Você está na página 1de 10

Módulo 1 | Aula 3

FORMAS LEGAIS DE CONSTITUIÇÃO


DAS ENTIDADES SEM FINALIDADE LUCRATIVA
E A ATUAÇÃO MAIS RECENTE DAS INSTITUIÇÕES
DO TERCEIRO SETOR.

AULA 3
INTRODUÇÃO
Nesta aula, te apresentarei formas legais de constituição das
entidades sem finalidade lucrativa e a atuação mais recente
das instituições do Terceiro Setor.

Para entendermos como chegamos até aqui, farei uma breve


retrospectiva.
AULA 3

Formas legais de constituição das entidades sem finalidade


lucrativa e a atuação mais recente das instituições do Terceiro Setor.

Acompanhamos a evolução das ações de caridade, filantrópicas ou beneficência desde a Antiguidade até a Idade
Contemporânea.

Esse processo de evolução se inicia com ações isoladas e pessoais, mais ligadas a necessitados relacionados às guerras ou
a catástrofes, já que naquela época os governos não tinham nenhuma função social, exceto a de proteção – com
relação a invasões de outros povos – e a de justiça, no julgamento de conflitos internos.

Ainda na Idade Média a realidade era muito próxima a essa. No entanto, a Igreja, por ser uma instituição mais bem
estruturada e com capilarização em diversos reinos, desenvolvia ações de caridade como acolhimento a órfãos,
enfermos e inválidos, por meio de conventos, mosteiros e paróquias.

Nos séculos XV e XVI, com o fim da Idade Média, já na Idade Moderna, o Renascimento e as Grandes Navegações
proporcionaram um maior contato entre as nações, permitindo troca de informações sobre as ocorrências em geral,
promovendo alterações nas estruturas da sociedade.

A partir do final do século XVIII, a Revolução Francesa e a Revolução Industrial proporcionaram uma mudança ainda
maior na sociedade, que deixou de ser integralmente subjugada pelos monarcas e passou a ter, aos poucos, alguns
direitos mais consistentes. Destaca-se, sobretudo, a ascensão dos burgueses, que eram os ricos comerciantes e sua
atuação nos setores político, econômico, social e assistencial. Já estamos falando da Idade Contemporânea.

Vieram da burguesia as ações filantrópicas, que além de abrirem o leque das ações de ajuda, incluindo a Ciência e a
Cultura, por exemplo, implantou essa nova modalidade que era representada pelo apoio financeiro às ações de
caridade, sem um envolvimento direto e em troca de reconhecimento.

As empresas, que até então eram de um ou dois donos e tinham suas obrigações fundidas com as dos proprietários,
com o desenvolvimento do comércio e da indústria, cresceram e começaram a ter direitos e deveres próprios, distintos
de seus donos.

O direito que originariamente era voltado para a Pessoa Natural, que conhecemos como Pessoa Física, começa a
considerar as obrigações das empresas de forma distinta das obrigações de seus donos. Esse foi o embrião da Pessoa
Jurídica, que acabou por transferir, também, o dever de pagar impostos.

Com o entendimento de que entidades têm direitos e deveres independentes das pessoas que a dirigem, tanto
empresas como governos, começam a se consolidarem como Pessoas Jurídicas.

Assim, as Pessoas Jurídicas Públicas, ligadas aos Governos, formavam um grupo com características próprias de
atendimento à população em geral. As Pessoas Jurídicas Privadas, ligadas às empresas, também com características
próprias, porém com fins de lucro, formavam outro grupo. Um, ficou conhecido como Primeiro Setor. O outro, como
Segundo Setor.
Acontece que esse processo de consolidação das entidades como Pessoa Jurídica também foi chegando aos grupos que
se propunham às atividades filantrópicas. Até porque, aquelas ações individuais e locais tinham ganhado corpo,
passando a atuar de forma mais sistematizada, com grupos de colaboradores significantes e, algumas vezes, em mais
de uma localidade.

Por ter se formado depois dos dois primeiros grupos, governo e empresas, as entidades sem finalidade lucrativa, mas de
atendimento às necessidades da sociedade, ficaram conhecidas como Terceiro Setor. Feita essa retrospectiva, vamos
ao tema desta aula.

Quais as formas legais de se constituir uma entidade sem fins lucrativos.

