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Psicologia em Pesquisa | UFJF | 4(02) | 118-134 | julho-dezembro de 2010

A Pesquisa em Neuropsicologia:
Desenvolvimento Histórico, Questões Teóricas e Metodológicas

Research in Neuropsychology: Historical Development,


heoretical and Methodological Issues

Simone CagninI

Resumo
O presente artigo tem como objetivo enfocar a pesquisa na Neuropsicologia, a partir de uma revisão histórica da literatura da
área, destacando os principais métodos e questões teóricas que surgiram no percurso dos estudos cientíicos da relação cérebro-
mente. Inicialmente, pretende-se apresentar os antecedentes históricos da pesquisa em Neuropsicologia, privilegiando-se
a emergência do método anátomo-clínico, no século XIX, e as escolas psicométrica e cognitivista do século XX. Neste
contexto, algumas pesquisas clínicas e experimentais com estudos de caso único e estudos de grupo são privilegiadas. Uma
discussão sobre as contribuições e os limites das técnicas de neuroimagem é também esboçada. Por último, uma conclusão é
proposta com o intuito de integrar as relexões tecidas ao longo do trabalho.
Palavras-chave: Neuropsicologia; história; pesquisa; método.

Abstract
his article aims to focus on research in neuropsychology from a historical review of the literature highlighting the key
methods and theoretical issues that have arisen in the course of scientiic studies of the brain-mind relationship. Initially, we
intend to present the historical background of research in neuropsychology, privileging the emergence of anatomical-clinical
method in the nineteenth century, and psychometric and cognitive schools of the twentieth century. In this context, some
clinical and experimental studies of a single case and group studies are emphasized. A discussion of the contributions and
limitations of neuroimaging techniques is also outlined. Finally, a conclusion is proposed in order to integrate the relections
made throughout the paper.
Keywords: Neuropsychology; history; research; method.

I
Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Este trabalho pretende descrever, a partir de uma outros, apresentaram, em seus trabalhos, revisões teóricas
revisão histórica, as principais questões teóricas e me- que destacaram aspectos teóricos e metodológicos relevan-
todológicas no âmbito da Neuropsicologia. O avanço tes ao longo da história da Neuropsicologia, incluindo-se
das pesquisas nas Neurociências na década de 1990, a aqui a Neuropsicologia Cognitiva. Porém, acreditamos que
chamada ‘década do cérebro’, e as pesquisas posteriores nosso ensaio teórico pode vir a contribuir para aprimorar
do novo século, tanto as mais voltadas para o estudo o debate iniciado por estes e outros autores, na medida em
do hardware cerebral subjacente a determinadas funções que busca reletir sobre questões teóricas e metodológicas
cognitivas quanto as mais direcionadas para a relação importantes que, a nosso ver, apresentam algumas lacunas
cérebro-mente, ou mesmo aquelas que privilegiam o es- e ainda não encontram consenso na área.
tudo da mente, devem parte de seu sucesso atual aos es- Sendo assim, objetivamos apresentar uma revisão
tudos pioneiros de neuroanatomistas, clínicos, teóricos integrativa e crítica da literatura da área, destacando os
e pesquisadores dos séculos XIX e das décadas anteriores principais métodos e técnicas encontrados ao longo da
às décadas de 90 do século XX. Mostra-se, assim, rele- história da Neuropsicologia. A diversidade de objetivos e
vante traçar o percurso histórico das abordagens teóri- de abordagens teóricas que guiam os pesquisadores da área
cas e metodológicas que serviram de base para o nítido parece trazer, por um lado, maior complexidade aos méto-
desenvolvimento que a Neuropsicologia encontra na dos e técnicas desenvolvidos, mas, por outro lado, parece
contemporaneidade. diicultar o consenso e a integração teórica e metodológica.
Autores como Shallice (1988), Kristensen, Almeida Inicialmente, cabe observar que a Neuropsico-
e Gomes (2001), Caramazza e Coltheart (2006), dentre logia só surge como uma disciplina cientiica mais di-

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ferenciada nas primeiras décadas do século XX, sendo ra dessas abordagens ou escolas, denominada clássica,
o termo “Neuropsicologia” inicialmente utilizado por baseia-se em estudos de casos clínicos isolados, com
Hebb (1949), com o intuito de marcar, como observa- construção teórica baseada em diagramas, ênfase na
ram Kolb e Wishaw (1980), um estudo cientíico que correlação anátomo-clínica e na testagem ad hoc. A se-
combinava o interesse comum pelo funcionamento ce- gunda escola, por sua vez, possui um enfoque psico-
rebral compartilhado pelos neurologistas e pelos psicó- métrico, com ênfase na coleta de dados quantitativos
logos da Psicoisiologia da época. Não obstante, investi- e no uso de testes estandardizados, priorizando, neste
gações cientíicas da relação cérebro-mente começaram contexto, o estudo de grupos de pacientes selecionados
a ocorrer nas últimas décadas do século XIX, investiga- a partir da semelhança dos sintomas clínicos e/ ou do
ções estas que merecem ser aqui destacadas, pois forne- locus da lesão. A terceira escola, considerada uma es-
ceram as bases para as abordagens metodológicas que cola experimental com ênfase cognitiva, prioriza, por
surgiram posteriormente. sua vez, o estudo de caso único e tarefas experimentais
Estes estudos pioneiros, desenvolvidos por anato- baseadas em modelos de processamento da informa-
mistas e clínicos do século XIX, em uma época em que ção. Enfocaremos, aqui, inicialmente, estas abordagens
as técnicas de avaliação das lesões cerebrais dependiam metodológicas, pois, a nosso ver, trazem questões até
especialmente de uma análise neuroanatômica post hoje signiicativas para a área.
mortem, merecem ser destacados não só por seu caráter A primeira abordagem metodológica foi introdu-
cientíico inaugural, mas também pela ousadia de tal zida por Broca, no século XIX, abordagem esta que se
empreitada com tão poucos instrumentos e pressupos- expressou através do método anátomo-clínico, sendo este
tos teóricos consistentes que os guiassem. método um marco na emergência de um método ver-
Por outro lado, como já referido, no âmbito da dadeiramente cientíico nos estudos da relação cérebro-
própria Neuropsicologia, encontramos uma diversi- -mente. Os estudos anteriores aos de Broca, nas primeiras
dade de enfoques, desde aqueles mais voltados para décadas do século XIX, especialmente os de Gall e seus
os substratos cerebrais envolvidos em determinados seguidores, estudos estes conhecidos como representantes
processamentos da informação, passando por estudos da frenologia, apresentaram um método pouco rigoro-
com ênfase na coleta de dados quantitativos com en- so e duvidoso para o estudo da relação cérebro-mente.
foque psicométrico, até aqueles mais voltados para o A análise das conformações cranianas para a postulação
estudo da mente per se, ou seja, estudos com ênfase de uma correlação entre áreas cerebrais distintas e facul-
cognitivista e menos preocupados com o hardware ce- dades mentais especíicas, mais ou menos desenvolvidas
rebral. Nesta direção, apesar de muitos pesquisadores em função de seu “volume” cerebral, proposta por estes
se situarem na mesma interface, os mesmos podem ter estudos, é hoje considerada pseudocientíica.
interesses muito divergentes, o que suscita, de certo Como o próprio nome indica, o método anáto-
modo, a nosso ver, certa fragmentação de saberes e de mo-clínico visa a estabelecer correlações entre os sin-
métodos produzidos na área. tomas apresentados na clínica neuropsicológica com o
Sendo assim, frente a tal diversidade de enfoques, locus da lesão cerebral subjacente. Através da análise do
priorizaremos aqui estudos e métodos que considera- tecido cerebral post-mortem, pioneiros da investigação
mos mais afeitos a nosso objetivo de esboçar uma rele- cientíica da relação cérebro-mente como Broca, Wer-
xão sobre as principais questões teóricas e metodológi- nicke, dentre outros, propuseram algumas correlações
cas envolvidas na pesquisa em Neuropsicologia. iniciais entre áreas cerebrais restritas e déicits funcio-
nais especíicos relacionados a síndromes diferenciadas
Antecedentes Históricos da Pesquisa Sobre no contexto do estudo das afasias.
a Relação Cérebro-Mente nos Primórdios Entretanto, como observa Kertesz (1983), as cor-
da Neuropsicologia relações propostas através do método anátomo-clínico,
embora provendo uma informação anatômica relati-
vamente detalhada, encontraram alguns problemas do
No curso da história da Neuropsicologia, pode-
ponto de vista metodológico. Um desses problemas
mos identiicar três grandes abordagens metodológicas
refere-se ao intervalo entre as épocas da avaliação clínica
mais amplas, como aponta Shallice (1988). A primei- e da avaliação anatômica, pois podem ocorrer outros

