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Fabio Andre Guaragni, Ellen Galliano Barros e Fernando Gustavo Knoerr

PODER JUDICIÁRIO E MEIO AMBIENTE: UMA GESTÃO JUDICIÁRIA SUSTENTÁVEL


JUDICIARY AND THE ENVIROMENT: A SUSTAINABLE JUDICIAL MANAGEMENT

Fabio Andre Guaragni, Ellen Galliano Barros, Fernando Gustavo Knoerr


art.unicuritiba@gmail.com
Centro Universitário Curitiba (UNICURITIBA). Curitiba, PR, Brasil.

Resumo

O presente artigo objetiva examinar a colaboração dos órgãos do Poder Judiciário para a redução de
impactos ambientais, através da organização de uma gestão judiciária sustentável. Tal pretensão justifi-
ca-se pelo cenário marcado, de um lado, pela crise ecológica, à vista do consumismo, da superprodução
e da prioridade de lucro rápido e, de outro vértice, pela a emergente conscientização de práticas volta-
das ao meio ambiente sadio e equilibrado. Nesta toada, cabe ao Estado, acompanhado das instituições
privadas e dos cidadãos, realizar e fomentar, diariamente, práticas ecologicamente corretas, atendendo,
deste modo, às diretrizes constitucionais e da legislação extravagante, bem como às diretivas indicadas
por reuniões entre países. A par disto, faz-se necessária nas estruturas do judiciário a inserção de um
gerenciamento ecológico adequado, que estimule o emprego de técnicas de reuso, reciclagem, logística
reversa e ecodesign de produtos, bem como promova o uso racional de bens públicos e recursos naturais,
a licitação sustentável, a capacitação de membros e colaboradores acerca do desenvolvimento sustentável
em ações cotidianas, e mais, que promova a sensibilização do indivíduo, de forma a afasta-lo da inér-
cia frente à crise ambiental instalada e, após, torne-se um “ecomultiplicador”. Inicialmente, o trabalho
tratará das particularidades do cenário socioeconômico e ambiental, na sequência, indicará o papel do
Estado diante das previsões legais de preservação ao ecossistema e, ao final, abordará as peculiaridades
da gestão ecológica judiciária. Destarte, o procedimento metodológico utilizado é o dedutivo-indutivo,
em virtude do exame do problema com suporte doutrinário e das disposições legais.
Palavras-chave: Crise Ambiental. Equilíbrio Ecossistêmico. Poder Judiciário. Gestão Sustentável.

Abstract

This article aims to examine the collaboration of the organs of the Judiciary to reduce environmental im-
pacts through the organization of sustainable judicial management. Such a claim is justified by the scenario
marked, on the one hand, by the ecological crisis, in the face of consumerism, overproduction and the prio-
rity of rapid profit and, on the other vertex, by the emerging awareness of practices aimed at the healthy and
balanced environment. In this task, it is the responsibility of the State, accompanied by private institutions
and citizens, to carry out and promote, on a daily basis, ecologically correct practices, thus complying with
the constitutional guidelines and the extravagant legislation, as well as the directives indicated by meetings
between countries. In addition, it is necessary in the structures of the judiciary to insert an appropriate
ecological management that stimulates the use of reuse, recycling, reverse logistics and product ecodesign
techniques, as well as promoting the rational use of public goods and natural resources, sustainable bid-
ding, training of members and collaborators on sustainable development in everyday actions, and more,
that promotes the sensitization of the individual, so as to move him away from inertia in the face of the
installed environmental crisis and then become a “Ecomultiplier”. Initially, the paper will deal with the
particularities of the socioeconomic and environmental scenario. It will then indicate the role of the State
in the face of legal prescriptions for preserving the ecosystem and, in the end, address the peculiarities of
ecological judicial management. Thus, the methodological procedure used is deductive-inductive, due to
the examination of the problem with doctrinal support and legal provisions.
Keywords: Environmental Crisis. Ecosystem Balance. Judiciary. Sustainable Management.

Recebido: 12/03/2019
Aceito: 12/07/2019

Revista da Faculdade de Direito da FMP, Porto Alegre, v. 14, n. 1, p. 76-86, 2019. 76


