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André Henrique Rosa

Leonardo Fernandes Fraceto


Viviane Moschini-Carlos
Organizadores
M514 Meio ambiente e sustentabilidade [recurso eletrônico] /
Organizadores, André Henrique Rosa, Leonardo Fernandes
Fraceto, Viviane Moschini-Carlos. – Dados eletrônicos. –
Porto Alegre : Bookman, 2012.

Editado também como livro impresso em 2012.


ISBN 978-85-407-0197-7

1. Meio ambiente. 2. Sustentabilidade. I. Rosa, André


Henrique. II. Fraceto, Leonardo Fernandes. III. Moschini-
Carlos, Viviane.

CDU 502-022.316

Catalogação na publicação: Natascha Helena Franz Hoppen CRB10/2150


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Saúde e meio ambiente
MARCELA PELLEGRINI PEÇANHA, NOBEL PENTEADO DE FREITAS,
ROBERTO WAGNER LOURENÇO, MARIA RITA DONALISIO CORDEIRO,
RICARDO CARLOS CORDEIRO e MARIA APARECIDA VEDOVATO

Objetivos do capítulo

A necessidade de enfrentamento das alterações ambientais e de seus efeitos sobre


a saúde humana e a compreensão de que a promoção da saúde só se dá em um
ambiente equilibrado, consolida a importância da Saúde Ambiental. Isso exige que
se busque, por meio de políticas públicas, articular, estruturar, instrumentalizar as
distintas esferas envolvidas, favorecendo o aprofundamento de estudos que auxi-
liem a compreensão da dinâmica do binômio ambiente-saúde e o desenvolvimento
de ações corretivas e preventivas. É urgente que fique claro que os desafios dos
profissionais da área de saúde e de meio ambiente devem focalizar um só caminho,
o do esforço para manter um ambiente saudável no qual todos os seus elementos
interajam de forma equilibrada e em harmonia. Para isso, é preciso investir na for-
mação de equipes integradas e com visão sistêmica capaz de executar um trabalho
contínuo de investigação, com novas ferramentas que subsidiem ações eficientes
de gestão ambiental e a consequente promoção de saúde, buscando a reafirmação
do valor da vida e da equidade para todos os seres humanos.

A SAÚDE E A AÇÃO DO tos e assimilá-los retornando ao equilíbrio.


HOMEM SOBRE O AMBIENTE A capacidade de assimilar essas alterações é
denominada capacidade de suporte. Quan-
A vida de todos os seres vivos causa altera- do a intensidade das alterações provoca o
ções no meio ambiente. Estas podem ser al- desequilíbrio do ecossistema, e este não re-
terações químicas, físicas e até biológicas, torna ao estágio de equilíbrio, isso significa
cuja extensão depende da sua intensidade e que a capacidade de suporte desse ecossiste-
frequência. O crescimento populacional in- ma foi superada.
tensifica as alterações localmente e faz com O Relatório Planeta Vivo, publicado
que possam ser amplificadas até atingir pela WWF em 2008, indica que a pegada
efeitos ecossistêmicos. Essas alterações in- ecológica do homem hoje chegou a 2,7 hec-
terferem na dinâmica dos ecossistemas e tares globais por pessoa. De acordo com
podem ser neutralizadas pela capacidade esse indicador de sustentabilidade, isso sig-
que o ambiente tem de receber esses impac- nifica que o homem necessita em média de
156 Rosa, Fraceto e Moschini-Carlos (Orgs.)

