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Tiradentes, um herói para a república

 A luta em torno do mito de origem para a república mostrou a dificuldade de


construir um heróis para a república.
 Heróis são símbolos poderosos, encarnações de idéias e aspirações, pontos
de referência.
 Os heróis são instrumentos eficazes para atingir a cabeça e o coração dos
cidadãos, buscando legitimar os regimes políticos.
 Não existe regime político que não promova culto aos seus heróis. Alguns
quase que espontâneos, que vem de lutas que mudam a conjuntura.
 Em outros casos, de menor profundidade popular foi necessário maior esforço
na escolha e promoção dos heróis.
 É nesse caso em que o heróis é mais importante. Como o povo não participa
do processo, tenta-se compensar por meio da mobilização simbólica.
 Heróis que se preze tem que ter a cara da nação. Precisa responder a
alguma necessidade ou aspiração coletiva, refletir algum tipo de
personalidade que corresponda a um modelo coletivamente valorizado.
 Porque senão o esforço para a mitificação será em vão. As pessoas não o
reconhecerão. Seriam ignorados, e pior ridicularizados.
 No Brasil observa-se esse processo em torno dos heróis do 15 de novembro.
 Suas virtudes são cantadas em livros, jornais, manifestações cívicas que
remontam o 15 de novembro, monumentos, quadros, leis da república.
Nomes em ruas, praças, cidades, navios de guerra.
 Deodoro era o candidato mais óbvio ao papel de herói republicano. Ele
chefiou o movimento militar que derrubou a monarquia, mas também por
alguns aspectos de sua atuação no 15 de novembro.
 O velho militar, moribundo às vésperas, mal sentado na sela, coloca-se à
frente da tropa entrando no quartel general: há elementos de heroísmo aí.
 Mas contra ele havia outros fatores: jeito de general, de monarca, sua figura
física lembrava o imperador. Era militar demais para ser popular.
 Outro candidato era Benjamin Constant. Ele era republicano ma snão tinha
figura de herói. Não era um líder militar nem popular.
 Eduardo Prado o define como “um general incruento, um sábio inédito,
exibido sob a espada virgem um livro branco”.
 Por mais que os positivistas buscassem promovê-lo ele era mais limitado que
Deodoro.
 Candidato mais serio era Floriano Peixoto. A partir da revolta armada no Rio
de Janeiro ganhou mais visibilidade.Para os jacobinos, os civis e militares ele
era o heróis republicano por excelência.
 Mas se não dividia civis e militares, dividias os militares. Exercito x marinha.
 As mesmas atitudes qualificadas pelos jacobinos como reveladores de pureza
e bravura eram vistas como sanguinárias pelos liberais. Ele só podia ser visto
como sanguinárias.
 Não há uma grande densidade histórica no 15 de novembro. Foi apenas uma
pequena passeata militar. Como fazer um mito ai? (elaborar??)
 Poucos eram os republicanos convictos, quase nenhuma participação
popular.
 Não havia densidade histórica nos sujeitos candidatos. Não tinham a estatura
exigida para o papel, não pertenciam ao movimento republicano desde 1870,
nem mesmo eram heróis militares.
 Floriano e Deodoro foram eleitos heróis depois do processo, já como parte da
mitificação das duas figuras.
 Assim, diante das dificuldades em promover protagonistas que participaram
