Você está na página 1de 89

TEORIA GERAL DO DIREITO PRIVADO (2/2016)

PROFESSORA ANA FRAZÃO


CADERNO CECÍLIA ROSAL (2˚ BIMESTRE)

10/10 (segunda-feira) – ROTEIRO 8


PESSOAS JURÍDICAS: União de pessoas ou de bens, organizada para a obtenção de
fins comuns.
Seres ideais que, ao lado das pessoas físicas, também podem ter direitos e obrigações.
Por trás das pessoas jurídicas, existe uma ideia muito comum de que a união faz a força:
pessoas jurídicas envolvem uma série de atividades segundo as quais uma pessoa natural,
em razão das suas limitações naturais (de patrimônio, de esforço), não pode fazer sozinha
e, quando essas pessoas se unem, elas são capazes de unir esforços, unir patrimônio, ampliar
seu centro de imputação (cuja existência transcende a de seus fundadores).
A pessoa natural tem uma personalidade que acaba com a morte. A pessoa jurídica não
necessariamente. A pessoa jurídica pode durar 100, 200.. anos. Ela pode ser criada para ter
uma existência por tempo indeterminado, desde que sua estrutura organizacional
possibilite essa manutenção.
Teorias das pessoas jurídicas: a adoção de uma ou outra teoria gera implicações práticas:
países que adotam teorias mais rigorosas, tendem normalmente a prever mais requisitos para a
criação das pessoas jurídicas; os países que tendem a adotar teorias menos rígidas, tendem a
ter uma legislação mais flexível (esse último é o caso do Brasil – temos uma legislação
relativamente flexível na criação de pessoas jurídicas e é por essa razão que temos tantos
problemas em torno das pessoas jurídicas aqui).
Requisitos necessários para a criação das pessoas jurídicas: Há basicamente três sistemas,
dois extremos e uma alternativa intermediária (adotada pelo Brasil):
- Teoria extrema da livre constituição: cunho liberal; valoriza a autonomia
privada – sustenta que as pessoas jurídicas devem ser livremente criadas. Crítica: Isso é viável
do ponto de vista prático? A pessoa jurídica envolve a criação de um novo centro de
imputação, ela é criada para agir com terceiros, então qual segurança esses terceiros poderiam
ter se a criação de pessoas jurídicas fosse totalmente livre e sem nenhum tipo de respaldo
estatal? Seria totalmente inexequível, pois na criação de uma pessoa jurídica cria-se um novo
centro de imputação, com patrimônio próprio, que vai assumir obrigações e que, portanto,
precisa ter alguns cuidados.
Obs1.: Cuidado inclusive na sua constituição (CF, por exemplo, é uma forma de se entender o
que é a União federal como pessoa jurídica de direito público; é um ato constitutivo, apesar de
ter outras funções, como garantia de direitos). Constituição reflete como se organiza essa
pessoa jurídica –quem fala por ela, quem são a boca e as mãos dela, como se organiza, quais
são seus objetivos– já que isso não é uma realidade autoevidente e precisa ser exteriorizado
para poder se entender que tipo de ser é aquele. É por isso que todas as pessoas jurídicas têm
seus atos constitutivos (associações e fundações têm seus estatutos – é o que diz o que é
aquela pessoa jurídica, qual o nome dela, porque ela foi criada, quais são suas finalidades,
como ela é organizada, quem pode e que não pode falar por ela) Assim, a livre criação não
daria a mínima condição de os terceiros entenderem que pessoa jurídica é aquela, já que
a pessoa jurídica necessariamente precisa de um ato constitutivo, que possa ser de
conhecimento de terceiros. As pessoas jurídicas jamais são um fim em si mesmas, elas são
criadas para atender a um fim, que consta nos seus atos constitutivos.
No caso de pessoas físicas, não há necessidade de ter uma constituição, pois elas são um fim
em si mesmas. Minha boca fala por mim, minhas mãos manifestam a minha vontade, eu não
preciso determinar qual o objeto ou a atividade que justifica a minha existência.
Obs2.: pode-se criar associações a todo momento, porquanto nem toda associação é
personificada, i.e., a exigência da personificação não tem a ver propriamente com a questão
da associação. A questão é em que momento e observando quais requisitos é que essas novas
associações podem ser um novo centro de imputação.
- Teoria extrema da restrição excessiva: só poderia haver criação de pessoas jurídicas
com autorização do Estado. Crítica: dizer que o Estado precisa autorizar pode restringir
consideravelmente a autonomia privada.
- REGIME DAS DISPOSIÇÕES NORMATIVAS: a lei tem disposições normativas
mínimas para cada tipo de pessoa jurídica, a partir dessas disposições as partes criam
seus respectivos atos constitutivos (contrato social para as sociedades, estatuto para
associações e fundações) e submetem esse ato constitutivo ao registro público. É a partir
desse registro que se tem a aquisição da personalidade jurídica (autoridade responsável
pelo registro vai verificar se aquele ato constitutivo de fato corresponde às disposições
normativas, i.e., se atende aos requisitos legais mínimos para a constituição daquela pessoa
jurídica).
Obs.: Existe um certo controle de legalidade formal, mas sempre se trata de um ato vinculado.
Se o ato constitutivo preenche os requisitos legais, o registro não tem outra opção senão
deferir a concessão de personalidade jurídicas, ele não tem nenhuma discricionariedade para
avaliar mais a fundo a conveniência ou a pertinência daquela pessoa jurídica.
Brasil: por meio do regime das disposições normativas, acabou adotando uma orientação
intermediária entre essas duas posturas extremas: não é só a autonomia privada, pois se tem
que submeter o ato constitutivo a registro, mas ao mesmo tempo não é propriamente uma
autorização estatal, porque no regime das disposições normativas o controle que o Estado tem
é muito reduzido (ato constitutivo, atendendo aos requisitos legais mínimos (pequenos, diga-
se de passagem) já autoriza o registro e a consequente concessão de personalidade jurídica).
Pessoas jurídicas, em princípio, 1) não são fins em si mesmas, 2) personalidade mais restrita,
sempre têm capacidade, 3) registro é constitutivo, 4) regra geral do sistema brasileiro é o
regime das disposições normativas, porém há algumas exceções.
Efeitos do registro: Registro, para a pessoa jurídica, tem efeito muito distinto que o efeito
para a pessoa natural.
Pessoa natural (registro = certidão de nascimento) – efeito declaratório: personalidade
da pessoa natural começa com o nascimento com vida (há quem suporte que mesmo desde a
concepção – art. 2º). Pessoas que não têm registro ainda são pessoas, só não têm registro.
Pessoa jurídica – efeito constitutivo – não há pessoa jurídica sem registro dos seus
atos constitutivos.
Pessoa jurídica, pelo simples fato de não ser um fim em si mesma, tem personalidade
jurídica mais restrita que a pessoa natural, o que faz com que ela sempre tenha
capacidade.
Em termos de personalidade, a pessoa jurídica é muito mais limitada que a pessoa
natural (ainda que ela possa ter direitos de personalidade, esses direitos são muito mais
restritos que os direitos de personalidade das pessoas naturais).
Em relação às pessoas jurídicas, não há aquela discussão sobre incapacidade, pois não
faz sentido que o ordenamento crie pessoas jurídicas sem que elas possam exercer
diretamente seus deveres e obrigações. Claro que elas precisarão de pessoas naturais para agir
por elas, mas aqui não é propriamente um caso de representação.
Embora a regra do sistema brasileiro seja o regime das disposições normativas, há algumas
EXCEÇÕES, em que aí sim se exige a autorização do Estado. Quando se fala em
autorização, é um ato que vai muito além do mero controle formal de atos constitutivos, como
ocorre no registro (há interesses sociais muito importantes w, por isso justifica-se).
Ex.: Fundações – para que haja uma fundação, o MP tem que aprovar o estatuto dessa
fundação. É uma pessoa jurídica que, em razão do seu grau de abstração envolver tantas
delicadezas do ponto de vista do seu gerenciamento, que o próprio MP tem que velar e
supervisionar o andamento dessas conduções.
Ex2.: Sociedades por ações abertas – companhias que negociam suas ações no
mercado de capitais, como a bolsa de valores. Como aqui há o problema de captação da
poupança popular, para que haja criação de uma companhia aberta, a comissão de valores
mobiliários (CVM) precisa autorizar essa pessoa jurídica e, para essa autorização, analisa-se
não apenas questões jurídicas, mas também questões econômicas (saber se aquele
empreendimento é viável, do ponto de vista econômico, a ponto de justificar a captação da
poupança popular).
Empresário individual e MEI (microempresário individual (≠ empresário social)): têm CNPJ,
são equiparados a pessoas jurídicas, mas não são pessoas jurídicas!
Empresários individuais adotam CNPJ mas não são PJ (nada impede que o legislador
equipare a pessoa natural a PJ para fins específicos). MEI, em tese, não é PJ (é pessoa física,
visa a benefícios tributários). Eireli necessariamente é PJ. Finalidade da Eireli é criar
separação patrimonial perfeita para o empresário individual. Apesar de ser essa a intenção, é
difícil de operacionalizar isso na prática.
Do ponto de vista empresarial, uma das grande importâncias é assegurar a chamada
separação patrimonial perfeita: uma vez formada a pessoa jurídica, só o patrimônio dela
responde pelas dívidas das suas atividades, não mais o patrimônio dos sócios.
Responsabilidade limitada: surge na Idade Média como forma de estimular o
investimento – ninguém vai investir em atividades de risco se souber que seu patrimônio
individual está sujeito ao risco do empreendimento.
Ex.: sociedade de responsabilidade limitada – não somente os sócios tem blindagem
patrimonial, mas também a sociedade. Se um sócio tiver devendo como pessoa física, a
sociedade não pode responder pelas dívidas do sócio.
Socialização parcial do risco empresarial – parte-se da premissa de que a atividade
empresarial, o estímulo ao risco, é algo do interesse de todos e, em razão disso, é razoável que
haja essa socialização parcial do risco = os sócios assumem parte do risco pois eles têm que
compor o contrato social. A partir do momento em que a sociedade não têm mais
patrimônio, quem sofre o prejuízo são os credores dessa pessoa jurídica (por isso
socialização parcial, os credores passam a sofrer os efeitos do risco).
Obs.: Empresário individual responde por todo o patrimônio, ele não tem nenhuma proteção
patrimonial específica. Ele está somente sujeito às proteções patrimoniais do cidadão comum
(como a impenhorabilidade do bem de família).
Além da separação patrimonial perfeita que existem em sociedades, essa separação
patrimonial perfeita existe em outras pessoas jurídicas. Associação é pessoa jurídica que tem
patrimônio próprio (por isso as pessoas se sentem tão confortáveis para fazerem parte de
associações). Associados jamais terão que responder pelas dívidas da pessoa jurídica.
Separação patrimonial perfeita tem importância muito grande, para negócios, na ótica
empresarial, mas também para a dinâmica das relações privadas, que não tem essa intenção
econômica – é isso que nos dá tranquilidade para nos associarmos a pessoas jurídicas, porque
sabemos que elas têm patrimônio próprio e é só o patrimônio dela que responde por suas
dívidas.
Nas sociedades que há esse critério misto (separação patrimonial perfeita e
imperfeita). A regra para as fundações e associações é a separação patrimonial perfeita.
Embora haja a separação patrimonial perfeita (ideia de que pessoa jurídica tem seu
patrimônio próprio, nem o sócio responde pelas dívidas da pessoa jurídica nem a pessoa
jurídica responde pelas dívidas dos sócios), é importante destacar que no direito brasileiro a
personalização não é apenas uma técnica de separação patrimonial absoluta ou perfeita. Ela
também é usada na separação patrimonial relativa ou imperfeita.
Ex.: sociedade em nome coletivo/sociedade em comandita (em relação a alguns sócios
a separação é imperfeita) – responde pelas dívidas da pessoa jurídica prioritariamente o
patrimônio da pessoa jurídica. Mas, se a pessoa jurídica não tiver patrimônio,
automaticamente os sócios já respondem subsidiariamente por aquela dívida. Separação
imperfeita pois, em princípio, vai para o patrimônio da pessoa jurídica (reconhece-se que há
um patrimônio distinto e que responde prioritariamente), porém, nao havendo patrimônio da
pessoa jurídica, automaticamente já entra o patrimônio dos sócios.
Em relação a esses casos não há nem necessidade de se falar em desconsideração da
pessoa jurídica (forma que se tem de flexibilizar a separação patrimonial para imputar ao
sócio uma responsabilidade pela pessoa jurídica). Não se faz isso nessa hipótese de sociedade
em nome coletivo pois já é uma consequência necessária do próprio tipo de sociedade, aqui o
sócio já responde naturalmente quando a pessoa jurídica não tiver patrimônio.
Embora a maior importância da pessoa jurídica se dê nessas hipóteses de separação
patrimonial perfeita, há também a possibilidade de separação patrimonial imperfeita. Isso nos
ajuda a entender de fato o que é a pessoa jurídica – é um novo centro de imputação para todos
os efeitos (responsabilidade civil, responsabilidade administrativa e hoje cogita-se até mesmo
responsabilização criminal); ela terá uma vontade que irá se manifestar por meio dos seus
órgãos (que pode até ser convergente, mas não se confunde com a vontade de seus sócios); ela
tem patrimônio próprio; ela tem responsabilidade própria.
Relação entre pessoa jurídica e qualidade de sujeito: embora haja controvérsias, há a ideia
de que o direito brasileiro não trabalha com uma dualidade entre subjetividade e
personalidade, i.e., não trabalha com a ideia de que só sou sujeito de direito se sou pessoa
(seja pessoa natural seja jurídica).
Não necessariamente todos os países tratam desse assunto da mesma maneira. Em
alguns países há subjetividades que não são personalidades, i.e., personalidade é como se
fosse uma escala mais sofisticada no processo de ser sujeito. Nesses países, é possível que
haja sujeitos personalizado e sujeitos não personalizados. NÃO é o que acontece no Brasil
Aqui, para ser sujeito, há necessidade antes de ser pessoa (subjetividade e personalidade
acabam sendo sinônimos).
O que pode acontecer é que, assim como acontece com o nascituro, o
ordenamento confira capacidade processual a algumas coletividades que não são
propriamente uma pessoa, não titulariza direitos, mas pode ser autor e réu de ações).
Ex.: condomínios edilícios – têm capacidade processual, podem ser
autores e réus de ações, mas não são pessoas jurídica.
Sobre a importância do registro:
Art. 45. Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato
constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder
Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo.
Art. 46. O registro declarará:
I - a denominação, os fins, a sede, o tempo de duração e o fundo social, quando houver;
II - o nome e a individualização dos fundadores ou instituidores, e dos diretores;
III - o modo por que se administra e representa, ativa e passivamente, judicial e extrajudicialmente;
IV - se o ato constitutivo é reformável no tocante à administração, e de que modo;
V - se os membros respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais;
VI - as condições de extinção da pessoa jurídica e o destino do seu patrimônio, nesse caso.
Essas disposições dos incisos devem constar no ato constitutivo. Nada disso é
evidente, cada pessoa jurídica tem que esclarecer esses aspectos no seu ato constitutivo
(finalidade lucrativa ou não lucrativa? Qual o objetivo específico? Como essa pessoa vai se
organizar? Quem fala por ela? Quem são seus órgão? Qual seu nome? Onde é seu domicílio)
Uma série de informações que não são necessárias para os seres humanos e que são
necessárias para a pessoa jurídica (no nosso registro de pessoa natural consta basicamente
nome, data de nascimento, local, filiação, sexo e cor – porque nós somos fins).
Artigo que trata da constituição das pessoas jurídicas, das informações fundamentais
que definirão esse centro de imputação e darão para os terceiros as informações necessárias
sem as quais eles não teriam como agir em nome da pessoa jurídica.
TEORIA DOS ÓRGÃOS: Pessoa natural manifesta sua vontade se utilizando do seu próprio
corpo (eu escrevo, eu assino, eu manifesto verbalmente minha vontade, eu tenho recursos que
fazem parte do meu próprio corpo que me possibilitam fazer isso e, caso eu seja incapaz, há
um representante ou um assistente). As pessoas jurídicas também precisarão de órgãos para
agir o problema é que esses órgãos não são evidentes como são nas pessoas naturais – por
isso a lei vai determinar alguns órgãos obrigatórios e, naquilo que a lei não dispuser de forma
obrigatória, as pessoas jurídicas terão ampla autonomia para criarem órgãos.
Ex.: associação: lei prevê um órgão obrigatório para as associações, que é a
assembleia geral (encontro de todos os associados) – lei diz que, em algumas matérias, só a
assembleia delibera (reforma de estatuto é competência privativa da assembleia, por exemplo.
Assim como nós, pessoas naturais, precisamos de órgãos para exercermos nossa
vontade, também é para as pessoas jurídicas. Apenas que esses órgãos das pessoas jurídicas
são formados por pessoas naturais e a pessoa jurídica tem que atender a alguns requisitos
legais obrigatórios, mas também tem uma margem muito grande para constituir outros órgãos
e estabelecer uma forma própria de funcionamento. São as pessoas que constituem a pessoa
jurídica, na sua autonomia privada, que podem dizer como as PJ poderá agir ou não. Essa
ação é chamada por Pontes de Miranda de:
PRESENTAÇÃO:
Pontes de Miranda: quando se fala em representação, há uma dualidade muito clara – há duas
pessoas com suas vontade, mas como uma não pode manifestar ou exercer validamente sua
vontade, a outra vai manifestar por ela.
Na presentação não há essa dualidade. A pessoa jurídica não tem outra vontade que não
aquela que é manifestada pelos seus órgãos.
Pessoa jurídica, exatamente por não ser um fim em si mesma é constituída para atender a uma
finalidade específica e, para isso, terá órgãos que poderão manifestar a sua vontade, i.e., que
presentem a sua vontade. Esses órgãos passam a manifestar não seus interesses próprios, mas
os interesses da pessoa jurídica.
Claro que às vezes há convergência entre a vontade da pessoa jurídica e o interesse
dos sócios, mas convergência não é coincidência e, a partir do momento em que se tem um
novo centro de imputação, todas as pessoas naturais que fazem parte desse novo centro vão
ter que submeter seus interesses pessoais ao interesse da pessoa jurídica.
13/10 (quarta-feira) – FINAL ROTEIRO 8
SIMULAÇÃO 18 E 19
Concorrência de culpas/ culpa concorrente da vítima – não afasta a responsabilidade civil,
o que afasta é a culpa exclusiva (o médico errou porque não informou, mas a vítima também,
porque não leu a bula). Admite-se a responsabilidade do médico, mas a concorrência de culpa
vai ter um desdobramento no valor da indenização.
Eles entraram com uma ação contra a pessoa jurídica. Isso se justifica pelo: Art. 932, CC: São
também responsáveis pela reparação civil, III - o empregador ou comitente, por seus
empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão
dele; (respondem objetivamente pelos atos dos seus empregados e prepostos).
A pessoa jurídica não tem como agir senão por meio de pessoas naturais, sendo os
empregados de uma empresa importantes mecanismos por meio do qual essas pessoas
jurídicas agem na vida civil. É razoável, portanto, que se impute à própria pessoa jurídica os
danos causados por um empregado/preposto, representante da pessoa jurídica.
Da mesma forma que os pais respondem objetivamente pelos atos ilícitos dos filhos
menores, imputa-se a uma pessoa que não praticou diretamente o ilícito as consequências
desse ilícito em razão da proximidade que ela tem com ofensor (relação de paternidade,
relação de emprego/preposição). Isso no campo da responsabilidade extracontratual.
No campo da responsabilidade contratual, há uma regra do art. 47, sujeita a algumas
modulações.

Desconsideração ≠ despersonalização
DESCONSIDERAÇÃO não é extinção da pessoa jurídica, é só desconsiderar pontualmente
um dos efeitos da pessoa jurídica, no caso, a separação patrimonial perfeita. É a suspensão
parcial da separação patrimonial perfeita em relação a uma obrigação específica (pessoa
jurídica continua existindo, separação patrimonial perfeita continua existindo em relação a
todas as outras dívidas que não aquela que justificou a desconsideração; os sócios continuam
respondendo limitadamente mas, nesse caso específico, os sócios responderão pela dívida
da pessoa jurídica).
Só faz sentido na separação patrimonial perfeita. Na separação patrimonial
imperfeita os sócios já naturalmente respondem pelas dívidas da sociedade/pessoa jurídica,
ainda que subsidiariamente, i.e., se a pessoa jurídica não tem patrimônio automaticamente o
credor já pode direcionar sua pretensão contra os sócios. Porém, em sociedades limitada, em
associações, em fundações, há uma separação patrimonial perfeita sócios não respondem, via
de regra, pelas dívidas de uma sociedade limitada, assim como associados não respondem
pelas dívidas de uma associação e administradores de uma fundação não respondem pelas
dívidas desta.
A desconsideração pretende, portanto, suspender a separação patrimonial perfeita em
relação a uma obrigação específica. Quando isso ocorre, não se está acabando com a
separação patrimonial perfeita, só se está suspendendo-a para aquele efeito específico. Outro
credor, se quiser acesso ao patrimônio dos sócios, vai ter que entrar com sua própria ação e
pedir isso.
O que justifica a desconsideração desvio de finalidade: pelo art. 50 do CC (cláusula
geral de desconsideração da personalidade jurídica)
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão
patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no
processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares
dos administradores ou sócios da pessoa jurídica. TEORIA MAIOR DA DESCONSIDERAÇÃO

Numa sociedade, a desconsideração atinge sócios e administradores; numa


associação, atinge associados e administradores; numa fundação, que não tem base
patrimonial, só pode atingir administradores (únicas pessoas naturais responsáveis pela
condução daquelas atividades). Como o foco desse artigo é as sociedades, ele só menciona os
sócios, mas a doutrina entende que por sócio se entende sócio lato sensu, abrangendo também
o associado.
Pressuposto material da desconsideração: desvio de finalidade (explícito no art. 50)
Pressuposto funcional da desconsideração (implícito no art. 50): insuficiência
patrimonial da pessoa jurídica. Se a pessoa jurídica tem patrimônio não faz sentido que o
credor queira exercer qualquer tipo de pretensão contra os sócios.
Combinação de dois fatores, portanto, no art. 50: insuficiência patrimonial da pessoa
jurídica (credor sabe que ele não tem como satisfazer o seu crédito apenas com o patrimônio
da pessoa jurídica) + há um ilícito, há um desvio de finalidade (entender quais as finalidades
sociais, econômicas que justificam a criação dessa pessoa jurídica e, sempre que houver um
desvio dessa finalidade, estaríamos diante de uma hipótese de desconsideração.
Observa-se aqui os mesmos parâmetros da discussão de abuso de direito
(vedação de excesso, por exemplo). Embora o dolo, a fraude sejam importantes hipóteses para
o abuso de direito, não necessariamente só haverá abuso/desvio de finalidade em hipóteses
intencionais. Pode haver desvio de finalidade culposos (sócios, associados, administrador não
tinha intenção, mas agiu de forma imprudente, negligente, e acabou causando esse tipo de
desvio).
Desvio de finalidade OU confusão patrimonial – não são hipóteses distintas.
A confusão patrimonial é uma hipótese clara de desvio de finalidade da separação patrimonial
perfeita (pessoa jurídica tem patrimônio próprio que só pode ser utilizado para atender às suas
próprias finalidades. Quando os sócios de uma pessoa jurídica começam a se utilizar do
patrimônio dela para pagar suas despesas pessoais, tem-se um caso claro de confusão
patrimonial) a lei exige um ilícito, que é o desvio de finalidade (pode ser tanto na sua
modalidade dolosa, como a fraude, quanto culposa).
Hipótese do art. 50 é chamada Teoria maior da desconsideração, porque ela tem mais
requisitos. Do ponto de vista da incidência ela é restrita, pois tem que se comprovar a
ilicitude. Maior por causa dos requisitos, não por causa da sua amplitude (quanto mais
requisitos, mais restrita é a amplitude).
TEORIA MENOR DA DESCONSIDERAÇÃO (menor porque tem menos requisitos, mas
por isso tem mais amplitude) – em algumas áreas específicas, como o direito do consumidor e
do trabalho, a desconsideração não precisa da ilicitude, do desvio de finalidade, basta
haver a insuficiência patrimonial. Porque se lida-se com credores vulneráveis, desde que a
pessoa jurídica não tenha patrimônio, automaticamente aqueles credores já terão acesso ao
patrimônio dos sócios.
Pressupostos essenciais da desconsideração: suspensão parcial da separação patrimonial
perfeita, em relação a obrigações determinadas. Nos termos do art. 50, adota-se como regra
geral a teoria maior, que é maior porque exige além da insuficiência patrimonial também o
requisito de desvio de finalidade da pessoa jurídica.

Art. 47, CC: Obrigam a pessoa jurídica os atos dos administradores, exercidos nos limites de seus poderes
definidos no ato constitutivo.
Muito importante no âmbito do direito contratual e está diretamente relacionado à
teoria dos órgãos Órgãos presentam (e não representam) a pessoa jurídica porque não há
duplicidade de vontades. Os órgãos de uma pessoa jurídica estão para ela assim como a minha
boca está para mim. Nas pessoas naturais, os órgãos são visíveis pois fazem parte de uma
realidade biológica, enquanto que nas pessoas jurídicas, porque elas têm um aspecto de
ficção, precisa-se criar uma organização artificial (órgãos coletivos, como a assembleia, mas
também órgãos individuais, como os administradores, que vão cuidar do dia a dia da pessoa
jurídica – presidente, vice presidente, etc.).
Administrador quando age, presenta a pessoa jurídica tanto quanto minha boca me
presenta enquanto pessoa natural.
Durante muito tempo prevaleceu, por influência do direito inglês, uma teoria chamada
de ultra vires quando um administrador age fora dos seus poderes, ele não vincula a pessoa
jurídica, ele vincula somente a si mesmo. Vem da ideia de que tudo relacionado a uma pessoa
jurídica precisa estar no seu ato constitutivo, que está no registro ou nos instrumentos que são
acrescidos a esse registro. Assim, tem-se a ideia de que o terceiro sempre tem como saber se
aquela pessoa que diz ser órgão da pessoa jurídica, que diz ter competência para agir em
nome dela, está correta ou não, porque basta ele olhar no registro.
Dificuldade pois o registro realmente tem essa finalidade de publicidade e
segurança, mas a própria prática do dia a dia, a rapidez que os negócios exigem mostram que
as pessoas nem sempre tem tempo de parar uma negociação, ir até o registro, enfrentar
burocracias, pra no final das contas descobrir se aquele que se diz administrador da pessoa
jurídica tem aqueles poderes que ele alegou ter na negociação.
Com base nessas circunstâncias, começou-se a se desenvolver uma teoria oposta, a
teoria da aparência não deixa de ser um desdobramento da boa fé objetiva. Se o
administrador aparentava ter poderes, ele vincula a pessoa jurídica; se o terceiro está de
boa fé (não sabia que o administrador estava agindo sem poderes, nem teria porquê saber),
então ele vincula a pessoa jurídica. Desdobramento da teoria dos órgãos – cria-se uma regra
de vinculação da pessoa jurídica sempre por atos dos seus órgãos, desde que diante de um
terceiro de boa fé. Terceiro de boa fé = não sabia, nem deveria saber; não sabia em uma
situação na qual não era exigível que ele soubesse.
Segunda metade do séc. XX essa teoria da aparência começa a ganhar força e
sua consequência principal é que, também no campo contratual, a pessoa jurídica
sempre se vincula pelos atos de seus administradores. Diante de terceiros de boa fé,
essa vinculação é absoluta, pouco importando se o administrador não tinha poderes, se
aquela limitação de poderes estava escrita e averbada corretamente no registro, porque
se entendia que impor ao terceiro de boa fé esse ônus de consultar o registro seria algo
demasiado.
Essa solução é reconhecida na doutrina e na jurisprudência em todo o mundo.
Lei da teoria orgânica e da presentação, conforme o grau de complexificação da pessoa
jurídica, ainda colocará uma segunda etapa, em que esses órgãos delegarão parcialmente seus
poderes, aí sim, para representantes, porque aí sim teríamos duas vontades: a vontade da
pessoa jurídica presentada por aquele órgão e a vontade do representante que receberá
poderes específicos para determinado contrato, para determinada operação (gerente
normalmente é representante, pois administrador delegou a ele poderes específicos para
determinados contratos, e ele vai exercer isso como representante, sujeito às regras de
representação).

