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Caso Prático nº2

Operação de Entrada de Ativos

Sandra Cristina Guerra Correia – nº 1703

Planeamento Fiscal
Docente: Jaime Esteves

5ª edição – Mestrado em Fiscalidade


29 de Junho de 2014
Planeamento Fiscal – Operação de Entrada de Ativos

Índice

Índice ................................................................................................................................... 2

Índice de Figuras ................................................................................................................. 3

Lista de acrónimos e siglas ................................................................................................. 4

1. Introdução ..................................................................................................................... 5

2. Enquadramento ............................................................................................................ 6

3. Caso Prático ................................................................................................................. 8

3.1 Enunciado ............................................................................................................. 8

3.2 Resolução ............................................................................................................. 9


3.2.1 Forma de estruturar a operação ...................................................................... 9

3.2.2 Diferimento temporal de tributação – neutralidade fiscal ............................... 10

3.2.3 Dificuldades à concretização da operação .................................................... 12

4. Análise de Jurisprudência .......................................................................................... 13

5. Conclusão ................................................................................................................... 15

6. Bibliografia .................................................................................................................. 16

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Planeamento Fiscal – Operação de Entrada de Ativos

Índice de Figuras

Figura 1: Operação de entrada de ativos (elaboração própria) ....................................... 8

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Lista de acrónimos e siglas

AT – Autoridade Tributária
CAAD – Centro de Arbitragem Administrativa
CPA – Código de Procedimento Administrativo
CPPT – Código do Procedimento e Processo Tributário
CIRC – Código do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Coletivas
LGT – Lei Geral Tributária
TJUE – Tribunal de Justiça da União Europeia

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1. INTRODUÇÃO

Num mercado em constante mutação, as empresas são obrigadas a adaptar-se


continuamente às exigências que lhe são impostas para sobreviver e prosperar. Uma das
condicionantes externas com que as empresas se defrontam é a fiscalidade, a qual nem
sempre respeita o princípio da neutralidade
Este trabalho é realizado no âmbito da disciplina de “Planeamento Fiscal” e tem por
objetivo a resolução de um caso prático, cujo tema abrange o diferimento temporal da
tributação nas operações de reorganização ou reestruturação empresarial, através da
possibilidade de opção pela aplicação do regime especial de neutralidade fiscal previsto no
CIRC.
Este regime de neutralidade fiscal permite às empresas realizarem operações de
reestruturação empresarial, sem efeitos imediatos de tributação, no sentido de se readaptarem
a novas realidades impostas pela globalização e constituírem soluções económicas eficientes.
Na fase inicial é feito o enquadramento breve do conceito de planeamento fiscal, fraude
fiscal, evasão fiscal e da cláusula antiabuso.
No capítulo seguinte é apresentada a resolução do caso prático, evidenciando a forma
de estruturar a operação, as dificuldades à sua concretização (requisitos e limites) e o seu
impacto fiscal.
Por último, é realizada uma análise à jurisprudência existente quer do Tribunal de
Justiça da União Europeia, tribunal administrativo e tribunal arbitral versará essencialmente
pela interpretação da legislação, no sentido de aferir o conceito de “motivo económico válido”
em contraponto com a presunção ou necessidade da prova da existência de objetivo principal a
obtenção de vantagem fiscal e respetivo comportamento abusivo na operação de
reestruturação societária, verificando-se assim os requisitos de aplicação da cláusula
antiabuso.
Para o TJUE existe abuso de um direito quando o seu titular exerça esse direito de
forma fraudulenta para obter vantagens ilegítimas que manifestamente não têm relação com o
objetivo prosseguido pelo legislador comunitário ao conferir esse direito numa situação
específica e concreta.

