ou uma combinação dessas três restrições.
23/ Outra alternativa, ainda que formalmente mais complexa e com resultados similares, consistirá em minimizar uma função
objetivo dada pelos custos, sendo a restrição um determinado nível de produção. Assim, teríamos que: Min. CT (K, L, h),
s.a. F [ K; L * e(h) ] εQ*, onde Q* é um nível de produto exogenamente determinado. O problema consiste em determinar os
níveis de K, L e h que minimizam a função de custos respeitando a restrição.
24/ Lembremos que, supondo dois fatores de produção (K e L), para maximizar lucros a firma tem
que se situar em um ponto no qual QL/ QK = w / r. Neste caso, como estamos supondo que a firma é tomadora de preços
no mercado de fatores, os custos marginais do capital e do trabalho são, respectivamente, r e w.
25/ Dado que o valor da produtividade marginal é igual ao preço do bem (ou seja, o preço de Q) vezes a produtividade
marginal, como o preço é o mesmo, visto que o bem produzido pelas horas e o trabalho é o mesmo, o cociente entre os
valores das produtividade marginais se reduz à relação entre as produtividades marginais.
26/ Lembremos que, na análise desenvolvida nesta Seção, consideramos a quantidade produzida dada e, assim, uma
alteração na jornada legal de trabalho gerava substituições entre os três “fatores” (quantidade de assalariados, quantidade
de horas trabalhadas por trabalhador e capital) para produzir essa quantidade. Uma perspectiva diferente (ou complementar
da anterior) consiste em considerar que a quantidade produzida também pode ser afetada pela alteração de uma mudança
na jornada de trabalho legal.
27/ No prefácio de seu Livro mais famoso, Princípios de Economia Política e Tributação, Davi Ricardo sustenta:
“Determinar as leis que regulam essa distribuição é a principal questão da Economia Política.....” (ver, Ricardo, D.
Princípios de Economia Política e Tributação, 1982, Abril Cultural, São Paulo, pag. 39)
28/ O critério se denomina de Pareto dado que foi proposto por Vilfredo Pareto no seu livro Manuel dEconomie Politique
(Manual de Economia Política), de 1906. Em realidade, a economia do bem-estar se “apropriou” do critério de Pareto, dado
que o objetivo deste era analisar a eficiência do equilíbrio no sistema walrasiano.
29/ Outra variável que, para esse arcabouço teórico, reveste mais importância para o tratamento dos aspectos vinculados à
desigualdade dos rendimentos está diretamente vinculada à educação. Esse tema será tratado no Capítulo V, no qual
abordaremos a Teoria do Capital Humano.
30/ Desde essa perspectiva, muitos dos diagnósticos que no cotidiano observamos como identificados com processos
discriminatórios não poderiam ser catalogados como tais. Por exemplo, é comum que, no dia Internacional da Mulher ou em
jornadas contra a prática de racismo, os movimentos feministas ou os movimentos negros apresentem estatísticas do
mercado de trabalho no qual as mulheres ou os negros ganham menos que os homens ou os brancos. Para um neoclássico,
esse dado não estaria provando que existe discriminação, ao menos no mercado de trabalho. Suponhamos que uma das
variáveis que determinam a produtividade seja a educação (ver Capítulo V, Teoria do Capital Humano). Se as mulheres ou
os negros apresentam um menor nível de escolaridade que os homens ou os brancos, segundo o arcabouço neoclássico o
diferencial não é, necessariamente, discriminação. Para quantificar o grau de discriminação se teria que utilizar alguma
variável de “controle”, ou seja, calcular os salários para homens e mulheres com o mesmo grau de escolaridade. Esse é o
diferencial que deveria ser atribuído à discriminação.
31/ Esse “imperialismo” da economia sobre campos tradicionalmente ocupados por outras ciências sociais fica evidente
nessa explicação de tendências da sociedade a partir de imperativos exclusivamente econômicos (como, no caso da
discriminação, da concorrência). A crescente importância dos direitos humanos nas sociedades contemporâneas é
explicada por muitos neoclássicos a partir da Teoria do Capital Humano (educação, por exemplo), devido a sua notável
crescente importância nas sociedades modernas como fator explicativo do crescimento econômico. Abordaremos os temas
vinculados ao Capital Humano no Capítulo V.
32/ Logicamente, estamos supondo discriminação contra o sexo feminino, os negros e segmentação geográfica e setorial.
33/ Para Ricardo, a renda dos proprietários da terra era um resíduo uma vez determinados a remuneração dos salários e os
lucros do capital. Na medida em que se utilizavam terras cada vez menos férteis, a renda dos proprietários agrícola subiria e,
no limite, assistiríamos a um esgotamento no processo de acumulação de capital. Lembremos, contudo, que toda a
construção ricardiana tem como base, como em Marx, a teoria do valor-trabalho, um arcabouço teórico que depois foi
abandonado pela teoria neoclássica.
34/ Essa crítica à agregação do capital oriunda da heterogeneidade do mesmo e, em geral, da função de produção
neoclássica foi realizada pela escola de Cambridge, Inglaterra. A partir dessa contestação, houve uma resposta do

Page 129 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 131 -
pensamento neo-clássico a partir de outra Cambridge, EUA, estabelecendo-se, assim, a polêmica que, na literatura, ficou
conhecida como controvérsia de Cambridge. Em termos individuais, os maiores exponentes dessa polêmica foram Joan
Robinson, pela Cambridge-Inglaterra e Paul Samuelson, pela Cambridge-EUA. A perspectiva crítica de Joan Robinson com
respeito à função de produção pode ser sintetizada a partir de seguinte afirmação: “ Mais ainda, a função de produção foi
um instrumento muito eficaz de deformação (mis-education no original). Se ensina ao estudante de teoria econômica a
fórmula Q = f(K,L), onde L é a quantidade de trabalho, K a quantidade de capital e Q a produção de mercadorias. Ele é
instruiído a assumir que todos os trabalhadores são parecidos e que L deve ser medido na quantidade de horas de trabalho
. Diz-se-lhe alguma coisa sobre o problema dos números índices que envolvem a escolha de uma medida para a produção e
apressadamente passa-se à questão seguinte, na esperança que ele (o aluno) esqueça de perguntar em que unidade
medimos K (o capital). Antes que ele coloque essa questão, ele será professor e, assim, a indolência intelectual se
transmitirá de uma geração a outra” (Robinson, J., “The Production Function and the Theory of Capital”, Review of
Economics Studies, Vol XXI (2), Nº 55, pag. 81. A tradução é nossa. Existe uma versão em Português desse artigo no livro
Contribuições à Economia Moderna, Jorge Zahar, 1978)
35/ Keynes, por exemplo, foi explícito quando sustentou que a inadequação da teoria por ele denominada de clássica
provinha não das deduções lógicas a partir de suas hipótese senão da falsidade das hipóteses: “Nossa crítica à teoria
econômica clássica geralmente aceita consistiu menos em revelar os defeitos lógicos de sua análise do que em assinalar o
fato de que as suas hipóteses tácitas nunca ou quase nunca são satisfeitas, com a conseqüência de que ela se mostra
incapaz de resolver os problemas econômicos do mudo real” ( Keynes, J;M;, Teoria Geral do Emprego, do Juro e da
Moeda, Editora Atlas, 1982, pág. 288. Essa obra de Keynes, que revolucionou a ciência economica, foi originalmente
publicada em 1936).
36/ O termo balanização originou-se em um hoje clássico trabalho de Kerr, C., The Balkanization of Labor Markets, MIT
Press, 1954, uma das referências incontornáveis da corrente institucionalista, alternativa teórica ao neoclassisismo.
Abordaremos a corrente institucionalista no Capítulo ?.
37/ Ainda que pareça paradoxal, esta posição não é incomum no pensamento econômico. Robert Lucas, Prêmio Nobel de
Economia e um dos maiores teóricos de uma corrente dentro do pensamento neoclássico, as expectativas racionais,
sustentou que o conceito de desemprego involuntário (ou seja, o desempregado que gostaria de trabalhar ao salário
vigente mais não encontra vagas) é uma invenção de Keynes e que, portanto, não está dentro de suas preocupações tentar
explicar um fenômeno que, para ele, não existe. Talvez esse desleixo se deva a que, muito provavelmente, o Professor Lucas
está, e seguramente sempre esteve, empregado. De toda forma, aos interessados em consultar essa preciosidade teórica
remetemos ao artigo (“Unemployment Policy”, American economic Review, N 168, 1978).
38/ Esses modelos serão tratados com certo detalhe no Capítulo IV.

Cap. 4:
1/ Atitudes como essas levam a muitos críticos da corrente neoclássica a afirmar que a postura dos teóricos dessa escola
poderia resumir-se como: “se a realidade não é compatível com o modelo, pior para a realidade” ou “estatísticas não podem
desqualificar sólidos argumentos”.
2/ É fácil concluir que, se um indivíduo tem ilusão monetária, todo a modelagem de maximização de utilidade sujeita a uma
restrição orçamentária que baliza a Teoria do Consumidor vai por água abaixo. Nessa análise, o relevante não são os preços
absolutos senão os preços relativos. A moeda só serve como unidade de medida. Em termos práticos: se dobram todos os
preços (dos bens, do trabalho, etc.) o ponto de equilíbrio não muda. Se temos ilusão monetária, o equilíbrio pode mudar.
Ou seja, importam os preços relativos e os absolutos. No caso dos salários relativos, na análise microeconômica corriqueira
o “agente representativo” é míope, não olha para "o lado”. O importante é afunção de utilidade do consumidor, por
exemplo, sua renda e os preços relativos. Se na função de utilidade de Maria entra a forma de vestir de Joana, temos uma
externalidade no consumo e todo o modelo muda. Keynes sustentava que um sindicato ia estar insatisfeito se o sindicato
do lado conseguisse uma elevação de salários. Deve ficar claro que não estamos criticando os supostos de Keynes,
simplesmente afirmando que eram incompatíveis com a análise microeconômica que os neo-ckeynesianos conservaram.
3/ Quando Richard Nixon, o Presidente dos EUA, declarou, no fim dos anos 60, que “hoje somos todos Keynesianos”,
estava se referindo a essa síntese dos neo-keynesianos e refletia bem a profundidade hegemônica que, na época, essa
corrente atingiu.
4/ Em realidade, para ser justos, deveríamos mencionar um esforço nessa direção realizado pelos
denominados macroeconomistas do desequilíbrio (Clower, Leijonhufvud, Barro, Grossmam, Benassy e Malinvaud são, tal
vez, os teóricos mais notórios). Essa perspectiva macroeconômica, promissória no começos dos anos 80, não consegui
consolidar-se como um paradigma alternativo e hoje não integra a agenda de discussão.
5/ Na literatura, a fundamentação de uma economia de mercado, as hipótese de existência e suas características (equilíbrio
ou equilíbrios, estabilidade, etc.) foram estabelecidas no Modelo de Equilíbrio Geral desenvolvido por K.J. Arrow, F.H.
Kant e G. Debreu. Tal vez as referências mais famosas sejam, Arrow, K.J. and Debreu, G., “ Existence of an Equilibriun for a
Competitive Economy”, Econometrica, Vol. 22, July, 1954; Arrow, K.J. and Hahn, F.H., General Compétitive Analysis,
Holden days, San Francisco, 1971 e Debreu, G., Théorie de la Valeur, Dunod, Paris, 1966. Não obstante serem três os
maiores teóricos da teoria do equilíbrio geral moderno, popularmente o modelo se conhece como de Arrow-Debreu. Arrow,
junto com John R. Hicks, recebeu, em 1972, o Prêmio Nobel de Economia, justamente, devido a suas contribuições ao
Modelo de Equilíbrio Geral. Hoje, nos programas de economia, ainda no caso da pós-graduação, não obstante sua

