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Márcio Antônio ESTRELA, autor de textos sobre questões teóricas e práticas de bancos centrais, é servidor
aposentado do Banco Central do Brasil. Economista, com MBA em finanças, tem mais de 25 anos de experiência no
Banco Central do Brasil de onde aposentou-se em julho de 2020, quando exercia, na Diretoria Colegiada, a função de
Chefe de Gabinete (“Chief of Staff”) de Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos Corporativos (Direx).
Atuando na Diretoria Colegiada do BCB como chefe de gabinete (“Chief of Staff”) da área de assuntos internacionais e
de gestão de riscos corporativos, participava do Comitê de Política Monetária (Copom), do Comitê de Estabilidade
Financeira (Comef), do Comitê de Gestão de Risco, do Comitê de Projetos Corporativos; além de subsidiar e
acompanhar as decisões da Diretoria Colegiada.
Exerceu ao longo de sua carreira profissional diversas funções de chefia e de coordenação no âmbito do BCB,
destacando-se as áreas responsáveis por manter interlocuções da Autarquia com os organismos internacionais, como o
FMI, BIS, G20, OMC, CEMLA, BRICS e OCDE, tendo sido responsável pela coordenação do processo de adesão do Brasil
aos Códigos de Liberalização da OCDE e a atuação do BCB no processo do Brasil para tentar virar membro pleno
daquela Organização.. Gerenciou, também, a área que institucionalmente cuida dos sistemas de pagamentos
internacionais (CCR e SML), e coordenou, ainda, até 2018, a participação do BCB nos processos de integração
financeira e monetária Internacional, incluindo o exercício da presidência do Mercosul Financeiro (SGT-4) e a
negociação da parte financeira do Acordo Comercial do Mercosul com a União Europeia..
Após se aposentar, tornou-se consultor na “Starnet Estrela Consultoria & Treinamento em Regulação Financeira e
Cambial – incluindo Fintech, Open Finance, Criptoativos, PLD/FT – Licenciamento e Assuntos Internacionais”.
É autor de “Moeda, Sistema Financeiro e Banco Central – Uma Abordagem Prática e Teórica sobre o Funcionamento
de uma Autoridade Monetária no Mundo e no Brasil”; Fundação Cesgranrio; Rio de Janeiro: 2011.
➢ Telefone (e WhatsApp): +55(61) 995-828-496; e-mail: starnet.estrela.consultoria@gmail.com
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Banco Central com autonomia, “que bicho é esse”?
Não existe “técnica” isenta da política!
Tudo pode e deve ser criticado!

Mas é fundamental entender para criticar corretamente:

— Fazer crítica sem fundamento ou tecnicamente inconsistente esvazia a crítica e


enfraquece o crítico.

O Banco Central do Brasil passou a ter “autonomia”. Como funciona isso, qual a
fundamentação, qual a experiência internacional e quais as inconsistências?

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LC nº 179/2021 (“Objetivos e Autonomia do BCB”) conjugada com
a Lei nº 13.820/2019 (“Relação BCB x Tesouro”).
O Banco Central do Brasil (BCB) passou a deter uma autonomia formal a partir da promulgação da Lei Complementar (LC)
nº 179/2021 (“Objetivos e Autonomia do BCB”) – conjugada com a Lei nº 13.820/2019 (“Relação BCB x Tesouro”).
— A LC nº 179/2021 definiu de maneira mais direta os objetivos do BCB, estabeleceu mandatos e proteção contra
exoneração e o desvinculou de ministérios.
— A Lei nº 13.820/2019, por sua vez, deu mais segurança financeira ao estabelecer regras mais objetivas e mandatórias
ao orçamento de autoridade monetária do BCB.
Embora seja uma autonomia que em quase nada difira das que já possuem as agências reguladoras brasileiras (Anatel,
Anvisa, Aneel, Anac etc.), por envolver o BCB gerou muita discussão e se faz necessário esclarecer seu significado.