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2. ENQUADRAMENTO

Planeamento Fiscal (lícito) pode ser caracterizado por um comportamento consciente


adotado pelo sujeito passivo com o objetivo de obter uma vantagem fiscal por eliminação (pelo
método da isenção), redução (pelo método de crédito do imposto) ou diferimento temporal de
impostos. Ocorre em qualquer tipo de imposto e difere da fraude e da evasão fiscal.
A Fraude é caracterizada pela prática de atos ilícitos, por infringirem a lei – contra
legem; e a Evasão é caracterizada pela prática de atos lícitos mas qualificados como
desconformes por serem divergentes ou anómalos da realidade económica, anormais,
1
abusivos – extra legem .
A obtenção da vantagem fiscal decorre à volta de vários atributos (a sua gestão
originará um comportamento de substituição), opções ou alternativas fiscais previstas pelo
legislador, nomeadamente, quanto à forma e local de realização das operações ou atividade,
momento de tributação, categoria e tipo de rendimentos, interposição de sociedades, imóveis e
gestão internacional.
A possibilidade de tomar opções que tem resultado equivalente mas com vantagem
fiscal, decorre do princípio da liberdade contratual, que é algo como um direito que nos assiste,
e como direito pode ser utilizado para fins diferentes para o qual foi conferido.
Esse comportamento pode ser considerado de desvalor e por isso sujeito à censura,
podendo ser considerado abuso de direito. Por consequência existe um conjunto de normas
que pretendem limitar o abuso por parte dos sujeitos passivos.
Nesse sentido, para evitar a possibilidade do uso de planeamento fiscal abusivo, existe
em direito fiscal as cláusulas de antiabuso que se dividem em cláusula geral antiabuso e
cláusula especial antiabuso.
Ao existir limites ao exercício do direito de liberdade contratual, significa que
juridicamente existe um outro princípio superior a defender, que é o princípio da igualdade e da
não discriminação, que consiste em tratar igual o que é igual e diferente o que é diferente.
Se o sujeito passivo usa o seu direito privado (direito de liberdade contratual) de forma
artificiosa e outro sujeito passivo usa o direito da forma prevista pelo legislador, está em causa
o direito de igualdade e para dissipar estes constrangimentos e limitar comportamentos
abusivos e artificiosos, existem as cláusulas anti abuso.
A cláusula geral antiabuso aplica-se a qualquer facto tributário que se verifique os
2
requisitos do art.º 38º nº2 da LGT , quanto ao comportamento (adotado), fim (principal
propósito do comportamento), resultado (fim económico), artifício (censurável).

1
Apontamentos da disciplina disponibilizados pelo professor.
2
Art.38º/2 LGT – “São ineficazes no âmbito tributário os actos ou negócios jurídicos essencial ou principalmente
dirigidos, por meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas, à redução, eliminação ou
diferimento temporal de impostos que seriam devidos em resultado de factos, actos ou negócios jurídicos de
idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas, total ou parcialmente,

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Se em determinado facto tributário for provado estes requisitos, a Autoridade Tributária


(AT) desconsidera o comportamento adotado, sendo ineficaz e tributa o facto tributário usual. O
ato em termos jurídicos mantém-se válido e produz os seus efeitos, sendo ineficaz perante o
cálculo do montante do imposto. Ao ser desconsiderado pela AT para efeitos tributários,
significa que a AT pode tributar, não de acordo com o comportamento adotado, mas de acordo
com o comportamento normal, originando liquidações adicionais de imposto.
Os preços de transferência é uma das cláusulas especiais de antiabuso, que consiste
na política de preços que vigora nas relações internas de empresas interdependentes e que,
em virtude destas relações especiais, pode conduzir à fixação de preços artificiais, distintos dos
3
preços de mercado.
Também a neutralidade fiscal das fusões, cisões e entrada de ativos têm uma cláusula
especial antiabuso, prevista no nº10 do art.º73º do CIRC, que define que o regime especial
deixa de ser aplicado quando se conclua que teve como principal objetivo a evasão fiscal (obter
uma vantagem fiscal por meios artificiosos).

sem utilização desses meios, efetuando-se então a tributação de acordo com as normas aplicáveis na sua
ausência e não se produzindo as vantagens fiscais referidas.”
3
Cfr Alberto Xavier, Direito Tributário Internacional.

