Você está na página 1de 11

Centro de Cura Espiritual e Cromoterapia

Artigo originalmente publicado na Revista Caducel no. 1 em março de 2007

Paulo de Tarso: herói ou vilão?


Por Mt. R.Bogomolow

A Controversa posição de Paulo em relação ao Cristianismo primitivo


e à sua real importância para a determinação do Catolicismo como
modelo religioso para o mundo cristão1 .

Introdução
Muito se critica em relação ao papel do apóstolo Paulo – Saulo quando usava
o nome grego. Normalmente essas críticas não se baseiam em dados históricos,
levando-se em conta o contexto da época, e muitas vezes apenas de teorias ou
opiniões pessoais a respeito do personagem que certamente nada acrescentam à
História e em nada ajudam na compreensão do porquê Mestre Jesus tê-lo escolhido
para ser o Seu apóstolo perante os Gentios.
O texto a seguir terá como objetivo esclarecer o fato com base em
documentos da História da Religião em que estudiosos do tema se predispuseram a
interpretá-lo sob uma perspectiva histórica, baseada em documentos e análises
contextuais, e certamente dispensando as paixões e os sentimentos sobre a sua
figura, que, como dissemos, em nada contribuem para a compreensão de seu
verdadeiro papel no apostolado cristão.

Os Apóstolos e suas linhas


“...Tudo o que há de bom no Cristianismo provém de Jesus, tudo o que há de mal, de
Paulo...”. Frase atribuída ao teólogo alemão protestante Franz Overbeck (1837-1905)
em 1919.

Começaremos a discorrer sobre nossa linha de raciocínio, esclarecendo um


pouco do que se passava com os seguidores de N.S. Jesus Cristo e sobre quem eram
eles.
Primeiramente através dos registros históricos, não só o Novo Testamento,
obviamente aí, incluindo as cartas e Atos dos Apóstolos, mas também através de
inúmeros registros históricos sobre o comportamento dos romanos na época,
podemos afirmar que o Cristianismo nasceu em meio a grupos sociais de seguidores
extremamente desarmônicos e destoantes na forma de pensar e agir, mesmo em
relação à sua base filosófico-religiosa: o Judaísmo.
Observamos ainda que o Cristianismo verdadeiramente nasceu quando Jesus
ressuscitou e ascendeu aos céus, conforme revelam as Escrituras. Até então, Suas
práticas e Seus ensinamentos, depois continuados por seus seguidores, os
apóstolos, se restringiam principalmente ao imediatismo do atendimento das

1
Título original do artigo.
Material apenas para estudo e reflexão. 1
Proibida a reprodução total ou parcial sem a autorização escrita do autor
Centro de Cura Espiritual e Cromoterapia
Artigo originalmente publicado na Revista Caducel no. 1 em março de 2007

necessidades dos que buscavam a Jesus (notadamente mais por necessidades


materiais do que espirituais). Ou melhor, os que buscavam Jesus, na verdade,
buscavam algo para a sua vida material, e Mestre Jesus “embutia” ensinamentos de
cunho espiritual, filosófico e religioso dentro das práticas ou “milagres” a ele
atribuídos quando “resolvia” os problemas dessas pessoas.
A verdade é que os homens da “Terra Santa” daquela época, de um modo
geral e com raras exceções, não estavam interessados em questões de ordem
filosófica, religiosa ou mesmo moral, já que isso era instituído e suprido pelos
rabinos e Sacerdotes do Grande Templo, onde as práticas ritualísticas da Lei
Mosaica eram, segundo eles, suficientes para suprir seu “contato com Deus” e suas
determinações.
Se naquele tempo existia uma prática religiosa, certamente ela não acontecia
ou não passava pelo coração de todos os homens, ficando restrita, como já
dissemos, às normas de cunho moral que também tinham valor de Lei social, e
muitas vezes com atributos jurídicos e penais (subordinando, inclusive, valores e
normas de conduta social do povo judeu daquela época). Desse modo, os laços
com o transcendente “se faziam” por intermédio dos Sacerdotes e pelas práticas
ritualísticas do Torah e dos sacrifícios.

Fig. 1:- Mapa da Antiga Galiléia.

Nesse modo de conduzir a religiosidade dos judeus, havia duas maneiras de


interpretar as Leis Mosaicas, uma mais branda e outra, digamos, mais radical,
sendo que entre os dois extremos existiam inúmeras maneiras de interpretar a Lei,
as quais, por sua vez, geravam os debates nos salões do Grande Templo, local em
que aqueles que liam e depois estudavam os textos sagrados, teciam seus
comentários sobre eles e promoviam debates. Eles eram chamados pelos fariseus ou
doutores da Lei2de Rabis.

