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O DIREITO PENAL SIMBÓLICO E OS EFEITOS DA PENA

O DIREITO PENAL SIMBÓLICO E OS EFEITOS DA PENA


Ciências Penais | vol. 0/2004 | p. 24 - 49 | Jan - Jun / 2004
DTR\2004\21

José Luis Díez Ripollés

Área do Direito: Penal

Palavras-chave: Pena - Efeitos simbólicos - Direito penal simbólico


Sumário:

1. Introdução - 2. Sobre o conceito do efeito simbólico e o seu lugar entre os efeitos da


pena - 3. Sobre o conceito de direito penal simbólico - 4. A identificação do direito penal
simbólico - 5. Estratégias de confrontação com o crescente desenvolvimento do direito
penal simbólico

1. Introdução

A crítica de que o legislador se utiliza ilegitimamente do direito penal para produzir


efeitos simbólicos na sociedade tornou-se um argumento freqüente no debate
político-criminal. Seu emprego serve para desqualificar tangentemente determinadas
decisões legislativas, geralmente criminalizadoras, que não apenas carecem dos
fundamentos materiais justificadores de sua adoção, mas também realizam um uso
excessivo do direito penal para fins que não lhe são próprios.

O fenômeno certamente adquiriu, nos últimos tempos, um alcance inquietante,


facilmente perceptível nas últimas reformas penais que estão acontecendo na Europa, e
encontrou uma boa ocasião para seu desenvolvimento na profunda renovação da qual
tem sido objeto os diversos Códigos Penais europeus, entre eles o espanhol, sem que se
deva esquecer o uso cada vez mais freqüente do direito penal por parte dos órgãos
internacionais e europeus na hora de solucionar conflitos. Daí a necessidade de que
surjam estudos cuidadosos que lhe dêem a atenção que merece. Esses estudos, porém,
deveriam evitar análises simplificadas e meras expressões sobre o papel que os
denominados efeitos simbólicos desempenham ou haverão de desempenhar no direito
em geral e no direito penal em particular.

Com efeito, a potencialização do injuriado direito penal simbólico está diretamente


relacionada a certas transformações sociais recentes que a Política Criminal não pode
ignorar.

Entre elas cabe mencionar o crescente papel dos meios de comunicação social em um
duplo sentido: em primeiro lugar, enquanto foro no qual a partir de um princípio se
desenvolve a discussão pública sobre os problemas sociais mais relevantes, sem que tal
discussão chegue mediada por um prévio debate entre os especialistas, que em geral
acontece de modo simultâneo. Em segundo lugar, pela configuração progressiva dos
meios como um dos agentes mais significativos do controle social nas sociedades
modernas, ao ter demonstrado com sobra sua capacidade para generalizar a assunção
de pontos de vista e de atitudes.

De acordo com o exposto, interessa mencionar o deslocamento acentuado do âmbito de


decisão dos diversos dilemas valorativos sociais para o plano jurídico, cuja legitimação
para delimitar os interesses implicados em cada conflito não deixou de crescer à medida
que aumentou a autocompreensão das sociedades atuais como sociedades pluralistas.
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Por sua vez, por certas razões que enumeramos em outro lugar, são a ordem
jurídico-penal e, em menor medida, a jurisprudência constitucional os setores do direito
sobre os quais se está apoiando de modo destacado a resolução dos conflitos sociais
mais agudos em cada momento.
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O DIREITO PENAL SIMBÓLICO E OS EFEITOS DA PENA

Sem dúvida, ambas as circunstâncias estão originando certas evoluções positivas em


nossas sociedades, que agora não podem ser objeto de nossa atenção: seja com a
referência ao fortalecimento de uma sociedade mais consciente de suas possibilidades
comunicativas e discursivas; ou ao cuidado cada vez maior estabelecido na garantia de
âmbitos privados de comportamento, herdeiro de um raciocínio despojado de certezas e
respeitoso com os interesses de cada um. No entanto, por mais que essa visão seja
otimista, não pode libertar-se de certas preocupações fundadas no processo
uniformizador de fundo ao qual, de modo cada vez mais intenso, estão sujeitas as atuais
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sociedades industrializadas.

Porém, tais transformações sociais também estão produzindo outros efeitos indesejáveis
sobre uma perspectiva político-criminal, aos quais se deve prestar atenção: entre eles,
pode-se mencionar o grave risco de que o protagonismo dos meios na discussão de
problemas relacionados com sérios conflitos sociais ou com a delinqüência dê lugar a
uma distorção, por interesses mercadológicos ou de outra natureza, das condições reais
da questão, com dissimulação ou desconsideração de dados relevantes; ou o abandono
dos esforços para consolidar uma moralidade civil, cuja função de difusão de regras
morais de comportamento é indispensável em uma sociedade pluralista, e que, não
obstante, registra um processo alarmante de empobrecimento ao identificar seu
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conteúdo com os do direito, necessariamente muito mais limitados.

Porém o processo que agora nos interessa ressaltar, derivado da combinação das duas
circunstâncias supracitadas, é aquele pelo qual a opinião pública, movida pelos meios de
comunicação social, submete os Poderes Públicos a uma pressão contínua para que se
empreendam as reformas legislativas que permitam o direito; e para o direito penal em
particular, refletir os consensos, compromissos ou estados de espírito produzidos nesses
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debates públicos sobre problemas sociais relevantes. Em troca, os poderes públicos,
conhecedores dos significativos efeitos socializadores, e principalmente sociopolíticos,
que a admissão de tais demandas toleram, não só se mostram inclinados a atendê-las
mas, com freqüência, as fomentam.

Assim entramos no reino do Poder Legislativo declarativo-formal, cuja pretensão é a de


plasmar na norma legal, do modo mais fiel e contundente possível, o estado atual das
opiniões coletivas sobre uma certa realidade social conflitiva e que está alheio a qualquer
consideração sobre a medida em que a norma em questão pode colaborar para a solução
do problema.

Os meios para neutralizar essa preocupante evolução da política legislativa penal devem
transitar por diferentes vias. Uma delas é, sem dúvida, o deslocamento da ênfase da
reflexão jurídico-penal a partir do campo da aplicação do direito ao de sua criação.
Torna-se urgente o aprofundamento da elaboração de uma teoria e uma técnica de
legislações penais que destaquem os pressupostos materiais, e não somente os formais,
de qualquer decisão legislativa penal; e que estejam longe de se satisfazer com a
identificação do bem jurídico a tutelar em cada caso ou com reflexões ingênuas sobre o
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princípio da intervenção mínima vigente no direito penal. A outra tem que atender a
uma delimitação sem prejuízo dos contornos dentro dos quais o direito penal pode
utilizar os denominados efeitos simbólicos da sanção, e ainda das normas penais. É
deste último aspecto que nós vamos nos ocupar neste trabalho.

O ponto de partida tem que ser a dupla constatação de que ao direito penal lhe é
consubstancial o uso dos denominados efeitos simbólicos e que, realmente, serviu-se
sempre deles, em geral com plena consciência de sua legitimidade, para a obtenção de
seus fins. Daí por que, como será visto, o escopo de nossa reflexão não deve ser a busca
de mecanismos pelos quais se podem proscrever do campo de atuação penal o emprego
de tais efeitos, mas sim se aprofundar inicialmente na sua natureza e no modo de operar
para, em seguida, nos determos em realizar algumas contribuições às condições que
devem concorrer para que seu uso tenha legitimidade. Somente nesse contexto poderão
se identificar as bases de crítica ao "direito penal simbólico", cuja generalização nos
preocupava desde o início destas linhas.
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2. Sobre o conceito do efeito simbólico e o seu lugar entre os efeitos da pena

2.1 Efeitos instrumentais e efeitos simbólicos

É freqüente na literatura jurídico-penal contrapor aos efeitos instrumentais os efeitos


simbólicos da pena. Desse modo, os efeitos instrumentais, vinculados ao fim ou à função
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de proteção de bens jurídicos, teriam capacidade para modificar a realidade social pela
via da prevenção da realização de comportamentos indesejados. Os efeitos simbólicos,
por outro lado, estariam conectados ao fim ou à função de transmitir à sociedade certas
mensagens ou conteúdos valorativos, e sua capacidade de influência ficaria confinada às
mentes ou às consciências, nas quais produziriam emoções ou, quando muito,
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representações mentais.

Nesse contexto, a consideração que se tem pelos efeitos simbólicos é muito limitada na
medida em que não atendem primariamente à proteção de bens jurídicos nem produzem
modificações comportamentais na realidade social. Assim, para uns somente são
admissíveis enquanto efeitos secundários da intervenção penal, variando sua aceitação
segundo a importância que é atribuída aos fins ou funções preventivo-gerais da pena, os
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quais, parece, se logram através dos efeitos simbólicos. Para outros, estamos diante de
um efeito da intervenção penal que não é suscetível de legitimação, por mais que para
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alguns seja inevitável.

2.2 Efeitos expressivo-integradores e efeitos materiais

Considero, porém, que o descrédito que se produz dos efeitos simbólicos é precipitado,
pois, ao contrário do que se sustenta, não apenas estão em condições de proteger bens
jurídicos através da prevenção de comportamentos, mas também tornam-se
indispensáveis para alcançar tais propósitos.