Código Civil, a partir do art. 40, começa a entrar em classificações que envolvem inclusive
pessoas jurídicas de direito público. Isso acontece também na parte em que o código trata dos
bens (pessoas de dir. público, pessoas de dir. privado, bens de dir. público, bens de dir.
privado). Arts. 40 a 43 são artigos que tratam de matéria de direito público (direito
administrativo, são coisas que inclusive a constituição já trata mas, por uma questão de
sistematicidade, está no CC também).
PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO – ART. 44 DO CÓDIGO CIVIL:
Art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado:
I - as associações;
II - as sociedades;
III - as fundações.
IV - as organizações religiosas;
V - os partidos políticos;
VI - as empresas individuais de responsabilidade limitada.
Os três primeiros incisos trazem as principais pessoas jurídicas de direito privados
(associações, sociedades e fundações).
Art. 44, I. Associação: união de pessoas.
Finalidade: sem fins econômicos.
Art. 44, III. Fundação: união de bens (união patrimonial). Pessoa jurídica de maior abstração
pois é, em tese, um patrimônio destinado a uma finalidade.
Finalidade: tem finalidades não só consideradas não econômicas, mas também
relevantes do ponto de vista social e com grau de altruísmo e solidarismo. Art. 62. § único.
A fundação somente poderá constituir-se para fins de: I. assistência social; II. cultura, defesa e
conservação do patrimônio histórico e artístico; III. educação; IV. saúde; V. segurança
alimentar e nutricional; VI. defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção
do desenvolvimento sustentável; VII. pesquisa científica, desenvolvimento de tecnologias
alternativas, modernização de sistemas de gestão, produção e divulgação de informações e
conhecimentos técnicos e científicos; VIII. promoção da ética, da cidadania, da democracia e
dos direitos humanos; IX. atividades religiosas.
Art. 44, II. Sociedade: estrutura intermediária, união de bens e pessoas.
Finalidade: tem fins econômicos que normalmente são fins lucrativos, mas não
necessariamente (cooperativa, por exemplo, tem fim econômico mas não lucrativo, pois ali os
sócios cooperados não tem por objetivo o lucro, mas sim obter benefícios).
Embora associações e fundações tenham em comum finalidades não econômicas, as
finalidades das fundações são muito mais restritivas (uma associação pode exercer todas as
finalidades das fundações, pois pode ser qualquer fim não econômico. Mas uma fundação
não pode exercer todas as finalidades de uma associação). O campo das associações em
termo de finalidades é muito maior.
Ex.: fim não econômico muito comum que justifica a criação de uma associação –
representação de classes ou categorias: interesses coletivos mas sem nenhuma conotação
altruísta.
Art. 44 prossegue tratando de pessoas jurídicas que não são propriamente pessoas jurídicas
tipicamente privadas e, por isso, serão regidas por outras legislações ou não estarão sujeitas a
nenhum tipo de requisito.
Art. 44, IV. As organizações religiosas. §1˚. São livres a criação, a organização, a
estruturação interna e o funcionamento das organizações religiosas, sendo vedado ao poder
público negar-lhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessários ao seu
funcionamento.
Diante das organizações religiosas, tem-se uma pessoa jurídica cuja criação é
totalmente livre, aqui o legislador não impõe nenhum requisito, como ele o fez em relações a
outras pessoas jurídicas (precisa do registro, sem registro não tem pessoa jurídica). Por isso
que muitas vezes há abusos na criação dessas pessoas jurídicas, são verdadeiras empresas que
se aproveitam da condição religiosa para ter uma liberdade que nenhum outro agente
econômico teria.
Art. 44, V. Os partidos políticos. Não deixam de ser associações, mas associações tão
específicas que vão ser regidas por uma legislação específica, o direito eleitoral.
Sindicatos. Não consta nessa enumeração, mas são também associações, só que
representativas de empregadores ou empregados, de categorias profissionais. Associações
mas que, em razão das suas peculiaridades, vão ser regidas pelo direito do trabalho e não
propriamente pelo Código Civil.
Art. 44, VI. Empresa individual de responsabilidade limitada (EIRELI). Inovação, pessoa
jurídica criada em 2011. Alguns entendem que é uma sociedade unipessoal, sociedade de um;
outros entendem que é um patrimônio de afetação (forma de possibilitar ao empresário
individual que ele tenha, de alguma maneira, a separação patrimonial perfeita, o que antes
dessa alteração só se admitia em relação às sociedades); e outros entendem que é uma pessoa
jurídica sui generis (não é nem sociedade unipessoal, nem patrimônio de afetação). Por
enquanto: entender que é uma pessoa jurídica composta por apenas uma pessoa, em que o
empresário individual vai, por meio daquela pessoa jurídica, criar um novo centro de
imputação e um patrimônio separado.
ASSOCIAÇÕES: Art. 53. Constituem-se as associações pela união de pessoas que se
organizem para fins não econômicos.
Código Civil procurou acabar com uma confusão que sempre existiu no direito brasileiro
entre associações e sociedades. Antes do CC, havia várias sociedades com fins não
econômicos (Sociedade Brasileira de Cirurgiões, por exemplo), assim como havia associações
com fins econômicos. Veio CC e separou: sociedades têm fins econômicos e associações têm
fins não econômicos.
Problema: associações como a Abrace, que vendem canecas, camisetas, isso não é
atividade econômica? Doutrina e jurisprudência sempre fizeram um recorte: essas finalidades
não econômicas do art. 53 são as atividades fim. Nada impede que uma associação
desempenhe atividade econômica como atividade meio, desde que com a finalidade exclusiva
de reempregar os benefícios daquela atividade meio na sua atividade fim.
Entretanto, alguns autores hoje já sustentam que associações podem sim ter fins
econômicos e que o correto do recorte é o recorte da lucratividade e não da atividade
econômica. Então, associações poderiam sim ter fins econômicos, desde que não distribuam
lucros, tudo aquilo que obtiverem na atividade econômica tem que se reinvestido na sua
própria finalidade institucional. Leem, no art. 53, finalidades não econômicas como
finalidades não lucrativas.
O importante é que, na prática, existem muitas associações com finalidades
econômicas. Embora isso seja muito discutível, há muitos que defendam que isso é sim
possível. Mas isso não é um consenso (não pode finalidade não econômico qualquer que
seja x não pode finalidade não lucrativa).
Art. 53, § único: Não há, entre os associados, direitos e obrigações recíprocas.
Só existe uma relação jurídica: aquela entre o associado e a pessoa jurídica associação.
Importante pois, nas sociedades, além da relação que existe entre cada um dos sócios e a
pessoa jurídica sociedade, há relações recíprocas entre os sócios. É por isso que a sociedade é
uma pessoa jurídica mais complexa que a associação, dá margem a mais conflitos de
interesses que as associações (sócios estabelecem relações entre si, com a pessoa jurídica, e
com terceiros, dependendo do caso).
Art. 54. Sob pena de nulidade, o estatuto das associações conterá: I. a denominação, os fins e a sede da
associação; II. os requisitos para a admissão, demissão e exclusão dos associados; III. os direitos e deveres dos
associados; IV. as fontes de recursos para sua manutenção; V. o modo de constituição e de funcionamento dos
órgãos deliberativos; VI. as condições para a alteração das disposições estatutárias e para a dissolução. VII. a
forma de gestão administrativa e de aprovação das respectivas contas.
Requisitos do lado constitutivo de uma associação. Tem que ser interpretado em
comum com o art. 46 (artigo que fala de todas as coisas que tem que constar nos atos
constitutivos de uma pessoa jurídica. É uma regra geral, que se aplica a todas as pessoas
jurídicas. O art. 54 é o que trata especificamente das associações).
Art. 55. Os associados devem ter iguais direitos, mas o estatuto poderá instituir categorias com vantagens
especiais.
Dentro do possível, assegurar isonomia e democracia nas associações. Tem se
interpretado esse artigo como: naquilo que for essencial à condição de associado (ex.: direito
de voto), esses direitos têm que ser iguais. Embora isso seja controverso – alguns autores
defendem a possibilidade de pesos diferenciados em algumas associações, desde que com
alguns critérios de razoabilidade. No mínimo, a discussão se divide entre direitos essenciais
(como o voto) e vantagens (como associados fundadores terem direito a desconto no aluguel
da sede para fazer uma festa). Nessas situações, que não dispõem do núcleo duro da vida
associativa, a jurisprudência entende que pode haver diferença. Mas, nos direitos essenciais,
entende-se que precisa haver isonomia.
Art. 57. A exclusão do associado só é admissível havendo justa causa, assim reconhecida em procedimento que
assegure direito de defesa e de recurso, nos termos previstos no estatuto.
Artigo que não constava da redação original do código, já é uma alteração legislativa
que decorre do acórdão do supremo que reconheceu a eficácia horizontal do direito
fundamental relacionado ao contraditório e à ampla defesa nas relações associativas. Exclusão
de associado deixa de ser questão de mera vontade dos associados, de mera deliberação da
maioria, passa a estar sujeito a requisito material (justa causa – estatuto prevê as condições) e
requisito procedimental (direito de defesa e de recurso).
Art. 59. Compete privativamente à assembleia geral: I – destituir os administradores; II – alterar o estatuto.
Competência privativa da assembleia geral, principal órgão da pessoa jurídica (porque é o
único que reúne todos os membros da pessoa jurídica). Em relação a essas matérias,
consideradas muito relevantes (destituição de administradores e reforma de estatuto), somente
todos os associados vão poder decidir na assembleia. Tirando essas matérias, associação vai
ter ampla liberdade para, por meio do seu estatuto, criar outros órgãos colegiados ou dizer
que, fora das hipóteses do art. 59, o diretor ou presidente, como órgão individual, pode fazer
tudo. O estatuto pode também aumentar as matérias de competência da assembleia, só não
pode é reduzir o art. 59. Isso assegura democratização.
Art. 60. Assegura a 1/5 dos associados o direito de convocar assembleia. Não basta dizer que
a assembleia é competente, tem que dar a uma minoria qualificada a chance de convocar a
assembleia (normalmente a assembleia é convocada pelo administrador).
Art. 61. Dissolvida a associação, o remanescente do seu patrimônio líquido, depois de deduzidas, se for o caso,
as quotas ou frações ideais referidas no parágrafo único do art. 56, será destinado à entidade de fins não
econômicos designada no estatuto, ou, omisso este, por deliberação dos associados, à instituição municipal,
estadual ou federal, de fins idênticos ou semelhantes.
Destino do patrimônio da associação em caso de extinção da pessoa jurídica. O
legislador dá uma relativa autonomia para o estatuto mas, sendo ele omisso, havendo
patrimônio remanescente, esse patrimônio seja dirigido a uma associação de fins semelhantes.
Acontece coisa similar nas fundações.
FUNDAÇÕES
Pessoa jurídica com maior grau de abstração. Não há base associativa, a fundação é
patrimônio afetado a um fim.
A forma de constituição da fundação é diferente, normalmente acontece em duas etapas:
primeiro, o ato de instituição (ato por meio do qual alguém, em vida ou testamento, destina
parte de seu patrimônio a uma daquelas finalidades que justifica uma fundação) e o ato de
constituição da fundação em si.
Art. 63. Quando insuficientes para constituir a fundação, os bens a ela destinados serão, se de outro modo não
dispuser o instituidor, incorporados em outra fundação que se proponha a fim igual ou semelhante.
No âmbito dessa primeira etapa de ato de instituição, às vezes a pessoa, num
testamento ou em vida, deixa um patrimônio insuficiente para constituir uma fundação. Nesse
caso, não se desperdiça, ele vai ajudar numa fundação que já exista e tenha propostas
semelhantes. Se cria uma nova fundação, quando suficiente, ou esses bens serão transferidos
para uma fundação com fins semelhantes.
Art. 64. Constituída a fundação por negócio jurídico entre vivos, o instituidor é obrigado a transferir-lhe a
propriedade, ou outro direito real, sobre os bens dotados, e, se não o fizer, serão registrados, em nome dela, por
mandado judicial.
Se esse ato de instituição for feito em vida, o instituidor não pode se arrepender. O
interesse público relacionado à instituição dessa fundação é tão grande que o próprio
legislador já criou todos os mecanismos para que aquele ente surja a partir da dotação
patrimonial. Fundações são consideradas quase que braços-direitos do Estado, são pessoas
jurídicas de direito privado, mas que exercem finalidades de interesse público.
As sociedades e associações normalmente são criadas pela vontade dos sócios ou
associados, que decidem redigir seu estatuto. Numa fundação isso não acontece, porque não
tem essa base associativa. Normalmente, o que acontece numa fundação é que o instituidor
nomeia alguém para redigir o estatuto da fundação. Mas a lei é tão diligente para que a
fundação aconteça, que ela coloca:
Art. 65. Aqueles a quem o instituidor cometer a aplicação do patrimônio, em tendo ciência do encargo,
formularão logo, de acordo com as suas bases, o estatuto da fundação projetada, submetendo-o, em seguida, à
aprovação da autoridade competente, com recurso ao juiz.
A autoridade competente é o ministério público. Por isso as fundações são exceções
ao regime das disposições normativas. Aqui não basta ter um ato constitutivo levado a
registro, precisa de uma instituição, depois de um ato constitutivo e depois vai para o
ministério público, que precisa aprovar e autorizar e, somente com essa autorização do MP,
é que há o registro.
Art. 65, § único. Se o estatuto não for elaborado no prazo assinado pelo instituidor, ou, não havendo prazo,
em cento e oitenta dias, a incumbência caberá ao Ministério Público.
Se o instituidor esqueceu de nomear uma pessoa para fazer o registro ou nomeou mas
a pessoa não cumpriu com essa competência, o próprio MP que fará o estatuto e tomará todas
as providências para que aquela pessoa jurídica seja criada.
Art. 66. Velará pelas fundações o Ministério Público do Estado onde situadas.
Como as fundações não têm base associativa, que ajude a exercer as suas finalidades,
que controle e supervisione a ação dos gestores, tudo isso é substituído pela ação do
Ministério Público. MP exerce controle direto sobre as fundações, fiscalizando-as,
verificando se de fato os administradores estão agindo adequadamente, se estão empregando
os bens nas finalidades propostas.
Art. 67. Para que se possa alterar o estatuto da fundação é mister que a reforma:
I. seja deliberada por dois terços dos competentes para gerir e representar a fundação; II. não contrarie ou
desvirtue o fim desta; III. seja aprovada pelo órgão do Ministério Público no prazo máximo de 45 dias, findo o
qual ou no caso de o Ministério Público a denegar, poderá o juiz supri-la, a requerimento do interessado.
Quando se fala na alteração do estatuto das fundações, além de deliberação por 2/3
dos componentes dessa fundação (administradores), MP precisa aprovar essas alterações
estatutárias.
Como associações podem exercer todas as finalidades de uma fundação (mas o contrário não
é verdadeiro), muitas vezes se é sugerido fazer uma associação para alguém que quer criar
uma pessoa jurídica de direito privado para alguma das finalidades previstas no §único do art.
62, pois, do ponto de vista da gestão é muito mais fácil; fundação recebe interferência e
monitoramento constante do MP.
Art. 69. Tornando-se ilícita, impossível ou inútil a finalidade a que visa a fundação, ou vencido o prazo de sua
existência, o órgão do Ministério Público, ou qualquer interessado, lhe promoverá a extinção, incorporando-se o
seu patrimônio, salvo disposição em contrário no ato constitutivo, ou no estatuto, em outra fundação, designada
pelo juiz, que se proponha a fim igual ou semelhante.
Regra semelhante a das associações. Se a fundação for extinta, em tese, a solução
usual é que seu patrimônio seja transferido para uma instituição semelhante.
Única possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica de uma fundação seria
para trazer a responsabilidade dos administradores, porque ela não tem sócio nem associados.
Teria que se comprovar que os administradores estão praticando desvio de finalidade e isso
justificaria, então, a desconsideração.

19/10 (quarta-feira) – ROTEIRO 9 E INÍCIO ROTEIRO 10


DOMÍCILIO
Localização da pessoa para efeito das relações jurídicas.
Se a pessoa é domiciliada aqui ou no estrangeiro, se a pessoa é casada com uma pessoa
domiciliada no estrangeiro, isso importa nos regimes jurídicos, importa na incidência
normativa.
Centro das relações e atividades de uma pessoa.
Lugar onde as pessoas podem ser oficialmente encontradas, para responder por
obrigações, cumprimento dos deveres legais e exercício de direitos.
Domicílio é onde você é encontrado com fins de cobrar o cumprimento de obrigações
e possibilitar o exercício de direitos. É no domicílio que um credor, por exemplo, tem que
demandar o devedor.
Regras de domicílio importantes para estabelecer a lei aplicável a diversas relações jurídicas.
Consequências em diversas áreas do direito (processual, tributário, internacional privado).
Parte geral do CC: LINDB (Decreto-lei n˚ 4.657/42):
- regras sobre invalidade do matrimônio e regime de bens
- qualificação dos bens e regulação das relações a eles concernentes
- sucessão por morte ou por ausência
- capacidade para suceder
- determinação da competência da autoridade judiciária brasileira
Regras para a pessoa natural:
Residência (habitat, moradia) com ânimo definitivo (elemento subjetivo, psicológico da
pessoa, de intenção de se fixar, mas pode ser aferido por elementos objetivos do dia a dia – a
pessoa realmente desenvolve suas atividades de cidadã naquele local).
CC, art. 70. O domicílio da pessoa natural é o lugar onde ela estabelece a sua residência com ânimo definitivo.
CC, art. 71. Se, porém, a pessoa natural tiver diversas residências, onde, alternadamente, viva, considerar-se-á
domicílio seu qualquer delas.
Lugar onde a profissão é exercida – mas só para fins concernentes à atividade
econômica.
CC, art. 72. É também domicílio da pessoa natural, quanto às relações concernentes à profissão, o lugar onde
esta é exercida.
Teoria da multiplicidade/pluralidade de domicílio: uma mesma pessoa tem mais de
um domicílio, tanto a residência onde ela habita com ânimo definitivo, mas também o lugar
onde exerce sua profissão.
CC, art. 74, § único. Se a pessoa exercitar profissão em lugares diversos, cada um deles constituirá domicílio
para as relações que lhe corresponderem.
Tem pessoas que não têm uma residência habitual (artistas circenses, povos nômades)
– nesse caso impera a teoria da aparência (a pessoa pode ser encontrada e demandada para
exercer suas obrigações e seus direitos onde ela estiver, no lugar onde ela se encontrar).
CC, art. 73. Ter-se-á por domicílio da pessoa natural, que não tenha residência habitual, o lugar onde for
encontrada.
Mudança de domicílio: se dá pela transferência de residência com intenção manifesta
de mudar o domicílio (essa intenção manifesta está no âmbito psicológico, mas pode ser
aferida objetivamente através da declaração da pessoas às municipalidades ou a própria
mudança, com as circunstâncias que a acompanharem).
CC, art. 74. Muda-se o domicílio, transferindo a residência, com a intenção manifesta de o mudar.
§ único. A prova da intenção resultará do que declarar a pessoa às municipalidades dos lugares, que deixa, e para
onde vai, ou, se tais declarações não fizer, da própria mudança, com as circunstâncias que a acompanharem.
DOMICÍLIO x RESIDÊNCIA X MORADA:
Domicílio: onde a pessoa reside (elemento objetivo) com ânimo definitivo (elemento
subjetivo) OU onde exerce sua profissão (para demandas relacionadas estritamente ao
exercício da atividade econômica);
é uma situação jurídica, reconhecida pelo direito para fins de incidência de normas (esse
aspecto tem divergência).
Residência: onde a pessoa reside, porém sem ânimo definitivo;
é um estado de fato (esse aspecto tem divergências).
Ex.: grupo de atores que residem em uma cidade por 8 meses por conta de filmagens;
estudante que vai estabelecer residência no exterior por 2 anos.
Morada: habitação eventual, provisória. Ex.: hotel nas férias.
O domicílio sempre implica uma residência, só que há um plus, que é o ânimo definitivo.
TIPOS DE DOMICÍLIO: voluntário, necessário ou legal; por eleição ou contratual (ou
especial):
Domicílio voluntário: é o que falou-se acima – residência com ânimo definitivo.
Domicílio necessário: ainda que na vida real os fatos mostrem que aquele não é o
domicílio da pessoa, a lei diz que sim. É para algumas pessoas físicas especiais. Ex.:
incapaz – seu domicílio é o mesmo do seu representante legal, do seu
assistente. Por mais que ele viva com a tia, se a representante legal dele é a avó, o domicílio
daquela pessoa é a casa da avó.
Servidor público: lugar em que exerce permanentemente suas funções.
Militar: onde servir ou, no caso de marinha/aeronáutica, sede do comando a que se encontrar
imediatamente subordinado.
Marítimo: onde o navio estiver matriculado
Preso: lugar onde cumprir a sentença
Agente diplomático do brasil: que, citado no estrangeiro, alegar extraterritorialmente sem
designar onde tem, no país, o seu domicílio, poderá ser demandado no DF ou no último ponto
do território brasileiro onde o teve.
CC, art. 76. Têm domicílio necessário o incapaz, o servidor público, o militar, o marítimo e o preso.
Parágrafo único. O domicílio do incapaz é o do seu representante ou assistente; o do servidor público, o lugar em
que exercer permanentemente suas funções; o do militar, onde servir, e, sendo da Marinha ou da Aeronáutica, a
sede do comando a que se encontrar imediatamente subordinado; o do marítimo, onde o navio estiver
matriculado; e o do preso, o lugar em que cumprir a sentença.
CC, art. 77. O agente diplomático do Brasil, que, citado no estrangeiro, alegar extraterritorialidade sem designar
onde tem, no país, o seu domicílio, poderá ser demandado no Distrito Federal ou no último ponto do território
brasileiro onde o teve.
Domicílio por eleição: contratos escritos – contratantes especificam domicílio onde se
exercitem e cumpram os direitos e obrigações resultantes do contrato. Não se derrogam
normas de ordem pública, com as relativas à competência em razão da matéria, direitos do
consumidor, etc.
CC, art. 78. Nos contratos escritos, poderão os contratantes especificar domicílio onde se exercitem e cumpram
os direitos e obrigações deles resultantes.
Regras para a pessoa jurídica:
União – DF
Estados e territórios – suas capitais
Município – lugar onde funcione a administração municipal.
Demais pessoas jurídicas – multiplicidade de domicílio: onde elegerem domicílio especial no
seu estatuto ou atos constitutivos ou lugar onde funcionarem as respectivas diretorias e
administrações
Art. 75. Quanto às pessoas jurídicas, o domicílio é:
I - da União, o Distrito Federal;
II - dos Estados e Territórios, as respectivas capitais;
III - do Município, o lugar onde funcione a administração municipal;
IV - das demais pessoas jurídicas, o lugar onde funcionarem as respectivas diretorias e administrações, ou onde
elegerem domicílio especial no seu estatuto ou atos constitutivos.
- Pessoa jurídica com estabelecimentos em lugares diferentes – cada um deles será
considerado domicílio para os atos nele praticados
CC, art. 75, § 1o Tendo a pessoa jurídica diversos estabelecimentos em lugares diferentes, cada um deles será
considerado domicílio para os atos nele praticados.
- Administração ou diretoria com sede no estrangeiro – no tocante às obrigações contraídas
por cada uma das suas agências, o lugar do estabelecimento, sito no brasil, a que ela
corresponder
CC, art. 75, § 2o Se a administração, ou diretoria, tiver a sede no estrangeiro, haver-se-á por domicílio da pessoa
jurídica, no tocante às obrigações contraídas por cada uma das suas agências, o lugar do estabelecimento, sito no
Brasil, a que ela corresponder.

