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Alagoinhas-BA
2022
FABIANA DOS SANTOS DIAS
Banca examinadora:
Profa. Dra. Marilécia Oliveira Santos (UNEB)
Profa. Dra. Luana Carla Campos Akinruli (UFMG)
Prof. Dr. Raimundo Nonato Pereira Moreira (UNEB)
Alagoinhas-BA
2022
Sistema de Bibliotecas da UNEB
Biblioteca Carlos Drummond de Andrade – Campus II
Rosana Cristina de Souza BarrettoBibliotecária – CRB 5/902
CDD 320.98142
Dedico este trabalho às minhas irmãs,
maiores incentivadoras, e aos
meus pais, Maria e Tolentino.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, como não poderia deixar de ser, pois me deu forças para chegar
aonde jamais imaginei.
Aos meus pais, que mesmo sem estudo trabalharam duro para que todos os filhos
tivessem oportunidades as quais eles não tiveram. Mesmo sem entender direito o que eu tanto
estudava, e sem poder dar o aporte necessário para manter a minha vida acadêmica, me
ensinaram a lutar pelo que eu queria. Para eles toda a minha gratidão e amor.
Sou grata às minhas irmãs, em especial Diana, Tatiana e Elenice, por todo o incentivo
e apoio que sempre depositaram em mim.
Ao meu marido Daniel, agradeço a paciência de sempre. Sempre compreensivo em
entender os dias que eu não podia sair, nem fazer coisas simples do dia a dia, assim como as
noites em claro que passei afundada nos livros. Um grande companheiro que a vida me deu.
Grandiosamente agradeço à minha orientadora, Marilécia Oliveira. Sou de poucas
palavras em nossas conversas, mas às lagrimas vem aos olhos quando escrevo este
agradecimento, acredito que ela nem imagina o quanto é importante para mim. Mais que uma
orientadora, foi uma incentivadora. Agradeço pela compreensão nos dias difíceis, pela
paciência com a escrita. Obrigada por tudo e por tanto.
Aos meus colegas do mestrado, pelo companheirismo tão importante para os dias
difíceis, pois de várias formas nos ajudamos e incentivamos. Agradeço por ter convivido e
aprendido com vocês nesse período.
Aos professores, à coordenação, e aos técnicos do programa de Pós-Graduação em
História, Cultura e Práticas Sociais, que nos deram o aporte necessário para a realização desta
pesquisa.
RESUMO
This dissertation investigates the trajectory of the Santinho colonel in the city of Alagoinhas,
in the state of Bahia. Chronologically orientated by the years of existence of the colonel, from
1883 to 1963. The current approach checks his political, commercial and family connections
in the Riacho da Guia district, rural area of Alagoinhas. The place acted as the focus location
of this research, given that Santinho colonel centered all his activities in Riacho da Guia,
where it was pursued the identification of historical elements of the coronelismo through the
practical analysis of Santinho in the region. With the goal of embracing the principal political
scenario that Santinho colonel passed on during his life journey, this study also looks into his
participation on the First Republic and the 1930’s Revolution context, as well as the political
positions that defended as he stood in opposition of the Getúlio Vargas government, and
subsequent of his change, with the end of the New State, by joining the PSD party, with the
aim of understading the aspects of the coronelismo created in Riacho da Guia from the
behavior of Santinho during this time period.
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 11
CAPÍTULO 01: CORONEL SANTINHO: ORIGENS REGIONAIS E COMERCIAIS 19
1.1 ORIGENS REGIONAIS E FAMILIARES ........................................................................ 19
1.2 ALAGOINHAS .................................................................................................................. 32
1.3 AS INSTALAÇÕES NO RIACHO DA GUIA .................................................................. 39
1.4 O COMÉRCIO DO FUMO ................................................................................................ 47
CAPÍTULO 02: O CORONEL SANTINHO NAS CONJUNTURAS DA PRIMEIRA
REPÚBLICA E DA REVOLUÇÃO DE 1930...................................................................... 58
2.1 ATUAÇÃO DOS FAMILIARES DE SANTINHO NAS DISCUSSÕES SOBRE A
REPÚBLICA ............................................................................................................................ 58
2.2 ADESÃO DE ALAGOINHAS E RIACHO DA GUIA AO MOVIMENTO
REPUBLICANO ...................................................................................................................... 63
2.3 PRÁTICAS CORONELISTAS DE SANTINHO .............................................................. 66
2.4 PARTICIPAÇÃO DE SANTINHO NA CONJUNTURA DE 1930 ................................. 74
CAPÍTULO 03: CORONEL SANTINHO: OPOSIÇÃO E REDEMOCRATIZAÇÃO.. 81
3.1 EM OPOSIÇÃO ................................................................................................................. 81
3.2 CORONEL SANTINHO NO PERÍODO DO ESTADO NOVO ....................................... 94
3.3 POSIÇÃO POLÍTICA DE SANTINHO NA REDEMOCRATIZAÇÃO ........................ 104
3.4 FINALIZANDO A CARREIRA ...................................................................................... 116
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 122
FONTES ................................................................................................................................ 126
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 128
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem o objetivo de analisar a trajetória de José Lúcio dos Santos
Silva (1883-1963), popularmente conhecido como coronel Santinho do Riacho da Guia1, na
cidade de Alagoinhas, na Bahia, buscando compreender elementos da história do coronelismo
na região por meio da análise das suas práticas. A discussão desta trajetória não pode passar
ao largo das mudanças políticas ocorridas nas conjunturas em que ele viveu, como a Primeira
República, a Revolução de 1930, o Estado Novo em 1937, e a redemocratização política, em
1945.
Filho de Antônio Lucio dos Santos Silva e Thereza Maria de Jesus, José Lúcio nasceu
em 15 de abril de 1883 na fazenda Prompto, localizada na zona rural de Alagoinhas. Em
1911, mudou-se com a família para o Riacho da Guia, um distrito de Alagoinhas, onde
desenvolveu atividades comerciais relacionadas principalmente ao comércio do fumo. Na vida
política, Santinho iniciou sua carreira como membro do Conselho Municipal de Alagoinhas
em 1907, mesmo ano em que recebeu sua patente de coronel, com 25 anos de idade. Foi
vereador do município por diversos mandatos representando o Riacho da Guia, falecendo em
1963, aos 80 anos de idade.2
Analisar a trajetória do coronel Santinho implica contextualizar todo o período em que
esteve envolvido, assim como compreender os elementos do coletivo e do social da cidade de
Alagoinhas e seus arredores. Edward Hallet Carr, considera que “a sociedade e o indivíduo
são inseparáveis; que são necessários e complementares um ao outro.”3 A trajetória do
coronel Santinho nos oferece essa rica complexidade da relação entre o individual e o social, e
a busca pela reconstituição da experiência de Santinho possibilita conhecer novos aspectos do
passado de Alagoinhas.
Concernente ao viés coronelista desta investigação, uma vertente que exerce grande
influência sobre as discussões em torno do coronelismo é a enfatizada por Victor Nunes Leal,
1
Nesse ponto é necessário esclarecer e diferenciar a trajetória do coronel Santinho de outros homens de mesma
nomenclatura e que tiveram suas trajetórias também analisadas por outros pesquisadores, a saber: a tese de Ceci
Vieira Juruá, Estado e Construção Ferroviária: quinze anos decisivos para a economia brasileira, 1852-1867, a
autora trata do visconde de Pirajá, também conhecido como coronel Santinho, e João José Reis no livro A Morte
é uma festa, também menciona um visconde de Pirajá que era chamado de coronel Santinho. Ver: JURUÁ, Ceci
Vieira. Estado e construção ferroviária: quinze anos decisivos para a economia brasileira, 1852-1867. Tese.
(Doutorado em Políticas Públicas e Formação Humana) – Faculdade de Educação –Universidade do Estado do
Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2012.; REIS, João José. A morte é uma festa: Ritos fúnebres e a revolta popular
no Brasil no século XIX. São Paulo: Companhia das Letras, 1991.
2
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011.
3
CARR, Edward Hallet. “A sociedade e o indivíduo”. In: CARR, Edward Hallet. Que é História? Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1982, p.67-90.
12
Nessa perspectiva, esse estudo visa investigar a história política a partir da trajetória
do coronel Santinho, que foi um homem aparentemente comum no seu grupo social, assim
como tantos outros na cidade de Alagoinhas, mas que conseguiu ganhar destaque e certa
4
CPDOC. Verbete do coronelismo. Disponível em: http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-
tematico/coronelismo. Acesso em: 05 fev. 2022. ver: LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, enxada e voto: o
município e o regime representativo no Brasil. São Paulo: Editora Alfa- Ômega, 1948.
5
JANOTTI, Maria de Lourdes Mônaco. Coronelismo: uma política de compromissos. São Paulo: Editora
Brasiliense, 1981.
6
REMOND, René. Por uma História Política. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003, p.19.
13
visibilidade no cenário político da cidade, através do título de coronel e de tudo que ele
abarcava.
Este estudo também tem um traço biográfico, na medida em que busca nortear o
trabalho com as características biográficas do coronel. Para Vavy Pacheco Borges, a biografia
se configura como um caminho para conhecer não somente uma pessoa, como também uma
época, a sociedade em que ela viveu, como uma fonte de conhecimento do ser humano por
meio da qual percebe-se a sua grande variedade em tempos e espaços diferentes, e que a vida
do biografado fornece pistas para outras fontes, pois carrega uma multiplicidade de
características de uma época.7
Para Pierre Bourdieu, seria uma ilusão tratar a trajetória de vida como um relato
coerente e sequencial, porque “o real é descontínuo” e a história de vida é imprevista, de
forma que para compreendermos uma trajetória é necessário analisar o seu espaço de
construção, o campo no qual ela se desenrola, e as relações que a envolve, pois cada indivíduo
age de forma diferente, de acordo com o campo e espaço que ele se relaciona.8
Dessa forma, o recorte temporal deste trabalho tem como ponto de partida o
nascimento do coronel Santinho, em 1883, avançando para o momento da sua ascensão
política, até o seu falecimento em 1963. A priori, a intenção era tratar de um recorte temporal
menos extenso, entretanto, em se tratando do momento de dificuldade vivido em virtude das
medidas de isolamento social em face da pandemia da Covid-19, que impediu o acesso a
algumas fontes, optamos por manter o recorte temporal que se refere a toda a trajetória de
vida do coronel Santinho, pois de outra forma, haveria lacunas na construção desta
dissertação. Ainda que em alguns períodos permaneçam algumas lacunas, em virtude mesmo
da dificuldade apontada anteriormente.
Em se tratando do recorte espacial, este estudo se debruça sobre a cidade de
Alagoinhas, que surgiu em meados do século XIX. A cidade que teve seu crescimento
associado principalmente à chegada da linha férrea em 1863, se tornou no início do século
XX uma das cidades mais importantes da economia baiana.9 Atrelado a cidade de Alagoinhas,
tratamos também do Riacho da Guia, local onde Santinho residiu com a família a maior parte
de sua vida, e que possibilitou ao coronel considerável aumento de seu poder político e
econômico. Ademais, o Riacho da Guia tornou-se importante neste estudo por ser o centro das
7
BORGES, Vavy Pacheco. “Grandezas e misérias da biografia”. In: PINSKY, Carla (org.). Fontes históricas. 3ª
ed. São Paulo: Contexto, 2011, p.214-215.
8
BOURDIEU, Pierre. A ilusão biográfica. In: AMADO, Janaina & FERREIRA, Marieta M. (orgs.). Usos e
abusos da história oral. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas. p.185.
9
LIMA, Keite Maria Santos do Nascimento. Entre a Ferrovia e o Comércio: Urbanização e Vida Urbana em
Alagoinhas (1868-1829) Dissertação. (Mestrado em História) - Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2010.
14
relações de poder que o coronel mantinha nas diversas esferas de sua vida, e por estar
enraizado também em seu próprio nome, pois era conhecido por todos que conviveu como
coronel Santinho do Riacho da Guia.
O interesse pela temática surgiu da necessidade de um estudo mais aprofundado sobre
a trajetória do coronel Santinho, e a intenção com esta dissertação de mestrado foi realizar um
estudo mais específico sobre a participação do coronel no meio político e econômico da
região. O primeiro contato com o tema ocorreu por meio de uma exposição de objetos e
documentos do coronel, que foram doados pela família para a Fundação Iraci Gama de
Cultura (FIGAM), localizada em Alagoinhas, em meados de 2014. Destacamos que esta
pesquisa teve início com a monografia, que tinha em vista trabalhar com a documentação
existente naquela fundação. Entretanto, no referido Trabalho de Conclusão de Curso de
Licenciatura em História10, houve dificuldades no manuseio da documentação que ainda não
estava catalogada naquele período.11 Dessa forma, me propus a analisar, na monografia,
aspectos da vida do coronel Santinho tomando como fonte principal a memória construída
sobre ele por seus familiares, a saber, o livro Coronel Santinho do Riacho da Guia12, de
autoria de sua neta, Maria Da Guia Silva Lima.13
Neste estudo atual, procuramos fazer uma análise da trajetória do coronel com
intermédio de novas fontes. Todavia, a memória ainda é uma parte importante desse estudo,
pois foi responsável por nortear a condução deste trabalho, fornecendo pistas que
perseguimos. Entretanto, a tarefa de analisar a reconstrução do passado por meio da memória
10
DIAS, Fabiana dos Santos. Nos Rastros da Memória: Coronel Santinho do Riacho da Guia pelo olhar de Maria
da Guia Silva Lima (1883-1963). Monografia. Licenciatura em História pela Universidade do Estado da Bahia-
UNEB Campus II, Alagoinhas, 2017.
11
Não sabemos ao certo se a documentação referida já foi catalogada, para este trabalho não conseguimos acesso
à documentação, pois a instituição se manteve fechada em razão da pandemia de Covid-19.
12
No livro Coronel Santinho do Riacho da Guia, Maria da Guia retrata a trajetória de vida do coronel Santinho,
desde o seu nascimento à sua morte, em uma narrativa repleta de detalhes minuciosos sobre a vida familiar,
econômica e política do coronel, baseadas nas suas memórias, e também nas de familiares e moradores do
Riacho da Guia. O livro também conta com um posfácio escrito por Wilis Filho, bisneto primogênito do coronel.
A obra teve sua primeira edição publicada em 1997, em versão alemã, e em 2011, ano que completaria 100 anos
da chegada do coronel ao Riacho da Guia, a autora publicou uma versão em português, uma edição revisada e
com acréscimos.
13
Maria da Guia iniciou o curso secundário no Ginásio de Alagoinhas, e terminou os estudos no colégio
Imaculada Conceição em Fortaleza. Formou-se em medicina, pela Universidade Federal do Ceará em 1960,
recebendo medalha de ouro por se classificar em primeiro lugar nos estudos, e bolsa de estudos na Santa Casa de
Misericórdia do Rio de Janeiro. Em 1962 foi admitida como professora assistente da UFC, trabalhou no Instituto
Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro, e defendeu sua tese de doutorado no Departamento de Bioquímica no centro
de Estudos Nucleares de Grenoble, na França. Foi chefe do Departamento de Bioquímica por quatro mandatos,
bolsista do CNPq, publicando artigos em revistas científicas nacionais e internacionais. Atualmente Maria da
Guia é aposentada como professora titular de Bioquímica na Universidade Federal do Ceará (UFC). (Dados
extraídos do livro Coronel Santinho do Riacho da Guia).
15
encontra vários fatores e questionamentos que necessitam ser feitos, pois para analisar a
memória é necessário considerar o contexto social como sua base de reconstrução.
No livro Coronel Santinho do Riacho da Guia, observamos que as memórias sobre o
coronel partiram não apenas da autora, mas também do grupo familiar e de moradores do
Riacho da Guia, de forma que a narrativa presente no livro se constitui como uma memória
familiar ou coletiva. De acordo com as contribuições de Maurice Halbwachs, relacionado a
categoria de “memória coletiva”, a memória resulta de um processo coletivo, com um
contexto social específico, pois o indivíduo que lembra e rememora está sempre inserido em
um grupo social, de forma que a memória se constitui coletivamente, estando sujeita a
mudanças e transformações constantes.14 Entendemos que a construção da memória familiar
depende do ponto de vista de quem a escreve, podendo ser escrita em favor de um ideal, ou
para resgatar uma identidade ou identificação como descendência de alguém que teria sido
importante, como podemos observar na narrativa presente no livro de Maria da Guia.15
Cabe destacar alguns trabalhos de historiadores locais que, em suas investigações,
mencionaram o coronel Santinho. Keite Maria Santos Lima, no artigo Coronel Saturnino da
Silva Ribeiro: de caixeiro a intendente. Alagoinhas–Ba (1905-1937), descreveu o coronel
Santinho como figura importante da política local, ao tratar dos laços mantidos por Saturnino
Ribeiro com os políticos da região;16 Ede Ricardo de Assis Soares, na dissertação Os
Comunistas e a Formação da Esquerda (Alagoinhas, 1945-1956), identificou o coronel
Santinho como integrante do partido PSD (Partido Socialista Democrático), e como o político
mais poderoso do Riacho da Guia17; e na tese de doutorado de Eliana Evangelista Batista,
intitulada A Bahia para os baianos - Acomodação e reação política ao Governo de Getúlio
Vargas (1930-1937), a autora retratou o coronel Santinho como um dos maiores produtores de
fumo da região, e maior rival político do prefeito Mário Cravo.18 Todos esses estudos
inseriram em suas análises a participação de Santinho na política da região. Entretanto, são
14
HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Centauro, 2013, p. 43.
15
BARROS, Miriam Moraes Lins de. Memória e Família. Rio de Janeiro: Estudos Históricos, 1989.
16
LIMA, Keite Maria Santos do Nascimento. Coronel Saturnino da Silva Ribeiro: de caixeiro a intendente.
Alagoinhas – Ba (1905-1937). In: XXVII SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA – Conhecimento histórico e
diálogo nacional, Natal/RN, 2013. Disponível em:
http://www.snh2013.anpuh.org/resources/anais/27/1365196912_ARQUIVO_KEITENASCIMENTO.pdf Acesso
em: 22 mar. 2022.
17
SOARES, Ede Ricardo de Assis. Os Comunistas e a Formação da Esquerda (Alagoinhas, 1945-1956).
Dissertação. (Mestrado em História Social) - Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal
da Bahia, Salvador, 2013.
18
BATISTA, Eliana Evangelista. A Bahia para os baianos. Acomodação e reação política ao governo de
Getúlio Vargas (1930-1937). Tese. (Doutorado em História Social) - Faculdade de Filosofia e Ciências
Humanas, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2018.
16
estudos que investigam outros temas da história local de Alagoinhas e da Bahia, de forma que
não há um aprofundamento específico na trajetória do coronel.
Nessa perspectiva, esta investigação se propõe a analisar a trajetória do coronel
Santinho com um olhar mais detido, buscando compreender mais as características da sua
trajetória. Para isso, utilizamos como fontes dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), a fim de compreendermos a estrutura rural e urbana de Alagoinhas, seu
contingente populacional, e as questões relacionadas a economia e agricultura da região no
período estudado. Algumas atas da Câmara Municipal de Alagoinhas também foram
analisadas, para entender a atuação política do coronel em alguns dos mandatos de vereador
que exerceu.
Os jornais locais também foram de suma importância para este estudo, pois
permitiram observar quais as visões sobre coronel Santinho veiculadas nestes periódicos na
localidade, e também para identificar aspectos políticos da cidade nas diversas conjunturas
que cobrem o período analisado. Dessa forma, utilizamos o jornal Correio de Alagoinhas, o
Jornal O Nordeste, o Jornal O Popular, o Alagoinhas Jornal, e o Jornal de Alagoinhas, este
último que pertenceu ao próprio coronel Santinho e nos deu informações importantes sobre
suas posições políticas. Para tratar dos momentos posteriores a Revolução de 1930, utilizamos
periódicos digitalizados, encontrados nos sites da Fundação Getúlio Vargas, da Hemeroteca
Digital e do Instituto Histórico Geográfico Brasileiro, a saber, o jornal A Batalha (RJ), À
Tarde (BA), Diário de Notícias (RJ), Jornal do Brasil (RJ), Correio da Manhã (RJ), A Pátria
Baiana (BA).
Cabe destacar que os jornais, assim como outros meios de comunicação, tornaram-se
importantes fontes documentais para o historiador na medida em que se apresentam como
ferramentas capazes de desvendar aspectos importantes das relações sociais de uma época. O
emprego da imprensa nos estudos tem se intensificado em diversas áreas do conhecimento
humano. “Nos diversos campos de pesquisa, da comunicação à semiótica, da crítica literária à
educação, a imprensa aparece como fonte e também como objeto de pesquisa.”19 Na
investigação histórica, a utilização de jornais está cada vez mais generalizada, pois houve uma
maior valorização dos jornais como fonte pela historiografia, sobretudo nas últimas décadas.
A parcialidade presente nos jornais, e que foram aspectos que restringiam seu uso como fonte
histórica pelas desconfianças das narrativas que portavam, hoje são vistas como importantes
19
CRUZ, Heloisa de Faria; PEIXOTO, Maria do Rosário da Cunha. Na Oficina do Historiador: conversas sobre
História e imprensa. Projeto História, São Paulo, n.35, p.253-270, dez. 2007.
17
para adentrar na arena das disputas dos grupos que os veículos estiveram vinculados em seu
período de circulação.
Destaca-se também como fontes para esta pesquisa os livros de memórias locais, que
nos forneceram uma compreensão mais abrangente das questões que envolvem o social, o
político e o econômico da cidade de Alagoinhas, a exemplo do livro Alagoinhas e seu
Município de Américo Barreira20, importante memorialista que escreveu sobre a história da
cidade do seu nascimento aos primeiros anos da República. Américo Barreira foi redator do
jornal Diário de Notícias em Salvador, e redator chefe do jornal O popular de 1901 a 1910,
em Alagoinhas.21 Médico, ele mudou-se para a cidade em 1897, com a função de dar
assistência aos prisioneiros da guerra de Canudos, atendidos em Alagoinhas, onde também
acompanhava de perto as epidemias que assolavam a cidade, principalmente a varíola, que
ocasionou milhares de falecimentos na região, entre os anos de 1886 a 1890.22 Em seu livro,
ele conta a história de Alagoinhas principalmente através de memórias, muitas das quais
foram testemunhadas pelo próprio autor.
