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Desconsideração ≠ despersonalização
DESCONSIDERAÇÃO não é extinção da pessoa jurídica, é só desconsiderar pontualmente
um dos efeitos da pessoa jurídica, no caso, a separação patrimonial perfeita. É a suspensão
parcial da separação patrimonial perfeita em relação a uma obrigação específica (pessoa
jurídica continua existindo, separação patrimonial perfeita continua existindo em relação a
todas as outras dívidas que não aquela que justificou a desconsideração; os sócios continuam
respondendo limitadamente mas, nesse caso específico, os sócios responderão pela dívida
da pessoa jurídica).
Só faz sentido na separação patrimonial perfeita. Na separação patrimonial
imperfeita os sócios já naturalmente respondem pelas dívidas da sociedade/pessoa jurídica,
ainda que subsidiariamente, i.e., se a pessoa jurídica não tem patrimônio automaticamente o
credor já pode direcionar sua pretensão contra os sócios. Porém, em sociedades limitada, em
associações, em fundações, há uma separação patrimonial perfeita sócios não respondem, via
de regra, pelas dívidas de uma sociedade limitada, assim como associados não respondem
pelas dívidas de uma associação e administradores de uma fundação não respondem pelas
dívidas desta.
A desconsideração pretende, portanto, suspender a separação patrimonial perfeita em
relação a uma obrigação específica. Quando isso ocorre, não se está acabando com a
separação patrimonial perfeita, só se está suspendendo-a para aquele efeito específico. Outro
credor, se quiser acesso ao patrimônio dos sócios, vai ter que entrar com sua própria ação e
pedir isso.
O que justifica a desconsideração desvio de finalidade: pelo art. 50 do CC (cláusula
geral de desconsideração da personalidade jurídica)
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão
patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no
processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares
dos administradores ou sócios da pessoa jurídica. TEORIA MAIOR DA DESCONSIDERAÇÃO
Art. 47, CC: Obrigam a pessoa jurídica os atos dos administradores, exercidos nos limites de seus poderes
definidos no ato constitutivo.
Muito importante no âmbito do direito contratual e está diretamente relacionado à
teoria dos órgãos Órgãos presentam (e não representam) a pessoa jurídica porque não há
duplicidade de vontades. Os órgãos de uma pessoa jurídica estão para ela assim como a minha
boca está para mim. Nas pessoas naturais, os órgãos são visíveis pois fazem parte de uma
realidade biológica, enquanto que nas pessoas jurídicas, porque elas têm um aspecto de
ficção, precisa-se criar uma organização artificial (órgãos coletivos, como a assembleia, mas
também órgãos individuais, como os administradores, que vão cuidar do dia a dia da pessoa
jurídica – presidente, vice presidente, etc.).
Administrador quando age, presenta a pessoa jurídica tanto quanto minha boca me
presenta enquanto pessoa natural.
Durante muito tempo prevaleceu, por influência do direito inglês, uma teoria chamada
de ultra vires quando um administrador age fora dos seus poderes, ele não vincula a pessoa
jurídica, ele vincula somente a si mesmo. Vem da ideia de que tudo relacionado a uma pessoa
jurídica precisa estar no seu ato constitutivo, que está no registro ou nos instrumentos que são
acrescidos a esse registro. Assim, tem-se a ideia de que o terceiro sempre tem como saber se
aquela pessoa que diz ser órgão da pessoa jurídica, que diz ter competência para agir em
nome dela, está correta ou não, porque basta ele olhar no registro.
Dificuldade pois o registro realmente tem essa finalidade de publicidade e
segurança, mas a própria prática do dia a dia, a rapidez que os negócios exigem mostram que
as pessoas nem sempre tem tempo de parar uma negociação, ir até o registro, enfrentar
burocracias, pra no final das contas descobrir se aquele que se diz administrador da pessoa
jurídica tem aqueles poderes que ele alegou ter na negociação.
Com base nessas circunstâncias, começou-se a se desenvolver uma teoria oposta, a
teoria da aparência não deixa de ser um desdobramento da boa fé objetiva. Se o
administrador aparentava ter poderes, ele vincula a pessoa jurídica; se o terceiro está de
boa fé (não sabia que o administrador estava agindo sem poderes, nem teria porquê saber),
então ele vincula a pessoa jurídica. Desdobramento da teoria dos órgãos – cria-se uma regra
de vinculação da pessoa jurídica sempre por atos dos seus órgãos, desde que diante de um
terceiro de boa fé. Terceiro de boa fé = não sabia, nem deveria saber; não sabia em uma
situação na qual não era exigível que ele soubesse.
Segunda metade do séc. XX essa teoria da aparência começa a ganhar força e
sua consequência principal é que, também no campo contratual, a pessoa jurídica
sempre se vincula pelos atos de seus administradores. Diante de terceiros de boa fé,
essa vinculação é absoluta, pouco importando se o administrador não tinha poderes, se
aquela limitação de poderes estava escrita e averbada corretamente no registro, porque
se entendia que impor ao terceiro de boa fé esse ônus de consultar o registro seria algo
demasiado.
Essa solução é reconhecida na doutrina e na jurisprudência em todo o mundo.
Lei da teoria orgânica e da presentação, conforme o grau de complexificação da pessoa
jurídica, ainda colocará uma segunda etapa, em que esses órgãos delegarão parcialmente seus
poderes, aí sim, para representantes, porque aí sim teríamos duas vontades: a vontade da
pessoa jurídica presentada por aquele órgão e a vontade do representante que receberá
poderes específicos para determinado contrato, para determinada operação (gerente
normalmente é representante, pois administrador delegou a ele poderes específicos para
determinados contratos, e ele vai exercer isso como representante, sujeito às regras de
representação).
Código Civil, a partir do art. 40, começa a entrar em classificações que envolvem inclusive
pessoas jurídicas de direito público. Isso acontece também na parte em que o código trata dos
bens (pessoas de dir. público, pessoas de dir. privado, bens de dir. público, bens de dir.
privado). Arts. 40 a 43 são artigos que tratam de matéria de direito público (direito
administrativo, são coisas que inclusive a constituição já trata mas, por uma questão de
sistematicidade, está no CC também).
PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO – ART. 44 DO CÓDIGO CIVIL:
Art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado:
I - as associações;
II - as sociedades;
III - as fundações.
IV - as organizações religiosas;
V - os partidos políticos;
VI - as empresas individuais de responsabilidade limitada.
Os três primeiros incisos trazem as principais pessoas jurídicas de direito privados
(associações, sociedades e fundações).
Art. 44, I. Associação: união de pessoas.
Finalidade: sem fins econômicos.
Art. 44, III. Fundação: união de bens (união patrimonial). Pessoa jurídica de maior abstração
pois é, em tese, um patrimônio destinado a uma finalidade.
Finalidade: tem finalidades não só consideradas não econômicas, mas também
relevantes do ponto de vista social e com grau de altruísmo e solidarismo. Art. 62. § único.
A fundação somente poderá constituir-se para fins de: I. assistência social; II. cultura, defesa e
conservação do patrimônio histórico e artístico; III. educação; IV. saúde; V. segurança
alimentar e nutricional; VI. defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção
do desenvolvimento sustentável; VII. pesquisa científica, desenvolvimento de tecnologias
alternativas, modernização de sistemas de gestão, produção e divulgação de informações e
conhecimentos técnicos e científicos; VIII. promoção da ética, da cidadania, da democracia e
dos direitos humanos; IX. atividades religiosas.
Art. 44, II. Sociedade: estrutura intermediária, união de bens e pessoas.
Finalidade: tem fins econômicos que normalmente são fins lucrativos, mas não
necessariamente (cooperativa, por exemplo, tem fim econômico mas não lucrativo, pois ali os
sócios cooperados não tem por objetivo o lucro, mas sim obter benefícios).
Embora associações e fundações tenham em comum finalidades não econômicas, as
finalidades das fundações são muito mais restritivas (uma associação pode exercer todas as
finalidades das fundações, pois pode ser qualquer fim não econômico. Mas uma fundação
não pode exercer todas as finalidades de uma associação). O campo das associações em
termo de finalidades é muito maior.
Ex.: fim não econômico muito comum que justifica a criação de uma associação –
representação de classes ou categorias: interesses coletivos mas sem nenhuma conotação
altruísta.
Art. 44 prossegue tratando de pessoas jurídicas que não são propriamente pessoas jurídicas
tipicamente privadas e, por isso, serão regidas por outras legislações ou não estarão sujeitas a
nenhum tipo de requisito.
Art. 44, IV. As organizações religiosas. §1˚. São livres a criação, a organização, a
estruturação interna e o funcionamento das organizações religiosas, sendo vedado ao poder
público negar-lhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessários ao seu
funcionamento.
Diante das organizações religiosas, tem-se uma pessoa jurídica cuja criação é
totalmente livre, aqui o legislador não impõe nenhum requisito, como ele o fez em relações a
outras pessoas jurídicas (precisa do registro, sem registro não tem pessoa jurídica). Por isso
que muitas vezes há abusos na criação dessas pessoas jurídicas, são verdadeiras empresas que
se aproveitam da condição religiosa para ter uma liberdade que nenhum outro agente
econômico teria.
Art. 44, V. Os partidos políticos. Não deixam de ser associações, mas associações tão
específicas que vão ser regidas por uma legislação específica, o direito eleitoral.
Sindicatos. Não consta nessa enumeração, mas são também associações, só que
representativas de empregadores ou empregados, de categorias profissionais. Associações
mas que, em razão das suas peculiaridades, vão ser regidas pelo direito do trabalho e não
propriamente pelo Código Civil.
Art. 44, VI. Empresa individual de responsabilidade limitada (EIRELI). Inovação, pessoa
jurídica criada em 2011. Alguns entendem que é uma sociedade unipessoal, sociedade de um;
outros entendem que é um patrimônio de afetação (forma de possibilitar ao empresário
individual que ele tenha, de alguma maneira, a separação patrimonial perfeita, o que antes
dessa alteração só se admitia em relação às sociedades); e outros entendem que é uma pessoa
jurídica sui generis (não é nem sociedade unipessoal, nem patrimônio de afetação). Por
enquanto: entender que é uma pessoa jurídica composta por apenas uma pessoa, em que o
empresário individual vai, por meio daquela pessoa jurídica, criar um novo centro de
imputação e um patrimônio separado.
ASSOCIAÇÕES: Art. 53. Constituem-se as associações pela união de pessoas que se
organizem para fins não econômicos.
Código Civil procurou acabar com uma confusão que sempre existiu no direito brasileiro
entre associações e sociedades. Antes do CC, havia várias sociedades com fins não
econômicos (Sociedade Brasileira de Cirurgiões, por exemplo), assim como havia associações
com fins econômicos. Veio CC e separou: sociedades têm fins econômicos e associações têm
fins não econômicos.
Problema: associações como a Abrace, que vendem canecas, camisetas, isso não é
atividade econômica? Doutrina e jurisprudência sempre fizeram um recorte: essas finalidades
não econômicas do art. 53 são as atividades fim. Nada impede que uma associação
desempenhe atividade econômica como atividade meio, desde que com a finalidade exclusiva
de reempregar os benefícios daquela atividade meio na sua atividade fim.
Entretanto, alguns autores hoje já sustentam que associações podem sim ter fins
econômicos e que o correto do recorte é o recorte da lucratividade e não da atividade
econômica. Então, associações poderiam sim ter fins econômicos, desde que não distribuam
lucros, tudo aquilo que obtiverem na atividade econômica tem que se reinvestido na sua
própria finalidade institucional. Leem, no art. 53, finalidades não econômicas como
finalidades não lucrativas.
O importante é que, na prática, existem muitas associações com finalidades
econômicas. Embora isso seja muito discutível, há muitos que defendam que isso é sim
possível. Mas isso não é um consenso (não pode finalidade não econômico qualquer que
seja x não pode finalidade não lucrativa).
Art. 53, § único: Não há, entre os associados, direitos e obrigações recíprocas.
Só existe uma relação jurídica: aquela entre o associado e a pessoa jurídica associação.
Importante pois, nas sociedades, além da relação que existe entre cada um dos sócios e a
pessoa jurídica sociedade, há relações recíprocas entre os sócios. É por isso que a sociedade é
uma pessoa jurídica mais complexa que a associação, dá margem a mais conflitos de
interesses que as associações (sócios estabelecem relações entre si, com a pessoa jurídica, e
com terceiros, dependendo do caso).
Art. 54. Sob pena de nulidade, o estatuto das associações conterá: I. a denominação, os fins e a sede da
associação; II. os requisitos para a admissão, demissão e exclusão dos associados; III. os direitos e deveres dos
associados; IV. as fontes de recursos para sua manutenção; V. o modo de constituição e de funcionamento dos
órgãos deliberativos; VI. as condições para a alteração das disposições estatutárias e para a dissolução. VII. a
forma de gestão administrativa e de aprovação das respectivas contas.
Requisitos do lado constitutivo de uma associação. Tem que ser interpretado em
comum com o art. 46 (artigo que fala de todas as coisas que tem que constar nos atos
constitutivos de uma pessoa jurídica. É uma regra geral, que se aplica a todas as pessoas
jurídicas. O art. 54 é o que trata especificamente das associações).
Art. 55. Os associados devem ter iguais direitos, mas o estatuto poderá instituir categorias com vantagens
especiais.
Dentro do possível, assegurar isonomia e democracia nas associações. Tem se
interpretado esse artigo como: naquilo que for essencial à condição de associado (ex.: direito
de voto), esses direitos têm que ser iguais. Embora isso seja controverso – alguns autores
defendem a possibilidade de pesos diferenciados em algumas associações, desde que com
alguns critérios de razoabilidade. No mínimo, a discussão se divide entre direitos essenciais
(como o voto) e vantagens (como associados fundadores terem direito a desconto no aluguel
da sede para fazer uma festa). Nessas situações, que não dispõem do núcleo duro da vida
associativa, a jurisprudência entende que pode haver diferença. Mas, nos direitos essenciais,
entende-se que precisa haver isonomia.