Poder judiciário e meio ambiente: uma gestão judiciária sustentável

1 Introdução

O presente estudo pretende analisar, dentro da atual perspectiva de crise ecológica e do desen-
volvimento da sustentabilidade ambiental, a colaboração do Estado, especificamente na estrutura do
Poder Judiciário, para a minimização dos graves impactos ambientais, a partir de uma gestão judiciá-
ria sustentável.
Como bem se sabe, no interior da estrutura judiciária existem inúmeras varas e tribunais, cada
uma com força de trabalho de nível elevado - número total de juízes, servidores, colaboradores e es-
tagiários - e muitas horas de trabalho diário, logo, é de se calcular o número de resíduos produzidos
em cada instituição, desde o uso de materiais de expediente, até o mobiliário utilizado, com posterior
destinação final.
Nesta perspectiva, é de se refletir o impacto ecossistêmico decorrente do modo como as ativida-
des dos órgãos judiciários ocorrem e a cultura de sustentabilidade fomentada aos servidores, podendo
influenciar ora positivamente, ora em prejuízo às formas de vida.
Diante da relevância da reflexão sobre tais impactos, cabe ao Poder Judiciário, em sua integra-
lidade de órgãos, garantir o desenvolvimento de um meio ambiente sadio e equilibrado, de forma a
atender às diretrizes constitucionais (artigos 170, inciso VI e artigo 225, ambos da Constituição Fede-
ral), além do regramento estabelecido pela legislação extravagante, ligada à Política Nacional do Meio
Ambiente (Lei nº 6.938/81), e mais, aos conteúdos determinados em reuniões internacionais acerca
do resguardo ambiental.
Destarte, a referida tutela ecológica demanda a implantação de técnicas específicas ambientais,
utilizadas, em grande parte, nos estabelecimentos industriais, tais como: reuso, reciclagem, logística
reversa e o ecodesign de produtos. Mais que isto, aponta a necessidade do incentivo de comportamen-
tos cotidianos individuais sustentáveis, além da inclusão da licitação sustentável, do uso racional de
bens públicos e recursos naturais, do adequado gerenciamento de resíduos diversos, favorecendo, as-
sim, a qualidade de vida no trabalho e a sensibilização de cunho ecológico por todos os funcionários.
Deste modo, o trabalho analisará, inicialmente, as particularidades da crise ecológica versus sus-
tentabilidade ambiental, na sequência, abordará o papel do Estado frente às diretrizes constitucionais
e legais sobre o meio ambiente e, ao final, tratará das especificidades da gestão judiciária sustentável.
Portanto, o objetivo é fomentar, no âmbito judiciário, a realização de condutas solidárias e o agir eco-
logicamente correto, afastando interesses egoístas.

2 Crise ecológica versus sustentabilidade ambiental

Não pairam dúvidas de que a recente perspectiva socioeconômica e ambiental expressa maior
preocupação com o equilíbrio do ecossistema, isto porque, embora haja a receio com o resguardo am-
biental e com a implantação efetiva do termo “sustentabilidade” nas instituições públicas e privadas,
não se pode negar a preponderância do lucro e do poder a qualquer custo, ainda que em detrimento
das espécies naturais e da qualidade de vida da população.
Nesta perspectiva, é evidente que as atividades econômicas de grandes potências e suas empresas
protagonizam gravíssimos prejuízos ao meio ambiente, soma-se a isto a despreocupação do próprio
indivíduo, dentro da sociedade em que vive, pois não lhe é ensinado, de forma adequada, a manter
um comportamento em favor do bem estar coletivo, mediante o consumo equilibrado e o descarte de
resíduos utilizados, com vistas à qualidade de vida digna, sem afetar o presente e, por conseguinte, o
futuro (SOUZA; PAVAN, 2013, p.15).
Como bem se sabe, a intensificação do lucro advém da Era da Globalização e com ela do desen-
volvimento científico e tecnológico, pois com a complexidade das relações entre países e pessoas, o
comércio internacional, o avanço dos meios de comunicação e de novos maquinários, a superprodução
das empresas e o consumismo ganharam força, o que acarretou no crescimento financeiro de entes pri-
vados renomados a qualquer custo, endossado pelos “Estados Globalizadores” (MARTÍN, 2009, p. 05).
No entanto, vale salientar que, embora os países capitalistas aparentem o protagonismo dos maio-
res prejuízos ao ecossistema, esta situação independe do modelo ideológico adotado por cada governo,

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inclusive porque, em análise aos modelos estatais liberal (de intervenção mínima, com proteção desti-
nada apenas à segurança e à propriedade) e social (ações prestacionais diretas) (ANTONIETTO; RIOS,
2016, p. 349-350), o organismo público entendia a exploração ambiental como necessária ao crescimen-
to econômico nacional (SARAIVA, 2016, p. 125).
Diferentemente daquela época, com a atual ideologia de bem-estar social, o poder público en-
tende como encargo seu a preservação efetiva do meio ambiente, mediante o agir ético e sustentável.
Trata-se, ainda, da influência da denominada corrente pós-positivista e do constitucionalismo
democrático, que denotam à lógica da efetivação real de direitos constitucionais, inserindo como
prioridade das políticas públicas o resguardo da qualidade de vida da população, por meio da preven-
ção de riscos à saúde pública e da valorização do ecossistema.
Em síntese, este contexto revela, primeiramente, a manutenção de gravosas consequências em
desfavor dos ecossistemas – sistemas complexos de interação entre organismos vivos e não-vivos (AL-
MEIDA, 2007, p.13) – que, aliás, podem ser irreversíveis. Alguns destes impactos seriam: a escassez
da água; o aquecimento global; elevada emissão de gases poluidores do ar; o surgimento de novas epi-
demias (por exemplo, gripe nas aves); a introdução de espécies exógenas; a perda da biodiversidade; e
a sobrepesca nos oceanos (expansão da pesca).
Assim, resta claro a existência de uma crise ambiental, pois o ecossistema, necessário para a
sobrevivência e interação de todos os seres com seus ambientes, tem sido afetado intensamente, quer
pela atitude desmedida das instituições públicas e privadas, quer pela insustentabilidade do compor-
tamento do homem. Há que se falar, portanto, na consequente crise existencial, pois o homem como
ser inseparável do meio ambiente natural (CAPRA, 1999, p. 25-26), acaba tendo a sua existência afe-
tada por impactos negativos em desfavor das espécies naturais.
A partir disto, o outro vértice expressa a chamada “Sociedade do Risco”, que dentro de um processo
de modernização, de avanço tecnológico e científico, existe a necessidade de cálculos de riscos industriais
fabricados e seus efeitos incertos, através do debate político, moral e existencial entre a sociedade, buscando
a segurança frente a um futuro desconhecido (BECK, 2007, p. 27 apud MOTTA, 2011, p. 386-387).
Neste panorama de preocupação social com a presente geração e a futura, os planos de governo
buscam a ligação com as formas de minimização de riscos ambientais e a proteção de bens jurídicos
constitucionais. A democratização do risco, por meio da sua maior percepção, diante complexidade
social e tecnológica, destaca a maior cautela com o futuro e a segurança, por intermédio de ações de
toda a sociedade (DIAS, 2014, p. 611).
Diante deste embate entre crise existencial versus valorização de princípios “ecocêntricos” – cen-
tralizados na Terra (CAPRA, 1999, p. 28) -, é de responsabilidade do indivíduo, do Estado e dos entes
privados, como atores sociais, desenvolverem a preocupação com os direitos humanos e a percepção
ecológica profunda na consciência cotidiana, sem deixar preponderar o egoísmo de certas minorias a
sobrevivência da coletividade mundial e do planeta (MILARÉ, 2013, p. 57).
Isto é, devem introduzir, através da responsabilidade compartilhada, a sustentabilidade ambien-
tal nas suas atitudes diárias, a partir da implantação de meios de contenção de novos riscos (ação
humana, ciência e tecnologia), tornando possível o equilíbrio entre o progresso econômico e a conser-
vação dos ecossistemas (SOUZA; PAVAN, 2013, p. 23), mais que isto, a construção de uma sociedade
justa, livre e solidária, como preconiza a Constituição Federal.
Destarte, a seguir será analisada a colaboração estatal diante da noção de sustentabilidade e das
diretrizes constitucionais e legais de proteção ao ecossistema sadio e equilibrado.