2
No tempo de Jesus havia duas tendências ou linhas de raciocínio e interpretação da Lei de Moisés. Estas eram
expressas pelas escolas rabinas dos grandes fariseus Hillel e Shammai. Na escola mais laxista, a de Hillel,
ensinava-se, por exemplo, que se podia divorciar da mulher por qualquer motivo, mesmo os mais banais. A
escola mais rigorosa, a do Shammai, só permitia o divórcio por motivos muito sérios. Por isso, em Mateus a
pergunta se define melhor: “É permitido ao homem divorciar-se de sua mulher por qualquer motivo?” (Mt.
Material apenas para estudo e reflexão. 2
Proibida a reprodução total ou parcial sem a autorização escrita do autor
Centro de Cura Espiritual e Cromoterapia
Artigo originalmente publicado na Revista Caducel no. 1 em março de 2007

Os primeiros apóstolos de Mestre Jesus, comandados por Simão Pedro,


também conhecido como Cefas, séculos depois ficaram conhecidos como
“jerosolomitanos”, ou apóstolos de Jerusalém, e tinham como característica serem
espectadores dos debates no Grande Templo. De modo geral, eram seguidores dos
ensinamentos dos rabinos, mas não faziam parte dos debates, com a exceção de
Jesus. Como “seguidores” da Lei, não tinham como norma, fazer críticas a respeito
do que era debatido, ou seja, de modo comum, simplesmente aceitavam ou não as
interpretações da Lei.
Resumindo, os Jerosolomitanos eram pessoas simples, sem grande
conhecimento intelectual, ainda que pessoas hábeis em suas profissões.
Certamente eram, porém, pessoas comuns, do povo.
Existiu também, por outro lado, um outro movimento, tão fiel a Mestre Jesus
quanto o primeiro. Ele foi chamado de Helenista (Atos 9:29), e era comandado, por
assim dizer, por Estevão (Atos 6:5), sendo composto por judeus de formação
cultural grega ou helênica (portanto, falavam, liam e escreviam em grego) e que por
diversas razões haviam retornado à Palestina. Eram originários das colônias do
período da dispersão (diáspora). O que os diferenciava brutalmente dos
Jerosolomitanos era o fato de seu nível cultural ser muito elevado, visto que o
helenismo primava pela cultura das tradições e ensinamentos Aristotélicos. Deste
modo, eles criticavam muito o “simplismo” dos apóstolos originais (Atos 6:1-4),
taxando-os de despreparados e incompetentes, já que lhes faltava “discernimento”
para discutir as questões religiosas.
O próprio Pedro os chamou de arruaceiros ou desordeiros, já que os
Helenistas organizavam grandes e tumultuadas manifestações. É claro, não tardou
serem expulsos da cidade... No seu êxodo, refugiaram-se segundo a história, na
Samária (que foi inclusive a antiga capital do reino de Israel, depois destruída pelos
Assírios em 721 a.C. pelo rei Sargão II) e de lá foram se espalhando gradualmente
por Chipre, Fenícia, Síria, tendo daí conseguido um bom número de seguidores
principalmente em Damasco.
O fato interessante entre os Helenistas, é que seu líder maior Estevão, acabou
sendo morto pela revolta dos próprios judeus entre 31 e 33 d.C., justamente em
função de seus ataques contra o Grande Templo (Atos 7:58), e paradoxalmente a
Igreja católica o considera-o o seu primeiro mártir, ou melhor o primeiro mártir do
cristianismo3. Ora este fato pode ser considerado como um contra-senso, pois os
Helenistas não consideravam os Jerosolomitanos como apóstolos autênticos dos
ensinamentos de Jesus. Os helenistas diziam que sua maneira de pregar ou ensinar
estes ensinamentos padeciam da deficiente formação por parte de seus ensinantes.
E é aqui justamente que a história começa a ficar interessante.
Entre os judeus que martirizaram Estevão, encontrava-se um cidadão
especial de nome Saulo (Atos 7:58). Alguns registros históricos apontam que ele era
natural da cidade de Tarso, na Sicília. São Gerônimo no século IV, no entanto,
aponta que Saulo seria natural de Giscala, na Judéia, onde teria sido deportado