Para fundamentar a afirmação precedente é conveniente, em primeiro lugar, substituir o


termo "simbólico" por outro menos pejorativo, que permita evitar mais facilmente
argumentações preconcebidas. Proponho partir, de acordo com um parecer muito
difundido nas ciências sociais, de que toda ação legislativa, e por extensão também toda
ação judicial e de execução penal, contém ou pode conter fins ou funções instrumentais,
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expressivos e integradores. E poderíamos concordar também em denominar as
conseqüências que são derivadas de tais fins ou funções de efeitos instrumentais,
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expressivos e integradores. Em princípio, por efeito instrumental entenderíamos aquele
que supõe certa modificação da realidade social e, mais precisamente, dos
comportamentos humanos; consideraríamos efeito expressivo ao que suscita emoções
ou sentimentos nas consciências; e estaríamos diante de um efeito integrador quando
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são geradas determinadas representações valorativas nas mentes. Pois bem, parece
fácil concordar que o conteúdo geralmente atribuído aos efeitos simbólicos guarda uma
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estreita relação com o próprio dos denominados efeitos expressivos e integradores.
Considerando que o problema reside na oposição entre estes últimos efeitos e os
instrumentais, tomarei a licença, com propósito simplificador, de integrar em um só
conceito os efeitos expressivos e os integradores e, em conseqüência, os denominarei a
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partir de agora de efeitos simbólicos expressivo-integradores.

Explicando melhor o que foi exposto, seria necessário saber se os efeitos


expressivo-integradores realmente são incapazes de tutelar bens jurídicos através da
prevenção de comportamentos: sustentar tal afirmação supõe aceitar que a produção de
determinados estados de ânimo ou representações mentais nos cidadãos através da
pena não tem conseqüências diretas sobre seu atuar, quer dizer, se esgota no mero
despertar da emoção ou no enriquecimento cognitivo correspondente, sem repercussões
sobre seus comportamentos futuros. Ou que essa repercussão é tão limitada ou tão
carente de legitimação que somente pode ter um papel muito secundário, devendo
admitir-se como um efeito indesejável. Pelo contrário, para mim parece que os efeitos
expressivo-integradores constituem um dos pilares fundamentais da utilização legítima
da pena, já que constituem o núcleo da prevenção intimidadora, individual e coletiva,
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além de ter também o papel fundamental nas teorias preventivas que buscam reforçar
determinadas socializações ou confirmar a vigência dos conteúdos básicos da ordem
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social entre os cidadãos.

E, em contrapartida, estimo que os denominados efeitos instrumentais, entendidos como


aqueles que não são expressivos nem integradores, não têm o monopólio da prevenção
de comportamentos. Daí que seja razoável privá-los do monopólio semântico da
utilidade, e denominá-los efeitos materiais. Quaisquer que sejam os efeitos materiais e
os efeitos expressivo-integradores, estes poderão ser, em determinadas circunstâncias,
meios adequados para a prevenção de comportamentos lesivos ou perigosos para os
bens jurídicos e, em tal medida, instrumentais para tal objetivo.

Contudo, as afirmações precedentes exigem que, da maneira mais breve possível,


exponham-se certas convicções pessoais sobre o fundamento e os critérios legitimadores
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da pena.

2.3 O fundamento da pena

O uso de reações penais por parte da intervenção jurídico-penal necessita ser


fundamentado. Isto constitui um nível argumentativo prévio no que se refere à
legitimação dos diversos efeitos sociais que se querem causar com elas, já que se
tornará impossível legitimar a busca de qualquer finalidade social através do mecanismo
da pena se o seu uso não for fundamentado. Ao fundamento da reação penal servem de
pressuposto duas realidades sociais: de um lado, a efetiva produção, em nossa
sociedade, de graves lesões ou perigo de lesão de bens jurídicos fundamentais para a
convivência; de outro, a existência de cidadãos que, de alguma forma, podem ser
responsáveis por tais danos sociais.

O fundamento da pena se configura como um conjunto escalonado de decisões


político-criminais, todas baseadas nos pressupostos supra-referidos, e que pretendem
ser legitimadas por motivos utilitários.

O objetivo imediato é evitar danos, riscos ou perigos graves aos bens jurídicos
fundamentais para a convivência, e se legitima pela necessidade de manter a ordem
social básica.

A configuração do objetivo e de sua legitimação faz com que a busca de sua consecução
deva acomodar-se à vigente ordenação valorativa dos pressupostos essenciais para a
convivência, isto é, ao catálogo de bens jurídico-penais e à identificação das lesões ou
perigos mais significativos a eles (princípio da fragmentariedade). Dessa maneira, um
planejamento da obtenção do objetivo desconhecedor de tal ordenação valorativa
volatilizaria este último e geraria desordem social, razão pela qual a citada ordenação se
torna decisiva na delimitação do objetivo.

Procura-se lograr o citado objetivo elegendo como objeto de intervenção social as


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pessoas suscetíveis de serem responsáveis por tais danos ou riscos, o que se legitima
pela necessidade de incidir sobre um dos fatores decisivos na lesão ou no perigo de
lesão de bens jurídicos.

O objeto escolhido e sua legitimação fazem com que seja necessário manter como ponto
de referência os critérios culturalmente vigentes sobre a atribuição de responsabilidade
pela realização de um comportamento socialmente relevante, isto é, o sistema de
responsabilidade penal e sua graduação. Uma configuração da pessoa suscetível de
responsabilidade desconhecedora de tal sistema de atribuição e de sua diferenciação
volatilizaria o objeto de intervenção e o desconectaria de sua legitimação, pelo que tal
sistema de responsabilidade é condicionante da eleição do objeto de intervenção social.
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O modelo de intervenção social escolhido é o de controle social em sua vertente


sancionatória, o que se justifica pela sua eficácia na neutralização das condutas
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socialmente perturbadoras.

Dentro dos subsistemas de controle social, opta-se pela modalidade mais enérgica, que
é o controle social jurídico-penal que tolera o emprego de penas; isso se legitima
cumulativamente pela irrenunciabilidade do objeto perseguido e o caráter subsidiário
diante de outras modalidades de política e de controle social. Mas o modelo concreto de
intervenção sócio-jurídico escolhido e sua legitimação devem ajustar-se estritamente aos
limites da afetação dos planos de vida individuais reconhecidos aos poderes públicos no
momento de estabelecer a ordem social, isto é, às condições de aceitação do contrato
social. Um exercício da intervenção sócio-jurídica mencionada que ignora tais conteúdos
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não se legitimaria por superar os limites do poder acordados socialmente.

2.4 A legitimação dos efeitos da pena

Uma vez estabelecido o fundamento das sanções penais, convém salientar os efeitos
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sociais a obter com as penas. Certamente à cominação, imposição e execução das
sanções penais se vêm atribuindo virtualidade para produzir diversas conseqüências
sociais. A legitimidade para produzir uns e outros derivará de sua correspondência com
as decisões fundamentadoras da utilização das sanções penais.

Tal correspondência assegura-se mediante o respeito aos princípios que podemos


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denominar princípios da sanção penal:

O primeiro deles seria o de proporcionalidade: de acordo com esse princípio, que carece
de conotações utilitárias, a existência e essência da pena devem refletir a presença e a
importância da lesão ao bem jurídico, assim como a concorrência e a intensidade da
responsabilidade do autor. Por meio do respeito se garante a coerência da pena com as
condições de seus dois primeiros fundamentos.

Um segundo princípio, o teleológico, estaria constituído pelo que freqüentemente se


denominam os fins da pena. Através de sua configuração, estritamente utilitária,
determinam-se os efeitos sócio-pessoais que se quer conseguir com a pena. Cada um
destes se legitimará na medida em que sejam necessários para executar as decisões
político-criminais que fundamentam a pena; quer dizer, eles devem cooperar, de modo
direto, com a proteção de bens jurídicos, têm que guardar relação com as necessidades
de controle social a satisfazer com a intervenção penal e, em estreita relação com o
supracitado, devem emprestar a devida consideração à maior ou menor proximidade da
pessoa afetada de algum modo com a pena, à sua possível responsabilidade pela lesão
ou pelo perigo de lesão dos bens jurídicos.

Parece-me que o cumprimento de tais exigências dar-se-á na medida em que o efeito


correspondente se ajuste de um modo determinado dentro de certas referências
fundamentais. A primeira distingue conforme o efeito que previne a comissão de crimes
de uma maneira direta, indireta ou mediada por outra prevenção. A segunda delas
refere-se ao âmbito pessoal de incidência do efeito correspondente: desse modo, pode
atuar sobre delinqüentes reais, delinqüentes potenciais em grau diverso ou cidadãos
simplesmente suscetíveis de serem delinqüentes. A terceira determina a modalidade de
incidência pessoal escolhida: podem-se impedir materialmente comportamentos, alterar
o modo de conduta, produzir representações mentais ou fornecer informação relevante.
A quarta descreve o conteúdo do efeito produzido: reabilitação, ressocialização e
reinserção individual, intimidação individual ou coletiva, melhora de socializações
individuais ou coletivas defeituosas e confirmação de modelos comportamentais. A
quinta diferencia em função do momento no qual tem lugar o efeito: poderá ser durante
a cominação, a imposição ou a execução da pena, sem que sejam hipóteses excludentes.
A sexta atende ao grau em que o efeito se configura como um mal para o afetado por
ele.

O terceiro princípio é o da humanidade das penas e garante que as sanções penais não
ultrapassem os níveis de incidência sobre cidadãos que são admissíveis no marco das
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condições de aceitação do contrato social. De caráter não utilitário, assegura que a pena
se mantenha dentro dos limites inerentes ao quarto fundamento.

