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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB


DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS II
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA

“Medidas sanitárias de que a Bahia precisa”: as Delegacias de Saúde, o


Hospital de Isolamento e a Reforma Sanitária em Salvador (1921-1930)

CHACAUANA ARAÚJO DOS SANTOS

ALAGOINHAS-BA
2018
3

CHACAUANA ARAÚJO DOS SANTOS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em História do Departamento de
Educação – Campus II, Alagoinhas, da
Universidade do Estado da Bahia (UNEB) como
requisito para obtenção do grau de Mestra em
História, sob a orientação da Prof. Dra. Maria
Elisa Lemos Nunes da Silva.
Orientadora: Prof. Dra. Maria Elisa Lemos Nunes
da Silva

ALAGOINHAS-BA
2018
4

FICHA CATALOGRÁFICA
Sistema de Bibliotecas da UNEB

S237m Santos, Chacauana Araújo dos.

“Medidas sanitárias de que a Bahia precisa”: As delegacias de


saúde, o hospital de isolamento e a reforma sanitária em Salvador
(1921-1930)./ Chacauana Araújo dos Santos – Alagoinhas, 2018.

95f. il.

Dissertação (Mestrado) – Universidade do Estado da Bahia.


Departamento de Educação. Mestrado em História.

Orientador: Prof.ª Dr.ª Maria Elisa Lemos Nunes da Silva.

1. Reforma sanitária – Salvador (BA). 2. Política de saúde. 3. Saúde


Pública. I. Silva, Maria Elisa Lemos Nunes da. II. Universidade do
Estado da Bahia. Departamento de Educação. III. Título.

CDD 362.1098142

Biblioteca do Campus II / Uneb

Bibliotecária: Iza Christina P. de A. Costa - CRB: 5/1042


5

CHACAUANA ARAÚJO DOS SANTOS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História do Departamento de


Educação – Campus II, Alagoinhas, da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), para a
seguinte banca examinadora:

__________________________________________________
Prof. Dra. Maria Elisa Lemos Nunes da Silva – Orientadora
Universidade do Estado da Bahia–UNEB/Campus II – Alagoinhas

__________________________________________________
Prof. Dr. Paulo Santos Silva – Examinador
Universidade do Estado da Bahia–UNEB /Campus II - Alagoinhas

__________________________________________________
Prof. Dra. Cleide Lima Chaves – Examinadora
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - UESB

ALAGOINHAS-BA
2018
6

À minha Vó Alzira e à minha Vó Isabel


os pilares da minha família.
7

AGRADECIMENTOS

No processo de construção desta Dissertação coisas muito boas aconteceram, mas


outras difíceis de lidar também surgiram. Assim, a conclusão do Mestrado só foi possível por
existir pessoas especiais em minha vida, dentro e fora da academia.

Por isso quero agradecer ao Programa de Pós-Graduação em História, em especial à


Professora Maria Elisa Nunes Lemos da Silva, que acolheu o meu projeto e me orientou
durante todo o período de escrita, acompanhando cada passo. Lembrarei com saudades de
nossos momentos de orientação. Tudo se tornou possível porque pude contar com uma
orientadora que soube me entender e me ajudar nos momentos difíceis que passei durante o
Mestrado.

Agradeço ao Professor Paulo Santos Silva, que aceitou participar da minha Banca de
qualificação e defesa. Além disso, fui sua aluna e fiz tirocínio em sua turma, isso me ensinou
que estar ao seu lado é sempre um aprendizado.

Muito obrigada a Professora Cleide Chaves, pelo carinho e boa vontade em aceitar
participar da minha defesa, agradeço desde já as contribuições. Serei sempre grata à
Professora Christiane Cruz, pelas contribuições na Banca de qualificação.

Meu obrigado a CAPES, por me conceder bolsa durante o mestrado.

Agradeço a Maurício, Igor e Diana, amigos que o Mestrado presenteou-me e, em


especial, a Lise, que esteve ao meu lado durante alguns momentos difíceis, ajudando-me a não
desistir.

Durante todo o Mestrado, a minha família foi essencial para que esse momento se
tornasse real, por isso, agradeço a minha mãe, sem ela jamais chegaria até aqui, às minhas tias
Neves, Lia, Kika, Irá e Suzan, pela alegria e amor que sempre me trataram. Às minhas
sobrinhas Cibele, Catrine, Heloisa e Iasmin, por vocês tento sempre ser o melhor exemplo. Às
minhas irmãs e irmão, pela torcida, em especial minha irmã Beybe, a pessoa que mais tem
paciência comigo no mundo e está sempre ao meu lado não importa o que aconteça, e a
Bartira Batista, pela torcida e alegria que sempre me recebe! Agradeço aos primos e primas,
principalmente Matheus Araújo, que ajudou a cuidar de mim durante toda a minha
recuperação.
8

Agradeço ao meu primo/irmão e companheiro de todas as horas, Ricardo Batista,


sempre presente em minha vida, me ajudou a construir o projeto para a seleção de mestrado e
discutiu textos e fontes comigo durante todo o processo. Sempre aparecia com um livro ou
uma fonte nova para contribuir com a minha pesquisa, é sempre muito bom contar com você
dentro e fora da academia!

Agradeço, imensamente, à minha companheira Kadja Nataly, que acompanhou essa


pesquisa desde o início. Sempre entendeu sem questionar os dias e noites dedicados aos
estudos, as viagens para congressos e todas as abdicações necessárias para chegar até aqui. E
a sua família, que ajudou a cuidar de mim no momento em que a minha saúde estava
comprometida, em especial Silene, Ruy e Beto.

Aos amigos, agradeço os momentos de alegria que sempre passamos juntos, vocês
sempre foram meu refúgio para todos os momentos, especialmente Leandro Nascimento,
Carlos Alberto e Diego Rebelo sei que sempre posso contar com vocês, e Leandro Colling,
pela vibração a cada conquista.
9

RESUMO

Esta dissertação tem como objetivo analisar o papel das Delegacias de Saúde e do
Hospital de Isolamento de Mont’Serrat, no processo da Reforma Sanitária que ocorreu na
Bahia na década de 1920. A ideia é discutir questões ligadas às políticas sanitárias que foram
implementadas após a criação da Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública e do Código
Sanitário, ambos em 1925. As fontes utilizadas nesta pesquisa foram: relatórios das
Delegacias de Saúde; relatórios do Subsecretário de Saúde da época; relatóri os médicos
do Hospital de Isolamento de Mont’Serrat; leis e decretos sanitários; Mensagens dos
Governadores e matérias dos jornais A Tarde, Diário de Notícias e Diário da Bahia. Foi
possível conhecer o perfil dos atendidos pelas instituições pesquisadas, b em como as
suas condições de moradia. A população pobre e negra foi a que mais necessitou desses
serviços. As ações desenvolvidas pelas Delegacias de Saúde e pelo Hospital não foram
isoladas. Buscou-se criar uma rede de atendimento, vinculado à Sub-Secretaria de Saúde
e Assistência Pública que tinha como base o Código Sanitário. Ambos tiveram um papel
importante no processo da reforma, contribuindo para a articulação do estado com as
políticas sanitárias nacionais.

Palavras-chave: Reforma Sanitária. Delegacias de Saúde. Hospital de Isolamento.


10

ABSTRACT

This dissertation objective to analyze the role of the Health Police and the Isolation
Hospital of Mont'Serrat, in the process of Sanitary Reform that occurred in Bahia in the
1920s. The idea is to discuss issues related to the health policies that were implemented after
the creation of the Subsecretariat of Health and Public Assistance and the Sanitary Code, both
in 1925. The sources used in this research were: reports from the Health Departments; reports
of the Assistant Secretary of Health at the time; medical reports from the Isolation Hospital of
Mont'Serrat; laws and sanitary decrees; Messages from Governors and newspaper articles “A
Tarde”,” Diário de Notícias” and “Diário da Bahia”. It was possible to know the profile of
those attended by the institutions surveyed, as well as their living conditions. The poor and
black population was the one that most needed these services. The actions developed by the
Health Police and the Hospital were not isolated. It was sought to create a service network,
linked to the Sub-Secretariat of Health and Public Assistance that was based on the Health
Code. Both played an important role in the reform process, contributing to the articulation of
the state with national health policies.

Key-words: Sanitary Reform; Health police; Isolation Hospital


11

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Dois casos de Peste Negra.......................................................................................41

Figura 2 – Sede da 1ª Delegacia de Saúde................................................................................49

Figura 3 – Apelo ao Subsecretário............................................................................................56

Figura 4 – Pavilhão de Administração..... ................................................................................67

Figura 5 – Enfermaria para Variolosos.....................................................................................67

Figura 6 – Será entregue amanhã à S. P. B. O novo hospital de variolosos.............................68

Figura 7 – Vacinai-vos e aos vossos filhos, enquanto é tempo.................................................74

Figura 8 – Além de tudo, escamoteador de cadáveres..............................................................79

Figura 9 – A Bubônica em ronda sinistra pela cidade..............................................................81


12

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Número de habitantes nos anos de 1890, 1900 e 1920..........................................26


Quadro 2 – Número de infectados pela Peste Bubônica por Distrito no ano de 1904.............32
Quadro 3 – Número de mortos na Bahia entre 1908 a 1912....................................................35
Quadro 4 – Número de mortos na Bahia por moléstias transmissíveis entre 1908 a
1912...........................................................................................................................................35
Quadro 5 - Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública....................................................... 45
Quadro 6 – Inspetorias Sanitárias, 1925...................................................................................52
Quadro 7 – Organização das Delegacias de Saúde no momento da sua criação......................55
Quadro 8 – Tipos de cobertura nas residências da região suburbana em 1930.....................62
Quadro 9 – Dados de pacientes que deram entrada no HIMS...............................................72
Quadro 10 – Dados do atendimento das 5 Delegacias de Saúde em 1926, 1927 e
1928...........................................................................................................................................76
Quadro 11 – Dados das profissões dos pacientes atendidos no Hospital de Isolamento de
Mont’Serrat nos anos 1926, 1927, 1928 e 1929 construídos a partir dos
relatórios..............................................................................................................................77/78
Quadro 12 – Quantidade de pacientes atendidos no Hospital de Isolamento de Mont’Serrat
nos anos 1926, 1927, 1928 e 1929 por Distritos construídos a partir dos
relatórios....................................................................................................................................80
Quadro 13 – Quantidade de pacientes atendidos no Hospital de Isolamento de Mont’Serrat
nos anos 1926, 1927, 1928 e 1929 separados por sexo e cor/raça construídos a partir dos
relatórios....................................................................................................................................82
13

LISTA DE MAPAS

Mapa 1 – Divisão Territorial da zona urbana de Salvador, Bahia 1920.................................27

Mapa 2 – Espacialização das Delegacias de Saúde, Salvador/Bahia, na década de


1920...........................................................................................................................................54
14

LISTA DE SIGLAS

DNSP – Departamento Nacional de Saúde Pública

HIMS – Hospital de Isolamento de Mont’Serrat

APEB – Arquivo Público do Estado da Bahia

DGSP – Diretoria Geral de Saúde Pública

BPEB – Biblioteca Pública do Estado da Bahia

IGHB – Instituto Geográfico e Histórico da Bahia

IOC – BA – Instituto Oswaldo Cruz / Bahia


15

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.......................................................................................................................16

PARTE I - A BAHIA E A REFORMA SANITÁRIA DA DÉCADA DE


1920...........................................................................................................................................23

1.1. Prelúdios da Reforma Sanitária da Bahia .........................................................................25

1.2. O atendimento sanitário e a fiscalização ..........................................................................36

1.3. De volta à Reforma Sanitária na Bahia ............................................................................42

PARTE II - AS DELEGACIAS DE SAÚDE E O HOSPITAL DE MONT’SERRAT


DURANTE A REFORMA SANITÁRIA..............................................................................48

2.1. As Delegacias de Saúde.....................................................................................................48

2.2. O Hospital de Isolamento de Mont’Serrat.......................................................................64

2.3. E a população? Quem utilizava os serviços de saúde na década de 1920 em

Salvador?...................................................................................................................................75

CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................................84

FONTES...................................................................................................................................86

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA...............................,,...................................................89

ANEXOS..................................................................................................................................93
16

INTRODUÇÃO

Esta dissertação tem como objetivo analisar o papel das Delegacias de Saúde e do
Hospital de Isolamento de Mont’Serrat (HIMS), no processo de constituição da reforma
sanitária na Bahia na década de 1920.
No início do século XX, desenvolveu-se no Brasil um movimento sanitarista que
divulgou as condições de vida das pessoas que moravam longe dos grandes centros urbanos.
Uma série de viagens, realizadas pelos pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz, mostrou um
país desconhecido e doente. Um dos objetivos desse movimento era diminuir a distância que
existia entre o Brasil urbano e o Brasil rural e mostrar para as elites que o rural não estava tão
distante como se imaginava, mesmo porque, as doenças estavam presentes nas cidades
assolando principalmente a população pobre.
A partir das discussões e lutas desse movimento, foi criado em 1920 o Departamento
Nacional de Saúde Pública (DNSP). Este órgão tinha objetivo intervencionista estatal de
cunho nacional, respeitada a perspectiva federalista da Constituição republicana de 1891. O
Governo Federal poderia colaborar com os estados no que diz respeito às questões sanitárias e
de saúde, através de acordos por eles solicitados.
Os políticos baianos aderiram ao projeto nacional de reforma sanitária, em 1921,
ocasião em que o governador José Joaquim Seabra assinou um acordo com a União para a
realização de serviços de Profilaxia Rural de combate à sífilis e às doenças venéreas, de luta
contra a tuberculose e de higiene infantil.1
Em 1924, na gestão de Francisco Marques de Góes Calmon, o compromisso foi
renovado por mais cinco anos. O Governo do Estado da Bahia criou a Subsecretaria de
Saúde e Assistência Pública, através da lei 1.811 de 29 de julho de 1925. 2
Alguns meses depois, foi promulgado o Código Sanitário da Bahia, seguindo
orientações do DNSP a partir do Decreto 4.144 de 20 de novembro de 1925, que
indicava como deveria funcionar a nova organização sanitária da Bahia. 3
Junto à Subsecretaria, novas atribuições surgiram referentes à área de saúde na
Bahia e dois órgãos chamaram a atenção para esta pesquisa: as Delegacias de Saúde e o

1
BATISTA, Ricardo dos Santos. Sífilis e reforma da saúde na Bahia (1920-1945). Salvador: EDUNEB, 2017, p.
30;71.
2
BAHIA. Lei 1.811, de 19 de Julho de 1925. Cria a Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública, Salvador,
1925.
3
BAHIA. Decreto 4.144, de 20 de Novembro de 1925. Arquivo Público do Estado da Bahia. Salvador, 1925.
17

Hospital de Isolamento de Mont’Serrat (HIMS).


As Delegacias de Saúde foram criadas em 1925. Elas estavam localizadas em diversos
pontos da cidade e cada uma deveria atender a três Distritos, somando quinze no total. O
HIMS foi criado em 1853 com o objetivo de cuidar das pessoas que contraiam a febre
amarela. Na década de 1920, o hospital já havia passado por diversas mudanças na sua
estrutura física e na concepção do atendimento e dos serviços prestados. A partir da
criação da Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública e do Código Sanitário, o HIMS
passou a fazer parte desse conjunto de ações sanitárias que tinham como objetivo
“sanar” a Bahia dos principais problemas de saúde que assolavam a população.
A escolha do ano de 1921 como marco cronológico inicial desta dissertação está
relacionada ao momento em que o estado baiano firmou compromissos com o Governo
Federal no sentido de combater doenças e ampliar a ação sanitária. Observa -se nesse
período grande preocupação em “educar” a população a partir dos novos ideais de
“civilização”. Esses ideais estiveram presentes nas principais cidades brasileiras da
época, inclusive Salvador. A baliza cronológica final é o ano de 1930, quando oco rreram
mudanças na configuração política e sanitária da Bahia e do Brasil, com a Revolução de
1930.
As reflexões que desenvolvemos neste trabalho inserem-se no campo de estudos
conhecidos como história da saúde e das doenças. Embora ele seja relativamente novo,
vem se expandido desde as últimas décadas do século XX. Nos anos de 1970, os
historiadores Jacques Revel e Jean-Pierre Peter incluíram a enfermidade na coletânea
destinada aos “novos objetos”, “novas abordagens” e “novos problemas” da história,
apontando como o seu estudo poderia fornecer inúmeros esclarecimentos sobre
articulações e mudanças nas sociedades. 4 Ou seja, os estudos relacionados à saúde e às
doenças possibilitam conhecer não somente problemas ligados às enfermidades, mas nos
permitem analisar as questões sociais de um período.
Na Bahia, as pesquisas no campo da história da saúde e das doenças vêm se
ampliando. Onildo Reis David foi um dos pioneiros ao pesquisar a epidemia do cólera
que atingiu a população baiana nos anos de 1855 e 1856. 5 O autor abordou a
insalubridade das freguesias urbanas de Salvador, discute as concepções médicas acerca

4
REVEL e PETER. O corpo: o homem doente e sua história. In: LE GOFF, Jacques e NORA, Pierre (Dir.).
História: novos objetos. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1976, p. 141-159.
5
DAVID, Onildo Reis. O inimigo invisível: epidemia na Bahia no século XIX. Salvador: EDUFBA/Sarah
Letras, 1996.Para o estudo da epidemia do cólera de 1855 e 1856, em Salvador ver também: ATHAYDE,
Johildo Lopes de. Salvador e a grande epidemia de 1855. Centro de Estudos Baianos da UFBA, (113), 1985.
18

do cólera na época, observou o impacto causado pela epidemia e as providências


tomadas pelo Governo para combatê-la.6
A partir desse estudo, as perspectivas então abertas se ampliaram e novas
investigações foram incorporadas nesse campo de pesquisa Entre os trabalhos produzidos
destaca-se A gripe espanhola na Bahia, no qual Christiane Maria Cruz de Souza estudou essa
epidemia que atingiu o território baiano entre setembro de 1918 e os primeiros meses de
1919. A autora, utilizando uma vasta documentação de diversas áreas do estado e
dialogando com ampla bibliografia brasileira e internacional, nos ajuda a entender os
impactos que a epidemia causou à Bahia.7 Christiane Souza publicou vários artigos em
livros e periódicos. Ela ainda organizou com Maria Renilda Nery Barreto o volume História
da saúde na Bahia: instituições e patrimônio arquitetônico (1808-1958) 8.
Maria Renilda Nery Barreto pesquisou sobre Assistência e Saúde, no livro
publicado com Christiane Souza ela faz uma analise sobre a Santa Casa de Misericórdia
de Salvador e a assistência aos doentes que a instituição ofereceu durante o século XIX.
9
A pesquisadora contribuiu ainda com vários outros estudos na área, um deles foi à
análise da História da Obstetrícia, principalmente de que maneira essa ciência se
desenvolveu ao longo dos séculos em Portugal no artigo A ciência dos partos nos
manuais portugueses de obstetrícia.10
Deslocando o enfoque da temática da saúde e das doenças para a perspectiva
institucional e biográfica, Maria Elisa Lemos Nunes da Silva analisou a trajetória do
Médico José Silveira (1904 - 2001) na luta contra a tuberculose, especialmente a partir da
criação do Instituto Brasileiro para Investigação da Tuberculose (IBIT), em 1937. A autora
observou as estratégias discursivas e as práticas por ele utilizadas para se constituir
como um tisiólogo de prestígio 11. Elisa Silva também examinou a constituição de políticas
voltadas para o combate da tuberculose, na Bahia, especificamente na cidade do Salvador.