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3. CASO PRÁTICO

3.1 ENUNCIADO

“As famílias Pereira e Vitorino detêm, cada, uma sociedade. A família Pereira detém a
“Jeans Pereira, Lda” e a família Vitorino a “Vitorino Têxteis, Lda”. Ambas as sociedades
dedicam-se, entre outras atividades, à produção de calças de ganga. As famílias decidiram
concentrar esta atividade de modo a ganharem economia de escala. Para o efeito acordaram
criar uma filial comum, detida em partes iguais pelas atuais sociedades, e para a qual
pretendem transferir toda a atividade até agora desenvolvida com a produção de calças de
ganga, incluindo o património e contratos afetos a essa atividade. Diga, justificadamente, a
melhor forma de estruturar a operação, de modo a minimizar os impostos devidos e refira
eventuais dificuldades à concretização dessa operação.”

ENTRADA DE ATIVOS

Família Pereira Família Vitorino

Jeans Pereira, Lda Vitorino Têxteis, Lda


(dedica-se a várias atividades) (dedica-se a várias atividades)

Parte do Parte do
Transferência de um ramo de Transferência de um ramo de
capital capital
atividade: atividade:
social social
 Produção de calças de ganga,  Produção de calças de ganga,
50% 50%
incluindo o património e contratos incluindo o património e contratos
afetos a esta atividade afetos a esta atividade

“Jeans Pereira e Vitorino Têxteis,


Lda”
(Filial comum)
Razão económica Válida:
“Ganhar economia de escala.”

Figura 1: Operação de entrada de ativos (elaboração própria)

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3.2 RESOLUÇÃO

O CIRC prevê, nos art.ºs 72º e seguintes, o regime fiscal aplicável à transformação e
4
reestruturação de sociedades, estabelecendo a possibilidade do exercício de opção pelo
regime especial aplicável às fusões, cisões, entradas de ativos e permutas de partes sociais,
5
que consiste no regime de neutralidade fiscal que prevê o diferimento da tributação incidente
sobre as operações de reestruturação.

3.2.1 Forma de estruturar a operação

No caso em apreço estamos perante uma operação de reestruturação societária, na


qual duas sociedades destacam/transferem um ramo de atividade autónomo para constituir
uma nova sociedade. Esta operação poderia ser caracterizada como cisão simples ou entrada
de ativos, cujas definições estão previstas no art.º 73º nºs 2 e 3, respetivamente:

“Considera-se cisão a operação pela qual:


a) Uma sociedade (sociedade cindida) destaca um ou mais ramos da sua actividade,
mantendo pelo menos um dos ramos de actividade, para com eles constituir outras sociedades
(sociedades beneficiárias) ou para os fundir com sociedades já existentes, mediante a
atribuição aos seus sócios de partes representativas do capital social destas últimas
sociedades e, eventualmente, de uma quantia em dinheiro que não exceda 10% do valor
nominal ou, na falta de valor nominal, do valor contabilístico equivalente ao nominal das
participações que lhes sejam atribuídas; …”

“Considera-se entrada de ativos a operação pela qual uma sociedade (sociedade


contribuidora) transfere, sem que seja dissolvida, o conjunto ou um ou mais ramos da sua
atividade para outra sociedade (sociedade beneficiária), tendo como contrapartida partes
do capital social da sociedade beneficiária.”

Embora operação de entrada de ativos seja muito parecida com a cisão e se possam
confundir, estas têm diferenças, das quais destaco o empobrecimento da entidade cindida ao
contrário do não empobrecimento da entidade contribuidora:
 pois na operação de cisão, o ramo de atividade transferido para a entidade
beneficiária é retribuído aos sócios da sociedade cindida com partes
representativas do capital social da respetiva entidade beneficiária,

4
Reestruturação empresarial pode ser entendida como o conjunto de medidas tomadas pelas empresas que podem
alterar a estrutura de ativos (pela aquisição ou venda de ativos) ou a estrutura de financiamento (pela modificação da
proporção de dívida e capital próprio).
5
O regime de neutralidade fiscal prevê o diferimento da tributação incidente sobre as operações de reestruturação.

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 enquanto que na operação de entrada de ativos, o ramo de atividade transferido


para a entidade beneficiária é retribuído à respetiva sociedade contribuidora com
partes representativas do capital social da respetiva entidade beneficiária.

