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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS


CURSO DE DIREITO

A POSIÇÃO DE ALGUMAS RELIGIÕES E QUESTÕES POLÊMICAS


ACERCA DO ABORTO

KELLI CRISTINA RIBEIRO

ITAJAI , maio de 2007


ii

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI


CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS
CURSO DE DIREITO

A POSIÇÃO DE ALGUMAS RELIGIÕES E QUESTÕES POLÊMICAS


ACERCA DO ABORTO

KELLI CRISTINA RIBEIRO

Monografia submetida à Universidade


do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de
Bacharel em Direito.

Orientador: Professor DOUTOR JOÃO JOSÉ LEAL

Itajai , maio de 2007


iii

AGRADECIMENTO

Primeiramente a Deus, meu pai, que esteve


comigo em todos os momentos, me deu forças
quando eu não acreditava que iria conseguir, e
me fez crer que para querer, é preciso seguir em
frente, apesar de tudo. Muito obrigada!

A minha mãe, pela dedicação, carinho, toda a


ajuda oferecida sem nada querer de volta, e
principalmente por ter me dado a vida em um
momento que poderia ter feito outra opção.

A minha filha, por ser quem é e como é, as vezes


fazendo até papel de mãe, pelos momentos que
me proporciona de alegria, de satisfação, pelo
orgulho que tenho de ser sua mãe. Obrigada
mesmo!

A minhas amigas, Adriana Espezim,


Valdete, Keyla, Graciane e Isolete, por toda
a paciência e incentivo, mesmo quando
meu humor não era dos melhores,
tentaram e conseguiram me ajudar.
Valeu meninas!.

A professora Adriana Spengler por toda a sua


disponibilidade, com certeza sem sua ajuda
seria mais difícil. Obrigada de coração!

E finalmente porém de forma especial gostaria de


agradecer aos professores Motta e Romeu
Falconi, simplesmente pelo fato de existirem e de
alguma forma tornarem este mundo melhor. Bom
seria se o mundo tivesse mais pessoas como
vocês. À vocês toda minha admiração, meu
carinho e respeito. Muito obrigada pelas poucas
porém muito proveitosas conversas!
4

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho de pesquisa a todas as


mulheres que em algum momento de aflição
buscaram ajuda e não encontraram.

Dedico também a minha filha Pricila e a minha


mãe, que completam a minha vida, sem elas eu
talvez tivesse chegado até aqui, mas com certeza
a satisfação não seria a mesma.

E por fim, dedico a todas as pessoas que de uma


maneira íntegra, e sem se corromper ou se curvar
as convenções e aos ladrões, lutam por um Brasil
melhor, sem essa diferença social gritante que
vemos todos os dias.
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí , maio de 2007

Kelli Cristina Ribeiro


Graduando
PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale


do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Kelli Cristina Ribeiro, sob o título A
Posição de Algumas Religiões e Questões Polêmicas Acerca do Aborto, foi
submetida em [Data] à banca examinadora composta pelos seguintes
professores: [ ] ([ ]), e aprovada com a nota [ ] ([ ]).

[ ],[ ]

Professor Doutor João José Leal


Orientador e Presidente da Banca

Antônio Augusto Lapa


Coordenação da Monografia
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ART/ARTS Artigo/artigos

DR. Doutor

PT Partido dos Trabalhadores

N. Número
ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à


compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Aborto

O aborto é a morte de uma criança no ventre de sua mãe produzida durante


qualquer momento da etapa que vai desde a fecundação (união do óvulo com o
espermatozóide) até o momento prévio ao nascimento.1

Anencefalia

“A anencefalia é resultado da falha de fechamento do tubo neural, decorrente da


interação entre fatores genéticos e ambientais, durante o primeiro mês de
embriogênese.”2

Anticoncepcional
“Substancia que evita a gravidez.”3

Concepção

“Formar (o embrião) pela fecundação do óvulo, gerar.”4

1
O Que é o Aborto. Disponível em http://www.acidigital.com/vida/aborto/definicao.htm, acesso em
28/05/2007.
2
PINOTTI, José Aristodemo. Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e
Obstetrícia. Disponível em http://www.febrasgo.org.br/anencefalia2.htm, acesso em
17/05/2007.
3
XIMENES, Sérgio. Minidicionário Ediouro da Língua Portuguesa. Ediouro. 2° ed. São Paulo.
2000.
4
XIMENES, Sérgio. Minidicionário Ediouro da Língua Portuguesa.
Crime

Ação ou omissão que se proíbe e se procura evitar, ameaçando-a com pena,


porque constitui ofensa (dano ou perigo) a um bem ou a um valor da vida social.5

Dogma

“Doutrina indiscutível de uma doutrina religiosa ou de qualquer doutrina ou


sistema.”6

Dolo

“Diz-se o crime doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de


produzi-lo.”7

Embrião

“O ser humano até o final da oitava semana intra uterina.”8

Eugenia

“O estudo dos agentes sob o controle social que podem melhorar ou empobrecer
as qualidades raciais das futuras gerações seja fisica ou mentalmente.”9

Feto

“O novo ser humano em desenvolvimento, da nona semana de gestação até o


nascimento”10

5
FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal: Parte Geral. São Paulo. Editora
Bushatsky. Vol. 1. 1985. p. 147.
6
XIMENES, Sérgio. Minidicionário Ediouro da Língua Portuguesa.
7
BRASIL. Código Penal. Organização dos textos, notas remissivas e índices por Luiz Flávio
Gomes. Editora Revista Dos Tribunais. São Paulo. 2002.
8
XIMENES, Sérgio. Minidicionário Ediouro da Língua Portuguesa.
9
GOLDIM, José Roberto. Eugenia. Disponível em http://www.ufrgs.br/bioetica/eugenia.htm,
acesso em 17/05/2007.
10
XIMENES, Sérgio. Minidicionário Ediouro da Língua Portuguesa.
Religião

“1. Crença na existência de força(s) sobre-humana(s), criadora(s) do universo. 2.


Cada um dos vários sistemas organizados que se baseiam nessa crença, e que
possuem doutrina e rituais próprios. 3. Reverência às coisas sagradas.”11

Vida

“Espaço de tempo entre o nascimento e a morte.”12

11
XIMENES, Sérgio. Minidicionário Ediouro da Língua Portuguesa.
12
XIMENES, Sérgio. Minidicionário Ediouro da Língua Portuguesa.
SUMÁRIO

RESUMO .........................................................................................XIII

INTRODUÇÃO.................................................................................... 1

CAPÍTULO 1....................................................................................... 3

DOS CRIMES DOLOSOS CONTRA A VIDA...................................... 3


1.1 BREVE HISTÓRICO DO CÓDIGO PENAL ..................................................... 3
1.2 CONCEITO ...................................................................................................... 7
1.2.1 DOLO .............................................................................................................. 7
1.2.2 HOMICÍDIO....................................................................................................... 8
1.2.2.1 Homicídio Simples ................................................................................. 10
1.2.2.2 Homicídio Privilegiado........................................................................... 11
1.2.2.3 Homicídio Qualificado............................................................................ 13
1.2.2.3.1 Motivos .................................................................................................. 14
1.2.2.3.2 Meios ..................................................................................................... 14
1.2.2.3.3 Modos .................................................................................................... 15
1.2.2.3.4 Finalidade .............................................................................................. 16
1.2.3 INDUZIMENTO, INSTIGAÇÃO OU AUXÍLIO A SUICÍDIO .......................................... 16
1.2.4 INFANTICÍDIO ................................................................................................. 18
1.2.5 ABORTO........................................................................................................ 18
1.2.6 TRIBUNAL DO JÚRI – COMPETÊNCIA NO CRIME DE ABORTO .............................. 19

CAPÍTULO 2..................................................................................... 22

OS TIPOS DE ABORTO................................................................... 22
2.1 BREVE HISTÓRICO DO ABORTO ............................................................... 22
2.2 ESPÉCIES DE ABORTO ............................................................................... 27
2.2.1 ABORTO ESPONTÂNEO................................................................................... 27
2.2.2 ABORTO PROVOCADO .................................................................................... 27
2.2.2.1 Auto Aborto e Aborto Consentido ........................................................ 28
2.2.2.2 Aborto Provocado por Terceiro ............................................................ 29
2.2.2.3 Aborto Qualificado ................................................................................. 29
2.2.2.4 Terapêutico ou Necessário.................................................................... 30
2.2.2.5 Sentimental ............................................................................................. 32
2.2.2.6 Eugênico ou Eugenésico....................................................................... 34
2.3 As Críticas ao art. 128 do Código Penal..................................................... 36
2.4 Métodos Anticoncepcionais........................................................................ 37
2.4.1 PÍLULA ANTICONCEPCIONAL ........................................................................... 38
2.4.2 INJEÇÃO ANTICONCEPCIONAL ......................................................................... 38
2.4.3 DISPOSITIVO INTRA UTERINO .......................................................................... 38
2.4.4 VASECTOMIA ................................................................................................. 38
2.4.5 ENDOCEPTIVO ............................................................................................... 38
2.4.6 IMPLANTE ANTICONCEPCIONAL ....................................................................... 39
2.4.7 ANEL VAGINAL .............................................................................................. 39
2.4.8 ADESIVO ANTICONCEPCIONAL ........................................................................ 39
2.4.9 PÍLULA DO DIA SEGUINTE .............................................................................. 39
2.4.10 CAMISINHA .................................................................................................. 40
2.4.11 DIAFRAGMA................................................................................................. 40
2.4.12 CAMISINHA FEMININA ................................................................................... 40
2.4.13 ESPERMATICIDA........................................................................................... 41
2.4.14 MÉTODO DO MUCO ...................................................................................... 41
2.4.15 TABELINHA.................................................................................................. 41
2.4.16 COITO INTERROMPIDO .................................................................................. 41

CAPÍTULO 3..................................................................................... 42

A POSIÇÃO DE ALGUMAS RELIGIÕES E QUESTÕES POLÊMICAS


ACERCA DO ABORTO .................................................................... 43
3.1 ABORTO E RELIGIOSIDADE ....................................................................... 43
3.1.1 O CATOLICISMO E O DOGMA DE DEUS COMO AUTOR DA VIDA ....... 44
3.1.2 A POSIÇÃO DAS IGREJAS PROTESTANTES ....................................................... 45
3.1.3 ISLAMISMO E CONDESCENDÊNCIA COM O ABORTO.......................... 46
3.1.4 JUDAÍSMO: ABORTO NÃO PODE SER CRIME.................................................... 47
3.1.5 ESPIRITISMO E GRAVIDEZ COMO MANDATO DE ORDEM DIVINA .......................... 48
3.1.6 CANDOMBLÉ E NÃO PROIBIÇÃO ...................................................................... 49
3.2 ALGUNS ASPECTOS POLÊMICOS ACERCA DA PRÁTICA ABORTIVA .. 50
3.2.1 ASPECTOS POLÊMICOS RELIGIOSOS ............................................................... 50
3.2.2 ASPECTOS POLÊMICOS SOCIAIS E ECONÔMICOS.............................................. 53
3.2.3 QUANDO INICIA A VIDA HUMANA?................................................................... 58
3.2.4 UMA QUESTÃO TAMBÉM DE SAÚDE PÚBLICA ................................................... 60

CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................. 68

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 71


RESUMO

A pesquisa realizada tem como questão central o crime de


aborto, com a visão e os ensinamentos religiosos, juntamente com os aspectos
polêmicos. Visto que a discussão é bastante polêmica e já de longa data e
considerando que até mesmo os livros mais antigos como a Bíblia fazem menção
ao aborto, não se tem aqui a pretensão de realizar uma pesquisa que esgote
todas as fontes, até porque tal feito não seria possível. Dessa forma, busca-se na
fase inicial, abordar um pouco sobre a história das relações entre os seres
humanos para em seguida relatar a importância da existência de leis que
regulamentem essas relações, trazendo então um breve histórico do Código
Penal Brasileiro, para em seguida apresentar os tipos penais considerados como
crime contra a vida. Na seqüência, de maneira pouco mais aprofundada, passa-se
a tratar unicamente da questão do aborto, por ser esta uma questão um tanto
quanto delicada, busca-se aqui também, relatar e explicar quais as espécies de
aborto. No decorrer da pesquisa, considera-se de certa relevância mostrar
também alguns dos tipos de anticoncepcionais existentes no Brasil. Na última
parte do trabalho, a pesquisa foi realizada voltando-se unicamente para a questão
tema, ou seja, a visão e ensinamentos religiosos juntamente com os aspectos
polêmicos acerca do aborto. Para chegar ao fim do trabalho monográfico, foram
pesquisadas jurisprudências, artigos e reportagens que tratam da discordância de
opiniões, tratando consequentemente das mulheres que sofrem ao decidir pelo
aborto, e o praticam as margens da lei. A pesquisa realizada, demonstra quão
atual é a discussão do tema, lembrando que pode inclusive vir a ocorrer plebiscito
para a possível descriminalização do aborto, priorizando o direito da mulher de
tomar decisões sobre seu corpo.
INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto discorrer sobre o


crime de aborto e as questões polêmicas que o norteiam , elencando-se quais são
os fatos geradores da polêmica, e de que forma as crenças religiosas impostas
podem influenciar a sociedade diante da criminalização do aborto.

O motivo da pesquisa que resultou no presente trabalho foi o


de solucionar os problemas formulados, para testar as hipóteses, buscando
analisar a situação da gestante, enumerando quais os motivos que a levam a
cometer um aborto, levantando ainda a possibilidade de desconsiderar a prática
como crime.

A escolha do tema deve-se à necessidade de aprofundar o


conhecimento da pesquisadora diante de seus questionamentos, uma vez que
entende que descriminalizar o aborto não é apenas respeitar o direito de escolha
da gestante, mas também é parte da solução para o problema da saúde pública
decorrente dos abortos clandestinos e mal feitos.

O objetivo institucional foi o de produzir a presente


Monografia para a obtenção do título de Bacharel em Direito, pela Universidade
do Vale do Itajaí.

O objetivo investigatório geral foi pesquisar, analisar e


descrever com base na legislação, doutrina e jurisprudência brasileiras, como
também, artigos publicados na mídia, sobre a descriminalização do aborto, frente
o direto de escolha da mulher sobre o seu próprio corpo.

Para tanto no primeiro capítulo, apresentando-se um breve


histórico da lei penal brasileira e os tipos penais, considerando ser aborto um
crime contra a vida
2

No segundo capítulo, a abordagem foi sobre o histórico do


aborto no mundo, elencando-se quais os tipos de aborto, juntamente com suas
definições e alguns tipos de meios anticoncepcionais existentes no Brasil.

O terceiro capítulo, traz o resultado da pesquisa relativo ao


tema, trazendo os ensinamentos e crenças religiosas sobre o aborto e as
polêmicas que tornam o aborto tão controvertido, discutindo a questão dos
direitos das mulheres em decidir.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as


Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões
sobre a posição de algumas religiões e questões polêmicas acerca do aborto.

Para a presente monografia foram levantadas as seguintes


hipóteses:

 A prática do aborto e recepcionada na legislação pátria, sendo a


maioria figuras criminosas e poucas permitidas

 A tipificação do aborto no Brasil sofreu influência das religiões


predominantes no país?

 No caso de ocorrer a descriminalização do aborto, haveria impacto


na questão da saúde pública?

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de


Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados o
Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente
Monografia é composto na base lógica Indutiva.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as


Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa
Bibliográfica.
CAPÍTULO 1

DOS CRIMES DOLOSOS CONTRA A VIDA

1.1 BREVE HISTÓRICO D O CÓDIGO PENAL

O homem é um ser que, sabe-se que vive em sociedade e é


inegável que tem ocorrido através dos tempos uma constante evolução da figura
humana no que diz respeito a racionalidade.

Seja em grandes ou pequenos grupos, a vivência em


sociedade tem evoluído de forma mais organizada conforme o desenvolver da
razão. Porém, a convivência do homem com seus semelhantes trouxe os
conflitos e consequentemente atritos e violência de uns contra os outros. Tornou-
se, então, necessário, o regramento e as limitações diante das condutas tidas
como amplamente nocivas praticadas pelo homem contra seu semelhante.

Devido ao fato de que não havia como garantir a segurança


e o respeito a vida, integridade, honra e patrimônio de cada ser humano vivente
foram criadas normas para regrar as condutas humanas.

Mirabete ensina que “A vida em sociedade exige um


complexo de normas disciplinadoras que estabeleça as regras indispensáveis ao
convívio entre os indivíduos que a compõem.” 13

Dessa forma, a criação das normas jurídicas vem


acontecendo conforme a necessidade do homem em sua coletividade para que a
sua coexistência torne-se cada vez mais harmoniosa.

Desde as primeiras civilizações, ao cunhar a lei, esteve


presente um dos seus objetivos primordiais, que é limitar e regular o

13
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal I. 19 ed.. São Paulo. Editora Atlas, 2003. p
21
4

procedimento das pessoas diante de condutas amplamente consideradas como


nocivas e reprováveis.

O Código de Hamurabi, dentre outros regramentos penais


contra o crime, adota a chamada Lei do Talião ou a conhecida lei do olho por
olho, dente por dente, que concedia aos parentes da vítima o direito de praticar
com o criminoso a mesma ofensa e no mesmo grau por ele cometida.