em 15 de novembro, quem se mostrou capaz de atender ás exigências foi
Tiradentes.
 Os clubes republicanos do rio, de minas vinham desde 1870 resgatar sua
memória.
 1866: Saldanha Marinho, presidente da província de Minas Gerais manda
erguer um monumento em Ouro Preto.
 1881: Houve no rio a primeira celebração de 21 de abril
 Mas mesmo promovendo Tiradentes, os líderes dos clubes republicanos não
tiveram papel de destaque em 15 de novembro. Então porque Tiradentes foi
escolhido?
 Até hoje se busca definir qual o seu papel na inconfidência, qual a sua
personalidade, quais suas convicções, qual sua aparência física.
 Não vamos discutir se ele era líder ou seguidor, se era pobre ou rico, branco
ou mulato.
 Vamos fazer uma análise de construção do mito, que ocorre no imaginário,
que se manifesta da produção artística, escrita e oral.
 Pouco se sabe da memória de Tiradentes. Ela deveria existir. Há algumas
provas do abalo causado entre a população da capitania de Minas e do Rio
pelo processo dos réus, e pela execução de Tiradentes.
 Em “Memória do êxito que teve a conjuração de Minas”, o autor anônimo
descreve como os habitantes da cidade ficaram consternados.
 Usando a cidade para expor seus sentimentos pessoais: “A ‘cidade’ nunca
vira execução mais medonha e de mais feia ostentação. A notícia da
condenação e morte de onze réus, dada no dia 19 de abril de 1972 abalou ‘a
cidade’, que sem prestar lealdade à rainha, não pôde escapar de toda
opressão que sentia”.
 O anúncio do perdão de todos menos Tiradentes: “ a cidade sentiu-se em um
instante aliviada do desuso que a oprimia. Encheram-se as ruas, povoaram-
se as janelas, muitos e muitos não sustinham suas lágrimas”.
 Joaquim Silvério dos reis, traídos que se mudou para o Rio por não poder
viver em paz em Minas também deixou registros. Ele mudou de nome
acrescentando o Montenegro e foi morar no Maranhão. Houve atentado a
tiros e incêndio em sua casa.
 A exibição da cabeça de Tiradentes havia marcado Vila Rica não apenas,
mas a província inteira. No século XIX a memória ainda era muito viva,
segundo cronistas, e as pessoas acreditavam que a pena imposta fora
excessivamente injusta.
 Embora estivesse viva na memória popular, a inconfidência era um tema
delicado para a elite do segundo reinado. Afinal o proclamador era neto de d.
Maria I, contra quem tinham se rebelado os inconfidentes
 O Brasil, governado pela casa de Bragança e os inconfidentes pregavam uma
república americana. Não era fácil exaltar os inconfidentes, Tiradentes em
particular, sem de alguma forma se auto-condenar.
 Alguns autores dizem que a Inconfidência foi o primeiro movimento de fato
revolucionário no país.
 E Tiradentes muitas vezes aparece como mártir por excelência, como herói.
Se sacrificou por uma idéia.
 A literatura Brasileira passa a publicar o tema antes que a história própria
fosse escrita
 As Liras de Gonzaga, em 1840.
 O romance “Gonzaga ou a Conjuração de Tiradentes”, de Antônio Ferreira
Souza, em 1848.
 O Conto “A cabeça de Tiradentes”, de Bernardo Guimarães, em 1867.
 A peça “Gonzaga ou a Revolução de Minas”, de Castro Alve, representada
em 1866.
 “Ei-lo o gigante da praça,
O Cristo da multidão!
É Tiradentes quem passa...
Deixem passar o Titão.