De acordo com a descrição do caso prático em análise estamos perante uma operação
de entrada de ativos, pois as sociedades contribuidoras “Jeans Pereira, Lda” e “Vitorino
Têxteis, Lda”, dedicando-se ambas, entre outras atividades, à produção de calças de ganga,
decidem transferir esse ramo de atividade, incluindo o património e contratos afetos a esse
ramo, com o propósito de criar economias de escala (razão económica válida), concentrando-o
numa nova sociedade (filial), sendo a sociedade delas beneficiária, tendo como contrapartida
partes de capital social para ambas as sociedades contribuidoras na proporção de 50%
cada.
Nos termos do nº4 do art.º 73º do CIRC “considera-se ramo de atividade o conjunto
de elementos que constituem, do ponto de vista organizacional, uma unidade económica
autónoma, ou seja, um conjunto capaz de funcionar pelos seus próprios meios, o qual pode
compreender as dívidas contraídas para a sua organização ou funcionamento.”
De acordo com a alínea a) do nº7 do art.º73 do CIRC, as famílias Pereira e Vitorino
podem optar pela aplicação deste regime especial à operação de entrada de ativos para
criação da filial, pelas suas sociedades terem sede ou direção efetiva em território português
sujeitas e não isentas de IRC.

3.2.2 Diferimento temporal de tributação – neutralidade fiscal

De acordo com o nº1 do art.º 74º do CIRC, a neutralidade fiscal deste regime consiste
em obter uma vantagem fiscal (exclusão de tributação na operação), existindo um diferimento
no tempo quer para os beneficiários, quer para os transmitentes, uma vez que a data e valores
dos ativos e passivos transferidos não alteram nenhuma das suas características fiscais.
Nesse sentido, na determinação do lucro tributável das sociedades contribuidoras:
 não é considerado qualquer resultado derivado da transferência dos elementos
patrimoniais em consequência da entrada de ativos,
 nem são considerados como rendimentos, nos termos do n.º 3 do artigo 28.º e do
n.º 3 do artigo 35.º, os ajustamentos em inventários e as perdas por imparidade e
outras correções de valor que respeitem a créditos, inventários e, bem assim, nos
termos do n.º 4 do artigo 39.º, as provisões relativas a obrigações e encargos
objeto de transferência, aceites para efeitos fiscais, …

Desde que se trate de:


 Transferência efetuada por sociedade residente em território português e a
sociedade beneficiária seja igualmente residente nesse território, …

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Por outro lado, no nº2 estabelece que a aplicação do regime especial determina que a
sociedade beneficiária mantenha, para efeitos fiscais, os elementos patrimoniais objeto de
transferência pelos mesmos valores que tinham nas sociedades contribuidoras antes da
realização da operação de entrada de ativos, considerando-se que tais valores são os que
resultam da aplicação das disposições do CIRC ou de reavaliações efetuadas ao abrigo de
legislação de carácter fiscal.
Nos termos do nº3, na determinação do lucro tributável da sociedade beneficiária deve
ter-se em conta o seguinte:
 O apuramento dos resultados respeitantes aos elementos patrimoniais
transferidos é feito como se não tivesse havido entrada de ativos;
 As depreciações ou amortizações sobre os elementos do ativo fixo tangível, do
ativo intangível e das propriedades de investimento contabilizadas ao custo
histórico transferidos são efetuadas de acordo com o regime que vinha sendo
seguido nas sociedades contribuidoras;
 Os ajustamentos em inventários, as perdas por imparidade e as provisões que
foram transferidos têm, para efeitos fiscais, o regime que lhes era aplicável nas
sociedades contribuidoras.

Para efeitos da determinação do lucro tributável da sociedade contribuidora, prevê o


nº5 que, as mais-valias ou menos-valias realizadas respeitantes às partes de capital social
recebidas em contrapartida da entrada de ativos são calculadas considerando como valor de
aquisição destas partes de capital o valor líquido contabilístico aceite para efeitos fiscais que os
elementos do ativo e do passivo transferidos tinham nessa sociedade antes da realização da
operação.