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Autonomia X Independência de um BC
Autonomia de banco central está relacionada à capacidade de tomar e manter decisões e liberdade para definir como atuar
para atingir as metas e objetivos estabelecidos.
➢ Independentes (independência total): os bancos centrais que têm poder para definir, eles próprios, suas metas e
objetivos; que têm liberdade operacional para definir como atuarão para atingi-las; e cujas decisões não podem ser
revertidas pelos governantes.
➢ Autônomos (independência operacional): os bancos centrais que têm liberdade operacional para definir como atuarão
para atingir as metas e objetivos que lhes foram definidos externamente; e cujas decisões não podem ser revertidas pelos
governantes.
• Os objetivos podem ser estabelecidos pelo Executivo, pelo Legislativo, por algum Conselho composto por
representantes de variados setores da sociedade etc.
o Caso a atuação do BC esteja alinhada aos seus objetivos, eventuais alterações devem se dar via ajustes nos
objetivos definidos externamente – não se pode reclamar por o BC fazer o que lhe foi estabelecido para fazer.
 O BCB tem seu principal objetivo, a “meta de inflação”, estabelecido externamente pelo CMN, onde o governo
eleito tem maioria.
➢ Dependentes/subordinados: os bancos centrais que sequer detêm a liberdade de definir como atuarão para atingir seus
objetivos.
Independência não é um “ponto fixo”, mas uma linha contínua com graus diferentes – desde a dependência até a
independência, passando pela autonomia.
— O Banco Central Europeu (BCE) é hoje o exemplo de BC com “maior grau de independência” do mundo. 5
Independência de um Banco Central
— Grau de liberdade da Autoridade Monetária para tomar as medidas necessárias para atingir os objetivos estabelecidos.
— Dar autonomia aos BCs NÃO significa que o próprio BC definirá seus objetivos.
• Objetivos definidos externamente (pela sociedade/pelo Legislativo/pelo Executivo – com a exceção dos poucos casos de
BCs com independência total) e o BC tem liberdade para definir como atingi-los.
• Grau de liberdade da Autoridade Monetária para tomar as medidas necessárias para atingir os objetivos estabelecidos.
• Independência de instrumentos e não de objetivos. Liberdade para tomar atitudes politicamente impopulares.
— Tendência atual é aumentar a autonomia.

Por que um BC deve ser independente?


— Porque a política monetária, por sua própria natureza, requer um horizonte de planejamento de mais longo prazo, haja vista
a defasagem entre decisões e efeitos da política monetária sobre a produção e a inflação – o controle da inflação demanda
ações hoje, mas cujos resultados dar-se-ão 1,5-2 anos à frente (no Brasil, por exemplo, quando o BCB altera os juros, os
principais efeitos na economia se dão 15 meses a frente). Assim, é necessário que os “tomadores de decisão” tenham uma
maior continuidade que permita a manutenção de políticas no médio e longo prazos, sem pressões para resultados
imediatos.
— O processo de desinflação tem um custo inicial e apenas gradualmente, com o tempo, dá retornos. É importante resistir à
tentação de buscar ganhos de curto prazo, à custa do futuro. (Blinder 1999). fundamental controlar a inflação e ter
sustentabilidade fiscal para ter um ambiente macroeconômico que permita crescimento econômico sustentável que viabilize
alguma distribuição de renda. 6
Inflação: por que evitar?
— Como principal efeito microeconômico da inflação tem-se a perda do poder aquisitivo, com a transferência
de valor do detentor para o emissor da moeda. Essa transferência de riqueza da sociedade para o governo
atinge mais a população de menor renda por ser a que menos condição tem para se defender da
desvalorização da moeda.
— Quanto aos efeitos macroeconômicos da inflação destacam-se o enfraquecimento do sistema de preços e o
descrédito na moeda que desorganizam a economia e deteriora a visão do futuro, com efeitos sobre a
poupança e o investimento.
Não existe crescimento econômico sustentável, geração de emprego nem distribuição de renda sem inflação
controlada.
— A própria história econômica brasileira prova isso: em todos os episódios de aceleração da inflação não
houve crescimento econômico nem distribuição de renda – e quem viveu a inflação descontrolada das
décadas de 1980 e 1990 sabe bem.
É fundamental controlar a inflação e ter sustentabilidade fiscal para ter um ambiente macroeconômico que
permita crescimento econômico sustentável que viabilize alguma distribuição de renda.