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 132 -
importância teórica (e, em não poucas circunstâncias, sua utilidade na pesquisa empírica), o Modelo de Equilíbrio Geral
dificilmente é estudado. Os modelos apresentados à maioria dos estudantes se limitam ao equilíbrio parcial (um mercado).
6/ Nós estamos referindo especificamente à escola neoclássica. Outras correntes, como os keynesianos mais radicais,
sempre consideraram o mundo como estando caracterizado pela incerteza. Todavia, essa é outra perspectiva e sua análise
escapa aos objetivos de nosso texto.
7/ Os desenvolvimentos teóricos vinculados à informação assimétrica valeram o Prêmio Nobel de Economia 2001 para
George A. Akerlof, A. Michael Spencer e Joseph E. Stiglitz. O artigo de Akerlof de 1970 (The Market of Lemons..) hoje é um
clássico e inaugurou um novo campo teórico e de pesquisa. Em qualquer livro moderno de Microeconomia dedica-se um
Capítulo aos problemas de informação e o marco de referência é o modelo apresentado por Akerlof. Ver, por exemplo, o
Capítulo 32 do livro-texto de Hal. R. Varian, Microeconomia, Princípios Básicos, Editora Campus, 1994, hoje a referência
bibliográfica mais popular para o Ensino de Economia na Graduação no Brasil. No caso dos livros-texto da pós-graduação,
o livro de D. M. Kreps (A Course in Microeconomic Theory, McGRAW-HILL, NY, 1995) dedica três capítulos aos
modelos de informação imperfeita e um a apresentar o modelo de Akerlof.
8/ Na literatura, esse campo da Teoria Econômica é conhecida como Teoria dos Incentivos. Esta é, realmente, uma nova
perspectiva de analisar as economias de mercado. Historicamente, a economia neoclássica assumia o mercado como uma
construção “natural”. Toda atividade econômica levaria à geração de um mercado. Uma perspectiva mais heterodoxa via o
mercado como uma “instituição”, uma forma de organizar a produção e distribuição criada socialmente (historicamente
datada). Atualmente, muitos neoclássicos assumem que os mercados atuam pautados por marcos institucionais, que
podem ser mais ou menos eficientes, dependendo dos incentivos que transmitem a seus participantes. Vamos dar um
exemplo para ilustrar esses conceitos gerais através de um caso concreto. No Brasil, existem analistas que sustentam que
as instituições que regulam o mercado de trabalho (a Consolidação das Leis Trabalhistas, CLT, e a Constituição, etc.)
incentivam a rotatividade, impedindo uma maior formação profissional na própria firma e elevando os conflitos trabalhistas.
A proposta de reforma não seria eliminar as regulamentações senão reformá-las, a fim de introduzir incentivos para que os
vínculos trabalhistas sejam mais duradouros. Voltaremos sobre este ponto no Capítulo XII, quando analisaremos as
abordagens institucionalistas e as propostas de reforma às instituições que regulam o mercado de trabalho brasileiro.
9/ Na literatura anglo-saxão, esse tipo de risco se denomina de “Moral Hazard”. Utilizamos a tradução de “Risco Moral”.
Outra tradução possível e também utilizada é “Perigo Moral”.
10/ Podemos mencionar duas obras como sendo cruciais para essa mudança na forma de relacionar salários e
produtividade. A primeira é o livro de Leibestein, H., Economic Backwardness and Economic Growth, Wiley, NY, 1957,
cujo enfoque é mais nutricional ou biológico. O mesmo autor retoma o tema em um artigo de 1966, “Allocative Efficiency
versus X- efficiency”, American Economica Review, Nol. 56, juin), onde a relação entre salários e eficiência deixa de ser
tratada em termos tecnológicos ou biológicos e concentra a atenção na motivação dos trabalhadores como variável que
contribui para determinar a produtividade. Posteriormente, esses tipos de modelos identificando relações entre salários e
produtividade mais complexas se multiplicam, resultando nos diferentes modelos que estudaremos ao longo deste
Capítulo.
11/ Dado que já analisamos o artigo de Oi com certo detalhe no Capítulo III, não nos deteremos, agora, nas suas
especificações.
12/ Em realidade, essa seria uma aplicação particular, no caso do Mercado de Trabalho, dos vínculos entre preço e
qualidade. Sinteticamente, quanto maior for o preço que estamos dispostos a pagar por um bem, maior será a qualidade que
poderemos obter.
13/ Estamos supondo pleno emprego. Ou seja, um mercado de trabalho neoclássico, com salário único que iguala a oferta e
demanda e é flexível. Nesse caso, se o assalariado é desligado, dado o pleno emprego, consegue mais ou menos
imediatamente outro emprego ao salário real vigente.
14/ Na literatura, o resultado de (L·e) se denomina, muitas vezes, trabalho eficaz ou trabalho
eficiente. Se denominamos de Le esse trabalho eficaz ou eficiente, a função de produção representada em (1) tem as
hipótese usuais das funções de produção neoclássicas (FLe > 0 FLeLe < 0).
15/ O modelo que desenvolveremos a seguir é aquele comumente utilizado para “sintetizar” as principais idéias implícitas
nas distintas abordagens que tratam de Salários de Eficiência e a referência bibliográfica é o modelo de Solow de 1979
(“Another Possible Source of Wage Stickiness”, Journal of Macroeconomics, Vol 1,).
16/ Na literatura, a condição (7) se denomina de Condição de Solow, devido a seu formulador, o economista Robert Solow,
um dos idealizadores dos primeiros modelos de Salários de Eficiência
(ver Nota Rodapé N º 14).
17/ Não exploraremos aqui as condições de segunda ordem, que requerem que a inclinação da curva de custo marginal seja
superior à curva de custo médio (CMa’ > CMe’ ). Em outros termos, que a curva de CMa corte a curva de CMe por baixo.
18/ Essa definição do CMa surge do Teorema da Função Inversa. Através deste se pode provar que se f(x) é estritamente
crescente ou estritamente decrescente em um intervalo S e x0 ª S, f tem uma função inversa g, contínua e estritamente
crescente ou decrescente em S e g’(x0) = 1/ y ‘ (x0).
19/ Alternativamente, poderíamos raciocinar em termos do “dual”: o ponto no qual a firma maximiza a intensidade do
esforço por unidade de salário.
20/ Dado que o raciocínio é simétrico, não nos deteremos no caso de elasticidade menores que 1.
21/ Como já afirmamos, para simplificar a álgebra, supusemos que o único insumo na função de produção fosse o trabalho.

Page 131 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 133 -
As conclusões não mudariam se incluíssemos outros fatores (como capital ou recursos naturais, por exemplo). Contudo, é
fácil perceber que o salário escolhido pela firma independe do preço desses outros insumos.
22/ O Salário de Reserva é o patamar mínimo de salário a partir do qual o indivíduo participa do mercado de trabalho.
Apresentamos esse conceito (Salário de Reserva) no Capítulo I.
23/ Na literatura anglo-saxã o termo utilizado é “shirking”, que significaria alguma coisa como “não realizar seu trabalho ou
seus deveres ou obrigações”.
24/ No Brasil, por exemplo, o empregador, quando desliga um empregado sem justa causa, deve pagar, ao próprio
trabalhador desligado, uma “multa” de 40% do saldo do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço).
25/ Veremos, no próximo Capítulo, que essa formação brindada pela firma se denomina de Capital Humano Específico e
apresenta diversos desdobramentos em termos de políticas educacionais, emprego, desemprego, etc.
26/ Existe uma certa dificuldade na tradução da expressão em inglês “gift”. Seria uma espécie de “favor”, “presente”,
“dádiva”, etc. Os franceses utilizam o termo “don”.

Cap. 5:
1/ Lembremos que estes modelos tentam explicar porque os salários sobem ou descem nos movimentos conjunturais, não
porque alguns salários sobem e outros descem.
2/ John Stuart Mill (1806-1873) foi o filho maior de James Mill, contemporâneo e influente amigo de Ricardo.
3/ Tendo em vista os objetivos do nosso livro, não abordaremos o tratamento dado por pensadores de esquerda (marxistas
ou não) ao tema da educação. Cabe mencionar, porém, que na obra de Marx o tema da educação dos trabalhadores,
especialmente a educação técnica, foi em diversas ocasiões mencionado, sobretudo em textos políticos. Marx via a
educação tanto como uma exigência do progresso técnico como uma política para o fortalecimento da classe trabalhadora
na sua luta pela superação da sociedade capitalista. Contudo, seus herdeiros tenderam a negligenciar o papel da educação,
dando ênfase aos aspectos organizacionais da classe trabalhadora e ao conflito social e político.
4/ Tanto Gary Becker como Theodore Schultz foram galardoados com o Prêmio Nobel de Economia (1992 e 1979,
respectivamente).
5/ Como o leitor pode perceber, não abordaremos os temas vinculados às inter-relações entre educação e crescimento
econômico, um tema hoje muito estudado pelos atuais modelos de crescimento econômico.
6/ Logicamente, uma terceira alternativa seria ingressar no mercado de trabalho e paralelamente estudar. Em última
instância, a lógica não muda, visto que entre os custos devem estar computados o esforço do estudo, além, obviamente,
dos eventuais custos associados ao estudo (deslocamento, material bibliográfico, matrícula, no caso do ensino privado,
etc.).
7/ Estamos supondo, acompanhando a Teoria do Capital Humano, que os retornos da educação são exclusivamente
econômicos. O maior status social produto de maior educação, por exemplo, não é considerado. Contudo, o modelo não se
alteraria se, entre os benefícios de maior acumulação em capital humano, além dos maiores rendimentos, incluimos a
valoração que o indivíduo outorga ao maior status social.
8/ Aliás, ao elevar o capital humano de seus trabalhadores, a firma pode estar elevando as chances desses assalariados
encontrarem outros empregos. O seja, a formação pode elevar a rotatividade dos empregados e, assim, aumentar os custos
da firma. Assim, a formação ou reciclagem pode ser uma das causas das firmas pagarem “Salários de Eficiência”, modelos já
tratados no Capítulo anterior.
9/ Esta hipótese nutre uma série de pesquisas que tratam de quantificar o diferencial de rendimentos na vida adulta entre
dois indivíduos com igual escolaridade mas ambientes familiares distintos na primeira infância. Por exemplo, um indivíduo
oriundo de uma família pobre e outro cuja origem é uma família abastada.
10/ Essas considerações, que a primeira vista parecem apresentar um certo viés acadêmico ou teórico, são, em realidade, de
crucial importância para a formulação de políticas públicas. Como estudaremos no Capítulo XIII, quando abordaremos as
diferentes Políticas de Emprego, a estratégia dos governos consiste em formar ou reciclar os desempregados no intuito de
torná-los “empregáveis”. Contudo, se a formação adquirida em cursos não é rapidamente aplicada devido a que o
desempregado não consegue uma colocação mais ou menos imediata, as habilidades e técnicas estudadas nos cursos de
formação podem facilmente ser “esquecidas”. Assim, os recursos públicos aplicados serão de duvidosa eficiência e
eficácia para reduzir o desemprego quando aplicados genericamente. Nessa perspectiva, a formação e reciclagem deveria se
realizar só quando o desempregado tivesse uma oferta concreta de emprego e sua deficiente formação fosse seu único
handicap.
11/ O exemplo clássico é a fabricação de chapéus.
12/ Essa possibilidade pode ser ilustrada tomando como referência os taquígrafos, uma profissão já quase desaparecida
pelo surgimento de formas mais confiáveis, rápidas e seguras de reprodução de discursos, palestras, etc.
13/ Uma outra possibilidade de perder capital humano já acumulado está correlacionada com a idade, na medida em que, a
partir de um certo momento, a deterioração física pode ser perceptível, especialmente quando associada a trabalhos físicos.
Em geral, independentemente de ser trabalho físico ou intelectual, com o transcorrer dos anos, a flexibilidade ou
capacidade dos indivíduos em adquirir ou atualizar seus conhecimento e modos de pensar se reduz.
14/ Poderíamos mencionar outras menos evidentes. Hábitos, por exemplo, que são adquiridos tanto no sistema escolar
como no ambiente familiar (disciplina nos horários, formas de apresentar-se e comunicar-se, higiene, etc.). Esses aspectos,
que os sociólogos costumam denominar de “socialização”, estão muito vinculados com as possibilidades de mobilidade