2,7 hectares da superfície terrestre para for- vem ocupando os ambientes, resultante do
necer os subsídios para manutenção da sua modelo de desenvolvimento adotado e não
vida e para receber os resíduos provenientes apenas do número de habitantes na face da
de seu consumo. Considerando-se que a Terra. Esse modelo foi edificado sobre a
área disponível hoje, per capita, é de 2,1 crença de que a sociedade deve ter como
hectares, fica evidente que a necessidade meta o aumento contínuo e ilimitado da
por recursos naturais para suprir as ativida- produção e o crescimento econômico a
des humanas e a área necessária para rece- qualquer custo, mesmo que esse custo seja
ber os resíduos dessas atividades, já superou social ou ambiental. A consolidação do mo-
a capacidade do nosso planeta. A pegada delo capitalista repercute praticamente em
ecológica de países como os Estados Unidos todas as esferas das sociedades atuais, o que
chega a 9,4 hectares. Se toda a população engloba os aspectos não só do trabalho, mas
mundial apresentasse esse padrão, seriam da saúde e do meio ambiente. O avanço
necessários mais de 4 planetas Terra para científico e tecnológico corroborou para
suprir as necessidades das pessoas. O cresci- essa postura fortalecendo a falsa ideia de
mento demográfico intensifica esses impac- que o homem pode dominar a natureza e
tos, mas este não é o determinante dessa explorá-la de acordo com os seus objetivos
crise ambiental. O mesmo relatório indica a imediatos, como se não fôssemos parte in-
emissão de CO2, proveniente da queima de tegrante desse cenário e, portanto, sujeitos
combustíveis fósseis, nossa principal matriz às consequências dessa intervenção tecno-
energética, como o componente que mais lógica, contínua e intensiva na natureza. A
influencia a pegada ecológica mundial. Por- Figura 7.1 mostra o intensivo avanço da ur-
tanto, fica evidente que o grande desafio a banização sobre as matas e cursos da água
ser enfrentado é a forma como o homem provocando diversos processos que levam à

Figura 7.1
Avanço da urbanização sobre áreas naturais.
Meio ambiente e sustentabilidade 157

poluição das águas, à contaminação, ao as- 1320, que teria perdurado cinco anos. A aná-
soreamento e à erosão dos solos. lise desse evento exemplifica a consequên­­cia
Os efeitos dessas intervenções se vol- para o próprio ser humano da ação humana
tam para o próprio homem. A história sobre o ambiente.
apresenta uma série de eventos que afeta- O avanço tecnológico permitiu e exi-
ram significativamente a vida da humani- giu a amplificação e intensificação da com-
dade como consequência da própria ação plexidade dos efeitos da ação do homem
antrópica sobre o meio. Essa afirmação sobre o meio ambiente. A falta de conheci-
pode ser ilustrada com a análise de uma das mento da rede que conecta os elementos
doenças mais devastadoras da história, a ambientais não permitiu ao homem a com-
peste negra. Trata-se de uma doença cujo preensão imediata dessas consequências.
agente etiológico, a Yersinia pestis, é uma No entanto, o impacto de alguns eventos e a
bactéria transmitida pelas pulgas que contribuição de alguns trabalhos ajudaram
podem infestar ratos e se disseminar pelo essa compreensão. Na década de 1960, a pu-
ambiente por meio deles. Os ratos prolife- blicação do livro “Primavera Silenciosa”, da
ram atraídos pela oferta de alimentos no cientista Rachel Carson, chamou definitiva-
lixo (Figura 7.2). Portanto, o crescimento mente a atenção para a extensão dos efeitos
de centros urbanos favoreceu a infestação da introdução de pesticidas e inseticidas
por ratos e, consequentemente, a ocorrên- sintéticos, como o DDT no ambiente. Essa
cia da doença. Várias pandemias dessa do- publicação, aliada a uma série de publica-
ença já foram registradas. Estima-se que em ções anteriores que já apontavam para os
uma delas, a peste urbana, tenha dizimado efeitos dessas substâncias no ambiente,
30% da população europeia, causando 25 comprovou a necessidade da avaliação glo-
milhões de mortes na pandemia iniciada em bal dos efeitos de agentes químicos antes de

Figura 7.2
Áreas de acumulação de lixo propiciam a proliferação de doenças.
158 Rosa, Fraceto e Moschini-Carlos (Orgs.)