2.5 Os efeitos legítimos da pena

Uma análise dos efeitos sócio-pessoais da pena, realizada exclusivamente a partir do


princípio teleológico, nos permite legitimar instrumentalmente, em uma gradação de
mais a menos, os seguintes:

A reabilitação do delinqüente: com esse efeito se consegue, de modo direto, prevenir a


comissão de crimes, incidindo sobre delinqüentes reais, atestados pela prévia comissão
de um delito, e escolhendo a via de impedir comportamentos futuros da mesma ou
semelhante natureza do realizado. O efeito é alcançado através da execução de
determinadas penas; imediatamente a de prisão, mas também por meio das
incapacitações e suspensões, as privações de direitos e as proibições de residência,
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aproximação ou comunicação, entre outros. Em todo caso, são males que sofre o
delinqüente.

A ressocialização do delinqüente: manter-se-á dentro do objetivo legitimado e limita-se


a prevenir, de maneira direta, a comissão de crimes, o que fará incidindo sobre
delinqüentes reais, caracterizados como tais pela prévia comissão de um crime, e
mediante a alteração de regras de comportamento ligadas às causas sócio-pessoais que
se estimam relevantes para a realização futura de delitos da mesma natureza ou até
mesmo de crimes em geral. O efeito é adquirido por causa da execução de determinadas
penas, como pode ser assinalado, durante o regime de cumprimento das penas de
prisão, as de trabalhos em benefício da comunidade ou de suspensão da execução da
pena privativa de liberdade, entre outras hipóteses. De qualquer maneira, trata-se de
imposições pessoais que o delinqüente suporta.

A intimidação do delinqüente: também logra prevenir a comissão de crimes de um modo


direto, mantendo sua incidência sobre delinqüentes reais por haverem cometido
previamente um delito. A via de incidência selecionada é a produção de certas
representações mentais no delinqüente, que se constituem em fatores relevantes em
futuros processos motivadores, de forma que podem ter efeitos refreantes de decisões
de realizar crimes da mesma natureza ou de delitos em geral. O efeito é causado tanto
com a imposição como com a execução da pena: no primeiro caso, pela estigmatização
social que advém do fato de ter sido condenado; no segundo caso, pelo componente
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aflitivo de qualquer pena. O efeito mencionado continua constituindo um mal para o
delinqüente, com caráter de ameaça por atos conclusivos.

A intimidação de possíveis delinqüentes: pode-se continuar afirmando que se obtém uma


prevenção direta da comissão de crimes ao incidir sobre os cidadãos que estejam
pensando em delinqüir, isto é, sobre delinqüentes potenciais próximos e que, embora
não sejam objeto de uma identificação concreta, sua existência pode-se confirmar a
partir de resultados confiáveis da investigação social. Incide-se sobre eles mediante a
produção de representações mentais que podem ter um papel significativo nos processos
motivacionais já em andamento ou futuros, de forma que eles são suscetíveis de frear a
adoção de decisões delitivas da mesma natureza que as já tomadas e executadas por
um delinqüente real ou quaisquer outras. O efeito é manifestado na cominação,
imposição e execução da pena: desse modo, na cominação da pena configura-se como
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um mero anúncio de diversos males ligados à descoberta do crime, constituindo-se
esse mesmo anúncio em um mal para o delinqüente potencial, com caráter de ameaça
condicional; por sua vez, na imposição e execução da pena, a efetiva aplicação dos
males anunciados sobre o delinqüente real constitui um mal para o delinqüente
potencial, na forma de uma ameaça condicional que é reforçada, através de sua
materialização em outras pessoas, em suas notas de seriedade e persistência.

A socialização de possíveis delinqüentes: com ela se previne a comissão de crimes de


maneira indireta, isto é, por meio da prevenção de socializações defeituosas que podem
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levar facilmente à comissão de crimes. Isto se faz sobre cidadãos que, pode-se dizer,
têm uma distante potencialidade de delinqüência, na medida em que não se trata de
pessoas que estejam pensando em delinqüir, mas sim de cidadãos que, ao contrário da
maioria social, têm dificuldades para identificar corretamente determinados pressupostos
essenciais para a convivência (bens jurídicos), e cuja existência consta a partir de
conclusões confiáveis da investigação social. Incide sobre eles mediante a produção de
representações mentais que nesse caso reforçam ou consolidam a interiorização de
modelos de comportamento de acordo com o respeito a bens jurídicos penalmente
tutelados, a fim de reduzir os déficits cognitivos e os comportamentais relativos a certas
condutas socialmente inaceitáveis para a convivência social básica. O efeito é
desenvolvido de um modo equivalente nas três fases da sanção penal, na cominação, na
imposição e na execução, pois em todas elas o cidadão percebe que a respeito de
determinadas condutas está-se empregando o modelo de intervenção social mais
enérgico, o controle social penal, o que o motiva, de modo mais ou menos consciente, a
interiorizar os padrões valorativos contidos nessas normas para não correr o risco de
ver-se confrontado, algum dia, com uma pena. Esse funcionamento do controle social
penal em certos âmbitos constitui um mal em si, mesmo para o delinqüente potencial
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distante, pois cria insegurança a respeito de suas condições pessoais para
acomodar-se à lei penal.

A confirmação da ordem social básica em cidadãos com capacidade delitiva: também


nesse último efeito legitimável da pena, estamos diante da prevenção em face da
comissão de crimes, porém mediada pela prevenção da desorganização social, quer
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dizer, pela perda das regras sociais básicas de referência comportamental.

Com isso não se pode alegar que já se perdeu o objetivo legitimador da utilização da
pena, constituído pela proteção de bens jurídicos, pois a proteção diante da
desorganização social não é comparável à proteção do consenso social em geral, o que
certamente suporia utilizar a pena para fins que não lhe correspondem, mas que se
centra nos elementos primários da ordem social, como adequado ao âmbito de proteção
próprio do controle social penal.

Esse efeito incide sobre os cidadãos com capacidade para serem delinqüentes, isto é,
sobre quem possui as condições pessoais para criar danos ou riscos aos bens jurídicos
penais e para ser responsável por isso; trata-se de cidadãos sem potencialidade para
delinqüir, já que não mostram um risco apreciável de realizar condutas delitivas
enquanto as considerem como tais; porém, a ausência das reações próprias do controle
social penal poderia suscitar neles, seja a decisão de realizar quaisquer condutas
objetivamente delitivas, na medida em que já não as sentiriam assim por reconhecer
que já não regem os limites à liberdade pessoal derivados dos deveres de autocontrole
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assumidos no contrato social primário, seja a decisão de realizar certas condutas
delitivas, ou condutas delitivas em geral, sob certas condições já não consideradas
delitivas por terem chegado à conclusão errônea de que variaram algumas concepções
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culturais básicas integrantes do contrato social.

Ainda poder-se-ia falar de outra conseqüência da falta de reação do controle social


penal: o desenvolvimento de atitudes de tolerância para os comportamentos dos demais
cidadãos originados nas mesmas razões.

O meio escolhido para incidir sobre eles é o fornecimento de informação socialmente


relevante sobre a vigência da ordem social primária e seus conteúdos, o que confirma as
convicções a respeito desses cidadãos, impedindo que surjam idéias equivocadas sobre
sua modificação e que se busquem eventualmente outros conteúdos cognitivos e
modelos comportamentais. O efeito se apóia nas três fases da pena, a cominação, a
imposição e a execução, pois o desenvolvimento de cada fase por separado, e de todas
em seu conjunto, constituem a demonstração de que a ordem social primária e os
elementos que as integram estão vigentes. A conotação negativa desse efeito social se
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reduz à limitação das possibilidades de realização dos comportamentos proibidos, mal
que é neutralizado em parte pela conseqüência positiva consistente na recompensa que
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supõe para esses cidadãos a confirmação de suas convicções. Só quando, superando o


conteúdo negativo aqui assinalado, se produzem através da pena modificações dos
elementos básicos da ordem social vigente, entramos em um efeito social constitutivo de
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um mal carente de legitimação.

Sobre o conjunto de efeitos sócio-pessoais da pena acabados de reconhecer


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teleologicamente cabe fazer ainda as seguintes colocações:

- De importância especial para nosso propósito é ressaltar que, dentro da escala


precedente, os efeitos sócio-pessoais legitimados passam a ter caráter
expressivo-integrador desde que se pretenda a intimidação do delinqüente real daí por
diante.

A pretensão de traçar um limite qualitativo entre os efeitos intimidadores, para


considerar no pretendido atuar instrumental-racional ou utilitário, e os produtores de
outras representações mentais ou de informações relevantes, que devem ter em conta
um agir valorativo ao qual, somente com esforço, lhe concede a qualidade de racional,
não só perde, em meu parecer, por não dar a importância devida no atuar humano em
sociedade aos condicionantes expressivos e integradores, mas, principalmente, porque
parte de uma visão ingênua do atuar utilitário, próprio de concepções condutoras já
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superadas tempos atrás.

