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REVISÃO

Ciências & Cognição 2021; Vol 26(2) 360-369 © Ciências & Cognição
ISSN 1806-5821 <http://www.cienciasecognicao.org/revista>
Submetido em 13/02/20 | Aceito em: 13/06/21 | Publicado online em 31/12/21

Revisão da literatura sobre Transtorno Opositivo Desafiador


e Transtorno de Conduta: causas/proteção, estratégia escolar
e relação com a criminalidade

Literature review about Oppositional Defiant Disorder and Conduct Disorder:


causes / protection, teaching school and relationship with crime

Dhaniella Cristhina de Brito Oliveira, Danielle Rodrigues Monteiro da


Costa *

Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática,


Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará, Marabá, Pará, Brasil.

Resumo
De acordo com variados estudos científicos, nas idades escolares os estudantes
podem apresentar diferentes distúrbios comportamentais. Assim, este artigo
tem como objetivo apresentar uma revisão da literatura sobre o Transtorno
Opositivo Desafiador (TOD) e o Transtorno de Conduta (TC) de modo a
favorecer o diagnóstico e intervenções escolares. Para isso, realizou-se busca
por descritores no Portal da Capes e no Google Acadêmico em que foram
selecionados trabalhos mais recentes escritos em português e inglês que
continham no título dos manuscritos os termos da busca e os conteúdos destes
foram divididos em categorias, tais como, fatores de causa/proteção;
estratégias de trabalho com alunos acometidos de TOD e TC e a relação que os
distúrbios podem apresentar com o cometimento de atos infracionais.
Verificou-se que os autores abordam que ambos os distúrbios podem
desenvolver-se pela influência do ambiente social das crianças e adolescentes,
e que o professor pode exercer influência sobre o comportamento e
rendimento escolar destes estudantes. O presente estudo contribui, portanto
para a compreensão dos distúrbios a partir da exposição do debate de diversos
autores o que pode auxiliar professores, alunos e pais no trabalho com pessoas
acometidas de TOD e TC.

Palavras-chave: transtorno de conduta; transtorno opositivo desafiador;


revisão.

Abstract
According to several scientific studies, at school age, students may have
different behavioral disorders. Thus, this article aims to present a literature
review on Oppositional Defiant Disorder (ODD) and Conduct Disorder (CT) to
favour diagnosis and school interventions. A search for descriptors in Capes

*
D.R. M. da Costa - E-mail: danymont@uepa.br br – ORCID http://orcid.org/0000-0002-8593-371X; D.C.O.
Oliveira – ORCID http://orcid.org/0000-0002-9051-3584

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Submetido em 13/02/20 | Aceito em: 13/06/21 | Publicado online em 31/12/21

Portal and Google Scholar was carried out, in which more recent works written
in Portuguese and English that contained the search terms in the title of the
manuscripts and their contents were divided into categories, such as
causative/protective factors; work strategies with students suffering from ODD
and CT, and the relationship that the disorders can present with infractions. We
found that the authors state that both disorders can develop under the influence
of the children's and adolescents' social environment and that the teacher can
influence their behavior and academic performance. Therefore, the present
study contributes to the understanding of disorders from the discussion of
several authors' debates, which can help teachers, students, and parents work
with people with ODD and CT.

Keywords: conduct disorder; oppositional defiant disorder; revision.