Art. 57. A exclusão do associado só é admissível havendo justa causa, assim reconhecida em procedimento que
assegure direito de defesa e de recurso, nos termos previstos no estatuto.
Artigo que não constava da redação original do código, já é uma alteração legislativa
que decorre do acórdão do supremo que reconheceu a eficácia horizontal do direito
fundamental relacionado ao contraditório e à ampla defesa nas relações associativas. Exclusão
de associado deixa de ser questão de mera vontade dos associados, de mera deliberação da
maioria, passa a estar sujeito a requisito material (justa causa – estatuto prevê as condições) e
requisito procedimental (direito de defesa e de recurso).
Art. 59. Compete privativamente à assembleia geral: I – destituir os administradores; II – alterar o estatuto.
Competência privativa da assembleia geral, principal órgão da pessoa jurídica (porque é o
único que reúne todos os membros da pessoa jurídica). Em relação a essas matérias,
consideradas muito relevantes (destituição de administradores e reforma de estatuto), somente
todos os associados vão poder decidir na assembleia. Tirando essas matérias, associação vai
ter ampla liberdade para, por meio do seu estatuto, criar outros órgãos colegiados ou dizer
que, fora das hipóteses do art. 59, o diretor ou presidente, como órgão individual, pode fazer
tudo. O estatuto pode também aumentar as matérias de competência da assembleia, só não
pode é reduzir o art. 59. Isso assegura democratização.
Art. 60. Assegura a 1/5 dos associados o direito de convocar assembleia. Não basta dizer que
a assembleia é competente, tem que dar a uma minoria qualificada a chance de convocar a
assembleia (normalmente a assembleia é convocada pelo administrador).
Art. 61. Dissolvida a associação, o remanescente do seu patrimônio líquido, depois de deduzidas, se for o caso,
as quotas ou frações ideais referidas no parágrafo único do art. 56, será destinado à entidade de fins não
econômicos designada no estatuto, ou, omisso este, por deliberação dos associados, à instituição municipal,
estadual ou federal, de fins idênticos ou semelhantes.
Destino do patrimônio da associação em caso de extinção da pessoa jurídica. O
legislador dá uma relativa autonomia para o estatuto mas, sendo ele omisso, havendo
patrimônio remanescente, esse patrimônio seja dirigido a uma associação de fins semelhantes.
Acontece coisa similar nas fundações.
FUNDAÇÕES
Pessoa jurídica com maior grau de abstração. Não há base associativa, a fundação é
patrimônio afetado a um fim.
A forma de constituição da fundação é diferente, normalmente acontece em duas etapas:
primeiro, o ato de instituição (ato por meio do qual alguém, em vida ou testamento, destina
parte de seu patrimônio a uma daquelas finalidades que justifica uma fundação) e o ato de
constituição da fundação em si.
Art. 63. Quando insuficientes para constituir a fundação, os bens a ela destinados serão, se de outro modo não
dispuser o instituidor, incorporados em outra fundação que se proponha a fim igual ou semelhante.
No âmbito dessa primeira etapa de ato de instituição, às vezes a pessoa, num
testamento ou em vida, deixa um patrimônio insuficiente para constituir uma fundação. Nesse
caso, não se desperdiça, ele vai ajudar numa fundação que já exista e tenha propostas
semelhantes. Se cria uma nova fundação, quando suficiente, ou esses bens serão transferidos
para uma fundação com fins semelhantes.
Art. 64. Constituída a fundação por negócio jurídico entre vivos, o instituidor é obrigado a transferir-lhe a
propriedade, ou outro direito real, sobre os bens dotados, e, se não o fizer, serão registrados, em nome dela, por
mandado judicial.
Se esse ato de instituição for feito em vida, o instituidor não pode se arrepender. O
interesse público relacionado à instituição dessa fundação é tão grande que o próprio
legislador já criou todos os mecanismos para que aquele ente surja a partir da dotação
patrimonial. Fundações são consideradas quase que braços-direitos do Estado, são pessoas
jurídicas de direito privado, mas que exercem finalidades de interesse público.
As sociedades e associações normalmente são criadas pela vontade dos sócios ou
associados, que decidem redigir seu estatuto. Numa fundação isso não acontece, porque não
tem essa base associativa. Normalmente, o que acontece numa fundação é que o instituidor
nomeia alguém para redigir o estatuto da fundação. Mas a lei é tão diligente para que a
fundação aconteça, que ela coloca:
Art. 65. Aqueles a quem o instituidor cometer a aplicação do patrimônio, em tendo ciência do encargo,
formularão logo, de acordo com as suas bases, o estatuto da fundação projetada, submetendo-o, em seguida, à
aprovação da autoridade competente, com recurso ao juiz.
A autoridade competente é o ministério público. Por isso as fundações são exceções
ao regime das disposições normativas. Aqui não basta ter um ato constitutivo levado a
registro, precisa de uma instituição, depois de um ato constitutivo e depois vai para o
ministério público, que precisa aprovar e autorizar e, somente com essa autorização do MP,
é que há o registro.
Art. 65, § único. Se o estatuto não for elaborado no prazo assinado pelo instituidor, ou, não havendo prazo,
em cento e oitenta dias, a incumbência caberá ao Ministério Público.
Se o instituidor esqueceu de nomear uma pessoa para fazer o registro ou nomeou mas
a pessoa não cumpriu com essa competência, o próprio MP que fará o estatuto e tomará todas
as providências para que aquela pessoa jurídica seja criada.
Art. 66. Velará pelas fundações o Ministério Público do Estado onde situadas.
Como as fundações não têm base associativa, que ajude a exercer as suas finalidades,
que controle e supervisione a ação dos gestores, tudo isso é substituído pela ação do
Ministério Público. MP exerce controle direto sobre as fundações, fiscalizando-as,
verificando se de fato os administradores estão agindo adequadamente, se estão empregando
os bens nas finalidades propostas.
Art. 67. Para que se possa alterar o estatuto da fundação é mister que a reforma:
I. seja deliberada por dois terços dos competentes para gerir e representar a fundação; II. não contrarie ou
desvirtue o fim desta; III. seja aprovada pelo órgão do Ministério Público no prazo máximo de 45 dias, findo o
qual ou no caso de o Ministério Público a denegar, poderá o juiz supri-la, a requerimento do interessado.
Quando se fala na alteração do estatuto das fundações, além de deliberação por 2/3
dos componentes dessa fundação (administradores), MP precisa aprovar essas alterações
estatutárias.
Como associações podem exercer todas as finalidades de uma fundação (mas o contrário não
é verdadeiro), muitas vezes se é sugerido fazer uma associação para alguém que quer criar
uma pessoa jurídica de direito privado para alguma das finalidades previstas no §único do art.
62, pois, do ponto de vista da gestão é muito mais fácil; fundação recebe interferência e
monitoramento constante do MP.
Art. 69. Tornando-se ilícita, impossível ou inútil a finalidade a que visa a fundação, ou vencido o prazo de sua
existência, o órgão do Ministério Público, ou qualquer interessado, lhe promoverá a extinção, incorporando-se o
seu patrimônio, salvo disposição em contrário no ato constitutivo, ou no estatuto, em outra fundação, designada
pelo juiz, que se proponha a fim igual ou semelhante.
Regra semelhante a das associações. Se a fundação for extinta, em tese, a solução
usual é que seu patrimônio seja transferido para uma instituição semelhante.
Única possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica de uma fundação seria
para trazer a responsabilidade dos administradores, porque ela não tem sócio nem associados.
Teria que se comprovar que os administradores estão praticando desvio de finalidade e isso
justificaria, então, a desconsideração.
BENS
Os bens são o objeto das relações jurídicas. Toda e qualquer relação jurídica abrangida pelo
direito tem um objeto, que é um bem.
Representam valores materiais e imateriais (crédito, honra, direitos autorais).
Bens econômicos são sempre jurídicos.
Tecnologia altera o conceito de bens de produção, das relações de trabalho, econômicas,
empresariais e direitos envolvidos.
Conceito de bem é um conceito histórico e relativo. O que é bem em um momento pode não
ser em outro, e vice-versa. Relativo porque pode ser um bem principal/inalienável/indivisível/
imóvel em uma relação, e não em outra. Cada vez mais relacionado a discussões sobre acesso
e inclusão social.
Elementos estruturantes da relação jurídica: sujeito (proprietário, favorecido por uma
garantia) + objeto (bem imóvel; ex: terreno) + conteúdo/vínculo (propriedade, prestação de
garantia hipotecária, direito subjetivo, etc.).
Por que saber as classificações/ regras? Porque sua classificação tem implicações em diversas
áreas do direito: processual, tributário, do consumidor, etc.
Bens materiais: bens corpóreos, coisas, objeto dos direitos reais (tratam das relações entre
indivíduos e as coisas). Ex.: propriedade, superfície.
Bens imateriais: bens incorpóreos, valores/prestações, objeto dos direitos pessoais. Ex.:
direito da família, propriedade intelectual, dados pessoais, clientela, direitos de personalidade,
direito à informação, conhecimento técnico, meio ambiente.
Divisão do Código Civil:
1. BENS CONSIDERADOS EM SI MESMO:
A1) Bens imóveis:
Imóveis por natureza: não podem ser transportados sem sua destruição (ex.: solo, sua
superfície, sobsolo e espaço aéreo). Obs.: Art. 1229, CC – na medida da utilidade ao exercício
do direito de propriedade.
Art. 1.229. A propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo correspondentes, em altura e
profundidade úteis ao seu exercício, não podendo o proprietário opor-se a atividades que sejam realizadas, por
terceiros, a uma altura ou profundidade tais, que não tenha ele interesse legítimo em impedi-las.
Imóvel por acessão: tudo quanto se incorporar/ aderir ao solo natural ou artificialmente (ex.:
árvores, plantações, construções que não podem ser retiradas sem danos ou modificação.
Imóvel por determinação legal: opção do legislador. Os direitos reais sobre imóveis (servidão,
hipoteca, etc.); as ações que asseguram esses direitos reais (ação de rescisão de compra e
venda, etc.); o direito à sucessão aberta (direito à herança); as edificações que, separadas do
solo, mas conservando a sua unidade, forem removidas para outro locais (ex.: casa pré-
fabricada); os materiais provisoriamente separados de um prédio, para nele se reempregarem.
A2) Bens móveis:
Móveis por natureza: suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem
alteração da substância ou da destinação econômico-social. Ex.: animais, ações de uma
companhia, mercadorias, navios e aeronaves (enquanto não hipotecados).
Móveis por determinação legal: alguns bens o legislador decidiu enquadrar como móveis para
incidirem sobre eles todo o regramento de móveis. Ex.: as energias que tenham valor
econômico; os direitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes; os direitos
pessoais de caráter patrimonial e respectivas ações; propriedade intelectual.
Móveis por antecipação (doutrina): são os bens incorporados ao solo, mas com a intenção de
separá-los oportunamente e convertê-los em móveis. Ex.: árvores destinadas ao corte, frutos
ainda não colhidos.
Efeitos práticos da diferenciação entre bens móveis e imóveis: regimes jurídicos diversos;
imóveis têm leis mais rigorosas para aquisição/transferência – “regime especial”; diferente
quanto à tributação, etc.
B) Bens fungíveis: a priori, sempre bens móveis (parte da doutrina entende que bens imóveis
podem ser fungíveis, mas a maior parte não). São móveis que podem ser substituídos por
outros da mesma espécie, qualidade e quantidade, sem prejuízo. A ver com a
substituibilidade. Genéricos e não-individualizáveis. Ex.: dinheiro, roupa que não seja peça
única, mesa.
Para parte da doutrina, há imóveis fungíveis. Ex.: lotes de um loteamento. Mas o CC refere-se
apenas aos móveis.
Podem ser transformados em infungíveis por vontade das partes (o contrário não pode). Ex.:
se duas pessoas são coproprietárias de um determinado bem, elas podem entender que o bem
é tão insubstituível que elas podem, por comum acordo, transformarem-no em infungível.
C) Bens consumíveis:
Móveis cujo uso importa destruição imediata da própria substância (diferente de
deteriorabilidade) – consuntibilidade natural.
Móveis destinados à alienação (comercialização, transferência) (ainda que naturalmente
sejam inconsumíveis) – consuntibilidade jurídica (não é natural, é uma criação legal para
incidir esse regramento específico).
Livro é consumível (não por natureza, mas por ser alienável), e fungível ou infungível (se for
raro, único é infungível).
A intenção das partes pode tornar algo consumível em não consumível, justamente, por
exemplo, por ser infungível.
D) Bens divisíveis:
Podem ser fracionados sem alteração na sua substância, sem prejuízo do uso a que se
destinam, e sem diminuição considerável de valor. Novo CC: critério da utilidade –
divisibilidade jurídica
Ex.: divisão de um diamante grande em duas partes diminui consideravelmente seu
valor. Juiz determina a venda e divisão do dinheiro, em vez de a divisão do diamante.
Podem tornar-se indivisíveis por determinação da lei (ex.: módulo rural) ou por vontade das
partes (testamento com condição de não divisão do imóvel por até 5 anos). Indivisibilidade
jurídica é quando a lei ou a vontade das partes transformam em indivisível algo que, por sua
natureza, seria divisível.
Critério de divisibilidade/indivisibilidade física (vários bens que não têm como serem
divisíveis sob pena de se desconfigurarem por completo), econômico (diamante, que
materialmente é divisível mas, se eu pegar um diamante grande e dividir em 10 pedacinhos, a
doma do preço dos 10 é muito menor que o preço total do diamante inteiro) e funcional.
E1) Bens singulares: Considerados em sua individualidade, independentemente dos demais,
mesmo que reunidos.
E2) Bens individuais compostos: formados pela união material de outros bens. Ex.: casa.
Suas partes integrantes: podem ser separadas sem perder a identidade (ex.: porta da casa).
Suas partes componentes: não podem ser separadas sem perda de identidade (ex.: cimento da
parede).