- Quanto aos dois últimos efeitos sócio-pessoais mencionados, cuja vinculação a alguns
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dos conteúdos atribuídos à prevenção geral positiva é facilmente perceptível, deve-se
reafirmar sucintamente sua legitimidade ante certas objeções desqualificadoras. Desse
modo, o emprego da sanção penal para socializar a comunidade, que deficientemente
interiorizou os componentes primários da ordem social, constitui uma imposição social
aceitável, na mesma linha que a ressocialização preventivo especial individual. E não há
de se deparar com problemas de legitimação, especialmente com a censura de
moralização indevida, enquanto se limite aos conteúdos mínimos da coexistência que
protegem contra a desorganização social e as representações mentais suscitadas
coincidam materialmente com as assumidas pela grande maioria social aceitadora da
ordem social básica. Do mesmo modo, nada obsta que a confirmação das convicções
básicas da maioria dos cidadãos sobre a vigência da ordem social primária e seus
componentes essenciais possa configurar-se como um efeito social a se obter ao término
da escala de intervenções sociais que viemos descrevendo: somente a pretensão de
modificar tais convicções através da reação penal, atuando contra os valores
amplamente majoritários, ou de impossibilitar sua evolução espontânea, podem tornar
injustificável a utilização desse efeito, da mesma forma que se coloca esse efeito no
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primeiro plano da intervenção penal, que é necessariamente aflitiva.

Talvez não seja demais lembrar como o método de suscitar representações mentais nos
cidadãos, certamente não limitado para produzir efeitos intimidadores, pôde ser
qualificado por algum profundo e crítico conhecedor da evolução dos mecanismos de
controle social como algo característico das técnicas "ilustradas" que acabaram cedendo
diante das demandas de reabilitação e ressocialização individual da "sociedade
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disciplinar".

Entretanto, não cabe ignorar que, na base do distanciamento de importantes setores


doutrinais com os conteúdos preventivos gerais positivos, encontra-se o convencimento
de que os efeitos psicológico-sociais estão necessariamente vinculados à satisfação de
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demandas irracionais da sociedade. Com isso, antes de tudo, mesclam-se dois planos
que deveriam estar diferenciados claramente: uma coisa é a aceitação da teoria de
origem psicanalítica que defende que a reação penal está profundamente condicionada
pelas exigências punitivas que surgem nos cidadãos ordenados depois de verificar sua
indevida identificação com o delinqüente e a conseqüente necessidade que sentem de
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acalmar seus sentimentos de culpabilidade através da pena a impor aos delinqüentes;
e outra muito diferente estimar que qualquer uso por meio da reação penal de
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mecanismos de psicologia social será moldado inevitavelmente nesse contexto. Na
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realidade, a rejeição dos efeitos psicológico-sociais encobre, em um grande número de


casos, enfoques especializados ou elitistas que aspiram a determinar os conteúdos do
direito penal com independência de quais sejam as convicções sociais majoritárias a
respeito, que são tachadas, a todo momento, de irracionais e incapazes de alcançar
consensos sociais baseados em uma análise consciente e fundadas nas exigências sociais
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de cada momento histórico e cultural. Assim, tal qual a concreção do catálogo de bens
jurídicos essenciais para a convivência ou à configuração do sistema de responsabilidade
precisa indubitavelmente do suporte das convicções gerais; os fins a obter com a pena
devem atender às demandas sociais e contar com as reações psicológico-sociais que a
intervenção penal suscitará na população, sem que uns e outros devam desqualificar-se
sistematicamente por estarem supostamente conectados a fenômenos irracionais
41
inconscientes.

- Por último, convém destacar que o conteúdo negativo da pena, progressivamente,


diminui à medida que nos distanciamos do delinqüente real e que, correlativamente, a
intensidade da modalidade e conteúdo da intervenção diminui, até chegar a um ponto
em que a reação do controle social penal começa a apontar os caracteres de uma
42
recompensa, em vez de uma sanção.

Isso tem indubitável repercussão, em primeiro lugar, no momento de legitimar aqueles


efeitos primordialmente incidentes sobre aqueles que não são delinqüentes reais, nem a
partir de certo momento, potenciais.

Na mesma linha argumentativa opera o fato que, do ponto de vista das pessoas sobre as
quais incidem, os efeitos sócio-pessoais estudados podem ter um caráter cumulativo em
uma única direção: aquela que vai desde o delinqüente real ao cidadão com capacidade
43
para ser delinqüente, porém não em sentido contrário.

Porém, também há conseqüências ao responder à conhecida crítica de que a busca de


objetivos sociais pela pena supõe instrumentalizar, de modo contrário à sua dignidade
pessoal, o cidadão que sofre a sanção diretamente, em benefício das comunidades que
captam a mensagem emitida com a imposição daquela. Pois a pena tem alguns efeitos
negativos diretos sobre os delinqüentes potenciais próximos ou distantes, e até mesmo
sobre os cidadãos simplesmente caracterizados por sua capacidade para ser delinqüente,
como tivemos oportunidade de analisar. Daí que não se pode dizer que a pena é um mal
somente para o delinqüente, e sim que o é, em diferentes medidas segundo o caso, para
toda a sociedade.

Além disso, a pena que se impõe e executa no delinqüente real deve poder justificar-se
a todo momento pelos efeitos que diretamente se pretendem obter sobre ele, sem que
os fins sociais a obter sobre aqueles que não delinqüiram possam condicionar a sua
aplicação. Certamente, e como vimos, os efeitos a obter sobre o delinqüente real não se
reduzem à sua ressocialização, mas abarcam igualmente sua reabilitação e intimidação
44
individual, mas em qualquer caso, os princípios que orientam e as possibilidades que
oferecem à individualização judicial e penitenciária da pena devem estar orientados para
garantir tal justificação. Somente o princípio de proporcionalidade, encarregado de
assegurar a coerência da pena com seus dois primeiros fundamentos, juntamente com a
importância da lesão do bem jurídico e com a intensidade da responsabilidade do autor,
poderá estabelecer limites a essa adequação da imposição e execução da pena, para os
efeitos sociais pretendidos sobre o delinqüente real.

3. Sobre o conceito de direito penal simbólico

3.1 Os conceitos de direito penal simbólico e sua crítica

Se procurássemos um denominador comum a todas as concepções sobre o que seja o


direito penal simbólico, poderíamos afirmar que residiria no predomínio que nele se
produz dos efeitos simbólicos sobre os efeitos instrumentais. Mas além dessa
coincidência, é fácil avaliar dois enfoques diferentes que se cruzam em certas ocasiões,
os quais enfatizam aspectos diversos.
Página 9
O DIREITO PENAL SIMBÓLICO E OS EFEITOS DA PENA

Para alguns, o decisivo é a manutenção da intervenção penal apesar de não serem


alcançados os efeitos instrumentais, mas simula-se ou parte-se da ilusão de que o são,
para assim persistir na consecução dos efeitos simbólicos. Nesse enfoque passa para o
primeiro plano o engano consistente em que se aparenta perseguir alguns fins distintos
dos efetivamente perseguidos ou, se assim se prefere, a ficção de que se cumprem
algumas funções, as patentes, quando as que se satisfazem são outras, as latentes. De
45
qualquer maneira, dar-se-ia lugar ao fenômeno de dupla linguagem.

Para outro, ao contrário, o ponto decisivo é a desnaturalização da intervenção penal que


acarreta, dada a falta de legitimação de todos ou a maior parte dos efeitos simbólicos.
Daí que chame atenção o protagonismo de tais efeitos simbólicos na correspondente
46
intervenção penal.

A meu ver, o fenômeno do direito penal simbólico não pode ser entendido como um
problema de desajuste entre os efeitos que se pretendem (fins) ou se crêem (função)
conseguir, e os que realmente se pretendem ou obtêm. Pois o questionamento do direito
penal simbólico não nasce da pretensão de garantir a coerência entre os programas de
47
decisão, em geral legislativo, e os resultados alcançados, mas das dúvidas sobre a
legitimidade da produção de certos efeitos sócio-pessoais. Até o ponto de que se uma
intervenção penal produz efeitos que previnem comportamentos lesivos de bens
jurídicos, não a desqualificará como "simbólica", por mais que esse efeito ou efeitos
48
produzidos não fossem desejados ou previstos. A ênfase no engano ou na ficção
supõe, no melhor dos casos, fixar-se no adjetivo e não no substantivo.

É melhor, por isso, vê-lo como um problema de não-legitimação da intervenção penal


por carecer de tal legitimidade uma boa parte dos efeitos produzidos, ou os mais
significativos entre eles. Bem, essa análise não pode estar condicionada pela prévia
desqualificação, total ou parcial, dos efeitos expressivo-integradores, tachados de
simbólicos, porque desse modo ignora-se o importante e desejável papel que esses
efeitos desempenham no marco da reação penal.

Em síntese, tampouco se trata de uma situação de desequilíbrio na produção de alguns


efeitos legítimos, os materiais ou instrumentais, e outros ilegítimos ou secundariamente
legitimados, os expressivo-integradores ou simbólicos. O fenômeno, na minha opinião, é
de natureza diferente.

3.2 A caracterização do direito penal simbólico

O denominado "direito penal simbólico" constitui um caso de superação dos limites


utilitários que o princípio teleológico da sanção penal assinala à intervenção penal.
Caracteriza-se, de um modo geral, por se produzirem através da pena efeitos
sócio-pessoais expressivo-integradores que carecem de legitimidade não por sua
natureza, mas porque não se ajustam às decisões político-criminais que fundamentam a
pena.

