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Ao fazer um comparativo das funções delegadas às mulheres no início

do século XX no Brasil com o atual papel exercido pela mulher na sociedade


brasileira é possível perceber diferenças significativas, assim configurando o
progresso feminino perante a sociedade.
No período que compreende a primeira metade do século passado, as
mulheres não tinham a capacidade de votar, assim como eram impedidas de
estudar, tais atividades eram permitidas somente ao público masculino. A efetiva
mudança da posição da mulher em sociedade foi impulsionada pelos
movimentos sufragistras1 e feministas que iniciaram na Europa, sendo difundidos
pelo mundo.
Está erradicada, no âmbito social, a idéia de dicotomia, ou seja, de
ordenamentos opostos, o que efetiva as distinções, por exemplo, feminilidade e
masculinidade; cultura e natureza. Esses ordenamentos opostos têm a
capacidade de efetivar as hierarquias, assim faz-se entender de maneira pré-
estabelecida que um seja relativamente superior ou outro.
A determinação das funções sociais masculinas e femininas advém do
procedimento de constituição simbólica. Essa determinação refere-se ao caráter
de representatividade, nesse sentido o homem e a mulher adotam um habitus
que é estabelecido por meio da ordem cultural.
De acordo com Löic Wacquant2 o conceito de habitus é definido como
“um modo estenográfico de designar uma postura de investigação adequada à
observação metódica da constituição social de agentes em quadros
institucionais diversos”. Sendo assim, entende-se que o contexto sócio-cultural
tem a capacidade de influenciar na construção do habitus que é um
procedimento em constante mutação.
No que tange ao gênero, o habitus exerce o papel de ordenam social.
Segundo Bordieu3 o masculino e feminino são analisados como “sistema de
esquemas classificatórios”, em conseqüência disso há a incidência da conduta
previamente facultada aos homens e as mulheres no âmbito sócio-cultural.

1 Movimento social, político e econômico de reforma que tem o objetivo de estender o direito ao
voto à população feminina.
2
WACQUANT, Löic. Esclarecer o habitus. Educação & Linguagem, ano 10, nº 16, p. 63-71, jul.-
dez. 2007.
3 BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. Rio de Janeiro: Bestbolso, 2014.
Assim, é possível compreender que o habitus, avaliado como hábito incita o
comportamento social.
Para compreender tal conduta previamente facultada é preciso analisar
como fora instituída, para tanto, os estudos precursores sobre a desigualdade
de gênero baseavam-se nas características biológicas entre homens e mulheres.
A força física da mulher, geralmente inferior a dos homens era, e ainda é utilizada
como exemplo para confirmar a idéia que a população feminina é mais frágil que
a masculina.
Esse posicionamento da condição humana é o resultado da legitimação
da desigualdade de gênero. As condições e os lugares sociais são
conseqüências de construções históricas, assim, sofrem constantes mutações,
portanto não devem ser compreendidas como permanentes.
De acordo com Santos4 gênero refere-se a um mecanismo cultural,
socialmente construído, relacionado com a identidade social das pessoas e o
sexo é relativo às suas características biológicas, ou seja, corresponde ao órgão
reprodutor dos indivíduos. Assim, compreende-se que o conceito de gênero é
infligido pela construção social que estabelece um posicionamento desigual
entre homens e mulheres.
Adotando o entendimento dicotômico gênero versus sexo, Bruschini5
define como:
Princípio que transforma as diferenças biológicas entre os sexos em
desigualdades sociais, estruturando a sociedade sobre a assimetria
das relações entre homens e mulheres. Usar “gênero” para todas as
referências de ordem social ou cultural, e “sexo” para aquelas de ordem
biológica.

Evidencia-se que o conceito gênero e sexo são distintos, portanto não


deveriam ser confundidos. A definição de genro corresponde ao âmbito sócio-
cultural, naturalmente diverso do conceito de sexo que é relativo a anatomia do
corpo humano, assim, de ordem biológica.

4 SAFFIOTI, Heleieth I.B. Primódios do conceito de gênero. Cadernos pagu (12) 1999: pp.157-
163, Disponível em <
file:///C:/Users/CCE/Desktop/Prim%C3%B3rdios+do+conceito+de+g%C3%AAnero.pdf> Acesso
em: 02/06/2017.
5 BRUSCHINI, Cristina. Tesauro para estudos de gênero e sobre mulheres. São Paulo:

Fundação Carlos Chagas, 1998.


A socióloga Heleieth Saffioti6 expõe que gênero abrange o
posicionamento social dos indivíduos, sendo este a efetivação da existência do
corpo, contudo destaca que o corpo deve ser analisado como uma circunstância,
ou seja, um instrumento de possibilidades culturais que serão absorvidas e
reinterpretadas.
Cumpre informar que o corpo deve ser considerado para analisar o
posicionamento da mulher e do homem em diferentes nações, entretanto o corpo
não é suficiente para definir a identidade de gênero das pessoas enquanto
homens e mulheres.
No presente contexto, essa construção social de gênero é capaz de
interferir na vida profissional e pessoal dos sujeitos. Nesse sentido, tais
comportamentos, pré-estabelecidos, delegados às mulheres e aos homens
alteram o processo de socialização e educação da população feminina e
masculina na sociedade.
É importante destacar que o posicionamento previamente instituído às
pessoas pode variar de acordo com o contexto sócio-cultural, assim avalia Maria
Luiza Heilborn7
O comportamento esperado de uma pessoa (...) é produto das
convenções sociais acerca do gênero em um contexto social
específico. E mais, essas idéias sobre o que se espera de homens e
mulheres são produzidas relacionalmente; isto é: quando se fala em
identidades socialmente construídas, o discurso
sociológico/antropológico está enfatizando que a atribuição de papéis
e identidades para ambos os sexos forma um sistema simbólico
concatenado.

Percebe-se desta forma que a atribuição de papéis acima mencionada,


estabelecida aos homens e mulheres abrange um ambiente social específico, ou
seja, tais comportamentos podem apresentar alterações diante da diversidade
social, bem como cultural das nações.
Na teoria de Chodorow8, a divisão do trabalho no ambiente familiar, bem como,
a atribuição de tarefas para ambos os pais são fatores determinantes para a
efetivação da desigualdade nas relações de gênero.

6 SAFFIOTI, Heleieth. Rearticulando gênero e classe social. In: COSTA, Albertina de


Oliveira; BRUSCHINI, Cristina (org.) Uma questão de gênero. Rio de Janeiro: Rosa dos
tempos, 1992.
7
HEILBORN, Maria Luiza. Gênero, Sexualidade e Saúde. Disponível em:
<https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/490609/mod_resource/content/1/HEILBORN%20G%C
3%AAnero%2C%20Sexualidade%20e%20Sa%C3%BAde.pdf>. Acesso em: 24/05/2017.
8
CHODOROW, Nancy. Psicanálise da maternidade: uma crítica de Freud a partir da
mulher. Rio de Janeiro: Rosa dos tempos, 2002.

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