autorização para o seu uso indiscriminado. Foi também em 1956, no Japão, que
A divulgação dessas informações sensibili- ocorreram inúmeras mortes decorrentes da
zou as pessoas e influenciou mudanças das contaminação da Baía de Minamata por
políticas de aprovação e normas para a uti- mercúrio. Estima-se que cerca de 3 mil pes-
lização desses compostos. Posteriormente, soas possam ter sido vítimas dessa contami-
inúmeras ocorrências mostraram direta- nação decorrente da atividade industrial
mente os efeitos da contaminação ambien- local que causava uma neuropatia. Além do
tal sobre o equilíbrio dos ecossistemas e es- homem, a contaminação vitimou também
pecificamente sobre a saúde humana. Al- outros animais, como peixes, polvos, pássa-
guns eventos mostraram essa associação em ros e animais domésticos. Apenas em 1969,
função da abrangência e do caráter agudo a Chisso-Minamata, indústria de fertilizan-
de seus efeitos. Podemos citar fatos marcan- tes responsável pela contaminação, foi pro-
tes como o lançamento das bombas atômi- cessada, sendo que a região foi considerada
cas em agosto de 1945 em Hiroshima e em livre da contaminação apenas em 1997.
Nagasaki, com cerca de 200 mil mortos e A atividade industrial pode ser rela-
inúmeras pessoas com sequelas dos efeitos cionada a vários outros eventos como o aci-
imediatos ou tardios. dente de Bhopal, na Índia, em 1984, com o
Em 1948, 43% da população de Do- vazamento de cerca de 40 toneladas de gases
nora, centro siderúrgico da Pensilvânia, nos tóxicos de isocianato de metila da produção
EUA, adoeceram, sendo que 20 dessas pes- de agrotóxicos da Union Carbide. Embora a
soas morreram após a ocorrência de um ne- literatura apresente diferentes números, es-
voeiro sulfuroso. Em dezembro de 1952, em tima-se que o acidente tenha causado a
Londres, berço da Revolução Industrial morte imediata de 2.800 pessoas por quei-
movida a carvão, condições atmosféricas maduras e sufocamento e a intoxicação de
favoreceram a formação de um smog extre- outras 200 mil, caracterizando, assim, a
mamente tóxico que causou a morte ime- maior catástrofe da indústria química. Iro-
diata de 445 pessoas, chegando posterior- nicamente, o isocianato de metila é utiliza-
mente a mais de 4 mil óbitos em decorrência do na fabricação de carbonatos, produzidos
de complicações circulatórias e respira­tórias. em substituição aos organoclorados como
Essas foram, talvez, as primeiras manifesta- o DDT.
ções da poluição industrial urbana a desen- A busca pela diversificação das matri-
cadear a percepção desses efeitos e as ações zes energéticas envolve a utilização da ener-
de controle, como a Lei do Ar Puro em gia nuclear. Nesse caso, também há registros
1956, em Londres, quando foram estabele- de acidentes em decorrência do efeito dele-
cidos limites para emissão de poluentes e os tério que a radioatividade pode causar nos
níveis aceitáveis de qualidade do ar. A partir seres humanos. Em 26 de abril de 1986,
daí, novas leis foram aprovadas na América ocorreu o acidente nuclear de Chernobyl,
do Norte, como o “Clean Air Act” nos EUA, na Ucrânia. Os relatórios locais citam 4 mil
em 1970, ano da criação da Agência de Pro- mortes diretas ou de áreas adjacentes por
teção Ambiental Americana, a EPA, e em di- exposição direta à radiação, bem como as
versos países da Europa Ocidental e no próprias equipes de socorro, além dos nas-
Japão, propiciando a criação de agências cidos com sequelas decorrentes dos efeitos
para monitorar, regulamentar e avaliar a teratogênicos da radiação. Na ocasião, foi li-
qualidade ambiental nesses países. É dessa berada uma radiação aproximadamente 90
década também a criação, no Brasil, da vezes maior que a das bombas de Hiroshi-
SEMA, Secretaria Especial de Meio Am- ma e Nagasaki. A nuvem nuclear que atin-
biente. giu a Europa contaminou milhares de qui-
Meio ambiente e sustentabilidade 159