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 134 -
social e podem ser cruciais na hora de preencher os “requisitos sociais” mas que os “requisitos técnicos”, para um
determinado posto de trabalho.
15/ Essa acumulação de capital humano específico fruto da experiência é representado por uma função côncava, que
sintetiza o fato de que, na medida em que transcorrem os anos, os rendimentos oriundos do trabalho sobem mas a taxas
decrescentes. Nas equações econométricas de salários esse fato é representado por uma função onde a variável idade
entra duas vezes, uma de forma simples e outra elevada ao quadrado.
16/ Estamos restringindo a análise aos rendimentos do trabalho. Um indivíduo ou família podem apresentar um
sub-investimento em capital humano e não serem pobres em razão de possuírem os outros ativos (capital, terra, etc.). A
herança, sorte (ganhar na loteria, por exemplo), etc. podem estar na origem de um expressivo estoque de outros ativos
ainda que o capital humano acumulado seja reduzido. Se não incorporarmos na análise esses outros ativos e restringirmos
a nossa análise aos rendimentos do trabalho, a pobreza se explicaria a partir de, exclusivamente, uma baixa acumulação de
capital humano. Na realidade, seguramente esses handicaps se acumulam. Indivíduos ou famílias com baixo capital humano
muito seguramente apresentam baixas dotações de outros ativos.
17/ Logicamente, estamos restringindo a análise às generalidades. Não estamos considerando indivíduos que sabiam das
potencialidades da educação mas não tinham a inteligência mínima requerida para atingir o capital humano necessário e se
situar sobre a linha de pobreza, ou tinham problemas de personalidade, etc. De qualquer forma, é factível imaginar
inter-relações entre fenômenos, especialmente, ainda que não exclusivamente, na perspectiva inter-generacional. Vamos
dar dois exemplos. Um baixo desenvolvimento intelectual pode ser produto de uma infância vivida no seio de uma família
pobre (a desnutrição afetando o desenvolvimento intelectual, por exemplo). O segundo exemplo diz respeito a problemas
de personalidade que se desenvolveram a partir de fatores econômicos (a pobreza propiciando, em indivíduos naturalmente
predispostos, o alcoolismo).
18/ Poderíamos colocar toda essa discussão em termos de projeto de investimento. Nas famílias pobres, a taxa de desconto,
ou seja, o valor que seus membros outorgam ao presente, é muito elevado. Não tem nenhuma relevância se a mãe (pobre)
de uma criança sabe que, se ela estuda e chega a ser “doutor”, terá uma vida com poucas privações materiais, visto que
seu horizonte de tempo pode ser o dia (não tem nada para comer hoje). Nessas circunstâncias, um horizonte de 15 anos é,
para ela, o infinito, ou, em termos de valor presente, o valor atual desse hipotético fluxo de renda futuro é próximo de zero.
Ela tem que sobreviver hoje e, esse imperativo, torna o projeto de investimento “Educação das Crianças” inviável.
Assim, a questão não é saber se as famílias pobres não conhecem os benefícios da educação ou elevar a oferta de vagas
para esse público. A questão é que, dada sua situação, a preferência intertemporal está muito viesada para o presente
(elevada taxa de desconto) e esse fato não torna viável os “Projetos de Investimento em Educação”.
19/ Em termos da classificação das políticas sociais, uma política pode ser universal ou focalizada. No caso da política ser
universal, todo cidadão de uma sociedade, pelo simples fato de pertencer a ela, tem direito. O exemplo mais comum, hoje no
Brasil é a educação primária e a saúde. Contrariamente, uma política focalizada requer pertencer a um determinado grupo
social, definido previamente pelo governo ou seus parceiros. A “Bosa-Escola” é um típico exemplo de política focalizada.
Em geral, a discussão entre políticas sociais universais e focalizadas é um divisor de águas entre as corrente de “direita” e
“esquerda”. No caso da direita, seus teóricos sustentam que a intervenção do Estado na área social deve limitar-se às
famílias pobres, as demais deveriam procurar satisfazer suas necessidades de bens ou serviços no mercado. A lógica é
mais ou menos o seguinte: porque utilizar recursos públicos para financiar a saúde de uma família com recursos suficientes
para satisfazer suas necessidades por meio da oferta privada (um seguro saúde, por exemplo). Porque não concentrar os
poucos recursos públicos disponíveis em um público que conta com recursos suficientes para “comprar” os bens ou
serviços oferecidos pelo setor privado. Esta preocupação deu início a toda uma série de pesquisas, tanto no Brasil como
no resto do mundo, que tenta identificar o público alvo dos programas sociais do governo, seu impacto sobre as
condições de vida das famílias menos favorecidas e sobre a distribuição de renda. Sob uma perspectiva de “esquerda”,
essa análise peca por um viés “economicista”. A educação e saúde, por exemplo, seriam serviços cujos impactos positivos
permeiam amplas populações, chegando a atingir um contingente muito além daquele beneficiado de forma direta (ou seja,
apresentam externalidades positivas) e, por outro lado, seriam direitos do cidadão, independentemente de sua situação
econômica e social.
20/ Como os programas do tipo “Bolsa Escola” são desenhados e administrados de forma descentralizada (existe um
programa federal mas a forma concreta que adote o projeto depende da iniciativa dos Estados ou Municípios, os quais
definem algumas de suas características, como a quantia a ser transferida a cada família e o público alvo), o montante que
recebe cada família muda segundo o Município e o Estado. O Programa Federal garante uma transferência de R$ 15 por
filho até um máximo de três filhos (máximo de R$ 45 por família).
21/ O PT sustenta que esse tipo de programa teve seu berço na administração de Cristovam Buarque (PT) em Brasília (DF).
Contrariamente, o PSDB alega que o primeiro programa desse tipo foi implementado em Campinas, na administração de
José Roberto Magalhães Teixeira (PSDB).
22/ Lembremos que o Coeficiente de Gini no Brasil, um dos indicadores mais tradicionais para medir a distribuição de renda,
é próximo de 0,60. Esse coeficiente pode tomar valores entre 0 e 1 e quanto mais elevado (mais perto de 1) maior a
concentração de renda. Segundo as séries estatísticas internacionais, o país que ostenta um dos maiores coeficientes de
Gini, só superado por poucos países, como Serra Leoa, na África. O Gini do Brasil é próximo daquele registrado na África
do Sul, Zimbábue e Paraguai. Em geral, os menores Índices são registrados nas nações desenvolvidas. A Finlândia, por
exemplo, apresenta um Gini de 25,6, Itália 27,3, Japão 24,9, Dinamarca 24,7, Noruega 25,8. Contudo, certos países em
desenvolvimento apresentam coeficientes similares aos registrados nos países de maior renda. Egito, por exemplo, observa

Page 133 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com
- 135 -
um Gini de 28,9, Coréia 31,6, Mongólia 33,2. (Fonte: World Development Report, 2000-2001, Worl Bank, Oxford University
Press, 2000)
23/ Na literatura anglo-saxã, esse problema de incompatibilidade é conhecido como problema de “matching”.
24/ As justificativas teóricas, a experiência internacional e a prática nacional das políticas de formação e reciclagem serão
tratadas com mais detalhe no Capitulo XV, onde abordarmos as Políticas de Emprego.
25/ A taxa média anual de crescimento entre 1967 e 1973 foi de 11,2%.
26/ Essa tese foi formulada originalmente por um livro de Carlos Langoni, Distribuição de Renda e Desenvolvimento
Econômico no Brasil, Editora Expressão e Cultura, Rio de Janeiro, publicado originalmente em 1973 é hoje,
independentemente do pesquisador coincidir ou não com suas tese, é uma referencia incontornável no país, especialmente
por ser o primeiro esforço para analisar a evolução da distribuição de renda e ensaiar uma explicação a partir de um marco
teórico relativamente consolidado (a Teoria do Capital Humano). Langoni estuda o período de 1960 e 1970 a partir dos
dados censais. A esperança que esse processo fosse passageiro e o próprio processo de desenvolvimento gerasse um
movimento contrário (redução das desigualdades), fica claro no título de um artigo que o próprio Langoni escreveu na
época: ” Depois do boom virá a distribuição”, no Jornal do Brasil, 26-11-71.
27/ Essa trajetória é denominada de “Curva de Kusnetz”, devido ao autor de sua formulação (I.B. Kusnetz). Além desses
aspectos vinculados à Teoria do Capital Humano, a concentração de renda era vista como sendo necessária para superar a
“armadilha do subdesenvolvimento”. Os países subdesenvolvidos não podiam se desenvolver porque não gerariam a
poupança suficiente, em virtude de seu nível de renda, para financiar os investimentos que viabilizassem a elevação de
seus patamares de renda. Ou seja, a pobreza se autoreproduzia pela restrição da poupança. Ao concentrar a riqueza se
viabilizariam os investimentos uma vez que elevava o nível de poupança (a propensão a poupar aumenta na medida em que
se eleva o nível de renda). Esse processo era sintetizado na frase “aumentar o bolo para depois distribuí-lo”. Hoje, os
modernos modelos de crescimento endógeno colocam dúvidas sobre essa associação. A experiência internacional tem
mostrado que os países que apresentam distribuições de renda mais igualitárias atingem taxas de crescimento mais
elevadas e sustentáveis que aqueles, como o Brasil, que registram distribuições
de renda muito concentradas.
28/ No Capítulo IX, quando estudamos o modelo macroeconômico pós-keynesiano, desenvolveremos uma crítica mais
radical. Seguindo a tradição Clássica (Ricardo e Marx), os pós-keynesianos vinculam o salário com o processo de
acumulação. Contudo, como já mencionamos, neste Capítulo estamos tratando o tema desde uma perspectiva
microeconômica e, assim, não estamos analisando porque os salários sobem ou descem, senão porque alguns sobem e
outros descem (ou, em termos mais rigorosos, os salários relativos).
29/ Sob uma perspectiva um pouco mais sofisticada, poderíamos supor que adquirir esses “sinais” tem custos, seja
financeiros (o custo dos estudos) ou de outro tipo (esforço e dedicação ao estudo). Para os indivíduos mais aptos, esses
custos serão menores, seja porque vão permanecer menos anos no sistema escolar seja porque o esforço requerido é
menor. Assim, torna-se mais atrativo, continuar os estudos visto que a relação benefício/custo é mais favorável para os
indivíduos com maior aptidão.
30/ Seria interessante pesquisar, por exemplo, se o mercado valoriza (paga salários mais elevados) no caso dos egressos
dos cursos universitários que, no Provão do Ministério de Educação, apresentam maiores notas (ou letras).
31/ O livro mais famoso de Thurow foi Generating Inequality. Mechanisms of Distribuition in the U.S. Economy, Basic
Books, New York, 1975.
32/ Nas grandes metrópoles brasileiras não é incomum estar na presença de um motorista de taxi com curso superior. Dada
a ausência de outras oportunidades, esse indivíduo se vê obrigado a aceitar ofertas de emprego para as quais estaria
sobrequalificado. Para os teóricos do Capital Humano, o exemplo que acabo de apresentar talvez não faça muito sentido.
Segundo essa corrente, o fato relevante a ser estudado é a correlação entre rendimentos e educação. A aparente
incongruência no caso de um engenheiro-taxista pode não ser tal, dado que, não obstante não utilizar intensivamente
conhecimentos e habilidades específicos adquiridos no curso superior, o capital humano geral (capacidade e rigorosidade
no raciocínio, disciplina, etc.) adquirido pode ser um recurso importante em qualquer atividade, inclusive entre os taxistas.
A pergunta que deveria ser feita é: os rendimentos dele são mais elevados dos de outra pessoa que, ainda exercendo a
mesma atividade, tem um nível de educação inferior ? Se a resposta é positiva, os argumentos básicos da Teoria do Capital
Humano ainda resistiriam.
33/ As pesquisas suplementares da PNAD já contemplaram aspectos vinculados à mobilidade social., como em 1996 (ver
Capítulo II).
34/ Essa reduzida popularidade se observa ainda entre as correntes de esquerda, que, em princípio, teriam que ser as mais
adeptas a este tipo de abordagem. Notemos que, para a teoria credencialista, a educação é um dos mecanismos (no campo
das habilidades técnicas e da cultura) para reproduzir, social e economicamente, o sistema vigente. Nessa perspectiva, a
popularização da educação não seria um instrumento a ser privilegiado dentro de uma estratégia de ruptura e mudança. Tão
ou mais importante que a popularização seria o conteúdo da formação. Contudo, o discurso hoje na esquerda tende a
reproduzir àquele sustentado pela Teoria do Capital Humano e identifica na educação a alternativa mais importante para
reduzir a pobreza e redistribuir renda. Voltaremos sobre este tema na última Seção deste Capítulo.
35/ Para uma definição de segmentação ver Capitulo III.

