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INTRODUÇÃO À TEORIA JUNGUIANA E FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS

GE-JAL

GRUPO DE ESTUDOS – JUNG AO AR LIVRE

RESUMO: TEMAS ABORDADOS – PRIMEIRO ENCONTRO

PAULO CÉSAR SOUZA

Psicólogo Clínico – CRP 03/16037

Especialista em Teoria Junguiana pela Psiquê – Clínica de Psicologia e


Centro de Estudos Carl Gustav Jung

SALVADOR

2019
A Psicologia Analítica foi desenvolvida por Carl Gustav Jung (1875-1961),
cidadão suíço, médico, psiquiatra, psicanalista, professor, escritor e, acima de tudo, um
homem que na sua inquietude, buscou amparar os desequilíbrios da humanidade se
dedicando com afinco ao que acreditava ser o caminho mais coerente da evolução
humana, sem desconsiderar as possibilidades que outros conhecimentos lhe
apresentavam. As teorias, conceitos e temas levantados por Jung ainda carecem, de
certo, de determinado esclarecimento, mesmo aos leitores de outras áreas da saúde,
filosofia, sociologia e das artes, assim como, principalmente aos psicólogos que
estudem e/ou trabalhem com outras abordagens teóricas.

Desde muito cedo, Jung se dedicou a estudos um tanto quanto avançados para
sua idade, mergulhando nos escritos de filósofos como Kant, Shopenhauer, Schelling,
Hegel, dentre outros pensadores que se debruçavam sobre a existência humana e suas
ramificações do existir para além da máxima cartesiana do “penso, logo existo” se
fundindo com os ideais de Nietzsche que buscava uma inversão dos valores tradicionais,
primando pelo que o próprio chamou mais tarde de valores vitais.

Podemos pensar a estruturação da obra psicológica de Jung tendo por base três
modelos: o científico em que os estudos estão voltados para um método objetivo e
diretivo em que a palavra é o elemento central do estudo, e foi quando o uso do teste de
associação de palavras tomou proporções à descoberta dos complexos e sua carga
afetiva representada pela palavra dita; o modelo estético-artístico, tendo como prisma a
imagem, o inconsciente se apresenta através do símbolo e existe um respeito maior pela
relação entre a personalidade do analista e a personalidade do analisando (relação
dialética; e por fim, o modelo místico-religioso em que o “silêncio” fala mais que a
palavra, a psique objetiva (inconsciente coletivo) ganha voz para o processo de
individuação e nós, enquanto terapeutas, somos convidados a confiar no que não
podemos controlar, algo incognoscível, da ordem do mistério; a dialética se estabelece
entre o religere (estar atento aos sinais, estar presente na ação) e o religare (vislumbrar
a reconexão com o sagrado).
Em sua teoria, Jung busca descrever a estrutura da personalidade humana. Para
tanto, ele construiu um esquema básico da constituição da personalidade dos sujeitos,
denominando a personalidade como Psique. A Psique funciona com um regulador da
adaptação humana no ambiente. Jung orientou sua teoria, determinando que a Psique se
estrutura em sistemas e níveis interatuantes, denominando estes níveis de consciência,
inconsciente pessoal, e inconsciente coletivo, se contrapondo à metodologia freudiana
que em seus achados limitava o sujeito à camada do inconsciente pessoal formado por
experiências reprimidas vividas na infância.

A consciência é marcada pelo que se vê, pelo que é percebido pelo sujeito, é a
forma de reação direta do sujeito com o meio. Em nível consciente, para regular os
conteúdos a serem exteriorizados, temos o ego que funciona como um vigia da
consciência: nada chega à consciência sem o filtro do ego que está em constante relação
com o inconsciente pessoal onde estão os conteúdos dispensados à consciência através
da regulação do ego, o que denuncia sua maior importância por concentrar esses
conteúdos e mantê-los em registro como uma espécie de memória ou banco de dados.
Um dos grandes feitos de Jung foi a identificação do aglomerado de conteúdos do
inconsciente pessoal, dispensados pelo ego, e constituindo estruturas denominadas de
complexos, consideradas como pequenas personalidades integradas e autônomas e
podem atuar de forma intensa no controle dos nossos pensamentos e comportamentos.
A prova da interatuação entre as estruturas que constituem a psique é que, sendo o
complexo um aglomerado de conteúdos do inconsciente pessoal que não atravessa o ego
para atingir a consciência, a sua base é promovida por um arquétipo, ou seja, todo
complexo possui uma base estruturada no inconsciente coletivo.

