1) O documento discute as raízes judaicas de Jesus e sua relação com os fariseus. 2) Apesar de cristãos comumente verem os fariseus de forma negativa, eles eram respeitados no primeiro século por sua piedade e zelo pela Torá. 3) O documento argumenta que os ensinamentos de Jesus eram compatíveis com as doutrinas dos fariseus.
1) O documento discute as raízes judaicas de Jesus e sua relação com os fariseus. 2) Apesar de cristãos comumente verem os fariseus de forma negativa, eles eram respeitados no primeiro século por sua piedade e zelo pela Torá. 3) O documento argumenta que os ensinamentos de Jesus eram compatíveis com as doutrinas dos fariseus.
1) O documento discute as raízes judaicas de Jesus e sua relação com os fariseus. 2) Apesar de cristãos comumente verem os fariseus de forma negativa, eles eram respeitados no primeiro século por sua piedade e zelo pela Torá. 3) O documento argumenta que os ensinamentos de Jesus eram compatíveis com as doutrinas dos fariseus.
Escreveu William Manson: “Acostumamo-nos de tal forma, e com razão, a fazer de Jesus objeto de religião, que acabamos por esquecer que, em nossos registros mais antigos, ele é apresentado não como objeto de religião, mas como homem religioso. ” (The Teaching of Jesus, 1935, página 101). A advertência do preclaro estudioso é importante porque ressalta que Yeshua era um homem religioso. Então, qual era a religião de Yeshua? Era Yeshua cristão? Em estudos anteriores, demonstrou-se que Yeshua não veio criar uma nova religião. Logo, Yeshua nunca foi cristão. A uma, porque o Cristianismo surgiu em momento bem posterior à sua morte. A duas, porque nas Escrituras não há um texto sequer em que Yeshua recomenda a criação de uma nova religião. A três, porque a B’rit Chadashá é de clareza solar ao apontar quais eram as práticas religiosas de Yeshua e de seus talmidim. Enquanto homem, Yeshua viveu plenamente o Judaísmo e pautou toda a sua vida por meio da prática desta religião. Insta frisar: Yeshua não era cristão, mas sim um judeu zeloso da Torá e o maior rabino que o Judaísmo conheceu. À luz das bessorot (boas novas ou “evangelhos”) não há dúvidas de que Yeshua foi um mestre do Judaísmo, razão pela qual era chamado de rabi: “E Yeshua, voltando- se e vendo que eles o seguiam, disse-lhes: Que buscais? E eles disseram: Rabi, onde moras?” (Yochanan/João 1:3) “Natan’el respondeu, e disse-lhe: Rabi, tu és o Filho de Elohim; tu és o Rei de Yisra’el.” (Yochanan/João 1:49). “E, respondendo Yehudá, o que o traía, disse: Porventura sou eu, Rabi? Ele disse: Tu o disseste.” (Matityahu/Mateus 26:25) No primeiro século já sabemos que existiam três grandes grupos dentro do Judaísmo:
● 1) os p’rushim (fariseus); ● 2) os ts’dukim (saduceus) e ● 3) os isiyim (essênios).