3 O papel do estado frente às diretrizes constitucionais e legais de proteção ecossistêmica

Antes de examinar a responsabilidade dos Poderes do Estado com o meio ambiente, oportuno
salientar que a proteção à natureza possui natureza unitária, considerando a gama de diretrizes, prin-
cípios e objetivos consagrados pela Política Nacional do Meio Ambiente.
Ademais, em que pese existam várias modalidades do meio ambiente, respectivamente, meio
ambiente natural ou físico; meio ambiente cultural; meio ambiente artificial ou humano; e meio

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ambiente do trabalho, o foco deste artigo é conceituar o seu aspecto natural/físico, conforme os ensi-
namentos de Pedro Lenza (2011, p. 1088):
Conforme proposto, reconhecendo o caráter unitário do conceito de meio ambiente, do ponto
de vista didático, propomos a identificação de quatro importantes aspectos, focando aspectos
específicos: Meio ambiente natural ou físico: nos termos do art. 3º, I, da Lei n. 6.938/81 (que
dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente), pode ser definido como o conjunto de
condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga
e rege a vida em todas as suas formas. Em outras palavras, o meio ambiente natural ou físico é
constituído pelo solo, água, ar atmosférico, energia, fauna, flora, qual seja, a correlação entre os
seres vivos e o meio em que vivem. (cf. art. 225, caput, e §1º, I e VII).

Realizada esta conceituação essencial, merece destaque o resguardo específico do meio ambien-
te natural, baseado nos conteúdos de Direito Constitucional, Internacional e ecológicos.
Inicialmente, trata-se de direito fundamental da terceira geração, direito constitucional difuso
voltado à essência do ser humano, em outras palavras, à razão de existir humana e ao seu destino,
fundando-se num sentimento de solidariedade e fraternidade, de forma transindividual (titularidade
coletiva) e transfronteiriça, em prol da coletividade social (STF, 1995).
Neste seguimento são as lições de Paulo Affonso Leme Machado (2007, p. 118):
O meio ambiente é um bem coletivo de desfrute individual e geral ao mesmo tempo. O direito
ao meio ambiente é de cada pessoa, mas não só dela, sendo ao mesmo tempo “transindividual”.
Por issot, o direito ao meio ambiente entra na categoria de interesse difuso, não se esgotando
numa só pessoa, mas se espraindo para uma coletividade indeterminada. Enquadra-se o direito
ao meio ambiente na problemática dos novos direitos, sobretudo a sua característica de direito
de maior dimensão”, que contém seja uma dimensão subjetiva como coletiva, que tem relação
com um conjunto de atividades. (MACHADO, 2007, p. 118).

Assim sendo, em 1972 foi realizada a Declaração sobre o Ambiente Humano, na Conferência
das Nações Unidas em Estocolmo, que declarou a tendência contemporânea de preocupação aos in-
teresses difusos, aliás, com o meio ambiente. Após esta ocasião, a Constituição vigente consagrou a
proteção aos recursos naturais da Terra, bem como às espécies da fauna e da flora em benefício das
gerações atuais e futuras, mediante um planejamento cauteloso, com administração adequada, até
mesmo durante o desenvolvimento econômico (MORAES, 2011, p. 868).
Então, no artigo 225, caput, da Constituição Federal, referente à ordem social de direitos funda-
mentais, é previsto que todos têm o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade
o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
Para além de ser um direito fundamental da ordem social, o meio ambiente também é consi-
derado um princípio da ordem econômica, conforme dispõe o art. 170, inciso VI, da Constituição.
Trata-se, assim, de uma orientação à atuação do Estado e dos particulares nos processos de produção,
circulação, distribuição e consumo de riquezas do país (BARROSO, 2001, p. 193).
Quer dizer, com base neste princípio, tanto o Estado, quanto os entes privados devem manter a
conservação efetiva do meio ambiente. Cabe ao primeiro o poder-dever de intervir no âmbito empre-
sarial, por intermédio da edição de leis e regulamentos que objetivem a promoção do desenvolvimento
sustentável (BARROSO, 2001, p. 198). O segundo, por sua vez, apesar de ter o direito à livre iniciativa,
quando do exercício da atividade econômica e da busca pelo lucro, não pode livremente destruir a na-
tureza, pelo contrário, deve zelar pelo ambiente saudável, a partir da adoção de técnicas sustentáveis.
Já a ideia de sustentabilidade consiste na preservação de determinado bem, a conservação de deter-
minado material ou matéria-prima, a fim de que seja possível a fabricação de bem da mesma natureza.
Aliás, traz a noção de conservação de determinados produtos, bens materiais e imateriais, com o propósito
de não ser perdido pelo tempo, sequer ser escasso ou extinto (DIAS; MARDEGAN, 2011, p. 604-605).
Nestes moldes, como dito anteriormente, é dever do Estado adequar o desenvolvimento susten-
tável à sua estrutura organizacional, às ações e às políticas públicas, sobretudo estabelecendo práticas
equilibradas, determinadas pela Constituição Federal, legislação extravagante, além de tratados e re-
uniões com representantes do mundo todo.

