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ARTIGO ORIGINAL

AVALIAÇÃO DA QUALIDADE SANITÁRIA DOS RÓTULOS DE ALIMENTOS


EMBALADOS DE ORIGEM ANIMALa

Augusto Amorim Bastosb


Maria Helena Belinelloc
Tatiana Carla C. Saraivad
Ana Cristina Soutob

Resumo
Neste estudo avalia-se a qualidade das informações e dos rótulos de alimentos
embalados, de origem animal, importante instrumento de informação ao consumidor e da
segurança sanitária e alimentar. Este é um estudo descritivo, no qual as unidades de observação
foram os rótulos de alimentos de origem animal comercializados em supermercados das cidades
de Barreiras e Salvador (BA). Foram analisados rótulos de ovos, mel, frango congelado, lingüiça
calabresa, iogurte e leite líquido de diversas marcas. As categorias analíticas foram: tipo de
alimento, identificação do produtor, lote, inscrição “Indústria Brasileira”, registro no Ministério da
Agricultura, validade, data de fabricação/envase, carimbo do serviço de inspeção, informações
nutricionais e ingredientes, instruções sobre armazenamento e conservação, preparo ou uso,
aderência do rótulo, legibilidade, visibilidade, coerência e clareza. Verificou-se que a maioria dos
rótulos atendia a legislação em vigor. Inconformidades encontradas foram falta do número de lote
e visibilidade das informações. Alimentos com pior qualidade da rotulagem foram ovos, mel e
lingüiça calabresa. Um maior controle sanitário das informações contidas nos rótulos de alimentos
poderá tornar o consumidor mais consciente de seus direitos.

Palavras-chave: Alimentos de origem animal. Rotulagem de alimentos. Vigilância sanitária.

a
Este estudo foi financiado com recursos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), por intermédio do Centro
Colaborador ISC/Anvisa, conforme convênio n° 022.081.
b
Instituto de Saúde Coletiva (ISC), Universidade Federal da Bahia (UFBA).
c
Secretaria Municipal de Saúde de Salvador.
d
Secretaria Municipal de Saúde de Barreiras.
Endereço para correspondência: Augusto Amorim Bastos. Instituto de Saúde Coletiva/Centro Colaborador ISC/ANVISA. Rua
Basílio Gama, s/n 3º andar, Canela. Salvador, Bahia, Brasil. CEP - 40110 -170. Tels: (71) 3230-6907/9918-6933. E-mail:
augustobas@yahoo.com.br

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Revista Baiana HEALTH QUALITY ASSESSMENT OF LABELS FROM PACKED FOOD OF ANIMAL ORIGIN
de Saúde Pública
Abstract
The purpose of this study is to evaluate information and the label quality of packed
animal food, an important instrument for consumer information and food and health safety. It is a
descriptive study carried out with labels of animal origin food available in supermarkets in Barreiras
and Salvador, both cities located in the state of Bahia, Brazil. Egg, honey, frozen chicken, sausage,
yogurt and liquid milk of several brand names were analyzed. Analytical categories were: type of
food, producer identification, lot, origin inscription, register in the Ministry of Agriculture, expiration
date, production/packaging date, inspection stamp, ingredients and nutritional information, storage
and preservation instructions, instructions for preparation or usage, label adherence, legibility,
visibility, consistency and clarity. It was observed that most labels were in conformance with the
legislation. Non-compliance was observed in the lot number and information visibility. Worst label
quality foods were eggs, honey and sausage. A better health control of food label information can
make consumer more conscious of his rights.

Key words: Animal origin foods. Food labeling. Health surveillance.

INTRODUÇÃO
Inúmeros alimentos embalados, de origem animal, são colocados à venda no
mercado brasileiro sem a devida observância do recomendado pela legislação em vigor,
especialmente no que se refere à informação na rotulagem, não obstante as normas sanitárias e do
Código de Defesa do Consumidor (CDC). De acordo com as exigências legais, os rótulos destes
alimentos devem apresentar: nome, identificação civil do produtor, número de registro no
Ministério da Agricultura (MA), carimbo do Serviço de Inspeção Federal (SIF) do MA, data de
fabricação, lote, validade, quantidade, composição, condições ideais de transporte,
armazenamento e conservação, formas de preparo e consumo, características, preços e outras
informações inerentes ao produto exigidas pela legislação específica.1, 2
A criação do CDC representou um avanço para o controle do risco sanitário de
produtos de interesse da saúde, ao reforçar a legislação de proteção e defesa da saúde,
responsabilizando o produtor pela qualidade, obrigando-o a fornecer informações ao consumidor.3
Portanto a vigilância da rotulagem desempenha importante papel no controle sanitário de alimentos
com vistas à proteção da saúde da coletividade. Sua atribuição é detectar possíveis erros que
podem ocasionar agravos à saúde da população, quando o rótulo não leva ao consumidor
informações claras, visíveis, corretas, completas e precisas sobre o alimento exposto à venda.