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Independência e controle da inflação:
Autonomia de umestudos empíricos
Banco Central
— Países já industrializados, com bancos centrais mais autônomos, gozam de índices médios de inflação mais baixos,
sem apresentar índices médios de crescimento reduzidos.
— Arnone et al (2007) afirmam que um banco central que passe a ter uma completa autonomia, as chances de uma
inflação baixa ser mantida aumentam em torno de 50%.
— Atualmente não mais existe questionamento relevante sobre o mandato da autoridade monetária para decidir e
implementar a política monetária sem interferência (Blinder 2010). Resultados empíricos sustentam que a
independência da política monetária produz não apenas menos inflação como também performance
macroeconômica superior – menos e menor volatilidade de inflação sem maior volatilidade do PIB.
— Pesquisas apontaram que banqueiros centrais e economistas consideram a independência dos bancos centrais
como uma importante maneira de se estabelecer e manter a credibilidade (Blinder 2000).

Evidencias para países Emergentes


— Quando se usa como critério de independência a rotatividade dos presidentes de bancos centrais, se obtém uma
clara relação inversa entre inflação e a sua independência legal (Eijffinger e Haan, 1996).
— Arnone et al (2007) enfoca exatamente os países emergentes e em desenvolvimento e argumenta que o aumento
no grau de autonomia dos BCs nesses países entre 1992 e 2003 foi um dos responsáveis pela significativa queda da
inflação durante esse período, visto que essa maior autonomia permitiu uma redução do financiamento dos
déficits fiscais do governo.
8
Aumento da autonomia de BCs com redução da inflação, tanto em economias
desenvolvidas quanto em Emergentes

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Tendência de aumento do grau de autonomia e
sem nenhum sinal de reversão desde 2008

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Processo de Independência de BC
Arnone, Laurens, Segalotto e Sommer (2006, 2007) indicam que o processo de autonomia de um BC envolve, na maioria dos
casos, três estágios:
i. Estabelecimento do marco legal para a autonomia.
ii. Desenvolvimento da autonomia operacional.
iii. Aprofundamento da autonomia política em termos de formulação de políticas.

Independência, Responsabilização e Governança


Ao exercer sua autonomia, um BC deve estar sujeito a questões de responsabilização (accountability) e governança.
— Segundo Moser-Boehm, a articulação destes três elementos configura o chamado triângulo moderno dos bancos centrais.

Aspectos que avaliam o grau de Independência de um Banco Central*


— Limitação de objetivos e funções.
— Especificidades e precisão de metas.
— Base estatutária para autonomia.
— Garantias institucionais do Executivo.
— Nomeação da sua diretoria. * Estes fatores permitem identificar as características que contribuem
— Financiamento das atividades. para que um BC exerça sua missão com autonomia. Estes são as
características e não a definição de BCs autônomo. O que define um
— Forma de controle externo. BC como autônomo é a sua capacidade de tomar e manter decisões. 11
Objetivos e funções
— Um banco central mais autônomo trabalha com objetivos específicos e, sempre que mais de um objetivo,
hierarquizados.
• BCE: salvaguardar a moeda.
• FED: busca preços estáveis e do emprego máximo – este condicionado àquele.
➢ No Brasil: a LC 179/2021 especificou e hierarquizou os objetivos do BCB, incluindo a “dupla estabilidade”:
1ª) Estabilidade Monetária: controlar a inflação;
Uma vez este assegurado o controle da inflação, secundariamente, o BCB também tem como objetivos:
2ª) Estabilidade Financeira: estabilidade e eficiência do sistema financeiro(evitar crises bancárias
sistêmicas).
E, complementarmente:
Complementar) Pleno emprego: suavizar as flutuações do nível de atividade econômica e fomentar o
pleno emprego.
— Quanto aos objetivos desenvolvimentistas e de redução de desigualdades regionais, e até sociais, estes seguem
importantes, mas devem ser deixados para os ministérios e agências especializadas trabalharem. O BCB contribui
dentro de sua especialidade, ou seja, criar um ambiente com bons fundamentos econômicos e maior
previsibilidade para permitir que essas outras políticas possam ser implementadas.
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Responsabilidade formal na condução da política monetária
— É a principal característica de um banco central autônomo: o BC ser o único responsável pela política
monetária.
➢ No Brasil:
• A CF estabelece que cabe ao Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República, dispor,
respectivamente, sobre "matéria financeira, cambial e monetária, instituições financeiras e suas
operações", e sobre "moeda, seus limites de emissão e o montante da dívida mobiliária federal”.
• No Brasil, pela LC nº 179/2021, o mandato para controlar a inflação foi dado de forma explícita ao BCB
e os seus objetivos foram especificados e hierarquizados.

