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COMO NÃO ODIAR UM MARQUÊS

AMORES INDECENTES - 4

MICHAELLY AMORIM

SINOPSE

O Marquês de Winchester vivia feliz com sua vida de solteiro


libertino e não pretendia se casar. Viu de perto sua mãe
definhar por causa das traições do pai e, por saber que em
suas veias corria o mesmo sangue daquele homem,
acreditava que nunca poderia ser fiel a nenhuma esposa e
temia fadar qualquer mulher ao mesmo destino de sua mãe.
Por isso, fugia do casamento como o diabo fugia da cruz.
Mas o rei tinha outros planos para o Marquês e não lhe
restava outra escolha, a não ser, casar-se com Lady Clara
de Catterfield.

Lady Clara de Catterfield, escondia um segredo que podia


ser sua ruína. Há dois anos, ela trabalhava no Rogue’s, um
dos clubes de cavalheiros mais bem-conceituados de
Londres, como a Dama de Copas: a melhor jogadora de
cartas do clube. Sua vida estava perfeita, com o que
adquiria no Rogue’s, ela mantinha a si, sua mãe e seus
irmãos mais novos seguros dos vícios do pai. Mas teria que
abandonar tudo para se casar contra a sua vontade. E, para
piorar sua situação, o seu noivo a ignorava, enquanto
passava as noites flertando com a Dama de Copas.

Copyright © Michaelly Amorim, 2018

Todos os direitos reservados. É proibido o armazenamento,


cópia e/ou reprodução de qualquer parte dessa obra ―
física ou eletrônica ―, sem a prévia autorização do autor.
Esta é uma obra de ficção, qualquer semelhança com
nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido
mera coincidência.

Preparação: Michaelly Amorim

Revisão: Barbara Pinheiro

Capa e diagramação: Michaelly Amorim

2018

1ª Edição

COMO NÃO ODIAR UM MARQUÊS

Série — Amores Indecentes ― Livro 4

© Todos os direitos reservados a Michaelly Amorim

COMO NÃO ODIAR UM MARQUÊS

SINOPSE

PRÓLOGO

CAPÍTULO 1 ― CASAMENTO INDESEJADO

CAPÍTULO 2 ― VISITAS

CAPÍTULO 3 ― COMPENSAÇÃO

CAPÍTULO 4 ― ÓPERA

CAPÍTULO 5 ― PREOCUPAÇÕES

CAPÍTULO 6 ― JANTARES E SEDUÇÕES

CAPÍTULO 7 ― BEIJO
CAPÍTULO 8 ― WILLOW CASTLE

CAPÍTULO 9 ― DESCOBERTAS

CAPÍTULO 10 ― ALICE

CAPÍTULO 11 ― SENTIMENTOS

CAPÍTULO 12 ― DESMASCARADA

CAPÍTULO 13 ― PROPOSTA

CAPÍTULO 14 ― GRETNA GREEN

CAPÍTULO 15 ― SEGREDOS

CAPÍTULO 16 ― ENTREGAS

CAPÍTULO 17 ― CASAMENTO

CAPÍTULO 18 ― ESCÂNDALO

CAPÍTULO 19 ― WILLOW CASTLE

CAPÍTULO 20 ― MAGDALA

CAPÍTULO 21 ― TUDO FICARÁ BEM

EPÍLOGO

PRÓLOGO
14 anos atrás.

A neve caia impiedosamente, cobrindo tudo com um manto


gélido e branco. O vento açoitava as portas e janelas da
mansão Winchester, mas a estrutura espessa conseguia
manter o ar frio do lado de fora.

Gabriel estava encolhido embaixo dos lençóis, odiava o frio.


Sua lareira estava acesa e abastecida de lenha, o suficiente
para mantê-la assim, por horas a fio. A primeira batida na
porta soou abafada e ele quase não ouviu, apesar de estar
acordado. Quando a batida se repetiu, mandou que, quem
quer que estivesse na porta, entrasse.

A senhora Gaiman, sua babá, entrou no quarto e se colocou


ao lado da cama.

— Milorde, sua mãe quer vê-lo.

— Ela está bem? — o menino perguntou, preocupado, se


levantando de imediato. Sua mãe estava doente, já fazia
muito tempo e não se recuperava. E nos últimos dias ela
tivera poucos momentos de lucidez.