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Estudos têm demonstrado deficiências nas informações de rótulos de alimentos no
que se refere à composição química, valores nutricionais, indicação de ausência ou presença de
alimentos provenientes de organismos geneticamente modificados,4 denominação de origem,
acessibilidade a serviços de atendimento ao consumidor,4,5 ausência de rótulo em alimentos
clandestinos, falta do número de registro5 e uso de mensagens confusas que podem levar o
consumidor a erros ou riscos à saúde.4,6-8 Desta forma, o controle sanitário, competência da vigilância
sanitária, é essencial para a garantia da qualidade das informações de rotulagem. Ademais, a
qualidade reporta-se à noção de atributo intrínseco, presumivelmente esperado, de bens materiais e
imateriais relacionados à saúde, responsabilidade do produtor e prestador de serviços.9
Este trabalho tem como objetivo principal avaliar a qualidade, do ponto de vista
sanitário, dos rótulos de produtos alimentícios embalados, de origem animal, expostos à venda no
comércio varejista de alimentos. Os objetivos específicos são: avaliar o tipo e a qualidade das
informações constantes nos rótulos de acordo com as normas do Ministério da Saúde (MS), do MA
e CDC, segundo o tipo de alimento e empresas produtoras; avaliar o rótulo quanto a sua
aderência, legibilidade, visibilidade, coerência e clareza das informações; descrever o risco sanitário
decorrente da deficiência nos dizeres de rotulagem daqueles alimentos.

MATERIAL E MÉTODOS
Este é um estudo descritivo, no qual as unidades de observação foram rótulos de
alimentos de origem animal selecionados de supermercados de Salvador, capital do estado da
Bahia e a cidade de Barreiras, localizada na região extremo-oeste desse estado. Essas cidades
foram escolhidas devido à conveniência operacional e o interesse de profissionais de saúde que
ali residiam.
Os alimentos examinados foram ovos, mel, frango congelado, lingüiça calabresa,
iogurte integral e desnatado com e sem polpa de fruta, leite líquido desnatado e integral, de todas
as marcas encontradas, selecionadas independentemente dos fabricantes. A escolha destes
alimentos foi feita com base em: 1) denúncias realizadas por consumidores junto aos serviços de
vigilância sanitária sobre a não-conformidade das rotulagens; 2) alimentos de grande consumo10 e/
e/ou que integram a cesta básica, definida de acordo com o Decreto Lei n 399, de 30 de abril de
1938.11 Não foi realizada amostragem devido à indisponibilidade de cadastro de supermercados e
de listagem dos produtos existentes nesses estabelecimentos.
Os dados foram coletados pelos autores, entre maio e junho de 2003, em sete
supermercados de Barreiras e oito de Salvador, num total de quinze estabelecimentos, escolhidos
entre aqueles de caráter varejista, de grande porte e elevada popularidade, ou situados em bairros