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Independência em relação ao Executivo
— Proibição de emprestar recursos a qualquer autoridade do setor público.
— Autonomia para definir taxas de juros.
— Irreversibilidade das decisões.
➢ No Brasil:
• Ao BCB é vedado conceder, direta ou indiretamente, empréstimos ao Tesouro Nacional e a qualquer órgão ou
entidade que não seja instituição financeira desde a Constituição Federal de 1988 e só pode comprar títulos para fins
de política monetária.
• O BCB tem como principal objetivo legal controlar a inflação.
• O BCB detém o monopólio de emissão monetária.
• Já a condução da política cambial, a administração das reservas internacionais e as demais atribuições na área
externa são executadas pelo BCB, sob a responsabilidade do Conselho Monetário Nacional.

Cooperação com o Governo


Autonomia não significa ausência de coordenação: BCs mantêm canais de coordenação com policy makers dos governos eleitos.
• FED: reuniões periódicas entre o Chairman do Board do FED e o Secretário do Tesouro dos EUA nas quais são discutidas
as políticas monetária, orçamentária e financeira e coordenada ações.
• BC do Chile: o ministério da fazenda do governo eleito pode participar das reuniões do Conselho do BC com direito a voz,
tendo poder de veto em temas específicos.
— Nos países industrializados o relacionamento entre BC e governo tende a ser mais informativo, enquanto nos países
emergentes existe uma troca maior de informações detalhadas, análises e maior escopo dos assuntos tratados, indicando
assim uma maior propensão para a cooperação.
14
Independência em relação aos mercados
Um ponto comumente ignorado, mas fundamental na discussão de independência e autonomia, é a necessidade de
independência em relação aos mercados.
Assim como a independência e autonomia em relação ao Executivo, a em relação aos “Mercados” é também
fundamental para o adequado cumprimento de seus objetivos.
O papel da Autoridade Monetária requer, algumas vezes, enfrentar os interesses do “Mercado” e, até, confrontar
suas perspectivas, análises e prognósticos.
— Segundo Blinder (1999), os bancos centrais podem recorrer ao mercado para obter avaliação das decisões. Para
decidir, entretanto, devem prevalecer as percepções dos dirigentes dos bancos centrais, que diferem
fundamentalmente das do mercado.

Independência do Banco Central e credibilidade


A credibilidade é um bem precioso que não deve ser desperdiçado.
— Um banco central, quanto mais autônomo, mais poder tem sobre a economia. Essa autoridade é uma confiança
pública delegada ao banco pelo corpo político. Em troca, os cidadãos têm o direito de exigir que as ações do
banco correspondam às suas palavras, o que é a marca registrada da credibilidade.

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Designação e demissão do presidente e diretores
— Normalmente mandatos com prazos pré-fixados para o presidente e membros do board, preferencialmente desencontrados
do mandato do Poder Executivo, conferem maior autonomia ao BC e garantem a continuidade as ações de longo prazo.
— Os mandatos podem ser renovados.
— A demissão só ocorre quando é cometida falta grave.
— Existem BCs que, até, buscam equilíbrio entre diferentes “escolas de pensamento econômico”.
➢ No Brasil:
 Nomeação é feita pelo Presidente da República e aprovada pelo Senado Federal, após sabatina.
 Mandatos de quatro anos (com direito a uma recondução).
 Substituição do presidente do BCB dar-se-á na metade do mandato do presidente da República e os diretores serão
substituídos dois por ano – o que permitirá ao presidente eleito já assumir indicando dois diretores e substituir toda
a diretoria dentro de seu mandato
➢ Nos bancos centrais “mais independentes” essa substituição é mais espaçada, como a substituição de toda a
diretoria exigindo mais de um mandato do presidente eleito.
 Proteção contra exoneração injustificada: exoneração a pedido; por enfermidade; por condenação transitada em
julgado ou proferida por órgão colegiado; ou por desempenho insuficiente (este, sob proposta do CMN,
condicionado à prévia aprovação, por maioria absoluta, do Senado Federal).
➢ Com os mandatos e proteção contra exoneração, cresce o risco de ocorrer uma maior “politização” nas
indicações para presidente e diretores do BCB – pelo menos até que se consolide o entendimento do BCB como
uma instituição técnica de Estado que protege a sociedade da inflação.
16
Financiamento das atividades do Banco Central
A integridade financeira de um banco central deve ser protegida para impedir influência
governamental via direcionamento das despesas ou via procedimentos para apropriação de seus
recursos.
— Regras pré-estabelecidas, claras e mandatórias, com separação total de balance sheets.
— Transferências compulsórias, contingente a ganhos e perdas com a condução de política monetária
e cambial.
— Moser-Bohem (2007) inclui também entre a autonomia financeira dos bancos centrais, a
capacidade de ajustar salários e, assim, atrair e manter profissionais no nível dos padrões
requeridos para suas ações.
➢ No Brasil:
• O BCB elabora o orçamento institucional e o Congresso Nacional aprova. Já o Orçamento
Operacional – Orçamento de Receitas e Encargos de Operações de Autoridade Monetária –
é aprovado no âmbito do CMN.
• A Lei nº 13.820/2019 regulou e trouxe segurança e estabilidade para as relações financeiras
entre o BCB e o Tesouro.

