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Ética: bases teóricas e conceituais

Docente:

Justino Quina

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Introdução

Todos conhecemos a expressão “o homem é um animal social”. Isso


significa simplesmente que os seres humanos vivem em
sociedade. Para subsistir, qualquer sociedade precisa de normas,
escritas e não escritas, que ligam os indivíduos e regulam os
seus comportamentos quando estes se relacionam nos seus
vários papéis ou domínios de intervenção (familiar, social,
profissional, etc.), de forma a manter a coesão e a integração
social harmoniosas.

Com efeito, o homem necessita criar regras que lhe permitam


interagir. Estas servirão de base para identificar o que é certo e
o que é errado, o que é permitido e o que não é permitido,
dando previsibilidade à sua conduta. Estes padrões culturais ou
de conduta, socialmente criados, são vinculativos para os
membros do grupo. Só assim a sociedade pode desenvolver-se,
num contexto de ordem e estabilidade, que permite aos homens
construir projectos de vida. 2
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Evolução do Conceito da Ética
Um dos critérios fundamentais que determinam as regras de
conduta do indivíduo é: a pressão e o contexto social.

A evolução do conceito de ética foi, sempre, dentro de


determinados contextos específicos, determinado pelo homem.
Significa que a evolução do conceito resulta de condições
civilizacionais e de contemporaneidade que foram mudando ao
longo do tempo.

É a sociedade que determina as regras da ética (seja através das


leis, dos costumes, da Moral, de códigos de conduta ou da
deontologia) mas existe sempre um espaço de consciência
individual que permite a cada cidadão estabelecer as suas
fronteiras desde que não infrinja princípios determinados por
regras de conduta sociais.
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i) Os Clássicos (ética dos bens)

A ética como ciência nasceu com o advento das cidades


gregas, no "Século de Péricles" (século V a.C.), primeiro
com os sofistas, depois com Platão e Aristóteles, autor das
três obras básicas da ética no Ocidente: Ética a Nicómaco,
A grande moral e a Ética a Eudemio.

Para os clássicos, existe um “bem supremo” a nortear o


comportamento. Ele é o fim de todos os meios. E os bens
possíveis são: felicidade, virtude, prazer e a sabedoria.

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Para Platão (427-347 a.C.), agir eticamente é agir com rectidão de
consciência. A inteligência, quando bem utilizada, conduz ao
Bem, ao Belo, ao Justo. Ao comportar-se de forma ética, o
homem aproxima-se do verdadeiro mundo, o mundo das Ideias,
do qual o mundo em que vivemos é uma mera cópia. O
verdadeiro sábio procura actuar em busca do ideal e corrigir-se
quando se engana. Através da sua inteligência e virtude, o
homem regressa ao mundo das ideias.

Aristóteles (384-322 a.C.) defendia que a ética é a ciência prática


do bem. E Bem é aquilo que todos desejam. Não existe um único
bem, este é relativo, é um modo de existência determinado pela
natureza das diferentes criaturas - por isso, ao agir, cada um
deve tratar de forma igual o que é igual e de forma desigual o
que é desigual. Cada um procura alcançar o bem ao atuar, pelo
que do bem depende a autorealização do homem, a sua
felicidade. O bem próprio do homem é a inteligência: o homem
é um animal racional 12
ii) Contratualismo (Abordagem do bem comum)
Para os contratualistas, a ética é um conjunto de regras e
princípios em que temos de acordar para que a sociedade
funcione.

A abordagem do bem comum defende uma ética em que o bem


individual está ligado ao bem comum, da comunidade. Por isso,
os membros da comunidade estão ligados por objectivos e
valores comuns. A noção de bem comum remonta a Platão,
Aristóteles e Cícero e foi, mais recentemente, definido por John
Rawls como as condições que existem em benefício de todos.

Os conceitos comuns a estes autores são o “estado de natureza” e


o “contrato social”, embora os utilizem em sentidos muito
diferentes.
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Mas a premissa básica é, a partir do “estado de natureza”,
descobrir argumentos racionais para um “contrato social”
que rege as relações entre indivíduos em sociedade.

Os filósofos diferem na forma do consentimento dado ao


contrato mas concordam que, uma vez celebrado, o contrato
social constitui a base da lei e da ética e da nossa obrigação
social de reconhecer e respeitar as necessidades dos outros
indivíduos. Na realidade, são teorias mais políticas do que
éticas.

Os teóricos desta abordagem é Thomas Hobbes (1588-1679),


John Locke (1632-1704), Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) e,
recentemente, John Rawls (1921-2002).
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iii) Utilitarismo (abordagem consequencialista)
O objectivo da ética é a maior felicidade para o maior número
possível de pessoas. O padrão ético do utilitarismo é “estão
certas as acções que produzam a maior quantidade possível de
bem-estar”.

Para eles, o conceito de felicidade não é o conceito clássico


(perfeição, sentido nobre da vida), mas o conceito hedonista
(interesse imediato, prazer, bem-estar).

Uma das linhas de pensamento mais seguidas pelos utilitaristas


defende que cada indivíduo pode utilizar as suas preferências
como guia para a acção, embora cada pessoa deva também
promover as condições que permitam aos outros prosseguir as
suas próprias preferências.
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 Efectivamente, a análise utilitarista de um problema ético é
muito útil num processo de decisão, uma vez que se inicia com a
identificação das consequências para quem é afectado pela
decisão. Comporta basicamente quatro passos:

1) identificar as várias acções possíveis;


2) identificar os stakeholders, ou seja, todos aqueles que possam ser
afectados (positiva ou negativamente) pela decisão ou nela ter
interesse;
3) determinar os efeitos positivos e negativos das várias decisões
possíveis;
4) decidir qual a acção que produz a maior utilidade global (moires
benefícios com o menor dano possível) – “o maior bem para o
maior número.