As penas da Lei do Talião conhecidas como olho por olho,


dente por dente, foram substituídas pela pena de multa, aplicando-se também a
prisão perpétua em lugar da pena de morte14.

Até a idade média a noção de crime não era muito clara,


freqüentemente confundida com outras práticas reprováveis, que se verificavam
nas diversas esferas legais, administrativas, contratuais, sociais, e até religiosas.

Até a consagração do princípio nullum crimen nulla poena


sine lege (não há crime, não há pena sem lei), crime e pecado se confundiam
pela persistência de um vigoroso direito canônico que às vezes confundia (e até
substituia) a legislação dos Estados.

Deve-se, portanto, àquele princípio, a formulação atual de


várias legislações penais que, em verdade, não proíbem nenhuma prática, mas
simplesmente tipificam condutas e preconizam as respectivas penas àqueles que
as praticam.

A história dos códigos, relata que o Império trazia em seu


ordenamento jurídico criminal de 1830, os crimes contra o Estado em seu início e
os crimes contra a pessoa em sua última parte, como por ordem de importância.

Em 1890, o Código Republicano seguiu a mesma linha, o


que posteriormente foi mudando, e no Código Penal de 1940, os crimes contra a
pessoa é que iniciam a parte especial, colocando a importância do bem jurídico
vida em destaque.

14
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal. p 36
5

É o entendimento de Bitencourt:

O Código Criminal do Império inaugurava sua Parte Especial


tipificando os crimes contra o Estado, enquanto organismo político
jurídico, e a encerrava com os crimes contra a pessoa. O Código
Penal republicano de 1890 seguiu a mesma orientação, revelando
nos diplomas legais a preeminência do Estado sobre a pessoa. 15

O mesmo doutrinador traz, em seus ensinamentos, as


devidas mudanças e transformações ocorridas através dos tempos e da história
penal:

Essa hierarquia de valores foi rompida, em boa hora, pelo Código


Penal de 1940, cuja parte especial continua em vigor. Com efeito
o atual Código Penal inicia a Parte Especial tratando dos crimes
contra a pessoa e a encerra com os crimes contra o Estado,
colocando o ser humano como o epicentro do ordenamento
jurídico, atribuindo à pessoa humana posição destacada na tutela
que o Direito Penal pretende exercer.16

Os crimes dolosos contra a vida estão descritos na parte


especial do Código Penal Brasileiro17, em seu título I, respectivamente tipificados
nos artigos 121, 122, 123, 124, 125, 126, e 127.

São crimes dolosos contra a vida, o homicídio, induzimento,


instigação ou auxílio ao suicídio, infanticídio, aborto provocado pela gestante ou
com seu consentimento, aborto provocado por terceiro e aborto com o
consentimento da gestante (simples ou qualificado).

15
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Especial, volume 2. ed. 3. São
Paulo. Editora Saraiva. 2003. p.1.
16
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Especial. p.1.
17
BRASIL. Código Penal. Organização dos textos, notas remissivas e índices por Luiz Flávio
Gomes. Editora Revista Dos Tribunais. São Paulo. 2002.
6

Podem ser consumados ou tentados, e são dolosos por


existir a vontade do agente de colocar um fim a vida de outra pessoa ou assumir
esse risco conforme consta do art. 18, I do Código Penal.18

Em face da supremacia do bem tutelado, sendo a vida


humana um bem indisponível, possui assento na Constituição da República
Federativa do Brasil em seu artigo 5°19, como primeiro direito individual, também
protegido pelo Código Penal, em sua parte especial conforme segue:

Art. 5° - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer


natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País, a inviolabilidade do direito à vida...

No entanto, certo é que, impossibilitado está, o judiciário, de


proteger a vida humana contra tudo e todos, conforme os ensinamentos de Teles:

A proteção que o Direito concede à vida não é, todavia, absoluta.


Não pode, porque impossível, protegê-la de todos os ataques,
mormente os naturais. Não pode impedir a morte de alguém por
ação do raio que cai, ou por fenômenos da natureza, nem a morte
natural, mas procura alcançar apenas as ações previsíveis e, por
isso, evitáveis, que se voltam contra esse que é o bem mais
importante da sociedade. 20

E, sobre o assunto esplanado no parágrafo anterior, o


mesmo doutrinador explica que: “O Direito não protege a vida de modo absoluto,
também porque é o mesmo Direito que permite sua destruição, em situações
específicas, como é o caso da legítima defesa e do estado de necessidade”.21

18
BRASIL. Código Penal.
19
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília. DF.
Senado.
20
TELES, Ney Moura. Direito Penal: Parte Especial. São Paulo. Editora Atlas S. A., 2004, p 44.
21
TELES, Ney Moura. Direito Penal: Parte Especial. p 44
7

1.2 CONCEITO

1.2.1 Dolo

É considerado doloso pela doutrina e pela lei, o crime


cometido com intenção, sendo que, para que exista dolo não basta que haja
crime, mas que o agente tenha a intenção de produzir o resultado.

O dolo está conceituado no art. 18, inciso I, do Código Penal


Brasileiro: “diz-se o crime: doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o
risco de produzi-lo.”22

Continuando, a doutrina distingue o dolo como direto e


indireto ou eventual, sendo que no dolo direto o agente quer o resultado
determinadamente, e no dolo indireto o agente busca um resultado mas este não
é especifico, como por exemplo querer acertar um tiro, seja para matar, seja para
ferir gravemente. 23

Aparecem também na doutrina o dolo de dano, em que o


autor do fato delituoso, conforme ensina Mirabete “quer ou assume o risco de
causar lesão efetiva (121, 155 etc.)”, e o dolo de perigo, em que o agente “ quer
apenas o perigo ( arts. 132, 133 etc.)”, sendo que a importância decai para o fato
de o agente querer ou consentir o resultado, não importando se é dano ou
perigo.24

A doutrina tradicional distinguiu o dolo em genérico e


específico, tratando como dolo o genérico, aquele no qual o agente quer realizar o
fato típico de forma geral, como por exemplo matar, e o dolo específico seria a
vontade de praticar o ato com um fim determinado, como matar alguém mediante
tortura, porém, conforme Jesus:

22
BRASIL. Código Penal.
23
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal . p. 140, 143.
24
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal . p. 144.
8

O dolo é um só, variando de acordo com a figura típica. Nos


termos da orientação, o chamado dolo com intenção ulterior (dolo
específico), que em si expressa um fim ( o rapto é a subtração da
mulher para casar-se com ela ou para corrompê-la), assim como o
animus que certos delitos exigem, não são propriamente dolo com
intenção ulterior, e sim elementos subjetivos do tipo.25

Mirabete mostra a figura do dolo geral, explicando-a:

Existe este nos casos em que o agente, supondo ter conseguido o


resultado pretendido, pratica nova ação que, esta sim, vem a
resultar no evento. É o exemplo da vítima de golpes de faca em
tentativa de homicídio que é atirada ao mar pelo agente, na
suposição de já tê-la eliminado, causando-lhe a morte por
afogamento. Responderá ele por homicídio doloso consumado em
decorrência do denominado dolo geral quando, tecnicamente
haveria tentativa de homicídio seguida de homicídio culposo.26

Traz ainda Jesus a figura do preterdolo. O crime


preterdoloso, também conhecido como preterintencional, é uma espécie do
gênero crime qualificado pelo resultado.

Ocorre quando, há dolo no fato antecedente e culpa no fato


conseqüente. Dessa forma tem-se os tipos de dolo que são abrangidos pela
maioria da doutrina, especificados e exemplificados.27

1.2.2 Homicídio

Assassinato e homicídio são terminologias que apesar de


parecer ter o mesmo significado, no século XIX eram diferentes.

Assassinato servia para definir o ato de matar alguém que,


por algum motivo, fosse de maior gravidade, e homicídio, o mesmo ato, mas
nesse caso de menor gravidade.

25
JESUS, Damásio E. de. Código Penal Anotado. 4°ed .São Paulo. Editora Saraiva. 1994. p.53
26
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal . p. 144.
27
JESUS, Damásio E. de. Código Penal Anotado. p.59.
9

Porém, apesar de ser esse o entendimento da época, o


Brasil, em seu Código Penal Republicano adotou apenas a terminologia homicídio
para o ato de matar, é o que nesse sentido ensina a doutrina de Bitencourt:

O Código Penal brasileiro de 1890 adotou a terminologia de


homicídio para definir o crime de matar alguém, não seguindo a
orientação da maioria dos diplomas legais alienígenas, que, não
raro, preferiam classificá-lo em assassinato, quando, por alguma
razão apresentasse maior gravidade, e homicídio para a
modalidade comum. 28

A doutrina concorda quando se diz que é considerado


homicídio a destruição da vida extra-uterina, por outro homem.

Segundo o conceito de Teles, “A lei não estabelece quando


começa a vida; portanto, cabe à doutrina buscar o socorro da ciência para definir
esse termo.” 29

Continua o autor explicando que em conformidade com a


maioria da doutrina a vida extra-uterina tem início com o parto e completa
explicando que “Iniciado o parto, há vida extra-uterina e sua destruição será
homicídio...”30

Para completar o conceito de Teles sobre o momento em


que a vida extra-uterina tem seu início, traz-se o entendimento de Gomes sobre o
que seria parto:

o conjunto de processos mecânicos, fisiológicos e psicológicos


tendentes a expulsar do ventre materno o feto chegado a termo ou
já viável - e completa - que tem como marco inicial o rompimento
do saco amniótico. Deve-se considerar iniciado o parto cirúrgico –
cesariana – com a primeira incisão realizada no corpo da gestante
pelo obstetra. 31

28
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Especial. p27.
29
TELES, Ney Moura. Direito Penal: Parte Especial. p 47.
30
TELES, Ney Moura. Direito Penal: Parte Especial. p 47.
31
GOMES, Hélio. Medicina Legal. 32. ed. Rio de Janeiro. Editora Freitas Bastos, 1977. p. 602.
10

A lei penal utilizada atualmente no Brasil tem suas


semelhanças com a lei anterior (Código Penal Brasileiro de 1890), a exemplo
desta continuou com a nomenclatura de homicídio, porém, para os casos de
maior ou menor gravidade, foi criada a distinção dos crimes de homicídio ,
detalhada na obra de Bitencourt:

O atual Código preferiu não criar figuras especiais, tais como


parricídio, matricídio ou fratricídio, rejeitando, enfim, a longa
catalogação que o Código anterior prescrevia (art. 294 par. 1, do
CP de 1890). As circunstâncias e peculiaridades concretas é que
deverão determinar a gravidade do fato e a sua adequada
tipificação em uma das três modalidades de homicídio que
disciplina – simples, privilegiado ou qualificado. 32

1.2.2.1 Homicídio Simples

Art. 121. Matar alguém:

Pena – reclusão, de 6 (seis) a 20 (vinte) anos.

É a forma mais comum da prática ou ato de matar tipificada


no art. 121 do Código Penal atual, para Teles “é um crime comum, material,
simples, de dano instantâneo, de efeitos permanentes e de forma livre.” 33

Teles explica que é comum porque qualquer pessoa pode


ser o sujeito ativo, e quanto aos demais requisitos acima descritos ensina que:

É crime material, porque há no tipo a descrição de uma conduta,


com a exigência, para sua consumação, de que o resultado morte
seja produzido pela conduta do agente. Simples porque atinge um
único bem jurídico, a vida humana extra-uterina, e de dano, pois
destrói o bem jurídico protegido. É instantâneo de efeitos
permanentes, porque consuma-se no momento da morte da vítima
e suas conseqüências perduram por todo o tempo. É um crime
que pode ser praticado pelas mais diversas formas de execução,

32
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Especial. p.27.
33
TELES, Ney Moura. Direito Penal: Parte Especial. p 54
11

por ação stricto sensu ou por omissão, daí que se diz ser um
crime de forma livre.34

No conceito da obra de Alves, homicídio simples “É o ato


singelo de matar.”, diz ainda que o conceito é negativista, conceituando na
verdade, “o que o homicídio simples não é.”35

1.2.2.2 Homicídio Privilegiado

Encontra-se no § 1° do art. 121 do Código Penal Brasileiro


assim definido, “Se o agente comete o homicídio impelido por motivo de relevante
valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a
injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um
terço”.36

Considera-se relevante valor social o crime cometido por


motivação da população, como por exemplo, o linchamento de um estuprador de
crianças pego no momento em que comete o crime.

Explica Alves que “O motivo determinante do crime envolve


o interesse de várias pessoas. O agente é levado a matar face a existência de
uma emoção ou paixão coletiva” .37

O valor social que leva alguém a cometer um crime deve ser


muito relevante e de grande importância para a coletividade, Teles exemplifica
esse tipo penal como o combate ao tráfico de entorpecentes:

...pode-se conhecer o privilégio daquele que, com a exclusiva


intenção de combater a criminalidade, mata o chefe da quadrilha
que domina sua região. Move-o a busca da paz e da tranqüilidade
social, que são, a toda evidência, de enorme relevância social.38

34
TELES, Ney Moura. Direito Penal: Parte Especial. p 54
35
ALVES, Ivanildo Ferreira. Crimes Contra a Vida. Belém. Editora Unama, 1999. p 35.
36
BRASIL. Código Penal.
37
ALVES, Ivanildo Ferreira. Crimes Contra a Vida. p 37.
38
TELES, Ney Moura. Direito Penal: Parte Especial. p 56
12

O homicídio privilegiado é tido como causa de diminuição da


pena na 3° fase da dosimetria penal39.

No entanto, não pode um estranho á causa, ou seja, alguém


sem os mesmos motivos ajudar no cometimento do crime e receber o benefício.

Nesse sentido ensina Fragoso que, “A circunstância de ter


agido por motivo de especial valor social ou moral tem caráter subjetivo e assim
não se comunica ao co-autor, que não age impelido pelas mesmas razões”.40

O crime cometido mediante relevante valor moral


diferentemente do tipo declinado anteriormente tem como característica o
interesse individual e particular do autor.

É o caso da eutanásia onde o autor sofre por ver o


sofrimento da vítima e comete o crime para que cesse de uma vez essa dor.

Conforme ensina Alves “O homicídio eutanásico, crime


perante o Direito Penal Brasileiro, é realizado por dó, por piedade diante da
situação aflitiva e tormentosa da vítima. A consternação, a condolência leva o
agente a matar”, e completa: “Não obstante crime, a lei penal privilegia a conduta
criminosa, prevendo a minoração da reprimenda penal no quantum especificado
no § 1”.41

O terceiro tipo de homicídio privilegiado é homicídio


cometido sob o domínio de violenta emoção logo após a injusta provocação da
vítima.

É um tipo que tem como característica atingir violentamente


o sistema emocional do autor do fato delituoso de forma que este sinta-se
dominado, vindo a ter reação violenta e imediata42.

39
BRASIL. Código Penal.
40
FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal: Parte Geral. São Paulo. Editora
Bushatsky. 1976. Vol. 1, p. 60
41
ALVES, Ivanildo Ferreira. Crimes Contra a Vida. p 37.
42
TELES, Ney Moura. Direito Penal: Parte Especial. p. 59
13

Bitencourt esclarece que o artigo da lei é claro quando diz


“violenta emoção”, pois não pode o autor estar simplesmente emocionado para
cometer crime e receber o privilégio, sendo também necessário a provocação da
vítima, provocação esta generalizadamente repulsiva incutindo a repulsa do
agente.43

Nos ensinamentos de Teles a ação do agente deve ser


imediatamente após a injusta provocação que lhe desencadeou a violenta
emoção:

A reação deve ser pronta e rápida, imediatamente após a


provocação, pois do contrário não se poderia atribuí-la ao estado
emocional. Passado algum tempo após a provocação, o estado
psíquico alterado do agente já não será o mesmo, o furor já terá
arrefecido e sua reação só poderá ser atribuída ao desejo de
vingança ou ao ódio que em si se instalara, sentimento esse que o
Direito não poderia, mesmo, premiar. Se não reagiu no instante
seguinte a provocação, em que a intensidade da emoção que lhe
arrebatou era maior, é porque ela não lhe alterou sobremaneira a
capacidade de controlar-se, logo, não pode invocar o privilégio.44

Dessa forma entende-se que o agente deve estar com seu


estado emocional abalado ao extremo, de forma que não consiga usar seu
raciocínio.

Para se usar como exemplo: quando o agente encontra o


cônjuge no ato do adultério, isso pode ser uma imagem destrutiva acarretando o
cometimento do crime no momento do flagrante, o que enquadra o tipo
perfeitamente no § 1 do art. 121 do Código Penal Brasileiro.

1.2.2.3 Homicídio Qualificado

Por outro lado, o legislador também tratou de não deixar de


fora os motivos mais reprováveis para o ser humano querer tirar a vida de outrem.

43
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Especial. p.60, 61.
44
TELES, Ney Moura. Direito Penal: Parte Especial. p. 59
14

O tipo penal encontra-se no art. 121, § 2 , I, II, III, IV, e V do


Código Penal Brasileiro e tem pena prevista no ordenamento jurídico penal com
reclusão de doze a trinta anos45

1.2.2.3.1 Motivos

Mediante paga é quando o agente recebe pagamento antes


de cometer o crime considerando a recompensa mais valiosa do que a vida
humana, o que não acontece na promessa de recompensa onde o agente tem
somente uma expectativa de receber vantagem que pode não ser patrimonial ou
outra vantagem de ordem pessoal.