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Revista Baiana ou locais de intensa movimentação e alta densidade demográfica. Permissão para a realização da
de Saúde Pública
pesquisa foi solicitada previamente. Encaminhou-se uma carta a cada estabelecimento,
apresentando os propósitos da pesquisa, a identificação dos pesquisadores de campo, a
importância do estudo, tipos de alimentos que seriam estudados, incluindo-se uma cópia do
instrumento utilizado para o registro dos dados. Não houve recusa de participação na pesquisa.
Inicialmente, os pesquisadores procuravam o responsável pelo estabelecimento e
informavam sobre a coleta de dados. Em seguida, se dirigiam às seções onde estavam expostos os
alimentos de interesse, registrando os dados em formulários elaborados para a pesquisa. Em geral,
estes procedimentos foram realizados sem a presença de funcionários dos supermercados.
Os formulários empregados para a coleta de dados foram preparados pelos autores,
com base na revisão de literatura, na legislação sanitária e de defesa do consumidor (Apêndice A).
Realizaram-se também reuniões para padronizar os procedimentos de coleta, modo de
apresentação e conduta nos estabelecimentos. O formulário foi estruturado com base nos
seguintes construtos: identificação do produto, segurança sanitária, qualidade da informação, do
rótulo e informação sobre o atendimento ao consumidor. Os dados coletados, agrupados nestas
categorias de análise, foram: tipo de alimento, identificação do produtor (nome, endereço e
Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica - CNPJ), lote, inscrição “Indústria Brasileira”, número de
registro no Ministério da Agricultura e Abastecimento, prazo de validade, data de fabricação/
envase, carimbo do Serviço de Inspeção Federal (SIF) ou no Serviço de Inspeção Estadual (SIE),
informações nutricionais, armazenamento e conservação, preparo e instrução de uso (quando
necessário), ingredientes (se pertinente), aderência do rótulo, legibilidade, visibilidade, coerência e
clareza das informações, ligação gratuita, ligação paga, caixa postal, e-mail, home page.
Em todos os dados coletados também foram observadas, individualmente, a
legibilidade, visibilidade, coerência e clareza da informação. Foram considerados os seguintes
requisitos:
a) adequação e coerência em relação às recomendações técnicas;
b) clareza como informação inteligível, compreensível ao entendimento do
consumidor12;
c) ostentação da informação de forma visível, apresentada aos olhos do
consumidor, dispensando qualquer esforço para a sua localização na
embalagem.12 A visibilidade foi definida como a informação aparente,
manifesta, perceptível ou que se pode ver;
d) legibilidade como informação que se pode ler, nítida, sem manchas ou
borrões.

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Devido a sua importância sanitária, foram observadas e registradas as informações
específicas relativas a instruções de uso e preparo adequado dos alimentos. Os produtos foram
examinados apenas uma vez para cada marca.
A análise foi realizada estimando-se freqüências simples das variáveis do estudo por
tipo de alimento, e os resultados foram confrontados com o previsto na legislação. Como o
objetivo principal deste trabalho foi avaliar a qualidade das informações dos rótulos de alimentos
embalados de origem animal como um instrumento de informação ao consumidor, justifica-se a
não divulgação dos nomes comerciais e as respectivas marcas dos produtos alimentícios estudados
que apresentaram irregularidades. Os dados foram digitados no programa Excel, versão 2000.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram coletados dados dos rótulos de 117 marcas comerciais de diversos tipos de
alimentos, sendo os mais comuns o iogurte (29,0%), leite líquido (19,7%), mel (17,1%), frango
congelado (14,5%), lingüiça calabresa (11,1%) e ovos (7,7%). Nos sete supermercados visitados na
cidade de Barreiras, os ovos eram comercializados com embalagens sem nenhuma rotulagem.
Portanto foram excluídos do estudo.
Verificou-se um universo maior de marcas de iogurte em relação às demais marcas
dos alimentos estudados. Isto pode evidenciar o crescimento da produção deste tipo de alimento
e seu maior consumo em nossa sociedade, ocasionado provavelmente pelo apelo comercial, uso
infantil, indicação de suplementação de cálcio e vitaminas e por causa do desenvolvimento
tecnológico e modernização das sociedades.

IDENTIFICAÇÃO DO PRODUTO
A totalidade dos rótulos de iogurte, leite líquido e frango congelado apresentavam
registro no MA, e carimbo do SIF ou SIE. Todavia faltavam esses registros nos demais, especificamente,
31,8% nos rótulos de lingüiça calabresa, 11,1% para ovos e 10,0% para o mel (Tabela 1). Isto é
sugestivo de que pode haver produtos de comercialização clandestina em ambas as cidades. Vale
ressaltar que a ausência desse registro nos rótulos de lingüiça calabresa pode ser resultante da prática da
comercialização fracionada no varejo, o que leva à omissão da rotulagem completa do produtor.
O mel, pelo fato de sua produção ser mais comumente artesanal, e a comercialização
ser realizada em pequenas quantidades e em períodos sazonais, ainda se encontra com pouco
controle sanitário, tanto na produção como na comercialização varejista. Isso implica em problemas
sanitários, inclusive em sua rotulagem. Para a maioria da população, o mel tem um significado cultural
de “pureza”, “energia” e “saúde”, o que ainda favorece a comercialização de alguns produtos de
origem clandestina. Afinal, para muitos consumidores, constitui-se em alimento “inofensivo”,