Isso acontecerá se os mencionados efeitos satisfazem objetivos que não são necessários
para manter a ordem social básica, se centram sua incidência sobre objetos pessoais que
não são os decisivos na lesão ou perigo de lesão dos bens jurídicos, ou se, finalmente,
seu conteúdo não guarda relação com as necessidades de controle social a satisfazer
com a reação penal.

Em qualquer caso, a idéia de desequilíbrio entre efeitos legítimos e ilegítimos, antes


descartada, tem um ponto a considerar: com o direito penal simbólico estamos diante de
49
um conceito gradual, pelo que seu emprego para descrever uma intervenção penal
alude a um significativo deslocamento desta até a produção de efeitos com as carências
já mencionadas, sem que isso exclua a presença de outros efeitos sem essas faltas,
embora haja o desempenho por parte destes de um papel significante.

Desse modo, poderemos discordar a respeito de quando uma intervenção penal merece
Página 10
O DIREITO PENAL SIMBÓLICO E OS EFEITOS DA PENA

ser qualificada como simbólica, mas em qualquer caso a discussão não deve abandonar
o plano utilitário, isto é, deve girar sobre quando o emprego da sanção penal descansa
de forma relevante sobre efeitos sócio-pessoais desnecessários a partir do princípio
teleológico legitimador da sanção penal. Secundária é a perda da coerência entre o
querido ou previsto e o realmente buscado ou obtido, e a outro lugar pertence a questão
de se os efeitos sócio-pessoais implicados se tornam inaceitáveis a partir do ponto de
vista dos demais princípios, não utilitários, legitimadores da pena, como o da
50
proporcionalidade e da humanidade das penas.

4. A identificação do direito penal simbólico

Dentro do contexto conceitual precedente, a identificação do que seja uma intervenção


penal simbólica será alcançada verificando o substancial descumprimento das decisões
político-criminais fundamentadoras dos fins da pena, para o qual será de grande ajuda
ter presentes as referências fundamentais mediante as quais diferenciamos entre os
diversos efeitos sócio-pessoais de modo geral e nos casos isolados.

4.1 Em função do objetivo satisfeito

Um primeiro grupo de casos será caracterizado porque o efeito fundamentalmente


suscitado pela reação penal não atende à prevenção de comportamentos delitivos, isto
é, para evitar danos ou riscos graves aos bens jurídicos fundamentais para a
convivência. Por conseguinte, ignora o objetivo fundamentador da intervenção penal.

No âmbito da cominação da pena podemos citar como exemplos:

As leis reativas, nas quais predomina o objetivo de demonstrar a rapidez de reflexos de


ação do legislador diante do aparecimento de problemas novos. É o caso, no Código
Penal (LGL\1940\2) espanhol, da proibição de certas condutas ainda impossíveis de
realizar ou de difícil realização, como a criação de seres humanos idênticos pela
clonagem no art. 161.2.

As leis identificativas, com as quais, sobretudo, se manifesta a identificação do legislador


com determinadas preocupações dos cidadãos. Assim, a configuração do delito de
assédio sexual do art. 184.1 no CP (LGL\1940\2) espanhol, ou a expressa tipificação da
provocação de ações terroristas com fins atemorizadores do art. 170.2.

As leis declarativas, com as quais esclarecem contundentemente quais sejam os valores


corretos a respeito de uma determinada realidade social. Esse foi o efeito fundamental
da recente reintrodução do delito de corrupção de menores do art. 189.3 do CP
(LGL\1940\2).

Nesse último tipo de leis produz-se com freqüência um fenômeno inverso, também
presente em maior ou menor medida em outras modalidades, em virtude do qual se
renuncia a despenalizar determinados comportamentos, cuja necessidade de prevenção
jurídico-penal já não existe ou é muito discutível, sob o argumento, neste caso, de que a
derrogação de tais preceitos produziria o efeito indesejado de que a sociedade
consideraria tais condutas, a partir desse momento, socialmente corretas. Isto esteve,
nos anos 70 e 80, no centro da polêmica sobre a derrogação dos delitos de adultério,
escândalo público e jogos ilícitos e é, sem dúvida, um dos efeitos cuja possível produção
condiciona as atuais decisões legislativas que persistem em incluir a maconha entre as
substâncias objeto dos delitos relativos às drogas, ou que levou a manter a punição,
51
quase só nominal, da cooperação necessária à eutanásia do art. 143.4.

As leis principialistas, que manifestam primordialmente a validade de certos princípios de


convivência. É o caso do crime de negação de fatos históricos do art. 607.2 do Código
Penal (LGL\1940\2) espanhol, em que se impede qualquer questionamento de certos
dados e interpretações históricas, sobre o qual se construiu, em boa parte, o valor
52
superior da igualdade no ordenamento espanhol.

Página 11
O DIREITO PENAL SIMBÓLICO E OS EFEITOS DA PENA

As leis de compromisso, cujo papel mais significativo é o de mostrar às forças políticas


que as estimularam o respeito dos acordos alcançados. Um bom exemplo é o art. 78 do
Código, na medida em que o § 2.º, a partir do último inciso do § 1.º, permite neutralizar
a decisão inicial de computar integralmente as penas para efeitos de benefícios
53
penitenciários.

Mas se conseguem também esses efeitos na fase de imposição da pena: por exemplo,
mediante decisões judiciais atentas especialmente a mostrar sua identificação com as
preocupações dos cidadãos, como seria o caso da jurisdição penal espanhola, que,
acusada em numerosas ocasiões de escassa sensibilidade no tocante às agressões
sexuais, desenvolveu uma jurisprudência que tende a se conformar rapidamente com o
mero testemunho da vítima para condenar por agressões sexuais ou conjunção carnal.
54

A mesma coisa acontece no âmbito das decisões judiciais e penitenciárias durante a


execução da pena: pense-se no uso que se fez recentemente do espaço de decisão das
autoridades penitenciárias no lugar de cumprimento da condenação por parte dos presos
terroristas, condicionada pelo objetivo principal de excluir a violência como meio de
negociação política.

4.2 Em função de pessoas principalmente afetadas

Um segundo grupo de casos é aquele no qual a intervenção penal não incide


principalmente sobre delinqüentes reais ou potenciais próximos, deslocando, pelo
contrário, sua influência em direção a objetos pessoais mais distantes de sua possível
responsabilidade pela lesão de bens jurídicos, isto é, os delinqüentes potenciais distantes
e os cidadãos suscetíveis de serem delinqüentes. Dessa forma, altera-se
substancialmente a estrutura pessoal da intervenção penal, em virtude da qual esta
última aumenta progressivamente seu âmbito de influência pessoal desde os cidadãos
responsáveis penalmente até os mais distantes de uma possível responsabilidade penal,
com diferentes etapas intermediárias.

Trata-se de intervenções penais cujos efeitos não vão além da fase da cominação penal,
sem prejuízo de que, ao contrário das anteriores, tenha capacidade para prevenir
comportamentos delitivos. Entre elas podem ser mencionadas:

Leis aparentes, cujas formulações tecnicamente defeituosas as fazem inacessíveis às


condições operativas do processo penal, que é o meio inevitável para chegar
eventualmente à imposição da pena. Podem-se mencionar aqueles preceitos
exclusivamente estruturados sobre elementos subjetivos, como o art. 510.1,
particularmente sua variante que penaliza a provocação ao ódio contra determinados
grupos sociais.

Leis gratuitas, enquanto aprovadas sem os recursos pessoais ou materiais necessários


para sua efetiva aplicação no caso de infração. Entre elas cabe mencionar uma boa parte
das obrigações ou deveres que se podem condicionar a suspensão da execução da pena
do art. 83, ou a introdução no novo Código da pena de serviços em benefício da
comunidade.

Leis imperfeitas, que não prevêem sanções ou sua aplicação é, tecnicamente,


impossível. À primeira suposição pertencia o crime de atentado impróprio do antigo art.
231.1.º, que carecia de previsão penal, e na atualidade a qualificação como delitivo da
55
apologia no art. 18.1 p. 2, apesar de que somente é punível se constitui provocação.

4.3 Em função do conteúdo dos efeitos sociais produzidos

Um terceiro grupo de suposições abarca intervenções penais cuja natureza dos efeitos
supera as necessidades de controle social a satisfazer pela reação penal, o que acontece
quando se vai além do efeito de confirmação da ordem social básica em cidadãos com
capacidade delitiva. Dessa forma, são ignoradas as exigências do princípio da
Página 12
O DIREITO PENAL SIMBÓLICO E OS EFEITOS DA PENA

subsidiariedade.

Isto não obsta que estejamos ante intervenções penais com virtualidade para prevenir
comportamentos delitivos e respeitosos com a estrutura pessoal da intervenção penal
que acabamos de recordar na parte anterior. Ademais, seus efeitos podem ser
localizados na fase de cominação, mas também nas de imposição e execução das penas.

Entre os exemplos da fase de cominação penal, podem ser citadas:

As leis ativistas, com as quais se cria na sociedade a confiança de que se está fazendo
algo ante os problemas não resolvidos. Assim sucedeu com a criação do crime de
não-pagamento de pensões familiares do art. 227, em um contexto de incapacidade
56
para executar as decisões civis, ou com os delitos de tráfico de influências do art. 428
et seq., dentro de uma atividade administrativa, cuja discricionariedade progressiva não
57
se deseja pôr limite.