Os motivos acima descritos são também considerados como


torpeza, tido como torpe o motivo que agride o seio da sociedade e esta o tem
como repugnante.

Teles repugna o agente de tal crime dessa forma:

Como se fora um deus, decide, por uma motivação abjeta, por fim
a vida humana simplesmente para auferir um ganho monetário ou
uma vantagem patrimonial, econômica ou de qualquer natureza. É
o cúmulo do egoísmo. Interromper toda uma vida pela simples
razão de obter um ganho pessoal.46

Motivo fútil seria o banal, ou seja, aquele pelo qual não


justifica de forma alguma o crime, é desproporcional ao fato criminoso cometido
pelo agente.

1.2.2.3.2 Meios

O emprego de veneno, considerado pela doutrina como


meio insidioso, para ser tido como qualificadora deve ser feito de forma
dissimulada, sendo que a vítima deve desconhecer a intenção do agente de lhe
provocar a morte por envenenamento.

45
BRASIL. Código Penal.
46
TELES, Ney Moura. Direito Penal: Parte Especial. p 62.
15

Para Hungria é considerado como veneno “ a substância


que, introduzida no organismo, é capaz de, mediante ação química ou bioquímica,
lesar a saúde ou destruir a vida”.47

O emprego de fogo ou explosivo pode ser meio cruel como


também pode resultar perigo comum dependendo da circunstância ou da forma
como é empregado.

Outro meio é o emprego de asfixia, forma pela qual se


impede a capacidade respiratória da vítima e pode ser feita mecanicamente,
podendo ser por meio de enforcamento, afogamento, sufocação, esganadura,
estrangulamento; ou tóxica forçando a parte passiva a respirar gás asfixiante.

Ainda sobre a asfixia Teles explica que “ é a supressão da


respiração, com a cessação das trocas orgânicas, reduzindo-se o teor de
oxigênio, aumentando o teor de gás carbônico no sangue arterial.”48

O emprego de tortura é do tipo que causa sofrimento


prolongado para a vítima, vindo esta a padecer de forma desnecessária e cruel.

O meio insidioso é aquele utilizado de forma dissimulada


que através do elemento surpresa deixa a vítima sem condições de defesa.

Meio cruel é quando o agente torna o sofrimento da vítima


bárbaro e brutal, porém desnecessário, revelando no mesmo certa dose de
sadismo a ponto de se sentir bem ao ver o sofrimento causado por ele na vítima.

Meio de perigo comum ocorre quando o agente, para


concretizar seu intento, coloca em risco a vida de um número indeterminado de
pessoas.

1.2.2.3.3 Modos

Traição é o modo pelo qual a vítima não desconfia que corre


perigo, seja por estar de costas para o perigo, seja por confiar no agente de forma

47
HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal. Rio de Janeiro. Editora Forense, 1956. Vol.
2. p. 434.
16

que nem imagina a intenção deste de lhe fazer mal, sendo assim a ocultação da
vontade pode ser moral ou física.

A emboscada é o modo pelo qual o agente se utiliza do


elemento surpresa provocado na vítima quando a mesma não espera pelo
ataque, deixando esta sem condição alguma de defesa. O agente esconde-se
para aguardar o momento certo e seguro para cometer o crime, o que torna
impossível uma reação de defesa da vítima.49

A dissimulação ocorre quando o agente do crime usa de


disfarces, de forma a esconder seu propósito e enganar a vítima fazendo-se
passar por pessoa amiga para que esta lhe tenha total confiança e seja
surpreendida pelo ataque de maneira que não tenha tempo de apresentar defesa.

Outro recurso que torne impossível a defesa do ofendido


deve ser um modo análogo a traição, emboscada ou dissimulação, o mais comum
é quando a vítima é pega de surpresa.

1.2.2.3.4 Finalidade

Assegurar a execução, neste caso a qualificadora não é a


prática de outro crime mas sim a prática de um crime para assegurar a ocorrência
de outro crime.

No mesmo inciso, tem-se as figuras da ocultação e


impunidade que se caracterizam por ter o agente, a intenção de destruir as provas
de outro crime, e por último, temos a figura de assegurar vantagem de outro crime
que se caracteriza por querer o agente, garantir o êxito de outro crime.

1.2.3 Induzimento, Instigação ou Auxílio a Suicídio

É suicídio o ato de por fim a própria vida, não sendo no


entanto um ato punível por ser impossível a punibilidade e, também não se pune

48
TELES, Ney Moura. Direito Penal: Parte Especial. p 69.
49
TELES, Ney Moura. Direito Penal: Parte Especial. p 74.
17

a sua forma tentada, pois se alguém acredita que não vale a pena viver a ponto
de matar-se, qualquer sanção só viria a piorar seu estado emocional,
encorajando-o a tentar novamente por fim ao seu sofrimento através da morte.

A lei não pune o ato da coação para impedir o suicídio (art.


146 § 3 , inciso II do Código Penal Brasileiro), pois o bem jurídico tutelado mais
importante é a vida.

No entanto, a forma descrita em lei penal traz como crime o


induzimento, a instigação e o auxílio para que o suicida tenha êxito em seu
intento.

O ato de induzir, para a doutrina, significa incutir, inferir,


fazer com que o outro acredite que tem que matar a si mesmo, sendo que este
nem pensava em tal coisa, por outro lado, instigar significa que já existe o
pensamento suicida, esse pensamento só é reforçado, estimulado, de maneira a
não permitir que o suicida venha a desistir.

Nessa linha de pensamento ensina Mirabete que:

Embora o induzimento e a instigação sejam situações


semelhantes, pode-se distinguir o ato de induzir, que traduz a
iniciativa do agente, criando na mente da vítima o desejo do
suicídio quando esta ainda não pensara nele, do ato de instigar,
que se refere a conduta de reforçar, acoroçoar, estimular a idéia
preexistente de suicídio. 50

Já o auxilio é a ajuda para que o ato se concretize, como


ensinar o uso de determinado veneno ou a entrega da arma, é tornar viável,
possível a prática suicida, ou ainda como ensina Noronha, auxiliar de suicídio
pode também ser a pessoa que “impede a intervenção de pessoa que poderia
frustrar o ato de desespero...” .51

50
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal II. 22° ed.. São Paulo. Editora Atlas, 2004
p. 82.
51
NORONHA, E. Magalhães. Direito Penal. 28 ed. São Paulo. Editora Saraiva, 1996. vol 1, p.
270.
18

Note-se que no tipo penal em questão, o autor do fato


delituoso não é, senão, o suicida mas sim o que comete uma das três condutas
para tornar possível o suicídio, sendo fundamental a sua participação.

1.2.4 Infanticídio

É um crime próprio, sendo considerado próprio todo o crime


que exige agente específico, o infanticídio é praticado pela mãe em estado
puerperal, caso fosse praticado por outra pessoa, ou não se encontrando a mãe
em estado puerperal deixa de ser um infanticídio para se tornar um homicídio,
conforme comportamento descrito nos ats 121 e 123 do Código Penal.52

O estado puerperal não é pacificado pela doutrina, o que se


tem é que é o momento do parto ou logo após, quando a mãe se encontra sob
uma espécie de alteração psíquica lhe produzindo perturbações emocionais,
sendo que não necessariamente toda mulher que matar seu filho durante ou logo
após o parto vai estar sob a influência do estado puerperal.

A condição do puerpério, conforme ensina Bitencourt, é


definida por exames médicos, em que não sendo comprovado, o crime cometido
é de homicídio.53

1.2.5 Aborto

O aborto provocado pela gestante ou com seu


consentimento, é o assunto tema deste trabalho, por esse motivo, será tratado de
forma mais aprofundada no capítulo seguinte.

O crime de aborto encontra-se tipificado nos arts. 124,125


e126, com qualificação no art. 127, todos do Código Penal atual,54 é também um
crime doloso contra a vida conforme consta da lei Penal em vigor.

52
BRASIL. Código Penal.
53
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Especial. p. 140,141.
19

Por se tratar de uma discussão sobre ter ou não, a


gestante, o direito de tomar a decisão com respeito ao seu corpo, o assunto, vem
a muito tempo gerando controvérsias, e atualmente, é tema de debate na mídia e
na sociedade.

1.2.6 Tribunal do Júri – Com petência no Crime de Aborto

Os crimes dolosos contra a vida, assim como o assunto


tema deste trabalho, ou seja, o aborto, tem como competência para julgamento o
tribunal do júri, reconhecido pela Constituição da República Federativa do Brasil
de 1988 em seu art. 5°, XXXVIII, “d”, e disciplinado pelo Código de Processo
Penal no art. 74 § 1°.

As origens do Tribunal do Júri são controvertidas pela


doutrina, encontrando-se muitas vertentes. Acquaviva tráz algumas delas em sua
obra específica sobre o tema.

Relata o doutrinador que inicialmente o júri era formado por


cidadãos que se alistavam antecipadamente, sendo depois escolhidos por sorteio
para decidir sob juramento a culpa ou não das infrações penais em geral.55

As raízes do júri são diversas, com relatos na Grécia antiga


de que o júri iniciou-se com o tribunal dos Heliastas que eram membros da
Heliéia, e tinham competência para julgar todas a causas de direito público e a
maioria do direito privado, era o mais importante tribunal ateniense, composto de
seis mil membros, sorteados anualmente entre os cidadãos de mais de trinta anos
de idade.56

Existem muitas correntes para os primórdios do júri, com


teorias que defendem seu início no direito romano, há inclusive uma comparação
com os apóstolos de Jesus Cristo, comparando o caráter religioso que é imposto
ao júri pelo número de jurados que seria uma identificação com os doze

54
BRASIL. Código Penal.
55
ACQUAVIVA, Marcus Claudio. Tribunal do Júri. São Paulo. Editora Ícone, 1991. p. 17.
20

discípulos, devido ao papel que é dado ao homem comum para ser detentor da
verdade e julgar uma conduta de outro ser humano.

Acquaviva faz menção a esse respeito dizendo que:

Em lembrança dos doze apóstolos que haviam recebido a visita


do Espírito Santo, quando doze homens de consciência pura se
reuniam sob a invocação divina, a verdade infalivelmente se
encontrava entre eles. Desta crença teria nascido o Júri. 57

No entanto a doutrina na sua maioria e o próprio Acquaviva


comentam sobre as origens do júri que podem ter sido na Inglaterra, assim como
ensina o doutrinador, na mesma obra mais adiante ao relatar que:

Essas origens acham-se na história da Inglaterra, por volta de


1215, quando o Concílio de Latrão aboliu as Ordálias e os juízos
de Deus. Entre os anglo-saxãos, a instituição deixou profundas
raízes, muito mais firmes do que aquelas firmadas no continente
europeu.58

No Brasil, como já foi dito anteriormente, o júri está


consagrado pela Constituição da República Federativa do Brasil em seu art. 5°,
XXXVIII, “d”, mas também tem sua história.

Com início em 18/06/1822, foi criado para, a princípio, julgar


os crimes de imprensa. Dois anos mais tarde, em 25/03/1824 passou a ser órgão
do poder judiciário e sua competência elevou-se, passando a julgar também
questões civis e criminais, foi alterado e regulamentado por inúmeras outras leis
no decorrer do tempo e mantido pela Lei Magna de 1891 e nas subsequentes,
quando em 1937 a Constituição foi omissa e teve que ser corrigida pelo Decreto
n° 167/38.

Retomando o legado histórico das Constituições anteriores


à de 1937, retorna, soberanamente e definitivamente a Instituição do Júri com a

56
ACQUAVIVA, Marcus Claudio. Tribunal do Júri. p. 17.
57
ACQUAVIVA, Marcus Claudio. Tribunal do Júri. p. 17.
21

Constituição de 1946 (art. 146,§28), sendo pois ratificado pela Carta Magna de
1967 (art.150, § 18), bem como pela Emenda Constitucional n° 1/69 (art. 153, §
18).

Acquaviva, no entanto, não considera a instituição do


Tribunal do Júri muito feliz, e assevera que se fossem bons os resultados, a
competência não teria sido restringida desde cedo apenas para os crimes dolosos
contra a vida, consumados ou tentados.59

Porém, não se pode deixar de ressaltar que na Constituição


da República Federativa do Brasil de 1988 o Júri ganhou status de direito e
garantia fundamental, tornado-se cláusula pétrea, ou seja, intocável.

Pode-se discutir e reformar sua competência e seus


procedimentos, mas sua existência jamais pode ser tocada.

É certo, que tratar sobre aborto é deveras delicado, porque


ele aborda questões de cunho religioso e moral, e para que se possa ter uma
melhor opinião sobre o tema, se faz necessário estudar sua origem e métodos.

Desta forma, por ser o aborto também um crime contra a


vida, e ser de competência de julgamento do Tribunal do Júri, estar-se-á tratando
no próximo capítulo do presente trabalho sobre as antigas legislações que
defendiam ou recriminavam o aborto, as várias formas de cometer o ato, além de
uma breve noção dos métodos contraceptivos.

58
ACQUAVIVA, Marcus Claudio. Tribunal do Júri. p. 17.
59
ACQUAVIVA, Marcus Claudio. Tribunal do Júri. p. 19.
22

CAPÍTULO 2

OS TIPOS DE ABORTO

2.1 BREVE HISTÓRICO D O ABORTO

Tão antigo e ainda despertando discussões, o aborto divide


as legislações desde que se tem notícia do assunto.

Na antigüidade, no Código de Hammurabi, o aborto era


considerado crime, face os interesses do marido, e também era tido como uma
lesão a integridade física da mulher.

Seguindo uma outra vertente, observou-se que, em algumas


legislações de tempos tão antigos, quanto da época de Hammurabi, o aborto não
era considerado crime.

Belo, em sua obra, muito bem explica o porque de em


algumas civilizações antigas, não haver crime de aborto quando estirpado a
criança dentro do ventre da mãe, pois o feto era como se fosse parte do corpo da
genitora, a não ser que esta estivesse casada, pois o marido, naquela época tinha
o direito de vida e de morte sobre seus filhos, portanto, cabia ao varão decidir
quanto ao nascimento ou abortamento, fora isso a mulher poderia decidir o futuro
de sua gravidez. 60

Destaca-se que na Bíblia, que é um livro considerado


sagrado na doutrina cristã, encontra-se relatos sobre o aborto.

No livro do Êxodo, da lei Hebraica, em seu cap. 21, vs. 22 a


25 lê-se:

60
WARLEY Rodrigues Belo. Aborto, Considerações Jurídicas e Aspectos Correlatos. Belo
Horizonte. Editora Del Rey. 1999. p. 21
23

Se alguns homens pelejarem e ferirem uma mulher grávida, e


forem causa de que aborte, porém não houver morte, certamente
será multado, conforme ao que lhe impuser o marido da mulher, e
pagará diante dos juízes; 23. Mas se houver morte então darás
vida por vida, 24. Olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé
por pé, 25. Queimadura por queimadura, ferida por ferida, golpe
por golpe.61

Note-se, que nesta tradução de Almeida, ao se fazer uma


interpretação do versículo 22, é concluir que naquela época, o feto era
considerado como parte do organismo da mulher, portanto em casos de aborto
provocado por terceiros, estes não eram condenados pela morte ocasionada, e
sim por lesão corporal contra a gestante; o que leva a crer, que o produto da
gravidez não era considerado como pessoa, mas apenas parte do corpo humano.

No entanto, na questão relativa a tomada de decisão sobre o


futuro de uma gravidez, Belo62 relata de forma clara que nem todas as mulheres
tinham esse poder.

As greco-romanas por exemplo, não podiam decidir sobre


sua própria situação, uma vez que, enquanto solteiras encontravam-se sob a
tutela do pai, passando para o marido após o casamento, faltando os dois,
passaria a ser tutelada pelo Estado, inclusive no que diz respeito aos seus bens e
filhos.

Ocorre que, apesar de a mulher grega não ter o poder de


decisão, o mesmo autor63, explica que na Grécia de Aristóteles o aborto não era
considerado um crime, sendo inclusive difundido pelo filósofo, que já se
preocupava com o que conhecemos hoje por explosão demográfica, sendo que
Aristóteles, Platão e o mestre de ambos, Sócrates compartilhavam as mesmas
opiniões e tinham a mesma preocupação, o aumento exagerado das populações.

Com a pesquisa realizada, descobriu-se que até mesmo o


pai da medicina, Hipócrates, apesar de ter jurado não ensinar as mulheres

61
ALMEIDA. João Ferreira. Bíblia Sagrada. 2. ed. Geográfica. São Paulo. 2.000. p. 78.
62
WARLEY Rodrigues Belo. Aborto, Considerações Jurídicas e Aspectos Correlatos. p. 22.
63
WARLEY Rodrigues Belo. Aborto, Considerações Jurídicas e Aspectos Correlatos. p. 22.
24

grávidas receitas e técnicas abortivas, repassava os preceitos médicos de aborto


para as parteiras, talvez porque acreditasse que ensinando-as apenas, estaria
cumprindo seu juramento.64

Tessaro preleciona em sua obra, relatos de que, foi após a


revelação da imortalidade da alma por meio do cristianismo, predominante e com
influência na idade média, que se consolidou o entendimento de que o início da
vida não se dá com o nascimento, mas sim com a concepção, e que portanto um
feto recém concebido não é diferente de um ser humano já nascido, a partir de
então, a lei romana passou a assemelhar o aborto ao homicídio, penalizando
quem cometesse tal delito com a pena de morte. 65

Santo Agostinho, que era um bispo, católico, teólogo e


filósofo, considerava um pecado contra o matrimônio, tanto o aborto, quanto as
medidas tomadas para se evitar a gravidez.

