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CIÊNCIA POLÍTICA E TEORIA DO ESTADO:


UM GUIA PARA ESTUDOS DIRIGIDOS.1

01. Relevância, Objetivos e Métodos Científicos

Qual a relevância científica do estudo da Ciência Política e da Teoria do Estado? A Ciência


Política e a Teoria do Estado são disciplinas importantes porque auxiliam na compreensão
da relação do indivíduo com o Estado e seu poder. Elas servem de base para segmentos
específicos do Direito, sobremaneira do Direito Público.

O Direito Público se ocupa do estudo de relações jurídicas entre indivíduos e o Estado; ao passo que
o Direito Privado se ocupa, essencialmente, do estudo de relações entre indivíduos. Paulo Bonavides,
em “Ciência Política” (1967), leciona que é: Direito Administrativo, segmento que descreve o papel
das instituições de governo e estuda os serviços, bens e entidades aptos a realizar a função
administrativa do Estado; Direito Constitucional, segmento que determina a forma estatal e
governamental, bem como reconhece direitos fundamentais, garantias processuais e guarnece direitos
humanos; e Direito Internacional Público, segmento que se ocupa das relações e organizações
internacionais que se estabelece entre Estados.

Quais são os objetos de estudo da Ciência Política e da Teoria do Estado? A Ciência Política
tem por objetivo estudar processos de formação, organização e exercício do poder. A Teoria
do Estado, por sua vez, tem por objetivo estudar processos de surgimento, evolução, estrutura
e dinâmica do Estado.

Quais são os métodos científicos utilizados pela Ciência Política e pela Teoria do Estado? A
Ciência Política e a Teoria do Estado são ciências autônomas (e diversas da Ciência
Jurídica) e possuem etapas e procedimentos próprios para a construção de seus estudos e
análises. Através do método empírico, o Cientista Político constrói o seu pensamento
apoiado na observação de fatos e em experiências vividas por ele. De outra banda, através
do método histórico-dialético, o Teórico do Estado constrói o seu pensamento apoiado na
materialidade de eventos históricos experenciados pela sociedade.

1
3 ed. 2018.
2

02. Teorias Introdutórias ao Estudo do Direito e da Ciência Política

A Sociologia do Direito, como segmento da Ciência Jurídica, faz uma investigação sociológica,
refletindo sobre o comportamento humano para entender relações sociais (com repercussão jurídica).
Por sua vez, a Filosofia do Direito, como segmento do Direito, faz uma investigação filosófica sobre a
existência humana para compreender problemas fundamentais enfrentados pelo Direito.

Teoria sociológica do Direito (TSD)


Autor de destaque: Eugen Ehrlich (1862-1923), jurista austríaco, representante da escola sociológica
do direito; Obra: “Fundamentados da Sociologia do Direito”(1912).

A TSD informa que o Direito representa um sistema de fluência mútua nas relações sociais,
que compreende tanto a sociedade quanto o Estado. Assim, o fluxo dos acontecimentos
sociais deve ser estável para manter-se a segurança (jurídica) das relações. O Direito,
percebido desse modo, é chamado de Direito Vivo (Living Law). Voltando-se para as
manifestações do fenômeno jurídico, observamos: Direito Bruto, aquele advindo da sociedade,
pelo qual se percebe uma normatividade espontânea nas relações; e Direito Institucional,
aquele advindo do Estado, no exercício de sua função jurisdicional (Direito Pretoriano) ou de
suas funções legislativa e executiva (Direito Escrito).

Observações:
(a) Nos países que seguem o Sistema de Civil Law se vê uma preponderância do direito escrito; nos
países que seguem o Sistema de Common Law, por sua vez, do direito pretoriano.
(b) Os conflitos presentes na sociedade tendem a ser solucionados pelos Poderes de Estado
(Legislativo, Judiciário e Executivo); a irracionalidade na resolução de conflitos acarreta atos que
violam o Direito (p.ex. a noção de “vingança privada”).

Poder Legislativo Lei erga omnes2


ESTADO Poder Judiciário Decisão judicial inter partes3
Poder Executivo Ato administrativo4

2
A lei é regra de conduta social genérica e abstrata que visa dar coesão à sociedade, possuindo, em
regra, validade contra todos os indivíduos.
3
A decisão judicial se presta a pacificar conflitos entre os indivíduos, possuindo, em regra, validade
entre as partes envolvidas.
3

Teoria tridimensional do Direito (TTD)


Autor de destaque: Miguel Reale (1910-2006), jurista brasileiro, representante da escola filosófica do
direito; Obras: “Teoria tridimensional do direito” e “O Direito como experiência” (1968).

A TTD informa que o Direito é o conjunto ordenado de fatos sociais, normas positivas e
valores éticos. Fatos sociais são acontecimentos advindos da sociedade; Normas positivas são
atos que instrumentalizam o Direito, conferindo obrigatoriedade e coercitividade a preceitos
éticos; Valores éticos são construções histórico-sociais que dão sentido à vida em sociedade e
que o Direito consagra como princípios fundamentais. Através da experiência jurídica se
consegue manter a estabilidade das relações sociais.

Observações:
(a) Após a Segunda Guerra Mundial, houve um movimento de positivação (constitucionalização) de
valores éticos pelo qual emergiram teorias colocando a dignidade da pessoa humana como princípio
fundamental do Direito.
(b) Se um dos elementos constitutivos não está presente, entende-se que emergem fenômenos que com
o Direito não se devem confundir.

Fato + Valor Norma + Valor Fato + Norma


Preceito Moral Tácito Preceito Ético Positivo Preceito Jurídico Positivo
Exemplo: Exemplo:
Exemplo:
Preâmbulo da Constituição “Leis de Nuremberg”
“Os 10 Mandamentos” 5
Federal de 19886 (Alemanha, 1935)7
Situação bastante comum Situação bastante comum em Situação bastante comum em
em doutrinas religiosas Estados Constitucionais regimes antidemocráticos

03. Epistemologia e Política como objeto científico

Epistemologia: é o estudo crítico do conhecimento científico em seus diversos ramos.

4
O ato administrativo é manifestação unilateral da Administração Pública que, agindo nessa
qualidade, modifica, extingue e declara direitos ou obrigações ao cidadão ou a si própria.
5
Decálogo escrito por Deus em tábuas de pedras e entregues a Moisés, segundo o texto bíblico.
6
Preâmbulo da Constituição: não constitui norma central. Invocação da proteção de Deus: não se trata
de norma de reprodução obrigatória na Constituição estadual, não tendo força normativa." (STF, ADI
2.076, DJ de 08/08/2003.)
7
Lei para a proteção do sangue e honra alemães, Lei de cidadania do Reich e Lei da bandeira alemã.
4

Ciências Sociais Aplicadas: disciplinas que estudam os aspectos sociais das diversas
realidades humanas, buscando melhor entender as diferentes realidades com que convivemos,
no que diz respeito às culturas humanas, suas realizações, seus modos de vida e seus
comportamentos. Exemplo: DIREITO.

Ciências Humanas: disciplinas que estudam a condição humana em si, analisando o ser
humano em uma perspectiva múltipla, buscando melhor entender as diferentes facetas de sua
personalidade, no que diz respeito à arte, à construção de pensamento e sua expressão.
Exemplo: CIÊNCIA POLÍTICA, disciplina que centra seu estudo nos fenômenos sociais
humanos que influem na constituição do poder e no seu exercício.
 Fenômenos sociais humanos: comportamentos, situações e eventos advindos da sociedade, a
partir de ações humanas;
 Constituição do poder: processo de formação ou criação de estruturas institucionais para o
exercício do poder, entendido como força supraindividual dentro de uma sociedade;
 Exercício do poder: realização prática, fática ou jurídica, do poder em face das vontades
individuais, no âmbito de relações sociais.

PODER POLÍTICO

1ª Corrente: Poder político é expressão de força estatal. Nicolau Maquiavel (1469-1527).


Obra fundamental: “O Príncipe” (1532). Contribuições do autor: observação da política com
traços científicos (fuga de julgamentos morais) e abordagem das questões referentes à
legitimação do poder, do uso da força e da soberania no âmbito das relações entre indivíduos
e o Estado. Ele foi precursor da utilização do termo latino status (“modo de ser”) no sentido
de “modo de ser político” – a partir daí, a noção de Estado se difundiu nos estudos científicos.

2ª Corrente: Poder político é poder legítimo. Max Weber (1864-1920). Obra fundamental:
“A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo” (1904). Contribuições do autor: introdução
do debate sobre a ética no âmbito do estudo do poder e estabelecimento da análise das
relações de mando e de obediência no campo da política, qualificando um poder legítimo. A
partir dele, o interesse científico pela Política como objeto de estudo se acentuou.

Temáticas de interesse da Ciência Política


 Política interna ou doméstica: relações intraestatais;
5

 Política externa: relações internacionais;


 Biopolítica: relações que agregam e aproximam setores distintos da realidade que dizem
respeito à vida e ao conhecimento, cujas mudanças ao longo do tempo revelam a
importância da ciência e da tecnologia ao campo político.8

Expressões de poder
(manifestações do poder analisadas a partir de relações específicas)

I – Perspectiva histórica (Direito Romano)

Poder de fato (potentia): manifestação de poder que se impõe em uma relação com base no
mundo dos fatos (cotidiano). Exemplo: a posse fática sobre uma coisa; o poder que alguém
uniformizado exerce sobre um indivíduo durante uma identificação civil.

Poder de direito (potestas): manifestação de poder que se impõe em uma relação com base
no mundo jurídico (Direito). Exemplo: a propriedade documentada sobre uma coisa; o poder
que o Estado se investe, a partir da lei (norma), sobre quem aufere renda (fato), tributando-o e
gerando recursos financeiros para sua manutenção (valor).

Observações:
(a) A TSD que trabalha com a dicotomia entre Direito Bruto e Direito Institucional encontra
similaridade com a dicotomia romana de mundo dos fatos e mundo jurídico.
(b) A TTD que apresenta o Direito como conjunto ordenado de fatos, normas e valores, ao seu turno,
se aproxima da concepção romana de mundo jurídico.

II – Perspectiva contemporânea9

O exercício de poder é uma relação em que:


A: se refere à ideia de “mando”, detenção ou domínio do poder;
B: se refere à ideia de “obediência”, sujeição ao poder;

8
Biopoder é aplicação do poder político sobre todos os aspectos da vida humana. Concepção de:
Michel Foucault (1926-1984), filósofo francês, que se concentrou no desenvolvimento da história
crítica da humanidade.
9
Lições de: Noberto Bobbio (1909-2004), filósofo político e historiador italiano, que se concentrou
na análise da democracia e de suas repercussões jurídicas e políticas.
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Eixo: se refere ao fato ou ato de ligação entre os polos;


Espaço ou Esfera: se refere ao ambiente em que o poder é exercido.