Salomão Barros foi outro importante memorialista que escreveu sobre a cidade de
Alagoinhas. Segundo Thales de Azevedo23, que escreveu o prefácio do livro de Salomão
Barros, ele nasceu em 7 de junho de 1899, foi funcionário público, telegrafista, gráfico e
jornalista.24 Escreveu sobre Alagoinhas tomando como base dados de noticiários locais,
principalmente de O Popular e do Diário Popular, dos quais foi redator. Em seu livro Vultos
e feitos do município de Alagoinhas, ele se propôs a escrever sobre personagens e episódios
da cidade desde o final do século XVIII, descrevendo nomes, datas, lugares e acontecimentos
específicos da cidade. Sua obra aborda aspectos do desenvolvimento urbano da cidade, os
aspectos econômicos, políticos e sociais da vida urbana, e toma como referência o livro de
Américo Barreira, com a perspectiva de dar continuidade ao trabalho do mesmo.
20
BARREIRA, Américo. Alagoinhas e Seu Município: Notas e apontamentos para futuro. Alagoinhas:
Typografia do Popular, 1902.
21
BARROS, Salomão. Vultos e feitos do município de Alagoinhas. Salvador: Artes Gráficas, 1979, p.298.
22
BARREIRA, Américo. Alagoinhas e Seu Município: Notas e apontamentos para futuro. Alagoinhas:
Typografia do Popular, 1902, p.155.
23
Thales Olympio Góes de Azevedo nasceu em 1904 na cidade de Salvador, na Bahia. Na juventude seguiu
carreira médica, doutorando-se em 1927 pela Faculdade de Medicina da Bahia. Ainda estudante de medicina,
começou a escrever na imprensa local. Foi revisor do Diário Oficial da Bahia, do Diário da Bahia e do jornal A
Tarde. Em1949, escreveu “Povoamento da Cidade de Salvador”, obra que o credenciou para a dirigir a primeira
Cadeira de Antropologia e Etnografia do Brasil, na Faculdade de Filosofia da Bahia. A partir de então, Thales de
Azevedo tornou-se um dos antropólogos e etnólogos mais importantes do Brasil. Publicou vários trabalhos,
muitos dos quais baseados em pesquisas originais. Colaborou como professor e pesquisador em diversas
instituições científicas e culturais, na Bahia e em outros estados, e também ocupou cargos de projeção nacional
durante sua carreira, falecendo em 1955. Disponível em: http://ilustresdabahia.blogspot.com/2014/12/thales-de-
azevedo.html. Acesso em: 12 jul. 2022.
24
BARROS, Salomão. Vultos e feitos do município de Alagoinhas. Salvador: Artes Gráficas, 1979, p.06.
18
Outro livro de memórias que foi importante para este trabalho é Coronel Santinho do
Riacho da Guia, de Maria da Guia Silva Lima, que carrega as memórias de familiares sobre o
coronel Santinho, e relata a trajetória do coronel desde seu nascimento ao seu falecimento,
possibilitando a compreensão da estrutura familiar, econômica e política do coronel. O livro
também traz em anexo, nas suas últimas páginas, cópias de documentos pessoais do coronel,
fotografias da família, manchetes de jornais, bem como correspondências com políticos, que
também foram utilizadas como fonte para este trabalho.
As memórias de Joanitta Cunha, em Traços de Ontem, também nos permitiram
entender o cenário da cidade de Alagoinhas na primeira metade do século XX. Na obra a
autora rememora a sua vida familiar na cidade, desde a sua infância até a juventude e
casamento, onde também retrata aspectos da sociedade local, bem como sua estrutura
econômica, urbana e política. Seu trabalho permite adentrar nas características da sociedade
alagoinhense naquele período.
O resultado deste estudo foi dividido em três capítulos, que procuram seguir uma
ordem cronológica a partir da trajetória de vida do coronel Santinho. O primeiro capítulo tem
como título Coronel Santinho: origens regionais e comerciais, onde buscamos entender os
elementos da trajetória de vida do coronel desde o momento anterior ao seu nascimento,
atrelados a zona rural de Alagoinhas, sobretudo o Riacho da Guia, objetivando entender as
origens regionais e familiares das quais ele veio, bem como a importância que a localidade
conferiu à sua carreira comercial na produção e comercialização do fumo.
O Segundo capítulo tem como título O Coronel Santinho nas conjunturas da Primeira
República e da Revolução de 1930, em que fazemos uma análise de dois períodos de mudança
na política brasileira, a Primeira República e a Revolução de 1930, onde investigamos a
entrada de Santinho no cenário político da Primeira República, bem como suas práticas
coronelistas, e por conseguinte, o seu envolvimento nas discussões políticas do movimento
revolucionário de 1930, objetivando compreender as posições políticas assumidas pelo
coronel naquele contexto.
No terceiro capítulo intitulado Coronel Santinho: oposição e redemocratização
política, analisamos o período posterior a Revolução de 1930, quando o coronel Santinho
esteve em oposição, buscando compreender aspectos daquele momento vivido por ele e o
possível impacto nas suas relações comerciais e políticas. Posteriormente tratamos do
momento de redemocratização eleitoral em 1945, e da escolha do coronel de se colocar a
favor do governo, em contradição com os anos em que esteve em oposição, seguindo para os
últimos anos do coronel Santinho e a continuidade da sua atuação na política local.
19
Discorrer sobre o coronel Santinho sem mencionar suas origens regionais significaria
ignorar suas raízes, uma vez que os locais em que ele viveu permaneceram entrelaçados em
sua história, como o seu lugar de pertencimento. Assim, trataremos neste capítulo das
principais localidades que Santinho viveu e se relacionou: Riacho da Guia e Alagoinhas, com
a problemática de entender o panorama regional que caracterizou a imagem de Santinho como
coronel, buscando reconstituir aspectos do ambiente social em que ele nasceu, seus laços
familiares, e o período inicial do seu crescimento econômico. Para este capítulo utilizamos
como fontes principais o livro de memórias Coronel Santinho do Riacho da Guia, dados do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e livros de memorialistas da região.
Um território se configura como uma área delimitada sob uma posse, seja de uma
pessoa ou de um grupo, de uma organização ou instituição, que corresponde a área de um
país, de um estado ou de um município.25Ao trabalhar com a cidade de Alagoinhas, na Bahia,
buscamos analisar não somente a cidade como um espaço territorial histórico, como também
o ambiente rural, identificando ambos como espaços de formação de identidade. De acordo
com Milton Santos, “é o uso do território, e não o território em si mesmo, que faz dele objeto
de análise social.”26 Nessa perspectiva, o objeto de análise deve ir além do território,
destacando as articulações existentes nesse espaço, e os atores sociais que dele se apropriam.
O território de Alagoinhas possuía, até os anos de 1950, uma área correspondente a 1449 km²,
fazendo limite com os municípios de Catu, Entre Rios, Inhambupe, Irará, Mata de São João,
Pojuca e Santo Amaro. O município se dividia em cinco distritos, Alagoinhas, Araçás, Boa
União, Aramari e o Riacho da Guia.27
Nesse momento, concentraremos essa investigação no distrito do Riacho da Guia. A
localidade teve significativa contribuição na trajetória do coronel, considerando que favoreceu
o seu desenvolvimento econômico, e que foi onde criou seus laços familiares. Foi nesta
localidade que José Lucio dos Santos Silva, o coronel Santinho, conviveu a maior parte da sua
25
TERRITÓRIO. Dicionário Online de Português. Disponível em: https://www.dicio.com.br/territorio. Acesso
em: 22 mar.2022.
26
SANTOS, Milton. “O retorno do território”. In: SANTOS, Milton; SILVEIRA, Maria Laura; SOUZA, Maria
Adélia (org.) Território– Globalização e Fragmentação. São Paulo, Hucitec/Anpur, 1994.
27
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Enciclopédia dos Municípios Brasileiros. Rio de
Janeiro, 1958, p.22. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br. Acesso em: 23 jan. 2022.
20
vida. Nasceu em 15 de abril de 1883, na fazenda Prompto, pertencente a seus pais, que se
localizava nas proximidades do distrito. Após formar sua família Santinho passou a residir de
fato no Riacho da Guia. Assim, ao tratar do Riacho da Guia adentraremos também nas origens
familiares e nas questões políticas e econômicas que envolveram a trajetória do coronel, pois
todas estiveram entrelaçadas no seu espaço de convivência.
O Riacho da Guia está localizado à vinte e sete quilômetros da cidade de Alagoinhas. 28
Na imagem 01, podemos observar um mapa que destaca a distância entre a cidade e o distrito
do Riacho.
28
Ibidem, p.21.
21
29
BARREIRA, Américo. Alagoinhas e Seu Município: Notas e apontamentos para futuro. Alagoinhas:
Tipografia do Popular, 1902. p. 217.
30
FRAGA FILHO, Walter. Mendigos, moleques e vadios na Bahia do século XIX. São Paulo/Salvador:
Editora Hucitec; EDUFBA, 1996.
31
Ibidem, p.17-24.
22
Ao que tudo indica, na região de Alagoinhas a situação era semelhante nesse período,
mesmo entre aqueles que já viviam nas lavouras da região, pois de acordo com as
investigações de crimes de furto em Alagoinhas e Inhambupe, feitas por Antônio Hertes de
Santana, na segunda metade do século XIX o furto era o segundo crime mais frequente na
região, ficando atrás apenas dos crimes de homicídio. A maioria dos bens furtados eram
animais de grande porte, objetos de valor, e produtos retirados diretamente da terra, como
raízes de mandioca. Segundo o autor, de todos os processos crimes analisados, a grande
maioria dos réus eram livres ou libertos que afirmavam viver da lavoura.32 Assim, as
autoridades locais buscaram agir no sentido de garantir a ordem, que nesse caso significava
manter as relações de dependência dos trabalhadores livres ou libertos com os proprietários de
terras.33
Analisando os dados do recenseamento do Brasil em 1872, observamos que na Bahia,
a maioria da população era composta por lavradores ou criadores, porém, a maior quantidade
estava relacionada àqueles identificados como “sem profissão”. Em Alagoinhas, a população
do período era de 17.076 habitantes, e a maior parcela populacional era composta por livres
ou libertos. Dentre as outras profissões destacadas, como advogados, médicos, comerciantes,
entre outros, a maioria das pessoas se encaixava na categoria dos “sem profissão”. 34 Podemos
pensar que, essa população era aquela que trabalhava nas lavouras, nas grandes e médias
fazendas das zonas rurais, ou aquelas que viviam da mendicância nas cidades, ou seja, a
população pobre.
Ao caracterizar como profissionais agrícolas os lavradores e criadores, é provável que
o censo estivesse se referindo aos proprietários de terras e de cabeças de gado, e não aos
trabalhadores braçais das fazendas agrícolas ou agropecuárias. Podemos inferir que a maioria
da população da região de Alagoinhas não possuía meios de trabalho ou uma profissão que
garantisse o seu sustento, e ao mesmo tempo, o ambiente rural poderia ser, nesses casos, o
principal meio de vida encontrado por essa parcela da população, que provavelmente não
tinha muitas opções.
De acordo com os estudos de Antônio Hertes de Santana, na região de Alagoinhas,
eram considerados ricos todos aqueles que trabalhavam com a produção agrícola voltada para
32
SANTANA, Antônio Hertes Gomes de. Conflitos pela propriedade e reordenamento do trabalho em
Alagoinhas e Inhambupe (1860-1890). Dissertação. (Mestrado em História) – Universidade Federal Rural do
Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2015.
33
Ibidem, p.74.
34
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Recenseamento do Império do Brasil em 1872.
Biblioteca do IBGE, Rio de Janeiro, 1872. Disponível em: Recenseamento Geral do Brazil 1872 (ibge.gov.br).
Acesso em: 25 maio. 2022.
23
o consumo interno e a exportação, que mantinham a criação de gado, e que possuíam mão de
obra escrava, livre ou liberta. Segundo o autor, mesmo aqueles que possuíam poucos escravos
eram considerados como ricos.35 Entendemos que a pobreza da população refletia na
caracterização de rico mesmo para aqueles que possuíam pouca quantidade de bens, pois
como reflexo da grande desigualdade em que a população vivia, possuir alguns bens
significava riqueza, em comparação com aqueles que viviam em extrema pobreza.
Não temos documentação que nos permita medir o grau de pobreza ou riqueza da
população do Riacho da Guia nesse período. Entretanto, em 1902, Américo Barreira
descreveu o Riacho da Guia como um local simples, com engenhos antes prósperos mas que
estavam abandonados, boas fazendas de gado e moradores humildes, e que poucos eram
saudáveis, a julgar por aqueles que iam se consultar com o médico em seus relatos.36
Provavelmente o distrito não tinha outras formas de renda, exceto alguns pequenos engenhos
que continuaram a vender “raspaduras do quizambu”, que de acordo com Barreira, eram
famosas na região. Entendemos assim, que a população do Riacho da Guia era desprovida de
bens valiosos, e que a maioria estava provavelmente submetida ao poder dos grandes e
médios fazendeiros da região.
Relacionado a este grupo de fazendeiros rurais, considerados como ricos, destacamos
Antônio Lucio dos Santos Silva, o pai do coronel Santinho, que não viveu propriamente no
distrito do Riacho da Guia, mas mantinha terras nas proximidades. A atividade de Antônio
Lucio naquela região estava voltada para agricultura, em que se dedicava a plantação de
mandioca, milho, feijão, e também do fumo. Além da agricultura, ele também trabalhava com
a criação de gado.37
A julgar pela desigualdade social existente no século XIX, os pais de Santinho
provavelmente vinham de uma família abastada, ou que acumulou alguma riqueza. Em meio
aos pertences do coronel, doados pela família à Fundação Iraci Gama, consta um documento
referente à quitação de venda de um escravo, deixado em inventário pelo avô de Antônio
Lucio da Silva, datado de 4 de maio de 1882, na fazenda Patioba. Antônio Lucio recebeu
como herança um escravo por nome Eduardo, e o documento se refere à venda do mesmo,
provavelmente a um parente próximo, o que fica explícito quando é relatada a frase “nosso
35
SANTANA, Antônio Hertes gomes de. Conflitos pela propriedade e reordenamento do trabalho em
Alagoinhas e Inhambupe (1860-1890). Dissertação. (Mestrado em História) – Universidade Federal Rural do
Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2015, p.22.
36
BARREIRA, Américo. Alagoinhas e Seu Município: Notas e apontamentos para futuro. Alagoinhas:
Tipografia do Popular, 1902, p.21.
37
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p.16.
24
avô” no documento.38 Não temos conhecimento sobre a quantidade de escravos que a família
de Santinho mantinha na região, mas a julgar pela indicação de riqueza do período, que
estava, entre outras coisas, no fato de possuir escravos, é provável que a família tivesse outros
escravos além do identificado no registro da família.
As raízes familiares de Santinho nas terras que correspondiam a zona rural do
município de Alagoinhas eram antigas. Segundo Maria da Guia, concernente a propriedades
de terras, o documento familiar mais antigo é datado de 1852, e faz referência à venda da
fazenda Prompto, pelo capitão Joaquim José da Costa a Manoel Ferreira de Sant’Anna, que
era o avô de Antônio Lucio, portanto bisavô de Santinho. Em 1894, as mesmas terras
pertenciam a José Domingos Pereira, que provavelmente as comprou de Manoel Ferreira de
Sant’Anna, e novamente as vendeu a Antônio Lucio da Silva, pai do coronel Santinho.39As
terras da fazenda Prompto posteriormente passaram a pertencer a Santinho, desta vez como
herança dos pais, pois o censo rural do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
menciona o coronel Santinho como seu proprietário no ano de 1920.40
De acordo com Maria da Guia, a fazenda Patioba também foi comprada pela família
de Santinho em 1897. As terras de Firmino Joaquim de Sant’Anna, tio de Santinho ficavam
em frente às do irmão, Antônio Lucio, indicando os laços familiares presentes na região,
como consta na planta das terras de Santinho demonstrada a seguir, executada pelo
agrimensor Joaquim Marcos de Souza Bastos, em que são descritas as terras da família, com
seus relevos e limites com outras propriedades.41
38
O documento aparenta ser um recibo de quitação, e encontra-se na Fundação Iraci Gama de Cultura, em
Alagoinhas, assim como outros documentos referentes ao coronel.
39
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p.17.
40
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Recenseamento do Brasil. Relação dos proprietários
dos estabelecimentos rurais recenseados no Estado da Bahia, Rio de Janeiro, 1920. p.25. Disponível em:
https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?id=217715&view=detalhes. Acesso em: 25 mai.
2022.
41
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p.18.
25
42
O referido documento tem uma cópia anexada ao final do livro “Coronel Santinho do Riacho da Guia”.
43
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p. 16.
44
BARROS, Salomão. Vultos e feitos do município de Alagoinhas. Salvador: Artes Gráficas, 1979. p. 177.
26
reafirma a ideia de que a família de Santinho possuía lugar de destaque no ambiente rural
daquela região.
Em relação às origens dos pais de Santinho, Maria da Guia assevera que o pai dele era
um português tranquilo, que gostava de um bom vinho e que tinha forte influência econômica
e política. Já a mãe de Santinho, Thereza, ou dona “Tetê”, foi descrita como uma mulher de
personalidade forte, que era conhecida como valente em suas decisões, que portava sempre
“uma garrucha na cintura”, e acordava todos os moradores muito cedo para rezar o Ofício da
Virgem Maria, antes de realizarem o trabalho no campo.45 Percebe-se que Maria da Guia
atribui características a seus descendentes que denotam um destaque, descrevendo o pai de
Santinho como um político com forte influência, e a mãe uma mulher forte, que também
mantinha certa autoridade sobre os moradores próximos.
Destaca-se que nos textos memorialísticos, como o de Maria da Guia, a escrita é mais
livre, e muitas histórias são reproduzidas através da oralidade, por integrantes da família, e no
já citado livro de memórias sobre o coronel Santinho é possível identificar momentos em que
a autora recorre à oralidade familiar para relatar alguns episódios vividos por sua família,
como no caso da descendência da mãe de Santinho. Assim ela discorre:
Sobre a mãe, Thereza Maria de Jesus, era dito á boca pequena ser uma
(cigana) (...) O depoimento de parentes remotos permitiu a seguinte
reconstituição: no tempo da construção da estrada de ferro de Alagoinhas em
direção ao rio São Francisco, um português Antônio de Souza Peixoto
ganhara dinheiro participando da execução e fora então habitar na localidade
(...) um dia, passou pela região um bando de ciganos que acampou nas
redondezas. Entre eles havia uma cigana jovem, que despertou o desejo de
Peixoto (...) algum tempo depois, localizou o bando no povoado conhecido
como Levada (...) não demorou muito para sair de levada com a ciganinha de
volta para a Roncaria. Da união de Peixoto com a ciganinha nasceu uma
menina, e assim organizou-se a vida familiar do casal (...), mas um dia, o
bando saiu mansamente da cidade e com ele seguiu a cigana tão
ousadamente conquistada. Ela deixou, porém a filhinha (...) esta menina
metade portuguesa metade cigana viria a ser a avó ou mãe de Thereza Maria,
a futura mãe do Coronel Santinho.46
Segundo este registro, por muito tempo o assunto da descendência da mãe do coronel
foi silenciado na família, talvez por vergonha das origens familiares, que contrastavam com a
origem dita portuguesa do pai de Santinho. No entanto, percebe-se que é um relato confuso
até mesmo para Maria da Guia, por ser uma história antiga, em que não há certeza de como
45
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011, p. 16.
46
Ibidem, p.20.
27
ocorreu. A própria autora afirma não saber se a história se referia à mãe ou a avó do coronel
Santinho. Isso também pode endossar o que ela afirmou sobre o assunto ser tratado a “boca
pequena”, afinal provavelmente não era uma origem considerada nobre, primeiro por se tratar
de uma descendência que resultava de um rapto, e segundo pela ascendência cigana, e talvez
por isso o ramo português tenha sido o mais enfatizado. Cabe destacar que a oralidade foi
importante neste resgate da história familiar feito por Maria da Guia.
Vindo de uma família já envolvida no meio político, é possível identificar que
Santinho foi preparado desde cedo para o exercício da vida política. Com o provável intuito
de fazer um sucessor, ainda criança Santinho foi enviado pelos pais para estudar na cidade de
Aporá, com o propósito de aprender latim, religião e aritmética, que era a base intelectual para
pessoas de sua condição social, e mais tarde foi mandado a Salvador, para estudar no Colégio
Interno do Mestre Carneiro Ribeiro, indicando uma preocupação da família em relação a sua
educação, provavelmente com a intenção de dar continuidade às atividades de Antônio Lucio,
que como vimos ocupava postos e funções de destaque na ocasião.
Ainda de acordo com Maria da Guia, no período em que Santinho estudava no
internato, no colégio Mestre Carneiro Ribeiro, nunca houve registro de queixas sobre o
desenvolvimento intelectual do mesmo, porém, logo ele teria conseguido entrar em atrito com
o diretor da escola, quando junto a colegas, compôs um poema apaixonado para a filha do
diretor. Segundo ela, “enquanto os colegas se eximiram da responsabilidade, Santinho
confessou sua participação na criação da composição, e por isso, foi mandado de volta pra
casa”.47 Ela afirma também, que um mês depois, um surto de febre amarela sobreveio a cidade
de Salvador, atingindo o colégio, e o colega que ocupara a cama que Santinho dormia logo
morreu, de forma que Santinho se considerava desde então um “protegido das rimas”, porque
a expulsão o salvou da morte.48
Percebe-se nesse relato que Santinho, provavelmente na sua adolescência, agia como
outros colegas, como em típicos casos de paixões adolescentes, em que se fazem declarações
amorosas. No entanto, Maria da Guia deixa claro que desde cedo ele já era diferente, e que ali
já se destacava com suas atitudes, ao reconhecer, diante do diretor da escola a sua
responsabilidade. Esta passagem do livro de Maria da Guia demonstra uma tentativa de
destacar as características de coragem e ousadia que a autora frequentemente atribuiu ao avô
em seu livro, e que nesse caso, ela procurou mostrar que ele tinha essas qualidades desde
cedo. Provavelmente com o intuito de reforçar a imagem de jovem promissor e inteligente que
47
Ibidem, p. 22.