Este é o outro sistema de estruturação da psique da qual Jung também dedicou


maior atenção - o Inconsciente coletivo (também denominado como psique objetiva).
Pelo Inconsciente coletivo, Jung percebeu e instituiu que a evolução da mente humana
perpassa por um processo de hereditariedade, assim como acontece ao corpo físico
humano, e sua notoriedade vai além do comum quando Jung postula que a mente
humana é pré-figurada pela evolução. É neste sistema que nota-se uma herança de
elementos a que Jung denominou como “imagens primordiais” e que constituem o
centro de todos os complexos. Essas “imagens primordiais” ou arquétipos, são os
conteúdos do inconsciente coletivo, são tipos antigos (pela etimologia da palavra)
organizados de maneira a valorizar modelos originais e universais que revelam sentido a
outras coisas do mesmo tipo. Em seus estudos, Jung percebeu a existência de diversos
arquétipos, citando como exemplo, o arquétipo da grande mãe, do herói, do deus, da
bruxa, do velho sábio, entre outros.

Dentre diversos arquétipos, Jung dedicou maior atenção ao estudo de alguns


mais importantes à formação da nossa personalidade: persona, anima e animus, sombra
e self. A persona seriam as máscaras que utilizamos para nos adequar às convenções
sociais a que somos postos, é o aspecto externo utilizado na vida social, enquanto que
podemos considerar como aspectos internos dessa adequação, os arquétipos da anima
(ou a representação do feminino) e do animus (a representação do masculino). Nota-se
que o conceito de anima e animus sofreu alterações ao longo da evolução dos estudos
junguianos, pois a sua fundação data de períodos sociológicos de extremo machismo e
patriarcado; hoje aferimos que tanto pessoas do gênero masculino quanto feminino
possuem manifestações da anima e do animus e consideramos estes arquétipos enquanto
instâncias psíquicas inerentes a quaisquer sujeitos. A sombra representa tudo aquilo que
há de bem e mal no ser humano. É onde se armazena maior parte da natureza animal e
sombria dos sujeitos. Voltada para a positividade, a sombra favorece o desenvolvimento
de processos criativos, oriundos de intuições profundas e da espontaneidade, enquanto
que seu lado negativo está fortemente vinculado à não aceitação do sujeito sobre
componentes pertencentes a si mesmo, que são simbolizados em objetos projetados no
outro. O self é a representação da ordem e da organização da personalidade (psique) e é
o principal arquétipo do inconsciente, sendo o responsável por atuar diretamente com a
consciência e seus complexos, orientando os demais arquétipos na harmonização da
personalidade, fator preponderante para o processo de individuação, atribuindo ao
sujeito à noção de unidade.

No processo do existir, o que se busca é o equilíbrio entre as funções e atitudes,


harmonizando a consciência. Esse equilíbrio, essa busca por uma elevação da
consciência e conhecimento de si mesmo, recebeu o nome de individuação. Ao
contrário do que o nome sugere, o processo de individuação não é sinônimo de
perfeição nem tampouco de valorização exacerbada do ego, mas sim, um
direcionamento para o autoconhecimento.

Observamos que a psicologia de Jung é repleta de simbolismo. É pela


representação simbólica que o humano pode manifestar suas impressões acerca da
existência, principalmente de forma mística, para dar sentido às coisas intangíveis e
inexplicáveis, como por exemplo a atribuição e correlação dos fenômenos da natureza
com deuses, reafirmando em toda e qualquer época e civilização, a necessidade de uma
figura superior (um símbolo) a quem se possa responsabilizar e/ou clamar em
momentos de crise. Em alguns casos, podemos considerar que essas representações
simbólicas se expressam através de mitos, sonhos, pela arte, enfim. A criatividade
humana expressa fortemente sua própria necessidade de se simbolizar e tentar voltar-se
a si mesmo.

Levando em consideração os aspectos da simbologia que rodeia nossas vidas,


vale compreendermos dois pontos de conceituação: signo e símbolo. Os signos estão
relacionados a estruturas de significado fixo e invariável, independente do lócus em que
os encontremos. Por exemplo, placas de trânsito – estas possuem conceito específico,
invariável e direto, independente do olhar do observador; a placa PARE/STOP terá a
mesma representação para qualquer pessoa em qualquer lugar do planeta. Já um símbolo
está muito mais ligado ao inconsciente coletivo em interação com a consciência: um
símbolo possui, em si mesmo, variação de significado, a depender de quem o
contemple; o sol, por exemplo, pode representar força, energia, luz, destruição, criação,
poder... dependendo da constituição do sujeito e das interferências sociais. Interessante
pensarmos que alguns signos, com o passar do tempo, podem se transmutar em
símbolos, a exemplo da cruz que possui seu valor enquanto signo e também enquanto
símbolo.
BIBLIOGRAFIA

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