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Fundamentos da Psicologia Comunitária 2022.

Claudiana Ramos da Silva

Exercício 1

O documentário “Junho - O mês que abalou o Brasil”, permite fazer algumas análises
acerca dos conceitos de ideologia e alienação. Uma das cenas que permite fazer isso é a do
Datena estranhando o fato de que a maioria dos participantes de uma enquete apoiava o tipo de
manifestação que se estava dando em São Paulo. Parece-me que ela se assenta em uma
representação do brasileiro como pacífico e não violento, tal como proposto por Chauí (1980).
Isso pode ser visto também em uma fala do então governador Geraldo Alckimin, em uma outra
cena, na qual sustenta que tudo se trata de um movimento organizado por um grupinho de
vândalos criminosos. Isso demonstra como ele crê que se trata de algo que não representa toda a
sociedade, mas apenas uma minoria, sendo algo pontual.

Para a surpresa do apresentador da Band, entretanto, a alteração da pergunta da enquete


para "você é a favor de protesto com baderna?", na qual o sim continua vencedor, demonstra
como essa representação manifesta uma ideologia ao atribuir um caráter absoluto – o brasileiro é
assim e pronto – a um fato social – a violência ou não do brasileiro – e também ao contribuir para
manter a ordem social como está. Se a violência é apenas algo localizado, isso justificaria a
repressão policial que então se dá para conter os protestos, o que confirmaria posteriormente a
ideia de que realmente somos pacíficos, pois teria sido algo de momento que logo foi contido.

Ao se deparar com a contradição que existe entre as representações e a realidade que está
diante dele, Datena oferece a justificativa de que o novo resultado da enquete somente se deve ao
fato de as pessoas estarem insatisfeitas por conta dos preços - novamente, é algo esporádico e
passageiro. Essa é claramente "uma justificativa que encerra o processo [de pensar] com uma
elaboração ideológica" (Lane, 1984, p. 43). Ou seja, uma elaboração que mantém a representação
ao invés de questioná-la, o que poderia sim levar a uma conscientização ao permitir a
continuidade do processo.

Ao contrário dele, percebe-se em outra cena, a de Sérgio Vaz, uma consciência de si e


também de classe. Isso porque ele se percebe como constituído e constituinte de suas relações
sociais. A situação em que está não é somente fruto das ações dos governantes, mas também das
suas, sendo um caminho de mão-dupla. Ao mesmo tempo, “O indivíduo consciente de si,
necessariamente, tem consciência de sua pertinência a uma classe social” (Lane, 1984, p. 42) de
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onde se depreende que ele também a tem. Entretanto, como a consciência de classe é uma
categoria sociológica, teria que se analisar seu grupo como um todo para saber se ele (grupo) a
tem, se “se percebem sujeitos das mesmas determinações históricas que os tornaram membros de
um mesmo grupo, inseridos nas relações de produção que caracterizam a sociedade num dado
momento” (Lane, 1984, p. 42) e se agem de acordo com isso, já que o processo de consciência
envolve pensamento e ação. Pode-se entender que eles agem, porque o poeta afirma que a
periferia sempre vai para a rua, demonstrando que lutam contra a ordem social atual, mas não se
pode analisar ao certo esta consciência sem a análise das representações do grupo.

Referências

Canzian, F. (Produtor), Wainer, J. (Diretor). (2014). Junho - O mês que abalou o Brasil

[Documentário]. São Paulo: Folha de São Paulo.

Chauí, M. (1980). A não-violência do brasileiro, um mito interessantíssimo. Almanaque:

Cadernos de Literatura e Ensaio, 11, 16-24.

Lane, S.T.M. (1984). Consciência/alienação: a ideologia no nível individual. In: S.T.M. Lane &

W. Codo (Orgs), Psicologia social: o homem em movimento (pp.40-48). São Paulo:

Braziliense.

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