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Erich Fromm e Habermas

A ética humanista de Erich Fromm


O filósofo Erich Fromm em sua obra “A análise do homem” pensa na Ética Humanista como alternativa contra a ética
subjetiva e contra a ética autoritária.
Para o filósofo e psicanalista alemão Erich Fromm, o homem moderno entra em um conflito ao se perceber escravo
daquilo que criara e ao perceber que apesar de seus conhecimentos a respeito da matéria, ignora as questões
fundamentais da existência. No Iluminismo, a Razão foi elevada ao status de um guia para estabelecer normas éticas
válidas. A autonomia do homem em relação às autoridades exteriores, para contestá-las e rejeitá-las, conduz a um
relativismo ético pelo qual valores e normas parecem se tornar uma questão de gosto ou preferência arbitrária.
Quando se torna incapaz de fazer alguma afirmação com validade objetiva, o homem – que, para Fromm, não pode
viver sem valores e normas – torna-se presa de sistemas irracionais de valores: exigências do Estado, líderes poderosos
e sucesso material.
Como alternativa ao relativismo, Fromm defende a Ética Humanista: a Ética Humanista formulou os sistemas de
valores apoiados na autoridade e razão do homem partindo da premissa de que para saber o que é bom ou mau para
o homem é necessário conhecer sua natureza.
Ética Humanista
Ao seguir o pensamento dos humanistas, Erich Fromm vê que a ética não pode ser somente subjetiva, pois se assim
fosse o relativismo seria levado ao extremo e o que teríamos ao fim seria uma ética hedonista. Existe, de fato, uma
escola da ética humanista que postula um subjetivismo radical, incompatível com as normas éticas universais, em que
o desejo é a pedra de toque do valor e para qual todos os desejos que causam prazer seriam válidos. Mas, essa não é
a única modalidade de ética humanista e por isso resta ainda uma alternativa além do subjetivismo e da submissão a
uma ética autoritária. De acordo com Fromm (1974, p. 151),
O hedonismo sustenta que o prazer é o princípio diretor da ação humana, tanto factual quanto normativamente.
Aistipo, o primeiro representante da teoria hedonista, acreditava que alcançar o prazer e evitar a dor eram a finalidade
da vida e o critério da virtude. (...) A primeira tentativa de revisão da posição hedonista, introduzindo critérios objetivos
nos conceitos de prazer, foi feita por Epicuro, que, embora insistisse em que o prazer era o alvo da vida, afirma que
‘conquanto todos os prazeres sejam em si bons, nem todos devem ser escolhidos’, porquanto alguns causam
ulteriormente aborrecimentos maiores do que o próprio prazer.
Há um aspecto relevante no princípio hedonista de Epicuro: ele fecha as portas a uma autoridade exterior que
determine o “melhor” sem levar em conta seus sentimentos. Pensadores humanistas-não-hedonistas – Platão,
Aristóteles, Spinoza e Spencer – enfrentaram a mesma questão e chegaram a três conclusões em comum:
“1) que a experiência subjetiva do prazer não é si mesma suficiente como critério de valor;
2) que a felicidade está combinada com o bem;
3) que pode ser encontrado um critério objetivo para a avaliação do prazer. (p. 155)”.
Surge a questão: Como é possível conciliar Humanismo e ética objetiva?
Na ausência de uma autoridade transcendente, como o homem pode estabelecer para si mesmo normas de conduta
e julgamentos de valores que sejam objetivamente válidos?
Para tentar resolver esse impasse é preciso, primeiramente, lembrar que “objetivamente válido” não é idêntico a
“absoluto”, conceito que só é significativo no campo teológico e que, portanto, não tem lugar nem na ética, nem no
pensamento científico em geral.
A objeção que é feita desde Kant é a de que só podem ser feitas afirmações objetivamente válidas a respeito de fatos,
e uma prova do “caráter científico” é justamente a exclusão de afirmações sobre valores.
Diferente do que ocorre nas ciências, nas artes se formula um sistema de normas objetivamente válidas (ciência
aplicada), deduzido de princípios científicos (teoria). Embora haja diversas formas de se alcançar bons resultados, as
normas não são arbitrárias e sua violação é punida tão somente por maus resultados.

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Viver, para Fromm, “é em si mesmo uma arte”. E a ética humanista é a ciência aplicada da arte de viver, baseada na
teoria estabelecida pela “ciência do homem”, e sua excelência é proporcional ao conhecimento. As normas só podem
ser deduzidas de teorias, tendo em vista uma meta, a meta, no caso do homem, é viver. A escolha do homem não
deve ser entre a vida e a morte, essa é mais aparente do que real, pois todo organismo tem inerente a si o impulso
para viver. “A escolha real do homem é entre uma vida boa e uma vida má” (p. 26).
Entretanto, na modernidade perdeu-se a concepção do viver como uma arte, como também se perdeu o sentimento
de sua dificuldade, pois como todos vivem, viver é considerado uma atividade simples na qual todos são especialistas.
Como a felicidade não é a meta da vida e sim o sucesso, ele age na ilusão de que beneficia seus interesses próprios,
embora na verdade, sequer os tem em conta. A hipótese de Fromm é que, embora seja preciso conhecer a natureza
do homem, é preciso considerá-lo como um indivíduo diferente dos demais. Isso só pode se dar se considerarmos que
“estar vivo” é um conceito dinâmico e que “o dever de estar vivo” significa o mesmo que o dever de se transformar a
si próprio naquilo que é em potencial.
Ética Autoritária
Erich Fromm criou o conceito de Ética Autoritária em oposição à Ética Humanista, aquela em que o homem estabelece
as normas de conduta para si mesmo. O autor distingue ambas por meio de um critério formal e um critério material.
Vejamos:

O problema “qual autoridade devemos ter” perpassa a conceituação difícil de autoridade, pois se pensa que é preciso
escolher entre a autoridade ditatorial e ausência de autoridade. Entretanto, o autor menciona dois tipos de
autoridade:
Autoridade racional: fundada na competência e se alicerça na igualdade entre as partes. As pessoas só são distintas
em grau de conhecimento. Portanto, é compatível com a Ética Humanista.
Autoridade irracional: sua fonte é o poder sobre as pessoas e cujas bases são o medo e o poder, ou seja, na diferença
de valor, na desigualdade entre as partes.
Habermas e o direito em Filosofia
Jürgen Habermas (Düsseldorf, 18 de junho de 1929) é um grande filósofo e sociólogo alemão, participante da tradição
da teoria crítica e do pragmatismo e também da famosa Escola de Frankfurt, tendo sido assistente de Theodor Adorno.
Assim, ele é considerado como um integrante da “segunda geração da Escola de Frankfurt” e suas investigações sobre
a democracia são muito importantes, principalmente através de sua teoria sobre o agir comunicativo e sobre a esfera

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pública. Habermas teve uma formação marxista e, no entanto, adaptou essas ideias ao capitalismo próprio das
sociedades contemporâneas industriais.
No contexto do século XX, vemos surgir uma nova maneira de se relacionar com as questões éticas e morais. Nesse
sentido, a noção de sujeito e, mais propriamente, a noção de consciência, dá lugar a uma investigação sobre a
linguagem. Em linhas gerais, esses questionamentos sobre a linguagem derivam da filosofia analítica, de pensadores
como Ludwig Wittgenstein (1889 - 1951) e Richard Rorty (1931 - 2007). Portanto, estamos em um contexto de crítica
da razão, tal como entendida na modernidade, e de aprofundamento do estudo sobre a linguagem. Veremos agora
como Habermas fundamenta a sua ética do discurso, aspecto central de toda a sua investigação filosófica.
O conceito de razão é importante para a fundamentação da ética do discurso em Habermas, mas não a razão tal como
entendida por Immanuel Kant - não uma razão reflexiva, reduzida ao sujeito - mas sim uma razão dialógica, uma razão
comunicativa, ou seja, uma noção ampliada de razão. Trata-se, portanto, de uma ética não fundamentada pela
subjetividade (ética kantiana), mas uma ética fundamentada na intersubjetividade, no diálogo, na própria interação
dos indivíduos que compõem um grupo.
Assim, há uma distinção proposta por Habermas entre, por um lado, a razão instrumental e, por outro, a razão
comunicativa. Podemos citar como exemplo de utilização da razão instrumental a própria manipulação indiscriminada
dos recursos naturais, o que gera enormes consequências do ponto de vista global, como o aquecimento global. Como
podemos ver, o uso da razão instrumental é sempre guiado por interesses particulares.
Já a razão comunicativa, leva em consideração o consenso entre os indivíduos, a possibilidade de se posicionarem de
maneira crítica a respeito das normas a serem ou não adotadas pelo grupo. Assim, as normas não seriam derivadas
de uma razão abstrata e universal, mas sim de um consenso a que chegariam os indivíduos, numa situação de
corresponsabilidade. Nesse sentido, do ponto de vista ético, não se pode abandonar, segundo Habermas, a ideia do
homem como um ser relacional e que, portanto, tem a necessidade da comunicação. Trata-se de uma concepção
ética muito importante na medida em que abre caminho para o diálogo, para a tolerância, para o consenso, no âmbito
das sociedades contemporâneas.
O agir comunicativo, com efeito, baseia-se no entendimento entre indivíduos racionais que buscam convencer uns aos
outros sobre a validade das normas, até que elas possam ser aceitas por todos a partir do consenso. Para que isso
funcione da maneira adequada, todos os argumentos relevantes, dentro de uma “situação ideal de fala”, serão levados
em consideração na discussão de uma determinada questão, o que levará a soluções mais democráticas, a uma
abertura maior ao diálogo e ao reconhecimento das diferenças intersubjetivas existentes no interior de uma
sociedade.
FONTES BIBLIOGRÁFICAS:
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; Martins, Maria Helena Pires. Filosofando: Introdução à Filosofia. SP: Ed. Moderna. 1994.
FROMM, Erich. A análise do homem. Rio de Janeiro: Zahar, 1974.
MARTINS, Mª Helena Pires; ARANHA, Mª Lúcia de Arruda. Filosofando: introdução à Filosofia, editora Moderna, 5ª ed, 2015.

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