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Controle externo
Independência e autonomia não isentam os bancos centrais da necessidade de “prestar contas”. Ao contrário, tornam a
transparência uma contrapartida imprescindível.
— Lybek (2004) argumenta que a responsabilização é necessária para assegurar que um banco central autônomo use
efetivamente e de forma eficiente a autonomia que lhe foi atribuída pelo poder político. Por maior que seja a autonomia
do banco central, existe a obrigação de prestar contas a um órgão específico.
A maior parte dos bancos centrais reporta-se semestral ou trimestralmente ao congresso nacional. Há ainda inúmeros
relatórios públicos sobre as atividades dos bancos centrais.
— Audiências no Congresso com dirigentes.
— Auditorias rigorosas – em alguns casos até auditorias sobre a eficiência das políticas do BC
— Relatórios diversos: Política Monetária, Econômicos, Risco, Gestão.
➢ No Brasil:
• A fiscalização é feita pelo Congresso Nacional, com o auxílio do Tribunal de Contas da União; o Executivo exerce o
monitoramento pela Secretaria de Controle Interno. O BCB, também, submete-se a auditoria independente
desde proposta do próprio BCB, aprovada pelo CMN, no ano de 2000 (Voto CMN 048/2000).
• O presidente do BCB comparece regularmente ao Congresso (Comissão de Assuntos Econômicos do Senado
Federal);
• O BCB publica diversos relatórios, como: de Inflação; de Estabilidade Financeira; de Gestão de Reservas; de
Administração; de Riscos. 18
BCB – os custos de não ter independência De Jure
O BCB não tinha autonomia De Jure (pela Lei), mas atuava com autonomia De Facto (na prática) desde
meados da década de 1990, autonomia conquistada pela efetiva atuação na manutenção da
estabilidade inflacionária.
A sociedade brasileira concedia ao BCB essa autonomia De Facto, mas apesar de o BCB atuar na prática
com autonomia, a sociedade pagava os custos de o BCB não ter, ainda, uma autonomia De Jure.
Essa ausência de autonomia na Lei cobrava os custos da sociedade com maior inflação e maiores juros,
principalmente em períodos de transição.
A sociedade brasileira era cobrada pelo que já tinha dado

19
Maior inflação e maiores dificuldades de política monetária em períodos eleitorais

20
Maior volatilidade e aumento do prêmio de juros emde
Autonomia períodos eleitorais
um Banco Central

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O aumento da autonomia do BCB
— Base estatutária para autonomia: assegurada pela Lei Complementar 179/2021.
— Limitação de objetivos e funções + Especificidades e precisão de metas: o objetivo fundamental do BCB é a
estabilidade monetária (controlar a inflação) e, uma vez este assegurado, complementarmente o BCB
também tem como objetivos a estabilidade financeira (evitar crises bancárias sistêmicas) e buscar o
crescimento econômico e o “pleno emprego”.
— Maiores garantias frente ao Executivo: sem vinculação a Ministérios.
— Nomeação da Diretoria: mandatos fixos – com direito a uma recondução – e vencimentos intercalados;
proteção contra exoneração injustificada.
— Controle Externo: TCU, Auditoria Independente.
— Transparência: Relatórios de Inflação, de Estabilidade Financeira, das Reservas; de Gestão, de Riscos;
Indicadores Econômicos; Consultas Públicas.
— Financiamento das atividades: ponto ainda a ser trabalhado – embora a Lei nº 13.820/2019 tenha
avançado no questão fundamental do relacionamento BCB – Tesouro.