6
DAVID. O inimigo invisível. 1996.
7
SOUZA, Christiane Maria Cruz de. A gripe espanhola na Bahia: saúde, política e medicina em tempos de
epidemia. Salvador: EDUFBA; Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2009.
8
SOUZA, Christiane Maria Cruz de. SANGLARD, Gisele. Saúde pública e Assistência na Bahia da Primeira
República (1889 -1929) IN SOUZA, Christiane Maria Cruz de. BARRETO, Maria Renilda Nery (org.). História
da Saúde na Bahia: Instituições e Patrimônio Arquitetônico (1808 – 1958) – Barueri, SP: Minha Editora, 2011
9
Idem
10
BARRETO, Maria Renilda Nery. A ciência dos partos nos manuais portugueses de obstetrícia . Revista
Gênero.UFF: V. 7, n. 2, p. 219 – 236., 1 sem. 2007
11
SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da Silva. Do “Centro” para o “Mundo”: A trajetória do Médico José
Silveira na Luta contra a Tuberculose. Tese (Doutorado em História). Universidade Federal de Pernambuco.
Recife. 2009; Ciência e saúde no ''centro' do Brasil: a trajetória do médico José Silveira na luta contra a
tuberculose. In: SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da; SILVA, Paulo Santos. (Org.). Rastros biográficos:
estudos de trajetórias. Salvador: Eduneb, 2014, p. 53-95.
19

Segundo ela, a criação do Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP), em 1920, foi
essencial no tange à implementação de ações voltadas para o controle dessa doença. O acordo
firmado entre este Departamento e a Liga Bahiana Contra a Tuberculose (LBCT) possibilitou
que o Dispensário Ramiro de Azevedo, específico para atender tuberculosos, fosse colocado
em funcionamento.12
Buscando expandir os estudos para além da capital e seu entorno, Cleide de Lima
Chaves organizou a coletânea História da saúde e das doenças no interior da Bahia: séculos
XIX e XX.13 Esta obra apresenta contribuições de autores que discutem a temática em
diferentes localidades do estado. No capítulo de sua autoria, Cleide Chaves abordou o
surgimento da assistência médico-hospitalar no sertão baiano e explorou a história da
Santa Casa de Misericórdia da cidade de Vitória da Conquista, interior da Bahia. 14 A autora
também estudou a atuação do médico Crescêncio Antunes da Silveira (1884-1952), cujas
trajetórias pessoal e profissional estiveram ligadas ao Hospital da Santa Casa e à filantropia
cristã, em Vitória da Conquista.15
Ampliando o campo de estudos em questão, Ricardo dos Santos Batista, abordou a
Reforma Sanitária da Bahia, entre 1920 e 1945, dando ênfase à atuação da Inspetoria de
Profilaxia da Lepra e Doenças Venéreas (IPLDV). Entre os aspectos por ele tratados, estão as
ações desempenhadas pelos médicos baianos no intuito de efetivar um projeto políico-
sanitário no estado, inclusive em cidades do interior. 16
As abordagens envolvendo instituições de saúde foram retomadas por Fátima
Lorenzo Figueiredo. Esta pesquisadora traçou a trajetória do Hospital de Isolamento de
Monte’Serrat (HIMS) desde a sua fundação, em 1853, até se tornar Hospital Couto
Maia, passando pelas reformas e ampliações. Fátima Figueiredo elaborou ainda a

12
SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da. “O Dispensário Ramiro Azevedo e a Constituição de políticas de
enfrentamento da tuberculose na Bahia na década de 1920”. In: SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da;
BATISTA, Ricardo dos Santos (organizadores). História e Saúde: políticas, assistência, doenças e instituições.
Salvador: EDUNEB, 2018 (no prelo).
13
CLEIDE, de Lima Chaves (org). História da saúde e das doenças no interior da Bahia: Séculos XIX e XX.
Vitória da Conquista: Ed UESB, 2013.
14
CHAVES, Cleide de Lima (Org.). História da saúde e das doenças no interior da Bahia: séculos XIX e XX.
Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2013.
15
CHAVES, Cleide de Lima. Crescêncio Antunes da Silveira: um médico filantropo baiano In: SANGLARD,
Gisele et al. (Org.). Filantropos da nação: sociedade e assistência no Brasil e em Portugal. Rio de Janeiro: Ed.
FGV, 2015.
16
BATISTA, Ricardo dos Santos. Sífilis e Reforma na Bahia (1920 – 1945). Salvador: Eduneb, 2017.
20

biografia do Médico Augusto Couto Maia, diretor que esteve à frente do HIMS durante
anos.17
Os conflitos entre as políticas de saúde e a população foram objeto de análise de
Adriano Arruda Pontes. Em seu o trabalho ele discutiu a presença da Fundação
Rockefeller no combate à febre amarela na Bahia, entre 1918 e 1940. A cronologia deste
estudo cruza-se com nossos marcos temporais quando se leva em conta o envolvimento
da instituição americana nas ações voltadas para essa doença, no processo de
constituição da reforma sanitária no estado. Além disso, ele faz uma reflexão acerca do
posicionamento dos médicos baianos ao programa da Rockefeller e trata ainda da
resistência da população às ações propostas por essa fundação para o controle dessa
enfermidade. 18
Para alcançar nosso objetivo, utilizamos como fontes principais os relatórios das
Delegacias de Saúde e os relatórios das ocorrências do Hospital de Isolamento de
Mont’Serrat. Essa documentação contém informações acerca da saúde pública em
Salvador no período analisado, desde os nomes dos médicos que atuaram nesse conjunto
de ações até dados dos pacientes atendidos. Através da sua leitura foi possível perceber
que a população pobre e negra era a mais atingida pelas moléstias, uma vez que ela
estava submetida às piores condições de vida e de trabalho. Além disso, suas moradias
dificilmente atendiam aos padrões de higiene previstos no novo código sanitário.
Os documentos são entendidos como discursos produzidos em determinadas condições
históricas, marcados por relações de poder e saber. São, portanto, materiais a serem
trabalhados na construção do texto historiográfico.19 Essa orientação em relação às fontes
esteve presente na nossa pesquisa.
Infelizmente existem algumas falhas temporais na documentação acessada. Não
encontramos relatórios de todos os anos pesquisados, por diversos motivos parte da
documentação se perdeu. Porém, isso em momento algum prejudicou a pesquisa.
Três jornais da chamada grande imprensa fazem parte do corpus documental
desta dissertação: Diário de Notícias, Diário da Bahia e A Tarde. O Diário de Notícias

17
FIGUEIREDO, Maria de Fátima Lorenzo. Hospital Couto Maia: Uma Memória Histórica (1853 – 1936)
Dissertação (Mestrado). Programa de Pós-Graduação em Ensino, Filosofia e História das Ciências. Universidade
Federal da Bahia, Universidade Estadual de Feira de Santana, 2010.
18
PONTES, Adriano Arruda. Caçando mosquitos na Bahia, a Rockefeller e o combate à febre amarela: inserção,
ação e reação popular (1918-1940). Dissertação de mestrado – Faculdade Filosofia e Ciências Humanas,
Programa de Pós Graduação em História. Universidade do Estado na Bahia, Salvador, 2007.
19
Le GOFF, J. Documento/ Monumento. In: Le GOFF, História e memória. Trad. Bernardo \Leitão. 5. ed.
Campinas: UNICAMP, 2003, p. 525-541; CERTEAU, Michel de. A escrita da história. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 1982, p. 65-117.
21

foi fundado por Manuel da Silva Lopes Cardoso, em 1875, tendo saído de circulação em
1980. Este periódico publicou regularmente notícias sobre as epidemias e a situação
sanitária da cidade de Salvador e do estado da Bahia como um todo. 20
O Diário da Bahia, fundado por Demétrio Ciríaco Tourinho e Manuel Jesuíno
Ferreira, começou a circular em 1856 e encerrou definitivamente suas atividades em 1957.
Até 1868, veiculava a linha ideológica do Partido Liberal. De 1880 até 1899, foi dirigido por
Augusto Álvares Guimarães. A partir desse período, ficou fechado por dois anos, quando foi
adquirido por Severino Vieira, voltando a circular em 1901. A orientação ideológica de
Serverino Vieira durou até 1921, quando o periódico passou a ser gerido por uma sociedade
anônima.21
O jornal A Tarde foi fundado em 1912 por Ernesto Simões Filho. Na chamada
Primeira República, a atuação política do jornal foi dividida em duas fases. A primeira de
1912 a 1924, período de dominação política de J. J. Seabra, no qual A Tarde foi um
importante instrumento de oposição política. A segunda fase corresponde à ascensão de
Francisco Marques do Góes Calmon ao governo do estado (1924-1928). Nesse período, A
Tarde passou a apoiar o executivo baiano, abandonando o caráter oposicionista.22
A pesquisa nesses jornais contribuiu para entender um pouco mais o conjunto de
ações voltadas para as questões sanitárias na Bahia, além de permitir conhecer o “jogo”
político, uma vez que o conteúdo das matérias publicadas nesses periódicos variavam
conforme a aproximação ou o afastamento entre eles e os governos.
Para trabalhar com esses periódicos, dialogamos com o conceito de “grande
imprensa” de Nelson Werneck Sodré, seguido por José Weliton Aragão ao estudar a imprensa
baiana. A “grande imprensa” é uma empresa jornalística que vende notícia e visa o lucro.
Tendo como base de sustentação a publicidade, “veicula a ideologia da classe dominante.” 23
O Diário Oficial da época também foi consultado. Ele traz informações acerca do
funcionamento dos órgãos de saúde, apresentando, por exemplo, números de vacinações
realizadas, nomeações de médicos e de demais profissionais para compor a equipe
sanitária do município. Essa documentação também está disponível no Arquivo Público
do Estado da Bahia.
20
SAMPAIO, Consuelo Novais. Verbete biográfico. Diário de Notícias. Disponível em:
http://www.fgv.br/CPDOC/BUSCA/Busca/BuscaConsultar.aspx>.
21
SAMPAIO, Consuelo Novais. Verbete biográfico. Diário da Bahia. Disponível em:
http://www.fgv.br/CPDOC/BUSCA/Busca/BuscaConsultar.aspx>.
22
SAMPAIO, Consuelo Novais. Verbete biográfico. A Tarde. Disponível em:
http://www.fgv.br/CPDOC/BUSCA/Busca/BuscaConsultar.aspx>.
23
SANTOS, José Weliton Aragão. Formação da grande imprensa na Bahia. Dissertação (Mestrado em Ciências
Sociais) - Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Salvador: UFBA, 1985, p. 5.
22

Constituem-se ainda como fontes deste trabalho as Mensagens e Falas dos


governadores e a legislação sanitária estadual e federal. Ao tratar da saúde pública na
Bahia nos anos 1920 é importante analisar os relatórios de Antônio Luis Cavalcanti
Albuquerque de Barros Barreto. Ele dirigiu a Subsecretaria de Saúde e Assistência
Pública, que depois se tornou Secretaria de Saúde e Assistência Pública. Essa
documentação foi acessada na Biblioteca Pública do Estado da Bahia (BPEB) e no
Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB).
Esta dissertação está dividida em duas partes. Na primeira, abordaremos a reforma
sanitária de 1920 e a articulação da política sanitária baiana com a nacional. Falaremos
do cenário social e político no qual a reforma sanitária se constituiu no es tado.
Situaremos os Distritos da capital geograficamente com auxílio de um mapa e assim
analisaremos as extensões territoriais dos Distritos Centrais e Periféricos numa tentativa
de identificar como a população estava distribuída nesse território e quais as doenças
que eram notificadas. Trata-se, portanto, de buscar compreender, a partir dos Distritos, a
situação sanitária da cidade de Salvador. Além disso, falaremos das habitações e como
elas dificultavam o trabalho dos profissionais ligados à saúde pelo f ato de em sua
maioria estarem fora dos padrões de higiene que estavam tentando implantar.
A segunda parte trata das delegacias de saúde e do Hospital de Isolamento de
Mont'Serrat. Discutiremos a contribuição dessas instituições no processo de reforma
sanitária da década de 1920. Analisaremos onde cada Delegacia estava localizada e qual
o território que cada uma ficava responsável através das inspetorias. Apresentaremos o
perfil da população atendida nas Delegacias de Saúde e no HIMS. O propósito é
entender quem eram essas pessoas que necessitavam dos serviços dessas instituições.
23

PARTE I
A BAHIA E A REFORMA SANITÁRIA DA DÉCADA DE 1920

As primeiras décadas do século XX são de grande relevância para os cuidados com a


saúde no Brasil, pois marcaram o processo de constituição das políticas sanitárias. Embora a
preocupação com essas questões, por parte dos poderes públicos, não estivesse de todo
ausente, as ações desenvolvidas de um modo geral eram voltadas principalmente para o
combate das epidemias.
O conhecimento da precária situação sanitária do país que levou à defesa da proposta
de uma reforma nesse setor foi resultado das expedições científicas organizadas pelo Instituto
Oswaldo Cruz, nas primeiras duas décadas do século XX, com intuito de conhecer as áreas
distantes do Brasil. Entre elas, se destacam as realizadas pelos médicos Belisário Pena e
Arthur Neiva. Eles percorreram o norte e o noroeste da Bahia, o sudoeste de Pernambuco, o
sul do Piauí e o norte de Goiás e publicaram, em 1916, um relatório apresentando a precária
condição sanitária e de saúde da população do sertão.24 Era necessário combater endemias
como a ancilostomíase, a malária e a doenças de Chagas.
Em 1916, foi iniciada a campanha pelo saneamento do sertão, intensificada, em 1918,
com a criação da Liga Pró-saneamento do Brasil. O movimento sanitarista identificou a
doença como o maior empecilho à “civilização”. As moléstias transmissíveis, mesmo que
acometessem as populações distantes, eram, em função da interdependência social, um
problema que deveria ser encarado nacionalmente.25
Gilberto Hochman, ao trabalhar com o conceito de interdependência, mostra a
centralidade que a doença adquire no processo de construção do Estado Nacional. Para fazer
essa discussão, ele dialogou com o médico Cyrus Edson, chamando a atenção de como a
doença e os micróbios não tinham fronteiras. A possibilidade do contágio aproximou ricos e
pobres e permitiu que a sociedade entendesse que as ações públicas de saúde deveriam atingir
a todos, através de cuidados coletivos e compulsórios. As elites passaram a se preocupar não
apenas com a saúde de seus pares, mas da nação.26

24
LIMA, Nísia Trindade; HOCHMAN, Gilberto. Condenado pela raça, absorvido pela medicina: o Brasil
descoberto pelo movimento sanitarista da Primeira República. In: MAIO, Marcos Chor; SANTOS, Ricardo
Ventura (organizadores). Raça, ciência e sociedade. Rio de Janeiro, Editora FIOCRUZ/ CCBB, 1996, p. 24-26.
25
HOCHMAN, Gilberto. A era do saneamento: as bases da política de saúde no Brasil. São Paulo: Editora
HUCITEC. 1998, p. 41-54.
26
HOCHMAN. A era do saneamento, p. 51.
24

Como fruto do movimento sanitarista, foi criado o Departamento Nacional de Saúde


Pública (DNSP), através do decreto de nº 3.987 de 2 de janeiro de 1920, pelo então
presidente, Epitácio Pessoa.27 Esse Departamento era subordinado ao Ministério da Justiça e
Negócios Interiores e tinha objetivo intervencionista estatal de cunho nacional, respeitada a
perspectiva federalista da Constituição de 1891, pois os acordos ocorreriam com os estados
que pedissem auxílio da União. O DNSP foi estruturado a partir de três diretorias: Diretoria
da defesa Sanitária Marítima e Fluvial; Diretoria de Saneamento e Profilaxia Rural e a
Diretoria dos Serviços Sanitários Terrestres.28
Segundo Hochman, ainda em 1920 os estados do Paraná, Minas Gerais e Maranhão,
além do Distrito Federal, firmaram acordos com o Governo Federal. Em 1922, quando
Epitácio Pessoa deixou a presidência do Brasil, quinze estados já haviam estabelecido
parceria com a União. Em 1924, esse número chegou a dezessete.29
A parceria com a Bahia ocorreu em 15 de abril de 1921, durante o segundo governo de
José Joaquim Seabra (1920-1924). Ricardo dos Santos Batista, ao tratar da reforma sanitária
na Bahia, principalmente a partir das ações direcionadas ao enfrentamento da sífilis, chama a
atenção para a amplitude do acordo feito com o Governo Federal. Ele previu a realização dos
serviços de profilaxia rural de combate à sífilis e às doenças venéreas, de luta antituberculose
e de higiene infantil.30
Até fins de 1924, o Governo Federal custeou integralmente os serviços de profilaxia
rural de combate à sífilis e às doenças venéreas. O Estado da Bahia ficou responsável em
amortizar a dívida com a união em dez parcelas, cuja quantia corresponderia à metade do
dinheiro investido. Esse convênio foi renovado, em 1925, por mais cinco anos. No que diz
respeito à tuberculose e à higiene infantil, a união assumiu integralmente os custos dos
serviços até 1929, quando passou a dividir as despesas com o Governo Estadual.31
Em 1925, durante o governo de Francisco Marques de Góes Calmon (1924-1928), foi
criada a Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública através da lei 1.811 de julho de 1925. 32
Alguns meses depois, foi promulgado o Código Sanitário da Bahia, seguindo orientações do

27
BRASIL, Decreto n. 3.987 – de 2 de janeiro de 1920: Reorganiza os serviços da Saúde Pública. Disponível
em: http://legis.senado.gov.br/legislação/ListaPublicacoe.action?id=48173. Acesso em junho de 2015.
28
BRASIL. Decreto 14.354 de 15 de setembro de 1920. Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decr
et/1920-1929/decreto-14354-15-setembro-1920-503181-publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso em 19.07.2017.
29
HOCHMAN. A era do saneamento, p. 173.
30
BATISTA, Ricardo dos Santos. Sífilis e Reforma na Bahia (1920 – 1945), p. 29-30.
31
SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da. “O Dispensário Ramiro Azevedo e a Constituição de políticas de
enfrentamento da tuberculose na Bahia na década de 1920”. Obra citada (no prelo).
32
BAHIA, Lei 1.811, de 19 de julho de 1925. Organiza a Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública.
Salvador, 1925.
25

DNSP.33 Com a criação da Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública, e do Código


Sanitário ambos, em 1925, a política sanitária do estado equiparou-se cada vez mais ao
modelo de reforma do Governo Federal.34
Para maior entendimento dessa Reforma na Bahia e do papel das Delegacias de Saúde
e do Hospital de Isolamento de Monte’Serrat nesse processo, é importante observar a
trajetória das ações sanitárias empreendidas pelo Estado, nas primeiras décadas republicanas.

PRELÚDIOS DA REFORMA SANITÁRIA NA BAHIA

Salvador é uma cidade de topografia acidentada com o seu espaço dividido em Cidade
Alta e Cidade Baixa. Sua beleza natural foi ressaltada pelos viajantes que chegaram de regiões
distantes desde o período colonial. A primeira impressão, contudo, logo poderia ser
substituída pela identificação de suas mazelas. Era possível encontrar muitas áreas
abandonadas. O lixo e os excrementos eram deixados na rua em toda cidade. As precárias
condições sanitárias de Salvador indicavam que ela era uma cidade assolada por doenças
endêmicas e epidêmicas. Essa situação atravessou o século XIX e manteve-se nas primeiras
décadas republicanas.
O acesso aos dois níveis da cidade se fazia por meio de ladeiras, pelos elevadores
Lacerda e do Taboão, e pelos planos inclinados Gonçalves e do Pilar, construídos no final do
século XIX. O tráfego urbano, além de contar com os elevadores e com os planos inclinados,
era feito por bondes, caminhões e carroças de tração animal. Poucas pessoas podiam fazer uso
de automóveis que passaram a circular na cidade no início do século XX. Mas os bondes eram
o principal meio de transporte.35
Com uma população de 283.492 habitantes, em 1920, Salvador cresceu em dados
populacionais cerca de 2% ao ano.36 Se compararmos a cidade com outras capitais,
percebemos que a população soteropolitana não aumentou muito, pois o seu crescimento foi
principalmente vegetativo, enquanto outras cidades contaram com o fenômeno da imigração.
Apesar desse crescimento lento, a estruturação do espaço urbano foi desordenada.

33
BAHIA, Decreto 4.144, de 20 de novembro de 1925. Institui o Código Sanitário do Estado. Salvador. 1925.
34
BATISTA, Sífilis e Reforma na Bahia (1920 – 1945), p. 27, 71.
35
O Elevador Lacerda foi inaugurado em dezembro de 1873 e O Plano Inclinado Gonçalves em 1889. O
Elevador do Taboão e o Plano Inclinado do Pilar datam de 1897. Ver a esse respeito: CARVALHO, Carlos
Alberto de. A Locomoção da cidade através dos tempos. in: Revista do IGHB (66) : 77-108. 1940.
36
SANTOS, Mário Augusto da Silva. Crescimento Urbano e Habitação em Salvador (1890-1940), p.21;
NEVES, Laert Pedreira. O crescimento de Salvador e das demais cidades baianas. Salvador: Centro Editorial e
Didático da UFBA, 1985, p. 19.
26

O quadro abaixo mostra a população de Salvador, do Distrito Federal e de São Paulo


nos anos de 1890, 1900 e 1920.37
Capitais Número de Habitantes
1890 1900 1920
Salvador 174.412 205.813 283.492
Distrito Federal 532.651 811.443 1.157.873
São Paulo 64.934 239.813 579.013
Quadro 1 – Número de habitantes nos anos de 1890, 1900 e 1920.
Fonte: IBGE, Censo demográfico. Ministério da Agricultura, Indústria e comércio Diretoria Geral de Estatística.
Volume IV, Tomo I. 1920.

A cidade encontrava-se dividida em doze distritos urbanos, centrais e periféricos.38 Os


centrais eram Conceição, Pilar, Sé, Paço, São Pedro, Santana e Nazaré. Os periféricos: Mares,
Penha, Vitória, Brotas e Santo Antônio (Ver mapa 1).
De acordo com Mário Augusto da Silva Santos, desde o final do século XIX a
estrutura urbana de Salvador foi se modificando em função do crescimento das atividades do
comércio especialmente nos distritos da Sé, Conceição, Pilar e Passo.39
Durante as primeiras décadas do século XX, o distrito da Sé, localizado na parte alta
da cidade, mantinha-se como centro político e administrativo, mas se tornava cada vez mais
área de negócios em que se localizavam casas comerciais a varejo e de tecidos. Lá também
estavam muitos escritórios de advogados e consultórios médicos. Na Cidade Baixa,
principalmente nos distritos de Conceição e do Pilar estava localizada a principal zona de
comércio, com lojas, armazéns, depósitos, trapiches Nessa parte da cidade, ficavam as
instalações portuárias.40

37
IBGE, Censo demográfico. Ministério da Agricultura, Indústria e comércio Diretoria Geral de Estatística.
Volume IV, Tomo I. 1920.
38
Havia também a área suburbana, composta pelos distritos de Pirajá, Paripe, Aratu, Cotegipe, Matoim, Passé,
Maré e Itapoan. SAMPAIO, Lauro (Org.). Indicador e Guia Prático da Cidade do Salvador. Salvador: Typografia
Agostinho Barbosa e Cia, 1928.
39
SANTOS. Crescimento urbano e habitação em Salvador (1980 – 1940), p. 21-24.
40
SANTOS. Crescimento urbano e habitação em Salvador (1890-1940), p. 23.
27

Mapa 1
28

Quanto à moradia, era principalmente nos distritos de Vitória, Santo Antônio, Brotas,
Nazaré, Santana e São Pedro que a população de Salvador residia sem perder de vista as
desigualdades sociais.