Introdução

Vários são os fatores que impedem que o trabalho pedagógico em sala de aula ocorra
de maneira mais proveitosa. Entre esses fatores está o mau comportamento estudantil que
toma do professor tempo de aula, atenção dos demais alunos de classe, entre outras
consequências. Quando este comportamento dos estudantes se torna preocupante?
Considerando a faixa etária dos alunos entre os anos iniciais e finais de escolarização, têm-se
idades em que podem ser apresentados diferentes distúrbios comportamentais, dentre os
quais os de conduta.
Os distúrbios de conduta são um conjunto de problemas e comportamentos repetidos
agressivos, violentos, antissociais, ou desafiadores, capazes de violar regras, deveres e normas
sociais. Nesta categoria estão o Transtorno Opositivo Desafiador (TOD) e o Transtorno de
Conduta (TC). O TOD caracteriza-se por um padrão de comportamentos hostis, desafiadores
e desobedientes, iniciados normalmente entre seis e oito anos, raramente após o início da
adolescência. Assim, as pessoas acometidas deste transtorno não se sujeitam a regras, por
não se conformarem com as exigências de outros, e tendem a enfrentar e questionar os
adultos ou figuras de autoridade que tentam colocar regras e estabelecer limites para com
eles. Quantitativamente, o transtorno atinge uma média de 6% das crianças e adolescentes, e
é similar em ambos os gêneros, porém, apresenta-se com maior persistência em crianças do
gênero masculino e suas características variam de acordo com a idade da criança e a gravidade
do transtorno (Bernardo, Silva & Santos, 2017; Silva, 2017; Araújo & Araújo, 2017; Vilhena &
Paula, 2017).
Quando não tratado o TOD pode evoluir para o TC, que, caracterizado como um
transtorno mais grave, apresenta padrões persistentes de conduta dissocial, agressiva ou
desafiante. Crianças e adolescentes com TC expressam comportamentos vingativos,
rancorosos, explosivos, com perda rápida de temperamento, reagindo de maneira agressiva
às pessoas e animais, destruindo propriedade e apresentando um padrão de roubo ou de
falsidade (American Psychiatric Association, 2014). Ambos os transtornos se desenvolvem em
indivíduos com idade inferior a 18 anos, momento que corresponde às idades escolares em
que crianças e adolescentes brasileiros estão cursando o ensino básico (fundamental e
médio), passando em média quatro horas diárias no ambiente escolar.

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A presente revisão tem por objetivo apresentar uma revisão da literatura sobre o
Transtorno Opositivo Desafiador (TOD) e o Transtorno de Conduta (TC) de modo a favorecer
o diagnóstico e intervenções escolares.

1. Fundamentação

Ambos os transtornos estão descritos no Manual Diagnóstico e Estatístico de


Transtornos Mentais (American Psychiatric Association, 2014). Documento mundial que
aborda critérios para o diagnóstico do transtorno a partir da verificação da existência de um
padrão de comportamento em indivíduos com idade inferior a 18 anos. Para que o diagnóstico
seja positivo, o indivíduo deve nos últimos 12 meses apresentar pelo menos quatro ou mais
comportamentos dos 15 critérios diagnósticos presentes no manual, associado de no mínimo
um comportamento antissocial (furtos, brigas com uso de armas etc.) nos últimos seis meses.
De acordo com Ezpeleta, Navarro, Osa, Penelo e Domenech (2019), no período da pré-
escola a probabilidade de aparição de distúrbios de conduta é alta, apresentando diminuição
no início da infância (6 e 7 anos) e outro aumento na aproximação da puberdade (8 e 9). Vale
destacar que este é o período em que a criança está adquirindo habilidades importantes de
autorregulação e função executiva, aprendendo a lidar com as suas frustrações pessoais e
emoções provenientes da vida em sociedade. Na convivência social, Dias (2012) informa que
pessoas com distúrbios de conduta podem ter suas relações comprometidas pela
impulsividade, alteração na regulação do afeto, e prejuízos nas funções executivas e na
atenção dos seus portadores, além de apresentarem riscos de desenvolver outros problemas,
incluindo transtornos de ansiedade e depressão.
No ambiente escolar, Rodrigues, Sousa e Carmo (2010) relatam, em um estudo de
caso, que no ensino fundamental o aluno tende a desafiar professores e demais funcionários
que tentam lhe impor limites, persistem na violação de normas sociais, rotineiramente brigam
com os colegas, não realizam tarefas extraclasse, culpam aos outros por seu comportamento
hostil e apresentam baixo rendimento escolar trazendo limitações acadêmicas e sociais às
crianças ou aos adolescentes.
Quanto ao baixo rendimento escolar que estes alunos podem apresentar, diferentes
autores abordam que esses transtornos psiquiátricos não apresentam ligação direta com
dificuldade de aprendizagem. No entanto, o transtorno pode potencializar prejuízos na
atenção dos seus portadores no processamento de linguagem e na aquisição de novas
informações, o que pode causar repetência e evasão escolar. Além disso, o transtorno pode
incidir no trabalho do professor com os demais alunos individual e coletivamente, uma vez
que pode promover agressões verbais e físicas aluno-aluno e aluno-professor, sendo
necessário o desenvolvimento escolar de estratégias de apoio a estes estudantes, tais como
intervenções que reforcem a pro- atividade e o comportamento pró-social de maneira a
reduzir comportamentos disruptivos (Vilhena & Paula, 2017; Tyler, White, Thompson & Blair,
2019).
Nas escolas, no entanto, Silva (2017) ressalta que não há suporte adequado para
identificar ou mesmo desenvolver estratégias para o trabalho com alunos que sofrem dos
transtornos já citados. Isto tem contribuído para que, cada vez mais, sejam acentuadas
rotulações indevidas aos alunos que possuem transtornos definindo-os como hiperativos, sem
limites etc., além de favorecer momentos de agressão aluno-professor e aluno-aluno. Atitudes
estas que comprometem a missão educativa das instituições escolares.