48
Ibidem, p. 23.
28
a família cultuava a respeito de Santinho, Maria da Guia afirma que em pouco tempo de
estudos Santinho atingiu conhecimento que o permitia estabelecer confrontos com o próprio
mestre, e que vários anos mais tarde, traduziria os textos aprendidos para os netos, quando
esses se preparavam para prestar vestibular.49 É possível que de fato santinho tivesse esses
atributos, porém, fica evidente nas narrativas familiares a construção e alimentação da ideia
do coronel como um mito familiar, com características promissoras desde a infância.
Em fevereiro de 1905, com 21 anos, Santinho casou-se com Amélia Sant’Anna, filha
do seu tio Firmino Joaquim de Sant’Anna, portanto sua prima. Entretanto, Maria da Guia
afirma que essa não era a intenção de Santinho, pois ele teria se apaixonado por sua outra
prima, Júlia, também filha do seu tio Firmino, que, como já informamos, possuía terras em
frente às do pai de Santinho. Segundo os relatos presentes no livro, Firmino tinha cinco filhas,
Julia, Idelfonsa, Maria, Elisa e Amélia. Santinho teria preferido se casar com Julia, porque
ela era a mais bela e a única da família que aprendeu a ler e escrever. Entretanto, mesmo com
os bilhetes que o “preto Miguel” levava de uma fazenda a outra, o major Firmino não atendeu
a preferência sentimental de Santinho, destinando Julia a casar-se com o “coronel Zuza”, de
uma fazenda vizinha, enquanto que Santinho foi destinado a casar-se com Amélia.50 Mesmo
apaixonado por Júlia, a Santinho foi dada por esposa a outra irmã, Amélia. O desejo de
Amélia em relação ao casamento com Santinho não é mencionado por Maria da Guia.
Sabemos que no período a maioria dos casamentos derivavam de arranjos familiares, em que
principalmente as mulheres não tinham direito de escolher com quem se casariam. Todavia,
mesmo entendendo que a escolha provavelmente não agradou a Santinho, e talvez também a
Amélia, Maria da Guia faz questão de enaltecer o casamento dos avós e para isso fez críticas à
Julia, sua tia e antigo amor do coronel:
49
Ibidem, p. 18-22.
50
Ibidem, p. 24.
51
Ibidem, p. 25.
29
52
PAIXÃO, Carlos Nássaro Araújo. Traços da cidade de Alagoinhas: Memória, política e impasses da
modernização (1930-1949). Dissertação. (Mestrado em História Regional e Local) Departamento de Ciências
Humanas- Universidade do Estado da Bahia, Salvador, 2009. p. 59.
53
O referido registro está anexado ao final do livro Coronel Santinho do Riacho da Guia. Ver LIMA, Maria da
Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora, 2011.
30
Manoel Ferreira de Sant’Anna era avô de Antônio Lúcio dos Santos Silva e de seu
irmão, Firmino Joaquim de Sant’Anna. Antônio Lúcio casou-se com Thereza Maria de Jesus e
teve um único filho, José Lúcio dos Santos Silva (coronel Santinho). De seu irmão, Firmino
Joaquim, não identificamos o nome da esposa, mas que foi pai de cinco filhas: Júlia, Maria,
Elisa, Idelfonsa e Amélia. Esta última casou-se com José Lucio, seu primo. José Lúcio e
Amélia tiveram cinco filhas, das quais três vieram a falecer, tendo sobrevivido Amélia e
Teresa, que constituíram a descendência familiar legítima de Santinho. Amélia (filha) não
teve filhos e não se casou, e Teresa constituiu família ao casar-se com Antônio Silva Lima,
que tiveram dentre os seus filhos, Maria da Guia Silva Lima, que se empenhou a escrever
sobre a história de sua família.54
54
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p.15.
31
Reproduzimos a seguir uma fotografia presente no livro de Maria da Guia, que tem
como integrantes Santinho, sua esposa Amélia, e a primeira filha do casal, Alzira, que viera a
falecer posteriormente. A fotografia foi feita em 1908, e mostra um casal relativamente jovem
com semblante e roupas austeras, comuns para os registros fotográficos e poses do período. A
seriedade também vinha em função das questões técnicas, uma vez que, neste período, os
movimentos e mudanças de expressões costumavam “borrar” as imagens que para serem
capturadas precisavam de um longo tempo de exposição à luz. Não há informações sobre o
fotógrafo ou se a foto foi feita na residência ou em estúdio. Provavelmente foi feita na
residência pois não porta os objetos que costumam integrar as fotografias feitas em estúdios,
apenas as cadeiras em que estão sentados. No período em que foi tirada, Santinho ainda vivia
com os pais, na fazenda Patioba.
De acordo com Maria da Guia, fora do casamento Santinho tinha larga descendência,
que nunca foi reconhecida nem ajudada pelo coronel, fruto dos envolvimentos do mesmo com
outras mulheres, que resultavam em filhas, que segundo a autora eram sempre “reconhecidas,
além de reconhecíveis por sua semelhança física”. Segundo Maria da Guia Santinho teve
numerosas filhas, mas apenas um filho homem, e relata que, em determinada ocasião, o
32
coronel mostrou interesse em reconhecer o suposto filho, pedindo a seu genro que
encaminhasse a educação do menino, mas foi impedido pela esposa Amélia, que se achou
humilhada pela posição desafiadora que a mãe da criança assumiu, posição essa que a autora
do livro não deixa claro. Segundo o relato, o coronel atendeu ao pedido da esposa, não
assumindo o suposto filho..55
É possível que o coronel ajudasse de alguma forma esses filhos, ou ao menos tivesse
esse desejo, mas era barrado por sua esposa, que provavelmente sentia-se constrangida com a
situação, o que coloca também em contradição a autoridade do coronel enfatizada por Maria
da Guia, pois neste caso percebe-se um recuo de autoridade diante dos protestos da esposa.
Certamente se de fato ele desejasse dar assistência ao filho encontraria meios para fazê-lo, e
talvez o tenha feito, porém não há como saber sobre os desdobramentos deste episódio.
As investigações feitas até o momento, trataram da vida de Santinho enquanto este
vivia na dependência dos pais. Nesse período Santinho já mantinha certo domínio comercial,
pois de acordo com Maria da Guia ele já era agricultor e criador de gado. Entretanto, Santinho
muda-se para o distrito do Riacho da Guia, que corresponde a outra etapa da sua vida, e a
mudança talvez tenha sido impulsionada pelo desejo de ter um maior envolvimento com a
política da cidade de Alagoinhas, ou pelo progressivo desenvolvimento que a cidade
vivenciava, como veremos a seguir.
1.2 ALAGOINHAS
55
Ibidem, p. 26.
56
As primeiras histórias do município de Inhambupe remontam ao ano de 1570, com a chegada de um fidalgo
português chamado Alexandre Vaz de Gouveia, que fundara a capela de Nossa Senhora da Conceição em 1624,
e posteriormente à chegada de Guilherme D’Ávila, Marechal da Casa Torre dos Garcia D’Ávila, que por ocasião
da primeira invasão Holandesa à Bahia em 1624, seguiu ao norte de suas terras, chegando ao povoado dos
Gouveia, o qual solicitou ao governador geral da época, Diogo Mendonça Furtado, a posse de uma sesmaria
naquelas terras, entre o rio Inhambupe e o rio Subaúma.
56
Ao se estabelecer próximo as terras dos Gouveia, os Garcia D’Ávila construíram outra capela, a do Divino
Espírito Santo, e a partir daí o povoado ficou dividido como Inhambupe de Cima, domínio dos Gouveia, e
Inhambupe de Baixo, domínio dos Garcia D’Ávila. Ver: MARIS, Estela. Evolução Histórica de Inhambupe.
Salvador: Contemp. 1993.
33
57
BARREIRA, Américo. Alagoinhas e Seu Município: Notas e apontamentos para futuro. Alagoinhas:
Tipografia do Popular, 1902.
58
BARROS, Salomão. Vultos e feitos do município de Alagoinhas. Salvador: Artes Gráficas, 1979.
59
BARREIRA, Américo. Alagoinhas e Seu Município: Notas e apontamentos para futuro. Alagoinhas:
Tipografia do Popular, 1902, p.29.
60
BARROS, Salomão. Vultos e feitos do município de Alagoinhas. Salvador: Artes Gráficas, 1979, p.49.
34
Na figura 04, vemos um mapa da província da Bahia em meados do século XIX, com
destaque para a região de Alagoinhas e Inhambupe, em que se observa também os municípios
próximos da região.
61
SANTANA, Antônio Hertes Gomes de. Conflitos pela propriedade e reordenamento do trabalho em
Alagoinhas e Inhambupe (1860-1890). Dissertação. (Mestrado em História) – Universidade Federal Rural do
Rio de Janeiro, 2015.
62
LIMA, Keite Maria Santos do Nascimento. Entre a Ferrovia e o Comércio: Urbanização e Vida Urbana em
Alagoinhas (1868-1829). Dissertação. (Mestrado em História) - Universidade Federal da Bahia. Salvador, 2010.
63
Ibidem, p.22.
36
A viagem de trem que tanto me encantou foi feita num “pirulito” (não sei o
por que do nome) um Maria-Fumaça que saía pela madrugada e chegava
num horário bastante elástico: entre dez e meia noite, quando não atrasava
muito. Todo mundo viajava nesse trem. Virava-se os bancos e formavam-se
rodinhas cujos bate-papos versavam sobre assuntos mais diversos. Os
alagoinhenses viajavam para a capital para resolver negócios, fazer compras,
ou mesmo para assistir filmes onde apareciam estrelas famosas, como Greta
Garbo, Marlene Dietrich e outras em voga na época. E eram 125 quilômetros
de ferrovia!65
64
Ibidem, p.22.
65
SANTOS, Joanitta da Cunha. Traços de Ontem. Belo Horizonte: Graphilivros Editores, 1987.
66
Ibidem, p.18.
67
Ibidem, p.24.
37
Cabe destacar que os caminhos de ferro alteraram também o ritmo de vida social, pois
possibilitou que a população alagoinhense conhecesse lugares antes desconhecidos, e
vivessem experiências diferentes, que ocasionou mudanças no modo de pensar a vida, que a
pequena vila de Alagoinhas não lhes permitia antes:
68
Ibidem, p.29.
69
PESAVENTO, Sandra Jatahy. Cidades invisíveis, cidades sensíveis, cidades imaginárias. In: Revista
Brasileira de História. São Paulo, jan. – jun. de 2007, p. 13.
70
PAIXÃO, Carlos Nássaro Araújo. Traços da cidade de Alagoinhas: Memória, política e impasses da
modernização (1930-1949). Dissertação. (Mestrado em História Regional e Local) - Universidade do Estado da
Bahia, Salvador, 2009.
38
De acordo com Keite Lima entre os anos de 1870-1880, mesmo com a construção da
linha férrea, Alagoinhas não tinha um comércio tão movimentado e diversificado,
consequência que a autora atribuiu a crise econômica vivenciada no século XIX. Segundo ela,
apenas quatro décadas depois a Bahia passou a vivenciar um período de prosperidade, pois
com a primeira República novas políticas de incremento às atividades econômicas foram
adotadas, que estimularam o comércio e também o aumento da exportação de produtos como
o fumo.73
Como já enfatizamos, na primeira metade do século XX o município de Alagoinhas
viveu um crescimento econômico vertiginoso. A população urbana também aumentou
consideravelmente, e não foi diferente no ambiente rural. Segundo as estatísticas do IBGE, até
o ano de 1950 Alagoinhas possuía uma população correspondente a 52.007 habitantes, e desse
total, 53% residiam nas comunidades rurais do município. Talvez impulsionado por esse
crescimento econômico, Santinho tenha resolvido mudar-se com a família recém-formada
para o Riacho da Guia, em 1911, por ser uma região próxima a Alagoinhas.
Possivelmente a mudança estava atrelada também a questões familiares, pois segundo
Maria da Guia, um dos motivos que fizeram a jovem família mudar-se da fazenda Patioba
para o Riacho da Guia foi a intenção de ganhar independência da mãe, dona Thereza, como já
mencionado. De acordo com Maria da Guia, a relação de Santinho com a mãe não era boa, e
relata as brigas entre eles que a memória familiar retinha:
72
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Enciclopédia dos Municípios Brasileiros. Rio de
Janeiro, 1958, p. 22. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br. Acesso em: 23 jan. 2022
73
LIMA, Keite Maria Santos do Nascimento. Entre a Ferrovia e o Comércio: Urbanização e Vida Urbana em
Alagoinhas (1868-1829). Dissertação. (Mestrado em História) - Universidade Federal da Bahia. Salvador, 2010.
p. 78.
40
Não foi só o fumo que mereceu interesse de Santinho. Ele aumentou bastante
o número de propriedades que herdara dos pais e do sogro. É conhecido o
quanto disputava com a mãe, que era, dizia a boca pequena, uma cigana que
zelava pelo que possuía e pelo seu próprio desempenho do poder. Santinho
em suas brigas com a mãe, dizia que só descansaria quando tivesse em sua
propriedade uma extensão de terra que permitisse deslocar-se do Riacho da
Guia para Alagoinhas, cerca de 20 quilômetros, exclusivamente em terras do
seu domínio. Esse objetivo ele alcançou.74
Foi após sair das dependências da mãe e passar a residir no distrito do Riacho da Guia,
que Santinho conseguiu auferir seus lucros e também fortalecer uma liderança política no
local, além de alcançar seus objetivos de obter uma extensão de terras que permitisse o
deslocamento do Riacho até Alagoinhas, projeto que segundo Maria da Guia ele conseguiu
realizar. Identificamos que após a mudança para o Riacho, Santinho conseguiu aumentar seus
domínios de terras em um período relativamente curto, considerando que 09 anos depois, o
censo brasileiro de proprietários rurais indicava duas propriedades em nome do coronel, a
fazenda Prompto, que era herança familiar, e mais o acréscimo do sítio São Pedro.75
A região proporcionou ao coronel maior visibilidade política, tendo em vista que era
do local que saía a maioria dos votos que permitiam a vitória de Santinho em todas as
candidaturas que se lançou. Para além disto, o distrito se configurava como seu local de
pertencimento, pois Santinho carregava o Riacho da Guia como aposto no próprio nome,
caracterizando a relevância daquele distrito para ele, e ao mesmo tempo o destaque de
Santinho para aquela localidade, onde era conhecido por todos como coronel Santinho do
Riacho da Guia, ou Santinho do Riacho.
No livro de Maria da Guia, algumas páginas são dedicadas a falar sobre a residência
adquirida pelo coronel ao mudar-se para o Riacho, chamada de “casa grande”, possivelmente
como uma referência aos antigos senhores de engenho. Segundo a autora, a compra da casa
“assobradada” foi feita pelo coronel Santinho por 650 mil réis, e a julgar pelas diversas
imagens da casa reproduzidas no livro, percebe-se a significância do local para a família, que
provavelmente considerava a mesma como um símbolo da riqueza familiar naquela
comunidade. Algumas das imagens serão reproduzimos logo a seguir.
74
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p. 36.
75
Recenseamento do Brasil. Relação dos proprietários dos estabelecimentos rurais recenseados no Estado da
Bahia, 1920. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br. Acesso em: 25 mai. 2022.
41
Na figura 07, vemos a primeira imagem da casa reproduzida por Maria da Guia,
caracterizada por um sobrado, com pessoas em pé a sua frente, homens, mulheres e crianças,
que não são identificadas pela autora, posando ao lado de dois veículos que estão em
destaque. Segundo Maria da Guia, a parte de cima servia de moradia para a família de
Santinho e também para as pessoas que trabalhavam nos serviços da casa, e a parte térrea era
utilizada como uma casa comercial. Após a compra, o coronel teria iniciado uma reforma que
provavelmente teve início com a sua chegada ao local, por volta de 1911, e que terminou
somente no ano de 1926.76
76
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p. 14.
42
Segundo a autora, a casa passou por três reformas no total. A figura 09 mostra o
resultado da última reforma, feita na década de 1980, ano que ficou na fachada da casa. A
reforma foi feita por Antônio Silva Lima, genro do coronel Santinho, pois nesse período o
coronel já havia falecido. Percebe-se assim uma preocupação da família com a preservação do
patrimônio familiar mesmo após o falecimento do coronel. Depois disso a casa permaneceu
sem maiores modificações.
Figura 10 - Casa de Santinho em 2005
A imagem acima é do ano de 2005. Nela aparecem Antônio Silva Lima, genro do
coronel Santinho e mais duas pessoas não identificadas. Embora nesta imagem a casa
evidencie os traços dos desgastes e da falta de manutenção, percebe-se sua importância para a
memória dos membros da família, que persistem em colocar-se em pose para foto na frente da
mesma.
Acima uma imagem do interior da casa. Nesta, o coronel Santinho está em pé, no pátio
interior de sua residência, e não temos data desse registro. Nas demais imagens são os
membros da família que se deixam fotografar a frente da residência, mas nesta, embora o
coronel esteja posando, não houve uma preocupação em cuidar do cenário, uma vez que
aparecem roupas penduradas no gradil, demonstrando um cenário cotidiano. As escadas que
dão acesso ao pátio interno evidenciam a diferença entre os pavimentos
45
77
Ibidem, p. 14.
46
recebiam o selo de J.L dos Santos Silva.78 Para além do fumo Santinho também se envolveu
no cultivo de milho, feijão, mandioca, e na criação de gado, pois foi registrado como criador
de gado pelo Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, em 1922.79
78
Ibidem, p. 28-34.
79
Cf. LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. Registro anexado ao final do livro.
80
PAIXÃO, Carlos Nássaro Araújo. Traços da cidade de Alagoinhas: Memória, política e impasses da
modernização (1930-1949). Dissertação. (Mestrado em História Regional e Local) Departamento de Ciências
Humanas- Universidade do Estado da Bahia. Salvador, 2009. p. 52.
81
BORBA, Silza Fraga Costa. Industrialização e Exportação de Fumo na Bahia (1870-1930). Dissertação.
(Mestrado em Ciências Humanas). Universidade Federal da Bahia -UFBA. Salvador, 1975, p. 09-11.
48
Para Roni Hilsinger, no país o tabaco estava presente desde que o Brasil ainda não
existia, pois os nativos já cultivavam e consumiam em rituais religiosos. Segundo ele, as
primeiras lavouras comerciais de tabaco no território surgiram na faixa litorânea entre
Salvador e Recife, e nos arredores do município de Cachoeira na Bahia. No Nordeste a
produção sempre esteve baseada no cultivo de fumos escuros, o fumo em corda, utilizado para
a fabricação de cigarros e charutos. O fumo passou a ser cultivado pelos alemães em 1824, e
com a imigração alemã para o Rio Grande do Sul, o cultivo foi ampliado na região, que lidava
principalmente com a produção do fumo claro. Assim, enquanto a Bahia continuava a
produzir o fumo escuro, o Sul buscava se adequar a demanda dos compradores,
principalmente a dos alemães que desejavam um produto com novas características. Essa
ruptura do tipo do tabaco desejado é importante para a história da produção de fumo no
Brasil, pois foi por essa razão que o polo mais dinâmico se transferiu da Bahia para o Rio
Grande do Sul em um processo que se consolida após 1920, quando a produção de fumo claro
se sobrepõe aos fumos escuros.82
De acordo com Paulo Henrique de Almeida, o complexo fumageiro baiano conheceu
seu auge do final do século XIX às primeiras décadas do século XX. O número de empresas
exportadoras de fumo do estado passou de 6 em 1860 para 26 em 1890, e chegou a 40 em
1930, de forma que o fumo em folha se tornou um dos três principais produtos de exportação
da Bahia, responsável por mais de 80% das exportações baianas até 1950. Neste período a
fumicultura de exportação permaneceu com os modos de produção consolidados no século
XIX, com o sistema dos armazéns de enfardamento e exportação, que controlavam a
comercialização da folha e dirigiam, através do fornecimento de crédito, sementes e
orientações técnicas para a produção fumageira.83
Entre as atividades comerciais de Santinho, a produção e o comércio do fumo
garantiram sua maior rentabilidade, e a loja Amélia, destinada ao abastecimento de seus
empregados do campo, teve um papel importante nesta lucratividade:
82
HILSINGER, Roni. O território do tabaco no Sul do Rio Grande do Sul diante da convenção quadro
para o controle do tabaco. Tese. (Doutorado em Geografia). Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto
Alegre, 2016. p. 63-65.
83
ALMEIDA, Paulo Henrique de. A manufatura do fumo na Bahia. Dissertação. (Mestrado em Ciências
Humanas) - Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 1983, p. 64.
49
Provavelmente esses moradores não possuíam suas próprias terras para trabalhar, ou
recursos para o plantio, necessitando assim da ajuda do coronel. Além disso, ao acumular
dívidas durante todo o ano, é provável que na época da colheita o lucro se tornasse pequeno
após a quitação da dívida, que logo em seguida era retomada, de forma que o negócio do
coronel com a produção e venda do fumo além de rentável era estratégico, porque, além de
controlar o comércio, também conseguia manter a dependência e lealdade por parte dos
moradores, que era requisitada nos períodos eleitorais.
Considerando a proximidade com o período escravista, abolido pouco mais de duas
décadas antes de Santinho passar a residir no Riacho da Guia, é possível inferir que seus
84
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p. 34.
85
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, enxada e voto. O município e o regime representativo no Brasil. São
Paulo: Companhia das Letras, 1948.
50
86
Ibidem. 45.
87
MORAIS, Moisés Leal. Urbanização Trabalho e seus interlocutores no Legislativo Municipal:
Alagoinhas-Bahia, 1948-1964. Dissertação. (Mestrado em História) - Universidade do Estado da Bahia.
Salvador, 2011. p. 28.