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A título de exemplo, ressaltam-se alguns destes eventos que colaboram para o desenvolvimento
sustentável na seara estatal. Em primeiro lugar, o Plano de Ação para Produção e Consumo Susten-
táveis (2011), realizado pelo Ministério do Meio Ambiente, que foi originado do termo de adesão ao
processo de Marrakech (2007). Este plano propiciou a elaboração do documento guia das ações de
governo, do setor produtivo e da sociedade que indica o país para os níveis mais sustentáveis de pro-
dução e consumo, além da redução da pobreza. Veja-se (CSJT, 2014, p. 1):
Em seu primeiro ciclo, de 2011 a 2014, o PPCS focará seus esforços em seis áreas principais,
a saber: educação para o consumo sustentável; varejo e consumo sustentável; aumento da
reciclagem; compras públicas sustentáveis; construções sustentáveis; e Agenda Ambiental na
Administração Pública – A3P, na qual figura como um dos eixos temáticos a Licitação Susten-
tável. Vale ressaltar que outros eixos temáticos da A3P – uso racional dos recursos naturais e
bens públicos; gestão adequada dos resíduos gerados; qualidade de vida no ambiente de traba-
lho e sensibilização e capacitação -, bem como áreas de foco do PPCS, têm relação direta com
as contratações públicas. (CSJT, 2014, p. 1).

Outro debate relevante ocorreu na Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento
Sustentável – Rio +20 -, o qual tratou do compromisso global pela sustentabilidade, bem como a in-
clusão e a erradicação da pobreza extrema a nível mundial. Com isto, o Estado brasileiro definiu oito
objetivos para o cumprimento da meta documentada, reconhecendo, assim, o seu papel de indutor e
regulador do desenvolvimento sustentável. A propósito (ONU, 2011):
[...] é fundamental que o Estado retome seu papel de indutor e regulador do desenvolvimento,
favorecendo a adoção de práticas econômicas e processos produtivos inovadores, calcados no
uso racional e na proteção dos recursos naturais e na incorporação de pessoas excluídas à eco-
nomia, por meio do acesso ao emprego, ao trabalho decente e à renda. Por meio de instrumentos
econômicos e políticas públicas, o Estado deve remover barreiras e criar incentivos positivos,
que facilitem a adesão do setor produtivo a padrões mais sustentáveis sob as óticas econômica,
ambiental e social [...]. O Estado pode ainda influenciar significativamente a adoção de modelos
mais sustentáveis pela forma como aufere e aplica a receita. Os instrumentos de política fiscal,
associados à valoração de serviços ambientais, desempenham, nesse sentido, papel central no re-
pertório de políticas do Estado, por meio das quais podem ser estabelecidos estímulos positivos
para a adoção de padrões mais sustentáveis em toda a cadeia produtiva [...]. As compras públicas
e investimentos também podem desempenhar papel nesse contexto. (ONU, 2011).

Oportuno mencionar, também, a construção da Agenda 21, documento final da Conferência


Rio-92, que firmou um plano de ação para o desenvolvimento equilibrado, aliás, acerca das altera-
ções dos padrões de consumo, estabeleceu uma série de atividades, como por exemplo, o exercício
da liderança por meio das aquisições pelos Governos, trazendo à baila o aperfeiçoamento do aspecto
ecológico nas políticas de aquisição.
Conclui-se, deste modo, que todos estes eventos em conjunto das disposições constitucionais e da
legislação extravagante reforçam o novo paradigma traçado pelo Estado brasileiro, ou seja, da política pú-
blica voltada ao desenvolvimento sustentável ambiental, de preocupação com o bem-estar das gerações.
E vai além, como examinado em capítulo anterior, se refere ao bom senso, à responsabilidade
social e ao sentimento cívico dos gestores públicos (CSJT, 2014, p. 05), a fim de efetivar os direitos
fundamentais pertencentes a toda a coletividade.
Na recente noção de contratação pública sustentável, por exemplo, é perceptível este novo ideal
de efetividade dos direitos ambientais e de resguardo das garantias dos cidadãos, afastando-se da
antiga estrutura da licitação, preocupada tão somente com os pilares social e econômico, de garantia
apenas da segurança jurídica, da livre concorrência e de obtenção do melhor produto e/ou serviço
com a proposta mais vantajosa, previsto no artigo 45, §1º, da Lei nº 8.666/93.
É dizer, então, que a licitação sustentável insere o terceiro pilar, de cunho ambiental, de forma
que, para além da livre e concorrência, do menor custo e da melhor proposta, seja visualizada a opção
de menor impacto ecológico para a totalidade do processo de compra e contratação governamental,
segundo Rachel Bideman, Laura Silvia Valente de Maceno, Mário Monzoni e Rubens Mazon (2006).
Neste sentido (BIDERMAN; MACEDO; MONZONI; MAZON, 2006 apud CSJT, 2014, p. 3) as
compras públicas sustentáveis devem observar os seguintes fatores:

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Primeiro, deve ser avaliada a real necessidade da aquisição pretendida; Segundo, a decisão deve
levar em conta as circunstâncias sob as quais o produto foi gerado, considerando os materiais de
produção, as condições de transporte, entre outros; Terceiro, deve ser feita uma avaliação em rela-
ção ao seu futuro, ou seja, como o produto pretendido se comportará durante sua fase útil e após
sua disposição final. (BIDERMAN; MACEDO; MONZONI; MAZON, 2006 apud CSJT, 2014, p. 3)

Fundamentado neste novo modelo licitatório, a legislação infraconstitucional foi construída. A


Lei nº 12.349/2010 introduziu a expressão “desenvolvimento nacional sustentável” na primeira parte
do artigo 3º, da Lei de Licitação. Ainda, nesta última lei, o artigo 12 dispõe sobre projetos básico e
executivo de obras e serviços de menor impacto ambiental.
Para além, constata-se outras diretrizes normativas de especial importância que abarcam o
mesmo conteúdo, respectivamente: Emenda Constitucional nº 42/2003 (insere a proteção ao meio
ambiente também no processo de elaboração do produto, conforme artigo 170, inciso VI, da Cons-
tituição); Lei nº 10.257/2001 (limites de sustentabilidade ambiental, social e econômica para política
urbana); Lei nº 12.187/2009 (Política Nacional sobre Mudança de Clima); Lei nº 12.305/2010 (Política
Nacional de Resíduos Sólidos); Lei nº 12.349/2010 (inclusão do desenvolvimento sustentável na práti-
ca licitatória); Instrução Normativa nº 01/2010 (especificações técnicas ambientais para aquisição de
bens e contratação de obras e serviços); Decreto nº 2.783/1998 (trata da proibição de aquisição de pro-
dutos ou equipamentos com potencial de destruição da camada de ozônio; e Decreto nº 5.940/2006
(separação dos resíduos recicláveis descartados pelos órgãos e entidades da administração pública
federal direta e indireta).
Desta forma, é perceptível, através da leitura de todos estes recentes conceitos, da atualização
da legislação e das diretrizes constitucionais, o encaminhamento das atividades estatais (dos poderes
e seus órgãos) para o desenvolvimento sustentável, em cooperação com servidores e colaboradores,
objetivando a redução de impactos socioambientais negativos resultantes da ação institucional, do
crescimento da conscientização ambiental e do aprimoramento de práticas ecológicas.

4 Gestão judiciária sustentável

Pois bem. Após a análise de todo este arcabouço de diretrizes destinadas aos poderes estatais,
acompanhadas do recente contexto de crise ambiental e urgente sustentabilidade ecológica, é de se
investigar as principais características do Poder Judiciário para a adequada gestão sustentável e o pla-
nejamento estratégico no interior de sua estrutura.
Para isto, examina-se, a seguir, o Relatório de Atividades da Comissão de Gestão Socioambiental
do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (2017) e o Guia de inclusão de critérios de sustentabilida-
de nas contratações da Justiça do Trabalho (2014).
Em primeiro lugar, para que haja o devido gerenciamento de resíduos e licitação sustentável, de-
ve-se analisar o contexto regional da estrutura judiciária, isto é, o número de comarcas e suas devidas
varas, a força de trabalho desenvolvida (número de servidores, funcionários e estagiários), bem como
a quantidade de bens móveis e imóveis, produtos e serviços, afinal, com o resultado deste exame, será
possível estimar a quantidade de resíduos produzidos por área e indivíduo.
Em segunda posição, importante listar os tipos de resíduos produzidos nestes ambientes, se são
recicláveis ou não recicláveis (rejeitos), se são nocivos ou não, inclusive se possuem natureza orgânica,
se são relativos à saúde, eletrônicos ou eletroeletrônicos, até mesmo de construção civil.
Fora isto, para que haja um planejamento estratégico adequado ao desenvolvimento sustentável,
é de suma importância a construção de setores internos específicos para a preservação ambiental e
a logística do gerenciamento de resíduos, buscando propagar a conscientização ecológica no interior
órgão judiciário. Assim, é notável a importância da integração entre os setores ligados ao meio am-
biente, servidores, gestores, agentes terceirizados, chefes, desembargadores e juízes.
À vista de todas as peculiaridades da seção judiciária, bem como dos resíduos produzidos, bens
utilizados e serviços prestados, na sequência, é de suma importância a apresentação da cultura de
sustentabilidade adotada pela instituição e por todos os seus membros, de forma a destacar, de início,
as principais diretrizes voltadas à minimização de impactos ambientais.