19,4). De qualquer modo, para um melhor entendimento, os Jerosolimitanos eram sectários da linha de
Shammai, enquanto os helenistas por vezes interpretavam como mais correta a linha de Hillel.( M.R.)
3
Alega-se que os helenistas, manipularam sem a permissão os óleos sagrados do Grande Templo, onde o texto
original do Talmud diz que “eles profanaram...” indicando que foi proposital. Para mais informações vide
http://www.chabad.org.br/datas/chanuca/cha016.html
Material apenas para estudo e reflexão. 3
Proibida a reprodução total ou parcial sem a autorização escrita do autor
Centro de Cura Espiritual e Cromoterapia
Artigo originalmente publicado na Revista Caducel no. 1 em março de 2007

pelos romanos para Tarso, junto com seus pais.4 Os evangelhos porém dizem, que
Saulo ou Paulo, era cidadão romano de nascimento (Atos 22:29), porém judeu da
tribo de Benjamim (Filipenses 3:5), tendo sido doutrinado no judaísmo na sua
juventude por um velho e grande doutor da Lei Mosaica (fariseu) de nome Gamaliel,
que pertencia a escola laxista de Hillel, o primeiro membro do Sinédrio a ter o título
de “Rabban” (Atos 5:34 e 22:3).
Saulo e depois Paulo, foi um “caçador” de cristãos (Atos 8:3, 9:1 e 22:4) nos
tempos do imperador Décio. Um dia, porém, Paulo foi a Jerusalém, solicitar junto
ao Sumo Sacerdote de Jerusalém, cartas para as Sinagogas de Damasco com a
intenção de continuar a prender cristãos judeus (Atos 9:2). O que se segue já é
conhecido por todos, embora existam três versões para o mesmo acontecimento
histórico como veremos a seguir. Na primeira versão encontrada em Atos dos
Apóstolos (Atos 9:3-19), Paulo relata que próximo a Damasco, surge uma luz a sua
frente que o envolve e o joga ao chão. Caído ele ouve uma voz que lhe pergunta:
“Saulo, Saulo, porque me persegues?” No que ele pergunta: “Quem és senhor?”
Tendo como resposta: ”Eu sou Jesus, a quem estás perseguindo. Mas, levanta-te
entra na cidade e te dirão o que fazer...” . Saulo neste momento está cego, os seus
acompanhantes, porém, apesar de terem ouvido a voz, não viram a ninguém mais.
Segundo a narrativa, Saulo foi conduzido até a cidade, como foi dito, cego,
permanecendo assim sem comer ou beber durante três dias. Nesta versão, Ananias
é enviado por uma aparição de Jesus, o qual o instrui a como chegar até Saulo na
casa de Judas.
Numa segunda versão, também encontrada em Ato dos Apóstolos (22:6-16), a
narrativa tem diferenças, pois nela Saulo afirma que era por volta de meio dia,
quando aparece uma luz que vem do céu e o envolve, existindo o mesmo diálogo
acima, porém com a diferença de que na identificação ele escuta: “Eu sou Jesus, o
nazareu, a quem tu estás perseguindo.” Neste relato, os que estavam com Saulo,
viram a luz, mas não escutaram nada, o restante com relação a Ananias se repete.
Já na terceira versão (Atos 26:12-18), Saulo afirma que, por volta do meio dia,
observava uma luz vinda do céu, e nela está Jesus, porém o interessante é que a luz
envolve também seus acompanhantes fazendo-os cair ao chão. A voz então fala a
Saulo em língua hebraica dizendo: “Saulo, Saulo, porque me persegues? No que ele
pergunta, igualmente quem era: “ Eu sou Jesus, a quem tu estás perseguindo. Mas,
levanta-te e fica firme em pé, porque este é o motivo por que apareci. Para constituir-te
servo e testemunha da visão na qual me viste e daquelas nas quais ainda te
aparecerei. Eu te livrarei do povo e das nações gentias, os quais te envio para lhes
abrires os olhos e assim se converterem das trevas para a luz, e da autoridade de
Deus para Satanás. De tal modo receberão, pela fé em mim, a remissão dos pecados
e a herança entre os santificados.”
Realmente impressionante! Não há outro modo de descrever as narrativas
evangélicas, que do mesmo fato criaram três versões que se contradizem desde
banalidades até a profundidade da mensagem do texto de Jesus em relação ao
converso Paulo. Esclareça-se, todavia, que a narrativa do fato é atribuída a Lucas,
já que foi quem escreveu as três versões no primeiro evangelho. E Lucas, foi
discípulo de Paulo.