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comprometimentos cerebrais neste período de tempo, por autores como Ellis e Young (1988), como “precur-
por exemplo, causados por seguidos AVCs (acidentes sor” de alguns modelos construídos sob a égide do para-
vasculares cerebrais), mascarando assim as correlações digma do processamento da informação. Neste sentido,
inicialmente propostas. Nesta direção, cabe observar então, os diagramas de Lichtheim e, anteriormente, os
que os AVCs, apesar de costumarem levar a quadros de Wernicke, podem ser considerados como pioneiros
clínicos mais estáveis, costumam ocorrer de modo se- de uma construção teórica com ênfase no detalhamento
qüenciado, o que pode levar a uma diiculdade de in- seqüencial do processamento da informação , em espe-
terpretação dos achados anatômicos. Outra fonte de cial no que diz respeito ao processamento da linguagem.
“interferência metodológica” que pode levar a diicul- Não obstante, como observa Shallice (1988) e
dade na interpretação dos resultados poderia ser ocasio- como já destacamos em trabalho anterior (Cagnin,
nada, por exemplo, no caso da existência de tumores, 2009), os construtores de diagrama, apesar de terem
pela compressão, causada por estes, em outras áreas encontrado certo sucesso na tentativa da construção
cerebrais, o que poderia levar a alterações endócrinas de uma taxonomia neurológica para a época, com a
e vasculares mais amplas e, conseqüentemente, a uma caracterização de síndromes afásicas diferenciadas,
imprecisão na avaliação da área cerebral comprometida. partiram de uma avaliação clínica pouco sistemática
E no caso de doenças degenerativas ou de um processo e insuiciente dos déicits e preservações cognitivas
de atroia cerebral devido ao envelhecimento, estes qua- dos pacientes por eles avaliados. As pesquisas desen-
dros também podem diicultar uma correlação baseada volvidas nos primórdios da investigação cientíica da
em necropsias do tecido cerebral. relação cérebro-mente enfatizaram o estudo de caso
Outra fonte de diiculdade trazida pelo método único, priorizando assim uma avaliação mais qualita-
anátomo-clínico refere-se ao fato de que, muitas vezes, tiva e pouco quantitativa dos achados clínicos, o que
os casos bem estudados na clínica neuropsicológica não de certo modo impossibilitou uma estandardização
têm a chance de serem necropsiados ou, então, inversa- dos resultados encontrados e, conseqüentemente, uma
mente, casos pouco avaliados clinicamente são, por sua comparação entre os pacientes avaliados.
vez, necropsiados, mas não permitem correlações mais Algumas diiculdades metodológicas emergiram
signiicativas devido à falta de um detalhamento funcio- neste contexto. A primeira refere-se à inferência da lo-
nal mais preciso de seus déicits cognitivos. calização da lesão cerebral tendo como base a avaliação
A emergência do método anátomo-clínico e seu clínica de pacientes com comprometimentos cerebrais.
uso pelos chamados "construtores de diagrama do sé- A segunda, por sua vez, diz respeito à inferência do
culo XIX", como Lichtheim (1885), iniciou uma era funcionamento da cognição normal a partir do estu-
de pesquisas na "Neuropsicologia" da época, respaldada do da cognição deicitária exibida por estes pacientes.
por um método fundamentado cientiicamente. Atra- Inclusive, como observa Shallice (1988), a diiculdade
vés de estudos de casos, qualitativamente descritos, estes de dissociar estes dois tipos de inferência, que apontam
"construtores de diagrama" ousaram propor modelos para implicações metodológicas distintas, tornou-se um
ou "diagramas" hipotéticos que visaram uma explicação desaio para os pioneiros do estudo cientíico da rela-
teórica dos seus achados clínicos. ção cérebro-mente que utilizaram o método anátomo-
Do ponto de vista metodológico, Lichtheim -clínico em suas pesquisas. O chamado “localizacionis-
(1885), discípulo de Wernicke e, conjuntamente com mo estreito”, foi o termo atribuído à perspectiva que
este autor, considerado um pioneiro na construção te- enfatizou uma correspondência mais termo a termo da
órica, especialmente no que se refere ao processamento localização das funções mentais no cérebro, perspectiva
da linguagem, contrapôs, por um lado, o caso "puro", essa que não dissociou adequadamente o problema da
que apresentava um único tipo de déicit e, por outro, localização cerebral das funções mentais do problema
o caso "misto, que apresentava múltiplos déicits fun- de inferir o processamento cognitivo normal a partir das
cionais. Porém, em sua opinião, só o caso “puro” tinha disfunções apresentadas pelos pacientes.
interesse teórico, na medida em que contribuía para a Não obstante, cabe observar que, para autores como
construção de modelos teóricos baseados nas perdas se- Gage e Hickok (2005), Wernicke propôs uma teoria bas-
letivas apresentadas por estes pacientes. Inclusive, hoje tante inovadora para a época, pois esboçou uma base teó-
em dia, o modelo teórico de Lichtheim é considerado, rica de como os conceitos eram adquiridos e representados

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no córtex de maneira distribuída, o que, inclusive, vai em execução de tarefas que envolvem aspectos constru-
direção a uma visão mais contemporânea da representação tivos após comprometimentos do hemisfério direito.
conceitual no cérebro. Neste sentido, Wernicke, com sua Porém, segundo esse autor, não se tem muita certeza
proposta de uma visão distribuída das representações con- se essa diiculdade é devida ao mau desempenho do
ceituais no córtex cerebral, já previa uma espécie de locali- hemisfério lesionado ou ao desempenho “normal” do
zacionismo distribuído, bem como considerava os efeitos hemisfério esquerdo sem a “ajuda” do hemisfério direi-
da plasticidade neuronal e da adaptação contextual, o que to. Em outros termos, após uma dada lesão cerebral,
vai de encontro às tentativas de enquadrá-lo como um re- às vezes, podem ser observados não só sintomas ne-
presentante do “localizacionismo estreito”. gativos e déicits, mas também sintomas positivos e o
Kertesz (1983) também destaca a diiculdade da surgimento de novos comportamentos.
inferência do funcionamento cognitivo normal a par- Sendo assim, um dos argumentos contra a pers-
tir do estudo da cognição deicitária apresentada pe- pectiva localizacionista estreita baseia-se na idéia de que
los pacientes com comprometimentos cerebrais. Para o desempenho observado após a lesão cerebral teria
este autor, a análise funcional de sistemas cognitivos pouca relação com a perda da função da área cerebral
normais poderia não fornecer base suiciente para que comprometida, tendo, em contrapartida, mais relação
sejam testadas as funções daniicadas e/ou “reorgani- com a combinação e a reorganização das estruturas re-
zadas” desses pacientes. Em outras palavras, nem sem- manescentes intactas.
pre podemos tirar conclusões diretas sobre o funcio- A segunda escola que surge no percurso da his-
namento cognitivo normal tendo como base apenas a tória da Neuropsicologia, a perspectiva denominada
observação das patologias encontradas na clínica neu- anti-localizacionista, contrapôs-se ao chamado “locali-
ropsicológica. Estudos clínicos e experimentais com zacionismo estreito” e foi, por sua vez, inluenciada pe-
sujeitos normais, não lesionados, também devem ser las idéias do gestaltismo, tendo seu auge nas décadas de
considerados, pois os mesmos podem ou não ratiicar 20 a 40 do século XX.
as interpretações e conclusões obtidas pelos estudos O conceito de equipotencialidade de K. Lashley
anteriormente mencionados. (1929, 1938), proposto a partir de seus estudos sobre a
Há que se observar ainda, como ressalta Caplan aprendizagem animal, foi um dos argumentos teóricos
(1981), que a própria deinição de “função mental” é utilizados pela escola antilocalizacionista, na medida em
arbitrária, pois clínicos, neuroisiologistas e psicólogos, que supõe a possibilidade de compensação da perda de
dentre outros, poderiam ter concepções diferentes a res- uma função cortical por outra área cortical preservada.
peito de um mesmo comportamento observado. Neste Jackson (1874) e Luria (1981) também abordaram a
sentido, diferentes concepções teóricas poderiam levar possibilidade de reorganização funcional das áreas cere-
a diferentes interpretações daquilo que denominados brais preservadas e a emergência de operações e estraté-
“função mental”. Por exemplo, para Luria (1981), esta gias compensatórias em pacientes com lesões cerebrais.
função demandaria a atividade de um sistema funcio- Do ponto de vista clínico, a escola antilocaliza-
nal complexo que envolve um conjunto de estruturas cionista contribuiu para o entendimento do quadro clí-
cerebrais em interação em contraposição a outras abor- nico mais amplo apresentado pelos pacientes, ou seja,
dagens que estabelecem correlações mais estreitas entre a compreensão dos déicits e de preservações cognitivas
estruturas cerebrais e funções mentais especíicas. em vários domínios do conhecimento ajudou a enten-
Já no que se refere à localização cerebral de fun- der os fatos clínicos mais complexos e menos diferencia-
ções, como destaca Kertesz (1983), uma das principais dos (Hécaen & Albert, 1978). Porém, do ponto de vis-
questões teóricas no que a isso diz respeito é aquela ta teórico e metodológico, autores como Ellis e Young
que indaga se o desempenho cognitivo observado em (1988), expoentes de uma perspectiva neuropsicológica
um dado paciente com lesão cerebral pode ser atri- cognitivista e modular, sinalizaram para o fato de que
buído apenas à perda de determinados componentes a perspectiva antilocalizacionista representou certo “re-
cognitivos ou ao surgimento de outras estruturas fun- trocesso” no curso da história da Neuropsicologia, na
cionalmente relacionadas ou mesmo não diretamente medida em que enfatizava uma abordagem integral e
relacionadas que são recrutadas após a injúria. Um menos “modularista” e diferenciada do cérebro.
exemplo disso poderia ser a diiculdade observada na