As leis apaziguadoras, que substancialmente produzem o efeito de acalmar as reações


emocionais que certos eventos produzem entre a cidadania. Foi claramente o caso da
criação dos chamados delitos de condutores suicidas, do art. 384, após a inquietude
criada por diversos acidentes automobilísticos surgidos de apostas de condução na
58
contramão nas rodovias de saída de Madrid.

As leis promotoras, cujo efeito deve ser a modificação de determinadas atitudes sociais,
diante de certos problemas sociais. É o caso do crime de usurpação de imóveis do art.
245.2, de algumas condutas incluídas entre os delitos relativos à flora e à fauna do art.
59
332 et seq., ou da inclusão dos maus-tratos psíquicos entre as hipóteses de violência
60
doméstica do art. 153.

As leis autoritárias, que produzem o efeito de demonstrar a capacidade coerciva em


geral dos poderes públicos. É o caso da estrutura punitiva dos crimes relativos a drogas
do art. 368 et seq., sendo especialmente significativas, além da intensidade da pena de
prisão, as conseqüências derivadas da combinação da forma de determinação das multas
com o âmbito do confisco.

Efeitos de natureza semelhante podem ser produzidos na fase de imposição e execução


da pena: sem dúvida, um efeito pacificador de reações emocionais sociais, ao mesmo
61
tempo que demonstra a capacidade coerciva em geral dos poderes públicos, é o abuso
jurisdicional, na fase de imposição da pena, do conceito de "alarme social" do art. 503
da Ley de Enjuiciamiento Criminal para decretar prisões preventivas, se é que já não é
merecedora do qualificativo de simbólica a própria previsão legal.

Também uma hipótese esclarecedora do efeito pacificador de reações emocionais, na


fase de execução da pena, seriam as circulares internas, respeitadas pelos juízes de
vigilância penitenciária que restringem a concessão de permissões de saída da
penitenciária depois que certos delitos graves são cometidos por internos que
desfrutaram de tais permissões.

Em suma, encontramo-nos com um direito penal simbólico que, no descumprimento dos


confins utilitários que têm de caracterizar o emprego das sanções penais, apresenta
perfis muito diferentes:

Por um lado, não se pode reservar o qualificativo exclusivamente para essas


intervenções penais das quais não se pode dizer que previnam comportamentos
delitivos, sendo que o adjetivo também deve se estender àquelas que, certamente,
previnem comportamentos delitivos, mas concentrando sua atenção nos objetos
pessoais menos significativos, ou que, ainda que respeitando este último requisito,
produzem efeitos com um conteúdo desnecessário para garantir o controle social penal.
62

Por outro lado, o direito penal simbólico não está reduzido ao âmbito da cominação
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O DIREITO PENAL SIMBÓLICO E OS EFEITOS DA PENA

penal ou, o que é a mesma coisa, a um problema relativo às decisões legislativas. Sua
propagação para o âmbito da imposição e execução da pena, através das decisões
judiciais e penitenciárias correspondentes, é cada vez mais evidente, e faltam estudos
sobre as decisões judiciais e de execução de pena que merecem o qualificativo de
simbólico.

5. Estratégias de confrontação com o crescente desenvolvimento do direito penal


simbólico

5.1 A naturalização dos efeitos expressivo-integradores

Partindo do reconhecimento de que o direito penal simbólico constitui um uso patológico


dos efeitos expressivo-integradores da sanção penal, resulta, portanto, insustentável a
desqualificação estendida ou a desconsideração dos componentes expressivos e
integradores da pena na atual reflexão político-criminal.

Em primeiro lugar, porque uma boa parte deles, como tivemos ocasião de ver, ajusta-se
estritamente ao objetivo de proteção de bens jurídicos através da prevenção de
comportamentos, assim como para o resto de decisões político-criminais que
fundamentam o uso da pena.

Em segundo lugar, porque renunciar a todos aqueles que vão além da intimidação do
delinqüente real ou potencial significa privar-se de alguns dos meios mais eficazes, na
atual sociedade de massas, para alcançar de uma maneira legítima o objetivo de manter
a ordem social primária. Na atual sociedade comunicativa, com a proliferação de
mecanismos de transmissão das mensagens normativas e sua influência sobre os
comportamentos, parece pouco realista sustentar que o controle social penal deve
limitar-se ao uso daqueles efeitos que chamamos materiais, somente reforçados por um
efeito expressivo-integrador - o intimidatório.

5.2 A discriminação entre os efeitos expressivo-integradores

É urgente, portanto, desenvolver critérios que, a partir de perspectivas puramente


63
utilitárias, permitam discriminar entre alguns efeitos expressivo-integradores e outros.
Como tive ocasião de mostrar no item 4, os argumentos político-criminais que
fundamentam o uso da pena devem ser os pontos de referência fundamentais.

Deve-se ter um claro predomínio do objetivo de proteger os elementos essenciais para a


convivência (bens jurídicos) através da prevenção dos comportamentos que os lesam ou
os colocam em perigo; e devem ser afastadas quaisquer pretensões de utilizar o direito
64
penal para reforçar o consenso social em geral. Especialmente suspeitas e
necessitadas de verificação serão aquelas intervenções penais que acreditam ou
aumentam de um modo patente a imagem positiva do legislador ou do resto dos
operadores penais, ou as que sejam posteriores a campanhas mediáticas ou de grupos
de pressão realizadas pouco tempo antes sobre o objeto da intervenção penal, ou que
causem a impressão de que perseguem objetivos diferentes dos declarados.

Se as intervenções penais tiverem que se concentrar naqueles que apresentam maior


risco de lesar bens jurídicos, devem ser os delinqüentes reais ou potenciais próximos o
objeto primordial de desenvolvimento dos efeitos da pena, sem que sejam admissíveis
intervenções legislativas focalizadas em quem não está pretendendo delinqüir. Sujeitas a
controle especial deverão ser, portanto, aquelas intervenções penais que priorizem as
atuações penais ante outras atuações sociais, no momento de solucionar o problema,
que sejam especialmente ambiciosas em seus objetivos ou no seu âmbito de aplicação,
ou que ignorem, de forma patente, as exigências de correção técnica.

Se se deve produzir os efeitos expressivo-integradores indispensáveis para o controle


social penal, há que se adotar uma atitude de redução relativa aos efeitos sócio-pessoais
a causar. Será emprestada vigilância singular às intervenções imediatas para eventos
que têm suscitado grande inquietude social, as que se ocupem de assuntos imersos num
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O DIREITO PENAL SIMBÓLICO E OS EFEITOS DA PENA

intenso debate na sociedade, ou as que supõem um incremento súbito do nível punitivo


a respeito de certas condutas.

5.3 Instrumentos técnicos de verificação

Mas todos esses critérios carecerão da devida concretização e operacionalidade enquanto


não se desenvolvam instrumentos técnicos que permitam verificar a correção das
decisões penais do ponto de vista dos efeitos sócio-pessoais pretendidos. E nesse
aspecto encontramo-nos com notáveis carências.

Certamente as mais atraentes, por sua maior transcendência na problemática que


tratamos, se dão no campo das decisões legislativas privadas de uma teoria e técnica
das legislações penais em que se inspiram. Novamente surge um problema que nos
mostra a necessidade de consolidar um procedimento material, e não somente
jurídico-formal, de elaboração das decisões legislativas penais que permita
deslegitimá-las, com sua correspondente declaração de invalidez, se não cumprem
determinadas exigências relativas à sua correspondência com a realidade e necessidade
65
sociais, tais como estas são acessíveis à investigação social. Em nosso caso isso
aconteceria se infringissem os precedentes critérios de justificação da produção de
efeitos expressivo-integradores.

Porém, tampouco se pode ignorar as insuficiências na aplicação do direito, sejam


decisões judiciais concernentes à imposição ou execução da pena, sejam decisões
administrativas sobre a execução. Se a vinculação à lei não deve implicar uma
apreciação formalista do direito, desconectada das necessidades sociais, a margem de
interpretação legítima que a lei deve possibilitar não tem que se aproveitar para
satisfazer demandas expressivo-integradoras da sociedade ou dos poderes públicos não
legitimados. Então, é necessário usar instrumentos de análise da motivação das decisões
aplicadoras do direito que permitam identificar tais excessos e possibilitar sua anulação
em instâncias superiores.

1. Veja sobre este último as reflexões que fiz em Exigencias sociales y política criminal.
Claves de razón práctica, 1998, n. 85, p. 48-49.

2. Vide sobre esse assunto em Díez Ripollés. "El bien jurídico protegido en un derecho
penal garantista". Jueces para la democracia 30/10, noviembre 1997.

3. Vide a este respeito em Exigencias sociales..., cit., p. 48-49. Compartilha dessa


preocupação recentemente Silva Sánchez, La expansión del derecho penal, Madrid:
Civitas, 1999, p. 44.

4. Em menor medida essas demandas de decisões penais se estendem, como teremos


oportunidade de ver, ao âmbito judicial e penitenciário.