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2. Método

2.1. Indexadores

O material para revisão foi selecionado a partir de consultas feitas ao Portal de


periódico CAPES e no Google Acadêmico, realizadas durante os meses de abril e maio de 2019
em que foram utilizados os seguintes descritores para a pesquisa: transtorno de conduta na
escola; transtorno opositivo desafiador na escola, acrescidos de suas traduções não literais
para a língua inglesa.

2.2. Critérios de inclusão e exclusão

Os critérios de inclusão foram: conter os descritores da busca no título do trabalho;


trabalhos escritos em língua inglesa publicados no primeiro trimestre de 2019; trabalhos em
língua portuguesa de estudantes de pós-graduação ou publicados em revistas científicas;
trabalhos com público cumpridor de medida socioeducativa; trabalhos práticos em escolas e
disponibilidade da publicação em formato integral. Por sua vez, foram considerados para
critério de exclusão trabalhos de revisão sistemática e/ou estudos teóricos.
Para a amostragem final, foram considerados relevantes trabalhos que ao debaterem
os transtornos de comportamento mencionavam o ambiente escolar e socioeducativo.
Os estudos selecionados para a amostragem final foram lidos na íntegra e suas
informações organizadas em categorias como: causas/proteção, estratégias de trabalho com
alunos acometidos de distúrbios de conduta e relação com atos infracionais.

3. Desenvolvimento

Na busca de trabalhos científicos que tratassem do tema, observou-se que os


distúrbios de conduta, quando comparados a demais transtornos são pouco pesquisados.
Referente aos transtornos discutidos neste trabalho observou-se na busca nos portais, que há
um maior número de estudos sobre o Transtorno de Conduta do que referente ao Transtorno
Opositivo Desafiador. A amostragem final foi composta por 16 estudos, os quais apresentam
seus conteúdos divididos em diferentes categorias, que passam a ser expostas abaixo.

3.1. Causas/proteção

Todos os trabalhos revisados neste artigo abordavam que não há esclarecimento


quanto à etiologia desses transtornos comportamentais. Descrevem, no entanto, que
observações referentes à idade de apresentação dos transtornos fazem com que diferentes
autores atribuam suas causas a fatores ambientais, sugerindo que, a família como primeiro
núcleo de aprendizagem de comportamento das pessoas seria responsável pela modelagem
de comportamentos e que devido as fortes influências das atitudes dos genitores, as crianças
poderiam interiorizar as experiências vivenciadas e formar sua personalidade (Dias, Oliveira-
Monteiro & Aznar-Farias, 2014; Adams, 2010). Sob esta mesma visão, Teixeira (2014)
esclarece que alguns fatores familiares influenciam, incluindo:

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Complicações pré e perinatais [...], psicopatologia e comportamento criminoso na família [...],


desenvolvimento materno e paterno deficiente [...], supervisão deficiente [...], perturbações das
qualidades das relações familiares [...], discórdia conjugal [...], tamanho da família [...] e
desvantagem socioeconômica (Teixeira, 2014, p. 50).