Poder atual é o poder instrumentalizado em um ato. Exemplos:


(1) O Governo tributa, mediante lançamento, de modo mais elevado produtos que não quer
que o cidadão consuma;
(2) O Estado expropria, através de decreto, propriedade em que se constate a exploração de
trabalho escravo, inibindo a conduta de determinados donos de terra.

Poder potencial é a capacidade ou possibilidade de exercício do poder. Exemplos:


(1) A “Lei Maria da Penha” (Lei 11.340/2006) objetiva coibir a violência doméstica contra a
mulher reprovando a conduta de agressores;
(2) A “Lei Menino Bernardo” (Lei 13.010/2014) objetiva coibir o uso de castigos físicos ou
tratamentos cruéis na educação de crianças e adolescentes reprovando a conduta de pais
negligentes.

Poder estabilizado é o poder potencial materializado e individualizado em uma relação.


Exemplos:
(1) Poder público é uma concepção que compreende o conjunto de instituições dotadas de
autoridade para realizar funções governamentais;
(2) Sociedade civil é uma concepção que compreende o conjunto de relações entre indivíduos,
grupos, classes sociais, que se desenvolvem a margem das instituições estatais;
(3) Opinião pública é uma concepção que compreende o conjunto de julgamentos sociais e
consciência comunitária sobre determinada questão de interesse ou visibilidade gerais;
(4) Os Poderes de Estado no Brasil estão estabilizados em Poder Legislativo, Poder
Executivo e Poder Judiciário.

Poder institucionalizado é a articulação do poder (estabilizado) em funções claramente


definidas e coordenadas entre si. Exemplos:
(1) No âmbito do Poder Judiciário (estabilizado), se faz a organização e a especialização de
varas e juizados (institucionalizados);
(2) No pós-Segunda Guerra, a nação judaica (estabilizada) se constituiu em Estado de Israel
(institucionalizado).
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Fenômenos incidentes às manifestações de contemporâneas de poder


Interesse político é o estado de mente de quem exerce o poder;
Consciência política é a disposição mental crítica de quem se submete ao poder, que capacita
uma análise pertinente sobre a realidade social e as relações estabelecidas.

Exemplos:
a) O Estado implementa mecanismos legais (“Lei Seca”) e executivos (“blitz”) objetivando
assegurar a segurança no trânsito (interesse político estatal) e criar uma cultura de paz no
trânsito (nova consciência política da população);
b) Adolf Hitler, através do livro Minha Luta (1925), propagou na Alemanha os ideais nazistas
(seu interesse político) que, posteriormente, permitiu o estabelecimento de práticas políticas
de banalidade do mal10 (consciência política de sustentação governamental).

III – Perspectiva pragmática (Realismo Jurídico)

Uso de força pelo Estado: trata-se de manifestação repressiva a atos antissociais ou


antijurídicos, mas também ao uso de poder de polícia (limitação do exercício de direitos
fundamentais, individuais ou coletivos, em favor do bem comum).

Bem comum é a finalidade do poder público e da sociedade civil, do Estado e de indivíduos, que
consiste no conjunto partilhado de bens que permitem a cada um dos indivíduos alcançar o pleno
desenvolvimento humano.

Exemplo: o Artigo 78 do Código Tributário Nacional aduz ser poder de polícia “[...] a
atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou
liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público
concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do
mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do
Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais
ou coletivos”.

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Concepção de: Hannah Arendt (1906-1975), filósofa alemã, que se concentrou no estudo da
filosofia política e nos impactos de ações e cenários políticos sobre os seres humanos.
8

Manipulação de informações pelo Estado: trata-se de manifestação decorrente do fenômeno


de centralização do poder (concentração de dados pelas estruturas estatais transmitidas em
diversos níveis de transparência, possibilitando assimetrias informacionais).

Exemplos:
a) A não divulgação de dados e informações sobre suicídios, com o objetivo de não incentivar
a sua prática;
b) A destruição e a falsificação de fotografias, livros e produções audiovisuais, promovidas
por Josef Stálin, na URSS, com o objetivo de encobrir fatos históricos anteriores ao seu
governo.

Dominância dos espaços de poder: É interessante notar que há diversos casos em que os
espaços de poder são dominados por grupos que não representam a maioria dos indivíduos
da sociedade. É caso brasileiro, em que a maioria da população é feminina, mas os
ambientes políticos são, predominantemente, preenchidos por homens.

04. Inter-relações entre Política, Ética e Direito

“A corte chegou ao Brasil empobrecida, destituída e necessitada de tudo. Já estava falida quando
deixara Lisboa, mas a situação se agravou ainda mais no Rio de Janeiro. Deve-se lembrar que entre
10.000 e 15.000 portugueses atravessaram o Atlântico junto com D. João. Para se ter uma ideia do
que isso significava, basta se levar em conta que, ao mudar a sede do governo dos Estados Unidos da
Filadélfia para a recém construída Washington, em 1800, o presidente John Adams transferiu para a
nova capital cerca de 1.000 funcionários. Ou seja, a corte portuguesa no Brasil era entre 10 e 15
vezes mais gorda do que a máquina burocrática americana nessa época. E todos dependiam do erário
real ou esperavam do príncipe regente algum benefício em troca do „sacrifício‟ da viagem. „Um
enxame de aventureiros, necessitados e sem princípios, acompanhou a família real‟, notou o
historiador John Armitage. „Os novos hóspedes pouco se interessavam pela propriedade do Brasil.
Consideravam temporária a sua ausência de Portugal e propunham-se mais a enriquecer-se à custa
do Estado do que a administrar a justiça ou a beneficiar o público‟.” (Trecho adaptado de “1808”
(2007), de Laurentino Gomes.)
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Política: fenômeno que diz respeito ao exercício de poder com legitimidade (ética e jurídica).

Ética: conjunto valorativo, ligado à justiça e ao bem comum, de conhecimentos extraídos do


comportamento humano cujo reflexo social importa em premissas finalísticas.

Direito: fenômeno sistemático de normas, fatos e valores que constituem um Estado


Democrático de Direito e asseguram garantias fundamentais.

Ética  Direito/Política
É a Ética que fornece valores ao Direito e à Política, através de princípios fundamentais.

Direito  Ética
É o Direito que dá efetividade prática aos preceitos e princípios éticos, em tese, assentidos
coletivamente.

Direito  Política
O Direito é o maior limitador da Política; o fenômeno jurídico baliza o exercício de poder. No
Estado Democrático de Direito, instrumentos normativos, como Constituições e leis, são,
simultaneamente, limitadores ao poder e meios para a Política ser efetivada.

Política  Ética
A Política permite a concretização de valores éticos.
Políticas públicas constituem um conjunto de programas, ações e atividades desenvolvidas
pelo Estado que visam materializar valores éticos.

Política  Direito
É através da Política que o Direito torna-se obrigatório e coercitivo. O poder político, através
do processo legislativo, positiva o Direito. Nitidamente é a partir de um ato político da
comunidade que, por exemplo, se pactuam Constituições.
10

05. Processo Legislativo

É o conjunto de atos, tutelados pelo Direito Constitucional, que objetiva a elaboração de


espécies normativas de forma democrática, ordenado procedimentalmente por autoridades
políticas.

O Artigo 59 da Constituição Federal informa que o processo legislativo compreende a


elaboração de:

I – Emendas à Constituição
Espécie normativa pela qual o Poder Legislativo (poder constituinte derivado) acrescenta,
modifica ou suprime o texto constitucional.
Poder constituinte originário: aquele que elaborou a Constituição.
Poder constituinte derivado: aquele competente para mudar o seu texto.

II – Leis complementares
Espécie normativa que complementa o conteúdo constitucional, tendo sua matéria
predeterminada pela própria Constituição.

III – Leis ordinárias


Espécie normativa residual (quando não cabe outra) que se caracteriza pela generalidade e
abstração de conteúdo.

IV – Leis delegadas
Espécie normativa pela qual o Poder Legislativo transfere para o Poder Executivo a
competência de legislar, observadas as limitações constitucionais.

V – Medidas provisórias
Espécie normativa utilizada pelo Poder Executivo em casos extraordinários de necessidade e
urgência, pela qual se adotam providências específicas e temporárias com força de lei.11

VI – Decretos legislativos

11
As medidas provisórias podem, posteriormente, ser convertidas em lei.
11

Espécie normativa utilizada pelo Poder Legislativo em casos de competência exclusiva do


Congresso Nacional.

VII – Resoluções
Espécie normativa utilizada pelo Legislativo em casos de competência privativa do
Congresso Nacional, do Senado Federal ou da Câmara dos Deputados.

Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro 1998, dispõe sobre a elaboração, a redação, a


alteração e a consolidação das leis. O seu Artigo 3º informa que uma lei será estruturada em
três partes básicas:
I – Parte preliminar, compreendendo a epígrafe, a ementa, o preâmbulo, o enunciado do
objeto e a indicação do âmbito de aplicação das disposições normativas;
II – Parte normativa, compreendendo o texto das normas de conteúdo substantivo
relacionadas com a matéria regulada;
III – Parte final, compreendendo as disposições pertinentes às medidas necessárias à
implementação das normas de conteúdo substantivo, às disposições transitórias, se for o caso,
a cláusula de vigência e a cláusula de revogação, quando couber.

Procedimentos legislativos
(fases pelos quais os atos do processo legislativo se desenvolvem)

Fases do procedimento de criação de leis (regra geral válida para as leis ordinárias)

(1) Iniciativa: ato pelo qual se inicia o processo legislativo, com a apresentação do projeto de
lei perante a Casa Legislativa competente.

Iniciativa concorrente: a Constituição atribui a mais de uma pessoa ou órgão a possibilidade


de iniciar o processo legislativo. Exemplo: Art. 24, CF (competência da União e dos Estados
para legislar concorrentemente).

Iniciativa privativa: a lei é de iniciativa exclusiva de determinadas pessoas, só podendo o


processo legislativo ser iniciado por elas. Exemplo: Art. 61, §1º, CF (matérias de iniciativa
privativa do Presidente da República).
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Iniciativa conjunta: diversas pessoas, conjuntamente, iniciam o processo legislativo. Não há


previsão constitucional.

Iniciativa popular: forma de exercício da soberania popular de forma direta, sem o


intermédio de representantes, através da apresentação de projeto de lei pelo povo. No âmbito
federal, o projeto de lei é apresentado à Câmara dos Deputados e subscrito por no mínimo 1%
do eleitorado nacional, distribuído por 5 estados. Exemplo: “Lei da Ficha Limpa” (Lei
Complementar 135/2010).

(2) Deliberação parlamentar: compreende discussão e votação; no âmbito federal, todo


projeto de lei deve ser discutido e votado nas duas casas do Poder Legislativo, ou seja, na
Câmara dos Deputados e no Senado Federal.

