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Transtornos Invasivos do Desenvolvimento

staff. Journal of Applied Behavior Analysis, 15, 335- que reforçar e como observar e registrar comporta-
351, 1982. mentos (1). O uso desse programa e a ênfase em
17. Sidman, M. Coercion and its fallout. Boston, envolver os conhecimentos dos pais no ensino fa-
MA: Authors Cooperative, Inc., Publishers, 1989. zem Carpenter (2) considerar o Projeto Portage a pe-
18. Skinner, B.F. The behavior of organisms. dra inicial do que é hoje conhecido como “parceria
Acton, MA: Copley Publishing Group, 1938. entre profissionais e pais”. (3)
19. Skinner, B. F. Ciência e comportamento O Projeto Portage é composto por três elementos
humano. (J. C. Todorov e R. Azzi, Trad.). São Paulo: Ed. complexos e distintos: 1) uma proposta de
Martins Fontes. (Trabalho original publicado em procedimento de treino domiciliar; 2) um currículo para
1953), 1988. avaliação e ensino de crianças com necessidades
20. Taylor, B. A. and McDonough, K. A. Selecting educacionais especiais (“Guia Portage de Educação Pré-
Teaching Programs. Em: Maurice, C., Green, G. and Escolar”(4) e 3) um Programa de Treinamento de Pais.
Luce S. c. (Eds.), Behavioral Intervention for Young (5,6) (Uma descrição mais completa de cada um desses
Children with Autism: A Manual for Parents and elementos pode ser encontra em Williams e Aiello). (7)
Professionals. Austin, TX: PRO-ED, Inc, 1994. Todas as intervenções do Projeto Portage ocorrem
na casa da crianças e o ensino é realizado pelo pais.
Um professor é designado para cada criança e família,
podendo ser um profissional ou um paraprofissional
treinado. Ele visita cada uma de suas famílias, um dia
por semana, durante mais ou menos uma hora e meia.
Preparado para trabalhar em três ou cinco atividades,
de uma ou todas as áreas de desenvolvimento
(cognição, desenvolvimento motor, autocuidados,
CAPÍTULO XXIV linguagem, socialização ou estimulação infantil),
antes de tudo o professor coleta dados de linha de
base para determinar o quanto a criança pode
O PROJETO PORTAGE E O INVENTÁRIO desempenhar cada uma dessa atividades. Essa
informação será comparada ao desenvolvimento da
OPERACIONALIZADO: criança após uma semana de treino realizado pelos
pais nas atividades propostas. Se a criança obtiver,
nas Segunda avaliação, um número de acertos acima
CONTRIBUIÇÕES PARA A de 80% em qualquer uma das atividades treinadas,
INTERVENÇÃO PRECOCE COM ela será considerada aprendida e deverá ser
CRIANÇAS AUTISTAS. incorporada na rotina diária da criança. Se a criança
apresentar uma qualidade de acertos menor que 80%
na atividade, o professor deverá, junto aos pais,
Ana Lúcia Rossito Aiello analisar as razões e, se necessário, alterar o
procedimento de treino, deixando a atividade para
ser ensinada por mais uma semana.
Este capítulo descreve, em linhas gerais, o Pro- Durante a visita domiciliar, o professor fornece
jeto Portage e o Inventário Portage Operacionalizado modelo aos pais de como ensinar cada uma das
e suas contribuições para a intervenção precoce em atividades para a criança, solicita que demonstre como
crianças com risco de deficiência estabelecidas e, prin- irão realizar as atividades e fornece feedback sobre a
cipalmente, com aquelas que apresentam sinais pre- atuação deles. No final de cada visita, o professor
coces de autismo. deixa com os pais as atividades e o procedimento de
ensino por escrito e os instrui a trabalhar com a criança
O PROJETO PORTAGE E SEUS COMPO- pelo menos uma vez por dia nas atividades prescritas.