Apesar de diversos outros setores do Judaísmo se fazerem
presentes, os três citados formavam os principais blocos da religião judaica. O pensamento do rabino Yeshua possui fortíssimas bases nas doutrinas dos p’rushim (fariseus) e dos isiyim (essênios). Neste capítulo, estudar-se-ão apenas as raízes farisaicas do pensamento de Yeshua, deixando- se para outro momento a análise dos aspectos essênios de suas doutrinas. Cristãos desavisados poderão se surpreender com este estudo, porque estão acostumados a pensar incorretamente que Yeshua era “inimigo dos fariseus”. Em verdade, os ensinos do Mashiach são compatíveis com as concepções farisaicas e o entrelaçamento entre ambos é tão profundo que alguns estudiosos afirmam categoricamente que “Yeshua foi fariseu”. Particularmente, pensamos que as doutrinas de Yeshua possuem tanto elo com o farisaísmo quanto com o essenismo, além de diversos elementos particulares, de modo que o Judaísmo por ele ensinado é singular. Por tal motivo e até em função da omissão dos evangelhos quanto ao tema, preferimos não rotular Yeshua como fariseu ou como essênio. Contudo, há conexões entre o magistério de Yeshua e o dos fariseus. Tal afirmativa parece insana aos indoutos cristãos, que desconhecem o significado da palavra parush (fariseu), bem como a crença desta facção do Judaísmo. No âmbito do Cristianismo, acostumou-se a achar que o vocábulo “fariseu” tem um sentido pejorativo, e é esta falsa ideia que está entranhada na mente das pessoas, como se observa no Dicionário Houaiss: “Fariseu. Adjetivo e substantivo masculino. 1. relativo a ou membro de grupo religioso judaico, surgido no século II A.C., que vivia na estrita observância das escrituras religiosas e da tradição oral; o grupo foi acusado de formalista e hipócrita pelos Evangelhos; 2. que ou aquele que segue de maneira formalista uma religião; 2.1. que ou aquele que, por observar fielmente um dogma ou rito, se acredita dono da verdade e da perfeição, achando-se no direito de julgar e condenar a conduta de outrem a pretexto de dar ajuda; 3. que ou aquele que ostenta piedade e virtude sem tê-las; 4. Derivação: sentido figurado. Que ou quem é orgulhoso e hipócrita.” Eis o conceito de “rabi”, conforme a lição da Jewish Enciclopédia: “Termo hebraico usado como título para aqueles que são distinguidos para o ensino, que são autoridades, professores da Torá, e apontados como chefes espirituais da comunidade. É derivado do substantivo br, que em hebraico bíblico significa ‘grande’.” (vocábulo “Rabbi”, Jewish Encyclopedia). Então, se chamavam Yeshua de rabi, significa que era Professor da Torá, ou seja, rabino. Yeshua viveu como rabino, porque: 1) ensinava a Torá (Matityahu/Mateus 5:17-19); 2) venceu a tentação no deserto citando três vezes a Torá (Matityahu/Mateus 4:1-10; compare com Devarim/Deuteronômio 8:3; 6:16 e 6:13); 3) disse que nunca conheceu aqueles que transgridem a Torá (“praticantes da iniquidade”) (Matityahu/Mateus 7:23); 4) pregou a teshuvá (retorno à Torá do ETERNO, “arrependimento”) (Matityahu/Mateus 4:17); 5) dirigia-se à sinagoga nos shabatot (sábados) para o estudo da Torá e dos Profetas (Lucas 4:16); 6) disse ao jovem rico que este deveria obedecer às mitsvot (mandamentos) da Torá para alcançar a vida eterna (Matityahu/Mateus 19:16-17); 7) lecionou os grandes princípios da Torá no “Sermão da Montanha” (Matityahu/Mateus 5 a 7); 8) citou o “Shemá” como a mitsvá (mandamento) mais importante, ao lado da mitsvá de amar o próximo como a si mesmo (Yochanan Marcus/Marcos 12:28-31; Devarim/Deuteronômio 6:4-5 e Vayikrá/Levítico 19:18); 9) vestia-se como judeu zeloso, usando tsitsiot (Matityahu/Mateus 9:20 e Bemidbar/Números 15:37-41); 10) como autêntico israelita, além de ser circuncidado no coração, também foi circuncidado na carne (Lucas 2:21); Partindo-se da premissa irrefutável de que Yeshua era um rabino, qual seria a seita ou as seitas do Judaísmo que compunham a base de seus ensinamentos? O Dicionário Houaiss tece um quadro negativo acerca dos fariseus, expressando a mentalidade popular de que “os fariseus foram religiosos hipócritas”. Não obstante, tal pensamento está totalmente equivocado, quando se analisa o significado histórico da palavra à luz do pensamento semita do primeiro século. Na época de Yeshua, os p’rushim (fariseus) eram respeitados e tidos em alta conta pela população de Yehudá (Judeia), ou seja, o parush (fariseu) era visto como homem piedoso, temente