Regra federal: os projetos de lei são apresentados na Câmara dos Deputados (casa iniciadora),
seguindo para o Senado Federal (casa revisora). Exceção: projetos de lei apresentados por
senador têm o Senado Federal como casa iniciadora.

Tramitação: O projeto de lei aprovado na casa iniciadora segue para a casa revisora; sendo
rejeitado na casa iniciadora é arquivado. O projeto de lei aprovado na casa revisora segue para
autógrafo (reprodução do documento oficial aprovado) e, após, deliberação executiva; sendo
rejeitado na casa revisora é arquivado. O projeto de lei emendado tem a parte modificada
encaminhada de volta à casa iniciadora, para apreciação e votação.

Observação:
A matéria constante de projeto rejeitado somente poderá constituir objeto de novo projeto na mesma
sessão legislativa12, mediante proposta da maioria absoluta dos membros de qualquer das casas.

(3) Deliberação executiva: aprovado pelo Poder Legislativo, o projeto de lei deve ser
apreciado pelo Poder Executivo, mediante sanção ou veto.

Sanção: aquiescência (concordância ou anuência) do Chefe do Poder Executivo com o


projeto de lei. Sancionado, o projeto de lei segue para promulgação e publicação.

12
Sessão legislativa é o período de atividade normal do Congresso Nacional a cada ano, de 02/02 a
17/07 e de 01/08 a 22/12.
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Sanção tácita: quando o Chefe do Poder Executivo no prazo de 15 dias úteis, contados da
data do recebimento do projeto de lei, não se manifesta, seu silêncio vale como sanção
(tácita).

Veto: ato que expressa a discordância do Chefe do Poder Executivo em relação ao projeto de
lei. Pode ser jurídico (em face de inconstitucionalidade) ou político (em face de contrariedade
ao interesse público).

O veto é apreciado em sessão conjunta e em votação secreta de Deputados e Senadores.


Acatado ou derrubado o veto, o projeto de lei é enviado para o Presidente da República para
promulgação.

(4) Promulgação: ato que atesta a validade da lei, realizado pelo Chefe do Poder Executivo
(Presidente da República). Caso ele não promulgue a lei, ela será promulgada pelo Poder
Legislativo (Presidente do Senado Federal).

(5) Publicação: ato por meio do qual é dado conhecimento público da inovação legislativa. É
a partir dela que se conta o prazo de vigência da lei.

Regra federal: a lei começa a vigorar em todo o país 45 dias depois de oficialmente publicada
(artigo 1º da Lei de Introdução ao Código Civil). Chama-se de vacatio legis o período entre a
publicação da lei e o início de sua vigência. Exceção: disposição na própria lei (vigência
imediata ou específica) e regra nos Estados estrangeiros (a lei começa a vigorar após três
meses da publicação oficial, respeitada a soberania do local).

06. Teorias Relacionais de Estado e Direito

Teoria monista: o Direito se confunde com o Estado. Só há fenômeno jurídico a partir do


Estado. Assim, o fenômeno jurídico se limita a se constituir como norma de conduta emanada
da autoridade política com força coercitiva contra todo e qualquer indivíduo. Não aceita a
ideia de direito natural, representando poder demasiado (exclusivo) ao Estado.
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Teoria dualista: o Direito é fato social, advindo integralmente da sociedade. Não se nega a
existência do Estado, porém, sua única função é positivar o fenômeno jurídico pré-existente.
A especificidade dos Poderes de Estado (e do direito positivo) é minimizada e seu papel é
subordinado ao Direito (natural), representando poder escasso (mínimo) ao Estado.

Teoria paralelista: o Direito e o Estado são fenômenos paralelos, havendo uma relação de
interdependência entre eles pela qual se observa que ambos objetivam a mesma finalidade,
qual seja: o bem comum.

Personalidade jurídica é o termo que designa a qualidade que o Direito possui de atribuir a
entidades e bens encargos e benefícios jurídicos. Assim, personalidade jurídica do Estado é a
qualidade atribuída pelo Direito que permite o Estado agir de modo independente em
relações (p.ex. internacionais) que estabelece.

07. Conceitos e elementos constitutivos do Estado

Unidade política é uma sociedade organizada (gênero do qual o Estado é espécie).

O que é um Estado? Estado, nas palavras de Darcy Azambuja, em “Teoria Geral do Estado”
(1942), é a “organização político-jurídica de uma sociedade para realizar o bem público
com governo próprio e território determinado”. Estado é a unidade política dotada de povo,
território, governo e soberania.

(1) Povo: elemento humano do Estado; a causa material do Estado, que não se confunde com:
 Nação: conceito moral, “parentesco” entre os indivíduos (que ultrapassa fronteiras estatais);
 População: realidade estatística; expressão quantitativa do Estado, de difícil aferição;
 Raça: argumento historicamente caudado em determinismo biológico, que pressupõe a
distinção pessoal a partir de aspectos fisiológicos.

(2) Território: espaço físico do Estado, que serve de limite à sua jurisdição e soberania.
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Natureza jurídica do território: em um Estado Democrático, o território não é propriedade


determinada e, sim, patrimônio comum. Percebe-se que o território comum é subsidiário à
propriedade privada, observado o imperativo constitucional de função social da propriedade.

Elementos territoriais: o território constitui-se do solo contínuo, envolvendo também o


espaço aéreo, subsolo, mar territorial, rios, lagos interiores, golfos, baias, plataforma marítima,
navios mercantis, solo interior, embaixadas, consulados. Conceitos físicos com adequações
jurídicas, reguladas pelo Direito Internacional Público.

(3) Governo: conjunto institucional de funções necessárias à manutenção da ordem fática e


jurídica do Estado.

Formas de Expressões Monarquia Governo de um só


Aristocracia Governo dos melhores
Governo em Puras
Democracia Governo do povo
“Política” Expressões Tirania Governo do interesse individual
(Aristóteles) Oligarquia Governo do interesse segmentário
Impuras
Politeia Governo da maioria (excluída a minoria)

Monarquia: forma de governo hereditária e vitalícia, fundamentada na ideia de direito


divino dos reis. Monarquia absoluta: forma de governo ilimitada que se identifica com a
ideia de autocracia (poder absoluto do governante) – Exemplo: Estados Modernos.
Monarquia constitucional: forma de governo limitada em que a Constituição restringe os
poderes do monarca, caracterizando um Estado Democrático – Exemplo: Espanha.

República: forma de governo eletiva e temporária, fundamentada na ideia de soberania


popular. República aristocrática: forma de governo em que direitos políticos são
assegurados para uma parcela da sociedade (permite desigualdades entre os indivíduos) –
Exemplo: Plutocracia grega. República democrática: forma de governo em que direitos
políticos são assegurados à integralidade da sociedade – Exemplo: República Federativa do
Brasil.13

13
A Constituição Federal de 1988 permite a intervenção do cidadão no Estado, de modo direito ou
indireto. O artigo 14 dispõe: A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto
direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: I – plebiscito (consulta
popular anterior à edição de ato legislativo ou administrativo sobre questão de relevância nacional,
cabendo ao povo aceita-lo ou rejeitá-lo); II – referendo (consulta popular posterior a edição de ato
legislativo ou administrativo sobre questão de relevância nacional, cabendo ao povo ratifica-lo ou
rejeitá-lo); III – iniciativa popular (ao processo legislativo).
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Anarquia
Forma de organização social (“autogoverno” ou “desgoverno”) que defende a abolição do
Estado, rejeitando qualquer autoridade política e negando a existência de monopólio do uso
da força na sociedade.

(4) Soberania: elemento fundamental do Estado.

Fundamento da soberania estatal: os indivíduos são a causa material de existência do Estado,


logo, o poder estatal advém deles. O poder do povo (ou soberania popular) é, assim, exercido
pelo Estado, porém resguarda-se o direito do povo de se autogovernar. A autonomia dos
indivíduos fundamenta, nesse sentido, a soberania estatal. Nota-se que a condição humana é,
materialmente, superior ao Estado.

Conceito clássico: a soberania representa independência externa (frente outros Estados) e


autossuficiência interna (garantia de sustentabilidade estatal). Observa-se que: a) ao longo da
história, governos soberanos se confundiram com o próprio Estado, esquecendo-se do
atendimento ao bem comum; b) o conceito clássico não dá conta do processo de globalização
que estreitou as “autonomias nacionais” (como p.ex. no caso da União Europeia).

Conceito contemporâneo: a soberania representa autossuficiência externa, responsabilidade


interna e atendimento a direitos humanos e fundamentais. Trata-se de uma qualidade estatal
limitada ética e juridicamente. Observa-se que atualmente a soberania encontra limitações no
âmbito das relações internacionais, na necessidade de atendimento a direitos humanos e no
regime de cooperação e organização dos Estados em conjunto (como p.ex. no caso das
Nações Unidas).
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08. Formas de Estado

Federais
Simples
Unitários
União pessoal
Estados Perfeitos União real
Compostos Incorporação
Confederação
Outras composições
Estados Imperfeitos

Estados perfeitos: Estados em que possuem povo homogêneo, território determinado,


governo próprio e soberania reconhecida. Exemplo: República Federativa do Brasil.

Estados perfeitos simples: representam um único Estado com elementos constitutivos


completos.

a) Estado federal: em regra, é Estado com um território maior em que não há pluralidade de
governo, havendo, contudo, diferentes níveis de poder em sua Administração Pública.

b) Estado unitário: em regra, é Estado com um território menor em que se percebe uma
grande centralização política, havendo um ou poucos níveis de poder em sua Administração
Pública.

Estado federal Estado unitário


Brasil Uruguai
Estados-membros (unidades federativas) Departamentos
Há divisões internas com autonomia política e Há divisões internas com autonomia
administrativa administrativa

A autonomia de Estados-membros ou departamentos corresponde à margem de liberdade que


possuem frente à Administração Superior do Estado, em regra, determinada constitucionalmente.

Princípio da simetria é um princípio jurídico decorrente da estruturação federativa que exige


uma relação simétrica entre os institutos constitucionais, advindos da Constituição Federal, e as
18

cartas-políticas das unidades federativas (Constituições dos Estados-Membros). As normas


estabelecidas nas Constituições Estaduais do Brasil e nas Leis Orgânicas Municipais possibilitam
a auto-organização limitada pelas competências e finalidades encontradas na Constituição
Federal.

Estados perfeitos compostos: representam a soma ou ligação de Estados completos.

União pessoal: fusão de Estados que se dá em razão das condições pessoais do governante.
É observável em monarquias, diante do problema da hereditariedade, quando p.ex. um rei
morre e não deixa herdeiros, o seu parente mais próximo, rei soberano de outro território
passa a reinar sobre ambos. Exemplo: União Ibérica, período entre 1581 e 1598, na qual
Portugal foi governado pelo Rei Felipe II da Espanha.

