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Erich Fromm 1 – Análise do Homem2


Fichamento e estudo por Luiz José Veríssimo (2022)
A ética humanista
Ética humanista [...] baseia-se no princípio de que só o próprio homem pode
determinar o critério do que é virtude ou pecado, e não uma autoridade a ele transcendente
(Fromm, 1964, p. 22).

Definições de virtude
No mito, em Homero (séc. IX-VIII a.C.): a virtude é a areté, ou seja, a excelência, uma
capacitação especial transmitida pelos deuses. O herói, que é filho de um deus com um(a)
mortal, nasce dotado da areté. A excelência é, portanto, uma herança divina, “a
superioridade em relação aos outros mortais” (Brandão3, 1987, p. 23).
Junto com a areté, encontramos um outro valor importante, a time, a honra pessoal do
herói, o reconhecimento da sua filiação divina (filho um(a) mortal com um deus).
Em Hesíodo (VIII a.C.): a virtude é o trabalho e a time corresponde à sua sede de justiça.
Em Sócrates (V a.C.) a principal virtude é o conhecimento da própria alma (conheça a ti
mesmo). Sócrates está ligado ao surgimento do Humanismo na Grécia.
Aristóteles4 emprega “virtude”” para indicar “excelência” – excelência da atividade por
meio das qual se realizam as potencialidades peculiares ao homem (Fromm, 1964, p. 22).
Na ética, importa considerar o desenvolvimento da racionalidade enquanto sabedoria
prática, ou seja, um saber que se desenvolve pelas ações (práxis) conjugadas à uma
sabedoria que vai sendo formada ao longo de nossas aprendizagens vivenciais
(Verissimo).
Spinoza [Espinoza] chega a um conceito de virtude que é apenas a aplicação da norma
geral à existência do homem. ‘Agir absolutamente de acordo com a virtude é, em nós,
nada mais que agir, viver e preservar nossa existência (estas três coisas têm o mesmo
significado) [...]” (Ética, IV, prop. 24).
Preservar a própria existência quer dizer, para Spinoza, tornar-se alguém o que é
potencialmente5 (Fromm, 1964, p. 33).
A virtude do homem, analogamente, é aquele conjunto definido de qualidades que
caracteriza a espécie humana [racionalidade, afetividade, senso estético, preocupações
morais, etc.], ao passo que a virtude de cada pessoa é sua individualidade exclusiva. É
“virtuoso” quem expande sua “virtude” (Fromm, 1964, p. 22).
[A virtude é] a excelência da realização da pessoa (Fromm, 1964, p. 26))

O sentido ético de humanismo


A ética humanista é antropocêntrica, não, naturalmente no sentido de que o homem é o
centro do universo, mas, no de que seus julgamentos dos valores como todos os outros
julgamentos e até percepções estão arraigados nas peculiaridades de sua existência e só
têm significação quando considerados em relação a esta; o homem é, de fato, “a medida
de todas as coisas”6 (Fromm, 1964, p. 22).

1
1900 – 1980.
2
FROMM, Erich. Análise do Homem. Trad. Octavio Alves Velho. 4.ed., Rio de Janeiro: Zahar, 1964.
3
BRANDÃO, Junito de Souza. Mitologia Grega Vol. III. Petrópolis: Vozes, 1987.
4
´Século IV a. C., 384 a.C. — 322 a.C.
5
Por associação de ideias me ocorreu a indicação de Píndaro, ressaltada por Nietzsche, torne-te quem tu
és (Veríssimo).
6
Frase do sofista Protágoras (V a. C., 492 a.C.- 422 a.C.).
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Refutação à tese do homem-medida


A posição humanista é de que nada há de superior ou mais digno de que a existência
humana. Contra isso, tem sido argumentado que é da própria natureza da conduta ética
ser relacionada com algo que transcende ao homem donde um sistema que admite apenas
o homem e seu interesse não poder ser na verdade moral, tendo como objetivo
simplesmente o indivíduo isolado e egoísta (Fromm, 1964, p. 22-23).

Refutação da refutação
Esse argumento comumente apresentado de molde a contestar a capacidade – e o
direito – do homem a postular e a julgar as normas válidas para sua vida, [...] não implica
que a natureza humana, é tal que o egoísmo ou o isolamento sejam bons para ele. Não
quer dizer que a finalidade do homem possa ser preenchida ficando este desligado do
mundo exterior. De fato, conforme muitos defensores da ética humanista aventaram, é
uma das características da natureza humana o homem só poder realizar-se e ser feliz em
ligação e solidariedade com seus semelhantes (Fromm, 1964, p. 23).

O amor
Entretanto, amar o próximo não é um fenômeno transcendente ao homem; é algo de
inerente a ele, que dele se irradia. O amor não é uma força superior que desça sobre o
homem nem um dever que lhe seja imposto: é seu próprio poder pelo qual se relaciona
com o mundo e torna este verdadeiramente seu (Fromm, 1964, p. 23).

(Fromm, 1964, p. 26)


[...]

(Fromm, 1964, p. 26-27)


Arte como estética e arte como técnica
A palavra grega techné foi traduzida pelo latim ars, em português, arte.
Ela abriga dois sentidos:
1) arte como estética (música, pintura, arquitetura, literatura, etc.).
2) arte como técnica (daí, ligada a ofício, atividade profissional).
Erich Fromm vai jogar com esses dois sentidos (Veríssimo).
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Viver como uma arte


Neste ponto, é interessante perguntar por que nossa época perdeu a concepção de
viver como uma arte.
O homem moderno parece crer que ler e escrever são artes [aqui, no sentido de técnica]
a serem aprendidas, que é preciso estudo considerável para tornar-se arquiteto,
engenheiro ou operário especializado, mas que viver é algo tão simples que não requer
nenhum esforço em particular para aprender como fazê-lo. Só porque todos “vivem” de
uma maneira ou de outra, viver é considerado um assunto em que todos são especialistas.
A predominante falta de alegria e felicidade no processo d vida está aí para obviamente
excluir tal explicação. A sociedade moderna, a despeito de toda a ênfase que atribui à
felicidade, à individualidade [aqui no sentido de realização pessoal] e interesse de cada
um, ensinou ao homem que não é a sua felicidade (ou, para empregarmos um termo
teológico, sua salvação) a meta da vida, mas sim a satisfação de seu dever de trabalhar,
ou o seu sucesso. Dinheiro, prestígio e poder transformaram-se em seus incentivos e fins.
Ele [o indivíduo na sociedade contemporânea] age na ilusão de que suas ações beneficiam
seu interesse próprio, embora na verdade ele atenda a tudo mais, exceto aos interesses de
seu eu real. Tudo é importante para ele, salvo sua vida e a arte de viver; ele [está
disponível para] tudo, exceto [para] si mesmo.
(Fromm, 1964, p. 27)

(Fromm, 1964, p. 27)


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