5. Vide mais sobre este tema em Díez Ripollés. "El bien jurídico...", cit., p. 13 et seq.

6. Sobre o uso na Política Criminal da distinção sociológica entre fim e função, em


virtude da qual pelo primeiro se entende os efeitos sociais que se pretendem ou buscam
ao pôr em marcha determinadas atuações sociais, enquanto com a segunda se alude aos
efeitos sociais que se produzem necessariamente ou com freqüência a partir dessas
atuações sociais, sejam queridos ou não, vide por todos: Hassemer. Einführung in die
Grundlagen des Strafrechts. Verlag C. H. Beck, 1981. p. 91; Pérez Manzano. Culpabilidad
y prevención. Ediciones de la UAM, 1986. p. 217-221. Neste momento não nos interessa
discriminar entre o plano intencional e o fático dos efeitos produzidos. Propõem-se a
analisar os efeitos simbólicos como função, entre outros: Voss. Symbolische
Gesetzgebung. Verlag Rolf Gremer, 1989. p. 58-59; Hassemer. "Derecho penal simbólico
Página 15
O DIREITO PENAL SIMBÓLICO E OS EFEITOS DA PENA

y protección de bienes jurídicos". Pena y Estado, 1991. p. 29; Silva Sánchez.


Aproximación al derecho penal contemporáneo. Barcelona: Bosch, 1992. p. 304.

7. Vide claramente nesse sentido Voss, op. cit., p. 2-6, 25, 40-42, 77-78, 181-182,
206-208, entre outros muitos lugares; Silva Sánchez. Aproximación..., cit., p. 304-306;
Silva Sánchez. "Eficiencia y derecho penal". Anuario de Derecho Penal y Ciencias Penales
, 1986. p. 119-120; Terradillos Basoco. "Función simbólica y objeto de protección del
derecho penal". Pena y Estado, 1991. p. 10-11, 15-16; Baratta. "Funciones
instrumentales y simbólicas del derecho penal: una discusión en la perspectiva de la
criminología crítica". Pena y Estado, 1991. p. 52-55; Melossi. "Ideología y derecho penal:
¿el garantismo jurídico y la ciminología crítica como nuevas ideologías subalternas?".
Pena y Estado, 1991. p. 57, 62; Sanguiné. "Função simbólica da pena". Revista
portuguesa de ciência criminal, 1995. p. 85-89. Más matizadamente, Hassemer,
"Derecho penal simbólico...", cit., p. 30; Bustos Ramírez, "Necesidad de la pena, función
simbólica y bien jurídico medio ambiente", Pena y Estado, 1991, p. 101, 107-109.

8. Vide: Hassemer. "Derecho penal simbólico...", cit., p. 27, 29, 30-31; Bustos Ramírez.
Op. cit., p. 101, 107-109; Terradillos Basoco. Op. cit., p. 10-11; Cuello Contreras. El
derecho penal español. Parte general/1. Madrid: Civitas, 1996. p. 58.

9. Silva Sánchez. Aproximación..., cit., p. 306-307; Baratta. Op. cit., p. 52-55; Melossi.
Op. cit., p. 62-64.

10. Vide uma documentada referência a respeito em Voss, op. cit., p. 68-70.

11. Certamente o que é instrumental, expressivo, simbólico, integrador não é o efeito


produzido por uma determinada ação legislativa, judicial ou de execução penal, mas a
ação em si mesma. Contudo, dado tal qualificativo às conseqüências que se derivam de
tais ações, procedo de maneira semelhante como o faz a maioria da doutrina.

12. Vide um uso similar destes termos, com as posteriores referências doutrinárias, em
Voss, op. cit., p. 64-66, 68-70, 151, 155-156, entre outros lugares.

13. Claramente nesse sentido, entre outros: Voss. Op. cit., p. 1-4, 25-35, 39, 40-42,
77-78, 138-139, 194, 206-208; Terradillos Basoco. Op. cit., p. 11, 15; Silva Sánchez.
Aproximación..., cit., p. 305-307; Hassemer. "Derecho penal simbólico...", cit., p. 27.

14. Defende igualmente uma clara proximidade conceitual entre os efeitos expressivos e
os integradores, Voss, op. cit., p. 1-4, 27, 40-42, 77, 194, 206, entre outros lugares.

15. Partindo de um conceito mais restritivo que o que aqui se vai defender, integram de
forma normalizada os efeitos expressivo-integradores entre os efeitos substantivos da
pena, Hassemer, "Derecho penal simbólico...", cit., p. 26, 27, 29; Bustos Ramírez, op.
cit., p. 101, 107, 109; Cuello Contreras, op. cit., p. 58.

16. Dada a finalidade deste artigo, limito-me nos itens subseqüentes a assentar as bases
da argumentação que se desenvolverá a partir do item 3, sem pretender entrar a fundo
na rica polêmica sobre o fundamento e os princípios da sanção penal.

17. Sem que isso implique que os Poderes Públicos tenham que renunciar a outros
objetos de intervenção social, como os condicionantes sócio-estruturais da delinqüência.

18. Tal sistema de responsabilidade não determina quais sejam as classes de objetos
pessoais sobre os quais tem de incidir, nem de que forma nem com que efeitos, porém
estabelece as diferenciações e graduações que, independentemente do momento no qual
se intervenha, deverão respeitar ao incidir sobre qualquer objeto pessoal. Assim, não
poderá atuar sobre meras atitudes internas, nem sobre inimputáveis, a intervenção terá
de ser distinta segundo sejam condutas de autoria ou de participação etc.
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O DIREITO PENAL SIMBÓLICO E OS EFEITOS DA PENA

19. Sem prejuízo de sua coexistência com outros modelos de intervenção social, como
as políticas assistenciais encaminhadas a superar situações individuais de
marginalização.

20. Vide sobre este último, mais amplamente Díez Ripollés. "El bien jurídico...", cit., p.
10.

21. Fora de nossa consideração vão ficar os efeitos sociais produzidos pela norma penal
em si mesma, independentes dos que se conseguem com a pena, e que, apoiados no
prestígio social do direito penal, supõem uma função, e não um fim, a ter em conta
seriamente.

22. Vide os outros dois blocos de princípios, todos constituintes dos princípios estruturais
do controle social penal, e uma breve enumeração dos relativos à proteção, em Díez
Ripollés, "El bien jurídico...", cit., p. 12-13.

23. Também se consegue um efeito reabilitador com penas de multa que produzem uma
quebra econômica que dificulta notadamente a reiteração do delito, com a limitação de
fim de semana quando o delito está relacionado com as atividades durante o tempo livre
ou, em geral, com quaisquer penas que intensifiquem o controle social sobre o
delinqüente.

24. É até possível salientar os efeitos intimidadores originados depois do cumprimento


da pena, mediante a persistência dos antecedentes penais, embora não esteja clara sua
fundamentação.

25. Aqueles que se mencionou que sofre o delinqüente real quando, ou ao menos os que
dão lugar a sua intimidação, mencionados na suposição anterior.

26. Que funda suas raízes nos males que sofreria se em algum momento falhasse em
sua adaptação social.

27. Que se concretizam no reconhecimento de que persistem as obrigações derivadas do


contrato social sobre os elementos primários de convivência e na correta identificação
das concepções culturais básicas nelas integradas, as quais são, em nosso âmbito,
determinada ordenação valorativa dos pressupostos essenciais para a convivência,
precisada em um catálogo de bens jurídicos, e determinadas idéias sobre a
responsabilidade dos cidadãos e os métodos para imputá-la.

28. Partir-se-ia do ponto que havia perdido vigência o contrato social ao não reagir
diante das violências de seus elementos integrantes.

29. Embora não se questionasse o contrato social em si mesmo, se sucedesse tal coisa
com respeito à ordenação valorativa dos pressupostos essenciais para a convivência
(bens jurídicos) ou com respeito ao sistema de responsabilidade estabelecido.

30. O que deriva de forma direta do respeito da própria norma e indiretamente dos
obstáculos materiais que tais proibições vão originar (prevenção policial, outras atuações
institucionais...). Chama a atenção sobre este aspecto negativo do efeito de confirmação
da ordem social básica Octavio García Pérez.

31. Vide infra.

32. Somente a primeira, contudo, muda no contexto utilitário desenvolvido no marco do


princípio teleológico da sanção penal. As outras relacionam-se com os restantes
princípios legitimadores da pena, o da humanidade e da proporcionalidade.

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O DIREITO PENAL SIMBÓLICO E OS EFEITOS DA PENA

33. Vide uma nítida contraposição entre ambos os modelos de atuar, manifestando-se
pelo primeiro, embora não desejando reconhecer a indubitável consideração de
elementos do segundo, em Silva Sánchez, "Eficiencia y derecho penal", Anuario de
Derecho Penal y Ciencias Penales, 1996, p. 98-106, 119-112, com uma postura mais
matizada que em escritos anteriores.

34. Vide uma classificação disto, por todos, em Pérez Manzano, Culpabilidad..., cit., p.
18-19, 248 et seq.

35. Sobre este último veja o que se diz em seguida sobre a gradação do componente de
"mal" da pena nos diferentes efeitos sociais por ela produzidos. Em sentido contrário ao
exposto: Voss. Op. cit., p. 117-123; Pérez Manzano. Culpabilidad..., cit., p. 250, 288;
Silva Sánchez. Aproximación..., cit., p. 300-304, quem parece partir de que todo
trabalho de socialização coletiva implica sobre toda uma função promocional, isto é, de
modificação de concepções sociais existentes ou de aceleração da implantação de
concepções sociais ainda não arraigadas. O ponto de vista desse autor tem
provavelmente a ver com a valoração que merecem as convicções sociais majoritárias
como critério de referência do direito penal, vide infra.