No art.º 78º estão definidas as respetivas obrigações acessórias a cumprir para usufruir
deste regime, nomeadamente:
 Dever de comunicação, da opção pela aplicação do regime especial, à Autoridade
Tributária e Aduaneira na declaração anual de informação contabilística e fiscal, a
que se refere o artigo 121.º, relativa ao período de tributação em que a operação é
realizada:
 Pela sociedade beneficiária, no caso de entrada de ativos, exceto
quando não seja residente em território português nem disponha de
estabelecimento estável aí situado, caso em que a obrigação deve ser
cumprida pela sociedade contribuidora;
 Para efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 74.º, a sociedade contribuidora deve
integrar no processo de documentação fiscal a que se refere o artigo 130.º os
seguintes elementos:
 Declaração da sociedade beneficiária de que obedece ao disposto no
n.º 3 do artigo 74.º;

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 A sociedade beneficiária deve integrar, no processo de documentação fiscal


previsto no artigo 130.º:
 a) As demonstrações financeiras da sociedade contribuidora, antes da
operação;
 b) A relação dos elementos patrimoniais adquiridos que tenham sido
incorporados na contabilidade por valores diferentes dos aceites para
efeitos fiscais na sociedade contribuidora, evidenciando ambos os
valores, bem como as depreciações e amortizações, provisões, perdas
por imparidade e outras correções de valor registados antes da
realização das operações, fazendo ainda o respetivo acompanhamento
enquanto não forem alienados, transferidos ou extintos, e ainda os
benefícios fiscais ou gastos de financiamento líquidos cuja transmissão
ocorra nos termos do artigo 75.º-A.

3.2.3 Dificuldades à concretização da operação

No entanto, esta operação não pode ter como principal objetivo ou como um dos
6
principais objetivos obter apenas uma vantagem fiscal, ou seja, a evasão fiscal , caso contrário
a AT realizará as correspondentes liquidações adicionais de imposto, aplicando a cláusula
7
especial anti-abuso prevista no nº10 do art.º 73 do CIRC.
Assim, caso a operação de entrada de ativos não possa beneficiar do regime de
neutralidade fiscal, a operação será tributada como qualquer operação de entradas em espécie
para realização do capital social da beneficiária.
Na esfera da sociedade beneficiária, a entrada em espécie será considerada uma
variação patrimonial positiva que não concorre para a formação do lucro tributável, como prevê
a al. a) do nº1 do art.21º do CIRC.
Na esfera da sociedade contribuidora, a operação será equiparada, para efeitos de
tributação, a uma permuta de bens. Considerar-se-á como valor de realização dos bens
transmitido (caso estes se encontrem registados como ativos ou instrumentos financeiros) o
valor de mercado das participações sociais recebidas, nos termos da al. a) nº3 art.º46º do
CIRC. Caso os bens transferidos se encontrem registados como existências, o valor do rédito
será idêntico ao justo valor das participações recebidas, cfr parágrafo 12 da NCRF20.
Para que não seja posta em causa, pela AT, a opção de aplicação do regime especial é
essencial que a totalidade dos rendimentos das sociedades intervenientes estejam sujeitas ao

6
Evasão fiscal = Planeamento fiscal abusivo; foca-se em operações que têm como objetivo contornar a lei fiscal sem
expressamente a infringir, ou seja, estes comportamentos não violam um qualquer dever de cooperação, mas ainda
assim não são desejados pelo legislador, por visarem manifestamente ladear o ordenamento jurídico-tributário para
conseguir um objetivo oposto aos valores que o estruturam. (cfr Sanches, 2006)
7
Cfr. Art.º73º nº10 do CIRC.

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mesmo regime de tributação em IRC e/ou ter “razões económicas válidas” para realizar a
entrada de ativos, tais como reestruturação ou racionalização das atividades das sociedades
8
contribuidoras – cfr art.º 73º nº3 do CIRC e nº15 al. a) da diretiva .
Neste caso podemos considerar que a intenção de concentrar o ramo de atividade de
produção de calças de ganga de ambas as sociedades constituindo uma filial por elas detidas
na mesma proporção, com o objetivo de criar economias de escala é justificação dos
requisitos exigidos para aplicação do regime especial de neutralidade fiscal.