Em nosso Código Civil de 1916, já havia a previsão de entidades filantrópicas, nas figuras de Associações e Fundações.
Mas qual era a diferença entre as duas entidades? Você sabe?

A constituição de uma Associação era feita a partir da reunião de um grupo de pessoas que tivesse um objetivo
filantrópico ou caritativo. Após iniciar suas atividades, deveriam procurar formas de se autossustentar, seja por meio de
doações, seja por prestação de serviços que gerassem renda para a autossustentação. Muitas vezes essa Associação
começava informalmente, como já vimos anteriormente, para, depois, com o seu crescimento, ser registrada como
Pessoa Jurídica.

As pessoas que a constituíam eram seus associados. Deveria haver um Estatuto, que é o documento que define as
finalidades e a forma de atuação da entidade. Dessa forma, os associados poderiam se organizar e atuar como
quisessem, desde que estivesse de acordo com seu Estatuto e, logicamente, com o Código Civil. O nível de autonomia
era muito grande.

Já a Fundação, para ser constituída, era bem mais complexo. O primeiro obstáculo, era que a fonte de recursos que
permitia a sua autossustentação deveria existir e ser sinalizada já no ato de sua constituição.

Como esse recurso deveria ter a finalidade exclusiva de sustentar a Fundação, para que isso fosse assegurado vinculou-
se as Fundações ao Ministério Público. Explicado de outra forma, como a gestão de uma fundação envolvida recursos
financeiros de destinação específica, com a possibilidade de mal-uso ou má gestão, as fundações eram veladas pelo
Ministério Público.

Cabe a explicação que o Ministério Público é o órgão responsável por zelar pelos interesses da sociedade em geral. Isto
também justifica sua independência de outros poderes.

Lembre-se que, na aula passada, falamos que as entidades sem finalidade lucrativa eram privadas, mas de interesse
público. E é justamente essa característica que leva o Ministério Público a velar pelas fundações. Isso, na prática,
significa que todas as atividades de uma fundação passam pela aprovação do Ministério Público.

Já no momento da constituição, tanto o Estatuto, como a Ata de constituição, incluindo seus membros, devem passar
pelo seu aval do MP. Depois, no seu dia a dia, é comum dar ciência de deliberações de assembleias e/ou situações
atípicas ao MP. E, por fim, anualmente, há a apresentação de Plano de Ação e Prestação de Contas ao MPO. Nesse
sentido, existe um auditor externo, qualificado pelo MP, mas contratado pela fundação, que deve dar parecer sobre as
Prestações de Contas.

2
De uma forma bem resumida, a diferença entre Associações e Fundações pode ser resumida à necessidade ou não de
assegurar seu custeio ou sobrevivência no ato de constituição e a existência de vínculo direto com o Ministério Público.

- Mas, se é tão mais simples constituir e gerir uma Associação, por que se dar ao trabalho de constituir uma fundação?

É uma boa pergunta! Já até ouvi, uma vez, o comentário: “prá que vou arrumar sarna pra me coçar?”
Mas vamos ver por outro ângulo!

Imagine que você é um grande empresário, ou empresária, que possui uma fortuna enorme. De repente, perde seu
filho único e seu cônjuge, em um curto espaço de tempo, para uma doença que ainda não tem cura. Então você decide
que grande parte de sua fortuna será destinada a criar uma entidade de pesquisa que busque a cura dessa doença. Mas
você quer ter certeza de que os recursos serão utilizados de forma correta e para os objetivos destinados, mesmo após
sua morte.

Bom, se você criar uma Associação, você terá controle dela enquanto for vivo. Mas, depois, dependerá daquele que
estiver à frente da Associação. Caso essa pessoa deseje altera a finalidade da Associação para cuidar de gatos
abandonados na rua, estará livre para fazê-lo. Basta convocar uma assembleia e aprovar a alteração. No entanto, se for
uma fundação, isso somente ocorrerá com aprovação do Ministério Público.

Talvez seja um exemplo muito trágico. Mas mesmo que ninguém morra, para assegurar o seu desejo de destinar parte
de seu patrimônio ou dos resultados de sua empresa para uma causa social, caso você não tenha a quem confiar essa
tarefa, a melhor opção é uma fundação.

Do contrário, se você tem a disposição de ajudar ao próximo, mas não tem como assegurar a sustentabilidade de sua
iniciativa, ainda que você conte com alguns amigos e familiares, o ideal é constituir uma associação.

