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Freitag, Bárbara. Itinerários de Antógona – a questão da moralidade.

Século 18 caracterizou-se pela revolução das idéias, seguida pela revolução política na
Europa continental. “A essência da moralidade iluminista consiste em buscar os
princípios orientadores da ação fora da religião”. 32. Negação das idéias de que
indivíduos devam ser submissos às leis divinas que foram reveladas. Segundo Freitag,
na filosofia Iluminista, é possível encontra pelo menos trÊs tipos-ideais de moralidade:
a moralidade fundada nas leis naturais (Rouseau), baseada na razão (Kant) ou nos
interesses individuais (Helvétius).

Citando Rouanet (1989), a autora afirma que todos os sistemas morais do século 18 têm
em comum o congnitivismo, o individualismo e o universalismo. “O cognitivismo da
Ilustração é a capacidade de fundamentação racional da ética (...) a razão fundamenta o
pensamento filosófico e científico, interfere na organização do Estado, da economia e da
sociedade. (...) a razão sabe como agir e julgar numa base argumentativa que segue
regras transparentes”32-33 O individualismo na Ilustração tem a ver com a idéia de
responsabilidade individual por suas ações. Segundo Kant, o indivíduo segue um
imperativo categórico, Rousseay fala em consciência moral,para diferenciar a vontade
que não é mais guiada pelos imperativos da Igreja. No universalismo da Ilustração está
implícita a idéia de uma natureza humana comum a todos os homens, essencialmente
racional. Essa é a matriz da Declaração dos Direitos Humanos

Rousseau (1712-1776)

Relação dialética entre moral e ética – consciência moral individual x sua objetivação
no mundo institucionalizado

Para Rousseau, a igualdade entre os homens originariamente assegurada pelo seu estado
de natureza, somente será reconstituída por um contrato social que garante igualdade
política e sócio-econômica para todos. Esse contrato precisa estar calcado na
solidariedade e cooperação entre os homens; instituições devem visar justiça e paz
social. Rousseau avança em relação aos gregos, por superar a divisão de classes e a
desigualdade política e confere possibilidae de questionamento do contrato social.

Rousseau admite duas fontes de perturbação para a consciência moral – as paixões e as


falsidades sociais. A educação moral teria por objetivo dotar os indivíduos da
capacidade de julgar e agir corretamente, sem ser influenciado por preconceitos. A
razão seria o instrumento de discernimento entre vício e virtude. Para Rousseau,
garantir que o homem permaneça em seu estado natural não significa que ele deva ser
deixado nos bosques, mas que inserido na vida social, seja capaz de se orientar por uma
racionalidade que não é nem governada por paixões, nem por autoridades artificiais.
Para Rousseau, a razão precisa ser aprendida, não é uma qualidade nata.

Falando da educação moral de Emílio, Rousseau afirma que a manutenção de um corpo


sadio é também uma regra que podemos inferir da natureza. Numa concepção
darwiniana, a Natureza seleciona os mais fortes e saudáveis. “já que tudo que penetra
no entendimento humano aí chega pela via dos sentidos, a primeira razão do homem é
uma razão sensitiva; é ela que serve de base para a razão intelectual: nossos primeiros
mestres da filosofia são nossos pés, nossas mãos, nossos olhos. Substituit tudo isso por
livros não significa ensinar-nos a pensar, significa fazer-nos crer em muita coisa sem
que jamais saibamos algo” (Rousseau, 1966 apud Freitag, 38

A teoria Moral de Kant (1724-1804)

Kant faz uma distinção entre três faculdades humanas: conhecer, julgar e querer. A
cada uma dessas faculdades corresponde uma instância:
O entendimento trata do conhecimento, o juízo que julga o verdadeiro, o útil e o
belo; e finalmente a razão que orienta a vontade.
Subjacente a cada uma dessas instâncias, encontra-se um princípio, sem o qual não seria
possível conceber o pensamento. O entendimento não seria possível sem a causalidade.
O juízo não teria como julgar se não tivesse como norte a finalidade e a razão não teria
como exprimir sua vontade se não for levada em consideração o fim último.

