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Uma das maiores especialistas em alfabetização no Brasil trata das práticas escolares frágeis que não ensinam a
ler e escrever, das mudanças no ensino nas últimas décadas e da qualidade da formação docente
Há 50 anos, ainda estudante do curso Normal, ela assumiu como professora sua primeira turma de 2ª série. "Não sabia
nada sobre alfabetização", revela Telma Weisz. Suas vivências quando criança colaboraram para que analisasse a
maneira pela qual os alunos aprendem. Começou a ler e escrever antes mesmo de ir à escola graças a um insistente
contato com gibis e uma lista de nomes de pessoas da família escrita pela mãe, a pedido dela. "Usava aquelas palavras, já
conhecidas, para comparar com outras que encontrava."
Sua trajetória como educadora e formadora de professores é marcada por feitos importantes para a história da Educação
no Brasil. Foi uma das autoras dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Língua Portuguesa, consultora do
Ministério da Educação (MEC) e supervisora pedagógica na elaboração e na implementação do Programa de Formação
de Professores Alfabetizadores (Profa). No livro O Diálogo entre o Ensino e a Aprendizagem (133 págs., Ed. Ática, tel.
4003-3061, 43,90 reais), discutiu a diferença entre os processos que dão nome à obra. Escreveu também a apresentação
de Psicogênese da Língua Escrita (300 págs., Ed. Artmed, tel. 0800-7033-444, 61 reais), título sobre as pesquisas
realizadas pela psicolinguista Emilia Ferreiro e pela pedagoga Ana Teberosky, ambas argentinas.
Telma segue se dedicando às questões do mundo da alfabetização. É coordenadora do curso de pós-graduação sobre o
tema no Instituto Superior de Ensino Vera Cruz (Isevec), na capital paulista. Responde também pela implementação e
supervisão do Programa Ler e Escrever, que capacita os professores da rede estadual paulista e pela elaboração da prova
do Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp), aplicada aos alunos do 3º ano - ambas
iniciativas com ótimos resultados. "Os dados das provas de 2011 revelam que 94,7% das crianças de 8 anos estão
alfabetizadas", comemora.
Nesta entrevista a NOVA ESCOLA, Telma fala sobre a alfabetização ontem e hoje, traçando um panorama da área e
apontando as fragilidades de algumas práticas atuais, e reflete sobre sua prática como educadora.
Qual a principal mudança na Educação desde os anos 1960, quando teve início seu trabalho na área?
TELMA WEISZ Há 50 anos, metade da população fracassava na escola porque ela não era para todos. Se não fossem
de classe média ou alta, as crianças eram tratadas como não ensináveis. Isso ficou mais evidente com a expansão do
acesso ao ensino para as classes populares e pela migração da classe média para as instituições particulares. Essa
separação pode ser notada até hoje, mas menos do que antes. A maioria dos professores atualmente assume que é
obrigação ensinar a todos, ainda que não consiga. Mas não era assim que se pensava.
Apesar de frequentarem a escola há anos, muitos jovens têm dificuldades para ler e escrever. Por quê?
TELMA Os analfabetos funcionais são produto de uma escola que produz não-leitores e não-escritores. Há uma ideia
falsa de como se aprende a ler e escrever e o currículo - cheio de ideias ultrapassadas - é reflexo disso. Ensina-se
gramática para que a turma produza textos escolares. Enquanto o ensino tiver esse foco, formaremos pessoas que não
saberão ler e escrever. Não são as aulas de gramática normativa que levam alguém a ser um bom escritor. Bons textos
são feitos por quem lê e redige regularmente.
As sondagens diagnósticas têm se popularizado, mas ainda dentro de diferentes perspectivas de alfabetização. Isso
é um problema?
TELMA Não. Essa simultaneidade faz parte de qualquer processo de transição. Ninguém passa do estado de ignorância
absoluta para o de sapiência total. Assumir que um professor está pronto para lecionar perfeitamente depois de formado é
errado. Uma situação desse tipo só funcionaria com robôs, e não com seres humanos. Na teoria construtivista, as pessoas
sempre se movem em direção ao conhecimento e ele não é um produto, e sim um processo. Fazer sondagens em sala de
aula representa um avanço, mas elas são apenas um meio para avaliar até onde o aluno foi, se ele aprendeu ou não
determinado conteúdo (leia a reportagem). De nada adianta se o educador faz um diagnóstico inadequado ou não usa os
resultados dele.