União real: fusão de Estados que se dá por interesse político mútuo, visando otimizar
relações internacionais. Exemplo: União de Kalmar, período entre 1397 e 1523, em que se
constituiu o Reino Unido da Dinamarca, Noruega e Suécia, pelo qual os Estados se
unificaram criando uma única personalidade jurídica externa, sob o governo de um único
monarca (de Rainha Margarida I ao Rei Cristiano II).

Incorporação: fusão de Estados, formando um único Estado novo. Pode-se tomar como
exemplo de união incorporada a Grã-Bretanha, porém trata-se de um caso sui generis.
Reino Unido da Grã-Bretanha (Inglaterra, Escócia e País de Gales) e Irlanda do Norte, se
constitui a partir da expansão do Estado Inglês que “incorporou” os demais.

Confederação: ligação maleável de Estados, decorrente de acordo de vontades expresso


(natureza contratual). Não se forma uma única personalidade jurídica externa, havendo
liberdade para cada um dos Estados agir sozinho no plano internacional. Há direito de
secessão, ou seja, há possibilidade de um dos Estados deixar a confederação quando julgar
interessante para si. Exemplo: Comunidade dos Estados Independentes (CEI), organização
comunitária formada após o fim da URSS por 11 Estados (Armênia, Azerbaijão,
Bielorrússia, Cazaquistão, Quirquistão, Moldávia, Rússia, Tajiquistão, Turcomenistão,
Ucrânia e Uzbequistão).
19

Federação Confederação
Brasil CEI
Estados-membros (unidades federativas) Estados-membros (unidades políticas)
Autonomia Soberania
Nacionalidade única Pluralidade de nacionalidades
Constituição (direito constitucional) Tratado (direito internacional)
Pacto federativo (cláusula pétrea) Direito de secessão
Decisão política por maioria Decisão política por unanimidade

Movimentos separatistas são manifestações de poder que reivindicam o direito de secessão, no


âmbito de uniões políticas rígidas, fundamentando-se no direito humano de “autodeterminação dos
povos”. Exemplo: Estado Espanhol vs. Catalunha.

Outras formas de composição de Estados

URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas): Estado perfeito composto, existente
entre 1922 (decorrente da Revolução Russa de 1917) e 1991 (fim da Guerra Fria).
Constitucionalmente, se constituía como federação, contudo, garantia o direito de secessão a
suas unidades componentes (característica de confederação). Poder Executivo: Conselho de
Ministros. Administração Superior e Chefia de Estado: Partido Comunista Soviético. Poder
Legislativo: Soviete Supremo. Poder Judiciário: Supremo Tribunal e Comitê de Supervisão
Constitucional.

UE (União Europeia): Estado perfeito composto sui generis com origem no Tratado de
Roma (1958). Não se trata de um posicionamento uníssono na doutrina que seja um Estado.
Constituída a partir do Tratado de Maastricht (1993), seus 27 membros são Estados
soberanos que cooperam em áreas estratégicas para atingir o bem comum. 14 Soberania
“mitigada”: os cidadãos dos Estados-membros são, simultaneamente, cidadãos europeus, o
que lhes confere liberdades de participação e de autonomia. Política monetária: 19 Estados-
membros constituem a Zona do Euro (área de moeda comum). Poder Executivo: Comissão
Europeia. Administração Superior: Conselho Europeu (Cimeira de Chefes de Estado). Poder
Legislativo: Parlamento Europeu e Conselho da UE. Poder Judiciário: Tribunal de Justiça
Europeu. Instituições democráticas: Tribunal de Contas e Banco Central Europeus.

14
“Brexit”: em referendo realizado em 24/06/2016, a maioria dos cidadãos do Reino Unido da Grã-
Bretanha e Irlanda do Norte votou pela saída do Estado da UE, dando-se início ao processo de saída
com previsão mínima de dois anos.
20

Estados imperfeitos: Estados em que não se observa algum dos elementos constitutivos,
nota-se a ausência de território ou governo ou soberania; o elemento povo está sempre
presente (é causa material do Estado).

Todo Estado apresenta um território determinado? Autoridade Palestina é uma instituição


estatal que governa partes da região da Cisjordânia e da Faixa de Gaza. É responsável pela
segurança interna e externa de áreas urbanas e pelo controle civil de áreas rurais. A
fragmentação do território palestino deu-se entre as décadas de 1940 e 1970, ainda hoje,
persiste o estado de conflito entre Israel e a Autoridade Palestina.

Todo Estado possui governo próprio? Estado Livre Associado de Porto Rico constitui um
território sem personalidade jurídica vinculada aos Estados Unidos da América, localizado
no mar do Caribe. Administrado por um Governador, em consulta popular, em 2012,
aprovou-se sua anexação como unidade da federação do Estado norte-americano, todavia, a
situação ainda está pendente de aprovação pelo Congresso dos EUA.

Todo Estado é dotado de soberania? Kosovo, localizado na região das extintas URSS e
Iugoslávia, em 2008, declarou-se como República parlamentarista independente. Obteve o
apoio internacional dos EUA, contudo, possui sua existência questionada pela Sérvia. A
Rússia declara publicamente a intenção de usar o poder de veto que possui como estratégia
de prevenção à possibilidade de reconhecimento oficial pelas Nações Unidas. O Comitê
Olímpico Internacional, por sua vez, em 2014, o reconheceu, permitindo sua participação
nas Olimpíadas Rio 2016.

ESTADO ISLÂMICO: trata-se de um autodeclarado califado (regime político-religioso


orientado pela Lei Islâmica Sharia e por preceitos corânicos) que fixou território entre o
Iraque e a Síria. Reivindicando o domínio sobre um vasto território entre esses dois países,
instituiu organização terrorista que assume a autoria de atentados terroristas na região e na
Europa.15

SÍRIA: formalmente uma República aristocrática, está em guerra civil desde 2011, em
decorrência dos movimentos da Primavera Árabe, que sofreram forte repressão estatal,

15
Em 09/07/2017, o primeiro-ministro iraquiano declarou vitória sobre o Estado Islâmico em Mossul,
segunda maior cidade do Iraque e último grande reduto urbano controlado pelo califado.
21

causando uma convulsão social entre as diversas etnias e correntes políticas internas. A partir
de 2013, com a expansão territorial do Estado Islâmico, a guerra civil ganhou proporções
insustentáveis e o fluxo migratório de pessoas fugindo do conflito passou a ser cada vez mais
intenso.

09. O Estado na História: Origem e Evolução da Realidade “Estado”

(a) Teoria da origem familiar: o Estado nasce a partir da ampliação das famílias. Corrente
matriarcal: predomina a figura da matriarca (ex. sociedades primitivas). Corrente patriarcal:
predomina a figura do pater famílias (ex. Roma). Objeção: diz-se que desconsidera outros
contextos políticos em que o Estado não surge da ampliação de um modelo familiar, como
p.ex. na realidade brasileira.

(b) Teoria da formação natural: o Estado surge das necessidades naturais dos indivíduos.
Identifica-se a formação estatal como evento natural (não ordenado), tendo inspiração em
Aristóteles e na sua defesa de que o ser humano é um ser político, isto é, que, naturalmente,
tende a se estabelecer em grupos sociais. Objeção: pondera-se que, mesmo agregando fatores
políticos e sociais à origem estatal, desconsidera realidades em que o fator territorial não é
preponderante para o surgimento do Estado, como p.ex. na realidade estadunidense.

(c) Teoria da origem violenta: o Estado surge do conflito, das disputas e das guerras por
territórios. Tem inspiração em Charles Darwin e na noção de que a evolução das espécies se
dá a partir da luta pela sobrevivência. Objeção: Fustel de Conlanges, em “A Cidade Antiga”
(1864), afirma que as instituições estatais se formam a partir dos interesses da sociedade
(realidade prática), não da violência.

(d) Teoria da formação histórica: o Estado surge a partir da realidade histórica (pela
observação de fatos históricos vê-se o surgimento estatal). Objeção: entende-se que apresenta
uma tipologia muito limitada, desconsiderando certas hipóteses de formação, e até mesmo
combinações entre os modos constatados.
22

Modo(s) de formação Características Exemplo


Estados completamente Estado de Israel
Por Inovação
novos são criados (Resolução das Nações Unidas)
Originário Alemanha ocidental e
Estados surgem a partir de
Por Conflito Alemanha oriental
guerras
(pós-Segunda Guerra Mundial)

Treze Colônias  EUA


Unidades políticas se unem
Uniões
e formam um Estado
URSS  Armênia, Azerbaijão,
Secundário Unidades políticas se Bielorrússia, Cazaquistão,
Fracionamentos segmentam e formam Quirguistão, Moldávia, Rússia,
Estados Tajiquistão, Turcomenistão,
Ucrânia, Uzbequistão, etc.
Estados surgem a partir da
Derivado Colonização dominação de outras Brasil
unidades políticas

(e) Teoria da formação jurídica: o Estado surge a partir de atos normativos positivos.
Percebe-se a filiação a doutrinas positivistas de pensadores como Friedrich Savigny e Hans
Kelsen. Objeção: critica-se por desconsiderar qualquer outro tipo de formação estatal que não
se dê a partir de marcos históricos estanques e pela existência de Estados em que não há
Constituição (como p.ex. Israel) ou em que a Constituição não esgota a matéria constitucional
(como p.ex. EUA).

Momento Marco histórico da formação estatal;


Constituição
inicial Nascimento jurídico do Estado.
Marco comprobatório da existência do Estado perante a
Momento
Reconhecimento comunidade e o direito internacional;
definitivo
Validação jurídica do Estado.

(f) Teoria da origem contratual: o Estado surge a partir de um pacto social em que cada
indivíduo assente (concorda) que é necessária a sua existência; a partir desse acordo de
vontades, constitui-se o Estado; fundamentado em bases racionalistas.