Não é uma questão de certo ou errado, melhor ou pior. É uma questão do que é mais adequado para uma situação.

Bom, como falei, o Código Civil era de 1916. O mundo foi evoluindo. A sociedade se reestruturando. E o Terceiro Setor
também.

Também já falei que essas mudanças ocorriam em ritmos diferentes em cada parte do mundo. Porém, uma alimentava
ou estimulava a outra.

No Brasil, a população urbana foi aumentando aos poucos, assim como o processo de industrialização do país. E, em
1942, no governo Vargas, foram criados o Conselho Nacional de Serviço Social – CNAS e a Legião Brasileira de
Assistência – LBA. Talvez tenha sido o primeiro passo mais estruturado do governo em direção a assumir um papel
mais atuante na promoção da Assistência Social.

Nos anos 80, as organizações sem finalidade lucrativa começaram a ser mais presentes na vida da sociedade brasileira
em geral. Talvez o grande momento de destaque, foi em 1992, por ocasião da Rio 92, evento ambiental de
abrangência mundial, organizado pela ONU.

Naquela época, ainda sob a vigência do Código Civil de 1916, as entidades sem fins lucrativos eram chamadas,
genericamente, de ONG’s – Organizações Não Governamentais. E, como dito, as ONG’s ou eram Associações ou eram
Fundações.

3
Mas a população não tinha esse conhecimento, então era comum perguntar se a entidade era uma Associação ou uma
ONG, como se fossem coisas diferentes. Da mesma forma, outras denominações genéricas começaram a surgir e
confundir os leigos. Não era de conhecimento público que Centros, Institutos, Núcleos, entre outras designações,
apenas serviam para nomear uma Associação.

Aqui cabe uma observação, as Fundação devem trazer especificado em seu nome o fato de ser uma fundação. Dessa
forma, sempre que for uma fundação, você saberá pelo nome. Como exemplo, Fundação Getúlio Vargas, Fundação
Roberto Marinho e Fundação Gol de Letra.

Talvez você se surpreenda em conhecer a diversidade de entidades que são ONG’s, ou seja, são entidades sem
finalidade lucrativa – Associações ou Fundações. São exemplos de ONG’s, na forma de associação, a Academia
Brasileira de Letras, a Pontifícia Universidade Católica – PUC e grande parte das universidades privadas, o Grêmio
Recreativo Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira e demais escolas de samba ou bloco carnavalescos, o
Museu de Arte de São Paulo - MASP, o América Futebol Clube e outros times de futebol, Confederação Brasileira de
Futebol - CBF, o Centro de Diretores Lojistas - CDL, entre outros.

Com o crescimento e estruturação das entidades sem fins lucrativos, os anos 80 e 90 viram os reflexos nos três setores.
O Primeiro Setor, o governo, aproveitou a capilaridade, ou seja, a abrangência que as entidades tinham pelos interiores
do país, e estabeleceu uma série de parcerias para atender às necessidades da população.

O Segundo Setor, as empresas, perceberam que as entidades sem finalidade lucrativa poderiam ajudá-las na divulgação
de sua imagem, bem como no atendimento de uma prática que começou naquela época, chamada Responsabilidade
Social. Isso tudo contando, ainda, com a possibilidade de utilizar parte do Imposto a ser recolhido ao governo.

Por fim, o Terceiro Setor, que aproveitou o interesse dos outros dois setores e se estruturou administrativa e
financeiramente.

Tudo estava indo muito bem. Quase o paraíso. Porém, como acontece muitas vezes, diante da facilidade, houve quem
resolveu tirar proveito.

Tanto houve quem montasse uma entidade sem fins lucrativos para manter contratos suspeitos com o governo, como
para prestar serviços sem pagar impostos, ou, ainda, para aproveitar os impostos que sua empresa pagaria para fazer
marketing ou tirar outros proveitos. Assim, houve uma sucessão de escândalos envolvendo o Terceiro Setor, que ficou
desgastado junto à opinião pública.

Como reação a esses episódios negativos, visando identificar as instituições que desenvolviam trabalhos consistentes, o
Terceiro Setor começou a se organizar corporativamente, com a criação de entidades que o agrupasse por área de
atuação, região geográfica ou outros pontos em comum. Surgiram a ABONG – Associação Brasileira de ONG’s, o GIFE
– Grupo de Institutos, Fundações e Empresas, a Confederação Brasileira de Fundações e a Federações Estaduais de
Fundações, entre outras.