Cap. 7:

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 136 -
1/ Keynes, no Capítulo I, de sua Teoria Geral, definiu que os economistas “clássicos” são: “.... uma denominação
inventada por Marx para designar Ricardo e James Mil e seus predecessores, isto é, os fundadores da teoria que culminou
em Ricardo. Acostumei-me, talvez perpetrando um solecismo, incluir na “escola clássica” os seguidores de Ricardo, ou
seja, os que adotaram e aperfeiçoaram sua teoria, compreendendo (por exemplo) J.S. Mill, Marshall, Edgeworth e o Prof.
Pigou”, (Keynes, J.M., A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, Editora Atlas, São Paulo, 1982, pág. 23. A
Teoria Geral foi publicada em 1936)
2/ A seguinte frase de Keynes é ilustrativa a esse respeito: “Os dois principais defeitos da sociedade econômica em que
vivemos são a sua incapacidade para proporcionar o pleno emprego e a sua arbitrária e desigual distribuição da riqueza e
das rendas”, (Keynes, J.M., A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, Editora Atlas, São Paulo, 1982, Capítulo 24,
pág. 284).
3/ Esse fato leva a muitos autores a denominar o Modelo Clássico como Modelo Macroeconômico Neoclássico.
4/ Essa eficiência também poderia expressar-se como: no equilíbrio, o valor da produtividade marginal do trabalho é igual
ao custo de oportunidade do lazer.
5/ O Modelo Clássico também admite uma função de poupança que dependa, além da taxa de juros, do nível de renda.
Ainda que essa seja a característica de um modelo de tipo mais keynesiano, as relações e resultados básicos de um Modelo
Clássico não seriam alteradas se sofisticamos um pouco mais a função poupança ou consumo. Lembremos que a poupança
é um resíduo depois de realizado o consumo (ou, alternativamente, o consumo é um resíduo depois de tomada a decisão de
poupar um determinado montante).
6/ Como já estudamos no Capítulo I, existe indeterminação teórica sobre a inclinação da curva de oferta de trabalho.
Teoricamente, ela poderia ter uma inclinação negativa. Nesse caso, o equilíbrio poderia ser instável e o modelo se
“complicaria”. Assim, dado que nosso objetivo no presente Capítulo não é estudar o equilíbrio no mercado de trabalho
(equilíbrio parcial) senão estudar o modelo sob uma perspectiva macroeconômica, vamos supor que a oferta de trabalho é
fixa, uma possibilidade. Em geral, as exposições dos modelos macroeconômicos consideram a oferta de trabalho fixa ou
com inclinação positiva.
7/ O equilíbrio no mercado de bens se obtém a partir da igualdade entre renda (Y) e produto (Q). Renda é igual a consumo
(C) mais poupança (S). O produto, por sua vez, pode ser definido como o consumo mais o investimento (I). Se, através da
taxa de juros, poupança é igual ao investimento, temos que Y = Q.
8/ Sobre este ponto ver também o Capítulo III.
9/ Esse diagnóstico que identifica a falta de qualificação como a principal variável que determina a situação de desemprego
foi mencionado (e popularizado) por Edward Amadeo, quando foi Ministro do Trabalho, no Governo Fernando Henrique.
Não obstante sua formação ser keynesiana e ter escrito diversos livros e artigos sobre as posições de Keynes (inclusive as
mais distantes dos padrões clássicos), uma vez no Ministério do Trabalho aderiu, de forma pouco crítica, aos postulados
clássicos, identificando as causas do desemprego no próprio mercado de trabalho (legislação trabalhista, falta de
qualificação, etc.)

Cap. 8:
1/ Nos estamos referindo a Tomas Kuhn e sua visão do progresso científico, sintetizado no célebre livro de 1962, The
Structure of Scientific Revolucions. Segundo esse autor, em cada momento do tempo a realidade ou o contexto que se
quer pesquisar ou entender está constituído por um conjunto infinito e caótico de dados que um marco conceitual
dominante ou hegemônico permite interpretar. Esse paradigma dominante determina categorias analíticas, a seleção dos
dados e as formas de tratamento dos mesmos, valores, etc.. Esse marco interpretativo se denomina de “ciência” e é aceito
até que as discrepâncias entre a realidade e os dados se tornarem tão gritante que outro “paradigma” substitui o anterior. O
sistema solar de Copérnico substituiu ao de Ptolomeo. O mesmo fez o relativismo de Eistem com respeito à física
Nwetoniana a qual, por sua vez, tinha substituído a aristotélica. Ou seja, a “ciência” não avança de forma lenta e gradual,
com contribuições pequenas (através de “papers”, por exemplo). O conhecimento avançaria, segundo Kuhn, mediante
Revoluções, rupturas de paradigmas. Nesse sentido, a obra de Keynes, especialmente sua Teoria Geral, pode ser
associada a uma verdadeira ruptura de paradigma.
Contudo, devemos ser prudentes quando estendemos as considerações de Kuhn das ciências naturais para as ciências
sociais (como é a economia). Quando o objeto de estudo é a realidade social, as dimensões “científicas” e “ideológicas”
são permeáveis (para certos autores, até inseparáveis). Assim, diferentes paradigmas podem conviver por longos
períodos.
2/ Uma boa pergunta seria: rigidez nos salários nominais ou reais ? Se a variável são os salários reais, o caso Keynesiano
até poderia ser um caso particular do Modelo Clássico. Se a variável inflexível são os salários nominais, essa
particularidade fica mais comprometida. Nossa opinião é, contudo, que a perspectiva Keynesiana não pode ser identificada
como um caso particular do Modelo Clássico. Contrariamente, é uma ruptura. No transcurso do Capítulo, o leitor poderá
perceber nossa perspectiva.
3/ Keynes sustenta que: “Ao enfatizar os aspectos que nos separam da doutrina clássica, não devemos esquecer uma
concordância importante. Manteremos, pois, o primeiro postulado como até aqui, ......” (Teoria Geral do emprego, do Juro
e da Moeda, página 33, Editora Atlas, 1982).
4/ Teoria Geral do emprego, do Juro e da Moeda, página 33 e 34, Editora Atlas, 1982 (Itálico no original)
5/ Vamos reproduzir a argumentação de Keynes: “Se bem que um trabalhador resista, normalmente, a uma redução do seu

Page 135 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 137 -
salário nominal, não costuma abandonar o trabalho ao se verificar uma alta de preços dos bens de consumo salariais” (
Teoria Geral do emprego, do Juro e da Moeda, página 27, Editora Atlas, 1982)
6/ Teoria Geral do emprego, do Juro e da Moeda, página 27, Editora Atlas, 1982,
7/ Por outra parte, uma elevação nos preços elevaria o investimento, dado que aumenta o rendimento dos investimentos
(eficiência marginal do capital, na terminologia de Keynes). Ou seja, uma elevação dos preços possibilita um maior nível de
emprego e, por sua vez, existiriam elementos que induzem esse crescimento do nível de atividade quando estamos diante
de uma elevação nos preços. Keynes sustenta que: ”A expectativa de uma baixa no valor da moeda estimula o
investimento e, em conseqüência, o emprego em geral, porque eleva a curva de eficiência marginal do capital......” (Teoria
Geral do emprego, do Juro e da Moeda, página 119, Editora Atlas, 1982).
8/ Keynes sustenta que: “A conseqüência da união de um grupo de trabalhadores é a proteção de seu salário real relativo”
(Teoria Geral do emprego, do Juro e da Moeda, página 31, Editora Atlas, 1982).
9/ Lembremos que, desde uma perspectiva macroeconômica, o importante é explicar porque os salários sobem ou descem,
não porque alguns salários sobem e outros descem ou porque um tipo de assalariado ganha mais que outro.
10/ Na literatura, esse impacto da queda dos salários nominais sobre o estoque de dinheiro se conhece como
“Efeito-Pigou”, A.C. Pigou foi o “sucessor” de Alfred Marshal em Cambridge, Inglaterra, na cátedra de Economia Política, a
partir de 1908. Seguindo a tradição dessa escola, Pigou (1877-1959) foi um economista que sempre tratou de conciliar os
princípios do livre mercado com as inquietudes sociais e posições inovadores, hoje corriqueiras, no tocante às
externalidades. Prova disso foi que sua principal obra tem como título The Economics os Welfare, de 1920, inaugurando
uma corrente denominada de Nova Economia do Bem-estar, uma tentativa de renovação da escola neoclássica no campo
dos aspectos distributivos. A contribuição de Pigou também foi importante no tocante à intervenção do Estado quando o
mercado fosse incapaz de quantificar, através dos preços, benefícios e custos (o que chamamos de externalidades).
Contudo, dada sua raiz neoclássica, Pigou foi muito ortodoxo na sua defesa da auto-regulação dos mercados em torno do
pleno emprego se existisse flexibilidade de salários (nominais e reais). Essa defessa ficou explícita no seu livro The
Economics of Unemployment, de 1933. Esse fato
levou Keynes a transformá-lo em sue principal rival em termos teóricos, transmitindo às futuras gerações uma suposta
ortodoxia e conservadorismo que não correspondem ao pensamento de Pigou.
11/ Em termos um pouco mais rigorosos, a “armadilha da liquidez” seria um caso no qual a taxa de juros chegou a um
patamar a partir do qual a demanda de dinheiro é infinita. A curva de demanda de dinheiro teria um intervalo “clássico”, cai
na medida em que cai a taxa de juros, e um limite a partir do qual devém horizontal. A “armadilha da liquidez” seria o
intervalo no qual a taxa de juros não cai mais e a demanda de dinheiro (em termos reais) é horizontal.
12/ A partir desse patamar mínimo na taxa de juros, a política monetária não teria mais impacto sobre o nível de atividade
(uma maior oferta seria totalmente absorvida pela demanda, sem impactos sobre a taxa de juros) e o aquecimento do nível
de atividade só poderia viabilizar-se a partir da política fiscal.
13/ Desde outra perspectiva, a taxa de juros seria o valor dado ao presente. Quanto maior o valor que o indivíduo
outorgasse ao presente com respeito ao futuro, maior seria a taxa de juros cobrada por abrir mão de consumo hoje.
14/ No jornal Folha de São Paulo, do 17-02-02, Caderno B (Dinheiro), página 11, encontramos um
título sujetivo: “Japão quer combater a recessão com feriado”. A lógica do argumento das autoridades japonesas, pelo seu
extremos keynesianismo, é ilustrativo. Como os japoneses não teriam muitos feriados, eles não teriam tempo para gastar
sua renda e poupariam muito. Elevando os feriados se aumenta o tempo disponível para gastar e, dada a recessão
estrutural da atual economia japonesa, se estaria introduzindo um elemento que aqueceriam, via multiplicador, o nível de
atividade. Esse é um típico caso keynesiano porque a elevada propensão a poupar seria um dos elementos que induzem ao
estancamento dessa economia.
15/ Neste caso, devemos interpretar o crescimento da oferta de trabalho como um deslocamento, à
direita, da curva de oferta. Esse movimento pode ter origem em diversos fatores (mudanças nas preferências entre consumo
e lazer, imigração, etc.).
16/ Em realidade, no período que vai do fim da segunda guerra mundial até meados dos anos 70, assistimos a uma situação
de permanente tensão no mercado de trabalho devido ao pleno emprego. A falta estrutural de mão-de-obra obrigou a
muitos países desenvolvidos, especialmente os Europeus, a abrirem seus mercados de trabalho para receberem
trabalhadores estrangeiros (magrebinos na França, turcos na Alemanha, Paquistaneses e Indianos na Inglaterra, etc.).
17/ Os fatores que mudaram qualitativamente (estruturalmente) o cenário mundial foram vários: choques de petróleo,
internacionalização das economias, crescente indexação dos salários, etc. Não é o nosso objetivo neste Capítulo abordar
esses assuntos. Os mesmos serão tratados no Capítulo XIII, quando estudaremos as diversas explicações do desemprego
contemporâneo.
18/ Esse definição da restauração dos princípios clássicos é muitas vezes atribuída a Harry. G. Johson. Seu livro Inflation
and the Monetarist (North-Holland, 1978) é uma boa e agradável apresentação dos principais tópicos sobre a decadência
do pensamento keynesiano na academia e entre os gestores de política e o ressurgimento da ortodoxia.
19/ Voltaremos sobre este ponto no Capítulo XIII, quando abordarmos as causas do desemprego contemporâneo. Poucos
são os keynesianos que perceberam que a relação entre o contexto histórico e a relevância de um marco teórico. Entre eles
podemos citar a Amit Bhadiri (ainda que este é mais um pos-keynesiano que um keynesiano típico). Ele afirma que: “Toda
teoria deve ser generalizável dentro de um contexto específico”, (Macroeconomics. The Dynamics of Commoddity
Production, Macmillan Education, pág. 13, 1986 (A tradução é nossa e o itálico está no original).