Kivumbi et al. (2019) e Saunders et al. (2019) sugerem que a pobreza extrema, a
violência, a presença de doenças sexualmente transmissíveis (presentes nos genitores) e a
mortalidade parental podem ser fatores associados aos transtornos de conduta, estando
relacionados à natureza ambiental, biológica, ou a um conjunto amplo de fatores que
interagem entre si, desencadeando o desenvolvimento de transtornos comportamentais.
Assim, denota-se influência da relação afetiva com os pais, a maneira de punição empregada
a estes, falta de carinho parental, sentimento de insegurança, hostilidade, agressividade em
relações sociais e familiares, humilhações, abuso físico e psicológico, e exposição a desenhos
de violência e jogos como estímulos ao comportamento agressivo, podendo provocar
alterações nos traços calosos dos portadores de transtornos. Referente a isto, Tyler et al.
(2019) afirmam que no cérebro de um jovem com problema de conduta, verifica-se
diminuição da atividade na via amígdala-ínsula, levando a elevada frieza emocional e pouco
remorso ou culpa pela angústia gerada a outros indivíduos o que pode reforçar suas atitudes
antissociais pela diminuição da reatividade autonômica ao medo e tristeza (Souroulla, Panteli,
Robinson & Panayiotou, 2019)
As atitudes demonstradas por pessoas com distúrbio – caracterizadas por Severa et al.
(2019) como falta de remorso ou culpa, insensibilidade, falta de empatia, falta de preocupação
com o desempenho e afeto superficial ou deficiente – faz com que, segundo Silva (2017), as
pessoas com o transtorno sejam muito prejudicadas por rejeições que são geradas em torno
deles. Isso gera nos portadores grande sofrimento por sua não aceitação uma vez que estes
não se consideram raivosos, opositores ou desafiantes, não compreendendo suas atitudes
como antissociais.
Quanto à forma de tratamento, ambos os transtornos, até o encerramento desta
pesquisa, não apresentavam cura, podendo apenas ser seus sintomas amenizados pelo uso
de neurolépticos e com psicoterapias que vão de treinamento de soluções de problemas,
desenvolvimento de habilidades sociais e orientação de pais e professores.
Os programas de tratamento para aspectos cognitivos e familiares associados aos
distúrbios, segundo Dias (2012) devem ser realizados enquanto o portador ainda é criança,
uma vez que, com o passar dos anos, há diminuição nas habilidades adaptativas do sujeito.
Essa diminuição ocorre devido a diátese-estresse que, de acordo com estudos de Tyler et al.
(2019), faz com que quanto maior for a exposição de um indivíduo a situações de estresse,
mais elevado serão seus traços calosos-não-emocionais, fazendo com que estes sejam menos
sensíveis a causar prejuízos físicos, materiais ou mentais a outras pessoas, reagindo de forma
excessiva a estressores moderados pelo resto de sua vida. Felizmente, vulnerabilidade
genética não significa imutabilidade, podendo ser tomadas medidas preventivas e estratégias
de tratamento que se baseiam em contrapor influências ‘negativas’ por ‘positivas mais fortes’
através de diferentes ações conjuntas com a família, a comunidade, a escola e com o próprio
menor (Rodrigues, 2009; Osa, Penelo, Navarro, Trepat & Ezpeleta, 2019).