Origem Obra Principais ideias


23

A sociedade é tida como “perfeita” (parte-se de


Hugo “Sobre a Lei um modelo ideal); Introduz-se a concepção de
Grócio Holanda de Guerra e “pacto social” ao afirmar que o Estado é fruto de
(1583-1647) Paz” (1625) um acordo de vontades entre “homens bons”
para se defender de “homens maus”.
Pressupõe que o homem em estado de natureza é
“Leviatã ou “mau”, assim, naturalmente, vive-se em
Matéria, permanente caos (o que daria causa ao
Thomas Forma e Poder extermínio da espécie). Cria-se o “pacto social”
Hobbes Grã-Bretanha de um Estado para impedir o “caos”. A autoridade estatal
(1588-1679) Eclesiástico e aparece para conter os impulsos do homem e o
Civil” (1651) consenso social se dá com a cessão do poder (e
de direitos) do indivíduo para o Estado.
Pressupõe que o homem em estado de natureza é
“gregário” e necessita viver em grupo. A
propensão ao conflito, eventualmente, faz parte
de sua natureza, porém, o anseio por liberdade,
igualdade e equilíbrio é preponderante. Cria-se o
“pacto social” para preservar e reestabelecer o
“Dois Tratados equilíbrio; o consenso social se dá pela
John Locke sobre o representatividade: o ser humano possui direitos
Grã-Bretanha
(1632-1704) Governo” indisponíveis que constroem uma esfera jurídica
(1681) que não pode ser atacada (pelo Estado e por
outros indivíduos). A sociedade “empresta”
poder ao Estado, todavia, se a autoridade política
não satisfizer as obrigações constantes do “pacto
social” deve ser substituída. Inspirou o
denominado “direito de revolução”.
Pressupõe que o homem em estado de natureza é
um “bom selvagem”, essencialmente, “puro”,
que, conforme se sociabiliza e sua vida fica mais
complexa, adquire defeitos, surgindo, assim, os
Jean- conflitos. Partindo desta ideia, cria-se uma
Jacques hipótese própria para a formação estatal pela
(Suíça) “Do Contrato qual o Estado surge como protetor da natureza
Rosseau França Social” (1762) humana. A partir da “vontade geral”, cada
(1712-1778)
indivíduo concorda com a formação do Estado e
opta por fazer o “pacto social”. Critica-se a tese
pelo excesso de idealismo que possui tanto ao
afirmar que todos optariam pelo contrato quanto
ao partir da figura de um homem “solitário”.
A racionalidade do ser humano é a única fonte
de explicação para o surgimento do Estado.
Utiliza-se dos conceitos de “razão pura”
(capacidade humana de reconhecer a
“Crítica da responsabilidade pelos próprios atos e também
Razão Pura” perceber as consequências imediatas deles),
Immanuel (1781) e
Kant Alemanha “razão prática” (capacidade de reconhecer o que
“Crítica da é adequado, e o que não é, ao convívio social) e
(1724-1804) Razão Prática” “imperativo categórico” (regra de conduta,
(1788) advinda da razão prática, que orienta atos
individuais em sociedade). O Estado surge para
elevar o imperativo categórico a um caráter
público, oficial e coercitivo.
24

Experiências relevantes à formação do Estado contemporâneo

Plutocracia Grega: pode-se perceber na Grécia uma gênese teórica da democracia. As


autoridades políticas não detinham caráter divino. Havia uma atividade intelectual intensa
refletindo e questionando sobre as práticas públicas e políticas. Em Atenas, destaca-se a
primeira tentativa de participação de cidadãos no governo da unidade política. Forma sui
generis de democracia, em que não detinham liberdade de participação 16 e liberdade de
autonomia 17 p.ex. os escravos, as mulheres e os estrangeiros. No plano da construção de
pensamento, a Democracia grega “ideal” já apresentava noção de direitos fundamentais.

Império Romano: no âmbito da unidade política romana, iniciou-se a distinção entre o Estado
(poder público) e os indivíduos (sociedade civil). O sentido de direito natural em oposição ao
direito estatal introduziu o debate, até hoje presente, sobre esferas pública, privada e política.

Estado Medieval: remonta ao período em que se estabelece o feudalismo (modo de


organização político-econômica baseada em relações servis). No campo econômico, há o
estabelecimento de classes sociais. No campo político, nota-se uma descentralização do poder
(o senhor feudal limitava-se pelas relações comerciais com outros senhores). No campo
jurídico, há desenvolvimento dogmático (direito romano, direito canônico, direito civil).
Pode-se afirmar que o modelo feudal já se constituía como Estado de Direito, ou seja, aquele
em que há funções normativamente positivadas, assegurando garantias fundamentais, na
forma do sistema institucional estabelecido.

Estado Moderno: remonta ao período em que a estrutura feudal, já esgotada, é substituída por
monarquias. Trata-se de um retrocesso no processo de evolução de pensamento democrático,
uma vez que se percebe uma concentração ilimitada de poder pela autoridade estabilizada. A
união de feudos forma o que se denominou Estado-Nação, isto é, aquele que se funda no
reconhecimento político, jurídico e geográfico de uma comunidade com afinidades culturais
(como língua e hábitos). Os Estados Nacionais eram dinásticos (ampliação de linhagens
familiares), absolutos (o governante exercia o poder de forma irrestrita), confessionais
(apoiados pela Igreja que confirmava a existência da ligação entre o governante e Deus),

16
Liberdade de participação liga-se a direitos políticos (sufrágio universal, direito de votar, garantia
de organização e participação em órgãos públicos) e a cidadania.
17
Liberdade de autonomia liga-se aos direitos fundamentais e a dignidade da pessoa humana.
25

burocráticos (pautados por pactos escritos e dotados de mecanismos jurisdicionais) e


territoriais (delineados por territórios e fronteiras).

Revoluções Liberais: as monarquias absolutistas estavam sob o domínio de governantes


(despóticos e autoritários), responsáveis por legislar, governar e julgar como quisessem, bem
como se centralizava o poder nas mãos de apenas um ator social. Em face aos desmandos das
autoridades políticas, os governados passaram a se insurgir. Afirma-se, nesse contexto, o
iluminismo (movimento responsável por “iluminar” os pensamentos dos indivíduos, a partir
de ideias libertárias greco-romanas que se encontravam “escondidas”). Eclodem, por
conseguinte, revoluções que trazem como inovação a constituição de documentos jurídico-
políticos, que buscam atender aos anseios dos insatisfeitos com o Antigo Regime.

Ingo Sarlet, em “Curso de Direito Constitucional” (2012), leciona: “A ideia de uma constituição
formal, no sentido de uma constituição jurídica ou normativa, como expressão de um poder
constituinte formal, encontrou sua afirmação (teórica e prática) apenas a partir do final do Século
XVIII”.

Documento Ideais
Revolução Gloriosa
Bill of Rights Liberdade, igualdade e propriedade
(1688)
Independência dos Declaração de Liberdade, igualdade e busca da
EUA (1776) Independência felicidade
Revolução Francesa Declaração dos Direitos
Liberdade, igualdade e fraternidade
(1789) do Homem e do Cidadão

10. Modelos Constitucionais de Estado

Estado Liberal: é estabelecido a partir das revoluções burguesas, sendo caracterizado pela
postura não intervencionista (em nítida oposição à postura absolutista). O anseio pelo direito
fundamental à liberdade demonstra a passagem de um Estado Absoluto para um Estado
Mínimo ou Estado-Polícia, que exerce mínimas funções, sendo garantidor apenas de
segurança com vista a assegurar a ordem pública. Modelos constitucionais de Estados
Liberais: EUA (1788) e Emirados Árabes (1971).
26

Estado(s) de Bem Estar: após a Revolução Industrial e as Guerras Mundiais, revelou-se a


necessidade de intervenção de ideologias18 distintas para a resolução das disparidades sociais,
trazidas pela vigência do Estado Mínimo, que correspondia ao primado de uma igualdade
formalista. O não intervencionismo proposto acentuou desigualdades sociais, acarretando a
afirmação da igualmente material como direito fundamental assegurado pelos Estados de
Bem Estar. Dá-se, assim, a passagem de um Estado Mínimo para um Estado Prestador ou
Estado-Providência, que exerce funções de abstenção e de prestação, garantindo, para além
da ordem pública, o atendimento a demandas sociais. Em um contexto de polarização
ideológica, decorrente da Guerra Fria, a ideologia liberal estabelece um Estado “Social” nos
EUA, sob o modelo econômico capitalista. A ideologia socialista, por sua vez, constitui um
Estado “Socialista” na URSS, sob no modelo econômico planificado. Modelos
constitucionais de Estados de Bem Estar: México (1917) e Coréia do Sul (1948).

Estado Democrático de Direito: mesmo com o avanço social proporcionado pela atenção a
questões supraindividuais, na colisão de direitos fundamentais (liberdade vs. igualdade), se
impôs a constituição de um Estado Máximo. A Democracia, como qualidade de modelo
constitucional, tornou possível o aperfeiçoamento estatal, em plano organizacional, para
estabelecer um ambiente em que prevalecem as normas legais, mas também valores éticos e
princípios jurídicos estruturantes. 19 Modelos constitucionais de Estados Democráticos de
Direito: Alemanha (1949) e Brasil (1988).

18
Compreendidas como métodos de interpretação valorativa de ideias, construídos através dos tempos,
que resultam em uma determinada visão de mundo. [v. tópico 15, p. 38.]
19
Esta é, segundo Norberto Bobbio, em “Diário de um século: uma autobiografia” (1998), a
característica do Estado democrático: “indivíduo e Estado não estão mais armados um contra o outro,
mas se identificam na mesma vontade geral, é a vontade de todos que comanda cada um. Na luta entre
liberalismo e socialismo, deflagrada no século XIX e presente ainda hoje, a democracia sempre
representou a salvação do Estado liberal que não quer se transformar no seu oposto e do Estado
socialista que não quer cair na anarquia. Algumas vezes foi invocada como corretivo de um e de outro.
Como tal, também representou o ponto de acordo das tendências opostas. E hoje representa sem
duvida o ponto de chegada da nossa situação”.
27

Modelo Modo de Controle Base


Constitucional Gestão Político Axiológica
Administração em prol Ausência de
Estado
dos interesses do Inexistente princípios éticos
Moderno/Absoluto
detentor do poder universalizáveis
Administração Controle rígido de Princípios
Estado
limitada processos de decisão formalistas e de
Mínimo/Liberal
normativamente política interesse individual
Administração Controle externo de
Estado Princípios de
limitada processos de decisão
Prestador/Social interesse coletivo
finalisticamente política
Controles rígidos,
Administração em prol Princípios éticos de
Estado externos, internos e
dos interesses interesse coletivo e
Máximo/Democrático populares dos processos
constitucionais individual
de decisão política

“Regras do jogo” democrático


Obra: “O futuro da democracia, uma defesa das regras do jogo” (Bobbio, 1984).

(a) Todos os cidadãos que tenham atingido a maioridade, sem distinção de raça, religião,
condições econômicas, sexo, devem gozar dos direitos políticos, isto é, do direito de exprimir
com voto a própria opinião ou eleger quem a exprima por ele;

(b) O voto de todos os cidadãos deve ter peso idêntico, isto é, deve valer por um;

(c) Todos os cidadãos que gozam dos direitos políticos devem ser livres para votar segundo a
própria opinião, formando-a o mais livremente possível, isto é, em uma livre concorrência
entre grupos políticos organizados, que competem entre si para reunir reivindicações e
transformá-las em deliberações coletivas;

(d) Todos os cidadãos devem ser livres ainda no sentido em que devem ser colocados em
condição de terem reais alternativas, isto é, de escolher entre soluções diversas;
28

(e) Para as deliberações coletivas e para as eleições dos representantes deve valer o princípio
da maioria numérica, ainda que se possa estabelecer diversas formas de maioria (relativa,
absoluta, qualificada), em determinadas circunstâncias previamente estabelecidas;

(f) Nenhuma decisão tomada pela maioria deve limitar os direitos da minoria, em modo
particular o direito de tornar-se, em condições de igualdade, maioria.

