Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
1
Edgar Morin é um antropólogo, sociólogo e filósofo francês judeu de ori-
gem sefardita. Seu verdadeiro nome é Edgar Nahoum (Paris, 8 de julho de 1921),
A citação é de seu livro: “Para Sair do Século XX. Rio de Janeiro, Nova Fronteira,
1986.
dreiro, mas reuniam-se à noite para conversa sobre diferentes temas e
terminavam a reunião com um jantar. Nessa época, o processo de ensino-
aprendizagem profissional e o estabelecimento de firmas construtoras
estava deixando o âmbito restrito das corporações de ofício, e se estabele-
cia sob novas leis e organizações.
4
A primeira parte tem sido tradicionalmente mal lida e pior inter-
pretada, tirando-se dela conclusões que não estão nela corroboradas. Ve-
jamos o que diz o texto:
5
(...) Noé, o nono descendente de seth, recebeu de Deus a or-
dem e a missão de construir a arca, a qual, embora de madeira, foi
fabricada certamente segundo a geometria, e de acordo com as re-
gras da maçonaria.
Ele segue em sua história, falando da construção da torre de
Babel, da dispersão dos povos, que levaram o conhecimento dos mé-
todos de construção(Maçonaria) a outras regiões. Cita o Egito,
aprendendo a arte de Misraim.
6
Cita também a linhagem surgida de outros filhos de Noé, Cam e Ja-
fet;
“E seguramente a bela e intrépida posteridade de Jafet (o fi-
lho mais velho de Noé) que imigrou para as ilhas dos gentios, deve-
ria ter sido igualmente hábil na geometria e em maçonaria.”(pag6)
E segue falando dos descendentes de Sem: Abraão e os patri-
arcas, descreve Moisés como mestre Maçom, e os israelitas, como
reino de maçons, pois :
8
“(...) mas seu discípulo, o grande Pitágoras, é autor da 47a
proposição do primeiro livro de Euclides, a qual, devidamente ob-
servada, é a base de toda Maçonaria, sagrada, civil e militar.
(pág.21)
Pitágoras tinha sua escola com ensinos esotéricos, divididos
em três graus, mas não eram esses ensinamentos a base da maçonaria,
mas sim a famosa equação matemática.
Sobre Ptolomeu Filadelfo, rei do Egito, comenta:
(...)”tornou-se um excelente arquiteto e Mestre Maçom Ge-
ral, tendo construído, entre suas grandes construções, a famosa torre
de Faros, a quinta das sete maravilhas do mundo.”(pág.24)
Admite também que as nações africanas, em imitação ao Egi-
to, tinham também relíquias de valor em maçonaria. Em referência a
sábios gregos, comenta:
(...) se bem que não maçons operativos, eram contudo bons
pesquisadores, ou, pelo menos, cultivavam a geometria, que é a base
sólida da verdadeira Maçonaria, e sua regra.(pág.24)
Na página 25 Anderson esclarece o que entende como verda-
deira maçonaria, modelo para todas as eras: um estilo arquitetônico:
“E porque se acredita racionalmente que o glorioso Augus-
to tornou-se o Grão Mestre da loja de Roma, pois além de
patrocinar Vitrúvio, contribuiu bastante para o bem-estar
dos companheiros, como o atestam os numerosos monu-
mentos construídos em seu reinado, cujas ruínas se torna-
ram o modelo e o padrão da verdadeira maçonaria em to-
dos os tempos futuros, pois são verdadeiramente o epítome
da arquitetura asiática, egípcia grega e siciliana, que de-
signamos comumente sob o nome de Estilo de Augusto, e
não fazemos agora senão tentar imitar, sem que tenhamos
atingido sua perfeição. (pág.25)
9
Nenhuma referência a Escolas de Mistérios, Ritos Esotéricos,
ou Tradição Primordial, conceitos tão queridos entre vários autores.
A segunda parte das “Constituições” trata das obrigações de
um Maçom Livre, como sendo “Extraídas dos arquivos das lojas de
Além – Mar, e daquelas na Inglaterra, Escócia e Irlanda, para uso
das lojas de Londres” É um texto bastante conhecido, encontrando-
se inserido, parcialmente, nos rituais de Aprendiz de muitas Potên-
cias maçônicas. O trecho objeto de maiores controvérsias, por ser
também mal lido, é o correspondente ao primeiro título “De Deus e
da Religião”. Um número extremamente grande de autores tem feito
leitura incompreensivelmente parcial desse texto.
Diz ele:
Um Maçom é obrigado, por sua condição, a obedecer à Lei moral;
e se compreende bem a Arte, não será jamais um ateu estúpido,
nem um libertino irreligioso. Mas se bem que nos tempos antigos
os maçons fossem obrigados em cada país a ser da religião, qual-
quer que fosse desse país ou dessa nação, contudo é considerado
mais conveniente de somente os sujeitar àquela religião sobre a
10
qual todos os homens estão de acordo, deixando a cada uma suas
próprias opiniões;
Um grupo espantosamente grande de autores, religiosos, leigos e
mesmo maçons, parou a leitura do texto nesse ponto, argumentando a
partir daí que a maçonaria propõe um a nova religião “na qual todos
os homens estão de acordo”, e que essa religião seria deísta para
alguns, vinculada a antigos deuses para outros, etc, etc, etc. Mas o
texto não para nesse ponto, ele continua, esclarecendo de modo com-
pleto e insofismável o que Anderson pretendia dizer com “A religião
na qual todos os homens estão de acordo”:
“...isto é, serem homens de bem e leais, homens de honra e probida-
de, quaisquer que sejam as denominações que os possam distinguir;
pelo que a maçonaria se torna o centro de união, o meio de firmar uma
amizade sincera entre pessoas que teriam ficado perpetuamente dis-
tanciadas.”