Os distritos de São Pedro, Nazaré e Santana, por sua vez, receberam o fluxo das
atividades de comércio, mas mantiveram sua característica residencial.41 Já o centro da cidade
passou a ser, cada vez mais, uma área em que as habitações se degradavam, levando a elite
economicamente privilegiada a construir seus casarões em outros locais, como na Vitória, na
Graça e na Barra.
Parte da população pobre cada vez mais se deslocou para a região suburbana e outra
parcela continuou morando no centro, pois os aluguéis eram mais baratos e próximos dos
locais de trabalho.42 No entanto, essas moradias sequer tinham janelas e havia ainda aquelas
que eram sublocadas, abrigando um número grande de moradores.43
Christiane Maria Cruz de Souza, ao analisar a epidemia de gripe espanhola que atingiu
a cidade de Salvador, em 1918, relacionou a precariedade das casas à propagação de doenças.
Segundo a autora,
Em um período de crise na habitação e grande especulação imobiliária, as
pessoas de poucos recursos se submetiam a morar, precariamente, em velhos
sobrados encortiçados, sobrelojas, “avenidas” e casas de cômodo, imóveis de
baixo aluguel que proliferavam nos bairros operários e nos distritos do
antigo centro de Salvador. Esse tipo de moradia, que favorecia o convívio
próximo de vários indivíduos em espaços exíguos e mal arejados, contribuiu
para a rápida propagação da gripe, que facilmente se espalhou pelos
quarteirões dos bairros pobres da cidade.44

Em estudo acerca da greve geral de 1919, em Salvador, Aldrin Armstrong Silva


Castellucci chamou atenção para o problema habitacional. Para ele, os trabalhadores, além de
estarem sujeitos à carestia dos alimentos, aos baixos salários e ao aumento da jornada de
trabalho, também viviam em casas de péssima qualidade. Em função do preço dos alugueis, a
classe operária viu-se obrigada a retirar-se cada vez mais para bairros distantes.45.
Quanto ao serviço de esgotos, a única rede existente foi construída em 1906,
compondo um conjunto de 27 km. Poucas casas eram servidas por essa rede. No que se refere

41
SANTOS. Crescimento urbano e habitação em Salvador (1890-1940), p. 23.
42
SANTOS. Crescimento urbano e habitação em Salvador (1890-1940), p. 25.
43
SANTOS. Crescimento urbano e habitação em Salvador (1890-1940), p. 26-27.
44
SOUZA, Christiane Maria Cruz de. A gripe espanhola na Bahia: saúde, política e medicina em tempos de
epidemia. Salvador: EDUFBA; Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2009, p. 200.
45
CASTELLUCCI, Aldrin Armstrong Silva. Industriais e operários baianos numa conjuntura de crise (1914-
1921) Salvador: Fieb, 2004, 114.
29

ao abastecimento de água, a primeira providência adotada em relação à prestação desse


serviço ocorreu em 1852, quando foi constituída a Companhia do Queimado. Até então o
abastecimento se fazia por meio de fontes públicas, construídas desde o período colonial. Essa
companhia era destinada a promover a captação e distribuição de chafarizes. Em função da
dificuldade que teve a companhia em arcar com a manutenção do serviço, a Intendência
Municipal passou a executar as obras sob a direção do engenheiro Teodoro Sampaio. Em
1925, este serviço passou ao governo do estado e quatro anos depois foi criada a Comissão de
Saneamento da Bahia.46
Consuelo Novais Sampaio ressaltou as limitações desse serviço pois na década de
1930, em todo o estado da Bahia apenas 39 cidades tinham abastecimento de água e 18
distribuição domiciliar. A água potável que era consumida pela maior parte da população era
vendida de porta em porta.47

Portanto, eram muitos os problemas sanitários e de saúde que atingiam a população de


Salvador nas primeiras décadas do século XX, que não foram alterados com a mudança de
governo de Monarquia para República. A perspectiva liberal e federalista da Constituição de
1891, a característica predominantemente agrário-exportadora da economia baiana e a
situação de entreposto comercial da cidade do Salvador, embora houvesse também uma
indústria consolidada em alguns setores da economia, levavam o Estado a agir principalmente
nos momentos das epidemias.48
Para Consuelo Sampaio, a autonomia dos estados perante o Governo Federal, trazida
pela República, não foi aceita facilmente pelos políticos baianos. Além disso, os grupos
políticos resistiram à implantação do novo regime, pois os ideais de igualdade não agradaram
aos mais abastados. O Partido Republicano inclusive não sobreviveu à Proclamação.49
Na Bahia, os governos republicanos foram tentando organizar os serviços sanitários e
de saúde, como pode ser observado na legislação sanitária e nas Mensagens dos
governadores do período. Cabe refletir que a existência de leis e de pronunciamentos dos

46
Quatro Séculos de História da Bahia. Álbum comemorativo do 4º Centenário. In: Revista Fiscal da Bahia 74-
78. 1949, p. 209.
47
SAMPAIO, Consuelo Novais. Poder & Representação. O legislativo da Bahia na Segunda República 1930-
1937. Salvador: Assembléia Legislativa, Assessoria e Comunicação Social, 1992. p. 32.
48
Aldrin Armstrong Silva Castellucci considera um erro imaginar que não existia em Salvador uma indústria
consolidada em determinados setores da economia, apesar da característica comercial inequívoca, tantas vezes
lembrada pela historiografia. CASTELLUCCI. Industriais e operários baianos numa conjuntura de crise (1914-
1921), p. 45.
49
SAMPAIO, Consuelo de Novais. Partidos Políticos da Bahia na Primeira república: uma política da
acomodação. Salvador: Editora da Universidade Federal da Bahia, 1998, p. 29-32.
30

gestores não implicava na realização de ações. As mensagens eram discursos de prestação de


contas e de autopromoção ainda que pudessem indicar os temas discutidos e as prioridades
das ações.
Em 23 de agosto de 1897, durante o governo de Luiz Viana (1896-1900), foi
promulgada a lei 213, voltada para as questões sanitárias do estado da Bahia.50 Essa lei tratou
da obrigatoriedade da notificação compulsória das doenças transmissíveis. O médico deveria
notificar essas moléstias à Inspetoria de Higiene. A ela caberia executar em todo o estado as
leis, regulamentos e instruções sanitárias aprovadas pelo governo. Depois de feita a
notificação deveria haver a desinfecção do ambiente e o isolamento do doente no próprio
domicílio, quando possível, ou em instituição apropriada.
Segundo essa lei, a prestação dos serviços sanitários e de saúde no estado da Bahia era
atribuição do poder municipal e estadual. A fiscalização dos portos ficava a cargo da União. O
município responsabilizava-se pelos serviços de abastecimento de água, canalização de
esgotos, coleta do lixo, fiscalização dos cemitérios, fiscalização de alimentos e organização e
direção dos serviços de vacinação e revacinação. Ao governo estadual cabia evitar a
propagação de doenças epidêmicas, a organização da estatística demografo-sanitária, a
fiscalização da medicina e da farmácia e a inspeção dos serviços sanitários a cargo do
município.51 Foram criados na capital os Inspetores Sanitários e os Delegados de Higiene, no
interior. Esta lei previu que o Estado reunisse em um Código Sanitário todas as disposições
elaboradas pelo Conselho Geral Sanitário. O Código Sanitário da Bahia, como vimos acima,
só se tornou realidade em 1925.
A Bahia vivia sob ameaça de epidemias como as de febre amarela, a peste bubônica e
a varíola.52 O governador Luiz Viana, fez referência à necessidade de investimento no
controle da varíola. Segundo informou, o trabalho de vacinação e revacinação realizado
contribuiu para que a varíola fosse debelada na capital, mas o mesmo não aconteceu em
algumas cidades do interior, pois nelas essa doença fez vítimas.53

50
APEB. Lei 213, de 23 de agosto de 1897.
51
Ver artigo 4º da Lei 231, de 23 de agosto de 1897.
52
Jorge Almeida Uzeda, em estudo acerca da política de saúde implementada pelo estado baiano durante a
primeira república, considera que em Salvador havia um “rodízio da morte” por doenças como a peste bubônica,
a varíola, a febre amarela, a febre tifóide e a tuberculose. UZEDA, Jorge Almeida. A morte vigiada: a cidade do
Salvador e a prática da medicina urbana (1890-1930). Dissertação de Mestrado em Ciências Sociais.
Universidade Federal da Bahia. Salvador. 1992.
53
BAHIA. Mensagem do Governador Luiz Viana à Assembleia Legislativa, 1898, p. 8-14.
31

Em 1900, esse mesmo governador registrou o temor de que a epidemia de peste


bubônica chegasse a Salvador. Felizmente nenhum caso tinha sido registrado.54 A peste
bubônica chegou à cidade em 1904.
Os jornais da chamada grande imprensa que circulavam em Salvador no período
noticiavam matérias acerca das precárias condições sanitárias da cidade e do estado. As
doenças epidêmicas como a febre amarela, a varíola e a peste bubônica eram abordadas com
frequência, embora também houvesse matérias sobre a tuberculose, moléstia de alta
incidência e mortalidade na cidade.55 O conteúdo das publicações variava conforme a visão
política dos periódicos.
As matérias que trataram da peste bubônica, por exemplo, associaram a sua ocorrência
às questões sanitárias da cidade, de um modo geral, e às habitações especificamente. A
definição da etiologia da doença pelos pesquisadores Alexandre Yersin e Shebasabuso
Kitasaco, em 1894, possibilitou a compreensão de que a peste não era uma moléstia humana,
mas uma doença transmitida por pulgas.56 Estas picavam os ratos contaminados nos quais elas
ficavam alojadas e ao picarem os humanos os infectavam. Cleide de Lima Chaves e Tatiane
Pereira Amorim, ao estudarem a epidemia de Peste Bubônica em Vitória da Conquista, entre
1927 e 1928, consideram que a cidade repetiu o receituário profilático de outras localidades
que foi o extermínio de ratos, bem como a desinfecção das casas e de objetos.57
Em 1906, o Diário da Bahia relatou a discussão sobre a peste bubônica realizada na
sessão do Conselho Sanitário Estadual dirigido pelo médico Pacífico Pereira. De acordo com
os presentes, havia avanços em relação ao ano de 1904 quando ocorreu um surto epidêmico
na cidade. Segundo o diretor, entre 7 de julho e 7 de dezembro de 1904, período em que
ocorreram as notificações, foram registrados 207 casos. Desses, 141 foram a óbito. Na
epidemia de 1906, entre 21 de novembro do ano anterior, quando ocorreu a primeira
notificação, até 25 de março, houve 73 casos, com 45 óbitos.58 Os números mostraram
diminuição na incidência de peste bubônica na capital.
Ao analisamos os mesmos números, proporcionalmente, percebemos que a quantidade
de óbitos e curas são quase os mesmos. Em 1904, quando 207 pessoas foram infectadas, 68%

54
BAHIA. Mensagem do Governador Luiz Viana à Assembleia Legislativa, 1900, p. 9.
55
SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da. Do “centro” para o “mundo”: a trajetória do médico José Silveira na
luta contra a tuberculose. p. 25-26.
56
CHAVES, Cleide de Lima; AMORIM, Tatiane Pereira. A peste bubônica nos sertões da Bahia: política e
cotidiano no raiar do século XX. In: SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da; BATISTA, Ricardo dos Santos
(organizadores). História e Saúde: políticas, assistência, doenças e instituições. Salvador: EDUNEB, 2018 (no
prelo).
57
CHAVES, Cleide de Lima; AMORIM, Tatiane Pereira. A peste bubônica nos sertões da Bahia (no prelo).
58
Diário da Bahia, Salvador, 28 mar. 1906, p. 1.
32

foram a óbito e 32% se curaram. Em 1906, das 73 pessoas que contraíram a doença, 61%
morreram e 38% conseguiram se curar. Ou seja, o número de pessoas infectadas diminuiu,
mas a porcentagem de mortos e curados foi semelhante nesses dois momentos.
Na mesma matéria, o Diário da Bahia mostrou a quantidade de casos em cada distrito.
Os números foram organizados no quadro a seguir:

Distritos Centrais Distritos Periféricos


Distritos Quantidade Distritos Quantidade
Conceição 40 Brotas 09
Nazaré 18 Mares 08
Paço 20 Penha 09
Pilar 24 Santo Antônio 18
Santana 14 Vitória 07
São Pedro 17
Sé 23
Quadro 2 – Número de infectados pela Peste Bubônica por Distrito no ano de 1904
Fonte: Diário da Bahia, 28 de março de 1906, p. 01.

Os dados apresentados sobre a peste bubônica mostram que a maioria das notificações
ocorreu nos distritos centrais, principalmente por causa das moradias insalubres, concentradas
naquela região.
Durante o governo de José Marcelino (1904-1908), houve rearrumação dos serviços
sanitários, com a promulgação da lei 628, de 14 de setembro de 1905.59 Foram estabelecidas
as doenças que deveriam ser compulsoriamente notificadas: a peste, a varíola, o tifo, o cólera,
a febre amarela, a escarlatina a difiteria, a desinteria e a tuberculose. Essa lei manteve
características semelhantes à de número 213, de 1897, mas criou a Diretoria dos Serviços
Sanitários órgão responsável por gerir vários serviços, como: o instituto bacteriológico
antirábico e vacinogênico, o serviço geral de desinfecção, a seção de estatística demógrafo-
sanitária e o hospital de Isolamento. A “polícia sanitária” também foi criada e uma de suas
incumbências era a prevenção de epidemias.
George Rosen, ao tratar do conceito de “polícia sanitária” numa perspectiva histórica,
considera sua origem no século XVIII, na Alemanha, quando foi direcionado principalmente
às leis que deveriam ser aprovadas. Posteriormente, esse conceito foi usado em outros países

59
BAHIA, Lei 628, de 14 de setembro de 1905. Reorganiza o serviço sanitário do Estado. Arquivo Público do
Estado da Bahia. Salvador, 1905.
33

europeus, em áreas nas quais a ação governamental era voltada mais especificamente ao
controle de doenças transmissíveis e ao saneamento do meio ambiente.60 Guardadas as
devidas peculiaridades geográfica e temporal, é possível dizer que a ideia de “polícia
sanitária” presente na legislação sanitária estadual tinha essas características.

No governo de João Ferreira de Araújo Pinho (1908-1911) houve uma nova


reorganização do serviço sanitário com a Lei 840 de 24 de agosto de 1910. Um ano antes, em
mensagem à Assembleia Legislativa, Araújo Pinho levantou a possibilidade de criar um
imposto para arrecadar fundos para a saúde. Para ele, os serviços especiais, como eram os de
assistência pública, deveriam ter sua receita própria assim como os “povos cultos”, cuja
receita era formada pelo provento de uma “taxa especial”. Nas suas palavras

esta taxa afeta a classe dos favorecidos, e recai ora sobre a propriedade, ora
sobre a renda individual superior a um dado limite, aqui sob uma feição, ali
sob modalidade diversa, mas sempre como uma porção que o poder público
pede às sobras da riqueza para compensar a inevitável e a eterna desigualdade
das condições e dos indivíduos na sociedade humana.61

Seu discurso, embora defendesse que o imposto deveria ficar a cargo dos
economicamente favorecidos, apresentava a desigualdade dos indivíduos como algo
inevitável e eterno. Os anseios de civilidade esbarravam na parcela da população que não
tinha condições de viver dentro dos padrões desejados. Havia a tentativa de copiar os países
considerados desenvolvidos para o estado conseguir fundos suficientes para dar assistência
aqueles que não tinham condições.
No primeiro governo de José Joaquim Seabra (1912-1916) Salvador passou por
modificações urbanas, orientadas principalmente por médicos, higienistas e sanitaristas,
cuja tônica consistia em trazer para o estado o “progresso” e a “civilização”. Houve o
alargamento de ruas da Cidade Baixa, a abertura da Avenida Sete de Setembro como via
principal da Cidade Alta e a construção da Avenida Oceânica. Apesar das mudanças referidas,
Salvador longe estava de ser considerada urbanizada e higiênica.
Rinaldo Cesar Nascimento Leite considera que J. J. Seabra se articulou com os
governos municipais e federal para colocar em prática seu projeto de modernização da capital
baiana segundo os moldes de urbanização europeia. Leite acredita que algumas áreas,
especialmente as habitadas pela elite, foram beneficiadas. Isso agravou ainda mais os
60
ROSEN, George. Da polícia médica à medicina social: ensaios sobre a história da assistência médica. Trad.
Ângela Loureiro de Souza. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1979, p. 171-172.
61
BAHIA, Assembleia Geral Legislativa. Mensagem. João Ferreira de Araújo Pinho. Salvador, 1909.
34

problemas relacionados à habitação, uma vez que a maioria dos investimentos, não chegou
principalmente onde residia a população pobre que era maioria. As benfeitorias alcançaram
aqueles que tinham maior poder aquisitivo.62 Por outro lado, a falta de esgotamento sanitário,
a má pavimentação das ruas e a ausência de medidas consideradas de higiene contribuíam
para que os problemas ligados à saúde estivessem presentes no cotidiano dos
soteropolitanos.63 O “conjunto de elementos que caracterizaram a cidade, sobrava a impressão
de que a civilização almejada não passou de numa obra inacabada e imperfeita.” 64
Nesse período, foi instituído, em Salvador, o Juízo dos Feitos de Saúde Pública. Esse
órgão, composto por um juiz, um procurador, um escrivão e dois oficiais de justiça sanitária,
tinha como objetivo fazer com que as ações relacionadas às questões sanitárias e de saúde
fossem tratadas numa perspectiva jurídica. Era de sua competência “conhecer todas as ações e
processos civis e criminais em matéria de higiene e salubridade pública concernente à
execução das leis e regulamentos sanitários.” Assim, cabiam-lhe ações de despejo, demolição,
interdição, desocupação, como também o julgamento do que considerava crime e
contravenção, e a cobrança de multas e taxas sanitárias.65
Para aumentar o respaldo legal do processo de reforma urbana, foi promulgada a lei
921, de 19 de novembro de 1912. Segundo Christiane Souza, foi criada a “Engenharia
sanitária”, ligada ao setor de Higiene, responsável pelas construções, reformas e fiscalizações
de tudo que estivesse vinculado ao atendimento sanitário.66
Em mensagem do seu primeiro ano de Governo, Seabra afirmou que buscaria garantir
a defesa sanitária do estado.67 No ano seguinte, o chefe do executivo baiano fez um
levantamento de suas realizações em prol da Saúde Pública. Para ele, até então os resultados
eram positivos, principalmente quando comparados com a gestão anterior.
Dentre as comparações feitas pelo então governador, na mensagem de 1913, há a
preocupação em mostrar que a mortalidade em Salvador estava caindo. Os quadros abaixo
reproduzem essa informação. O quadro 3 mostra os números gerais de mortes e o quadro 4
apresenta os números de mortos por moléstias transmissíveis.

62
LEITE, Rinaldo Cesar Nascimento. E a Bahia civiliza-se... Ideais de civilização e cenas de anti-civilidade em
um contexto de modernização urbana Salvador. 1912 – 1916. Dissertação (Mestrado em História) Universidade
Federal da Bahia. Salvador 1996, p. 55; 66.
63
LEITE. E a Bahia civiliza-se, p. 28.
64
LEITE. E a Bahia civiliza-se, p. 85.
65
APEB. Lei 892, de 10 de junho de 1912. Institui em Salvador o juízo dos feitos da saúde pública.
66
SOUZA. A gripe espanhola na Bahia, p. 59.
67
BAHIA, Assembleia Geral Legislativa Mensagem de José Joaquim Seabra. Salvador, 1912.
35

Ano Número de Mortos


1908 5.754
1909 5.830
1910 6.151
1911 5.259
1912 5.202
Quadro 3 – Número de mortos na Bahia entre 1908 a 1912.
Fonte: Mensagem de J. J. Seabra 1913.

Houve uma diminuição de 57 mortes de 1911 para 1912, no primeiro ano do Governo
de Seabra. Quando analisadas os casos de falecimento por doenças transmissíveis (quadro 4),
o déficit foi de 228 mortes nesses mesmos anos.

Ano Número de Mortos por moléstias


transmissíveis
1908 2.112
1909 2.176
1910 2.419
1911 1.543
1912 1.315
Quadro 4 – Número de mortos na Bahia por moléstias transmissíveis entre 1908 a 1912
Fonte: Mensagem de J. J. Seabra 1913.