BENS
Os bens são o objeto das relações jurídicas. Toda e qualquer relação jurídica abrangida pelo
direito tem um objeto, que é um bem.
Representam valores materiais e imateriais (crédito, honra, direitos autorais).
Bens econômicos são sempre jurídicos.
Tecnologia altera o conceito de bens de produção, das relações de trabalho, econômicas,
empresariais e direitos envolvidos.
Conceito de bem é um conceito histórico e relativo. O que é bem em um momento pode não
ser em outro, e vice-versa. Relativo porque pode ser um bem principal/inalienável/indivisível/
imóvel em uma relação, e não em outra. Cada vez mais relacionado a discussões sobre acesso
e inclusão social.
Elementos estruturantes da relação jurídica: sujeito (proprietário, favorecido por uma
garantia) + objeto (bem imóvel; ex: terreno) + conteúdo/vínculo (propriedade, prestação de
garantia hipotecária, direito subjetivo, etc.).
Por que saber as classificações/ regras? Porque sua classificação tem implicações em diversas
áreas do direito: processual, tributário, do consumidor, etc.
Bens materiais: bens corpóreos, coisas, objeto dos direitos reais (tratam das relações entre
indivíduos e as coisas). Ex.: propriedade, superfície.
Bens imateriais: bens incorpóreos, valores/prestações, objeto dos direitos pessoais. Ex.:
direito da família, propriedade intelectual, dados pessoais, clientela, direitos de personalidade,
direito à informação, conhecimento técnico, meio ambiente.
Divisão do Código Civil:
1. BENS CONSIDERADOS EM SI MESMO:
A1) Bens imóveis:
Imóveis por natureza: não podem ser transportados sem sua destruição (ex.: solo, sua
superfície, sobsolo e espaço aéreo). Obs.: Art. 1229, CC – na medida da utilidade ao exercício
do direito de propriedade.
Art. 1.229. A propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo correspondentes, em altura e
profundidade úteis ao seu exercício, não podendo o proprietário opor-se a atividades que sejam realizadas, por
terceiros, a uma altura ou profundidade tais, que não tenha ele interesse legítimo em impedi-las.
Imóvel por acessão: tudo quanto se incorporar/ aderir ao solo natural ou artificialmente (ex.:
árvores, plantações, construções que não podem ser retiradas sem danos ou modificação.
Imóvel por determinação legal: opção do legislador. Os direitos reais sobre imóveis (servidão,
hipoteca, etc.); as ações que asseguram esses direitos reais (ação de rescisão de compra e
venda, etc.); o direito à sucessão aberta (direito à herança); as edificações que, separadas do
solo, mas conservando a sua unidade, forem removidas para outro locais (ex.: casa pré-
fabricada); os materiais provisoriamente separados de um prédio, para nele se reempregarem.
A2) Bens móveis:
Móveis por natureza: suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem
alteração da substância ou da destinação econômico-social. Ex.: animais, ações de uma
companhia, mercadorias, navios e aeronaves (enquanto não hipotecados).
Móveis por determinação legal: alguns bens o legislador decidiu enquadrar como móveis para
incidirem sobre eles todo o regramento de móveis. Ex.: as energias que tenham valor
econômico; os direitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes; os direitos
pessoais de caráter patrimonial e respectivas ações; propriedade intelectual.
Móveis por antecipação (doutrina): são os bens incorporados ao solo, mas com a intenção de
separá-los oportunamente e convertê-los em móveis. Ex.: árvores destinadas ao corte, frutos
ainda não colhidos.
Efeitos práticos da diferenciação entre bens móveis e imóveis: regimes jurídicos diversos;
imóveis têm leis mais rigorosas para aquisição/transferência – “regime especial”; diferente
quanto à tributação, etc.
B) Bens fungíveis: a priori, sempre bens móveis (parte da doutrina entende que bens imóveis
podem ser fungíveis, mas a maior parte não). São móveis que podem ser substituídos por
outros da mesma espécie, qualidade e quantidade, sem prejuízo. A ver com a
substituibilidade. Genéricos e não-individualizáveis. Ex.: dinheiro, roupa que não seja peça
única, mesa.
Para parte da doutrina, há imóveis fungíveis. Ex.: lotes de um loteamento. Mas o CC refere-se
apenas aos móveis.
Podem ser transformados em infungíveis por vontade das partes (o contrário não pode). Ex.:
se duas pessoas são coproprietárias de um determinado bem, elas podem entender que o bem
é tão insubstituível que elas podem, por comum acordo, transformarem-no em infungível.
C) Bens consumíveis:
Móveis cujo uso importa destruição imediata da própria substância (diferente de
deteriorabilidade) – consuntibilidade natural.
Móveis destinados à alienação (comercialização, transferência) (ainda que naturalmente
sejam inconsumíveis) – consuntibilidade jurídica (não é natural, é uma criação legal para
incidir esse regramento específico).
Livro é consumível (não por natureza, mas por ser alienável), e fungível ou infungível (se for
raro, único é infungível).
A intenção das partes pode tornar algo consumível em não consumível, justamente, por
exemplo, por ser infungível.
D) Bens divisíveis:
Podem ser fracionados sem alteração na sua substância, sem prejuízo do uso a que se
destinam, e sem diminuição considerável de valor. Novo CC: critério da utilidade –
divisibilidade jurídica
Ex.: divisão de um diamante grande em duas partes diminui consideravelmente seu
valor. Juiz determina a venda e divisão do dinheiro, em vez de a divisão do diamante.
Podem tornar-se indivisíveis por determinação da lei (ex.: módulo rural) ou por vontade das
partes (testamento com condição de não divisão do imóvel por até 5 anos). Indivisibilidade
jurídica é quando a lei ou a vontade das partes transformam em indivisível algo que, por sua
natureza, seria divisível.
Critério de divisibilidade/indivisibilidade física (vários bens que não têm como serem
divisíveis sob pena de se desconfigurarem por completo), econômico (diamante, que
materialmente é divisível mas, se eu pegar um diamante grande e dividir em 10 pedacinhos, a
doma do preço dos 10 é muito menor que o preço total do diamante inteiro) e funcional.
E1) Bens singulares: Considerados em sua individualidade, independentemente dos demais,
mesmo que reunidos.
E2) Bens individuais compostos: formados pela união material de outros bens. Ex.: casa.
Suas partes integrantes: podem ser separadas sem perder a identidade (ex.: porta da casa).
Suas partes componentes: não podem ser separadas sem perda de identidade (ex.: cimento da
parede).
E3) Bens coletivos: formados pela reunião de bens singulares, que podem ser
individualizados, mas que são considerados em conjunto, formando um todo unitário em
razão de uma mesma destinação. Aqui, a união é ideal.
Universalidade de fato: os bens singulares pertencem a uma mesma pessoa e foram por ela
agrupados, com destinação unitária. Os bens singulares podem ser objeto de relações jurídicas
próprias. Ex.: rebanho, estabelecimento comercial.
Universalidade de direito: complexo de relações jurídicas, dotadas de valor econômico, ao
qual a lei atribui caráter unitário. Ex.: massa falida, herança.
Ex.: Bem singular = uma matéria prima, um pedaço de mármore.
Bem singular composto = um carro, porque é feito de várias matérias primas, várias partes
componentes (união material que não tem mais como separar) e várias partes integrantes
(pode separar, desmembrar e depois reagrupar, a roda por exemplo), mas todas elas estão
materialmente ligadas para formar um bem.
Universalidade de fato/ Bem coletivo = união de bens que não é material, é finalística
(rebanho, pinacoteca, biblioteca).
F1) Bens de produção (doutrina, não tá no CC): empregados na produção, na indústria, na
prestação de serviços (ex.: automóvel para o taxista).
F2) Bens de uso privado (doutrina, não tá no CC): bens de uso (ex.: moradia) e bens de
consumo (ex.: comida).
Confusão: uber, airbnb – moradia/carro utilizados como bem de produção, para
aluguel/prestação de serviço.
2. BENS RECIPROCAMENTE CONSIDERADOS:
A) Bens principais:
Existem sobre si, abstrata ou concretamente. Distinguem-se dos acessórios por sua
extensão, seu valor econômico, qualidade, funções. Ex.: solo em relação ao prédio, a arte em
relação ao material que a recepciona, juros em relação ao contrato.
A2) Bens acessórios:
Sua existência supõe a do principal. Essa dependência é estabelecida a) pela natureza
do bem, b) pela vontade humana ou c) pela lei. Diferentemente das partes integrantes e
componentes das coisas compostas, não se unem ao bem principal como uma só coisa.
Beviláqua – classificação dos bens acessórios:
Naturais: sem engenho humano. Ex.: frutos e produtos.
Industriais: com engenho humano. Ex.: benfeitorias
Civis: oriundos de relações jurídicas. Ex.: fiança em relação ao contrato de aluguel.
Obs.: princípio geral de que o acessório segue o principal, de que o direito sobre o principal se
extende para o acessório (exceto pertenças).
a) Frutos: produzidos naturalmente pelo bem sem desfalque de sua substância e
podem ser dele separados. Mesmo quando ainda não separados do bem principal, podem ser
objeto de negócio jurídico.
- Naturais (frutas, crias de animais); - Industriais (gerados com trabalho humano, pão); - Civis
(direitos, juros de mora).
Conforme relação com a coisa principal, os frutos são: - pendentes (unidos à coisa que
os produziu); - percebidos (já destacados da coisa principal); - percipiendos (deviam ter sido
colhidos, mas não foram); - consumidos (já utilizados).
b) Produtos: diferem dos frutos quanto à periodicidade e o desfalque da substância da
coisa. Ex.: minas e jazidas.
Obs.: Art. 1232, CC. Os frutos e mais produtos da coisa pertencem, ainda quando separados, ao seu
proprietário, salvo se, por preceito jurídico especial, couberem a outrem.
c) Benfeitorias: são obras realizadas pelo homem na estrutura da coisa principal, com
o propósito de conservá-la, melhorá-la ou embelezá-la.
Voluptuária: não aumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou
sejam de elevado valor (embelezam o bem). Ex.: obras de jardinagem.
Úteis: aumentam ou facilitam o uso do bem (melhoram o bem). Ex.: instalação de grandes
protetoras nas janelas.
Necessárias: têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore. Ex.: obras de reparação
de vazamentos.
d) Pertenças: incluídas entre os acessórios pelo novo CC.
Bens individualizados. Não há união material com o bem principal. Se destinam, de
modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro bem principal. Ex.:
móveis, aparelho de som de carro.
As pertenças não são abrangidas pelos negócios jurídicos que dizem respeito ao bem
principal, salvo se o contrário resultar da lei, da manifestação de vontade, ou das
circunstâncias do caso.
3. BENS CONSIDERADOS EM RELAÇÃO AOS SUJEITOS:
A1) Bens particulares: todos que não são públicos.
A2) Bens públicos: do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público
interno.
a) de uso comum do povo: destinados ao uso indistinto por qualquer pessoas. Ex.:
rios, mares, estradas, ruas e praças. Inalienáveis, enquanto conservam sua qualificação.
b) de uso especial: bens destinados a serviço ou estabelecimento da Administração. Ex.:
repartições públicas, museus. Inalienáveis, enquanto conservam sua qualificação.
c) dominicais: constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto
de direito pessoal ou real de cada uma dessas entidades. Ex.: terras devolutas. São alienáveis.
Obs.: consideram-se dominicais os bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito
público a que se tenha dado a estrutura de direito privado, não dispondo a lei em contrário.
O uso comum dos bens públicos pode ser gratuito ou retribuído, conforme for estabelecido
legalmente pela entidade a cuja administração pertencem.
Bens públicos: regra geral da inalienabilidade, imprescritibilidade e impenhorabilidade.
B1) Bens disponíveis e indisponíveis (comerciáveis e incomerciáveis):
O novo CC não repetiu essa classificação, de coisas fora do comércio, mas essa classificação
continua sendo importante, pois a doutrina aponta 3 categorias de bens inalienáveis:
a) naturalmente indisponíveis: insuscetíveis de apropriação (ex.: mar).
b) legalmente indisponíveis: bens públicos de uso comum e especial, direitos da
personalidade e vedações específicas (ex.: herança de pessoa viva).
c) indisponíveis por vontade humana – cláusulas de inalienabilidade
BEM DE FAMÍLIA – proteção constitucional do direito à moradia - Qualquer moradia?
Moradia luxuosa, excessivamente cara, fisicamente extrapoladora de uma moradia “mínima e
digna”? - Airbnb e outras questões. Lei 8.009/90 - Ver REsp 1.186.225-RS e outros julgados.
NOVOS BENS – espaço virtual – serviço gratuito? – contraprestação: dados do usuário?
Troca remunerada? – direitos do usuário? – titularidade do perfil no FB? => Dados, espaços
virtuais e tecnologia como bens jurídicos => direitos sobre páginas, perfis e seu acesso
- direito de propriedade – abrangência – coordenadas geográficas da propriedade –
endereço em ambiente de realidade aumentada – abuso de direito no ciberespaço X abuso de
direito de propriedade

31/10 (segunda-feira) – FINAL ROTEIRO 10


Simulação 21 – CC não entra em algumas discussões mais recentes, pensar sobre as novas
funcionalidades dos bens. É importante saber qual a função social-econômica daquele bem. A
ideia da impenhorabilidade do bem de família é incidir sobre bens destinados à moradia,
sendo que a economia de compartilhamento vem misturando e bagunçando esses conceitos.
Um bem pode ser, ao mesmo tempo, de uso próprio e também destinado à exploração
econômica (exemplo das pessoas que disponibilizam cômodos da sua casa, ou o carro quando
está de folga). Assim, cada vez mais a tecnologia possibilita que esses conceitos, que antes
eram bem separados, se misturem, trazendo novos desafios. Nessa situação, havia até a
discussão de saber se aquela pessoa que oferece os quartos de sua residência, de maneira
reiterada, é ou não empresário? A sazonalidade afeta mas o mais importante é a frequência.
Nesse caso, poderia se justificar dizendo que o imóvel não está totalmente protegido pela
impenhorabilidade porque ele está destinado à moradia, mas também exerce uma função
econômica que pode até ser considerada função empresarial.
Simulação 22: verificar aquela premissa de que os bens estão em constante expansão, então
por mais que a gente possa tentar delimitá-los, jamais conseguiremos capturar a riqueza da
realidade. Muitos sustentam que sites são quase que estabelecimentos virtuais onde as pessoas
realizam negócios. Então, se uma empresa se utiliza de um site para realizar transações, ela
sai prejudicada.
Simulação 23: será que o meu direito de propriedade envolve também uma dimensão que
transcende a parte física? Discussão que envolve “pacotes de direitos” (estamos discutindo
algo que não envolve só propriedade, direito de ir e vir, privacidade, tranquilidade). Para
efeito de responsabilidade civil, a conduta não precisa estar tipificado, basta que há violação
da cláusula geral, ou seja, basta que haja dano. É razoável que a empresa crie esses ginásios
diante de todos os transtornos que ela está causando ao proprietário? Estamos lidando com
novas realidades, novos bens, em que medida aquilo invade um espaço considerado inerente
ao proprietário. Estamos lidando com um caso de abuso de direito. Tecnologia reformata um
próprio bem físico já existente, no caso, a propriedade.

BENS: conceitos que não têm uma aplicabilidade prática nesse atual momento, mas terão em
outras áreas, como a das obrigações (prestações que são inerentes aos direitos pessoais) –
essas prestações estão sujeitas a várias das classificações que vimos nos bens (obrigações
divisíveis e indivisíveis, obrigações fungíveis e infungíveis).
Ao longo do desenvolver das relações, as partes vão, muitas vezes, poder alterar várias
dessas classificações. Quando um objeto tem valor sentimental ele, que a prioristicamente era
fungível por ser substituível, se torna infungível.
Essas classificações não são estanques, vão precisar ser contextualizadas no âmbito
dos negócios.
Pertença: se, por exemplo, eu compro um carro. No contrato, se identifica o carro pelo
chassi, modelo, ano e placa (não precisa colocar que ele tem quatro rodas, um volante). Isso
porque o carro é um bem individual composto, ele é formado por uma série de partes
integrantes, que se reúnem finalística e materialmente para compor o objeto final. Eu nao
preciso especificar no meu contrato que o carro precisa vir com o motor, porque todas as
partes integrantes, assim como as componentes, fazem parte necessariamente daquele bem. Já
a pertença é um bem acessório. E, exatamente por ser um bem acessório que, nos termos do
art. 94 (“os negócios jurídicos que dizem respeito ao bem principal não abrangem as
pertenças, salvo se o contrário resultar da lei, da manifestação de vontade, ou das
circunstâncias do caso”) não necessariamente acompanha a sorte do principal, é que a
pertença precisa estar expressa, no sentido de que ela acompanha o destino do bem principal.
Ex.: compra-se um carro e, na hora da compra, o vendedor retirou o som de fábrica.
Está ou não cumprindo o contrato? A discussão é saber se o som é ou não pertença. Se o som
for parte integrante, ele faz parte do carro e, portanto, não precisa especificar no contrato.
Mas, se o som for pertença, há margem para discutir: como o som seria bem acessório e não
está especificado no contrato que ele acompanharia o carro, então eu estaria cumprindo o
contrato ao vender o carro sem som.
A ideia de parte integrante é importante até para a facilitação dos contratos. É por isso
que, ao comprar um carro, não precisa estar especificado no contrato que o carro vem com um
volante, um motor, 5 retrovisores, um banco. Se não vier com algum desses bens, já está claro
que o carro não está completo e o vendedor descumpriu o contrato. A discussão para saber se
o vendedor está cumprindo com suas obrigações envolve a noção de parte integrante.
Parte integrante compõe o bem, não precisa especificar. Pertença é bem
acessório e, pela regra do art. 94, não acompanha, via de regra, o bem principal. Então se o
comprador não toma essa providência de incluir no contrato aquele bem, ele corre o risco de
muitas vezes receber o bem sem o acessório.
Benfeitoria x Pertença: benfeitoria são consideradas obras que são necessárias, úteis ou
destinadas ao aformoseamento do bem. Normalmente, benfeitorias são vistas como uma obra,
acréscimo feito ao bem imóvel. Pertenças são acessórios de bens móveis.
Grande questão sobre pertença é saber se ela acompanha ou não a sorte do bem principal.
Bem acessório segue a sorte do principal, como regra. Pertença é exceção a essa regra
(pertença não necessariamente segue a sorte do principal). Pertença é um acessório, mas um
acessório específico (benfeitorias – muitas entendem como pertenças).
Parte integrante x parte componente
Parte componente: existe uma união material tal entre as partes que não há como separá-las.
Ex.: muro (é feito de uma série de partes mas, uma vez que uniu-se todas essas partes em um
todo, não há como desmembrar essas partes).
Parte integrante: consegue separar sem prejuízo do bem composto, no sentido de que se
consegue reagrupar depois. Ex.: carro (pode tirar banco, rodas, volante e depois reagrupá-las
posteriormente).
Essa noção é importante para possibilitar que possamos adquirir bens
compostos, como um carro, sem ter que especificar todas as partes integrantes dele.
Bens singulares compostos x universalidades de fato: bens como biblioteca, rebanho,
pinacoteca – não há união material entre esses bens, como existe entre as partes integrantes de
um carro; esses entes estão unidos unicamente por uma questão de finalidade, não há que se
falar em partes componentes ou partes integrantes. O que une aquela coletividade é a
destinação (amplia as possibilidades de negócios jurídicos).
Universalidade de direito: conjunto de relações jurídicas. Não se refere propriamente a bens.
Pode inclusive tem uma soma negativa. Patrimônio (é o conjunto de relações jurídicas
patrimoniais que ela tem) é um exemplo de universalidade de direito – quando alguém tem
patrimônio negativo é porque as dívidas dele superam os créditos que ele tem.
Estabelecimento comercial também é considerado universalidade de fato. Por isso se
fala que há venda de ponto, por exemplo.
Próprio código trata dos bens públicos.
Bens dominicais: eles não estão afetados a nenhuma finalidade de interesse publico e
por isso vão poder ser exercido pelo poder público em um regime muito semelhante a um
regime privado (semelhante porque sempre há parcial derrogação do regime de direito
privado por normas imperativas do direito público, entretanto, o poder publico pode dispor
com uma relativa margem de autonomia).
Bens sempre vão precisar ser contextualizados, de acordo com o tipo de negócio jurídico, a
intenção das partes, entre outras circunstâncias.
Ex.: uma lareira como benfeitoria em uma cidade do RS é útil. Uma lareira como
benfeitoria aqui em Brasília é voluptuária.
Diante de disputas possessórias, é fundamental saber qual o tipo de benfeitoria, unindo
também a saber se o consumidor estava ou não de boa fé para saber qual os direitos que ele
têm ao desocupar a terra que ele estava possuindo.
Coisas x bens:
Coisa pode ser menos ou mais restritivo que bem, a depender do conceito que se
adota. Se eu entendo coisa como tudo o que existe no universo e bem como aquilo que pode
ser objeto de uma relação jurídica, então o conceito de bem vai ser muito mais restritivo que o
de coisa. Porém, há autores que entendem bem como a expressão geral para designar qualquer
tipo de objeto de relações jurídicas (nesse caso, até a personalidade, comportamentos
humanos, bens imateriais como o meio ambiente, podem ser bens), e coisa como aqueles bens
corpóreos que, entre aqueles bens, são objetos dos direitos reais. Na terminologia do código,
coisa é expressão mais restritiva (as coisas são os objetos corpóreos que, entre aqueles bens,
podem ser objeto dos direitos reais).

07/11 (segunda-feira) – ROTEIRO 11 (PARTE 1 E INÍCIO PARTE 2)


Objetivo desse roteiro é distinguir o negócio jurídico dos outros fatos jurídicos (fato jurídico é
todo fato que tenha consequências jurídicas, capaz de criar, modificar ou extinguir uma
relação jurídica).
Fatos jurídicos são classificados de várias maneiras:
1) Nem todos os fatos jurídicos são fatos que decorrem da ação humana: fatos
jurídicos naturais/fatos jurídicos stricto senso/fatos involuntários (decorrem de
acontecimentos da natureza, ou fatos relacionados ao homem mas que não decorrem
propriamente de uma vontade, como nascimento e morte) e fatos jurídicos humanos/atos
jurídicos em sentido amplo/fatos voluntários nos fatos humanos, é essencial avaliar qual o
papel da vontade, não apenas para formação desses fatos, mas também para atribuição de
consequência jurídica a esse fato.
2) Dentro desses fatos jurídicos humanos, quatro categorias de atos jurídicos em
sentido amplo (as três primeiras classificações – ato fato, ato jurídico stricto sensu e negócio
jurídico – são condutas humanas em conformidade ao direito, que se diferenciam conforme a
importância da vontade para essas condutas; já a terceira se diferencia exatamente por ser
contrário ao direito):
a) Ato fato jurídico: ato jurídico extremamente simplificado, a vontade não importa nem
para constituição do fato nem para atribuição de consequência jurídica a esse fato. Trata-
se conduta humana como se fosse um fato, quase que equiparando-a aos fatos naturais.
Ex.: quando um absolutamente incapaz (menor de 16 anos) esculpe uma escultura em
um bloco de mármore que não pertence a ele. Em uma situação como essa, o escultor se torna
proprietário da escultura (escultura mais importante que a matéria prima), mas tem que
ressarcir o dono da matéria prima. Aqui, pouco importa qual foi a vontade desse
absolutamente incapaz, o que importa é daquela conduta dele decorrerão consequências
jurídicas que já estão pré-determinadas na própria lei.
b) Ato jurídico stricto sensu: categoria em que a vontade importa muito para a
constituição do fato jurídico, mas não para a atribuição de consequência jurídica a ele.
Ex.: ocupação como fato aquisitivo originário de propriedade (todo aquele que se
apropria de coisa móvel sem dono ou abandonado se torna proprietário). A vontade humana é
extremamente importante para constituição do fato (parte-se da premissa de que só se
apropria algo quando a gente quer), porém, uma vez que aquele ato está constituído, as
consequências dele estão pré-determinadas na lei (é a lei que diz que daquele fato surge uma
relação jurídica de propriedade, não sou eu que vou estipular as consequências jurídicas
daquele fato).
Obs.: Parte geral não trata dessas duas categorias, há uma regra geral (art. 185, CC: Aos atos
jurídicos lícitos, que não sejam negócios jurídicos, aplicam-se, no que couber, as disposições
do Título anterior), sendo que aplica-se aos atos jurídicos stricto sensu as regras do negócio
jurídico quando forem aplicáveis, mas aqui o legislador não tem a preocupação de dar um
tratamento sistemático exatamente porque as consequências jurídicas dos ato jurídicos stricto
sensu e atos fatos já estão pré-determinadas pela lei.
c) Negócio Jurídico: aqui a vontade importa, não apenas para a constituição do fato
jurídico, como também para atribuição das consequência jurídicas que surgirão daquele
vínculo. Autonomia privada tem importância máxima. Contratantes em um contrato criam as
regras que irão reger a sua própria relação, por isso que contrato é visto como fonte de direito
(pois aqui as partes estão criando regras para suas próprias vidas, não serão regras abstratas
gerais como o legislador cria, mas serão regras específicas para aquela relação).
Teoria das incapacidades tem por foco os negócios jurídicos porque aqui precisa-se da
capacidade. As responsabilidades inerentes à prática de atos como esse são muito maiores que
nesses outros níveis, pois nos outros fatos as consequências jurídicas já estão estabelecidas
pelo legislador, então parte-se da premissa que o prejuízo das partes será muito menos em
razão da interferência do legislador. Diferentemente ocorre no negócio jurídico pois, a partir
do momento em que as partes estão criando regras e responsabilidades, é de se supor que elas
precisem gozar da CAPACIDADE para poderem gozar de tal responsabilidade.
É por essa razão que os negócios jurídicos recebem tratamento específico, já na parte geral.
Ao contrário dos outros atos, que são tratados de forma pontual na parte específica.
A peculiaridade do negócio jurídico é exatamente de que os efeitos não são pré-determinados
pelo legislador, ou pelo menos não todos os efeitos (alguns efeitos até podem estar pré-
determinados, mas não todos). Por isso aqui exige-se que as partes tenham total capacidade.
Obs.: incapacidade não se projetará no ato ilícito (incapaz pode responder pelos seus atos
ilícitos; não se projeta nas situações existenciais (como no caso dos direitos de personalidade;
mas ela se projeta essencialmente aqui, no negócio jurídico. É em razão da importância do
negócio jurídico que a parte geral dispensa a ele um tratamento próprio, explicando quais seus
pressupostos fundamentais e os princípios a que estão sujeitos esses negócios jurídicos.
d) Ato ilícito: ato contrário ao direito (exatamente por isso se diferentes dos outros atos, que
são conforme o direito), mas é considerado fato jurídico porque nossa definição de fato é
aquele fato do qual pode surgir uma relação jurídica. Ex.: quando alguém viola o direito de
outrem causando dano, surge para a vítima o direito ao ressarcimento, surge uma relação
obrigacional entre ofensor e vítima. Então, pelo nosso critério de fato jurídico, o ato ilícito,
ainda que contrário a direito, é considerado fato jurídico. Uma série de relações jurídicas que
surgem diante da violação de direitos alheios, portanto, em decorrência de atos ilícitos.

NEGÓCIO JURÍDICO: visto como aquele ato jurídico em que a vontade importa tanto para
a sua constituição, como também para atribuição das consequências jurídicas a esse ato.
Essencialmente é o contrato (por isso que estudaremos os princípios gerais e a estrutura básica
dos contratos) – tema retomado em obrigações – que decorrem tanto de negócios jurídicos,
quanto de atos ilícitos e também da lei; e em direito dos contratos.
Essa expressão negócio jurídico é considerada hoje uma expressão superada por muitos
autores. É uma expressão que vem da Pandectística e decorre daquela preocupação conceitual
que caracterizava essa escola – a ideia do jurista alemão do séc. XIX era que, partindo do
pressuposto que é sempre bom ter conceitos amplos que englobam categorias menores,
negócio jurídico seria uma categoria ampla que envolveria: negócios jurídicos bilaterais
(como contratos, no qual há dois polos, acordo de vontades), negócios jurídicos unilaterais
(como testamentos) e algumas outras situações como o próprio casamento, que, no contexto
do séc. XIX, era visto como negócio jurídico.
Entretanto hoje, nosso olhar é mais pragmático. Mesmo situações como casamento,
que antes eram vistas como negócios jurídicos, hoje não são mais. Do ponto de vista
existencial, se fôssemos classificar o casamento em alguma dessas categorias, seria o ato
jurídico stricto sensu (pois a vontade das partes é muito importante para constituição do
vínculo conjugal, porém, a partir daí, todas as consequências do vínculo conjugal são pré-
determinadas pela lei, como o dever de fidelidade, não são as partes que irão discutir que
consequências decorrerão no plano existencial daquele vínculo). No que tange ao regime
patrimonial, já é diferente (nesse caso, o casamento se assemelha a um negócio jurídico, como
um contrato, porque aí as partes vão poder decidir o seu regime patrimonial, vão poder adotar
qualquer modelo previsto pela lei, como inclusive criar um modelo próprio – por meio do
princípio da atipicidade dos contratos, no qual as partes não estão vinculadas aos modelos
oferecidos pelo legislador, mas elas podem criar novos contratos).
Diversas situações que antes eram vistas como meros contratos, meros negócios
jurídicos, a exemplo do casamento, hoje não são mais. O próprio testamento, ainda que
possamos entendê-lo como um negócio jurídico unilateral, o fato de ele ser unilateral e estar
vinculado a questões sucessórias traz tantas peculiaridade que faz com que ele seja regido de
modo muito pormenorizado pela lei e dificilmente possamos compará-lo a um contrato como
outro qualquer. É por isso que, o que acaba sobrando, sendo o núcleo do negócio jurídico é
contrato, como negócio jurídico bilateral, porque viria de uma acordo de vontades.
Hoje, já se cogita de contrato de um só (sociedade unipessoal, por exemplo) ou
contrato plurilateral (como o contrato de uma sociedade; é como se 10 sócios tivessem uma
relação entre si, no qual 2 podem sair e da sociedade e 3 podem entrar, mantendo-se o
vínculo; há uma plurilateralidade de partes – é um contrato diferente pois, ao contrato do
contrato bilateral em que, normalmente, os interesses das partes são contrapostos, aqui todas
as partes querem a mesma coisa, não há contraposição, mas alinhamento de interesses).