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Revista Baiana “saudável” e “nutritivo”, sendo, portanto, isento de “risco”. A título de exemplo, encontrou-se mel
de Saúde Pública
clandestino com a informação no rótulo, que estava aguardando o registro e carimbo por parte do
órgão competente regulador. Entretanto, visando provavelmente dar credibilidade ao produto, trazia
em seu rótulo inscrições visíveis da seguinte expressão: “Só Jesus Salva”.

Tabela 1. Distribuição da conformidade dos rótulos por categorias de análise e tipo de alimento

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Encontrou-se um rótulo de mel com um nome comercial que sugere uma ação
terapêutica, que o produto não possui. A Resolução nº. 259, de 20 de setembro de 20021 proíbe
esta prática, por se tratar de alimento que está ressaltando propriedades medicinais, curativas ou
terapêuticas e pelo fato de poder significar um apelo comercial, induzindo o consumidor a fazer
uso do produto com a finalidade curativa.
Verificou-se que apenas 28,6% dos alimentos de origem animal estudados
apresentavam o número do lote em suas rotulagens. Entre os alimentos com menores percentuais
de falta desse dado estão o frango congelado (11,8%), iogurte (14,3%), lingüiça calabresa (15,4%),
ovos (22,2%) e leite líquido (47,8%). O mel foi o que apresentou maior percentual (60,0%)
(Tabela 1). Resultado semelhante também foi encontrado no estudo de Graciano, Gonzalez, Jorge
e Silva5, no Estado de São Paulo, no período de janeiro de 1998 a junho de 1999, que também
apontava a ausência do número de lote como principal irregularidade relativa a informações de
rotulagem.
A legislação sanitária em vigor faculta a indicação do lote por meio da data de
fabricação, embalagem ou validade mínima. Tal dispositivo significa um equívoco, visto que o
número de lote representa maior controle da produção, servindo para identificação do produto e
sua conseqüente rastreabilidade. Isto permite agilizar providências para a retirada do produto do
mercado e a conseqüente eliminação ou redução de danos e agravos à saúde da população.
A inscrição Indústria Brasileira esteve presente em 61,5% dos rótulos de lingüiça
calabresa, 80,0% de mel, 91,4% de iogurte e 94,1% do total de rótulos de frango congelado
(Tabela 1). Com a atual expansão internacional dos mercados de produtos alimentícios, a
referência do país produtor de origem é importante para o consumidor e autoridades sanitárias,
para o devido controle da qualidade e a adoção de medidas de saúde pública, quando necessárias.

SEGURANÇA SANITÁRIA
Em todos os rótulos observados foi encontrado o registro do prazo de validade
(Tabela 1). Isto representa um avanço e uma conquista do exercício da cidadania, face ao
reconhecimento, por parte de consumidores e produtores, da relevância dessa informação para a
segurança alimentar. O Código de Defesa do Consumidor, que exige a apresentação dessa
informação, e sua massiva divulgação nos principais meios de comunicação, certamente contribuiu
para a consolidação dessa prática na sociedade brasileira.
Todos os rótulos de alimentos apresentaram falhas em relação à menção da data de
fabricação ou envase, à exceção do frango congelado. Entre os de menor freqüência de
conformidade estavam lingüiça calabresa e ovos, com 76,9% e 77,8%, respectivamente (Tabela 1).