lômetros de florestas e causou doenças em ção do petróleo como principal matriz ener-
mais de 40 mil pessoas. gética não traz apenas consequências em
No ano seguinte, em 10 de setembro de função da emissão de CO2, mas também em
1987, no Brasil, ocorreu o acidente com o função da contaminação das águas dos ocea-
Césio-137 na cidade de Goiânia. O desman- nos pelos inúmeros derramamentos aciden-
che de um equipamento de radioterapia em tais e operacionais decorrentes do transporte
um ferro velho da cidade e a posterior viola- desse tipo de produto. Em março de 1989, o
ção de uma cápsula contendo Césio-137 ex- petroleiro Exxon Valdez colidiu com rochas
puseram várias pessoas à radioatividade. A submersas na costa do Alasca e deu início ao
exposição direta levou 4 dessas pessoas a mais danoso derramamento de óleo por um
óbito cerca de um mês depois e outras 60 navio. O saldo do despejo foi de 40 milhões
pessoas em seguida. Mais 628 pessoas se con- de litros de óleo, com 100 mil aves mortas e 2
taminaram pelas ações de atendimento aos mil quilômetros de praias contaminadas. O
expostos e remoção do material. A Associa- problema se agravou porque o frio prolonga
ção de Vítimas do Césio-137 estima que o período de biodegradação. Apesar da lim-
cerca de 6 mil pessoas tenham sido contami- peza, que mobilizou 10 mil pessoas, cerca de
nadas, sendo que, mesmo após mais de 20 2% do petróleo que vazou continua poluin-
anos do acidente, uma centena de pessoas do a costa da região. A partir desse acidente,
dependem do recebimento de medicamen- foram criados protocolos de conduta utiliza-
tos para tratamentos dos efeitos crônicos ad- dos em posteriores situações semelhantes. A
vindos da exposição. Figura 7.3 mostra a expansão da emissão de
As regiões costeiras e sua população, CO2, principal gás de efeito estufa a partir do
também já foram muito castigadas. A utiliza- século XIX.
ppmv

Ano
Figura 7.3
Gráfico da evolução do CO2.
160 Rosa, Fraceto e Moschini-Carlos (Orgs.)