51
Maranhão, Amazonas, Pará, e Ceará, chegando a possuir seus próprios barcos para o envio de
seus produtos. Eliana Evangelista Batista cita o coronel Santinho como um dos homens mais
expressivos na política local na Primeira República, como político influente no Riacho da
Guia, além de ser um grande exportador de fumo.88
O fumo que Santinho comercializava ia além da produção local de suas terras, pois
segundo Maria da Guia ele tinha dezenas de compradores de sua produção, entre os quais ela
cita como Manoel das Almas, Antoninho da Baixa Grande, Pedro Figueiredo e Antônio
Moreno, homens que trabalhavam para o coronel, se deslocando pelas roças e redondezas, e
até mesmo no estado de Sergipe, para comprar fumo de pequenos produtores, a fim de que o
coronel pudesse adquirir uma maior quantidade de fumo da safra anual, que eram processados
no trapiche que Santinho instalou no Riacho da Guia:
88
BATISTA, Eliana Evangelista. A “Revolução de 30” no interior da Bahia: da queda da última barreira
legalista, à formação dos primeiros partidos políticos (Alagoinhas, 1930-1934). XXVIII SIMPÓSIO
NACIONAL DE HISTÓRIA- Lugares dos historiadores: Velhos e novos desafios, 2015, Florianópolis-SC.
Anais [...] Florianópolis: FAPESB, 2015.p. 1-16. Disponível em:
http://www.snh2015.anpuh.org/resources/anais/39/1434423563_ARQUIVO_TEXTOAnpuh2015Eliana.pdf.
Acesso em: 22 mai.2022.
89
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p. 35.
90
Ibidem, p.36-37.
52
A julgar pelos indícios deixados por ele, seu poderio aumentou e isso também foi
posto em evidência. São documentos e objetos atualmente disponibilizados na Fundação Iraci
Gama que evidenciam as aquisições e sua exibição. São produtos que melhoravam a vida
cotidiana da família, mas que também funcionavam como símbolo da riqueza acumulada pelo
Coronel. Maria da Guia afirma no Riacho da Guia, Santinho foi o primeiro a ter um rádio a
bateria, em que ouvia nele, “fumando grandes charutos”, as notícias do final da Segunda
Guerra. O aumento dos bens também se evidenciou na compra de um automóvel, segundo ela
o primeiro da localidade:
Santinho era conhecido pela velocidade que conduzia seu carro. Vários
foram os acidentes que sofreu e em uma das vezes, ao conseguir
desvencilhar-se dos destroços após a virada do carro em uma estrada, ele
constatou que as quatro rodas ainda giravam no ar. Sacou seu revólver e
alvejou uma a uma. Aquelas rodas não tinham mais por que girar já que o
carro estava todo destruído!91
91
Ibidem, p.37.
53
representavam a elite comercial da cidade.92 Isso nos faz pensar que o comércio do fumo
representava uma das atividades mais importantes do município.
Como os principais comerciantes do fumo eram participantes da política local,
podemos compreender a preocupação do poder público com a cultura do fumo, quando ela
entrou em crise após a Primeira Guerra Mundial, pois nesse período a Alemanha criou uma
sobretaxa sobre o produto, em que cobrava um imposto de 180 marcos de ouro por quilo de
fumo que entrasse no país, fazendo com que os negociantes que compravam fumo dos
comerciantes e produtores locais para revender no exterior se afastassem.93
Nesse período, a comercialização do fumo passou a ser prejudicada não só pela
concorrência com o Sul, mas também pelas dificuldades financeiras para manter as máquinas,
e a falta de investimentos que fez com que a Bahia, que tinha a economia baseada na
exportação para o mercado internacional, fosse atingida diretamente pelas oscilações desse
mercado.94Com a crise que provinha desde o início da década de 1930, o vereador Miguel de
Azevedo propôs alguns projetos de leis à Câmara de Vereadores de Alagoinhas em 1936, na
tentativa de solucionar os problemas de renda municipal. Entre esses projetos estava uma
premiação para os lavradores de fumo, criada com o intuito de incentivar a produção.95
Segundo Carlos Nássaro, a concessão de prêmios foi um pretexto dos políticos de
Alagoinhas, para aumentar a arrecadação pública, que vinha sofrendo baixa com a crise
econômica. O projeto buscava alcançar principalmente que os pequenos produtores de fumo,
desmotivados após imposto cobrado pela Alemanha em 1930, que deixou os lavradores e
comerciantes em situação difícil. Era preciso reerguer os proprietários de trapiches e
principalmente os pequenos produtores, que eram responsáveis pela maior quantidade de
produção, mas que não eram recompensados de forma suficiente para continuar a produção
em meio à crise. Dessa forma, o projeto tinha o intento de incentivar a produção de fumo pois
a mesma gerava grande arrecadação para os cofres púbicos.96
Além do fumo, o vereador Miguel de Azevedo também apresentou uma proposta na
Câmara de Vereadores, com o propósito de incentivar a produção da laranja, concedendo
92
PAIXÃO, Carlos Nássaro Araújo. Traços da cidade de Alagoinhas: Memória, política e impasses da
modernização (1930-1949). Dissertação. (Mestrado em História Regional e Local) Departamento de Ciências
Humanas- Universidade do Estado da Bahia. Salvador, 2009. p. 54.
93
Ibidem, p.55.
94
BORBA, Silza Fraga Costa. Industrialização e Exportação de Fumo na Bahia (1870-1930). Dissertação.
(Mestrado em Ciências Humanas) Universidade Federal da Bahia. Salvador, 1975. p. 11.
95
PAIXÃO, Carlos Nássaro Araújo. Traços da cidade de Alagoinhas: Memória, política e impasses da
modernização (1930-1949). Dissertação. (Mestrado em História Regional e Local) Departamento de Ciências
Humanas – Universidade do Estado da Bahia. Salvador, 2009. p. 56-58.
96
Ibidem, p.57-58.
54
97
Ibidem, p. 60-62.
98
Enciclopédia dos Municípios Brasileiros. IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Rio de
Janeiro, 1958, p. 21-25. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br. Acesso em: 23 jan. 2022.
99
SANTOS, Joanita da Cunha. Traços de Ontem. Belo Horizonte: Graphilivros Editores, 1987. p. 27-30.
100
Ibidem, p. 36.
55
O projeto concedia prêmios para lavradores que tivessem alcançado uma produção
superior a mil trezentos e cinquenta quilos de fumo por ano. Com o projeto aprovado pela
Câmara, foi necessária a ajuda do Instituto do Fumo, que segundo Carlos Nássaro tinha o
objetivo de trazer métodos modernos para o desenvolvimento do produto, financiando o
aumento da produção de forma quantitativa e qualitativa, com a disponibilização de créditos e
novas técnicas de manipulação.101
Segundo Paulo Henrique Almeida, o IBF (Instituto Bahiano de Fumo) foi implantado
em 1935 como um órgão do Estado que se responsabilizava pela produção e distribuição de
sementes e mudas selecionadas, além de prestar a orientação técnica no cultivo e
beneficiamento da folha.102 O instituto foi criado com a intenção de fortalecer a economia
fumageira baiana, pois de acordo com o autor, entre 1901 e 1950, houve dois períodos
distintos relacionados a exportação do fumo na Bahia. O primeiro caracterizou-se por um
lento crescimento da quantidade exportada, que durou até o início dos anos 1930, que
101
PAIXÃO, Carlos Nássaro Araújo. Traços da cidade de Alagoinhas: Memória, política e impasses da
modernização (1930-1949). Dissertação. (Mestrado em História Regional e Local) Departamento de Ciências
Humanas- Universidade do Estado da Bahia, Salvador, 2009. p. 57.
102
ALMEIDA, Paulo Henrique de. A manufatura do fumo na Bahia. Dissertação. (Mestrado em Ciências
Humanas) - Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 1983. p. 66.
56
Fonte: DESCONHECIDO
103
Ibidem, p. 67.
57
104
BARROS, Salomão. Vultos e feitos do município de Alagoinhas. Salvador: Artes Gráficas, 1979. 327-336.
105
SANTOS, Joanitta da Cunha. Traços de Ontem. Belo Horizonte: Graphilivros Editores, 1987. p. 20.
106
ALMEIDA, Paulo Henrique de. A manufatura do fumo na Bahia. Dissertação. (Mestrado em Ciências
Humanas) - Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 1983. p.91-92.
107
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p. 36.
58
Para analisar a inserção de Santinho na vida política é necessário voltar aos momentos
e pessoas que o motivaram, a fim de nortear os acontecimentos que, de certa forma,
conduziram o início de sua trajetória política. Santinho nasceu em 1883, em uma década
bastante agitada para a conjuntura política brasileira em diversos aspectos, e a atuação de
alguns membros da família do coronel naquele contexto, mais precisamente nas discussões
relacionadas à Primeira República, nos dá um indicativo de que sua família lhe passou o
legado ou o interesse para a política. Já inserido na política local, Santinho participou dos
movimentos que sucederam a Revolução de 1930, inicialmente como um apoiador da Aliança
Liberal. Neste capítulo, trataremos de alguns aspectos da trajetória econômica e política do
coronel Santinho, no período que se estende da Proclamação da República ao movimento
revolucionário de 1930, atentando para os aspectos de maior destaque, considerando como fio
condutor a participação do coronel e de seus familiares nessas conjunturas. Para este capítulo,
utilizamos como fontes principais, textos memorialísticos que se referem à cidade de
Alagoinhas, as memórias de Maria da Guia e dos familiares de Santinho, periódicos locais e
também de outros estados que cobrem o período.
108
COSTA, Emília Viotti da. Da Monarquia à República: momentos decisivos. São Paulo: Fundação Editora
da UNESP, 1999.
109
LINHARES, Maria Yedda (org.). História Geral do Brasil. Rio de Janeiro: Elsevier, 1990, p. 421-426.
110
COSTA, Emília Viotti da. Da Monarquia à República: momentos decisivos. São Paulo: Fundação Editora
da UNESP, 1999.
60
aos quais não restou alternativa senão permanecer trabalhando nas fazendas onde estavam, em
condições que pouco diferiam da anterior, sujeitos a tutela de seus antigos senhores. 111 Para
Walter Fraga Filho, mesmo após a abolição, muitos desses trabalhadores continuaram a
manter laços de dependência, e na maioria dos casos, a liberdade não significava a opção de
escolha em relação ao trabalho agrícola, pois os livres e libertos precisavam muitas vezes
continuar no mesmo ambiente, para garantir a sua sobrevivência e alguns acordos
costumeiros, de forma que a abolição não significou uma ruptura social e econômica com o
modelo anterior.112
De acordo com Iacy Maia Mata, na Bahia, uma região predominantemente agrícola,
as grandes lavouras do interior e do recôncavo dependiam fundamentalmente da mão de obra
escrava. A província baiana concentrava 10% da população escrava do Brasil, senhores ricos
empregavam número considerável de escravos na produção da cana, e às vésperas da
abolição, a Bahia possuía uma significativa população escrava. Para a autora, na Bahia a Lei
Áurea não significou o reconhecimento de um fato consumado, pois alguns escravocratas
baianos se recusaram a crer que a lei aboliria imediatamente a escravidão, muitos dos quais
não queriam abrir mão de suas prerrogativas senhoriais, utilizando-se muitas vezes até mesmo
da violência.113
Na cidade de Alagoinhas, a transição não foi diferente dos demais locais do país.
Havia uma preocupação das autoridades com o reordenamento do trabalho após a abolição,
principalmente após a chegada da linha férrea, que representava a modernidade, e por isso
prezava-se pelo seu bom funcionamento, reprimindo a população desocupada. Com a
predominância de atividades agrícolas na região, havia também por parte dos legisladores
uma preocupação com a economia agrícola, que era mantida principalmente com a mão de
obra escrava.114
De acordo com Américo Barreira, Alagoinhas já estava com uma economia em
decadência, com alguns engenhos antes prósperos como o Engelho Velho, Barbado e
Quizambú, transformados em fazendas para plantação de fumo. A decadência era atribuída a
111
LINHARES, Maria Yedda (org.). História Geral do Brasil. Rio de Janeiro: Elsevier, 1990, p.426.
112
FRAGA FILHO, Walter. Encruzilhadas da Liberdade: histórias de escravos e libertos na Bahia
(1870/1910). Campinas: Editora da Unicamp, 2006.
113
MATA, Iacy Maia. Os “Treze de Maio”: ex-senhores, polícia e libertos na Bahia pós-abolição (1888-1889).
Dissertação. (Mestrado em História) – Universidade Federal da Bahia – Salvador, 2002.p. 1-3.
114
SANTANA, Antônio Hertes Gomes de. Possíveis memórias do trabalho na escravidão e no pós-abolição em
Alagoinhas. In: X ENCONTRO NACIONAL DE HISTÓRIA ORAL. Testemunhos: História e Política, 2010,
Recife/PE. Anais [...] Recife: UFPE, 2010. p.1-13. Disponível em:
https://www.encontro2010.historiaoral.org.br/resources/anais/2/1268951319_ARQUIVO_Possiveismemoriasdot
rabalhonaescravidaoenoposabolicaoemAlagoinhas.pdf. Acesso em: 29 mai. 2022.
61
uma crise comercial e agrícola que assolava o Brasil no período, atingindo a cidade, que tinha
sua maior riqueza quase exclusivamente das lavouras. Segundo Barreira, a abolição anunciou
as perdas materiais que o Brasil teria, em que os maiores culpados eram os senhores de
engenho, que não se prepararam para a transformação que lhes chegou de surpresa:
Nunca se viu nem antes nem depois uma obsessão tão cega, uma teimosia
tão absurda como a dos escravocratas ou simples retardatários, que pareciam
obumbrados pelo clarão deslumbrante de Liberdade que se avizinhava,
dominando a sociedade inteira (...) e, consumado o fato, na certeza da perda
total e irremissível da propriedade escrava, colheu-os o desanimo com o
arredamento do braço forte do cativo, que eles, na vigência do regime negro,
não souberam preparar para o trabalho livre, honrado e produtivo.115
Dessa forma, com o regime Imperial enfraquecido em suas bases com a abolição, a
República se concretizou no Brasil em 1889, quando Marechal Deodoro da Fonseca assumiu
o cargo de primeiro Presidente do Governo Provisório, que durou até 1891. Iniciou-se um
novo regime, e o país passou de uma monarquia para uma República, uma mudança que, de
acordo com Boris Fausto, foi “quase um passeio em termos de episódio”116, em razão da
rapidez com que essa mudança se concretizou.
No âmbito político, a República se caracterizava por uma forte crítica à centralização
monárquica, e pela implantação de um regime político substanciado na política da federação,
baseado no fortalecimento do poder das oligarquias estaduais a partir do coronelismo. Entre
as mudanças feitas pelo novo regime, estava a deliberação de amplos poderes ao Estado, que
poderia criar seus próprios impostos interestaduais, e também o sufrágio universal, que
permitia uma “ampliação” da participação política, desde que os eleitores não fossem
analfabetos. Ou seja, estava excluída de exercer a cidadania a classe mais pobre da população,
que não era alfabetizada.117
José Murilo de Carvalho, no livro os Bestializados, faz um estudo sobre a transição do
regime monárquico para o republicano na cidade do Rio de Janeiro, e afirma que mesmo a
maioria da população permanecendo excluída do processo eleitoral, não estiveram inertes a
esse momento, pois encontraram outros meios de participação política, e construíram sua
115
BARREIRA, Américo. Alagoinhas e Seu Município: Notas e apontamentos para futuro. Alagoinhas:
Typografia do Popular, 1902.p.206-207.
116
FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: Editora da USP. 1994.
117
MENDONÇA, Sônia Regina de. Estado e Sociedade: A consolidação da república oligárquica. In:
LINHARES, Maria Yedda (org.). História Geral do Brasil. Rio de Janeiro: Elsevier, 1990.
62
118
CARVALHO, José Murilo de. Os Bestializados. São Paulo: Companhia das Letras. 2001.
119
SAMPAIO, Consuelo Novais. Partidos políticos da Bahia na Primeira República. Salvador, Editora da
Universidade Federal da Bahia, 1998. p.13.
120
Ibidem, p. 15.
121
Ibidem, p. 16.
63
De acordo com Renato Lessa, na chegada do novo regime houve mais que uma
“ausência de povo”, pois existiu outra ausência marcante, que foi a não reação dos próprios
republicanos. Segundo o autor, não houve uma “modernização política” após a proclamação
da República, que teria sido limitada pela marca da moderação. Dessa forma, o golpe de
estado de 15 de novembro não teria sido um projeto minuciosamente planejado, e a derrubada
do poder monárquico não trouxe de imediato uma nova ordem, mas uma “desrotinização” da
vida política.122 Para Lessa, o governo de Campos Sales (1889-1894), teve como referência
negativa não o regime monárquico, mas a infância conturbada do próprio regime republicano
nos seus 10 primeiros anos, e por essa razão, Campos Sales implementou a política dos
governadores, visando estabelecer uma interação política que viabilizasse o seu mandato.
Com a intenção de suprimir os “inimigos do regime”, e transformar o sentimento republicano
que era pequeno, em maioria eleitoral, Campos Sales implementou a política dos estados, que
passou a intervir diretamente nas eleições:
Nos trinta anos que se seguiram à Primeira República, o Brasil teve uma organização
social marcada pelo predomínio do setor industrial e agrário, em que São Paulo e Minas
Gerais comandavam a vida política do país através de uma apropriação do poder central. O
federalismo consagrou os desejos das elites dominantes do país, que no regime Imperialista
não tinham possibilidades de ascensão ao poder, pois dependiam da submissão à elite
dominante do Império. O estabelecimento da República permitiu que diversas economias
locais ascendessem ao poder em seu âmbito regional, utilizando mecanismos para sua
permanência no poder, sendo um deles o coronelismo.124
122
LESSA, Renato. A Invenção Republicana: Campos Sales, as bases e a decadência da Primeira República
brasileira. Rio de Janeiro: Topbooks, 1990, p. 17.
123
Idem, p. 25.
124
MONTEIRO, Hamilton de Mattos. Da República Velha ao Estado Novo. In: LINHARES, Maria Yedda
(org.). História Geral do Brasil. Rio de Janeiro: Elsevier, 1990.
64
125
BARREIRA, Américo. Alagoinhas e Seu Município: Notas e apontamentos para futuro. Alagoinhas:
Tipografia do Popular, 1902. p. 50.
126
BARROS, Salomão. Vultos e feitos do município de Alagoinhas. Salvador: Artes Gráficas, 1979. p. 277.
127
BARREIRA, Américo. Alagoinhas e Seu Município: Notas e apontamentos para futuro. Alagoinhas:
Tipografia do Popular, 1902. p. 50.
128
Ibidem, p.50-55.
65
naquele momento, já evidenciava ser uma localidade de peso político da região, demonstrou
uma capacidade de adaptação aos novos rumos que a nação seguia, e que os cidadãos dali não
estavam alheios aos acontecimentos políticos do país. Américo Barreira retratou um trecho da
ata dessa reunião em seu livro:
129
Ibidem, p. 58.
130
Ibidem, p. 59.
131
BARROS, Salomão. Vultos e feitos do município de Alagoinhas. Salvador: Artes Gráficas, 1979. p. 201.
66
132
BARREIRA, Américo. Alagoinhas e Seu Município: Notas e apontamentos para futuro. Alagoinhas:
Typografia do Popular, 1902, p.144.
133
Para Eu Soo Pang, a raiz do coronelismo encontra-se no período colonial, onde sua legitimidade se baseava
em um status de senhor absoluto, em que o cargo de coronel poderia ser dado a advogados, professores,
comerciantes, padres, ou seja, ser coronel não significava necessariamente ser um fazendeiro. Entretanto, ele
afirma que o coronelismo passou por um amadurecimento como instituição com o início da Primeira República.
Na mesma vertente de Eu Soo Pang, Maria de Loudes Janotti também enfatiza que as raízes do coronelismo
estavam sedimentadas no Império, e que a República apenas ampliou o seu papel dentro da nova estrutura
política. Ver: PANG, Eul-Soo. Coronelismo e Oligarquias 1889-1934. A Bahia na Primeira República Brasileira.
Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1979.; JANOTTI, Maria de Lourdes M. O Coronelismo: Uma
política de compromissos. São Paulo: Editora Brasiliense, 1981.Ver também: CARVALHO, José Murilo.
Mandonismo, Coronelismo, Clientelismo. Uma discussão conceitual. Dados, Rio de Janeiro, 1997.; QUEIROZ,
Maria Isaura Pereira de. "O Mandonismo Local na Vida Política Brasileira". Anhembi, 1957.; CAMMACK,
Paul. “O Coronelismo e o Compromisso coronelista: Uma Crítica". Belo Horizonte, 1979.
67
prestígio. Dessa forma, o surgimento do coronelismo tem a ver com a relação de cooperação
entre o Município, o Estado, e o Presidente da República. Um sistema de compromissos que
só passou a existir com o contexto político possibilitado pela Primeira República.134
Nos ambientes rurais, o coronelismo se apresentou por meio de homens providos de
terras, de relações comerciais e políticas, atributos que favoreciam a sua influência sobre a
população, como no caso do coronel Santinho. O envolvimento de Santinho na política
começou cedo, pois ao que tudo indica, sua família o preparou para essa carreira,
considerando a preocupação com a formação de Santinho quando criança. É provável que ao
mudar-se para o Riacho da Guia, Santinho já tivesse a intenção de desenvolver uma relação
política com a população, e formar uma estrutura de poder que favorecesse seu
desenvolvimento político, pois segundo Maria da Guia, mesmo quando ainda morava com os
pais na fazenda Patioba, na década de 1910, Santinho já tinha envolvimento com a política do
Riacho da Guia, e no período eleitoral se dirigia ao local para ajudar nas eleições, que no
período aconteciam pelo método “bico de pena”:
Segundo Nunes Leal, o método do “bico de pena” era um processo em que, na maioria
das vezes, o vencedor já era conhecido, pelo fato de ser corriqueira a compra de votos dos
eleitores, em sua maioria moradores rurais que “obedeciam” a orientação dos seus chefes
locais.136 De acordo com Boris Fausto, no período o voto não era obrigatório, mas o povo
encarava as eleições como troca de favores, e os resultados não representavam a escolha da
população, em razão das fraudes eleitorais, das falsificações de atas, e da pressão dos chefes
locais a que os votantes estavam sujeitos.137
Formalmente a atuação política de Santinho teve início quando ele tinha 24 anos, com
o exercício do mandato de Conselheiro Municipal, em 1907, como consta no livro de atas da
134
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, enxada e voto. O município e o regime representativo no Brasil. São
Paulo: Companhia das letras, 1948. p. 6.
135
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011.p. 30.
136
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, enxada e voto. O município e o regime representativo no Brasil. São
Paulo: Companhia das letras, 1948.