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Nesse sentido, vale mencionar as principais observações relativas às licitações e contratações


no âmbito dos Tribunais Regionais do Trabalho feitas pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho
(2014, p. 6), as quais podem servir de base para a prática diária de cada servidor:
Preferência por produtos de baixo impacto ambiental; Não geração, redução, reutilização, reci-
clagem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição final ambientalmente adequada
dos rejeitos; Preferência para produtos reciclados e recicláveis, bem como para bens, serviços e
obras que considerem critérios compatíveis com padrões de consumo social e ambientalmente
sustentáveis (Lei 12.305/2010); Aquisição de produtos e equipamentos duráveis, reparáveis e que
possam ser aperfeiçoados; Adoção de procedimentos racionais quando da tomada da decisão de
consumo, observando-se a necessidade, oportunidade e economicidade dos produtos a serem
adquiridos; Nas aquisições e locações de imóveis, deve ser dada preferência a imóveis que aten-
dam aos requisitos de acessibilidade previstos na NBR 9050 da ABNT, de forma a assegurar o
direito de ir e vir das pessoas com deficiência e com mobilidade reduzida. (STJ 2014, p. 6).

A partir destas diretivas, necessário implantar a logística adequada de descarte de resíduos, ex-
plicando o método mais sustentável para todo o grupo que trabalha no órgão ou presta algum serviço.
Deste modo, a apresentação tem início com a estimativa de resíduo produzida, desde a produção
por seus geradores (servidores), com base na força de trabalho total e período de trabalho (horas).
Posteriormente, indica-se a segregação por meio de ilhas de lixeiras de recicláveis (plástico, papéis,
metais e vidros) e não recicláveis (orgânicos) em gabinetes, corredores e áreas abertas. Após, a coleta
seletiva é realizada por agentes terceirizados, mediante a retirada do lixo com uso de equipamentos de
segurança e o acondicionamento em sacolas plásticas apropriadas.
Sobrevém o armazenamento temporário em lixeiras maiores (de uso externo), sendo vedada a
acumulação de resíduos de qualquer natureza, nas unidades do Poder Judiciário. Ademais, deve-se
evitar sacos plásticos frágeis para o acondicionamento do material, além disto, containers e lixeiras
maiores devem permanecer dentro do terreno do órgão judiciário.
Por fim, na ocasião da destinação final (ciclo externo), os resíduos serão coletados, periodica-
mente, por caminhões particulares ou da própria prefeitura da comarca, depois levados até o ambiente
adequado, em aterro.
Todavia, segundo o relatório elaborado pela Comissão de Gestão Socioambiental do TJPR
(2017) e o guia construído pelo CSJT (2014), deve ser evitada a geração de resíduos ou promovida a
sua redução, estabelecendo uma divisão entre áreas de serviço, bens e materiais utilizados, e mais, a
integração com técnicas de ecologia industrial.
As técnicas de ecologia industrial seriam as seguintes: a “Logística Reversa”, “Reuso, “Recicla-
gem” e o “Ecodesign de produtos”. A Logística Reversa constitui método que possibilita o retorno
de bens e materiais constituintes do ciclo produtivo ou de negócios (LEITE, 2003, p. 17), tais como
papel, plástico e isopor. Já o Reuso, é a reutilização adequada do material utilizado durante a cadeia
de fabricação do produto, enquanto a Reciclagem indica o seu reaproveitamento, após o desfrute
pelo consumidor final. Enfim, o Ecodesign trata de projetos de produtos que economizem materiais
constitutivos e suas embalagens, a partir da ergonomia, controle de energia e durabilidade do material
(SILVA; MORAES; MACHADO, 2015).
De mais a mais, sobre a aquisição de bens de consumo e materiais permanentes, devem ser
comprados, por exemplo, produtos biodegradáveis, recicláveis, atóxicos e reutilizáveis, materiais com
as devidas certificadoras do IBAMA (fabricados com madeira), da ANVISA (com fórmula química)
e que atendam as normas técnicas da ABNT, garantindo a economicidade, a qualidade, resistência,
utilidade e a segurança dos materiais. Outrossim, deve ser possível a reutilização de materiais, como
blocos de rascunho.
Quanto aos materiais de limpeza, importante observar produtos menos agressivos ao meio
ambiente, concentráveis, de embalagens recicladas ou recicláveis, armazenados em refil, além de pos-
suírem composição química sem prejuízo à saúde dos servidores e ao ecossistema.
Acerca dos gêneros alimentícios, do material de copa e cozinha, menciona-se a aquisição de
produtos sem agrotóxicos, inclusive com a certificadora de item orgânico, para mais, a utilização de
copos e xícaras de material durável, respectivamente: vidro, cerâmica ou aço escovado, substituindo o

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Poder judiciário e meio ambiente: uma gestão judiciária sustentável