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 138 -
20/ Sobre este ponto, consultar o Capítulo IV.
21/ Aqui não estamos sustentando que Keynes “tinha razão”. Simplesmente consideramos que as proposições dos que
hoje se auto-denominam de herdeiros de Keynes dentro do pensamento dominante (conhecidos como neo-keynesianos)
têm poucos pontos de contato com a obra original desse autor.
22/ O monopólio do curto prazo fica bem sintetizado na famosa frase de Keynes segundo a qual, no longo prazo, todos
estaremos mortos.
23/ A opção política de Keynes, por uma intervenção do Estado como regulador da demanda agregada e não como
produtor de bens e serviços fica explícita no Capítulo 24 da Teoria Geral Esse Capítulo é de leitura relativamente agradável
e sintetiza as posições políticas de Keynes (tanto contra o liberalismo como contra a socialização dos meios de produção).
24/ Um outro autor que, paralelamente (no tempo), a Keynes estabeleceu o princípio de demanda efetiva como
determinante do nível de atividade no curto prazo foi o economista polaco Michal Kalecki (1899-1970). Inicialmente
desenvolveu suas idéias na própria Polônia, durante os anos 30. Não obstante ser uma perspectiva similar à Keynesiana,
ao trabalhar em um país periférico, suas contribuições passaram desapercebidas. Só depois de emigrar de seu país e exercer
suas atividades na Inglaterra (Cambridge e Oxford), começa a ser conhecido. Sua “apresentação” no mundo acadêmico
ocidental foi realizada por certos discípulos de Keynes (principalmente Joan Robinson). Dada sua origem de intelectual
mais à “esquerda” que Keynes, Kalecki nunca ficou preso a certos aspectos do pensamento mais ortodoxo (como a função
de produção ou a igualdade entre as produtividades marginais e a remuneração dos fatores). O princípio de demanda
efetiva, no seu caso, estava mais vinculado aos sistemas de reprodução. Mais tarde,
parte de sua produção intelectual é dedicada aos problemas das economias socialistas (retorna a seu país em 1954, ou seja,
em pleno período do socialismo real) e dos países sub-desenvolvidos.
25/ Abordaremos o Modelo Pós-Keynesiano no Capítulo IX.

Cap. 9:
1/ Em realidade, se somos rigorosos, não deveríamos utilizar a palavra “equilíbrio” no Mercado de Trabalho, teríamos, que
afirmar que se determina o nível de emprego. Como veremos nos próximos
parágrafos, esse nível de emprego pode redundar em desemprego de parte da força de trabalho. O equilíbrio
macroeconômico é que pode resultar em subemprego ou pleno emprego.
2/ Justamente, essa inflexibilidade nos preços levou a que esta tentativa de síntese entre os modelos clássicos e
keynesianos seja muitas vezes conhecida como “modelos a preços fixos”. Ou, em termos
menos radicais, são modelos que supõem que as quantidades se ajustam mais rápido que os preços. Em
realidade, essa denominação de “Modelos a Preços Fixos” não nos satisfaz dado que os salários reais são
fixos (resistentes a queda) em contextos de desemprego clássico. Contudo, quando a restrição relevante é
a demanda agregada, um crescimento desta é eficaz. Contudo, a elevação do contingente de ocupados provocada pelo
aumento no nível de atividade requer queda nos salários reais. De todas formas, as referências bibliográficas deste tipo de
modelo já foram apresentadas no Capítulo 4 e, entre as mais importantes, poderíamos mencionar: Leijonhufvud, A., On
keynesian Economics and the Economics os Keynes, Oxford University Prees, New York, 1968 e Barro, R. J., and
Grossman, H.I., Money, Employment and Inflation, Cambridge University Press, Cambridge, 1976, Malinvaud, E., The
Theory of Unemployment Reconsidered, Basil Blackwell, Oxford, 1977. Para não ser injustos, deveríamos incluir, também, a
J.P. Bénassy, um dos principais teóricos deste tipo de modelo. Talvez por ser francês, com poucas obras publicadas em
inglês, esse autor não é usualmente citado fora da França, não obstante ter desenvolvido textos de uma densidade analítica
pouco comum
3/ Estudaremos essa corrente no Capítulo XII. Muito sinteticamente, a corrente institucionalista supõe que o
funcionamento de uma economia envolve um conjunto de arranjos institucionais que são, ao mesmo tempo, econômicos,
políticos sociais e, até, culturais. Nesse contexto, “cada caso é um caso”, não existem
generalizações e a forma de funcionamento de uma economia, especialmente, ainda que não exclusivamente, do mercado
de trabalho, está datada no tempo e no espaço.

Cap. 11:
1/ Logicamente, essas circunstâncias não se aplicam, exclusivamente, ao termo informal. O conceito de
pobreza é outro no qual passar da percepção intuitiva a uma definição robusta está
muito longe de ser uma tarefa trivial.
2/ Concretamente, os artigos nos quais o conceito surge são dois: “Employment, Income and
Inequality: A Strategy for Increasing Productive Employment in Kenya”. OIT. Genebra. 1972 e
“Informal income Opportunities and Urban Employment in Ghana” Journal of Modern African
Studies. Nº 11. 1973. Em ambos os casos, o autor foi Keith Hart.
3/ Essa caracterização do processo de desenvolvimento como sendo um fenômeno quase inexorável e universal
por estágios foi popularizado por um economista dos EUA chamado Walt
Whitman Rostow. Seu livro mais conhecido foi As Etapas do Desenvolvimento Econômico. Um Manifesto
Não-Comunista. Rio de Janeiro, Ed. Zahar, 1961. O Subtítulo (Um Manifesto Não-Comunista) manifesta o viés

Page 137 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 139 -
político-ideológico do autor. Rostow foi assessor de segurança nacional e funcionário do Departamento de
Estado do Presidente Kennedy nos conturbados anos 60. Em realidade, as Etapas do Desenvolvimento
Econômico pretenderam ser uma alternativa aos enfoques que nesse momento ganhavam popularidade pregando
uma ruptura com o capitalismo e os EUA a fim de acelerar o desenvolvimento, redistribuir renda e combater a
pobreza.
4/ Esse artigo seminal foi publicado em 1954 no journal Manchester School of Economic and
Social Studies. (Vol.22) com o título de “Economic Development with Unlimited Supplies of Labor”. No Brasil,
esse artigo pode ser encontrado em Agarwala, A.N. e Singh, S.P. (Eds.) A Economia do Desenvolvimento.
Ed Forense. 1969. Págs. 406-456.
5/ Além do artigo seminal de Lewis, duas outras referências são incontornáveis na literatura sobre economias
duais: Jorgenson., D. “The Development of a Dual Economy” Economic Journal. N º 71. 1961 e Ranis,G. e Fei,
J.C., “A Theory of Economic Development”. American Economic Review. Vol. 51. 1961. Em português, as
teses de Jorgenson e Ranis e Fei podem ser encontradas em: Fei, J.C.H. e Ranis, G, “Agrarismo, Dualismo
eDesenvolvimento Econômico” e Jorgenson, D.W., “Teste de Teorias Alternativas de Desenvolvimento em
Economia Dualista”. Ambos artigos estão em Cidade de Araújo, P.F. e Schuh. G.E. (Eds.), Desenvolvimento
da Agricultura. Natureza do Processo e Modelos Dualistas. Livraria Pioneira Editora. 1975.
6/ O Modelo de Lewis continua sendo uma referência na explicação dos processos migratórios.
Contudo, ele não foi o primeiro a pretender identificar causas econômicas como o principal motivo que explica a
migração. Em realidade, as primeiras teorizações sobre os processos migratórios se devem a Ernst Georg
Ravenstein, geógrafo alemão que publicou três famosos papers: “The Birthplace of the People and the Laws of
Migration” (The Geografical Magazine. Vol. 3. 1876), “The Laws of Migration” (Journal of Statistical Society.
Vol. 46. 1885) e The Laws of Migration: second paper (Journal of Statistical Society. Vol. 52. 1889). Esses
artigos, especialmente os de 1885 e 1889, são uma referência elementar em qualquer resenha sobre as causas
dos processos migratórios. Porém, o corpo teórico que tenta entender as causas e determinar as conseqüências
nos fluxos migratórios se sofisticou muito com o passar dos anos. As primeiras teorizações de Ravenstein e o
próprio Modelo de Lewis, não obstante sua contemporaneidade, receberam uma sofisticação cujas referências
ultrapassaM nossos objetivos neste livro. Voltaremos sobre este ponto quando abordarmos o Modelo de Harris e
Todaro, nos próximos parágrafos.
7/ Logicamente, o leitor pode levantar uma pergunta pertinente: se o setor moderno satisfaz suas crescentes
necessidades de trabalho a partir da oferta infinitamente elástica de mão-de-obra oriunda do setor arcaico,
quando este acaba por desaparecer, como são cobertos esses
requerimentos? Voltaremos sobre este ponto quando analisarmos a consistência das explicações sobre a
existência e persistência do setor informal. Contudo, poder-se-ia argüir que a existência só de um setor moderno
e sua acumulação de capital no contexto de ausência de uma oferta ilimitada de trabalho possibilitaria elevar os
salários (reduzir a concentração de renda) e/ou induziria a adoção de tecnologias capital-intensivas.
8/ Um caso típico inúmeras vezes mencionado na literatura tem como referência a Indústria
Automobilística. Esta última foi, no transcurso do processo de substituição de importações, a
“caricatura” do setor moderno. Porém, seu desenvolvimento induzia ao surgimento de pequenas oficinas de
concerto que tinham todas as características atribuíveis ao “setor não-moderno”: pequenas unidades de
produção, mão-de-obra não assalariada ou, quando assalariada, asrelações trabalhista não estavam pautadas
pela legislação, etc..
9/ A experiência do Brasil é, nesse sentido, ilustrativa. O dinamismo econômico tinha como eixo as modernas
indústrias do centro-sul do país. As necessidades de mão-de-obra das mesmas eram satisfeitas pela migração
nordestina. Dessa forma, em termos da caricatura do Modelo de Lewis, o Nordeste seria sinônimo de “sociedade
arcaica” e o centro-sul (especialmente os Estados de São Paulo e Rio de Janeiro) de “pólo moderno”. Em geral,
na quase totalidade dos países da América Latina se viveu esse processo: a substituição de importações
dinamizava restritos espaços geográficos, que paulatinamente se convertiam em grandes metrópoles, e as
necessidades de recursos humanos eram preenchidas a partir da oferta de mão-de-obra oriunda das áreas rurais
do interior. Ou seja, o Modelo de Lewis parecia ter uma correspondência quase total com a história concreta dos
países em rápido processo de desenvolvimento, como era a América Latina nas décadas de 50 e 60.
10/ Talvez o inspirador principal desse projeto tenha sido Raul Prebish, mas em torno dele, com o transcorrer
dos anos, se agruparam economistas do porte de Celso Furtado, Aníbal Pinto, Osvaldo Sunkel, entre outros.
11/ Aqui estamos fazendo uma muito breve referência ao marco teórico cepalino. O leitor
interessado nos argumentos e fragilidades dessa corrente pode consultar Rodriguez, O., A Teoria do
Subdesenvolvimento da CEPAL. Forense-Universitária. 1981.
12/ Abordamos este ponto no Capítulo II, quando analisamos as tentativas de construir indicadores de
desemprego que contemplem formas de desocupação oculta. Lembremos que esse desemprego oculto poderia
ser oriundo tanto do trabalho precário (a situação de desemprego estaria oculta pelo trabalho precário) ou pelo

