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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE EDUCAÇÃO E HUMANIDADES

INSTITUTO DE PSICOLOGIA

CURSO DE GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

ANGÉLICA DA GRAÇA FRANÇA, ANDERSON GUIMARÃES, HERIBERTO


SILVA, FLÁVIA DOS SANTOS DE LACERDA, ROBERTA PESTANA

ANÁLISE GLOBAL – MÉDICO NEFROLOGISTA

Análise Global entregue à disciplina de


Psicologia do Trabalho e Organizacional I
com ênfase no trabalho ministrada pela
professora Kátia Santorum, do curso de
graduação em Psicologia, da Universidade
do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

RIO DE JANEIRO - RJ
NOVEMBRO/2016
Introdução

Este trabalho tem como objetivo realizar uma análise global do trabalho escolhido -
médico nefrologista do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF). Para
tal, fez-se necessário uma busca histórica dos elementos que compõem o objeto de
análise selecionado: a profissão médico, a especialidade nefrologia e o local em que o
profissional escolhido exerce sua atividade. Foi realizada uma entrevista com a médica
nefrologista Nathalia da Fonseca Pestana, concursada no HUCFF, gerando dados que
foram utilizados nessa análise global.

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A profissão de médico adquiriu prestígio e destaque na sociedade,
principalmente após a consolidação da área no campo científico. Nos anos iniciais da
profissão, na época do império Romano, os médicos eram escravos e a ocupação era
considerada inferior. Na França, até meados do século XX, os médicos eram pobres e
poucos alcançavam prestígio na profissão. Aqui no Brasil, os primeiros médicos eram
judeus ou cristãos novos, eles andavam pelas vilas em busca de clientela e eram
serviçais. A partir do início do século XX, com o desenvolvimento científico é que a
profissão de médico adquiriu poder e privilégio (MACHADO, 1997).

A partir da década de quarenta, aqui no Brasil cresceu a influência hereditária na


profissão, o aumento de médicos cujos pais ou avós também pertenciam à profissão,
fortalecendo a origem artesanal da medicina. Nas últimas décadas é possível observar
uma crescente melhora no poder aquisitivo da profissão e o grande interesse das
famílias de classes privilegiadas na inserção dos filhos no mercado da medicina
(MACHADO, 1997).

O curso de medicina é dispendioso e mesmo em faculdades públicas, que


oferecem gratuidade no ensino, alguns pontos limitam a entrada da população pobre na
área: o material é caro, o curso é integral e a concorrência é gigantesca. Então, mesmo
na rede do SUS, a maioria dos profissionais que trabalham na área de medicina é
originária de classes sociais privilegiadas.

A especialidade médica em nefrologia se dedicada ao diagnóstico e tratamento


das doenças do sistema urinário, principalmente as doenças relacionadas aos rins. O
médico especializado no tratamento e diagnóstico dessas doenças chama-se médico
nefrologista. No Brasil, o tempo para formar um nefrologista é de 10 anos de estudo (6
anos do curso médico, 2 anos de residência ou estágio em clínica médica e mais 2 anos
de residência ou estágio em nefrologia) (BRASIL, 2016).

Entre as diversas atividades de um médico nefrologista, pode-se destacar:


prevenção de doenças renais; diagnóstico e tratamento de hipertensão arterial (pressão
alta); diagnóstico e tratamento de infecções urinárias; diagnóstico e tratamento de
nefrites; diagnóstico e tratamento de litíase renal (pedra nos rins); diagnóstico e
tratamento de doenças renais císticas; diagnóstico e tratamento da doença renal crônica;

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diagnóstico e tratamento da lesão renal aguda; hemodiálise; diálise peritoneal;
transplante renal (BRASIL, 2016).