Para facilitar as decisões sobre o que ensinar à criança
NENTES: DESCRIÇÃO GERAL. e como planejar as atividade de ensino é utilizado o Guia
O Projeto Portage é um projeto amplo de trei- Portage de Educação Pré-Escolar, (4) composto por:
namento domiciliar aos pais e dirigidos à educação 1) um inventário comportamental (denominado
pré-escolar que teve início em 1969. Ele foi elabora- Inventário Portage) que lista 580 comportamentos
do para desenvolver, implementar e demonstrar um divididos em seis áreas de desenvolvimento –
programa modelo para crianças em idade pré-esco- cognição, autocuidados, socialização, linguagem,
lar, habitantes da área rural de Wisconsin (EUA). Por- desenvolvimento motor e estimulação infantil
tanto, trata-se de um programa de ensino domiciliar (específica para bebês) – por faixa etária de zero a seis
que busca envolver os pais na educação de seus fi- anos; 2) um conjunto de cartões descrevendo o
lhos, programa de ensino domiciliar que busca en- comportamento e sugerindo estratégias de ensino,
volver os pais na educação de seus filhos, oferecen- atividades, materiais a serem utilizados e análise de
do-lhes treinos sobre o que ensinar, como ensinar, o tarefas para cada um dos 580 comportamentos. (Esse

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3º Milênio

conjunto de cartões serve de referência para o dar-lhes modelo do comportamento adequado, soli-
professor e pais ao planejar e ensinar os citar-lhes que pratiquem o comportamento, oferecer-
comportamentos à criança) e 3) um manual contendo lhes feedback sobre essa atuação, reforçar-lhes os acer-
instruções de como utilizar o inventário e os cartões tos, registrar-lhes suas respostas e torna-se-lhes dispo-
de ensino além de informações sobre treinamento. níveis para possíveis consultas. Os autores do Progra-
O inventário comportamental da criança ma Portage de Pais (5,6) recomendam que o ensino
(Inventário Portage), elaborado com base em escalas de habilidades aos pais seja realizado pelo professor
de desenvolvimento de crianças normais, é utilizado junto ao treino de crianças, durante a visita domiciliar,
para apontar os comportamentos que uma crianças e ai sugerem que o professor deixe aos pais leituras
específica sabe realizar nas diferentes áreas de semanais sobre as habilidades ensinadas a eles.
desenvolvimento. Os comportamentos do inventário Portanto, estudos descritos na literatura indicam
que indicam habilidade emergentes (aqueles que o Projeto Portage tem sido um modelo útil de
comportamentos não aprendidos que ocorrem logo intervenção precoce, propiciando ganhos as crianças
após aos aprendidos) (1) podem ser aqueles prescritos (em termos do número de habilidades adquiridas e
para treino. Entretanto, recomenda-se que a idade, aceleração do desenvolvimento), além de ser um dos
interesse, o ambiente domiciliar, as prioridades dos modelos pioneiros em oferecer ajuda às famílias em
pais e as deficiências motoras e sensoriais da criança seu domicílio. Ele foi traduzido para 37 línguas e
sejam considerados, nesse processo de decisão, em introduzido em mais de 78 países atendendo diferentes
relação aos itens que a ela devem ser ensinados. populações. (7,8) Além disso, Cameron (9) afirma que
Embora o Inventário Portage tenha sido desenvolvido o Projeto Portage tem sido uma plataforma na qual se
com implicações educacionais, o professor deve fundamentam muitos programas de intervenção
avaliar cuidadosamente a relevância de um item precoce existentes hoje. Seu uso, em termos de pesquisa
particular para cada criança. e intervenção, foi introduzido no Brasil, mais
Como foi dito, o Projeto Portage oferece um Pro- especificadamente na Universidade Federal de São
grama de Treinamento de Pais. (5,6). Os procedimen- Carlos, no final da década de setenta por Williams. (10)
tos e materiais descritos nesse programa são baseados
na análise experimental do comportamento e visam
habilitar os pais para técnicas mais adequadas de ensi-
INVENTÁRIO PORTAGE
no e de manejo do comportamento da criança. Além OPERACIONALIZADO (IPO)
disso, durante a visita domiciliar, enfatiza-se a obser-
Williams e Aiello (7) operacionalizaram cada um
vação das interações pais-criança, em termo do mo-
delo antecedente-comportamento-conseqüente, em dos 580 comportamentos do inventário comporta-
que os eventos antecedentes e conseqüentes ofereci- mental da criança (Inventário Portage) propondo-lhes
dos pelos pais servem para evocar e manter o compor- definições, critérios, especificação das condições de
tamento da criança. O programa é composto por: avaliação e descrição do material a ser utilizado (ver
1) um inventário comportamental de pais (5), desenvol- exemplo na Tabela 1). A necessidade de tal
vidos para lhes facilitar o planejamento, a operacionalização surgiu da experiência de utilizar o
implementação e a avaliação de programas de ensino Inventário Portage original e obter baixos índices de
para eles individualizados, constituído por 82 itens fidedignidade entre os observadores ao avaliar o
que, de acordo com a literatura, parecem relevantes repertório de crianças.