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LC nº 179/2021 (“Objetivos e Autonomia do BCB”)
Se antes o BCB traduzia indiretamente da Lei nº 4.595/1964 sua missão da dupla estabilidade (monetária e
financeira, sem prevalência de uma sobre a outra), com a LC nº 179 o BCB passou a ter explicitados e
hierarquizados seus objetivos: o objetivo fundamental do BCB é a estabilidade monetária (controlar a inflação)
e, uma vez este assegurado, complementarmente o BCB também tem como objetivos a estabilidade financeira
(evitar crises bancárias sistêmicas) e buscar o crescimento econômico e o “pleno emprego”.
Apontada como grande novidade a busca pelo crescimento econômico e o “pleno emprego”, estes em nada
inovam em relação ao que era adotado na prática pelo BCB dado que o Comitê de Política Monetária (Copom)
já atuava nessa linha: uma vez assegurado o controle da inflação, buscava definir a taxa de juros que gerasse o
melhor desempenho econômico.
A definição de qual é o “nível de desemprego ideal” pode ser questão de divergências dado que para o banco
central o nível de desemprego aceitável é o que não causará inflação (a chamada “taxa natural de
desemprego” do regime de metas para inflação), não necessariamente o menor desemprego possível.
Destaque-se que o principal objetivo do BCB, a meta de inflação, é dado externamente a ele, por um
conselho econômico do governo eleito, o Conselho Monetário Nacional (CMN).