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 140 -
desalento (o indivíduo, devido às dificuldades em encontrar emprego e visto os custos recorrentes da procura do
trabalho, deixa de realizar atividades de procura e seria caracterizado, pelas metodologias de medição
tradicionais, como inativo).
13/ Trataremos esta questão no Capítulo III e não nos deteremos sobre este aspecto.
14/ Em realidade, a oferta originada no setor informal seria comercializada no pequeno comércio à margem dos
circuitos legais. Dado que os assalariados não estão legalizados, dificilmente pagam direitos de patentes e
prima a denominada “pirataria”, os pontos de venda ou são totalmente ilegais (camelôs em áreas públicas, por
exemplo) ou não preenchem os requisitos requeridos pela legislação, a qualidade da oferta é duvidosa, etc. os
circuitos de comercialização são instáveis, situados nos bairros da periferia das grandes aglomerações urbanas
ou em pontos de grande concentração popular. Em geral, seu público serão os assalariados (formais ou não) de
menores salários. Na literatura esta caracterização se conhece como “produção de pobres para pobres”.
15/ Esta capacidade do setor informal em absorver o contingente de assalariados não incorporados ou
desligados do setor formal alimentou uma denominação relativamente popular
para esse setor: “esponja”, justamente por essa característica de absorção.
16/ Aqui não queremos entrar na polêmica sobre o conceito de flexibilidade. Contudo, é lógico supor que, diante
de uma recessão, por exemplo, a existência de um salário mínimo pode não
possibilitar um ajuste de preços (salários) diante da queda da demanda.
17/ Poder-se-ia argüir que podem existir instituições como sindicatos, dado que essas são
instituições não-estatais. Contudo, a pequena escala das unidades de produção dificulta a presença de
sindicatos. Em geral, é uma hipótese realista supor que não existem instituições no setor informal, ainda que
esta suposição possa ser questionada. Por exemplo, existem
associações de ambulantes. Contudo, ainda que se assuma a existência de certas instituições no seio do setor
informal, o raciocínio não mudaria, exceto quando assumimos que essas instituições não permitem a livre
entrada. Esta é uma polêmica vinculada ao papel das instituições (e ao próprio conceito de instituição) no
funcionamento do mercado de trabalho. Analisaremos estes aspectos com mais detalhe no Capítulo XIII.
Contudo, se em um determinado espaço é factível supor que não existe livre entrada (por exemplo, não é
qualquer indivíduo que pode chegar a uma rua e “vigiar” carros se já existe um “vigia” no lugar) visto desde uma
perspectiva mais geral, é aceitável sustentar que no setor informal se verifica livre entrada.
18/ Em termos muito globais, essas políticas são as preconizadas pela CEPAL (industrialização, proteção do
mercado interno, planificação estatal, etc.). Tendo como referência o mercado de trabalho, as políticas não são
muito claras e voltaremos sobre elas nos próximos parágrafos.
19/ A questão do fluxo conjuntural poderia ser resolvida mediante um adequado sistema de seguro-desemprego.
Contudo, a questão não é tão simples, dado que um sistema de proteção ao trabalhador desempregado poderia
não coibir o trabalho informal, visto que, por definição, este não está controlado pelo aparelho do estado. Em
outros termos: um indivíduo poderia receber seguro-desemprego e estar ocupado nos espaços informais.
Voltaremos sobre estes aspectos nos próximos parágrafos e no próximo Capítulo, quando estudaremos com
particular atenção o caso do sistema de proteção a experiência do Brasil na matéria.
20/ Vemos, assim, o quão distante está este marco analítico das proposições contidas no Modelo de Lewis. A
dualidade da sociedade tende a se perpetuar e não a ser um fenômeno transitório.
21/ Em termos das isoquantas dos usuais cursos de microeconomia, seria uma isoquanta tipo de Leontief. Ou
seja, ter-se-ia só uma combinação de insumos não importando os preços relativos entre eles.
22/ Em princípio, como não vigora a legislação, o salário mínimo não necessariamente é um
parâmetro de referência. Por outra parte, também não existem sindicatos. Ou seja, não existem
elementos que impeçam considerar a total flexibilidade de salários. Se existe algum tipo de
inflexibilidade seria oriunda de outras causas que não as institucionais/legais. Contudo, é
perfeitamente válido supor um ajuste completo dos rendimentos aos excessos de oferta e procura de trabalho.
23/ O livro clássico no qual estão sintetizadas essas teses é o de Samir Amin La Acumulación em Escala
Mundial. Sigo XXI Editores. 1975. Em geral, em qualquer das obras de Samir Amin podem ser encontradas
estas teses. Contudo, a produção deste economista egípcio que chegou a renovar o pensamento marxista nos
anos 70 foi editada de forma muito esparsa no Brasil, onde a maioria de seus livros está esgotada. Uma boa
referência no país pode ser Imperialismo e Desenvolvimento Desigual. Editora Vértice. 1987.
24/ Nas categorias marxistas, existe o conceito de modo de produção e de formação social. A
formação social seria a forma concreta que adota uma sociedade em um determinado momento do tempo e nela
convivem ou não diferentes modos de produção, sendo um deles hegemônico. No feudalismo europeu, por
exemplo, conviveriam com relações feudais outros modos de produção (inclusive capitalista), mas o modo de
produção feudal seria hegemônico.
25/ O pensamento liberal também poderia identificar outras instituições, além do Estado, que
“distorcem” as remunerações relativas. Por exemplo, os sindicatos.

Page 139 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 141 -
26/ Em realidade, esse ganho de importância do pensamento mais ortodoxo em termos das
interpretações da informalidade está umbilicalmente vinculado à crise do pensamento keynesiano na teoria
econômica (ponto que já tratamos nos Capítulo IV, VIII e IX e tornaremos a abordar no Capítulo XIV) e ao retorno
do Modelo Clássico na macroeconomia. Lembremos que o pensamento da CEPAL foi muitas vezes definido
como o keynesianismo aplicado às economias periféricas. Raul Prebish, o inspirador da CEPAL, escreveu nos
anos 40 um pequeno livro (Introducción a Keynes. México, DF: Fondo de Cultura Económica, 1947) que foi
uma espécie de apresentação do pensamento keynesiano na América Latina. Nessa perspectiva, o
revigoramento das interpretações mais ortodoxas dos fenômenos vinculados à informalidade deve ser visto desde
uma perspectiva mais ampla e é um caso particular de uma tendência mais geral. No caso específico do setor
informal, um livro que ganhou uma certa transcendência nos meios acadêmicos e políticos foi The Other Path.
The Economic Answer to Terrorism, de Hernando de Soto (Harper and Row Publishers. 1989). Hernando de
Soto é um economista peruano e esse livro foi escrito nos anos em que o grupo terrorista Sendero Luminoso, de
tendência maoísta, constituía uma real ameaça no Peru. Nesse sentido, o título do livro (O Outro Sendero) pode
ser interpretado como sendo a síntese da mensagem: uma alternativa liberal a uma opção de extrema esquerda
que, nesse período, parecia ter reais possibilidades de tomar o poder nesse país. Em pouco tempo as teses de
De Soto ganharam popularidade e se converteram em uma verdadeira síntese (em realidade, uma apologia do
livre mercado) da interpretação mais liberal dos fenômenos ligados à informalidade. O livro ganhou tal
popularidade que sua versão em inglês de (Perseus Books Group) na capa e contra-capa podem ler-se elogios
de ex-Presidentes dos EUA tão dispares (ideologicamente) como Bill Clinton, Richard Nixon, Ronald Reagan e
George Bush (pai).
27/ Um aspecto importante do potencial dinamismo que poderia proporcionar o segmento informal diz respeito
aos direitos de propriedade bem documentados. Esses direitos, mal ou
inadequadamente documentados, têm desdobramentos negativos sobre muitos aspectos. Por
exemplo, as restrições ao crédito são maiores (ou, no limite, a restrição é total). Por outra parte, a
comercialização desses direitos está muito restrita, especialmente em termos geográficos. Em geral, direitos de
propriedade de duvidosa legalidade não são reconhecidos além das fronteiras da localidade ou comunidade. Em
termos nacionais, uma realocação de recursos em função de produtividades locacionais ou setoriais fica muito
restrita, reduzindo a potencialidade decrescimento da produtividade. Este aspecto dos direitos de propriedade
está muito presente na abordagem ortodoxa mais moderna. Ver, por exemplo, De Soto, H., “El Mistério del
Capital”.
Finanzas y Desarrollo. FMI. Marzo. 2001. Em realidade, esse artigo se baseia no Capítulo 3 do livro do autor
denominado O Mistério do Capital. Porque o capitalismo dá certo nos países desenvolvidos e fracassa
no resto do mundo. Editora Record. 2001.
28/ Os custos tanto podem ser diretos e afetam o nível de salário como indireto, quando aumentam os custos de
contratação ou desligamento.
29/ Esses dados estão contidos em Perspectives de LEmploi. 1999. OCDE. Paris.
30/ Pode-se encontrar os dados das PNADs 89 e 90 em: IBGE, Trabalho no Brasil. Brasil e
Grandes Regiões. 1989. Vol. 1 e IBGE, Trabalho no Brasil. Brasil e Grandes Regiões. Vol2.
1990.
31/ Os dados de 1990 são muito similares aos encontrados para 1989. Por exemplo, 48.61% dos ocupados que
não eram funcionários públicos nem militares nem possuiam carteira de trabalho assinada não tinham interesse
em alterar sua situação em favor de um emprego com carteira.
32/ Logicamente, como no caso das escolhas dos ativos de risco no mercado financeiro, de onde esta
interpretação teórica foi, em última instância, retirada, a esperança dos ganhos médios varia positivamente com
o risco. Maior o risco maior o ganho médio esperado. Obviamente, ajustados pelo risco, todos os retornos
deveriam ser iguais.
33/ Nesse sentido, poderíamos esperar que as mulheres optassem por trabalhos no setor público, dado que não
existe discriminação (ou reduzidas as possibilidades em função da legalidade).
34/ Esta alternativa tem uma sustentação teórica frágil. Com efeito, desde a perspectiva dos
assalariados, optar por não legalizar seu vínculo tem como corolário a perda de certos benefícios (aposentadoria,
seguro-desemprego em caso de dispensa não justificada, etc.). No caso do empregador, ele sempre correrá o
risco de ser denunciado à Justiça Trabalhista pelo próprio empregado ou ser flagrado pela fiscalização. Ou seja,
a não legalização do vínculo é um resultado não necessariamente válido. Como veremos no Capítulo seguinte,
negociar a não declaração do vínculo pode ser um resultado consensual em circunstâncias pontuais, como no
caso do recebimento do seguro-desemprego. Por outra parte, vários teóricos do liberalismo identificam nos
benefícios universais e sem nenhuma contrapartida (contribuição) uma fonte que induz a preferir não declarar o
vínculo por parte dos assalariados. Por exemplo, a aposentadoria por idade (sem contribuição mínima em termos
de tempo de serviço) tornaria, segundo esta perspectiva, a não declaração mais atraente. Quanto maiores