para os que se propõem a facilitar o ensino de diferen-
Nº Item Área Inventário Portage Inventário Portage
tes habilidades às crianças, bem como a lidar com os Faixa etária Operacionalizado
seus possíveis comportamentos inadequados. Esse 18 Cognição Emparelha objetos Emparelha objetos
1 a 2 anos semelhantes Semelhantes
inventário subdividi-se em cinco seções: comporta- Condição: para diminuir a
mentos antecedentes ao ensino material de ensino, complexidade da tarefa,
comportamento conseqüentes ao ensino, comporta- não apresente objetos com
qualquer dimensão
mentos relevantes para o fornecimento de comporta- diferente; exemplo: cor,
mento adequados gerais da criança e planejamento tamanho, forma, textura.
Dispor objetos que servirão
instrucional (por exemplo, o que e como ensinar); como modelo (exemplo:
2) um manual (5) para o professor contendo suges- uma bola, uma boneca,
uma colher), entregar seus
tões para utilizar o inventário comportamental de pares à criança solicitando-
pais e realizar o ensino de suas habilidades, além lhe a resposta de
de descrever modelos de treinamento aos pais; emparelhar.
Resposta: emparelhar =
3) um livro de leituras para os pais (6) oferecendo-lhes, em cada tentativ corresponde a
linguagem acessível e ilustrada por pequenas estórias, colocar um objeto próximo
do seu objeto semelhante.
princípios da análise do comportamento (reforçamento, Material: duas bolas, duas
medelagem, encadeamento, etc.), sugestões para bonecas, duas colheres,
duas camisetas da mesma
envolvimento da família no processo de ensino, cor, duas frutas iguais.
procedimentos de correção, entre outros tópicos. Critério: emparelhar pelo
Desse modo, no processo de ensino de habilida- menos três diferentes pares
de objeto.
des de manejo de comportamento infantil, o profes-
sor deve avaliar as habilidades de interação dos pais Tabela 1: Exemplo de operacionalização de item do
com seus filhos, precrever-lhes objetivos de ensino, Inventário Portage proposto por Williams e Aiello.