Teoria clássica dos contratos: contrato seria acordo de duas ou mais partes para criar,
regular ou extinguir direito
Séc. XIX se caracteriza por um direito privado extremamente patrimonialista e
individualista, que tem na família, na propriedade e no contrato os seus três pilares
fundamentais. Se o direito do século XIX é por excelência o da propriedade, esse direito está
sempre acoplado ao contrato, pois é por meio do contrato que se transfere e adquire
propriedade. Relação propriedade e contrato é muito próxima, sendo ainda mais próxima
no séc. XIX, quando o contrato era visto essencialmente como instrumento de transferência
de riqueza. Hoje, contrato também é visto como instrumento de criação de riqueza, mas, no
séc. XIX, tem a função basicamente de transferência e circulação de riquezas (instrumento do
próprio regime de propriedade).
Para uma burguesia que luta contra o Estado Absolutista, exatamente contra todas as
interferências desse Estado na economia, era fundamental que, naquele contexto pós-
revoluções liberais, ela retirasse o Estado da atividade econômica. Mas retirar em partes,
porque em algumas partes o Estado precisava ficar, sendo que uma dessas partes é para
garantir o cumprimento obrigatório dos contratos. A atividade econômica da época
precisava de segurança e previsibilidade que só um direito racional poderia dar (posso até
contratar da forma mais ampla, posso até não querer a presença do Estado no momento em
que eu contrato, mas quando algo dá errado, aí sim eu quero a presença do Estado para
assegurar que aquela pessoa que não está cumprindo o contrato o faça; e quero a presença
extensa do Estado, até se valendo de medidas coercitivas).
Então, é basicamente em torno dessa preocupação que surge a teoria clássica dos
contratos quer afastar o Estado no que diz respeito aos pressupostos e ao conteúdo do
contrato, mas quer o Estado sempre que alguma coisa der errado, quer que o Estado com seu
poder de império, seu poder de polícia, possa assegurar o cumprimento dos contratos. Isso era
fundamental para a revolução liberal daquele momento: assegurar o pacta sunt servanda,
assegurar a força obrigatória dos contratos, inclusive por meio da utilização do Estado.
PRINCÍPIOS DO CONTRATO LIBERAL:
1) Autonomia da vontade e liberdade de contratar: eu contrato quando eu quero, com
quem eu quero, se eu quiser, da forma que eu quiser, e exatamente por isso eu sou obrigada a
cumprir o contrato.
Esse era o argumento dos grandes industriais quando contratavam pessoas por meio de
salários de fome, obrigando-as a trabalhar 16 horas, a um regime de trabalho subumano (ela tá
aqui porque ela quer, se ela não quiser há uma fila de pessoas querendo). Havia a ideia
ingênua de que a liberdade de contrato era absoluta, como se as pessoas não agissem por
necessidades, como se houvesse liberdade de contratar quando uma parte era muito mais forte
que a outra. Esse era o arcabouço fundamental do contrato no séc. XIX.
Por isso que hoje alguns autores não gostam de falar em autonomia da vontade, mas
em autonomia privada, por entenderem que a autonomia privada reforça também o aspecto de
responsabilidade, de aspectos funcionais daquela liberdade, como a função social do contrato,
que não mais possibilitam a compreensão da liberdade como algo absoluto, ilimitado. No
entanto, esse era o argumento predominante na época, mesmo que nunca tenha sido possível
direitos absolutos (mesmo no séc. XIX, por mais que houvesse toda aquela ideologia que
reforçava a importância de um direito absoluto, na prática, já havia vários exemplos que
mostravam que direitos precisavam ser limitados, como as regras de vizinhança. Ou seja,
mesmo em relação à propriedade já havia a ideia de limitação desse direito, o mesmo vale
para os contratos).
Apesar de se defender e ser a ideia predominante que o contrato está sujeito à
liberdade absoluta, mas os ordenamentos jurídicos, a começar pelo código napoleônico, já
impunham algumas limitações, como ordem pública, moral, bons costumes, algumas
vedações específicas (ex.: contrato de prostituição não era possível no séc. XIX pois se
entendia que ele violava a ordem pública, era considerado um contrato nulo, pois seu objeto
era juridicamente impossível – se houvesse uma liberdade de contratar tão ampla, não haveria
porquê se negar validade a um contrato desse). Só para ficar claro que esse grau absoluto de
liberdade de contratar nunca aconteceu, mas certamente a margem de liberdade era muito
maior que a que existe hoje.
Envolve também a atipicidade dos contratos = possibilidade que as partes têm de
criar novos contratos e novos arranjos, de acordo com sua criatividade. Desde que elas
respeitem as normas imperativas de ordem pública, elas não estão restritas aos modelos
legais.
Há os contratos tipificados (compra e vida, mandato), pois diante da sua
importância e reiterada utilização, o próprio legislador já entende que é melhor dar uma
moldura para aquele contrato, dizendo regras que são obrigatórias (as partes não podem abrir
mão) e, em muitos casos, prevendo regras dispositivas, que apenas prevalecerão se as partes
se omitirem ou não adotarem nenhuma solução (sobre as regras dispositivas, o legislador está
presente, vai dizer algo como “salvo disposição em contrário, o contrato não/vai poder isso e
aquilo”. Se o contrato for omisso, não mencionar, então aplica-se essas regras dispositivas).
As partes não são vinculadas ao modelos oferecidos pelo legislador, elas
podem criar os contratos atípicos, podem misturar modelos contratuais. Muitas vezes
primeiro o contrato é criado na prática e só depois o legislador corre atrás para tentar
disciplinar. Atipicidade dos contratos dá um grande dinamismo na vida social.
2) Princípio do consensualismo: basta o consenso para a formação do contrato. O contrato é
sim um ato de vontade, um acordo entre as partes, mas qualquer forma de manifestação do
consenso é válida para formação do contrato. Diferença entre manifestação de vontade
(piscada, levantar o dedo, silêncio) e declaração de vontade (espécie da manifestação; é
verbalizada, por meio de palavras escritas ou orais).
Exceção são os contratos aos quais a lei exige uma forma específica (alguns tipos de
transações imobiliárias, por exemplo). Em todos os demais contratos, qualquer manifestação
de vontade é suficiente e, portanto, somente quando a lei exigir uma forma especial como
requisito de validade do ato, é que não vale o princípio do consensualismo.
Ex.: apertar o botão do estacionamento do shopping é manifestação de vontade;
contrato eletrônico, por meio de um clique do mouse.
Isso não afasta a utilização da forma escrita como regra na maioria dos contratos, mas
não porque a forma escrita é requisito de validade do contrato, mas tão somente para efeito de
prova (contratos orais, de boca, são inseguros). Assinatura de testemunhas também.
3) Força obrigatória dos contratos: contrato é considerado lei entre as partes, a partir do
momento que as partes fixam uma obrigação, elas têm que cumprir - têm que cumprir por
bem ou por mal; ou elas cumprem espontaneamente ou eu chamo a força coercitiva do Estado
para assegurar o cumprimento daquela obrigação (prisão, medida restritiva de liberdade e
outros constrangimentos). Só mais recentemente é que vem se falar em impenhorabilidade do
bem de família, que não cabe prisão civil por dívida.
4) Eficácia relativa do contrato (princípio da relatividade): utilizado como grande fator de
distinção entre os direitos reais e os direitos obrigacionais, pois os direitos obrigacionais têm
como importantes fontes os contratos e o ato ilícito. Direitos reais são direitos, do ponto de
vista da eficácia subjetiva, erga omnes (toda a sociedade como titular), e os direitos
obrigacionais vinculam apenas partes determinadas ou determináveis, que se obrigam entre si
mediante comportamentos específicos, que são prestações. Essa é a razão do princípio da
relatividade = vínculo contratual apenas produz consequências jurídicas para as partes.
Isso, em princípio, é considerado óbvio e razoável pois, se somente as partes
consentiram, como é que um terceiro que não participou do vínculo, não manifestou sua
vontade, estará sujeito às consequências do contrato? Terceiro é visto sob uma perspectiva de
total isolamento em relação ao contrato. Contrato somente produz efeitos entre as partes
contratantes, em relação a terceiros eles não vai poder beneficiar e parte-se da premissa que
também jamais poderá prejudicar.
Hoje, já se vê que as coisas não são bem assim. Já se pode perceber uma grande
alteração no princípio da relatividade.
5) Justiça comutativa: há vários doutrinadores do séc. XIX que dizem que se é contratual é
justo. Se as próprias partes entenderam que aquele acordo de vontades é vantajoso para elas,
e elas não teriam celebrado aquele contrato se não fosse por meio da sua concordância, não
cabe a nenhum terceiro interferir nesse conteúdo contratual. Até porque a ideia que
predominava era igualdade formal. As partes, vistas pelo prisma da isonomia formal, a partir
do momento em que consentem com algum conteúdo contratual, estão vinculadas
obrigatoriamente a esse conteúdo. Não se questionava se o objeto da contratação dizia
respeito a um bem essencial, se havia assimetria entre as partes. O contrato era visto como
justo por si só. Não se admitia nenhuma forma de controle: se é contratual é justo. Se as duas
partes concordaram, não se discute que aquilo é o melhor pra elas.
Hoje já se admite que há uma margem de intervenção judicial nos contratos mas, por
trás dela, vai uma discussão muito complexa de saber se somente as partes sabem o que é bom
para elas.

SIMULAÇÃO 20, 24 (boa fé pós-contratual; terceiro tem de respeitar um contrato existe?) e


25 (terceiros podem invocar direitos de um contrato ao qual eles não fazem parte?)
Dever geral de abstenção nos contratos: quando o terceiro sabe ou deveria saber da
existência do contrato (no caso Zeca Pagodinho, não há dúvidas que as partes sabiam da
existência do contrato anterior). A questão é saber se era exigível que se soubesse da
existência do contrato e daí inferir se havia dever geral de abstenção.
Já estamos diante de um contexto em que o princípio da relatividade não pode mais ser
considerado um valor absoluto. Até por razões de sociabilidade, relações contratuais
podem sim trazer efeitos para terceiros e terceiros podem sim interferir nas relações
contratuais. Parte-se da premissa que terceiros podem sim ter deveres em relação a um
contrato que ele não participou. A questão é saber se ele violou esse dever.

09/11 (quarta-feira) – ROTEIRO 11 PARTE 2


Ainda sobre os contratos liberais interpretação dos contratos – no séc. XIX, a grande
divergência era saber se, havendo divergência entre a manifestação de vontade e a
intenção verdadeira da própria vontade, o que vai prevalecer? A vontade é o critério, a
manifestação é como a gente exterioriza. O CC napoleônico, ainda muito preocupado com a
vontade, se houve alguma divergência entre a vontade e a sua manifestação, deveria
prevalecer a vontade. Já o sistema alemão, procurava apontar as falhas desse sistema e disse
que a vontade, por ser algo interno, não pode ser um parâmetro de interpretação dos contratos,
sob pena de haver grande instabilidade nos contratos. Assim, prevaleceria a manifestação.
Claro que ao longo do séc. XIX foram havendo mudanças e o sistema francês passou a
aceitar aspectos da declaração, o sistema alemão passou a aceitar a vontade.
CONTRATOS NO SÉC. XX
Cenário em que direito subjetivos e liberdades eram vistos como direitos absolutos e passam a
sofrer limites. Teoria do abuso é fruto da busca de se ver o fenômeno jurídico a partir de uma
perspectiva finalista (tentar entender qual a finalidade do direito, introduzindo um juízo de
proporção, de solidariedade entre direitos). E tudo isso também aconteceu em relação ao
contrato assim como falamos em função social da propriedade, também falamos em função
social do contrato; assim como falamos de abuso do direito de propriedade, também falamos
em abuso do direito de contratar e das faculdades contratuais.
O que é realmente uma novidade é que o contrato, do ponto de vista econômico, passa
também por modificações muito importantes a partir do séc. XX.
Primeiro, o contrato deixa de ser visto apenas como instrumento de circulação de
riquezas (que era a função econômica básica do contrato no séc. XIX) – ele passa também a
ser visto como instrumento de criação de riquezas (ex.: serviço que, no contrato, gera
riqueza para o contratante). Isso está relacionado ao crescimento cada vez maior do setor de
serviços (no séc. XIX, predominava o comércio, então fazia todo o sentido pensar no contrato
como instrumento de circulação de propriedade; a partir do momento que se complexificar as
atividades econômicas, com crescimento da indústria e setor de serviços, o papel do contrato
também se amplia e vai deixando de estar restrito à circulação de bens).
Segundo, a ideia de que o contrato passa cada vez mais a ser um contrato
massificado, como consequência de uma sociedade cada vez mais massificada. Exemplo de
um contrato de massa é um contrato de adesão (consumidores quando querem comprar
produtos ou serviços não sentam e negociam cláusulas daquele contrato, mas normalmente
são apresentados a um formulário e a única opção é assinar – contrato em que somente uma
das partes negocia e impõe as cláusulas ao outro). É um contrato que, do ponto de vista
econômico, facilita e agiliza as transações. Contratos de massa são contratos padronizados,
normalmente de adesão, e daí vem o grande problema (quando, além de tudo, são utilizados
entre partes muito desiguais, nas relações assimétrica).
Contrato de massa vem cercado de uma série de vantagens, sendo que o
grande problema se dá quando esses contratos existem entre partes com posições de poder
muito diferentes (relações assimétricas). Uma coisa é uma contrato de adesão entre dois
grandes empresários, no qual ambos tem grande poder de barganha, então é vantajoso que
haja um modelo contratual pronto, economizando tempo. Outra coisa é quando há uma parte
vulnerável, como o consumidor, que muitas vezes não tem outra opção senão aceitar aquelas
cláusulas.
Por essas questões, muitos chegam em falar em morte dos contratos. Sabe-se que os contratos
não morreram, eles se complexificaram, o que morreu foi aquela compreensão liberal do
contrato, baseada em uma ingenuidade que não mais prevalece.
CATEGORIAS DE CONTRATOS: (essa liberdade de contratar hoje é posta em xeque.
Categorias que não são excludentes entre si, um mesmo contrato pode ser classificado em
várias dessas categorias).
1) Contrato de adesão: aquele que uma das partes cria todas as cláusulas, a outra só adere. O
problema da adesão não é propriamente a adesão em si, é a adesão quando a parte que adere
não tem outra opção senão aderir. Se a parte que adere adeque porque quer, porque teria
outras opções mas prefere aderir, estamos em uma situação diferente.
2) Contrato necessário: contrato em que o contratante precisa daquele bem, não contrata
propriamente porque ele quer, mas porque a subsistência digna dele depende daquele serviço
(contratos relacionados à água, luz, educação, alimentação saúde, até mesmo internet, e outros
tantos serviços considerados fundamentais para a sobrevivência e inserção das pessoas na
vida social).
Se é um contrato necessário e de adesão há um problema: ela contrata não
propriamente porque ela quer e, mesmo assim, na hora da contratação ela não tem nenhum
poder de barganha para discutir as cláusulas, só tem a opção de pegar ou largar e, devido à
necessidade do serviço, ela vai então pegar.
Portanto, essencialidade do bem contratado e assimetria entre as partes são dois
critérios fundamentais. Se estou diante de um contrato necessário e contrato de adesão os dois
requisitos estão presentes: bem é essencial (quanto mais o objeto do contrato está relacionado
à situação existencial, maior a proteção que se deve dar aquele contrato) e estou diante de
hipótese de assimetria entre as partes. Ex.: contratos de consumo.
Legislador, já partindo da premissa da vulnerabilidade do consumidor, procura criar
no Código de Defesa do Consumidor, um regime protetivo para compensar essa assimetria de
poder. Algo que existe também no direito do trabalho, no qual há uma legislação específica
que procura compensar minimamente essa assimetria do trabalhador.
3) Contrato de fato: contrato em relação ao qual não há nem mesmo manifestação verbal da
vontade ou outra manifestação que, embora não seja verbal, envolva algum tipo de
sofisticação. Ex.: compra em máquina de refrigerante, apertar o botão no estacionamento do
shopping, apertar o botão na compra pela internet.
Não há dúvida de que há um contrato, mas pode dizer que a pessoa só por apertar o
botão do estacionamento ou clicar no botão do mouse está concordando com todas as
cláusulas?

14/11 (segunda-feira) – CONTINUAÇÃO ROTEIRO 11 PARTE 2


4) Contratos normativos: contrato que não tem outra finalidade senão estabelecer regras
para elaboração de contratos futuros. Ele não tem nenhum efeito concreto, não tem obrigações
concretas (diz respeito a partes que, normalmente, terão intensos relacionamentos futuros e,
então, cria-se normas para elaboração desses contratos).
5) Contratos conexos: conexão funcional que contratos iguais ou diferentes podem ter. Ex.:
contrato de seguro – muitos dizem que diante de uma seguradora todos os contratos dos
segurados são conexos porque o risco da seguradora é calculado em conjunto, então a
notificação de um contrato altera os outros contratos daquela mesma cadeia.
Contratos que estão em uma mesma cadeia de prestação. Ex.: compra-se um
automóvel e há vários contratos envolvidos, o contrato entre a montadora e a concessionária,
entre esta e o comprador, contratos intermediários. Muitos dizem ser contratos conexos pois
estão unidos por uma finalidade comum. A própria empresa, muitas vezes, é definida como
um conjunto de contratos conexos, pois há vários contratos (contrato que a sociedade tem
com os sócios, com os fornecedores, com os funcionários, com os consumidores) e todos eles
estão conectados funcionalmente a uma só realidade, que é a empresa.
Importa para a necessidade de, muitas vezes, fazermos uma análise macro dos
contratos, contextualizá-los em uma perspectiva maior. Muitas vezes não se pode entender um
contrato analisando apenas a individualidade dele, mas como ele se insere na atividade
econômica, qual a relação que ele tem com outros contratos.
O problema dos contratos de longo prazo: uma coisa é um contrato de execução
imediata (contrato de compra e venda, você chega, paga o produto e leva pra casa). Há
problemas, mas são diferentes daqueles problemas de contratos que serão executados daqui 5,
10, 30 anos. Ou de contratos por tempo indeterminado (contrato de previdência privada, de
plano de saúde). Muitos economistas procuram dar a esses contratos uma abordagem
diferenciada, como a dos contratos incompletos (estratégia utilizada nas negociações
contratuais de longo prazo em que as partes, sabendo que não têm como congelar ou prever o
futuro, muitas vezes propositalmente deixam o contrato incompleto para que elas tenham
flexibilidade de ajustar esse contrato no futuro diante de novos cenários que surgem). Nesse
sentido, o contrato deixa de ter como função econômica apenas segurança e previsibilidade,
mas passa também a adotar a adaptabilidade e flexibilidade como função econômica.
6) Contratos cativos: contratos de adesão que se referem a obrigações de longo prazo
(previdência privada, plano de saúde). Em muitos casos são também coativos.
7) Contratos coativos: há obrigação de renovação (ex.: locação).
8) Contratos relacionais: contratos de longo prazo, normalmente incompletos, que
apresentam elemento de troca mas também elemento de cooperação muito intensos, e
exatamente porque as partes precisam adaptar diante de um futuro incerto elas vão precisar,
antes de tudo, ter estruturas de governança (estruturas que ajudem as partes a modificar o
contrato sempre que for necessário).
Aqui, a teoria contratual se depara com problemas muito semelhantes ao do legislador.
Hoje, o legislador se utiliza cláusulas gerais porque ele não tem como prever antecipadamente
todo um cenário de possibilidades da realidade. O contrato incompleto é uma resposta para
problemas semelhantes: como as partes não têm condições de prever o futuro, elas não podem
apenas utilizar regras fechadas em seus contratos.
Essas categorias não são excludentes!!!
Entender como aumentou a complexificação dos contratos. E um dos primeiros e mais
importantes desdobramentos dessas modificações se projeta na interpretação dos contratos.
No século XIX, a grande discussão era saber o que prevalece: se a intenção ou a
declaração, partindo-se da premissa de que poderia haver uma oposição entre essas duas e que
teria de haver um critério para saber qual prevaleceria.
O que começa a acontecer a partir do séc. XX é um fortalecimento cada vez maior da
boa-fé objetiva – cláusula geral importantíssima com um desdobramento fundamental na
interpretação, que é exatamente a teoria da confiança.
Teoria da confiança: manifestações de vontade como atos de comunicação social, que
devem ser analisadas a partir da reação que eles causam nos destinatários daquelas
manifestações. Portanto, a melhor interpretação do contrato é aquela que preserva a
situação de confiança que pode ser gerada a partir daquela manifestação.
Interpreta-se o contrato a partir das situações de confiança que decorrem das suas
cláusulas. Sempre que daquelas cláusulas for possível o sentimento de uma situação de
confiança, é esse o parâmetro fundamental que deverá orientar a interpretação do contrato.
Preocupa-se com a declaração da parte, mas não naquela dicotomia estática do século XIX, o
que se quer saber é qual o efeito da declaração de vontade sobre o destinatário. Preocupa-se
com a comunicação no seu sentido mais dinâmico e dialógico. A comunicação, assim como o
contrato, não são processos unilaterais, então analisa-se a eficácia do contrato de acordo com
as situações de confiança que podem decorrer de suas cláusulas.
Contratos no Estado Democrático de Direito: uma das grandes consequências da
constitucionalização do direito civil foi mostrar a dignidade da pessoa humana como
princípio fundamental das relações privadas, a importância da personalização dessas relações
e a ideia de que situações patrimoniais têm que ser vistas também de acordo com esses
situações existenciais. A gente viu que não há propriamente propriedade, há propriedades,
isso a depender da função que se dá a cada uma. O mesmo vale pros contratos: não há um
contrato, há contratos Se o contrato diz respeito a um objeto essencial à sobrevivência digna
(contrato necessário; não se pode comparar o contrato de compra e venda de uma joia a um
contrato no qual o pai contrata a escola do seu filho – do ponto de vista existencial, são
contratos totalmente diferentes), certamente que ele merece proteção diferencia. Se há, além
de tudo, assimetria entre as partes (posição de poder entre elas muito diferentes; parte-se da
premissa de que quem tem poder vai usá-lo em seu favor), com maior razão há necessidade de
se redobrar a proteção que se dá àquele contrato (ESSENCIALIDADE DO BEM
CONTRATADO + ASSIMETRIA ENTRE AS PARTES).
Necessidade de proteção a dois tipos de contratos: os contratos necessários – que
dizem respeito a bens ou serviços essenciais, relacionados à sobrevivência digna dos cidadão;
e os contratos assimétricos – contratos entre pessoas com posições distintas de poder. Se o
contrato for, ao mesmo tempo, necessário e assimétrico, há uma necessidade redobrada de se
proteger a parte mais fraca (ela contrata não propriamente porque ela quer, mas porque ela
precisa; ela não tem poder de barganha, muitas vezes a única opção é concordar com todas as
cláusulas que são unilateralmente impostas pelo fornecedor do bem ou serviço) – será que
aqui se fala no pacta sunt servanda como se falava no séc. XIX? Se a parte assumiu esse
compromisso o contrato é entre as partes e não podermos flexibilizarmos de nenhuma
maneira? NÃO! A questão é saber que situações justificam uma flexibilização do contrato
na busca de introdução de alguns elementos de justiça substantiva, para evitar que
pessoas em situações de vulnerabilidade, diante de bens ou serviços que elas não só querem
como precisam adquirir, sejam prejudicadas; em que medida tais situações justificariam uma
intervenção até mesmo judicial no conteúdo desses contratos.
Alguns princípios fundamentais:
Autonomia da vontade: alguns autores hoje nem gostam mais de se utilizar dessa expressão,
preferem autonomia privada para ressaltar que não há liberdade absoluta, mas sim uma
liberdade que vem acompanhada de responsabilidade e dos deveres e limites da função
social.
Desdobramento: possibilidade de criar contratos atípicos – o CC e leis extravagantes
apresentam modelos contratuais (compra e venda, doação), o que normalmente acontece
quando um contrato é muito importante, seja pelo atual momento econômico seja por uma
experiência histórica, e o legislador acaba regulando esse contrato de maneira mais intensa,
seja para impor algumas regras obrigatórias (autonomia privada jamais será absoluta), seja
para prever o que chamamos de regras dispositivas (regras que podem ser afastadas pela
vontade das partes, mas que prevalecem na omissão – às vezes as partes fazem maus contratos
se esquecendo de algo fundamental, então, se há uma lacuna, ela será completada pelo
modelo contratual) princípio da atipicidade dos contratos (art. 425, CC. É lícito às partes
estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste Código): as partes não estão

restritas aos modelos contratuais, elas podem criar novos contratos, novos arranjos
contratuais que fogem dos modelos previstos pela lei. Desde que esses contratos não sejam
utilizados para burlar a legislação obrigatória (regras fundamentais para proteção dos
interesses do Estado, interesses difusos mais relevantes, interesses dos mais vulneráveis),
desde que esses limites sejam respeitados, as partes têm toda autonomia para criar novos
arranjados e novos modelos contratuais.
Consensualismo: autonomia privada é tão prestigiada que, em princípio, desde que a lei não
contenha regra em sentido contrário, as partes podem se utilizar de qualquer forma
para manifestar a sua vontade. Qualquer forma de manifestação do consenso é válida
(balançar a cabeça, apertar um botão). As partes normalmente se utilizam da forma escrita por
questões de segurança e prova. (obs.: diferença entre manifestação e declaração da vontade:
manifestação é mais ampla, declaração é sempre manifestação verbalizada, enquanto que a
manifestação pode ocorrer de várias formas, inclusive pelo silêncio).
CC, Art. 107. A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei
expressamente a exigir.
CC, Art. 111. O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for
necessária a declaração de vontade expressa.
Desde que a lei não diga que há necessidade de declaração da vontade expressa, o
silêncio é considerado sim manifestação de vontade. Tudo vai depender da situação de
confiança que pode decorrer daquele silêncio. Tudo depende da eficácia daquele silêncio,
dentro do contexto em que ele acontece, dentro dos usos e costumes, tudo depende da
possibilidade daquela situação de silêncio gerar uma situação de confiança. Se for possível a
geração dessa situação de confiança, o silêncio é sim considerado uma manifestação válida de
vontade, válida inclusive para estabelecimento de contratos mesmo diante do silêncio de uma
das partes.
Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que
visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a
trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.
Exceção expressa ao princípio do consensualismo: negócios que tenham por objeto
direitos reais e que tenham por valor uma soma superior a 30x o SM do país só podem ser
celebrados pela via da escritura pública. Aqui a forma é da substância do ato. Exatamente
porque a lei prevê como exceção, é que ela afasta a hipótese do consensualismo. Nesse caso,
vê-se que o legislador foi claro e que a escolha pela escritura pública não é uma mera questão
de prova, é uma questão de validade do negócio jurídico.
Proteção da confiança: Irrelevância da reserva mental. Art. 110. A manifestação de vontade subsiste
ainda que o seu autor haja feito a reserva mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário
tinha conhecimento.
Reserva mental é declarar o que eu não quero, é mentir, falsear. Eu estou
manifestando uma vontade sabendo que aquilo não corresponde ao que eu realmente quero. E
ela pode não querer por várias razões (ela pode estar brincando, pode ser uma mentirosa
compulsiva), tudo depende da boa-fé do destinatário. Se é claro que o que a pessoa está
falando não corresponde a sua vontade, se o destinatário tinha conhecimento, sabia que a
outra pessoa não queria aquilo que ela estava falando, não há que se cogitar em formação de
situação de confiança. Mas, caso não fique claro e seja possível a formação de situação de
confiança, então ele fica vinculado àquilo que ele manifestou, pouco importando se aquilo
correspondia ou não ao que ele queria. Desde que situações de confiança sejam geradas a
partir da manifestação da vontade, você responde por elas (usa-se o critério do homem
médio).
Isso torna a interpretação muito mais complexa, pois antes analisava-se a declaração e,
de certa forma, o argumento de que aquilo não correspondia à vontade era um argumento
exclusivo do declarante, pois jamais poderia entrar na cabeça dele para comprovar que ele
declarou aquilo que não queria. Agora, o Código inverte essa lógica: cuidado declarantes! As
suas manifestações de vontade vão ser julgadas não a partir do que você quer, mas a partir da
reação que ela causa nas demais pessoas. Se situações de confiança forem geradas a partir daí,
você estará vinculada a sua manifestação de vontade.
Importância da intenção: Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas
consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.
Artigo que deve ser interpretado de acordo com a boa-fé (art. 113). Por boa-fé, no que diz
respeito ao seu efeito interpretativo, entende-se teoria da confiança – boa-fé é,
essencialmente, proteger a confiança.
Aqui não houve uma mera reprodução do que havia no código anterior. Antes, se
falava que na declaração da vontade deve-se ater mais à intenção que ao sentido literal da
linguagem. Mesmo no contexto do código anterior, a doutrina e a jurisprudência nunca
entenderam que daquele dispositivo havia o acolhimento da teoria da vontade dos franceses.
Direito brasileiro sempre privilegiou a teoria da declaração, afastando a interpretação literal,
sem colocar a vontade de maneira absoluta e prioritária em relação à declaração Mas era fato
que o dispositivo dava margem a muitas interpretações, o que foi solucionado pelo art. 112.
Art. 112 não fala mais somente em intenção, mas fala em intenção consubstanciada na
declaração. Rompe-se com essa dicotomia entre declaração e vontade. Declaração é vontade
em movimento, vontade em ação. Entende-se a declaração pela intenção e a intenção pela
declaração. Por isso não é qualquer intenção, é intenção consubstanciada na declaração. Aqui,
o código procura trabalhar com uma perspectiva em que intenção e declaração são vistas de
maneira dinâmica, elas se interpenetram.
O que vale é intenção consubstanciada na declaração (interpenetração entre esses
dois vetores) e interpreta-se essa intenção consubstanciada na declaração a partir das
situações de confiança que dela decorrem. Teoria da confiança dá um fecho a todos esses
dispositivos que tratam de interpretação contratual.
Analisa-se a situação de confiança sempre a partir do destinatário. Quando se diz
“intenção consubstanciada na declaração” se quer dizer que a declaração deve, dentro do
possível, refletir a intenção – declaração é intenção é movimento. Agora, nem sempre é o
destinatário concreto, analisa-se a partir da ideia do destinatário como homem médio (numa
situação como essa, um homem de prudência média acreditaria e se sentiria numa situação de
confiança?).
Equidade: equidade não é bem uma cláusula geral, só pra mostrar que, em alguns momentos,
o código tem essa preocupação em introduzir elementos de justiça substantiva, mas que são
pontuais, em alguns casos somente.
Art. 114. Os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente.
Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a
interpretação mais favorável ao aderente.
Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a
direito resultante da natureza do negócio.
CLÁUSULAS GERAIS: tem a peculiaridade de serem, antes de tudo, normas abertas. Não
dizem como os juízes deverão julgar, mas dão diretrizes para que os juízes, com base nelas,
crie a norma para o caso concreto. Essas cláusulas sempre se interpenetram. Muitas vezes
nem mesmo a jurisprudência faz essas diferenciações entre as cláusulas, daí porque boa-fé
objetiva e função social normalmente são tratadas em conjunto.
1) FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO: alguns desdobramentos mais concretos:
reconhecimento do dever de contratar e proibição de abuso de direito nos contratos.
Reconhecimento do dever de contratar: função social envolve dimensão ativa, no
que diz respeito à imposição de deveres. Daí porque em alguns casos o legislador impõe o
dever de contratar. Algo regular diante da função social dos contatos.
Em alguns casos a parte tem dever de contratar. É algo semelhante àquela dimensão
social ativa da função social – imposição de um dever. Ex.: renovatória de aluguel – o
proprietário o obriga a ficar no contrato; direito do consumidor – toda oferta de um prestador
de bens/serviços é pro público, então a partir do momento que o consumidor chega e diz “eu
quero”, ele tem o dever de contratar, ele não pode te discriminar (dizer que não vai vender pra
você, ou dizer que vai vender por outro preço, a oferta é irrevogável).
Proibição do abuso de direito: assim como há o dever positivo, há também a
limitação do exercício da autonomia privada e das faculdades contratuais. Ex.: concessionária
de energia elétrica cortar a luz diante da inadimplência do usuário de 85 centavos. Discussão
sobre abuso de cláusulas contratuais. Havia um contrato que dizia que, diante da
inadimplência do usuário, a concessionária podia cortar a luz dele. Mas, o fato de existir uma
cláusula dizendo que ele genericamente pode fazer isso, quer dizer que ele pode utilizar essa
cláusula em qualquer situação? Abuso de direito envolve sempre exame qualitativo e
quantitativo (quais são as finalidades sociais e econômicas que justificam o exercício daquela
faculdade naquela ocasião? Diante dos meios que ele teria para exercer o seu direito, o meio
que ele escolheu é razoável? Há uma adequação entre meios e fins). Tudo o que vimos sobre
abuso de direito se aplica aqui.
Às vezes, algumas situações justificam algumas especificações, como a teoria do
adimplemento substancial: quando uma das partes já cumpriu substancialmente um contrato, a
outra parte não pode exercer contra ela faculdades sancionatórios extremamente restritivas,
como a busca e a apreensão, nem muitos menos colocar fim ao contrato. É um desdobramento
prático do juízo de proporcionalidade inerente ao abuso de direito. Ex.: pessoa quer comprar
um carro e pede um financiamento, ela tem posse direta do bem mas o proprietário é o
financiador. Se ela atrasa a prestação, como ela está usando um bem que a rigor não é dela, o
credor pode se utilizar da busca e apreensão. Supondo que o contrato tinha 48 prestações e o
devedor pagou somente 46 prestações, se tornando inadimplente, e o financiador entrou com a
busca e apreensão. Para situações como essa, foi criada a teoria do adimplemento substancial.
Portanto, se o devedor falhou as duas últimas prestações, resta ao financiador cobrar essas
prestações. É proporcional em uma situação como essa querer pôr fim a um contrato em que o
devedor pagou 46 das 40 prestações e pedir a busca e apreensão? Dificulta quando são 40, 36,
30 prestações. A questão é saber se pode considerar um contrato substancialmente cumprido.
Flexibilização do princípio da relatividade: Reconhecimento da eficácia da relação
contratual sobre terceiros. Hoje, diante da função social dos contratos, o princípio da
relatividade (contratos só produzem direitos e deveres entre as partes e não produzem efeitos
sobre terceiros) não é mais visto como algo absoluto. Viu-se que terceiros podem sim ter
deveres diante de contratos, como dever geral de abstenção diante de um contrato de cuja
existência se sabe ou de cuja existência se deveria saber. Outra possibilidade de função social
dos contratos é imaginar a possibilidade de terceiro se beneficiar de um contrato.