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Cabe observar que outros problemas e variáveis sua vez, permitiria um bom grau de generalização dos
podem também contribuir para diicultar uma locali- estudos animais para a espécie humana.
zação mais termo a termo de funções mentais no cére- Cabe observar que estes estudos, apesar de não
bro como, por exemplo, a variabilidade da etiologia e a serem “típicos” da Neuropsicologia, pois utilizavam,
evolução da lesão cerebral, a idade e o sexo do paciente preferencialmente, sujeitos experimentais animais e
que sofreu a injúria cerebral, o fato de o mesmo ser possuíam um enfoque mais psicoisiológico, também
destro ou canhoto, as diferenças anatômicas individu- contribuíram para o estudo da relação cérebro-mente,
ais, dentre outros fatores importantes que poderiam especialmente para a investigação dos processos motiva-
ser destacados. Entretanto, não enfocaremos tais fato- cionais e emocionais e de seus substratos neurais, pro-
res, devido aos objetivos mais amplos já mencionados cessos estes que parecem permitir um maior grau de ge-
do presente trabalho. neralização para a espécie humana do que os processos
De modo complementar aos estudos desenvol- associados às chamadas “funções cognitivas superiores”,
vidos nos primórdios da clínica neuropsicológica, os como o pensamento e a linguagem.
estudos desenvolvidos em laboratório com sujeitos ani- Neste contexto, o desenvolvimento do método
mais também merecem ser brevemente destacados, na experimental com diferentes técnicas de intervenção e
medida em que contribuíram para o aprimoramento de registro cerebral, como as de estimulação e de re-
de técnicas de registro e de intervenção cerebral, bem gistro por eletrodos, passando por técnicas de lesão ce-
como para algumas correlações entre áreas cerebrais es- rebral seletiva, dentre outras técnicas de intervenção,
pecíicas e determinados distúrbios comportamentais. possibilitou o estudo do papel de determinadas áreas
Trabalhos como os de Flourens (1853), Lashley (1929, cerebrais em processos emocionais e motivacionais es-
1938), Klüver e Bucy (1939), dentre inúmeros outros, pecíicos, bem como em processos como atenção, me-
poderiam ser aqui destacados. mória, aprendizagem e ciclo sono-vigília.
Como observam Hart e Semple (1990), os estu- Estes trabalhos, desenvolvidos em uma época des-
dos propostos pela Neuropsicologia experimental animal provida dos recursos atuais das técnicas de neuroimagem e
buscaram determinar os princípios fundamentais das do auxílio computacional, foram de fundamental impor-
funções cerebrais usando espécies não humanas. Estes tância não só para o desenvolvimento de uma metodolo-
estudos contribuíram de modo signiicativo para o de- gia experimental consistente no estudo da relação cérebro-
senvolvimento da metodologia experimental e tiveram a -mente, como também para o entendimento das bases
vantagem de poder controlar variáveis como o tamanho neurais subjacentes a determinados comportamentos.
da lesão cerebral, sua localização, bem como o registro e/ Em suma, as pesquisas clínicas e experimentais que
ou a estimulação elétrica de áreas cerebrais especíicas. De inauguraram a investigação cientíica da relação cérebro-
modo complementar, a vantagem de poder se exercer um -mente, seja com o método anátomo-clínico ou com as
controle rigoroso do meio ambiente e a obtenção de da- diversas técnicas de intervenção e de registro cerebral in
dos mais precisos sobre a história de vida dos animais sub- vitro, forneceram as bases para os subseqüentes estudos
metidos aos experimentos também merecem destaque. desenvolvidos ao longo da história da Neuropsicologia.
A questão do grau de generalização dos acha- A interface com diferentes disciplinas básicas e aplicadas,
dos experimentais desses estudos animais para a espé- muitas delas hoje situadas no contexto das chamadas
cie humana parece ser alvo de controvérsias, pois, por Neurociências, caracterizou a emergência desta disciplina
um lado, autores como Davison (1974) apontam para híbrida que denominamos Neuropsicologia.
a complexidade do comportamento humano em con-
traposição ao comportamento animal e, por outro lado, A Neuropsicologia do Pós-Guerra:
autores como Kolb e Wishaw (1980) apontam para a Contribuição de A.R. Luria e da Psicologia
fundamental importância desses estudos para a Neu-
Experimental
ropsicologia humana. O principal argumento desses
últimos autores reside no fato de que o meio ambiente
A grande mudança metodológica que ocorreu
apresentaria problemas básicos para todos os mamífe-
novamente na Neuropsicologia surge após a Segunda
ros, problemas estes que demandariam a mediação de
Guerra Mundial. Por um lado, a Neuropsicologia se alia
mecanismos neurais similares na sua solução, o que, por

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à Psicologia Experimental e à Psicometria da década de ros achados que corroboraram o pressuposto de que os
50, nos países ocidentais, e por outro lado, no contexto hemisférios cerebrais processariam as informações com
da extinta União Soviética, Luria aproxima os seus inú- certa independência e especiicidade. De modo geral, a
meros trabalhos clínicos e teóricos da perspectiva sócio- idéia vigente seria de que haveria a dominância no pro-
-histórica de Vygotsky. cessamento da linguagem pelo hemisfério esquerdo ver-
Inicialmente, cabe destacar brevemente a impor- sus a dominância do processamento visuoespacial pelo
tância dos trabalhos de Luria (1981, 1992), em espe- hemisfério direito, na maioria dos indivíduos.
cial, seus inúmeros estudos clínicos e seus estudos com Observamos ainda que muitas das pesquisas ex-
pacientes com lesões frontais. A par de sua vasta con- perimentais com sujeitos animais, inclusive, serviram
tribuição teórica e clínica mais ampla, os estudos com de inspiração e apoio para pesquisas realizadas com pa-
os chamados pacientes pré-frontais e a postulação de cientes humanos como, por exemplo, as realizadas por
que as regiões frontais estariam envolvidas com a pro- Sperry (1984) com pacientes comissurotomizados (com
gramação, veriicação e regulação das funções cogniti- secção do corpo caloso).
vas como um todo merecem destaque. A sua ênfase na Não obstante, estudos interessados em estudar
complexidade dos sistemas funcionais cerebrais e sua não só a lateralização cerebral de funções e a assimetria
contribuição para a avaliação e a reabilitação neurop- funcional hemisférica, como também a comunicação
sicológicas foram de fundamental importância para o inter-hemisférica, vêm apontando para uma maior
desenvolvimento da área. Inclusive, o grande número complexidade na organização cerebral de funções e
de avaliações clínicas feitas por Luria e seus colaborado- para uma maior colaboração inter-hemisférica na rea-
res originou a Bateria de Testes Luria-Nebraska, bateria lização de tarefas complexas que envolvem maior carga
esta que ainda é uma referência no contexto da avalia- cognitiva. Autores como Gazzaniga e LeDoux (1981),
ção neuropsicológica. Cooney e Gazzaniga (2003), dentre outros, observa-
Ainda no que se refere à contribuição de Lu- ram que os sistemas relacionados aos dois hemisfé-
ria, concordamos com Kristensen, Almeida e Gomes rios cerebrais, apesar de funcionalmente assimétricos,
(2001) que uma de suas principais contribuições diz conformariam uma rede funcional articulada e, neste
respeito às inovações metodológicas propostas por sentido, não teria sentido a proposição de uma visão
ele na avaliação clínica de seus pacientes. A partir do dualista que propõe um isolamento mais radical na co-
uso de técnicas aparentemente não muito soisticadas, municação inter-hemisférica.
porém guiadas por referenciais teóricos consistentes, Já no que diz respeito à nova abordagem meto-
como sua idéia de uma organização sistêmica das fun- dológica originada da aliança entre a Neuropsicologia
ções corticais superiores, Luria parece ter conseguido e a Psicologia Experimental, a chamada escola psico-
compatibilizar o pressuposto da complexidade das métrica, esta teve seu auge nas décadas de 1940 e 1950
funções corticais superiores da escola anti-localizacio- do século XX, mas alguns estudos em décadas anterio-
nista com a possibilidade de uma localização dinâmica res poderiam ser considerados precursores deste tipo
dessas mesmas funções. de abordagem, como os estudos de Weisenburg e Mac
Podemos ainda destacar os trabalhos realizados Bryde (1935), com ênfase na construção de um teste
nas décadas de 50 e 60 com ênfase na lateralização ce- normatizado sobre as afasias, dentre outros.
rebral de funções, pois estes trouxeram contribuições Para esta nova escola, as observações clínicas, so-
teóricas e metodológicas importantes para o entendi- mente, não constituem uma base de dados suiciente
mento da especiicidade dos hemisférios cerebrais no para uma especulação teórica consistente e nem para a
desempenho de determinadas funções cognitivas. Pes- padronização de testes. Neste contexto, os estudos de
quisas experimentais e clínicas, como as de Myers e grupo adquiriram uma ênfase especial e a quantiicação
Sperry (1953), Gazzaniga, Bogen e Sperry (1962), den- dos dados apresentados pelos pacientes foi a tônica, em
tre outros, com animais com secção do corpo caloso e contraposição à ênfase em estudos de caso único dos
com sujeitos com comprometimentos no corpo caloso, primórdios da Neuropsicologia. Nesta direção, inúme-
bem como pesquisas experimentais com sujeitos nor- ros testes foram padronizados e grandes baterias de tes-
mais com o uso, por exemplo, da escuta dicótica e da tes foram propostas, como as baterias Luria-Nebraska
apresentação visual taquitoscópica, forneceram inúme- e Halstead-Reitan, bem como houve a soisticação dos