3.2. Estratégias de trabalho com alunos acometidos de distúrbios

A divulgação nas escolas e em momentos de formação continuada para professores e


gestores sobre os possíveis transtornos que podem ser gerados nas idades escolares, de

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acordo com Rodrigues et al (2010) e Silva (2017) são de extrema importância para que a escola
crie estratégias de trabalho com os alunos e para que seja superado equívocos de avaliação
que categorizam alunos com distúrbios de conduta como pessoas com dificuldade de
aprendizagem. Isto impede a realização de intervenções necessárias ao trabalho com estas
crianças e adolescentes.
Referente às estratégias para o trabalho docente com os estudantes, apresentados
neste trabalho, ressalta-se que não se tem uma receita infalível de como lidar com alunos
acometidos de distúrbios de comportamento; a primeira tática seria buscar ajuda de um
profissional qualificado, como a exemplo psicólogos e psicopedagogos. Esses profissionais,
conhecendo o caso, podem traçar planos de trabalho juntamente com o professor para um
atendimento personalizado do aluno que sofre desse e de outros distúrbios. Trabalhos como
o de Araújo e Araújo (2017) demonstram grandes benefícios deste método, pois como citado
anteriormente, o transtorno é dimensional em sua gravidade, e o atendimento personalizado
permite um trabalho mais centrado no comportamento antissocial apresentado pelo
estudante.
Em continuidade, Rodrigues et al (2010) entendem ser de extrema importância
estabelecer rede de relações escola-família-profissionais especializados. Essas redes são
cooperativas; assim, a escola responsabiliza-se pelos ensinamentos necessários que lhe cabe,
como: realização de intervenções cognitivas, treinamento em habilidades sociais, orientação
vocacional e reforço escolar, além de permitir a intervenção de profissionais especializados
na melhoria das didáticas de ensino do aluno com transtorno. Evita-se, assim: práticas
educativas coercitivas, abuso físico e psicológico; negligência, disciplina relaxada, punição
inconsistente e monitoria negativa. A família fica incumbida do papel de fortalecimento de
boas relações familiares. Nesta estratégia, no entanto, segundo Bernardo et al (2017), é
necessário que cada um compreenda e faça o seu papel, uma vez que esforços unilaterais
sobrecarregam e podem não surtir os efeitos esperados.
Diferentes autores entendem que no ambiente escolar, a relação professor-aluno não
deve ser marcada por rotulações. É importante que o docente conheça o aluno e a família
dele e procure sempre apresentar uma postura pedagógica adequada, uma vez que as
crianças e adolescentes tendem a imitar modelos que, para eles, são significativos. Quanto às
atividades pedagógicas, Carmo (2010) comenta que o professor pode elaborar: provas com
poucas questões, sendo estas claras e diretas; provas orais; direcionar menor quantidade de
lições para serem feitas em domicílio; exercitar o conteúdo mediante repetições de exercícios;
permitir o uso de gravador, tabela periódica e calculadora para determinados momentos da
aula, incentivar o uso de estratégias de memorização e recuperação de informações, entre
outros.
Fora isto, em sala de aula é importante que o professor dialogue com o aluno com o
transtorno, perguntando a ele, por exemplo: sobre sua relação com a família, quais tarefas
desenvolvem em casa, o que gosta de estudar/fazer na escola, porque não gosta de fazer
outras atividades e assim por diante, de forma a identificar qual estratégia pedagógica será
mais bem recepcionada por esse aluno e, também, as formas de aproximação entre aluno e
professor mais viáveis, promovendo a autoestima dos estudantes e estimulando a confiança
e a satisfação no convívio em sala de aula. A relação harmoniosa professor-aluno é
fundamental para que crianças com transtornos percam a concepção de que adultos apenas
agem de forma severa e punitiva e disponham-se a estabelecer conversas honestas e objetivas
sobre seu comportamento, sem partirem para agressões (Silva, 2017; Araújo & Araújo, 2017).

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Além da relação aluno–professor, o convívio com os demais estudantes da classe deve