4
Cf. Gerônimo, Comentários sobre a Epístola aos Filipenses, XXIII- M.LXXVI. 617-643 e cf. Fócio, Ad
amphilocium, CXVI. - N.A.
Material apenas para estudo e reflexão. 4
Proibida a reprodução total ou parcial sem a autorização escrita do autor
Centro de Cura Espiritual e Cromoterapia
Artigo originalmente publicado na Revista Caducel no. 1 em março de 2007

- detalhe de capa de "Paulo e Estevão", psicografia de Chico Xavier, editora Feb. fig.
2. Apedrejamento de Estevão

O que nos revela de interessante


também, é que pelo fato de Paulo nunca ter
conhecido Jesus “pessoalmente”, ele não
pode ter o conhecimento das mensagens de
Jesus através Dele diretamente. Isto
significa então que possivelmente ele foi
catequizado por Ananias em Damasco. E
Ananias era cristão helenista. Esses fatos
formam base para afirmarmos que a
formação grega de Paulo, lhes permitiu
assimilar o pensamento helenista
incorporando-o ao conceito do Cristo ao
nome de Jesus. Reforça esta tese o fato de
sabermos que o conceito “Cristo” vem da
palavra grega “Chrestos” que significa
“ungido” ou “purificado”. Este conceito foi
utilizado por Ésquilo e Heródoto no século
V a.C. em uma modalidade esotérica da
mitologia grega.
Deste modo surgiu o nome “Jesus Cristo”, algo totalmente fora do contexto
judeu, pois os apóstolos chamavam Jesus de “Rabi” (João 1:38 e 9:1 e Mateus
26:25), que significa “Mestre” ou na pessoalidade “Meu mestre” e pelo fato de a idéia
de “Cristo” pertencer a mitologia grega, como dissemos afastava-o completamente
da tradição judaica, ao menos na visão do que ou quem era Jesus.
Sob os argumentos da terceira versão da visão de Paulo, ele saiu para
catequizar os Gentios (Gál.2:7-9). Isto é uma completa descaracterização do
princípio da menção feita por Jesus (Mt. 10:5-8) que desconsiderava a possibilidade
dos Gentios participarem do Evangelho (Boa Nova), então aí já encontramos uma
contradição no próprio evangelho.
A confusão se mostra novamente e se confirma, quando vemos também nos
relatos, que Pedro (Jerosolomitano) converte alguns Gentios em um discurso na
casa de Cornélio, mais precisamente um centurião romano da corte itálica (Atos
10:48). Porém, fica muito suspeita esta passagem já que os Atos dos Apóstolos foi
como dissemos, escrito por Lucas, que como sabemos foi discípulo de Paulo. Será
que os textos foram então manipulados por Lucas com a intenção de amenizar as
tensões entre os Jerosolomitanos e os Paulíneos?
Outro fato importante também é que nos primeiros anos do cristianismo
primitivo, os apóstolos originais pouco ou quase nada se afastaram da Palestina, já
que estes consideravam que a palavra de Jesus não poderia ou deveria sair do
território Palestino, ou estender-se fora dos limites judaicos.
Concluindo então esta primeira parte, vemos sim, que no século I d.C., as
palavras de Jesus, já haviam desencadeado três poderosas frentes de interpretação.
A primeira seria a dos Jerosolomitanos, que fundamentavam o cristianismo no
judaísmo (embasado portanto, na tradição judaica das Leis de Moisés, tendo

Material apenas para estudo e reflexão. 5


Proibida a reprodução total ou parcial sem a autorização escrita do autor
Centro de Cura Espiritual e Cromoterapia
Artigo originalmente publicado na Revista Caducel no. 1 em março de 2007