uso intensivo do copo plástico descartável. Mais que isto, promover a utilização de copos descartáveis
à base de material não poluente (amigo de milho e/ou papelão).
No tocante às peças mobiliárias, estas devem estar em conformidade com as Normas Brasileiras,
para garantir a segurança, ergonomia e boa utilização de cadeiras, poltronas, mesas, armários, estações
de trabalho, divisórias e móveis em madeira (com certificação de procedência da madeira pelo IBAMA).
Acerca dos materiais perigosos, as recomendações são estabelecidas conforme a natureza do
produto, quais sejam: lâmpadas; pilhas e baterias; e cartuchos e toners. A escolha dos produtos deve
estar voltada a economicidade e durabilidade (por exemplo, lâmpadas LED), fora isto, todos devem
ser recolhidos e descartados de forma e ambiente adequados, com a possibilidade de reutilização, rea-
proveitamento e da logística reversa.
A respeito dos equipamentos de tecnologia da informação e comunicação, as diretrizes dos ór-
gãos judiciários destacam, novamente, a escolha de maquinários que possam ser atualizados ao longo
do tempo, com a operacionalização e recolhimento sustentáveis, como a impressão de modo frente e
verso. Evitando, ainda, a aquisição de equipamentos de composição química perigosa.
Para os contratos de serviços, o guia aponta a necessidade de treinamento de funcionários, a
utilização dos equipamentos de segurança, a implantação de programas de saúde ocupacional, o uso
adequado de recursos naturais, o emprego de produtos recicláveis e atóxicos, com posterior coleta e
separação. As recomendações são indicadas para os seguintes serviços contratados: mão de obra geral;
limpeza e conservação; restaurante; copa; jardinagem; e dedetização.
Ressalta-se, também, que as diretrizes de sustentabilidade são destinadas para obras e serviços
de engenharia, área que engloba desde o estudo de viabilidade técnica, o campo de obra, constru-
ção de novos prédios, a manutenção, reformas, ampliação e até mudanças de utilização. Mais ainda,
destaca-se que as principais recomendações recaem sobre a flexibilidade das instalações (gabinetes,
corredores, salas de julgamento e outras, demais áreas internas e externas), a acessibilidade para toda
a população, a ventilação natural, eficiência energética, bem como o uso de tinta de maior absorção
de raios solares.
Quer dizer, o desenvolvimento sustentável inicia-se pelos projetos de engenharia, passando
pelas instalações hidrossanitárias (torneiras com temporizador), projetos elétricos e de iluminação
(sensor de presença), climatização (número razoável de janelas) e urbanização, alcançando as reais
condições de trabalho (ambientes saudáveis, sem insalubridade e periculosidade).
Para fomentar a sustentabilidade no âmbito judiciário existem certificações, de validade anual,
e os inventários socioambientais para as unidades do órgão, como utiliza o TJPR, com a finalidade de
reconhecer os setores que cumprem as diretrizes ecológicas, além de promover os membros do Poder
Judiciário.
Além disto, é de suma importância o credenciamento de cooperativas de catadores, com vistas
à destinação ambientalmente adequada e à promoção social, e mais, promover a vida útil aos aterros
sanitários, à economia de recursos públicos para destinação de resíduos e a preservação de recursos
naturais.
Diante de todos estes modelos de sustentabilidade implantados no TJPR e no TRT, percebe-
se a relevância das ações praticadas e fomentadas em favor da ecologia dentro do Poder Judiciário,
contribuindo para o real desenvolvimento equilibrado do ecossistema. Afinal, através da estrutura
institucional e da cooperação entre todos os seus membros, é possível tornar o ambiente natural saio
e resguardar a qualidade de vida de todas as gerações.
Em outras palavras, o indivíduo, no panorama de crise ecológica versus realização de vantagens
pessoais, deve optar pela via de benefícios à coletividade, saindo do estado de inércia e conformismo,
visto que é um dos atores social. Logo, é seu dever, como ser em sociedade, modificar seu posiciona-
mento ambiental, priorizando a ciência dos profundos impactos naturais frutos do egoísmo e do lucro
desmedido.
Este cenário remonta ao denominado “Dilema do Prisioneiro” (EPSTEIN, 1995, p. 151-154)
– jogo em que os participantes devem escolher uma estratégia mútua, mais de uma vez, com a lem-
brança dos seus encontros prévios, tendo ciência de que uma escolha interfere na outra, podendo

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expandir a dependência de sua decisão para apenas um indivíduo ou para a sociedade inteira -, pois,
à vista deste recente embate, o homem, em determinado momento, passa a refletir sobre a opção mais
adequada e justa entre: benefícios pessoais e práticas sustentáveis. Com isto, é de se esperar a decisão
pelo agir ecologicamente correto, isto é, vantajoso ao coletivo.
Assim sintetiza Ricardo Barbosa Lima e Maria das Graças Rua (2003, p. 74):
No que se refere às questões ambientais, essa densidade analítica é muito bem-vinda. Principal-
mente diante do que chamamos, aqui, de dilema ambiental: a situação na qual, ao seu reconhe-
cido atrativo e capacidade de mobilizar a adesão global, multifacetada e multisetorial, se contra-
põe, em muitas ocasiões, a baixa efetividade da participação dos atores sociais na resolução do
problema. Ou, em termos de dilema do prisioneiro, o reconhecimento da plena capacidade de
fazer escolhas racionais e agir consistentemente com as mesmas não basta para evitar compor-
tamentos cujas previsíveis consequências, individual e coletivamente, mostram-se desastrosas.
(RUA, 2003, p. 74)

Vale dizer, cada membro social deve optar, dentro de uma lógica de estratégias, o caminho da
solidariedade, o comportar-se racionalmente e para o coletivo, afastando-se de benefícios individuais
de curto prazo e de desfrute imediato. Mais que isto, o importante é não agir de forma acertada tão
somente na esfera pessoal, mas fomentar a conduta sustentável em pessoas e grupos próximos, cons-
truindo um desenvolvimento sustentável a partir da ação coletiva concreta.
Nesse sentido explica Isaac Epstein (1995, p. 160):
Muitos problemas, como proteção do meio ambiente, conservação dos recursos naturais, con-
trole da natalidade entre outros - e particularmente entre nós, a questão premente da distribui-
ção iníqua da renda nacional, demandam de imediato um esforço comum dos mais privilegiados
em favor dos despossuídos, mas que no futuro poderá beneficiar a todos. O desafio é induzir as
pessoas a contribuírem para causas comuns quando as ações egoístas trazem maiores benefícios
individuais e imediatos. Em resumo, esses dilemas sociais envolvem grupos de pessoas tentando
conseguir benefícios comuns na ausência de coerção externa, ou mesmo crenças introjetadas.
(EPSTEIN, 1995, p.160)