No entanto, a diminuição tanto da mortalidade geral quanto da causada por doenças


transmissíveis já estava ocorrendo antes de Seabra assumir o governo em 1912. Vale lembrar
que Seabra e João Ferreira de Araújo Pinho, seu antecessor, eram rivais políticos, logo, ele
tinha interesse em atacá-lo.
Seabra, em mensagem apresentada ao seu sucessor e aliado político, Antônio Ferrão
Moniz de Aragão, em 1916, descreveu as mudanças ocorridas no seu mandato. Para ele,
foram “os serviços de saúde pública” objeto de seu “maior cuidado” pois ninguém tinha dado
tanta atenção ao assunto quanto ele. Ressaltou, porém, que ainda havia muito a ser feito.68
Em 1917, durante o governo de Muniz de Aragão (1916-1920), foi promulgada a lei n. 1.231,
de 31 de agosto, que mais uma vez re-arrumou os serviços de saúde. Esse governador, em
mensagem apresentada à Assembleia Legislativa nesse mesmo ano, depois de fazer um

68
BAHIA, Assembleia Geral Legislativa Mensagem José Joaquim Seabra. Salvador, 1916.
36

histórico do que tinha realizado no setor de saúde pública durante os governos anteriores,
enfatizou que, no período imperial, o poder público olhava sempre com descaso para o
serviço de higiene, daí os governos republicanos terem encontrado a Bahia totalmente
desaparelhada.
Até os últimos anos da década de 1910, as ações sanitárias foram direcionadas às
doenças transmissíveis, principalmente as que se manifestavam de forma epidêmica, ainda
que as “autoridades competentes” defendessem uma organização de serviços permanente.
Instituições foram criadas e serviços foram modificados. Se, em 1897, o órgão máximo era a
Inspetoria Sanitária, em 1905, surgiu a Diretoria dos Serviços Sanitários que, em 1910, foi
transformada em Diretoria Geral de Serviços Sanitários. Em 1912, o serviço sanitário e de
saúde do estado da Bahia ficou sob a direção da Diretoria Geral de Saúde Pública.69
Observa-se nesse período que o governo estadual vai ampliando as suas atribuições em
relação às ações sanitárias e de saúde. Os governantes tentavam intervir nos problemas
sanitários da capital, empreendendo ações e promulgando leis que as legitimassem, cujo
conteúdo estava ligado à organização sanitária e à fiscalização.
Cabe ressaltar que a política baiana na Primeira República, além de ser caracterizada
pela estrutura oligárquica e coronelística, não era representada por partidos políticos
fundamentados em programas. Para Consuelo Sampaio, eles eram “conhecidos e identificados
muito mais através dos nomes dos seus chefes que do rótulo que ostentavam”.70
Luiz Antônio de Castro Santos considera que a Bahia não conseguiu ter avanço com a
reforma sanitária nas duas primeiras décadas do século XX, apesar de terem sido criados
alguns órgãos como o Conselho de Higiene. Para ele, um dos motivos foi a elite conservadora
e um ambiente político e intelectual indiferente às ações de saúde pública. Só na década de
1920 houve progresso do movimento reformista graças à intervenção do governo federal e à
ação sanitária da Fundação Rockefeller.71

O atendimento sanitário e a fiscalização

69
SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes Do “Centro para o “mundo”. Doutorado em História. Recife, UFPE, 2009,
p. 38..
70
SAMPAIO, C. N. Os partidos políticos na Primeira República: uma política de acomodação. Obra citada, p.
47.
71
SANTOS, Luiz Antonio de Castro. Poder, Ideologias e Saúde no Brasil da Primeira República. In
HOCHMAN, Gilberto (org.). Cuidar, controlar e curar. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2004., p. 266
37

Os anos que antecederam à reforma sanitária na Bahia foram assolados por doenças
endêmicas e epidêmicas. Esse problema já era sinalizado desde o início do século com as
fiscalizações.72 As inspetorias faziam o trabalho de fiscalização dos domicílios, em Salvador,
à luz da legislação vigente.
Caso fosse necessário, o proprietário era notificado tendo um prazo para fazer os
reparos que variava de acordo com o que deveria ser realizado. O não cumprimento do
estabelecido ocasionava multa.
Se os inspetores encontrassem um enfermo que pudesse colocar em risco a saúde dos
demais moradores da casa, deveriam imediatamente encaminhá-lo para internamento.
Em 31 de janeiro de 1900, foi entregue um relatório da polícia sanitária do 6º distrito,
região da Penha, que tratou das casas visitadas pelos inspetores. O senhor Domingos
Estrellado, que possuía uma casa térrea de nº 51 na rua Barão H. de Mello, locada por Durval
Estrellado, foi notificado. Segundo o inspetor, o local necessitava de “reparação completa do
teto da casa, limpeza do quintal e tijolamento”. E para esses reparos lhe foram concedidos 40
dias. Na mesma rua, o senhor Vitor Soares Ribeiro possuía três propriedades, sendo que uma
ele locava ao senhor Domingos Martins Faria. Durante a inspeção desse imóvel, não foi
encontrado nenhuma irregularidade. No entanto, na casa que ele alugava ao senhor Roberto
Antônio do Espírito Santo era preciso “caiar a cozinha” e para isso lhe deram um prazo de 20
dias. A casa de número 52, por sua vez, pertencente ao mesmo proprietário, estava locada ao
senhor Arlindo de Oliveira Alves e também não necessitou de reparos.73
É provável que as casas onde os proprietários residiam tivessem menos problemas
para serem resolvidos do que as residências alugadas. A probabilidade das fiscalizações
encontrarem irregularidades era grande pois a população enfrentou sérios problemas
habitacionais, como foi observado anteriormente. É possível também que as decisões de
multas ou reparos fossem manipuladas de acordo com as relações existentes.
Os jornais noticiavam como esse trabalho estava sendo feito pela equipe de saúde.
Com o título de “Salubridade Pública” o Diário da Bahia, de 22 de outubro de 1913,
estampou na primeira página a seguinte matéria:

Foram noticiados, domingo, 3 casos de peste bubônica no


prédio numero 86, ao Pelourinho, sendo os doentes 2 árabes
72
SOUZA, Christiane Maria Cruz de. SANGLARD, Gisele. Saúde pública e Assistência na Bahia da Primeira
República (1889 -1929). In: SOUZA, Christiane Maria Cruz de. BARRETO, Maria Renilda Nery (org.). História
da Saúde na Bahia: Instituições e Patrimônio Arquitetônico (1808 – 1958), 2011, p. 51.
73
APEB. Mapas do movimento da polícia sanitária nos distritos de Santo Antônio, Mares e Santana ou seja 1º,
3º e 6º distritos. APEB Caixa 3688, maço 989, ano 1900.
38

residentes no 2º e 3º andares e uma criança que se


removeram para o Hospital de Isolamento. O prédio
desinfectado ficou interdito temporariamente.74

O periódico informou ainda que, segundo os inspetores sanitários dos 11º e 13º
Distritos, foram interditados provisoriamente por serem inabitáveis os prédios n. 145, a rua do
Fortinho; um sem número, pertencente ao Sr. José Joaquim dos Santos e definitivamente
interditado por ser totalmente inabitável o casebre sem número, situado no Candeal, de
propriedade da Sra. Marcellina Soares dos Santos. Isso indica que, de alguma forma, tentava-
se cumprir a legislação. Mas poderia também ser uma denúncia das condições das habitações
de Salvador, no governo de J. J. Seabra, cujo Diário da Bahia fazia oposição. 75
Em 1916, em matéria intitulada “A peste Negra”, o Diário da Bahia noticiou a
situação insalubre de alguns locais. Havia “pontos da cidade” que eram “verdadeiros ninhos
de ratos” e entre eles estavam “a ponte da ‘Navegação Baiana’ e o ‘Mercado Modelo’”. 76 Os
dois locais citados eram de embarque e desembarque de mercadorias, pontos de comércio da
cidade. Neles, além de transitar muita gente, circulavam alimentos que seriam utilizados nas
refeições. Na mesma publicação, o jornal falava de algumas providências que foram tomadas
pelo Governo, como a dedetização para matar os ratos e a troca da ponte. O articulista
aproveitava para perguntar ao Secretário Gonçalo Moniz quando a peste seria erradicada,
ouvindo como resposta o seguinte:

“... é um erro falar-se em extinguir a peste na Bahia, pois para isto é preciso
arrasar a Preguiça, o Pilar e tantos outros focos, por a prova de ratos todas as
edificações da cidade e estabelecer uma admirável rede de esgoto em toda ela,
e nós não temos posses para isto...”77

Assim, a o trabalho de fiscalização, de notificação e de desinfecção permaneceu ao


longo das primeiras duas décadas do século XX, embora a legislação sanitária tenha sido
reorganizada em vários momentos.
No dia 22 de abril de 1918, o Departamento Geral da Saúde Pública da Bahia –
DGSPB recebeu da 17ª inspetoria um relatório em que constavam três visitas a residências
particulares e duas a residências para alugar. Além disso, foram aplicadas quatro vacinas

74
“Salubridade Pública”. Diário da Bahia, 22 de out. 1913, p. 1.
75
SAMPAIO, Consuelo Novais. Verbete biográfico. Diário da Bahia. Disponível em:
http://www.fgv.br/CPDOC/BUSCA/Busca/BuscaConsultar.aspx>.
76
“A peste negra”. Diário da Bahia. Salvador, 28 nov. 1916, p. 01.
77
“A peste negra”. Diário da Bahia. Salvador, 28 nov. 1916, p. 01.
39

contra a varíola e foi requisitada uma desinfecção. Duas intimações foram expedidas para que
o proprietário fizesse os melhoramentos necessários e uma reclamação foi atendida.78
Quando o serviço de desinfecção era chamado, quase sempre se fazia necessário além
de desinfetar a casa, encaminhar o doente para o Isolamento a depender da doença. Foi o que
aconteceu dia 11 de maio de 1918, quando o serviço foi solicitado na residência do senhor
Valdomiro Athaide, localizada na Rua do Paço nº 45. Após a desinfecção, foi preciso
encaminhá-lo ao Hospital de Mont’Serrat com suspeita de varíola.79
Não foi possível saber se a suspeita foi confirmada. De todo modo, em 1919, Salvador
foi assolada pela maior epidemia de varíola ocorrida na sua história, ocasião em que 2.804
pessoas morreram.80
Um ano antes, a gripe espanhola tinha atingido a Bahia causando sérios danos. A
doença encontrou uma sociedade com péssimas habitações, problemas de esgotamento
sanitário e de abastecimento de água. Christiane Souza faz uma análise desse momento e
mostra como as autoridades baianas se organizaram para combater a moléstia. Inicialmente
não havia consenso diante do diagnóstico e alguns médicos tentaram negar a existência de
uma epidemia em Salvador.81
Na tentativa de entender o que estava acontecendo, a Diretoria Geral de Saúde Pública
da Bahia criou uma comissão para estudar a epidemia. O grupo foi composto por Frederico
Koch, Dyonisio Pereira e Aristides Novis. A comissão deveria pesquisar a doença e
apresentar um parecer sobre ela.82 A comissão entendeu que a ação da “espanhola” tinha
relação com o tipo de moradia da população, que era insalubre, e também com os espaços
públicos onde as pessoas tinham contatos. Por isso:

conscientes da contagiosidade da gripe, recomendaram a adoção de algumas


práticas de higiene individual e coletiva que poderiam contribuir para abreviar
o tempo de vida do patógeno e limitar a sua disseminação. Apesar de
78
APEB. Boletim diário dos serviços de Polícia e Vigilância Sanitárias. APEB Caixa 3688, maço 985, ano
1918.
79
APEB. Boletim diário dos serviços de Polícia e Vigilância Sanitárias. APEB Caixa 3688, maço 985, ano
1918.
80
.Christiane Maria Cruz de Souza e Gilberto Hochman buscaram identificar o impacto da epidemia na sociedade
soteropolitana e a resposta da população a esse evento. Ver: SOUZA, C. M. C. de & HOCHMAN, Gilberto Ano
de nove, ano de varíola: a epidemia de 1919, em Salvador, Bahia. Fênix, Vol. 9, Ano IX, Nº 3. Set/out/nov/dez.
2012, p. 1-19; Esdras Santos Oliveira abordou o uso político da epidemia de varíola na imprensa de Salvador,
durante a epidemia de 1919. Ver: OLIVEIRA, Esdras Santos. O uso político da varíola: epidemia, imprensa e
sucessão governamental em Salvador, Bahia, 1919. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em História),
UNEB, 2014.
81
SOUZA, Christiane Maria Cruz de. A gripe espanhola na Bahia: saúde, política e medicina em tempos de
epidemia. Salvador: EDUFBA; Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2009, p 138.
82
SOUZA, Christiane Maria Cruz de. A epidemia de gripe espanhola: um desafio à medicina baiana. In
História, Ciências, Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro, vol.15, n. 4, p. 945 – 972, 2008, p. 962- 963.
40

reconhecerem a causalidade específica da doença, ponderavam que as


condições materiais de existência constituíam fatores importantes a considerar,
quando se tratava da resistência do organismo humano às infecções.83
Os médicos acreditavam que era preciso melhorar as condições de vida da população,
a exemplo da moradia, alimentação, sobretudo dos menos favorecidos, assim:

Conscientes de que esses e outros fatores contribuíam para a incidência e


propagação de doenças como a gripe e para o surgimento de complicações no
decurso da doença, defendiam a adoção de medidas de saúde pública voltadas
para as camadas mais pobres da sociedade baiana, que não podiam prover o
seu próprio tratamento, e propugnavam, também, que a ação do serviço
público de saúde privilegiasse os lugares onde havia maior convívio ou
proximidade entre as pessoas.84

Dois anos depois, em 24 de março de 1920, o jornal Diário da Bahia, em matéria da


primeira página, associou a precária situação sanitária de Salvador à ocorrência da peste
bubônica. O jornal citou o boletim médico do Hospital de Isolamento e ironizou dizendo:
“Como se vê é excelente para não dizer detestável, o estado sanitário da capital.” Isso porque
segundo informações do boletim demográfico sanitário, citadas na matéria, haviam sido
notificados diversos doentes com peste, tuberculose, varíola, paludismo, gripe e febre
typhoide. Segundo a reportagem, os documentos oficiais ocultavam outros casos.85
O periódico questionava o discurso do governo na época que propagandeava as
reformas urbanas e o investimento em saneamento na Capital. Ainda nessa mesma
publicação, o articulista fez sérias denúncias sobre tais problemas:

Cidade sem esgotos, sem preceitos de higiene urbana expostos e seguidos, não
é possível combater entre nós, assim sendo, os ratos e conseguintemente as
pulgas, origem uns e vectoras as outras da peste negra humana.

Temos um mal crônico, de longa data instalado e nada quase temos feito de
profilaxia agressiva ou defensiva, ao menos, contra a sua permanência.
Quando nas suas alternativas costumeiras um surto maior se denuncia, como
agora, nem por isso os responsáveis se movem para uma campanha seria e
decisiva.

Pergunte-se que providencias já tomou o governo contra o surto atual?

As mesmas que tomou contra a varíola, isto é, nenhuma.86

83
SOUZA. A epidemia de gripe espanhola: um desafio à medicina baiana, p. 967.
84
SOUZA. A epidemia de gripe espanhola: um desafio à medicina baiana, p. 968.
85
“A peste Negra e o estado sanitário da capital”. Diário da Bahia. Salvador, 24 mar. 1920, p 1.
86
“A peste Negra e o estado sanitário da capital”. Diário da Bahia. Salvador, 24 mar. 1920, p. 1.
41

O autor finalizou criticando o posicionamento do governo baiano em relação às


providencias sobre um possível surto de peste. Além disso, acusou o governo de ter feito o
mesmo durante a epidemia de varíola.
Em 07 de outubro de 1921, mais uma vez o Diário da Bahia publicou sobre as
questões sanitárias da capital. Dessa vez, Gonçalo Muniz, diretor da Saúde Pública da Bahia,
foi entrevistado sobre a peste negra, doença que estava amedrontando a população. Um dos
problemas apontados como propiciadores foi a habitação.

Figura 1 – Dois casos de Peste Negra

Fonte: Diário da Bahia, Salvador, 07 jan. 1921, p. 1.

Durante a entrevista, o diretor deixou claro que a cidade precisava de casas para a
população e afirmou que para acabar com o problema da peste negra era preciso:

(...) que se cuidasse a sério do problema das habitações, o mais urgente


que temos na atualidade (...) Nós não temos casas suficientes para a
população, e isso determina o mal que não posso combater. É preciso
antes de tudo construir casas higiênicas, casas com ar e luz, casas para
operários, afim de que possa interditar esses pardieiros (...) 87

Para Gonçalo Moniz, era necessário interditar urgentemente inúmeras casas mas, para
isso, outras que atendessem os novos padrões de higiene precisavam ser construídas, afinal,
para onde iria toda essa população? A matéria foi finalizada com a seguinte frase: “Eis,
portanto, o que é preciso urgente: Casas!casas!casas!”.88

87
“Dois casos de peste negra”. Diário da Bahia. Salvador, 07 Jan. 1921.p 01.
88
“Dois casos de peste negra”. Diário da Bahia. Salvador, 07 Jan. 1921.p 01.
42

As matérias relatam problemas durante a gestão de Seabra, ainda que elas


funcionassem como uma alerta à população sobre o que estava acontecendo, havia também
um jogo político e disputa de poder.

DE VOLTA À REFORMA SANITÁRIA NA BAHIA

Quando a Reforma Sanitária foi iniciada na Bahia a partir do acordo feito com o
Governo Federal, em 1921, pelo então governador José Joaquim Seabra, conforme vimos
anteriormente, já existiam leis e instituições que de alguma maneira tentavam organizar a
saúde no estado.
Com a criação da Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública, em 1925, as
instituições existentes ficaram a ela subordinadas. Outras foram criadas para atender às
demandas dessa nova organização.
A Subsecretaria, subordinada direta e exclusivamente ao governador Francisco
Marques de Góes Calmon, passou a gerir todos os serviços de higiene e saúde pública
executados no estado da Bahia. Esse aspecto deve ser observado à luz das disputas políticas
estaduais. Ricardo Batista chama a atenção que o acordo para o saneamento da Bahia deu-se
através de dois governos opositores sendo iniciado com o convênio durante a gestão de
Seabra (1920-1924), e consolidado em 1925, com a criação da Subsecretaria de Saúde e
Assistência Pública e do Código Sanitário da Bahia, durante o governos de Góes Calmon
(1924-1928). A submissão da Subsecretaria diretamente ao governador implicava o aumento
de poder do representante do executivo baiano, causando desconforto no grupo seabrista.89
Cabia à Subsecretaria: o estudo de todas as questões que interessassem à saúde
coletiva; a adoção de todas as medidas técnicas que visassem evitar diminuir e suprir as
causas de doenças e morte; o melhoramento das condições de saúde e bem estar da
população.90 O seu artigo 5º previa que enquanto vigorasse o contrato firmado entre o
Governo Federal e o Estado, os serviços de Saneamento Rural, Profilaxia da Sífiles e Doenças
venéreas, Higiene Infantil e Tuberculose seriam executados com a colaboração financeira da

89
BATISTA. Sifilis e Reforma da Saúde na Bahia (1920-1945). p. 79.
90
BAHIA. Lei 1.811, de 19 de julho de 1925. Organiza a Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública.
Salvador, 1925.
43

União. Cessando o apoio federal esses serviços passariam a ser efetivados exclusivamente
pelo Estado que aproveitaria ou não os funcionários dele encarregados.
Três meses depois de criada a Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública, foi
instituído o Código Sanitário da Bahia. Este foi apresentado pelo então governador Francisco
Marques de Góes Calmon como um “instrumento legal” sustentado nos “modernos preceitos
da saúde pública.”91
A direção da Subsecretaria ficou a cargo do médico sanitarista Antônio Luis
Cavalcante Albuquerque de Barros Barreto. Barros Barreto nasceu no "Engenho do Meio da
Várzea", próximo à Cidade do Recife, em 11de maio de 1892. Em 1910, matriculou-se no
curso médico da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, graduando-se em 1916. Depois de
formado, Barros Barreto fez cursos nos Estados Unidos, França e Alemanha. Além disso,
frequentou vários serviços de Saúde Pública na Bélgica,Suíça e Itália. Quando retornou ao
Brasil, em 1923, chefiou a Seção de Propaganda e Educação Sanitária do Departamento
Nacional de Saúde Pública, no Rio de Janeiro. Em 1924, foi Chefe do Serviço de Saneamento
Rural no Paraná. Em seguida, foi nomeado a cargo similar na Bahia, onde liderou as
mudanças sanitárias ocorridas no estado, estando à frente da Subsecretaria de Saúde
Assistência Pública, criada em 1925. 92
No relatório acerca do primeiro ano de funcionamento da Subsecretaria, foi registrado
que durante muito tempo as leis sanitárias não estavam sendo cumpridas corretamente, daí ter
sido fundamental fazer algumas alterações para que a nova legislação fosse seguida. Barros
Barreto aproveitou para divulgar que a Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública em um
curto espaço de tempo havia mandado médicos para a América do Norte, Europa e para
região Sul do Brasil a fim de aprender sobre novas técnicas de saúde e assim melhorar o
atendimento sanitário da capital baiana. Além disso, foi feita uma parceria com a Fundação
Rockfeller.93
Seu discurso visava desqualificar a gestão de Seabra e valorizar as medidas tomadas a
partir do governo de Góes Calmon. Barros Barreto também comparou a antiga Diretoria Geral

91
APEB. Assembleia Geral Legislativa. Mensagem.Francisco Marques de Góes Calmon. Salvador, 1927.
92
JACOBINA, Ronaldo Ribeiro. Memória histórica do bicentenário da Faculdade de Medicina da Bahia
(2008): os professores encantados, a visibilidade dos servidores e o protagonismo dos estudantes da FAMEB.
Salvador: Faculdade de Medicina da Bahia/UFBA, 2013. 3 v. p. 37-44.
93
BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano de
1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927. Para a discussão acerca da atuação da Fundação Rockfeler na
Bahia ver: PONTES, Adriano Arruda. Caçando mosquitos na Bahia, a Rockefeller e o combate à febre amarela:
inserção, ação e reação popular (1918-1940). Dissertação de mestrado – Faculdade Filosofia e Ciências
Humanas, Programa de Pós Graduação em História. Universidade do Estado na Bahia, Salvador, 2007.
44

de Saúde Pública (DGSP) com a Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública. A ideia era
mostrar as mudanças e sobretudo os avanços que segundo ele estavam acontecendo.
A DGSP era composta por: uma secretaria, um serviço de estatística, dezoito
inspetorias, um serviço de desinfecção, o Instituto Oswaldo Cruz, o serviço de assistência
pública, o Cemitério da Quinta dos Lázaros, o Hospital de Isolamento, o Hospital dos
Lázaros, o Hospício dos Alienados, pela Justiça Sanitária e pelo Conselho Sanitário. Portanto,
essa era a estrutura que existia até 1925.
Com a criação da Subsecretaria foram instituídas seis Diretorias e cada uma tinha
vários órgãos e serviços a elas ligados. O quadro 5 mostra a estruturação dos serviços de
saúde na Bahia com a criação da Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública em 1925.
45
I - Diretoria de demografia e educação sanitária.