— Ela não está bem, mas quer vê-lo... — a criada se


interrompeu, deixando no ar a frase.

— Antes de morrer? — o jovenzinho completou a frase por


ela.

— Vamos vê-la. — A babá o guiou para o quarto da


Marquesa.

Sua mãe estava deitada na cama, sua pele parecia ainda


mais pálida e seus cabelos revoltos deixavam os ossos de
seu rosto magro ainda mais proeminentes. Sua mãe já tinha
sido uma mulher linda e exuberante, com uma vivacidade
acima do normal. Gabriel se aproximou da mãe e pegou a
sua mão frágil e esquelética.

— Meu menino querido. — A Marquesa sorriu ao reconhecê-


lo. — Eu sinto muito, meu filho, mas não poderei ficar mais
com você.

— Eu o odeio. — A criança chorou ao sentir que a mãe


estava se despedindo. — Espero que ele vá para o inferno.

— Não diga isso, meu amor, não cultive o ódio em seu


coração. Eu também o odiei por muito tempo. Apenas
porque o amava demais. Mas de nada adianta odiá-lo, o
ódio só irá consumir você. A apesar de tudo, ele é seu pai.
— Lady Emanuele olhou entristecida para o filho.

— Era ele quem devia estar morrendo, não a senhora, ouvi


o médico dizer à senhora Gaiman que foi ele que deixou a
senhora doente e que ele deve ter contraído de alguma
meretriz.

― O menino enxugou o nariz que escorria com a manga da


camisa ― Ele não devia ter feito isso.

Como pôde fazer isso com a senhora?

— Ele não ama somente a mim, meu amor, não se pode


pedir fidelidade a alguém assim, seu pai nunca soube o que
era ser fiel. Seu pai não sabia amar só uma pessoa. Ele
amava várias ao mesmo tempo. Suas meias-irmãs e seu
meio-irmão estão aí para provar isso.

Gabriel se lembrou de suas irmãs mais novas, irmãs apenas


por parte de pai, filhas que ele tinha tido fora do casamento
e que, apesar de tudo, tinha reconhecido como suas: Cecília
e Alice. Elas eram mais novas do que ele, assim como o
Samuel, seu meio irmão, que era quase da idade dele. Sua
mãe tinha acolhido os três com o coração aberto, mesmo
sabendo que eram resultado da traição do Marquês.

— Quero que cuide dos três. Eles não têm culpa dos erros
de seu pai. Não desconte nelas o pecado de Jonathan — a
Marquesa pediu em um fio de voz. Estava cada vez mais
fraca.

Ficaram um tempo em silêncio e ela estava tão quieta, que


ele temeu que a mãe tivesse partido.

— Mamãe?

— Você se parece tanto com ele. — Emanuele sorriu para o


filho.

— Não sou como ele. Nunca farei o que faz. E não serei um
libertino como ele.

— Meu amor, não é errado viver a vida, eu me apaixonei por


seu pai justamente por isso, ele sabia viver o melhor que a
vida tinha a oferecer, meu erro foi pensar que o amor era
recíproco e que eu seria suficiente para ele quando nos
cassássemos. Você não deve ter medo de viver a vida. Você
é um garoto tão lindo, vai ser um homem maravilhoso, por
onde passar as damas darão suspiros. Não precisa viver
uma vida celibatária, desde que tenha cuidado com quem
se deita.

Aproveite a vida ao máximo e seja feliz. Mas, quando um dia


se casar, mesmo que não ame sua esposa, cumpra seus
votos feitos no altar, assim não condenará ninguém à
mesma dor que agora sinto.

— É uma promessa — Gabriel jurou.

— Eu te amo, meu querido. Nunca se esqueça disso.


— Eu também a amo.

E naquela mesma noite a Marquesa partiu, finalmente,


descansando em paz.

CAPÍTULO 1 ― CASAMENTO

INDESEJADO

Gabriel Campbell Deen Anbrock, o décimo segundo Marquês


de Winchester, estava em conflito. Não queria casar com a
mulher que o rei lhe ordenara. Nunca odiara tanto o rei
quanto naquele momento.

Seu casamento com Lady Clara de Catterfield aconteceria


dali a cinco meses e ele mal tinha aparecido na casa de sua
noiva. Não que negligenciá-la resolvesse algum de seus
problemas, mas fazer a corte à mulher que seria sua esposa
tornava real demais a ordem de Vossa Majestade.