Portanto, a pretensão recai no abandono da falsa noção de que a responsabilidade pelo equilí-
brio ecossistêmico está nas mãos de terceiros, ou do avanço tecnológico e científico, é indicar que cada
um é encarregado da redução de novos prejuízos ambientais e de minorar os efeitos do aquecimento
global. A propósito, é deixar de acreditar que o aquecimento global não é palpável, logo, não é nocivo
a todos os seres, como descreve o “Paradoxo de Giddens” (MARTINS, 2011, p. 239).
Trata-se de tomar uma postura de ação afirmativa, enquanto há tempo, não esperando que seja
tarde demais para iniciar as trajetórias de reversão do panorama ambiental.
Nesta linha, Anthony Giddens (2009) sugere que para a concretização do lema do desenvolvi-
mento sustentável seja adotada uma política de mudança climática institucional, em que o “Estado
assegurador” seja visto como um agente facilitador, garantindo a confiança de instituições e dirigentes
de outros Estados no que diz respeito ao cumprimento de metas e manutenção dos acordos de médio
e longo prazo necessários a política de mudança climática (MARTINS, 2011, p.241).
Destarte, no âmbito deste modelo de Estado, cada servidor, deve ingressar em práticas de coo-
peração universal, de figurar como “ecomultiplicador”, distanciando-se do autointeresse, de curto
prazo, que, em regra, conduz à autodestruição. Melhor dizer, significa inserir no cálculo das ações
individuais os recursos implicados no planejamento de longo prazo que a política climática requer
(MARTINS, 2011, p. 241).
Enfim, é nestes moldes que a cultura dos órgãos do Poder Judiciário deve ser fixada, quer apontando
o devido comportamento ecológico no interior da instituição, quer repercutindo a orientação de varas e
tribunais, além de propagar e aprimorar diretrizes e técnicas específicas de ecologia sadia e equilibrada.
Como resultado disto, os efeitos positivos não serão só evidenciados nas instituições judiciárias,
considerando que para o bem-estar no trabalho e o sucesso das atividades próprias do órgão serão
atingidas a partir do resguardo do meio ambiente e da saúde dos indivíduos, mas também beneficiará
o mundo externo, caso atendido às diretrizes constantes em guias de sustentabilidade, como os exem-
plos citados, no presente artigo.

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5 Conclusão

Ante o exposto, resta evidenciado um cenário marcado pelo embate entre impactos ecológicos e
a sustentabilidade ambiental emergente, reflexos do processo de globalização, do avanço tecnológico
e do crescimento econômico, em contraponto à sociedade do risco e à conscientização do agir ecolo-
gicamente correto.
Nesta toada, conclui-se pela relevância da atuação do Estado, das pessoas jurídicas e dos in-
divíduos, em conjunto, na colaboração para a construção de um meio ambiente ecologicamente
equilibrado, garantindo, assim, a qualidade de vida desta geração e das futuras, como preconiza os
artigos 225, caput, e 170, inciso VI, ambos da Constituição Federal.
Quanto ao papel do Estado, especificamente, dos órgãos do Poder Judiciário, observa-se a
necessidade da cultura e das atividades em prol do desenvolvimento sustentável promovidas na sua
estrutura, influenciando as práticas cotidianas de todos seus membros, afinal é acentuada a quantida-
de de resíduos produzidos, diariamente, no interior de varas, seções e tribunais.
Neste panorama, a adoção de uma gestão judiciária sustentável no interior das instituições tem
especial utilidade, uma vez que demonstra o comprometimento e a responsabilidade ambiental com-
partilhada entre servidores, estagiários, juízes e colaboradores. Assim, a gestão judiciária adequada
somente terá efetividade desde que empregadas técnicas de ecológica ambiental, específicas para a
redução ou a eliminação de resíduos, bem como para a devida destinação final dos rejeitos. Ademais,
é de grande valia o incentivo de práticas sustentáveis a cada membro, em atuações individuais, e
mais, a realização de licitações sustentáveis, a capacitação para uso racional de bens públicos e re-
cursos naturais, bem como a colaboração de todos os indivíduos como “ecomultiplicadores” de ações
equilibradas.
Enfim, todo este conjunto de diretrizes e técnicas demonstrará o comprometimento dos órgãos
judiciários frente à crise ambiental estabelecida, de forma a afastar os interesses pessoais egoístas e
a conduta apática de cada indivíduo. Por conseguinte, será possível a contribuição, dia a dia, para a
construção de uma sociedade, livre, justa e solidária, a partir da proteção de um ecossistema sadio.

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Como citar este artigo (ABNT/NBR 6023:2018):


GUARAGNI, Fabio Andre; BARROS, Ellen Galliano; KNOERR, Fernando Gustavo. Poder judiciário e meio ambiente:
uma gestão judiciária sustentável. Revista da Faculdade de Direito da FMP, Porto Alegre, v. 14, n. 1, p. 76-86, 2019.
Disponível em: https://revistas.fmp.edu.br/index.php/FMP-Revista/article/view/120.

Revista da Faculdade de Direito da FMP, Porto Alegre, v. 14, n. 1, p. 76-86, 2019. 86

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