inclusive na circuncisão, o símbolo de aliança com Deus), e tinha como seus


principais elementos de difusão Pedro, João e depois em Tiago, irmão de Jesus;
Aqui cabe um complemento de informação, além de Jesus ser chamado de
Rabi (o Mestre), neste conceito, os seus seguidores, eram chamados de Nazoreanos
ou Nazarenos. Neste quadro, Ele era conhecido como o profeta oriundo de Deus,
identificado como o Messias, anunciado por Elias, e instituía a reflexão e o
conservadorismo das tradições, onde o pacifismo era o conceito principal,
secundado pelo respeito às Leis e Escrituras Judaicas.
Praticamente na mesma época, surgiu uma segunda linha, a dos helenistas
judeus, que mesmo após a morte de Estevão, encontrou em Felipe um difundidor
deste mecanismo de interpretação de Sua palavra.
A característica deste movimento era principalmente a língua, no caso a
língua grega, já que a maioria destes judeus vinha daquela parte do mundo antigo.
Em comum tinham o fato da alta erudição (que se traduzia em uma visão religiosa
intelectualizada), formada em valores Aristotélicos e Néo-platônicos (com vertentes
herméticas na forma filosófica), mesclada com conhecimentos que teriam se
originado no antigo Egito.
Isto os arremetia diretamente contra o poder político e religioso dos judeus da
época, já que os consideravam ultrapassado, arcaico e despreparado de
conhecimentos que lhes desse sustentação. Ou seja, o judaísmo era visto pelos
helenistas como desprovido da razão ou lógica, onde os suposto aparatos das leis
mosaicas teriam sim, que ser revistos sob uma ótica de novos conhecimentos
filosóficos já existentes, os quais deveriam se somar às antigas tradições.
Estes fatores levaram os helenistas judeus a agir por vezes com extremos de
violência em alguns casos no Grande Templo (atitude inaceitável dado o cunho
sagrado deste local para os judeus).
Eles viram em Jesus, a possibilidade de uma nova ordem religiosa, inclusive
reformista e superior ao próprio judaísmo, já que esta possibilitava levar a
mensagem de Jesus a todos sem exceção e não apenas aos doutos, sem se importar
com as conseqüências. Melhor dizendo, era algo que podia ser aberto a todos, já que
o ser cristão representava uma nova religião, com uma nova e renovada forma de
percepção de Deus e de seus objetivos para com o homem, portanto era irrelevante
o fato de ser judeu ou não para se aderir a ela. Isto no modo de pensar deles
tornava o Cristianismo superior e independente da religião judaica, assim como
qualquer outra vertente do judaísmo existente. Por fim uma terceira vertente cristã
desabrochava forte e poderosa. A do Gentio Paulo de Tarso. Nascendo originalmente
sob a esfera de influência dos Helenistas, entraria em confronto quase mortal com
os mesmos a ponto de Paulo ter sua vida ameaçada justamente pelas diferenças e
desentendimentos (Atos 9:29), inclusive foi este o motivo que o obrigou a fugir da
Palestina.
O que se estuda nos textos é que no final das contas, Paulo abriu de vez toda
a filosofia do cristianismo para uma série de ordenamentos filosóficos, herméticos,
religiosos e doutrinários, fundindo-os aos preceitos do cristianismo. Certamente
nem mesmo o mais liberal dos helenistas, imaginaria o “vôo” que Paulo daria
distanciando-o tanto (o cristianismo) dos dogmas e preceitos judaicos para criar os
dogmas do cristianismo atual.
Um outro fator histórico importante foi a não aceitação inicial de Paulo entre
os Jerosolomitanos, que inclusive questionavam a forma como Paulo realizava a
conversão dos Gentios para o cristianismo (Atos 21:17-25).
Material apenas para estudo e reflexão. 6
Proibida a reprodução total ou parcial sem a autorização escrita do autor
Centro de Cura Espiritual e Cromoterapia
Artigo originalmente publicado na Revista Caducel no. 1 em março de 2007

O Avanço do cristianismo entre os Gentios

Um fato muito importante para o cristianismo, é que a expulsão dos


helenistas de Jerusalém provocou uma rápida expansão de sua influência por
diversas regiões da Palestina (Samária, Galiléia, Síria, Fenícia e Chipre), ou seja,
expandiu-se para onde se rejeitava a linha dos jerosolomitanos.
Mesmo havendo divergências é evidente que houve intercâmbios de ordem
política e filosófica entre os helenistas e jerosolomitanos quando estes debatiam
sobre a interpretação das Leis Mosaicas e suas novas relações com o cristianismo.
Isto se demonstra claramente, no fato de que durante a perseguição dos cristãos
pelos romanos, em que houve a morte das principais cabeças judaico/helenistas
durante os primeiros anos existência cristianista, já que esta ocorrência possibilitou
uma reversão de valores e ensinamentos no cristianismo helênico, pois permitiu que
a partir daí, os jerosolomitanos em alguns aspectos pudessem exercer uma notória
influência filosófica e religiosa, nos novos membros das igrejas, dado o status do
contato “direto” que tiveram com Jesus. Isto porém, segundo alguns historiadores,
escondia por parte dos helênicos, uma utilização mútua dada as necessidades de
sobrevivência do próprio cristianismo.
Ainda assim, o avanço dos helenistas foi notório tanto entre os judeus como
entre os gentios. Este fato apesar de incomodar bastante os apóstolos iniciais,
incitou-lhes a aceitar esta nova realidade. A prova disto está como dissemos acima,
na conversão do centurião Cornélio, que inicialmente foi estimulado ao cristianismo
pelos helenistas, mas depois foi confirmado por Pedro (Atos 10:1).
Neste momento histórico, a Antióquia tornou-se um centro helenista de
difusão do cristianismo, fundamentalmente composto por uma grande colônia
judaico-cristã mesclada com muitos elementos Gentios.
Dez anos mais tarde, Paulo chegou a Antióquia, após breve estada de três ou
quatro anos na Palestina (obviamente depois de sua conversão em Damasco).
Cumpre destacar também, um outro personagem cristão, de nome Barnabé.
Ele foi uma figura muito importante dentro do quadro cristianista da Antióquia.
Inseguro, entretanto, quanto a condução da transmissão da “boa-nova”, ele
justamente procurou Paulo para “ajeitar as coisas”, uma vez que a comunidade
local estava repleta de Gentios e estes estavam insatisfeitos (na verdade ao que
parece, a insatisfação era mútua) com os jerosolomitanos, já que os Gentios se
recusavam a circuncisão.
Em 44 d.C., Paulo e Barnabé, à margem dos jerosolomitanos, converteram
um grande número de Gentios sem passar pelo judaísmo nem pela circuncisão.
Estava deste modo iniciada a nova modalidade do cristianismo, separada a
partir deste momento, definitivamente do judaísmo, helenista e jerosolomitano.
Houve naquele momento sem dúvidas, uma “paulinização”, por assim dizer do
cristianismo.
Evidentemente o processo desta transição não foi tão tranqüilo como o relato
parece ser. Esclareça-se, entretanto, que esta nova ação da cristandade, iniciada na
igreja de Antióquia (sem a passagem pelo judaísmo), ocorreu depois também em
Chipre, Panfilia e Anatólia Central, todas com grande êxito (Atos 13). Este
rompimento aberto com os helenistas e jerosolomitanos, gerou imediatamente por
Material apenas para estudo e reflexão. 7
Proibida a reprodução total ou parcial sem a autorização escrita do autor
Centro de Cura Espiritual e Cromoterapia
Artigo originalmente publicado na Revista Caducel no. 1 em março de 2007