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procedimentos experimentais e um maior controle das Entretanto, cabe assinalar que algumas sín-
variáveis envolvidas. dromes consideradas mais "puras" nas últimas dé-
No que se refere ao estudo de caso único, cadas, como, por exemplo, a dislexia profunda, o
Lichtheim (1885), nos primórdios dos estudos cientí- "agramatismo" na afasia de Broca, dentre outras, já
icos da relação cérebro-mente, fez, inicialmente, a dis- não são vistas como "puras" ou unitárias, pois há,
tinção metodológica entre o chamado “caso puro” que na clínica e na pesquisa neuropsicológicas, relatos
apresenta um único tipo de déicit e o “caso misto” que, variados de pacientes com dissociações funcionais
por sua vez, apresenta déicits múltiplos. Para ele, ape- dentro de uma mesma síndrome.
nas o caso puro teria importância teórica e metodoló- Seria interessante ressaltar, no que se refere aos
gica, pois ajudaria na construção de modelos teóricos a estudos de grupos de pacientes, alguns problemas que
respeito do funcionamento cognitivo humano. Apesar podem surgir na validação interna de uma pesquisa ex-
de possuir maior incidência clínica, o caso misto não perimental, e no caso, de uma pesquisa neuropsicológi-
ajudaria tanto na construção teórica, na medida em que ca com ênfase experimental.
não apresentaria déicits seletivos, o que diicultaria a Tendo como base os problemas apontados por
formulação de hipóteses a respeito dos subcomponentes Campbell e Stanley (1968) em relação à pesquisa
cognitivos envolvidos em determinadas tarefas. experimental, Crockett, Clark e Klonoff (1981) re-
De acordo com Shallice (1988), quando uma teoria dimensionam os mesmos para a pesquisa no âmbito
está sendo testada, a descrição de qualquer paciente, puro da Neuropsicologia.
ou misto, ajudaria na avaliação da capacidade explicativa O primeiro desses problemas, destacado pelos autores
destas teorias. Porém no que se refere à construção de mo- acima, refere-se às próprias mudanças que normalmente ocor-
delos teóricos, os casos puros apresentariam um quadro rem no percurso de uma doença neurológica. Desordens de
mais nítido de um determinado déicit cognitivo. A perda origem traumática ou por AVC, com início preciso e agudo
seletiva de um determinado processamento da informação ou desordens de origem degenerativa, com gradual deteriora-
atrelado aos chamados casos puros ajudaria no melhor en- ção cerebral, têm percursos distintos, sendo que as primeiras
tendimento do funcionamento cognitivo do que as múlti- podem levar a uma recuperação posterior total ou parcial, e as
plas perdas simultâneas apresentadas pelos casos mistos. segundas, a um declínio mental variável em seu percurso.
Se, por um lado, autores como Sokol, McCloskey, O segundo problema refere-se à seleção dos pa-
Cohen e Aliminosa (1991), Ellis e Young (1988), den- cientes para a composição dos grupos experimental e de
tre outros, concordam com Lichtheim quanto à maior controle. Há, normalmente, dois métodos mais tradi-
relevância do estudo de caso único para a construção cionais de seleção de pacientes: no primeiro, os sujeitos
teórica, por outro lado, autores como Robertson, Kni- são selecionados de acordo com o diagnóstico médico
ght, Rafal e Shimamura (1993) enfatizam o estudo de ou local da lesão, e, no segundo, os sujeitos são selecio-
grupos de pacientes por acharem os mesmos mais eluci- nados a partir de um modelo de comportamento pré-
dativos para a construção teórica. Na opinião desses úl- -estabelecido, ou seja, a partir de um critério funcional
timos autores, a comparação entre grupos de pacientes dos sintomas mais signiicativos.
poderia fornecer mais dados para o estudo da modula- Este primeiro método de seleção, "o local da
ridade do sistema cognitivo do que o estudo das singu- lesão", é problemático como "variável independen-
laridades apresentadas por um determinado indivíduo. te", pois as lesões, obviamente, são acidentais e con-
Outro problema que podemos destacar, neste sequentemente afetam áreas distintas cerebrais. Além
contexto, é que a inserção ou não de um paciente em disso, esta seleção parte da hipótese de que as relações
uma categoria mais pura ou mais mista é direcionada entre o cérebro e o comportamento são invariantes,
pelo enfoque teórico do qual se parte. Sendo assim, dife- o que é questionado por inúmeros estudos de casos
rentes teorias podem produzir diferentes "casos puros", relatados na literatura.
aquelas que para elas são mais relevantes e estejam mais Também Caramazza (1984), ao abordar os crité-
em consonância com seus modelos. Neste sentido tam- rios anatômicos e funcionais utilizados na seleção dos
bém já apontara Kuhn (1962), ao abordar a concepção grupos, aponta uma diferenciação entre alguns critérios
de paradigma e as implicações teórico-metodológicas na anatômicos de seleção. Para este autor, os critérios ana-
chamada ciência normal. tômicos para composição de grupos podiam ser dividi-

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dos em dois tipos mais amplos: o primeiro relacionado à ção entre os estudos realizados. A variabilidade entre
unilateralidade da lesão, e o segundo relacionado a áreas os sujeitos, como já foi mencionado, também era um
anatômicas mais restritas, tais como um determinado dado complicador que complementava as diiculdades
lobo em um hemisfério. encontradas por esta abordagem.
Há que se observar que, apesar de problemas na se- Como aponta Caramazza (1984), considerar a
leção inerentes aos estudos de grupos, muitos estudos de variância intra-grupo como um erro randômico da vari-
grupo têm contribuído de modo substantivo para a pes- ância pode mascarar as diferenças individuais signiica-
quisa neuropsicológica. Neste contexto, o agrupamento de tivas, ou seja, a heterogeneidade dos sintomas apresen-
pacientes, a partir de critérios anatômicos tendo como base tados pelos pacientes.
o locus cerebral da lesão, em termos de áreas cerebrais mais Ainda podemos destacar outros problemas que
restritas, trouxe inúmeras contribuições teóricas para a in- podem afetar a validade interna de modelos neuropsico-
vestigação de déicits cognitivos mais especíicos. lógicos puramente experimentais tais como a testagem
No que se refere ao critério funcional utilizado em si e os instrumentos utilizados na avaliação.
para a seleção experimental de pacientes com lesão ce- No que se refere à testagem em si, os pacien-
rebral, este toma como base os sintomas apresentados tes com lesão cerebral tendem a apresentar fadiga
por estes pacientes no percurso da avaliação neurop- facilmente, e/ou podem demonstrar ansiedade pela
sicológica. Uma abordagem sindrômica baseada na diiculdade na resolução de certos testes. Baterias
co-ocorrência de sintomas possui, entretanto, suas li- de testes mais longas podem, por um lado, ser mais
mitações, pois parte da assunção da homogeneidade abrangentes na avaliação dos déicits, mas, por outro,
dos pacientes selecionados, o que de fato não acontece são exaustivas e sujeitas a interferências como a fadi-
quando se analisa com maior profundidade os déicits ga e a ansiedade dos pacientes.
apresentados por estes. Segundo Lezak (1995), as abordagens de ava-
Problemas teóricos e práticos podem surgir neste liação neuropsicológica podem ser pensadas como si-
contexto, pois não só a complexidade e variabilidade dos tuando-se em um continuum que vai desde um pólo
déicits são comuns, como também a própria deinição mais quantitativo de análise a um pólo mais qualitativo.
de síndrome, às vezes, é vaga e não tão consensual entre Abordagens que priorizam exclusivamente a avaliação
os pesquisadores. Não obstante, na clínica neuropsicoló- de escores baseados no número de respostas corretas ou
gica, a taxionomia sindrômica, como, por exemplo, a das incorretas ou no tempo da resposta e derivam de uma
afasias, pode oferecer um referencial mais amplo em uma aplicação universal de um formato único de procedi-
primeira avaliação mais geral do paciente. Em contraste, mentos podem ser vistas como quantitativas. Como
na pesquisa neuropsicológica, a pressuposição da existên- vimos, a ênfase na estandardização e na quantiicação
cia de um sistema de processamento comum, daniica- de dados e na comparação dos mesmos destaca-se neste
do nos pacientes, pode levar à interpretação errônea dos contexto, e a chamada escola americana de Neuropsico-
achados clínicos. Mesmo porque, em realidade, como logia dos anos 50 e 60 com sua tradição psicométrica si-
já visto, são muito raras as chamadas síndromes "puras" tua-se nesse extremo. Em outro extremo, as abordagens
com apenas um componente (ou módulo) comprome- de avaliação que se baseiam em uma detalhada análise
tido. Normalmente, as "síndromes" costumam apresen- das respostas, com particular atenção na singularidade
tar mais de um componente comprometido, e são assim das respostas, podem ser vistas como qualitativas.
muito mais "mistas" do que parecem à primeira vista. Os instrumentos utilizados na avaliação neu-
A partir de uma avaliação clínica e/ou de aplica- ropsicológica também podem apresentar problemas. A
ção de testes estandardizados com o uso, por exemplo, utilização de testes mais estandardizados, tais como o
de grandes baterias de testes como a Hastead-Reitan e a WAIS (Escala de Inteligência Wechsler para Adultos),
Luria-Nebraska, os sujeitos-pacientes eram selecionados em conjunção com testes mais especíicos, tem se tor-
para compor os grupos experimentais participantes da nado mais corrente na pesquisa e na clínica neuropsi-
pesquisa neuropsicológica. Porém, dois problemas po- cológica. Entretanto, como observa Crockett, Clark e
deriam surgir nesse contexto: primeiro, não havia uma Klonof (1981), alguns testes como o BVRT (Benton
bateria de testes que fosse consensual entre os pesqui- Visual Retention Test), utilizado na clínica para avaliar
sadores e, segundo, havia a diiculdade de generaliza- a memória visual com bons resultados, apresentam pro-