Pela análise da história da nefrologia no Brasil, é possível observar o surgimento


da Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN) em dois de agosto de 1960. Gregório
(2000) relata que nessa data vários nefrologistas de São Paulo e de outros Estados
brasileiros fundaram a SBN numa época em que os especialistas não chegavam a 120
em todo o país. Fundada com o objetivo de reunir os especialistas para a troca de
experiências e, principalmente, contribuir para a formação de novos profissionais, a
SBN vem promovendo não apenas atividades científicas, mas também difundindo a
importância da especialidade e de seus profissionais.

Segundo Gregório (1996), ao longo dos anos os serviços de nefrologia


espalhados pelo país vêm evoluindo e aperfeiçoando os atendimentos e as equipes
médicas e de apoio.

A região Norte foi pioneira no tratamento dialítico. Em Belém, no ano de 1978,


foi inaugurada a Nefroclínica que tinha instalações e equipamentos modernos e só
atendia pacientes particulares, porém com o passar do tempo, a clínica passou a atender
basicamente pacientes do SUS. O médico fundador da clínica, doutor Edinaldo Lobato,
realizou treinamentos, pois poucos médicos sabiam manusear os equipamentos.
Segundo ele, quando a clínica foi inaugurada dispunha de equipamentos bons, mas na
época do artigo trabalhava com equipamentos ultrapassados. Já em Piauí, a Clinefro,
inaugurada em 1982 com ótimo nível de funcionalidade e de conforto, serviu de
referência para os outros serviços que se instalaram em Piauí e em outros estados da
região (GREGÓRIO, 1996).

Assim, segundo Gregório (1996), em cada região do Brasil a nefrologia foi


ganhando espaço, desde o norte até o nordeste com centro de pesquisas e prestadores de
serviços, a clínica Nosso Senhor do Bonfim em Feira de Santana realizou o primeiro
transplante com sucesso de todo norte e nordeste. No sul temos a implantação de uma
equipe multidisciplinar formada por nefropediatras, cirurgiões, psicóloga, nutricionista,
assistente social, professora e um corpo de enfermagem visando alcançar uma estrutura
próxima à encontrada em centros de diálises europeus.

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O profissional escolhido para este exercício de análise global do trabalho exerce
suas atividades no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF).

Localizado em um prédio de 110.000 m² na Ilha do Fundão, Rio de Janeiro, o 


HUCFF é referência no tratamento de diversas patologias de alta complexidade. Além
de realizar procedimentos inéditos e estudos pioneiros em parceria com entidades
nacionais e internacionais, é um centro de excelência em ensino, pesquisa e extensão.
Braço assistencial da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o HUCFF é
vinculado ao Ministério da Educação (MEC) e ao Sistema Único de Saúde (SUS) e
atende, somente, a partir do encaminhamento realizado através da Central de Regulação
(HUCFF, 2016).

Inicialmente a previsão do projeto do Hospital Universitário era de que a


unidade ocupasse uma área construída de 220.000 m², o dobro da atual. Foram muitos
os planos e locais escolhidos para sediar o novo hospital e, até a sua inauguração, em
março de 1978, a obra foi paralisada diversas vezes devido às mudanças de governo e
problemas na liberação de recursos. Em 1970, após a decisão de se reduzir a área de
funcionamento, os trabalhos recomeçaram e a unidade foi inaugurada. Presidente da
comissão de implantação e primeiro diretor do Hospital Universitário, o professor
Clementino Fraga Filho foi homenageado ao ter seu nome escolhido para identificar a
nova unidade (HUCFF, 2016).

O Hospital Universitário conta com 250 leitos ativos - com possibilidade de 450
- em todas as especialidades médicas e com um efetivo de mais de 3.000 profissionais
entre professores, enfermeiros, médicos e administrativos. O HUFCC há 35 anos
funciona como um importante laboratório para a formação de especialistas utilizando
para isso sua residência médica, uma das mais disputadas do país (HUCFF, 2016).