 Estatística demógrafo sanitária IV - Diretoria de Engenharia Sanitária


 Educação sanitária
 Construções
 Cadastro e recenseamento
 Águas

 Esgotos
 Obras de hidrografia sanitária
II - Diretoria de Epidemiologia e Profilaxia Geral  Lixo
 Serviços de enfermeiras sanitárias  Tombamento dos próprios pertences
 Delegacias de saúde (em número de da repartição sanitária
cinco, cada uma com três distritos
sanitários).
V - Diretoria de Assistência Pública
 Doenças transmissíveis
 Inspeções de saúde de:
 Polícia Sanitária
 Funcionários públicos
 Verificação de óbitos
 Empregados domésticos
 Hospital de Isolamento
 Empregados no comércio de
 Serviço Médico da hospedaria de
gêneros alimentícios
imigrantes
 Fiscalização do Exercício da
 Instituto Oswaldo Cruz
profissão médica e congêneres
 Seção de microbiologia
 Fiscalização de gêneros alimentícios
 Seção anti-rábica
 Serviços de socorros de urgência
 Seção vacionogenica
 Assistência a alienados (hospital São
 Seção química e
João de Deus)
bromatologia
 Assistência a Leprosos (hospital dos
 Seção de bioterapia
Lázaros)
 Seção de medicamentos
 Cemitério público da Quinta dos
 Profilaxia da Sífilis, lepra e doenças
Lázaros
Venéreas
 Profilaxia da tuberculose
 Postos municipais de higiene e
Saneamento rural
 Serviço de higiene industrial
 Serviço de luta contra animais VI - Diretoria de Expediente e contabilidade
transmissíveis  Portaria]seção de queixas e
informações
 Seção de expedientes
 Seção de contabilidade
 Arquivo
 Museu da higiene
III - Diretoria de Higiene infantil e escolar  Biblioteca
 Almoxarifado geral
 Desinfetório, cocheiros e garage
 Higiene da primeira infância  Oficinas
 Puericultura pré-natal
 Exames de nutrizes
 Higiene da idade pré-escolar
 Inspeção médica escolar
 Fiscalização dos estabelecimentos
de assistência à infância
VII - Justiça Sanitária

VIII – Conselho Sanitário

Quadro 5 - Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública


Fonte: BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano
de 1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927.
46

Como pode ser observado, a estrutura cresceu e se diversificou, havendo um aumento


do número de Diretorias e uma maior especificação dos serviços. Para isso foi necessário criar
novos órgãos.
As Delegacias de Saúde surgiram nesse momento e foram incorporadas à Diretoria de
Epidemiologia e Profilaxia Geral, setor que cuidava principalmente da prevenção e da
fiscalização das doenças. Nessa mesma Diretoria, estavam alocados o Hospital de Isolamento
de Mont’Serrat, o Serviço de Enfermeiras Sanitárias, o Serviço médico da hospedaria de
imigrantes, o Instituo Osvaldo Cruz, a Profilaxia da Sífilis lepra e doenças venéreas, a
Profilaxia da Tuberculose, os Postos Municipais de Higiene e Saneamento Rural, o Serviço de
higiene industrial e o Serviço de luta contra animais transmissíveis.
Os serviços de enfermeiras sanitárias foram instituídos no processo de reforma. As
profissionais a eles ligadas tiveram um papel importante de visitar e acompanhar os doentes
nos seus domicílios. No ano de 1928, elas visitaram 2.166 (duas mil, cento e sessenta e seis)
enfermos e, em 1929, foram visitados 2.693 (dois mil seiscentos e noventa e três) doentes.94
No entanto, a ênfase na relevância das enfermeiras sanitárias ou visitadoras era anterior à
gestão de Barros Barreto no governo de Góes Calmon. Em 1922, o Departamento Nacional de
Saúde Pública, através do Serviço de Profilaxia Rural dirigido pelo médico Sebastião Barroso,
firmou acordo com a Liga Bahiana Contra a Tuberculose para colocar em funcionamento o
Dispensário voltado especificamente para essa doença. A assistência que norteou a nova
instituição seguiu o que vinha sendo desenvolvido nos dispensários da Inspetoria de Profilaxia
da Tuberculose, do Rio de Janeiro, sob a direção do médico Plácido Barbosa, baseado no
trabalho das enfermeiras visitadoras. Era, dessa forma “um procedimento considerado novo,
consistindo a parte mais importante do serviço”. 95
A Diretoria de Higiene infantil e escolar foi criada a partir da Subsecretaria, cabendo a
ela pensar as estratégias de cuidado e de atenção voltadas para esse público. De acordo com
Lidiane Monteiro Ribeiro, na Bahia as ações direcionadas à infância aconteceram em
conjunto. As de cunho filantrópicos que já existiam se aliaram à Diretoria de Higiene Infantil,
cujo principal propósito era combater a mortalidade infantil. Para atingir esse objetivo, foram
criados consultórios para gestantes e creches com a intenção de orientar as mães e ajudar a

94
BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: anno de
1927. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1928. BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da
Secretaria de Saúde e Assistência Pública: anno de 1927. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1929.
95
SILVA. O Dispensário Ramiro Azevedo e a Constituição de políticas de enfrentamento da tuberculose na
Bahia na década de 1920 (no prelo).
47

cuidar das crianças. O médico Martagão Gesteira foi o responsável por coordenar essas ações
no estado. Segundo Ribeiro:

Como Martagão Gesteira havia anunciado na entrevista concedida ao jornal A


Tarde em 5 de junho de 1923, e confirmado por meio do estatuto da instituição
benemerente, as obras consistiram em um consultório de lactentes e uma
creche. A importância de cada uma delas estava diretamente relacionada à
proposta de combate à mortalidade infantil defendida pela entidade. 96

As Delegacias de Saúde e o Hospital de Isolamento de Mont’Serrat, objeto deste


estudo, tiveram papel importante no processo de constituição das ações relacionadas à
reforma sanitária em âmbito estadual. Essas duas instituições serão tratadas especificamente
na segunda parte desta dissertação.

96
RIBEIRO, Lidiane Monteiro. Filantropia e assistência à saúde da infância na Bahia: a Liga Baiana contra a
mortalidade infantil, 1923-1935. Mestrado em História das Ciências e da Saúde. Rio de Janeiro, Fundação
Oswaldo Cruz. Casa de Oswaldo Cruz, 2011.
48

PARTE II

AS DELEGACIAS DE SAÚDE E O HOSPITAL DE ISOLAMENTO DE


MONT’SERRAT DURANTE A REFORMA SANITÁRIA.

Nesta parte da dissertação vamos analisar duas instituições que desenvolveram ações
de saúde, no momento em que o estado da Bahia passava pelo processo de reforma sanitária:
as Delegacias de Saúde e o Hospital de Isolamento de Mont’Serrat.

AS DELEGACIAS DE SAÚDE

As Delegacias de Saúde em Salvador foram criadas com a Lei 1.811 de 27 de julho de


1925, que organizou a Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública. Elas foram instaladas em
diversos pontos da cidade e tiveram as seguintes funções: cadastro e recenseamento dos
prédios e da população dos distritos sanitários; estudo das causas de insalubridade e das
anomalias nosológicas existentes nas zonas de sua jurisdição; estudo epidemiológico dos
casos de doenças transmissíveis; combate às moléstias de notificação compulsória
compreendendo principalmente o isolamento domiciliário, desinfecção concorrente,
imunização específica, vigilância sanitária e luta contra animais transmissíveis; polícia
sanitária e higiene das habitações; fiscalização da profissão médica e suas congêneres, em
perfeito entendimento com respectivo serviço; fiscalização das farmácias, drogarias,
laboratórios farmacêuticos e bioterapêuticos, pertencentes a particulares, instituições oficiais,
ou privadas e serviço de verificação de óbitos.97
O sugirmento desse órgão atendia não apenas a uma deliberação estadual, mas seguia
também o modelo Federal de reforma sanitária, pois junto ao Departamento Nacional de
Saúde Pública (DNSP), criado em 1920, foram instituídas 10 (dez) Delegacias de Saúde cujo
objetivo estava voltado para a profilaxia.98
A 1ª Delegacia de Saúde funcionou no prédio do Instituto Osvaldo Cruz (IOC-BA), no
bairro do Canela. A imagem abaixo (figura 2), que está no Relatório de Barros Barreto,
Subsecretário de Saúde na época, mostra um local organizado e pronto para o atendimento.
97
BAHIA, Lei 1.811 de 27 de julho de 1925. Arquivo Público do Estado da Bahia. Salvador, 1925.
98
BRASIL. Decreto nº 14.354, de 15 de Setembro de 1920: Organização das Diretorias e Inspetorias. Disponível
em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1920-1929/decreto-14354-15-setembro-1920-503181-
publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso em: 28 de março de 2018.
49

Figura – 2 Sede da 1ª Delegacia de Saúde

Fonte: Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública - 1927

Cabe refletir, como nos sugere John Berger, que a fotografia não é um retrato fiel da
“realidade”, ela é uma parte daquilo que se quer apresentar. Para ele,
As fotografias testemunham uma opção humana sendo exercida numa dada
situação. A fotografia é o resultado da decisão do fotógrafo de que vale a pena
registrar em um evento (...) A fotografia já é uma mensagem sobre o
acontecimento que ela registra. A urgência dessa mensagem não é totalmente
dependente da urgência do acontecimento, mas também não pode ser
inteiramente independente dela (...).99

Assim, ela pode ser utilizada para mostrar algo específico, como é o caso da fotografia
acima, que parece sugerir que as Delegacias estavam funcionando bem.
O nome “Delegacia” vem do latim delegatus. Significa o local no qual atuam pessoas
a quem são delegados o poder para falar em nome das entidades que representam. Embora
não seja restrito a uma unidade policial, no caso específico das delegacias aqui tratadas havia
relação com ações “policiais”, sugerindo um tipo de prática de controle. As atividades

99
BERGUER, John. Para entender uma fotografia. Organização, introdução e notas Geoff Dyer. Tradução:
Paulo Geier. 1ª Ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2017, p. 37-38.
50

desenvolvidas pelas Delegacias de Saúde, portanto, tinham como objetivo fiscalizar e


controlar doenças, sobretudo as infectocontagiosas. O principal papel das Delegacias era
garantir que Salvador estivesse livre de surtos epidêmicos e fiscalizar para que o Código
Sanitário, criado no ano de 1925, fosse cumprido.
O quadro de funcionários das Delegacias estava organizado da seguinte maneira: um
Delegado, três inspetores, um Inspetor Vacinador, um Verificador de óbitos, um Escrevente
Datilógrafo, um Guarda Chefe e vários guardas sanitários. Eles deveriam seguir o Código
Sanitário na fiscalização e notificação dos doentes, acompanhando os enfermos quando era
possível tratar em casa e, quando havia necessidade de isolamento hospitalar, encaminhá-los
para o Hospital de Mont’Serrat.100 Além disso, os inspetores deveriam aplicar multas quando
o Código não fosse seguido.
Foram criadas cinco Delegacias de Saúde e cada uma deveria atender a três Distritos
Sanitários, entre os quinze existentes.101 No entanto, a organização sanitária em forma de
Distritos era anterior ao surgimento delas. A Lei de nº 628 de 14 de setembro de 1905, que
reorganizou o serviço de saúde do Estado no governo de José Marcelino de Souza (1904-
1908), previa no artigo 28 da seção Inspetorias Sanitárias que a Capital deveria ser dividida
em seis Distritos Sanitários: cinco urbanos e um suburbano.102 Cada Distrito ficaria sob a
responsabilidade de um Inspetor Sanitário, que deveria fiscalizar o cumprimento das leis
sanitárias, verificar casos de moléstias transmissíveis e averiguar o exercício ilegal da
medicina e da farmácia.
O artigo n.º 28 da lei 628 afirmava que “em épocas anormais”, os distritos poderiam
ser “subdivididos em secções, a critério do diretor do serviço sanitário, com aprovação do
governo”.103 Esse artigo permitiu a criação de mais Distritos na Capital, na medida em que as
necessidades foram aparecendo. Assim, a modificação da legislação sanitária ocorrida através
da Lei 840 de 24 de agosto de 1910 previu, no seu artigo 5º, a possibilidade de elevar os
distritos até o número de quinze.104 Este número foi ampliado, para dezesseis, com a
promulgação da lei n.º 921 de 1912, ficando cada um deles a cargo de um inspetor sanitário

100
A depender da localização da Delegacia, o enfermo poderia ser encaminhado para o Hospital Santa Izabel.
101
A Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública apresentou no Diário Oficial do Estado a nova divisão dos
Distritos Sanitários de Salvador. No documento era evidente a organização urbana/geográfica de cada um dos
quinze Distritos. BAHIA, Diário Oficial do Estado da Bahia, domingo, 30 de agosto de 1925. Arquivo Público
do Estado da Bahia. Salvador, 1925.
102
BAHIA, Lei 628, de 14 de setembro de 1905. Reorganiza o serviço sanitário do Estado. Arquivo Público do
Estado da Bahia. Salvador, 1905.
103
BAHIA, Lei 628, de 14 de setembro de 1905. Reorganiza o serviço sanitário do Estado. Arquivo Público do
Estado da Bahia. Salvador, 1905.
104
BAHIA, Lei n. 840 de 24 de agosto de 1910. Modifica a lei n. 628 de 14 de setembro de 1905 relativa ao
serviço sanitário Estadual.
51

que deveria ser médico, podendo seu auxiliar ser estudante da Faculdade de Medicina da
Bahia, desde que estivesse cursando entre a 5ª e 6ª série médica.105
Christiane Maria Cruz de Souza, ao analisar a organização sanitária da Bahia no
período da gripe espanhola, afirma que em 1917 a cidade do Salvador foi dividida em
dezessete distritos sanitários:

Moniz de Aragão achou conveniente manter o serviço de vigilância sanitária.


Ficava a cargo dos inspetores sanitários a realização de várias visitas médicas
aos domicílios e estabelecimentos, em especial àqueles onde existia alguma
concentração de pessoas em grandes ou pequenos espaços – escolas, fábricas,
asilos, quartéis, etc.. Para viabilizar os serviços dos inspetores, Salvador foi
106
dividida em 17 distritos sanitários.

O Diário Oficial de 01 de agosto de 1925,107 ao contabilizar a quantidade de pessoas


vacinadas contra a varíola, indica um número de dezoito Inspetorias Sanitárias (Quadro 6). No
mesmo ano, as inspetorias sofreram outra modificação, em virtude da criação das Delegacias
de saúde. Dessa vez, houve uma diminuição de dezoito para quinze inspetorias.

105
BAHIA, Lei 921 de 29 de novembro de 1912. Manda adaptar como lei sanitária do Estado a Organização
do Serviço Geral da Saúde Pública, editada pelo decreto 1.105 de 15 de julho do corrente ano. Arquivo Público
do Estado da Bahia. Salvador, 1912.
106
SOUZA, Christiane Maria Cruz de. A Gripe Espanhola na Bahia: saúde, política e medicina em tempos de
epidemia, EDUFBA; Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2009. p.71.
107
BAHIA, Diário Oficial do Estado da Bahia, sábado, 1 de agosto de 1925. Arquivo Público do Estado da
Bahia. Salvador, 1925.
52

Inspetoria Inspetor Responsável


1ª Menandro Meirelles Filho
2ª Walfedro Mendonça
3ª Pedro Ribeiro
4ª Dionysio Pereira
5ª Collatino de Borburema
6ª Edgard Tourinho
7ª Candido Figueiredo
8ª Francisco S. Senna
9ª Virgílio de Carvalho
10ª Januário Telles
11ª Franco Rocha
12ª Oswaldo Duarte
13ª Severino Pereira
14ª Mario Andrea
15ª Eduardo Diniz Gonçalves
16ª Clíniode Jesus
17ª Américo Duarte Ferreira
18ª Moneiro de Almeida
Quadro 6 – Inspetorias Sanitárias, 1925.

Fonte: BAHIA, Diário Oficial do Estado da Bahia, sábado, 1 de agosto de 1925. Arquivo Público do Estado da
Bahia. Salvador, 1925.

As inaugurações das Delegacias de saúde ocorreram em datas diferentes: a 1ª foi


inaugurada em 14 de agosto de 1925 e as demais em cinco de setembro do mesmo ano.108
Segundo Antônio Luis C. A. de Barros Barreto as Delegacias foram criadas para substituir as
Inspetorias, para ele:
as Delegacias de Saúde, compreendendo cada uma três inspetorias sanitárias
e que, localizadas em diversos pontos da cidade, vieram facilitar sobremodo o
trabalho de profilaxia das doenças transmissíveis e de polícia sanitária,
substituindo as primitivas 18 inspetorias que funcionavam simultaneamente no
mesmo prédio da antiga Diretoria Geral.109

108
APEB. Relatórios dos trabalhos executados na 1ª, 3ª, 4ª e 5ª Delegacia de Saúde. APEB. Caixa 4026, maço
14, ano 1925 – 1929.
109
BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano de
1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927.
53

De acordo a nova legislação, as Delegacias, além de atenderem a três distritos


sanitários cada uma, deveriam estar espalhadas geograficamente pela cidade, de modo que os
serviços por elas oferecidos pudessem acontecer de maneira mais eficaz e abrangente.
Se pensarmos que antes a estrutura estava localizada em um só lugar, podemos dizer
que a rede do atendimento sanitário se diversificou. Quando existiam 18 inspetorias, todas
ficavam instaladas em um mesmo prédio, dificultando o acesso da Diretoria Geral de Saúde
Pública à população e da população até as inspetorias. Com as Delegacias, esses profissionais
puderam ficar em locais diferentes facilitando o atendimento.
O mapa 2 mostra de que maneira essas Delegacias foram instaladas geograficamente
110
em Salvador. O quadro 7 apresenta como estavam organizados os cargos e funções das
cinco Delegacias de saúde de Salvador no momento da sua criação.

110
Para a construção desse mapa, seguimos as informações de Mário Augusto da Silva Santos no que diz
respeito aos nomes e à quantidade de Distritos. Utilizamos como referência o mapa atual de Salvador, uma vez
que as mudanças dos limites foram pequenas. Para fazermos a divisão, foi preciso analisar os endereços de cada
Delegacia de Saúde e as ruas que os distritos atendiam, conforme foi publicado no Diário Oficial. A utilização de
um mapa da década de 1940 (SILVA, M. E. N. da, 1998, p. 49), também serviu como norteador para o período
aqui tratado. Acreditamos que o resultado apresentado é próximo da divisão da época, uma vez que não
encontramos mapas datados de 1920. Essa foi a melhor maneira que encontramos para mostrar a distribuição
geográfica das Delegacias de Saúde entre os Distritos Centrais e Periféricos.
54

Mapa 2
55

1º Delegacia
Sede 1º Delegado 1º Inspetor 2º Inspetor 3º Inspetor Inspetor Vacinador Verificador de óbitos
Instituto Osvaldo Menandro dos Reis Eduardo Diniz Walfredo de Mendonça Francisco Vieira Fernando de Moraes Walter Pinto de Almeida
Cruz - Canela Meirelles Filho Gonçalves Campello Studart
2º Delegacia
Sede 2º Delegado 4º Inspetor 5º Inspetor 6º Inspetor Inspetor Vacinador Verificador de óbitos
Edifício da Dionysio da Silva Lima Alvaro Conde Lemos Guilherme Gama de Virgílio de Carvalho Raymundo Leopoldo Manoel da Silva Lima
Assistência Pereira Araújo Ramos Ribeiro da Silva Pereira
Pública
3º Delegacia
Sede 3º Delegado 7º Inspetor 8º Inspetor 9º Inspetor Inspetor Vacinador Verificador de óbitos
Desinfectório Alvaro da França Rocha Eutychio da Paz Bahia José Maria Monteiro de Almir Aranha de Edgard Frederico Pedro de Campos Nogueira
Almeida Almeida Braga Tourinho
4º Delegacia
Sede 4º Delegado 10º Inspetor 11º Inspetor 12º Inspetor Inspetor Vacinador Verificador de óbitos
Posto Pacifico Mario Andrea dos Santos Pedro Ribeiro Mariane Oswaldo Duarte Ferreira Euxuperio da Silva Luiz Machado Almir de Sá Cardoso de
Pereira à Rua das Bittencourt Braga Oliveira
Sete Portas
5º Delegacia
Sede 5º Delegado 13º Inspetor 14º Inspetor 15º Inspetor Inspetor Vacinador Verificador de óbitos
À Rua de Roma nº Januário Cyrillo da Silva ClinioAntonio Zacharias Américo Duarte Ferreira Raul Vasco da Gama Flávio Ferreira Vianna Carlos Chiacchio
294 Telles de Jesus Bandeira

Quadro 7 – Organização das Delegacias de Saúde no momento da sua criação


Fonte:BAHIA, Diário Oficial do Estado da Bahia, domingo, 30 de agosto de 1925. Arquivo Público do Estado da Bahia. Salvador, 1925.
56

A matéria do jornal Diário de Notícias, de 17 de janeiro de 1926 (Figura 3),111


fez uma rápida reflexão sobre como o Código Sanitário era utilizado na Bahia. Segundo
informou, locais como cinemas e igrejas não seguiam a legislação. Ao falar das
Delegacias de Saúde, o periódico tentou convencer a população da importância que tais
órgãos tinham para o combate às moléstias em Salvador, na década de 1920. O artigo
aparece em uma matéria de capa, com grande destaque, além de trazer a imagem dos
prédios ligados à Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública.

Figura 3 - Apelo ao Subsecretário

Fonte: Diário de Notícias, 17 jun.1926,

Ao comparar o Quadro 6 que apresenta o nome dos Inspetores Sanitários em


agosto de 1925, quando as Delegacias não haviam sido fundadas, com o Quadro 7 que
mostra os funcionários das Delegacias, percebemos que onze dos dezoito Inspetores
continuaram no serviço sanitário. Alguns como Inspetores e outros passaram a ser
Delegados.