36. Vide: Foucault. Vigilar y castigar. 3. ed. Siglo XXI Editores, 1978. p. 94-136.

37. Especialmente convencidos desse ponto de vista, entre outros, Silva Sánchez.
Aproximación..., cit., p. 204-206, 228-241, 307-308; Luzón Peña. "Prevención general y
psicoanálisis". Derecho penal y ciencias sociales. Mir Puig de. UAB, 1982. p. 146 et seq.;
Perez Manzano. Culpabilidad..., cit., p. 42-43, 170-171, 257-258, 260, 270-274, 281.

38. Vide uma descrição do fenômeno em Díez Ripollés, Los elementos subjetivos del
delito. Bases metodológicas, Tirant, 1990, p. 155-189; Haffke, Tiefenpsychologie und
Generalprävention, Verlag Sauerlander, Frankfurt, 1976.

39. De fato, o incontestável efeito de intimidação coletiva através da pena é um


mecanismo psicológico-social que não é objeto de tal conexão com a teoria do "bode
expiatório".

40. O que justificará o afastamento, nas decisões penais, se é preciso, de tais


convicções. Vide, entre outros, Silva Sánchez, Aproximación..., cit., p. 228-241; Perez
Manzano, Culpabilidad..., cit., p. 273, 281 e 288. Sobre os diversos critérios de
legitimação do direito penal, com um delineamento diametralmente oposto, vide Díez
Ripollés, "El bien jurídico...", cit., p. 16-17; já antes em El derecho penal ante el sexo,
Barcelona: Bosch, 1981, p. 118 et seq.

41. Na realidade, até quando essas necessidades irracionais estão presentes, não se
pode resolver o problema simplesmente ignorando-as, pois constituem uma função, em
ocasiões inevitáveis e em todo caso indesejáveis, de certas intervenções penais e ante a
qual tem que desenvolver certas estratégias sociais. Contudo, este é um problema sobre
o qual agora não podemos nos pronunciar.

42. Sobre a presença nos mecanismos de controle social de recompensas junto a


sanções, vide: Pitts-Etzioni. "Voz 'Control social'". Enciclopedia Internacional de las
Ciencias Sociales, p. 165-166.

43. Isto não quer dizer, contudo, que tal acumulação tem obrigatoriamente de se
produzir. De forma que não há por que surgir todos os efeitos sócio-pessoais descritos
posteriormente na escala naqueles que se encontram nos níveis anteriores.

44. Efeitos estes que devem ter-se devidamente em conta, igual ao respeito ao princípio
da proporcionalidade (vide imediatamente infra), a hora de concretizar as atuações a
respeito dos delinqüentes ocasionais, não necessitados de ressocialização.
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O DIREITO PENAL SIMBÓLICO E OS EFEITOS DA PENA

45. Claramente nessa linha: Voss. Op. cit., p. 2-4, 39, 71-71, 74-75, 77-78, 206-212;
Hassemer. "Derecho penal simbólico...", cit., p. 28-30, 35; Paul. "Megacriminalidad
ecológica y derecho ambiental simbólico". Pena y Estado, 1991. p. 122; Cuello
Contreras. Op. cit., p. 58; Pérez Manzano. "El impago de prestaciones económicas a
favor de cónyuge y/o hijas e hijos". Análisis del Código Penal (LGL\1940\2) desde la
perspectiva de género. Instituto vasco de la mujer, 1998. p. 221-222.

46. Nesse sentido, Baratta, op. cit., p. 53-55; Terradillos Basoco, op. cit., p. 10-14, que
na realidade fala de um direito penal ideológico, mais que simbólico, quando superados
certos limites; Melossi, op. cit., p. 57, 62; Bustos Ramírez, op. cit., p. 101, 107-109;
Silva Sánchez. Aproximación..., cit., p. 305-307; do mesmo: Eficiencia..., cit., p.
119-120. Este último autor, contudo, parece que está modificando notavelmente sua
atitude radicalmente negativa para o que agora denomina prevenção
"simbólico-comunicativa" (vide: La expansión del derecho penal. Madrid: Civitas, 1999.
p. 57-61, 124, 127).

47. Contudo, Voss, op. cit., p. 208-218 chega a interpretar o direito penal simbólico
como uma infração da pretensão de validez da veracidade referida à ação comunicativa
de Habermas. Sem prejuízo de que toda ação comunicativa, também a jurídica, deva
satisfazer tal pretensão, não acredito que esse seja o elemento decisivo para
caracterizar o direito penal simbólico, como exponho em seguida.

48. No fundo compartilham também desse ponto de vista Voss y Hassemer, como
demonstra sua decisão de analisar esta problemática a partir do conceito de função e
não do de fim. Vide: Hassemer. "Derecho penal simbólico...", cit., p. 20; Voss. Op. cit.,
p. 58-59. Isto sem esquecer que, com freqüência, simplesmente acontece que o
legislador não sabe o que quer.

49. Alude igualmente a esta idéia Hassemer, "Derecho penal simbólico...", cit., p. 29.

50. Isso explica que, ao meu juízo, a problemática sobre a imposição seletiva ou
arriscada da pena, que mostra a concentração da reação penal sobre certos coletivos ou
indivíduos, ou sua imposição de uma maneira aleatória a somente uma pequena parte
dos infratores, não tem a ver com o direito penal simbólico, mas com o princípio da
humanidade das penas, mediante o qual se oculta, entre outras coisas, pela
não-aplicação desigual da lei. Hassemer estabeleceu a questão nos debates do colóquio
de Toledo, no qual teve origem este artigo.

51. Vide também uma menção a este tipo de leis em Voss, op. cit., p. 30-31, entre
outros lugares.

52. Vide uma crítica nesse sentido do citado preceito em Díez Ripollés, "El delito de
negación de hechos históricos", Diario El País, 9 jul. 1999. Vide também Laurenzo
Copello, "La discriminación en el Código Penal (LGL\1940\2) de 1995", Estudios penales
y penitenciarios, XIX, Universidad de Santiago de C., 1996, p. 265-269. Apóia em geral
o efeito, para o simbólico, da pena de transmitir um sentimento de igualdade entre os
cidadãos, com expressa menção do genocídio, Bustos Ramírez, op. cit. p. 101, 108-109.

53. Vide outro exemplo ao falar das leis imperfeitas.

54. Veja uma esclarecedora análise crítica em Gracia Martín, "Consideraciones en torno a
la validez de la prueba del testigo perjudicado por el delito", Revista de Derecho Penal y
Criminología, 1998, p. 223 et seq.

55. Suposição esta que constitui, também, um bom exemplo de lei de compromisso.
Veja supra.

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56. Menciona esta hipótese entre os simbólicos, Silva Sánchez, Aproximación..., cit., p.
305. Vide também: Zugaldía Espina. Fundamentos de derecho penal. 3. ed. Tirant,
1993. p. 239-240. Em sentido contrário, Pérez Manzano, "El impago...", cit., p. 221-223.

57. Nessa linha, vide: Gimbernat Ordeig. "El nuevo delito de tráfico de influencias".
Diario El Mundo. 5 de febrero de 1991; Silva Sánchez. Aproximación..., cit., p. 305; e o
mesmo em Exigencias sociales..., cit., p. 50-51. Na realidade, estes preceitos
encaixam-se facilmente também entre os que temos denominado supra como leis
aparentes.

58. Veja Díez Ripollés, Exigencias sociales..., cit., p. 51.

59. Os delitos contra o meio ambiente, em geral, são objeto habitual de repreensões
relativas ao seu caráter simbólico, freqüentemente embora não sempre, no contexto do
efeito sócio-pessoal que agora criticamos. Vide, entre outros muitos: Hassemer.
"Derecho penal simbólico...", cit., p. 26; Paul. Op. cit., p. 122; Bustos Ramírez. Op. cit.,
107-109; Voss. Op. cit., p. 28-31; Baratta. Op. cit., p. 43-49. Não obstante, as críticas à
caracterização simbólica desta legislação entram em demasiadas ocasiões (Hassemer;
Baratta. Ibidem, não assim Bustos, p. 102-104) associadas a uma não-legitimação dos
bens jurídicos coletivos, que não compartilho. Vide a respeito: Díez Ripollés. "El bien
jurídico...", cit., p. 18-19.

60. O próximo objetivo neste tema é, aparentemente, aprovar uma lei específica sobre a
violência doméstica onde se agrupe a maior parte das intervenções legais, penais ou
não, já existentes, com a pretensão de visualizar, ante a sociedade de uma maneira
mais transparente à repreensão que devem merecer estas condutas. Veja uma crítica a
respeito em meu "Prefácio" à monografia de Cerezo Dominguez, El homicidio em la
pareja: tratamiento criminológico, Tirant, 2000, p. 18-19.

61. Quando não se torna, também ou substitutivamente, em um ilícito meio de pressão


para progredir na investigação dos fatos denunciados.

62. Desse modo, será habitual que uma mesma intervenção penal participe de vários
desses excessos, seja dentro da mesma ou em diferente categoria. Já destacamos
alguns exemplos.

63. Das não utilitárias já se ocupam, no marco dos princípios da sanção, os princípios da
proporcionalidade e da humanidade das penas. Vide supra item 2.4.

64. Também criticamente a esse respeito: Terradillos Basoco. Op. cit., p. 14-15; Baratta.
Op. cit., p. 53-54; Melossi. Op. cit., p. 62.

65. Veja o foi dito na Introdução e o que sustentei mais amplamente em Díez Ripollés,
Exigencias sociales..., cit., p. 49-50.

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