“As pessoas admitidas como membros de uma Loja devem ser ho-
mens de bem e leais, nascidas livres, e de idade madura e circuns-
pecta, nem escravos nem mulheres, nem homens sem moralidade ou
de conduta escandalosa, mas de boa reputação.”
Interessante também é o comentário apresentado no título seguinte;
Dos Mestres, Vigilantes, Companheiros e Aprendizes:
11
“Toda promoção entre os maçons está fundada sempre no valor real
e no mérito pessoal; (...) Conseqüentemente, nenhum Mestre ou Vi-
gilante é escolhido pela Antigüidade, mas por seu mérito.”
Quando o texto fala de Mestre, refere-se ao que hoje chamamos de
Venerável Mestre, pois o grau de mestre ainda não tinha sido criado.
Essa compreensão soluciona o aparente problema de se verem Com-
panheiros escolhidos para serem Mestres, Vigilantes e Grandes Vigi-
lantes. No título “Da Gestão do Ofício” lemos:
“O mais experimentado dos companheiros será escolhido como Mes-
tre, ou Vigilante dos trabalhos do Senhor; deverá ser chamado Mes-
tre por aqueles que estão sob suas ordens.”
E mais adiante, (pág 53):
“Quando um companheiro for escolhido como Vigilante do trabalho,
sob a direção do Mestre, será leal ao mesmo tempo ao Mestre e aos
Companheiros, vigiará com zelo o trabalho durante a ausência do
Mestre em favor do Senhor, e seus irmãos o obedecerão.”
A terceira parte da obra apresenta os regulamentos gerais, estabele-
cendo as normas para reuniões trimestrais, mestres, aprendizes e
companheiros, condições para iniciação e eleição de oficiais, nas
lojas e na Grande Loja. Em seu texto vemos também a ausência de
mestres, como grau ─ dignitários e oficiais são companheiros:
“O Grão Mestre, ou a pessoa que presidir em seu lugar, orde-
nará a vigilantes particulares de funcionar como Grandes Vigi-
lantes pro tempore. Esses cargos deverão ser ocupados por
dois Companheiros da mesma loja.” (pág.63)
12
Grão-Mestre escrevendo também o nome do seu candidato; e o
candidato cujo nome for retirado em primeiro lugar pelo último
Grão-Mestre, fortuitamente ou por sorte, será o Grão-Mestre para o
ano seguinte;” (pag.69)
O documento termina com o registro das presenças dos (Veneráveis)
Mestres e vigilantes das Lojas. Em todo o texto de Anderson não se
encontra qualquer referência a Escolas de Mistérios, Ritos Esotéricos,
iniciáticos ou Tradição Primordial, conceitos tão queridos e acalenta-
dos por vários autores e maçons dedicados, mas que confundem suas
opções religiosas e filosóficas pessoais com a doutrina e tradição da
ordem maçônica. Devemos admitir, contudo, que esse equívoco não é
recente. Desde que foi revitalizada, a nova Maçonaria teve a partici-
pação de vários membros que viram em seus símbolos novas possibi-
lidades de associação, e procuraram fazer pontes entre novos graus e
ritos que surgiam e antigas filosofias, doutrinas e religiões.
Alguns diziam que os maçons não estavam sabendo interpretar seus
símbolos, e se desligavam da ordem maçônica tradicional, criando
outras organizações veiculando o que em sua particular opinião seria
“a interpretação correta” para ritos, doutrinas e símbolos. O problema
com esses autores, era a insistência em apresentar suas criações pes-
soais não só como maçonaria, mas como “A” Maçonaria! A maçona-
ria como ela devia ser!
Assim, em meados do século XVIII, o barão Von Hund se
disse inspirado por “Ilustres desconhecidos”, e incumbido de “restau-
rar” a maçonaria, criou o rito da Estrita Observância, ligando Maço-
naria a cavaleiros Templários e Escolas de Mistérios do passado. É
bom lembrar que durante boa parte do século XVIII, desenvolveu-se
na Europa grande número de sociedades culturais particulares que
concediam graus cavalheirescos, e se apresentavam como descenden-
tes de Cavaleiros Templários, filósofos gregos, sacerdotes egípcios e
persas. Alguns graus maçônicos foram desenvolvidos com inspiração
13
tirada dessas sociedades, porém veiculando significados e mensagens
maçônicas.
Adam Weishaupt, professor de direito canônico em Ingols-
tad, na Baviera, foi iniciado maçom em 1774. Deixou a Loja desa-
pontado por não encontrar nela o que almejava, e fundou a “Ordem
dos Perfectibilistas”, nome mais tarde alterado para “Illuminati”.