O HUCFF tem como visão e missão desenvolver ações de ensino e pesquisa em


consonância com a função social da universidade, articulada à assistência, à saúde de
alta complexidade e integradas ao SUS, promovendo ao seu público atendimento de
qualidade e de acordo com os princípios éticos e humanísticos. Por reunir em um só
local ensino, pesquisa científica e assistência à comunidade, no HUCFF convivem
diariamente profissionais de diferentes formações e com variadas funções, como:

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pesquisadores, professores, médicos, enfermeiros, assistentes sociais, psicólogos, entre
outros. A multidisciplinaridade é uma característica do hospital, que hoje conta com
2.882 profissionais (HUCFF, 2016).

Como mencionado anteriormente, o HUCFF atende somente a partir do


encaminhamento realizado através da Central de Regulação. O agendamento é feito
antecipadamente nos postos de saúde. Uma vez encaminhados, os pacientes são
submetidos à Central de Triagem e direcionados ao tratamento através do Serviço de
Ambulatório (SAM), que funciona de segunda a sexta-feira. Por dia o hospital recebe
cerca de 1.300 pacientes para atendimentos ambulatoriais e/ou exames, além das quase
200 internações/diárias mantidas pela unidade. Em média, 25 cirurgias são feitas
diariamente no HUCFF (HUCFF, 2016).

O SAM é a principal porta de entrada do HUCFF e está subordinado à Divisão


de Saúde da Comunidade, funcionando no 1º e no 2º andar do hospital. É composto de
123 salas (consultórios, salas de pequenas cirurgias, auditório e áreas administrativas) e,
em média, são realizados 840 turnos semanais de atendimento, distribuídos entre 34
especialidades médicas, além de consultas em Nutrição, Enfermagem, Serviço Social,
Fisioterapia, Odontologia, Fonoaudiologia e Psicologia (HUCFF, 2016).

A Central de Triagem, que funciona na portaria do Ambulatório do HUCFF,


conta com equipe formada por Médico Clínico no horário da manhã, enfermeiros,
técnicos de enfermagem e pessoal de apoio em todo o horário. Todas as vagas de
primeira vez no Ambulatório do HUCFF são agendadas pela Central de Regulação do
Rio de Janeiro, através do Sistema Nacional De Regulação (SISREG III), com base nos
critérios determinados por cada especialidade. Desta forma, pedidos de demanda
espontânea não são atendidos (HUCFF, 2016).

A Central de Marcação de Consultas e Exames realiza marcação dos pedidos de


parecer interno, exames e procedimentos provenientes dos diversos ambulatórios
médicos, para pacientes matriculados e em acompanhamento ativo no HUCFF. O
Atendimento no ambulatório conta com consultas de Enfermagem, Nutrição, Serviço
Social, Odontologia, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Psicologia e consultas Médicas em
diversas especialidades. A Emergência está disponível apenas para os pacientes com

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prontuário no hospital, sendo chamada de serviço de intercorrêcias clínico-cirúrgicas.
Algumas especialidades médicas desenvolvem ambulatórios com programas especiais
de saúde, destinados aos pacientes com quadros mais graves, de difícil tratamento em
outros locais da rede pública de saúde dos quais alguns são AIDS, Hipertensão arterial,
Doenças Inflamatórias Intestinais (HUCFF, 2016).

O hospital atende a pacientes de todo o estado do Rio de Janeiro. Dos pacientes


atendidos, poucos possuem plano de saúde privado. O hospital tem grande importância
na região metropolitana do Rio de Janeiro, pois muitos procedimentos só são realizados
no HUCFF tais como transplantes, biopsia renal, alguns tipos de cirurgias (PESTANA,
2016).

O HUCFF ainda possui a Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos e


Tecidos para Transplantes (CIHDOTT). A CIHDOTT é uma Comissão Intra-hospitalar
formada por equipe multiprofissional da área de saúde, que tem a finalidade de
organizar, no âmbito da instituição, rotinas e protocolos que possibilitem o processo de
doação de órgãos e tecidos para transplantes. Sua composição em todos os hospitais
públicos, privados e filantrópicos foi determinada por uma série de portarias, sendo a
última atualização em 2012 (HUCFF, 2016).