a Elohim e zeloso observador da Torá. Cita-se, por oportuno, o testemunho do historiador Flávio Josefo, que viveu nos tempos de Yeshua: “Assim, cidades inteiras dão testemunhos valiosos de sua virtude [do grupo dos fariseus], de sua maneira de viver e de seus discursos”. (História dos Hebreus, CPAD, 8ª edição, Página 830). “Quanto às duas primeiras seitas de que falamos, os fariseus são tidos como os mais perfeitos conhecedores de nossas leis e de nossas cerimônias. (...). Enquanto os fariseus são sociáveis e vivem em amizade uns com os outros, os saduceus são naturalmente rudes e vivem mesmo grosseiramente entre si, como se fossem estrangeiros.” (Ob. Cit. Página 1134). Por conseguinte, segundo o depoimento de Josefo, percebe-se que os p’rushim (fariseus) eram homens virtuosos e cumpridores da Torá, razão pela qual gozavam de prestígio perante a população. Entretanto, houve distorções e erros no farisaísmo que foram criticados por Yeshua, e isto não pode ser usado como argumento de que “todos os fariseus foram perversos”. Tal generalização é absurda. Seria o mesmo que chamar todos os brasileiros de idólatras pelo fato de grande parte da população do Brasil pertencer a religiões pagãs. Haverá a exposição, neste capítulo, da afinidade existente entre as lições de Yeshua e a doutrina dos fariseus, fato que foi constatado por inúmeros historiadores, inclusive o aquilatado Professor Geza Vermes, da Oxford University, ao tratar da mensagem de Yeshua: “Seja como for, poucos contestariam que a sua mensagem foi essencialmente judia ou que, no tocante a determinados tópicos controversos – por exemplo, sobre a ressurreição dos mortos -, ele [Yeshua] exprimia a opinião dos fariseus.” (Jesus e o Mundo do Judaísmo, Loyola, 1996, página 15). consulta-se o magistério de David Stern: “Na época de Yeshua existiam duas principais opiniões do que era a situação religiosa. Em 586 A.E.C [antes da era comum, ou seja, antes de Yeshua], a Babilônia conquistou a Judéia e Jerusalém, derrubou o Primeiro Templo, que o rei Salomão tinha construído, e deportou as classes governantes para a Babilônia. Com o Templo, os sacrifícios e os kohanim [sacerdotes] não funcionando mais, os judeus no exílio, e depois de seu retorno, 70 anos depois, buscaram outra forma de se organizar e pela qual pudessem centrar sua vida comunal. Eles a encontraram na Torá (a ‘Lei’, veja 5:17 N), como pode ser visto no relato sobre a leitura da Torá por Esdras (Neemias 8). Os antigos estudantes, desenvolvedores e mantenedores da Torá, parecem ter sido da casta sacerdotal hereditária – o próprio Esdras era um kohen [sacerdote] e um sofer (‘escriba’). Mas depois, na medida em que os kohanim [sacerdotes] voltaram a se preocupar com o sistema sacrificial como ele se desenvolveu no período Segundo Templo, um movimento que apoiava a Torá e favorecia sua adaptação às necessidades do povo surgiu e tornou-se um desafio para a autoridade dos kohanim [sacerdotes]. Os kohanim do século I E.C eram conhecidos como tz’dukim [saduceus], em homenagem ao kohen gadol [sumo sacerdote], apontado como pelo rei Salomão Tzadok (seu nome significa ‘justo’; comparece 6:1-4 & N; 13:17 & N). Nesse meio tempo, sob a autoridade dos Macabeus no século II A.E.C, aqueles cuja principal preocupação não eram os sacrifícios, porém a Torá, eram chamados de Hasidim [ou Chassidim] ... (...) Os sucessores dos Hasidim [ou Chassidim] eram conhecidos como p’rushim, que significa ‘separados’, porque eles se separavam do modo mundano para não fazer o mesmo que as pessoas faziam. Esses p’rushim não apenas assumiram que o Tanakh era a palavra de Deus para o homem, mas também consideravam que a tradição acumulada ao longo dos séculos pelos sábios e mestres era também a palavra de Deus – a Torá Oral – de modo que se desenvolveu um sistema de viver que tocava em cada aspecto da vida. Nos dias de Yeshua, os tz’dukim [saduceus] tendiam a ser mais ricos, mais céticos, mais carnais e cooperavam mais com os governantes romanos do que os p’rushim.” (Comentário Judaico do Novo Testamento, editora Atos, 2008, páginas 43 e 44). Tendo em vista que a corrupção política e sacerdotal havia se instalado, bem como que o ETERNO não mais estava a falar diretamente ao povo por meio de seus profetas e dos kohanim (sacerdotes), como o homem religioso poderia saber qual é a vontade de Elohim? Se não mais havia revelação direta, como consultar o ETERNO? Entendiam os p’rushim (fariseus) que a vontade do ETERNO já estava revelada em suas Escrituras (o Tanach) e nas tradições transmitidas oralmente por seus antepassados. Por conseguinte, o desiderato de Elohim deveria ser buscado por meio do estudo da Torá. Os p’rushim estudavam a Torá e a ensinavam à população, incentivando que os homens comuns conhecessem a Palavra do ETERNO. Construíram sinagogas em diversas cidades de Yisra’el com o objetivo de criar centros comunitários de congregação, oração e estudo das Escrituras. Graças ao trabalho incansável dos p’rushim, 50 anos antes do nascimento de Yeshua, cada vila da Terra Santa contava com uma sinagoga, todas detentoras de rolos da Torá a fim de viabilizar o estudo por parte do homem leigo. Em tal época, não havia imprensa, sendo os rolos copiados manualmente. Para disseminar o conhecimento da Palavra do ETERNO, muitos p’rushim eram soferim (escritas), dedicando-se à reprodução fiel das Escrituras Sagradas e distribuindo-as às sinagogas. Se hoje nós temos acesso às Escrituras, devemos reconhecer o trabalho de cada sofer (escriba) que permitiu que a verdade escrita de Elohim chagasse até os dias atuais. Nas sinagogas disseminadas pelos p’rushim, existiam escolas em que os meninos eram alfabetizados e iniciados nos estudos das Escrituras, garantindo-se o direito de todo homem de ler e aprender a Torá. Os judeus frequentavam as sinagogas com o propósito de ler a Torá e os Profetas no shabat, dia santificado pelo ETERNO. Também era comum que houvesse a leitura e estudos nas segundas e quintas-feiras. Qualquer pessoa do povo que tivesse o conhecimento da Torá e devoção inerente poderia conduzir a congregação, ler a Lei e explicar o conteúdo para seus pares, ou seja, não havia a concentração da pregação nas mãos de um líder especial. No Cristianismo, quem conduz a missa ou o culto é o padre ou o pastor, sendo vedado que o fiel assuma a pregação no lugar das “autoridades eclesiásticas”. Pensam os cristãos que a “a Palavra do Senhor foi confiada apenas a homens especiais” (padre ou pastor). De modo totalmente contrário, na região de Yehudá (Judeia) do primeiro século, entendiam os p’rushim (fariseus) que todo homem deve conhecer a Torá e tem o direito de transmitir sua mensagem a seus compatriotas. É claro que nas sinagogas havia liderança, normalmente constituída dos anciãos e rabinos. Não obstante, havia plena participação democrática dos membros. Cumpre repetir: já que o sacerdócio no Beit Hamikdash (Templo) estava corrompido, os p’rushim e os judeus zelosos passaram a dar grande importância às sinagogas, local em que poderiam aprender a Torá, considerada o antídoto do ETERNO contra o pecado: “Mesmo assim, o SANTO, bendito seja, falou a Yisra’el: ‘Meus filhos, eu criei o impulso mau, mas eu [também] criei a Torá como seu antídoto. Se vocês se ocuparem da Torá, não serão entregues ao domínio do impulso mau. Mas, se não se ocuparem da Torá, então serão entregues ao poder do impulso mau’.” (Talmud Bavli, Kidushim 30b). Além de ser um centro de estudo da Torá e adoração nos shabatot (sábados), as sinagogas funcionavam durante a semana como local de administração da justiça, reuniões políticas, prestação de serviços fúnebres, educação dos jovens, distribuição de alimentos aos pobres etc. Em todas estas plúrimas atividades, os p’rushim (fariseus) estavam na liderança e, por tal motivo, conquistaram a simpatia da população e exerceram grande influência junto à opinião pública. Neste contexto, fácil entender o motivo de Flávio Josefo registrar o apreço da população pelos p’rushim: “... os que pertenciam à seita dos fariseus, de que falamos há pouco, os quais desfrutam tal prestígio perante o povo, que este acolhe os seus sentimentos, ainda que contrários aos dos reis e dos sumo sacerdotes.” (História dos Hebreus, CPAD, 8ª edição, página 605). “... os fariseus tinham também a fama de ser muito piedosos e muito mais instruídos que os outros, em coisas de religião...” (Ob. Cit. Página 1018). Eram os p’rushim reputados pela população como verdadeiros sábios, participando ativamente do Sanhedrin (Sinédrio), a suprema corte religiosa e política de Yisra’el. Flávio Josefo estima que no primeiro século o grupo dos p’rushim contava com pouco mais de seis mil pessoas, número pequeno, considerando-se a grande população da época (há divergências acerca do número de habitantes da região no primeiro século, variando-se de 500 mil a dois milhões e meio).