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Quem é você?

P (de costas para a câemra, olhando para o espelho) - Você existe mesmo? De verdade?
A - Mas claro, você não vê?
P - Olha, pra falar a verdade… não. Eu só sinto você?
A - Ai, ai, ai… Esses humanos de hoje em dia só sabem sentir…
P - (voltado-se para a câmera) Querem saber que ele é?
A - E quem ele é?
P - Domingo, às 3 tarde no Canal Arautos. (A some do espelho)
P - (voltando-se para o espelho) Ei!!! Volta aqui, a nossa conversa ainda não acabou…

P - Faner
Ladrão - Bonifácio
Alma - Faner

A cena acontece à noite com o P andando na rua. Em certo momento se aproxima L


encapuzado, sacando a arma.

L - Ei tio, fica quietinho aí e vai passando tudo, tá ligado?!


P - (levantando os braços) Ô! Calma aí.
L - Vamu, já falei. Passa tudo aí meu! Vai rápido!!! Eu não tenho tempo pra perder não!!!
P - Mas eu não tenho nada!
L - Eu já falei, vou te meter bala, rapaz. Passa tudo. Vamu!

Nesse momento a câmera passa a filmar como se fosse o P, com o L na frente apontando a
arma.

L - Olha, eu tô perdendo a paciência… Eu vou atirar.


P - Não! Espera aí…
L - Eu vou atirar, eu vou atirar. Vai!!! Passa tudo!

O L atira. Nesse momento o P desperta do sonho. Passando para a cama dele num quarto.

P - NÃO!!!!....

Se apalpa. Percebendo que era apenas um sonho. Respira fundo. Se levanta para ir lavar o
rosto. Ao lavá-lo, ele vai pensando consigo mesmo. Tudo gravação, como pensamento dele.

P - (pensamento) Ai… que pesadelo…. (vai lavando o rosto e se olhando no espelho) ainda
bem que era só sonho. Morrer agora. Só de pensar já dá um ruim! Se bem que com a morte
tudo acaba né...

(a câmera, nesta hora pega só a fisionomia dele, sem o espelho)

A - (Som da cena, não mais gravação) Será mesmo? Eu acho que não!
Agora a câmera volta a filmar os dois, mas enquanto um fica surpreso mexendo o rosto como
que procurando quem falou isso. A alma no espelho fica parada olhando para ele. E ao
perceber o reflexo no espelho não se mexe P diz:

P - Que isso?! (faz movimentos com a mão ou com a fisionomia, mas a alma não se mexe)
Que… que isso?! Quem é… você?
A - Quem é você? Quem sou eu? Ummm… Eu sou você. E você sou eu…
P - Quê??? Você sou eu e… eu sou você???
A - É.
P - Como assim?
A - Eu sou… sua alma.
P - Você é a minha alma? Alma? Ah… acho que estou delirando…. Mas essa história de alma
não existe.
A - Eu sei que você pensa isso. Afinal de contas eu sou você…. Bem, mas creio que agora
você não duvida mais, não é? Ou também não acredita em seus sentidos?
P - Neles eu acredito, é claro. Se não seria meio irracional, não é….?
A - Meio eu não diria… mas totalmente… Agora, porque você achava que a alma não existe?
P - Olha sra alma ou… eu…. é… sei lá. Você já deve saber que sou médico, e já abri muita
gente e nunca encontrei nem sequer resquício de você em canto nenhum. Nunca tive uma
alma nas mãos.
A - Pelo que vejo você não duvida mesmo de seus sentidos, pelo contrário, coloca fé demais
neles…. (sarcástico) Você é um homem de muita fé, viu….?
P - É...
A - Ai, ai.ai…. essa humanidade de hoje…. Mas escute: você já segurou com as mãos os
raios do sol…? Já viu andando por aí a Verdade…? Ou então a corrente elétrica, o ar…?
P - Não... Nunca tive em minhas mãos os raios do sol, nem a eletricidade, etc…. Mas sinto os
seus efeitos, né?
A - Ora pois… O mesmo se passa comigo. Você nunca me teve nas mãos, mas sente os meus
efeitos, entendeu?
P - Estou começando a entender.
A - O que é por exemplo a inteligência, a vontade e a sensibilidade? Movimentos puramente
celulares, moleculares, radioativos…. Será que não tem algo a mais aí?
P - Tá, mas onde fica o cérebro em tudo isso? Não é ele que dá vida pro corpo? Não é ele que
comanda tudo?
A - Se é ele que dá vida para o corpo, qual a diferença entre um homem vivo e um homem
morto? Os dois têm cérebro.... Só que um vive e o outro não.
P - Hum….
A - E me diga qual a diferença entre um animal e um homem? Os dois têm cérebro. Mas um
cachorro é bem diferente de um homem. Será que a única diferença é a espécie? Um
aglomerado diferente de células e conexões nervosas? Muito simplista você não acha?
P - É. Você tem razão. (coçando a cabeça) um… eu tenho razão... Tem algo a mais aí.
A - O cérebro é uma massa material. É matéria. E pode a matéria produzir algo espiritual?
P - Acho que não.
A - Pois é. Não pode. Se o cérebro é o princípio vital do homem, onde fica o pensamento
nisso aí? Ele não tem nada de material… E o amor, o ódio? Tudo isso é espiritual. E se o
homem é só matéria, como pode ele querer alguma coisa que vai contra os seus instintos?
P - Um animal qualquer não consegue fazer isso.
A - Exato, não consegue e nunca conseguirá. Se ele tem vontade de comer, ele come. Se tem
vontade de dormir, ele dorme.
P - Mas o homem consegue fazer diferente quando quer. Se tem vontade de comer, mas está
de regime, ele não come. Se tem vontade de dormir, mas não pode, ele não dorme.
A - Isso mesmo. Agora sabe porque os homens de hoje querem cada vez mais
transformarem-se em puros animais?
P - Pra quê?
A - Para ter direito de viver como os animais, fazendo o que quer, como quer e quando quer.
P - Hehe, mas isso eles nunca vão conseguir.
A - Não tem como arrancar a espiritualidade do homem. E se você continuar como eles,
tentando viver como se eu não existisse,querendo se transformar em puro animal irracional,
sabe onde você vai parar?
P - Onde?

Nesse momento a alma no espelho começa a pegar fogo. E num susto o P acorda
“novamente” do sonho. Tudo o que se passou era sonho do sonho.

“Vemos que todo este mundo é vaidade, que a vida é


um sonho, que tudo passa, que tudo acaba, e que nós
havemos de acabar primeiro que tudo, e vivemos como
se fôramos imortais, ou não houvera eternidade.”
Pe Antônio Vieira

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