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Revista Baiana Todos os rótulos de leite líquido e ovos apresentaram informação nutricional, o que
de Saúde Pública
não aconteceu com os demais alimentos, principalmente com os rótulos de mel (Tabela 1). Isto
pode significar riscos para consumidores que têm doenças metabólicas, cujo tratamento exige
controle na dieta alimentar (diabetes). Foi encontrado um rótulo de mel com a seguinte
informação: “não contém aditivos, açúcar, glicose ou corante”. Esta informação pode levar o
consumidor diabético a acreditar que este alimento pode ser consumido sem restrições por conta
desta falsa informação, o que evidencia a falta de clareza.
Estudos7,8,12 sobre o entendimento por parte dos consumidores das informações de
rotulagem, sobretudo nutricional, revelam que a maioria dos indivíduos pesquisados apresentavam
dificuldades na compreensão de termos técnicos e informações numéricas.
Vale observar que, neste estudo, não foi avaliado se a informação nutricional estava
de acordo com a norma específica, a Resolução nº. 40, de 21 de março de 2001,14 vigente na
época da coleta dos dados. É importante ressaltar que a referida norma foi substituída pela
Resolução nº. 360, de 23 de dezembro de 2003.15
De acordo com a Tabela 1, apenas iogurte e frango congelado apresentaram
informações sobre armazenamento e conservação em 100,0% de seus rótulos. As rotulagens de
leite líquido, ovos, lingüiça calabresa e, principalmente, mel apresentaram índices menores quanto
a este requisito legal (95,7%, 77,8%, 76,9% e 65,0%, respectivamente). Este item é relevante para
orientar a população sobre a forma de armazenar e conservar os alimentos, visando a manutenção
de sua qualidade e características originais. Trata-se de uma informação técnica que o produtor
disponibiliza, importante para a manutenção da integridade do produto, sendo salutar na
prevenção de agravos e doenças ocasionadas por inadequações de armazenamento e conservação
de alimentos.
Os rótulos de frango congelado foram os que apresentaram maior percentual (88,2%)
de informações quanto a critério de preparo e instruções de uso. Todos os rótulos de iogurte
apresentaram informações sobre ingredientes utilizados no processo de fabricação (Tabela 1). Este
requisito não foi observado nos rótulos de frango congelado e ovos porque estes não são produzidos
com o uso e manipulação de ingredientes. Este item pode ser necessário para os consumidores que
sejam alérgicos a algum ingrediente ou substância que constitua o alimento.

QUALIDADE TÉCNICA DO RÓTULO


A Tabela 1 demonstra que foi baixo o percentual de irregularidades nos rótulos
dos alimentos quanto à legibilidade. Apenas mel apresentou maior percentual de irregularidade.
Entretanto observaram-se deficiências no que tange à visibilidade da informação nas rotulagens

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dos alimentos estudados. Verificou-se que 49,7% da totalidade dos produtos analisados
encontravam-se com pouca visibilidade. O iogurte foi o tipo de alimento que apresentou o
menor índice, com apenas 28,9% de seus rótulos sendo considerados de boa visibilidade. Da
mesma forma, frango congelado, mel e leite líquido também apresentaram rotulagens com
problemas desta natureza, com percentuais de regularidade de apenas 29,4%, 45,0% e 52,2%,
respectivamente. Ovos foi o tipo de alimento que mais atendeu a este critério, apresentando
88,8% de seus rótulos com boa visibilidade das informações (Tabela 1). Cowburn e Stockley7
destacam que o tamanho das impressões nos rótulos é uma das razões citadas por consumidores
para a não leitura da rotulagem nutricional.
Observou-se também que alguns alimentos apresentavam o rótulo em locais
inadequados. Por exemplo, no caso do frango, quando estavam próximas ao lacre da embalagem,
formavam pregas, o que dificultava a visualização, comprometendo sua função de comunicação. O
pequeno tamanho das letras e o pouco contraste entre a cor do fundo e a do texto também
dificultavam a visualização. Enfatiza-se que a legislação relativa à rotulagem não especifica a
dimensão da fonte de letra adequada a uma fácil leitura. Também não explicita local para
impressão e contraste de cores que facilitem a visibilidade das informações contidas nas rotulagens
de alimentos embalados. Esses aspectos deverão ser incorporados nas normas futuras.
Salienta-se a identificação de embalagens de iogurte em placas de seis potes
(inclusive com dizeres advertindo que o produto só pode ser vendido em placas) sendo os potes
vendidos separadamente, principalmente em supermercados de bairros periféricos. Assim, as
informações nutricionais e tantas outras importantes simplesmente são omitidas. É interessante
destacar que os rótulos de várias marcas — principalmente aquelas destinadas às crianças — têm
uma profusão tão grande de cores e imagens que se torna difícil a leitura.
Não foram constatadas muitas irregularidades na aderência dos rótulos às
embalagens. Ovos e mel apresentaram os menores percentuais de regularidade, com 44,4% e
90,0%, respectivamente (Tabela 1). Houve problemas de aderência nos rótulos de mel,
exatamente naqueles sem registro, traduzindo o amadorismo de muitos produtores. No caso dos
ovos, é ainda muito comum o produtor embalar seus produtos em caixas forradas com filmes de
plástico, com o rótulo solto em seu interior.
A maioria dos produtores de alimentos que necessitam de refrigeração (iogurtes,
frangos) já providenciou as necessárias adequações, utilizando a própria embalagem ou
empregando, nos rótulos, material mais resistente a água. Os produtores de leite se serviram do
avanço tecnológico da embalagem tetrapak, que vem possibilitando condições especiais de
esterilização e de proteção contra a luz e o ambiente externo.