137
FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: Editora da USP. 1994. p. 262.
68
Prefeitura Municipal de Alagoinhas.138 Sua nomeação para o posto de tenente coronel veio
logo depois, por meio do decreto de 20 de novembro de 1907, assinado em 9 de abril de 1908
pelo presidente da República Afonso Pena, que lhe conferia o título de comandante do 481°
Batalhão de Infantaria da Comarca de Alagoinhas.139
Segundo Maria Janotti, os postos da Guarda Nacional, utilizados no período regencial
para submeter escravos e grupos sociais aos interesses dos senhores de terras, foram ocupados
em sua maioria por mandatários locais:
eleição.”144 No ano mencionado Santinho ainda não era suplente de Juiz de Direito, mas a
julgar pela afirmação de Maria da Guia, de que Santinho desde cedo participava da
organização das eleições do Riacho, é possível que talvez ele soubesse ou mesmo tivesse
algum envolvimento nessas fraudes eleitorais narradas sobre o Riacho.
Exercendo o cargo de vereador, Santinho foi eleito por alguns mandatos representando
o Riacho da Guia e, em alguns deles tomou posse como presidente da Câmara, demonstrando
o peso da sua influência na localidade do Riacho nas eleições, pois na maioria das vezes, o
presidente da Câmara era o vereador eleito mais votado. Em meio aos documentos do coronel
disponibilizados pela família para a FIGAM, está presente uma lista de todos os eleitores do
distrito do Riacho da Guia, e essa relação provavelmente o ajudava no controle do seu
eleitorado. Keite Maria Santos Lima, ao dissertar sobre o Coronel Saturnino Ribeiro145,
afirmou que a ascensão política do mesmo se deu principalmente graças aos seus aliados,
representantes políticos de grande importância para o período, como J.J. Seabra e Dantas
Bião, e também por políticos influentes do local, como o coronel Santinho do Riacho da Guia,
citado pela autora como destacada figura no cenário político de Alagoinhas.146
No período, a organização agrária do Brasil possibilitava a dependência da população
rural ao fazendeiro, e impedia o contato direto dos partidos com essa parcela de eleitores, que
era majoritária, de forma que o intermédio do dono de terras se tornava essencial para o
governo do Estado conseguir vencer as eleições. Os dependentes dos senhores de terras
consideravam o patrão como seu benfeitor, pois era por meio dele que conseguiam alguns
favores, e os votos de cabresto resultavam dessa organização econômica rural, de forma que a
dependência que se mantinha impedia, na maioria das vezes, os trabalhadores contestarem por
melhorias, pois a falta de suporte do Estado mantinha na figura do coronel, o seu único
benfeitor.147 Além da proximidade, afinal, nas urgências da vida como a alimentação e os
auxílios nos momentos de doenças e mortes de familiares, era com eles que a população
poderia contar.
144
O PLEITO nos distritos ocorreu fraudulentamente. Jornal A Pátria Baiana, Salvador, 16 jun. 1920.
145
Segundo Keite Lima, o coronel Saturnino foi um homem de origem simples que conseguiu fazer carreira
política, chegando até o cargo de Intendente do município de Alagoinhas.
146
LIMA, Keite Maria Santos do Nascimento. O Coronel Saturnino da Silva Ribeiro e a cidade de
Alagoinhas – Ba. Uma história de reconhecimento e esquecimento (1905-1937). In: XXVIII SIMPÓSIO
NACIONAL DE HISTÓRIA – Lugares e Historiadores: Velhos e novos desafios. Florianópolis/SC, 2015.
Disponível em:
http://www.snh2015.anpuh.org/resources/anais/39/1434398820_ARQUIVO_OCORONELSATURNINODASIL
VARIBEIROEACIDADEDEALAGOINHAS.pdf. Acesso em 24 maio 2022.
147
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, enxada e voto. O município e o regime representativo no Brasil. São
Paulo: Companhia das letras, 1948. p. 25.
70
Por essa razão a figura de homens como Santinho se fizeram notórias nessas regiões
rurais, seja por seus padrões de vida abastados, ou pelo seu modo de demonstrar poder e
autoridade entre os moradores. Maria da Guia enfatiza que para os padrões da época, os
homens eram íntegros em sua forma de viver, e que o coronel Santinho procurava seguir esses
padrões éticos, mesmo em meio a situações desconfortáveis. Ela relata que em certa ocasião,
Santinho seguia para Alagoinhas na boleia de um caminhão, que atolou no caminho, e
“mesmo vestido de terno branco” começou imediatamente a ajudar os que estavam ali a
retirar o caminhão da lama. Segundo ela, em certo momento Santinho viu um jovem que
estava parado, apenas olhando, e então gritou para que o mesmo viesse ajudar, e a resposta
que recebeu foi: “se o senhor está apressado, leve o caminhão na cabeça!”. Essas palavras
teriam levado o coronel a esbofetear o rapaz, e também a sacar o seu revólver para ele, atitude
que segundo a autora foi denunciada à polícia, fazendo com que Santinho respondesse um
processo judicial.148
Percebemos neste episódio, que a autoridade de Santinho foi questionada, pois mesmo
Maria da Guia enfatizando que ele possuía atitudes de um homem que seguia os padrões
éticos da época, procurando ajudar as pessoas mesmo com seu “paletó branco”, elas não
deixavam de ser questionadas, uma vez que ele foi posteriormente denunciado à polícia. Não
tivemos acesso ao processo mencionado, mas destacamos que a autoridade de Santinho foi
enfrentada perante a justiça. Após o ocorrido, Maria da Guia afirma que os amigos do
coronel, e também o seu genro, o incentivaram a negar o espancamento diante do juiz, para
que a situação fosse amenizada e sua sentença fosse favorável, mas que na hora precisa ele
narrou os fatos como realmente tinham acontecido, afirmando que: “um homem da minha
idade não vai mais aprender a mentir!” Maria da Guia afirma ainda que “esse era o código de
ética dos homens daqueles tempos”.
É um relato questionável, pois dizer a verdade perante o juiz provavelmente não o
isentava da culpa e da responsabilidade dos atos que cometeu. Há de se pensar que,
possivelmente ao ser aconselhado a dizer a verdade, seus amigos ou o próprio coronel,
tenham tentado subornar testemunhas que estavam presentes no local, para confirmar que ele
não tinha espancado ou ameaçado o rapaz com o revólver. Esta é uma verdade que não
conseguiremos alcançar. Assim, percebemos que Maria da Guia identifica no coronel uma
figura que seguia os padrões de respeitabilidade da época, pelo fato do mesmo não mentir
para esconder os seus erros. Ela não leva em conta a violência da ação. Por outro lado,
148
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p. 51-52.
71
percebemos que, mesmo descrito como um homem digno, que não aceitava ofensas, o coronel
não estava isento de pagar pelos seus atos, precisando responder na justiça pelos seus erros.
Ainda de acordo com Maria da Guia, no período eleitoral, era na casa de Santinho que
os eleitores do Riacho faziam a solicitação direcionada ao Juiz da Comarca, pedindo a sua
qualificação como eleitor, para que assim fosse expedido o título, que também chegava pelas
mãos do coronel. Segundo ela, nesse período o coronel Santinho e toda a família se
empenhavam em cobrar os favores prestados à população local, e diante da possibilidade de
suspeita de mudança de voto, o eleitor era interrogado na Igreja Católica do Riacho, perante o
altar de Nossa Senhora da Guia, tarefa que era feita por Teresa e Amélia, as filhas de
Santinho.149 Além disso, o coronel oferecia regalias no dia das eleições, possivelmente uma
estratégia para angariar votos e persuadir o eleitorado a comparecer na votação:
Percebe-se no relato, que as trocas de cédulas na hora do voto, feita pelas filhas de
Santinho, indicam que havia oposição política a Santinho no Riacho da Guia, e que o poder e
controle do eleitorado exercido pelo coronel não era absoluto como ela tentou demonstrar,
pois de outro modo não se cogitaria a possibilidade de mudança de voto. É provável que as
regalias oferecidas pelo coronel ocorressem apenas nos períodos eleitorais, como um tipo de
“compra de votos”, ou uma maneira de ludibriar os moradores do local. Para os eleitores de
Santinho as eleições provavelmente não representavam algo relevante em suas vidas. Por
outro lado, o voto que eles direcionavam ao coronel também lhes era conveniente, pois
naquele dia poderiam usufruir de regalias que talvez não conseguissem por seus próprios
meios, e dessa forma era vantajoso para ambos os lados. Nota-se também, que o favor
prestado pelo coronel não representava uma total fidelidade dos eleitores, pois se assim fosse,
não haveria a necessidade coagir o eleitorado, apelando com o recurso da sua fé. Com o
receio de que os eleitores mentissem sobre suas escolhas, se valiam do apelo do juramento
diante do altar da Santa.
149
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011, p. 59.
150
Ibidem, p.58.
72
151
CHARTIER, Roger. A História Cultural: entre práticas e representações. Tradução de Maria Manuela
Galhardo. Lisboa: Difel/rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1990, p. 17.
152
LIMA, Keite Maria Santos do Nascimento. Entre a Ferrovia e o Comércio: Urbanização e Vida Urbana em
Alagoinhas (1868-1829). Dissertação. (Mestrado em História) Universidade Federal da Bahia – UFBA.
Salvador, 2010. p. 02.
153
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011, p.59.
154
BARROS, Salomão. Vultos e feitos do município de Alagoinhas. Salvador: Artes Gráficas, 1979. p.312.
73
155
PANG, Eul-Soo. Coronelismo e Oligarquias 1889-1934. A Bahia na Primeira República Brasileira. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1979. p. 40
156
Ibidem, p. 47.
74
157
FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: Editora da USP. 1994. p. 319-320.
75
que ficou responsável para divulgar a Aliança Liberal na capital e em alguns municípios da
Bahia.158
De acordo com Eliana Evangelista Batista, em Alagoinhas os grupos de maior
projeção social mostraram-se a favor da candidatura de Vital Soares para vice-presidente do
país, onde importantes líderes locais assinaram um telegrama em apoio a essa indicação, entre
os quais estavam Dantas Bião159 e Saturnino Ribeiro, importantes comerciantes da cidade e
apoiadores de Otávio Mangabeira.160
O jornal Correio de Alagoinhas, destacou a passagem da Aliança Liberal na cidade,
em que um discurso em favor da chapa de Getúlio Vargas foi realizado por J.J. Seabra, na
praça de Alagoinhas que leva o seu nome.161A campanha da Aliança Liberal também recebeu
adesão de chefes políticos locais de Alagoinhas. Ligado a José Joaquim Seabra, na esfera
local, o coronel Santinho procurou seguir suas decisões políticas, apoiando inicialmente a
campanha aliancista e posteriormente colocando-se em oposição ao governo Vargas. A
documentação pesquisada permite-nos considerar que Santinho foi muito influenciado por J.J.
Seabra, e foi durante um de seus mandatos como governador da Bahia que Santinho foi
nomeado como substituto do juiz de direito da cidade. Entendemos assim que o sistema de
compromissos do coronelismo era uma realidade na vida do coronel, que buscava dar apoio
ao poder estadual, do mesmo modo que provavelmente dependia do apoio de Seabra, pois
segundo Consuelo Novais Sampaio, enquanto esteve no poder, Seabra procurou desenvolver
em seu governo um esquema de domínio absoluto da política estadual, em que procurava
“controlar o Legislativo na capital, e domesticar os coronéis no interior”.162
Em primeiro de março de 1930, o candidato que representava a elite cafeeira, Júlio
Prestes, venceu as eleições presidenciais. Após a derrota nas eleições, alguns oposicionistas
viram como alternativa apoiar o ponto de vista dos tenentes, que nos anos anteriores teriam
tentado conseguir respostas pelas armas, através do movimento tenentista iniciado em 1922
com a Revolta do Forte de Copacabana. Segundo Boris Fausto, mesmo derrotado,
158
A FRENTE única da Bahia. Jornal A batalha, Rio de janeiro, 4 de set. 1930. Disponível em :
http://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/. Acesso em 03/03/2022.
159
Joaquim Climério Dantas Bião era natural da cidade de Santo Amaro, na Bahia. Mudou-se para Alagoinhas
na sua juventude e tornou-se um político prestigiado. Formado em medicina pela Faculdade da Bahia, exerceu
mandatos de Senador Estadual, entre os amigos políticos destaca-se Otávio Mangabeira. Ver: BARROS,
Salomão. Vultos e feitos do município de Alagoinhas. Salvador: Artes Gráficas, 1979.
160
BATISTA, Eliana Evangelista. A Bahia para os baianos. Acomodação e reação política ao governo de
Getúlio Vargas (1930-1937). Tese. (Doutorado em História Social) - Faculdade de Filosofia e Ciências
Humanas, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2018. p. 40
161
PRÓ liberal. Correio de Alagoinhas, Alagoinhas, 26 fev.1930. p. 1.
162
NOVAIS, Consuelo Sampaio. Partidos políticos da Bahia na Primeira República. Salvador, Editora da
Universidade Federal da Bahia, 1998, p. 29.
76
posteriormente o movimento tenentista continuava sendo uma força de importância por sua
experiência militar.163 Assim, a Revolução de 1930 foi caracterizada como um Golpe de
Estado, que impediu a posse do candidato Júlio Prestes a presidência da República, eleito
pelo voto popular, e colocou em seu lugar Getúlio Vargas, que assumiu a presidência no
momento que marcou o fim da Primeira República do Brasil. Após o movimento, Getúlio
assumiu um governo provisório, que durou até o ano de 1934, quando pelos termos legais da
Constituição foi eleito como presidente, o que garantiria sua estadia no poder até 1938, ano
em que haveria novas eleições.164
Para Boris Fausto, as disputas em torno da sucessão presidencial, ocorridas em 1929,
ganharam uma expressão mais ampla com a formação da Aliança Liberal. Entretanto, as
forças que realizaram a Revolução não eram exatamente as mesmas que formaram a Aliança,
de forma que a derrota eleitoral de 1929 teria explicado apenas em parte a Revolução. 165De
acordo com Sonia Mendonça, o monopólio do poder estatal pelas elites agrárias não estava
isento de conflitos entre as classes dominantes, e as insatisfações das oligarquias de “segunda
classe”, que reivindicavam a extensão das políticas setoriais, abriu possibilidades para as
cisões oligárquicas que, atreladas a crise econômica que o Brasil passava em 1929, resultaram
na articulação de estados para a derrubada do regime republicano em 1930.166
Na Bahia, as elites baianas receberam o movimento de 1930 com um sentimento de
mal-estar, ao ver desfeita a estabilidade política que o Estado vivia antes desse período. De
acordo com Paulo Santos Silva, era um momento em que as lideranças do Estado
recuperavam uma posição de destaque com a transição governamental de 1930, que colocou a
Bahia em uma posição relevante no cenário político nacional, com a eleição de Pedro Lago.
Essa perspectiva foi afastada com o movimento de 1930, que desfez a acomodação e o bem-
estar dos políticos baianos, visto que a Revolução afastou os principais membros políticos da
Bahia do aparelho do Estado, estes que consequentemente não aderiram ao movimento.167
Para Paulo Santos Silva, o único nome da política baiana que aderiu ao movimento de
1930 foi José Joaquim Seabra. Nascido em 21 de agosto de 1855 e falecido em 5 de dezembro
de 1942, J.J. Seabra foi um personagem expressivo na política baiana, principalmente durante
a República Velha, quando foi governador da Bahia por dois mandatos, o primeiro na eleição
163
FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: Editora da USP. 1994. p. 309-310.
164
Ibidem, p.365.
165
Ibidem, p. 227-250.
166
MENDONÇA, Sônia Regina de. Estado e Sociedade: A consolidação da república oligárquica. In:
LINHARES, Maria Yedda (org.). História Geral do Brasil. Rio de Janeiro: Elsevier, 1990.p.475-477.
167
SILVA, Paulo Santos. Âncoras de tradição: luta política, intelectuais e construção do discurso histórico na
Bahia (1930-1949). Salvador: EDUFBA, 2000, p.25.
77
Ao prezado Sr. Cel. José Lucio dos Santos Silva, saúda cordialmente, e toma
a liberdade de pedir o valioso concurso de sua real e merecida experiência
nesse município, em favor da causa da Aliança Liberal, afirmando-lhe que se
sentirá muito penhorado com o acolhimento que este apelo encontrar em seu
alto patriotismo.171
168
Ibidem, p. 26.
169
CPDOC. Telegrama de Seabra a Getúlio Vargas. Arquivo: Getúlio Vargas. Disponível em:
http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/arquivo. Acesso em: 10 jun.2022.
170
SILVA, Paulo Santos. Âncoras de tradição: luta política, intelectuais e construção do discurso histórico na
Bahia (1930-1949). Salvador: EDUFBA, 2000, p.26.
171
Carta emitida por Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, e endereçada ao coronel Santinho. Este documento
encontra-se nos anexos do livro Coronel Santinho do Riacho da Guia.
172
BATISTA, Eliana Evangelista. A Bahia para os baianos. Acomodação e reação política ao governo de
Getúlio Vargas (1930-1937). Tese. (Doutorado em História Social) - Faculdade de Filosofia e Ciências
Humanas, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2018. p.42.
78
A adesão do coronel Santinho foi destacada em alguns jornais do país, e denota que a
inclinação política do coronel naquela conjuntura se mostrava relevante para aqueles que
tinham o seu apoio político. O jornal Correio da Manhã, da cidade do Rio de Janeiro,
publicou no dia 25 de fevereiro de 1930, em uma coluna cujo título era “Uma influência
política que adere a Aliança Liberal”, o anúncio de que José Lucio dos Santos Silva, citado
como influência política da cidade de Alagoinhas, tinha aderido à Aliança Liberal, através de
um manifesto publicado na imprensa.173
O periódico O jornal, em dia 11 de fevereiro de 1930, ao tratar das “Caravanas
Liberais do Norte do Paiz”, informou que, em Alagoinhas, elas foram recebidas por uma
grande massa popular, e que na ocasião o coronel José Lucio dos Santos Silva, e também o
coronel Joaquim Cravo foram citados como prestigiosos políticos de Alagoinhas que
prestaram adesão a Aliança Liberal.174 As caravanas liberais tinham a função de percorrer os
municípios realizando comícios em favor da campanha. Na Bahia, ela era realizada por
políticos como J. J. Seabra, Nelson Carneiro, João Neves, Carlos Machado, entre outros
políticos que ficaram responsáveis por viajar pelas regiões baianas discursando a favor da
causa aliancista.175
A chapa aliancista foi derrotada nas urnas, e as acusações de fraudes eleitorais foram
constantes. De acordo com Eliana Batista, na Bahia, os grupos que estiveram à frente da
Aliança Liberal foram sondados para participar do movimento de conspiração revolucionária,
mas apenas alguns militares e poucos civis foram envolvidos na conspiração. Para a autora,
deve-se considerar que a derrota deveu-se em parte aos efeitos produzidos pela censura da
imprensa, que agiu como uma estratégia para barrar o crescimento da campanha.176
Da mesma forma, percebe-se um descrédito na forma de tratamento dos jornais locais,
quando despontou o movimento revolucionário em outubro de 1930, como observamos no
jornal Correio de Alagoinhas, que traz o título de Borrasca Revolucionária:
173
UMA INFLUÊNCIA política adere a Aliança Liberal. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 25 fev.1930. p.2.
Disponível em: http://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/. Acesso em: 03/03/2022.
174
CARAVANAS Liberais do Norte do Paiz. O Jornal, Rio de Janeiro, 11 fev.1930. p.18. Disponível em:
http://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/. Acesso em 03/03/2022.
175
BATISTA, Eliana Evangelista. A Bahia para os baianos. Acomodação e reação política ao governo de
Getúlio Vargas (1930-1937). Tese. (Doutorado em História Social) - Faculdade de Filosofia e Ciências
Humanas, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2018.p.42-43.
176
Ibidem, p.50-51.
79
O jornal destacava ainda as forças de combate que estavam disponíveis para vencer o
movimento, e que diante da sua gravidade, Washington Luis afirmava a garantia de que o
abafaria. Todavia, Eliana Batista afirma que a mobilização do governo foi tardia. Segundo a
autora, no âmbito militar, assumiu a liderança na Bahia o tenente Joaquim Ribeiro Monteiro,
que recebia instruções de Joaquim Távora, líder da Revolução no norte do país, e apesar da
derrota nas urnas pelo situacionismo, o movimento revolucionário que se seguiu foi vitorioso.
De acordo com Salomão Barros, em Sauípe, um povoado que fica a 3 km de
Alagoinhas, em 24 de outubro de 1930, a vanguarda revolucionária entrou em combate com o
Posto de Vigilância Legalista, que resultou na morte de um militar, o cabo Josino, deixando
também outros militares feridos. Segundo o autor, Alagoinhas teve um papel de destaque no
movimento revolucionário, e acolheu os vitoriosos da revolução, pois segundo o autor a
vitória da revolução foi anunciada em Alagoinhas, às 10 horas da manhã do dia 24 de outubro
de 1930.178
Segundo Maria da Guia, nesse período de agitações militares com o movimento
revolucionário, os homens do Riacho da Guia se esconderam no matagal em torno do
povoado, e as mulheres e crianças se esconderam na Igreja do distrito. De acordo com a
mesma, o coronel Santinho foi ao encontro da coluna de militares vindos da Paraíba,
comandada por Juraci Magalhães, e foi considerado como um membro vitorioso do
movimento.179 Assim, ao que tudo indica, Santinho esteve inserido na luta revolucionária,
todavia não podemos deixar de identificar no relato da autora, o destaque para a participação
de Santinho no movimento, em detrimento da população do Riacho, que segunda a mesma
teria se escondido.
Com uma base de apoio limitada, a Revolução de 1930 foi se implantando com a
indicação de interventores. Na Bahia, Getúlio Vargas nomeou Leopoldo do Amaral, Artur
Neiva, e por fim, em 1931, o tenente Juracy Magalhães. 180 De acordo com Maria da Guia,
enquanto estava aliado à Aliança Liberal, Santinho participou das articulações revolucionárias
177
BARRASCA revolucionária. Correio de Alagoinhas. Alagoinhas, 11 out. 1930, p.5.
178
BARROS, Salomão. Vultos e feitos do município de Alagoinhas. Salvador: Artes Gráficas, 1979. P.204-
205.