Simulação 25: terceiro ter um direito em relação a um contrato do qual ele não faz parte. Para
alguns, não se poderia ter admitido que a vítima entrasse com ação direto contra a seguradora,
ao invés de primeiro para o ofensor e só depois que entrasse a seguradora. É possível na fase
de execução, mas no processo de conhecimento se mantém o esquema (cabe a vítima ajuizar
contra o ofensor, o ofensor faz a denunciação à lide contra a seguradora). A peculiaridade é a
pessoa jurídica (ofensora) ter se dissolvido. Havia outras soluções ao invés de processar direto
a seguradora, como a desconsideração da personalidade jurídica.
Simulação 26: quais os limites da utilização da boa-fé objetiva na proteção da confiança?
Proteção à palavra dada, confiança e situação existencial relacionada à impenhorabilidade do
bem de família. Se o devedor não falasse nada não haveria discussão, pois a
impenhorabilidade do bem de família incidiria. Agora, há renúncia expressa, o que contrapõe
à má fé é a boa fé subjetiva. A boa-fé objetiva envolve cuidados que independem da intenção.
Daí porque, ainda que o devedor ao renunciar não estivesse de má fé, há bons fundamentos
para se dizer que ele não cumpriu a boa-fé objetiva. Vedação venire, as pessoas não podem se
voltar contra seus próprios fatos, lealdade envolve coerência, não posso falar A depois fazer
B, não posso uma hora fazer uma renúncia e depois querer dizer que a renúncia não fale.

19/11 (sábado – aula extra)


2) BOA-FÉ OBJETIVA: essencialmente, boa-fé objetiva é proteção da confiança. Tanto que
uma dimensão da boa-fé objetiva na interpretação dos contratos é interpretar os contratos a
partir das situações de confiança que dele decorrem, i.e., interpretar manifestações de vontade
como um ato de comunicação social que deve ser julgado a partir dos efeitos que produzem,
sendo um desses efeitos a produção de uma situação de confiança.
É esse o tratamento que o código dá às situações de reserva mental e de silêncio. A
vinculação de manifestação de vontade com reserva mental depende da boa-fé do destinatário
(se o destinatário é capaz de produzir, a partir daquela declaração, uma situação de confiança,
então vincula). O mesmo vale para o silêncio (se o destinatário for capaz de gerar uma
situação de confiança a partir do silêncio, então o silêncio vinculará). Essa é a ideia da
proteção da confiança no que diz respeito especificamente a essa primeira dimensão
interpretativa da boa-fé objetiva, sempre em prol da busca e proteção da confiança.
Boa-fé objetiva, assim como a função social dos contratos, terá também uma dupla faceta:
uma faceta de limitação ao exercício da liberdade e das faculdades de contratar, diante de um
contrato já existente, e uma faceta de criação de deveres anexos ao contrato:
Dimensão limitativa de direitos e faculdades contratuais: ideia de boa-fé objetiva
aqui é semelhante a da função social no que diz respeito à vedação ao abuso de direito. Boa-
fé objetiva é um dos parâmetros para aferição de abuso do direito – todo exercício de direito
que é feito contrariamente à boa fé objetiva é considerado abusivo.
Dimensão de criação de deveres: muitas vezes a doutrina chama esses deveres de
deveres anexos ou laterais, mas com isso não se quer dizer que são deveres de menor
importância, só que são deveres que não precisam estar previstos expressamente no contrato.
Ainda que o contrato nada disponha a respeito desses deveres, é como se eles
automaticamente passassem a integrar aquele contrato. As partes nem poderiam afastar a
incidências desses deveres, diante do fato de termos uma cláusula geral de incidência
obrigatória em todos os contratos. Os principais deveres são:
a) proteção – dever de cuidado, segurança, incolumidade do outro contratante e do seu
patrimônio e o de terceiros (caso Zeca pagodinho: não só o contratante, como terceiros, tem
que ter esse dever de proteção = boa-fé objetiva chega a um resultado semelhante a da função
social do contrato). Deveres que os contratantes têm entre si, mas também diante de terceiros,
e que terceiros também têm diante dos contratantes (dever de proteção diante de contratantes
de um contrato no qual o terceiro sabe da existência ou deveria saber).
b) esclarecimento (informação e transparência) – a ideia de que as partes, em um
contrato, precisam estar o tempo inteiro cooperando uma com a outra, avisando uma a outra
sobre eventuais inadimplementos ou como aquele contrato deveria estar sendo cumprindo.
Boa-fé aqui até impede condutas oportunistas, que muitas vezes fazem com que uma das
partes até torça pelo descumprimento contratual da outra, para só então se valer de uma série
de faculdades do contrato (cobrança de multas, rescisão). A ideia é de que as partes precisam
cooperar a todo momento, se uma das partes não está cumprindo, a outra tem obrigação de
avisá-la, para que ela possa dentro do possível cumprir. Evitar a surpresa.
c) dever de lealdade (coerência, não surpresa, sigilo, assistência e colaboração) – a
boa-fé objetiva basicamente introduz nos contratos a ideia de cooperação: por mais que os
contratos bilaterais tenham interessem contrapostos, há a necessidade de que os dois polos
cooperem para um objetivo comum, que é o cumprimento do contrato, a satisfação dos
interesses contrapostos que deram ensejo a aquele contrato. As partes precisam ser vistas em
uma perspectiva de cooperação, não de conflito. A própria ideia de contrato se modifica, pois
a cooperação passa a ter um destaque cada vez maior.
O outro aspecto da boa-fé objetiva é a ideia de obrigação como um processo: ideia que tem
importância fundamental em todos os contratos, mas especialmente nos de longo-prazo.
Quando as partes fazem um contrato, o instrumento contratual (aquilo que elas pactuam) não
ficam cristalizados, engessados, i.e., os direitos e obrigações da partes não estão restritos
apenas a aquele primeiro instrumento. Os comportamentos supervenientes das partes vão
poder alterar aquilo que foi inicialmente compactuado, seja afastando seja suavizando
algumas obrigações, seja criando outros direitos. Obrigação como um vínculo dinâmico, que
pode se modificar ao longo do tempo de acordo com os comportamentos das partes, de acordo
com a geração de situações de confiança que uma parte causa na outra.
Ex.: contrato de locação em que fique claro que o dia do pagamento é o dia 5 de cada
mês e que, caso não haja pagamento no dia 5, haverá multas. Supondo que no primeiro mês o
devedor atrase 2 dias e o credor nada faz. Segundo mês também e assim continua por 3 anos,
com o devedor sempre pagando com esse atraso e o credor nada falando. Depois de 3 anos
chega o credor querendo pôr fim ao contrato e cobrando todas as multas e juros decorrentes
do inadimplemento. Analisando o contrato a partir do dispositivo inicial, o credor tem razão.
Mas analisando o contrato na sua dinamicidade, entende-se que, ao receber o pagamento em
atraso durante 3 anos, sem o credor nunca avisar, gera uma situação de confiança de que havia
tolerância no prazo. Isso acontece muito no direito do trabalho. É nesse sentido que se coloca
como importantíssimo o dever de esclarecimento (informação e transparência).
Boa-fé objetiva flexibiliza o pacta sunt servanda, que era o princípio tradicional do século
XIX (celebra-se um contrato, que cristaliza todas as obrigações entre as partes, aquilo é lei,
não se pode mais discutir ou questionar). Com a boa-fé objetiva, entende-se que os
comportamentos supervenientes das partes vão poder alterar aquilo que foi inicialmente
pactuado, seja para reduzir o conteúdo do contrato (diminuindo alguns direitos ou deveres),
seja para alargar o conteúdo do contrato, ao introduzir todos aqueles deveres (proteção,
esclarecimento, lealdade).
Mas, boa-fé objetiva pode ser usada para o efeito oposto, para reforçar o pacta sunt
servanda (simulação do devedor que renunciou o bem de família), para reforçar o respeito à
palavra dada.
Boa-fé objetiva possibilita que a mesma cláusula geral possa flexibilizar quanto
enrijecer o que foi pactuado no contrato. O critério para se saber quando a boa-fé será
utilizada em um sentido ou em outro é a proteção da confiança – quando a proteção da
confiança exigir a flexibilização do contrato, então é isso que deve acontecer. Quando a
proteção da confiança exigir o enrijecimento, reforço à palavra dada.
Assim como acontece com a função social, a boa-fé rompe também com o princípio da
relatividade contratos – traz terceiros para dentro da relação contratual. Quando se fala em
deveres anexos, são deveres que os contratantes tem prioritariamente entre si, mas em alguns
casos também diante de terceiros (dever de proteção, de cuidado – contratantes não podem
lesar interesses de terceiros livremente e terceiros também terão que ter dever de cuidado em
relação a contratos que eles conheçam ou devam conhecer).
Subprincípios (hipóteses que ajudam a entender o sentido da boa-fé objetiva).
1) Princípio do tu quoque: expressão latina que significa algo como “até tu”. O que está por
trás é a ideia da surpresa, alguém se ver totalmente traído pela conduta da outra pessoa.
Nenhum contratante pode exigir do outro aquilo que ele mesmo não faz. Princípio de
integridade, de coerência (se eu atraso a minha prestação, não há como eu exigir que a
contraparte cumpra a dela absolutamente de forma pontual, pouco importando o que diz o
contrato formalmente – o comportamento das partes vai ser fundamental para determinar a
exata extensão do contrato).
2) Venire contra factum proprium: se voltar contra um fato próprio da sua mesma autoria.
Proibir a contradição. Ex.: contrato diz que deve pagar até dia 5. Dia 1 o devedor contata o
credor dizendo que não vai poder pagar, perguntando se ele está ok e ele diz que sim e aí no
dia 6, credor vai lá e cobra multas desconhecendo esse fato anterior. Na atual dinâmica das
relações contratuais, condutas contraditórias não são mais toleradas. Exige-se que as partes
tenham obrigação de coerência e integridade. Impossibilita que um fato superveniente de uma
das partes seja contraditório a um fato anterior dela mesma.
Ele tem sido utilizado mesmo contra partes vulneráveis em contratos assimétricos.
Mesmo nesses contratos, em que uma das partes é presumivelmente vulnerável, não se pode
admitir que a parte mais fraca se utilize desse sistema protetivo para agir de maneira desleal,
contrária à boa-fé objetiva (ex.: tribunais trabalhistas, trabalhador recebia licença remunerada
para estudar no exterior ao revés de, quando voltar, ficar 2 anos na empresa. Trabalhador não
quer voltar e diz que não está vinculado ao que ele disse, sob fundamento da proteção da parte
mais fraca. Tribunais trabalhistas já entendem que ele está vinculado sim, partes vulneráveis
não estão livres para agir de forma desleal).
c) Supressio: perda da eficácia de um direito, em razão da omissão qualificada de uma das
partes em exercer esse direito. No exemplo do contrato de locação em que, apesar da previsão
de pagamento no dia 5, todo mês o locatário atrasa 2 dias e o credor nada fala – será que
depois de 3 anos omisso, o credor não gera uma situação de confiança no devedor de que ele
pode atrasar? Sim! Aqueles direitos que o credor teria diante do inadimplemento (multa)
deixam de ser exercidos. Credor não pode chegar depois de 3 anos querendo cobrar multa e
juros, pois houve omissão qualificada dele. Supressio tem muitos pontos em comum com o
venire contra factum proprium (alguns entendem que supressio é uma espécie do gênero
venire). Entretanto, pro venire, precisa de duas condutas do contratante, normalmente
comissivas, pouco importando o lapso temporal entre essas duas condutas, sendo que não
pode haver contradição entre a segunda conduta e a primeira. Na supressio, há uma omissão,
uma das partes nada faz. Omissão e lapso temporal – é o lapso temporal que faz com que a
primeira omissão seja qualificada a gerar situação de confiança.
A grande dificuldade é analisar como o lapso temporal, de acordo com as circunstâncias
específicas daquele contrato, pôde levar ou não a uma situação de confiança. Se chega-se à
conclusão de que sim, houve a geração de situação de confiança, é essa situação de confiança
que será preservada.
Uma das principais discussões sobre a supressio é saber se a sua consequências é a
perda da eficácia sobre o passado ou se pode chegar a ponto de levar à perda do próprio
direito, i.e., perder a eficácia também para o futuro. No direito estrangeiro, há uma tendência
de ser refratário aos efeitos da supressio pro futuro pois eles entendem que a renúncia a um
direito tem que ser sempre explícita, e a supressio advém de uma omissão. Então a real
consequência da supressio seria a perda da eficácia passada do direito.
Alguns dizem que a supressio acaba levando a uma antecipação indesejada da
prescrição (perda da pretensão). Regra geral de, enquanto eu tenho prescrição eu posso agir.
Ex.: 2 anos que o credor está omisso quanto aos pequenos atrasos do devedor. Chega o
devedor e diz, houve supressio e você não pode mais me cobrar. Ai chega o credor e diz que
não houve supressio, eu ainda tenho pretensão e eu posso exercer meu direito. Prescrição é
exatamente um prazo para eu agir, posso exercer até o último dia. Supressio só entra em
discussão quando não há prescrição, se trabalha-se com prescrição a ação da parte que
envolve o direito seria lícita. Apesar disso, se haver tido situação de confiança na outra parte,
mesmo ela tendo pretensão ela não vai poder exercê-la, pois aquele direito dela perdeu
eficácia diante de uma situação de confiança gerada. Por isso há problemas para a aceitação
da supressio, por isso devemos compreender a supressio com muito cuidado.
Apesar de ser controversa, já temos uma base doutrinária e jurisprudencial consistente
aqui no Brasil no sentido de que a supressio é sim admitida no nosso direito, pelo menos para
efeito de chancelar a perda da eficácia passada de faculdades contratuais, sempre que se gerar
na parte contrária a situação de confiança, a legítima expectativa. Grande questão é verificar,
a partir do envolvimento das partes e do lapso temporal, se realmente essa situação de
confiança existiu ou não.
d) Surrectio: criação de um direito em razão do comportamento continuado. Se o credor
perde o direito de poder cobrar multa diante de pequenos atrasos por parte do devedor, é
porque o devedor ganhou o direito correspondente de pagar com atrasos. Uma perde e outro
ganha. A questão é, pode-se imaginar que a surrectio tem projeção sobre o futuro? (há
divergências).
Ex.: contrato de sociedade – contrato plurilateral sem interesses contrapostos. Esse
contrato dava os percentuais de distribuição de lucro de acordo com as cotas. Mas essa
sociedade ficou durante anos distribuindo os lucros igualitariamente. Entende-se que houve
surrectio, houve alteração do contrato social mediante o qual o futuro passou a estar sujeito a
um critério igualitário, e não ao que estava previsto inicialmente.
O que se tem como certo é a ideia como supressio e surrectio sempre com efeitos
passados. Admite-se que na supressio uma das partes teve perda de eficácia do seu direito e a
outra parte ganhou um direito correspondente a essa perda de eficácia no outro na surrectio.
3) PRINCÍPIO DO EQUILÍBRIO CONTRATUAL/ DA EQUIVALÊNCIA
MATERIAL/ DA JUSTIÇA CONTRATUAL
Diferentemente da função social dos contratos e da boa-fé, esta não está expressa no código.
Doutrina e jurisprudência se dividem sobre a existência ou não dela como cláusula geral.
Baseia-se na ideia de que temos que pensar se não há necessidade de um juízo mínimo de
justiça nos contratos. A ideia que é colocada em cheque agora é aquela ideia do séc. XIX de
“se é contratual é justo”. Não é porque é contratual que é justo.
Questão é saber quais os limites e os parâmetros para que o judiciário possa intervir em
contratos injustos.
Para uma parte minoritária da doutrina, essa cláusula existe e, em princípio, justificaria um
controle da justiça dos contratos de maneira ampla. Para a parte majoritária, a questão
principal é saber se há desequilíbrios objetivos evidentes (desequilíbrio do contrato que
pode ser aferido só olhando as cláusulas daquela contrato) e se esses desequilíbrios objetivos
evidentes decorrem de um desequilíbrio subjetivo (desequilíbrio entre as partes, são as
relações assimétricas, são partes de exercício de poder/barganha muito diferentes).
Para muitos, o problema do desequilíbrio objetivo não é um mal por si só (todos
teriam direito a fazer um mau contrato e teriam que se responsabilizar por isso; autonomia da
vontade). Problema é um desequilíbrio objetivo que decorre de um desequilíbrio subjetivo –
aqui, não se pode imputar o desequilíbrio do contrato a uma falta de atenção do contratante e
sim uma vulnerabilidade desse contratante. Aqui faz sentido imaginar que possa haver um
espectro maior de intervenção no controle dos contratos.
Nas situações de assimetria da relação e essencialidade do bem contratado esse
princípio deve ser aplicado com um controle maior.
CC tem várias soluções pontuais para lidar com problemas de desequilíbrios contratuais que
ele considera inaceitáveis (lesão por exemplo – parte, se aproveitando do estado de
necessidade da outra, obriga essa outra a assumir uma obrigação manifestamente
desproporcional). A questão é, fora dessas hipóteses específicas, pode também haver
interferência judicial em contratos tão somente em questões de equilíbrio? A melhor
interpretação é de que essa cláusula existe sim, porém seu foco diz respeito a desequilíbrios
objetivos evidentes que decorram de desequilíbrios subjetivos. Mas, saber se um contrato é
equilibrado é muito difícil.
Caso de lesão = anulação do contrato.

Simulação 27: contrato cativo, essencial e assimétrico de longo prazo. Nos contratos
relacionais é importante que as partes tenham mecanismos para repactuar o contrato, pois
algumas coisas previstas há 35 anos talvez não funcionem mais para hoje. De um lado, não
pode haver aumento em relação à idade porque isso viola o estatuto do idoso por ser
discriminatório. De outro, o fator econômico relevante. Alguém tem que pagar essa conta: ou
a seguradora vai quebrar ou ela vai repassar sobre os mais jovens. Com base nisso que o STJ
reviu o primeiro entendimento e entendeu que um aumento compatível é válido, aumento só
não pode ser abusivo. Questão é saber qual percentual de aumento é razoável e a questão do
esclarecimento/informação.

ROTEIRO 11 PARTE 3
Como a temática dos negócios jurídicos é tratada na lei e como ela é tratada classicamente na
doutrina a partir de três planos (art. 106, CC): da existência, da validade e da eficácia.
1) Existência: o contrato existe? – contrato é acordo de vontades, então, para o contrato
existir, precisa-se de partes, que acordam em torno de um objeto e que vão se utilizar de uma
determinada forma sem a qual elas não conseguem manifestar o seu acordo (por ser oral,
silêncio, gestos, escrita...). Só que o contrato existir não é suficiente para o direito, contrato
precisa ainda ser válido.
2) Validade: qualifica juridicamente cada um dos três elementos de existência. Para que o
contrato exista, basta que haja duas partes. Para que ele exista e seja válido, ainda precisa que
essas partes sejam capazes.
Para que o contrato exista, qualquer objeto serve. Para que ele exista e seja válido,
ainda precisa de um objeto possível (fática e juridicamente), lícito e determinado ou
determinável. Agrega-se ao objeto uma série de requisitos sem os quais não há possibilidade
de um contrato do ponto de vista da validade.
Ex.: Impossibilidade fática seria, por exemplo, alguém vender terrenos em
saturno. Contrato de prostituição no século XIX. Entendia-se que haviam partes, um objeto e
uma forma (contrato existia). Mas não era válido, pois tinha um objeto ilícito.
Para que o contrato exista, qualquer forma serve. Para que ele tenha validade,
prevalece o princípio do consensualismo, mas consensualismo com exceções. Quando a lei
prevê expressamente a forma como sendo da substância do contrato, é porque ela é requisito
de validade. Na hipótese do art. 108 (“não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à
validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais
sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no país) a lei exige que certas

transações precisam ser feitas por meio da escritura pública, i.e., exceção ao princípio do
consensualismo e, portanto, a escritura pública é da substância do contrato, sendo requisito de
validade. Em todos os demais casos, a forma normalmente, em razão do princípio do
consensualismo, tem uma finalidade meramente probatória (pessoas se utilizam de uma forma
escrita tão somente para provar com maior segurança o que elas acordaram).
3) Eficácia: às vezes, o fato de um contrato existir e ser válido não quer dizer que ele é eficaz
desde já. Isso acontece pois o legislador trabalha com elementos acidentais, elementos como a
condição e o termo, que possibilitam que as partes possam “brincar” com a eficácia daquele
contrato.
Ex.: vou fazer uma doação de um carro popular para todos aqueles que concluírem o curso de
Direito na FD com SS em todas as disciplinas. Às vezes, as partes se utilizam disso para não
ter que aguardar um tempo, para estimular a cumprir determinadas condutas. Essa é a ideia
das condições e dos termos.
Condição é evento futuro e incerto. Condições e termos existem para ampliar as
alternativas da autonomia da vontade, i.e., é o fato de eu poder me utilizar de elementos
que possam modular a eficácia de um contrato, seja a eficácia inicial seja a final. No
plano da eficácia, já tendo passado do plano da validade, quero saber se aquele contrato não
está sujeito a elementos que, como o termo e a condição, vão poder modular a eficácia
daquele contrato, tanto a eficácia inicial como a final.
CC trata especificamente da representação (relacionada à capacidade): aquele que é
incapaz não pode exercer diretamente seus direitos e deveres, mas pode fazê-lo por meio de
seus representantes.
Existem dois tipos de representantes (falam em nome do representado, exercendo-a
sempre em nome do representado – por isso código impede conflito de interesses, por
exemplo): representantes legais (imposição que decorre da incapacidade – pais em relação
aos filhos, tutores e curadores em relação aos incapazes; obrigatória ) e representantes
contratuais (não tem a ver com a capacidade, mas com questões de praticidade – procuração;
facultativa). Regras gerais que tratam desses dois casos de representação. Por meio desses
dois tipos de representação, contratos são feitos a todo momento.