De acordo com Mori, Santo Agostinho trazia considerações


até mesmo sobre métodos possivelmente contraceptivos:

Numa célebre oração que começa com a palavra aliquando (“às


vezes”) observa que, mesmo casados, aqueles que praticam tais
atos “não são cônjuges” e que “ou ela é de alguma forma
prostituta do marido, ou ele é adúltero com a esposa. 66

Fato interessante da história, é que até o século XVI, os


homens não podiam nem mesmo na qualidade de médicos, ajudar as mulheres
na hora do parto, o que era feito por meio de senhoras mais velhas e com mais
experiência, por nós conhecidas como parteiras.

Essas parteiras, na época intituladas de comadres,


ajudavam não só na hora do parto, mas também nas questões amorosas, com

64
WARLEY Rodrigues Belo. Aborto, Considerações Jurídicas e Aspectos Correlatos. p. 22
65
TESSARO, Anelise. Aborto Seletivo: Descriminalização e Avanços Tecnológicos da
Medicina Contemporânea. Curitiba. Editora Juruá. 2002. p. 24
66
MORI, Maurizio. A Moralidade do Aborto. Brasília. Editora Unb. 1997. p.18 e 19.
25

poções para o amor e encantamentos, contraceptivos e até abortivos, sendo


consideradas bruxas, conforme declara Mori67.

Em 1917, na URSS o aborto deixou de ser penalizado,


porém, mais adiante, o governo teve que tomar novas medidas para regularizar a
situação com receio do grande percentual de abortos realizados de qualquer
forma, o que colocaria em grande risco a vida e a saúde das mulheres,
estabelecendo que somente poderia ser feita a interrupção em hospitais por
médicos do estado. Alguns anos mais tarde, o aborto voltou a ser proibido, mas,
precisamente em 1955 a liberdade de abortar, tornou a ser uma realidade para as
mulheres daquele país.

No Uruguai, a liberação do aborto consentido pela gestante


durou pouco, apenas de 1934 até 1938, sendo considerada uma afronta contra as
tradições jurídicas do país e passando a ser considerado crime o aborto
consentido ou não pela gestante, e também o praticado por ela mesma, sendo
que atualmente existe uma tendência de que as penas sejam abrandadas em
alguns casos .68

Na década de 1960 conforme relata Mori, um acontecimento


curioso levou a questão do aborto a ser novamente o assunto do momento,
ocorre que:

Milhares de mulheres da Europa e dos Estados Unidos tinham


utilizado, durante as primeiras fases da gravidez, a talidomida, um
calmante antiemético que provocava anomalias graves nos fetos.
Esse evento dramático colocou com força o problema do aborto
em casos de malformações fetais. 69

Em seguida, o autor continua explicando que, por mais que


as leis tentassem resolver o problema ampliando as exceções, não foi suficiente,
pois as mulheres queriam muito mais, desejavam o poder de decisão, sendo que

67
MORI, Maurizio. A Moralidade do Aborto. p. 21.
68
BELO, Warley Rodrigues. Aborto, Considerações Jurídicas e Aspectos Correlatos. p. 24 e
25.
69
MORI, Maurizio. A Moralidade do Aborto. p. 25.
26

em 1973, as mulheres dos Estados Unidos conquistaram o direito de interromper


a gravidez quando:

A Corte Suprema dos Estados Unidos estabeleceu, na histórica


sentença de Roe vs. Wade (22 de janeiro de 1973), que, embora
faltasse na Constituição americana uma definição do termo
“pessoa”, a utilização da palavra é tal que teria aplicação somente
depois do nascimento. Em caso nenhum vem permitir a
possibilidade de ser aplicada em fase pré-natal (...) a palavra
pessoa não inclui o não nascido.70

Já no Brasil, quando o país estava sob a égide do Código


Criminal do Império de 1830, não era crime o aborto realizado pela gestante,
porém qualquer outra pessoa que lhe ajudasse ou fornecesse algum tipo de ajuda
para a prática, ainda que fossem ervas, seria penalizado, pena esta que seria
ainda mais rigorosa, se o indivíduo que forneceu ajuda, tivesse qualidade de
médico.

Com o Código Penal Brasileiro de 1890, o aborto já era


considerado crime, sendo apenas autorizado para salvar a vida da gestante, caso
em que se esta chegasse a morrer, o médico ou a parteira seriam eventualmente
punidos por sua imperícia.71

O Código Penal Brasileiro de 1940, conforme consta da


mesma obra de Bitencourt72, considera como figuras típicas, o aborto provocado,
o aborto sofrido e o aborto consentido, mas, como escreve o autor, a Lei supra
citada, foi publicada respeitando os costumes e a cultura dos anos 30, desde
então já se passaram quase 80 anos e neste último século muitas foram as
mudanças, tanto no comportamento quanto na cultura e em tantas outras áreas.

Com a lei, espera-se, não seja diferente, mesmo até devido


aos grandes avanços da medicina, que muito podem contribuir para modernizar
as legislações pertinentes a este tema tão causador de polêmicas e debates.

70
MORI, Maurizio. A Moralidade do Aborto. p. 21.
71
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, Parte Especial. p. 156.
72
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, Parte Especial. p. 156.
27

2.2 ESPÉCIES DE ABORT O

2.2.1 Aborto Espontâneo

Este tipo de aborto, conhecido como aborto natural, ocorre


sem que haja qualquer provocação externa, não existe nesse caso, o desejo de
abortamento e o auxílio para que este ocorra, pois é o próprio organismo quem
faz a expulsão. É possível que o embrião ou feto com mau formação deixe de ter
funções vitais antes do fim da gestação, vindo assim a ocorrer um abortamento.

São consideradas como de grande influência para o aborto


espontâneo, as condições pessoais do pai e da mãe e as condições em que o
feto é gerado.

2.2.2 Aborto Provocado

O crime de aborto, alvo principal desta pesquisa,


caracteriza-se pela interrupção da gravidez, não necessariamente pela expulsão,
mas também pela destruição, seja do ovo, feto ou embrião. Ensina Mirabete que
“o produto da concepção pode ser, reabsorvido pelo organismo da mulher ou até
mumificado(...)”73, e, mesmo que a gestante venha a falecer durante o processo
abortivo, ainda assim não deixa de ocorrer o aborto.

Nosso Código Penal Brasileiro atual trata do crime de aborto


na sua forma dolosa, nos artigos 124 à 126, qualificando-o no art. 127.

O art. 124 trata do auto aborto, ou do consentimento para


que um terceiro o faça, já no art. 125 o autor passa a ser não a gestante, mas o
terceiro que pratica o aborto na gestante sem o consentimento desta, e finalmente
o art. 126 que tipifica o aborto provocado com o consentimento da gestante.74

Se a grávida não for maior de quatorze anos, for alienada ou


débil, ou ainda se o consentimento for obtido por meio de fraude, violência ou

73
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal II. p. 93.
28

grave ameaça, o autor não responde pelo art. 126, mas sim pelo art. 125, com
penalização mais severa.75

2.2.2.1 Auto Aborto e Aborto Consentido

A palavra aborto tem seu conceito definido como “a morte


de uma criança no ventre de sua mãe produzida durante qualquer momento da
etapa que vai desde a fecundação (união do óvulo com o espermatozóide) até o
momento prévio ao nascimento”.76

Trata-se dos tipos tipificados nos arts. 124 e 126 do Código


Penal Brasileiro que diz art. 124 “ provocar aborto em si mesma ou consentir que
outrem lho provoque”,77 e art 126 “Provocar aborto com o consentimento da
gestante”78

Na ocorrência deste tipo de crime, responde a gestante pelo


art. 124, caso tenha ela mesma provocado o aborto, conforme entendimento de
Mirabete: “Responderá pelo delito do art. 124 aquele que intervier na conduta
praticada pela gestante”.79

E caso tenha consentido que um terceiro o pratique,


responde ela pelo art. 124 e o terceiro pelo art. 126 ambos da Lei Penal em vigor,
isso se for o caso do terceiro que não tenha participado com aconselhamentos,
apenas na prática do ato, mais uma vez vale-se do entendimento de Mirabete
“Agora, se de qualquer modo, concorrer no fato do terceiro provocador,
responderá como partícipe do crime do art. 126 do CP.”80, como por exemplo os
casos de clínicas ou médicos que praticam aborto de forma clandestina.

74
BRASIL. Código Penal.
75
BRASIL. Código Penal.
76
O Que é o Aborto. Disponível em http://www.acidigital.com/vida/aborto/definicao.htm, acesso
em 28/05/2007.
77
BRASIL. Código Penal.
78
BRASIL. Código Penal.
79
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal II. p. 96.
80
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal II. p. 97.
29

2.2.2.2 Aborto Provocado por Terceiro

Encontra-se tipificado no art. 125 do Código Penal Brasileiro


que diz “Provocar aborto sem o consentimento da gestante”81. Esse crime é
considerado pela lei e pela doutrina como sendo de maior gravidade, pois nesse
caso a grávida também é vitima.

Existe a presunção de não consentimento em alguns casos,


conforme ensina Mirabete: “...quando a gestante “não é maior de quatorze anos,
ou é alienada, ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude,
grave ameaça, ou violência” (art. 126, parágrafo único)”.82

Entende-se que se a gestante preenche algum dos


requisitos acima, a mesma não pode consentir de forma válida que lhe
provoquem aborto.

2.2.2.3 Aborto Qualificado

As qualificadoras que se encontram no art. 127 tratam dos


seguintes resultados “as penas cominadas nos dois artigos anteriores são
aumentadas de um terço, se, em consequência do aborto ou dos meios
empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave;
e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.”83

O art. 127 não se aplica a gestante e somente aos autores


previstos nos artigos 125 e 126, excluindo a gestante e o art. 124 conforme
ensina Mirabete:

Não responderá, também, pela qualificadora o partícipe quando


lhe for imputado o crime previsto no art. 124. Há os que sustentam
que responderão eles por lesões corporais culposas ou homicídio
culposo, mas, a nosso ver, trata-se de solução forçada,

81
BRASIL. Código Penal.
82
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal II. p. 97.
83
BRASIL. Código Penal.
30

respondendo o agente pelo aborto simples, uma vez que não


participou do ato ou execução.84

Considere-se também que caso a lesão causada seja


necessária para a prática do aborto, não ocorre qualificação, pois entende-se
como causa conseqüente normal do aborto.

2.2.2.4 Terapêutico ou Neces sário

Esta modalidade tem consentimento legal no Código Penal


Brasileiro85:

art. 128. Não se pune o aborto praticado por médico.

I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante.

É realizado quando a gestante corre risco de morte, sendo


que não há outro meio de salvá-la senão realizando o aborto.

Para o aborto terapêutico não é necessário nenhum tipo de


consentimento, nem mesmo de uma autorização judicial conforme bem explica
Torres:

Para a caracterização do "aborto necessário", é imprescindível,


em primeiro lugar, que o abortamento seja praticado por um
médico. Assim, somente o médico pode praticar o abortamento
quando essa é a única forma de salvar a vida da gestante. E o
enfermeiro? Não pode praticar o abortamento nessa hipótese?...
Se uma pessoa não-médica pratica o abortamento como única
forma de salvar a gestante, não está praticando um crime, porque
está agindo em "estado de necessidade", que é uma forma
genérica da exclusão da antijuridicidade da conduta típica.86

84
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal II. p. 98.
85
BRASIL. Código Penal.
86
TORRES, José Henrique Rodrigues. Aspectos Legais Do Abortamento. Disponível em
http://www.ipas.org.br/rhamas/aspectos.html acesso em 18/05/2007.
31

Dessa forma entende-se pela pacificação da doutrina ao


afirmar que quem realiza o aborto terapêutico é o médico, e só este tem como
saber se a única forma de salvar a gestante é por meio de aborto, mas, nesse
caso, se a enfermeira realizar o aborto, não estará praticando crime algum, pois
trata-se de estado de necessidade, incorrendo então na exclusão de
antijuridicidade conforme mostrou-se anteriormente e no mesmo sentido ensina
Jesus:

Tratando-se de aborto necessário, em que não há outro meio de


salvar a gestante, não responde por delito. Não por causa do art.
128, uma vez que esta disposição só permite a provocação por
médico. Na hipótese, a enfermeira é favorecida pelo estado de
necessidade previsto no art. 24 do estatuto penal, que exclui a
ilicitude do fato. 87

Briquet citado por Mirabete, traz entendimento interessante


com relação a proveniência do aborto terapêutico ao afirmar que “O aborto
terapêutico provém, ou da deficiência de conhecimentos médicos, ou da não
observância dos princípios da assistência pré-natal”88, diante da qual explica
Mirabete:

Num país como o Brasil, todavia, em que é elevado o nível de


pobreza, precário o atendimento médico do estado e inexistentes
as condições de saúde e higiene, especialmente em lugares
distantes, não é descabida a justificativa legal. 89

Dessa forma, entende-se que em grande parte, o aborto


terapêutico ou necessário, pode ocorrer por falta de acompanhamento médico
durante a gestação, muitas vezes ainda, devido a falta de informação, falta de
interesse da gestante e a falta de condições financeiras, já que em muitos lugares
desse grande país, não existe sequer saneamento básico, o que dizer então da
saúde pública.

87
JESUS. Damásio E. de. Direito Penal: Parte Especial. p. 128
88
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal II. p. 98.
89
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal. p 99.
32

2.2.2.5 Sentimental

Conhecido como sentimental, é o aborto que decorre de


gravidez resultante de estupro comprovado. A permissão legal para este caso,
deve-se ao fato de que a mulher já passou por considerável violência e não é
obrigada a cuidar de uma criança gerada nessas condições, encontrando-se o
ato, devidamente amparado pelo Código Penal Brasileiro90 no inciso II do art.128:

Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico:

I - ...

II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido


de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

No entanto, se o aborto for praticado pela enfermeira, esta


incorrerá em crime, pois o art. 128 é taxativo quanto ao agente. Ocorre que, o
presente artigo merece reflexão, como bem questiona Jesus; “E se a enfermeira
auxilia o médico, responde por delito de aborto? Não. Como punir alguém por um
fato impunível? Se o fato principal praticado pelo médico, é lícito, a conduta da
enfermeira não pode ser punível”. 91

Sabe-se que o aborto deve ser realizado por médico, sem


necessidade de autorização judicial, porém, com a prévia autorização da
gestante, ou ainda se esta for legalmente incapaz, a autorização de seu
representante legal, como é o entendimento de Torres:

... é preciso lembrar que também não há nenhuma necessidade


de "autorização judicial" para a prática do "abortamento
sentimental". É verdade que, muita vez, o médico não tem
suficiente segurança para acreditar na história da gestante que
afirma ter sido vítima de um "estupro" ou de qualquer outra
violência sexual. Entretanto, mesmo assim, não há necessidade
nenhuma de pedido de autorização judicial. Cabe aos hospitais

90
BRASIL. Código Penal.
91
JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. p. 128.
33

adotar normas de conduta e procedimentos para o atendimento da


gestante que afirma ter sido vítima de estupro, para que o
abortamento possa ser regularmente praticado.92

Verifica-se que, não diferente dos outros tipos de aborto, o


sentimental, também é foco de polêmicas e discussões, e por conta disso, apesar
de estar pacífico na lei, o tipo ainda encontra discordância por parte de alguns
doutrinadores.

Hungria, ao discorrer sobre o tipo em questão, diz que “nada


justifica que se obrigue a mulher estuprada a aceitar uma maternidade odiosa,
que dê vida a um ser que lhe recordará perpetuamente o horrível episódio da
violência sofrida” 93.

Porém, conforme dito anteriormente, as opiniões se


divergem, é no sentido contrário que se manifesta Diniz:

Será que o abortamento faria com que a lembrança de uma


violência sexual praticada desaparecesse, eliminando o trauma
psicológico sofrido pela vítima? Quem poderia garantir que a
opção pelo aborto não viria a acrescentar um novo trauma,
somado ao da violência sexual? O aborto não seria um erro para
corrigir outro? Será que um erro justificaria o outro? Não se
deveria fomentar a prática de serviços psicológicos ou
psiquiátricos, que pudessem ajudar a gestante a superar o trauma
provocado pelo estupro? A brutalidade sofrida somente poderia
ser reparada mediante uma adequada assistência médica,
psiquiátrica e psicológica, pois é preciso lembrar que o trauma
viverá com a violência pelo resto da vida. 94

De acordo com o pensamento de Diniz, conclui-se que como


se não bastasse a mulher, ou como em tantas outras vezes menina, passar por

92
TORRES, José Henrique Rodrigues. Aspectos Legais Do Abortamento. Disponível em
http://www.ipas.org.br/rhamas/aspectos.html acesso em 18/05/2007.
93
HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal. 4 ed. 5 vol. Rio de Janeiro. Editora
Forense. 1958. p. 312.
94
DINIZ Maria Helena. O Estado Atual do Biodireito. 2 ed. São Paulo. Editora Saraiva. 2002. p.
34/35
34

momentos de tortura física e psíquica, teria ainda que conviver com a lembrança
viva de seus momentos de horror, talvez por toda a sua existência.

