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O problema da abordagem de Pondé na questão dos sexos

O Luiz Felipe Pondé é o homem das verdades homeopáticas e administradas


com cuidado, mas sem prejudicar as mentiras que circulam. Ele nunca ultrapassará os
limites impostos pelo estamento acadêmico esquerdista ao ponto de comprometer a sua
própria situação. Ele cumpre uma função de satisfazer os incômodos gerados pelo
estado atual de coisas, tratando essas angústias de tal modo que não se convertam em
forças hostis ao estamento. Apontará, por exemplo, os desajustes nos relacionamentos
causados pelo feminismo e a loucura fomentada pela extrema esquerda, com a
dissolução do sexo real no conceito de gênero fictício.
Ele é aquilo que vocês denominam de gatekeeper (guardião do portão), o
que impede os buscadores de conhecimento de ultrapassar o portão e tomar consciência
do que há por trás dos fatos. Ele realiza o trabalho de direcionamento dos intelectos
inquietos, que percebem anomalias e a partir delas querem explicações mais completas
do quadro social em que se encontram.
Estará sempre abordando aspectos leves das relações humanas, concedendo
afirmações verídicas aos leitores (ou ouvintes) aqui e acolá, mas ao final sempre
direcionando o espectador de volta para o esquema geral de enganos proposto e
reforçado pela mídia, esquerda, e pelas correntes de pensamento pós-modernas
pseudocientíficas. Exemplo: após abordar dose de veracidade no campo da política, dirá
que até mesmo votaria em Jean Willys dependendo da situação; também depois de
criticar o movimento feminista, manifestará adesão à opinião de que a mulher atual é
tão forte que “espanta” os homens, como se o problema estivesse em uma atitude
ressentida deles; contentará o estamento acadêmico, dizendo que votará em Lula,
rejeitando a figura de Bolsonaro.
Com a utilização da meia-verdade, o sr. Pondé realiza, frequentemente, essa
manobra de ida e volta, no sentido de que ao mesmo tempo em que fornece ao público
algumas verdades, realiza um movimento contrário para enquadrá-lo no esquema
mental admitido pelo campo cultural a que ele pertence. Ele dá uma mão enquanto retira
com a outra, é como o agente especializado em conversar com um insurgente para que
ele deponha suas armas e se renda. Rendido o revoltoso, ele é abraçado, neutralizado,
reeducado e reinserido em sociedade, desta forma nos moldes admitidos e de acordo
com os graus de verdade aceitáveis na sociedade moderna.
Na questão dos sexos e da crise causada na civilização ocidental pelo
feminismo, ele fala como se vivêssemos todos em uma alegre festa hippie e que o
problema, na verdade, é que o homem se perde nesse mar de sexo entre tantas ripongas
apetitosas e fáceis. Sobre a nossa época, ele diz que o sexo está fácil e barato, com isso
eu me pergunto se ele realmente vive no planeta Terra e parou para observar a situação
atual antes de opinar.
Aos olhos da massa, não estamos tratando de homem comum, trata-se de
homem com graduação em Filosofia pela Universidade de São Paulo, com curriculum
Lattes, livros publicados, artigos escritos em vários portais e sempre convidado para
opinar nos órgãos midiáticos. Ele possui a convivência com seus pares burocráticos da
educação superior e o aval dos jornalistas, assim se mostrando ao público como figura
abalizada e capacitada a nos fornecer, com o seu olhar científico, a verdade que pode ser
extraída dos acontecimentos mundanos.
Ao analisar o fenômeno dos MGTOW, ele se apega ao conceito de
ressentimento. Diz ele que o homem se sente inferiorizado diante da mulher moderna,
que esta muitas vezes é bem sucedida, compete no trabalho, “conquistou” lugares na
sociedade e que todos esses avanços causaram um mal estar que se converteu em
ressentimento masculino. O homem sentiria vergonha de ter uma mulher que ganha
mais, de não conseguir impor sua autoridade, trata-se de um inconformismo com os
novos termos da civilização, daí a recusa em relacionar-se com qualquer uma delas. Ele
converge com o argumento feminista de que o homem não aceita uma mulher
“empoderada” e de que os homens atuais sentem medo das mulheres.
Ora, senhores, percebam que ele partiu de uma ruptura antropológica grave,
provocada pelo feminismo, e ao invés de condená-lo como causa, focou-se nos aspectos
mais remotos e sintomáticos, a resposta que os homens encontraram, em sua
desorganização social, para amortecerem os efeitos danosos dessa ruptura. Ao se utilizar
da palavra ressentimento, Pondé não pretende com isso analisar de que maneira esse
sentimento surgiu, por que os homens sentem repulsa das mulheres modernas, o que
houve de errado. Aliás, pela maneira como ele argumenta, levando em conta a ascensão
feminina das últimas décadas, tenho minhas dúvidas se ele realmente percebe esse
acontecimento como algo anômalo e prejudicial.
Ele deixa de lado a grande cisão femideológica, ou seja, o acontecimento
principal (o núcleo da questão), e aborda tão somente a periferia dos fatos. A capacidade
filosófica que poderia dissecar como a pseudociência de gênero foi introduzida para
corromper a sociedade acaba se perdendo em casos pequenos de conflitos de namoro, de
sexo casual, aplicativos de encontros, dentre outras questões do dia-a-dia, sempre
abordadas como coisas bobas e próprias dos tempos modernos com os quais nos