11. Democracia e seus sentidos

Estado Democrático de Direito brasileiro: a Constituição Federal de 1988 indica que o


Brasil se constitui como um Estado Democrático de Direito, sendo explicitada ao longo do
texto constitucional a adoção ordem jurídica pela qual a autoridade pública faz a tomada de
decisões políticas com o objetivo de atender ao bem comum.

Estado Constitucional é aquele se estrutura a partir de funções definidas na Constituição,


sendo garantidor de liberdade e igualdade, sob a égide do regime democrático. A Democracia,
como regime político vigente em um Estado Constitucional, torna viável um ambiente em que
Política, Ética e Direito orientam a integralidade das relações públicas e privadas.

Sentidos da Democracia: a Democracia é identificada como qualidade de Estado (Estado


Democrático de Direito), forma de Governo (governo do povo), sinonímia da ideia de
República (governo eletivo e temporário) e, ainda, como sistema e regime governamentais.

Democracia direta: sistema em que os indivíduos discutem e votam diretamente as


principais questões de interesse do Estado. Exemplo: Plutocracia grega, na qual as
assembleias reuniam a população das unidades políticas em local (Ágora) onde as normas e
decisões eram deliberadas e estabelecidas.

Democracia indireta ou representativa: sistema em que os indivíduos votam e elegem


mandatórios que os representaram na discussão das principais questões do Estado.
Exemplo: República Federativa do Brasil, na qual os cidadãos, no plano constitucional, têm
os seus direitos fundamentais assegurados através de vereadores (esfera local), deputados
estaduais (esfera regional) e deputados federais (esfera nacional) que se comprometem a
atender as demandas de seus eleitores.
29

Regime democrático: regime político em que detentor do poder o exerce de modo limitado
pela existência de uma pluralidade de estruturas de poder e em prol de interesses individuais e
coletivos do povo. Assegura eleições livres, liberdade de pensamento e respeito a direitos
humanos e fundamentais, bem como possibilita a organização política e expressão de
ideologias distintas. Distingue-se dos seguintes regimes antidemocráticos:
 Absolutismo: regime em que o detentor do poder o exerce de modo absoluto, isto é, independente
de outra estrutura de poder e dos interesses individuais e coletivos da sociedade.
 Autoritarismo: regime no qual as normas jurídicas ou constitucionais são manipuladas pelo
detentor do poder no seu interesse político.
 Ditadura: regime no qual há participação popular limitada ou ela é inexistente. O poder, em regra,
manifesta-se em uma única instância.
 Totalitarismo: regime em que o detentor do poder o exerce de modo a controlar e regular tanto a
esfera pública quanto a esfera privada, não reconhecendo limites à sua autoridade.

12. Fins, Competências, Funções e Poderes Estatais

Fins do Estado

1ª Corrente: Não existe uma finalidade própria no Estado. O fim do Estado é, essencialmente,
um produto ideológico. Valores éticos não são objetos de preocupação do Direito, logo, a
finalidade estatal não é de interesse do cientista jurídico. Objeção: diz-se que ter ciência das
razões e motivações da constituição e dinâmica do Estado é importante para o entendimento
das relações dos indivíduos com ele.

2ª Corrente: O Estado é um fim em si mesmo. A finalidade estatal é o seu próprio


fortalecimento, manutenção e sustentabilidade. Entende-se que o Estado possui uma única
função, qual seja: se autossustentar. Objeção: pondera-se que o indivíduo é encarado como
mero instrumento do Estado, há um aviltamento do ser humano em detrimento da autoridade
política, abrindo possibilidade a regimes antidemocráticos.

3ª Corrente: O Estado é um meio de realização de direitos. O Estado é um meio e cada


indivíduo dentro dele é sua finalidade. A finalidade estatal é garantir a realização de direitos
da pessoa, a unidade política é apenas um modo de convívio social do agrupamento de
indivíduos. É a visão eticamente mais adequada e democraticamente mais aceita.
30

Fim Estatal vs. Competência Estatal


A finalidade do Estado não se confunde com a sua competência. Finalidade é uma questão
valorativa ao passo que competência é uma questão ideológica. O fim do Estado Democrático
é invariável: sempre visa o bem comum. Já os diversos caminhos pelos quais o Estado
percorre para alcança-lo (meios variáveis) determina(m) sua(s) competência(s).

Tipos de Estado em relação à sua competência

Estado Abstencionista: realiza poucas atribuições, deixando a maior parte das competências
(atividades essenciais) à esfera particular ou privada – intervenção mínima estatal. Ideologia
liberal.

Estado Intervencionista: avoca para si muitas atribuições, possuindo diversas competências


(realizando muitas atividades essenciais) e interferindo em inúmeros setores da sociedade.
Ideologia socialista.

Estado Supletivo: caracteriza-se pela divisão de competências entre o Estado e os particulares


de maneira às questões básicas ficarem sob responsabilidade estatal e às questões acessórias
ficarem sob a guarda privada. A maior parte dos Estados Democráticos é supletiva.

Estado Complexo: mescla políticas públicas de caráter socialista (predomínio de interesses


coletivos) e liberal (predomínio de interesses individuais).

Funções Estatais Estruturais

Função estrutural de segurança: função múltipla expressa em segurança pública e segurança


jurídica. A segurança pública internamente é expressa pelo exercício pelos órgãos policiais e
externamente pelas Forças Armadas. A segurança jurídica possibilita aos indivíduos saber de
antemão o que se pode fazer no convívio social, dando-lhes ciência sobre as consequências
impostas frente a seus atos.

Função estrutural de desenvolvimento: função variável e dependente das opções políticas de


cada Estado. Nos Estados Democráticos de Direito, corresponde à promoção da dignidade da
pessoa humana e dos direitos fundamentais que lhe são inerentes, pautando-se no conjunto
31

ordenado de valores e garantias constitucionais e assegurando o direito das gerações presentes


e futuras (sustentabilidade).

Funções Estatais Potestativas e PODERES DE ESTADO

Função potestativa legislativa ou legiferante: função de elaboração, modificação e revogação


de Direito “novo”, válido tanto para o Estado quanto para os indivíduos.

(I) Poder Legislativo


Refere-se à noção de Parlamento (assembleia de representação). Na esfera federal, possui
como principal característica ser bicameral (duas câmaras Casas Legislativas) – fato comum
na maioria dos Estados Democráticos. No Brasil, o Congresso Nacional compreende a
Câmara dos Deputados (513 representantes do povo) e o Senado Federal (81 representantes
das unidades federativas). Torna o processo legislativo mais seguro (uma vez que uma casa
revisa a outra) e representa descentralização de poder. Em âmbito estadual, municipal e
distrital, o sistema é unicameral, senão vejamos:
Unidade da Federação Órgão Legislativo Componentes
Estados Assembleia Legislativa Deputados Estaduais
Distrito Federal Câmara Distrital Deputados Distritais
Municípios Câmara Municipal Vereadores

Função potestativa judiciária ou jurisdicional: função de julgamento de conflitos de direitos


ou interesses, de indicação da interpretação adequada do Direito e da distribuição da justiça
aos indivíduos.

(II) Poder Judiciário


Refere-se à noção de Jurisdição (dicção do Direito). Órgão técnico responsável por
estabelecer a justiça no Estado. Aos seus membros (ingressantes por concurso público) são
asseguradas as seguintes garantias (privilégios que asseguram o pleno exercício e a autonomia
funcional): vitaliciedade (o juiz só pode perder o cargo mediante sentença judicial
irrecorrível), inamovibilidade (o juiz só pode ser removido do cargo, sem o seu consentimento,
mediante decisão motivada, assegurada a ampla defesa) e irredutibilidade de subsídios (a
remuneração do juiz não pode ser reduzida).
32

Função potestiva executiva ou administrativa: função de administração da coisa pública, de


aplicação do Direito e de adoção de políticas para o atendimento de providências efetivas à
realização do bem comum.

(III) Poder Executivo


Refere-se à noção de Administração Pública (gestão da coisa pública). Em Estados
presidencialistas, o Presidente é um agente político com uma grande gama de competências,
sendo responsável pela Chefia de Governo. A Chefia do Executivo no Brasil se apresenta do
seguinte modo:
Unidade da Federação Chefe do Executivo
União Presidente da República
Estados Governador do Estado
Distrito Federal Governador do DF
Municípios Prefeito Municipal

INSTITUIÇÕES DEMOCRÁTICAS
Os Tribunais de Contas, a Defensoria Pública e o Ministério Público não integram nenhum
dos Poderes de Estado. São instituições democráticas, constitucionalmente previstas e dotadas
de autonomia e funções próprias.

13. Separação (funcional) de poderes e Sistemas de Cisão

O poder do Estado é uno e indivisível; o que pode ser separado são as funções estatais. O Estado
para realizar suas funções e atingir suas finalidades necessita de órgãos e instituições democráticas.
Assim, quanto menos estruturas institucionais, maior será a concentração de poder.

Constituição Federal de 1988: são Poderes da União (Poderes de Estado), independentes e


harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário (Artigo 2º). A separação de
poderes é cláusula pétrea (limitação material ao poder constituinte derivado), sendo
inconstitucional qualquer proposta de emenda constitucional com intenção de aboli-la (Art. 60,
§ 4º, III, CF).20

20
Artigo 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: [...] § 4º Não será objeto de
deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto,
secreto, universal e periódico; III - a separação dos Poderes; IV - os direitos e garantias individuais.
33

 Distinção: distinguem-se funções que necessariamente precisam estar separadas;


 Autonomia: as funções distintas devem ser independentes na sua execução típica;
 Harmonia: deve haver uma interdependência entre as funções realizadas autonomamente.

Função típica Manifestações atípicas


Legislativa e O Senado julga o Presidente da República nos crimes de
Poder fiscalizatória responsabilidade (função jurisdicional);
Legislativo (contábil, financeira O Congresso Nacional instaura Comissão Parlamentar
e orçamentária) de Inquérito para investigar ato ilícito (função executiva).
Poder O Presidente da República edita medidas provisórias que
Administrativa
Executivo possuem força de lei (função legiferante).
Poder Os Tribunais concedem licenças e férias aos magistrados
Jurisdicional
Judiciário e seus serventuários (função administrativa).