O mais absurdo ainda, é oportunizar que no futuro, depois


de pagar a sua dívida com a sociedade, e até quem sabe arrepender-se do mal
causado, o estuprador, ou seja, o pai da criança, recorra a justiça para que esta
lhe conceda o direito de visita ao seu filho.

2.2.2.6 Eugênico ou Eugenés ico

Considera-se eugênico ou eugenésico o aborto realizado


para interromper a gravidez, cujo feto seja defeituoso de tal forma que não possa
sobreviver fora do ventre materno, tipo este que ainda não encontrou
conformidade na doutrina e muito menos na jurisprudência.

Porém, muito controversos são os trabalhos no que diz


respeito a eugenia, descoberta no século XIX pelo inglês Francis Galton, o qual a
conceituou como “O estudo dos agentes sob o controle social que podem
melhorar ou empobrecer as qualidades raciais das futuras gerações seja física ou
mentalmente.”95

É de conhecimento público e notório o massacre ocorrido na


segunda guerra mundial entre 1933 e 1945. Época na qual, por liderança do
chefe nazista Adolf Hitller, centenas de milhares de pessoas foram brutalmente
assassinadas, com o intuito de formar uma raça superior e perfeita, e é a esse
respeito, a explicação de Belo em sua respeitável obra que traz como título o
assunto em questão:

O nacional-socialismo de Hitller tinha como base o falso terreno


de objetivos eugenésicos, por autorizar a esterilização obrigatória
dos enfermos psíquicos e mentais, por pretender abortar filhos de
pessoas de “raças inferiores”, por proclamar, como fatal e
decisiva, a influencia hereditária na gênese das moléstias da
inteligência e do sentimento, por querer a perfeição genética...
Ora, conjeturar que o aborto eugênico, nos termos e limites

95
GOLDIM, José Roberto. Eugenia. Disponível em http://www.ufrgs.br/bioetica/eugenia.htm,
acesso em 17/05/2007.
35

apresentados, sejas de estirpe nazista é rejeitar a realidade que


entra pelos olhos. 96

No entanto, se para alguns o aborto eugênico é


inconcebível, a ciência procura a passos largos mostrar o quanto o estudo sobre o
assunto pode ser benéfico para toda a raça humana, prova é a possibilidade de
saber se o produto da gravidez tem alguma má-formação que lhe torne impossível
a sobrevida assim como o caso da anencefalia, tão discutido atualmente, ou ainda
em outras situações como a Síndrome de Down.

Belo97 defende que, “debelar a ermo a vida de um feto,


pretender o melhoramento genético de uma raça é uma coisa. Possibilitar à
mulher gestante a paralisação de uma gravidez onde já se sabe que o feto possui
doenças incompatíveis com a sobrevivência extra-uterina é outra coisa bem
diferente”.

Na seqüência, para completar sua linha de raciocínio Belo


traz na mesma obra, o pensamento do então vice-presidente da Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência Francisco Salzano, no qual este relata
existirem “situações de vida que não podem ser consideradas exatamente
apropriadas para a vida do ser humano” e completa o mesmo “seria um método
para resolver problemas e aliviar sofrimentos do ser humano”.98

Enfim, entende-se que, com a ajuda da sociedade e


consequentemente dos representantes desta sociedade, poderá tornar-se
possível a decisão materna de concluir ou não uma gestação com feto deformado
ou fatalmente doente, o que pode vir a diminuir a dor dessa mãe, que com a atual
legislação, ainda tem que sentir evoluir em seu útero um filho que sabe, não
poderá ver crescer.

96
BELO, Warley Rodrigues. Aborto, Considerações Jurídicas e Aspectos Correlatos. p. 81.
97
BELO, Aborto, Considerações Jurídicas e Aspectos Correlatos. p. 81
98
BELO, Aborto, Considerações Jurídicas e Aspectos Correlatos. p.85
36

2.3 As Críticas ao art. 128 do Código Penal

O art. 128 do Código Penal Brasileiro leva a confusão de seu


entendimento quando diz “não se pune”, por deixar uma situação dúbia a respeito
do que trata o artigo, se de exclusão de ilicitude ou de ausência de culpabilidade.

Referindo-se a esse tema Belo preceitua que:

Diante disso, se se tratar de escusa absolutória, o aborto


necessário e o aborto sentimental são crimes. Por derradeiro, não
haveria aborto legal no Brasil, apenas aborto não punível. Se,
entretanto, se tratar de exclusão de ilicitude, os abortos referidos
são legais, pois não seriam considerados crimes.99

As críticas ao referido artigo são de ordem de redação, os


doutrinadores, como se pode ver, acreditam e defendem que a redação deveria
ter sido diferente, pois conforme deixa muito claro Jesus, o que é licito não pode
ao mesmo tempo ser ilícito, a ponto de precisar ser entendido como exclusão de
antijuricidade.

Os dois incisos do art. 128 contêm causas de exclusão da


antijuricidade. Note-se que o CP diz que “não se pune o aborto”.
Fato impunível em matéria penal é fato lícito. Assim, na hipótese
de incidência de um dos casos do art. 128, não há crime por
exclusão da ilicitude. Haveria causa pessoal de exclusão de pena
somente se o CP dissesse “não se pune o médico”.100

O artigo em questão, é gerador de muitas críticas pela


doutrina, pois recebe críticas não só de Jesus, mas também de outros, como
Noronha:

Segundo cremos não é das mais felizes a redação do art. 128. Se


o fundamento do inciso I é o estado de necessidade, e o do inciso
II ainda o mesmo estado, conforme alguns, ou a prática de um
fato lícito, não nos parece que na técnica do Código se devia dizer

99
BELO, Aborto. Considerações Jurídicas e Aspectos Correlatos. p. 86.
100
JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. 26 ed. 2 vol. São Paulo. Editora Saraiva. 2004. p. 128.
37

‘não se pune...’Dita frase pode levar a conclusão de que se trata


de dirimente ou de escusa absolutória, o que seria insustentável.
Em tal hipótese, a enfermeira que auxilia o médico, no aborto,
seria punida. Nos incisos do art. 128, o que desaparece é a
ilicitude ou a antijuricidade do fato, e, conseqüentemente, devia
dizer-se: ‘Não há crime’. 101

Mirabete, participa da mesma linha de pensamento quando


afirma que “são causas excludentes da criminalidade, embora a redação do
dispositivo pareça indicar causas de ausência de culpabilidade ou punibilidade”,
dessa forma a doutrina procura tornar mais fácil o entendimento do art. 128 do
CPP, para a clareza de sua aplicação. 102

Com a intenção de melhor instruir o presente trabalho,


acredita-se que é importante destacar os métodos contraceptivos, como forma de
demonstração de que em muitos casos, a gravidez é gerada contra a vontade da
genitora, uma vez que, diante da violência e da má informação, a mesma não tem
como precaver-se.

2.4 Métodos Anticoncepc ionais

Diante de tudo o que foi pesquisado acerca do aborto e


todas as suas modalidades, faz-se necessária a explanação de alguns métodos
anticoncepcionais existentes no Brasil.

Após incansável pesquisa, foi pesquisado o site do Dr.


Sérgio dos Passos Ramos, onde se pôde ver o maior número de informações
sobre os métodos contraceptivos com atualizações até 04/01/2007, portanto, a
explanação dos métodos anticoncepcionais que segue pode ser inteiramente
encontrada nesse endereço.103

101
NORONHA, E. Magalhães. Direito Penal. Vol. 2. São Paulo. Saraiva. 1994. p. 69
102
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal. p 98.
103
RAMOS, Sérdio dos Passos. Atenção Integral a Saúde da Mulher. Disponível em
http://www.gineco.com.br/index.htm HYPERLINK acesso em 21/02/2007.
38

2.4.1 Pílula Anticoncepcion al

Considerada como um dos métodos mais eficazes no


controle da natalidade, a pílula é hoje um do meios mais utilizados pelas mulheres
que não desejam ter filhos.

2.4.2 Injeção Anticoncepcio nal

Podendo somente ser receitada por médico, esse tipo de


contraceptivo consiste em injeções que são aplicadas na região glútea,
normalmente usadas por mulheres que não podem tomar pílula ou esquecem
com freqüência.

2.4.3 Dispositivo Intra Uteri no

O dispositivo intra uterino, é uma peça que é colocada


dentro do útero e tem a mesma eficiência da pílula anticoncepcional, muito usado
por mulheres que já têm filhos e não querem engravidar novamente por pelo
menos dois anos, considerando que atualmente já existem dispositivos com
duração de até dez anos.

2.4.4 Vasectomia

A vasectomia é uma pequena intervenção cirúrgica que


corta o canal de ligação que leva os espermatozóides até as glândulas produtoras
do esperma. A ejaculação continua normalmente, porém sem os
espermatozóides, impedindo assim a concepção. É uma cirurgia sem reversão,
ou seja, o homem nunca mais poderá ter filhos, motivo pelo qual deve ter certeza
da sua decisão.

2.4.5 Endoceptivo

Esse método tem algumas características do DIU, é também


colocado dentro do útero por isso tem esse nome, tem duração aproximada de
cinco anos e funciona como inibidor da ovulação.
39

2.4.6 Implante Anticoncepc ional

O implante é novidade no Brasil, e através das pesquisas


realizadas, já teve um alta porcentagem quanto a sua segurança. Consiste em
uma cápsula que é colocada embaixo da pele contendo um hormônio
anticoncepcional. A duração do implante é de aproximadamente três anos
funcionando como inibidor da ovulação.

2.4.7 Anel Vaginal

É também um novo método que chegou no Brasil, o anel


vaginal é colocado na vagina no quinto dia útil da menstruação e ali permanece
por três semanas.

Contendo os mesmos hormônios da maioria das pílulas


anticoncepcionais, o anel vaginal tem a vantagem de que a mulher não precisa
tomar pílula todos os dias, não correndo o risco de esquecer, é absorvido pelo
organismo o que evita alguns efeitos colaterais da pílula.

2.4.8 Adesivo Anticoncepci onal

O adesivo é colocado sobre a pele no primeiro dia da


menstruação, assim ficando por uma semana, contém os mesmos hormônios que
a maioria das pílulas anticoncepcionais e tem as mesmas vantagens do anel
vaginal.

2.4.9 Pílula Do Dia Seguinte

Surgiu no Brasil em 30 de julho de 1999 no VI Congresso de


Ginecologia e Obstetrícia, ficou conhecida como contraceptivo de emergência.
Deve ser ingerida até 72 horas após a relação sem proteção ou acidental com o
intuito de evitar a gravidez.
40

“Usada até 24 horas da relação tem um índice de falha de 5


%. Entre 25 e 48 horas o índice de falha aumenta para 15 % e entre 49 e 72
horas o índice chega a 42 % de falhas.”104

Não deve ser tomada por costume, apenas em caso de


emergência, não é método garantido, e assim como quase todos os
contraceptivos deve ser usada somente com receita médica.

2.4.10 Camisinha

É a maneira mais segura de manter relações sexuais


prevenindo a gravidez e protegendo contra doenças sexualmente transmissíveis.
Deve-se ter cuidado no manuseio para não furar, sendo interessante ter sempre
ao alcance. É o método mais seguro, se usado de forma correta.

2.4.11 Diafragma

“Diafragma é um pequeno anel de metal recoberto por uma


película de borracha ou silicone que é colocado pela mulher dentro da vagina
antes da relação e retirado 12 horas após”.105

Tem a função de impedir a entrada dos espermatozóides no


útero, é discreto, porque só a mulher sabe se esta ou não usando, além de ter
grande durabilidade.

2.4.12 Camisinha Feminina

A camisinha feminina tem a mesma função e as mesmas


vantagens da masculina, e os cuidados a tomar também são os mesmos, a única
diferença entre ambas é a forma de uso, pois a masculina é usada de forma
externa, ou seja, fica por fora do pênis, e a feminina é colocada no interior da
vagina.

104
RAMOS, Sérdio dos Passos. Atenção Integral a Saúde da Mulher. Disponível em
http://www.gineco.com.br/index.htm acesso em 21/02/2007.
105
RAMOS, Sérdio dos Passos. Atenção Integral a Saúde da Mulher. Disponível em
http://www.gineco.com.br/index.htm acesso em 21/02/2007.
41

2.4.13 Espermaticida

Os espermaticidas são produtos que se coloca dentro da


vagina antes da relação para matar os espermatozóides, não tem a mesma
segurança da camisinha e seu acesso além de difícil não é muito divulgado no
Brasil.

2.4.14 Método Do Muco

É o método pelo qual a mulher observa a consistência do


muco vaginal, que fica mais espesso durante o período fértil. Porém não é de
grande eficácia, as mulheres que não querem engravidar não devem fazer uso
desse método.

2.4.15 Tabelinha

Muito mais usado para as mulheres que desejam engravidar,


pois consiste em conhecer o ciclo menstrual através da contagem dos dias a
partir do primeiro dia da menstruação para se saber em quais deles é mais
provável que se esteja fértil, já que a mulher normalmente tem seu período de
fertilidade no meio do ciclo menstrual que é o espaço temporal entre uma
menstruação e outra.

Não é de grande eficácia, pois algumas mulheres,


principalmente adolescentes, passam por variações em seu ciclo menstrual o que
torna ainda mais difícil saber quais dias são férteis e quais não são.

2.4.16 Coito Interrompido

A Bíblia, livro sagrado do cristianismo, faz menção ao coito


interrompido no livro de Gênesis, capítulo 38, versículo 1-9, conta a história de
Onã, filho de Judá, que recebe a ordem de seu pai para tomar como sua a Tamar,
mulher de seu irmão, morto por ser mau aos olhos do Senhor, para que seu irmão
não fique sem sementes na terra.
42

Porém, Onã sabe que o primeiro filho do ventre de sua


cunhada não poderá ser considerado seu, então ao possuir Tamar, Onã
desperdiçou sua semente na terra, e o senhor o matou por ser este um mau aos
seus olhos.

O costume da época era que se um homem morre, a viúva é


possuída pelo cunhado e o primeiro filho dessa união será como filho do morto,
isso ocorria para que nenhum homem ficasse sem sementes na terra e sua
linhagem tivesse continuação.

O coito interrompido ocorre quando o homem, segundos


antes da ejaculação, retira o pênis e ejacula fora da vagina, não é método seguro,
pois o pênis tem secreções que podem conter espermatozóides.

Com exceção da camisinha todos os métodos


anticoncepcionais devem ter um acompanhamento médico, para que seja feito de
forma correta, pois somente o médico saberá em que casos irá receitar os
devidos métodos contraceptivos, para que dessa forma a paciente possa usufruir
de uma vida sexual tranqüila. 106

Finalizando este segundo capítulo, tratar-se-á na sequência


deste trabalho sobre o tema principal, ou seja, o terceiro capítulo do presente
trabalho fará menção ao que ensinam as religiões e sobre alguns aspectos
polêmicos acerca do aborto.

CAPÍTULO 3

106
ALMEIDA. João Ferreira. Bíblia Sagrada. p. 40.
43

A POSIÇÃO DE ALGUMAS RELIGIÕES E QUESTÕES POLÊMICAS


ACERCA DO ABORTO

3.1 ABORTO E RELIGIOS IDADE

Devido a matéria da pesquisa ser alvo de atuais


controvérsias, fez-se necessário a utilização de artigos e entrevistas veiculados
na mídia, para a conclusão da monografia. Destaca-se que neste capítulo,
finaliza-se a proposta da pesquisa, que é apontar os aspectos destacados e
polêmicos do aborto, tanto no âmbito religioso quanto no social, financeiro e
criminal.

O estudo é necessário, frente a possibilidade de mudanças


sobre o tema, inclusive é matéria atual de projeto legislativo. Sabe-se que em
outros países o aborto já foi amplamente discutido, resultando, em alguns destes,
na legalização.

O direito é uma ciência viva, em permanente transformação,


abordando-se nesse capítulo alguns enfoques que no presente momento, em
nosso País, não permitem termos a descriminalização do aborto.

O objetivo não é apenas demonstrar que o foco da


discussão pode ter origem na visão arcaica de alguns juristas, visão esta
atormentada pelos dogmas e crenças religiosas impostas na sociedade, tratando-
se apenas de imposição cultural, mas sim, discutir o direito que a mulher tem
sobre o seu próprio corpo, cabendo unicamente a ela o direito de decisão, a qual
deverá ser respeitada pela sociedade.