EVOLUÇÃO DA PERCEPÇÃO favorecidos economicamente e a saúde des-


DA PROBLEMÁTICA tes como principais vítimas das consequên-
cias do desequilíbrio ambiental. Os riscos
AMBIENTAL
associados aos processos de produção e de
consumo da sociedade e a consequente de-
Alguns eventos internacionais geraram do- gradação ambiental e agravos à saúde são
cumentos norteadores que podem ser distribuídos espacial e socialmente de for-
apontados como marcos políticos. A partir ma desigual.
desses eventos, a sociedade iniciou uma Em 1987, a publicação do documento
mudança de paradigmas, apontando para a “Nosso Futuro Comum”, Relatório da reu-
necessidade de desregulamentar a ação dos nião da Comissão das Nações Unidas para o
agentes econômicos sobre o meio ambiente. Desenvolvimento Sustentável, ocorrida em
Durante muitos anos, o desenvolvimento Oslo, na Noruega, apontou para o modelo
econômico decorrente da Revolução Indus- de Desenvolvimento que contemplasse o
trial impediu que os problemas ambientais princípio de solidariedade entre as gera-
fossem considerados com a devida impor- ções, visando ao compromisso com esta e as
tância. Embora a poluição e os impactos futuras gerações, ou seja, um desenvolvi-
ambientais do desenvolvimento desordena- mento solidário e sustentável.
do fossem visíveis, os benefícios proporcio- Os documentos gerados na Conferên-
nados pelo progresso sempre foram usados cia das Nações Unidas para o Meio
como justificativa para manutenção desse Am-biente e o Desenvolvimento (Rio-92),
modelo em detrimento da atenção às ques- pre-conizam o direito a um ambiente
tões ambientais. O relatório do Clube de sadio, que proteja a saúde, o bem-estar e
Roma, “Limites ao crescimento”, já aponta- os valores culturais. A Agenda 21,
va para restrições à forma de crescimento programa de ações para o século XXI,
decorrente do esgotamento de certos recur- em seu Capítulo 6 – seção I – já
sos naturais e da contaminação ambiental reconhecia a saúde ambiental como
associada aos processos produtivos e forma prioridade social para a promoção da
de ocupação do ambiente. saúde.
A Conferência das Nações Unidas
sobre o Meio Ambiente Humano em 1972
(Estocolmo – Suécia) já reforçava a necessi-
dade de medidas que coibissem a acelerada
degradação do meio ambiente e suas possí-
veis consequências sobre a saúde humana.
Foi prevista a intensificação e ampliação
das ações do Estado na conservação e prote-
ção do meio ambiente, e esse é visto não só
em relação às questões associadas à gestão
da vida selvagem, conservação do solo e am-
biente aquático, mas contemplando tam­bém
as questões relativas à inserção social e inse-
rindo as questões ambientais na agenda da
política nacional e internacional. Fica explí-
cita a íntima relação entre as questões am-
bientais e a pobreza, que coloca os menos
Esta página foi deixada em branco intencionalmente.
16
Gestão ambiental
GERSON ARAUJO DE MEDEIROS, LUCILIA DO CARMO GIORDANO
e FABIO AUGUSTO GOMES VIEIRA REIS

Objetivos do capítulo

A gestão ambiental vem assumindo uma importância e repercussão crescentes como


uma resposta à demanda da sociedade contemporânea pela incorporação do para-
digma da sustentabilidade em todas as etapas das atividades antrópicas. Nesse sen-
tido, o presente capítulo se propõe a explorar as diferentes visões e conceituações
relacionadas à gestão ambiental, desde um contexto territorial até uma abrangência
voltada ao meio empresarial. Inicia-se com uma apresentação de conceitos relaciona-
dos à gestão ambiental e sua interface e complementaridade com o planejamento
ambiental. Em seguida, discutem-se a gestão ambiental territorial brasileira, os as-
pectos legais envolvidos e as suas principais abrangências como a gestão dos recur-
sos hídricos e bacias hidrográficas, a gestão da zona costeira, a gestão urbana e o
zoneamento ecológico e econômico. Finalmente, aborda-se a gestão ambiental em-
presarial, na qual é abordado o sistema de gestão ambiental e a série de normas da
ISO 14000, especialmente a ISO 14001, e outros modelos como a Produção Mais
limpa, a Ecoeficiência, a Produção Limpa e a Rotulagem Ambiental.

CONCEITOS GERAIS exemplo, a manutenção do ciclo hidrológi-


co, tão essencial para toda a bioesfera e para
O homem está em um momento de sua os processos do meio físico, o qual pode ser
história evolutiva em que é necessária afetado pelos lançamentos de gases contri-
uma mudança de paradigma a respeito da buintes para o efeito estufa, alterando a
sua inter-relação com o meio ambiente e quantidade e localização de precipitações,
seu uso, pois os recursos naturais não são bem como pelo desmatamento e uso do
mais capazes de manter a sustentabilidade solo agrícola sem proteção a processos ero-
dos ecossistemas e, ao mesmo tempo, su- sivos, que afetam a velocidade de escoa-
prir a demanda cada vez mais intensa de mento superficial, diminuindo a capacida-
consumo imposta pelos padrões da vida de de infiltração de água no solo e em de-
moderna. corrência a sua capacidade de manutenção
Entende-se que os recursos naturais e reposição de água em cursos fluviais.
podem ser utilizados desde que não se cesse Esses serviços ambientais ou ecossis-
a capacidade do ambiente de continuar têmicos são aqueles promovidos natural-
provendo serviços ambientais, como, por mente na Terra e pelos quais o homem não
376 Rosa, Fraceto e Moschini-Carlos (Orgs.)