Sabia que não tinha saída a não ser se casar, mas até o
casamento, faria o possível para aproveitar os dias contados
de sua liberdade.

Por esse motivo, Lorde Winchester podia ser facilmente


encontrado, quase todas as noites, no Rogue's, sentado em
uma mesa na ala da Gula ou da Avareza, com um copo de
whisky na mão, observando outra mulher que não era sua
noiva. Aquela sim, era a dona de seus pensamentos. Se a
tivesse conhecido alguns dias antes do decreto do rei,
talvez não estivesse tão aflito quanto a seus votos
matrimoniais.

Copas era uma mulher linda, misteriosa, deslumbrante e


inteligente, diferente de outras damas — e de mulheres com
uma denominação menos respeitosa — que conhecia. Ela
parecia não se influenciar pela sua beleza, charme ou título,
na verdade, ela o olhava com certo deboche e descaso e às
vezes até beirava a ira. E tudo isso o intrigava.

Ela não era nenhuma prostituta. Era apenas uma jogadora.


Para ser justo, não apenas uma, e sim, a melhor jogadora de
cartas do Rogue's, talvez até de toda Londres. Mas não era
apenas isso que a tornava incomum. A mulher tinha uma
segurança, uma independência e, acima de tudo, um
mistério que escondia atrás daqueles olhos tempestuosos
que o fascinavam e atraíam. Tinha-o encantado à primeira
vista. Ele não sabia se tinha sido pela mente ardilosa dela,
ao criar o plano para unir Henry e Phillipa, ou se tinha sido
pela força interior que havia demonstrado ao enfrentar o
Lorde. Desde que a conheceu, Winchester não passou um
dia sequer sem pensar ao menos uma vez nela.

Infelizmente, para o Marquês, a atração por Copas tinha


acontecido no pior momento possível, pois teria que se
casar com Lady Clara, quer quisesse, quer não. Era um
decreto do rei e ele não poderia desobedecer.

A seus olhos, Lady Clara era comum, com hábitos comuns,


uma beleza comum e que, sinceramente, não tinha nada
que o fizesse olhar duas vezes para ela. Era uma dama bem
respeitada, de reputação impecável, filha de um Duque, um
bom partido, mas nada disso o interessava. Ele não queria
uma mulher passiva e que o obedecesse em tudo, queria
uma mulher que o fizesse suspirar e que despertasse o seu
desejo, alguém como Copas. Não se importava se ela tinha
título ou não, a mulher o tinha intrigado e o enfeitiçado
desde o início, e ele a queria, a desejava, e isso estava
deixando o Marquês ensandecido.

Com um suspiro resignado, o Marquês pediu outra dose de


whisky, uma dama de branco lhe serviu a bebida e, em
seguida, se afastou para atender outros clientes. Winchester
pegou o seu copo e se direcionou para a ala da Avareza.
Copas estava lá e ele precisava vê-la antes de voltar para
casa.

A ruiva estava sentada em uma mesa de apostas, cinco


homens estavam apostando com ela. As fichas jogadas na
mesa, e o dealer distribuindo as cartas, Copas estava
concentrada em seu jogo e não viu o Marquês se aproximar.
Vinte minutos depois, ela ganhava o jogo, para a frustração,
elogios e xingamentos dos outros competidores.

― Belo jogo ― o Marquês elogiou, se sentando em um lugar


vago ao lado dela.

A mulher o olhou brevemente e começou a organizar as


cartas, com um gesto de cabeça dispensou o dealer e os
outros homens se retiraram, ao perceber que ela não iria
iniciar outra partida naquele momento, deixando apenas os
dois na mesa.

― Vai jogar? ― perguntou, ignorando o elogio. Sempre fazia


isso, como se soubesse que ele apenas tentava agradá-la
com palavras bonitas.

― Não. ― Ele colocou o copo na mesa e se sentou de frente


para ela.

― Que pena. ― Copas continuou separando as cartas, sem


dar-lhe atenção. Quando o baralho ficou arrumado,
levantou-se. ― Com licença.
― Espere, Copas ― Gabriel chamou, quando percebeu que
ela iria embora. ― Eu quero uma partida.

Com um sorrisinho de lado, a mulher voltou a se sentar.