Apesar de não ser a religião, o assunto central deste


trabalho, é necessário assinalar o que algumas delas ensinam em sua doutrina a
respeito do tema. Apesar de não ser possível trazer todas as religiões existentes,
procurou-se buscar ao menos as mais difundidas e conhecidas no Brasil, para
que assim se possa entender, ou ao menos tomar conhecimento dos aspectos
religiosos sobre a prática abortiva.
44

3.1.1 O CATOLICISMO E O DOGMA DE DEUS COMO AUTOR DA VIDA

A doutrina da igreja católica vem mudando de forma


considerável, por volta do século IV São Basílio trouxe a teoria que a igreja adota
na atualidade, de que o feto adquire alma no momento da fecundação, o que ficou
conhecido como teoria da animação imediata.

Mais tarde, durante o século VI, no Código de Justiniano


esse entendimento mudou, adotou-se a teoria de que o feto somente adquiria
alma, a partir do momento em que tomasse forma humana, sendo assim, o aborto
realizado antes disso não era considerado ato criminoso.

Em meados do século XVI, no Concílio de Trento, os


católicos passaram a ter como entendimento doutrinário a teoria do movimento,
ou seja, o feto passava a ter alma quando apresentava seus primeiros
movimentos ainda no interior do útero.

Mais tarde Pio IX restabeleceu a teoria da animação


imediata. Atualmente o aborto é condenável em qualquer situação, pois ensinam
que o feto tem o mesmo direito a vida que a mãe, e que, nem mesmo para salvar
a vida da gestante é tolerável que se aborte107.

A igreja católica parte do princípio que ao ocorrer a


fecundação o novo ser já tem uma alma, e como Deus é o autor da vida, somente
Ele tem poder para ceifá-la, ninguém mais. O catolicismo não aceita sequer
método anticoncepcional, a não ser a abstinência sexual, pois qualquer outro
meio contraceptivo era visto como crime contra a natureza.

Existiram no decorrer da história, situações nas quais o


catolicismo permitiu o aborto, como é o caso da gravidez em que o feto é
fecundado nas trompas, pois nesse caso além de o feto não ter como sobreviver,
também a mãe não sobreviveria, porém, adverte Prado que:

107
LORICCHIO, João Demétrio. Aborto: A Lei, A Ética e As Religiões. 25/05/2001. Disponível
em <http://www.feal.com.br/colunistas.php?art_id=2&col_id=9> acesso em 10/05/2007.
45

Em 1902 a Igreja católica rejeitou de forma explícita qualquer


tentativa de salvar a mulher nesse caso, apesar de o feto nessas
condições não sobreviver. Somente em 1947 esta política foi
deixada de lado, mas ficou estipulado que o médico não poderia
simplesmente remover o embrião, e sim teria de retirar toda a
trompa, dificultando futura gravidez. Isso porque a Igreja não
permite a intromissão direta no óvulo fecundado.108

Explica o autor que ainda hoje a igreja mantém sua posição


em relação a esse assunto, apesar de que há algumas semanas o Papa Bento
XVI mostrou-se mais tolerante com relação a camisinha, sem posição favorável
tomada de forma definitiva, mas, abrindo caminho para reflexões.

3.1.2 A Posição das Igrejas Protestantes

A doutrina dos protestantes é mais flexível, e entende o


aborto de forma mais amena, pois dá maior importância à vida materna,
considerando a mãe, ser humano muito importante , pois é esta que quem passa
por todos os sabores e dissabores da gravidez desde a fecundação ao
nascimento, e após, com seus cuidados e zelos para com aquele que concebeu
em seu ventre dessa forma entendem que:

Assim, se uma escolha tiver de ser feita entre a vida da mãe e a


do embrião ou do feto, recairá sempre sobre ela a escolha
prioritária, cabendo portanto ao médico decidir, em última análise,
quando ele poderá desligar a mãe de sua responsabilidade em
relação ao feto. 109

As igrejas protestantes têm mais de um seguimento, dessa


forma seus entendimentos também são variados, sendo que algumas aceitam o
aborto eugênico, como as Unitárias que entendem não ser reprovável o aborto

108
PRADO, Danda. O Que É Aborto. São Paulo. Ed. Brasiliense. 1985. p.62
109
PRADO, Danda. O Que É Aborto. p.64.
46

praticado por justo motivo, como quando ocorre estado de perigo para a gestante
e gravidez resultante de estupro ou incesto110.

Essa religião também se difere da católica ao não tomar


posição certeira quanto ao momento em que o embrião se torna humano e
quando se inicia a vida humana. Porém, todos os seguimentos têm pacificidade
no sentido de que jamais o aborto deve ser praticado como forma de
planejamento familiar.

3.1.3 ISLAMISMO E CONDE SCENDÊNCIA COM O ABORTO

Conforme ensina Prado111 em sua pesquisa, com base nos


escritos do Grão Muft da Jordânia, os islâmicos de forma geral não favorecem o
ato de abortar, mas, são também, um pouco mais condescendentes no tema,
pois conforme sua doutrina, pregam que o feto ou embrião não é considerado ser
humano desde a concepção, mas sim alguns meses depois desta ter ocorrido,
Prado traz em sua obra, escritos do Grão Muft da Jordânia:

Antigos juristas, há 1500 anos, afirmaram que é possível tomar


medicamentos abortivos durante a fase da gravidez anterior à
conformação do embrião em forma humana. Esse período gira em
torno do 120 primeiros dias, durante os quais o embrião ou feto
ainda não é um ser humano.112

Portanto, Prado explica que para os seguidores da religião


islã só depois de o feto ou embrião estar formado por ossos e carne é que se
daria o crime de aborto, punindo-se como assassinato.

Nós o colocamos Como uma gota de semente Em local seguro


Preso com firmeza: Depois fundimos A gota em coalhos
Moldamos Um (feto) bolo; então Nesse bolo talhamos Ossos, e

110
LORICCHIO, João Demétrio. Aborto: A Lei, A Ética e As Religiões. 25/05/2001. Disponível
em <http://www.feal.com.br/colunistas.php?art_id=2&col_id=9> acesso em 10/05/2007.
111
PRADO, Danda. O Que É Aborto. p.65.
112
LORICCHIO, João Demétrio. Aborto: A Lei, A Ética e As Religiões. 25/05/2001. Disponível
em <http://www.feal.com.br/colunistas.php?art_id=2&col_id=9> acesso em 10/05/2007.
47

vestimos os ossos Com carne; Então o produzimos Como outra


criatura Assim, bendito é Deus O melhor Criador.113

O texto acima foi extraído do Corão, livro sagrado dos


muçulmanos, por Prado, para que se explique o entendimento islâmico acerca de
quando o embrião se torna ser humano.

Loricchio relata que para o islamismo, o feto passa por


diferentes estágios, até tomar forma humana, momento este em que recebe sua
alma, o que ocorre por volta do quarto mês de gravidez, e que:

Se houver um aborto antes do quarto mês, os envolvidos deverão


pagar uma indenização equivalente ao preço de cinco camelos; se
o aborto ocorrer após o quarto mês, quando o feto já foi animado,
a indenização poderá chegar até 100 camelos e é considerado
assassinato. 114

Portanto o que se entende, é que até que haja alma, o


aborto é condenado por pagamento de indenização, após o recebimento da alma
pelo feto, além da indenização, ainda ocorre o crime de assassinato.

3.1.4 Judaísmo: Aborto Não Pode Ser Crime

A lei judaica, conhecida como Halacha estabelece no


Talmude (lei judaica) que o feto faz parte do corpo da mãe, e o que prevalece é a
saúde da mulher, dentro do seu equilíbrio psíquico e físico, e assegura-se ainda
que com relação a encarnação, se o feto não chegar a nascer ,seu espírito
retorna para Deus. Dessa forma Prado traz uma citação do rabino David Feldman
dizendo que:

Ele (aborto) interrompe indubitavelmente uma vida possível, mas


o que os rabinos acentuam é que uma mulher que decide, após a
concepção, interromper a gravidez, não estaria muito distante
daquela que deixa de ter relações com seu marido para não

113
PRADO, Danda. O Que É Aborto. p.67.
114
LORICCHIO, João Demétrio. Aborto: A Lei, A Ética e As Religiões. 25/05/2001. Disponível
em <http://www.feal.com.br/colunistas.php?art_id=2&col_id=9> acesso em 10/05/2007.
48

conceber. Se no segundo caso não há homicídio também não há


no primeiro. 115

Para o judaísmo, deve-se levar em conta os aspectos


positivos ou negativos que esse feto trará como conseqüência para sua mãe, e os
motivos que a levaram a optar pela interrupção da gravidez. Os motivos podem
ser os mais variados, como de ordem econômica, devido as exigências que a
sociedade judaica impõe para seus membros.

Em termos gerais, tal como escreveu o saudoso rabino Abraão


Assor neste texto que transcrevemos, a Halacha (Lei Judaica) não
só permite o aborto, como em algumas circunstância exige a
interrupção da gravidez. Acima de tudo, norteada pelo princípio da
responsabilização individual – um princípio central do judaísmo –,
a tradição judaica coloca a decisão na esfera familiar e, por vezes,
comunitária.116

Dessa forma o que se entende é que ocorre a análise dos


motivos para que se realize ou não o aborto, o que deve ser ponderado e decidido
pela família, quando o caso é mais sério, leva-se até a comunidade judaica do
local, consultando-se o rabino.

3.1.5 Espiritismo e Gravide z como Mandato de Ordem Divina

Religião que vem crescendo muito no Brasil, podendo ser


também encontrada sob outras denominações, tem como ponto principal a crença
na reencarnação do espírito, que se desliga da carne através da morte e
reencarna em outro corpo.

Os espíritas vêem o aborto como crime, porém, as razões


dessa crença difere de outras religiões, pois ensinam que o espírito vem ao corpo
por mandado de Deus, sendo o aborto, uma forma de recusar esse mandado,

115
PRADO, Danda. O Que É Aborto. p.67.
116
JOSUÉ, Nuno Guerreiro. Aborto: Uma Perspectiva Judaica. 30/08/2004. Disponível em
http://ruadajudiaria.com/?p=58. Acesso em 11/05/2007.
49

entendem os espíritas que o espírito que virá reencarnado no feto tem um


compromisso com os futuros pais.

O aborto é um crime nefando, porque praticado contra um


inocente indefeso; o produto da concepção está vivo, e tem o
direito Divino de continuar vivendo e de nascer. Transgride-se
assim o 5o Mandamento: "Não Matarás". Errar é humano; assumir
o erro, é divino. O Espiritismo não aceita a legalização do aborto,
nem com ela compactua, porque legalizá-lo é legalizar o crime e a
irresponsabilidade. O "aborto seguro" com que acenam, dizendo-
se defensores da vida da mulher, mesmo se verdadeira, não
passa de uma proposta para o crime, em que saem em
desvantagem as vítimas, os inocentes e indefesos conceptos e
aparentemente premiada a irresponsabilidade, excetuando-se
desta os casos de estupro, no qual também não justificamos o
delito, pois mesmo aí existe um compromisso cármico a ser
cumprido.117

No entanto, a prioridade a vida em situações de risco,


sempre recaem em favor da mulher. Portanto, se a mulher grávida corre perigo de
morte, é mister que se escolha pela prática do aborto para que se salve a mãe.
De acordo com Prado,118 os espíritas acreditam que o espírito existe desde
sempre e que com o aborto fica frustrado, podendo se tornar perigoso se as
razões que levaram ao abortamento não são de boa fé.

3.1.6 Candomblé e Não Pro ibição

Essa religião não tem doutrinas escritas que faça referência


ao aborto, porém o que se pode relatar sobre suas crenças, é que não fazem
restrições com relação ao sexo, sendo que, os sacerdotes e as sacerdotisas não
proíbem o aborto, mas também não apóiam, a não ser que a concepção tenha
ocorrido em período de recolhimento religioso, pois conforme ensina Prado “neste

117
MOREIRA, A. Fernando. Aborto – Crime e Conseqüências. Revista Reformador. Julho de
2001. Disponível em http://www.guia.heu.nom.br/aborto_crime_e_consequencia.htm. Acesso em
11/05/2007.
118
PRADO, Danda. O Que É Aborto. p.68.
50

caso poderia ter-se dado por injunções alheias à vontade daquela mulher que
devem, ser por ela acatadas” .119

Embora não se faça referência ao aborto, o que defendem é


o esforço pela manutenção da vida. Apesar de não encontrarmos escritos sobre o
aborto, existe uma crença do Candomblé, na qual consta que quando uma mulher
traz ao mundo mais de uma vez criança morta, não se trata de várias crianças,
mas sim várias aparições do mesmo ser, que para os religiosos do Candomblé
são aparições do mal.120

Enfim, é de forma clara e evidente que se percebe a grande


influência da religião na questão do abortamento, com maior ênfase para a do
catolicismo, pois conforme relatado anteriormente, em tempos passados a igreja
tinha relevante influência sobre o regime feudal fazendo com que este impusesse
as leis da igreja sobre a plebe.

3.2 ALGUNS ASPECTOS POLÊMICOS ACERCA DA PRÁTICA ABORTIVA

3.2.1 Aspectos Polêmicos R eligiosos

A Lei deve ser criada com o intuito de proporcionar


garantias, tais como a da liberdade de escolhas, e não é cabível que alguns
juristas privilegiem certos grupos religiosos por uma questão de moralidade, uma
vez que na nossa Constituição é garantida a inviabilidade da liberdade de
consciência e assim, cada pessoa é livre para escolher sua convicção religiosa.

Como bem preceitua Gischkow:

Ainda que tenha o Estado o dever de regular as relações das


pessoas, não pode deixar de respeitar o direito à liberdade e
garantir o direito à vida, não só vida como mero substantivo, mas

119
PRADO, Danda. O Que É Aborto. p.69.
120
PERNA, Fernando Oli. Candomblé Uma Religião Sem Mistérios A Serviço Do Povo.
Disponível em http://translenza.com.br/orixa/imprimir.php?id=16. Acesso em 11/05/2007.
51

vida de forma adjetivada: vida digna, vida feliz. A norma escrita


não tem o Dom de aprisionar e conter os desejos, as angústias, as
emoções as realidades e as inquietações do ser humano.121

Para comprovar que o entrave para a legalização do aborto


é apenas uma questão religiosa, destaca-se as palavras de Roberto Arriada
Lorea, Diretor do Departamento de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos
do Rio Grande do Sul:

O debate sobre aborto está muito mal colocado no Brasil. Não


cabe a ninguém ser a favor ou contra o aborto. O razoável é dizer
que cabe à mulher decidir. No cenário internacional, não há mais
espaço para dúvida. O aborto vai ser descriminalizado no Brasil. É
uma questão de tempo. Por influência da Igreja Católica, o Brasil
aprovou o divórcio com quase 100 anos de atraso em relação à
França.122

Diante dos argumentos apresentados acima, entende-se


mais uma vez, que não cabe à lei constituir como crime, atos por convicções
religiosas, nem mesmo dizer o que cada pessoa deve fazer com seu corpo. Cabe
sim, a Lei, propiciar as pessoas o direito de escolha.

A muito tempo a igreja condena o ato do aborto, sejam quais


forem as circunstâncias, conforme melhor explicado anteriormente, enquanto isto
se encontra na doutrina da igreja, não se vê problemas, mas é inviável a lei,
basear-se em princípios religiosos para privar a mulher de um direito individual, ou
seja, ter esta direito sobre seu próprio corpo.

Talvez, as palavras de Lorea, destoem de forma cruel no


âmbito religioso, sensatamente ele destaca o atraso intelectual de nosso país,
onde o grande problema da não legalização do aborto é na esfera da Saúde
Pública. Os procedimentos realizados em função dos abortos clandestinos,
elevam e muito os custos do Sistema Único de Saúde, além de que, ao realizar o

121
PEREIRA, Sérgio Gischkow. Estudos de Direito de Família. Porto Alegre. Editora Livraria do
Advogado. 2004. p.13
122
LOREA, Roberto Arriada. Aborto Sim Ou Não? entrevista concedida a Cristiane Segatto.
Revista Época, 16/04/07, p.84.
52

aborto clandestino, a mulher fica a mercê de profissionais não habilitados,


correndo risco de vida

O México, país da América Latina, e também segundo mais


católico do mundo, aprovou no dia 24/04/2007 a lei que regulariza o aborto
legalizando sua prática por escolha da gestante até a 12° semana da gestação,
medida que levou a arquidiocese da capital a “ameaçar excomungar os
legisladores da capital que votassem a favor da legalização do aborto”, porém a
lei só vale para a capital mexicana Cidade do México.123

A promulgação da lei se deu, dentre outros motivos, em


razão da grande mortalidade materna decorrente dos abortos realizados de forma
clandestina, o que também vem ocorrendo no país é a negação do direito ao
aborto em caso de estupro, que já era legalizado anteriormente.