E3) Bens coletivos: formados pela reunião de bens singulares, que podem ser
individualizados, mas que são considerados em conjunto, formando um todo unitário em
razão de uma mesma destinação. Aqui, a união é ideal.
Universalidade de fato: os bens singulares pertencem a uma mesma pessoa e foram por ela
agrupados, com destinação unitária. Os bens singulares podem ser objeto de relações jurídicas
próprias. Ex.: rebanho, estabelecimento comercial.
Universalidade de direito: complexo de relações jurídicas, dotadas de valor econômico, ao
qual a lei atribui caráter unitário. Ex.: massa falida, herança.
Ex.: Bem singular = uma matéria prima, um pedaço de mármore.
Bem singular composto = um carro, porque é feito de várias matérias primas, várias partes
componentes (união material que não tem mais como separar) e várias partes integrantes
(pode separar, desmembrar e depois reagrupar, a roda por exemplo), mas todas elas estão
materialmente ligadas para formar um bem.
Universalidade de fato/ Bem coletivo = união de bens que não é material, é finalística
(rebanho, pinacoteca, biblioteca).
F1) Bens de produção (doutrina, não tá no CC): empregados na produção, na indústria, na
prestação de serviços (ex.: automóvel para o taxista).
F2) Bens de uso privado (doutrina, não tá no CC): bens de uso (ex.: moradia) e bens de
consumo (ex.: comida).
Confusão: uber, airbnb – moradia/carro utilizados como bem de produção, para
aluguel/prestação de serviço.
2. BENS RECIPROCAMENTE CONSIDERADOS:
A) Bens principais:
Existem sobre si, abstrata ou concretamente. Distinguem-se dos acessórios por sua
extensão, seu valor econômico, qualidade, funções. Ex.: solo em relação ao prédio, a arte em
relação ao material que a recepciona, juros em relação ao contrato.
A2) Bens acessórios:
Sua existência supõe a do principal. Essa dependência é estabelecida a) pela natureza
do bem, b) pela vontade humana ou c) pela lei. Diferentemente das partes integrantes e
componentes das coisas compostas, não se unem ao bem principal como uma só coisa.
Beviláqua – classificação dos bens acessórios:
Naturais: sem engenho humano. Ex.: frutos e produtos.
Industriais: com engenho humano. Ex.: benfeitorias
Civis: oriundos de relações jurídicas. Ex.: fiança em relação ao contrato de aluguel.
Obs.: princípio geral de que o acessório segue o principal, de que o direito sobre o principal se
extende para o acessório (exceto pertenças).
a) Frutos: produzidos naturalmente pelo bem sem desfalque de sua substância e
podem ser dele separados. Mesmo quando ainda não separados do bem principal, podem ser
objeto de negócio jurídico.
- Naturais (frutas, crias de animais); - Industriais (gerados com trabalho humano, pão); - Civis
(direitos, juros de mora).
Conforme relação com a coisa principal, os frutos são: - pendentes (unidos à coisa que
os produziu); - percebidos (já destacados da coisa principal); - percipiendos (deviam ter sido
colhidos, mas não foram); - consumidos (já utilizados).
b) Produtos: diferem dos frutos quanto à periodicidade e o desfalque da substância da
coisa. Ex.: minas e jazidas.
Obs.: Art. 1232, CC. Os frutos e mais produtos da coisa pertencem, ainda quando separados, ao seu
proprietário, salvo se, por preceito jurídico especial, couberem a outrem.
c) Benfeitorias: são obras realizadas pelo homem na estrutura da coisa principal, com
o propósito de conservá-la, melhorá-la ou embelezá-la.
Voluptuária: não aumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou
sejam de elevado valor (embelezam o bem). Ex.: obras de jardinagem.
Úteis: aumentam ou facilitam o uso do bem (melhoram o bem). Ex.: instalação de grandes
protetoras nas janelas.
Necessárias: têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore. Ex.: obras de reparação
de vazamentos.
d) Pertenças: incluídas entre os acessórios pelo novo CC.
Bens individualizados. Não há união material com o bem principal. Se destinam, de
modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro bem principal. Ex.:
móveis, aparelho de som de carro.
As pertenças não são abrangidas pelos negócios jurídicos que dizem respeito ao bem
principal, salvo se o contrário resultar da lei, da manifestação de vontade, ou das
circunstâncias do caso.
3. BENS CONSIDERADOS EM RELAÇÃO AOS SUJEITOS:
A1) Bens particulares: todos que não são públicos.
A2) Bens públicos: do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público
interno.
a) de uso comum do povo: destinados ao uso indistinto por qualquer pessoas. Ex.:
rios, mares, estradas, ruas e praças. Inalienáveis, enquanto conservam sua qualificação.
b) de uso especial: bens destinados a serviço ou estabelecimento da Administração. Ex.:
repartições públicas, museus. Inalienáveis, enquanto conservam sua qualificação.
c) dominicais: constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto
de direito pessoal ou real de cada uma dessas entidades. Ex.: terras devolutas. São alienáveis.
Obs.: consideram-se dominicais os bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito
público a que se tenha dado a estrutura de direito privado, não dispondo a lei em contrário.
O uso comum dos bens públicos pode ser gratuito ou retribuído, conforme for estabelecido
legalmente pela entidade a cuja administração pertencem.
Bens públicos: regra geral da inalienabilidade, imprescritibilidade e impenhorabilidade.
B1) Bens disponíveis e indisponíveis (comerciáveis e incomerciáveis):
O novo CC não repetiu essa classificação, de coisas fora do comércio, mas essa classificação
continua sendo importante, pois a doutrina aponta 3 categorias de bens inalienáveis:
a) naturalmente indisponíveis: insuscetíveis de apropriação (ex.: mar).
b) legalmente indisponíveis: bens públicos de uso comum e especial, direitos da
personalidade e vedações específicas (ex.: herança de pessoa viva).
c) indisponíveis por vontade humana – cláusulas de inalienabilidade
BEM DE FAMÍLIA – proteção constitucional do direito à moradia - Qualquer moradia?
Moradia luxuosa, excessivamente cara, fisicamente extrapoladora de uma moradia “mínima e
digna”? - Airbnb e outras questões. Lei 8.009/90 - Ver REsp 1.186.225-RS e outros julgados.
NOVOS BENS – espaço virtual – serviço gratuito? – contraprestação: dados do usuário?
Troca remunerada? – direitos do usuário? – titularidade do perfil no FB? => Dados, espaços
virtuais e tecnologia como bens jurídicos => direitos sobre páginas, perfis e seu acesso
- direito de propriedade – abrangência – coordenadas geográficas da propriedade –
endereço em ambiente de realidade aumentada – abuso de direito no ciberespaço X abuso de
direito de propriedade
BENS: conceitos que não têm uma aplicabilidade prática nesse atual momento, mas terão em
outras áreas, como a das obrigações (prestações que são inerentes aos direitos pessoais) –
essas prestações estão sujeitas a várias das classificações que vimos nos bens (obrigações
divisíveis e indivisíveis, obrigações fungíveis e infungíveis).
Ao longo do desenvolver das relações, as partes vão, muitas vezes, poder alterar várias
dessas classificações. Quando um objeto tem valor sentimental ele, que a prioristicamente era
fungível por ser substituível, se torna infungível.
Essas classificações não são estanques, vão precisar ser contextualizadas no âmbito
dos negócios.
Pertença: se, por exemplo, eu compro um carro. No contrato, se identifica o carro pelo
chassi, modelo, ano e placa (não precisa colocar que ele tem quatro rodas, um volante). Isso
porque o carro é um bem individual composto, ele é formado por uma série de partes
integrantes, que se reúnem finalística e materialmente para compor o objeto final. Eu nao
preciso especificar no meu contrato que o carro precisa vir com o motor, porque todas as
partes integrantes, assim como as componentes, fazem parte necessariamente daquele bem. Já
a pertença é um bem acessório. E, exatamente por ser um bem acessório que, nos termos do
art. 94 (“os negócios jurídicos que dizem respeito ao bem principal não abrangem as
pertenças, salvo se o contrário resultar da lei, da manifestação de vontade, ou das
circunstâncias do caso”) não necessariamente acompanha a sorte do principal, é que a
pertença precisa estar expressa, no sentido de que ela acompanha o destino do bem principal.
Ex.: compra-se um carro e, na hora da compra, o vendedor retirou o som de fábrica.
Está ou não cumprindo o contrato? A discussão é saber se o som é ou não pertença. Se o som
for parte integrante, ele faz parte do carro e, portanto, não precisa especificar no contrato.
Mas, se o som for pertença, há margem para discutir: como o som seria bem acessório e não
está especificado no contrato que ele acompanharia o carro, então eu estaria cumprindo o
contrato ao vender o carro sem som.
A ideia de parte integrante é importante até para a facilitação dos contratos. É por isso
que, ao comprar um carro, não precisa estar especificado no contrato que o carro vem com um
volante, um motor, 5 retrovisores, um banco. Se não vier com algum desses bens, já está claro
que o carro não está completo e o vendedor descumpriu o contrato. A discussão para saber se
o vendedor está cumprindo com suas obrigações envolve a noção de parte integrante.
Parte integrante compõe o bem, não precisa especificar. Pertença é bem
acessório e, pela regra do art. 94, não acompanha, via de regra, o bem principal. Então se o
comprador não toma essa providência de incluir no contrato aquele bem, ele corre o risco de
muitas vezes receber o bem sem o acessório.
Benfeitoria x Pertença: benfeitoria são consideradas obras que são necessárias, úteis ou
destinadas ao aformoseamento do bem. Normalmente, benfeitorias são vistas como uma obra,
acréscimo feito ao bem imóvel. Pertenças são acessórios de bens móveis.
Grande questão sobre pertença é saber se ela acompanha ou não a sorte do bem principal.
Bem acessório segue a sorte do principal, como regra. Pertença é exceção a essa regra
(pertença não necessariamente segue a sorte do principal). Pertença é um acessório, mas um
acessório específico (benfeitorias – muitas entendem como pertenças).
Parte integrante x parte componente
Parte componente: existe uma união material tal entre as partes que não há como separá-las.
Ex.: muro (é feito de uma série de partes mas, uma vez que uniu-se todas essas partes em um
todo, não há como desmembrar essas partes).
Parte integrante: consegue separar sem prejuízo do bem composto, no sentido de que se
consegue reagrupar depois. Ex.: carro (pode tirar banco, rodas, volante e depois reagrupá-las
posteriormente).
Essa noção é importante para possibilitar que possamos adquirir bens
compostos, como um carro, sem ter que especificar todas as partes integrantes dele.
Bens singulares compostos x universalidades de fato: bens como biblioteca, rebanho,
pinacoteca – não há união material entre esses bens, como existe entre as partes integrantes de
um carro; esses entes estão unidos unicamente por uma questão de finalidade, não há que se
falar em partes componentes ou partes integrantes. O que une aquela coletividade é a
destinação (amplia as possibilidades de negócios jurídicos).
Universalidade de direito: conjunto de relações jurídicas. Não se refere propriamente a bens.
Pode inclusive tem uma soma negativa. Patrimônio (é o conjunto de relações jurídicas
patrimoniais que ela tem) é um exemplo de universalidade de direito – quando alguém tem
patrimônio negativo é porque as dívidas dele superam os créditos que ele tem.
Estabelecimento comercial também é considerado universalidade de fato. Por isso se
fala que há venda de ponto, por exemplo.
Próprio código trata dos bens públicos.
Bens dominicais: eles não estão afetados a nenhuma finalidade de interesse publico e
por isso vão poder ser exercido pelo poder público em um regime muito semelhante a um
regime privado (semelhante porque sempre há parcial derrogação do regime de direito
privado por normas imperativas do direito público, entretanto, o poder publico pode dispor
com uma relativa margem de autonomia).
Bens sempre vão precisar ser contextualizados, de acordo com o tipo de negócio jurídico, a
intenção das partes, entre outras circunstâncias.
Ex.: uma lareira como benfeitoria em uma cidade do RS é útil. Uma lareira como
benfeitoria aqui em Brasília é voluptuária.
Diante de disputas possessórias, é fundamental saber qual o tipo de benfeitoria, unindo
também a saber se o consumidor estava ou não de boa fé para saber qual os direitos que ele
têm ao desocupar a terra que ele estava possuindo.
Coisas x bens:
Coisa pode ser menos ou mais restritivo que bem, a depender do conceito que se
adota. Se eu entendo coisa como tudo o que existe no universo e bem como aquilo que pode
ser objeto de uma relação jurídica, então o conceito de bem vai ser muito mais restritivo que o
de coisa. Porém, há autores que entendem bem como a expressão geral para designar qualquer
tipo de objeto de relações jurídicas (nesse caso, até a personalidade, comportamentos
humanos, bens imateriais como o meio ambiente, podem ser bens), e coisa como aqueles bens
corpóreos que, entre aqueles bens, são objetos dos direitos reais. Na terminologia do código,
coisa é expressão mais restritiva (as coisas são os objetos corpóreos que, entre aqueles bens,
podem ser objeto dos direitos reais).
NEGÓCIO JURÍDICO: visto como aquele ato jurídico em que a vontade importa tanto para
a sua constituição, como também para atribuição das consequências jurídicas a esse ato.
Essencialmente é o contrato (por isso que estudaremos os princípios gerais e a estrutura básica
dos contratos) – tema retomado em obrigações – que decorrem tanto de negócios jurídicos,
quanto de atos ilícitos e também da lei; e em direito dos contratos.
Essa expressão negócio jurídico é considerada hoje uma expressão superada por muitos
autores. É uma expressão que vem da Pandectística e decorre daquela preocupação conceitual
que caracterizava essa escola – a ideia do jurista alemão do séc. XIX era que, partindo do
pressuposto que é sempre bom ter conceitos amplos que englobam categorias menores,
negócio jurídico seria uma categoria ampla que envolveria: negócios jurídicos bilaterais
(como contratos, no qual há dois polos, acordo de vontades), negócios jurídicos unilaterais
(como testamentos) e algumas outras situações como o próprio casamento, que, no contexto
do séc. XIX, era visto como negócio jurídico.