Apresentava-se nos moldes maçônicos, e praticava cerimônias liga-
das a antigos ritos e escolas filosófico/religiosas. Tinha um programa
de reforma da sociedade, que passava pela deposição dos governantes
então no poder. Quando as autoridades tomaram ciência de seu pro-
grama, a ordem foi perseguida e desarticulada, tendo Weishaupt fu-
gido para outro país, onde ficou exilado até sua morte.
Na França, Giuseppe Balsano, conhecido como conde Cagliostro,
encantava a corte francesa na segunda metade do século com seus
dotes de adivinho e hipnotizador. Ele fundou também uma loja “ma-
çônica” criando o rito de “Maçonaria Egípcia”, quando nada se co-
nhecia da cultura e história egípcias (Champolion não tinha ainda
decifrado os hieróglifos). Semelhantemente, o ex-sacerdote benediti-
no Joseph Pernety, funda os “Iluminados de Avignon” apresentada
também como “Loja Maçônica”.
Assim, quando tomam contato com textos desse tipo, muitos
leitores atuais pensam, equivocadamente, estar encontrando a “ver-
dadeira e antiga maçonaria”, sem saber que eles são fruto da criativi-
dade de um indivíduo ou pequeno grupo, divergentes da verdadeira e
original tradição maçônica. Maçons místicos comentam que Ander-
son teria optado por ocultar raízes místicas da Maçonaria, queimando
rituais esotéricos e documentos antigos, por ser ele pastor presbiteri-
ano. Vamos examinar essa alegação. Existia o costume de se escrever
texto discursivo sobre Maçonaria, para ser lido aos iniciantes. Após a
cerimônia de iniciação os textos eram queimados para evitar que
caíssem em mãos profanas.
14
Lembremos, porém, que o texto de Anderson foi o primeiro
com caráter oficial, mandado imprimir para assegurar sua preserva-
ção. Foi examinado por comissão de 14 irmãos. Depois foi lido na
íntegra na presença dos obreiros de 24 lojas e, sugeridas algumas
alterações foi aprovado e enviado para impressão.
Será razoável admitir que todos os maçons presentes naquela
reunião, membros de 24 lojas, participaram de um “complô” de ocul-
tação de verdades e documentos históricos?
Mas, usemos a imaginação, e vamos admitir possível o ab-
surdo “complô”. Em 1751 ocorreram uma série de controvérsias en-
tre maçons irlandeses que não se sentiam bem aceitos pela Grande
Loja de Londres e recusando-se então a aceitar sua autoridade funda-
ram a “Grande Loja dos Antigos”, chamando a si mesmos “Antigos”,
e aos maçons londrinos “Modernos”. A divergência entre as duas
Grandes Lojas só terminou em 1813, quando os grão-mestres das
duas organizações eram irmãos de sangue, príncipes da família real
15
britânica, e após uma série de negociações, fundaram então a Grande
Loja Unida da Inglaterra.
Ora, no longo período de mais de meio século durante o qual
existiu antagonismo entre as duas Potências britânicas, os maçons
“Antigos” certamente teriam denunciado o suposto ocultamento de
documentos, se este tivesse existido, pois assim estariam provando a
falha maçônica de seus adversários e sua irregularidade.
Mas, já que estamos usando a imaginação, vamos admitir
uma possibilidade ainda mais desvairada: Os maçons da Grande Loja
dos Antigos eram adversários dos londrinos, mas concordaram em
ocultar, queimar, destruir todos os “antigos e místicos rituais iniciáti-
cos” da Inglaterra!
Mas, o que teria então acontecido com os rituais similares das
corporações francesas? E das alemães? E das italianas? (pois essa
linha de pensamento entende a maçonaria mística existindo desde
sempre nesses países) Todos alcançados, queimados, destruídos pela
fúria “fundamentalista cristã” dos maçons ingleses? Não creio que
exista alguém que possa admitir com seriedade tal fantasia. Os do-
cumentos antigos existentes na Inglaterra e em outros países da Eu-
ropa são apenas estatutos das corporações de construtores, determi-
nando normas, direitos e deveres dos trabalhadores. Não existe
qualquer doutrina ou conceito místico-esotérico nem qualquer refe-
rência a antigas escolas de mistério. As únicas referências de caráter
religioso são fórmulas introdutórias, invocando a benção do Deus
Pai, Filho e Espírito Santo, da “Santa Madre Igreja” ou de santos
padroeiros do panteão católico.
A época de Anderson foi um período de transição. As lojas
não eram mais reunião de trabalho de construtores, mas não eram
ainda o que temos hoje como maçonaria. O que parece ter sido o
“divisor de águas” para o desenvolvimento da Maçonaria na forma
atual, foi a criação do grau de Mestre em 1725. Nos anos subsequen-
tes, rituais foram escritos, novos ritos e graus criados em um proces-
16
so de crescimento que formatou a maçonaria atual. Mas isso já é ou-
tra história, que será abordada em outros ensaios.
BIBLIOGRAFIA
17