Paralelamente, o governo iniciou uma série de reformulações nas regras de parceria com o Terceiro Setor, além de
algumas Leis específicas para regular essa relação. Foram criadas as qualificações de Organizações Sociais – OS, em
1998, e de Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP, em 1999.

4
Além disso, em 2002 é aprovado o Novo Código Civil, que entra em vigor no ano de 2003. São várias atualizações,
mas, no campo do Terceiro Setor, a inovação fica por conta de novos tipos de Pessoa Jurídica sem finalidade lucrativa,
que passam a ser as associações, as fundações (criadas por iniciativa privada), as organizações religiosas e os partidos
políticos.

Esses dois últimos se enquadravam, anteriormente como associações ou fundações. No entanto, por sua
especificidade, passaram a compor grupo diferenciado, atendendo a diferenças legais na sua composição e gestão.
Dessa forma, voltamos as velhas associação e fundação. A menos que você faça parte ou trabalhe em uma organização
religiosa ou partido político.

Mas cabe uma observação, no que tange às fundações. Não foi à toa que citei que estamos nos referindo às fundações
criadas por iniciativa privada. Algumas fundações foram criadas e são mantidas pelo poder público. Essas são
equiparadas às autarquias e, portanto, são do Primeiro Setor. Todo o seu regramento e gestão estão ligados à
Administração Pública.

São exemplos de fundações públicas a Fundação João Pinheiro, em Minas; a Fundação Escola do Serviço Público – FESP,
no Rio de Janeiro; e, a Fundação Casa, em São Paulo.

Bom, agora você já tem uma boa noção de como a filantropia se desenvolveu através do tempo, e como se
desenvolveu no Brasil até o início deste milênio. Já sabe, também, como podem ser constituídas as entidades sem fins
lucrativos.

Então vamos falar de uma sopa de letrinhas: ONG, OSC, OS, OSCIP!

Já vimos que ONG significa Organização Não Governamental, que era como as entidades sem fins lucrativos eram
chamadas. Com o passar do tempo, a denominação ONG passou ser questionada, já que não expressava o que as
entidades realmente eram.

Você já percebeu que a expressão apenas diz o que ela não é?!
Organização Não Governamental!

Ora, as empresas e cooperativas, por exemplo, também não são governamentais. Nem por isso são sem fins lucrativos.
Atualmente, criou-se a denominação Organizações da Sociedade Civil - OSC, que parece, finalmente, representar as
Associações e Fundações.

Dessa forma, simplificando a expressão “entidade sem finalidade lucrativa” e corrigindo a expressão “ONG”, podemos
utilizar, simplesmente, OSC. É assim que chamaremos daqui para frente.

Outra grande confusão são os títulos concedidos às OSC’s.

Veja bem, OSC é o nome das entidades que podem ser constituídas como associações ou fundações. Dessa forma,
como as fundações têm que ter o termo “Fundação” em seu nome, as demais OSC serão associações, não importando
se são chamadas de Instituto, Núcleo, Centro, Unidade ou algo similar.

Outra situação são os títulos ou qualificações.


Já que a gente falou de Pessoa Física e Pessoa Jurídica, vou fazer uma analogia.

5
Você é um ser humano, uma pessoa. Se estuda e se forma em Engenharia, passa a ser um engenheiro. Não deixou de
ser uma pessoa. Apenas ganhou o título de Engenheiro. Ou se qualificou para ser um Engenheiro.

A mesma coisa acontece com as OSC. Elas serão sempre OSC. Mas pode se qualificar para ter direito a determinada
atuação. Assim, uma OSC pode obter o título de Utilidade Pública, Filantropia, OS e/ou OSCIP.

Muitas dessas qualificações podem ocorrer nas esferas municipal, estadual ou federal. E, assim como um curso de
Engenharia é diferente de um curso de Medicina, cada titulação ou qualificação irá exigir diferentes competências da
OSC.

Bom, espero que você tenha aproveitado todas a informações. Lembre-se que você pode assistir às aulas quantas
vezes quiser. E, caso tenha dúvidas ou comentários, envie pelo e-mail duvidas@projetocapacitar.com.br.

Até a próxima aula.

Você também pode gostar