Dentre suas atribuições, a CIHDOTT deve: avaliar juntamente com a Direção do


HUCFF e Centro de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos do Rio de Janeiro
(CNCO-RJ), a capacidade da instituição em recursos disponíveis, para diagnosticar e
avaliar possíveis doadores de órgãos e tecidos para transplantes; definir junto com ao
Diretor Médico do HUCFF e CNCDO-RJ, os indicadores de qualidade com base no
número de prováveis e potenciais doadores de órgãos e tecidos, considerando suas
características; articular-se com os setores externo e internos, visando ao cumprimento
das rotinas e protocolos estabelecidos; identificar no HUCFF setores e profissionais
envolvidos no diagnóstico de morte encefálica e manutenção do potencial doador, a fim
de acompanhar e registrar todos os processos em curso, conforme protocolos
estabelecidos pelo Sistema Nacional de Transplantes; elaborar rotinas internas que
ofereçam aos familiares de pacientes falecidos no HUCFF, a possibilidade de doação de
órgãos e tecidos; promover programa de educação continuada para todos os
profissionais do HUCFF visando à devida compreensão no processo de doação de

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órgãos e tecidos; arquivar e guardar adequadamente documentos de indicadores
qualitativos e quantitativos, apresentando-os mensalmente à CNCDO-RJ (HUCFF,
2016).

Em termos de aparelhagem e equipamento podemos constatar que o plano


diretor do hospital para o decênio 2011-2020 (HUCFF, 2016) destaca a necessidade de
aquisição de diversos equipamentos como: desfibriladores, mesas cirúrgicas e outros
instrumentos cirúrgicos como: bisturis, autoclaves, aparelhos de ultrassonografia,
aparelhos de mamografia entre muitos outros, esses são instrumentos indispensáveis
para a manutenção de serviços essenciais para a população e para que o hospital possa
cumprir sua missão institucional e oferecer um serviço de qualidade e excelência. Outro
ponto importante é que o hospital possui uma Comissão de Direitos do Paciente (CDP)
que tem como missão fortalecer a noção de direito e cidadania, através de ações
educativas, junto à comunidade do HUCFF, implementando o controle social na saúde,
se colocando com um espaço de luta na defesa dos direitos dos pacientes.

No que tange ao seu quadro de pessoal o HUCFF possui hoje um quadro com
3.642 funcionários do quadro permanente e 934 extra-quadros. A ausência de concursos
públicos para renovação e ampliação de seu quadro de funcionários motivou a
contratação de pessoal por outros meios, para exercer atividades-meio, ou ações
administrativas de apoio do hospital sejam eles cooperativas, fundações de apoio ou,
mais recentemente, contratos ditos “extra-quadro”. O plano diretor demonstra a
necessidade de uma gestão ativa de pessoal que realize o dimensionamento e alocação
ideal por setor e que avalie a eficiência destes recursos na produção assistencial. Em
relação à modernização e informatização do hospital o Aplicativo de Gestão para
Hospitais Universitários (AGHU) hoje não se encontra operando, estando em fase de
preparo para a implantação. Há defasagem tecnológica de sistemas e do parque
instalado, isso gera uma baixa utilização do sistema gerencial para planejamento
estratégico, de modo a viabilizar a comunicação entre processos em andamento, o
planejamento orçamentário e a avaliação de resultados (HUCFF, 2016).

Nathalia de Fonseca Pestana, entrevistada para o presente trabalho, é uma


médica nefrologista de 31 anos, que trabalha no HUCFF. Ela estudou na UFRJ e sua
origem socioeconômica é da classe média carioca.

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O HUCFF utiliza para investidura no cargo de Médico Nefrologista a
modalidade do concurso público, que se oficializa com a publicação do correspondente
decreto ou portaria e se completa com a posse e o exercício. Segundo a médica
entrevistada, alguns médicos do hospital não são concursados, mas sim contratados.

O concurso para o cargo de médico é feito em conjunto com outros centros


médicos do governo como o Instituto de Doenças do Tórax (IDT), o Instituto de
Ginecologia (IG), Instituo de Neurologia Deolindo Couto (INDC), o Hospital Central da
Aeronáutica, entre outros.