Kant fala sobre três componentes da racionalidade::


Razão teórica – atividade do entendimento
Razão prática – atividade da vontade
Razão estética – mediação entre intuição e dialética

Razão prática e razão teórica

A razão prática desvenda as leis da natureza, do cosmos, do mundo orgânico e


inorgânico; já a razão prática desvenda as leis do mundo dos costumes. O mundo da
natureza representa para Kant o reino da necessidade, contingência e determinação; e o
mundo dos costumes o da indeterminação, da liberdade e possibilidade. “O mundo da
natureza constitui o Ser cuja finalidade última escapa à vontade humana. O mundo dos
costumes constitui o deve-ser, cuja finalidade última é definida pela vontade humana.
(...) No primeiro mundo, valem os julgamentos científicos, no segundo os julgamentos
morais.” (47)

O Imperativo Categórico
Conceito ligado à razão prática de Kant. “Age de modo que a máxima de sua
vontade possa servir simultaneamente como princípio de uma legislação geral” Kant
1974 apud Freitag pág 49

Para compreender o significado desse imperativo, é necessário aina conceituar a


vontade, autonomia, meios e fins, dignidade, universalidade, dever máxima
Vontade – faculdade de determinação das próprias ações segundo certas regras
(vontade legisladora – gesetzgebender wille). O exercício dessa vontade pressupõe uma
liberdade, um local onde a vontade se exprime. A liberdade é guiada pela razão.

Autonomia – ligada à liberdade. Leis morais fixadas pela nossa vontade

Dignidade – a dignidade humana é a finalidade última do imperativo categórico. “Não


se trata de uma sujeição sega (hegemônica ) à lei. Trata-se deseguir uma
diretrizracional, compreendida como tal, que se impõe a consciência de cada um como
necessária e justa, tendo em vista essa finaldiade última: a defesa e o respeito à
dignidade humana” Freitag (19xx50)
O imperativo categórico de kant é uma lei moral, exprimindo a necesidade de agir de
acordo com uma determinada lei, ditada pela razão, que possibilita a existência de uma
sociedade justa fundamentada em um contrato social que atenda aos direitos de todos.

Capítulo 3
Moralidade e Eticidade
Os críticos de Kant dizem que ele é excessivamente formal e idealista. Hegel foi um
deles.

Durkheim (1858-1917)

Ética Discursiva e Ação Comunicativa

No estudo sobre a moralidade pode-se retirar da filosofia as reflexões sobre o bem e o


mal, o justo e o injusto, o belo e o feio. É na filosofia que encontram-se as reflexões
que nos permitem pensar sobre o julgamento moral, os cirtérios e leis que regem esses
julgamento. Sob a ótica sociológica, a ênfase recai sobre valores, normas e sanções que
acompanham essa ação, dentro de um espaço delimitado. Sob a perspectiva
psicológica, é possível compreendermos os processos e mecanismos de constituição da
consciência moral.

Ética discursiva é uma teoria sobre a moral que pressupõe a linguagem. (Freitag) A
lingugagem para Habermas é um meio através do qual se realizam interações.

Ação instrumental x ação comunicativa. – Habermas faz essa distinção em sua teoria da
ação comunicativa. A ação instrumental é a forma de ação técnica que aplica
racionalmente meios para a obtenção de fins. Nas sociedades modernas, essa forma de
ação institcionalizou-se nos sistemas econômico e político, que possibilitam a
manutenção do sistema como um todo. No sistema econômico não há espaço para a
ação comunicativa, pois o dinheiro substitui a linguagem e no sistema político essa é
substituída pelo poder.

Já no Lebenswelt, ou mundo da vida, as interações são linguisticamente mediadas e o


objetivo final é o entendimento. Uma das patologias da modernidade apontadas por
Habermas é a colonização do mundo da vida pelo mundo sistêmico. Onde deveria
haver ação comunicativa passa a haver ação instrumental.

Para Habermas, a expulsão da ação instrumental da esfera do mundo da vida se dá por


meio da restauração da solidariedade, da sociabilidade e da espontaneidade. A ação
comunicativa permite que os atores movimentem-se simultaneamente entre o mundo
objetivo dos fatos, o mundo das regras e valores sociais e o mundo subjetivo individual.