 O primeiro conflito envolvendo Tiradentes ocorreu quando em 1862


inaugurou-se a estátua de D. Pedro I (seu neto) no Rocío, hoje praça
Tiradentes, em que a rainha condenara à morte o mártir.
 Pedro Luiz pereira de Souza compões um poema a ser distribuído no dia:
 Nos dias da cobardia
Festeja-se a tirania
Fazem-se estátuas aos reis
...
Hoje o Brasil se ajoelha
E se ajoelha contrito
Ante a massa de granito
Do primeiro Imperador!
...
Foi ele o mártir primeiro
Que pela pátria morreu
...
Do sangue de Tiradentes
Brotou-nos a Salvação.
 (verificar a comoção social)
 Termina dizendo que Tiradentes não precisa de estátua, pois o vemos no pé
do pelourinho, cercado de uma auréola de liberdade e fé;
 A luta entre D. Pedro I e Tiradentes continuou amistosa, mesmo depois da
proclamação da república, e passou a significar monarquia e república.
 21 de abril de 1893 tentou-se encobrir a estátua para a comemoração do 21
de abril (mas foi cancelado o festejo)
 1902 pensou-se em erguer um monumento, mas a câmara mandou
desapropriar o local. VERIFICAR SIMBOLOGIA.
 Luis Gama em 21 de abril de 1882 publica no jornal do Clube Tiradentes
artigo chamado “À forca o cristo da multidão”. E faz um paralelo entre
Tiradentes e Cristo.
 A forca é equiparada À cruz, o Rio de Janeiro a Jerusalém, o Calvário ao
Rocio.
 Um dos marcos mais importantes na construção do mito de Tiradentes esteve
na “história da Conjuração Mineira”, de Joaquim Norberto de Souza Silva.
 A publicação da obra foi apressada por causa do movimento republicano que
começava em 1870.
 Com a proposição da criação de um monumento, o autor discordou, inclusive
da representação de Tiradentes como um mártir vestido de roupa branca,
além do papel secundário que lhe atribuía.
 Norberto foi acusado de estar do lado da monarquia, de tentar amesquinhar a
inconfidência e denegrir a imagem de Tiradentes.
 Ele afirmava apenas se basear na documentação que consultou para a
escrita do livro, afirmando que não era um apaixonado.
 Ele era funcionário público, monarquista invicto.
 Mas o pior é que do ponto de vista histórico ele estava certo. Ele teria
substituído seu ardor patriótico pelo fervor religioso por todo o tempo de
reclusão.
 Segundo Norberto, Tirandentes havia escolhido morrer com o credo nos
lábios ao invés de fazer o brado de revolta: viva a liberdade que explodira no
peito de outros mártires, pernambucanos de 1817 e 1824.
 Os republicanos protestaram, negavam que Tiradentes teria beijado os pés
do carrasco., não teria caminhado com crucifixos, que tinha roupa alva por
baixo da alva, Jesus havia morrido nu por seus pecados.
 Duvidavam que ele teria se tornado um místico durante o período de prisão e
perdido o impulso patriótico.
 Ele havia ainda deslocado o papel principal para Tomás Antônio Gonzaga,
um exilado da elite e não o homem do povo.
 Tanto Norberto quanto os republicanos estavam enganados quando
pensaram que a ligação religiosa abalaria a imagem de herói.
 Cada vez mais passaram a aproximá-lo a figura de Cristo.
 A partir de 21 de abril de 1882 as referências publicadas no Jornal do clube
Tiradentes faziam a ligação.
 Depois da proclamação da república o culto cívico a Tiradentes foi
intensificado. Em 1890 foi decretado feriado nacional, juntamente com o 15
de novembro, e as alusões a Cristo continuaram.
 O primeiro desfile que passou a fazer parte das comemorações de 21 de abril
saiu dos corredores da cadeia velha, em que ele estivera preso, prosseguiu
até a praça Tiradentes, e até o Itamaraty, onde Deodoro saudou os
manifestantes. Parecia a celebração da paixão, morte e ressurreição. Uma
nova via sacra.
 “Durante o desfile de 1890, Decio Villares, pintor positivista, distribuiu uma
litogravura em que aparecia o busto de Tiradentes, corda ao pescoço, ornado
com a palma dão martírio e louros da vitória. Barba e cabelos longos, ar
serenos, olhar no infinito, era a própria imagem de Cristo”. (EXIBIR)
 Não havia nenhum retrato de Tiradentes feito por quem o tivesse conhecido
pessoalmente. Baseando-se em Alvarenga Peixoto, Norberto havia o descrito
como feio e assustado.
 Muitas outras obras traziam a representação do martírio. No “martírio de
Tiradentes” EXIBIR, ele é visto de baixo para cima, como um crucificado e
tendo aos pés um frade, que lhe apresenta o crucifixo e o carrasco, cobrindo
a mão com o rosto. È uma cena do pé-da-cruz.
 Na representação de Pedro Américo de 1893 a relação PE completamente
explícita (exibir)
 Além do apelo obvio à tradição cristã do povo, que facilitava a transmissão da
imagem de Cristo cívico, poder-se-ia perguntar por outras razões do êxito de
Tiradentes como herói.
 Ele tinha outros competidores como Frei Caneca no norte.
 O fator geográfico foi importante. Ele era herói de uma área que era= a partir
da metade do XIX o centro político do país. – Minas, São Paulo, Rio.
 O nordeste no fim do XIX era uma região decadente economicamente e
políticamente falando.
 Frei Caneca e outros se envolveram em lutas reais, em que houvera sangue
e morte, enquanto que Tiradentes como um líder religioso. Poupou sangue,
imaculado na brancura da sua roupa.
 Isso fazia clamar o sentimento popular. Na figura dele todos podiam se
identificar,e ele representava o sentimento de participação, de união.
 Sendo assim, para conciliar com o passado monarquista, elege-se Tiradentes
como um heróis cívico-religioso e não como um mártir.
 Ele foi aceito não como heróis da república, mas como herói nacional.
 Ele unia o país através do espaço, do tempo e das classes.
 Para isso sua imagem precisava ser idelaizada, e assim o foi já que não
haviam fotos suas, nenhuma descrição.

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