179
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011.p.30-41.
180
SILVA, Paulo Santos. Âncoras de tradição: luta política, intelectuais e construção do discurso histórico na
Bahia (1930-1949). Salvador: EDUFBA, 2000, p.28-30.
80
181
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p. 40.
182
BATISTA, Eliana Evangelista. A Bahia para os baianos. Acomodação e reação política ao governo de
Getúlio Vargas (1930-1937). Tese (Doutorado em História Social) - Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas,
Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2018. p. 80.
81
Com a Revolução de 1930, José Joaquim Seabra afirmou seu apoio a Getúlio Vargas e
ao programa da Aliança Liberal. Santinho, que era seu aliado, também apoiou o movimento.
Entretanto, em 1933 ambos já se colocavam em oposição ao governo, participando das
disputas eleitorais com a Concentração Autonomista. Neste capítulo trataremos do período em
que Santinho fez oposição ao governo de Juracy Magalhães (interventor nomeado por Getúlio
Vargas), objetivando entender se esse momento atingiu sua vida econômica e política.
Analisaremos o período que se seguiu ao fim do Estado Novo, em 1945, discutindo a
participação política de Santinho com a redemocratização eleitoral e o seu posicionamento
político no período. Para a condução deste capítulo utilizamos como fontes os periódicos do
município e de alguns estados do país, Atas da Câmara Municipal de Alagoinhas e o livro de
memórias Coronel Santinho do Riacho da Guia.
3.1 EM OPOSIÇÃO
183
SILVA, Paulo Santos. Âncoras de tradição: luta política, intelectuais e construção do discurso histórico na
Bahia (1930-1949). Salvador: EDUFBA, 2000. p. 37.
184
Ibidem, p. 28-31.
82
185
Ibidem, p.15.
186
Ibidem, p.35-41.
187
BATISTA, Eliana Evangelista. Reações à Concentração Autonomista no interior da Bahia (1932/1937).
In/: XXVII SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA- Conhecimento histórico e diálogo social, 2013, Natal/RN.
Anais [...] Natal: UNEB, 2013. p. 1-18. Disponível em:
http://www.snh2013.anpuh.org/resources/anais/27/1364955997_ARQUIVO_TextoAnpuh-2013.pdf Acesso em:
10 jun.2022.
83
Joaquim Climério Dantas Bião era natural de Santo Amaro, na Bahia, mas passou a
residir em Alagoinhas na juventude, onde tornou-se um grande proprietário de terras e de
gado na cidade. Formou-se em medicina e também foi senador estadual, sendo politicamente
muito ligado a Otávio Mangabeira. Faleceu em 10 de outubro de 1936, e foi sepultado em
Alagoinhas.189 Percebe-se que as facções políticas buscavam se interligar e formar laços em
favor da oposição, e a necessidade de se posicionar frente à conjuntura existente. Observamos
também que o coronel Santinho tinha considerável força política, e esteve envolvido nessas
junções políticas em torno da corrente oposicionista.
Ainda segundo Eliana Batista, em meio às campanhas eleitorais, o governo de Getúlio
Vargas perseguiu seus opositores. José Joaquim Seabra, em uma visita a Bahia em 1933, teve
sua estadia marcada por essas perseguições. Na viagem, Seabra fez palestras na capital,
Salvador, e também procurou trocar correspondências com seus correligionários do interior,
fazendo campanha e criticando a administração de Juracy Magalhães. Nesta visita, um de seus
oradores, o advogado Otávio Barreto, foi preso pouco tempo depois do desembarque, e além
disso o jornal O Imparcial, que tentou manter-se contra o governo, relatando essas
perseguições, também teve sua circulação suspensa.190
Retornando ao Rio de Janeiro, Joaquim Seabra concedeu algumas entrevistas para o
jornal A Batalha, denunciando as perseguições à imprensa baiana, e também aquelas sofridas
por ele e seus apoiadores durante a visita ao estado da Bahia. Em uma dessas entrevistas, em
21 de outubro de 1933, que tinha por título “Selvagerias e Violências”, Seabra relatou, entre
outras informações, a prisão e o espancamento, na penitenciária baiana, de Nelson Carneiro
de Souza, afirmando que após o espancamento ele teria aparecido “com a roupa
188
AMIGOS do sr. Otávio Mangabeira aderem ao situacionismo baiano. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 24
de fev. 1933. p. 3, http://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/. Acesso em 03/03/2022.
189
BARROS, Salomão. Vultos e feitos do município de Alagoinhas. Salvador: Artes Gráficas, 1979. p.281.
190
BATISTA, Eliana Evangelista. A Bahia para os baianos. Acomodação e reação política ao governo de
Getúlio Vargas (1930-1937). Tese. (Doutorado em História Social) - Faculdade de Filosofia e Ciências
Humanas, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2018.
84
ensanguentada, todo lapeado pelos braços e pelo corpo, efeito da surra levada na Bahia.”191
Nelson Carneiro era um bacharel em direito, que sempre reafirmava a sua fidelidade a Seabra,
e que anos depois, após a derrubada do Estado Novo, daria encaminhamento a organização
dos centros Cívicos J. J. Seabra, que entre outras coisas, tinha o objetivo de cultuar a memória
de Seabra e buscar a implantação de suas ideias, reiterando a sua fidelidade.192
Ainda nesta entrevista fornecida ao jornal A Batalha, Seabra relatou a perseguição
imposta a Antônio Silva Lima, o genro do coronel Santinho, que segundo o jornal militava na
oposição, trabalhando no periódico A União, em Alagoinhas:
Antônio Silva Lima era marido da filha caçula de Santinho, Teresa, e pai de Maria da
Guia. Não encontramos registros do jornal A União, mas em seu livro, Maria da Guia traz
relatos de perseguições sofridas por seu pai Antônio Silva Lima, destacando também a
estratégia que ele teria usado para “escapar” da prisão, conseguindo ajuda do Cabo do
exército, que teria sido aluno da sua mãe, permitindo assim, por consideração, que ele se
comunicasse com a redação do jornal que trabalhava.
Na esteira dos ódios políticos estava meu pai Antônio Silva Lima então
noivo da filha do Coronel Santinho, Teresinha. Ele militava no jornalismo de
oposição em Alagoinhas, foi feito prisioneiro e mandado de trem sob escolta
para Salvador. O soldado que o vigiava, um cabo do Exército de nome
Dourado, puxou conversa com seu prisioneiro e chegaram à conclusão que o
mesmo fora alfabetizado no sertão bahiano pela mãe de Antônio Silva Lima,
agora seu prisioneiro. (...) O cabo Dourado fingiu que não viu quando meu
pai, em uma parada de trem já nas proximidades de Salvador, foi a estação
ferroviária e conseguiu comunicar-se por telefone com a redação do jornal
no qual trabalhava em Salvador. Esta iniciativa possibilitou o conhecimento
da sua prisão e as iniciativas foram tomadas para a sua libertação.194
191
SELVAGERIAS e violências. A Batalha, Rio de Janeiro, 21 out. 1933.
http://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/. Acesso em 03/03/2022.
192
SILVA, Paulo Santos. A volta do jogo democrático, Bahia 1945. Salvador: Assembleia Legislativa da
Bahia. Salvador, 1992, p.130-131.
193
SELVAGERIAS e violências. A Batalha, Rio de Janeiro, 21 out. 1933.
http://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/. Acesso em 03/03/2022.
194
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p. 47.
85
Destacamos que Maria da Guia está retratando o próprio pai nesse episódio, e que as
interferências familiares de resgate da memória podem ter influenciado na construção deste
relato. Maria da Guia afirma que o coronel Santinho também passou por momentos de
perseguições como este, depois que se colocou em oposição ao governo. Ela relata um
episódio em ele foi cercado em sua casa para ser preso, por causa dos ataques às autoridades
que fazia em seu jornal. No entanto, diferente do genro, que chegou a ser preso, o coronel
conseguiu escapar, com a ajuda de uma de suas filhas:
O resultado dos ataques às autoridades foi que certa vez a polícia, com
ordem de prisão, cercou a casa de Santinho. Ele conseguiu escapar pela porta
dos fundos para a fazenda Patioba. Para tentar localizá-lo, uma das filhas foi
levada de carro pelos policiais para a casa da avó na Patioba. A intenção era
atrair Santinho com a presença da filha e assim seria determinar sua presença
no local. Mas a filha agiu astuciosamente. Ao aproximar-se da casa da avó,
ela começou a chamá-lo pelo nome, assinalando com isso sua presença e
possibilitando a fuga do pai mais uma vez.195
governo, de forma que “o maior mal que poderia acontecer a um chefe político era ter o
governo do Estado como adversário”, pois sem o Estado não conseguiriam manter por muito
tempo a sua liderança.196
Para Paulo Santos Silva, a base de apoio do governo de Juracy Magalhães estava na
troca de favores com os coronéis, atividade típica da Primeira República. No entanto, não
eram todos os coronéis que se tornavam a base de apoio do interventor, pois ele identificava
os coronéis que lhe pareciam mais adequados e repudiava os que, segundo ele, não mereciam
sua confiança.197 Entre esses provavelmente estavam aqueles que, assim como o coronel
Santinho, se opuseram ao seu governo. Percebe-se assim que mesmo após o fim da Primeira
República, os chefes locais continuaram a ter papel decisivo no processo político,
principalmente em razão da maioria do eleitorado brasileiro se encontrar nos ambientes rurais,
o que endossa a percepção de Eul-Soo Pang, quando afirma que a influência do coronelismo
na Primeira República não desapareceu com a ascensão de Getúlio Vargas ao poder, que não
houve um declínio, mas sim mudanças. Para o autor, o coronelismo evoluiu para “uma nova
forma de domínio oligárquico”,198em que o coronel não dependia mais dos seus próprios
recursos para expandir o seu poder pessoal, mas dos recursos do governo:
196
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, enxada e voto. O município e o regime representativo no Brasil. São
Paulo: Companhia das Letras, 1948. p. 36.
197
SILVA, Paulo Santos. Âncoras de tradição: luta política, intelectuais e construção do discurso histórico na
Bahia (1930-1949). Salvador: EDUFBA, 2000. p. 31.
198
PANG, Eul-Soo. Coronelismo e Oligarquias 1889-1934. A Bahia na Primeira República Brasileira. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1979. p. 60.
199
Ibidem, p.232-233.
200
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, enxada e voto. O município e o regime representativo no Brasil. São
Paulo: Companhia das Letras, 1948. p. 20.
87
201
SILVA, Paulo Santos. A volta do jogo democrático, Bahia 1945. Salvador: Assembleia Legislativa da
Bahia. Salvador, 1992. p. 118-120.
202 LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p. 45.
88
partidos opostos. Nascido em Salvador em 1910, Nelson Carneiro foi um político com
trajetória extensa. Participou de diversos partidos, foi deputado federal em cinco mandatos, e
senador em dois mandatos, findando carreira com 44 anos de exercício. Filiou-se ao Partido
Democrático Universitário Baiano em 1929, influenciado por Joaquim Seabra. Iniciou
carreira como jornalista em O Jornal, órgão aliancista que apoiou a Revolução. Formou-se em
direito da família, onde começou a traçar os primeiros esboços das teses divorcistas, que mais
tarde marcariam sua atuação.203
No período das discussões da emenda sobre o divórcio, defendida pelo deputado
Nelson Carneiro, o periódico de Alagoinhas O Nordeste, se manifestou em um tom favorável,
pois segundo o referido jornal, o projeto do deputado tinha “um cunho moral e cristão (...) um
velho anseio do povo brasileiro que se sente envergonhado de ser tão atrasado”, finalizando a
matéria afirmando que, o jornal estava liderando um movimento de solidariedade a Nelson,
enviando uma mensagem de apoio, que poderia ser assinada por todos que quisessem
comparecer ao jornal.204 Algumas páginas depois, mas na mesma edição, a matéria Notas e
Fatos, trazia a notícia dessa vez em um tom um pouco mais crítico:
Assim, em meio a opiniões diversas, em 1977, após várias tentativas, Nelson Carneiro
conseguiu aprovar a emenda constitucional que instituiu o divórcio no Brasil.206Nesse período
de oposição e dificuldades, Maria da Guia afirma que na localidade do Riacho da Guia
Santinho também teve seus opositores, que procuravam persegui-lo politicamente. O maior
deles teria sido o subdelegado Manoel Virgílio da Caldeira, indicado pelo intendente de
Alagoinhas e pelo interventor do Estado. Maria da Guia relata que, certa vez o subdelegado,
que era seu rival, fez uma batida policial no local em que Santinho jogava, para dar ordem de
prisão ao coronel por porte de arma, prática de jogo em local não autorizado, e também pela
morte de uma cabra do próprio subdelegado, que teria entrado na propriedade de Santinho, e
203
Biografia Nelson de Souza Carneiro. FGV – CPDOC, 1984. Disponível em:
http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/nelson-de-sousa-carneiro. Acesso em
05/03/2022.
204
NOTAS e fatos. Jornal Nordeste, Alagoinhas, 29 jul. 1951. p. 5.
205
NOTAS e fatos. Jornal Nordeste, Alagoinhas, 29 jul. 1951. p. 9.
206
Biografia Nelson de Souza Carneiro. FGV – CPDOC, 1984. Disponível em:
http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/nelson-de-sousa-carneiro. Acesso em
05/03/2022.
89
este teria abatido o animal com um tiro, deixando o corpo exposto na praça do Riacho da
Guia. Segundo o relato, três tiros foram disparados contra Santinho, mas as balas não saíram.
Maria da Guia narra que, para os que estavam no momento e relataram o ocorrido, houve
ajuda de um poder sobrenatural ao coronel, que o fez escapar de uma morte certa pelo
subdelegado Manoel Virgílio. Por outro lado, Maria da Guia afirma que foi a esposa do
subdelegado que tirou as balas do revólver do marido, mas que a interpretação corrente foi a
de que, por ser filho de uma cigana, dotada de “poderes misteriosos, ela teria feito as balas do
revólver do subdelegado desviar-se do alvo, que era seu filho”. Santinho não foi preso, mas
ainda assim, respondeu outro processo que durou muitos anos, e ao final foi absolvido da
acusação.207
Para Maria da Guia, situações como essas ocorreram várias vezes, e tinham o intuito
de “desmoralizar e apear” a liderança do coronel no local. Observa-se que ela procura explicar
os fatos como algo sobrenatural, demonstrando que o coronel era diferente, “protegido”, e que
se destacava dentre os outros, pois de acordo com ela, no Riacho da Guia, Santinho era
Assim, para Maria da Guia, no Riacho da Guia Santinho era o chefe, aquele que todos
obedeciam irrestritamente. Ao que parece o coronel Santinho era um homem com uma
autoridade econômica e política que impunha um determinado respeito, e talvez até temor por
parte das pessoas que o rodeavam. Entretanto, nada disso poderia conferir para ele o título de
homem “obedecido de forma irrestrita”, pois o respeito e até mesmo o temor podem ter
surgido entre os moradores pelo poder econômico e político que ele possuía, pela influência
que ele exercia sobre as pessoas, e pela dependência das mesmas, fosse por causa das relações
de trabalho ou por troca de favores. Contudo, a própria narrativa da sua descendente permite
acessar diversos episódios em que essa obediência irrestrita foi colocada em xeque.
Maria da Guia afirma que o coronel Santinho tinha “gosto pelo jogo de cartas”, uma
afirmação contraditória em relação à imagem de um homem que procurava manter os valores
éticos da época, considerando que a jogatina era proibida no período. Ela afirma que Santinho
costumava se reunir com seus compradores de fumo, para jogar na casa de “Maria de Bebé”,
207
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p. 44.
208
Ibidem, p. 43.
90
que ficava próxima ao seu trapiche, e tinha fama de ser o cassino da época. Segundo Jocélia
Gonçalves, nos anos seguintes à República, a imprensa local de Alagoinhas passou a
reproduzir um discurso de civilidade e progresso, na qual passara a refutar as atividades de
diversão como a jogatina que manchava a imagem da cidade. Havia também, segundo ela,
uma perseguição constante da polícia principalmente ao jogo do bicho, que foi proibido de
acordo com o Código Penal em 1890, mas que continuou a ser realizado e se expandiu por
diversas áreas do município.209
Ao analisar a trajetória do coronel Santinho, percebemos que mesmo em oposição ao
governo ele continuou a ter determinado prestígio como chefe político do Riacho da Guia. Ao
que tudo indica, o seu poder econômico também não diminuiu, pois identificamos que ele
continuou a ser retratado por jornais locais como um homem abastado e de influência no
local, mesmo após o movimento de 1930. No periódico Correio de Alagoinhas, podemos
observar como o coronel foi apresentado na publicação da sua festa de bodas de prata em 11
de fevereiro de 1930, antes do movimento, e após a Revolução de 30, nas felicitações pelo seu
aniversário, em 29 de abril de 1937:
Nota-se que mesmo em momentos distintos o jornal se refere ao coronel Santinho com
o mesmo apreço. Na primeira citação, o jornal faz referência à comemoração das bodas de
209
GONÇALVES, Jocélia Novaes. A imprensa de Alagoinhas-Ba no início do século XX e o desejo de
“controlar” os excluídos. In: BATISTA, Eliana Evangelista (org.). Quarteto editora, 2015, p.55.
210
AS BODAS de prata do casal José Lúcio. Correio de Alagoinhas, Alagoinhas, 11 fev. 1930.
211
ANIVERSÁRIO de um prócer oposicionista alagoinhense. Correio de Alagoinhas, Alagoinhas, 29 abr.
1937.
91
prata do coronel e sua esposa, que completavam 25 anos de casamento, e foi comemorado
com festejos na casa do coronel, no Riacho da Guia. Na matéria também podemos observar
que o prestígio dado ao coronel era compartilhado pela sociedade de Alagoinhas, a julgar pela
ostentação que tinha na festa, e pela presença de convidados que faziam parte da “melhor
sociedade”, que se transportara até o Riacho da Guia por meio de automóveis, demonstrando
assim que a casa de Santinho era frequentada por pessoas da “elite”, e que o mesmo também
fazia parte dela. Já no aniversário do coronel, em 1937, o jornal não menciona festejos, mas
observamos que há uma permanência do prestígio do coronel como comerciante e político,
mesmo num momento em que estava em oposição, e que não exercia nenhum cargo público,
ele continuava a ser visto como um “oposicionista prestigioso”.
Anos depois, o casal também comemorou bodas de ouro, em fevereiro de 1955, um
momento em que Santinho não estava mais em oposição, e na ocasião vários políticos da
região compareceram à casa do coronel. A notícia também foi anunciada em uma matéria do
jornal Nordeste, que felicitou casal por completar meio século juntos.
92
O jornal aponta como participante dos festejos o coronel Filadelfo Neves e o deputado
Nelson Carneiro, que teria se deslocado do Rio de Janeiro para participar das comemorações,
que contou com uma missa realizada na igreja de Nossa Senhora da Guia, no distrito.
Podemos observar na imagem, que ao falar das bodas de Santinho e sua esposa, a única
imagem que aparece é a do coronel. É um uso político da imagem de uma família
personificada e estruturada pelo coronel. Observamos que a imagem da moral familiar foi
explorada politicamente pelo coronel, de uma família coesa apesar de tudo, pois os casos
amorosos de Santinho eram amplamente conhecidos, de acordo com os relatos, nem mesmo
da esposa ele escondia as suas “aventuras” amorosas, que resultavam em filhos fora do
casamento. No posfácio do livro Coronel Santinho do Racho da Guia, Wilis Filho, bisneto de
Santinho, narra esses momentos, afirmando que o coronelismo em si, analisando pelos
padrões da atualidade, estaria completamente errado, e que no caso do seu avô, tinha “sérios
agravantes”, no que diz respeito a sua conduta amorosa. Assim ele narra:
93
212
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011, p.86.
94
Fazendo uso desse argumento, Getúlio Vargas deu um novo golpe em 1937, e instituiu
o Estado Novo, que durou até 1945, cancelando as eleições previstas para 1938, fechando o
Poder Legislativo e cassando o registro de partidos e mandatos de deputados. No Estado da
Bahia, desde 1930 a liderança política dividia-se entre Juracy Magalhães, interventor do
Estado, e Otávio Mangabeira, representante da Concentração Autonomista. Entretanto,
segundo Paulo Santos Silva, mais tarde, com a aproximação do fim do Estado Novo, a
Concentração Autonomista da Bahia seria reforçada com a adesão de Juracy Magalhães. Isso
porque em 1937, Juracy Magalhães deixou a interventoria do Estado, e em seu discurso de
despedida, pregou sobre a democracia a qual defendia, optando por servir ao governo Vargas
em esferas não diretamente políticas. Todavia, essa atitude já o aproximava de certa forma da
Concentração Autonomista, a qual passaria a se vincular com a luta pelo fim do Estado Novo
na década de 1940.214
Com a saída de Juracy Magalhães do cargo de Interventor, o baiano Landulfo Alves de
Almeida assumiu a interventoria, e se manteve no poder até o ano de 1942, quando foi
substituído pelo General Renato Onofre Pinto Aleixo, o qual foi responsável pelo processo de
articulação política do governo Vargas, nas eleições de 1945. Com as eleições, antigos
adversários tentaram superar suas divergências, e mesmo sendo embaraçoso para juracistas e
213
FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: Editora da USP. 1994. p. 264.
214
SILVA, Paulo Santos. Âncoras de tradição: luta política, intelectuais e construção do discurso histórico na
Bahia (1930-1949). Salvador: EDUFBA, 2000.p.44-46.
95
A Alagoinhas
Lutei e sofri para reparar o mal que contra ti pratiquei. Tarde demais
compreendi o meu crime, haver contribuído para a retirada de um Saturnino
da Silva Ribeiro, da tua prefeitura para colocar em seu lugar um Mário da
Silva Cravo. Graças ao bom Deus pude viver e ver entregue os teus destinos
a um filho ilustre, Antônio Martins de Carvalho Junior, a quem me prendem
laços de verdadeira estima, e a quem todos apontam como um digno.
Reparado o mal, não precisando a política de mim, nem eu dela, enrolo a
minha velha bandeira, esfarrapada na agrulha dos combates, e recolho-me a
vida privada. Sei que tens muitos filhos dignos os quais deverão ocupar os
postos de vigilância do teu futuro, confia a eles os teus cargos. Fui um
215
Ibidem, p. 47.