Para ingressar no cargo, os requisitos de comprovação técnica que constam no


edital são a carteira do Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro (CREMERJ),
o diploma de graduação em Medicina reconhecido pelo MEC e o comprovante de
Residência Médica em Nefrologia credenciada pela Comissão Nacional de Residência
Médica (CNRM). No edital de residência médica para Nefrologia de 2015, não existe
cota de vagas para deficientes e segundo a entrevista não existe médico com deficiência
física na equipe da nefrologia.

Segundo a “Demografia Médica no Brasil” (SCHEFFER, 2015), a nefrologia


pertence a área de Clínica Médica. No país existem 3.813 nefrologistas, sendo que 448
estão no estado do Rio de Janeiro. A média idade da profissão é 49,3 anos (desvio
padrão de 12,1 anos). A profissão possui uma divisa igualitária entre os sexos - 49,3%
dos profissionais são do sexo feminino. O tempo de formado em média é de 22,5 anos
(desvio padrão 15,6 anos). A médica entrevistada trabalha há 7 anos no HUCFF, mas
está há apenas 2,5 anos na especialidade de nefrologia.

Dentro do HUCFF existe a Divisão de Recursos Humanos (DRH) que é


responsável pela admissão e administração do quadro de funcionários do hospital. O
DRH faz manutenção dos dados cadastrais dos servidores, o processamento das
aposentadorias, mapas e averbações de tempo de serviço, concessão de licença por
assiduidade, afastamentos com previsão legal e registra as entradas e saídas de
servidores ocorridas na unidade. Segundo a entrevista, o treinamento do médico
nefrologista é feito no dia a dia, não existindo curso específico para o iniciante.

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O sindicato da classe médica do Rio de Janeiro é o SINMED, as últimas eleições
gerais para composição da diretoria e do conselho fiscal ocorreram em agosto de 2016.
A classe médica do estado do Rio de Janeiro possui também o Conselho Regional de
Medicina do Estado do Rio de Janeiro (CREMERJ) que é uma autarquia federal, criada
em 1957 e composta por 42 conselheiros.

Em relação à jornada de trabalho, segundo dados do documento “Demografia


Médica no Brasil” (SCHEFFER, 2015), 32,4% dos médicos trabalham mais de 60 horas
semanais, 75,5% trabalham mais de 40 horas semanais, sendo que um quarto dos
médicos com menos de 35 anos trabalham em jornadas de mais de 80 horas semanais.
A médica entrevistada trabalha 20 horas na clínica do HUCFF, 20 horas na CTI do
HUCFF, 24 horas em outro hospital e ainda atende em seu consultório uma tarde por
semana, o total da jornada de trabalho é de 68 horas semanais (PESTANA, 2016).

A médica informou que dentro do HUCFF existe uma escala de trabalho


complexa dividida em rotina, plantões e plantões de fim de semana. A equipe em que
ela trabalha é multidisciplinar, composta por nefrologistas, enfermeiros, técnicos de
enfermagem, assistente social, psicólogos e secretários, além disso, também trabalham
no grupo alunos de graduação e médicos residentes. A equipe possui 30 nefrologistas, a
regra mais importante para definir a escala é a antiguidade, na prática isso significa que
os servidores mais antigos tem prioridade de escolhas nas escalas (PESTANA, 2016).

A médica disse que sua rotina de trabalho é basicamente vendo os pacientes


internados as quintas e as sextas pela manhã, nas sextas a tarde ela trabalha no
ambulatório. Os plantões que ela executa são em algumas quintas à noite e em alguns
sábados. Ela trabalha cerca de 20 horas semanais na nefrologia e o plantão dura 16
horas semanais. O plantão é composto por um médico, duas enfermeiras e vários
técnicos de enfermagem (PESTANA, 2016).