parte de Pedro e Tiago, o envio dos apóstolos Judas e Silas até a Antióquia (Atos
15:22-35), os quais tinham a missão clara de resgatar, o que se chamou de “pureza
espiritual”, dentro do conteúdo evangélico, de não mudanças das leis e dos profetas,
que eram atribuídas ou foram determinadas por Jesus, e segundo a visão dos
apóstolos, estava claramente sendo deturpado por Paulo e Barnabé.
Barnabé neste momento tornou-se inseguro com relação aos rumos que a
igreja estava tomando, então, discordando de Paulo, retomou a linha helenista,
gerando uma disputa litigiosa que culminou na separação de ambos. A partir daí,
Barnabé continuou sua peregrinação com Marcos, indo para Chipre e Paulo com
Silas segue rumo a Síria, Sicília, Derbe e Listra.
Durante mais de dez anos (de 48 a 58 d.C) Paulo pregou o Evangelho por
quase todas as cidades do mar Egeu, impondo sua autoridade aos diversos
colaboradores que nomeou, nas diversas comunidades que formou junto ao
cristianismo primitivo.
Paulo, neste processo de instauração do cristianismo, enfrentou acirradas
disputas com autoridades dos lugares onde passou. Fossem elas políticas, religiosas
ou romanas. Paulo tem ainda o mérito de ter conseguido ao fundar as comunidades
por onde passou, de ter constituído igrejas que permaneceram em franco processo
de desenvolvimento, muito maiores que os helenistas e jerosolomitanos, uma vez
que os supervisores daquelas igrejas davam continuidade ao seu trabalho, mesmo
depois da sua morte, graças aos seus inúmeros inscritos.
Ressalte-se ainda, que estas comunidades, não eram somente constituídas de
Gentios, mas também de inúmeros judeus, que adentravam na “boa nova” do reino
de Deus, que se interessavam pelas palavras de Jesus mas não necessariamente
pelo conteúdo total das Leis de Moisés. Aconteceu naquele período do primeiro
século, nas novas igrejas, o nascimento de uma nova forma da mensagem de Jesus
chegar às pessoas, o que chamaríamos de “cristianismo de Paulo”, onde uma parte
do helenismo remanescente do período clássico, junto com algumas tradições
jerosolomitanas e somados ao personalismo indiscutível de Paulo foram tomando
conta do mundo gentio e judaico (além de outros) daquela época.
Enquanto Paulo fazia sua peregrinação pelas cidades gregas, muitos
supunham que Pedro que havia desaparecido de Jerusalém, se encontrava em
Roma desde 44 d.C. (em virtude da perseguição por Heródes Agripa), ficando lá até
67 d.C. Neste período foi auxiliado por Lino e ali escreveu duas Epístolas.
Estas informações são contestadas por aqueles que desacreditam que Pedro
foi o bispo de Roma já que sabemos por Irineu, um dos mais importantes bispos do
Catolicismo atual (e porque não dizer do próprio cristianismo) que a realidade pode
não ser bem esta.
Irineu deixou entre outros registros históricos, uma descrição de uma linha
genealógica, em sua Oração Eucarística constando ali todos os bispos de Roma até o
vigésimo e afirmou nela que Lino teria sido o primeiro e não Pedro. Supostamente a
razão de Pedro ter viajado à Roma era pelo fato de haver uma tentativa sua de
reorganizar o cristianismo jerosolomitano da comunidade judaico-romana,
evangelizada e dominada pela influência de Paulo. Porém não existem referências
históricas de quando isto teria realmente ocorrido, visto que em Atos dos Apóstolos
12:17, após sua prisão e miraculosa libertação da prisão de Heródes Agripa, Pedro
não é mais mencionado e muitas vezes até, sendo substituído por Paulo no
destaque principal de muitos acontecimentos.