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Dessa forma, a operacionalização do Inventário torno em bebês ou crianças jovens (crianças na faixa
Portage permite que ele seja usado como um etária de dois anos). Assim, atualmente, um bebê ou
instrumento par: 1. Realizar avaliação sistemática do uma criança jovem com autismo pode ser reconhe-
repertório de crianças vulneráveis a diversos riscos cida por suas dificuldades em orientar-se para estí-
ou consideradas especiais, em relação às diferentes mulos sociais, limitado contato visual e prejuízos na
áreas do desenvolvimento e faixa etária (zero a seis imitação motora e atenção. A importância dessa iden-
anos) – uma vez que os itens estão descritos em tificação precoce parece ser valorizada ao se analisar
termos observáveis, a presença ou ausência de um os resultados favoráveis (melhora no desenvolvimen-
comportamento pode ser facilmente determinado to e no comportamento social, aumento do QI, aqui-
favorecendo a visualização de progresso (ou não) da sição de linguagem, diminuição dos sinais de autismo)
criança ao se realizar medidas periódicas de seu obtidos por crianças que receberam programas de
desenvolvimento; 2. Orientar pais ou familiares para intervenção precoce após a identificação, também
oferecerem uma estimulação compatível com as precoce, dessas dificuldades (12). Entretanto, cabe
necessidades da criança; 3. Capacitar o profissional ressaltar que alguns autores, como por exemplo
que executará a avaliação das crianças e a orientação Gresham e MacMillan, (13), apontam problemas
dos pais e 4. Indicar ao profissional se suas metodológicos (momento do início do tratamento,
intervenções junto à criança ou família estão surtindo sua intensidade e duração, seus delineamentos de
os efeitos esperados. pesquisa e integridade e a designação aleatória dos
Por isso, o IPO tem sido usado no Brasil, por participantes em grupo experimental e de controle)
diversos pesquisadores e profissionais, com vários nas pesquisas sobre eficácia da intervenção precoce
tipos de população (crianças com necessidades no autismo que mereceriam investigações futuras.
educacionais especiais ou em risco de atraso de Assim, a possibilidade de identificação precoce
desenvolvimento, com bebês prematuros e de baixo de autismo acarretou uma incidência maior de estudos
peso), em diferentes situações de ensino (Apaes, na literatura voltados para, pelo menos, quatro
creches, clínicas particulares, domicílios), com vários aspectos:
objetivos (monitorar desempenhos de crianças, 1. Determinar e avaliar quais são as dificuldades ou
estimular bebês institucionalizados ou bebês de alto sinais precoces de autismo. Um dos caminhos uti-
risco após alta hospitalar, formar alunos de graduação lizados para se estudar os sintomas precoces de
em Psicologia e treinar mães e familiares) e em vários autismo se dá por Meio de uso de filmes domicilia-
Estados. (7). res realizados pelos pais. Nesses estudos, pesquisa-
No livro O Inventário Portage Operacionalizado: dores solicitam vídeos domésticos (por exemplo, da
Intervenção com Famílias (7), o leitor encontrará festa de um ano de idade) tanto que foram posteri-
sugestões sobre o procedimento de observação dos ormente diagnosticadas autistas como de criança
comportamentos (que áreas observar, por qual faixa normais e com os desepenhos de ambas na mesma
etária começa a avaliação, onde encerrar a avaliação, situação. Esses estudos (14-20) têm mostrado que é
duração das sessões de observação, como organizar possível identificar comportamentos, em crianças
previamente uma sessão), como registrar os muito pequenas, que parecem ser sinais precoces de
comportamentos da criança e exemplos de folhas de autismo;
registros para cada área de desenvolvimento do 2. Avaliar e propor deferentes programas de intenção
inventário (desenvolvimento motor, cognição, para crianças jovens como autismo. Por exemplo,
autocuidados, socialização, linguagem e estimulação intenções que facilitam a socialialação (21) e a
infantil). Além disso, o leitor também encontrará integração motora, visual e audidita (22) dessas
materiais e sugestões de como avaliar e treinar crianças:
professores e pais, formas de analisar e monitorar o 3. Elaborar instrumentos/testes derivados desses si-
seu desempenho e o da criança (por exemplo, usando nais para sua detecção precoce, bem como pro-
a reta de regressão). por instrumentos mais refinados , baseados em
critérios mais recentes, para diagnosticar o
autismo;
O INVENTÁRIO PORTAGE 4. Alertar os pediatras e os profissionais da saúde so-
OPERACIONALIZADO: POSSÍVEL bre a necessidade de incorporar à sua prática pro-
CONTRIBUIÇÕES PARA O fissional avaliações que permitam detectar essas