devemos acostumar. As suas manifestações não são um documentário, mas um episódio
de casos de família com opinião um pouco mais rebuscada.
Eu noto o ressentimento dos homens com relação às mulheres, assim como
a revolta das pessoas desempregadas, a angústia das vítimas de injustiças, o desespero
dos que estão vulneráveis a criminalidade, e eu nunca pego esses sentimentos de forma
isolada dos reais problemas que os provocam. O masculinismo é maior do que a sigla
Men Going Their Own Way (MGTOW), no tocante a estes, eu pude distinguir até agora
duas classificações possíveis.
Para o primeiro grupo, o casamento é um erro e naturalmente é prejudicial
ao homem. Estes não se casariam nunca. Isso não é oposição a nada, muito menos
combate ao feminismo, pois se trata de uma mera postura pessoal. São os mgtow
absolutos (ou stricto sensu). Não são contrarrevolução ou reacionários, porque sua
postura não é reação a um desajuste antropológico, sendo no máximo aliados ocasionais
de tentativas de erosão ao feminismo.
De acordo com o segundo grupo, o casamento foi tornado um erro diante
das circunstâncias da modernidade com o influxo de correntes ideológicas que
prejudicam as relações recíprocas dos sexos. Este grupo se casaria se os fatores virais
feministas fossem removidos. São os mgtow relativos ou rebus sic stantibus (enquanto
as coisas se mantiverem enquanto tal). São fatores de contrarrevolução e reacionários,
pois atuam no sentido de desejar a restauração de uma ordem perdida.
Vez ou outra será encontrado algum MGTOW diferenciando o “estar
mgtow” com o “ser mgtow”, ele estará fazendo referência a essa divisão acima
explicada. Para mim essa divisão não possui sentido valorativo algum, embora eu note
que os que a fazem querem dar a entender que o mgtow absoluto é mais sério e está
acima do relativo, como se houvesse ali uma escala de valores. Por essa razão, não me
preocupo em me classificar enquanto tal, estive consumindo conteúdo masculinista na
época PUA, com os escritos de Nessahan Alita, também tive acesso a artigos da REAL
e agora vejo conteúdo MGTOW. Quando o mgtow acabar (se acabar), estarei na
próxima etapa de discussões masculinistas e continuarei a ler a abordagem crítica ao
feminismo.
É nesta abordagem crítica que eu quero trazer à baila algumas questões. Já
que o sr. Pondé está tão interessado na questão de gênero, no feminismo, na tensão
sexual entre homens e mulheres, por que não aborda os instrumentos estatais abusivos
que prejudicam essa relação? Ele enfoca a recusa de alguns homens em constituir
famílias, por que não aborda também o desinteresse das mulheres em casamento? Ao
contrário do que ele afirma, essa é a geração que menos faz sexo, não é tão fácil para a
maior parte dos homens quanto era na década de 80 ou 90. Como no Japão, a tendência
das sociedades modernas tem sido uma massa de homens sem atividade sexual (muitos
até virgens) com mulheres promíscuas. Aplicativos de encontros não formam casais, são
meros catalisadores para aqueles que já conseguiriam sexo sem os aplicativos, ou seja,
apenas turbinam a hipergamia ainda mais.
Até aí poderia alguém rebater no sentido de que os instrumentos virtuais são
menos eficazes do que conhecer as pessoas presencialmente. Pois bem, nas festas e
baladas o isolamento do homem comum também é perceptível, porque ou as mulheres
se entregam aos destacados ou encerram a noite sozinhas em seu grupo de amigas.
Ele nada diz a respeito do direito que incentiva o divórcio unilateral, da
proliferação de pseudoviolências, do aparato judicial hostil ou mesmo do conceito de
hipergamia elevado ao absurdo nos tempos atuais. Tendo dito em outra oportunidade
que não havia domínio de esquerda no meio acadêmico de sua época, ele raciocina em
termos marxistas (ainda que sem saber) ao dizer que a máquina jurídica no Brasil não é
tão impositiva quanto a norte-americana, pelo fato de o capitalismo brasileiro ainda não
ser tão “azeitado” quanto o capitalismo norte-americano. Como se as definições
econômicas determinassem as relações de poder (ou seja, adotando a perspectiva
economicista).
Ele provavelmente deve observar a movimentação da juventude, as
calouradas daqueles estudantes, regados a bebida e drogas, o alto grau de libertinagem
de grupos universitários, daí conclui uma suposta facilidade sexual para a população em
geral. A verdade, porém, é que o homem ordinário é praticamente invisível, tanto para
as mulheres quanto para os analistas, ficam de fora da equação e não influenciam nas
conclusões desses opinadores.
Ele diz não saber se hoje é tão fácil para as mulheres mudarem de parceiro
quanto aos homens, ou seja, como se fosse fácil para os homens em geral mudarem de
parceiras. Para ele, o homem vive num mar sexual, a mulher nem tanto. Uma simples
observação da realidade esclareceria esse ponto, para a mulher ter sexo ou mesmo
relacionamento, basta que queira; para o homem, querendo sexo ou relacionamento,
deve despender um esforço que na maior parte das vezes se mostrará inútil.
Pondé vive em outra dimensão, sua visão não serve de orientação e, mesmo
demonstrando tanto interesse nessa questão dos relacionamentos, deixa escapar pontos
essenciais para elucidar o problema de forma satisfatória.

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