Entretanto hoje, nosso olhar é mais pragmático. Mesmo situações como casamento,
que antes eram vistas como negócios jurídicos, hoje não são mais. Do ponto de vista
existencial, se fôssemos classificar o casamento em alguma dessas categorias, seria o ato
jurídico stricto sensu (pois a vontade das partes é muito importante para constituição do
vínculo conjugal, porém, a partir daí, todas as consequências do vínculo conjugal são pré-
determinadas pela lei, como o dever de fidelidade, não são as partes que irão discutir que
consequências decorrerão no plano existencial daquele vínculo). No que tange ao regime
patrimonial, já é diferente (nesse caso, o casamento se assemelha a um negócio jurídico, como
um contrato, porque aí as partes vão poder decidir o seu regime patrimonial, vão poder adotar
qualquer modelo previsto pela lei, como inclusive criar um modelo próprio – por meio do
princípio da atipicidade dos contratos, no qual as partes não estão vinculadas aos modelos
oferecidos pelo legislador, mas elas podem criar novos contratos).
Diversas situações que antes eram vistas como meros contratos, meros negócios
jurídicos, a exemplo do casamento, hoje não são mais. O próprio testamento, ainda que
possamos entendê-lo como um negócio jurídico unilateral, o fato de ele ser unilateral e estar
vinculado a questões sucessórias traz tantas peculiaridade que faz com que ele seja regido de
modo muito pormenorizado pela lei e dificilmente possamos compará-lo a um contrato como
outro qualquer. É por isso que, o que acaba sobrando, sendo o núcleo do negócio jurídico é
contrato, como negócio jurídico bilateral, porque viria de uma acordo de vontades.
Hoje, já se cogita de contrato de um só (sociedade unipessoal, por exemplo) ou
contrato plurilateral (como o contrato de uma sociedade; é como se 10 sócios tivessem uma
relação entre si, no qual 2 podem sair e da sociedade e 3 podem entrar, mantendo-se o
vínculo; há uma plurilateralidade de partes – é um contrato diferente pois, ao contrato do
contrato bilateral em que, normalmente, os interesses das partes são contrapostos, aqui todas
as partes querem a mesma coisa, não há contraposição, mas alinhamento de interesses).
Teoria clássica dos contratos: contrato seria acordo de duas ou mais partes para criar,
regular ou extinguir direito
Séc. XIX se caracteriza por um direito privado extremamente patrimonialista e
individualista, que tem na família, na propriedade e no contrato os seus três pilares
fundamentais. Se o direito do século XIX é por excelência o da propriedade, esse direito está
sempre acoplado ao contrato, pois é por meio do contrato que se transfere e adquire
propriedade. Relação propriedade e contrato é muito próxima, sendo ainda mais próxima
no séc. XIX, quando o contrato era visto essencialmente como instrumento de transferência
de riqueza. Hoje, contrato também é visto como instrumento de criação de riqueza, mas, no
séc. XIX, tem a função basicamente de transferência e circulação de riquezas (instrumento do
próprio regime de propriedade).
Para uma burguesia que luta contra o Estado Absolutista, exatamente contra todas as
interferências desse Estado na economia, era fundamental que, naquele contexto pós-
revoluções liberais, ela retirasse o Estado da atividade econômica. Mas retirar em partes,
porque em algumas partes o Estado precisava ficar, sendo que uma dessas partes é para
garantir o cumprimento obrigatório dos contratos. A atividade econômica da época
precisava de segurança e previsibilidade que só um direito racional poderia dar (posso até
contratar da forma mais ampla, posso até não querer a presença do Estado no momento em
que eu contrato, mas quando algo dá errado, aí sim eu quero a presença do Estado para
assegurar que aquela pessoa que não está cumprindo o contrato o faça; e quero a presença
extensa do Estado, até se valendo de medidas coercitivas).
Então, é basicamente em torno dessa preocupação que surge a teoria clássica dos
contratos quer afastar o Estado no que diz respeito aos pressupostos e ao conteúdo do
contrato, mas quer o Estado sempre que alguma coisa der errado, quer que o Estado com seu
poder de império, seu poder de polícia, possa assegurar o cumprimento dos contratos. Isso era
fundamental para a revolução liberal daquele momento: assegurar o pacta sunt servanda,
assegurar a força obrigatória dos contratos, inclusive por meio da utilização do Estado.
PRINCÍPIOS DO CONTRATO LIBERAL:
1) Autonomia da vontade e liberdade de contratar: eu contrato quando eu quero, com
quem eu quero, se eu quiser, da forma que eu quiser, e exatamente por isso eu sou obrigada a
cumprir o contrato.
Esse era o argumento dos grandes industriais quando contratavam pessoas por meio de
salários de fome, obrigando-as a trabalhar 16 horas, a um regime de trabalho subumano (ela tá
aqui porque ela quer, se ela não quiser há uma fila de pessoas querendo). Havia a ideia
ingênua de que a liberdade de contrato era absoluta, como se as pessoas não agissem por
necessidades, como se houvesse liberdade de contratar quando uma parte era muito mais forte
que a outra. Esse era o arcabouço fundamental do contrato no séc. XIX.
Por isso que hoje alguns autores não gostam de falar em autonomia da vontade, mas
em autonomia privada, por entenderem que a autonomia privada reforça também o aspecto de
responsabilidade, de aspectos funcionais daquela liberdade, como a função social do contrato,
que não mais possibilitam a compreensão da liberdade como algo absoluto, ilimitado. No
entanto, esse era o argumento predominante na época, mesmo que nunca tenha sido possível
direitos absolutos (mesmo no séc. XIX, por mais que houvesse toda aquela ideologia que
reforçava a importância de um direito absoluto, na prática, já havia vários exemplos que
mostravam que direitos precisavam ser limitados, como as regras de vizinhança. Ou seja,
mesmo em relação à propriedade já havia a ideia de limitação desse direito, o mesmo vale
para os contratos).
Apesar de se defender e ser a ideia predominante que o contrato está sujeito à
liberdade absoluta, mas os ordenamentos jurídicos, a começar pelo código napoleônico, já
impunham algumas limitações, como ordem pública, moral, bons costumes, algumas
vedações específicas (ex.: contrato de prostituição não era possível no séc. XIX pois se
entendia que ele violava a ordem pública, era considerado um contrato nulo, pois seu objeto
era juridicamente impossível – se houvesse uma liberdade de contratar tão ampla, não haveria
porquê se negar validade a um contrato desse). Só para ficar claro que esse grau absoluto de
liberdade de contratar nunca aconteceu, mas certamente a margem de liberdade era muito
maior que a que existe hoje.
Envolve também a atipicidade dos contratos = possibilidade que as partes têm de
criar novos contratos e novos arranjos, de acordo com sua criatividade. Desde que elas
respeitem as normas imperativas de ordem pública, elas não estão restritas aos modelos
legais.
Há os contratos tipificados (compra e vida, mandato), pois diante da sua
importância e reiterada utilização, o próprio legislador já entende que é melhor dar uma
moldura para aquele contrato, dizendo regras que são obrigatórias (as partes não podem abrir
mão) e, em muitos casos, prevendo regras dispositivas, que apenas prevalecerão se as partes
se omitirem ou não adotarem nenhuma solução (sobre as regras dispositivas, o legislador está
presente, vai dizer algo como “salvo disposição em contrário, o contrato não/vai poder isso e
aquilo”. Se o contrato for omisso, não mencionar, então aplica-se essas regras dispositivas).
As partes não são vinculadas ao modelos oferecidos pelo legislador, elas
podem criar os contratos atípicos, podem misturar modelos contratuais. Muitas vezes
primeiro o contrato é criado na prática e só depois o legislador corre atrás para tentar
disciplinar. Atipicidade dos contratos dá um grande dinamismo na vida social.
2) Princípio do consensualismo: basta o consenso para a formação do contrato. O contrato é
sim um ato de vontade, um acordo entre as partes, mas qualquer forma de manifestação do
consenso é válida para formação do contrato. Diferença entre manifestação de vontade
(piscada, levantar o dedo, silêncio) e declaração de vontade (espécie da manifestação; é
verbalizada, por meio de palavras escritas ou orais).
Exceção são os contratos aos quais a lei exige uma forma específica (alguns tipos de
transações imobiliárias, por exemplo). Em todos os demais contratos, qualquer manifestação
de vontade é suficiente e, portanto, somente quando a lei exigir uma forma especial como
requisito de validade do ato, é que não vale o princípio do consensualismo.
Ex.: apertar o botão do estacionamento do shopping é manifestação de vontade;
contrato eletrônico, por meio de um clique do mouse.
Isso não afasta a utilização da forma escrita como regra na maioria dos contratos, mas
não porque a forma escrita é requisito de validade do contrato, mas tão somente para efeito de
prova (contratos orais, de boca, são inseguros). Assinatura de testemunhas também.
3) Força obrigatória dos contratos: contrato é considerado lei entre as partes, a partir do
momento que as partes fixam uma obrigação, elas têm que cumprir - têm que cumprir por
bem ou por mal; ou elas cumprem espontaneamente ou eu chamo a força coercitiva do Estado
para assegurar o cumprimento daquela obrigação (prisão, medida restritiva de liberdade e
outros constrangimentos). Só mais recentemente é que vem se falar em impenhorabilidade do
bem de família, que não cabe prisão civil por dívida.
4) Eficácia relativa do contrato (princípio da relatividade): utilizado como grande fator de
distinção entre os direitos reais e os direitos obrigacionais, pois os direitos obrigacionais têm
como importantes fontes os contratos e o ato ilícito. Direitos reais são direitos, do ponto de
vista da eficácia subjetiva, erga omnes (toda a sociedade como titular), e os direitos
obrigacionais vinculam apenas partes determinadas ou determináveis, que se obrigam entre si
mediante comportamentos específicos, que são prestações. Essa é a razão do princípio da
relatividade = vínculo contratual apenas produz consequências jurídicas para as partes.
Isso, em princípio, é considerado óbvio e razoável pois, se somente as partes
consentiram, como é que um terceiro que não participou do vínculo, não manifestou sua
vontade, estará sujeito às consequências do contrato? Terceiro é visto sob uma perspectiva de
total isolamento em relação ao contrato. Contrato somente produz efeitos entre as partes
contratantes, em relação a terceiros eles não vai poder beneficiar e parte-se da premissa que
também jamais poderá prejudicar.
Hoje, já se vê que as coisas não são bem assim. Já se pode perceber uma grande
alteração no princípio da relatividade.
5) Justiça comutativa: há vários doutrinadores do séc. XIX que dizem que se é contratual é
justo. Se as próprias partes entenderam que aquele acordo de vontades é vantajoso para elas,
e elas não teriam celebrado aquele contrato se não fosse por meio da sua concordância, não
cabe a nenhum terceiro interferir nesse conteúdo contratual. Até porque a ideia que
predominava era igualdade formal. As partes, vistas pelo prisma da isonomia formal, a partir
do momento em que consentem com algum conteúdo contratual, estão vinculadas
obrigatoriamente a esse conteúdo. Não se questionava se o objeto da contratação dizia
respeito a um bem essencial, se havia assimetria entre as partes. O contrato era visto como
justo por si só. Não se admitia nenhuma forma de controle: se é contratual é justo. Se as duas
partes concordaram, não se discute que aquilo é o melhor pra elas.
Hoje já se admite que há uma margem de intervenção judicial nos contratos mas, por
trás dela, vai uma discussão muito complexa de saber se somente as partes sabem o que é bom
para elas.
restritas aos modelos contratuais, elas podem criar novos contratos, novos arranjos
contratuais que fogem dos modelos previstos pela lei. Desde que esses contratos não sejam
utilizados para burlar a legislação obrigatória (regras fundamentais para proteção dos
interesses do Estado, interesses difusos mais relevantes, interesses dos mais vulneráveis),
desde que esses limites sejam respeitados, as partes têm toda autonomia para criar novos
arranjados e novos modelos contratuais.
Consensualismo: autonomia privada é tão prestigiada que, em princípio, desde que a lei não
contenha regra em sentido contrário, as partes podem se utilizar de qualquer forma
para manifestar a sua vontade. Qualquer forma de manifestação do consenso é válida
(balançar a cabeça, apertar um botão). As partes normalmente se utilizam da forma escrita por
questões de segurança e prova. (obs.: diferença entre manifestação e declaração da vontade:
manifestação é mais ampla, declaração é sempre manifestação verbalizada, enquanto que a
manifestação pode ocorrer de várias formas, inclusive pelo silêncio).
CC, Art. 107. A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei
expressamente a exigir.
CC, Art. 111. O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for
necessária a declaração de vontade expressa.
Desde que a lei não diga que há necessidade de declaração da vontade expressa, o
silêncio é considerado sim manifestação de vontade. Tudo vai depender da situação de
confiança que pode decorrer daquele silêncio. Tudo depende da eficácia daquele silêncio,
dentro do contexto em que ele acontece, dentro dos usos e costumes, tudo depende da
possibilidade daquela situação de silêncio gerar uma situação de confiança. Se for possível a
geração dessa situação de confiança, o silêncio é sim considerado uma manifestação válida de
vontade, válida inclusive para estabelecimento de contratos mesmo diante do silêncio de uma
das partes.
Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que
visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a
trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.
Exceção expressa ao princípio do consensualismo: negócios que tenham por objeto
direitos reais e que tenham por valor uma soma superior a 30x o SM do país só podem ser
celebrados pela via da escritura pública. Aqui a forma é da substância do ato. Exatamente
porque a lei prevê como exceção, é que ela afasta a hipótese do consensualismo. Nesse caso,
vê-se que o legislador foi claro e que a escolha pela escritura pública não é uma mera questão
de prova, é uma questão de validade do negócio jurídico.