ROTEIRO 11 PARTE 4
Condições, termos e encargos vão modular a eficácia temporal dos contratos.
Esses elementos são chamados acidentais para enfatizar que eles não precisam acontecer
(ex.: do doação do carro, eu não precisaria colocar aquela condição, eu coloquei porque quis.
É um plus, uma forma que as partes têm de terem ainda mais recursos para exercerem sua
autonomia da vontade. Porém, a partir do momento em que elas optam por se utilizar desses
elementos, eles deixam de ser acidentais e passam a fazer parte essencial do contrato e vão ter
inúmeros desdobramentos.
Condições e termos são sempre eventos futuros. A diferença é que o nas condições o
termo futuro é incerto enquanto no termo o evento futuro é certo.
CONDIÇÃO: Art. 121. Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da
vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto.
Condição suspensiva: impede/suspende a eficácia imediata do contrato até sua
ocorrência.
Ex.: doar um carro quando e se concluir o curso de direito tirando SS em todas as
matérias. O contrato existe, pode ser válido, mas não é eficaz – sua eficácia está suspensa até
que ocorra a condição, se é que vai ocorrer.
Na maiorias dos casos de condição suspensiva, elas estão sujeitas a algum tipo de
modulação temporal. Ex.: se alguém mudar para Paris em até 5 anos – tem o elemento de
certeza, mas ele está modulado temporalmente de forma que eu sei que, se isso não acontecer
dentro de 5 anos, não acontecerá mais. Porém, a depender, a condição suspensiva pode
impedir a eficácia e tornar uma relação instável por toda uma vida. Ex.: doarei um carro se
concluir um doutorado em Harvard. Em tese, enquanto eu estiver viva, isso pode acontecer,
quando eu terminar o curso ou daqui há 30 anos.
Uma condição ilícita ou que já se sabe que não ocorrerá tira o elemento de incerteza que é
necessário para a condição. Se, quando aquela condição foi pensada, havia uma certeza de
que ela não ocorreria isso vai poder afetar o negócio. A ideia da condição é submeter o
contrato, seja do ponto de vista da suspensão, seja da resolução, a um elemento de incerteza
verdadeiro.
Grande parte da doutrina exige uma incerteza objetiva: incerteza que possa ser minimamente
apurada, que não apenas a partir dos juízos pessoais das partes. Até para evitar situações
como “vou doar esse carro se eu quiser” – é um elemento de incerteza que depende totalmente
do arbítrio de uma das partes.
Toda condição sempre é um ato de vontade. É isso que diferencia condição de um
requisito de validade. Mas esse elemento de vontade precisa estar lastreado a uma incerteza
que, por sua vez, precisa de um mínimo de objetividade e não pode ficar sujeita apenas ao
arbítrio das partes (≠ “vou doar esse carro se eu me mudar para Paris dentro de 5 anos).
Condição resolutiva: o contrato começa plenamente eficaz, mas se ela acontecer o contrato
deixa de ter eficácia imediatamente. Condição que resolve o contrato, põe fim à eficácia do
contrato. Na condição suspensiva, contrato não tem eficácia e pode nunca ter. Na condição
resolutiva, contrato já é eficaz desde o início, apenas se sabe que, acontecendo aquele evento
futuro e incerto, o contrato deixa de ter eficácia.
Condição suspensiva não possibilita aquisição de direitos, possibilita apenas, no máximo,
expectativas de direito, que vai dar alguns poderes jurídicos ao titular da expectativa, mas que
não dá pra ele qualquer tipo de direito. Na condição resolutiva, há aquisição de direito, que é
um direito resolúvel pois ele tem eficácia temporal condicionada a um evento futuro e incerto
(ex.: eu já doei o carro pra você, mas no momento da doação coloquei a condição resolutiva
de só tirar notas acima de ss – a pessoas adquire o direito de usufruir o bem, mas sabendo que
a eficácia temporal está condicionada a um evento futuro e incerto).
Art. 125. Subordinando-se a eficácia do negócio jurídico à condição suspensiva, enquanto esta se não
verificar, não se terá adquirido o direito, a que ele visa.
Art. 130. Ao titular do direito eventual, nos casos de condição suspensiva ou resolutiva, é permitido
praticar os atos destinados a conservá-lo.
Condição é evento futuro e incerto, que decorre da vontade (se decorre da vontade não é
requisito de validade), que tem que ter um parâmetro minimamente objetivo. Como o
legislador trata dessa questão: Art. 121. Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente
da vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto.
O que o ordenamento reconhece como condição: Art. 122. São lícitas, em geral, todas as condições
não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes; entre as condições defesas se incluem as que
privarem de todo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes aplica-se em

relação à condição algo semelhante ao objeto do contrato como um todo, é um requisito de


licitude (não apenas lei, mas ordenamento jurídico como um todo, por isso menciona-se
ordem pública e bons costumes). Toda condição decorre da vontade, i.e., ela é potestativa.
O problema é a condição puramente potestativa (que é essa última hipótese do art. 122),
aquela que está lastreada exclusivamente na vontade, sem nenhum elemento objetivo (“dou
um carro para você se eu quiser”).
Art. 123. Invalidam os negócios jurídicos que lhes são subordinados: I - as condições física ou juridicamente
impossíveis, quando suspensivas. II - as condições ilícitas, ou de fazer coisa ilícita. III - as condições
incompreensíveis ou contraditórias.
I. Se eu coloco uma condição suspensiva impossível (“quando você for a saturno”),
seja física seja juridicamente, a consequência é dizer que o negócio jurídico é nulo.
II. condição ilícita é condição que implique uma conduta que não seja considerada
aceitável diante de um ordenamento visto como um todo (condição de não casar – interfere
indevidamente em uma condição existencial) e condição de fazer coisa ilícita é condição que
diga respeito a uma conduta expressamente vedada no ordenamento (“vou dar um carro se
você matar alguém”). Aqui, a condição invalida o negócio jurídico.
No art. 123, legislador considera que a gravidade dessas condições é tal que a
consequência é invalidação do próprio negócio jurídico. Dependendo do grau de ilicitude
da condição, ela não apenas afeta a eficácia do contrato como a própria validade. Apesar de o
122 não ser claro nesse sentido, entende-se que as condições nele previstas (condição
puramente potestativa) tem as mesmas consequências do art. 123, i.e., invalidação do negócio
jurídico.
Arts. 122 e 123 são requisitos de validade das condições. Se não cumpridos,
invalidam não só a condição, como invalidam o próprio negócio jurídico. Somente nas
hipóteses desses 2 artigos é que não pode salvar o negócio e ele é anulado. Mas isso não é
uma regra em todas as condições.
Art. 124. Têm-se por inexistentes as condições impossíveis, quando resolutivas, e as de não fazer coisa
impossível nessas hipóteses, desconsidera a condição e a entende como inexistente. São

condições que não comprometem tanto a autonomia da vontade, então só retiram-se essas
condições e aproveita-se o resto do contrato. Importante pois: “as condições não admitidas no
ordenamento jurídico levam necessariamente à invalidade do negócio?” Não! Pela hipótese
do art. 124 a condição é tida como inexistente e salva-se o negócio jurídico. Somente nas
hipóteses dos arts. 122 e 123 é que não há como salvar o negócio jurídico.
Nesse art. 124 aplica-se o princípio da conservação dos negócios jurídicos: tentar
aproveitar, dentro do possível, o negócio jurídico. Para efeito de nulidades, se um contrato
tem uma parte que anula, mas que eu possa destacá-la para salvar o resto do contrato, é isso
que se deve ser feito.
Quando as partes se utilizam de uma condição elas estão sujeitando o seu contrato a um
elemento de incerteza. Exatamente por isso elas não podem interferir indevidamente nesse
elemento de incerteza ex.: vou doar um carro se você ganhar uma maratona, aí quando vejo
que você está quase ganhando vou e pulo em cima de você. Essa incerteza que caracteriza a
condição impede a malícia, impede que as partes dolosamente impeçam a ocorrência de uma
condição.
Art. 129. Reputa-se verificada, quanto aos efeitos jurídicos, a condição cujo implemento for
maliciosamente obstado pela parte a quem desfavorecer, considerando-se, ao contrário, não verificada a
condição maliciosamente levada a efeito por aquele a quem aproveita o seu implemento.
TERMO: O elemento fundamental da condição é a incerteza. No termo, o evento é futuro
mas é certo. O ideal seria que as partes, se possível, se utilizem de datas (termo certo).
Embora os termos sejam normalmente dados por lapsos temporais, a doutrina faz referência
também ao termo incerto ou relativo. O termo incerto é aquele evento futuro certo mas em
relação ao qual não tem como precisar quando exatamente ele ocorrerá (ex.: morte é termo).
O termo inicial não impede a aquisição do direito (ao contrário da condição suspensiva),
impede somente o exercício (Art. 131. O termo inicial suspende o exercício, mas não a aquisição do
direito).

Tanto no termo final, quanto na condição resolutiva, eu não tenho suspensão imediata da
eficácia do contrato, ele começa a ser eficaz desde já, só que essa eficácia está subordinada a
um evento futuro e incerto (no caso da condição resolutiva) ou a um evento futuro e certo (no
caso do termo final). Em ambos os casos, adquire-se o direito resolúvel, no sentido de que a
eficácia daquele direito até sujeita a um evento futuro (que pode ou não acontecer, no caso da
condição resolutiva, ou que certamente acontecerá, no caso do termo final).
No caso da condição suspensiva, tem suspensão de eficácia e há só expectativa de
direito, que pode inclusive nunca se confirmar.
Termo inicial é futuro e certo – não impede a aquisição do direito, mas impede o
exercício. Não há suspensão total da eficácia do contrato como há na condição suspensiva, há
só uma suspensão mais light do contrato, não chega a suspender a aquisição, só suspende o
exercício. Somente a condição suspensiva impede a aquisição de direito, jamais o termo
inicial – este impede tão somente o exercício.
Ex.: termo inicial – te dou um carro no dia 20 de fevereiro de 2017. Termo final – você pode
usar o meu carro até o dia 20 de fevereiro de 2017.
ENCARGO: É o ônus imposto a uma liberalidade com o fim de limitá-la. Nos chamados
atos de liberalidade (atos em que apenas uma das partes têm vantagens e a outra não –
doação e legados, por exemplo, que são ≠ de um contrato de compra e venda, onde ambos tem
vantagens e desvantagens; quem tem vantagem é o donatário ou quem se beneficia do
testamento, donatário economicamente tem a desvantagem). Questão é que nem sempre as
pessoas fazem essas liberalidades imbuídas de um total desprendimento, às vezes elas querem
vincular a liberalidade a uma pequena contraprestação por parte de quem está
recebendo. Pequena pois, se não houver desproporção entre o benefício e a contraprestação
não é liberalidade e nem encargo, é compra e venda.
Ex.: doar uma fortuna em troca de cuidar do cachorro.
O encargo não impede nem a aquisição nem um exercício do direito – ao contrário da
condição suspensiva, em que não adquire-se nada além da expectativa, e ao contrário do
termo inicial, em que já se adquire direito mas não pode exercê-lo, no encargo já se adquire
direito e já se pode exercê-lo, mas tem que cumprir o encargo. Caso haja descumprimento do
encargo, pode haver a revogação da liberdade, que é uma forma de se colocar fim à doação
diante desse descumprimento, mas não tem nada a ver com a validade nem com a eficácia (a
doação foi válida, foi eficaz de imediato, apenas o descumprimento do encargo faz com que a
partir daquele momento aquela doação seja revogada).

21/11 – ROTEIRO 11 PARTE 5


DEFEITOS DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS: defeitos se enquadram dentro das
anulabilidades, são vícios que podem levar à anulação de um negócio jurídico, mas há
possibilidade da convalidação desse negócio por diversas formas. Erro, dolo e coação +
fraude contra credores + estado de perigo e lesão.
Essencialmente, os defeitos ou os vícios dos negócios jurídicos eram classificados até o atual
CC em dois grandes grupos:
1) vícios de vontade: vícios que se preocupam com a formação de vontade dos
contratantes e que, portanto, existem exatamente para preservar a vontade das partes.
Os vícios de vontade tradicionais são o erro, o dolo e a coação.
2) vícios sociais: vícios que são reconhecidos para a proteção do interesse de
terceiros. Ex.: fraude contra credores – vício por meio do qual as partes podem lesar interesse
de terceiros e isso possibilita que esse terceiro possa requerer a anulação de um negócio
jurídico do qual ele não faz parte; já mostra que a relatividade dos contratos tem exceções.
São vícios que, portanto, não se preocupam com os contratantes, se preocupam com terceiros.
Antes do CC/2002 havia dois vícios sociais extremamente importantes: a fraude contra
credores e a simulação. Após o CC, só subsistiu a fraude contra credores, simulação se
transformou em um defeito ainda mais grave – deixa de ser causa de anulabilidade e se torna
causa de nulidade, tornando insuscetível o negócio jurídico de qualquer tipo de convalidação.
CC/2002 traz outros dois novos vícios: o estado de perigo e a lesão. Há dúvidas sobre a
própria natureza desses vícios – alguns entendem que seriam vícios de vontade, outros que
seriam vícios que decorrem daquela cláusula geral de proteção ao equilíbrio material. São
dois vícios que têm a finalidade de evitar graves desequilíbrios objetivos que decorrem
também de desequilíbrios subjetivos.
1) VÍCIOS DE VONTADE: Vícios que procuram proteger o contratante, assegurar que
a vontade manifestada é uma vontade genuína, que não padece de nenhum vício
considerado inaceitável. Acabam normalmente decorrendo ou de:
a) uma violência (coação) ou
b) de uma falsa representação da realidade, que tanto pode ser
- espontânea (hipótese de ERRO), como poder ser
- provocada pelo outro contratante ou um por um terceiro (hipótese de DOLO).
Erro e dolo tem em comum serem ambos uma falsa representação da realidade, o que
vai determinar a diferença de tratamento é saber se é espontâneo ou se foi provocado por
terceiro.
Ex.: pessoa que compra um castiçal de latão achando que era de prata; pessoa que compra um
cachorro achando que é pedigree mas na verdade é vira-lata; há falsa representação da
realidade, pessoa quer na verdade algo que não corresponde aquilo que ela efetivamente está
contratando.
Séc. XIX, o grande debate sobre a interpretação dos contratos era saber o que iria prevalecer
diante de uma eventual divergência entre vontade e declaração (para a teoria francesa
prevaleceria a vontade, para a alemã, a declaração). Mas na situação de falsa representação da
realidade não teria como ser resolvida do ponto de vista interpretativo, pela escolha entre uma
teoria ou outra, pois não há propriamente divórcio entre a vontade e a declaração. Aqui
há o aspecto essencial desse vício: a pessoa declara o que ela quer, só que o problema é
anterior à declaração, o problema diz respeito à própria formação da vontade (formação da
vontade ocorre de maneira viciada pois decorre de uma falsa representação da realidade). Esse
é o problema do erro e do dolo: não há propriamente divergência entre declaração e
manifestação de vontade. Na verdade, a manifestação corresponde exatamente à vontade,
o problema é exatamente essa vontade, que foi formada a partir de premissas
equivocadas.
Mas, não é qualquer falsa representação que justifica esse vício que leva até
mesmo à possibilidade de anulação do negócio jurídico. Somente o erro essencial ou dolo
essencial. É aquela falsa representação que, se não tivesse ocorrido, não teria havido contrato.
Se houve erro ou dolo, mas o contrato teria ocorrido da mesma maneira, ainda que por meios
diversos então não há dolo/erro essencial (ex.: gostei do castiçal/cachorro e levaria ele mesmo
que fosse de latão/vira-lata, só não pagaria o mesmo preço). Erro e dolo, para levarem a
anulação do negócio jurídico, precisam ser essenciais (dizer respeito a um aspecto
fundamental ao negócio jurídico). Art. 139 elenca as hipóteses em que o erro pode ser
considerado substancial/essencial.
Art. 139. O erro é substancial quando: I - interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da
declaração, ou a alguma das qualidades a ele essenciais; II - concerne à identidade ou à qualidade essencial da
pessoa a quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo relevante; III - sendo de
direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou principal do negócio jurídico.
Justificação da anulação de um negócio jurídico:
Na hipótese de dolo, é fácil entender a anulação do contrato, no que há falsa representação
provocada por um terceiro ou pela parte contrária e o ordenamento não tolera má-fé (alguém
que vende castiçal de latão falando que era de prata). (obs.: o próprio ordenamento fala do
chamado dolo por omissão. ex.: castiçal de prata – comprador diz “esse castiçal de prata é
lindo”, o vendedor sabe que não é de prata e fica calado = dolo por omissão; não é erro pois
há um contexto que deve ser analisado).
Na hipótese de erro, considerando que a outra parte não tem qualquer culpa ou participação
no erro da parte que está incidindo nesse vício, já é mais difícil. É preciso sempre lembrar que
o erro é sempre algo genuinamente espontâneo (lembrar dolo por omissão, não é erro). Há
sempre a ideia de que quem erra é que deve arcar com as consequências do seu erro, mas
quando anula-se um contrato nessa hipótese, há transferência dessa responsabilidade para a
parte que não errou. Por isso que em relação ao erro, sempre houve muitas controvérsias em
torno de se saber o que justificaria a anulação do contrato. É por isso que, mesmo no séc.
XIX, tanto a doutrina quanto a jurisprudência sempre procuraram restringir as possibilidades
de anulação pelo erro. Um primeiro filtro seria considerar somente os erros substanciais
(tem que ser um erro fundamental, sem o qual o negócio não teria acontecido). Exigiam
também o requisito da escusabilidade do erro – erro teria que ser desculpável, justificável
(se fosse um erro absurdo, que decorresse da mera imprudência daquele que está errando,
então não seria um erro escusável e portanto teria que ser suportando por quem errou, não
podendo levar a anulação do negócio jurídico).
Lembrar que no séc. XIX e XX havia essa preocupação de considerar a vontade
genuína como fonte de criação dos contratos. Essa discussão sobre a anulação do contrato por
erro se torna maior agora no novo CC Grau de rigor em relação ao erro este ainda maior, já
que ele procura trabalhar não apenas com o estado mental da parte que erra, mas também com
o estado da parte que pode eventualmente se aproveitar do erro.
Art. 138. São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial
(descritos no art. 139) que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do
negócio para que haja anulação do negócio jurídico, esse erro teria que poder ser
percebido por uma pessoa de diligência normal em face das circunstâncias do negócio,
i.e., se exige da parte contrária uma posição de mais absoluta boa-fé objetiva (não basta
apenas que ela não saiba do erro, já que se ela souber e ficar calada é dolo por omissão; se a
parte contrária não sabia que a outra parte estava errando, mas deveria saber, porque uma
pessoa de diligência normal saberia, então ela não está de boa-fé objetiva e por isso o negócio
por ser anulado) com isso o legislador trouxe a boa-fé objetiva para o erro – se a parte a quem
o erro aproveita (não é a parte que está errando, é a contraparte) está em uma posição de boa-
fé objetiva (nem sabia nem deveria saber do erro, porque uma pessoa de diligência normal
também não teria como saber), então o negócio jurídico é mantido. Somente na hipótese em
que o erro pudesse ser percebido por uma pessoa de diligência normal é que há a anulação
(OBS.: para anulação em caso de erro: erro essencial + escusabilidade do erro + teria que
poder ser percebido por uma pessoa de diligência normal).
Ex tradicional.: contraparte sabe que o castiçal é de latão, ela só não sabe e nem teria
como saber que a parte que compra acha que é de prata.
No século XIX, a ideia do erro era fundamental porque ainda não tinha a boa-fé objetiva e o
seu desdobramento do dever de informação. Antes, não se entendia que as partes tinham
toda essa obrigação de informar uma a outra sobre as características do objeto. Hoje, esse
dever da boa-fé e de informação é muito forte, o que tende a restringir as possibilidades de
erro, porque as partes têm muito mais informações.
Ex.: dever de informação pelos fornecedores é fundamental em relação aos
consumidores, até porque as ofertas públicas vinculam os agentes (dever de contratar). Cabe
ao fornecedor dar todas as informações precisas ao consumidor, até para que não possa errar.
O próprio dever de informar e uma série de outros deveres (dever de contratar, relações
assimétricas) já é suficiente para ensejar a proteção do consumidor, sem a gente precisar de
socorrer do erro. Erro importa mais nas relações paritárias, entre iguais.
Obs.: Dolus bônus: exagero por parte do vendedor acerca do bem (“esse cavalo é
maravilhoso, é o melhor cavalo, corre demais”). Hoje, diante da boa-fé objetiva e do dever de
informação, avaliações subjetivas por parte do vendedor são toleradas mas, quando é
avaliação subjetiva (“cavalo é campeão, descendente do cavalo x”), aí já não há mais margem
para esses exageros. Pequenos exageros sim, mas jamais a ponto de levar a uma falsa
representação da realidade.
RESUMINDO: Erro é falsa representação espontânea! Exatamente por ser espontânea é que
gera tantos problemas para saber se, quando e em que circunstâncias ele leva à anulação do
negócio jurídico (em algumas circunstâncias, não levará à anulação). Diferentemente
acontece com o dolo. Se o dolo existir, o único juízo é se o dolo é acidental ou essencial. Se
o dolo for essencial (o negócio não teria como ocorrer se não tivesse havido o dolo) a solução
é a anulação do negócio jurídico. Se o dolo for acidental, mantém-se o negócio jurídico mas é
facultado à parte que foi vítima do dolo a devida indenização por perdas e danos (eu comprei
o castiçal de latão achando que era prata então é razoável que eu seja indenizado pela
diferença de preço). Peculiaridade do dolo: estamos falando de má-fé, então é razoável que o
ordenamento jurídico tenha uma postura muito mais rigorosa que em relação às outras
hipóteses.
Art. 145. São os negócios jurídicos anuláveis por dolo, quando este for a sua causa.
Art. 146. O dolo acidental só obriga à satisfação das perdas e danos, e é acidental quando, a seu despeito, o

negócio seria realizado, embora por outro modo consequência do dolo acidental é perdas e danos,

não anulação!!!!!!!
Art. 147. Nos negócios jurídicos bilaterais, o silêncio intencional de uma das partes a respeito de fato ou
qualidade que a outra parte haja ignorado, constitui omissão dolosa, provando-se que sem ela o negócio não se
teria celebrado dolo por omissão (a contraparte sabe que a outra está errando e não fala nada).
Art. 148. Pode também ser anulado o negócio jurídico por dolo de terceiro, se a parte a quem aproveite dele
tivesse ou devesse ter conhecimento; em caso contrário, ainda que subsista o negócio jurídico, o terceiro
responderá por todas as perdas e danos da parte a quem ludibriou dolo não necessariamente precisa vir

da outra parte, pode vir de terceiro. Ex.: terceiro que me falou que esse castiçal era de prata
ou que o cavalo ela de raça, não foi o contratante. Tudo depende da boa-fé do contratante. Se
o contratante não está de boa fé (porque ele sabia ou deveria saber do dolo do terceiro), a
consequência é a mesma: anulação do negócio jurídico. Se o contratante estava agindo de
acordo com a boa-fé objetiva (nem sabia nem teria porque saber do dolo do terceiro), o
negócio é mantido, protegendo-se a boa-fé do contratante, mas a vítima do dolo tem ação de
perdas e danos contra o terceiro.
Art. 150. Se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo para anular o negócio, ou reclamar
indenização as duas estão agindo de maneira desleal, então o negócio fica do jeito que está e

cada qual que suporte as consequências da sua deslealdade.


RESUMINDO: Há no dolo e no erro hipóteses em que a vontade da pessoa que erra ou que é
vítima do dolo e sua manifestação se coincidem. O problema é, portanto, anterior à formação
da vontade – a formação da vontade que é viciada, e exatamente por isso teria que levar à
anulação do negócio jurídico no caso de dolo e, dependendo da ausência de boa-fé objetiva,
no caso do erro.
COAÇÃO:
Art. 151. A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta ao paciente fundado temor de
dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens.
Parágrafo único. Se disser respeito a pessoa não pertencente à família do paciente, o juiz, com base nas
circunstâncias, decidirá se houve coação.
Na coação há um problema muito diverso do erro e do dolo (em que vontade e manifestação
coincidem). Aqui, há um total divórcio entre vontade e manifestação: a pessoa manifesta
aquilo que ela não quer, mas ela o faz em virtude do fundado temor que a outra parte ou
um terceiro incute nessa.
Em uma hipótese como essa, em tese, até poderia se resolver pela teoria da intenção, do ponto
de vista interpretativo. Mas esses casos são tão sérios que há um tratamento específico.
Embora a doutrina não seja pacífica, alguns autores fazem a diferença entre a coação como
violência indireta e como violência direta (alguém colocar uma arma na minha cabeça e
dizer assina essa escritura de doação da sua casa) alguns autores dizem que, nessas hipóteses
de violência direta, não seria propriamente coação, mas inexistência da vontade e o negócio
nem mesmo existiria (lembrar que existência é o primeiro plano de análise dos negócios -
contrato é acordo de vontades, precisa-se de partes, que acordam em torno de um objeto e que
vão se utilizar de uma determinada forma; precisa de um mínimo de voluntariedade das
partes). Assim, para esses autores, a coação corresponderia aos casos de violência indireta
(pessoa tem, em tese, uma certa escolha, por mais que seja difícil).
Art. 152. No apreciar a coação, ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a condição, a saúde, o temperamento do
paciente e todas as demais circunstâncias que possam influir na gravidade dela aqui a ideia é saber quais

são os desdobramentos de uma ameaça diante da pessoa x. Coação requer um exame atento
do caso concreto. Ameaças podem gerar impactos diferentes a depender do destinatário.
Art. 153. Não se considera coação a ameaça do exercício normal de um direito, nem o simples temor reverencial
diferenciação dos casos de “pressão” legítima e os casos de coação. Quando um credor diz
para o devedor “ou você paga a dívida ou eu vou te processar”, por mais que se possa ver isso
como uma ameaça, decorre na verdade do exercício regular de um direito, não é coação
(lembrar que coação é dano iminente e considerável (entendendo dano como prejuízo injusto;
credor exercer sua pretensão não causa prejuízo injusto, mas justo porque é legitimado).
Temor reverencial é atitude de respeito diante de autoridades, religiosas ou parentes (é o fato
de pessoas agirem na vida civil porque o pai disse “ou você faz isso ou eu paro de falar com
você”). Situações em que as pessoas fazem algo em razão de um temor ou respeito
normalmente são afastadas da ideia de coação.
Normalmente, a coação é considerada no momento da celebração do contrato, não ao
exercício de posições contratuais quando o contrato já existe.
Assim como o dolo, pode ser que a coação também venha de um terceiro, e não
necessariamente da parte contrária. A resposta é idêntica a resposta para o dolo: tudo
depende da boa-fé objetiva do outro contratante: se a outra parte estava agindo com boa-fé
objetiva (nem sabia e nem teria como saber da coação do terceiro), o negócio é mantido e a
vítima da coação vai ter perdas e danos contra o seu coator. Se a parte que se aproveita da
coação não está agindo conforme a boa-fé objetiva (sabia ou deveria saber), há anulação, sem
prejuízo de perdas e danos.
Art. 178. É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a anulação do negócio jurídico, contado: I - no
caso de coação, do dia em que ela cessar começa do dia em que a coação cessar, não da data da

realização do negócio, pois não seria exigível que ela pudesse agir antes da coação começar.
Esses três vícios são chamados de vícios de vontade e fica claro que eles têm esse nome pois,
nos dois primeiros casos (erro e dolo), há uma vontade equivocadamente formada por causa
de uma falsa representação da realidade; no terceiro caso (coação) há um divórcio total entre
vontade e manifestação – manifesta-se aquilo que eu não se quer diante de um temor do
coator. Em todas essas hipóteses, entende-se que não se está diante de manifestações
válidas de vontade, então há possibilidade de anularmos esses negócios jurídicos.