111
“Medidas Sanitárias de que a Bahia precisa: um apelo ao Sub Secretário da Saúde Pública”. Diário de
Notícias, Salvador, 17 jan. 1926, p. 1
57

Apesar das disputas políticas, muitos que permaneceram em cargos importantes


ligados à saúde pública da Bahia destacaram-se nas suas áreas de atuação. Como
exemplos, podem ser citados os médicos Mario Andrea dos Santos e Menandro dos
Reis Meirelles.
Mario Andrea dos Santos nasceu no Estado do Amazonas em 1884 e faleceu em
1960. Formou-se na Faculdade de Medicina da Bahia em 1910 na 96ª turma e foi
Professor Catedrático dessa instituição, responsável pela cadeira de Anatomia
Patológica /Histologia. Ocupou o cargo de 14ª Inspetor Sanitário e a partir de 1925 com
a criação das Delegacias de Saúde tornou-se o 4º Delgado. Em 1923, publicou o livro
intitulado “Patologia geral”. Segundo Christiane Maria Cruz de Souza, quando a Gripe
espanhola se espalhou pela Bahia ele analisou vários exames para entender melhor a
doença e o que ela causava nos doentes. 112
Menandro dos Reis Meirelles Filho nasceu em Salvador em 1876 e faleceu na
mesma cidade em 1947. Formou-se em Medicina pela Faculdade de medicina da Bahia,
em 1898, na 82ª turma. Foi diretor interino do Hospital de isolamento de Mont’Serrat
inclusive em um momento importante, durante uma das reformas. Dentre os vários
cargos ligados à medicina, dirigiu a maternidade Climério de Oliveira entre os anos de
1914 e 1925.113 Ele esteve à frente da 1ª Inspetoria e, quando as inspetorias foram
extintas e surgiram as Delegacias de Saúde, tornou-se o 1° Delegado da 1ª Delegacia de
Saúde.
Os médicos responsáveis pelas Delegacias escreveram relatórios periódicos nos
quais abordaram os serviços realizados e as dificuldades enfrentadas. As condições de
moradia da população eram referidas como um dos problemas que mais prejudicavam o
trabalho das Delegacias de Saúde. Por outro lado, além das condições precárias das
habitações muitas delas eram sublocadas, servindo a mais de uma família, o que
atrapalhava ainda mais as ações dos profissionais envolvidos.
Outros problemas eram apontados pelos delegados como merecendo atenção, a
exemplo do número insuficiente de Delegacias. Os relatórios da 5ª Delegacia de Saúde,
com sede na rua de Roma, por exemplo, indicaram que a região Suburbana necessitava
de mais Delegacias. O médico Januário Telles, Delegado de Saúde, fez queixas em

112
JACOBINA, Ronaldo Ribeiro. Memória histórica do bicentenário da Faculdade de Medicina da
Bahia (2008):Os Professores encantados, a visibilidade dos Servidores e o protagonismo dos Estudantes
da FAMEB. Salvador: Faculdade de Medicina da Bahia/UFBA, 2013. 3 v. p. 64-65
113
JACOBINA. Memória histórica do bicentenário da Faculdade de Medicina da Bahia (2008), p. 32-
33.
58

relação à quantidade de pacientes que precisavam dos cuidados daquele órgão, o que
inviabilizava o trabalho dos inspetores. No relatório enviado a Barros Barreto,
Subsecretário de Saúde e Assistência Pública, ele levantou a possibilidade de criar uma
nova unidade na região suburbana, pois as que lá existiam estavam sobrecarregadas:

Insisto no alvitre que tomei a liberdade de apontar-vos no meu ultimo


relatório e que seria a criação de uma Delegacia de Saúde Suburbana ou um
Centro de saúde, com sede em Plataforma, e que resolveria o problema do
saneamento daquela zona vastíssima e populosa, e que seria eficiente barreira
e que se oporia a uma possível incursão, na Capital, de algum surto de
114
moléstia epidêmica que por lá venha aparecer.

É possível perceber que Januário Telles estava preocupado com a possibilidade


de ocorrência de algum surto epidêmico naquela região, uma vez que as pessoas viviam
em péssimas condições de higiene. Além disso, se ocorresse uma contaminação em
massa, o restante da cidade também corria o risco de ser atingido. Existia uma grande
preocupação em “sanear”, para não “espalhar”. Era preciso muito cuidado, pois não
adiantava pôr fim ao vírus em uma determinada região e outra permanecer vulnerável.
Para ele, era necessário criar uma “barreira” que impedisse a proliferação das
doenças.115
Gilberto Hochman chama a atenção para o problema da transmissibilidade das
doenças. Segundo ele, a defesa contra o contágio e a produção de condições salubres
enfrentaram problemas de cooperação e de ação coletiva.116 Eram questões que
precisavam ser resolvidas por expor as fronteiras e, no caso aqui analisado, as fronteiras
da própria cidade.
Os serviços prestados pelas Delegacias de Saúde enfrentaram sérios problemas,
desde a falta de fichas para fazer a catalogação das visitas, à falta de opção de moradia
para a população pobre. Segundo os Delegados, as inspeções não podiam ser rigorosas,
pois as pessoas eram obrigadas a recorrer a domicílios insalubres, a exemplo daqueles
localizados nos distritos da Sé e Conceição da Praia. Foi o que afirmou Mário Andrea
dos Santos, da 4ª Delegacia de Saúde, no relatório enviado a Barros Barreto:

(...) esta Delegacia a que luta mais intensamente com a ignorância e


deficiência de recursos, por que nela residem as classes mais pobres,
114
APEB. Relatórios dos trabalhos executados na 1ª, 3ª, 4ª e 5ª Delegacia de Saúde. APEB Caixa 4026,
maço 14, ano 1925/1929.
115
APEB. Relatórios dos trabalhos executados na 1ª, 3ª, 4ª e 5ª Delegacia de Saúde. APEB Caixa 4026,
maço 14, ano 1925/1929.
116
HOCHMAN. A era do saneamento, p. 39.
59

sem instrução, incapazes de qualquer medida higiênica individual que


se torna mais eficiente a campanha sanitária.

(...)

Não se poderá em certas zonas, exigir esgotos nem forças, por quanto
a falta de coletor geral e a quase ausência d’água, que apenas dá para
as necessidades orgânicas captada em poços torna impossível tais
medidas.

(...)

além disto as zonas extensas onde predominam as casas sopapo, de


palha, feitas até de folhas de latas velhas, de propriedade dos próprios
moradores que vivem quase na indigência, mal podendo conseguir o
alimento para a família.117

As reclamações e questionamentos partiam de várias regiões. Para alguns


médicos, era necessário sanear primeiro a região para só então fiscalizar corretamente as
habitações. Segundo relatos, era muito difícil seguir as regras relacionadas às
habitações, com ruas sem esgoto, água e outros serviços essenciais para o saneamento
da região. Para Mario Andrea,

(...) Só após o saneamento dos campos insalubres, que os há na 4ª


Delegacia, tais como na baixa do Cabula, Retiro, Beijú, etc, com as
obras de hidrografia sanitária varrendo o paludismo que mais persegue
às essas zonas, é que poderá estender com maior justeza a campanha
saneadora às habitações pobres.118

Atender às noções básicas de higiene na década de 1920, momento em que


mudanças sanitárias estavam ocorrendo, era difícil. Um dos questionamentos dos
Delegados de Saúde na ocasião das vistorias era que a maioria das casas não seguia o
Código Sanitário. Ainda assim, era preciso permitir que as famílias permanecessem
naqueles locais insalubres, por serem os únicos lugares que elas tinham para viver. Eles
acreditavam que para “sanear” a Bahia era preciso seguir o Código Sanitário, tarefa
nada fácil e nem sempre possível.

117
APEB. Relatórios dos trabalhos executados na 1ª, 3ª, 4ª e 5ª Delegacia de Saúde. APEB. Caixa 4026,
maço 14, ano 1925/1929.
118
APEB. Relatórios dos trabalhos executados na 1ª, 3ª, 4ª e 5ª Delegacia de Saúde. APEB. Caixa 4026,
maço 14, ano 1925/1929.
60

A região que compreendia a 3ª Delegacia também estava fora dos padrões de


higiene. No entanto, alguns avanços foram apontados nos relatórios do delegado Álvaro
da França:

O imundo beco do Mateus está hoje transformado em avenida Major


Mateus e nela se vêm prédios modestos, mas perfeitamente habitados
(...)
O proprietário do cinema Olympia já deu início aos melhoramentos
completando a impermeabilização de todo o piso, removendo e
substituindo aparelhos sanitários e etc. (...)119

Na citação, o delegado falou de alguns problemas que começaram a ser


solucionados a partir das ações feitas pela Delegacia sob sua responsabilidade. Porém,
mais adiante, também fez reclamações. Para ele,

Na Baixa dos sapateiros, o Mercado ali situado continua pela sua falta
de higiene e imundície, um dos maiores atentados à saúde pública, por
ventura observados nesta cidade e para ele peço a ação da Inspetoria de
Gêneros Alimentícios tanto que comecem a funcionar os seus
serviços.120

Percebemos que a ideia era criar uma rede de atendimento sanitário. As


Delegacias eram responsáveis por fazer fiscalizações inclusive em locais que
comercializavam alimentos. Nesse momento, o delegado acreditava que a Inspetoria
responsável por alimentos deveria fazer essa fiscalização, uma vez que o mercado
deveria vender exclusivamente produtos de gênero de alimentos.
O único Delegado que fez elogios às novas construções foi o médico Menandro
dos Reis Meirelles Filho, responsável pela 1ª Delegacia, segundo ele:

É com a maior satisfação que observo o desenvolvimento que tem sido


as novas construções no perímetro desta Delegacia, principalmente no
1º Distrito, sendo talvez no momento, onde só tenha construído maior
número de habitações obedecendo as condições de higiene e de
estética.121

119
APEB. Relatórios dos trabalhos executados na 1ª, 3ª, 4ª e 5ª Delegacia de Saúde. APEB. Caixa 4026,
maço 14, ano 1925/1929.
120
APEB. Relatórios dos trabalhos executados na 1ª, 3ª, 4ª e 5ª Delegacia de Saúde. APEB. Caixa 4026,
maço 14, ano 1925/1929.
121
APEB. Relatórios dos trabalhos executados na 1ª, 3ª, 4ª e 5ª Delegacia de Saúde. APEB. Caixa 4026,
maço 14, ano 1925/1929.
61

A área citada pelo médico era a Vitória, local para onde as elites migraram e
foram construir seus casarões, como já foi dito na primeira parte desta dissertação.
Talvez por isso, as habitações foram elogiadas pelo delegado. A população que estava
fazendo essas construções era a que tinha dinheiro e podia seguir os novos padrões
exigidos naquele momento.
Apesar dos relatórios das Delegacias de Saúde apresentarem alguns avanços
sobre a situação sanitária de Salvador, essa mesma documentação apontou falhas e
lacunas existentes pois uma grande parcela da população ainda permanecia fora do
“modelo” de higiene, o que dificultava o trabalho dos agentes responsáveis.
Durante os anos de funcionamento desses órgãos foi feita a fiscalização nos
estabelecimentos residenciais e comerciais de Salvador, embora não seja possível
afirmar a abrangência dessa atividade. Fiscalizar apenas não poderia resolver o
problema mesmo porque as antigas Inspetorias já faziam esse trabalho.
Os funcionários das delegacias, por sua vez, queixavam-se da sobrecarga de
trabalho e diziam não conseguir cumprir as normas e regras como deveriam. A
legislação era explícita, no entanto, a melhoria das condições sanitárias e de saúde da
população requeria mudanças nas condições de habitação, de alimentação e de questões
ligadas às condições de vida e de trabalho que só seriam alcançadas mediante
interferência governamental através de políticas sociais.
Talvez por isso, em 1930, quando os Inspetores da 4ª Delegacia de Saúde
fizeram o trabalho de fiscalização habitacional ainda encontraram um grande número de
residências apresentando antigos problemas de higiene. Muitas delas eram cobertas com
palhas, sem reboco nas paredes e de chão batido (quadro 8). Vale lembrar que nesse
período já haviam passados cinco anos da promulgação do Código Sanitário e nove dos
primeiros acordos com o Governo Federal.
62

REGIÃO TIPO DE COBERTURA TOTAL DE RESIDENCIAS


TELHA PALHA
Quant. % Quant. %
Água Comprida 39 42 53 58 92
Muriqueira 19 17 90 83 109
Periperi 320 63 189 37 509
Praia Grande e Enseada 147 98 3 2 150
Quadro 8 – Tipos de cobertura nas residências da região suburbana em 1930.
Fonte: APEB. Relatórios dos trabalhos executados na 1ª, 3ª, 4ª e 5ª Delegacia de Saúde. APEB. Caixa
4026, maço 14, ano 1925/1929

Com base nas informações do quadro 8, podemos perceber que em duas


localidades (Água Comprida e Muriqueira) a maioria das casas eram cobertas de palha.
Em Praia Grande e Enseada, houve o maior número de casas com telhado. Apenas 2%
delas não possuíam esse tipo de cobertura. Mesmo em Periperi, onde 320 das 509 casas
fiscalizadas possuíam cobertura de telha, o número das que não tinham era expressivo,
pois 37% do total de casas verificadas ainda eram cobertas com palhas.
Em 1927, as Delegacias de Saúde passaram a denominar-se Centros de Saúde,
através da lei nº 1.993 de 20 de julho de 1927, que transformou a Subsecretaria de
Saúde e Assistência Pública em Secretaria de Saúde e Assistência Pública. 122 Segundo o
artigo 3º desta lei, os dispositivos do Código Sanitário relativos às Delegacias seriam
aplicados aos Centros.123 No entanto, embora tenha havido essa mudança no texto da
lei, elas continuaram sendo referidas como Delegacias, porém em processo de transição
que se iniciou em 1928 e foi até 1930. No relatório de 1930, Barros Barreto falou dessa
mudança e chamou as Delegacias de saúde de primitivas para justificar a mudança para
Centros de Saúde, Para ele

Até o presente apenas duas das primitivas Delegacias a título de ensaio,


foram transformadas em Centros de Saúde. Os benefícios consequentes
a essa experiência, pelas facilidades proporcionadas á difusão dos
preceitos de higiene individual e coletiva, as oportunidades de favorecer
a população pobre da Cidade, assistência médica e dentária
principalmente no que se refere ao tratamento da sífilis e doenças
venéreas, verminoses, paludismo, consultas de higiene infantil e

122
Cabe ressaltar que em 1927 já funcionava um Centro de Saúde junto ao Hospital de Isolamento de
Mont’Serrat. Ver: APEB. Relatório dos principais fatos ocorridos no Hospital de Isolamento de Mont’
Serrat. APEB. Caixa 4026, maço14, ano 1927/1929.
123
BAHIA. Lei 1.993, de 20 de Julho de 1927. Cria a Secretaria de Saúde e assistência Pública em
substituição a Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública, Salvador, 1927.
63

maternal, de otorrinolaringologia, exames gratuitos dos tuberculosos,


etc. autoriza-nos a preconizar, após dois anos de funcionamento, a
metamosrfose das atuais Delegacias em centros de saúde, onde sejam
executados os seguintes serviços: educação sanitária, polícia das
habitações, inspeção de empregados domésticos, epidemiologia e
profilaxia das doenças de notificação compulsória, higiene pré-natal,
infantil e mental, imunização preventiva (anti-variolica, anti-typhica,
anti-meningitica e etc), tratamento da sífilis, doenças venéreas,
paludismo e verminoses, exames para diagnóstico da tuberculose,
assistência dentária e consultas de afecções de garganta, nariz e
ouvidos.
Com esse objetivo diligencia esta Secretaria no sentido de adaptar as 2ª,
3ª e 4ª Delegacias (...) em Centros de Saúde.124

Os dois centros que já estavam instalados em 1929 eram o 1º Centro de Sáude,


localizado na Calçada, oriundo da 1ª Delegacia de saúde que funcionava no bairro do
Canela, no distrito de Vitória, e o 2º Centro de Saúde que funcionava no Hospital de
isolamento de Mont’Serrat. Naquele momento, deixou de existir a 5ª Delegacia de
saúde, situada na Rua de Roma.
As Delegacias de Saúde foram importantes apesar do pouco tempo de
existência. Quando foram implantadas, elas ampliaram os serviços das Inspetorias e ao
serem instaladas em diferentes pontos da cidade permitiram um maior acesso da
população necessitada, chegando a lugares distantes onde antes não havia serviços
sanitários.
Em 1931, a lei 7.337 de 27 de março estabeleceu que os serviços de saúde em
Salvador seriam prestados a partir de três Centros Sanitários e cada um deles abrangeria
quatro distritos sanitários. Assim foram extintas as Delegacias de Saúde que ainda
funcionavam.125

124
BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano
de 1929. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1930.
125
BAHIA, Lei 7.337 de 27 de março de 1931. Reorganiza os atuais serviços de saúde pública e modifica
a legislação sanitária em vigor.
64

O HOSPITAL DE ISOLAMENTO DE MONT’SERRAT

O Hospital de Isolamento de Mont’Serrat (HIMS) foi fundado em 1853, em uma


casa afastada do centro da cidade do Salvador, localizada na Ponte de Mont’Serrat. Seu
principal objetivo era cuidar das pessoas que chegavam à capital da Bahia em
embarcações de diversos lugares, infectadas pela febre amarela, embora desde a sua
criação ele tenha também atendido os atingidos por outras doenças epidêmicas que
periodicamente assolavam o estado.126 Dessa maneira, a instituição ficava aberta apenas
alguns meses durante o ano e quando os surtos eram contidos, dispensava os
funcionários e fechava as portas. Com o passar dos anos, o HIMS vivenciou diversas
modificações. Além de reformas físicas para aumentar sua capacidade, mudou também
sua política de atendimento, passando a funcionar o ano inteiro. O objetivo era evitar
que as doenças contaminassem outras pessoas na cidade de Salvador.127 As construções
precárias do século XIX, quando o HIMS foi fundado, não atendiam às necessidades
surgidas no início do século XX.
Christiane Souza aborda essa etapa do Isolamento e as reformas e ampliações
iniciadas, em 1911, pelo então governador João Ferreira de Araújo Pinho (1908-1911).
Além de comprar novos terrenos, o governador contratou a empresa Guinle e Cia para
fazer o serviço. A ideia era construir os novos pavilhões seguindo o modelo pavilhonar
do Pasteur Grancher de Paris. Um dos problemas enfrentados na época foi a oposição
do diretor interino do hospital, o médico Menandro Meireles Filho, que não concordava
que o modelo parisiense fosse transplantado para a capital baiana. Mesmo assim, a obra
foi iniciada mas logo em seguida embargada.
A reforma do HIMS foi retomada no governo de Antônio Ferrão Muniz de
Aragão (1916-1920).128 Esse governador, em mensagem à Assembleia Legislativa no
ano de 1918, informou que naquele ano seriam inaugurados cinco novos pavilhões no
Hospital, além de estarem sendo projetados mais dois, seguindo o modelo do hospital
Pasteur de Paris. Ele aproveitou para fazer referência a algumas mudanças sanitárias

126
SOUZA, Christiane Maria Cruz de. A constituição de uma rede de assistência à saúde na Bahia, Brasil,
voltada para o combate das epidemias. In: Dynamis, Granada, vol. 31, n. 1, p. 85-105, 2011, p. 90.
127
FIGUEIREDO, Maria de Fátima Lorenzo. Hospital Couto Maia: Uma Memória Histórica (1853 –
1936) Dissertação (Mestrado). Programa de Pós-Graduação em Ensino, Filosofia e História das Ciências.
Universidade Federal da Bahia, Universidade Estadual de Feira de Santana, 2010, p 31-55.
128
SOUZA, Christiane Maria Cruz de. A Gripe Espanhola na Bahia: saúde, política e medicina em
tempos de epidemia. p. 67.
65

que estavam ocorrendo na Bahia. A ideia era centralizar as ações relacionadas às


doenças infectocontagiosas. Nessa perspectiva, o desinfectório do Hospital dos Lázaros
deveria ser anexado ao Isolamento.
Durante estas mudanças o Diretor do Hospital era o médico Augusto de Couto
Maia. Couto Maia nasceu em 12 de janeiro de 1876, em Salvador. Formou-se pela
Faculdade de Medicina da Bahia em 14 de dezembro de 1898, apresentando a tese:
Considerações sobre as polyneurites encaradas à luz da moderna concepção de sistema
nervoso. Foi Diretor do Hospital por mais de trinta anos. Fez carreira como professor
da Faculdade de Medicina da Bahia chegando a Vice-Diretor da Faculdade. Fez vários
cursos inclusive na Europa. Foi homenageado em 1936 ocasião em que Hospital de
Isolamento de Monte Serrat passou a ser Hospital Couto Maia. Faleceu em 28 de
setembro de 1944. 129
O governador Muniz de Aragão deixou registrado seu apreço pelo diretor do
hospital, o médico Augusto de Couto Maia e citou as atividades desenvolvidas. Para ele,
a equipe realizava um trabalho de excelência com as instalações antigas. Como as novas
estavam prestes a ser inauguradas, acreditava que o serviço ganharia ainda mais
qualidade.130
Apesar do Hospital de Mont’ Serrat ter sido construído em período anterior, ele
passou a integrar o conjunto de ações propostas pela reforma da saúde iniciada em 1921
e intensificada, em 1925, com a criação da Subsecretaria de Saúde e de Assistência
Pública e do Código Sanitário. Em função dessa reforma, mudanças relacionadas à
saúde pública na Bahia começaram a acontecer e com elas surgiu a preocupação de
melhorar as instalações do Isolamento.
No relatório que detalha as reformas do hospital, o médico Augusto de Couto
Maia, seu diretor, afirmou que o governador José Joaquim Seabra, em seu primeiro
mandato (1912-1916), tinha como Diretor Geral de Saúde Pública o professor Pinto de
Carvalho e nesse período houve uma tentativa de construir os novos pavilhões do HIMS
ao lado do Instituto Oswaldo Cruz, no Canela, para que na região do Mont’Serrat
permanecesse a hospedaria para imigrantes. Foram longas as negociações para

129
FIGUEIREDO, Maria de Fátima Lorenzo. Hospital Couto Maia: Uma Memória Histórica (1853–1936)
Dissertação (Mestrado), Programa de Pós-Graduação em Ensino, Filosofia e História das Ciências.
Universidade Federal da Bahia, Universidade Estadual de Feira de Santana, 2010. p.70– 75.
130
BAHIA, Assembleia Geral Legislativa Mensagem. Antônio Moniz Sodré de Aragão. Salvador, 1918.
66

conseguir o terreno no Canela e após algumas tentativas não foi possível tal mudança.
Com isso, a reforma ficou parada durante o primeiro governo de Seabra.131
Contudo, no relatório referente à reforma do Hospital, Couto Maia falava sobre
o que foi feito durante a gestão de Moniz de Aragão. Segundo o médico, apesar de
inaugurar cinco pavilhões não foi possível utilizá-los para os fins que haviam sido
construídos, pois faltava o básico: água, luz, gás e esgoto. Ele relatou também que
haviam sido encomendados materiais clínicos na França, no ano de 1918, mas em
função da Primeira Guerra Mundial o material foi embargado, chegando apenas, em
1920.132 Couto Maia aproveitou para criticar o governo de José Joaquim Seabra (1920 -
1924). Segundo informou,

durante o governo do ExeºSnrº D. J. J. Seabra, de 1920 a 1924 nenhuma


modificação sofreram os pavilhões, a não ser a ruína de um deles, a pequena
fenda nas paredes de outro, a queda da muralha de arrimo e a deterioração
133
dos demais.