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blemas na pesquisa neuropsicológica em termos de es- Um último problema apontado por Crockett,
cala, distribuição e variabilidade estatística. Clark e Klonof (1981) refere-se à diiculdade de um
Também podemos destacar o problema da in- acompanhamento experimental longitudinal em mui-
terpretação dos dados clínicos apresentados pelos pa- tos pacientes, pois, muitas vezes, estes não retornam
cientes. Por exemplo, baixos escores em testes como para novas avaliações ou há mortalidade nos grupos ex-
o WAIS poderiam estar relacionados a diferentes fa- perimental e de controle.
tores, tais como baixa luência verbal, problemas de Em suma, cabe assinalar que a interação entre
memória, diferenças culturais ou baixa inteligência. os problemas já mencionados é mais comum do que
Cabe assinalar, entretanto, que a aplicação de testes a existência de um problema único, o que pode afetar
mais especíicos, posteriormente, orientados por uma ainda mais os estudos experimentais ou quase-expe-
hipótese mais focal, pode ajudar na discriminação da rimentais na pesquisa e na clínica neuropsicológicas.
natureza dos déicits e na interpretação dos achados Além disso, a etiologia do dano cerebral, a magnitude
clínicos. Inclusive, o problema da validade ecológica da lesão, a história da doença e outros fatores podem
de testes como o WAIS, dentre outros, tem sido desta- variar, e neste sentido são variáveis "incontroláveis"
que em trabalhos como os de Duncan, Burgess e Ems- em um modelo experimental.
lie (1995), Van der Elst, Van Boxtel, Van Breukelen e Uma mudança metodológica tem surgido, entre-
Jolles (2008), dentre outros autores. tanto, nas últimas décadas, com o ressurgimento do sta-
Outro problema experimental que pode tam- tus dos estudos de caso único, especialmente no âmbito
bém surgir na pesquisa neuropsicológica é a chamada da Neuropsicologia Cognitiva. De modo complemen-
regressão estatística em direção à média. Dada a na- tar, as modernas técnicas de neuroimagem in vivo tam-
tureza da população preferencialmente estudada pela bém têm contribuído para a pesquisa na área, possibili-
Neuropsicologia, podemos inferir que, em determina- tando em muitos casos uma localização mais precisa de
das tarefas, tais sujeitos terão um desempenho abaixo algumas lesões. A seguir, abordaremos mais diretamente
da média. Mas, por deinição, estes escores são, nor- alguns aspectos teóricos e metodológicos envolvidos na
malmente, extremos e assim mais suscetíveis de regres- pesquisa neuropsicológica na contemporaneidade.
são em direção à média. Este problema é mais nítido
especialmente quando somado aos problemas experi- A Contribuição Atual da Neuropsicologia
mentais já citados anteriormente. Cognitiva e das Técnicas de Neuroimagem
Campbell e Stanley (1968) também destacam ou-
para a Pesquisa em Neuropsicologia
tro problema que poderia afetar a validade interna de
um dado experimento: a existência de "vieses" na sele-
De modo diferenciado dos estudos pouco funda-
ção ou artefatos da seleção, como na acepção de Shallice
mentados dos construtores de diagrama do século XIX,
(1988), dos sujeitos da pesquisa. Na Neuropsicologia,
os novos estudos de caso investigados pela Neuropsico-
este problema pode ocorrer e, provavelmente, ocorre
logia Cognitiva contemporânea são vistos hoje em dia
freqüentemente, pois a diiculdade na seleção de sujei-
como um procedimento empírico bastante signiicativo
tos que formem um grupo relativamente homogêneo é
para a construção de inferências sobre a cognição nor-
comum na pesquisa neuropsicológica. A variabilidade
mal, pois, nestes estudos, há uma grande preocupação
entre sujeitos normalmente é grande e não pode ser me-
com a produção de dados quantitativos que possam
ramente resolvida a partir de critérios de diagnóstico.
permitir uma análise estatística consistente.
Esta variabilidade pode estar diretamente relacionada às
Alguns estudos de caso único, como, por exem-
variações do locus da lesão nos pacientes. As caracterís-
plo, o estudo do paciente K.F. feito por Shallice e War-
ticas pré-mórbidas dos pacientes também podem afe-
rington (1974), estudos anteriores de Scoville e Milner
tar o processo de seleção, levando a uma diiculdade de
com o paciente HM. (2000), dentre inúmeros outros
avaliação se um determinado desempenho após a lesão
estudos, têm contribuído, inclusive, para a reformula-
é realmente originado de um comprometimento cogni-
ção de teorias sobre a memória e para a revisão de mode-
tivo propriamente dito ou se tem também inluência de
los teóricos que não se coadunam com os seus achados
diiculdades pré-mórbidas do paciente.
clínicos. Os trabalhos de Baddeley (1986, 1990, 2000),

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com ênfase na construção de modelos sobre a memória diiculdade da tarefa proposta. Porém, quando encontra-
de trabalho, exempliicam esse tipo de construção teóri- mos pacientes duplamente dissociados funcionalmente, a
ca de inspiração computacional. questão da diiculdade da tarefa deixa de existir.
Uma das vantagens do estudo de caso único é que Coltheart (2008) destaca o fato de que as in-
este método parece permitir resolver o problema da he- ferências que partem das duplas dissociações funcio-
terogeneidade encontrada em estudos de grupos. Através nais teriam a vantagem de não apresentarem nenhum
de uma análise intensiva e quantitativa dos déicits e pre- problema metodológico intrínseco, em contraste com
servações dos pacientes, o estudo de caso único demons- as inferências baseadas nas associações funcionais ou
tra ser um método promissor para prover informações da mesmo nas dissociações funcionais simples. Neste
organização funcional de subsistemas cognitivos. sentido, então, parece haver certo consenso na área a
A modularidade da mente, pressuposto teórico do- respeito da importância das duplas dissociações fun-
minante na Neuropsicologia Cognitiva, por sua vez ins- cionais, especialmente, para o entendimento dos sub-
pirado por Marr (1982) e Fodor (1983), parece encontrar sistemas cognitivos envolvidos em determinados pro-
no estudo de caso um importante aliado metodológico cessamentos da informação.
para respaldar a idéia de comprometimentos diferencia- Inicialmente, as duplas dissociações funcionais
dos em módulos especíicos dos sistemas cognitivos. As estavam correlacionadas com loci anatômicos cerebrais
dissociações funcionais, especialmente as duplas disso- especíicos, sendo que as dissociações eram assim con-
ciações funcionais que surgem entre pacientes e intra- sideradas como evidências de uma topograia cerebral
-paciente complementam essa idéia de uma organização diferenciada correlacionada com uma dada função cog-
modular ou parcialmente modular de alguns subsistemas nitiva. Entretanto, há uma série de problemas com esta
cognitivos. Aliás, como destacamos em trabalho anterior correspondência mais estreita entre função mental e
(Cagnin, 2009), uma grande contribuição metodológica área cerebral, em termos inferenciais, pois diferentes ar-
para a Neuropsicologia foi o princípio de dupla disso- quiteturas mais ou menos distribuídas podem produzir
ciação funcional, proposto por Teuber (1955), princípio distintas dissociações funcionais. Neste sentido, na mo-
este cuja lógica Shallice (1988) considerava análoga à das dernidade, a concepção de dupla dissociação funcional
interações cruzadas na análise de variância. prescinde, muitas vezes, da variável anatômica inicial-
Uma dissociação funcional dupla poderia ser vista mente proposta por Teuber.
quando, por exemplo, um dado paciente tem um desem- Em contraste com a associação de sintomas, base
penho muito pobre em um processamento da informa- da classiicação por síndromes, as duplas dissociações
ção, (p. e. capacidade de reconhecer faces), mas mantém funcionais, especialmente as duplas dissociações "for-
a capacidade de processar a informação envolvida em tes", são importante método de comparação entre pa-
outra tarefa (p. e. reconhecer símbolos). Em contraste cientes e mesmo intra-paciente, comparando seus dé-
com este primeiro paciente, é encontrado outro paciente icits e preservações para a elaboração de inferências a
que apresenta o desempenho oposto, ou seja, o reconhe- respeito não só de natureza do quadro apresentado pelo
cimento de símbolos é preservado, mas não o de faces, o paciente, mas também apontando para a organização
que demonstra certa independência entre esses dois tipos normal do sistema cognitivo.
de processamentos. Já a dissociação funcional simples ou No que se refere às associações funcionais entre
clássica seria observada quando há a perda de um dado déicits, frequentemente, pode se tornar difícil discer-
processamento em um paciente sem que haja um con- nir se trata-se de uma associação anátomo-funcional
traste mais direto com a preservação simultânea desse ou de uma mera proximidade anatômica da lesão,
mesmo processamento em outro paciente. Uma das des- sem o envolvimento de uma relação funcional signi-
vantagens da dissociação funcional simples como méto- icativa entre os déicits. Em outras palavras, a lesão
do seria a de que não haveria o controle da complexidade pode daniicar áreas anatômicas próximas, áreas estas
da tarefa. Em outros termos, quando um dado paciente que podem ou não ser a base neural de componentes
executa bem uma primeira tarefa e mal uma segunda ta- cognitivos distintos. Porém, como na clínica neurop-
refa, sem que possamos compará-lo com outro paciente sicológica os sintomas associados a estes componentes
que apresenta o quadro oposto em termos de déicits e costumam co-ocorrer, parecem ser originados de um
de preservações cognitivas, isso pode ter sido devido à mesmo “módulo” ou subsistema cognitivo. Através de