Material apenas para estudo e reflexão. 8


Proibida a reprodução total ou parcial sem a autorização escrita do autor
Centro de Cura Espiritual e Cromoterapia
Artigo originalmente publicado na Revista Caducel no. 1 em março de 2007

Além disso, Paulo escreveu no ano 58 a famosa Carta aos Romanos, na qual
saudava famílias inteiras mencionando especificamente 29 pessoas e nenhuma
delas era Pedro. Porque omitiria então o nome de Pedro senão pelo fato dele não
estar lá? Fato este que entre outras controvérsias, alega-se que as referidas
Epístolas atribuídas a ele, na realidade foram então escritas pelo apóstolo Silvano,
que era seguidor de Paulo.
Até hoje se questiona se é verdadeira a afirmação de que Pedro viveu 25 anos
em Roma. Em termos de provas documentais isto inexiste.
Pode-se, no entanto, afirmar, a sua permanência naquela cidade por no
máximo quatro anos até a sua morte.

Conclusões

Enganam-se aqueles pensam que de modo simplista podemos questionar o


cristianismo em virtude da aparição de Paulo. Provavelmente se não fosse Paulo,
nem ao menos existiria o cristianismo, seja primeiramente na forma Católica e
depois na forma ortodoxa e depois em suas inúmeras vertentes, as chamadas
formas religiosas cristãs.
Paulo, inegavelmente foi um desbravador. O modo simplista de analisar sem
um exame acurado de documentos, nos conduz tão somente a pensar como homens
desta época (vide Franz Overbeck). Ledo engano. Devemos quando vamos estudar
Paulo, primeiramente entendê-lo como homem do seu tempo, regido e submetido a
leis que para nós hoje em dia não tem o mesmo sentido que possuíam naquela
época.
Roma era a força ou o poder dominante e por conseqüência as leis romanas
eram soberanas no império, ainda que leis tidas como “menores” também fossem
postas em prática, como por exemplo, as leis do Sinédrio já que valia para as áreas
de influência do judaísmo. Se levarmos em conta o fato de que os judeus e o
judaísmo eram muito mal vistos, não só pelos romanos, mas por outros povos
também5, entenderemos que ficaria difícil para os desígnios divinos (aí pensando
como espírita/espiritualista ou mesmo como um simples religioso que acredita que
a “mão de Deus” se encontra em tudo o que se refere ao homem) que permite ao
homem da Terra, entre outras coisas, através do livre arbítrio, escolher a sua
expressão ou forma de veneração religiosa, encontrar na palavra de Jesus, a
chamada “Verdade” que Ele veio trazer.
Pelo próprio “ranço” e estigma existente quanto aos judeus e pelo próprio
judaísmo, seria improvável que a mensagem Dele – Jesus - “vingasse” através dos
tempos. Aliás, seria pouco provável que os romanos aceitassem nos séculos futuros
esta mesma palavra (a Boa-nova), se ela fosse trazida somente pelos judeus, fosse
jerosolomitanos ou helenistas.