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 142 -
fossem os benefícios atrelados a prévios vínculos legais maiores seriam os custos da informalidade.
35/ O livro de Schumacher foi publicado pela Harper & Row Plublishers.
36/ O livro da Piore e Sabel foi The Second Industrial Divide: possibilities of prosperity. Basic Books. 1984.
Afirmamos que esta tentativa surge de acadêmicos com amplo reconhecimento internacional dado que M.J.
Piore, por exemplo, é um reconhecido institucionalista dos EUA e professor do MIT (Massachusetts Institute of
Technology).
37/ As primeiras idéias sobre os Distritos Industriais foram introduzidas por A. Marshall nos seus Princípios de
Economia, cuja primeira edição data de 1890. Ele utilizou esse termo para se referir à Indústria Algodoeira de
Lancashire e cutelaria de Sheffield. A partir dos anos 90, e nesse sentido muito contribui o livro de Piore e Sabel
que mencionamos, a discussão sobre os Distritos Industriais (ou arranjos produtivos, em certa literatura) atinge
um estágio que continua até hoje. Nos próximos parágrafos sintetizaremos alguns aspectos que estão
relacionados com a discussão sobre o setor informal que estamos desenvolvendo. A literatura sobre Distritos
Industriais é hoje tão ampla, inclusive no Brasil, que de forma alguma pretendemos resenhar a mesma.
38/ No caso específico da literatura vinculada aos Distritos Industriais, os requisitos para que uma constelação
de pequenas firmas constituam um arranjo produtivo são várias e estão vinculadas a variáveis como a existência
de liderança, capacidade inovadora, nível tecnológico,
cooperação/concorrência entre as firmas, introdução de novos produtos, concentração espacial, especialização,
etc. Voltamos a repetir que a literatura sobre este tema atingiu tal diversificação e extensão no Brasil que sua
resenha ultrapassa os nossos objetivos no presente livro. Contudo, devemos mencionar, dado que é um aspecto
vinculado ao tema que estamos abordando, que no auge do pensamento mais ortodoxo, especialmente na
década de 90, diante de um crescente descrédito das políticas industriais que vigoravam no período de
substituição de importações, a identificação e apoio a arranjos produtivos locais era a uma das poucas ações
estatais aceitas.
39/ Neste Capítulo só mencionaremos, sem aprofundar, a questão da organização do trabalho na firma
“fordista”. Voltaremos com mais detalhes sobre este tema no próximo Capítulo, quando estudaremos com
particular atenção as políticas de emprego, e no Capítulo ????, na ocasião da apresentação de temas vinculados
às explicações do desemprego contemporâneo.
40/ Não unicamente seria datada no tempo, senão também teria especificidades setoriais. Um dos grandes erros
dos dirigentes soviéticos (especialmente de Lênin) foi supor que a organização taylorista-fordista das firmas era
uma forma de organização “científica”, por sobre os matizes ideológicos e que perpassava o tempo, o espaço e
setores. As pequenas unidades de produção seriam um vestígio do passado. Ao caracterizar o
taylorismo-fordismo como universal ou “científico”, a elite soviética enviou militantes aos EUA e estudá-la para
ser aplicada na nascente União Soviética. A aplicação neste país (e, posteriormente, em todo o bloco soviético)
foi generalizada, permeando todos os setores. Não vamos comentar com detalhe, mas é por demais conhecida a
crise estrutural da agricultura no sistema soviético e nos seus satélites. A organização taylorista-fordista foi uma
forma de organização das unidades produtivas muito funcional na Indústria de Transformação em um período do
tempo, mas, com certeza, não foi adequada ao setor agrícola. Por outra parte, só muitos anos depois, correntes
de esquerda (como os regulacionistas franceses) identificaram no taylorismo-fordismo uma forma de controle do
processo produtivo pelos administradores das firmas. Mas uma vez, e desde outra perspectiva, as firmas
tayloristas-fordistas distavam de ser modelo de “ciência” ou neutralidade na organização da produção.
41/ Temos aqui uma evidente contradição ou, ao menos, um conflito, entre duas interpretações do desemprego
contemporâneo, um tema que trataremos no Capítulo ????. Por um lado, as novas tecnologias elevariam de tal
forma a produtividade que os impactos do crescimento sobre o emprego seriam negligenciáveis. Por exemplo, se
a produtividade aumenta 3%, mantendo o mesmo contingente de assalariados, só essa elevação geraria um
aumento de 3% no PIB. Ou, desde outra perspectiva, uma elevação de 3% no PIB não geraria crescimento na
demanda de trabalho em um contexto de aumento de 3% na produtividade. Mas, por outra parte, se a nova
base tecnológica que propicia essa elevação da produtividade estaria constituída por pequenas empresas, que
seriam mais intensivas em trabalho que as grandes, torna-se frágil sustentar que o crescimento da
produtividade reverte os ganhos de emprego do aumento do PIB.
42/ Lembremos, ver Capitulo IV, sobre a Teoria do Capital Humano, que para a Teoria NeoClássica a
concentração na renda (fluxo) constitui a manifestação do grau de concentração da riqueza (estoque). Nesse
sentido, políticas de redistribuição de renda teriam que adotar medidas para desconcentrar o estoque de
riqueza.
43/ Ainda que o primeiro não contribua para a previdência e recebe seus rendimentos de forma não legalizada, o
consultor do mercado financeiro não integraria o setor informal. Poderia até fazer parte da economia negra ou
subterrânea, mas, certamente, não corresponderia identificá-lo ao setor informal quando este é assumido como
sendo o “depósito” estrutural e conjuntural do excedente do trabalho.
44/ Logicamente, além de definir a variável, tem-se que determinar o divisor de águas em cada

Page 141 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 143 -
uma delas. Por exemplo, a partir de que nível de educação deve-se incluir o indivíduo no setor
formal? Ou, a partir de qual nível de renda o conta-própria passa a fazer parte do espaço formal? Deixamos de
forma proposital, no nosso exemplo ilustrativo, de considerar os empregadores, dado que, por constituírem uma
parte quase insignificante dos ocupados, pouco mais de 5%, nos dados da PNAD/2003, geralmente não são
contabilizados nas desagregações entre formal e informal. Contudo, em caso de serem incluídos, também se
deveriam escolher as variáveis que permitam catalogá-los. Por exemplo, podem ser os rendimentos e/ou o
número de assalariados e/ou as características dos vínculos (familiares ou não) e/ou a natureza legal desses
vínculos (assina carteira ou não). Em geral, a escolha das variáveis e a determinação do divisor de águas sempre
será motivo de polêmica, dado que envolve uma certa dose de subjetividade ou arbitrariedade. Esse fato tende a
alimentar os críticos da relevância e pertinência do setor informal como categoria de análise, dado que sua
própria definição envolve um grau tal de subjetividade e empirismo que o tornam frágil em termos conceituais
abstratos.
45/ Logicamente, não estamos aqui endossando esta classificação. Simplesmente, como é a
corriqueiramente utilizada e dado que o nosso exemplo é simplesmente ilustrativo, vamos utilizá-la. Em todo
caso, o percentual de autônomos que poderiam ser qualificados como formais (dado que contribuem para a
Previdência), é mínimo (14%, na PNAD/2003).
46/ Neste exemplo vamos utilizar a PME (cujos dados estão restritos às seis principais regiões
metropolitanas) e não a PNAD (cuja abrangência é nacional, deixando de cobrir apenas as áreas rurais da
Região Norte) devido a que não existem dados da PNAD para os anos de 1991 (ano de Censo Demográfico),
1994 (quando a PNAD não foi levada a campo por restrições orçamentárias) e 2001 (ano de Censo Demográfico).
Nos anos nos quais o IBGE realiza o censo a PNAD não é levada a campo. O leitor pode encontrar no Capítulo II
uma análise pormenorizada das principais fontes de dados no Brasil o leitor pode encontrar no Capítulo II. Ainda
que os dados de nosso exemplo estejam restritos à força de trabalho do Brasil Metropolitano, realizar
extensões para a integralidade do país não parece ousado, tanto pelo peso populacional das seis maiores áreas
metropolitanas como porque o restante do país tendeu a acompanhar os movimentos estilizados que estamos
analisando.
47/ Estamos falando aqui de incerteza na perspectiva keynesiana, ou seja, aos eventos futuros não poderiam ser
associadas probabilidades ou, inclusive, os agentes não seriam capazes de elencar a totalidade dos futuros
cenários. No caso do risco, às alternativas futuras podiam ser associadas a probabilidades e o risco ser
administrado. Em termos da teoria neoclássica tradicional, essa distinção não é realizada e risco e incerteza
são sinônimos. Voltaremos a abordar com mais detalhes a questão da flexibilidade no Capítulo XIV, quando
tratarmos certos aspectos do debate contemporâneo em torno da questão do desemprego.
48/ Concretamente, os artigos foram: Todaro, M.P., “A Model of Migration and Urban Unemployment in Less
Developed Countries” American Economic Review. Vol. 59. 1969 e Harris, J.R. e Todaro, M.P., “Migration,
Unemployment and Development: a two-sector analysis”
American Economic Review. N 110. 1970. Esses dois papers, assim como todo trabalho seminal, deram
origem a toda uma série artigos e pesquisas que dificilmente pode ser resenhada na sua totalidade. Talvez pela
sua transcendência, devemos citar o famoso artigo de G. S.Fields. “Rural-Urban Migration, Urban
Unemployment and Unemployment, and Job-Search Activity in LDCs,” Journal of Development Economics
.1974. Assim como os artigos que deram origem ao conceito do setor informal, a observação da África
(especificamente, de Nigéria e Quênia) foram o berço dos modelos de Harris e Todaro. John R. Harris, por
exemplo, é professor de economia da Universidade de Boston e por muitos anos (1975-1987) foi o diretor do
Centro de Estudos Africanos dessa Universidade.
49/ Percebamos que esta situação pode originar um fato curioso. Tradicionalmente, nos cursos
corriqueiros de macroeconomia, um aquecimento no nível de atividade gera uma queda no
desemprego. Contudo, na situação que estamos analisando pode ocorrer o contrário: aumenta a demanda de
trabalho das firmas, aumenta a probabilidade de ser contratado no setor moderno, a esperança dos ganhos se
eleva e aumenta o desemprego, visto que muitos indivíduos podem passar a uma situação de desemprego aberto
para elevar suas chances de ser contratado formalmente, que é seu objetivo último.
50/ Especificamente, o livro é: Doeringer, P. e Piore, M., Internal Labor Markets and Manpower Analysis.
Lexington. 1971.
51/ Nos próximos parágrafos faremos uma apresentação muito sintética da abordagem
institucionalista contida no livro de Doeringer e Piore. Este desenvolvimento tem como único
objetivo fazer um paralelo entre os modelos oriundos dos países centrais que guardam um estreito paralelo com
os modelos à la Harris/Todaro. O leitor interessado em uma análise muito mais aprofundada da perspectiva
institucionalista, consultar o Capítulo ????.
52/ Este forma de administrar os recursos humanos é típica em firmas de certos países, como, por exemplo, as
grandes firmas do Japão ou em certas empresas estatais do Brasil. Nessas empresas, os postos de comando