Sistema de freios e contrapesos (“checks e balances”): refere-se às interferências de um


Poder em outro em nome do estabelecimento de um equilíbrio entre os Poderes.
Executivo → Executivo participa do processo legislativo tanto na iniciativa de
Legislativo proposições quanto nos atos de sanção ou veto.
Legislativo → Rejeição de veto do Executivo pelo voto da maioria absoluta dos
Executivo membros do Congresso Nacional.
Judiciário → Declaração da inconstitucionalidade de leis por Tribunais e juízes.
Executivo

Sistemas de cisão de poderes

Montesquieu (1689-1755), em sua obra “O Espírito das Leis” (1748), partindo de lições
aristotélicas, identificou três funções estatais distintas (legislativa, jurisdicional e executiva),
exercidas por três órgãos distintos, autônomos e harmônicos entre si. A partir daí, certos
sistemas foram catalogados:

Mononuclear Poder Absoluto


Bipartição Poder Executivo (Função Executiva + Função Jurisdicional)
Poder Legislativo (Função Legislativa)
Poder Absoluto (Função Executiva + Função Legislativa)
Poder Técnico (Função Jurisdicional)
34

Tripartição Poder Judiciário


Poder Legislativo
Poder Executivo
Tetrapartição Poder Judiciário
Poder Legislativo
Chefia de Governo (Função Executiva e Administração Superior)
Chefia de Estado (Representação Externa)
Pentapartição Poder Judiciário (Função Jurisdicional)
Parlamento (Função Legislativa)
Poder Executivo (Função Executiva)
Chefia de Governo (Administração Superior)
Chefia de Estado (Representação Externa)
Hexapartição Poder Judiciário (Função Jurisdicional)
Tribunal Constitucional (Interpretação e Aplicação Constitucional)
Poder Legislativo (Função Legislativa)
Poder Executivo (Função Executiva)
Chefia de Governo (Administração Superior)
Chefia de Estado (Representação Externa)

14. Sistemas de Governo

Sistema diretorial: sistema suíço em que as funções executivas e administrativas são


exercidas por um grupo de pessoas (Conselho Federal), mediante decisão colegiada, eleito
de modo indireto pelo Poder Legislativo, ao qual ficam subordinadas. Sistema vigente na
Suíça.

Sistema parlamentarista: sistema em que as funções executivas e administrativas são


exercidas pelo Poder Executivo (Gabinete de Governo), mediante decisão colegiada, eleito
de modo indireto pelo Chefe de Governo (Primeiro-Ministro), observada manifestação do
Poder Legislativo (Parlamento). Sistema decorrente da Revolução Gloriosa.
35

Características do parlamentarismo

(a) Organização dualista: âmbito de governo (área de dissenso) e âmbito estatal (área de
consenso) encontram-se separados. A Chefia de Estado possui atribuições estratégicas, como
o comando das Forças Armadas, o exercício de relações diplomáticas, e a prerrogativa
política do poder de dissolução do Parlamento. A Chefia de Governo, por sua vez, é
responsável pela Administração Superior e todas as questões cotidianas do Estado e da
sociedade, coordenando o Executivo.

(b) Órgão governamental colegiado: o órgão que exerce a Chefia de Governo é colegiado,
isto é, ele é formado por um grupo de pessoas e não por um só representante (característica
do presidencialismo). Ele advém da união de um grupo de parlamentares (Gabinete de
Governo) que toma todas as decisões políticas em conjunto. O Gabinete de Governo é
composto por Ministros de Estado, sendo o Primeiro-Ministro, o líder deste grupo e
possuindo a prerrogativa de desempatar eventual conflito nas decisões coletivas.

(c) Funcionamento: os parlamentares são eleitos pelo povo (voto direto) e o Gabinete de
Governo é composto a partir do Parlamento (voto indireto). O Primeiro-Ministro é, em
regra, o líder do partido que obtém maioria de votos no Parlamento e é o primeiro a integrar
o Gabinete. Pode haver eleição para Primeiro-Ministro (voto direto). Os demais Ministros
de Estado são indicados pelo Primeiro-Ministro, devendo ser aprovados pela maioria
parlamentar. Todos os Ministros decidem em conjunto e todas as decisões têm de ser
aprovadas pelo Parlamento para serem executadas.

(d) Parlamento vs. Gabinete de Governo: em caso de desacordo grave ou de corrupção, o


impasse é resolvido, primeiramente, por interpelação (paralização proposta por um
parlamentar), seguida de debates públicos (manifestação da opinião pública, idealmente feita
por plebiscito) e, posteriormente, decisão do Parlamento (moção). Três moções são
possíveis: a) quando a opinião pública está a favor do Gabinete e contra o Parlamento: “não
cai o Gabinete” – o Parlamento dá uma moção de confiança; b) quando a opinião pública
está a favor do Parlamento e contra o Gabinete: “o Gabinete cai” – o Parlamento dá uma
noção de desconfiança; c) quando a opinião pública está a favor do Gabinete e contra o
Parlamento, e mesmo assim ele emite uma moção de desconfiança, a Chefia de Estado
vale-se da prerrogativa de dissolução.
36

Sistema semipresidencialista: sistema em que as funções executivas e administrativas são


exercidas pelo Poder Executivo, de modo compartilhado, entre a Chefia de Governo
(Gabinete de Governo) e a Chefia de Estado (Presidente), ambos responsáveis pela
Administração Superior.

Sistema presidencialista: sistema em que as funções legislativa, administrativa e


jurisdicional são exercidas por Poderes de Estado distintos, sendo o Poder Executivo, a
Chefia de Governo e a Chefia de Estado responsabilidade do Presidente. Sistema decorrente
da Independência Norte-Americana.

Características do presidencialismo

(a) Organização monista: há uma unidade no Poder Executivo, o Chefe de Estado é


também Chefe de Governo. Os Ministros de Estado são subordinados a ele.

(b) Separação entre Governo e Legislativo: poucas decisões do Presidente, acerca da


Administração Superior, passam por aprovação do Poder Legislativo – destacam-se casos
de guerras e medidas provisórias de matéria orçamentária.

(c) Impedimento: a incompetência do Presidente não impede o seu exercício; o impedimento


presidencial só ocorre em casos extremados como o cometimento de um crime comum (que
qualquer pessoa poderia cometer) ou crime de responsabilidade (cometido somente no
exercício de função, definido pela Lei 1.079/1950).21

Presidencialismo Parlamentarismo
Independência dos Poderes Interdependência dos Poderes
Chefia una Chefia colegiada
Mandatos por prazo certo Mandatos indeterminados
Responsabilidade perante o povo Responsabilidade perante o Parlamento

21
Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a
Constituição Federal e, especialmente, contra: I - a existência da União; II - o livre exercício do
Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das
unidades da Federação; III - o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais; IV - a segurança
interna do País; V - a probidade na administração; VI - a lei orçamentária; VII - o cumprimento das
leis e das decisões judiciais. Parágrafo único. Esses crimes serão definidos em lei especial, que
estabelecerá as normas de processo e julgamento.
37

Impeachment
É o processo cabível no caso de cometimento de crimes de natureza político-administrativa.
Apresenta um procedimento bifásico:
a) Juízo de admissibilidade na Câmara dos Deputados: feita a acusação (por qualquer
cidadão no gozo de seus direitos políticos), a Câmara pode, por maioria qualificada de 2/3 de
seus membros, admiti-la, autorizando a instauração do processo de impedimento;
b) Julgamento no Senado Federal: autorizado pela Câmara, o Senado instaurará o processo
(presidido pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal) e procederá ao julgamento. A
condenação é proferida por 2/3 dos senadores. Condenado pelo Senado Federal, o Presidente
da República sofrerá, sem prejuízo de outras sanções judiciais, a perda do cargo e a
inabilitação para o exercício de qualquer função pública por oito anos.

Impeachment de 1992
01/06/92 Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI mista) apura negócios ilícitos e tráfico de
influências na Presidência da República
21/08/92 Manifestação da União Nacional dos Estudantes (UNE)
24/08/92 Relatório da CPI indica envolvimento do Presidente em atos ilícitos
26/08/92 CPI indica a prática de crime pelo Presidente e pela Primeira-Dama
28/08/92 Procurador-Geral da República (MPU) aponta a prática de crimes no caso
01/09/92 Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)
apresentam o pedido de impedimento presidencial
29/09/92 Câmara dos Deputados aprova a abertura do processo (441 a 33 votos)
01/10/92 Senado Federal instaura o processo de impedimento
02/10/92 Afastamento do Presidente; Vice-Presidente assume interinamente
29/12/92 Senado Federal inicia o julgamento do impeachment; Presidente renuncia ao cargo por
meio de uma carta lida por seu advogado em plenário
30/12/92 Fernando Collor é condenado à perda do mandato e à inelegibilidade por oito anos (76
a 3 votos)
O Vice Itamar Franco assume a Presidência da República

Eventos posteriores
Abr/93: através de um plebiscito, o eleitorado brasileiro afirmou a opção pelo sistema de governo
presidencialista;
Dez/93: o Superior Tribunal de Justiça (STJ) mantém Fernando Collor inelegível e inapto ao
exercício de cargos e funções públicas;
Dez/94: o Supremo Tribunal Federal (STF) absolve o Presidente impichado da acusação de corrupção
passiva;
Ago/98: o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nega o pedido do Ex-Presidente para concorrer às
eleições presidenciais;
Abr/14: o STF julga última ação movida contra Fernando Collor, absolvendo-o em face da prescrição.
38

Impeachment de 2016
01/12/15 Presidência da Câmara dos Deputados aceita pedido de impedimento presidencial
apresentado por Hélio Bicudo, Janaína Paschoal e Miguel Reale Jr.
08/12/15 STF suspende o processo objetivando analisar o seu rito constitucional
11/12/15 Presidenta pleiteia no STF a anulação do processo; MPU ingressa com ação
questionando diversos pontos da Lei 1.079/1950
15/12/15 Partidos de oposição defendem a legalidade do processo no STF
16/12/15 Ação da Presidenta é julgada improcedente
17/12/15 STF se posiciona pela possibilidade do Senado Federal eventualmente recusar a
abertura de um processo de impedimento, mesmo após a autorização da Câmara dos
Deputados
16/03/16 STF entende que o Senado não pode instaurar um processo próprio de impedimento
17/03/16 Comissão Especial é instaurada na Câmara dos Deputados para analisar o pedido de
impedimento
06/04/16 Relatoria da Comissão Especial apresenta parecer contrário à continuidade da
Presidenta no governo
11/04/16 Comissão Especial, por maioria, se posiciona pela aprovação da abertura do
procedimento na Câmara
14/04/16 STF recusa pedidos de suspensão e anulação da votação
17/04/16 Câmara dos Deputados aprova a abertura do processo (367 a 137 votos)
18/04/16 Presidência da Câmara entrega à Presidência do Senado processo com 12.044 páginas
22/04/16 Comissão Especial é instaurada no Senado para analisar o processo de impedimento
presidencial
06/22/16 Comissão Especial, por maioria (15 a 05 votos) se posiciona pelo seguimento do
processo de afastamento da Presidenta
09/12/16 Presidência da Câmara dos Deputados anula a votação de 17/04/16 (voltando atrás
horas depois)
11/05/16 STF nega pedido de anulação do processo formulado pela Presidência da República
12/05/16 Senado Federal instaura o processo de impedimento
12/05/16 Afastamento da Presidenta; Vice-Presidente assume interinamente
25/08/16 Senado Federal inicia o julgamento do impeachment
29/08/16 Presidenta se defende em plenário do Senado e classifica o processo como um golpe ao
Estado Democrático de Direito
31/08/16 Dilma Rousseff é condenada à perda definitiva do cargo (61 a 20 votos), mas mantém
sua elegibilidade (42 a 36 votos)
O Vice Michel Temer assume a Presidência da República

15. Doutrinas Políticas Contemporâneas e Partidos Políticos

Doutrinas político-econômicas

(1) Liberalismo: doutrina que se pauta na construção de um Estado limitado, no sentido de


limitação de poderes e de funções estatais, no qual o interesse geral está submetido à
liberdade cívica, econômica e de consciência individuais.
39

(2) Socialismo: doutrina que se pauta na construção de um Estado interventivo, pelo qual se
busca equilíbrio na distribuição de riquezas, bens e justiça, e se induz a erradicação de
estratificações e segmentações sociais.