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uma dupla dissociação funcional entre pacientes que Os chamados neuropsicológicos "ultra-cogniti-
apresentam, de modo diferenciado, comprometimen- vistas", na acepção de Shallice (1988), também pare-
tos diferentes, muitas vezes opostos, em tarefas dis- cem não se preocupar com a correlação entre o locus
tintas, podemos discriminar melhor, hipoteticamente cerebral da lesão e os déicits funcionais apresentados
falando, os subsistemas cognitivos subjacentes aos dé- pelo paciente. Para eles, a questão da localização cere-
icits apresentados. bral de funções deixa de ser prioritária no contexto de
Como também assinalam Ellis e Young (1988), pesquisa na Neuropsicologia Cognitiva. Em contra-
os pacientes podem ser semelhantes em alguns sinto- partida, Shallice (1988), defende a compatibilização
mas, mas são diferentes em outros, e mesmo naqueles dos estudos de grupo com os estudos de caso, pois, em
que apresentam sintomas semelhantes, isso não signiica sua opinião, ambos podem contribuir para a formu-
necessariamente que estes sintomas comuns sejam ne- lação e a testagem de hipóteses na pesquisa neuropsi-
cessariamente causados pelo mesmo motivo. cológica. Concordamos com Shallice e com sua pers-
Caramazza (1986), ao abordar os componentes pectiva mais moderada, que visa a compatibilizar os
necessários para a explicação dos achados neuropsicoló- dois tipos de metodologias, estudo de caso e de grupo,
gicos, realça a necessidade da construção de uma hipó- pois, acreditamos na possibilidade do intercâmbio de
tese inicial sobre o funcionamento normal de um dado informações para a construção teórica que possa advir
subsistema cognitivo. A seguir, ele aponta a necessidade do uso desses dois métodos.
da elaboração de uma hipótese a respeito de "como" este Apesar de demandarem mais tempo e esforços na
subsistema foi daniicado por certa lesão. Também a as- seleção dos pacientes apropriados, os estudos de gru-
sunção de que o comportamento apresentado pelo pa- po não devem ser rejeitados como metodologia, pois
ciente relete as operações do sistema cognitivo subtraído trazem a vantagem de resultados mais idedignos e a
de alguns de seus componentes (a assunção de transpa- possibilidade de maior generalização, estandardização
rência ou subtração) complementa estes requisitos. Por e comparação entre os pacientes. Também os estudos
último, a assunção de que todos os sistemas cognitivos de casos encontram alguns problemas tais como os pa-
funcionam do mesmo modo, quando intactos, a chama- drões de recuperação apresentados pelos pacientes após
da universalidade, é também um princípio básico que o comprometimento cerebral.
guia as análises explicativas na Neuropsicologia. Estudos longitudinais centrados na avaliação de
A partir desses princípios diretores mais amplos, padrões de recuperação podem ser também úteis na
Caramazza sugere algumas conclusões, realçando a im- pesquisa neuropsicológica, na medida em que acom-
portância dos estudos de caso único para a pesquisa panham a evolução dessa variação e podem ajudar na
neuropsicológica. Para ele, cada caso poderia ser vis- interpretação dos déicits. Estratégias utilizadas pelos
to como uma espécie de “teste independente” para a pacientes após a lesão, como já mencionamos inicial-
uma dada teoria e a generalização não poderia ser fei- mente, também podem complementar as diiculda-
ta de modo pré-teórico entre pacientes. Também, em des de avaliação do desempenho destes pacientes no
sua opinião, não é possível replicar um determinado sentido da discriminação dos déicits e preservações
achado clínico na Neuropsicologia. E, por último, os em seu quadro clínico.
estudos de grupo são por ele vistos como não possibi- Não obstante, o método das duplas dissociações
litando uma base signiicativa de dados para a genera- funcionais pode ajudar na identiicação desses déicits e
lização para a função normal. preservações e, assim, minorar os efeitos tanto da recupe-
Podemos inferir que Caramazza (1986) e Cara- ração quanto da utilização de novas estratégias cognitivas
mazza e Coltheart (2006), dentre outros, defendem o após a lesão cerebral. As duplas dissociações funcionais
estudo de caso único como o método mais adequado a são, neste sentido, mais importantes do que as dissociações
ser utilizado na investigação neuropsicológica que tem simples, no que se refere às diiculdades interpretativas dos
como objetivo a entendimento da função normal. Ellis déicits. Como vimos, eliminar a hipótese de uma interfe-
e Young (1988) também apóiam a legitimidade do estu- rência de diiculdade de tarefa, no sentido de uma maior
do de caso em detrimento dos estudos de grupos, con- complexidade da mesma afetando o desempenho de um
cordando com Caramazza e Caramazza e colaborador, paciente, é um dos papéis da dupla dissociação funcional.
no que a isso diz respeito.