dificuldades nos bebês durante as consultas de
AUTISMO. rotina, (23-25) assim como estudos sobre
Inicialmente, faz-se necessário situar o leitor no capacitação desses profissionais. (26,27)
que há de novo sobre autismo para, posteriormente, Cumine, Leach e Stevenson (28), em livro recen-
descrever as possíveis contribuições do Projeto te destinado a pais e profissionais sobre a natureza e
Portage e do IPO para essa população. implantações educacionais do autismo, particular-
Darwson e Osterling (11) apontam que um dos mente no bebê e na criança jovem, têm resumido os
conhecimentos mais recentes e excitantes no campo seguintes comportamento mais prejudicadas no
do autismo é a habilidade para reconhecer esse trans- autismo:

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3º Milênio

1. Interação social. A criança jovem com para crianças já identificam, a maioria desses
autismo: instrumentos faz o profissional observar e analisar
• Pode não se colocar no lugar de outra pessoa (pode apenas os itens indicativos de autismo, raramente
não compreender a outra pessoa) e assusta-se remetendo-o para uma avaliação global do
imprevisivelmente; desenvolvimento da criança e menos ainda para o
• Parece relacionar-se melhor com objetos do que contexto familiar mais amplo em que ela se encontra.
com pessoas; Ao proceder dessa forma, parece que a ocorrência de
• Pode tolerar abordagem de pessoas muito familiares; erros nesse processo de diagnóstico são facilitados.
• Pode abordar pessoas que lhes são muito Uma tentativa de evitar esses erros está sendo
conhecidas; implementar, na Universidade Federal de São Carlos, ao
• Pode parecer usar pessoas apenas como um meio utilizar o Projeto Portage e o IPO paralelo ao processo de
para um fim – para obter fora de seu alcance; diagnóstico e tratamento sugerido por Filipek et al. (29)
• Desconhece regras sociais simples e convenções. a criança com sinais de autismo. Inicialmente, o CHAT
(Checklist for Autism in Toddlers) (30), um dos instru-
2. Comunicação Social. A criança jovem com mentos mais conhecidos para triagem de sinais preco-
autismo: ces de autismo, foi aplicado por alunos de Psicologia, as
•É lenta para desenvolver a fala – e pode não crianças de creche, visando verificar a utilidade do ins-
desenvolve-la; trumento na detecção de sinais de autismo na popula-
• Se sua palavra, freqüentemente usa fora de contexto ção brasileira. (31) Posteriormente, as crianças assim
e sem intenção de comunicação. identificadas ou as encaminhadas por outras fontes ao
• Pode ecoar as palavras de outras pessoas – imediata projeto, passaram a receber visita domiciliar semanal,
ou posteriormente; com uma hora de duração, realizada por dupla de alu-
• Pode usar palavras e posteriormente “perde-las”; nos do curso de graduação em Psicologia, sob supervi-
• Usa pouco contato visual; são da autora. A parti daí, o Projeto Portage e o IPO teve
• Raramente compreende ou usa gestos; início incorporando a eles vários princípios apontados
• Pode desenvolver gestos como apontar, mas usa pela literatura atual como sendo fundamentais para o
indicar necessidade mais do que para compartilhar sucesso de intervenções com família e criança. Tais prin-
uma experiência. cípios são: 1. Oferecer serviços centrados na família (32)
e nos seus pontos fortes mais do que nas suas deficiên-
3. Imaginação social e flexibilidade de pensamen- cias ou aspectos negativos; 2. Utilizar uma abordagem
to. A criança jovem com autismo: eco-sistêmica (33,34) de intervenções na qual a família
• Pode não compreender facilmente seqüência de é vista como um sistema menor dentro de um sistema
eventos; maior (comunidade), sendo necessário analisar todas
• Pode torna-se aflita quando se altera a rotina familiar; as intenções entre os sistemas e subsistemas; 3. Analisar
• Pode impor rotina às outras pessoas; a rede de apoio social35 disponível à família, funda-
• Freqüentemente engaja em comportamentos mental para ajudá-la a enfrentar as dificuldades advinda
esteriotipados; de diferentes estressores e ampliar tal rede quando ne-
• Freqüentemente resiste a novas experiências (por cessário; 4. Usar estratégias para prevenir risco de
exemplo: recusando alimentos diferentes ou roupas estresse (3,36); 5. “Empoderar” (empowerment) (37)
novas); as famílias oferecendo oportunidades para que efetiva-
• Acha difícil trabalhar no que outras pessoas estão mente consigam solucionar seus problemas tomando
fazendo e certamente não compreende por que elas as decisões pertinentes. (Para uma descrição mais deta-
fazem coisas – é incapaz de se colocar no lugar do lhada destes princípios e a interface com o Projeto
outro; Portage e o IPO ver Aiello e Williams). (38,39).