paga, e que sem eles dificilmente a vida no mum) ou ainda por ambos (situação mais
planeta poderia ser mantida. desejável). A gestão ambiental encontra na
Contudo, diversos problemas am- legislação, na política ambiental e em seus
bientais ocasionados por essa atuação an- instrumentos e na participação da socieda-
de suas ferramentas de ação.
trópica irresponsável sobre o ambiente são
computados diariamente, gerando poluição
da água e do ar, passivos ambientais, degra- Entretanto, existem autores que esta-
dação da paisagem, problemas de saúde, belecem a definição de Gestão Ambiental
doenças infectocontagiosas, entre outros. com um enfoque mais empresarial, como é
Essa situação tem produzido um cres- o caso de Valle (2009), que conceitua o
cimento dos custos econômicos e sociais termo como um conjunto de medidas e
decorrentes desses problemas ambientais procedimentos bem definidos que, se ade-
que ceifam recursos financeiros e poderiam quadamente aplicados, permitem reduzir e
ser utilizados em prol da melhoria da quali- controlar os impactos introduzidos por um
dade de vida da população. empreendimento sobre o meio ambiente.
Assim, a Gestão Ambiental é uma prá- Um dos maiores pontos de divergên-
tica que vem se desenvolvendo de forma cia observados na bibliografia do assunto
considerável nas últimas décadas, como re- está na diferenciação entre: “Planejamento
sultado da necessidade de adequação a essa Ambiental” e “Gestão Ambiental”. Muitas
nova forma de pensar em desenvolvimento vezes esses termos são utilizados com signi-
e produção de bens de consumo, circuns- ficados um do outro, ou então, o primeiro
crita pelo desenvolvimento sustentável. com enfoque de realizações públicas, e o se-
O conceito de desenvolvimento susten- gundo associado às práticas ambientais rea-
tável foi apresentado, inicialmente, na obra lizadas no setor privado, principalmente re-
intitulada Nosso Futuro Comum, elaborada lacionados às indústrias.
pela Comissão Mundial do Ambiente e De- Por definição, planejar significa elabo-
senvolvimento. Esse novo paradigma de de- rar (em etapas e com bases técnicas) plano e
senvolvimento, ratificado na Conferência programas com objetivos definidos, ao
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento passo que gestão significa o ato de gerir, ge-
Sustentável (Rio 92), se propõe a atender as rência ou administração (Ferreira, 1986).
necessidades da atual geração sem compro- Vargas (2004) define que planejar é
meter o direito das futuras gerações atende- preparar previamente para a ação, enquan-
rem as suas próprias necessidades. to a gestão deve incluir o planejamento e a
Existe ainda muita confusão sobre o implantação das ações propostas, bem co­mo
significado do termo “Gestão Ambiental” e, seu monitoramento para que se possa ga-
da mesma forma, muitos autores têm-lhe rantir que os objetivos sejam alcançados.
atribuído diferentes conceitos. Neste capítu- Assim, pode-se dizer que o planeja-
lo, é adotada uma definição em concordân- mento está inserido no processo de gestão,
cia com Souza (2000), o qual considera que: ou, então, que gestão é o modo de fazer fun-
cionar o planejamento e, da mesma forma,
A gestão ambiental pode ser entendida... pode-se entender que o Planejamento Am-
como o conjunto de procedimentos que biental é parte do processo de Gestão Am-
visam à conciliação entre desenvolvimento
biental.
e qualidade ambiental. Essa conciliação
acontece a partir da observância da capaci-
Santos (2004) descreve um processo
dade de suporte do meio ambiente e das de planejamento composto inicialmente
necessidades identificadas pela sociedade pela Definição de Objetivos, seguida por
civil ou pelo governo (situação mais co­ uma Fase de Inventário, que gera o Diagnós-
Meio ambiente e sustentabilidade 377