Ele elogiou a postura do governador Francisco Marques de Góes Calmon (1924-


1928) que logo após assumir o executivo baiano fez visitas ao Isolamento, ficando
perplexo com tamanho descaso. Góes Calmon autorizou então que fosse iniciada mais
uma reforma que resultou na inauguração de várias instalações. Ainda assim alguns
melhoramentos ficaram por fazer.
Em 1925, o hospital foi entregue à sociedade com várias benfeitorias e isso
ocorreu no período em que a Bahia criava novos mecanismos para melhorar a saúde
pública.134 A partir desse momento, o hospital além de ter novos pavilhões inaugurados,
fez parte do conjunto de instituições que compuseram o novo serviço de saúde pública
da Bahia.135
Seguem algumas imagens dos novos pavilhões e instalações do HIMS após a
reforma. Mudanças foram feitas e um novo mobiliário foi comprado, resultando numa
melhor estrutura para atender os pacientes que chegavam ao hospital. A Figura 4 mostra

131
APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Monte Serrat. Sobre os novos pavilhões. APEB.
Caixa 4072, maço 97, 1925.
132
APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Monte Serrat. Sobre os novos pavilhões. APEB.
Caixa 4072, maço 97, ano 1925.
133
APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Monte Serrat. Sobre os novos pavilhões. APEB.
Caixa 4072, maço 97, ano 1925.
134
APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Monte Serrat. Sobre os novos pavilhões. APEB.
Caixa 4072, maço 97, ano 1925.
135
BATISTA, Ricardo dos Santos. Sífilis e Reforma na Bahia (1920 – 1945). Salvador: Eduneb, 2017. p.
85.
67

o pavilhão da administração e a figura 5 a enfermaria para variolosos reformada e com


novo mobiliário.

Figura 4 – Pavilhão de Administração

Fonte: APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Monte Serrat. Sobre os novos pavilhões. 1925.

Figura 5 – Enfermaria para Variolosos

Fonte: APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Monte Serrat. Sobre os novos pavilhões.1925.

As imagens acima, presentes no relatório elaborado por Couto Maia mostram o


HIMS no período em que foi reinaugurado. Podemos perceber que foram utilizadas para
68

valorizar as reformas realizadas. São fotografias que registram a instituição de maneira


limpa e organizada. “Uma fotografia preserva um momento no tempo e impede que ele
seja apagado pela sucessão de momentos seguintes”136. Não foram encontrados registros
fotográficos na medida em ele foi sendo utilizado. Logo, não podemos acompanhar essa
sucessão de momentos, ficando apenas guardadas as imagens da sua inauguração.
Couto Maia, além de apresentar os novos pavilhões do hospital, datados de
1925, denunciou os problemas que vivenciou cotidianamente, ano após ano, à frente
daquele hospital, criticando, portanto, a gestão de J. J. Seabra.
Esse momento foi noticiado pela Imprensa da época. Em 02 de agosto de 1925,
o Diário da Bahia divulgou na primeira página a reinauguração do pavilhão dos
variolosos, como mostra a figura 6.
Figura 6 – Será entregue amanhã à S. P. B. O novo hospital de variolosos

Fonte: Diário da Bahia, 02 ago. 1925. p. 01.

136
BERGUER, John. Para entender uma fotografia. Organização, introdução e notas Geoff Dyer;
tradução Paulo Geier. – 1ª Ed – São Paulo; Companhia das Letras, 2017, p. 90.
69

Entretanto, é necessário ressaltar que a reinauguração aconteceu com pouco


tempo de governo de Góes Calmon, o que não possibilitou a realização de tantas
modificações. Assim, parece válido pensar que muitos governadores investiram no
hospital, apesar da lentidão das reformas. A década de 1920 foi um período de grande
disputa política na Bahia. De um lado estavam os apoiadores de J. J. Seabra e do outro
os defensores de Francisco Marques de Góes Calmon. Essa disputa político-ideológica
pode ser percebida nos discursos das fontes. Ricardo Batista ressalta que, apesar de
muitas ações terem sido desenvolvidas no Governo Góes Calmon, o acordo entre a
União e o governo do estado, para o desenvolvimento de atividades sanitárias na Bahia,
ocorreu pelas mãos de Seabra.137
Embora o Hospital tenha sido reinaugurado em 1925, no Governador Góes
Calmon, ele continuou necessitando de benfeitorias. Em 1930, outra reforma foi
interrompida138 devido à Revolução de 1930.139
Barros Barreto em relatório de 1926 elencou vinte e dois pontos relacionados às
melhorias que deveriam ser feitas no HIMS. Segundo ele, o Hospital ainda necessitava
de:
1º- Fechamento do terreno com cerca de arame em quatro e bons
moirões;
2º - Preparo do parque e acabamento do jardim;
3º - Canalização da água para o parque e para o jardim;
4º - Melhorar as condições do fogão, vedando convenientemente os seus
interstícios;
5º - Instalação de uma terceira fase para melhorar a iluminação;
6º - Instalação de um aparelho de gás para poderem ser utilizados os
aquecedores dos banheiros e os aparelhos dos Laboratórios;
7º - Modificação do elevador;
8º - Terminação do tanque da rua da Imperatriz, sua ligação ao pequeno
e instalação de outra bomba;
9º - Colocação de um flutuador com campa e alarme no tanque da torre;

137
BATISTA, Ricardo dos Santos. Sífilis e Reforma na Bahia (1920 – 1945), p. 30.
138
APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Monte Serrat. Sobre os novos pavilhões. APEB.
Caixa 4072, maço 97, ano 1925.
139
A Chamada revolução de 1930 foi um movimento que segundo Boris Fausto aconteceu por conta de
disputa entre as oligarquias brasileiras com a presença de movimentos militares. O objetivo era pôr fim à
hegemonia oligárquica cafeeira. Segundo Paulo Santos Silva, a Bahia recebeu o movimento liderado por
Getúlio Vargas com um “Mal-estar”. O estado estava vivendo um momento de estabilidade política e com
a chamada revolução muitos representantes políticos da elite foram retirados do poder. Após algumas
mudanças, Juracy Magalhães, um jovem tenente e cearense, foi colocado no cargo de interventor o que
não agradou os baianos. Ainda assim, ele permaneceu como chefe do governo chegando a ser eleito nas
eleições realizadas em 1933 e 1934. Um dos motivos que o levaram a permanecer no poder foi a sua
aproximação com os coronéis baianos. FAUSTO, Boris. A Revolução de 1930 – História e historiografia.
16ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1997; SILVA, Paulo Santos. Âncoras de tradição: luta política,
intelectuais e construção do discurso histórico da Bahia (1930 – 1949) Salvador: EDUFBA, 2011.
70

10º - Ampliação da rede de esgoto;


11º - Conclusão das lavanderias de cima e do pavilhão para variolosos,
instalando nelas aparelhos de Genest, as caldeiras, o aparelho para
lavar, o parelho para passar roupa e o fogão;
12º - Construção de um pequeno forno para incineração do lixo, com
chaminé, abertura de entrada superior e passadiço;
13º - Construção de um pequeno bioteiro; canil, coelheira, pombal e
depósito com água, esgoto e iluminação;
14º - Construção de um galpão para três veículos e uma carroça, com
água, esgoto e iluminação;
15º - Construção de uma baia para seis animais, com água, esgoto e
iluminação;
16º - Construção de um galinheiro, parte cimentado, com água, esgoto e
iluminação;
17º - Colocação dos telefones nos pavilhões que ainda não possuem;
18º - Construção de uma estequeira, com oito divisões, tubo de
ventilação e esgoto;
19º - Preparo de uma planta geral do parque e dos edifícios com os
respectivos detalhes;
20º - Planta da canalização de água, esgoto, gás, água da chuva,
corrente elétrica, nas paredes dos edifícios e fora;
21º - Adaptação e reparo geral do pavilhão do alto, de acordo com a
planta apresentada ano passado;
22º - Assentamento da linha de Bondes da Boa Viagem até os diferentes
pavilhões. 140

Nesse documento, o Secretário solicitou desde coisas mais simples, como o


fechamento de terrenos com cerca de arame e a preparação dos jardins, a questões mais
complexas como a conclusão das lavanderias e do pavilhão de variolosos, a reparação
de aparelhos específicos, além de água, esgoto e iluminação. Barros Barreto pediu para
ter acesso às plantas do HIMS, pois elas poderiam ajudar a entender melhor sua
estrutura e refletir sobre o que ainda faltava ser realizado. O acesso dos enfermos e
funcionários ao hospital também era uma preocupação que apareceu no documento,
visto que foi solicitada uma linha de Bonde especifica que ligasse a Boa Viagem aos
pavilhões do hospital.
A 5ª Delegacia de Saúde, que atendia uma parcela pobre da população de
Salvador, tinha o Mont’Serrat como referência para o encaminhamento dos doentes que
não podiam ser tratados em casa. O problema era que essas pessoas viviam em casebres
insalubres, sem as condições básicas de habitação, o que inviabilizava a possibilidade de

140
BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano
de 1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927.
71

tratamento na residência e aumentava o número daqueles que seriam levados para o


isolamento.
Em um dos relatórios médicos do Hospital, os profissionais falaram sobre
algumas doenças e sua incidência em regiões pobres e populosas. Estava ocorrendo, por
exemplo, um número grande de pessoas infectadas pela Meningite Cérebro-espinhal
epidêmica. Os médicos diziam que a maioria dos doentes vinha de São João de
Plataforma (distrito suburbano de Pirajá), onde surgiram os primeiros casos e onde,
naquele momento concentrava-se o foco da moléstia. Segundo eles, foi possível conter
os surtos através das ações tomadas pela Saúde Pública.141
Os discursos veiculados principalmente nos relatórios feitos para serem
encaminhados ao Secretário de Saúde e Assistência Pública, apesar de relatarem
diversos problemas, em sua maioria estavam cheios de entusiasmos por parte dos
médicos que os redigiam. Esse entusiasmo era por conta de algumas ações feitas pela
Secretaria de Saúde e Assistência Pública que começavam a atingir seus objetivos. No
relatório que apresenta o movimento do HIMS do ano de 1928, o médico José Pinto
Soares Filho afirmou que a peste pubônica, uma das doenças que assolavam a
população, estava desaparecendo dos boletins sanitários:

Felizmente, graças a intensificação da vacina, a aplicação de outras


medidas sanitárias pela Secretaria de Saúde e Assistência Pública do
Estado pode essa terrível moléstia ser impedida em sua assustadora
142
marcha, voltando a ficar ausente de nosso boletim sanitário.

A análise de relatórios médicos do HIMS e de relatórios do Secretário de Saúde


e Assistência Pública indica alguns avanços relacionados à quantidade de pessoas
atendidas e também o tipo de moléstia que chegava ao posto de observação do Hospital.
Nesse local, amostras de sangue eram colhidas e os exames laboratoriais do doente eram
encaminhados ao Instituto Oswaldo Cruz – IOC/BA. Esta instituição enviava o
resultado o mais rápido possível. Caso a suspeita da moléstia fosse confirmada, o doente
era levado para o pavilhão a ela destinado.143
O quadro abaixo foi construído a partir dos relatórios do Hospital de Isolamento,
relativos aos anos de 1924, 1928 e 1929 e dos relatórios da Secretaria de Saúde

141
APEB. Relatório das principais ocorrências no Hospital de Isolamento de Mont’ Serrat. Caixa 4026,
maço 14, ano 1927-1929.
142
APEB. Relatório das principais ocorrências no Hospital de Isolamento de Mont’ Serrat. Caixa 4026,
maço 14, ano 1927-1929.
143
APEB. Relatório das principais ocorrências no Hospital de Isolamento de Mont’ Serrat. Caixa 4026,
maço 14, ano 1927-1929.
72

Assistência Pública, dos anos de 1927. Ele apresenta o número de pacientes que deram
entrada no posto de observação do hospital, nos anos de 1923, 1926, 1927 e 1928, numa
tentativa de perceber até que ponto a inauguração dos pavilhões, a promulgação do
Código Sanitário e a criação das Delegacias de Saúde (as três datadas de 1925)
influenciaram o atendimento do hospital.
DOENÇA 1923 1926 1927 1928 1929
Beriberi 5 3 - - -
Cirrose 1 - - -
Coqueluche - 1 - - -
Dengue 88 - - -
Diarrhéa Infantil - - - -
Dipheteria - 13 4 2 3
Disenteria 6 40 26 1 13
Escarlatina - - 1 -
Febre Amarela 12 19 1 2 5
Febre eruptiva - 1 1 - -
Febre Typhica 1 68 - 20 25
Gripe 1 2 4 - 13
Lepra - - - - 1
MenigiteCerebro-espinhalepidemica - 11 12 44
Meningite por infecção indeterminada - 1 1 - -
Molestia indeterminada - - 141 -
Moléstia venérea - 1 - - -
Paludismo 2 1 1 - -
Parotidite - 1 - -
Peste 7 4 4 40 -
Pneumonia - - - 2
Pneumonia Pestosa - - - - 4
Portadores de Germe (meningocoe) - - - - 10
Raiva - - - - 1
Sarampo 7 42 - - 31
Tétano - 1 - 3 4
Tipho - 18 - 3
Tuberculose Pulmonar - 1 - - 1
Varicella 5 9 47 - 12
Varíola 5 148 10 - 5
TOTAL 140 355 132 223 180
Quadro 9 – Dados de pacientes que deram entrada no Posto de Observação do HIMS
Fonte: APEB. Relatório das principais ocorrências no Hospital de Isolamento de Mont’ Serrat. Caixa
4026, maço 14, ano 1927-1929. APEB. Relatório das ocorrências do Hospital de Isolamento de Mont’
Serrat. APEB. Caixa 4072, maço 97, ano 1924. BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da
Secretaria de Saúde e Assistência Pública: anno de 1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927.
BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: anno
de 1927. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1928. BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório
da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: anno de 1928. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1929.
BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: anno
de 1929. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1930.
73

Ao analisar os números acima, algumas informações nos chamam a atenção. A


primeira é que quatorze das vinte e duas moléstias que aparecem tiveram diminuição à
medida que os anos foram passando. São elas: beriberi, cirrose, dengue, diarréia infantil,
escarlatina, febre Amarela, febre eruptiva, meningite por infecção indeterminada,
paludismo, parotidite, pneumonia, sarampo, tétano e a typho. Algumas inclusive
chegaram a desaparecer dos boletins médicos do HIMS. Ou seja, uma redução de
dezoito moléstias ao longo dos anos analisados. A redução da febre amarela contou a
intervenção da Fundação Rockfeller. Adriano Arruda Pontes refere que a primeira
missão Rockfeller chegou à Bahia, em 1919. Como resultado dessa visita, foi assinado
em 1920 um contrato com o governo do estado da Bahia para o combate da
ancilostomose. A partir de 1923, as campanhas contra a febre amarela passaram a ser
organizadas pela Fundação, quando foi criada a Comissão de Febre Amarela.144
Quatro doenças aumentaram ao longo desses anos: dipheteria, febre typhica,
peste e tétano. Muitos fatores podem justificar a diminuição ou o aumento das
moléstias. No que diz respeito à peste, o crescimento significativo dos casos, em 1928,
que passaram de 4 em 1927 a 40 ano seguinte, por exemplo, ocorreu em função da
epidemia que atingiu a cidade do Salvador mais uma vez nesse ano.145 Foram
imunizadas 964 (novecentos e sessenta e quatro) pessoas através das Delegacias de
Saúde. Os jornais diziam que a cidade estava sendo assolada pela doença. Durante todos
os meses do ano, notas sobre ela apareciam quase sempre na primeira página. Para os
articulistas, a culpa estava no trabalho do Secretário da Saúde Pública Barros Barreto.
Os títulos das matérias eram construídos para chamar a atenção do leitor, como por
exemplo “A ronda fatal e macabra da Bubônica”146 ou ainda “Enquanto a Bubônica
dizima”147. Como já foi dito no parte 1 desta dissertação, os jornais tinham
posicionamentos políticos partidários e as matérias eram escritas numa tentativa de
enaltecer um grupo político em detrimento do outro, mas, no quadro 09, o ano em que a
peste bubônica mais aparece é exatamente em 1928, com 40 casos. Em 1929, a doença
desaparece dos Boletins médicos.

144
PONTES, Adriano Arruda. Caçando Mosquitos na Bahia: a Rockefeller e o combate à febre amarela:
inserção, ação e reação popular (1918 – 1940). Mestrado em História. Salvador, UFBA, 2007, p. 60-92.
145
CHAVES, Cleide de Lima; AMORIM, Tatiane Pereira. A peste bubônica nos sertões da Bahia:
política e cotidiano no raiar do século XX. In: SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da; BATISTA, Ricardo
dos Santos (organizadores). História e Saúde: políticas, assistência, doenças e instituições. Salvador:
EDUNEB, 2018 (no prelo).
146
“A ronda fatal e macabra da Bubônica”. Diário da Bahia, Salvador, 18 fev. 1928, p.1.
147
“Enquanto a Bubônica dizima”. Diário da Bahia, Salvador, 01 mar. 1928, p.1.
74

Ainda sobre o quadro 09, se tomarmos a varíola como exemplo, em 1923 houve
cinco casos e nos anos seguintes dez cada um. Em 1928 ela desapareceu dos boletins,
voltando, em 1929, com 5 casos. Segundo o diretor do Hospital, esse desaparecimento
se deu por causa do trabalho feito pela Secretaria de Saúde e Assistência Pública. 148 Ao
verificar os números de vacinação, é possível perceber que houve um aumento ao longo
dos anos. Em 1925, foram vacinados contra a varíola 1.924 (um mil novecentos e vinte
e quatro) pessoas em Salvador.149 Dois anos depois, esse número saltou para 258.166
(duzentos e cinquenta e oito mil e cento e sessenta e seis) pessoas vacinadas contra a
varíola.150 As vacinações eram feitas em conjunto. As vacinas eram aplicadas por vários
órgãos e isso permitiu a melhora do atendimento sanitário de Salvador. Muitas
campanhas também foram feitas numa tentativa de chamar a atenção da população para
a importância da vacina, como mostra a imagem abaixo:

Figura 7 – Vacinai-vos e aos vossos filhos, enquanto é tempo

Fonte: Diário de Notícias, 6 ago. 1928. p 01

O trabalho das Delegacias de saúde pode ter contribuído para diminuir o fluxo
de doentes nos hospitais da capital. Os funcionários das Delegacias tinham como

148
APEB. Relatório das principais ocorrências no Hospital de Isolamento de Mont’ Serrat. Caixa 4026,
maço 14, ano 1927-1929.
149
BAHIA. Diário Oficial do Estado da Bahia, sábado, 1 de agosto de 1925. Arquivo Público do Estado
da Bahia. Salvador, 1925.
150
BAHIA. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública. Arquivo Público Municipal.
Salvador, 1928.
75

obrigação observar doentes em seus domicílios. Em muitos casos, esses pacientes eram
tratados em casa sem que houvesse necessidade de internamento hospitalar. Em 1926,
3.168 (três mil cento e sessenta e oito) pessoas foram observadas em casa pelos
funcionários das cinco delegacias.151 No ano seguinte, esse número chegou a 15.708
(quinze mil setecentos e oito) pacientes observados pelos funcionários das cinco
delegacias.152 Percebemos que na medida em que os anos foram passando, houve uma
tentativa de investimento na melhoria dos serviços de saúde da capital, embora tenham
sido insuficiente para dar conta dos problemas sanitários e de saúde da população.
Cabe destacar a ligação entre o Hospital de Isolamento de Mont’Serrat, as
Delegacias de Saúde e o Instituto Oswaldo Cruz (IOC-BA). O Hospital recebia doentes
notificados pelas Delegacias e o IOC era responsável por fazer exames de materiais
coletados nos pacientes das Delegacias, do Isolamento e de outras unidades
hospitalares. O IOC-BA incumbia-se também da distribuição das vacinas que os
Inspetores Vacinadores aplicavam na população.

E A POPULAÇÃO? QUEM UTILIZAVA ESSES SERVIÇOS DE SAÚDE NA


DÉCADA DE 1920?

Os relatórios de Barros Barreto apresentam informações sobre esses serviços. O


quadro 10 permite observar o trabalho feito pelas Delegacias de Saúde, principalmente
no que diz respeito à “polícia Sanitária”, nos anos de 1926, 1927, 1928 e 1929. Dentre
os trabalhos realizados, escolhemos as visitas feitas em residências e em edifícios que
abrigavam estabelecimentos comerciais. Além disso, serão apresentados os números das
notificações por moléstias infectocontagiosas e a quantidade de enfermos que foram
observados em suas residências.