ser o mais sadio possível. Araújo e Araújo (2017) em seu trabalho com estudantes acometidos
de transtornos recorre à explicação da doença aos demais alunos da sala de aula de maneira
a demonstrar a importância da melhoria de suas relações, oportunizando, a partir do
conhecimento do transtorno, um melhor relacionamento intraclasse. No entanto, esta forma
de abordagem pode também causar a prática de bullying com o estudante acometido de
transtorno, criando assim maiores empecilhos ao tratamento do aluno. Os autores citam,
ainda, que a turma e o aluno com transtorno podem discutir propostas metodológicas para
auxiliar os professores no aperfeiçoamento e/ou criação das didáticas de ensino,
demonstrando ao estudante com TC ou TOD que as tarefas e regras da escola não lhe estão
sendo impostas, mas também escolhidas por ele, dando-lhe a sensação de está realizando as
tarefas por vontade própria. Após o estabelecimento das regras de convívio em turma, é
importante dialogar continuamente com os estudantes abordando o que foi estabelecido de
forma cooperativa, elogiando ou relembrando aos alunos as atitudes que foram acordadas.
Os elogios podem agir como recompensas pelo cumprimento das medidas de convivência
estabelecidas. Isto ajuda, ainda, a reincorporar outra estratégia, a motivação, pois a
capacidade de empatia entre professor-aluno e aluno-aluno pode fazer com que sejam
sustentados relacionamentos de alta qualidade, diminuindo conflitos e melhorando o
desempenho acadêmico dos estudantes (Tyler et al. 2019).
Um método no qual autores apresentam divergência de pensamento refere-se ao
trabalho em grupo e ao uso de jogos didáticos em sala de aula. Enquanto, a exemplo, Araújo
e Araújo (2017) sugerem que esta metodologia de ensino não é apropriada devido os alunos
com transtorno não se sentirem à vontade pelas regras do jogo e também no trabalho em
grupo, Rodrigues et al (2010) aconselham os professores a levarem para sala de aula jogos
educativos que estimulem os alunos a se comportarem melhor. Sendo assim, cabe a
verificação do comportamento do aluno ou, como Rodrigues et al 2010 nomeiam o “remapear
do comportamento”, comparando resultados de suas observações com o de outros
profissionais da educação, analisando o comportamento dos alunos perante o jogo e ao
trabalhar em grupo. Isto permite verificar o que incomoda o aluno nesses dois momentos, as
atitudes que ele apresenta quando não se sente à vontade, e quais recompensas recebem por
esse comportamento. Assim, o professor pode traçar maneiras de direcionar a atividade de
forma que o estudante com transtorno possa realizá-la. Caso os resultados não sejam
positivos, não surtindo os efeitos desejáveis, o professor pode direcionar o aluno para o
trabalho em dupla com uma criança mais tranquila, que sirva de modelo. Ao invés do uso de
jogos o professor, pode realizar oficinas de desenvolvimento de brinquedos, maquetes,
desenhos, entre outras tarefas acordadas. Além disso, pode apresentar filmes não agressivos,
que sinalizam maneiras adequadas de resolver conflitos, de forma a propiciar o contato com
atitudes que possam ser interiorizadas pelo aluno e que ele possa querer imitar.

3.3. Relação com atos infracionais

Ao longo dos anos, diferentes pesquisas vêm sendo realizadas em diversos países para
identificar a relação que os transtornos comportamentais podem ter com o cometimento de
atos infracionais. Em antecipação, Pacheco e Hutz (2009) já apontavam que atitudes
antissociais ocorridas na infância poderiam ser protótipos do que pode acontecer no futuro.
Estudos mais recentes sugerem que, se não houver tratamento adequado, por dimensões
supostamente performativas do TOD, pode-se supor que a criança com o transtorno será um