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Cabe observar que, mesmo no estudo de caso em um dado teste para a postulação de hipóteses e de
único, normalmente, há a aplicação de uma abordagem inferências sobre a ‘função’ cognitiva que está sendo
experimental onde o próprio paciente é o seu "contro- avaliada. Aliás, a inferência feita a respeito do funcio-
le". Aspectos quantitativos são enfatizados e parecem namento cognitivo a partir dos resultados da avaliação
se conjugar para uma avaliação mais detalhada dos dé- comportamental obtidos em testes ou em tarefas expe-
icits e preservações apresentadas pelo paciente. Nesta rimentais, tanto em pacientes com déicits cognitivos
direção, como também assinala Lezak (1995), a avalia- quanto em indivíduos normais, pode sofrer efeitos in-
ção neuropsicológica pode ser vista como uma série de terpretativos variáveis. Em outros termos, para os au-
“experimentos” guiados por uma hipótese explicativa, tores, as funções cognitivas não seriam avaliadas per se,
como ocorre em situações tradicionais de pesquisa. Sen- mas sim o comportamento que, por sua vez, demanda
do assim, então, não só o neuropsicólogo mais direta- processos inferenciais para ser interpretado. E, como vi-
mente voltado para a pesquisa neuropsicológica, como mos, o próprio conceito de função mental pode variar
o neuropsicológo com uma ênfase mais clínica e nos de acordo com a abordagem teórica utilizada na área.
processos de reabilitação, poderiam ser considerados Cabe abrir um parênteses para a menção aos tra-
“pesquisadores” em sua prática. balhos desenvolvidos no contexto brasileiro, como os de
Como destacam Semenza, Bisiacchi e Rosenthal Capovilla (2007), Ferracini, Trevisan, Capovilla e Dias
(1988), há uma tendência, na Neuropsicologia Cognitiva, em (2007), Capovilla e colaboradores (2009), com ênfase
contraste com a Neuropsicologia das décadas de 50 e 60, para no uso da avaliação psicológica e na construção e vali-
a conformação de grupos menores e mais homogêneos de pa- dação de testes. Com o desenvolvimento de um grande
cientes e também para estudos de casos dentro de um grupo, número de testes e com uma abrangência de populações
ou seja, uma espécie de método misto que permite a análise estudadas, esses pesquisadores têm contribuído para o
das diferenças individuais dentro do estudo de grupo. aprimoramento metodológico e para a ampliicação de
Observamos assim na contemporaneidade, como questões teóricas na área.
também aponta Ralph (2004), o aumento do número Concluímos que a emergência do novo paradigma
de pesquisas que incluem uma série de casos que en- do processamento da informação, que muito inluen-
volvem pacientes similares, estudados tanto individu- ciou a Neuropsicologia Cognitiva, teve implicações não
almente quanto de modo comparativo. Este tipo de só do ponto de vista metodológico, ou seja, afetando o
metodologia “mista” parece compatibilizar as vantagens tipo de método e os procedimentos experimentais ado-
do estudo de caso único com as vantagens do estudo de tados, mas também afetando o tipo de inferência pos-
grupos de pacientes, como sugerem Ralph, Moriarty e sível a ser delineada a partir dos achados dos pacientes
Sage (2002). Esse tipo de metodologia “híbrida” pare- com lesão cerebral.
ce permitir, como observam esses últimos autores, uma Já no que se refere à questão da localização cerebral
melhor explicitação da relação entre a severidade do dé- da lesão, esta pode ser mais ou menos importante, depen-
icit e o desempenho na tarefa, algo que seria impossível dendo dos objetivos da pesquisa neuropsicológica. Na
apenas com estudos de casos únicos. clínica neuropsicológica, por exemplo, esta questão ainda
A utilização de testes padronizados, retirados de um tem bastante relevância, talvez mais do que nas pesquisas
pool de testes, a partir de uma hipótese explicativa, e a cognitivamente orientadas da Neuropsicologia Cogniti-
posterior escolha de testes ou tarefas complementares mais va. Pesquisadores como Shallice (2003), em estudos mais
especíicas para avaliar os aspectos mais comprometidos de recentes, destacam a importância dos estudos feitos com
cognição, pode ser um bom referencial tanto para os estu- técnicas de neuroimagem, pois acreditam que os mesmos
dos de caso quanto para os estudos de grupo. Esta aborda- podem ajudar não só no entendimento da organização ce-
gem mais focal, na clínica e na pesquisa neuropsicológicas, rebral de funções, mas também da compreensão do fun-
parece ter inúmeras vantagens, não só em termos de sua cionamento cognitivo humano. Inclusive, acreditamos
aplicabilidade, como também para a testagem de hipóteses que as inúmeras pesquisas que utilizam as atuais técnicas
mais deinidas e mais teoricamente direcionadas. de neuroimagem nas Neurociências têm contribuído para
Não obstante, como observam Newcombe e Ra- redimensionar a questão da localização cerebral de funções
tclif (1979), podemos observar algumas diiculdades na contemporaneidade, possibilitando, por um lado, uma
interpretativas quando se parte dos resultados obtidos localização mais precisa de algumas lesões em pacientes

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neurológicos e, por outro lado, o estudo do cérebro in vivo ajudaria na deinição de áreas cerebrais comprometidas.
em pacientes lesionados e em indivíduos normais. De modo complementar, possibilitaria entender o proces-
Em contraposição ao método anátomo-clínico, so de recuperação neuronal, ou seja, a plasticidade cerebral,
utilizado, muitas vezes, para inferir o locus da lesão em quando há algum tipo de injúria ou lesão.
pacientes neurológicos com a posterior localização post No que diz respeito à plasticidade cerebral, po-
mortem da área cerebral afetada, estas técnicas não inva- demos observar que, como sinalizam Bates e Elman
sivas podem prescindir desse tipo de inferência, isto é, a (1994), Stiles (2000) e Stiles e colaboradores (Stiles &
localização das áreas cerebrais e de sua ativação seletiva hal, 1994; Stiles, Reilly, Paul & Moses, 2005), e no
se dá diretamente pelas imagens obtidas. No caso de passado já havia sinalizado Lenneberg (1967), dentre
lesões cerebrais, ajudam na precisão do local e tamanho outros, a razoável recuperação de funções linguísticas
da lesão, trazem informações sobre processos de atroia e espaciais, após injúria cerebral no início do processo
cerebral e podem indicar assimetrias hemisféricas em do desenvolvimento ontogenético, sugere a ativação de
indivíduos com ou sem comprometimentos cerebrais. mecanismos de plasticidade em sistemas cerebrais ima-
Técnicas como a Tomograia Computadorizada turos em contraposição à menor plasticidade observada
(CT), a Imagem por Ressonância Magnética Funcional após comprometimentos cerebrais em adultos. Segundo
(fMRI) e a Tomograia por Emissão de Pósitrons (PET), Stiles (2000), com o desenvolvimento, os sistemas neu-
dentre outras técnicas de neuroimagem, têm também rais estabilizariam padrões de funcionamento otimiza-
ajudado no teste de modelos teóricos, muitos deles de dos, mas isto não elimina a capacidade de adaptação
inspiração computacional, além de revelaram os substra- destes sistemas, ainda que em menor grau.
tos neurais de processamentos cognitivos mais implícitos, Os estudos destes e de outros autores sugerem
inclusive podendo demonstrar a recuperação funcional que quando se compara as lesões cerebrais precoces com
cerebral, como sugerem Humphreys e Price (2001). Nes- as lesões adquiridas em adultos, os padrões de associa-
ta direção, o desenvolvimento de programas computa- ção entre o comportamento e o substrato neural afetado
dorizados que modelam o funcionamento cerebral tem pode ser mais variável, ou seja, como observa a autora
ajudado na testagem de hipóteses sobre este funciona- supracitada (Stiles, 2000), padrões particulares de mu-
mento, bem como tem ajudado na observação dos efeitos dança podem variar em função da idade e do domínio
de lesões seletivas em partes desse sistema (Santos, 2008). do conhecimento avaliado. Ainda que estes mecanismos
Também na concepção de Henson (2005), as não sejam bem conhecidos em suas bases, supõe-se que
técnicas de neuroimagem, especialmente a PET e a os mesmos envolvam mudanças tanto no substrato
fMRI ajudariam na construção da hipótese de um ma- neural quanto nas estratégias cognitivas utilizadas pelas
peamento “sistemático” entre estrutura e função no crianças para atingir determinados comportamentos.
cérebro, e poderiam auxiliar na testagem de modelos No se refere a algumas das implicações dos
teóricos, mas isso não signiica estabelecer uma corres- mecanismos de plasticidade para a pesquisa na área,
pondência termo a termo de variáveis comportamentos podemos observar assim certo dinamismo na própria
com estruturas cerebrais. Neste caso, segundo este au- organização funcional ao longo do desenvolvimento,
tor, os dados trazidos por estas técnicas poderiam ser especialmente na criança, mas também em adultos,
considerados uma variável dependente, como a própria ainda que em menor grau, o que parece trazer alguns
variável comportamental, e poderiam ajudar não só no problemas para o pressuposto de uma estabilização
diagnóstico clínico de pacientes, mas também nas pes- funcional invariável. Inclusive, podemos aqui argu-
quisas experimentais da Psicologia Cognitiva. mentar se as técnicas de neuroimagem funcional se-
Santos (2008) destaca que as inovações tecnológi- riam sensíveis para captar esse tipo de variabilidade,
cas expressas pelas diferentes técnicas de neuroimagem es- especialmente quando a mesma é sutil.
trutural e funcional, aliadas às técnicas neuroisiológicas, Um outro problema que observamos no uso das
podem auxiliar no diagnóstico precoce dos distúrbios cog- técnicas de neuroimagem refere-se ao fato de que tam-
nitivos e comportamentais. E para Marcucci e Vandresen bém pode haver variabilidade nos indivíduos em termos
(2006), a análise da atividade cerebral in vivo ajudaria na de idade, sexo, preferência manipulatória, dentre outras
identiicação das áreas do cérebro que estão mais ativadas e variações inter-individuais que podem ter implicações
subjacentes a determinados comportamentos, bem como na organização funcional cerebral, o que pode levar a