A problemática da descriminalização do aborto já vem de


muito tempo, em entrevista concedida ao jornal O Estado de São Paulo no ano
de 1994, a socióloga e ex-freira Maria José Rosado relatou com relação ao aborto
ser um atentado contra a vida que:

É curiosa essa defesa absoluta da vida, porque ela só é absoluta


para a igreja no caso do aborto. Veja: no Brasil há casos de
padres que trabalham com a questão da terra e que são
freqüentemente ameaçados de morte. Mas ninguém diz a eles
para abandonarem o trabalho, por estarem correndo risco de vida.
A igreja proclama santos homens e mulheres que preferem morrer
a renegar a fé.124

E ainda quando questionada pelo jornal sobre achar ou não


ser a interrupção da gravidez um pecado, a socióloga e ex-freira ressaltou que:

123
Cidade do México Aprova Legalização do Aborto. Disponível em:
www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/story/2007/04/070424_mexicoabortoaprova_ac.shtml Acesso
em 25/04/2007
124
ROSADO, Maria José. Ex-religiosa Defende Direito ao Aborto. entrevista concedida a
Roldão Arruda. O Estado de S. Paulo. Caderno A, 29/08/94, p.13.
53

No passado, houve uma intensa discussão sobre isso, no século


XIX que se decidiu condenar todo tipo de aborto como um crime
ou atentado contra a vida. Antes disso, ele era definido como um
pecado por denunciar a infidelidade conjugal, ou o liberalismo
sexual.125

A resposta da socióloga demonstra que nem sempre o


aborto foi considerado pela igreja como crime contra a vida, mas apenas como
pecado contra a fidelidade ao matrimônio.

Considera-se então, que a Constituição da República


Federativa do Brasil, na qualidade de Lei Maior e ordenamento de maior
importância jurídica resguarda entre os direitos individuais a liberdade de direitos
indiferentemente de crença religiosa, levando em conta a sua laicidade, sendo
Estado laico aquele que não adota religião alguma como oficial, e serve como
regra e ordenamento para todas as pessoas, seja qual for sua crença ou religião.

3.2.2 Aspectos Polêmicos S ociais e Econômicos

A descriminalização do aborto é tão iminente em nosso


ordenamento jurídico, que vem sendo matéria de discussão já a algum tempo,
estando agora as vias de ocorrer plebiscito, para a sua regularização. Pena que
essa atitude, só virá atrasar os direitos de escolha da mulher, uma vez que,
vivemos numa sociedade atrelada a culpa, obrigando assim a mulher a tomar
decisões que não envolvam apenas seus interesses, mais sim de toda uma
sociedade.

Muitos são os problemas oriundos da proibição da prática do


aborto, entre eles, encontra-se a dificuldade que algumas mulheres, que sofreram
estupro, encontram para conseguir fazer um aborto em hospital público de forma
segura, como aconteceu com uma adolescente estuprada pelo próprio irmão que
buscou ajuda médica:

125
ROSADO, Maria José. Ex-religiosa Defende Direito ao Aborto. entrevista concedida a
Roldão Arruda. Jornal O Estado de S. Paulo. Caderno A, 29/08/94, p.13.
54

Estuprada e grávida do próprio irmão, a estudante C.,18, de


Guaraci (SP), perambulou por cinco diferentes hospitais de três
cidades do interior paulista para interromper a gravidez. Mesmo
com o boletim de ocorrência em mãos comprovando o estupro, os
ginecologistas se recusaram a fazer o aborto na jovem alegando a
necessidade de um alvará judicial.Um mês depois, já de posse da
autorização no caso, desnecessária, C. encontrou novo obstáculo:
a objeção de médicos contrários ao aborto. Só no quarto mês de
gestação é que ela conseguiu fazer o procedimento em São
Paulo, a 476 km da casa.126

Brilhantemente, ressalta Ana Maria Costa: “A legalização do


aborto dignifica as mulheres. Tira do limbo um procedimento que é muito mais
comum do que imaginamos.”127

O que se vê todos os dias são ações e opiniões que se


contradizem, a maneira como se colocam as questões para as pessoas com
baixo grau de instrução as deixa em dúvida, pergunta-se a alguém se é contra ou
a favor do aborto, sendo que a pergunta correta seria se é a favor ou contra a
mulher ter o direito a continuar ou não uma gravides.

Dessa forma a mulher é vista como uma criminosa que


deveria ter pensado antes de engravidar, e que se engravidou agora tem que
responder por seus atos, daí surgem muitas questões.

A própria Constituição da República do Brasil trás em seu


art. 5°, inciso VIII que “ninguém será privado de direitos por motivo de crença
religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se
de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa,
fixada em lei”128

126
COLLUCCI, Claudia. Ginecologistas Atrasam Aborto Por Ignorar a Legislação. Disponível
em http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u106150.shtml acesso em 18/05/2007.
127
COSTA, Ana Maria. Aborto Sim Ou Não? entrevista concedida a Cristiane Segatto. Revista
Época, 16/04/07, p.86.
128
BRASIL, Constituição (1988). Constituição da Republica Federativa do Brasil.
55

Pode-se ressaltar que a Declaração Universal dos Direitos


Humanos proclamada em 10/12/1948 é clara ao dizer no art. 1° que “Todas as
pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e
consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de
fraternidade.”129

O aumento do número de pessoas que vivem abaixo da


linha da pobreza só vem aumentar também os casos de aborto clandestino
realizado de forma insegura, e na maioria das vezes sem profissional da saúde
presente.

Privilégio como esse, é para quem tem condições


econômicas, devido a prática ser considerada criminosa, os locais que oferecem
esse tipo de serviço, cobram caro e trabalham na clandestinidade, mas nem por
isso deixam de existir.

As mulheres que pertencem a grupos sociais


desfavorecidos, ou seja, sem possibilidade financeira, não tendo meios de optar
por uma clínica particular, optam por outros métodos, os quais tendem a ser mais
agressivos, como instrumentos cortantes, agulhas de tricô, dentre outros, além de
medicamentos proibidos no país como o cytotec, que, apesar de ser indicado para
o tratamento de úlceras tem função abortiva.

Para essas mulheres, estar grávida representa mais


despesas e sofrimento tanto para elas quanto para seus filhos, o que as leva a
encontrar um meio de se ver livre de uma gravidez que não foi planejada e, caso
tenha continuidade só vai aumentar o grau de necessidades básicas e pobreza da
família.

No ano de 1994 no dia 21 de agosto uma reportagem do


jornal Diário Catarinense relatou que o Estado de Santa Catarina tinha em média
43 mil abortos anualmente e o Brasil com média de 1 milhão e 400 mil por ano

129
Declaração Universal Dos Direitos Humanos. Disponível em:
http://www.unhchr.ch/udhr/lang/por.htm acesso em 18/05/2007.
56

com cerca de 56 mortes diárias.130Em pesquisa feita pela Organização das


Nações Unidas, chegou-se a um cálculo de que na América Latina cerca de 50%
da mortes que ocorrem durante a gravidez são provenientes de abortos
clandestinos.

Quanto a seriedade da situação não resta dúvida que algo


deve ser feito imediatamente, pois como relata literalmente a reportagem “A igreja
diz que é pecado, a Medicina diz que é proibido e o Judiciário diz que é crime”131,
no entanto a mulher que deseja realizar um aborto não deixa de fazê-lo, pois
acredita que seus motivos para praticar o ato abortivo, seja de que forma for,
valem o risco que ela vai correr, ainda que não custe apenas sua liberdade, mas
também sua vida.

Em setembro de 1994 foi realizada na cidade do Cairo, no


Egito, uma Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento
(CIPD), na qual foram debatidos temas como o direito sexual e reprodutivo das
mulheres, onde 179 países firmaram acordos com a meta de garantir o acesso
universal a serviços de saúde reprodutiva até 2015, viabilizando meios para
melhorar as condições de saúde e liberdade sexual e reprodutiva da mulher,
reconhecendo-os como direitos humanos.132

Essas Conferências ocorreram também no Canadá em


2002, na França em 2004 e em Bangkok nos dias 21 e 22 de novembro de 2006
para fortalecer o acordo ocorrido anteriormente, em Bangkok esteve presente a
deputada do PT de São Paulo, Telma de Souza, representando o Brasil.

Atualmente, os ocorridos nos levam a crer que as mulheres


clamam por sua independência sexual e reprodutiva, exigindo seus direitos como
mulher perante os mais importantes órgãos legislativos.

130
VICENZI, Celso. SC Tem Mais De 43 Mil Abortos Por Ano. Diário Catarinense, 21/08/94,
p.36/38.
131
VICENZI, Celso. SC Tem Mais De 43 Mil Abortos Por Ano. p.36/38.
132
Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento. Cairo, 1994, disponível em
http://portugues.iwhc.org/politicaglobal/nacoesunidas/conferencias/cipd.cfm acesso em 26/04/2007
57

O tema da liberdade de escolha talvez nunca tenha sido tão


discutido quanto no atual momento da história da humanidade, momento este, em
que somente no ano de 2007 dois países aderiram pela lei do direito a opção.

Na Europa, foi Portugal, que em fevereiro deste ano,


concedeu às mulheres o direito a opção por meio de plebiscito. A lei foi
promulgada em 10/04/07 pelo presidente português Aníbal Cavaco Silva133, o qual
sugeriu que as mulheres que procuram por esse método sejam anteriormente
orientadas social e psicologicamente, e ainda sobre a possibilidade de entrega
para adoção.

É necessário que a sociedade assim como os operadores da


lei reflitam, esquecendo se possível a questão religiosa, a respeito da questão do
aborto e dos motivos que levam uma mulher a tomar tal decisão, correndo riscos
sérios de vida, de saúde, a julgar pelas condições que muitas vezes isso ocorre, e
de liberdade considerando a questão jurídica do caso.

O juiz e professor da Universidade Federal do Espírito


Santo, João Batista Herkenhoff, nos traz um pouco de sua vivência como juiz e as
experiências que viveu ao julgar mulheres que cometeram o delito do aborto.

Nos casos que chegaram a mim, eu só me defrontei com


situações dramáticas. Nunca veio a minha presença mulher que
tivesse abortado por razões de conforto ou por motivo fútil (...).em
todos os casos que julguei, sem uma única exceção, minha
sentença, em razão da carência do dolo do agente (no caso, a
mãe) foi sempre de absolvição.134

O legislador reconhece que não há aborto culposo quando


praticado pela gestante ou com seu consentimento e explica que, para sentenciar
esses casos usou como base não só o direito, mas também a ciência e completa
seu raciocínio de forma majestosa “Reconheço que, na prática, a maioria dos

133
Saúde Pública. Revista Consultor Jurídico. http://conjur.estadao.com.br/static/text/54537,
publicação em 11/04/2007, acesso em 30/04/2007
134
HERKENHOFF, João Batista. Aborto: o Legal e o Existencial. Jus Navigandi, Teresina, ano
7, n. 66, jun. 2003. Disponível em http:jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4185. Acesso em:
16/02/2007.
58

juízes tende à estrita aplicação do preceito legal, presos a um legalismo que


desfavorece a absolvição. Daí a pertinência de uma mudança legislativa.”135

3.2.3 Quando Inicia a Vida H umana?

A principal discussão com relação ao aborto, questiona


quando tem início a vida humana, discussão esta que já encontrou muitas teses
mas nenhuma certeza ou prova. Com interesse na polêmica gerada pelo tema do
aborto e na necessidade de saber o exato momento do início da vida, a emissora
do canal de televisão - Rede Globo, através do programa Fantástico, exibido
semanalmente aos domingos, realizou uma pesquisa, a qual constatou a
existência de quatro correntes de pensamento sobre em qual momento inicia a
vida humana:136

A primeira linha de pensamento a ser reportada foi a tese


defendida pela igreja católica, na qual tem início a vida humana a partir do
momento em que o óvulo é fertilizado pelo espermatozóide.

Antônio Moser, que é frei da igreja católica e doutor em


bioética, ao ser questionado sobre tal questão afirmou que: “A vida é humana
desde o momento da fecundação”.

Como se vê, na concepção da igreja católica, a partir do


momento em que óvulo e espermatozóide se encontram já existe uma nova vida,
considerando ainda o fato de que os cristãos fiéis nada podem fazer para impedir
o encontro do espermatozóide com o óvulo.

Para uma segunda corrente, a vida começa a partir da


terceira semana de gravidez, tese defendida na entrevista por José Roberto
Goldim que trabalha no Laboratório de Bioética da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, o qual sustenta que “esse novo conjunto genético começa a

135
HERKENHOFF, João Batista. Aborto: o Legal e o Existencial. Jus Navigandi, Teresina, ano
7, n. 66, jun. 2003. Disponível em <http:jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4185>. Acesso em:
16/02/2007.
136
Quando A Vida Começa. Revista eletrônica Fantástico. Disponível em:
http://fantastico.globo.com/Jornalismo/Fantastico/0,,AA1517321-4005-0-0-15042007,00.html,
programa exibido em 15/04/2007, acesso em 16/04/2007
59

assumir o controle da célula nova”, essa corrente defende que a partir da terceira
semana já não é mais possível a divisão do embrião.

O presidente da Associação Brasileira de Neurociência,


Stevens Rehens, defende uma terceira linha de pensamento, para a qual, a vida
começa na oitava semana de gestação, pois é a partir desse momento que se
iniciam as atividades cerebrais, Rehens questiona que “O que se tem que
procurar é uma definição legal. A definição de morte é uma definição legal. O
coração continua batendo, o cérebro parou de funcionar e a pessoa é declarada
morta”. Dessa forma entende que é necessário também para a vida ter um
conceito jurídico aceitável.

Ainda sobre a terceira corrente defende o Doutor Fermin


Roland Schramm da Sociedade de Bioética do Rio de Janeiro:

...porque tem um organismo constituído, eu tenho a capacidade


desse organismo sentir dor ou prazer. E isso é relevante no
momento de fazer um aborto, porque quando já tem um cérebro
formado ou em formação, evidentemente esmagar esse cérebro é
relevante.

A quarta teoria pesquisada é de que o início da vida ocorre


quando o feto tem seus pulmões formados e adquire a possibilidade de sobreviver
fora do organismo materno, o que significa que o feto não precisa
obrigatoriamente permanecer os nove meses dentro do útero para que sobreviva,
pois a partir da 24° semana de gestação já é possível a sobrevida.

Sobre essa teoria, também defende o Doutor José Roberto


Goldim a situação das pessoas diante de uma questão tão delicada quanto a
situação imposta ao ser humano na condição de lei:

Quando uma sociedade começa a discutir essa questão, o mais


importante é tentar ver o que representa realmente um conjunto
de valores dessa população, para que ela aceite isso não como
uma imposição legal, mas como um reflexo da vontade e da
60

crença de que aquilo é o melhor para ela, naquele momento


histórico, naquele contexto.

O médico doutor, traz de forma sábia o entendimento de que


a interrupção voluntária da gravidez, é uma questão de ordem pessoal sendo
necessária a análise do momento e da situação.

Nota-se que são muitas as teorias sobre o início da vida,


mas no entanto, não há um conceito final e jurídico, pois o Código Civil em seu
art. 2° põe a salvo os direitos do nascituro, porém, ressalta que a personalidade
civil começa a partir do nascimento com vida137, considerando assim que o feto,
no período da gestação, tem sim uma expectativa de vida e de direitos, que
deixarão de ser expectativa a partir do nascimento com vida.

3.2.4 Uma Questão Também de Saúde Pública

Uma vez abordado as questões inerentes aos aspectos


religiosos, é importante analisar a questão dos anencéfalos, tipo de aborto já
explicado em capítulo anterior, que é talvez o aspecto mais delicado no quesito
aborto.

O aborto por anencefalia ou anomalia fetal é ainda


considerado crime no sistema de normas penais, sendo possível apenas através
de pedido judicial. No ano de 2004 o especialista em Direito do Estado Leon
Frejda Szklarowsky ,138 escreveu um artigo sobre aborto anencéfalo relatando um
caso que gerou muita polêmica no país. Tratava-se da história de uma mãe que
aguardou toda uma gestação esperando seu filho crescer no ventre para depois
enterrá-lo.

Depois de constatado através de exames médicos que a


má-formação do feto não deixava dúvidas quanto a impossibilidade de vida, a

137
BRASIL. Código Civil. Organização dos textos, notas remissivas e índices por Teothonio
Negrão. 26° ed. São Paulo. Editora Saraiva. 2007.
138
SZKLAROWSKY, Leon Frejda. O Aborto De Feto Com Anencefalia . Jus Navigandi, Teresina,
ano 9, n. 556, 14 jan. 2005. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6123>.
Acesso em: 07 maio 2007.
61

gestante entrou, através da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, com pedido de


autorização judicial para abortar.

Ocorreu que, conforme relata o autor em seu artigo:

O Juízo inferior indeferira o petitório, em virtude de ausência de


previsão legal, contudo o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro,
num rasgo de elevada sensibilidade e clarividência, prontamente,
dera autorização para a realização da interrupção da gestação,
encontrando no Direito posto a saída legal, para esse infortúnio.