Proteção da confiança: Irrelevância da reserva mental. Art. 110. A manifestação de vontade subsiste
ainda que o seu autor haja feito a reserva mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário
tinha conhecimento.
Reserva mental é declarar o que eu não quero, é mentir, falsear. Eu estou
manifestando uma vontade sabendo que aquilo não corresponde ao que eu realmente quero. E
ela pode não querer por várias razões (ela pode estar brincando, pode ser uma mentirosa
compulsiva), tudo depende da boa-fé do destinatário. Se é claro que o que a pessoa está
falando não corresponde a sua vontade, se o destinatário tinha conhecimento, sabia que a
outra pessoa não queria aquilo que ela estava falando, não há que se cogitar em formação de
situação de confiança. Mas, caso não fique claro e seja possível a formação de situação de
confiança, então ele fica vinculado àquilo que ele manifestou, pouco importando se aquilo
correspondia ou não ao que ele queria. Desde que situações de confiança sejam geradas a
partir da manifestação da vontade, você responde por elas (usa-se o critério do homem
médio).
Isso torna a interpretação muito mais complexa, pois antes analisava-se a declaração e,
de certa forma, o argumento de que aquilo não correspondia à vontade era um argumento
exclusivo do declarante, pois jamais poderia entrar na cabeça dele para comprovar que ele
declarou aquilo que não queria. Agora, o Código inverte essa lógica: cuidado declarantes! As
suas manifestações de vontade vão ser julgadas não a partir do que você quer, mas a partir da
reação que ela causa nas demais pessoas. Se situações de confiança forem geradas a partir daí,
você estará vinculada a sua manifestação de vontade.
Importância da intenção: Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas
consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.
Artigo que deve ser interpretado de acordo com a boa-fé (art. 113). Por boa-fé, no que diz
respeito ao seu efeito interpretativo, entende-se teoria da confiança – boa-fé é,
essencialmente, proteger a confiança.
Aqui não houve uma mera reprodução do que havia no código anterior. Antes, se
falava que na declaração da vontade deve-se ater mais à intenção que ao sentido literal da
linguagem. Mesmo no contexto do código anterior, a doutrina e a jurisprudência nunca
entenderam que daquele dispositivo havia o acolhimento da teoria da vontade dos franceses.
Direito brasileiro sempre privilegiou a teoria da declaração, afastando a interpretação literal,
sem colocar a vontade de maneira absoluta e prioritária em relação à declaração Mas era fato
que o dispositivo dava margem a muitas interpretações, o que foi solucionado pelo art. 112.
Art. 112 não fala mais somente em intenção, mas fala em intenção consubstanciada na
declaração. Rompe-se com essa dicotomia entre declaração e vontade. Declaração é vontade
em movimento, vontade em ação. Entende-se a declaração pela intenção e a intenção pela
declaração. Por isso não é qualquer intenção, é intenção consubstanciada na declaração. Aqui,
o código procura trabalhar com uma perspectiva em que intenção e declaração são vistas de
maneira dinâmica, elas se interpenetram.
O que vale é intenção consubstanciada na declaração (interpenetração entre esses
dois vetores) e interpreta-se essa intenção consubstanciada na declaração a partir das
situações de confiança que dela decorrem. Teoria da confiança dá um fecho a todos esses
dispositivos que tratam de interpretação contratual.
Analisa-se a situação de confiança sempre a partir do destinatário. Quando se diz
“intenção consubstanciada na declaração” se quer dizer que a declaração deve, dentro do
possível, refletir a intenção – declaração é intenção é movimento. Agora, nem sempre é o
destinatário concreto, analisa-se a partir da ideia do destinatário como homem médio (numa
situação como essa, um homem de prudência média acreditaria e se sentiria numa situação de
confiança?).
Equidade: equidade não é bem uma cláusula geral, só pra mostrar que, em alguns momentos,
o código tem essa preocupação em introduzir elementos de justiça substantiva, mas que são
pontuais, em alguns casos somente.
Art. 114. Os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente.
Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a
interpretação mais favorável ao aderente.
Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a
direito resultante da natureza do negócio.
CLÁUSULAS GERAIS: tem a peculiaridade de serem, antes de tudo, normas abertas. Não
dizem como os juízes deverão julgar, mas dão diretrizes para que os juízes, com base nelas,
crie a norma para o caso concreto. Essas cláusulas sempre se interpenetram. Muitas vezes
nem mesmo a jurisprudência faz essas diferenciações entre as cláusulas, daí porque boa-fé
objetiva e função social normalmente são tratadas em conjunto.
1) FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO: alguns desdobramentos mais concretos:
reconhecimento do dever de contratar e proibição de abuso de direito nos contratos.
Reconhecimento do dever de contratar: função social envolve dimensão ativa, no
que diz respeito à imposição de deveres. Daí porque em alguns casos o legislador impõe o
dever de contratar. Algo regular diante da função social dos contatos.
Em alguns casos a parte tem dever de contratar. É algo semelhante àquela dimensão
social ativa da função social – imposição de um dever. Ex.: renovatória de aluguel – o
proprietário o obriga a ficar no contrato; direito do consumidor – toda oferta de um prestador
de bens/serviços é pro público, então a partir do momento que o consumidor chega e diz “eu
quero”, ele tem o dever de contratar, ele não pode te discriminar (dizer que não vai vender pra
você, ou dizer que vai vender por outro preço, a oferta é irrevogável).
Proibição do abuso de direito: assim como há o dever positivo, há também a
limitação do exercício da autonomia privada e das faculdades contratuais. Ex.: concessionária
de energia elétrica cortar a luz diante da inadimplência do usuário de 85 centavos. Discussão
sobre abuso de cláusulas contratuais. Havia um contrato que dizia que, diante da
inadimplência do usuário, a concessionária podia cortar a luz dele. Mas, o fato de existir uma
cláusula dizendo que ele genericamente pode fazer isso, quer dizer que ele pode utilizar essa
cláusula em qualquer situação? Abuso de direito envolve sempre exame qualitativo e
quantitativo (quais são as finalidades sociais e econômicas que justificam o exercício daquela
faculdade naquela ocasião? Diante dos meios que ele teria para exercer o seu direito, o meio
que ele escolheu é razoável? Há uma adequação entre meios e fins). Tudo o que vimos sobre
abuso de direito se aplica aqui.
Às vezes, algumas situações justificam algumas especificações, como a teoria do
adimplemento substancial: quando uma das partes já cumpriu substancialmente um contrato, a
outra parte não pode exercer contra ela faculdades sancionatórios extremamente restritivas,
como a busca e a apreensão, nem muitos menos colocar fim ao contrato. É um desdobramento
prático do juízo de proporcionalidade inerente ao abuso de direito. Ex.: pessoa quer comprar
um carro e pede um financiamento, ela tem posse direta do bem mas o proprietário é o
financiador. Se ela atrasa a prestação, como ela está usando um bem que a rigor não é dela, o
credor pode se utilizar da busca e apreensão. Supondo que o contrato tinha 48 prestações e o
devedor pagou somente 46 prestações, se tornando inadimplente, e o financiador entrou com a
busca e apreensão. Para situações como essa, foi criada a teoria do adimplemento substancial.
Portanto, se o devedor falhou as duas últimas prestações, resta ao financiador cobrar essas
prestações. É proporcional em uma situação como essa querer pôr fim a um contrato em que o
devedor pagou 46 das 40 prestações e pedir a busca e apreensão? Dificulta quando são 40, 36,
30 prestações. A questão é saber se pode considerar um contrato substancialmente cumprido.
Flexibilização do princípio da relatividade: Reconhecimento da eficácia da relação
contratual sobre terceiros. Hoje, diante da função social dos contratos, o princípio da
relatividade (contratos só produzem direitos e deveres entre as partes e não produzem efeitos
sobre terceiros) não é mais visto como algo absoluto. Viu-se que terceiros podem sim ter
deveres diante de contratos, como dever geral de abstenção diante de um contrato de cuja
existência se sabe ou de cuja existência se deveria saber. Outra possibilidade de função social
dos contratos é imaginar a possibilidade de terceiro se beneficiar de um contrato.
Simulação 25: terceiro ter um direito em relação a um contrato do qual ele não faz parte. Para
alguns, não se poderia ter admitido que a vítima entrasse com ação direto contra a seguradora,
ao invés de primeiro para o ofensor e só depois que entrasse a seguradora. É possível na fase
de execução, mas no processo de conhecimento se mantém o esquema (cabe a vítima ajuizar
contra o ofensor, o ofensor faz a denunciação à lide contra a seguradora). A peculiaridade é a
pessoa jurídica (ofensora) ter se dissolvido. Havia outras soluções ao invés de processar direto
a seguradora, como a desconsideração da personalidade jurídica.
Simulação 26: quais os limites da utilização da boa-fé objetiva na proteção da confiança?
Proteção à palavra dada, confiança e situação existencial relacionada à impenhorabilidade do
bem de família. Se o devedor não falasse nada não haveria discussão, pois a
impenhorabilidade do bem de família incidiria. Agora, há renúncia expressa, o que contrapõe
à má fé é a boa fé subjetiva. A boa-fé objetiva envolve cuidados que independem da intenção.
Daí porque, ainda que o devedor ao renunciar não estivesse de má fé, há bons fundamentos
para se dizer que ele não cumpriu a boa-fé objetiva. Vedação venire, as pessoas não podem se
voltar contra seus próprios fatos, lealdade envolve coerência, não posso falar A depois fazer
B, não posso uma hora fazer uma renúncia e depois querer dizer que a renúncia não fale.
Simulação 27: contrato cativo, essencial e assimétrico de longo prazo. Nos contratos
relacionais é importante que as partes tenham mecanismos para repactuar o contrato, pois
algumas coisas previstas há 35 anos talvez não funcionem mais para hoje. De um lado, não
pode haver aumento em relação à idade porque isso viola o estatuto do idoso por ser
discriminatório. De outro, o fator econômico relevante. Alguém tem que pagar essa conta: ou
a seguradora vai quebrar ou ela vai repassar sobre os mais jovens. Com base nisso que o STJ
reviu o primeiro entendimento e entendeu que um aumento compatível é válido, aumento só
não pode ser abusivo. Questão é saber qual percentual de aumento é razoável e a questão do
esclarecimento/informação.
ROTEIRO 11 PARTE 3
Como a temática dos negócios jurídicos é tratada na lei e como ela é tratada classicamente na
doutrina a partir de três planos (art. 106, CC): da existência, da validade e da eficácia.
1) Existência: o contrato existe? – contrato é acordo de vontades, então, para o contrato
existir, precisa-se de partes, que acordam em torno de um objeto e que vão se utilizar de uma
determinada forma sem a qual elas não conseguem manifestar o seu acordo (por ser oral,
silêncio, gestos, escrita...). Só que o contrato existir não é suficiente para o direito, contrato
precisa ainda ser válido.
2) Validade: qualifica juridicamente cada um dos três elementos de existência. Para que o
contrato exista, basta que haja duas partes. Para que ele exista e seja válido, ainda precisa que
essas partes sejam capazes.
Para que o contrato exista, qualquer objeto serve. Para que ele exista e seja válido,
ainda precisa de um objeto possível (fática e juridicamente), lícito e determinado ou
determinável. Agrega-se ao objeto uma série de requisitos sem os quais não há possibilidade
de um contrato do ponto de vista da validade.
Ex.: Impossibilidade fática seria, por exemplo, alguém vender terrenos em
saturno. Contrato de prostituição no século XIX. Entendia-se que haviam partes, um objeto e
uma forma (contrato existia). Mas não era válido, pois tinha um objeto ilícito.
Para que o contrato exista, qualquer forma serve. Para que ele tenha validade,
prevalece o princípio do consensualismo, mas consensualismo com exceções. Quando a lei
prevê expressamente a forma como sendo da substância do contrato, é porque ela é requisito
de validade. Na hipótese do art. 108 (“não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à
validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais
sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no país) a lei exige que certas
transações precisam ser feitas por meio da escritura pública, i.e., exceção ao princípio do
consensualismo e, portanto, a escritura pública é da substância do contrato, sendo requisito de
validade. Em todos os demais casos, a forma normalmente, em razão do princípio do
consensualismo, tem uma finalidade meramente probatória (pessoas se utilizam de uma forma
escrita tão somente para provar com maior segurança o que elas acordaram).
3) Eficácia: às vezes, o fato de um contrato existir e ser válido não quer dizer que ele é eficaz
desde já. Isso acontece pois o legislador trabalha com elementos acidentais, elementos como a
condição e o termo, que possibilitam que as partes possam “brincar” com a eficácia daquele
contrato.
Ex.: vou fazer uma doação de um carro popular para todos aqueles que concluírem o curso de
Direito na FD com SS em todas as disciplinas. Às vezes, as partes se utilizam disso para não
ter que aguardar um tempo, para estimular a cumprir determinadas condutas. Essa é a ideia
das condições e dos termos.
Condição é evento futuro e incerto. Condições e termos existem para ampliar as
alternativas da autonomia da vontade, i.e., é o fato de eu poder me utilizar de elementos
que possam modular a eficácia de um contrato, seja a eficácia inicial seja a final. No
plano da eficácia, já tendo passado do plano da validade, quero saber se aquele contrato não
está sujeito a elementos que, como o termo e a condição, vão poder modular a eficácia
daquele contrato, tanto a eficácia inicial como a final.
CC trata especificamente da representação (relacionada à capacidade): aquele que é
incapaz não pode exercer diretamente seus direitos e deveres, mas pode fazê-lo por meio de
seus representantes.
Existem dois tipos de representantes (falam em nome do representado, exercendo-a
sempre em nome do representado – por isso código impede conflito de interesses, por
exemplo): representantes legais (imposição que decorre da incapacidade – pais em relação
aos filhos, tutores e curadores em relação aos incapazes; obrigatória ) e representantes
contratuais (não tem a ver com a capacidade, mas com questões de praticidade – procuração;
facultativa). Regras gerais que tratam desses dois casos de representação. Por meio desses
dois tipos de representação, contratos são feitos a todo momento.