216
Ibidem, p. 47.
217
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p. 40.
96
desastrado, sofri pelo meu erro, não quero, pois, recompensa, nem desejo
vingança, contigo chorei, contigo exulto de alegria.218
Já teria esquecido que alguém cujo nome não devo pronunciar, tenha querido
assassinar-me, desfechando seu revólver em minhas costas (dizem as más
línguas que a seu mando) e que V. S. com seu prestígio transformou a vítima
em algoz e o assassino em vítima? (...) ignorará que meu jornal “A União”
deixou de circular por perseguição de V. S.?2(...) Ignora talvez que V. S.
com o poder do seu ouro tentou negociar em fumo em corda (meu ramo de
trabalho) para perseguir-me? Ignora talvez que o seu agente em Fortaleza, V.
S. o levou ao armazém de Saturnino Ribeiro, onde sabia encontrar-me para
mostrar o sogro de Antônio da Silva Lima, meu genro e agente em Fortaleza,
a quem V. S. já havia mandado prender. (...). As palmas que Alagoinhas lhe
deu, foram por se ver livre de V. S. e daquela xaropada. Hoje V. S. não é
mais o poderoso sic transite glória mundi! Não guardarei rancores nem
desejos de vingança, pois V. S. não fez mais que dar realce ao meu pobre
nome, e criar para ele essa grande aura de simpatia que hoje desfruta na
sociedade. Muito grato. Renuncio até o desejo de reaver um dia, o meu
revólver colt calibre 32, registrado e que conservava como relíquia em seu
escritório, quando V.S. era Cravo & Cia, e eu era e sou José Lucio dos
Santos Silva.220
218
CARTA aberta a Alagoinhas. Correio de Alagoinhas, Alagoinhas, 08 jan. 1938.
219
CARTA aberta ao ex-prefeito Mário Cravo. Correio de Alagoinhas, Alagoinhas, 08 jan. 1938.
220
CARTA aberta à Alagoinhas. Correio de Alagoinhas, Alagoinhas, 08 de jan.1938.
97
Percebe-se através desta carta aberta de Santinho, que mesmo afirmando que não tinha
desejos de vingança em relação a Mário Cravo, apresentar suas queixas após a derrota política
de seu rival denota uma atitude vingativa, mesmo porque, após relatar as perseguições que
teria sofrido é provável que tivesse mágoa daquele que um dia foi seu amigo e que teria
alcançado o posto pela sua indicação e influência. Aqui percebemos que as rixas e querelas
entre os políticos locais influenciaram significativamente nas questões políticas e também
comerciais que afetaram o município.
Não encontramos fontes referentes ao jornal A União, mencionado por Santinho como
sendo de sua propriedade. Maria da Guia afirma que nesse período Santinho abriu o jornal
Opinião Livre, no qual ele atacava e criticava a administração local. Entretanto, encontramos
divergências nos nomes do jornal, pois identificamos que no ano seguinte, o coronel Santinho
abriu o Jornal de Alagoinhas, que durou até o ano de 1939. O jornal inaugurado em 7 de
setembro de 1938, tinha como diretor gerente Fausto Moreira Campos e suas publicações
eram feitas quinzenalmente. Em seu primeiro ano, o redator chefe era o jornalista Theodoro
dos Santos Filho, que no ano seguinte passou a trabalhar como gerente na agência de fumo em
corda do coronel Santinho na cidade de Parnaíba, além de manter também uma casa de
consignações e representações no local.221 A inauguração do Jornal foi divulgada no Correio
de Alagoinhas: “Alagoinhas tem mais um órgão de publicidade” , enfatizando que a “cidade
devia o seu novo jornal ao coronel José Lucio dos Santos Silva”.222
221
Jornal de Alagoinhas, Alagoinhas, 15 de março de 1939. p.8.
222
ALAGOINHAS tem mais um órgão de publicidade. Correio de Alagoinhas, Alagoinhas, 17 set. 1938.
98
Na figura acima vemos uma imagem de Santinho estampada na primeira página do seu
jornal, já no ano de 1939, com felicitações pelo seu aniversário. Observamos que o jornal traz
o destaque de que é uma propriedade de José Lucio dos Santos Silva, e ao mesmo tempo se
coloca como um órgão independente, noticioso e comercial. Certamente os interesses
comerciais e políticos davam o tom dos interesses do jornal e de seu proprietário, onde
provavelmente as notícias eram filtradas e adequadas também aos seus interesses. Esse jargão
de neutralidade era um recurso largamente usado pela imprensa para escamotear seus
propósitos e interesses. Segundo Tania Regina de Luca, a imprensa periódica seleciona,
ordena e narra de uma determinada forma aquilo que elege como digno de chegar ao público,
que pode atender a diferentes poderes ou interesses financeiros.223 Dessa maneira, é necessário
considerar que os discursos e a linguagem dos jornais não são neutros ou isentos, e que
223
DE LUCA, Tania Regina. A História dos, nos e por meio dos periódicos. In: PINSKY, Carla Bassanezi
(org.) Fontes Históricas. São Paulo: Contexto, 2005. p. 139.
99
atendem a interesses que vão muito além de uma simples informação à sociedade, em que a
identificação dessas intenções é fundamental para entendermos o seu contexto.224
De acordo com Maria da Guia, o jornal servia para expressar as aspirações de
Santinho no campo social, como melhoramentos para o Riacho da Guia e a instalação de uma
agência do Banco do Brasil na cidade. Além disso, também tinha o propósito de atacar o
prefeito de Alagoinhas e o interventor do Estado, afirmando sua política de oposição
estadual.225 No entanto, pouco se vê no jornal de Santinho críticas ao prefeito Antônio Martins
Carvalho ou ao governador Landulpho Alves que estavam no poder nesse período. Pelo
contrário, o jornal tece elogios aos mesmos, talvez uma indicação de que Santinho mudaria de
ideia em relação aos seus ideais políticos, como se veria em 1945, quando aderiu ao partido
PSD.
As críticas em seu jornal continuaram direcionadas ao ex-prefeito Mario Cravo, e a
pequenas situações das quais a administração da cidade deixava a desejar, porém, nada que
demonstrasse ares de um jornal oposicionista ferrenho, talvez pelo momento político em que
o país vivia, com o início do regime ditatorial do Estado Novo, que reprimia a imprensa. Um
outro ponto é que provavelmente Santinho buscou ter boas relações com a política local e
estadual, mesmo estando inicialmente em oposição, porque sem o apoio do estado o coronel
teria dificuldades de conferir favores àqueles que tinham sua “proteção”.
Paulo Santos Silva afirma que depois do movimento de 1930, as pretensões dos
coronéis continuaram sendo de ordem prática, pois estavam preocupados em atender aos
apelos de suas clientelas, que os tornariam merecedores de reconhecimento e de votos nos
futuros pleitos, e que na interventoria de Juracy Magalhães os coronéis do interior
encontraram circunstâncias adequadas as suas necessidades.226 Sabemos que ao se colocar em
oposição ao interventor Juracy Magalhães, Santinho provavelmente não obteve apoio do
governo do Estado no período em que ele esteve no poder, sendo muitas vezes até mesmo
perseguido pelo mesmo. Todavia, há de se considerar que enquanto coronel, e com a saída de
Juracy Magalhães, Santinho procurasse se adequar a política daquele período, buscando assim
uma continuidade do seu poderio no Riacho da Guia, pois provavelmente era dependente dos
favores do governo para manter sua liderança local. Constata-se também, que possivelmente
as querelas e alianças locais se sobrepunham as travadas no âmbito estadual e nacional.
224
CRUZ, Heloisa de Faria; PEIXOTO, Maria do Rosário da Cunha. Na Oficina do Historiador: conversas sobre
História e imprensa. Projeto História, São Paulo, n.35, p.253-270, dez. 2007.
225
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p. 76.
226
SILVA, Paulo Santos. Âncoras de tradição: luta política, intelectuais e construção do discurso histórico na
Bahia (1930-1949). Salvador: EDUFBA, 2000. p. 31.
100
Em um dos artigos do seu jornal, Santinho cobra do novo prefeito uma agência do
Banco do Brasil para Alagoinhas, que segundo ele por seu “pouco prestígio” com o prefeito
anterior, não foi atendido quando fez o pedido a Mario Cravo, criticando abertamente atitude
do mesmo em seu jornal, e mais uma vez, afirmando a sua responsabilidade em sua posse
como prefeito da cidade de Alagoinhas:
227
Artigo do coronel Santinho no Jornal de Alagoinhas, intitulado “Fábrica de Fitas”, anexado ao final do livro
Coronel Santinho do Riacho da Guia. Infelizmente não encontramos a matéria nos exemplares do jornal
disponíveis. Ver: LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão
Gráfica Editora, 2011.
228
MORAIS, Moisés Leal. Urbanização Trabalho e seus interlocutores no Legislativo Municipal:
Alagoinhas-Bahia, 1948-1964. Dissertação. (Mestrado em História) - Universidade do Estado da Bahia.
Salvador, 2011. p. 26.
101
229
O PREFEITO de Alagoinhas. Jornal de Alagoinhas, Alagoinhas, 15 fev. 1939. n.10.
102
Dias depois, os elogios feitos ao prefeito foram duramente criticados por Felippe de
Sant’Anna, em carta aberta direcionada ao “Pepe”, publicada no dia 15 de março de 1939 no
Jornal de Alagoinhas, indicando que os elogios ao prefeito nomeado pelo regime político de
Vargas, incomodavam o meio político opositor. Não conseguimos registros sobre as correntes
políticas defendidas por Felipe de Sant’Anna, nem a sua ligação com o coronel, no entanto,
sua carta permite inferir que ele seria da oposição e um crítico dessa aproximação de Santinho
ao governo Vargas ou aos seus representantes:
Temo meu caro, que no seu conceituado jornalzinho, tão colorido e enfeitado
de panegyricos aos homens de bem, (...) não haja lugar para um elogio aos
maus. (...) porque não termos também, uma palavrinha de elogios aos tidos
como maus, cujos corações são muitas vezes verdadeiros transumptos de
raras virtudes ainda desconhecidas pelos socialmente bons?230
230
CARTA aberta ao Pepe. Jornal de Alagoinhas, Alagoinhas, 15 mar. 1939. p.3.
231
É PROMISSOR o ano de 1939 para Inhambupe. Jornal de Alagoinhas, Alagoinhas, 15 jan. 1939.
103
O Jornal do coronel também serviu para divulgar suas atividades com o comércio do
fumo, funcionando como espaço de articulação e divulgação dos seus próprios interesses,
como no caso do concurso com distribuição de prêmios para estimular o comércio e produção
de fumo, que desde a década de 1930 vinha enfraquecendo sua produção na Bahia, e a
divulgação do evento beneficiaria o próprio Santinho, que provavelmente não desejava que
seu negócio decaísse e findasse, o que de fato aconteceu alguns anos depois. Por motivos
desconhecidos, o jornal mantido pelo coronel José Lucio durou pouco mais de um ano,
encerrando atividades em 1939.
Com relação aos demais jornais citados e as divergências referentes as suas
nomenclaturas, é possível que em momentos distintos alguns tenham sido criados e acabaram
tendo vida curta e exemplares não tenham sobrevivido. Este foi um recurso comum criado
pelas mesmas elites letradas do período na tentativa de criar um clima de diferentes opiniões,
mas que na prática se tratava das mesmas pessoas.
104
Aleixo, que passou a convocar os elementos ligados a administração pública, para definirem
suas posições políticas diante das duas candidaturas. Essa atitude era uma forma de pressionar
os seus subordinados, como os executivos municipais que temiam pela perda do poder caso
não atendessem o chamado do interventor, pois para os prefeitos municipais, se colocar em
oposição significava perder o prestígio político e assim vários prefeitos declararam
imediatamente o apoio ao interventor.237
Era no interior que se concentrava a maioria dos votos, e o apoio dos prefeitos era
importante tanto para a UDN quanto para o PSD, pois o controle desse eleitorado decidiria a
eleição. No entanto, segundo Paulo Santos, os chefes municipais não pareciam sensíveis aos
apelos da oposição, e a política clientelística era responsável por aumentar as vantagens de
Pinto Aleixo na disputa. Em uma exposição-feira de animais, que reuniu na capital do estado
prefeitos, fazendeiros, criadores de gado, e homens de destaque da política municipal, muitas
lideranças do interior prestaram apoio público ao interventor.238 Ao que tudo indica, entre
esses apoiadores estava o coronel Santinho, que após anos de oposição ao governo Vargas,
em apoio a J. J. Seabra e a Concentração Autonomista, com a volta da redemocratização
optou por apoiar o PSD, partido contrário a UDN, que representava a união dos autonomistas
com Juracy Magalhães. De acordo com Maria da Guia, Santinho arregimentou
correligionários para colaborar com a criação e conseguir filiados a um “partido político que
lhe coubesse com os aliados”. Segundo ela,
Segundo Maria da Guia, Santinho concordou com tudo, mas avisou ao interventor que
tinha um compromisso com seu amigo Nelson Carneiro, que estava fora das definições
partidárias, e que por essa razão apoiaria a candidatura do amigo para deputado estadual. Na
ocasião, Nelson Carneiro optara pela UDN, como fiel adepto de Seabra, e participante da
Concentração Autonomista desde o seu início. Na redemocratização política fez parte da
237
Ibidem, p.105-106.
238
Ibidem, p.107.
239
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011p. 54.
107
vertente seabrista do autonomismo, que teve papel decisivo no processo eleitoral.240A amizade
do coronel com Nelson Carneiro durou até o fim da vida de Santinho, segundo Maria da Guia,
e ele se manteve fiel no apoio a Nelson Carneiro até nas eleições seguintes, e que em 1950 a
legenda da UDN foi majoritária no Riacho da Guia, por força dos votos articulados pelo
coronel.241
Ao que parece, a amizade e respeito do coronel Santinho por Nelson Carneiro era
recíproca. Em 1949, quando estava na Câmara Federal, Nelson Carneiro fez agradecimentos
no Jornal do Brasil (RJ), àqueles que ajudaram a sua candidatura e entre eles menciona o
coronel Santinho:
Acontece que sou baiano. Foram uns cabras (ilegível) de minha terra que me
permitiram chegar à Camara Federal (...). No Riacho da Guia o coronel
Santinho usa outros métodos. Há decênios ele é o chefe, menos pela
autoridade, de que não se gaba, do que pela dedicação com que a todos
atende, aconselha e assiste. Seu prestígio por isso mesmo, atravessa
governos e transpôs e supera oposições.242
Outro autonomista que teve papel importante na luta contra o Estado Novo, foi Luiz
Viana. Advogado e também jornalista, durante a ditadura do Estado Novo dedicou-se ao
trabalho historiográfico, escrevendo livros como A Sabinada. Em 27 de fevereiro de 1945, ele
escreveu para o coronel Santinho, fazendo um apelo para a continuidade do coronel na
posição política a qual antes se mantinha.
Nos últimos sete anos, mesmo nas ocasiões em que tive o prazer de
conversar com o distinto amigo, evitei sempre tratar assuntos políticos, pois
o ambiente reinante não me proporcionava esperar poder amparar qualquer
amigo, que fosse vítima de violência. Agora, no entanto, os ventos mudaram.
E não só já respiramos um ar de liberdade e garantias, mas também nos
organizamos para sufragar um candidato, que tudo indica estar recebendo o
apoio, que lhe há de assegurar um triunfo esmagador. Nessas condições,
havendo sido sempre o distinto amigo um dos mais dedicados e valiosos
companheiros, sentir-me-ia mal se não lhe enviasse uma palavra, que, não
pretendo ser de orientação, é contudo uma advertência e um apelo no sentido
de vê-lo continuar na posição que sempre teve entre os nossos companheiros
(...).243
240
SILVA, Paulo Santos. A volta do jogo democrático, Bahia 1945. Salvador: Assembleia Legislativa da
Bahia. Salvador, 1992. p.94.
241
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p. 55.
242
EU não sou daqui. Jornal do Brasil. Rio de Janeiro, 06 out. 1949. de 1949. Disponível em:
http://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/. Acesso em: 15 mai. 2022.
243
Correspondência de Luiz Viana Filho para o coronel Santinho em 1945, em cópia anexada ao livro Coronel
Santinho do Riacho da Guia. Ver: LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia.
Fortaleza: Expressão Gráfica Editora, 2011.
108
Mesmo com os apelos de Luiz Viana, Santinho continuou a fazer parte do partido PSD
até o fim da vida. Nas eleições de 1945, a vitória nas urnas foi do seu candidato, Eurico
Gaspar Dutra, resultado que segundo Paulo Santos já era esperado, devido à pressão do
interventor para que as chefias locais assegurassem o apoio ao partido, e consequentemente a
sua vitória.244 A real motivação de Santinho ao mudar sua posição política é inalcançável,
porém, analisando o momento político, pode-se identificar suas possíveis motivações, se
observarmos que, até as eleições de 1934 o sistema político funcionava a base do
clientelismo, da relação de troca de favores entre deputados e suas bases eleitorais. Com o
fechamento do Legislativo Estadual em 1937, eles não conseguiram mais acesso aos recursos
públicos para administrar de acordo com a necessidade de suas bases eleitorais, pois quem
passou a manter esses recursos foram os interventores, vinculados aos chefes políticos de cada
município. Assim, o clientelismo passou a ser exercido diretamente pelo poder executivo, que
poderia recompensar ou punir aqueles que se mostrassem favoráveis ou contra a candidatura
oficial, o que dava ao interventor Pinto Aleixo um maior poder eleitoral, que provavelmente
foi o motivo de sua vitória.245Sendo assim, o coronel Santinho pode ter se visto acuado e
temeroso de perder favores políticos, que no momento estavam centrados nas mãos dos
interventores e do prefeito, a quem ele deu apoio, pois as articulações locais demarcavam as
alianças políticas. Cabe destacar, que ao apoiar o prefeito Santinho também estava reiterando
a sua oposição a Mario Cravo, pois estava apoiando o candidato que havia sucedido a ele.
Nas eleições municipais de 1947, o coronel Santinho, então com 64 anos, se
empenhou em colocar um sucessor político no Riacho da Guia, e indicou como candidato a
vereador seu genro, Antônio Silva Lima, pois como disse na carta aberta de 1937, ficaria
recluso. Nas eleições municipais de 1947, doze vereadores foram eleitos para a primeira
legislatura pós- Estado Novo, dos principais partidos brasileiros. Representando o PSD,
mesmo partido do sogro, Antônio Silva Lima venceu as eleições como o vereador mais
votado do município, com 394 votos, tornando-se presidente do Legislativo Municipal.246
De acordo com Moisés Leal, o pleito realizado em 1947 em Alagoinhas, apresentava
características diferentes das eleições ocorridas anteriormente, pois a maioria dos vereadores
assumiu os cargos pela primeira vez. No entanto, alguns casos traziam consigo o elemento da
continuidade, por carregarem a permanência dos nomes de famílias que estavam presentes em
244
SILVA, Paulo Santos. A volta do jogo democrático, Bahia 1945. Salvador: Assembleia Legislativa da
Bahia. Salvador, 1992. p. 143.
245
Ibidem, p.145.
246
MORAIS, Moisés Leal. Urbanização Trabalho e seus interlocutores no Legislativo Municipal:
Alagoinhas-Bahia, 1948-1964. Dissertação. (Mestrado em História) - Universidade do Estado da Bahia.
Salvador, 2011.p. 46.
109
mandatos que antecederam o Estado Novo247, lugar que também se encaixa Antônio Silva
Lima, pois mesmo não tendo o sobrenome do coronel Santinho, estava ali como seu sucessor.
Antônio Silva Lima permaneceu como vereador representante do Riacho da Guia por
apenas um mandato. Durante esse período, recebeu o título de Cidadão Alagoinhense, pela
Câmara Municipal, e segundo Maria da Guia construiu uma escola rural, em um terreno que
ele mesmo havia doado, e diligenciou para que a luz elétrica fosse fornecida no distrito do
Riacho da Guia.248 Notadamente, Maria da Guia, como filha de Antônio Silva Lima,
empenhou-se na narrativa do seu livro em exaltar os feitos do pai enquanto vereador, mesmo
que sua carreira política no Riacho tenha sido curta.
247
Ibidem, p.45.
248
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p.57.
110
249
GONÇALVES, Jocélia Novaes. A imprensa de Alagoinhas-Ba no início do século XX e o desejo de
“controlar” os excluídos. In: BATISTA, Eliana Evangelista (org.). Quarteto editora, 2015, p. 41.
250
TEMOS a barragem. Correio de Alagoinhas. Alagoinhas, 29 jul. 1939.
251
SOBRE a barragem. Correio de Alagoinhas. Alagoinhas, 12 ago. 1939.
252
BARRAGEM. Correio de Alagoinhas. Alagoinhas, 14 set. 1940.
253
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011, p. 61
111
pois na maioria das vezes, as famílias mais abastadas da região mandavam seus filhos para
estudar em Salvador, como foi o caso do próprio coronel Santinho quando jovem. Outro fato
a se analisar, é que de acordo com Maria da Guia, o genro teria percebido que no Riacho da
Guia não tinha possibilidade de crescer economicamente, e que ele queria ser independente do
sogro, pois o plantio de laranja que Antônio Silva Lima teria iniciado na localidade seria
insuficiente para cuidar da família como desejava.254 Todavia, é provável que, caso
continuasse a seguir a carreira de vereador, dificilmente teria dificuldades econômicas, tendo
em vista que se tornaria o sucessor do coronel, e que poderia ser eleito novamente. Em
Fortaleza, Antônio Silva Lima trabalhou com o comércio de fumo do coronel, que tinha filial
na localidade, o que de certa forma, continuaria a deixá-lo dependente dos negócios do sogro.
Dessa forma, tentativa do coronel Santinho de colocar um sucessor político foi frustrada, e
como não tinha filhos homens legítimos, significava para a época, que a carreira política da
família acabaria após a morte do coronel.