No entanto mais uma vez a igreja entrou na discussão


quando o padre Luiz Carlos Lodi ingressou no Supremo Tribunal Federal com
pedido de Habeas Corpus para que a decisão do Tribunal de Justiça fosse
negada, feito que conseguiu através de decisão da 5° turma do Superior Tribunal
de Justiça. Segue a decisão:139

HABEAS CORPUS. PENAL. PEDIDO DE AUTORIZAÇÃO PARA


A PRÁTICA DE ABORTO. NASCITURO ACOMETIDO DE
ANENCEFALIA. INDEFERIMENTO. APELAÇÃO. DECISÃO
LIMINAR DA RELATORA RATIFICADA PELO COLEGIADO
DEFERINDO O PEDIDO. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL.
IDONEIDADE DO WRIT PARA A DEFESA DO NASCITURO. 1. A
eventual ocorrência de abortamento fora das hipóteses previstas
no Código Penal acarreta a aplicação de pena corpórea máxima,
irreparável, razão pela qual não há se falar em impropriedade da
via eleita, já que, como é cediço, o writ se presta justamente a
defender o direito de ir e vir, o que, evidentemente, inclui o direito
à preservação da vida do nascituro. 2. Mesmo tendo a instância
de origem se manifestado, formalmente, apenas acerca da
decisão liminar, na realidade, tendo em conta o caráter
inteiramente satisfativo da decisão, sem qualquer possibilidade de
retrocessão de seus efeitos, o que se tem é um exaurimento
definitivo do mérito. Afinal, a sentença de morte ao nascituro, caso
fosse levada a cabo, não deixaria nada mais a ser analisado por
aquele ou este Tribunal. 3. A legislação penal e a própria
Constituição Federal, como é sabido e consabido, tutelam a vida

139
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus n° 32159, da 5° turma. Relator:Laurita
Vaz. Brasília. 2004.
62

como bem maior a ser preservado. As hipóteses em que se


admite atentar contra ela estão elencadas de modo restrito,
inadmitindo-se interpretação extensiva, tampouco analogia in
malam partem. Há de prevalecer, nesse casos, o princípio da
reserva legal. 4. O Legislador eximiu-se de incluir no rol das
hipóteses autorizativas do aborto, previstas no art. 128 do Código
Penal, o caso descrito nos presentes autos. O máximo que podem
fazer os defensores da conduta proposta é lamentar a omissão,
mas nunca exigir do Magistrado, intérprete da Lei, que se lhe
acrescente mais uma hipótese que fora excluída de forma
propositada pelo Legislador. 5. Ordem concedida para reformar a
decisão proferida pelo Tribunal a quo, desautorizando o aborto;
outrossim, pelas peculiaridades do caso, para considerar
prejudicada a apelação interposta, porquanto houve, efetivamente,
manifestação exaustiva e definitiva da Corte Estadual acerca do
mérito por ocasião do julgamento do agravo regimental.

O resultado da lide processual foi uma gravidez agonizante


onde a mãe passou todos os noves meses na certeza de estar gerando um filho
que teria que enterrar logo em seguida, pois a criança viveu apenas durante sete
dias, vindo depois a falecer pelos problemas diagnosticados anteriormente.

Por situações dessa importância é que vemos pessoas


como Leon Frejda Szklarowsky vindo em defesa da sociedade que busca no
Judiciário, o amparo que precisa, quando no mesmo artigo o autor traz adoc a
Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

Não se alegue que o Direito pátrio é omisso, porque, como ensina


a preclara Desembargadora do Tribunal de Justiça gaúcho, Maria
Berenice Dias, "como a plenitude do sistema estatal não convive
com vazios, para a concreção do direito, o juiz precisa ter os olhos
voltados à realidade social. Mister deixem de fazer suas togas de
escudos para não enxergar a realidade, pois os que buscam a
Justiça merecem ser julgados e não punidos"(in Revista Jurídica
Consulex 168, de 2004).

Mais do que problema de comportamento ou de fé religiosa,


o aborto é principalmente um sério dilema para as questões de saúde pública,
ainda sobre a anencefalia, é com a concordância do autor do artigo já citado que
63

se ousa dizer ser praticamente um ato de crueldade, obrigar uma mãe a carregar
no ventre um feto sem qualquer chance de sobrevida.

No entanto o caso contrário também ocorre, pois em


novembro do ano de 2006 na cidade de Patrocínio Paulista um outro caso de feto
anencéfalo balançou as divergentes opiniões e provocou a comoção de todos
quando a mãe do bebê decidiu que lutaria para levar adiante a gravidez.

Conforme tocante reportagem da respeitada jornalista


140
Cristiane Segatto, a criança nasceu sem parte do cérebro, portanto não
enxerga e tem apenas algumas reações, como piscar e sugar. Ocorre que a
mesma não desenvolve emoções, a não ser a que causa na família que, com
carinho e dedicação, cuida dela todos os dias, além da comoção da sociedade.

De acordo com o médico Luiz Celso Vilanova a morte é


breve e certa devido ao crescimento dos órgãos e a incapacidade do tronco
cerebral da criança, quando virá a óbito por falência múltipla dos órgãos.

Achou-se necessário trazer para este trabalho de pesquisa


os casos acima relatados para fortalecer o quão vantajosa pode ser uma
mudança na lei penal, para que não seja mais necessário a busca de autorização
judicial no que trata dos casos de interrupção da gravidez.

Como foi visto anteriormente algumas mães recebem o


amparo legal, enquanto outras ficam a mercê da interpretação de operadores de
leis que negam seus pedidos baseando-se na falta de previsão legal para o caso.

Podemos detectar essa mercê, em um julgado do Tribunal


de Minas Gerais:

EMENTA: ALVARÁ JUDICIAL - ANENCEFALIA - PEDIDO DE


INTERRUPÇÃO TERAPÊUTICA DA GESTAÇÃO - DIREITO A
VIDA. Impossível decretar ou mesmo antecipar a morte, mesmo

140
SEGATTO, Cristiane. Ela Já Não È Mais Minha, Entreguei-a Para Jesus. Disponível em:
http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDG76301-6014-455,00.html acesso em
07/05/2007.
64

diante da situação apresentada nos autos, pois o feto é


incontroverso pode nascer com vida, não sendo possível utilizar a
analogia e/ou princípios genéricos para fundamentar suposições e
ilações desprovidas de qualquer fundamento legal. APELAÇÃO
CÍVEL N° 1.0024.06.199818-3/001 - COMARCA DE BELO
HORIZONTE - APELANTE(S): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADO
MINAS GERAIS - RELATOR: EXMO. SR. DES. NILO LACERDA
141

A ementa acima é mais uma situação na qual o cidadão


busca pela tutela do Estado, para resolver uma situação de emergência e no
entanto se vê desamparado pela lei, pois esta não encontra fundamento legal
para atender ao presente pedido.

O Desembargador Nilo Lacerda, ao relatar o voto, manifesta-


se em sua fundamentação que a intenção da gestante é “exercer legitimamente
seu direito a interrupção da gestação”, pedidos dessa natureza são feitos por
necessidade e para evitar sofrimentos maiores no futuro, o qual inexiste para o
ser que cresce e tem como destino a morte certa.

EMENTA: APELAÇÃO CRIME. ABORTO EUGENÉSICO.


ANENCEFALIA. Inviabiliza a vida do feto, prenunciada sua morte
por malformação. Anencefalia comprovada. Hão de volver-se, os
cuidados, àquela que o gera, então permitindo-se a interrupção da
gravidez, que nestes casos a faz exposta a risco. Inteligência do
art. 128, do Código Penal. PROVIDO O RECURSO. (Apelação
crime N° 70016858235, Terceira Cãmara Criminal, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Newton Brasil Leão, Julgado em
28/12/2006).142

Essa ementa tem como pedido na inicial, o semelhante ao


da ementa anterior, porém com decisão contrária, neste caso a lei não só
reconhece como defere o pedido da gestante para a cessação de seu sofrimento.

141
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Apelação cível Nº
1.0024.06.199818-3/001 da 12° Cãmara Cível. Relator: Nilo Lacerda. 2006.
142
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Apelação Crime nº
70016858235 da 3° Cãmara Criminal. Relator: Newton Brasil de Leão. 2006
65

José Gomes Temporão,143 agindo na qualidade que lhe é


cabida de Ministro da Saúde, de forma corajosa anunciou: “Como cidadão eu
defenderia o aborto, mas como Ministro da Saúde o melhor é passar informações
para a sociedade decidir”, enfrentou as críticas e aversões que poderia sofrer,
defendendo publicamente a realização de um plebiscito para pôr em votação o
direito da mulher a interromper a gravidez, e, ao ser interrogado sobre a defesa
da legalização do aborto respondeu:

Falei em direitos sexuais reprodutivos, uma questão muito mais


ampla. Toquei no assunto porque me chamaram a atenção dois
números. Um mostrava que o Sistema Único de Saúde fez 2 mil
abortos com base na lei e 220 mil curetagens pós aborto no ano
passado. Não sabemos que percentual dessas mulheres perdeu o
bebê espontaneamente ou se submeteu a uma intervenção em
condições inseguras. É um problema de saúde pública. Como
envolve muita polêmica, me parece que a maneira mais adequada
de resolver é com uma consulta popular. Nunca foi uma bandeira
minha. Mas ficou evidente, dada a repercussão, que temos um
problema no país e que há grupos fundamentalistas que não
querem nem debate. 144

Como já era de se esperar, a atitude no mínimo arrojada do


então Ministro provocou a ira da igreja católica e seus seguidores, porém José
Gomes Temporão tratou de fundamentar: “várias religiões orientais , como o
budismo, admitem o aborto.” e acrescentou “Além disso nós vivemos num Estado
laico. Cada um exerce a sua religião de acordo com sua consciência e não se
pode impor aos outros filosofias ou questões morais que sejam próprias de
determinada religião”.145

Sua manifestação porém gerou reflexos positivos em alguns


grupos militantes na causa da interrupção voluntária, sendo acolhida suas
intenções por colegas e simpatizantes, que assim como ele são defensores dessa

143
MARQUES. Hugo. O Ministro e o Aborto. Revista Istoé, 11/04/2007, p.38.
144
TEMPORÃO, José Gomes. Sou A Favor Da Vida. entrevista concedida a Isabel Clemente.
Revista Época, 16/04/07, p.90.
145
TEMPORÃO, José Gomes. Sou A Favor Da Vida. p.91.
66

idéia. Destaca-se as palavras de Aníbal Faúndes146, ao conceder um entrevista


para a Revista Época: “Proibir o aborto não acaba com ele. Assim como seria
impossível proibir a existência de crianças de rua apenas baixando uma lei que
determinasse isso”.

A reportagem trouxe até mesmo relatos de mulheres que


passaram pela angústia de estar cometendo um ato ilícito, no entanto por estarem
em condições financeira abastada, puderam usufruir de um atendimento digno e
sem riscos, caso raro nas atuais condições da lei penal, é o exemplo da
vereadora do PT de São Paulo, Sônia Francine147:

Fiz um aborto aos 22 anos quando já tinha duas filhas. Meu


casamento estava apodrecido. Passávamos 95% do tempo em
guerra. Naquela situação eu provavelmente faria de novo. Por isso
bloqueei qualquer pensamento de arrependimento. Fui submetida
a uma raspagem com anestesia local. Doía muito. Pensei que
aquele era o preço que eu tinha que pagar. Hoje sou budista e
considero que a vida humana é algo incomparável. Mas apóio a
descriminalização do aborto. A clandestinidade custa mais vidas.

E da conhecida atriz Cássia Kiss148:

Abortei aos 28 anos. Tinha toda a condição financeira de ter um


filho, mas nenhuma condição emocional. Não me arrependo.
Sofria de bulimia e precisava de ajuda psiquiátrica. E também
estava trabalhando muito, fazendo Roque Santeiro, uma novela
que mobilizava as pessoas como uma Copa do Mundo. Hoje sou
mãe de Joaquim, Maria Cândida, Pedro Gabriel e Pedro Miguel.
Fora da Maternidade não sou nada. Se engravidasse hoje e meu
filho viesse com duas cabeças e seis pernas, eu o teria.”

José Gomes Temporão ganhou também o apoio da


deputada federal do PC do B do Rio de Janeiro Jandira Feghali: “Como médica e

146
FAÚNDES, Aníbal. Aborto Sim Ou Não? entrevista concedida a Cristiane Segatto. Revista
Época, 16/04/07, p.85.
147
FRANCINE, Sônia. Aborto Sim Ou Não? entrevista concedida a Cristiane Segatto. Revista
Época, 16/04/07, p.84.
148
KISS, Cássia. Aborto Sim Ou Não? entrevista concedida a Cristiane Segatto. Revista Época,
16/04/07, p.85.
67

mãe, também sou defensora incondicional da vida, e, por isso mesmo defendo
também a vida das mulheres e seu direito a opção”. 149

A saúde pública é a grande preocupação do Ministro


mostrando o aborto como a terceira causa de morte materna no país através da
quantidade de abortos praticados ilegalmente no país, os quais normalmente não
são bem sucedidos, que começam em casa ou em outros ambientes sem
condições médicas e higiênicas e vão parar no hospital, alegando terem sofrido
aborto natural.

Dessa forma, entende o Ministro pela necessidade da


atualização da Lei penal aos dias atuais, com o fim de assegurar o direito e a
saúde de mulheres que encontram-se desamparadas econômica e juridicamente.

Por todos os artigos e entrevistas pesquisados nota-se a


grande massa de pessoas, organizações, políticos e outros que pretendem pela
descriminalização, pode-se acompanhar também as mais variadas situações
entre pessoas com condições financeiras e outras nem tanto, para ambas o
direito deve acontecer da mesma forma.

A garantia de direitos deve ser para todos, e não a uma


pequena parcela da sociedade, buscando ultrapassar os limites da opções
individuais, sociais e religiosas, atendendo dessa forma a todas as classes e tipos
de pessoas, sejam elas ou não, seguidoras de cultos, ceitas e ou religiões. de
artigos voltados para a melhor compreensão do assunto.

149
CARAVILLA, André. Aborto – Religiosos Pressionam A Câmara. Disponível em:
http://www2.camara.gov.br/comissoes/cdhm/redeparlamentarrndh acesso em 25/04/2007
68

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa descrita nesta monografia demostrou as controvérsias


existentes sobre a descriminalização do aborto, fundamentando-se nos aspectos
religiosos e polêmicos sobre o tema.

No desenvolvimento da pesquisa, o primeiro capítulo apresenta os


crimes dolosos contra a vida, explanando sobre o que é o dolo, e abordando um
breve histórico da competência do Tribunal do Júri.

Na seqüência, no segundo capítulo, além de um breve enfoque do


histórico do aborto, tratou-se mais especificadamente sobre os tipos de aborto,
juntamente com suas tipificações e qualificações, para em seguida tratar das
críticas do artigo 128 do Código Penal; ao final tratando de alguns métodos
contraceptivos existentes no Pais.

Já na última parte do trabalho, o terceiro capítulo voltou-se unicamente


para a questão tema, ou seja, a visão e ensinamentos religiosos juntamente com
os aspectos polêmicos acerca do aborto, buscando justificar a possibilidade da
descriminalização do aborto.

Sobre o assunto abordado, conclui-se que, um país ao se proclamar


como Estado laico, não pode ater-se a valores morais, oriundos de religião
predominante, deixando que esses valores e entendimentos religiosos interfiram
na elaboração de suas leis.

É importante ressaltar que muitas são as correntes defensoras do


aborto ou do não aborto, mas não existem provas científicas que comprovem a
veracidade do momento exato do início da vida, no entanto, não são necessárias
pesquisas científicas para a comprovação de que a mulher é a grande vítima,
69

vítima de leis impostas que dizem respeito ao seu corpo, e que lhe negam o
direito de decidir sobre ele.

Por fim, tomam-se as hipóteses que nortearam o presente trabalho,


ressaltando que:

A primeira hipótese obteve sua resposta já no primeiro capítulo ao


constar que o tipo encontra-se no rol dos crimes contra a vida entre os arts. 124 e
126 na sua forma dolosa, e no art. 128 da mesma Lei encontram-se os tipos de
aborto legalmente autorizados.

A segunda hipótese restou comprovada porque, considerando que o


Código Penal tem 65 anos de vigência, visto que entrou em vigor na data de
01/01/1942, e que a mais de meio século atrás os costumes e valores eram mais
voltados para os ensinamentos religiosos e também mais rígidos, as religiões
predominantes tiveram influência na elaboração da Lei Penal em vigor,
principalmente na questão do aborto, onde a Igreja Católica entende que a vida
começa na concepção.

A terceira hipótese obteve sua resposta ao constatar que o aborto não


deixa de existir por ser considerado um crime, pior que isso, é realizado de forma
clandestina, as mulheres de baixo poder econômico que necessitam de uma
interrupção da gravidez e não conseguem por meios legais, quase sempre
buscam a clandestinidade, nessa busca encontram na maioria das vezes pessoas
despreparadas para realizar o aborto, colocando a própria vida em risco,
consequentemente chegam aos hospitais em situação de saúde grave, quando já
estão correndo risco de morte, o que torna mais oneroso o tratamento, um aborto
feito por médico em local apropriado traria um custo menor para o Estado
causando um grande impacto positivo na redução de custos da saúde pública.

O que essas mulheres desejam não é impor leis a outras


pessoas, mas sim ter garantido o seu direito de decidir, sem depender de análises
controvertidas, podendo dispor de seus direitos quando julgarem necessário, sem
ter que passar por situações vexatórias, como expor sua intimidade.
70

Dessa forma espera-se que o presente trabalho tenha


alcançado o efeito que se pretendia inicialmente, ou seja, discorrer sobre as
questões polêmicas e a influência da religião acerca do aborto.
71

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS

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Relator: Laurita Vaz. Brasília. 2004

BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Apelação cível Nº


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BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Apelação Crime


nº 70016858235 da 3°Cãmara Criminal. Relator: Newton Brasil de Leão. 2006
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