4. ANÁLISE DE JURISPRUDÊNCIA

No preâmbulo da diretiva revela que o seu fim é assegurar que as empresas se


adaptem às exigências do mercado interno, aumentem a sua produtividade e reforcem a sua
posição concorrencial no plano internacional.
Em virtude de adoção de comportamentos substitutivos que faziam uso abusivo das
disposições comunitárias com a finalidade de contornar obstáculos legais, obter vantagens
ilegítimas, entre outras operações que não caberiam no âmbito teleológico das disposições
comunitárias, começam a surgir questões levantadas ao TJUE relacionadas com a
interpretação da legislação comunitária no sentido de aferir se há ou não comportamento
abusivo, quando as empresas invocam o exercício de determinado direito ao abrigo das
disposições comunitárias.
A decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) no âmbito do processo C-
126/10 (caso Foggia SGPS), que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos
do artigo 267.° TFUE, apresentado pelo Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), por
decisão de 3 de Fevereiro de 2010, entrado no Tribunal de Justiça em 10 de Março de 2010,
no processo Foggia - Sociedade Gestora de Participações Sociais SA contra o Secretário de
Estado dos Assuntos Fiscais.
Estava em causa a recusa do Estado Português em autorizar uma transmissão de
prejuízos fiscais por fusão entre empresas do mesmo grupo por basear-se na presunção de
existência de fraude e evasão fiscal.
Interpretação do artigo 11.º, n.º 1, alínea a) da Diretiva 90/434/CEE, de 23 de Julho de
1990, relativa ao regime fiscal comum aplicável às fusões, cisões, entradas de ativos e
permutas de ações entre sociedades de Estados-Membros, no âmbito de um litígio que opõe
uma sociedade anónima de gestão de participações sociais ao Secretário de Estado dos
Assuntos Fiscais, por este não autorizar a transmissão de prejuízos fiscais na sequência de
uma operação de fusão de empresas que fazem parte do mesmo grupo. Os Estados-Membros
podem, excecionalmente e em casos específicos, recusar aplicar, no todo ou em parte, a
transmissibilidade dos prejuízos fiscais sempre que a operação de permuta de ações tenha
8
Diretiva Comunitária n.º 90/434/CEE do Conselho, de 23 de Julho, aprovou o regime fiscal comum aplicável às
fusões, cisões, entrada de ativos e permuta de participações sociais, atualmente em vigor através da diretiva
2009/133/CE do Conselho, de 19 de Outubro de 2009.

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como objetivo a fraude ou a evasão fiscais. O fato da operação não ser realizada por
razões económicas válidas, como a reestruturação ou a racionalização das atividades das
sociedades que participam na operação, pode constituir presunção de que essa operação
tem esse objetivo. Sendo que pode constituir uma presunção de que uma operação de fusão
entre duas sociedades do mesmo grupo não é efetuada por «razões económicas válidas», na
aceção do artigo 11.º, n.º 1, alínea a) da Diretiva 90/434/CEE, o facto de, à data da operação
de fusão, a sociedade incorporada não exercer nenhuma atividade, não deter nenhuma
participação financeira e se limitar a transmitir para a sociedade incorporante prejuízos fiscais
elevados e de origem indeterminada, ainda que essa operação tenha para o grupo um efeito
positivo consubstanciado em economias em termos de estrutura de custos.

Segundo o acórdão Leur-Bloem do TJUE, razões puramente fiscais não são razões
económicas válidas.