5
Os judeus estiveram em guerra e foram escravizados em diversos períodos da sua história. Fosse pelos
Egípcios, Babilônicos ou mesmo com relação aos Romanos eram considerados como um povo problemático
ainda que esta visão, deva ser vista como unilateral por parte daqueles dominadores. De fato foram vistos por
aqueles, como um povo sem cultura, toscos, fanáticos, indisciplinados e por vezes pretensiosos quando aludiam
ao Deus único – cultuado pelos judeus - como o maior e mais poderoso de todos, isto sem contar que se
autodenominavam “escolhidos por Ele”. N.A.
Material apenas para estudo e reflexão. 9
Proibida a reprodução total ou parcial sem a autorização escrita do autor
Centro de Cura Espiritual e Cromoterapia
Artigo originalmente publicado na Revista Caducel no. 1 em março de 2007

Portanto, se houve uma “pré-intenção divina” na escolha de Paulo, para se


levar o evangelho aos Gentios e de lá espalhá-lo ao mundo, por certo esta escolha
houve porque ficaria muito mais fácil dele ser aceito como de fato o foi.
Quando esta palavra veio através de um judeu sim, mas cidadão romano, de
cultura grega, portanto, tido como um erudito, ou ao menos “diferenciado” e
julgando-se com “sabedoria” muito além do que qualquer Fariseu ou mesmo outros
doutores da lei poderia sê-lo ou ao menos ser assim reconhecido pelos olhos
romanos, pode daí encontrar terreno fértil para sua propagação.
A tese nos leva a crer que Paulo claramente foi um missionário que veio a
Terra para dar continuidade a um plano divino previamente existente. Este plano
seria algo assim como o descrito pela doutrina Kardecista6 e chamado de Sistema
Crístico e que também é descrito por este nome na Doutrina sincrética do “Vale do
Amanhecer”7, estando também parcialmente assim colocado ou ao menos assim
podendo ser interpretado na profecia bíblica – e aqui falando sobre Jesus - sobre a
promessa feita por Deus, da vinda do “Messias”, para a libertação do homem.
Paulo exerceu um papel que se certamente não foi mais importante que o de
Pedro, com certeza complementou o necessário para a sobrevivência e propagação
do cristianismo.
Sem dúvidas, Pedro teve e tem um papel importante e simbólico dentro da
representação Cristã. A imagem da simplicidade de Jesus expressa na figura do
pescador, neste caso o pescador de almas.
Contemporâneo de Jesus que foi sem dúvidas Pedro foi o maior dos
Jerosolomitanos, importante para se manter a imagem de uma tradição entre os
seus contemporâneos judeus, desde o nascimento do cristianismo, e mesmo após a
fúria de Vespasiano em 69 d.C. e a nova dispersão dos Hebreus. Mas,
convenhamos, os judeus ao que pese a autodenominação de “povo escolhido de
Deus”, nunca foi o povo mais importante do planeta, ao menos visto sobre uma
ótica simples e humana embasadas nos cinco sentidos e, é claro se considerarmos
uma igualdade de tratamento divino que deveria haver por parte de Deus junto às
Suas outras criaturas humanas, ou seja, de amor por todos os seres humanos que
todos acreditamos ser dádiva e característica Dele.
Finalizando pelos argumentos colocados, defendemos a tese de que o
cristianismo provavelmente se perderia no tempo correndo sério risco de extinguir,
ainda que a mensagem de Jesus seja a do Salvador, a do Messias prometido, ou do
filho de Deus, se não fosse a labuta do missionário Paulo de Tarso.

6
Vide Allan Kardec, “o Evangelho segundo o espiritismo”.
7
Vide Mário Sassi, “2000 conjunção de dois planos” e “Sob os olhos da Clarividente” e ainda no “limiar do
3O milênio”.
Material apenas para estudo e reflexão. 10
Proibida a reprodução total ou parcial sem a autorização escrita do autor
Centro de Cura Espiritual e Cromoterapia
Artigo originalmente publicado na Revista Caducel no. 1 em março de 2007

B
Biibblliiooggrraaffiiaa
- AQUINO, São Thomaz, Comentários sobre a Epístola aos Filipenses,
http://www.accio.com.br/Nazare/1946/tom-paul.htm.
- A vida do Apóstolo Paulo de Tarso – artigo publicado
http://www.espiritismo.org/paulode.htm
- DAVIS, John, Dicionário Bíblico, http://www.novavoz.org.br/paulo.htm
- KARDEC, Allan. - O Evangelho Segundo o Espiritismo – ED. FEB.
- MORAIS, Vamberto, O mistério de Jesus, Ibrasa, São Paulo. 1990
- RUBIN Y., O toque Grego,
http://www.chabad.org.br/datas/chanuca/cha016.html
- XAVIER, Chico Paulo e Estevão", psicografia de, editora Feb.
- WEBSTER, William, O Cânon judaico e os apócrifos, http://www.cacp.org.br/cat-
canon-judeu.htm
- WELLS C.R.P. Um Extraterrestre na Galiléia, ED. Madras, São Paulo. 1999
- O Evangelho segundo Lucas.

Material apenas para estudo e reflexão. 11


Proibida a reprodução total ou parcial sem a autorização escrita do autor

Você também pode gostar