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Revista Baiana Nos frangos congelados observados, 35,3% encontravam-se com suas embalagens
de Saúde Pública
perfuradas, o que pode permitir sua contaminação e omitir informações de rotulagem, que neste
caso são as próprias embalagens.

QUALIDADE DA INFORMAÇÃO
Alimentos como frango congelado e ovos não apresentaram irregularidades quanto à
clareza das informações, não sendo evidenciado neste estudo grande percentual de inadequações
(Tabela 1). Pelo contrário, pôde-se constatar que o setor produtivo vem se esforçando para
atender seus consumidores com informações claras e inteligíveis a respeito dos produtos colocados
no mercado. Verificou-se, porém, que lingüiça calabresa, mel, leite líquido e iogurte ainda
apresentam percentuais menores que 100,0% de regularidade.
Também quanto à coerência, não se observou grande quantidade de desvios. Assim,
pode-se considerar que estes dois itens não se constituem objeto de grande preocupação no que
consiste em ocorrência de irregularidades. Ressalta-se que apenas leite líquido e lingüiça calabresa
apresentaram rotulagem que atendia em sua totalidade à coerência das informações (Tabela 1).
A maioria dos rótulos dos frangos congelados trazia informações específicas de
rotulagem. Entretanto encontraram-se cinco marcas de frango congelado, o que representou
29,4%, que não mostrava essas informações com adequada visibilidade. Um destes produtos
apresentava uma informação equivocada em relação ao descongelamento, que recomendava o
seguinte: “Descongelamento: Para conservação de todas as características sensoriais do Frango
Caipira X congelado, siga as seguintes regras: [...] Para um descongelamento rápido, embale o
frango num saquinho plástico e o ponha em uma bacia com água. Troque a água
constantemente, ou use o microondas.”
O descongelamento deve ser feito gradativamente, sob refrigeração, ou de forma
mais acelerada, com o uso do microondas, para não ocorrer perdas nutricionais. Esta
recomendação para o descongelamento poderá comprometer a integridade nutricional e sanitária
do produto. Portanto, “para não haver perdas de nutrientes”, como afirma o fabricante, este não
deveria orientar seu consumidor a proceder ao descongelamento embalando o frango em saquinho
plástico e o deixando em uma bacia com água. Esta informação, além de comprometida quanto a
sua coerência e clareza, leva o consumidor a erro.

Informações sobre o atendimento ao consumidor


Apesar de não ser exigido nenhum tipo de serviço de atenção ao consumidor na
rotulagem de alimentos, pela legislação em vigor, a oferta desse tipo de serviços pelos fabricantes

