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Análise I (aula 02)

Gênero, Estilo, Forma – Estrutura


Motivo e Frase
Salatiel Ferreira
11.02.2019

De acordo com Hodeir:


Gênero; de uma maneira simples, é um certo espírito que preside a concepção
de uma obra, ou ainda, é a reunião num mesmo conjunto de um determinado número
de formas que têm entre sim bastante afinidades de caráter. Por exemplo, música
sacra e profana, ou música vocal e instrumental.
Estilo; poderíamos dizer que é uma espécie de selo que o artista imprime ao
seu pensamento e que, depois de materializado pela técnica, faz com que a obra seja
original ou não. É pelo estilo que a obra vive; é o estilo que lhe dá o rosto, que permite
identificar o autor; é a ausência de estilo que torna a obra medíocre.
Porém, é possível considerar estilo em função do gênero – ou da forma – a que a obra
pertence. Essa associação não é de modo algum arbitrária: é frequente: quem nunca
ouviu “o estilo da fuga” ou “o estilo lírico”? É verdade que cada gênero e até cada forma
se adaptam a um estilo que lhe é próprio. Para o criador, trata-se, de algum modo, de
encontrar um “tereno comum” ao seu estilo pessoal e ao estilo do gênero que escolheu
trabalhar.
Forma e estrutura – Todos sabem o que é uma forma: um certo tipo de obra. A
sinfonia é uma forma; o concerto é uma forma. A primeira difere do segundo pelo fato
de o compositor nela usa uma linguagem especificamente orquestral, enquanto o estilo
instrumental está presente no concerto, modificando radicalmente a essência da obra.
Desta forma – A forma é a maneira como a obra se esforça por alcançar a unidade.
Schoenberg diz que o termo Forma é utilizado em muitas acepções: nas
expressões “forma binária”, “forma ternária” ou “forma-rondó”; a expressão “forma-
sonata” indica, por sua vez, o. tamanho das partes e complexidade de suas inter-
relações; quando nos referimos ao “minueto”, ao scherzo, e a outras formas de dança,
pensamos nas características rítmicas, métricas e de andamento, que identificam a
dança.
Em um sentido estético, o termo forma significa que a peça é “organizada”, isto
é, que ela está constituída de elementos que funcionam tal como um organismo vivo.
Sem organização, a música seria uma massa amorfa, tão ininteligível quanto um texto
sem pontuação. Os requisitos essenciais para a criação de uma forma compreensível
são a lógica e a coerência: a apresentação, o desenvolvimento e a interconexão das
ideias devem estar baseados nas relações internas, e as ideias devem ser
diferenciadas de acordo com sua importância e função.
Para compreensão de um todo, uma subdivisão apropriada facilita e determina a
forma. O tamanho e o número das partes não dependem das dimensões da peça. Em
geral, quanto maior o a obra, maior o número de partes: em alguns casos, uma peça
curta pode conter a mesma quantidade de partes de uma peça longa.
O compositor, ao escrever uma peça, não junta pedaços, mas concebe a
composição em sua totalidade. Porém, assim como um principiante (compositor) que é
incapaz de projetar uma composição em seu todo, devemos portanto proceder
gradualmente, analisar os blocos do mais simples ao mais complexo. Esses blocos
musicais (frases, motivo etc.) fornecerão materiais para compreender unidades maiores
de vários tipos, de acordo com a necessidade de cada estrutura.

Motivo
O motivo (inciso ou célula) é a mínima unidade musical significante, ou seja, a
menor unidade melódica reconhecível de uma determinada peça de música. O motivo
é incompleto em si mesmo, sendo utilizado como ponto de partida para a construção
de unidades mais extensas. Fazendo um paralelo com a linguagem verbal, o motivo
seria equivalente à palavra. Considera-se tradicionalmente que a extensão de um
motivo pode variar de três notas, no caso de um motivo curto, a oito ou nove notas, no
caso de um motivo longo.

Figura 1. Motivo longo de oito notas. J. S Bach (?), Minueto em Sol Maior.

Figura 2. motivo curto de três notas. F. Mignone, Aquela modinha que o Villa não escreveu.

Para Schoenberg, o motivo geralmente aparece de uma maneira marcante e


característica no início da peça. Os fatores constitutivos de um motivo são intervalares
e rítmicos, combinados de modo a produzir um contorno que possui, normalmente,
uma harmonia inerente. Um motivo aparece continuamente no curso de uma obra: ele
é repetido, geralmente variado, evitando assim, a monotonia.
Qualquer sucessão rítmica de notas pode ser usada como um motivo básico,
mas não pode haver diversidade muito grande de elementos.
As características rítmicas podem ser muito simples, mesmo no tema de uma
sonata (a); raramente uma sinfonia pode ser construída em padrões rítmicos muito
complexos (b e c).

Figura 3.
Um motivo não precisa conter uma grande diversidade de intervalos: por
exemplo, o tema principal da Sinfonia n. 4 de Brahms, apesar de também conter sextas
e oitavas, é formado por apenas uma sucessão de sextas.

Figura 4.

Um contorno ou perfil, será sempre significativo, mesmo que o tratamento


intervalar e rítmico se altere (salto da figura 3 a).