tico e consequente Prognóstico, que subsi- plantio da mata ciliar. Esse ciclo avaliado, e
diarão as fases finais de Tomada de Decisão o objetivo considerado alcançado, o próxi-
e Formulação de Diretrizes. mo ciclo então poderia ter o objetivo de di-
Dentro desse conceito, a Gestão Am- minuir a Demanda Bioquímica de Oxigê-
biental pode ser vista como a implantação nio (DBO), com a eliminação do lança-
do Planejamento Ambiental, adicionado mento de efluentes não tratados no curso
ao processo cíclico de retroalimentação em fluvial, a detecção das fontes lançadoras e
que os resultados de um ciclo implantado seu redirecionamento para uma Estação de
servem como subsídio para o início de um Tratamento de Esgoto.
novo ciclo de planejamento, e assim suces- No caso de se observar que os objeti-
sivamente. vos não foram alcançados, o próximo ciclo
Na prática, um exemplo pode ser re- de planejamento poderia propor novas for-
presentado em uma área como uma bacia mas de alcançar os mesmos objetivos. O
hidrográfica onde se pretende melhorar a que não se pode é descontinuar o ciclo, pois
qualidade da água fluvial. o processo deve ter um prazo para avaliação
No primeiro ciclo de planejamento, o que irá gerar novos subsídios para os próxi-
objetivo principal seria a diminuição da mos ciclos.
turbidez da água, com a contenção de pro- A Figura 16.1 ilustra o ciclo e a com-
cessos erosivos pontuais e dispersos e re- posição do processo de Gestão Ambiental.

Figura 16.1
Ciclo e composição do processo de Gestão Ambiental.
378 Rosa, Fraceto e Moschini-Carlos (Orgs.)

Nesse ponto, percebe-se que a Gestão das em empreendimentos e atividades so-


Ambiental pode ser realizada em diversos cioeconômicas.
âmbitos administrativos, incluindo nestes
as esferas públicas e privadas, bem como di-
versas áreas físicas. O que determina o enfo-
que de um processo de gestão é o aspecto
determinante a ser analisado, seja ele um
atributo físico, como o exemplo já citado de
uma bacia hidrográfica, ou alternativamen-
te, o aspecto determinante pode ser repre-
sentado por uma atividade específica como
uma empresa que produz celulose.
Outro aspecto importante a ser ressal-
tado é sobre como o exercício da Gestão
Ambiental pode ser enfocado. Segundo
Bitar e Ortega (1998), existem mecanismos
pelos quais a gestão pode ser realizada, de-
nominados Instrumentos de Gestão Am-
biental, que podem ser divididos em dois
grupos:

a) Instrumentos de Gestão Ambiental de Re-


giões Geográficas Delimitadas: engloban-
do bacias hidrográficas, áreas metropo-
litanas, zonas costeiras, etc.
b) Instrumentos de Gestão Ambiental de
Empreendimentos: englobando rodo-
vias, minerações, hidroelétricas, aterros
sanitários, indústrias, loteamentos, li-
nhas de transmissão, etc.

Concomitantemente ao desenvolvi-
mento da própria experiência de planeja-
mento e gestão, são criados alguns preceitos
sobre como esses processos devem ocorrer,
que podem ser representados por leis espe-
cíficas, normas técnicas, diretrizes de con-
duta, entre outras, formando um arcabouço
de conhecimento acerca de cada área de de-
senvolvimento, propiciando que o processo
de planejamento e gestão se torne cada vez
mais eficiente.
Portanto, o presente capítulo aborda a
Gestão Ambiental de duas formas: aquelas
direcionadas ao gerenciamento territorial
de áreas geográficas delimitadas e as aplica-

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