Para Habermas, o indivíduo constitui-se nos processos interativos, voltados para o


entendimento, para a autocompreensão e para a compreensão dos outros, que se
constitui o indivíduo, o sujeito consciente de si e suas ações, responsável por suas ações
e as consequencias dessas.

Com o mundo dos objetos e fatos, a ação comunictiva permite que os atores assegurem-
se da verdade argumentativamente, transformando a ação em discurso especializado.
Em relação ao relacionamento entre os atores, a ação comunicativa permite a
articulação de valores, a elaboração e validação de normas. Por meio da ação
comunicativa é possível buscar o consenso, o entendimento, a verdade, a aceitação de
normas e valores. Os processos argumentativos possibilitam o aumento da liberdade da
ação e a maior participação dos envolvidos nos processos sociais. A teoria da ação
comunicativa acrescenta a reflexão moral às ações sociais ao propor o conceito da ática
discursiva.

O entendimento é interpretado como um mecanismo de coordenação de ações, em que


um ator procura, por meio de uma argumentação racional convencer o outro da verdade
de uma afirmação, da validade de uma norma ou da veracidade de suas declarações.
Isso ocorre em situações específicas, que são ao mesmo tempo situações de ação e fala.
Esta última emerge da necessidade de um entendimento ou esclarecimento.

Os participantes de um processo comunicativo em uma situação de fala têm a


possibilidade de aceitar ou refutar as argumentações de um locutor. Quando há
refutação, as pretensões de validade dessa situação de fala ficam suspensas – os atores
podem dizer que o locutor está mentindo, que sua afirmação é falsa e as normas que
regem sua fala são ilegítimas ou incorretas.

“Habermas chama de discurso um tipo especial de ação comunicativa, na qual as


pretensões de validade implícitas nas situações de fala cotidiana estão temporariamente
suspensas. O discurso procura por um processo argumentativo, regulado segundo certos
princípios, restaurar as pretensões de validade desativadas temporariamente,
reassentando a comunicação em novas bases. “ 243 A comunicação pode ser restaurada
quando se prova a veracidade do locutor.

O discurso teórico procura validar ou refutar afirmações sobre os fatos e objetos. Os


cientistas buscam convencer seus pares da veracidade de suas afirmações com base em
argumentos racionais, buscando o entendimento. Essa é a essência da teoria consensual
da verdade. O discurso teórico problematiza a validade de uma afirmação sobre fatos; o
discurso prático problematiza a justeza de uma norma ou sistema normativo (habermas
vol2 p 39 in Freitag 243.

O discurso prático é a forma de argumentação em que as pretensões de validade das


normas são tematizadas. Normas existentes e propostas precisam ser legitimadas no
interior de um processo argumentativo. A norma deve ser legitimada, segundo o
critério de uma razão comunicativa, não pela tradição, carisma de uma autoridade, mas
através de um processo democrático, no qual é escolhido o melhor argumento.

O que diferencia, segundo Habermas o discurso teórico do prático são os tipos de


pretensões de validade que está em jogo. O discurso teórico procura validade
afirmações sobre fatos, fenômenos, objetos; já o discurso prático procura verificar se as
normas sociais estão ou não corretas.

ÉTICA DISCURSIVA E DISCURSO PRÁTICO

Duas pressuposições básicas da teoria de Habermas:


As pretensões de validade das normas têm um sentindo cognitivo e podem ser tomadas
como pretensões de verdade
A fundamentação de normas e ordens exige a realização de um discurso efetivo real,
que não é possível na forma monológica. O esforço cognitivo para examinar a verdade
ou examinar uma norma não é feito por um indivíduo isolado, mas por sujeitos capazes
de se comunicarem, integrantes de um discurso teórico e prático. Aqui o imperativo
categórico de Kant (princípio moral, racional e universal que orienta ações) é
substituído por um princípio U, que orienta o procedimento discursivo dos integrantes
de um discurso prático.

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