23
Lei nº 13.820/2019 (“Relação BCB x Tesouro”)
Os bancos centrais não podem ser comparados a empresas que visam lucro tendo em vista que o resultado de um banco
central será consequência da política econômica que se teve de seguir (a título de exemplo, se um banco central quiser
obter um lucro elevado – dado que a moeda é seu principal passivo – bastaria deixar ocorrer uma hiperinflação).
A Lei nº 13.820/2019 deu mais segurança financeira ao BCB ao estabelecer regras mais objetivas e mandatórias ao
orçamento de autoridade monetária. Embora esta Lei não tenha avançado na tratativa do “estoque passado” – o acumulado
de títulos no BCB e de recursos na conta única do Tesouro – ela avança na tratativa do “fluxo futuro”, estabelecendo regras
para o financiamento do BCB, incluindo transferência e cobertura de resultados do BCB, bem como a recomposição da
carteira de títulos para política monetária. Destacam-se:
• Foi estabelecida regra objetiva para que a carteira de títulos da Dívida Pública Mobiliária Federal interna (DPMFi) do BCB
seja recomposta pela Tesouro – evitando o risco de que o BCB seja deixado sem títulos públicos indispensáveis à
operacionalização da política monetária (a partir da LC nº 101, de 4/5/2000 – Lei de Responsabilidade Fiscal – o BCB não
mais emite títulos próprios e depende dos títulos do Tesouro para suas operações de política monetária).
• Foram constituídas reservas de resultado do BCB, uma espécie de “colchão de amortecimento” para cobrir resultados
negativos futuros.
• Foi definida de maneira mais objetiva a forma e o prazo em que o Tesouro cobrirá os resultados negativos do BCB.
Importante destacar que a Lei nº 13.820/2019 avança na tratativa do financiamento das atividades de autoridade monetária,
ou seja, o financiamento da política econômica conduzida pelo BCB. Nem a Lei nº 13.820/2019 nem a LC nº 179/2021 tratam
do “financiamento administrativo” do BCB: salários, passagens, diárias, TI, contas de concessionárias, gestão de pessoal e
concursos etc. Neste quesito, ao contrário dos principais bancos centrais do mundo, o BCB segue com orçamento totalmente
dependente do Executivo e, inclusive, passível de contingenciamentos que podem deixá-lo sem recursos para as mínimas
despesas de funcionamento.
24
BCB: não é ‘Prejuízo’ nem ‘Lucro’, é resultado da política
econômica
Banco central não é empresa que tem de dar lucro. E o resultado do orçamento MONETÁRIO do BCB não pode ser
entendido como “prejuízo” nem como “lucro”, apenas como resultado da política econômica que foi adotada.
Dependendo da política mais adequada ao momento, o BCB terá:
— Resultado negativo (que alguns chamariam de "prejuízo") e esse "prejuízo" tem a ver com a inflação baixa e Real
"forte".
— Resultado positivo (que alguns chamariam de "lucro") e esse "lucro” tem a ver com o aumento da inflação e a
desvalorização do Real.
Sim, o dito “prejuízo” pode ser o resultado mais correto para o BCB – tem a ver com a redução da inflação e a
valorização do câmbio/Real; e o dito “lucro” pode significar apenas que o governo perdeu o controle da inflação e
ocorreu uma desvalorização do câmbio/Real.
— O principal passivo do BCB é o real emitido. Assim, quando a inflação dispara, o passivo desvaloriza e o "lucro"
aparece.
— As reservas internacionais estão no ativo. Assim, quando o dólar dispara, o ativo em real dispara junto e o
"lucro" aparece instantaneamente.
Assim, o BCB lucra quando a inflação dispara e o dólar aumenta.
— Se quiser que o lucro do BCB seja gigantesco é só deixar a inflação ir pra 100% ao ano e o dólar disparar para
R$20.
25
Resolução CMN 2.682/1999: IFs NÃO estão transferindo os prejuízos
com empresas para o Governo – imposto sobre lucro não incide sobre
prejuízo
Se um empréstimo não será pago a uma IF, esse valor não pode continuar no ativo da IF como receita que será recebida porque
falsearia a real situação da IF, precisa ser “provisionado”.
— Se uma IF não vai receber um crédito porque uma empresa para quem emprestou faliu, a IF não pode contar com esses
recursos para pagar os seus credores.
É disso que trata a Resolução CMN 2.682/1999 – e de sua substituta, a Resolução CMN 4.966/2021, com as atualizações da
Resolução CMN 5.019/2022: crédito que não vai receber é "provisionado" (lançado como perda/prejuízo potencial).
O provisionamento desse valor acabará por diminuir o lucro e, com isso, reduzir o imposto pago sobre o lucro porque o lucro
diminuiu por esse prejuízo, sendo pago sobre um lucro menor.
— Depois, se receber o todo ou parte disso, vai resultar em lucro e o imposto será pago.
➢ A diferença entre tratamento prudencial e tributário vai acabar – ou pelo menos reduzir bastante – a partir de 2025: a
Lei 14.467/2022 aproxima o tratamento fiscal do tratamento prudencial para perdas em crédito; e a Resolução CMN
4.966/2021, com as atualizações da Resolução CMN 5.019/2022, revoga a Resolução CMN 2.682/1999 a partir de 2025,
atualizando a tratativa.
Assunto muito distorcido, criando falsa polêmica. Ou agora se está propondo pagar imposto sobre lucro também sobre
prejuízo? Vamos focar em discussões relevantes!
26
Banco Central com autonomia, quais as “inconsistências”?
— E a independência em relação aos mercados?
➢ O papel da Autoridade Monetária requer, algumas vezes, enfrentar os interesses do “Mercado” e, até, confrontar suas
perspectivas, análises e prognósticos.