ROTEIRO 11 PARTE 4
Condições, termos e encargos vão modular a eficácia temporal dos contratos.
Esses elementos são chamados acidentais para enfatizar que eles não precisam acontecer
(ex.: do doação do carro, eu não precisaria colocar aquela condição, eu coloquei porque quis.
É um plus, uma forma que as partes têm de terem ainda mais recursos para exercerem sua
autonomia da vontade. Porém, a partir do momento em que elas optam por se utilizar desses
elementos, eles deixam de ser acidentais e passam a fazer parte essencial do contrato e vão ter
inúmeros desdobramentos.
Condições e termos são sempre eventos futuros. A diferença é que o nas condições o
termo futuro é incerto enquanto no termo o evento futuro é certo.
CONDIÇÃO: Art. 121. Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da
vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto.
Condição suspensiva: impede/suspende a eficácia imediata do contrato até sua
ocorrência.
Ex.: doar um carro quando e se concluir o curso de direito tirando SS em todas as
matérias. O contrato existe, pode ser válido, mas não é eficaz – sua eficácia está suspensa até
que ocorra a condição, se é que vai ocorrer.
Na maiorias dos casos de condição suspensiva, elas estão sujeitas a algum tipo de
modulação temporal. Ex.: se alguém mudar para Paris em até 5 anos – tem o elemento de
certeza, mas ele está modulado temporalmente de forma que eu sei que, se isso não acontecer
dentro de 5 anos, não acontecerá mais. Porém, a depender, a condição suspensiva pode
impedir a eficácia e tornar uma relação instável por toda uma vida. Ex.: doarei um carro se
concluir um doutorado em Harvard. Em tese, enquanto eu estiver viva, isso pode acontecer,
quando eu terminar o curso ou daqui há 30 anos.
Uma condição ilícita ou que já se sabe que não ocorrerá tira o elemento de incerteza que é
necessário para a condição. Se, quando aquela condição foi pensada, havia uma certeza de
que ela não ocorreria isso vai poder afetar o negócio. A ideia da condição é submeter o
contrato, seja do ponto de vista da suspensão, seja da resolução, a um elemento de incerteza
verdadeiro.
Grande parte da doutrina exige uma incerteza objetiva: incerteza que possa ser minimamente
apurada, que não apenas a partir dos juízos pessoais das partes. Até para evitar situações
como “vou doar esse carro se eu quiser” – é um elemento de incerteza que depende totalmente
do arbítrio de uma das partes.
Toda condição sempre é um ato de vontade. É isso que diferencia condição de um
requisito de validade. Mas esse elemento de vontade precisa estar lastreado a uma incerteza
que, por sua vez, precisa de um mínimo de objetividade e não pode ficar sujeita apenas ao
arbítrio das partes (≠ “vou doar esse carro se eu me mudar para Paris dentro de 5 anos).
Condição resolutiva: o contrato começa plenamente eficaz, mas se ela acontecer o contrato
deixa de ter eficácia imediatamente. Condição que resolve o contrato, põe fim à eficácia do
contrato. Na condição suspensiva, contrato não tem eficácia e pode nunca ter. Na condição
resolutiva, contrato já é eficaz desde o início, apenas se sabe que, acontecendo aquele evento
futuro e incerto, o contrato deixa de ter eficácia.
Condição suspensiva não possibilita aquisição de direitos, possibilita apenas, no máximo,
expectativas de direito, que vai dar alguns poderes jurídicos ao titular da expectativa, mas que
não dá pra ele qualquer tipo de direito. Na condição resolutiva, há aquisição de direito, que é
um direito resolúvel pois ele tem eficácia temporal condicionada a um evento futuro e incerto
(ex.: eu já doei o carro pra você, mas no momento da doação coloquei a condição resolutiva
de só tirar notas acima de ss – a pessoas adquire o direito de usufruir o bem, mas sabendo que
a eficácia temporal está condicionada a um evento futuro e incerto).
Art. 125. Subordinando-se a eficácia do negócio jurídico à condição suspensiva, enquanto esta se não
verificar, não se terá adquirido o direito, a que ele visa.
Art. 130. Ao titular do direito eventual, nos casos de condição suspensiva ou resolutiva, é permitido
praticar os atos destinados a conservá-lo.
Condição é evento futuro e incerto, que decorre da vontade (se decorre da vontade não é
requisito de validade), que tem que ter um parâmetro minimamente objetivo. Como o
legislador trata dessa questão: Art. 121. Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente
da vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto.
O que o ordenamento reconhece como condição: Art. 122. São lícitas, em geral, todas as condições
não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes; entre as condições defesas se incluem as que
privarem de todo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes aplica-se em
condições que não comprometem tanto a autonomia da vontade, então só retiram-se essas
condições e aproveita-se o resto do contrato. Importante pois: “as condições não admitidas no
ordenamento jurídico levam necessariamente à invalidade do negócio?” Não! Pela hipótese
do art. 124 a condição é tida como inexistente e salva-se o negócio jurídico. Somente nas
hipóteses dos arts. 122 e 123 é que não há como salvar o negócio jurídico.
Nesse art. 124 aplica-se o princípio da conservação dos negócios jurídicos: tentar
aproveitar, dentro do possível, o negócio jurídico. Para efeito de nulidades, se um contrato
tem uma parte que anula, mas que eu possa destacá-la para salvar o resto do contrato, é isso
que se deve ser feito.
Quando as partes se utilizam de uma condição elas estão sujeitando o seu contrato a um
elemento de incerteza. Exatamente por isso elas não podem interferir indevidamente nesse
elemento de incerteza ex.: vou doar um carro se você ganhar uma maratona, aí quando vejo
que você está quase ganhando vou e pulo em cima de você. Essa incerteza que caracteriza a
condição impede a malícia, impede que as partes dolosamente impeçam a ocorrência de uma
condição.
Art. 129. Reputa-se verificada, quanto aos efeitos jurídicos, a condição cujo implemento for
maliciosamente obstado pela parte a quem desfavorecer, considerando-se, ao contrário, não verificada a
condição maliciosamente levada a efeito por aquele a quem aproveita o seu implemento.
TERMO: O elemento fundamental da condição é a incerteza. No termo, o evento é futuro
mas é certo. O ideal seria que as partes, se possível, se utilizem de datas (termo certo).
Embora os termos sejam normalmente dados por lapsos temporais, a doutrina faz referência
também ao termo incerto ou relativo. O termo incerto é aquele evento futuro certo mas em
relação ao qual não tem como precisar quando exatamente ele ocorrerá (ex.: morte é termo).
O termo inicial não impede a aquisição do direito (ao contrário da condição suspensiva),
impede somente o exercício (Art. 131. O termo inicial suspende o exercício, mas não a aquisição do
direito).
Tanto no termo final, quanto na condição resolutiva, eu não tenho suspensão imediata da
eficácia do contrato, ele começa a ser eficaz desde já, só que essa eficácia está subordinada a
um evento futuro e incerto (no caso da condição resolutiva) ou a um evento futuro e certo (no
caso do termo final). Em ambos os casos, adquire-se o direito resolúvel, no sentido de que a
eficácia daquele direito até sujeita a um evento futuro (que pode ou não acontecer, no caso da
condição resolutiva, ou que certamente acontecerá, no caso do termo final).
No caso da condição suspensiva, tem suspensão de eficácia e há só expectativa de
direito, que pode inclusive nunca se confirmar.
Termo inicial é futuro e certo – não impede a aquisição do direito, mas impede o
exercício. Não há suspensão total da eficácia do contrato como há na condição suspensiva, há
só uma suspensão mais light do contrato, não chega a suspender a aquisição, só suspende o
exercício. Somente a condição suspensiva impede a aquisição de direito, jamais o termo
inicial – este impede tão somente o exercício.
Ex.: termo inicial – te dou um carro no dia 20 de fevereiro de 2017. Termo final – você pode
usar o meu carro até o dia 20 de fevereiro de 2017.
ENCARGO: É o ônus imposto a uma liberalidade com o fim de limitá-la. Nos chamados
atos de liberalidade (atos em que apenas uma das partes têm vantagens e a outra não –
doação e legados, por exemplo, que são ≠ de um contrato de compra e venda, onde ambos tem
vantagens e desvantagens; quem tem vantagem é o donatário ou quem se beneficia do
testamento, donatário economicamente tem a desvantagem). Questão é que nem sempre as
pessoas fazem essas liberalidades imbuídas de um total desprendimento, às vezes elas querem
vincular a liberalidade a uma pequena contraprestação por parte de quem está
recebendo. Pequena pois, se não houver desproporção entre o benefício e a contraprestação
não é liberalidade e nem encargo, é compra e venda.
Ex.: doar uma fortuna em troca de cuidar do cachorro.
O encargo não impede nem a aquisição nem um exercício do direito – ao contrário da
condição suspensiva, em que não adquire-se nada além da expectativa, e ao contrário do
termo inicial, em que já se adquire direito mas não pode exercê-lo, no encargo já se adquire
direito e já se pode exercê-lo, mas tem que cumprir o encargo. Caso haja descumprimento do
encargo, pode haver a revogação da liberdade, que é uma forma de se colocar fim à doação
diante desse descumprimento, mas não tem nada a ver com a validade nem com a eficácia (a
doação foi válida, foi eficaz de imediato, apenas o descumprimento do encargo faz com que a
partir daquele momento aquela doação seja revogada).
negócio seria realizado, embora por outro modo consequência do dolo acidental é perdas e danos,
não anulação!!!!!!!
Art. 147. Nos negócios jurídicos bilaterais, o silêncio intencional de uma das partes a respeito de fato ou
qualidade que a outra parte haja ignorado, constitui omissão dolosa, provando-se que sem ela o negócio não se
teria celebrado dolo por omissão (a contraparte sabe que a outra está errando e não fala nada).
Art. 148. Pode também ser anulado o negócio jurídico por dolo de terceiro, se a parte a quem aproveite dele
tivesse ou devesse ter conhecimento; em caso contrário, ainda que subsista o negócio jurídico, o terceiro
responderá por todas as perdas e danos da parte a quem ludibriou dolo não necessariamente precisa vir
da outra parte, pode vir de terceiro. Ex.: terceiro que me falou que esse castiçal era de prata
ou que o cavalo ela de raça, não foi o contratante. Tudo depende da boa-fé do contratante. Se
o contratante não está de boa fé (porque ele sabia ou deveria saber do dolo do terceiro), a
consequência é a mesma: anulação do negócio jurídico. Se o contratante estava agindo de
acordo com a boa-fé objetiva (nem sabia nem teria porque saber do dolo do terceiro), o
negócio é mantido, protegendo-se a boa-fé do contratante, mas a vítima do dolo tem ação de
perdas e danos contra o terceiro.
Art. 150. Se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo para anular o negócio, ou reclamar
indenização as duas estão agindo de maneira desleal, então o negócio fica do jeito que está e
são os desdobramentos de uma ameaça diante da pessoa x. Coação requer um exame atento
do caso concreto. Ameaças podem gerar impactos diferentes a depender do destinatário.
Art. 153. Não se considera coação a ameaça do exercício normal de um direito, nem o simples temor reverencial
diferenciação dos casos de “pressão” legítima e os casos de coação. Quando um credor diz
para o devedor “ou você paga a dívida ou eu vou te processar”, por mais que se possa ver isso
como uma ameaça, decorre na verdade do exercício regular de um direito, não é coação
(lembrar que coação é dano iminente e considerável (entendendo dano como prejuízo injusto;
credor exercer sua pretensão não causa prejuízo injusto, mas justo porque é legitimado).
Temor reverencial é atitude de respeito diante de autoridades, religiosas ou parentes (é o fato
de pessoas agirem na vida civil porque o pai disse “ou você faz isso ou eu paro de falar com
você”). Situações em que as pessoas fazem algo em razão de um temor ou respeito
normalmente são afastadas da ideia de coação.
Normalmente, a coação é considerada no momento da celebração do contrato, não ao
exercício de posições contratuais quando o contrato já existe.
Assim como o dolo, pode ser que a coação também venha de um terceiro, e não
necessariamente da parte contrária. A resposta é idêntica a resposta para o dolo: tudo
depende da boa-fé objetiva do outro contratante: se a outra parte estava agindo com boa-fé
objetiva (nem sabia e nem teria como saber da coação do terceiro), o negócio é mantido e a
vítima da coação vai ter perdas e danos contra o seu coator. Se a parte que se aproveita da
coação não está agindo conforme a boa-fé objetiva (sabia ou deveria saber), há anulação, sem
prejuízo de perdas e danos.
Art. 178. É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a anulação do negócio jurídico, contado: I - no
caso de coação, do dia em que ela cessar começa do dia em que a coação cessar, não da data da
realização do negócio, pois não seria exigível que ela pudesse agir antes da coação começar.
Esses três vícios são chamados de vícios de vontade e fica claro que eles têm esse nome pois,
nos dois primeiros casos (erro e dolo), há uma vontade equivocadamente formada por causa
de uma falsa representação da realidade; no terceiro caso (coação) há um divórcio total entre
vontade e manifestação – manifesta-se aquilo que eu não se quer diante de um temor do
coator. Em todas essas hipóteses, entende-se que não se está diante de manifestações
válidas de vontade, então há possibilidade de anularmos esses negócios jurídicos.
Além desses três vícios, o CC/2002 introduz outros dois defeitos/vícios que estão
relacionados a outros fatores que não têm a ver propriamente com uma equivocada
manifestação de vontade, mas sim a uma hipossuficiência de uma das partes, de uma
vulnerabilidade acentuada de uma das partes, que faz com que ela assuma uma obrigação
excessivamente onerosa ou desproporcional = ESTADO DE PERIGO.