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uma maior diiculdade de interpretação das imagens e fato de não se mostrarem totalmente sensíveis a determi-
do cotejamento das mesmas. Nesta perspectiva, as vari- nados tipos de lesões mais difusas ou originadas por pro-
áveis individuais devem ser consideradas quando se uti- blemas neuroquímicos cerebrais. De modo complementar,
liza este tipo de técnica, o que poderia limitar, a nosso a diiculdade de ajustamento temporal entre as variáveis
ver, o grau de generalização das correlações anátomo- comportamentais, muitas delas de grande complexidade,
-funcionais encontradas. e as variáveis cerebrais subjacentes podem inluenciar na
De modo complementar, podemos argumentar interpretação das imagens obtidas e, consequentemente,
quais seriam as implicações das técnicas de neuroima- podem levar a correlações equivocadas e/ou parciais entre
gem para a Neuropsicologia, em especial para a Neu- essas variáveis. Em alguns casos, a nosso ver, poderia ocor-
ropsicologia Cognitiva. Muitos pesquisadores, espe- rer também a interpretação de uma relação de causa-efeito
cialmente aqueles com ênfase ‘ultra-cognitivista’, como entre estas variáveis onde apenas são encontradas correla-
Ellis e Young (1988), como o próprio adjetivo insinua, ções mais amplas, o que poderia levar a conclusões apressa-
costumam negligenciar as variáveis cerebrais e a locali- das e errôneas a respeito da relação entre as bases cerebrais
zação cerebral de funções, enfatizando a construção de de determinados comportamentos.
modelos de processamento da informação tendo como Por im, acreditamos que as modernas técnicas
inspiração o pressuposto da modularidade da mente. de neuroimagem, apesar de suas limitações, nem todas
Através da priorização de estudos de casos únicos, con- elas aqui elencadas, podem trazer signiicativas con-
sideram, inclusive, que a Neuropsicologia Cognitiva é tribuições não só para a compreensão da organização
uma espécie de ‘método’ da Psicologia Cognitiva, na cerebral das funções cognitivas humanas, mas também
medida em que pode trazer contra-exemplos’, ou seja, para o entendimento do funcionamento cognitivo per
exemplos que possam refutar, a partir de uma lógica de se. Neste sentido, dependendo dos objetivos da pes-
falseabilidade, modelos estabelecidos de cognição nor- quisa clínica, experimental e/ou teórica e da formação
mal. Neste contexto, podemos argumentar que as téc- dos pesquisadores que compartilham do interesse pelo
nicas de neuroimagem não adquirem a importância que estudo da relação cérebro-mente, as técnicas de neuroi-
possuem para outras abordagens neuropsicológicas mais magem podem adquirir maior ou menor importância.
preocupadas com a relação cérebro-mente per se. Porém, cabe observar que o alto custo desses recursos
Como mencionamos anteriormente, a pressupo- tecnológicos faz com que os mesmos nem sempre este-
sição de modularidade aplicada ao contexto da Neurop- jam disponíveis para a pesquisa neuropsicológica.
sicologia Cognitiva é mais afeita à perspectiva de Marr
(1982) do que a de Fodor (1983), ou seja, a idéia de um Considerações Finais
encapsulamento informacional dos módulos cognitivos,
preconizada por Fodor, bem como o caráter inato dos A signiicativa evolução teórica e metodológica
mesmos, não encontra total respaldo na área. Inclusive, que tem ocorrido nas Neurociências de modo geral, em
na contramão da perspectiva inicial de Fodor, alguns especial na Neuropsicologia contemporânea, tanto em
autores (i.e. Norman & Shallice, 1980; Shallice, 1988) sua vertente mais cognitivista, com menor ênfase no es-
propõem uma organização semi-modular em sistemas de tudo do hardware cerebral, quanto em sua vertente mais
domínio geral, como os sistemas centrais, e não apenas
moderada, com igual ênfase no funcionamento cogniti-
em sistemas de domínio especíico. Observamos ainda
autores que parecem compatibilizar uma abordagem mo- vo e na localização cerebral de funções, tem muito con-
dularista com o uso de técnicas de neuroimagem, como tribuído para o entendimento da cognição deicitária
alguns expoentes da chamada Neurociência Cognitiva exibida pelos pacientes neurológicos, bem como para o
(i.e. Swick, Ashley & Turken, 2008, dente outros), pois, entendimento das funções cognitivas normais.
mesmo que não utilizem explicitamente o termo “mo- Acreditamos, conjuntamente com Vallar (1999),
dularidade” em seus argumentos teóricos, a nosso ver, que os estudos de caso único e os estudos de grupos de
propõem correspondências mais estritas entre estruturas pacientes desenvolvidos na área, a par de suas vantagens
cerebrais e determinados funcionamentos mentais. e limitações metodológicas, podem contribuir, ambos,
Não obstante, algumas limitações das técnicas de para o desenvolvimento do conhecimento a respeito da
neuroimagem poderiam ser apontadas, dentre elas está o arquitetura neural e funcional envolvida nas funções

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mentais, e não haveria razão para a exclusão de uma ma cientíico atual com as técnicas de neuroimagem
destas fontes de pesquisa clínica e teórica. Mas, depen- funcional em um contexto teórico com diversiicados
dendo dos objetivos da pesquisa e das circunstâncias, modelos de processamento da informação, o percur-
pode haver a priorização de um destes tipos de estudos. so da pesquisa em Neuropsicologia parece ter se dado
Os estudos de caso único ainda se mostram relevan- por etapas, ou escolas, como prefere Shallice (1988),
tes na contemporaneidade, a nosso ver, pela diiculdade de etapas estas que utilizaram, preferencialmente, alguns
se encontrar, na clínica neuropsicológica, muitas vezes, ho- métodos e técnicas de pesquisa.
mogeneidade nos sintomas exibidos pelos pacientes. Neste Cabe observar que quando um novo método sur-
contexto, as técnicas de neuroimagem poderiam ajudar na ge no panorama cientíico costuma haver certa adesão
identiicação do locus da lesão, bem como, em alguns ca- imediata ao mesmo e certa priorização de suas vantagens
sos, de sua particularidade anatômica, corroborando assim em detrimento de suas limitações. Porém, acreditamos
os achados clínicos peculiares encontrados na avaliação que o aumento de pesquisas que utilizam estas aborda-
clínica. Podemos ainda realçar o valor epistemológico dos gens metodológicas, muitas delas relatando diiculdades
estudos de casos na falsiicação de hipóteses e de modelos e/ou a insuiciência do método e/ou das técnicas a este
teóricos, na tradição de estudos clássicos na área, como os relacionadas para o alcance de determinados objetivos,
de Baddeley (1990, 2000). possa suscitar uma relexão crítica a respeito das vanta-
Os estudos de grupos, por sua vez, também pa- gens e limitações do método ou técnica em questão.
recem se beneiciar do uso de técnicas de neuroimagem No que se refere às técnicas de neuroimagem, a
funcional, pois as mesmas permitem a seleção de indi- par de suas possibilidades e limites metodológicos e
víduos a partir de critérios anatômos-funcionais. Nesta inferenciais, acreditamos que as mesmas possam con-
perspectiva, tanto os estudos com pacientes com síndro- tribuir de modo signiicativo para a pesquisa na Neu-
mes neurológicas adquiridas, congênitas e/ou genéticas, ropsicologia, apesar de observarmos, em alguns casos,
transtornos psiquiátricos ou do desenvolvimento, den- certo exagero no tipo de inferência feito a respeito da
tre outros, quanto os estudos com indivíduos normais relação cérebro-mente tendo como base a avaliação da
poderiam se beneiciar do uso desse tipo de técnica. atividade cerebral.
Os achados obtidos em pesquisas experimentais De modo complementar, acreditamos que a
com sujeitos animais e, em alguns casos, com o uso de construção de modelos de funcionamento cognitivo
neuroimagem (como as de Shadlen e Newsome, 2001) humano e o teste de sua aplicabilidade na clínica e na
com macacos rhesus, dentre outras) e com sujeitos hu- pesquisa neuropsicológicas também podem trazer con-
manos sem comprometimentos cerebrais também po- tribuições importantes para o desenvolvimento teórico
dem contribuir para corroborar os achados sugeridos e metodológico no âmbito das Ciências Cognitivas, in-
pelas pesquisas desenvolvidas na clínica neuropsicoló- cluindo aqui a Psicologia Cognitiva, e das Neurociên-
gica, sendo esse intercâmbio de informações bastante cias de modo geral.
profícuo para o desenvolvimento da área. A natureza investigativa da Neuropsicologia me-
Nesta perspectiva, acreditamos que uma aborda- rece aqui destaque, pois são as hipóteses teoricamente
gem integrativa e inclusiva dos estudos de caso único e guiadas que fornecem a linha base norteadora na pes-
de grupo de pacientes, conjuntamente com os estudos quisa, avaliação e reabilitação neuropsicológicas. Como
experimentais com sujeitos animais e com indivíduos vimos, as abordagens de avaliação neuropsicológica des-
normais, possibilitaria não só o cotejamento de infor- de aquelas situadas em um pólo mais quantitativo de
mações obtidas a partir de diferentes técnicas e méto- análise até aquelas situadas em um pólo mais qualitativo
dos, mas também a articulação de saberes que, apesar de devem levar em conta o caráter investigativo de todo
diferenciados, a nosso ver, não se mostram excludentes. trabalho neuropsicológico, seja nos processos de avalia-
Desde os primórdios dos estudos da relação cé- ção, diagnóstico e reabilitação, seja na pesquisa empíri-
rebro-mente, com a emergência do método anátomo- ca e na construção teórica.
-clínico e sua contribuição pioneira para uma análise Por im, apesar do grande desenvolvimento teó-
verdadeiramente cientíica dessa relação, passando pe- rico e metodológico que as Neurociências e a Neurop-
los avanços metodológicos originados pela construção sicologia vêm vivenciando nas últimas décadas, acredi-
e estandardização de inúmeros testes, até o panora- tamos que ainda existam muitos problemas teóricos e

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