Você está na página 1de 4

Letras em dia, Português, 11.

º ano

Leitura

Apreciação crítica
Lê a apreciação crítica que se segue.

O génio de Chaplin

O Garoto de Charlot 

Poucas coisas servem melhor para lavar os olhos do que o


regresso a esta obra essencial, de onde, se não vem tudo, vem
quase tudo, voltada para o essencial: um olhar sobre a
humanidade, concentrada [até dado ponto] na figura de Charlot,
5 e dada em todas as suas contradições, sentimental e maldosa,
cruel e altruísta, violenta e pacífica, temente e revoltada. O
Homem no cinema é, muito possivelmente, Charlot.
E são os dois primeiros Charlots longos que agora voltam à
sala. Depois de vários anos a dirigir e a interpretar shorts,
10 Chaplin quis passar aos filmes de longa duração, um pouco
contra a opinião de toda a gente que, na época, via a longa-
-metragem como um formato dado à narrativa dramática e os
filmes de uma ou duas bobinas como o território de eleição da comédia. Chaplin, para O
Garoto de Charlot [1921], intuiu que a longa-metragem, e sobretudo a comédia de longa-
15 metragem, precisava de outra respiração e de outros condimentos que não se limitassem ao
slapstick rápido, curto e feroz da maior parte dos seus filmes até então. Embora já houvesse
sinais dele nalgumas curtas anteriores, é com O Garoto de Charlot que se inaugura, em
grande, o chamado, e tantas vezes tão mal-entendido, «sentimentalismo» chapliniano, que viria
a ter o seu zénite nesse filme inacreditável que é Luzes da Cidade. Encontramos então – no
20 garoto que desperta o instinto paternal e protetor de Charlot – a primeira e completa
«humanização» da personagem, mesmo que a relação entre os dois exista num meio tão
selvático (onde os pobres são vítimas dos outros pobres e vítimas dos ricos) como o descrito
pela norma chapliniana – homem que nunca esqueceu, mesmo podre de rico, a miséria da sua
infância londrina: o Garoto tem, de resto, algumas das mais célebres cenas de pancadaria
25 geral da obra de Chaplin. É um clássico luminoso, autêntico ícone do cinema americano, ainda
hoje capaz de pôr uma plateia a passar do riso ao choro sem perceber como.
A Quimera do Ouro, feito em 1925, regressa à figura de Charlot depois de um introito
[A Woman of Paris, de 1923] em que Chaplin se tentou livrar dela, operação que resultou num
filme genial mas à época incompreendido. [...] Se não faltam os elementos tradicionais dos
30 filmes de Chaplin (os «brutos», o «interesse romântico»), é pelo cenário e pela relação com ele
um filme bastante peculiar, e porventura – na questão da «proeza física» – o filme de Chaplin
que mais diretamente «compete» com o cinema físico e maquinalmente cronometrado de
Buster Keaton, então o único rival à sua altura. Um cinema sem «batota», ou onde a «batota»
era mantida a um nível mínimo: é por isso que, na celebérrima cena do jantar (quando Charlot
35 cozinha, e come, um par de botas), Chaplin está mesmo a comer botas (feitas de material
especial, mas botas). Com a ironia acrescida, e totalmente pensada, de num filme sobre o
«ouro» as imagens mais fortes sejam, afinal, as desta refeição de miséria absoluta.
O superlativo génio de Chaplin chega para o Natal, mas devia ser coisa para todo o ano.

OLIVEIRA, Luís Miguel, 2014. «O génio de Chaplin». Público.


https://www.publico.pt/2014/12/11/culturaipsilon/critica/o-genio-de-chaplin-1678981 [Consult. 2021-12-11]

1 | LDIA11 © Porto Editora


Letras em dia, Português, 11.º ano

Leitura

Seleciona a opção que, em cada um dos itens, permite obter uma afirmação adequada ao sentido do
texto.

1. A frase «O Homem no cinema é, muito possivelmente, Charlot.» (ll. 6-7) pretende

(A) valorizar todo o cinema que se debruça sobre temáticas essenciais à


humanidade.
(B) pôr em contraste a humanidade de Charlot com a personalidade de Chaplin.
(C) revelar que Charlot é a mais conhecida personagem do universo
cinematográfico.
(D) mostrar que a personagem Charlot sintetiza toda a complexidade da
humanidade.

2. De acordo com o segundo parágrafo,

(A) O Garoto de Charlot concretiza a vontade de Chaplin desenvolver novas


técnicas nas áreas da representação e direção de atores.
(B) O Garoto de Charlot representou uma novidade para a época, contrariando
algumas práticas cinematográficas instituídas.
(C) os filmes anteriores a O Garoto de Charlot eram filmes de longa duração.
(D) os filmes de uma ou duas bobinas eram de longa duração.

3. Relativamente ao «“sentimentalismo” chapliniano» (l. 18), o autor refere que

(A) foi potenciado, em O Garoto de Charlot, pela relação entre os protagonistas.


(B) apareceu pela primeira vez em O Garoto de Charlot.
(C) teve o seu ponto mais alto em O Garoto de Charlot.
(D) permitia que a plateia passasse frequentemente do choro ao riso.

4. Segundo o que o autor do texto apresenta no terceiro parágrafo,

(A) o cinema de Chaplin apostava na variedade temática, usando sempre a mesma


personagem, Charlot.
(B) O Garoto de Charlot centra a sua temática na exploração do ouro no início do
século.
(C) a riqueza, a profundidade dos filmes de Chaplin não é fruto do acaso.
(D) o filme A Quimera do Ouro foi um filme incompreendido na sua época, mas
atualmente muito aplaudido.

5. Nas linhas 34 e 35, os parênteses são usados para

(A) apresentar um comentário do narrador.


(B) especificar uma ideia apresentada anteriormente.
(C) enumerar algumas cenas específicas.
(D) fazer uma síntese das ideias apresentadas anteriormente.

6. O objetivo do texto é

(A) debater um tema.

2 | LDIA11 © Porto Editora


Letras em dia, Português, 11.º ano

Leitura

(B) expor um tema.


(C) fazer uma análise subjetiva.
(D) narrar acontecimentos

3 | LDIA11 © Porto Editora


Letras em dia, Português, 11.º ano Sugestões de resolução

3 | LDIA11 © Porto Editora

Você também pode gostar