Semi-frase
A semi-frase, que é também chamada de membro de frase, é composta pela
justaposição de diversos motivos. A semi-frase, assim como o inciso, não apresenta
uma ideia completa, sendo relativa à sentença ou oração na linguagem verbal. A semi-
frase pode ser binária, quando é formada por dois motivos, ou ternária, quando é
composta por três motivos.

Figura 5. semi-frase binária. J. S. Bach, Paixão Segundo São João.

Figura 6. semi-frase ternária. G. F. Handel, O Messias.

Frase
Para Schoenberg, Frase é a menor unidade estrutural, uma espécie de molécula
musical constituída por algumas ocorrências musicais unificadas, dotada de uma certa
completude e bem adaptável à combinação com outras unidades similares. O termo
frase significa, do ponto de vista da estrutura, uma unidade aproximada àquilo que se
pode cantar em um só fôlego.
A frase é uma ideia musical completa que finaliza com uma cadência. Assume a
função organizadora do discurso musical, sendo possível de ser classificada de
diversas formas:
a). quanto ao tipo de cadência com que determinada frase é finalizada, ela pode ser
uma frase suspensiva quando termina com uma cadência suspensiva, ou uma frase
conclusiva que finaliza com uma cadência conclusiva.
Figura 7. frases suspensiva e conclusiva. R. Schumann, O Cavaleiro Selvagem.

b). quanto ao número de semi-frases que compõem uma frase, esta pode ser
classificada de frase binária, quando é composta por duas semi-frases, ou de frase
ternária, quando resulta da conexão de três semi-frases.

Figura 8. frase binária. F. Schubert, Die Schöne Müllerin.

Figura 9. rase ternária. W. A. Mozert, Sonata K. 279, II.

c). do ponto de vista qualitativo, ou seja, quando se leva em conta o conteúdo das
semi-frases que constituem uma frase, esta será chamada de frase afirmativa quando
as semi-frases que a compõem são iguais ou semelhantes, ou seja, são construídas
com base no mesmo material. Quando os membros de frase diferem entre si, isto é,
são compostos de material diferente, a frase é chamada de frase contrastante. A
frase regular é aquela que possui semi-frases com a mesma extensão. A frase
irregular é aquela na qual as semi-frases diferem em sua duração, possuindo
diferentes extensões de tempo.

Figura 10. frase binária afirmativa. W. A. Mozart, Sinfonia n.º 40, III.

Figura 11. frase ternária contrastante. C. W. Gluck, Iphigène en Aulide.


Figura 12. frase binária irregular. B. Bartók, Aratáskor.

d). quadratura – as frases mais comuns são aquelas que têm a extensão de quatro
compassos, chamadas de frases quadradas. As frases de oito e dezesseis
compassos também são consideradas quadradas, pois estes números são múltiplos de
quatro. A construção musical com frases quadradas (quadratura) é a mais comum na
música do século XVIII, períodos Barroco Tardio e Clássico. No século XX, a escola
neoclássica também utilizou abundantemente este tipo de frase.

Figura 13. frase quadrada de 4 compassos. A. Dvořák, Dança Eslava n.º 2.

Figura 14. frase quadrada de 8 compassos. B. Bartók, Játék.

Harmonicamente, pode-se usar quase todas as progressões, mas para figuras


iniciais são mais comuns os graus I e V, já que eles expressam a tonalidade de uma
maneira mais convincente.

Figura 15.
O ritmo é um elemento importante na construção de uma frase: contribui para
deixá-la interessante e variada.
O final de frase é, em geral, ritmicamente de modo a estabelecer uma
pontuação. Podem ter diferentes combinações; redução rítmica, uso de intervalos
menores ou um número menor de notas, ou por qualquer forma adequada de
diferenciação.
O comprimento de uma frase pode variar, sendo que o tempo e compasso
influem diretamente em sua extensão. Nos compassos compostos, uma extensão de
dois compassos pode ser considerado um padrão médio; nos simples, quatro
compassos podem ser considerados o mais normal. Em tempos lentos, uma frase pode
ser reduzida a meio compasso; e em tempos muito rápidos, oito ou mais compassos.
É raro que a frase seja um múltiplo exato da duração do compasso; ela
geralmente, varia em um ou mais tempos e quase sempre atravessa as subdivisões
métricas sem que tenha preenchido totalmente os compassos.

Figura 16.

Bibliografia Básica:
COOK, N. A Guide to Musical Analysis. London: J. M. Dend & Sons. 1987.
HODEIR, A. As Formas da Música. Lisboa, Edições 70, 1970.
SCLIAR, E. Fraseologia Musical. Movimento, Porto Alegre, 1982.
SCHOENBERG, A. Fundamentos da Composição Musical. São Paulo: Edusp, 1991.

Bibliografia Complementar:

BENNETT, R. Forma e Estrutura da Música. Jorge Zahar Editor, Rio de Janeiro, 1980.
GIANELLI, A. M. A disciplina de análise em instituições de ensino superior do
estado de São Paulo. 2012. Dissertação de mestrado. Universidade Estadual Paulista.
São Paulo, 2012.
VERSOLATO, J. C. Rumos da Análise Musical no Brasil (análise estilística 1919-
84) São Paulo. Dissertação de Mestrado. Universidade Estadual Paulista. São Paulo.
2008.

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