Decisão arbitral no processo 124/2012


No caso em apreço deste acórdão, discute-se a inexistência de requisitos legais e dos
factos objetivos e subjetivos essenciais para aplicação da cláusula geral antiabuso.
Para que se possa aplicar a cláusula geral antiabuso é essencial a existência dos
requisitos legais e dos factos objetivos e subjetivos.
Os requisitos legais são:
 elemento resultado – obtenção de uma vantagem fiscal;
 elemento meio - ato ou negócio jurídico;
 elemento intelectual – escolha de um determinado meio com o único propósito de
obter uma vantagem fiscal, ou seja, dirigido essencialmente à obtenção de uma
redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos;
 elemento normativo – intenção legal contrária ou não legitimadora do resultado
obtido (diferente da intenção do legislador);
 elemento sancionatório – verificando-se todos (cumulativamente) os elementos
anteriores, conduz à sanção de ineficácia, no exclusivo âmbito tributário, dos atos
ou negócios tidos por abusivos, efetuando-se então a tributação de acordo com as
normas aplicáveis na sua ausência e não se produzindo as vantagens fiscais
pretendidas, como prevê a parte final do art.º 38º nº2 da LGT).

A decisão do Tribunal Arbitral foi favorável ao contribuinte, na qual julgaram


procedente o pedido de declaração de ilegalidade do ato de liquidação adicional de IRS, por
parte da Administração Tributária, uma vez que não se verificaram os requisitos de aplicação
da cláusula geral antiabuso.

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5. CONCLUSÃO

Planeamento fiscal é o exercício ativo e não abusivo dos princípios da iniciativa privada
e da liberdade contratual pela opção de conformação dos factos jurídicos tributários, mediante
renúncia a um comportamento (comportamento substituído) que origina maior onerosidade e
penosidade fiscal (fricção tributária).
Substituindo-o por um outro (ou uma série ordenada de outros) material e
economicamente equivalente (comportamento de substituição), mas que proporciona uma
vantagem fiscal traduzida, designadamente, na eliminação, redução ou diferimento de
impostos, isto é que proporciona um capital disponível mais elevado após impostos, em virtude
de exclusões tributárias, benefícios fiscais ou alternativas fiscais, decorrentes de ação
intencional, ou não, do legislador fiscal.
O problema político da humanidade é combinar três coisas: eficiência económica,
justiça social e liberdade individual.
O regime de neutralidade fiscal das fusões, cisões, entrada de ativos e permutas de
partes sociais permite o diferimento do imposto.
No entanto o regime deixa de ser aplicado quando se conclua que teve como principal
objetivo a evasão fiscal, nomeadamente quando as sociedades intervenientes não tenham a
totalidade dos seus rendimentos sujeitos ao mesmo regime de tributação em IRC e quando as
operações não tenham sido realizadas por razões económicas válidas, tais como
reestruturação ou a racionalização das atividades das sociedades.
Por consequência existem limites ao planeamento fiscal através da aplicação da
Cláusula geral antiabuso.
A aplicação da Cláusula geral antiabuso tem por objetivo evitar a manipulação da forma
jurídica para obtenção de um resultado fiscal vantajoso (em detrimento da eficiência
económica), causando o efeito de ineficácia fiscal dos negócios abusivos, justificada por
razões de equidade e justiça na distribuição dos encargos.
Para aplicar a cláusula geral antiabuso prevista no artigo 38º/2 da LGT, é necessário
que estejam preenchidos os respetivos requisitos: redução da carga fiscal, utilização de meios
artificiosos e abuso da forma jurídica. A AT tem o especial dever de fundamentação e cumprir o
procedimento especial previsto no art.º 63º da LGT.
Nesse sentido, o comportamento abusivo não pode ser presumido mas sim
comprovado.

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6. BIBLIOGRAFIA

Almedina, G. (2013). Códigos Tributários – 7ª edição. Coimbra: Almedina.


Campos, D.L., Rodrigues, B.S., & Sousa, J.L. (2012). Lei Geral Tributária: anotada e
comentada (4ª ed.). Lisboa:Encontro da escrita
Campos, D.L., & Soutelinho, S. (2013). Direito do Procedimento Tributário, Coimbra: Almedina.
Sanches, J.S. (2006) Os limites do planeamento fiscal – substância e forma no Direito Fiscal
Português, Comunitário e Internacional, Lisboa: Coimbra Editora.
Xavier, A., (2011) Direito Tributário Internacional, 2ª Edição, Coimbra: Almedina.

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