• Pode desenvolver jogo simbólico lentamente – caso
desenvolva; Além desses princípios, o atendimento oferecido
• Freqüentemente prestam atenção a detalhes. à criança e sua família tem por filosofia de ação:
Segundo cumine et al., (28) as crianças podem 1. Ênfase no ensino de habilidades positivas e nos
apresentar alguns ou vários desses sinais, obtendo, pontos fortes da família e da criança, procurando
cada uma, um perfil individual. fortalecer habilidades já existentes e a partir delas
No que se refere aos instrumentos a serem ampliar para novas habilidades. Busca-se, com isso,
utilizados desde a detecção precoce até o diagnóstico diminuir as diferenças entre o repertório de
final de autismo, Filipek et al. (29) especificam os comportamento da criança com necessidades
instrumentos descritos na literatura incluindo-os a educativas especiais e seus pares normais;
uma rota de avaliação composta de dois níveis. No 2. Reconhecimento de que a família possui
primeiro nível, sugerem que a triagem seja realizada conhecimento único e úteis sobre seu filho,
com todas as crianças (por profissionais da saúde fundamentais para uma parceria entre profissionais
nos atendimentos rotineiros à criança) e envolva a e pais (3) que buscam o melhor para a família e para
identificação delas em risco para qualquer atraso de a criança;
desenvolvimento. No segundo nível, mais específico 3. Instruções no ambiente natural com uma variedade

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Transtornos Invasivos do Desenvolvimento

de “professores” (pais, irmãos, alunos de Psicologia de violência existente no município, treinar pais e
e outros); irmãos em estratégias de ensino incidental (40),
4. Interações individualizadas e estruturadas como informar a família sobre o que é autismo, possíveis
forma de ensino a ser utilizada, pelo menos, no início tratamentos e resultados obtidos em eles, etc.).
do processo de ensino; Portanto, esse exemplo parece ilustrar que incorporar
5. Adequação de atividades à idade e interesse da ao processo de identificação precoce de sinas de
criança, bem como o ensino de habilidades autismo estratégias que acrescentam visita domiciliar,
funcionais derivadas do IPO que permitam a observação de interações pais-criança em situação
adaptação e realização de atividades do dia-a-dia natural e avalizada tanto sobre os aspectos do próprio
por parte da criança. processo de diagnóstico quanto os da intervenção.
O Projeto Portage e o IPO têm oferecido os Ao invés de deixar os pais “esperando” pelos
elementos básicos para essa análise e intenção. A visita resultados desses processos (que muitas vezes pode
domiciliar e a presença semanal dos alunos e ser longo) e a criança sem intervenções, eles são
supervisora (ou de profissionais) na casa da família, incluídos como parceiros para compreender o que
proporciona uma fonte de apoio estável e consistente, está ocorrendo com seus filhos, além de, junto a ele,
além de encorajamento, informações gerais sobre receber maior atenção às suas necessidades imediatas.
dúvidas e referência a recursos da comunidade para Esse parece ser mais um caminho promissor para o
a família. Também possibilita que os alunos e uso do Projeto Portage e o IPO que continuam a ser
supervisora detectem, muito mais rápido, possíveis explorados.