151
BAHIA. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública. Arquivo Público Municipal.
Salvador, 1927.
152
BAHIA. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública. Arquivo Público Municipal.
Salvador, 1928.
76

ANO Visitas a residências Notificação de Enfermos observados


DELEGACIA e edifícios moléstias contagiosas em casa
1ª 4.926 143 300
2ª 5.061 121 5.886
3ª 1926 4.637 88 2.099
4ª 4.891 324 921
5ª 5.037 126 4.846
TOTAL 24.552 802 14.052
DELEGACIA ANO Visitas a residências Notificação de Enfermos observados
e edifícios moléstias contagiosas em casa
1ª 2.476 240 109
2ª 2.472 199 1.202
3ª 1927 3.436 529 946
4ª 5.228 204 293
5ª 4.064 207 618
TOTAL 17.376 1.376 3.376
DELEGACIA ANO Visitas a residências Notificação de Enfermos observados
e edifícios moléstias contagiosas em casa
1ª 6.910 493 585
2ª 3.093 213 1.685
3ª 1928 8.491 435 6.217
4ª 2.352 271 4.330
5ª 4.410 27 6.891
TOTAL 25.259 1.139 15.708
DELEGACIA ANO Visitas a residências Notificação de Enfermos observados
e edifícios moléstias contagiosas em casa
1ª 4.870 65 1.125
2ª 3.001 189 963
3ª 1929 4.703 98 432
4ª 3.841 231 825
5ª 4.819 83 632
TOTAL 21.234 657 3.987
Quadro 10 –Atendimento das cinco Delegacias de Saúde em 1926, 1927, 1928 e 1929 construídos a
partir dos relatórios.
Fonte: BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública:
anno de 1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927. BARRETO, A. L. C. A. de Barros. Relatório da
Secretaria de Saúde e Assistência Pública: anno de 1927. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1928.
BARRETO, A. L. C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: anno de 1928.
Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1929. BARRETO, A. L. C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de
Saúde e Assistência Pública: anno de 1929. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1930.

Na década de 1920, Salvador possuía 283.492 (duzentos e oitenta e três mil,


quatrocentos e noventa e dois) habitantes.153 Comparando a população total com a que
foi atendida nas Delegacias, pode parecer que o número era pequeno. No entanto, o
atendimento mais próximo da população era algo novo e começava a se diversificar,
como vimos ao longo deste capítulo.
Durante os anos de 1926, 1927, 1928 e 1929, o número de enfermos observados
em casa foi 37.123 (trinta e sete mil, cento e vinte e três). O fato das pessoas estarem
sendo tratadas na residência contribuía para a diminuição do atendimento nos hospitais.

153
IBGE. Recenseamento demográfico 1920.
77

Com isso só chegavam às instituições hospitalares os doentes que não podiam


permanecer em tratamento domiciliar e em alguns casos os que ofereciam riscos às
pessoas que estavam ao seu redor.
Além do número de atendidos, os relatórios de Barros Barreto apresentam as
ocupações dos enfermos que chegaram ao HIMS de 1926 a 1929, encaminhados
principalmente pelos Inspetores das Delegacias, como pode ser visto no quadro 11.

Anos Total de
Ocupação Doenças
1926 1927 1928 1929
Alfaiate - - 2 1 3
Aprendizes de Marinheiro - 20 - 7 27
Agricultores - - 2 5 7
Artista - 1 - - 1
Bacharel 1 - - - 1
Bombeiro 1 - - - 1
Calafate - - - 1 1
Carregador 5 2 11 3 21
Carroceiro - - 2 2 4
Carteiro 1 - - - 1
Charuteiro - - 1 - 1
Chouffeur 1 - 2 - 3
Cocheiro 3 - - - 3
Colegiais - 2 6 6 14
Comerciantes - - 9 - 9
Comercio (empregado) 24 8 17 8 57
Condutor - - 1 - 1
Condutor de Bond/Motoreiro - - 1 2 3
Copeiro - - 4 5 9
Costureira 1 - 2 1 4
Cozinheiro - - 5 5 10
Empregado de Estábulo - - 1 - 1
Enfermeiro - - 1 3 4
Engenheiro - - 1 - 1
Engomadeira - - 1 - 1
Estivador - - 2 - 2
Estudante 4 1 2 9 16
Ferreiro - - - 1 1
Ferroviário - 8 - - 8
Foguista 5 - - 3 8
Funcionário das Docas - - - 1 1
Funcionário Federal - 1 - 1
Funcionário Público - - 1 4 5
Garimpeiro 2 7 6 11 26
Guarda Noturno 1 - - - 1
Guarda Sanitários - - 1 - 1
Hoteleiro - - - 1 1
Jardineiro 2 - 1 - 3
Lavadeira - - 2 - 2
Lavrador - 7 - 6 13
Maquinista - - 1 1 2
Marceneiro - - 2 - 2
Marinheiro 5 - - 2 7
Marítimo - 4 - 5 9
Mecânico 2 - - - 2
Médico 1 - 1 - 2
Militar 115 9 12 2 138
Motorista - 1 - - 1
Negociante - - - 7 7
78

Operários 34 15 1 8 58
Polidor - - - 1 1
Quitandeira - - 1 - 1
Roceiro 13 - 7 - 20
Servente 5 - 5 5 12
Serviço Doméstico 80 26 16 22 144
Taifeiro 3 - - 3
Vendedor Ambulante - - 3 - 3
Ignorada/Ignorada/Sem profissão 45 11 55 34 145
Total 355 132 190 180 857154
Quadro 11 – Dados das profissões dos pacientes atendidos no Hospital de Isolamento de
Mont’Serrat nos anos 1926, 1927, 1928 e 1929 construídos a partir dos relatórios.
Fonte: BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência
Pública: ano de 1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927. BARRETO, Antônio Luis C. A. de
Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano de 1927. Bahia, Imprensa Oficial do
Estado, 1928. BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência
Pública: ano de 1928. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1929. BARRETO, Antônio Luis C. A. de
Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano de 1929. Bahia, Imprensa Oficial do
Estado, 1930.

Algumas ocupações apareceram todos os anos. Chamamos a atenção para os


trabalhadores do comércio, com 57 enfermos, os operários, com 68, os carregadores,
com 21, e os garimpeiros, com 26. As profissões citadas exigiam muito do trabalhador.
Elas eram exercidas por pessoas mal remuneradas e que em consequência disso se
alimentavam mal. Os operários trabalhavam em diversos ramos de produção, sujeitos a
longas jornadas de trabalho em locais mal iluminados e pouco ventilados.155
Os estabelecimentos comerciais de Salvador eram insalubres. Mario Augusto da
Silva Santos chamou a atenção para as condições de trabalho desse setor, embora ele
fosse diversificado, compreendendo desde aqueles voltados para o grande comércio de
importação e exportação, aos de pequeno e médio porte. Os trabalhadores do comércio,
muitas vezes executavam várias funções ao mesmo tempo, “de domingo a domingo” e
dormiam no trabalho.156
Os Jornais noticiavam os problemas existentes. Foi o que aconteceu no “Café
Suíço”, em 1928, ano em que Salvador foi atingida pela epidemia de peste bubônica. O
estabelecimento foi interditado quando um funcionário passou mal e veio a óbito. Todo

154
Observamos uma diferença no número total de pessoas atendidas a cada ano no Hospital de
Isolamento. De acordo com a fonte, no ano de 1925, 355 pessoas foram atendidas. Em 1927, esse número
caiu para 123. Em 1928, houve 190 atendimentos e em 1928, 180 enfermos passaram pelo Hospital.
Porém, quando fizemos essa soma manualmente os números ficam diferentes. Em 1926 foram 354, em
1927 132, em 1928 são 223 e em 1929 aparecem 144 casos.
155
CASTELLUCCI. Industriais e operários numa conjuntura de crise (1914-1921), 2004.
156
SANTOS, Mario Augusto da Silva. Casa e balcão: os caixeiros de Salvador (1890-1930). Salvador:
EDUFBA, 2009, p. 33, 40-41.
79

o prédio e mais um local vizinho foram interditados para que fosse feita a desinfecção.
O edifício estava localizado na Praça Castro Alves, centro comercial da cidade.157
Nove dias antes, o mesmo jornal divulgou que um servente da Associação
Comercial da Bahia, faleceu no local de trabalho, vitimado pela peste, sendo retirado do
local às escondidas. Segundo a matéria, a notícia se alastrou e o “Juiz do comércio
suspendeu suas audiências no edifício suspeito”, como podemos ver na chamada da
matéria, figura 8.158

Figura 8 – “Além de tudo, escamoteiador de cadáveres”.

Fonte: Diário da Bahia, 14 fev. 1928, p 01

Há também no quadro 11, referência a 144 pessoas que exerciam serviços


domésticos. Essa informação deve ser tomada com reserva pois não quer dizer que eram
empregados domésticos. A referência a serviços domésticos ocorria também para as
mulheres que não trabalhavam fora de casa.
Os militares aparecem todos os anos no quadro analisado, com um número de
138 enfermos no total. Porém, vale ressaltar que só em 1926 o Hospital recebeu 115
militares necessitando de atendimento, representando 83% do total. Segundo Barros
Barreto, esses homens faziam parte do grupo de militares que estavam em:

... perseguição aos bandos rebeldes de Prestes e Miguel Costa deve ser
atribuído ao aparecimento de casos de varíola e de doentes de
symptomatelogia semelhante a febre amarela. A quase totalidade desses
enfermos provém de municípios baiano, região onde transitaram para
mais de 12.000 soldados legalistas, procedentes do Norte e Sul do país.
159

157
“A Bubônica”. Diário da Bahia, Salvador, 23 fev. 1928, p.1.
158
“Além de tudo, escamoteiador de cadáveres” Diário da Bahia, Salvador, 14 fev. 1928, p.1
159
BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública:
ano de 1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927.
80

A partir dessas informações, percebemos que a população pobre foi a que mais
os utilizou. Poucas pessoas com profissões que se pode considerar das classes média ou
alta aparecem no quadro 11. Entre elas encontram-se um bacharel, dois médicos, sete
negociantes e nove comerciantes. Podemos supor que aquelas que tinham melhores
condições econômicas preferiram se tratar em casa com o auxílio de médicos
particulares. A maioria dessas doenças era contagiosa podendo atingir também os mais
ricos, ainda que os pobres vivessem em situações bem mais vulneráveis.
Os dados do quadro 12 nos permitem observar de onde vinham esses enfermos.
A maioria era encaminhada pelas Delegacias de Saúde. Dez deles se apresentaram
diretamente na porta do Hospital, além dos 46 que vieram do interior do estado da
Bahia. Houve também 22 doentes que vieram de Alagoas.

Distritos Centrais 1926 1927 1928 1929 Total de pacientes


por Distrito
Conceição da Praia 8 20 24 12 64
Nazaré 24 18 14 18 74
Paço - 2 10 2 14
Pilar 2 3 7 8 20
Santana 7 5 7 15 34
São Pedro 32 2 27 13 74
Sé 18 7 8 19 52
Distritos Periféricos
Brotas 74 2 8 2 86
Mares 31 6 13 6 56
Penha 30 23 6 14 56
Pirajá 11 7 16 29 63
Santo Antônio 43 12 9 - 64
Vitória 20 17 10 5 52
Outras localidades
Apresentaram-se à porta do HIMS 5 - 2 3 10
Transportaram-se de bordo 15 6 5 21 47
Transportaram-se do Interior 35 2 4 5 46
Do Estado de Alagoas - - 20 2 22
Total de pacientes por ano 355 132 190 174 694
Quadro 12 – Quantidade de pacientes atendidos no Hospital de Isolamento de Mont’Serrat nos
anos 1926, 1927, 1928 e 1929 por Distritos construídos a partir dos relatórios.

Fonte: BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência


Pública: ano de 1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927. BARRETO, Antônio Luis C. A. de
Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano de 1927. Bahia, Imprensa Oficial do
Estado, 1928. BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência
Pública: ano de 1928. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1929. BARRETO, Antônio Luis C. A. de
Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano de 1929. Bahia, Imprensa Oficial do
Estado, 1930.
81

Apesar do quadro 12 apresentar o Distrito do Pilar como o que levou menos


enfermos ao HIMS, a imprensa questionava o trabalho feito por lá. Segundo o Diário da
Bahia de 03 de fevereiro de 1928, o Pilar estava se tornando o “novo setor de operações
da Peste”, como mostra figura abaixo:

Figura 9 – “A Bubonica em ronda sinistra pela cidade”.

Fonte: Diário da Bahia. 30 fev..1928. p 01

O quadro 12 mostra que no ano de 1928 apenas seis pacientes residentes no


Distrito da Penha foram encaminhados ao HIMS. Um deles foi relatado em matéria do
Diário da Bahia em 28 de março de 1928. De acordo com as informações contidas no
texto, tratava-se da professora Elisabeth Bitencourt, que havia sido infectada pela peste
e encaminhada para o Hospital. Na mesma matéria, eles diziam que outros tinham
contraído a doença e questionava o trabalho do Secretário da Saúde Pública, Barros
Barreto, que naquele momento já estava sendo chamado de “Urubú Princez”. 160
Em matéria do dia 17 de outubro de 1928, o Diário da Bahia relatou que em
alguns locais da cidade havia um grande número de pessoas sendo infectadas toda
semana pela Peste. Segundo o texto, isso acontecia por conta da falta de higiene desses
locais e porque a Saúde Pública não estava cumprindo o papel de fiscalizar e higienizar
a cidade. Na matéria, algumas ruas foram citadas, entre elas a Ladeira da Preguiça, a
Rua do Sodré e a Rua do Cabeça, todas situadas no centro de Salvador, local que tinha
problemas de higiene e de moradia. O jornalista enfatizava que era o bairro comercial o
que mais necessitava de cuidados.161

160
“Já é caso de Intervenção”. Diário da Bahia, Salvador, 28 mar. 1928, p.1.
161
“Prenúncios alarmantes e inquietadores”. Diário da Bahia, Salvador, 17 out. 1928 , p.1.
82

Em relação ao sexo e à cor das pessoas atendidas nesse mesmo período, o


quadro 13 mostra os números.

Sexo 1926 1927 1928 1929


Homens 264 101 138 127
Mulheres 91 31 52 53
Cor/Raça
Brancos 88 32 73 75
Mestiços 194 71 88 73
Negros 75 29 29 32
Nacionalidade
Brasileira 342 128 174 150
Estrangeira 13 4 16 21

Quadro 13 – Quantidade de pacientes atendidos no Hospital de Isolamento de Mont’Serrat nos


anos 1926, 1927, 1928 e 1929 separados por sexo e cor/raça construídos a partir dos relatórios.

Fonte: BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência


Pública: ano de 1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927. BARRETO, Antônio Luis C. A. de
Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano de 1927. Bahia, Imprensa Oficial do
Estado, 1928. BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência
Pública: ano de 1928. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1929. BARRETO, Antônio Luis C. A. de
Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano de 1929. Bahia, Imprensa Oficial do
Estado, 1930.

Percebemos que a maioria dos pacientes do Hospital era do sexo masculino. Não
acreditamos que as mulheres adoeciam menos do que os homens, mas o acesso a
cuidados e consultas poderia ser mais difícil. De acordo com os quadros 6 e 7, o
atendimento médico de Salvador era feito principalmente por homens. Apesar de
existirem as enfermeiras sanitárias, os médicos estavam presentes nos principais locais
do serviço sanitário. Nos hospitais, postos, inspetorias, eram eles que compunham os
principais cargos do Serviço Sanitário de Salvador e eram eles que examinavam os
pacientes que chegavam às unidades. Talvez isso tenha sido um fator que dificultou que
as mulheres procurassem atendimento nos órgãos de saúde.
Ricardo Batista, ao analisar o atendimento sanitário na década de 1920 e a sífilis,
aborda a diferença entre homens e mulheres. Para ele, as mulheres das elites eram
atendidas em casa por médicos particulares e as mulheres pobres principalmente tinham
dificuldades em frequentar os órgãos de saúde e quando iam preferiam ser atendidas por
enfermeiras. Ele sinaliza a importância das enfermeiras no tratamento da sífilis:
83

As dificuldades na profilaxia e tratamento da sífilis em mulheres nos postos


sanitários ocorriam pela escassez de enfermeiras. Receber cuidados por doença
venérea era considerado um risco, quando o executor dos curativos era um
homem. Temia-se a possibilidade de uma liberdade masculina, sobre o corpo
masculino, como o estabelecimento de um grau de intimidade considerado
imoral, e que poderia macular a reputação feminina. (...).162

Cabe ressaltar que havia também uma perspectiva de classe, pois os homens e as
mulheres dos setores economicamente privilegiados eram atendidos em casa por seus
médicos particulares.
Em relação à cor, os negros e mestiços eram maioria. As pessoas atendidas
nesses serviços eram pobres e moravam em residências precárias, daí terem maior
probabilidade de adoecer.
De acordo com as informações dos quadros 11 e 13 podemos dizer que as
pessoas que utilizavam os serviços públicos de saúde em Salvador na década de
1920 eram, em sua maioria, homens negros e mestiços, brasileiros que
conquistavam seu sustento através de trabalhos pesados, realizados em locais
insalubres, ficando assim expostos às doenças.

162
BATISTA, Ricardo dos Santos. Sífilis e as relações de gênero na Bahia.. In FRANCO, Sebastião
Pimentel, NASCIMENTO, Dilene Raimundo, SILVEIRA, Anny Jackeline Torres (orgs) Uma História
brasileira das doenças. 1ed. Belo Horizonte – MG. Fino Traço. 2017, p. 124.
84

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Procuramos nesta dissertação observar o papel das Delegacias de Saúde e


do Hospital de isolamento de Monte Serrat, no processo de constituição da reforma
sanitária da década de 1920, na Bahia. Esses dois órgãos, embora com objetivos
diferentes, funcionaram de forma integrada, visando “sanear” a cidade à luz dos novos
padrões exigidos pelo Código Sanitário.
Ao surgirem em 1925, as Delegacias de Saúde, através dos seus médicos/
delegados e inspetores, eram encarregadas de fiscalizar e punir. Elas seguiram o
modelo Federal de reforma sanitária, pois junto ao Departamento Nacional de Saúde
Pública (DNSP) foram criadas 10 (dez) delegacias cujo objetivo estava voltado para a
fiscalização e para a profilaxia
Apesar do pouco tempo de existência, as Delegacias ampliaram as ações das
Inspetorias e ao serem instaladas em diferentes pontos da cidade de Salvador
permitiram maior acesso da população necessitada, chegando a lugares distantes onde
antes não havia serviços de saúde.
O Hospital de Isolamento, embora tenha sido construído em período anterior,
passou a integrar o conjunto de ações propostas pela reforma da saúde iniciada em 1921
e intensificada, em 1925, com a criação da Subsecretaria de Saúde e de Assistência
Pública e do Código Sanitário. Ele foi ampliado e reformado para melhor atender à
população que necessitava dos seus serviços. Segundo Barros Barreto, o HIMS recebia
doentes portadores de patologias que poderiam causar um surto epidêmico na
cidade.
As ações desenvolvidas pelas Delegacias de Saúde e pelo Hospital, por sua
vez, não foram isoladas. O que ocorreu foi a tentativa de criação de uma rede de
atendimento, vinculado à Sub-Secretaria de Saúde e Assistência Pública e que
tinha como base o Código Sanitário.
A documentação consultada no que diz respeito às Delegacias de Saúde e ao
Hospital de Isolamento, além de ser esparsa e fragmentada, foi produzida por
aqueles que estavam a eles vinculados, tendo, dessa forma, objetivos específicos.
No entanto, foi possível observar, em alguns momentos, através dos relatórios dos
médios e inspetores, que eles consideravam que muitas doenças eram contraídas por
85

causa das precárias condições de vida da população. Assim, não bastava fiscalizar e
punir. As mudanças urbanas que ocorreram durante o período analisado não foram
suficientes para garantir moradia de qualidade, água potável, saneamento básico e boa
alimentação, questões essenciais para a saúde da população. Os problemas existentes
eram decorrentes das sociedades excludentes e desiguais, atingindo especialmente as
pessoas pobres e negras. Foram estas que mais necessitaram de atendimento, pois a
elite quase nunca o utilizou.
Podemos dizer que a década de 1920 foi um momento significativo na
história da saúde na Bahia. A Reforma Sanitária empreendida nesses anos, apesar
de suas limitações, trouxe mudanças, pois os serviços aumentaram e se
diversificaram.
As Delegacias de Saúde e o Hospital de Isolamento tiveram um papel
importante no processo de reforma, conseguindo contribuir para a articulação do
estado com as políticas sanitárias que estavam sendo implantadas nacionalmente.
Para concluir, a pesquisa realizada na produção desta dissertação, embora
tenha caráter inicial, abre pistas para a ampliação do conhecimento acerca da
Reforma Sanitária na Bahia, tema relevante, porém ainda pouco abordado em
âmbito estadual.
86

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BAHIA, Assembleia Geral Legislativa Mensagem.Francisco Marques de Góes Calmon.
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89

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93

ANEXOS

Imagens do Hospital de Isolamento de Mont’Serrat após a reforma.

Pavilhão para Pensionistas

Fonte: APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Mont’Serrat. Sobre os novos


pavilhões.

Vista dos Pavilhões

Fonte: APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Mont’Serrat. Sobre os novos pavilhões


94

Quarto para Pensionistas

Fonte: APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Mont’Serrat. Sobre os novos pavilhões

Enfermaria para indigentes

Fonte: APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Mont’Serrat. Sobre os novos pavilhões


95

Lavanderia

Fonte: APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Mont’Serrat. Sobre os novos pavilhões

Pavilhão da Farmácia

Fonte: APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Mont’Serrat. Sobre os novos pavilhões

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