Além desses três vícios, o CC/2002 introduz outros dois defeitos/vícios que estão
relacionados a outros fatores que não têm a ver propriamente com uma equivocada
manifestação de vontade, mas sim a uma hipossuficiência de uma das partes, de uma
vulnerabilidade acentuada de uma das partes, que faz com que ela assuma uma obrigação
excessivamente onerosa ou desproporcional = ESTADO DE PERIGO.
Art. 156. Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de
salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume
obrigação excessivamente onerosa. § único. Tratando-se de pessoa não pertencente à família do
declarante, o juiz decidirá segundo as circunstâncias ex.: alguém tá num barco em naufrágio, para eu

te salvar faça esse contrato. Alguém que está num estado de perigo está numa posição de
manifesta vulnerabilidade, daí porque há um desequilíbrio. Só que não é um mero
desequilíbrio, é uma obrigação excessivamente onerosa, é um desequilíbrio evidente que
decorre da situação de absoluta vulnerabilidade na qual ela se encontra (não de um descuido).
Nessas circunstâncias estamos diante de uma situação que pode comprometer sim a validade
do negócio jurídico.
Lesão segue a mesma ideia. Os parágrafos do artigo que trata da lesão são aplicáveis
também ao estado de perigo. Aliás, até se pode ver a lesão como um gênero maior do qual o
estado de perigo é uma espécie, porque um dos requisitos da lesão também é a premente
necessidade (premente necessidade é mais amplo que se salvar, mas envolve essa).
Art. 157. Ocorre a LESÃO quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por
inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da
prestação oposta a mesma lógica do estado de perigo: não é qualquer desequilíbrio, é um
desequilíbrio excessivo, evidente, objetivo, que decorre de um desequilíbrio subjetivo (uma
das partes está em situação de manifesta vulnerabilidade e exatamente por isso ela se obriga a
essa prestação).
Desde os romanos já se preocupavam com a ideia de que uma parte mais forte pudesse
submeter outra a prestações excessivas ou desarrazoadas. O problema é que esse instituto da
lesão, que foi aplicado pelos romanos e permaneceu na idade média, é algo incompatível com
a ideia de pacta sunt servanda que permeia os contratos a partir do séc. XIX (contrato é uma
lei obrigatória entre as partes, se é contratual é justo, as partes são vistas a partir de isonomia
formal – se as partes consentiram, problema delas). Daí porque toda a ideia de lesão,
construída há tanto tempo, acabou sendo desconsiderada no séc. XIX.
Gradativamente, no Código brasileiro, é que algumas hipóteses específicas de lesão
foram sendo reconhecidas pelo ordenamento (juros sobre juros – anatocismo, usura). Direito
do consumidor, diante da vulnerabilidade do consumidor e do equilíbrio contratual, introduz-
se mais ainda a lesão. E, com o CC/2002, há a extensão da lesão até mesmo a contratos
paritários, mas com essas duas observações de que tem que ser um desequilíbrio evidente e
que decorre de uma situação específica de assimetria entre as partes.
§ 1o Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores vigentes ao tempo em que foi celebrado o
negócio jurídico saber se houve a desproporção no momento da contratação.
§ 2o Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte favorecida
concordar com a redução do proveito quais as consequências de um contrato com um grande
desequilíbrio? O judiciário só anula ou o juiz pode rever por ele mesmo esse desequilíbrio
contratual? Muito entendem por esse parágrafo que esse reexame depende da concordância
das partes. Ao juiz não cabe optar se ele vai anular ou rever, ele anula, ele apenas irá
reequilibrar esse contrato se as próprias partes concordarem com aquela solução. Se ele
pudesse intervir mesmo contra a vontade das partes, ele poderia adotar uma solução que
desagradasse ambas. Entretanto, em alguns casos, não se tem como anular o contrato no
sentido de as partes voltarem a como estavam antes (ex.: se houver lesão na compra e venda
de uma casa, desfaz-se o negócio, devolve-se a casa para o antigo proprietário e o preço para
o comprador. Mas e se for uma prestação de serviço não já como anular o contrato, ele há foi
cumprido. Por isso muitas vezes o juiz não tem outra alternativa senão intervir).
De acordo com a doutrina e a jurisprudência, as hipóteses dos § que constam da lesão
(art. 157), se aplicam ao art. 156 também (art. 156 não afirma as consequências do estado de
perigo).

23/11 – FINAL ROTEIRO 11 PARTE 5 e INÍCIO PARTE 6


XXXXXXXX
Na coação, quem dá causa a ameaça é a outra parte ou terceiro. Na lesão ou estado de perigo,
a ameaça não tem a ver com o outro contratante, mas decorre das circunstâncias da vida
(alguém que está com um problema de saúde urgente, está perdendo a causa, a outra parte só
se aproveita – dolo aproveitamento). Ela não apenas não tem uma atitude solidária como ela
se aproveita daquilo para obter uma vantagem desproporcional, vantagem essa que ela não
teria se aquele contrato fosse minimamente paritário.
Transformar lesão e estado de perigo em casos de dolo acaba dificultando excessivamente a
configuração desse vício (trabalhar com dolo, juízo de intenção, é algo sempre complicado).
Por isso, lesão e estado de perigo nao são propriamente vícios de vontade, mas defeitos que
decorrem daquela cláusula de equivalência material dos contratos, i.e., são defeitos que
mostram que o ordenamento não pode ser insensível a casos evidentes de desequilíbrio
objetivo quando eles decorrem de um estado de perigo/necessidade (visão da professora) –
casos propícios à intervenção judicial.
Essa intervenção judicial é regulada pelos parágrafos do art. 157 (que são aplicados
também ao art. 156!).

Art. 157, § 2o Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte
favorecida concordar com a redução do proveito Uma solução usual desses defeitos é a anulação

desse negócio jurídico – as partes voltam ao seu estado anterior. Mas o §2˚ admite também a
conservação do negócio jurídico (alguns entendem como um princípio de que, quando for
possível, o melhor entendimento seria a manutenção do negócio jurídico). Então se uma das
partes concorda em reduzir a sua vantagem, se as próprias partes entendem espontaneamente
que pode haver uma redefinição do equilíbrio, essa seria a solução. Mas há muitos
doutrinadores brasileiros que entendem que aqui há uma faculdade das partes – elas podem
concordam ou não e, não concordando, o juiz deve anular o negócio jurídico (juiz não pode
tentar rever o equilíbrio do contrato sem a concordância das partes, sob pena de chegar-se a
uma situação em que ambas as partes discordam).
Mas, muitas vezes, a anulação dos negócio não interessa às partes. Ex.: contrato de
prestação de serviços no qual uma das partes já tenha pago a sua prestação; simulação do
plano de saúde. Precisa analisar o equilíbrio do contrato, as partes querem manter o contrato,
mas reajustando o equilíbrio. Nesses casos, a única solução disponível é mesmo a intervenção
judicial (mas isso não é regra). Em casos nos quais a anulação e o retorno das partes ao estado
anterior seja possível, o juiz desfaz o negócio. Mas, se a anulação não for possível, não cabe
ao juiz intervir sem a concordância das partes.
Mesmo para aqueles que entendem que há alguma similitude entre lesão e estado de perigo
com os vícios de vontade (erro, dolo e coação), que entendem que há a necessidade de um
dolo de aproveitamento, por exemplo, uma coisa é certa: a preocupação do legislador com o
equilíbrio contratual é muito importante, i.e., esses dois vícios tem uma diferença muito
marcante diante daqueles três vícios de vontade.

FRAUDE CONTRA CREDORES é o único vicio social que subsistiu no CC, já que o outro
vício social presente no CC/16 virou hipótese de nulidade.
O patrimônio do devedor é a garantia dos credores, motivo pelo qual ele não pode
abusivamente se desfazer dele.
A fraude contra credores é o negócio gratuito que é prejudicial aos credores por tornar o
devedor insolvente, agravar a insolvência ou tornar insuficiente garantia já concedida.
Porque é vício social? É um vício que tem a finalidade de proteger terceiros/ credores já
existentes (não os contratantes)! Ela tem uma razão de ser – há a ideia de que somente
pessoas que têm um patrimônio possam fazer atos de disposição patrimonial (doação, perdão
de dívidas) os credores poderão pleitear a anulação dos negócios do devedor por meio da
ação pauliana, a ser ajuizada contra o devedor, a pessoa que com ele celebrou negócio
jurídico fraudulento e terceiros adquirentes que hajam procedido de má-fé.
Ex.: tenho uma dívida com X e, antes da minha dívida vencer, resolvo doar todo o meu
patrimônio (que é a garantia do credor) para Y.
XXXXXXXXX +- 10min48seg
Remissão de dívidas não deixa de ser um ato de liberalidades – se eu estou perdoando meus
devedores, estou deixando de ter um acréscimo patrimonial legítimo, que poderia ser utilizado
para eu honrar os meus credores. É semelhante ao caso em que doa-se patrimônio. Em ambos
os casos, pratica-se liberalidades que comprometem o patrimônio do devedor e,
consequentemente, prejudica a capacidade de honrar compromissos anteriores.
Art. 158. Os negócios de transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já
insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores
quirografários, como lesivos dos seus direitos.
O ordenamento não está preocupação com a doação de bens em si, é com a
doação de bens ou prática de liberalidades estando insolvente (não tendo patrimônio para
honrar as dívidas já feitas) ou se tornando insolvente em razão disso. “Ainda quando o
ignore” – durante muito tempo, se entendeu que havia a necessidade de um elemento de dolo
na fraude contra credores, i.e., a pessoa já sabia o que ela estava fazendo. Hoje, aquele que
faz a liberalidade pode até não saber que eles está insolvente ou será reduzido à
insolvência, mas mesmo assim, se esta for a situação objetiva, é caso de fraude contra
credores. Legislador impõe uma espécie de dever geral de cuidado contra o patrimônio.
Considerando que hoje em dia as pessoas só respondem por suas dívidas com seu patrimônio
(não há mais castigos corporais, prisão por dívida), é fundamental que as pessoas ajam
legalmente – devedores, antes de fazer atos de disposição patrimonial, confiram se eles têm
realmente patrimônio para tanto. “Poderão ser anulados pelo credores quirografários, como
lesivos dos seus direitos” – credores ser garantia. Quando há garantias, os credores terão
outros recursos que não apenas o patrimônio do devedor. Por isso que a regra é da fraude
contra credores para apenas credores quirografários (apesar de haver exceções, uma delas já
está no §1˚).
Art. 158, § 1o Igual direito assiste aos credores cuja garantia se tornar insuficiente ex.: eu tenho uma dívida

com X e hipotequei minha casa. No entanto, houve um incêndio e a casa foi destruída. Antes,
a casa tinha valor suficiente pra pagar a dívida, depois houve fato superveniente e a casa
perdeu valor. O credor originário, para parte da dívida, se equipara a um credor quirografário,
pois, mesmo que ele execute aquele bem, o valor da execução, em razão da perda de valor
pelo incêndio, vai ser insuficiente para o pagamento da dívida e, portanto, ele vai ter que
contar com o patrimônio do devedor para pagar o resto da dívida. Fraude contra credores que,
em princípio, só protegeria o credor quirografário, na hipótese desse § protege também o
credor com garantias, mas garantias que se tornaram insuficientes.
Art. 158, § 2o Só os credores que já o eram ao tempo daqueles atos podem pleitear a anulação deles a ideia da

fraude contra credores é proteger credores que já o eram antes da liberalidade (não faz
sentido proteger o credor depois da liberalidade, porque aí já é ônus do credor apurar qual é o
patrimônio do seu devedor.
Ex.: João me empresta dinheiro porque ele sabe que eu tenho uma casa x (ele me
emprestou porque sabe que eu tenho patrimônio pra pagar). Se eu transfiro esse patrimônio
para Maria, estou frustrando as expectativas de um credor cuidadoso. Agora, imagina-se o
exemplo contrário. Antes de adquirir o empréstimo eu doei a casa para Maria e mesmo assim
João me emprestou. Não faz sentido proteger o credor em uma situação como essa, porque
quando o credor fez o empréstimo ele já sabia que eu não tinha mais patrimônio, não houve
fator surpresa.
Art. 159. Serão igualmente anuláveis os contratos onerosos do devedor insolvente, quando a insolvência for
notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro contratante alarga a possibilidade de fraude
contra credores, admitindo que ela possa ocorrer mesmo no caso de contratos onerosos (uma
compra e venda, por exemplo, não precisa ser mais liberalidade). Muitas vezes, em situação
de insolvência, a pessoa quer queimar bens concretos para ficar com o dinheiro (dinheiro é
mais fácil de ocultar). É exatamente esse tipo de situação que o legislador quer evitar. O foco
da fraude contra os credores são as liberalidades, pois aquele que está recebendo doação, caso
o contrato seja anulado, em tese ele não será prejudicado (só vai deixar de ter um acréscimo
material). Agora, nos casos dos contratos de compra e venda, há um dever de cuidado que o
legislador impõe para aqueles que estão fazendo negócio jurídico com devedor insolvente,
porque certamente ele já tem débitos pendentes e aquele patrimônio dele (?).
Art. 160. Se o adquirente dos bens do devedor insolvente ainda não tiver pago o preço e este for,
aproximadamente, o corrente, desobrigar-se-á depositando-o em juízo, com a citação de todos os interessados.
Parágrafo único. Se inferior, o adquirente, para conservar os bens, poderá depositar o preço que lhes corresponda
ao valor real assegurar que o valor daquela transação não vá para as mãos do devedor e os

credores fiquem a ver navios. Se ele deposita em juízo, aquele próprio depósito é uma
garantia contra os credores.
A fraude contra credores continua sendo um importante instituto que mostra que terceiros tem
de ficar atentos a contratos que possam prejudicar outros credores. O foco se dá em
liberalidades, porque ali há a ideia de que ninguém pode se aproveitar de uma situação em
que já existe um credor anterior. Art. 158 nao exige o dolo, nem por parte de quem está
praticando a liberalidade, nem por parte de quem está recebendo. Criar um parâmetro de
cuidado do patrimônio.
INVALIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO
Invalidade, no termo geral, abrange pelo menos duas espécies: nulidades e anulabilidades.
Antes do CC/2002, alguns ainda trabalhavam com uma terceira hipótese – negócios
inexistentes. Seria para aqueles casos de vícios absurdos (exemplo da violência direta, vício
tão grave que leva à inexistência do contrato).
Hoje, no entanto, do ponto de vista pragmático, não há mais a necessidade de se
utilizar dessa categoria da inexistência, pois: a diferença essencial entre atos nulos e anuláveis
de acordo com o CC/1916 era o prazo para desfazer esses negócios (que era um prazo curto
para as anulabilidades e um prazo maior para a nulidades). No caso da inexistência, recorria-
se a ela para dizer que havia vícios tão graves que o tempo jamais poderia convalidá-los (não
importava quantos anos se passassem, aquele negócio sempre poderia ser rediscutido para
efeito de se declarar a inexistência daquele negócio. Hoje, essa discussão deixou de ter
utilidade prática pois o critério que o CC/2002 adotou para distinguir nulidade de
anulabilidade é que: em se tratando de nulidade não é possível a convalidação (nem mesmo
pelo tempo), e a anulabilidade pode ser convalidada (de diferentes maneiras, inclusive pelo
tempo). Ou seja, aquilo que se buscava pela inexistência, hoje já se resolve pelos atos nulos.
Claro que nulidades, como vícios mais graves, precisam de uma resposta mais dura do
ordenamento, mas será que faz sentido dizer que algo não pode ser convalidado jamais pelo
tempo?
Ex.: Meu pai faz um contrato de herança hoje, daqui a 60 anos alguém questiona a
nulidade desse contrato. Há uma dificuldade com atos que não se convalidam com o tempo,
desconsiderar o passado pode ser muito complicado. Porém, não foi assim que o legislador
pensou, embora não tenhamos tido tempo suficiente para questionamentos, já que o CC é
recente.
As NULIDADES dizem respeito a interesses sociais, por isso que quando são violados, a
gravidade do vício é maior. Por isso que várias pessoas vão poder alegar a nulidade que
não apenas as partes (como o MP), por isso que o juiz vai poder reconhecer de ofício esse
problema, por isso que não há possibilidade de convalidação. Já nas ANULABILIDADES
o que está em jogo são interesses privados, por isso que, em princípio, somente as partes
vão poder alegar o vício, por isso que o juiz não vai poder reconhecer de ofício aquele
problema (ele tem que ser provocado para tal), por isso que o ordenamento admite a
convalidação de diversas formas (pelo menos três formas de convalidação de um negócio
jurídico anulável, o que não acontece diante de um negócio jurídico nulo).
Basicamente, os casos de NULIDADE são aqueles de violação dos requisitos de validade
obrigatória do negócio jurídico: Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:
I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz menores de 16 anos.
II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto viola os requisitos de validade do objeto
III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;
IV - não revestir a forma prescrita em lei nas hipóteses de exceção ao princípio do consensualismo, a forma é da
substância do ato (é requisito de validade).
V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;
VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa;
VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.
Todas essas hipóteses dizem respeito a vícios tão graves que o ordenamento entende
que a consequência é a nulidade, e a regra da nulidade é não apenas o desfazimento do
negócio, como a ausência de preservação de qualquer efeito daquele negócio.
As hipóteses de ANULABILIDADES: Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é
anulável o negócio jurídico:
I - por incapacidade relativa do agente;
II - por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores.
Esses vícios são causas de anulabilidade. Por mais que eles possam levar à anulação
do negócio jurídico, eles não necessariamente levarão à anulação. Eles poderão ser
convalidados.

SIMULAÇÃO: era considerado um vício social, mas hoje se transformou também em


hipótese de nulidade. Há dois tipos essenciais de simulação:
a) SIMULAÇÃO ABSOLUTA: não houve negócio jurídico, mas se quer dar a
aparência de que esse negócio jurídico aconteceu. Ex.: comum na lavagem de dinheiro – há
recursos ilícitos, não há como colocar na sua declaração de imposto de renda que você
recebeu esses recursos, então você tenta legitimar aqueles recursos. Uma forma usual de se
fazer isso é a consultoria do parecer. Quando alguém apresenta um contrato que na verdade
não aconteceu.
b) SIMULAÇÃO RELATIVA: houve negócio jurídico entre as partes, mas ele é
diferente daquele negócio jurídico que elas procuram aparentar. Ex.: contrato de compra
e venda que na verdade é uma doação, porque não houve pagamento do preço. Muito comum
no mercado imobiliário é dizer “uma coisa é o preço real outra coisa é o preço da escritura”,
porque paga-se tributos sobre o preço da escritura. Então, por exemplo, o valor da casa é 1
milhão, mas coloca-se na escritura 500 mil para pagar menos tributos. Aqui, há o negócio
simulado, que é a escritura cujo preço é 500 mil, e há o negócio dissimulado/real, que é o
negócio de 1 milhão pago.
Nas duas hipóteses, as partes estão querendo aparentar algo que não corresponde à
realidade, seja porque não houve negócio jurídico entre elas, seja porque o negócio jurídico
que realmente aconteceu entre elas é diferente daquele que elas estão apresentando. E o
objetivo normalmente é frustrar terceiros (frustram o fisco, que na verdade teria direito à
uma arrecadação maior se as partes de fato tivesse exteriorizado na escritura aquilo que
realmente aconteceu) (laranja é exatamente isso). Se tenta esconder uma realidade para
fraudar terceiros. Por isso é que a simulação, antes, estava junto da fraude contra credores
(vícios sociais pois se quer proteger terceiros, não mais o contratante). A resposta do
ordenamento foi dar à simulação um tratamento mais duro pois, sendo vício social, ele antes
podia ser convalidado, Hoje, o ordenamento dá uma resposta mais grave à simulação – aqui é
caso de nulidade do negócio jurídico, pois envolve interesse público do mais relevante,
exatamente por isso não diz respeito somente às partes, qualquer um pode averiguar, o juiz
pode reconhecer de ofício e nao se convalida por nenhuma maneira, nem mesmo pela ação do
tempo.
O código traz as principais hipóteses de simulação:
Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na
forma. § 1o Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:
I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se
conferem, ou transmitem caso do laranja. Há alguém que aparentemente é a parte, é o titular da

situação patrimonial mas que, na verdade, não corresponde à realidade.


II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira abrange qualquer tipo de

mentira, seja para efeito de simulação absoluta ou relativa.


III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados a data é fundamental para a

fidedignidade do contrato. Até as questões de data são consideradas simulação.


Art. 167, § 2o Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraentes do negócio jurídico
simulado preserva-se o negócio jurídico diante da boa-fé, mas em relação aos contraentes a

ideia é de que negócio jurídico simulado é sempre nulo. No caso da simulação absoluta
(lavagem de dinheiro), declara-se a nulidade do negócio e não sobra nada. No caso de
simulação relativa, declara-se a nulidade do negócio simulado e mantém-se o negócio
dissimulado, que é verdadeiro e aconteceu (exemplo da transação imobiliária: o que é nulo é
a escritura com valor aquém do valor efetivo, mantém-se o valor real e todos os tributos
recaem sobre esse valor real).
Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério
Público, quando lhe couber intervir. § único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer
do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a
requerimento das partes a nulidade é um vício tão grave que vai poder ser alegado não apenas

pelos contratantes, pode ser reconhecido por iniciativa própria do juiz (ao contrário das
anulabilidades).
Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo
confirmação é uma forma de convalidação de um negócio anulável e não é admitido para
casos de nulidade. Negócio jurídico nulo não se convalida pelo tempo. No CC/16, se aplicava
por analogia ao negócio jurídico nulo o maior prazo prescricional do sistema anterior, que era
de 20 anos. Hoje, isso não mais acontece – negócio jurídico nulo pode ser questionado depois
de qualquer tempo. Atos nulos não se convalidam (inovação, pois o antigo CC era omisso).
Art. 182. Anulado o negócio jurídico, restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se achavam, e, não
sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente a regra seria restituição das partes, mas

é difícil voltar as partes ao estado anterior, por isso muitas vezes a única solução é
indenização.
Art. 172. O negócio anulável pode ser confirmado pelas partes, salvo direito de terceiro.
Art. 173. O ato de confirmação deve conter a substância do negócio celebrado e a vontade expressa de mantê-lo.
Art. 174. É escusada a confirmação expressa, quando o negócio já foi cumprido em parte pelo devedor, ciente do
vício que o inquinava.
Art. 175. A confirmação expressa, ou a execução voluntária de negócio anulável, nos termos dos arts. 172 a 174,
importa a extinção de todas as ações, ou exceções, de que contra ele dispusesse o devedor.
A confirmação é a manifestação de vontade de que se quer manter o negócio mesmo
ciente do vício no negócio jurídico (ex.: houve dolo, comprei um cachorro achando que era
de raça, mas depois eu me apaixonei pelo cachorro e mesmo sabendo que ele era vira-lata eu
quero ficar com ele – confirma-se aquele ato). Manifesta-se novamente a vontade dizendo
que, mesmo sabendo do vício, quer se manter o negócio jurídico. Isso é possível pois a
anulabilidade diz respeito à vontade particular das partes, então o legislador acha que é
razoável que as partes possam ter esse grau de autonomia – o que ela não pode ser é obrigada
a se manter em um contrato viciado se ela não quiser, mas se ela quiser é justo e razoável que
ela possa confirmar. Na confirmação há o mesmo negócio jurídico (como se as partes
dissessem eu sei do vício e eu quero mesmo assim).
Art. 184. Respeitada a intenção das partes, a invalidade parcial de um negócio jurídico não o prejudicará na parte
válida, se esta for separável; a invalidade da obrigação principal implica a das obrigações acessórias, mas a
destas não induz a da obrigação principal há situação em que o problema não é no contrato como

um todo, é em uma determinada cláusula. Nessas situações, anula-se a cláusula e mantém-se


o contrato. Artigo que procura operacionalizar o princípio da conservação do negócio
jurídico. Se pode se separar o que é válido do que não é válido, então declara-se a invalidade
do que está viciado e mantém-se o que não tem vício. Mas nem sempre isso é possível!!!
Art. 170. Se, porém, o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que
visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade aqui não é
confirmação, é conversão. Na conversão é outro negócio jurídico, normalmente com uma
dimensão muito inferior ao do anterior (ex.: comprou uma Ferrari e vai converter para um
carro popular usado). Na confirmação há um mesmo contrato, na conversação não – é como
se dissesse “o contrato que vocês fizeram é nulo, mas há como reconfigurar e reinquadrar esse
contrato em um outro tipo contratual, que é diferente e que, desde que fosse imaginável que as
partes gostariam de ter esse contrato se soubessem que aquele primeiro era nulo, então a
conversão é possível”. O negócio jurídico nulo jamais vai subsistir pela dinâmica do
código. Mesmo na conversão – subsiste não o negócio jurídico nulo, mas um outro
negócio (diferente e de menor extensão e somente se for possível). Na confirmação há o
mesmo negócio, pois se aplica nas anulabilidades. Conversão é no nulo (há outro negócio).
Art. 174. É escusada a confirmação expressa, quando o negócio já foi cumprido em parte pelo devedor, ciente do
vício que o inquinava Confirmação tácita. A confirmação é algo que envolve nova manifestação

de vontade, ainda que ratificando a anterior. Mas isso não precisa acontecer necessariamente
(exemplo da compra do cachorro vira-lata achando que era de raça em prestações; ciente do
vício, continua pagando as prestações). Confirmação tanto pode ser expressa, quanto tácita.
Art. 178. É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a anulação do negócio jurídico, contado: I - no
caso de coação, do dia em que ela cessar; II - no de erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo ou lesão,
do dia em que se realizou o negócio jurídico; III - no de atos de incapazes, do dia em que cessar a incapacidade
Ainda há um terceira forma de convalidação de anulação, que é pelo tempo. Há um prazo
decadencial de 4 anos para anulação, se a parte nada fizer nesses 4 anos e a consequência é
a perda do próprio direito.
Art. 177. A anulabilidade não tem efeito antes de julgada por sentença, nem se pronuncia de ofício; só os
interessados a podem alegar, e aproveita exclusivamente aos que a alegarem, salvo o caso de solidariedade ou
indivisibilidade anulabilidades não podem ser reconhecidas de ofício e só podem ser
invocadas pelas partes. Ao contrários das nulidades que são reconhecidas de ofício,
podem ser invocadas pelo MP, pois aqui há interesses sociais importantes.
Art. 179. Quando a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem estabelecer prazo para pleitear-se a
anulação, será este de dois anos, a contar da data da conclusão do ato regra geral de prazo geral de

anulabilidade de 2 anos, se não houver um prazo específico.


Art. 180. O menor, entre dezesseis e dezoito anos, não pode, para eximir-se de uma obrigação, invocar a sua
idade se dolosamente a ocultou quando inquirido pela outra parte, ou se, no ato de obrigar-se, declarou-se maior
mesmo em um caso de anulabilidade, se o relativamente incapaz não estiver agindo de boa-fé,
pode-se flexibilizar a possibilidade de anulabilidade.