➢ A independência em relação aos “mercados” não foi, ainda, trabalhada adequadamente no marco legal do BCB, sendo
mais objeto de tratativas no âmbito do “Código de Ética do BCB” e da “Comissão de Ética Pública da Presidência da
República”.
— E a “politização” nas indicações para presidente e diretores do BCB?
➢ Membros de diretoria de bancos centrais respeitados evitam participação em eventos e reuniões políticas sem relação
ao BC – o atual presidente do BCB “contratou” críticas à autonomia do BCB quando se comportou como apoiador
político do governo anterior e mantendo esse comportamento inclusive após o atual Governo já ter assumido.
➢ Com os mandatos e proteção contra exoneração, cresce o risco de ocorrer uma maior “politização” nas indicações para
presidente e diretores do BCB.
— O BCB tem seu principal objetivo, a “meta de inflação”, estabelecido externamente, pelo CMN, onde o governo eleito tem
maioria.
➢ Caso o governo considere que a ação do BCB não esteja alinhada aos objetivos do governo eleito, alterações podem se
dar via ajustes nos objetivos definidos externamente – bastaria votarem no CMN pela alteração da meta de inflação que
o BCB tem de perseguir, bem como alterar e ampliar a composição do CMN.
— E qual é o “nível de desemprego ideal”?
➢ Para o banco central o nível de desemprego aceitável é o que não causará inflação (a chamada “taxa natural de
desemprego” do regime de metas para inflação), não necessariamente o menor desemprego possível. 27
Banco Central com autonomia e “comportamento” recente
— Foi apenas “técnico” o tom (de confronto) do comunicado e da ata da 253ª reunião do Copom?
— Foi adequada a declaração do atual presidente do BCB fazendo parecer que o SMPI é só aplicar o resultado da resposta da
pesquisa Focus? Tem-se de ter cuidado com o "case Libor" (quando operadores manipularam a taxa atuando sobre as
vulnerabilidades da metodologia – o que levou ao fim da Libor).
➢ O atual presidente do BCB antecipou que não vai reduzir a Selic enquanto a expectativa de inflação do Relatório Focus
não reduzir; a inflação do Relatório Focus é resultado da média do que os analistas econômicos – majoritariamente do
Sistema Financeiro – respondem na pesquisa; se os analistas decidirem "operar" na pesquisa para imputarem
expectativas de inflação mais altas, a média resultante será mais alta e com isso assegurarão Selic mais alta que
beneficia aos operadores do sistema financeiro.
• As expectativas têm grande influência no resultado econômico, principalmente na inflação, mas se a expectativa é
um dos fatores e não o único; é condição necessária, mas não suficiente. A expectativa da inflação faz parte do
SMPI, mas o BCB sempre teve uma visão mais ampla, apesar de a declaração do atual presidente do BCB fazer
parecer limitada à inflação resultante da pesquisa Focus.
 Na pesquisa Focus, o BCB analisa, também, a coerência entre inflação e Selic; não olha somente média e
mediana: olha quem mudou, quando mudou, quantos mudaram, qual a mudança.
— Está totalmente correto o cálculo da duração futura necessária do atual nível da Selic?
➢ Se está correto agora, esteve correto a piso e a duração da Selic adotada no governo anterior?
— Se o atual presidente do BCB disse que a Selic teria que ser de 26,5% para atingir a atual meta de inflação e dado que o
atual presidente do BCB descumpriu a meta em 2021 e 2022, está adequada essa meta?
➢ Caso a meta de inflação não esteja adequada, alterações podem se dar via CMN.
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Referências:
➢ ESTRELA, Márcio Antônio. “Autonomia do Banco Central do Brasil após a Lei Complementar 179/2020”. Revista Brasileira
de Comércio Exterior (RBCE)/Funcex, Rio de Janeiro, Edição 147, 2021, p. 18-22. Link: https://funcex.org.br/info/rbce-147-
abril-maio-junho-2021/autonomia-banco-central-brasil-apos-lei-complementar-170-2021 (ou:
http://www.funcex.org.br/rbce/rbce147/mobile/index.html).
➢ ESTRELA, Márcio Antônio. “Moeda, Sistema Financeiro e Banco Central – Uma Abordagem Prática e Teórica sobre o
Funcionamento de uma Autoridade Monetária no Mundo e no Brasil”. Rio de Janeiro: Fundação Cesgranrio, 2011 –
material utilizado nos cursos de formação de servidores do BCB.
➢ ESTRELA, Márcio Antônio. “Banco Central – não é ‘Prejuízo’ nem ‘Lucro’, é resultado da política monetária”. LinkedIn,
28.2.2023. Link: https://www.linkedin.com/posts/marcio-a-e-25a1aa18_como-esperado-com-a-valoriza%C3%A7%C3%A3o-
do-real-activity-7034177769651486720-o7nz?utm_source=share&utm_medium=member_desktop
➢ ESTRELA, Márcio Antônio. “Provisionamentos e impostos – Bancos NÃO estão transferindo o prejuízo da Americanas para
o Governo: imposto sobre lucro não incide sobre prejuízo”. LinkedIn, 1.3.2023. Link:
https://www.linkedin.com/posts/marcio-a-e-25a1aa18_cmn-americanas-cmn-activity-7036633908968402945-
xPpD?utm_source=share&utm_medium=member_desktop; complementado em:
https://www.linkedin.com/feed/update/urn:li:activity:7036633908968402945?commentUrn=urn%3Ali%3Acomment%3A%
28activity%3A7036633908968402945%2C7037072253972340736%29
➢ Lei Complementar Nº 179, de 24 de fevereiro de 2021 (“Objetivos e Autonomia do BCB”):
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp179.htm
➢ Lei Nº 13.820, de 2 de maio de 2019 (“Relação BCB x Tesouro”): http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-
2022/2019/lei/L13820.htm
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