(3) Social-Democracia: doutrina que se pauta na defesa da concepção de que as decisões


políticas devem atender a promoção de justiça social, dentro de uma lógica econômica que
assegure liberdade de mercado e de consumo, entendendo a democracia tanto como
qualidade do Estado quanto sistema de governo.

Doutrinas e correntes político-partidárias

Direita Esquerda
Doutrina que, ideologicamente, aceita Doutrina que, ideologicamente, defende a luta de
hierarquias e desigualdades sociais como classes e a supressão das hierarquias e
fenômenos sociais humanos inevitáveis. desigualdades sociais existentes.
Neoliberalismo(s) Novas Esquerdas
Correntes que, em linhas gerais, mesclam, Correntes que, em linhas gerais, mesclam,
respectivamente, posicionamentos de respectivamente, posicionamentos de esquerda,
direita, liberais e social-democratas. socialistas e social-democratas.

Em um cenário republicano democrático, o PARTIDO POLÍTICO é a pessoa jurídica de


direito privado que se constitui com o objetivo de dominar e exercer o poder político, no
âmbito dos Poderes de Estado, a partir da defesa de uma ideologia ou doutrina, no interesse
de uma parcela da população (sua base política).

Funcionalidades do Partido Político


V.O. Key Jr. (1908-1963), cientista político estadunidense;
Obra: “Política, Partidos e Grupos de Pressão” (1942).

No eleitorado: simplificação de escolhas para o eleitor, redução dos custos de informação,


educação política dos cidadãos, geração de símbolos de identificação, e mobilização para
participação cidadã na política.

Como organização: recrutamento de lideranças políticas, ocupação de postos governamentais,


treinamento de elites políticas, e articulação de interesses políticos.
40

No governo: coalizão de maiorias, organização do governo, implementação de objetivos,


atenuação de discordâncias e oposições, responsabilização de ações governamentais, controle
da Administração Pública, e manutenção da estabilidade política.

Sistemas partidários democráticos


Giovanni Sartori (1924-), cientista político italiano;
Obra: “Partidos e sistemas políticos” (1976).

Característica Nível de concorrência


Bipartidarismo Dualismo ideológico Dicotômico
Multipartidarismo de baixa
Pluralismo moderado Moderado
polarização ideológica
Multipartidarismo de alta
Pluralismo polarizado Integral
polarização ideológica
Sistema de partido dominante Ausência de polarização Inexistente

No Brasil, antes da reabertura política (pré-1988), vigeu o bipartidarismo;


Atualmente, vige o pluralismo partidário moderado.

Material didático desenvolvido por Veyzon Campos Muniz,


professor do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Taquara – FACCAT.
*
A reprodução parcial ou total do presente material didático requer a autorização expressa do
autor, titular dos direitos autorais, nos termos do inciso I do artigo 29 da Lei 9.610/1998.
41

ANEXO
Introdução à Teoria da Constituição
Hermenêutica, Aplicabilidade Normativa, Aspectos Estruturais e Materiais

Hermenêutica Jurídica: segmento epistemológico da Ciência do Direito que se ocupa da


interpretação das normas jurídicas, estabelecendo métodos para a sua compreensão.

Interpretação sistemática: operação racional que consiste em atribuir a melhor significação,


dentre várias possíveis a princípios, normas, regras e valores éticos e jurídicos, fixando-lhes o
alcance e superando antinomias, objetivando a resolução de casos concretos.

Conceito constitucional e seus aspectos estruturais e materiais

Constituição, na perspectiva de um Estado Democrático de Direito, representa um documento


jurídico-político que define as normas, regras e princípios que regem as relações públicas e
privadas em seu âmbito. As Constituições, em regra, têm por característica prevalecer sobre
todos os outros documentos normativos existentes em um Estado, dispondo sobre questões
essenciais, como:
a) Afirmação da identidade do ordenamento: Art. 215, § 1º, CF (proteção da cultura popular);
b) Afirmação de direitos fundamentais: Título II, CF (dos direitos e garantias fundamentais);
c) Estabilidade estatal: Art. 60º, § 4º, CF (cláusulas pétreas);
d) Legitimação da ordem jurídica estatal: Art. 3º, CF (objetivos fundamentais);
e) Limitação e controle do poder: Art. 2º (separação de Poderes de Estado);
f) Ordenação do complexo institucional estatal: Art. 1º (união indissolúvel das unidades
federativas);
g) Organização do poder: Título IV, CF (da organização dos Poderes de Estado);
h) Posicionamento dirigente: Art. 170, CF (ordem econômica subordinada à justiça social).

Características da Constituição de 1988


Quanto à forma, é escrita (documento único e solene);
Quanto à estabilidade, é rígida (processo de mudança formal, complexo e rigoroso);
Quanto à extensão, é analítica (é detalhada e com grande quantidade de dispositivos);
Quanto à origem, é popular (possui natureza democrática).
42

Texto constitucional e sua eficácia


Todas as normas constitucionais possuem eficácia no plano abstrato.
Eficácia social: potencialidade das normas de regulação de relações sociais, quando
efetivamente aplicadas;
Eficácia jurídica: capacidade das normas de produção de efeitos em relações jurídicas, em
maior ou menor grau.

Normas constitucionais e a produção de efeitos


Normas correspondem a disposições que modulam ou orientam determinados
comportamentos.

Normas constitucionais são disposições extraídas da Constituição.


Normas constitucionais de eficácia plena: não dependem de regulamentação por documento
infraconstitucional (lei) para gerar efeitos de modo imediato (aplicabilidade direta);
Normas constitucionais de eficácia contida: não dependem de regulamentação por documento
infraconstitucional (lei) para gerar efeitos de modo imediato (aplicabilidade direta), mas
admitem redução de efeitos a partir de ato distinto (eficácia redutível ou restringível);
Normas constitucionais de eficácia limitada: dependem de regulamentação por ato
infraconstitucional (lei) para gerar efeitos, ou seja, a Constituição não induz a produção de
efeitos de modo direto.

Eficácia Verbos “é” ou “são”. Não aparecem expressões do tipo “nos termos da lei” ou de
Plena “acordo com a lei”. Exemplo: Artigo 18, §1º (Brasília é a Capital Federal).
Verbos “é” ou “são”. Aparecem expressões com a palavra “lei” com a ideia de
Eficácia redução (como p.ex. “salvo as hipóteses que a lei estabelecer”). Exemplo: Artigo
Contida 5º, XIII (é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as
qualificações profissionais que a lei estabelecer).
O verbo da norma é conjugado em tempo futuro: “será”, “estabelecerá”.
Aparecem expressões com a palavra “lei” com a ideia de detalhamento (como
Eficácia
p.ex. “nos termos e nos limites definidos em lei"). Exemplo: Artigo 37, VII (o
Limitada
direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei
específica).
43

Normas e mudança constitucional


Mudança constitucional: uma nova ordem jurídico-política é estabelecida.
Regra de aplicabilidade: a nova Constituição revoga a Constituição anterior.

Fenômenos advindos da nova Constituição


I) Recepção: a nova Constituição recebe as normas infraconstitucionais que foram feitas de
acordo com Constituições anteriores, desde que não contrariem materialmente as novas
normas constitucionais. Exemplo: Constituição de 1988 e Códigos Penal de 1940 e Processo
Penal de 1941.
II) Desconstitucionalização: a nova Constituição recebe as normas constitucionais anteriores
como norma infraconstitucional (espécie de rebaixamento). Não ocorreu na experiência
brasileira.
III) Repristinação: a noção Constituição revigora ou revalida normas infraconstitucionais que
as normas constitucionais anteriores haviam revogado.

Eficácia dos direitos fundamentais


A Constituição, através de umas normas, se ocupa da guarnição de seus direitos
fundamentais. O Artigo 5º, § 1º, CF, nesse contexto, estabelece que “as normas definidoras
dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”.

Direitos Direitos de defesa Ausência de intermediação Plena


individuais (exigência de abstenção do Estado) concretizadora justiciabilidade
Direitos Direitos prestacionais Imposição factual da Justiciabilidade
sociais (exigência de prestações estatais) prestação relativa

Justiciabilidade: capacidade de se levar o reconhecimento do direito ou interesse pretendido


à apreciação do Poder Judiciário.
44

ÍNDICE

01. Relevância, Objetivos e Métodos Científicos.................................................................01


02. Teorias Introdutórias ao Estudo do Direito e da Ciência Política...................................02
03. Epistemologia e Política como objeto científico.............................................................03
04. Inter-relações entre Política, Ética e Direito....................................................................08
05. Processo Legislativo........................................................................................................10
06. Teorias Relacionais de Estado e Direito..........................................................................13
07. Conceitos e elementos constitutivos do Estado...............................................................14
08. Formas de Estado............................................................................................................17
09. O Estado na História: Origem e Evolução da Realidade “Estado”.................................21
10. Modelos Constitucionais de Estado.................................................................................25
11. Democracia e seus sentidos.............................................................................................28
12. Fins, Competências, Funções e Poderes Estatais............................................................29
13. Separação (funcional) de poderes e Sistemas de Cisão...................................................32
14. Sistemas de Governo.......................................................................................................34
15. Doutrinas Políticas Contemporâneas e Partidos Políticos...............................................38
ANEXO – Introdução à Teoria da Constituição.......................................................................41

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