Dentro do HUCFF a cultura interna preza a hierarquia, profissionais antigos são


muito respeitados e valorizados, envelhecer não é considerado um risco dentro da
carreira. Os mais antigos possuem alguns privilégios, por exemplo, como já foi dito, a
escolha da escala de trabalho.

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Em relação à remuneração na profissão, 53,9% dos médicos recebem mais do
que 12 mil reais e quase um quarto do total de médico ganha entre 8 mil e 12 mil reais.
Os jovens e as mulheres recebem os menores salários. Quase um terço dos médicos com
menos de 35 anos ganham menos que 8 mil reais (SCHEFFER, 2015). Além disso, a
médica (PESTANA, 2016) informou na entrevista que dentro do HUCFF existe
progressão de salário por tempo de serviço, por capacitação (cursos específicos), título
de mestrado e título de doutorado.

Segundo a entrevistada, não só os médicos como vários profissionais do HUCFF


apresentam problemas com estresse e desmotivação, ela disse que esta é a principal
“doença” dos profissionais da área.

O serviço de nefrologia do HUCFF fica no 7º andar do hospital, as instalações


elétricas e hidráulicas, o corredor, o posto de enfermagem, as enfermarias e a secretaria
foram refeitas em 2012.

A médica entrevistada disse que utiliza apenas insumos básicos de saúde, tais
como gaze, esparadrapo, seringa, antibióticos e remédios em geral (PESTANA, 2016).

O principal equipamento técnico que ela utiliza é a maquina de hemodiálise. As


máquinas do hospital estão em boas condições, porém elas precisam ser usadas junto
com materiais de uso único que estão em falta no hospital. No momento, o hospital
enfrenta uma crise e os materiais utilizados pela máquina estão em falta no estoque do
hospital. A situação é muito grave, a falta destes insumos acarreta na não realização de
hemodiálise no paciente, o que pode levar a morte (PESTANA, 2016).

O único sistema informatizado utilizado pela entrevistada no HUCFF é o


prontuário eletrônico, que é considerado excelente.

Foi levantado também em entrevista informações que dizem respeito à


ambiência física. Para tal, foi necessária uma pesquisa para saber como essa questão é
tratada no serviço público de saúde – local onde a entrevistada atua.

Ambiência na saúde compreende o espaço físico, social, profissional e de


relações interpessoais que deve estar em sintonia com um projeto de saúde voltado para
a atenção acolhedora, resolutiva e humana (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2009).

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A Política Nacional de Humanização (PNH) tem como uma de suas diretrizes a
valorização da ambiência, com organização de espaços saudáveis e acolhedores de
trabalho. Baseada na ideia de transversalidade e indissociabilidade da atenção e gestão,
de projetos co-geridos de ambiência como um dispositivo, para contribuir na mudança
das relações de trabalho (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2009).

Segundo o Ministério da Saúde (2004), essa compreensão de ambiência como


diretriz da PNH é norteada por três eixos principais: a) O espaço que visa à
confortabilidade focada na privacidade e individualidade dos sujeitos envolvidos,
valorizando elementos do ambiente que interagem com as pessoas – cor, cheiro, som,
iluminação, morfologia, arte, privacidade e individualidade–, e garantindo conforto aos
trabalhadores e usuários; b) O espaço que possibilita a produção de subjetividades –
encontro de sujeitos – por meio da ação e reflexão sobre os processos de trabalho. Ao
falarmos de produção de sujeitos, nos referimos à incorporação também dos que atuam
na ponta do serviço – como enfermeiros, médicos, recepcionistas, entre outros – para
discussão e construção do projeto, uma vez que estes podem dar mais detalhes do que
funciona e do que atrapalha no andamento das atividades nas unidades. Lembrando
também que estas pessoas muitas vezes trazem para a discussão a opinião dos pacientes
– suas maiores reclamações ou, então, a indicação do tipo de ambiente em que se
sentem melhor; c) A arquitetura usada como ferramenta facilitadora de mudança do
processo de trabalho, favorecendo a otimização de recursos, o atendimento humanizado,
acolhedor e resolutivo. A ambiência discutida isoladamente pode ser instrumento de
construção do espaço a que aspiram os trabalhadores de saúde e os usuários, com
garantia de biossegurança relativa à infecção hospitalar e prevenção de acidentes
biológicos, se constituindo em um ambiente que vai além da arquitetura normativa e
projetada exclusivamente para comportar alta tecnologia.