Com o genro fora da política, Santinho voltou a concorrer para vereador nas eleições
seguintes, e mesmo em idade avançada, continuou a exercer carreira política e também
influência na localidade, sempre ligado ao partido PSD. Em 1950, o PSD elegeu quatro
vereadores, Elias Amâncio de Souza, Heitor Dantas, Orlando Azevedo e José Lucio dos
Santos. Segundo Ede Assis, o coronel Santinho, além de ter grande ligação com Seabra,
também estava muito ligado a Pedro Dórea, quando foi eleito vereador pelo partido PSD, nas
legislaturas de 1951 a 1954. Em 1953, ele venceu novamente as eleições, tornando-se
novamente presidente da Câmara.255
254
Ibidem, p.60.
255
SOARES, Ede Ricardo de Assis. Os comunistas e a formação da esquerda (Alagoinhas, 1945-1956)
Dissertação. (Mestrado em História) - Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2013.
112
Guia, mesmo demonstrando saber do apoio que seria dado pelo coronel a Nelson Carneiro,
seu amigo pessoal:
256
A carta possui cópia anexada ao livro Coronel Santinho do Riacho da Guia. Infelizmente alguns trechos estão
ilegíveis. Ver: LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão
Gráfica Editora, 2011.
257
O jornal Nordeste foi fundado em 1948, por Joanito Rocha e com a direção de João Nou, e noticiava os
acontecimentos de Alagoinhas e das cidades vizinhas. Nas eleições de 1950, colocou-se do lado da UDN,
apoiando Juracy Magalhães, e combatendo a campanha do PSD, o jornal colocava-se contra as ideias
autonomistas, e também era antigetulista, provavelmente por influência de João Nou, que era membro da UDN
no período, e foi eleito deputado estadual no mesmo ano, sendo também advogado. Ver: SOARES, Ede Ricardo
de Assis. Os comunistas e a formação da esquerda (Alagoinhas, 1945-1956) Dissertação. (Mestrado em História)
- Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2013.
258
SOB UM clima de corrupção feriu-se o pleito. Jornal o Nordeste. 2 out. 1954.
114
Alagoinhas”259. Era uma crítica ao fracasso da UDN nas eleições, a partir da vitória de
Santinho pelo partido PSD, deixando claro que o eleitorado do Riacho da Guia era, ao menos
em sua maioria, constante no apoio ao coronel nos períodos eleitorais.
Em outubro de 1954, saíram 12 vereadores eleitos. O PSD elegeu 5 vereadores, assim
como a UDN, e o PSP elegeu 2, nessa eleição também foi vitorioso o prefeito Antônio
Martins de Carvalho Junior, representando a UDN. O candidato ao executivo municipal que
representava o PSD recebeu 2.936 votos, não conseguindo se eleger. 260
Segundo Maria da
Guia, no período de 1959 a 1963, quando Juracy Magalhães se apresentou novamente como
candidato a governador pela UDN, a filha de Santinho, Teresa, e o marido Antônio Silva
Lima, foram pressionados pelos “antigos inimigos” a intercederem por um período de paz
entre os que faziam oposição, e que assim houve um “desfile de políticos” na casa do coronel.
De acordo com Maria da Guia, até mesmo Juracy teria organizado uma visita ao coronel, que
acabou não acontecendo, por motivos que ela não relata. Ela afirma que ficou acertado que os
familiares e aliados de Santinho, votariam em Juracy Magalhães, menos o coronel, que
concordou em manter silêncio sobre sua posição nas eleições, mas deixou claro que não
votaria num antigo inimigo.261 Esse fato evidencia que Santinho não apoiava a união que se
fez entre Juracy Magalhaes e a Concentração Autonomista, após Juracy ter rompido com
Vargas em 1937, e se unido a sua antiga oposição em 1945, com o retorno das eleições.
Ao que parece, Santinho ainda guardava rancores em relação a Juracy Magalhães, pois
este, enquanto estava como interventor da Bahia no governo de Vargas perseguiu o coronel,
que por sua vez estava em oposição, e talvez esse tenha sido um dos motivos que fez Santinho
mudar de opinião ao compor o partido PSD, com o retorno da democracia. Em 1955, O jornal
O Nordeste, ao criticar o apoio de Juracy Magalhães ao candidato Juarez Távora, relembra os
momentos de perseguições feitas por Juracy ao coronel Santinho, quando o mesmo era
governador:
Tudo poderá acontecer se Juarez for presidente, pois quem mandará serão
coronel Juracy Magalhães. Poderemos até ver revividos os sofrimentos do
coronel José Lucio, no Riacho da Guia, que não está esquecido da luta que
teve que enfrentar pela sua lealdade às tradições de sua terra. Ele – o coronel
Santinho – não esquece que foram os revolucionários de 30, os comandados
259
PONTOS nos ii... Jornal O Nordeste. 15 ago.1955.
260
MORAIS, Moisés Leal. Urbanização Trabalho e seus interlocutores no Legislativo Municipal:
Alagoinhas-Bahia, 1948-1964. Dissertação. (Mestrado em História) - Universidade do Estado da Bahia,
Salvador, 2011. p. 78.
261
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p. 65.
115
Não encontramos registros sobre o delegado citado pelo jornal, nem relatos de sua
possível perseguição ao coronel, porém, como já mencionamos, através dos relatos do próprio
coronel Santinho, ele quase foi levado preso, no período em que fez oposição ao interventor
Juracy Magalhães, assim como seu genro, Antônio Silva Lima, que não teve a mesma sorte de
fugir como Santinho, e acabou sendo preso por atuar em um jornal da oposição. Entretanto, é
possível que nesse período o delegado em exercício fosse o mencionado pelo jornal.
Nas eleições municipais de 1958, Santinho demonstrou seu apoio ao candidato a
prefeito Antônio Valverde Bastos, do partido PTN, anunciando seu apoio em um
pronunciamento na praça da matriz do Riacho da Guia, que foi noticiado pelo Alagoinhas
Jornal, em 29 de setembro de 1958, ocasião em que o coronel teria afirmado que “entre os
quarto dignos candidatos ao cargo de prefeito de Alagoinhas, eu escolhi e indico ao meu
eleitorado o nome digno e honrado de Antônio Valverde Bastos.”263Com o apoio de Santinho
explicitado para a população do Riacho, que era notadamente fiel aos candidatos que o
coronel apoiava, e às próprias candidaturas do coronel, o que pode ser observado nos números
de votos que do Riacho se contavam, não seria surpresa que o candidato escolhido
conseguisse ser eleito, ou ao menos ser o mais votado na localidade do Riacho. Uma
“fidelidade” ao coronel que foi criticada pelo jornal Alagoinhas Hoje, em 23 de abril de 1960:
Repelido e derrotado em toda linha por falta de tato político, a UDN, partido
político de oposição ao PSD, ao qual Santinho pertenceu toda sua vida,
capitulou e para não ser alijada, completamente, da mesa da câmara,
perdendo a presidência que era exercida com acerto e diplomacia pelo Sr.
Luiz Rabelo, que passou para o cargo de primeiro secretário, recaindo a
escolha do presidente na pessoa do “coronel do envelope” José Lucio dos
Santos, mais conhecido como Santinho do Riacho da Guia, cuja virtude é ser
cabo eleitoral e conduzir em cabresto cerca de 500 eleitores do arraial do
Riacho da Guia, numa previsão pouco lisonjeira para os destinos de
Alagoinhas que, no impedimento do prefeito terá que ser entregue a uma
pessoa sem qualquer mérito administrativo, haja vista o atraso em que vive a
pobre gente do Riacho. Sinal dos Tempos.264
262
JURACY quer Juarez. Jornal Nordeste, Alagoinhas, 25 set. 1955. n. 188.
263
Matéria do Alagoinhas Jornal, que se encontra anexada ao livro Coronel Santinho do Riacho da Guia. Ver:
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011.65.
264
Matéria do Jornal Alagoinhas Hoje, que se encontra anexada ao livro Coronel Santinho do Riacho da Guia.
Ver: LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p.65.
116
O Jornal Alagoinhas Hoje, faz uma descrição pouco lisonjeira do coronel Santinho,
afirmando que ele “conduzia em cabresto” seus eleitores, demonstrando também certa
decepção com o partido da UDN, por ser derrotado na eleição para câmara de vereadores, que
foi entregue ao coronel Santinho, o qual o jornal denota preocupação de que na falta do
prefeito, Santinho descrito como alguém “sem qualquer mérito administrativo” poderia
assumir a prefeitura de Alagoinhas. Fica explícito que a imagem de Santinho como um
político que conduzia seu eleitorado por meio do voto de cabresto era falada entre seus pares,
e cabe ressaltar, que nesse período, por volta dos anos de 1960, essa atividade ao que tudo
indica, ainda era realizada pelo coronel, porque conseguia conduzir a população do Riacho da
Guia a votar nele, demonstrando que a prática típica do coronelismo ou seus resquícios ainda
subsistia, ao menos no Riacho da Guia.
265
Câmara Municipal de Alagoinhas. Ata do Legislativo Municipal de Alagoinhas, 20 nov.1953.
266
Câmara Municipal de Alagoinhas. Ata do Legislativo Municipal de Alagoinhas, 25 abr.1955.
117
267
Câmara Municipal de Alagoinhas. Ata do Legislativo Municipal de Alagoinhas, 08 mai.1953.
268
Câmara Municipal de Alagoinhas. Ata do Legislativo Municipal de Alagoinhas, 15 mai. 1953.
269
MUITO bem Sr. Prefeito. Jornal Nordeste. Alagoinhas, 29 jul.1951. p. 8.
118
Moisés Leal, a feira se iniciou na praça J.J. Seabra e se expandiu até a praça da Bandeira,
ficando conhecida como “feira do pau”, que acabou sendo deslocada em 1955, para a rua
Coronel Tamarindo, nas proximidades do colégio Brasilino Viegas, na gestão do prefeito
Antônio Martins de Carvalho Junior.270
Santinho faleceu em 6 de setembro de 1963, após agravamento dos seus problemas de
saúde, aos 80 anos de idade. Nota-se que em toda sua trajetória, Santinho buscou manter-se
em um lugar que lhe garantisse estabilidade política, e lhe permitisse continuar com o seu
poderio local, através das trocas de apoios e alianças com os deputados. No período inicial da
Revolução de 1930 ele esteve ao lado daqueles que já lhe ajudavam anteriormente, como
Seabra e Nelson Carneiro, e a mudança para a oposição reforça essa ideia, pois ele, por
ligação com Seabra, também passou para a oposição, demonstrando que a sua posição política
independia do partido político, mas sim do nome que estava por trás dele.
Com a redemocratização, quando o interventor Pinto Aleixo sugeriu que os chefes
locais demonstrassem sua posição política, a atitude de Santinho em apoiar governo,
dominante indica que provavelmente ele já mantinha relações estabelecidas com o mesmo,
pois como mencionamos, em seu jornal Santinho já demonstrava uma inclinação ao governo,
principalmente ao se colocar como apoiador do prefeito Antônio Martins de Carvalho.
Podemos observar também, que o apelo de Luiz Viana, para que Santinho continuasse na
oposição, indica que a relação dele com os oposicionistas já estava estremecida.
Sabemos que houve um hiato entre o primeiro momento da Concentração
Autonomista e o retorno da democracia. Todavia, mesmo com o período de tempo que se
passou, muitos daqueles que estavam no início da formação da corrente autonomista,
continuaram atuantes depois do Estado Novo. Entretanto, o coronel Santinho decidiu afastar-
se, em discordância com seus antigos aliados políticos da oposição. Podemos identificar essa
atitude como uma estratégia política, pois com os deputados da oposição desempossados dos
seus cargos durante o Estado Novo, e sem poder garantir ao coronel benfeitorias ou proteção,
Santinho, naquele novo momento, procurou ficar ao lado daqueles que tinham mais a lhe
oferecer, e que na época eram os detentores do poder político. Assim, é possível que Santinho
tenha buscado ajustar-se as situações favoráveis a ele, que fortaleciam a sua liderança no
Riacho da Guia.
270
MORAIS, Moisés Leal. Urbanização Trabalho e seus interlocutores no Legislativo Municipal:
Alagoinhas-Bahia, 1948-1964. Dissertação. (Mestrado em História) - Universidade do Estado da Bahia,
Salvador, 2011. p. 26.
119
Para Paulo Santos Silva, o momento que se estende da Revolução de 1930 a 1946,
representou um processo de “prestígio, desprestígio e represtígio dos coronéis” visto que a
retomada do processo eleitoral, em 1945, trouxe condições favoráveis ao seu reflorescimento,
permitindo a eles papel importante no processo político no período. Sendo assim, o
coronelismo se adaptou aos momentos históricos, transformando-se com eles.271 Por esse viés,
concluímos que o coronel Santinho procurou se adaptar aos momentos políticos, e talvez o
momento em que esteve em oposição o permitiu entender as dificuldades de se manter em
desacordo com os poderes governamentais, de forma que com a redemocratização, ele buscou
ir além de suas antigas alianças políticas, buscando se manter aliado do governo.
Em seus últimos anos de vida, sua saúde não permitiu um desempenho político como
manteve nos primeiros anos, pois ficava mais retraído em sua residência. De acordo com
Maria da Guia, com o tempo, o coronel tornou-se de humor introspectivo, e “passava muito
tempo contemplando o cemitério branco que se avistava do alpendre na parte de trás da casa”,
e quando ia para as seções da Câmara, um vizinho chamado Pidô dirigia seu automóvel, pois
o coronel já não podia conduzi-lo sozinho. A comercialização de fumo do coronel foi
encerrada, e ele passou a se manter como vereador e com a venda de gado. Com a saúde
muito frágil, Santinho passou seus últimos dias de vida residindo na cidade de Alagoinhas, em
residência de sua cunhada Idelfonsa, irmã de sua esposa Amélia, para que ficasse mais perto
dos serviços médicos.272
Após seu falecimento, em 6 de setembro de 1963, o deputado Nelson Carneiro, amigo
de longa data de Santinho, enviou uma carta a filha do coronel, na qual apresentava suas
condolências:
(...) soube que nosso Santinho se fora desse mundo, conduzido pela mão de
Nossa Senhora da Guia. (...) Estou mandando para ser publicado em “A
Tarde” um artigo sobre o nosso saudoso amigo, apontando-o como um
exemplo para os mais novos, pela fibra, pela lealdade, pela bravura. (...) a
mágoa que me invade a alma é irmã da que alcança aos da família, entre os
quais sempre me considerei. Não tenho o endereço, em Fortaleza do Silva e
da Terezinha, que certamente foram chamados a tempo para assistir aos
últimos momentos daquele velho jequitibá, que só a morte venceu. (...) cabe-
lhe Amelinha, assumir o lugar vazio, mantendo viva a chama do ideal por
melhores dias para esse povo.273
271
SILVA, Paulo Santos. A volta do jogo democrático, Bahia 1945. Salvador: Assembleia Legislativa da
Bahia. Salvador, 1992. p. 118-120.
272
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora,
2011. p.69-70.
273
Carta de Nelson Carneiro á Amelinha, em 30 de outubro de 1963. Cópia anexada ao livro Coronel Santinho
do Riacho da Guia. Ver: LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza:
Expressão Gráfica Editora, 2011.
120
Amelinha, filha de Santinho, não seguiu os passos do pai na política, como Nelson
Carneiro indicou que fizesse, e como Santinho não tinha outros filhos legítimos ou
identificados, a trajetória política familiar se encerrou com o coronel. De acordo com Maria
da Guia, com a saúde agravada, houve conversações familiares para preparar a retirada do
coronel Santinho da cena política para tratamento médico, e dessas discussões também
participava um morador do Riacho identificado como José, ou “Zé do Bode”, que
posteriormente tornou-se vereador do Riacho da Guia.274 A relação de Zé do Bode com a
família de Santinho, e a continuação da vida política no Riacho da Guia, suscitam uma
investigação futura.
Amélia, a esposa do coronel, faleceu em 1965, e com seu falecimento Amelinha, que
não era casada e não teve filhos, passou a morar com a irmã e o genro em Fortaleza, onde
faleceu em 1984, e desde então, a casa de Santinho foi apenas visitada pelos familiares, até se
transformar em ruínas, como se vê atualmente.275 O artigo citado por Nelson Carneiro na
carta, foi publicado no Jornal À Tarde, no dia 07 de novembro de 1963, e teve como título
“Um líder de Resistência”:
Aquele coronel sertanejo de pele curtida ao sol nas lavouras de fumo, tinha
as qualidades de liderança que vão esgarçando no mundo cada vez mais
utilitário e entre as solicitações dia a dia menos nobres. E resistiu contra todo
o peso da ditadura da violência à corrupção, do terror policial à promessa do
bem querer, ninguém o venceu eleitoralmente em seu reduto, (...) Deus
levou-o primeiro para que pudesse na hora derradeira sentir o ar de ternura
de D. Amélia, o espírito forte das filhas, as netas vencendo na vida. A
estrada que se abria diante de seus olhos moribundos devia ser, com certeza
menos difícil, mais acolhedora do que aquela outra que por amor a seu povo
lutou trinta anos. E a Senhora da Guia devia estar a espera-lo, no pórtico,
para guia-lo pela última vez, até o Reino dos Céus.276
Santinho do Riacho da Guia, em memória do seu avô, e que nos ajudou a construir a trajetória
de Santinho nesta dissertação.
122
CONSIDERAÇÕES FINAIS
declínio do coronelismo, isso não aconteceu de uma forma homogênea em todo país.
Analisando a trajetória do coronel Santinho, percebemos que mesmo em oposição ao governo,
ele continuou a ter determinado prestígio como chefe político regional, em relação à
população do Riacho da Guia e seu entorno, que pode ser justificado também pelo seu poder
econômico.
Relacionado à retomada do processo eleitoral no Brasil, a Concentração Autonomista
que se manteve inativa durante o Estado Novo, retornou às disputas políticas para as eleições
presidenciais de 1945. O rompimento de Juracy Magalhães com o governo Vargas em 1937, e
sua aproximação com a Concentração Autonomista, aproximou os remanescentes do PSD dos
autonomistas, que acabaram se unificando e fundando a UDN, que lançou a candidatura de
Eduardo Gomes para a presidência da República. Do outro lado estava o Partido Social
Democrático, fundado por Vargas, que nesse período deixou a cargo dos interventores de cada
estado, que articularam a candidatura de Dutra a presidência. Como era no interior que se
encontrava a maioria dos votos, o apoio dos chefes políticos decidiria as eleições. Em meio a
essa disputa, o coronel Santinho, que vinha de uma trajetória oposicionista, decidiu aliar-se ao
PSD, ficando em oposição àqueles que antes apoiara. A real motivação de Santinho ao mudar
sua posição política é inalcançável, porém, analisando o momento político, podemos inferir
que o coronel provavelmente se viu acuado e temeroso de novamente perder favores políticos,
que no momento estavam centrados nas mãos dos interventores e do prefeito. Identificamos
assim a importância dos acordos e alianças locais, que se sobrepunham a ideologias ou
filiações partidárias. Por outro lado, ao sair da oposição, Santinho não deixou de apoiar alguns
dos antigos aliados, como Nelson Carneiro, ao mesmo tempo em que ainda se manteve
contrário a Juracy Magalhães, pois enquanto Santinho passou a apoiar o governo, Juracy
voltou-se para a oposição.
No período de redemocratização, Santinho demonstrava dificuldades para manter o
vigor político, provavelmente em face dos problemas de saúde. Provavelmente por esse
motivo, ele tentou fazer do seu genro, Antônio Silva Lima, seu sucessor. Entretanto, depois de
exercer um mandato como vereador do Riacho da Guia, Antônio Silva Lima decidiu não
continuar carreira política, mudando-se com a família para outro estado. Sem filhos homens
para dar continuidade à sua carreira política, Santinho voltou à cena política, e se elegeu por
mais algumas candidaturas, porém, os seus últimos anos como vereador foram dificultados
pelas limitações de sua saúde, pois naquele período já estava avançado em idade.
A importância da memória nesta dissertação está demonstrada em todos os capítulos
narrados. O livro Coronel Santinho do Riacho da Guia foi o ponto de partida para se pensar
125
as questões discutidas nesse trabalho, pois a leitura do livro suscitou interesse e direcionou o
olhar para as fontes. São memórias de familiares de Santinho relatadas após seu falecimento,
detalhando a trajetória do coronel nos diferentes momentos de sua vida. Entretanto, sabe-se
que a memória é passível de questionamentos, e que porta uma carga de valores impostos pela
sociedade, pela relação familiar, de forma que se fez necessário entender as representações e
imagens que se intencionou apresentar sobre o coronel. Identificamos uma narrativa
intencionada em mostrar os feitos do coronel, de engrandecer os momentos vividos por ele
nas mais variadas situações. Em se tratando de memória herdada, há uma ligação estreita com
o sentimento de identidade. Assim, analisando a narrativa de Maria da Guia, e a oralidade
presente de demais familiares, notamos que a todo momento procurou-se divulgar a imagem
de um mito familiar, e também uma busca pela preservação de uma identidade concebida
como uma herança familiar.
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FONTES
Legislativas:
Periódicos:
Internet:
Memórias:
LIMA, Maria da Guia Silva. Coronel Santinho do Riacho da Guia. Fortaleza: Expressão
Gráfica Editora, 2011.
SANTOS, Joanita da Cunha. Traços de Ontem. Belo Horizonte: Graphilivros Editores, 1987.
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REFERÊNCIAS
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1989.
BORGES, Vavy Pacheco. Grandezas e misérias da biografia. In: PINSKY, Carla (org).
Fontes históricas. 3ª ed. São Paulo: Contexto, 2011.
BOURDIEU, Pierre. A ilusão biográfica. In: AMADO, Janaina & FERREIRA, Marieta M.
(orgs.). Usos e abusos da história oral. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas.
CARR, Edward Hallet. “A sociedade e o indivíduo”. In: CARR, Edward Hallet. Que é
História? Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.
CARVALHO, José Murilo de. Os Bestializados. São Paulo: Companhia das Letras. 2001.
COSTA, Emília Viotti da. Da Monarquia à República: momentos decisivos. São Paulo:
Fundação Editora da UNESP, 1999.
LINHARES, Maria Yedda. História Geral do Brasil. Rio de Janeiro: Elsevier, 1990.
MATA, Iacy Maia. Os “Treze de Maio”: ex- senhores, polícia e libertos na Bahia pós-
abolição (1888-1889). Dissertação. (Mestrado em História) – Universidade Federal da Bahia –
Salvador, 2002.
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REMOND, René. Por uma História Política. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003.