Art. 156. Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de
salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume
obrigação excessivamente onerosa. § único. Tratando-se de pessoa não pertencente à família do
declarante, o juiz decidirá segundo as circunstâncias ex.: alguém tá num barco em naufrágio, para eu
te salvar faça esse contrato. Alguém que está num estado de perigo está numa posição de
manifesta vulnerabilidade, daí porque há um desequilíbrio. Só que não é um mero
desequilíbrio, é uma obrigação excessivamente onerosa, é um desequilíbrio evidente que
decorre da situação de absoluta vulnerabilidade na qual ela se encontra (não de um descuido).
Nessas circunstâncias estamos diante de uma situação que pode comprometer sim a validade
do negócio jurídico.
Lesão segue a mesma ideia. Os parágrafos do artigo que trata da lesão são aplicáveis
também ao estado de perigo. Aliás, até se pode ver a lesão como um gênero maior do qual o
estado de perigo é uma espécie, porque um dos requisitos da lesão também é a premente
necessidade (premente necessidade é mais amplo que se salvar, mas envolve essa).
Art. 157. Ocorre a LESÃO quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por
inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da
prestação oposta a mesma lógica do estado de perigo: não é qualquer desequilíbrio, é um
desequilíbrio excessivo, evidente, objetivo, que decorre de um desequilíbrio subjetivo (uma
das partes está em situação de manifesta vulnerabilidade e exatamente por isso ela se obriga a
essa prestação).
Desde os romanos já se preocupavam com a ideia de que uma parte mais forte pudesse
submeter outra a prestações excessivas ou desarrazoadas. O problema é que esse instituto da
lesão, que foi aplicado pelos romanos e permaneceu na idade média, é algo incompatível com
a ideia de pacta sunt servanda que permeia os contratos a partir do séc. XIX (contrato é uma
lei obrigatória entre as partes, se é contratual é justo, as partes são vistas a partir de isonomia
formal – se as partes consentiram, problema delas). Daí porque toda a ideia de lesão,
construída há tanto tempo, acabou sendo desconsiderada no séc. XIX.
Gradativamente, no Código brasileiro, é que algumas hipóteses específicas de lesão
foram sendo reconhecidas pelo ordenamento (juros sobre juros – anatocismo, usura). Direito
do consumidor, diante da vulnerabilidade do consumidor e do equilíbrio contratual, introduz-
se mais ainda a lesão. E, com o CC/2002, há a extensão da lesão até mesmo a contratos
paritários, mas com essas duas observações de que tem que ser um desequilíbrio evidente e
que decorre de uma situação específica de assimetria entre as partes.
§ 1o Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores vigentes ao tempo em que foi celebrado o
negócio jurídico saber se houve a desproporção no momento da contratação.
§ 2o Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte favorecida
concordar com a redução do proveito quais as consequências de um contrato com um grande
desequilíbrio? O judiciário só anula ou o juiz pode rever por ele mesmo esse desequilíbrio
contratual? Muito entendem por esse parágrafo que esse reexame depende da concordância
das partes. Ao juiz não cabe optar se ele vai anular ou rever, ele anula, ele apenas irá
reequilibrar esse contrato se as próprias partes concordarem com aquela solução. Se ele
pudesse intervir mesmo contra a vontade das partes, ele poderia adotar uma solução que
desagradasse ambas. Entretanto, em alguns casos, não se tem como anular o contrato no
sentido de as partes voltarem a como estavam antes (ex.: se houver lesão na compra e venda
de uma casa, desfaz-se o negócio, devolve-se a casa para o antigo proprietário e o preço para
o comprador. Mas e se for uma prestação de serviço não já como anular o contrato, ele há foi
cumprido. Por isso muitas vezes o juiz não tem outra alternativa senão intervir).
De acordo com a doutrina e a jurisprudência, as hipóteses dos § que constam da lesão
(art. 157), se aplicam ao art. 156 também (art. 156 não afirma as consequências do estado de
perigo).
Art. 157, § 2o Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte
favorecida concordar com a redução do proveito Uma solução usual desses defeitos é a anulação
desse negócio jurídico – as partes voltam ao seu estado anterior. Mas o §2˚ admite também a
conservação do negócio jurídico (alguns entendem como um princípio de que, quando for
possível, o melhor entendimento seria a manutenção do negócio jurídico). Então se uma das
partes concorda em reduzir a sua vantagem, se as próprias partes entendem espontaneamente
que pode haver uma redefinição do equilíbrio, essa seria a solução. Mas há muitos
doutrinadores brasileiros que entendem que aqui há uma faculdade das partes – elas podem
concordam ou não e, não concordando, o juiz deve anular o negócio jurídico (juiz não pode
tentar rever o equilíbrio do contrato sem a concordância das partes, sob pena de chegar-se a
uma situação em que ambas as partes discordam).
Mas, muitas vezes, a anulação dos negócio não interessa às partes. Ex.: contrato de
prestação de serviços no qual uma das partes já tenha pago a sua prestação; simulação do
plano de saúde. Precisa analisar o equilíbrio do contrato, as partes querem manter o contrato,
mas reajustando o equilíbrio. Nesses casos, a única solução disponível é mesmo a intervenção
judicial (mas isso não é regra). Em casos nos quais a anulação e o retorno das partes ao estado
anterior seja possível, o juiz desfaz o negócio. Mas, se a anulação não for possível, não cabe
ao juiz intervir sem a concordância das partes.
Mesmo para aqueles que entendem que há alguma similitude entre lesão e estado de perigo
com os vícios de vontade (erro, dolo e coação), que entendem que há a necessidade de um
dolo de aproveitamento, por exemplo, uma coisa é certa: a preocupação do legislador com o
equilíbrio contratual é muito importante, i.e., esses dois vícios tem uma diferença muito
marcante diante daqueles três vícios de vontade.
FRAUDE CONTRA CREDORES é o único vicio social que subsistiu no CC, já que o outro
vício social presente no CC/16 virou hipótese de nulidade.
O patrimônio do devedor é a garantia dos credores, motivo pelo qual ele não pode
abusivamente se desfazer dele.
A fraude contra credores é o negócio gratuito que é prejudicial aos credores por tornar o
devedor insolvente, agravar a insolvência ou tornar insuficiente garantia já concedida.
Porque é vício social? É um vício que tem a finalidade de proteger terceiros/ credores já
existentes (não os contratantes)! Ela tem uma razão de ser – há a ideia de que somente
pessoas que têm um patrimônio possam fazer atos de disposição patrimonial (doação, perdão
de dívidas) os credores poderão pleitear a anulação dos negócios do devedor por meio da
ação pauliana, a ser ajuizada contra o devedor, a pessoa que com ele celebrou negócio
jurídico fraudulento e terceiros adquirentes que hajam procedido de má-fé.
Ex.: tenho uma dívida com X e, antes da minha dívida vencer, resolvo doar todo o meu
patrimônio (que é a garantia do credor) para Y.
XXXXXXXXX +- 10min48seg
Remissão de dívidas não deixa de ser um ato de liberalidades – se eu estou perdoando meus
devedores, estou deixando de ter um acréscimo patrimonial legítimo, que poderia ser utilizado
para eu honrar os meus credores. É semelhante ao caso em que doa-se patrimônio. Em ambos
os casos, pratica-se liberalidades que comprometem o patrimônio do devedor e,
consequentemente, prejudica a capacidade de honrar compromissos anteriores.
Art. 158. Os negócios de transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já
insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores
quirografários, como lesivos dos seus direitos.
O ordenamento não está preocupação com a doação de bens em si, é com a
doação de bens ou prática de liberalidades estando insolvente (não tendo patrimônio para
honrar as dívidas já feitas) ou se tornando insolvente em razão disso. “Ainda quando o
ignore” – durante muito tempo, se entendeu que havia a necessidade de um elemento de dolo
na fraude contra credores, i.e., a pessoa já sabia o que ela estava fazendo. Hoje, aquele que
faz a liberalidade pode até não saber que eles está insolvente ou será reduzido à
insolvência, mas mesmo assim, se esta for a situação objetiva, é caso de fraude contra
credores. Legislador impõe uma espécie de dever geral de cuidado contra o patrimônio.
Considerando que hoje em dia as pessoas só respondem por suas dívidas com seu patrimônio
(não há mais castigos corporais, prisão por dívida), é fundamental que as pessoas ajam
legalmente – devedores, antes de fazer atos de disposição patrimonial, confiram se eles têm
realmente patrimônio para tanto. “Poderão ser anulados pelo credores quirografários, como
lesivos dos seus direitos” – credores ser garantia. Quando há garantias, os credores terão
outros recursos que não apenas o patrimônio do devedor. Por isso que a regra é da fraude
contra credores para apenas credores quirografários (apesar de haver exceções, uma delas já
está no §1˚).
Art. 158, § 1o Igual direito assiste aos credores cuja garantia se tornar insuficiente ex.: eu tenho uma dívida
com X e hipotequei minha casa. No entanto, houve um incêndio e a casa foi destruída. Antes,
a casa tinha valor suficiente pra pagar a dívida, depois houve fato superveniente e a casa
perdeu valor. O credor originário, para parte da dívida, se equipara a um credor quirografário,
pois, mesmo que ele execute aquele bem, o valor da execução, em razão da perda de valor
pelo incêndio, vai ser insuficiente para o pagamento da dívida e, portanto, ele vai ter que
contar com o patrimônio do devedor para pagar o resto da dívida. Fraude contra credores que,
em princípio, só protegeria o credor quirografário, na hipótese desse § protege também o
credor com garantias, mas garantias que se tornaram insuficientes.
Art. 158, § 2o Só os credores que já o eram ao tempo daqueles atos podem pleitear a anulação deles a ideia da
fraude contra credores é proteger credores que já o eram antes da liberalidade (não faz
sentido proteger o credor depois da liberalidade, porque aí já é ônus do credor apurar qual é o
patrimônio do seu devedor.
Ex.: João me empresta dinheiro porque ele sabe que eu tenho uma casa x (ele me
emprestou porque sabe que eu tenho patrimônio pra pagar). Se eu transfiro esse patrimônio
para Maria, estou frustrando as expectativas de um credor cuidadoso. Agora, imagina-se o
exemplo contrário. Antes de adquirir o empréstimo eu doei a casa para Maria e mesmo assim
João me emprestou. Não faz sentido proteger o credor em uma situação como essa, porque
quando o credor fez o empréstimo ele já sabia que eu não tinha mais patrimônio, não houve
fator surpresa.
Art. 159. Serão igualmente anuláveis os contratos onerosos do devedor insolvente, quando a insolvência for
notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro contratante alarga a possibilidade de fraude
contra credores, admitindo que ela possa ocorrer mesmo no caso de contratos onerosos (uma
compra e venda, por exemplo, não precisa ser mais liberalidade). Muitas vezes, em situação
de insolvência, a pessoa quer queimar bens concretos para ficar com o dinheiro (dinheiro é
mais fácil de ocultar). É exatamente esse tipo de situação que o legislador quer evitar. O foco
da fraude contra os credores são as liberalidades, pois aquele que está recebendo doação, caso
o contrato seja anulado, em tese ele não será prejudicado (só vai deixar de ter um acréscimo
material). Agora, nos casos dos contratos de compra e venda, há um dever de cuidado que o
legislador impõe para aqueles que estão fazendo negócio jurídico com devedor insolvente,
porque certamente ele já tem débitos pendentes e aquele patrimônio dele (?).
Art. 160. Se o adquirente dos bens do devedor insolvente ainda não tiver pago o preço e este for,
aproximadamente, o corrente, desobrigar-se-á depositando-o em juízo, com a citação de todos os interessados.
Parágrafo único. Se inferior, o adquirente, para conservar os bens, poderá depositar o preço que lhes corresponda
ao valor real assegurar que o valor daquela transação não vá para as mãos do devedor e os
credores fiquem a ver navios. Se ele deposita em juízo, aquele próprio depósito é uma
garantia contra os credores.
A fraude contra credores continua sendo um importante instituto que mostra que terceiros tem
de ficar atentos a contratos que possam prejudicar outros credores. O foco se dá em
liberalidades, porque ali há a ideia de que ninguém pode se aproveitar de uma situação em
que já existe um credor anterior. Art. 158 nao exige o dolo, nem por parte de quem está
praticando a liberalidade, nem por parte de quem está recebendo. Criar um parâmetro de
cuidado do patrimônio.
INVALIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO
Invalidade, no termo geral, abrange pelo menos duas espécies: nulidades e anulabilidades.
Antes do CC/2002, alguns ainda trabalhavam com uma terceira hipótese – negócios
inexistentes. Seria para aqueles casos de vícios absurdos (exemplo da violência direta, vício
tão grave que leva à inexistência do contrato).
Hoje, no entanto, do ponto de vista pragmático, não há mais a necessidade de se
utilizar dessa categoria da inexistência, pois: a diferença essencial entre atos nulos e anuláveis
de acordo com o CC/1916 era o prazo para desfazer esses negócios (que era um prazo curto
para as anulabilidades e um prazo maior para a nulidades). No caso da inexistência, recorria-
se a ela para dizer que havia vícios tão graves que o tempo jamais poderia convalidá-los (não
importava quantos anos se passassem, aquele negócio sempre poderia ser rediscutido para
efeito de se declarar a inexistência daquele negócio. Hoje, essa discussão deixou de ter
utilidade prática pois o critério que o CC/2002 adotou para distinguir nulidade de
anulabilidade é que: em se tratando de nulidade não é possível a convalidação (nem mesmo
pelo tempo), e a anulabilidade pode ser convalidada (de diferentes maneiras, inclusive pelo
tempo). Ou seja, aquilo que se buscava pela inexistência, hoje já se resolve pelos atos nulos.
Claro que nulidades, como vícios mais graves, precisam de uma resposta mais dura do
ordenamento, mas será que faz sentido dizer que algo não pode ser convalidado jamais pelo
tempo?
Ex.: Meu pai faz um contrato de herança hoje, daqui a 60 anos alguém questiona a
nulidade desse contrato. Há uma dificuldade com atos que não se convalidam com o tempo,
desconsiderar o passado pode ser muito complicado. Porém, não foi assim que o legislador
pensou, embora não tenhamos tido tempo suficiente para questionamentos, já que o CC é
recente.