É importante ressaltar que esses três eixos devem estar sempre juntos na
composição de uma ambiência.

Ao avaliar o local de trabalho da médica nefrologista, pode-se observar que o


proposto na cartilha do Ministério da Saúde (2004) não é posto em prática. Espaços que
deveriam gerar conforto e privacidade aos pacientes e aos trabalhadores são precários:

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macas sem lençol, pia para lavagem das mãos entupidas. As condições de iluminação,
som, cores, cheiro, térmica são precárias (PESTANA, 2016).

Reuniões com todos os profissionais envolvidos (desde médicos, enfermeiros,


recepcionistas) naquele ambiente de trabalho a fim de discutir e promover mudanças são
inexistentes. A arquitetura do local é antiga e apresenta pouquíssimos sinais de
conservação, não estando, portanto de acordo com o projeto de humanização da saúde.
Já quanto à biossegurança, a médica informa que o lixo hospitalar é recolhido com
frequência e que não há resíduos tóxicos no ambiente (PESTANA, 2016).

Para discorrer sobre as condições organizacionais, recorremos ao texto


“Trabalho prescrito” de Jussara de Brito para embasar alguns aspectos. Segundo Brito
(2009), além do trabalho prescrito imposto ao trabalhador, podemos reconhecer que os
profissionais têm “normas antecedentes” que se referem aos saberes técnicos, científicos
e culturais historicamente incorporados ao fazer. É possível reconhecer alguma das
normas referentes ao trabalho de saúde no Brasil: os princípios de humanidade e
cidadania da Reforma Sanitária, o valor social e político atribuído ao SUS, as políticas
de saúde, os modelos de atenção e de gestão, a formação técnico-científica dos
profissionais, a constituição e a forma de divisão das tarefas em equipes, as tecnologias
e os materiais disponíveis, os protocolos terapêuticos, as rotinas de trabalho previstas, as
regras instituídas nos serviços, as forma de contato dos profissionais e as demandas dos
usuários.

Segundo a médica Nathalia, quando ela foi contratada, antes de iniciar suas
atividades no hospital, apenas houve uma reunião onde foram informados os direitos e
os deveres do servidor do HUCFF de um modo geral, porém não se falou nada sobre os
objetivos específicos a serem alcançados.

De acordo com a médica Nathalia, a divisão do trabalho se da conforme as


funções que os médicos exercem e entre eles não há uma rotação, pois pouca variação
existe dentro do procedimento. As equipes são divididas da seguinte forma: equipe da
hemodiálise; equipe de insuficiência renal aguda; equipe do transplante; equipe da
enfermaria. Os funcionários se comunicam através de e-mail e pelo prontuário online do
paciente. Segundo a entrevistada, os turnos dos médicos nefrologistas são de 4 horas

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(rotina) de plantões de 16 ou 12 horas e não existe um controle de qualidade com os
profissionais. A remuneração dos profissionais do HUCFF é feita através de um salário
pago pelo Governo Federal (PESTANA, 2016).

As máquinas usadas pelos médicos e enfermeiros que trabalham no HUCFF na


área de nefrologia são as máquinas de hemodiálise. São elas que fazem o trabalho do
rim, limpando e filtrando o sangue, quando este não está com o seu funcionamento
normal. A médica nos informou que essas máquinas estão dispostas e organizadas
dentro de uma sala própria e seguem uma legislação para seu uso.

De acordo com a Agência Nacional e Vigilância Sanitária (ANVISA), os


serviços de diálise devem funcionar atendendo aos requisitos de qualidade e a um
padrão de assistência médica que tenha como objetivo: a) exposição mínima aos riscos
decorrentes do próprio tratamento; b) monitoramento permanente da evolução do
tratamento e eventos adversos; c) responsabilidade integral sobre as complicações do
tratamento; d) melhora geral do seu estado de saúde com vistas à sua reinserção social
(ANVISA, 2004).