necessidades, desafios e dúvidas e intervenham mais
prontamente ajudando a família a solucioná-los. Ao
estar na casa da criança observando as relações
Endereço para Correspondência
existentes entre os membros e avaliando o Ana Lúcia Rossito Aiello
desenvolvimento global da criança, via IPO, o Rua Adolfo Catani, 976, Jardim Macarengo, Cep:
profissional tem uma visão ampla e contextualizada 13560-470, São Paulo, SP.
da família e da criança e não apenas de seus anaiello@uol.com.br
problemas.
Por exemplo, foi encaminhada ao serviço
descrito acima uma criança de 2 anos e 9 meses com
REFERÊNCIAS BILBLIOGRÁFICAS
suspeita de autismo, uma vez que apresentava os 1. Shearer MS, Shearer DE. The Portage Project: a
seguintes sinais: ter parado de falar, não manter model for early childhood education. Exceptional
contato visual com adultos estranhos, usar apenas Children. 39:210-217, 1972.
uma palavra e gestos para obter itens desejados e 2. Carpenter B. Finding the family: early
não interagir com colegas da mesma idade. (É intervention and the families of childrem with special
importante esclarecer que os profissionais que educational needs. In: Carpenter B. Ed Families in
encaminharam essa criança desconheciam os Context: Emerging Trends in Family Support and Early
instrumentos usados para identificação precoce e não Intervention. London: David Fulton Publishers; 1997:
aplicaram nenhum deles para confirmar tais suspeitas. p20-30.
Apesar disso, disseram à família que “ele é autista”). 3. Turnbull AP, Turnbull HR. Families,
Embora as observações estejam no início, foi possível Professionals, and Exceptionality: A Special
verificar, em poucas semanas, durante o atendimento Partnership 2nd ed. Columbus: Mirrill Publishing CO;
domiciliar, que os familiares “entendem” os gestos 1990.
da criança e propiciam à ela o item desejado. Portanto, 4. Bruma S, Shearer M, Frohman A, Hilliard J.
parece não haver estímulo para o uso da linguagem Portage Guide to Early Education. Ed. Revisada.
falada, por outro lado, o ambiente domiciliar é instável Portage, Wisconsion: Cooperative Educational Service
com freqüentes brigas entre os pais, seguido por Agency 12; 1976.
período de ausência do pai. A criança já presenciou 5. Boyd RD, Stauber KA, Bruma S. Portage Parent
inúmeras brigas inclusive algumas com violência física Program: Instructor,s Manual. Portage, Wisconsin:
à mãe. Que efeitos tem este contexto nos Cooperative Educacional Service Agency 12; 1977.
comportamentos inicialmente descritos dessa 6. Boyd RD, Bluma SM. Portage Parent Program:
criança? Eles continuariam sendo sinais precoces de Readings. Portage, Wisconsion: Cooperative
autismo à luz dessas novas informações? É preciso educacional Service Agency 12; 1977.
continuar investigando, aplicando os instrumentos e 7. Willian LCA, Aiello ALR. O Inventário Portage
a rota sugerida por Filipek et al. (29) antes de se afirmar Operacionalizado: Intervenção com a Família. São
com mais clareza se esses comportamentos Paulo: Memnon/FAPESP; 2001: p. 1-27.
apresentados pela criança são ou não sinais precoces 8. Wasik BH, Bryant DM. A historical overview. In
de autismo. Também é fundamental, paralelamente, (autores) Home Visiting: Procedures for Helping Families
iniciar intervenção sobre o que já foi detectado como 2nd ed. London: Sage Publications, 2001: p. 1-27.
sendo possível problemas (por exemplo, encaminhar 9. Camenron R. Portage: The Years of
a mãe para serviço de psicoterapia a mulheres vítimas Achievement. Windsor: NFER – Nelson, 1986.

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3º Milênio

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