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com

- 144 -
estão comumente ocupados por indivíduos que aí iniciaram suas carreiras profissionais. Ou seja, exceto nos
primeiros estágios da vida profissional, as necessidades de mão-de-obra são satisfeitas mediante um processo
de seleção no estoque de empregados situado em níveis inferiores.
53/ No Capítulo V já mencionamos a questão da segmentação no contexto da Teoria do Capital Humano.
Basicamente, seria uma definição similar, só que, naquele caso, o ponto central eram salários diferentes diante
de produtividades iguais. Lembremos que, nessa linha de raciocínio, os mercados de trabalho estavam, por
algum motivo, segmentados, sem “comunicação”, dado que, caso contrário, os salários, diante de iguais
produtividades, teriam que ser rigorosamente os mesmos.
54/ Aqui estamos diante da tradicional “piada”: se a realidade não se enquadra no meu paradigma “dane-se” a
realidade”. Esta situação é contemplada na interpretação de Kuhn das Revoluções Científicas. Quando um
paradigma teórico deixa de ser adequado para explicar ou entender fenômenos, abre-se espaço para uma
Revolução, sendo o antigo paradigma substituído por outro. Mencionamos, no Capítulo IV, este aspecto quando
abordamos a incapacidade do modelo neoclássico tradicional de explicar uma situação de persistência do
desemprego. Contudo, o paradigma neoclássico mostrou uma inusitada capacidade de renovação nos anos 80.
A persistência de situações de desemprego ou a insensibilidade dos salários reais ao desemprego (rigidez dos
salários reais) foi interpretada à luz dos modernos modelos (ver Capítulo IV). A segmentação à la Doeringer e
Piore mereceu, por parte do paradigma neoclássico, um tratamento que sintetizaremos nos próximos
parágrafos.
55/ Em realidade, acabamos de sintetizar os principais argumentos dos Modelos de Salários de
Eficiência. O leitor interessado em um detalhamento maior consultar o Capítulo IV.
56/ Inclusive, podemos imaginar que o estoque de assalariados de uma firma está ele próprio
segmentado. Ou seja, uma parte do mesmo é administrada mediante salários de eficiência (altos salários diretos
e indiretos, estabilidade, possibilidades de progressão funcional na própria firma, etc.) devido a problemas de
informação assimétrica e outra parte não goza desse tipo de tratamento. Por exemplo, uma empresa pode
outorgar uma administração diferencial a seus quadros que requerem elevada qualificação e responsabilidade e
outro tipo de política é aplicada aos assalariados que realizam tarefas que não requerem qualificação específica.
Temos uma segmentação dentro da própria firma. Alternativamente, podemos imaginar que o segundo tipo de
recursos humanos (que não requerem formação específica, etc.) é terceirizado. Nesse caso a segmentação se
dará entre firmas e não intra-firma. Assim, é factível imaginar a possibilidade de existência de dois tipos de
segmentação, entre firmas e intra-firmas.
57/ Os artigos que sedimentaram uma explicação neoclássica à questão de um mercado dual e à funcionalidade
do desemprego são diversos. Escolher só alguns, como os mais representativos, dentro da ampla literatura tem,
sempre, uma dose de arbitrariedade e subjetividade. Contudo, não poderíamos deixar de mencionar quatro, que
hoje são considerados clássicos: Stiglitz, J., “Wage Determination and Unemployment in LDCs: the labor
turnover model”. Quarterly Journal of Economics. Vol. 88. Pág. 194-227. 1974.; Stiglitz, J.,” The Efficiency
Wage Hypothesis, Surplus Labor and the Distribution of Income in LDCs” Oxford Economic Papers. Vol. 28.
Pág. 185-207. 1976; Shapiro, C. and Stiglitz, J., “Equilibrium Unemployment as a Worker Discipline Device”
American Economic Review. Vol. 74. Pág. 433-444. 1984; ; McDonald, I. and Solow, R., “Wages and
Employment in a Segmented Labor Market” Quarterly Journal of Economics. Pág. 1115-1141. 1985.
58/ Em realidade, para sermos rigorosos, teríamos que falar das esperanças de utilidade
intertemporal, dado que os indivíduos maximizariam sua função de utilidade no tempo. Por outra parte, estamos
falando de esperanças dado que não existe certeza de ser contratado pelo setor primário estando
desempregado. Assim, estamos trabalhando com probabilidades. As esperanças de utilidade dos
desempregados estão em função dos salários pagos no setor primário (no caso de virem a ser contratados) e da
existência ou não de benefícios tipo seguro-desemprego.

Anexo11:
1 / Na leitura dos próximos parágrafos devemos ter presente que, seguindo uma máxima institucionalista, as
correlações e comportamentos são válidos para o caso brasileiro e de nenhuma forma pretendemos realizar
generalizações sem espaço nem tempo.
2 / Neste Anexo não pretendemos analisar os impactos do salário mínimo no mercado de trabalho. A literatura
nesse sentido é tão farta em evidências empíricas contraditórias e plausíveis que existem resultados para “todos
os gostos”. O texto de Corseuil, C.H. e Servo, L.M. “Salário Mínimo e Bem-Estar Social no Brasil: uma resenha
da literatura” Texto para Discussão Nº 880. IPEA. 2002, constitui um bom survey sobre o assunto e já o
mencionamos no Capitulo III, quando estudamos a demanda de trabalho. Neste Anexo nosso objetivo não é fazer
um sumário das relações entre SM, salários, emprego, desemprego, inatividade e informalidade senão
apresentar certas particularidades do SM como instituição no caso do Brasil. Nesse sentido, muitos dos

Page 143 of 146 www.concursosonline.net


www.apostilas2010.com

- 145 -
exemplos que desenvolveremos não necessariamente são
consensuais, mas, certamente, alguma escola ou artigo encontrou evidências nessa direção.
3 / As evidências contidas na literatura são, neste sentido, amplas. Ver, por exemplo, Neri, M.,
Gonzaga, G. e Camargo, J.M., “Efeitos Informais do Salário Mínimo e Pobreza”. Texto para
Discussão Nº 393. Departamento de Economia. PUC/RJ.
4 / Souza, P.R. e Baltar, P.E., “Salário Mínimo e Taxa de Salários no Brasil”. Pesquisa e Planejamento
Econômico. Vol. 9. N 3. 1979.
5 / A redação exata do Art. 7º, IV, da Constituição é: “....... de atender a suas necessidades vitais básicas e às
de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência
social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo,......”
6 / Não estamos aqui entrando no mérito da consistência dessa legislação. Por exemplo, segundo o Art. 7º da
Constituição teria que existir um SM quase individualizado, dado que as necessidades de uma família são
diferentes no caso de uma trabalhadora solteira (sem companheiro) e com 8 filhos e no caso de uma jovem que
mora com seus pais e não tem filhos. Estabelecer mínimos a partir do indivíduo e não da família carece de
consistência e, nessa perspectiva, tomar mínimos sociais como referencia para determinar o SM é questionável.
A perspectiva de um SM mínimo vinculado a uma cesta de consumo capaz de sustentar uma “família tipo”
também é utilizada pelo DIEESE, que periodicamente estabelece qual deveria ser esse referencial. Sobre o
ponto, consultar: http://www.dieese.org.br/esp/salmin.xml#.
7 / Hoje, o debate anual sobre os percentuais de reajuste do SM está pautado mais em torno dos impactos das
mudanças sobre os gastos públicos que sobre o mercado de trabalho. Inclusive, os desdobramentos sobre o
nível de pobreza do SM se dariam mais através do desdobramento nos benefícios sociais (especialmente nas
aposentadorias rurais) que sobre as menores remunerações no mercado de trabalho.
8 / O mesmo Art.7º, IV da Constituição Federal estabelece que o reajuste do SM não pode servir de parâmetro
para outros reajustes (“.....sendo vedada sua vinculação para qualquer outro fim”).

Cap. 12:
1 / Estamos simplificando, dado que tomar a relação custobenefício como um parâmetro de avaliação também
pode ser motivo de polêmica, especialmente quando os debatedores são não economistas ou, em geral, um
público que resiste em reduzir o universo dos custos e benefícios a variáveis econômicas. Como exemplo mais
recente dessa possível discordância podemos mencionar o PLANFOR, onde se tinham estabelecidos como
objetivos do programa elevar o “grau de consciência social”, fortalecer a democracia, etc..Nesse caso, os
benefícios não seriam quantificáveis e sintetizar a relação custobenefício em um parâmetro se torna uma tarefa
infrutífera.
2 / Em realidade, a um grupo é distribuído o medicamento e a outro um “placebo” (substância neutra) na medida
em que o consumo de um medicamento pode provocar um efeito psicológico que acabe afetando a trajetória de
uma doença, por exemplo. Logicamente, nenhum indivíduo (exceto os pesquisadores) sabe quem está tomando
a verdadeira droga e quem, o placebo. Veremos, mais na frente, que o efeito psicológico também pode estar
presente nos programas de emprego.
3 / Em última instância, a única diferença entre os dois grupos consiste em um ter tido a “sorte” de ter sido
escolhido, aleatoriamente, para participar do programa. Em média, as outras variáveis têm que apresentar
valores próximos.
4 / O ME tem uma certa tradição em áreas das ciências sociais como psicologia e educação. As primeiras
tentativas em áreas correlatas às PE´s foram realizadas nos EUA a partir dos anos 60 (na ocasião do New
Jersey Income Maintenance e, posteriormente, no Job Training Partnership Act). Com o transcorrer dos anos se
foram tornando corriqueiras, sendo adotadas pelo Canadá e, hoje, são, dadas as restrições sobre as
possibilidades de implementação que vamos a analisar nos próximos parágrafos, na maioria dos países da
OCDE. Na América Latina, a ME foi utilizada para avaliar o programa de combate à pobreza PROGRESA, do
México, e, mais recentemente, o programa Pro-Empleo, na Argentina.
5 / Este fato leva a que, como mencionamos, nas experiências médicas se utilize o placebo e ninguém sabe se
está sendo submetido ou não ao novo medicamento. Em um curso de formação profissional, logicamente, todos
sabem se estão fora ou não contemplados.
6 / Estamos falando das variáveis relevantes dado que os indivíduos não têm que ser idênticos em tudo. Por
exemplo, em princípio não parece ser relevante uma variável como ser torcedor do flamengo ou não. As variáveis
relevantes seriam as usuais (sexo, idade, grau de instrução, etc.). Aprofundaremos este último ponto na próxima
frase.
7 / Esse incremento de rendimentos pode ser a chave para explicar o processo de migração.
8 / Inclusive, poderíamos comparar os rendimentos dos migrantes com os nativos da região de

www.concursosonline.net
www.apostilas2010.com
- 146 -
destino.
9 / Estamos imaginando uma situação hipotética só a fins de ilustração. Podemos supor, como
em realidade sugerem certos modelos na literatura, que os migrantes, contrariamente ao
exemplo, apresentam uma seletividade negativa na região de origem.
10 / Em caso de seletividade, os coeficientes da regressão estariam viesados.
11/ Estamos só ilustrando através de uma hipotética situação, visto que, em outras circunstâncias, a correta
utilização do ME poderia ser viável. Suponhamos que existam restrições orçamentárias e todos indivíduos que
demandam um curso não podem ser contemplados. Nesse caso, os beneficiários podem ser escolhidos
aleatoriamente e os não incluídos fazerem parte do grupo de controle. Nesse caso, se o viés de seletividade está
dado pela iniciativa de procurar o SPE, o mesmo estaria neutralizado.
12 / As referências aos artigos e Heckman são diversas. Talvez o de maior relevância em termos históricos seja:
“Sample Selection Bias as a Specification Error” Econometrica. Vol 47 (1). 1979. Para a síntese de um
panorama mais abrangente, o leitor interessado pode consultar: Heckman, J., Lalonde, R. and Smith. J., “The
Economics and Econometrics os Labor Market Programs”, in Ashenfelter, O and Card, O (Eds.), Handbook of
Labor Economics. Vol. III. Esevier Science. New York, 1999.

Page 145 of 146 www.concursosonline.net

Você também pode gostar