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foi também checada (Tabela 1). Ressalta-se que o Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC)
tem importante papel na aproximação entre produtor e consumidor, por ser um canal aberto para
melhorar a qualidade do produto e a satisfação do consumidor. Pôde-se observar que produtos
com menor tecnologia envolvida na produção, como mel e ovos, apresentaram menor
disponibilidade de serviços de ligações gratuitas para esclarecimentos aos consumidores, com
apenas seis (30,0%) e um (11,1%), respectivamente (Tabela 1).
Os endereços eletrônicos e acesso a páginas na Internet também foram encontrados
como meios de comunicação disponibilizados pelos produtores. Todavia esse acesso fica restrito
aos consumidores de nível educacional ou poder aquisitivo diferenciado. Quanto aos demais tipos
de SAC, foi encontrado em 69,2% do total de rótulos das lingüiças calabresa informações sobre a
disponibilidade de serviço de caixa postal. Em 37,1% dos rótulos de iogurte encontrou-se
informação do endereço eletrônico do produtor (e-mail), e em 43,5% das embalagens de leite
líquido havia indicação de endereço de página na Internet (Tabela 1).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Um adequado controle sanitário de alimentos requer a disseminação de informações
para o consumidor e o público em geral. A rotulagem, além de atender a objetivos mercadológicos
e de marketing, é importante veículo de informação em saúde para a sociedade, podendo
contribuir para a redução de problemas relativos à segurança no consumo de alimentos. Além da
obediência rígida a regras, o que requer fiscalização sistemática, nem sempre possível de ser
realizada com a abrangência e a qualidade requeridas, em um país de dimensões continentais
como o Brasil, é imprescindível a divulgação para a sociedade, por meio da mídia em geral, da
realidade da qualidade da rotulagem de alimentos. Estas ações poderão não só tornar o consumidor
mais consciente de seus direitos como também, seguramente, constituem-se no fator principal na
tarefa de controle da qualidade dos produtos comercializados.
Verificou-se também a permanência da prática cultural da venda de ovos a granel na
cidade de Barreiras, mesmo em supermercados. Desta maneira, o consumidor adquire o produto
sem nenhuma informação pertinente, devido à ausência de rótulos na embalagem. É possível que
fatores socioeconômicos e regulatórios contribuam para a permanência desta prática, como a
pouca informação sobre o risco sanitário, baixo poder aquisitivo e nível de escolaridade, e
insuficiente controle sanitário por parte dos órgãos competentes.
Apesar das limitações deste estudo, especialmente em relação a não ter sido usado
o processo aleatório de amostragem, a não inclusão de outros tipos de alimentos de origem animal
de grande consumo pela população, a não verificação do uso e compreensão das informações da

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Revista Baiana rotulagem pelos consumidores, e a avaliação apenas da existência de informações nutricionais,
de Saúde Pública
sem a comprovação com análises laboratoriais, acredita-se que tenha contribuído para demonstrar
alguns aspectos positivos, bem como algumas das principais deficiências relativas à rotulagem de
alimentos embalados de origem animal. Esses achados podem servir de instrumento para
informações aos serviços de controle sanitário de alimentos.
Por fim, a despeito das falhas ainda observadas quanto à identificação dos lotes e à
qualidade do rótulo (visibilidade da informação), observou-se uma preocupação do setor de
produção de alimentos de origem animal em atender ao preconizado na legislação vigente no
Brasil. Ainda assim, este estudo recomenda: adoção de providências relativas à alteração da
legislação, visando maior rigor na obrigatoriedade da declaração do número de lote nas rotulagens
de alimentos embalados, a exemplo da indústria farmacêutica; que os órgãos responsáveis pelo
controle sanitário dediquem maior atenção aos ovos, mel e lingüiça, principalmente este último,
devido à prática de fracionamento em alguns supermercados.

AGRADECIMENTOS
A todos os colegas do Centro Colaborador Instituto de Saúde Coletiva /Agência
Nacional de Vigilância Sanitária, pelo apoio para a elaboração deste trabalho, especialmente a sua
Coordenadora, Profa. Dra. Ediná Alves Costa. A Profa. Dra. Vilma Santana, pelas valiosas sugestões
e correções do texto final, nossos sinceros agradecimentos.

REFERÊNCIAS
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objetivas sobre o produto. Jus Navigandi 2002;57. Extraído de [http://
www.1.jus.com.br/pecas/texto.asp?id=501], acesso em [13 de abril de
2003].

13. Williams P. Consumer understanding and use of health claims for foods.
Nutr. Ver. 2005;63:256-64.

14. Brasil. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária.


Resolução RDC nº. 40, de 21 de março de 2001. Aprova o Regulamento
Técnico para Rotulagem Nutricional obrigatória de alimentos e bebidas
embalados, constante do anexo desta Resolução. Extraído de [http://
www.anvisa.gov.br], acesso em [25 de fevereiro de 2003].

15. Brasil. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária.


Resolução RDC nº. 360, de 23 de dezembro de 2003. Aprova Regulamento
Técnico sobre Rotulagem Nutricional de Alimentos Embalados, tornando
obrigatória a rotulagem nutricional. Extraído de [http://www.anvisa.gov.br],
acesso em [21 de abril de 2007].

Recebido em 8.5.2008 e aprovado em 8.8.2008.

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Revista Baiana Apêndice A
de Saúde Pública
Formulário para coleta de dados sobre a rotulagem de alimentos

v.32, n.2, p.218-231


maio/ago. 2008 231

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