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adulto em conflito com a lei. Isso não significa que todas as pessoas com distúrbios de conduta
se tornarão delinquentes, mas as condições ambientais destes e a falta de tratamento podem
desencadear atitudes antissociais consideradas graves.
Em relação a pesquisas desenvolvidas nesta área, Perez (2017), em seu estudo sobre a
prevalência de transtornos psiquiátricos em jovens infratores, afirma que o Transtorno de
Conduta tende ao envolvimento em atividades perigosas e até mesmo ilegais. Já Andrade,
Assumpção Jr., Teixeira & Fonseca (2011) demonstram que, entre meninos e meninas sob
condições de medida socioeducativas no Rio de Janeiro: um quantitativo de 77% tinha TC e
50% tinham TOD; havia uma maior prevalência de transtornos psiquiátricos na população
feminina de infratores adolescentes, quando comparada com a masculina. Em relação ao
ambiente familiar dos adolescentes infratores: 70% tinham sido expostos a alguma droga
ainda na vida intrauterina; 82% deles tinham caso de alcoolismo na família; 48% casos de
drogas ilícitas; aqueles que eram filhos de mães alcoólatras fizeram uso mais cedo de álcool.
Características do ambiente familiar semelhantes foram encontradas ao pesquisar fatores
familiares que podem influenciar o aparecimento do TOD e do TC.
Este último dado apresentado é de suma importância, uma vez que o comportamento
infrator pode ser determinado por dimensões sociais, culturais, individuais e familiares,
demonstrando que o ambiente de interação da criança pode ter graves influências no seu
desenvolvimento comportamental, evidenciando, ainda, que muitas atitudes delinquentes
podem estar ligadas a problemas de conduta por uma relação histórica entre transtorno
mental e delinquência a partir, entre outras coisas, das experiências infantis de negligência e
precariedade em termos de cuidados afetivos (Dias et al, 2014; Pacheco & Hutz, 2009; Perez,
2017).
Sabendo da associação da delinquência e criminalidade com os problemas de conduta,
Vilhena e Paula (2017) ressaltam que detectar os transtornos disruptivos na primeira infância
é de suma importância para prevenir que seus possuidores desenvolvam, quando adulto,
Transtorno de Personalidade Antissocial e casos irreversíveis de esquizofrenia e psicoses. No
entanto, embora várias pesquisas abordem esta relação, ainda é tímida em vários países,
inclusive no Brasil, a elaboração de programas de tratamento e/ou intervenções adequadas
para evitar que este problema se expanda.

4. Considerações finais

Observa-se mediante as literaturas apresentadas que os distúrbios de conduta afetam


não somente seus portadores, mas também uma gama de pessoas que, direta ou
indiretamente, estão associadas a estes indivíduos. O que é preocupante é que estes
transtornos quando não tratados apresentam possibilidade de evoluir a quadros bem
assustadores de comportamento delinquente, entre os quais para Transtornos de
Personalidade Antissocial, ocasionando atos criminosos graves. Frente a isto, todas as
literaturas concordam que os distúrbios de conduta devem ser considerados como problema
de saúde pública e ressaltam a necessidade da elaboração de políticas de saúde pública para
a identificação e acompanhamento de pessoas com distúrbios de maneira a resguardar a
integridade destas pessoas, daqueles que direto ou indiretamente convivem com estes e
daquelas que eles podem vir a gerar. Isto porque os transtornos comportamentais podem
desencadear um ciclo de atividades antissociais, prejudicando a sociedade como um todo pelo

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aumento da violência e ainda pelos custos social/econômico gerados pela delinquência e pela
criminalidade.
Desta forma, chamamos a atenção para a elaboração de políticas públicas de
prevenção e tratamento público e de qualidade para pessoas com transtornos
comportamentais e seus familiares, como forma de desenvolvimento da segurança social uma
vez que, somente com essas medidas será possível prevenir o aumento das taxas de violência
tanto nas escolas, onde os professores são os principais prejudicados, quanto na comunidade.

Referências

Adams, A. (2010) Entre a loucura e o desvio: adolescentes em conflito com a lei acometidos
de transtorno psicótico e de conduta no cumprimento de medida socioeducativa de
internação. Dissertação (Mestrado em ciências criminais) – Faculdade de Direito, PUC-
RS, Porto Alegre, RS.
Andrade, R. C.; Assumpção junior, F.; Teixeira, I. A. & Fonseca, V. A. S. (2011) Prevalência de
transtornos psiquiátricos em jovens infratores na cidade do Rio de Janeiro (RJ, Brasil):
estudo de gênero e relação com a gravidade do delito. Ciências e Saúde coletiva, 16
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REVISÃO
Ciências & Cognição 2021; Vol 26(2) 360-369 © Ciências & Cognição
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Submetido em 13/02/20 | Aceito em: 13/06/21 | Publicado online em 31/12/21

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