O HUCFF, apesar das péssimas condições dos hospitais públicos no Brasil, é


considerado de excelência tanto em pesquisas, quanto em atendimento médico. A
faculdade de medicina da UFRJ está entre as cinco mais bem classificadas de acordo
com as pesquisas mais recentes.

Em relação à concorrência de mercado, o que existe na saúde brasileira, não é


apenas uma questão de concorrência entre hospitais, a atual conjuntura é muito mais
complexa, existe uma situação de tensão entre o setor público e privado. A história da
saúde pública brasileira tem como característica a convivência de dois planos de saúde
distintos de atuação: a reforma sanitária e o projeto de saúde articulado pelo mercado. A
reforma sanitária tem como foco principal assegurar que o estado seja responsável pela
saúde, e por outro lado, aparece o projeto de saúde articulado pelo mercado que oferece
o modelo médico assistencial privatista.

Dentro deste conflito, nasce a dificuldade do SUS Implantar sua proposta


original de atuação: universalidade, integralidade, descentralização e participação
social. Atualmente, a saúde brasileira está dividida em três sistemas: o SUS, o sistema

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privado via planos de saúde e o sistema privado com desembolso direto(SOUSA,2014).
O estado brasileiro, através de medidas como transferência de recursos públicos para os
planos de saúde e terceirização de mão de obra, (transferência da gestão,
operacionalização e execução dos serviços de saúde pública para entidades privadas)
tem feito um verdadeiro desmonte da saúde publica; favorecendo assim, a privatização
do setor.

A situação atual da política de saúde no Brasil nega a concretização da


saúde como direito universal, os interesses privados se sobrepõe as verdadeiras
necessidades do bem estar social. O SUS não consegue se consolidar como um sistema
universal de saúde e não consegue romper com histórica linha divisória que impede o
acesso ao bem estar daqueles que não podem pagar. A missão de dar conta das
demandas de saúde no país apesar de complexa, não é impossível, países como Canadá,
Itália, Inglaterra optaram por soluções baseadas na solidariedade social e estão
conseguindo contemplar as necessidades dos seus usuários (SOUSA,2014).

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Considerações Finais

A profissão de medicina no Brasil ganhou força no início do século XX,


a partir de sua inserção no campo da ciência. A partir de então, a profissão ganhou
notoriedade e status social, angariando estudantes dos níveis sociais mais altos da
sociedade. Com a consolidação desse campo de trabalho, passaram a surgir
especialidades médicas que acompanharam o desenvolvimento científico e tecnológico.

Hoje, uma das especialidades médicas de relevância nos hospitais de alta


complexidade é a nefrologia, haja vista, os procedimentos pós-transplantes e de
hemodiálise. A análise global do trabalho de uma médica nefrologista do HUCFF
evidenciou as deficiências hoje presentes no sistema público de saúde. Tais deficiências,
todavia, não têm impedido a realização do trabalho. Uma análise mais detalhada poderá
apresentar no futuro, os aspectos mais relevantes da atividade aqui apresentada.

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Referências

ANVISA, RESOLUÇÃO - RDC Nº 154, Disponível em:


<http://www.ecosystem.com.br/wp-content/uploads/2014/03/RDC-154.pdf>.
Acesso em: 04/11/2012.

BRASIL, Sociedade Brasileira de Nefrologia. O que é nefrologia? Disponível em:


<http://sbn.org.br/publico/institucional/o-que-e-nefrologia/>. Acesso em:
28/10/2016.
BRASIL, Ministério da Saúde. Ambiência. 2004. Disponível em:
<http://www.otics.org/estacoes-de-observacao/rio-saude-presente/subpav/
promocao-da-saude/acolhimento-e-humanizacao/ambiencia/at_download/file>.
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