28/11 (segunda-feira) – ROTEIRO 12


ATO ILÍCITO
Os dois elementos fundamentais para o ato ilícito: violação de direito / infração de um
dever legal (violação da lei) ou contratual + dano material ou moral a outrem
Dano: lesão a um bem jurídico, mesmo que sem valor patrimonial. Danos emergentes
+ lucros cessantes (danos emergentes são prejuízos causados agora e lucros cessantes são os
lucros que eu teria caso não tivesse sofrido um dano)
Danos morais: lesão a direito da personalidade ou a cláusula geral da personalidade.
Requisitos gerais do ato ilícito:
1) Ilicitude – violação a direito de outrem ou violação de um dever jurídico.
2) Nexo de causalidade – relação de causa e efeito entre a conduta do agente e o dano.
3) Dolo/Culpa (culpa lato senso) – dolo é vontade deliberada de causar evento danoso/ culpa
stricto sensu é negligência, imprudência e imperícia = falta de cuidado.
4) Dano – prejuízo injusto.
Dois tipos de ato ilícito:
1) Ato ilícito puro: ato ilícito padrão. Traz a regra geral da responsabilidade civil por ato
ilícito (art. 186, CC) – responsabilidade subjetiva = responsabilidade que pressupõe a
existência de culpa lato senso (a pessoal só pode ser responsabilizada se a ela for imputado
culpa lato senso)
Violação de direito (princípios, práticas costumeiras, leis)
Ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência: voluntária pois a pessoa fez
pensando no resultado ilícito.
Resultado = dano.
Ex.: ultrapassa o sinal vermelho e atropela pessoa.
2) Ato ilícito equiparado: É o abuso de direito. É como se ele não fosse um ilícito puro,
existe polêmica sobre se ele preenche aqueles 4 requisitos ou não.
Exercício de um direito que excede manifestamente os limites impostos: pelo seu fim
econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
Críticas: é difícil se falar em bons costumes hoje.
Ex.: uma pessoa ajuíza ação que já sabe conter pedidos improcedentes, apenas para
importunar o réu.
Polêmica: abuso de direito pressupõe culpa? Prof. Frazão entende que sim.
Teoria subjetiva (majoritária): sim, precisa sempre de culpa para responsabilizar
alguém por um resultado ilícito. Lei não explicitou, mas sim com propósito de causar o dano.
Teoria objetiva: culpa é dispensável. Culpa sai de um contexto psicológico para ser
analisada no âmbito social (culpa objetiva) – evitabilidade do dano e reprovabilidade do ato.
Polêmica: exige resultado danoso?
Para a responsabilidade civil por ato ilícito (violações da lei): a responsabilidade vai ser
imposta sem nenhum diferença se a pessoa estava agindo com dolo (que é mais grave) ou
com culpa.
Para a responsabilidade contratual (violações de obrigações contratuais que as partes
livremente estabeleceram) e na fixação da indenização por danos morais: pode ter
repercussões diferentes se se fala de dolo ou culpa.
Exceção à regra geral de que a indenização é a reparação civil que a responsabilidade civil
projeta. Sempre medida pelo valor do dano. Quando há desproporção muito grande entre a
culpa e o dano (culpa é levíssima) – juízes, nesses casos, para não causarem injustiça muito
grande, ideia é desfazer um desequilíbrio causado por um ato ilícito, mas se eu onero demais
uma pessoa que causou um dano por um culpa muito leve, dá uma margem para o juiz
calibrar isso.
Teorias do nexo causal (NC liga a conduta causadora do ato ilícito ao resultado final dano)
utilizados no direito brasileiro – não é pacificado qual teoria é adotada:
Da causalidade adequada: causa mais adequada ao dano. Foca-se na causa mais adequada
no sentido de ser ela a que mais se harmoniza com o resultado dano, de parecer que é ela a
mais responsável o resultado dano. É uma teoria extremamente subjetiva.
Ex.: acidente de carro que uma pessoa se machuca e, na cirurgia, houve erro médico que
piorou a situação. Por essa teoria, responsabiliza-se o outro motorista, porque sem ele não
haveria o acidente, logo não haveria o erro médico.
Da causalidade imediata: importa a causa que aparece em último em uma série. Reconhece
que há uma série de causas que cominam num evento danoso, mas escolhe-se a última. Essa
tem reflexo no CC (art. 403), mas não pode se afirmar que é essa a teoria do código.
Situações que afastam o nexo causal (quebram um dos requisitos gerais do ato ilícito,
afastando a imputação de ato ilícito e impedindo qualquer responsabilização):
- culpa exclusiva da vítima: pedestre que atravessa fora da faixa e é atropelado.
obs.: quando a culpa é concorrente apenas diminui o valor da indenização.
- força maior ou caso fortuito, salvo se o devedor estiver em mora (art. 393): caso
fortuito ou força maior é fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir. Ex.:
explosão de máquina por defeito de fabricação com resultado morte para o convidado em uma
festa.
Situações que afastam a ilicitude (mesma consequência, afastam a responsabilização):
- legítima defesa: uso de recursos que há em mãos no estrito limite para repelir uma violação
de um direito seu. Ressalva da moderação: precisa ser no exato limite para afasta violação
injusta.
- exercício regular de um direito: não pode ser considerado violação a algum dever
jurídico.
- dano para remover perigo iminente: mas, necessidade e nos limites indisponíveis
para tanto. Obs.: pessoa lesada tem direito a indenização, desde que não seja culpada pelo
perigo.
- consentimento do ofendido: hipótese acrescida por Francisco Amaral – se direitos
disponível.
RESPONSABILIDADE CIVIL: dever jurídico de reparar um dano ou de indenizar por
um dano causado. Dano causado por fato próprio ou de pessoas ou coisas pelos quais se é
responsável. Dano recorrente de ato ilícito restauração do equilíbrio moral e/ou contratual.
Responsabilidade civil objetiva: dano + antijuridicidade + culpabilidade/
reprovabilidade do ato + nexo de causalidade.
Relação entre responsabilidade civil e responsabilidades penal e administrativa:
A distinção ocorre pela gravidade do ilícito (e não pela finalidade da sanção)
Kelsen: a sanção civil, embora tenha uma finalidade precipuamente reparatória, também
possui uma função retributiva (ideias de justiça) e preventiva, atributos tradicionalmente da
sanção penal
Obs: art. 935, CC = responsabilidade civil é independente da criminal. Não se pode questionar
mais sobre a existência de fato e autoria quando já decidido pelo juízo criminal.
a) RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
- violação de um dever contratual, direito relativo; ônus da prova é do devedor.
Art. 389, CC: perdas e danos + juros + correção + honorários
b) RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
- violação de dever legal, direito absoluto; surge com o dano; ônus da prova é da vítima
MAS: distinção entre os dois tipos de responsabilidade é questionada. Ambas têm como
pressuposto a obrigação de indenizar decorrente da violação culposa de um dever jurídico.
Reaproximação entre os dois tipos de responsabilidade => enriquecimento sem causa e boa-fé
objetiva
a) RESPONSABILIDADE SUBJETIVA - regra geral - art. 186 do CC – depende da
demonstração de dolo/culpa
b) RESPONSABILIDADE OBJETIVA - prescinde da comprovação de dolo/culpa
Art. 927, parágrafo único, CC: obrigação de reparação nos casos especificados em lei, ou
quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza,
risco para os direitos de outrem.
Teoria do risco: aquele que, por sua atividade, cria um risco de dano para terceiros,
deve ser obrigado a repará-lo, mesmo sem culpa
Ex: art. 938, CC: morador responde pelo dano proveniente das coisas que forem lançadas de
sua janela em lugar indevido.

30/12 (quarta-feira) – CONTINUAÇÃO ROTEIRO 12


Lembrar: roteiro sobre FATOS JURÍDICOS - ato fato, ato jurídico stricto senso, negócio
jurídico e ato ilícito.
Sobre o ATO ILÍCITO: embora seja algo contrário ao direito, dele decorrem
consequências jurídicas. Ato ilícito é uma importante fonte de relações jurídicas. Do ato
ilícito, surge entre ofensor e vítima uma série de relações obrigacionais, e daí porque ele é
considerado fato jurídico.
Porque ato ilícito normalmente se identifica com a responsabilidade civil subjetiva?
A ideia de RESPONSABILIDADE é uma obrigação subsidiária que decorre do
descumprimento de uma obrigação principal. Situação jurídica daquele que violou dever
jurídico (contratual ou não) causando dano a outrem e, por isso, terá obrigação de recompor o
dano ou indenizar o ofendido.
Responsabilidade civil contratual: se há uma relação obrigacional, que surge de um
contrato no qual as partes estabelecem entre si direitos e deveres recíprocos (prestações), e
uma das partes descumpre uma prestação que não poderá mais ser realizada, automaticamente
essa prestação se converte em perdas e danos (ex.: um dos princípios da anulação de um
contrato é o retorno ao status quo mas, caso não seja possível, há compensação por perdas e
danos). A ideia de perdas e danos é que isso não ocorreria se as partes tivessem cumprido suas
obrigações principais e por isso deverão ser responsáveis pelo descumprimento. Perdas e
danos se desdobra principalmente na indenização dos prejuízos sofridos pela parte que ficou
sem a sua devida prestação. Algo muito semelhante acontece no âmbito do ato ilícito.
Responsabilidade extracontratual: Ato ilícito é aquele tipo de relação jurídica com eficácia
jurídica erga omnes (não se fala mais do ilícito contratual, com eficácia entre as partes).
Quando se fala de ato ilícito, no que tange à parte geral do CC, fala-se de responsabilidade
entre pessoas que não possuem previamente uma relação entre elas, não possuem
relação contratual. Mas, vários direitos unem uma pessoa a uma coletividades
Ex.: direitos reais, eficácia erga omnes – se a pessoa tivesse cumprido o dever geral de
abstenção, não teria violado o direito do proprietário e consequentemente não teria causado
danos. Exatamente por ter havido a violação é que há a responsabilidade.
Ex.2: direitos de personalidade, eficácia erga omnes – se alguém descumpre o dever
geral de abstenção, violando direito de personalidade alheio e causando danos, passa a
praticar ato ilícito.
Na hipótese da responsabilidade contratual, já há uma relação prévia entre as partes. A
peculiaridade do ato ilícito na responsabilidade extracontratual é que não há uma relação
prévia e específica entre as partes.
Esse tipo de atribuição de responsabilidade é quase algo essencial da vida em sociedade. As
pessoas precisam ser responsáveis pelos danos que causam a outros.
Essa ideia de compensação por um dano causado vem desde o direito romano. O direito foi
evoluindo para tornar a resposta a danos uma resposta proveniente do Estado e foi procurando
passar esse tipo de resposta a respostas em indenizações pecuniárias (antes, aceitava-se a
vingança privada, por exemplo). É uma conquista evolutiva – as pessoas não respondem mais
com seu corpo ou com a sua liberdade, mas por meio de indenização em dinheiro.
Outro ponto é a importância que passou a ter a CULPA, principalmente a partir do
Jusnaturalismo dos séc. XVII-XVIII, que valorizava o homem e a vontade o critério que vai
diferenciar um prejuízo justo de um prejuízo injusto é o critério do exercício da vontade
no momento das ações.
Por ser um homem livre, posso escolher agir de acordo ou não de acordo com o
ordenamento jurídico. Se ajo de acordo com o ordenamento, não faz sentido que eu seja
responsabilizada, pois não há prejuízo injusto que decorra de um exercício regular do
direito (pode até haver prejuízo, mas será um prejuízo justo). O problema é saber o que é o
dano como prejuízo injusto, daí a importância da culpa
A culpa diz que o prejuízo injusto é aquele que decorre de uma conduta ilícita.
Ilícita pois ela viola o ordenamento jurídico e é, portanto, reprovável e culpável. CULPA é o
dolo (elemento intencional) ou culpa stricto sensu (não envolve um juízo de intenção, mas
sim um entendimento de cognoscibilidade, previsibilidade e evitabilidade do dano = age com
culpa aquele que conhecia a possibilidade do dano, que teria como prevê-lo e evitá-lo, mas
mesmo assim não o faz; negligência e imprudência; não se quer o dano deliberadamente, mas
se agiu de forma reprovável por não evitar o dano em uma situação em que ele seria evitável).
Culpa é fundamental para delimitar a ideia de responsabilidade civil no séc. XIX
responsabilidade civil subjetiva ou por ato ilícito era, no séc. XIX, a única forma de
responsabilidade existente. Só há responsabilidade pelos atos culposos ou dolosos. Não há
nenhum outro fundamento para justificar a responsabilização que não o dolo e a culpa.
Lembrar que, desde o início da teoria do abuso de direito, nem sempre é fácil
comprovar a culpa e o dolo. Daí porque quando a teoria do abuso de direito começou a
aparecer, houve preocupação de se ter um critério objetivo (desvio de finalidade) para
comprovar a reprovabilidade da conduta, e não mais a partir de critérios psicológicos
(cognoscibilidade, reprovabilidade e evitabilidade).
Resumindo: Séc. XIX, jusnaturalismo = é razoável que possamos pensar num sistema de
responsabilidade dos cidadãos pelos danos que eles causam aos outros e o fundamento desse
sistema é a culpa lato senso (que se desdobra no dolo -juízo de intenção- e na culpa stricto
sensu -imprudência, negligência, conhecimento, e mesmo assim não ter tomado o caminho
para evitar o dano).
No século XIX essa ideia de ilícito contratual e extracontratual era fundamental devido ao
ônus da prova.
Na primeira hipótese, quando viola-se uma obrigação contratual, há presunção de
culpa (se eu estou vinculado a alguém por um contrato e meu devedor nao cumpre a
prestação, basta alegar que ele descumpriu a prestação e daí já se presume que ele fez
dolosamente ou culposamente. Assim, é o devedor quem tem de provar que não agiu com
culpa, que de fato ocorreram circunstâncias alheias à sua vontade que o fizeram descumprir o
contrato). Já no ilícito extracontratual, pelo fato de não haver uma relação jurídica prévia
entre vítima e ofensor, se entendia que o ônus da prova era da vítima (vítima tem que
provar não só que sofreu um dano, mas que esse dano decorreu de um conduta dolosa ou
culposa de uma outra pessoa = restringe-se o regime de responsabilidade). Hoje, esses dois
regimes se aproximam, a distinção entre responsabilidade contratual e extracontratual já não é
mais tão relevante, mas mesmo assim ela continua existindo.
Lembrar: ato ilícito decorre uma responsabilidade extracontratual pois se estabelece entre
pessoas que até então não eram unidas por nenhuma relação jurídica específica (a relação
específica surge após a violação do dever geral de abstenção – já que normalmente se fala em
descumprimento de deveres erga omnes).
Embora o direito alemão até procure fazer uma distinção entre antijuridicidade/ilicitude e
culpabilidade (primeiro analisa-se se há uma ofensa formal ao ordenamento; depois, passa-se
para o juízo subjetivo de culpabilidade), o direito francês nunca trabalhou com essa distinção
– eles agregaram esses dois conceitos na fault (falta – falar em ato ilícito é falar em ilicitude e
culpabilidade).
O Código brasileiro vê essas duas questões como interpenetráveis – falar em ilicitude,
reprovabilidade e culpabilidade, na prática, equivale a falar em situações praticamente
sinônimas, ainda que conceitualmente hajam algumas diferenças. Para nós, ato ilícito é
reprovável, antijurídico e culpável, pois se age com dolo e culpa.
Outro aspecto fundamental para entendermos o sistema de responsabilidade civil que se forma
no séc. XIX é que, na França, se adotou um modelo muito diferente do modelo penal.
No direito penal, os ilícitos são tipificados (em razão das inúmeras garantias que ele
fornece). Os franceses positivaram um cláusula geral extremamente ampla, segundo a qual
todo aquele que cause danos a outrem é obrigado a ressarcir. É uma cláusula ampla, mas
suficiente para abarcar toda a responsabilidade civil. Por isso a responsabilidade civil cresce
tanto (a responsabilidade civil não precisa de leis, basta se pensar: o agente agiu ilicitamente,
com abuso de direito, causou um prejuízo injusto? Se responder tais questões
afirmativamente, isso é suficiente para entender que se configura responsabilidade).
Por isso que, quando se lida com responsabilidade civil, diante de uma cláusula
tão abrangente, há que se deter nos elementos essenciais dessa cláusula: o que é ato ilícito,
culpa, dano e nexo causal (une ato ilícito ao dano). Mas, não são questões simples. Daí porque
coube a doutrina e à jurisprudência traçar os filtros dessa responsabilidade civil.
Mas esse não é o único modelo existente. No direito anglo-saxão: torks, esses ilícitos
são previamente tipificados (claro que são tipos mais flexíveis que os do direito penal, mas o
legislador optou por tipificar os ilícitos civis).
Todas as discussões do séc. XIX sobre responsabilidade civil passam necessariamente sobre a
discussão do que é culpa. Mas, ao longo do séc. XIX, começam a acontecer uma série
acidentes de trabalho nas fábricas, que demonstram a insuficiência da responsabilização
fundada na culpa somente.
As primeiras discussões no séc. XIX são acerca da responsabilidade subjetiva, vem Josserand
e Saleilles e estruturaram uma nova ideia de responsabilidade: responsabilidade por risco
(alguns tem a ideia de que responsabilidade objetiva afasta qualquer comportamento de
aspecto volitivo da análise, quando na verdade é uma análise muito mais sofisticada e
complexa).
Para a responsabilidade por risco, se a atividade que eu exerço gera um risco para
terceiros, é razoável que eu responda por ela, mesmo que não haja culpa. Os
fundamentos são solidariedade social, equidade, prevenção do perigo e até critérios
econômicos.
A ideia de responsabilidade objetiva introduz questões que, em última análise, se
referem a noções de equidade e solidariedade social por um lado, e a noções de risco
econômico por outro (se há um risco que eu possa minimante calcular e prever, é razoável que
eu responda por esse risco e também pelos danos possíveis causado por esse risco).
Ex.: na atividade empresarial, se o empresário sabe que sua atividade gera
risco e tem condições de minimamente prever esses riscos, além de controlá-los, é razoável
que ele se responsabilizar por eles, mesmo sem haver culpa.
Assim, a discussão não é mais saber se ele agiu ou não com culpa (ex.: do acidente de
trabalho – antes, dizia-se que não agiu com culpa, então não é responsável), mas sim pela
ideia da responsabilidade por risco, não importando a culpa: se esse dano é inerente a sua
atividade, você criou o risco ou tem proveito dele, então você responderá por ele. Não
deixa de ser um responsabilidade por ato lícito (não há ilicitude a ser imputada a quem vai
responder). Na responsabilidade objetiva, retira-se ilicitude e dolo/culpa, basta que haja
dano e nexo causal – exclui-se o ato ilícito e a culpa.
Resumindo: Responsabilidade objetiva não discute mais culpa ou ilicitude. A discussão não
tem a ver com ilicitude ou culpa, mas sim se a conduta está ou não dentro do risco.
Responsabilidade extracontratual subjetiva – fundada no ato ilícito e na culpa.
Toda a discussão é saber se houve ato ilícito doloso ou culposo, do qual decorreu um dano
(visto como prejuízo injusto) e se há um nexo causal entre o ato ilícito e o dano (NC não
apenas une o ato ilícito ao dano, como delimita o próprio dano).
A partir do final do século XIX, ganha espaço, juntamente com a responsabilidade
pelo ato lícito, a responsabilidade objetiva, que no CC/02 é adotada como cláusula geral,
quando não houver cláusula específica ou quando a atividade de alguém gerar risco para outra
pessoa. Na responsabilidade objetiva não se preocupa com a ilicitude da conduta.
Mesmo com o avanço da responsabilidade objetiva, continua tendo uma ampla importância da
responsabilidade subjetiva no CC.
Ganha, no final do séc. XIX, importância a culpa objetiva ou normativa, que preocupa-se
com a ilicitude da conduta, mas coloca outros parâmetros para verificar a culpa, além
daqueles psicológicos (cognoscibilidade, previsibilidade e evitabilidade do dano). Continua
sendo responsabilidade subjetiva, é um ato ilícito baseado na culpa, porém quer-se
comprovar a culpa por um parâmetro objetivo.
Discussões sobre o critério de desvio de finalidade (que era o critério objetivo para se
comprovar o abuso de direito): Saleilles: sempre que há uma conduta anormal (fora dos
parâmetros de um homem de prudência média), já é suficiente para entender que o autor age
de forma reprovável.
Resumindo: Situações de culpa objetiva ou normativa se restringem a situação de ilicitude e
culpabilidade. Apenas se procurou romper com aquela ideia de culpa vinculada a critérios
psicológicos, pois isso sempre foi muito difícil de comprovar. O que se agravava ainda mais
ao considerar que o ônus da prova na responsabilidade objetiva era da vítima (vítima tinha
que provar que aquele risco era do conhecimento do ofensor, podia ser previsto e evitado por
ele). Enquanto que, com o desvio de finalidade, basta a vítima comprovar que houve desvio,
que houve comportamento anormal.
Resumindo: Responsabilidade por ato ilícito (subjetiva) – ato ilícito, dano, culpa e nexo
causal. Discussão de culpa normativa ou objetiva muito diferente da discussão de
responsabilidade objetiva (culpa normativa ou objetiva continua sendo culpa, continua
trabalhando com esse cenário de ilicitude, reprovabilidade e culpabilidade; a única diferença é
o critério que se usa para comprovar a ilicitude, reprovabilidade e culpabilidade, que não é um
critério psicológico, mas um critério objetivo, como o desvio de finalidade).
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano
a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito cláusula geral de reponsabilidade civil

objetiva.
É uma conduta humana, que tanto pode ser comissiva como omissiva, mas será
culposa (negligência e imprudência = culpa).
Pressuposto do ato ilícito é a violação de um direito (= prejuízo injusto). Precisa violar
direito e causar dano - somente violando um direito ou uma situação jurídica relevante digna
de tutela é que se causa dano. “Causar dano” introduz o NC.
Durante muito tempo, se entendeu que o pressuposto dessa responsabilidade
era a violação de direitos absolutos do ponto de vista da eficácia subjetiva (direitos reais ou
direitos de personalidade). Hoje, a responsabilidade civil está se alargando para buscar
também compreender na definição de direito algumas outras categorias (situações jurídicas
que não se enquadrem na categoria de direitos absolutos poderiam justificam também a
existência de uma ilicitude e consequentemente sua responsabilidade).
Pode ser dano a outrem, ainda que exclusivamente moral – essa ressalva não existia no
CC/16. Deixa claro que é qualquer tipo de dano.
Resumindo: ATO ILÍCITO é essencialmente uma conduta comissiva ou omissiva culposa
lato senso (dolo + culpa ss), que causa dano (visto como prejuízo injusto, e injusto porque
decorre da violação de um direito ou de uma situação jurídica suscetível de tutela por parte da
vítima). Se esses fatores estão presente, então há a aplicação do art. 186.
Sobre a culpa: Perspectiva mais clássica = parâmetros subjetivos (cognoscibilidade,
previsibilidade e evitabilidade do dano) vs. Perspectiva mais recente = parâmetros objetivos,
como o desvio de finalidade. Pergunta: aquela conduta é reprovável? Se sim, ela é ilícita e
culpável. Mas, não basta que a conduta seja reprovável, precisa que haja dano.
Sobre o dano: Basta que a conduta seja reprovável? Não. É preciso o dano. Para a
responsabilidade civil, o dano é fundamental. Mas, a necessidade de dano não é pacífica. Há
uma discussão hoje sobre responsabilidade civil sem dano, i.e., utilização da responsabilidade
civil com funções preventivas e punitivas para punir condutas consideradas intoleráveis,
mesmo que daquelas condutas não decorra nenhum dano. Além disso, danos existem de
diversas maneiras: danos concretos já verificados; danos emergentes (que ainda não
ocorreram, mas ocorrerão); lucros cessantes (o que a pessoa deixou de lucrar); danos morais –
dificuldade sobre o que é o dano e como quantificá-lo.
Daí a importância do nexo causal: é ele que, no mínimo, 1) une o ofensor ao dano e 2)
delimita o próprio dano. Quando se fala em causalidade, não se fala em uma causalidade
naturalística, mas em um juízo de imputação. Vale a teoria do dano direto imediato = somente
o dano que decorre direta e imediatamente daquela ação ou omissão é que será indenizado.
NC será fundamental também para se delimitar o próprio dano (ex.: se alguém esbarra em
alguém, mas esse alguém tem uma doença que só de triscar já quebra o osso. Será que se
imputa o dano maior àquela conduta? Dá pra se dizer que decorre direta e imediatamente da
conduta?). Essa teoria vincula o ofensor a determina conduta e a uma determina extensão de
danos.
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os
limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes prevê uma outra

espécie de ato ilícito, que é o abuso de direito, acolhendo a ideia de desvio de finalidade.
Desvio de finalidade, boa-fé e bons costumes como parâmetros para a avaliar se o
exercício de um direito pode ser considerado ato ilícito.
Desvio de direito x ato ilícito comum: o abuso tem um falso acento em direito, aquela
conduta a prioristicamente poderia ser vista como o exercício de um direito (muitas vezes é
uma questão de intensidade, de finalidade que transforma em abuso).
Art. 188. Não constituem atos ilícitos: I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um
direito reconhecido; II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover
perigo iminente. § único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem
absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo excludentes

de ilicitude.
Não constituem atos ilícitos: legítima defesa ou exercício regular e proporcional de um
direito; perigo eminente (alguns entendem que também o consentimento da vítima é uma
excludente de ilicitude).
Além das excludentes de ilicitude, poderão ser aplicadas aos atos ilícitos também as
excludentes de responsabilidade, que já existem mesmo em se tratando de responsabilidade
objetiva. Caso fortuito ou força maior, culpa exclusiva de terceiro ou culpa exclusiva da
vítima. Caso de culpa concorrente da vítima não exclui a responsabilidade, só atenua o
quantum da responsabilização.

05/12 (segunda-feira) – ROTEIRO 13


Prescrição = perda da pretensão (pretensão é atributo exclusivo dos direitos subjetivos)
Decadência = perda do próprio direito potestativo
Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que
aludem os arts. 205 e 206.
Art. 191. A renúncia da prescrição pode ser expressa ou tácita, e só valerá, sendo feita, sem prejuízo de terceiro,
depois que a prescrição se consumar; tácita é a renúncia quando se presume de fatos do interessado,
incompatíveis com a prescrição.
Não admite a renúncia à prescrição – se fosse possível as partes renunciarem a
prescrição elas sempre o fariam, então ela perderia esse papel de estabilização das relações no
tempo. Renúncia depois que a pretensão já esta consumada. Agora, se o direito está prescrito,
nada impede que o devedor possa renunciar a pretensão e cumprir aquele dever. Direito
prescrito continua a justificar o cumprimento espontâneo por parte daquele que é titular do
dever (assim como ele pode cumprir espontaneamente mesmo estando prescrita – renúncia
tácita, ele também pode renunciar à prescrição). Titular não pode mais exigir, pois está
prescrito, mas o devedor está livre para cumprir ou não.
Art. 192. Os prazos de prescrição não podem ser alterados por acordo das partes.
É matéria legal, matéria de ordem pública.
Exatamente por isso o art. 194 (Art. 194. O juiz não pode suprir, de ofício, a alegação de
prescrição, salvo se favorecer a absolutamente incapaz) foi revogado – prescrição é matéria que pode

ser reconhecida de ofício pelo juiz (assim como as nulidades, porque há conexão com o
interesse público).
Seções II e III. Das Causas que Impedem ou Suspendem a Prescrição e Das Causas que
Interrompem a Prescrição:
Quando o titular do direito não exerce pretensão dentro do prazo, considera-se que há
concordância do titular do direito com a própria violação daquele direito. Ha situações em que
não é exigível que uma pessoa exerça pretensão:
Art. 197. Não corre a prescrição:
I - entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal enquanto perdurar a sociedade conjugal, a prescrição
não corre.
II - entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar;
III - entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela.
Aqui há relações de afeto, assim não poderia ocorrer a pretensão; uma vez que
extingue a sociedade conjugal, por exemplo, aí sim pode (divórcio).
Art. 198. Também não corre a prescrição:
I - contra os incapazes de que trata o art. 3o;
II - contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos Municípios;
III - contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de guerra.
Também pessoas que estão em uma situação na qual não é razoável que exerçam
pretensão. Essas pessoas, ao nao exerceram pretensão é porque estão em situação que
impossibilita ou dificulta sobremaneira o exercício dessa pretensão.
Pretensão: Continua sendo um direito, só que enfraquecido, não pode exercer pretensão, mas
o devedor é respaldado pelo direito caso ele queira cumprir.
Causas de suspensão da prescrição: podem ocorrer reiteradas vezes, o que acaba muitas
vezes estendendo muito o prazo prescricional. Causas podem ser cumulativas. Prazos
prescricionais estão sujeitos a fatores de suspensão ou interrupção.
A peculiaridade da suspensão: podem existir várias suspensões e sempre se aproveita o
prazo já escoado. (ex.: há um prazo prescricional de 3 anos – acidente ocorreu em março/13,
as duas pessoas se casam em março/14, suspende tendo corrido 1 ano; divórcio em março/15
= volta a correr o prazo prescricional, faltando os 2 anos; se um dos ex-cônjuges vai morar no
exterior, suspende o prazo prescricional de novo).
Causas de interrupção da prescrição: há condutas importantes, seja condutas do titular do
direito ou do dever, que o legislador consideram que importam para efeito de contagem. Na
interrupção só pode haver 1 (suspensão pode haver várias).
Art. 202. A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á:
V - por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;
VI - por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo devedor.
§ único. A prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do último ato do
processo para a interromper.
Ao contrário da suspensão, só pode ocorrer uma vez e ela desconsidera o prazo que
já foi escoado (suspensão sempre leva em consideração esse prazo que já foi escoado).
Suspensão pode ocorrer várias vezes e sempre se aproveita o prazo, situações em que é
razoável a passividade do sujeito.
Interrupção: Condutas do titular do direito ou do dever que são consideradas relevantes para
efeitos de interromper o prazo – quando o prazo volta a correr ele volta integralmente.
Decadência convencional: prazos para que uma e outra possa exercer direitos potestativos do
contrato; decorrem da vontade das partes. Lei autoriza a renúncia nesses casos.
Art. 210. Deve o juiz, de ofício, conhecer da decadência, quando estabelecida por lei também
é considera da matéria de ordem pública e por isso pode ser reconhecida de ofício.
Decadência/
Dos Prazos da Prescrição: Arts. 205 a 210
Violado o direito surge para o titular do direito a pretensão, mas, as vezes, a jurisprudência
possibilita flexibilidade na contagem desses prazos.

Você também pode gostar