 Os teóricos desta abordagem são Jeremy Bentham (1748-1832),


John Stuart Mill (1806-1873) e Peter Singer. 16
iv) Abordagem Universalista
A ética baseada em princípios absolutos ou universais tem a sua
raiz na ética kantiana. Kant (1724-1804), à semelhança de David
Hume (1711-1776), defende que a ética não tem fundamentos
científicos nem metafísicos, mas é algo mais que os hábitos
sociais. É uma ética humana, autónoma, resultante da lei moral
intrínseca ao homem.

É uma ética pura, não contaminada pelo empirismo nem por


exigências exteriores. Assim, não é só a liberdade que importa, a
racionalidade também é importante.

Para Kant, os princípios da ética são imperativos categóricos.


São imperativos porque a lei moral manda, não aconselha. São
categóricos porque são juízos absolutos e não hipotéticos e são
incondicionados.
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A ideia fundamental a reter é a concepção da ética como um
sistema de regras que devemos seguir partindo de um sentido do
dever, independentemente do nosso desejo. Um juízo ético tem
de se apoiar em boas razões. E as razões têm de ser válidas para
todas as pessoas em todos os momentos.

Para Kant, existem alguns direitos e deveres morais que o


homem deve obrigatoriamente cumprir, independentemente dos
benefícios que obtenha. Por isso, esta corrente diz-nos que as
consequências das acções não são o principal aspecto a ter em
conta na decisão sobre o que se deve fazer. Devemos ter em
conta, em primeiro lugar, a justiça e a equidade.

A ética kantiana está de certa forma na origem de uma corrente


que também ganhou muitos adeptos, a ética do respeito pelas
pessoas. Esta teoria tem como padrão ético “estão certas as ações
que respeitam de forma igual cada pessoa como agente moral”.
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v) Idade Média (Santo Agostinho e São Tomás de Aquino)
 Na idade média o conceito de ética altera-se radicalmente. Desliga-se
da natureza para se unir a moral cristã. Só o encontro do Homem
com Deus lhe possibilitará a felicidade (séculos IV e XIV).

 Ética e moral fundiam-se numa simbiose que a igreja considerava


perfeita. Durante este período a Ética deixa de ser uma opção, passa
a ser imposta, confundindo-se com a religião e a moral.

 No final do séc. XIV, com o renascimento dão-se algumas


transformações: desenvolve-se o comércio e nasce a burguesia;
desenvolvem-se as ciências; nasce uma nova concepção do homem
como centro do Universo.

 Com os descobrimentos e mais tarde com as divisões da igreja


durante o séc. XVI, começaram a surgir teorias éticas que se afastam
dos valores do cristianismo e geram alguma conflitualidade. 19
vi) Idade Contemporânea
Surgem ramos diferenciados aplicados nos diferentes campos
do saber e das actividades do ser humano. No Séc.XIX começa a
aparecer a ética aplicada. A ciência e a economia substituem a
religião. Começa a falar-se de “ética utilitarista”: tudo oque
contribua para o progresso social é bom.

A economia é que serve de guia para o desenvolvimento com


prevalência sobre a ética.

No final do século passado:


- As desigualdades fazem despertar uma consciência cívica; O
consumidor-objecto dá lugar ao consumidor sujeito, mais
preocupado com o significado e as consequências dos seus
padrões de consumo; Multiplicam-se os códigos de ética ou de
conduta; Nasce a empresa-cidadã: postura ética empresarial.
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vii) Pensamento ético africano

A ética africana está enraizada no conceito “Ubuntu” - o valor


das pessoas, sobre sua dignidade, liberdade, auto-
determinação.

“Ubuntu” fala sobre o facto de que pertencemos a uma mesma


família. Pertencemos à família humana, à família de Deus.

Em grande parte da África, a visão do mundo envolve algo


chamado “Ubuntu”. “Ubuntu” é a essência do ser humano, de
uma pessoa.

“Ubuntu” fala de compaixão, de generosidade, de


hospitalidade. Ele anseia pelo social, pela harmonia comunal.
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O “ubuntu” encoraja o perdão, encoraja a reconciliação. A


vingança, raiva, ódio, rancores, tudo isso mina, corrói a
harmonia social.

São vários teóricos africanos que se dedicam/dedicaram nesta


matéria:

- Marcus Garvey; William Du Bois; Kwame Nkrumah; Franz


Fanon; Aimé Césaire; Leopold Senghor; Leon Damas; Wole
Soyinka; Desmond Ntutu; Paulin Hountondji; John Mbiti; Aléx
Kagamé; Placid Tempels; Severino Ngoenha; Brazão Mazula;
Eboussi Boulaga, Marcien Towa, Wiredu.

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Considerações finais

É extremamente importante anotar que o debate


ético teve vários momentos/contextos ao longo do
tempo, mas o objecto de estudo nunca mudou,
sempre permaneceu o mesmo, desde os clássicos,
cristãos, iluministas até aos africanos. A harmonia e
bem-estar das pessoas estão sempre no centro do
debate ético.

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Obrigado pela
atenção!

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