As NULIDADES dizem respeito a interesses sociais, por isso que quando são violados, a
gravidade do vício é maior. Por isso que várias pessoas vão poder alegar a nulidade que
não apenas as partes (como o MP), por isso que o juiz vai poder reconhecer de ofício esse
problema, por isso que não há possibilidade de convalidação. Já nas ANULABILIDADES
o que está em jogo são interesses privados, por isso que, em princípio, somente as partes
vão poder alegar o vício, por isso que o juiz não vai poder reconhecer de ofício aquele
problema (ele tem que ser provocado para tal), por isso que o ordenamento admite a
convalidação de diversas formas (pelo menos três formas de convalidação de um negócio
jurídico anulável, o que não acontece diante de um negócio jurídico nulo).
Basicamente, os casos de NULIDADE são aqueles de violação dos requisitos de validade
obrigatória do negócio jurídico: Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:
I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz menores de 16 anos.
II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto viola os requisitos de validade do objeto
III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;
IV - não revestir a forma prescrita em lei nas hipóteses de exceção ao princípio do consensualismo, a forma é da
substância do ato (é requisito de validade).
V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;
VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa;
VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.
Todas essas hipóteses dizem respeito a vícios tão graves que o ordenamento entende
que a consequência é a nulidade, e a regra da nulidade é não apenas o desfazimento do
negócio, como a ausência de preservação de qualquer efeito daquele negócio.
As hipóteses de ANULABILIDADES: Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é
anulável o negócio jurídico:
I - por incapacidade relativa do agente;
II - por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores.
Esses vícios são causas de anulabilidade. Por mais que eles possam levar à anulação
do negócio jurídico, eles não necessariamente levarão à anulação. Eles poderão ser
convalidados.
ideia é de que negócio jurídico simulado é sempre nulo. No caso da simulação absoluta
(lavagem de dinheiro), declara-se a nulidade do negócio e não sobra nada. No caso de
simulação relativa, declara-se a nulidade do negócio simulado e mantém-se o negócio
dissimulado, que é verdadeiro e aconteceu (exemplo da transação imobiliária: o que é nulo é
a escritura com valor aquém do valor efetivo, mantém-se o valor real e todos os tributos
recaem sobre esse valor real).
Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério
Público, quando lhe couber intervir. § único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer
do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a
requerimento das partes a nulidade é um vício tão grave que vai poder ser alegado não apenas
pelos contratantes, pode ser reconhecido por iniciativa própria do juiz (ao contrário das
anulabilidades).
Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo
confirmação é uma forma de convalidação de um negócio anulável e não é admitido para
casos de nulidade. Negócio jurídico nulo não se convalida pelo tempo. No CC/16, se aplicava
por analogia ao negócio jurídico nulo o maior prazo prescricional do sistema anterior, que era
de 20 anos. Hoje, isso não mais acontece – negócio jurídico nulo pode ser questionado depois
de qualquer tempo. Atos nulos não se convalidam (inovação, pois o antigo CC era omisso).
Art. 182. Anulado o negócio jurídico, restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se achavam, e, não
sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente a regra seria restituição das partes, mas
é difícil voltar as partes ao estado anterior, por isso muitas vezes a única solução é
indenização.
Art. 172. O negócio anulável pode ser confirmado pelas partes, salvo direito de terceiro.
Art. 173. O ato de confirmação deve conter a substância do negócio celebrado e a vontade expressa de mantê-lo.
Art. 174. É escusada a confirmação expressa, quando o negócio já foi cumprido em parte pelo devedor, ciente do
vício que o inquinava.
Art. 175. A confirmação expressa, ou a execução voluntária de negócio anulável, nos termos dos arts. 172 a 174,
importa a extinção de todas as ações, ou exceções, de que contra ele dispusesse o devedor.
A confirmação é a manifestação de vontade de que se quer manter o negócio mesmo
ciente do vício no negócio jurídico (ex.: houve dolo, comprei um cachorro achando que era
de raça, mas depois eu me apaixonei pelo cachorro e mesmo sabendo que ele era vira-lata eu
quero ficar com ele – confirma-se aquele ato). Manifesta-se novamente a vontade dizendo
que, mesmo sabendo do vício, quer se manter o negócio jurídico. Isso é possível pois a
anulabilidade diz respeito à vontade particular das partes, então o legislador acha que é
razoável que as partes possam ter esse grau de autonomia – o que ela não pode ser é obrigada
a se manter em um contrato viciado se ela não quiser, mas se ela quiser é justo e razoável que
ela possa confirmar. Na confirmação há o mesmo negócio jurídico (como se as partes
dissessem eu sei do vício e eu quero mesmo assim).
Art. 184. Respeitada a intenção das partes, a invalidade parcial de um negócio jurídico não o prejudicará na parte
válida, se esta for separável; a invalidade da obrigação principal implica a das obrigações acessórias, mas a
destas não induz a da obrigação principal há situação em que o problema não é no contrato como
de vontade, ainda que ratificando a anterior. Mas isso não precisa acontecer necessariamente
(exemplo da compra do cachorro vira-lata achando que era de raça em prestações; ciente do
vício, continua pagando as prestações). Confirmação tanto pode ser expressa, quanto tácita.
Art. 178. É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a anulação do negócio jurídico, contado: I - no
caso de coação, do dia em que ela cessar; II - no de erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo ou lesão,
do dia em que se realizou o negócio jurídico; III - no de atos de incapazes, do dia em que cessar a incapacidade
Ainda há um terceira forma de convalidação de anulação, que é pelo tempo. Há um prazo
decadencial de 4 anos para anulação, se a parte nada fizer nesses 4 anos e a consequência é
a perda do próprio direito.
Art. 177. A anulabilidade não tem efeito antes de julgada por sentença, nem se pronuncia de ofício; só os
interessados a podem alegar, e aproveita exclusivamente aos que a alegarem, salvo o caso de solidariedade ou
indivisibilidade anulabilidades não podem ser reconhecidas de ofício e só podem ser
invocadas pelas partes. Ao contrários das nulidades que são reconhecidas de ofício,
podem ser invocadas pelo MP, pois aqui há interesses sociais importantes.
Art. 179. Quando a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem estabelecer prazo para pleitear-se a
anulação, será este de dois anos, a contar da data da conclusão do ato regra geral de prazo geral de
objetiva.
É uma conduta humana, que tanto pode ser comissiva como omissiva, mas será
culposa (negligência e imprudência = culpa).
Pressuposto do ato ilícito é a violação de um direito (= prejuízo injusto). Precisa violar
direito e causar dano - somente violando um direito ou uma situação jurídica relevante digna
de tutela é que se causa dano. “Causar dano” introduz o NC.
Durante muito tempo, se entendeu que o pressuposto dessa responsabilidade
era a violação de direitos absolutos do ponto de vista da eficácia subjetiva (direitos reais ou
direitos de personalidade). Hoje, a responsabilidade civil está se alargando para buscar
também compreender na definição de direito algumas outras categorias (situações jurídicas
que não se enquadrem na categoria de direitos absolutos poderiam justificam também a
existência de uma ilicitude e consequentemente sua responsabilidade).
Pode ser dano a outrem, ainda que exclusivamente moral – essa ressalva não existia no
CC/16. Deixa claro que é qualquer tipo de dano.
Resumindo: ATO ILÍCITO é essencialmente uma conduta comissiva ou omissiva culposa
lato senso (dolo + culpa ss), que causa dano (visto como prejuízo injusto, e injusto porque
decorre da violação de um direito ou de uma situação jurídica suscetível de tutela por parte da
vítima). Se esses fatores estão presente, então há a aplicação do art. 186.
Sobre a culpa: Perspectiva mais clássica = parâmetros subjetivos (cognoscibilidade,
previsibilidade e evitabilidade do dano) vs. Perspectiva mais recente = parâmetros objetivos,
como o desvio de finalidade. Pergunta: aquela conduta é reprovável? Se sim, ela é ilícita e
culpável. Mas, não basta que a conduta seja reprovável, precisa que haja dano.
Sobre o dano: Basta que a conduta seja reprovável? Não. É preciso o dano. Para a
responsabilidade civil, o dano é fundamental. Mas, a necessidade de dano não é pacífica. Há
uma discussão hoje sobre responsabilidade civil sem dano, i.e., utilização da responsabilidade
civil com funções preventivas e punitivas para punir condutas consideradas intoleráveis,
mesmo que daquelas condutas não decorra nenhum dano. Além disso, danos existem de
diversas maneiras: danos concretos já verificados; danos emergentes (que ainda não
ocorreram, mas ocorrerão); lucros cessantes (o que a pessoa deixou de lucrar); danos morais –
dificuldade sobre o que é o dano e como quantificá-lo.
Daí a importância do nexo causal: é ele que, no mínimo, 1) une o ofensor ao dano e 2)
delimita o próprio dano. Quando se fala em causalidade, não se fala em uma causalidade
naturalística, mas em um juízo de imputação. Vale a teoria do dano direto imediato = somente
o dano que decorre direta e imediatamente daquela ação ou omissão é que será indenizado.
NC será fundamental também para se delimitar o próprio dano (ex.: se alguém esbarra em
alguém, mas esse alguém tem uma doença que só de triscar já quebra o osso. Será que se
imputa o dano maior àquela conduta? Dá pra se dizer que decorre direta e imediatamente da
conduta?). Essa teoria vincula o ofensor a determina conduta e a uma determina extensão de
danos.
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os
limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes prevê uma outra
espécie de ato ilícito, que é o abuso de direito, acolhendo a ideia de desvio de finalidade.
Desvio de finalidade, boa-fé e bons costumes como parâmetros para a avaliar se o
exercício de um direito pode ser considerado ato ilícito.
Desvio de direito x ato ilícito comum: o abuso tem um falso acento em direito, aquela
conduta a prioristicamente poderia ser vista como o exercício de um direito (muitas vezes é
uma questão de intensidade, de finalidade que transforma em abuso).
Art. 188. Não constituem atos ilícitos: I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um
direito reconhecido; II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover
perigo iminente. § único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem
absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo excludentes
de ilicitude.
Não constituem atos ilícitos: legítima defesa ou exercício regular e proporcional de um
direito; perigo eminente (alguns entendem que também o consentimento da vítima é uma
excludente de ilicitude).
Além das excludentes de ilicitude, poderão ser aplicadas aos atos ilícitos também as
excludentes de responsabilidade, que já existem mesmo em se tratando de responsabilidade
objetiva. Caso fortuito ou força maior, culpa exclusiva de terceiro ou culpa exclusiva da
vítima. Caso de culpa concorrente da vítima não exclui a responsabilidade, só atenua o
quantum da responsabilização.
ser reconhecida de ofício pelo juiz (assim como as nulidades, porque há conexão com o
interesse público).
Seções II e III. Das Causas que Impedem ou Suspendem a Prescrição e Das Causas que
Interrompem a Prescrição:
Quando o titular do direito não exerce pretensão dentro do prazo, considera-se que há
concordância do titular do direito com a própria violação daquele direito. Ha situações em que
não é exigível que uma pessoa exerça pretensão:
Art. 197. Não corre a prescrição:
I - entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal enquanto perdurar a sociedade conjugal, a prescrição
não corre.
II - entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar;
III - entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela.
Aqui há relações de afeto, assim não poderia ocorrer a pretensão; uma vez que
extingue a sociedade conjugal, por exemplo, aí sim pode (divórcio).
Art. 198. Também não corre a prescrição:
I - contra os incapazes de que trata o art. 3o;
II - contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos Municípios;
III - contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de guerra.
Também pessoas que estão em uma situação na qual não é razoável que exerçam
pretensão. Essas pessoas, ao nao exerceram pretensão é porque estão em situação que
impossibilita ou dificulta sobremaneira o exercício dessa pretensão.
Pretensão: Continua sendo um direito, só que enfraquecido, não pode exercer pretensão, mas
o devedor é respaldado pelo direito caso ele queira cumprir.
Causas de suspensão da prescrição: podem ocorrer reiteradas vezes, o que acaba muitas
vezes estendendo muito o prazo prescricional. Causas podem ser cumulativas. Prazos
prescricionais estão sujeitos a fatores de suspensão ou interrupção.
A peculiaridade da suspensão: podem existir várias suspensões e sempre se aproveita o
prazo já escoado. (ex.: há um prazo prescricional de 3 anos – acidente ocorreu em março/13,
as duas pessoas se casam em março/14, suspende tendo corrido 1 ano; divórcio em março/15
= volta a correr o prazo prescricional, faltando os 2 anos; se um dos ex-cônjuges vai morar no
exterior, suspende o prazo prescricional de novo).
Causas de interrupção da prescrição: há condutas importantes, seja condutas do titular do
direito ou do dever, que o legislador consideram que importam para efeito de contagem. Na
interrupção só pode haver 1 (suspensão pode haver várias).
Art. 202. A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á:
V - por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;
VI - por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo devedor.
§ único. A prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do último ato do
processo para a interromper.
Ao contrário da suspensão, só pode ocorrer uma vez e ela desconsidera o prazo que
já foi escoado (suspensão sempre leva em consideração esse prazo que já foi escoado).
Suspensão pode ocorrer várias vezes e sempre se aproveita o prazo, situações em que é
razoável a passividade do sujeito.
Interrupção: Condutas do titular do direito ou do dever que são consideradas relevantes para
efeitos de interromper o prazo – quando o prazo volta a correr ele volta integralmente.
Decadência convencional: prazos para que uma e outra possa exercer direitos potestativos do
contrato; decorrem da vontade das partes. Lei autoriza a renúncia nesses casos.
Art. 210. Deve o juiz, de ofício, conhecer da decadência, quando estabelecida por lei também
é considera da matéria de ordem pública e por isso pode ser reconhecida de ofício.
Decadência/
Dos Prazos da Prescrição: Arts. 205 a 210
Violado o direito surge para o titular do direito a pretensão, mas, as vezes, a jurisprudência
possibilita flexibilidade na contagem desses prazos.