― Por que sempre que eu tenho que conversar com você,


tenho que jogar? ― Winchester se encostou na cadeira para
observá-la melhor. Quando estavam colocando em prática o
plano de unir Henry e Phillipa, Copas parecia até gostar
dele, mas desde que seu noivado fora anunciado
oficialmente, o tratava com indiferença e até hostilidade. E
ele poderia compreender a indiferença, mas a hostilidade...
Parecia que a ofendia toda vez que falava com ela. E o pior,
sempre acabava lembrando a ele com todas as letras que
era noivo. Quase podia achar que ela estava aborrecida com
o compromisso dele.

― Porque eu estou trabalhando e meu trabalho é jogar


cartas. ― O deboche na voz da mulher era quase palpável.

― Eu acho difícil acreditar nisso. Ainda mais, depois de vê-la


conversando abertamente com outros clientes, sem estar
apostando com eles.

― Alguns clientes precisam ser persuadidos a perder


algumas libras. ― Ela começou a embaralhar as cartas, para
iniciar uma rodada de cartas. ― O que vai querer jogar?

― Rummy ― o Marquês respondeu. Aquele jogo permitiria


que passasse um bom tempo com Copas. Quanto mais o
evitava, mais ele ficava interessado em descobrir os
motivos.

― Tudo bem. O que vai apostar?

― Uma libra. ― O Marquês colocou na mesa os créditos


referentes ao valor apostado e a Dama de Copas fez o
mesmo.

Copas embaralhou o monte com eficiência e rapidez e, em


seguida, distribuiu onze cartas para cada um. Gabriel
observou as cartas que tinha recebido. Uma trinca já estava
montada e outra faltava apenas um sete, ou um quatro de
paus para ter a sequência e assim descer as cartas na
mesa. Winchester desceu a trinca de ouros que já estava
formado.

― Vai me dizer por que me odeia? ― o Marquês perguntou,


enquanto Copas analisava as cartas que tinha em mãos.
Não era a primeira vez que ele perguntava aquilo.

Clara baixou na mesa uma sequência de paus. E, em


seguida, fitou o Marquês.

― Eu não o odeio. Odiá-lo significaria que o senhor tem


alguma importância na minha vida, a ponto de eu perder
meu precioso tempo nutrindo um sentimento tão
desgastante.

O Marquês fingiu-se ofendido e puxou outra carta, já que


era sua rodada. A carta puxada era um quatro de espada.

― Assim magoa-me. Não devias ser tão cruel comigo, ainda


mais quando só anseio ver o

teu sorriso direcionado a mim.

Ela revirou os olhos. E puxou outra carta quando chegou na


sua rodada.

― Por favor, Winchester, está sendo dramático.

― E a senhorita, está sendo cruel. Por isso, creio que me


odeia. Mas diga-me, minha dama, o que fiz para merecer o
seu desinteresse?

Copas suspirou e desceu na mesa uma trinca.

― Não entendo o seu interesse em mim, milorde. Não tens


uma noiva?

― Não me lembre desse maldito noivado. ― O Marquês


tirou o sorriso do rosto. Odiava que o lembrassem de sua
noiva, a qual estava evitando deliberadamente.

― Vejo que o casamento não te agrada. ― Copas o fitou, e


Winchester jurou ter visto raiva nos olhos dela. Mas o cinza
tempestuoso era difícil de ser interpretado, a máscara o
impedia de ver as expressões que a ruiva fazia e a voz,
sempre baixa e controlada, não deixava transparecer
emoção nenhuma. Portanto, não teve certeza se realmente
era raiva que, brevemente, tinha visto em seu olhar.

― Não, se dependesse de mim, jamais casaria. Mas o rei


não me deu nenhuma outra escolha.

― Que eu saiba, ele lhe deu tempo para escolher com quem
gostaria de se casar, é bem mais do que sua noiva teve ―
Copas o alfinetou.

Gabriel puxou uma carta, um rei de copas, e suspirou. Não


se orgulhava de estar negligenciando a sua noiva,
entretanto, não conseguia encará-la. Era um covarde por
isso, estava ciente desse fato, mas só em imaginar-se tendo
que passear com ela, dar-lhe flores, a cortejar, quando não
queria fazê-lo, lhe parecia desleal consigo mesmo e com
sua noiva. Clara era apenas uma criança, tinha acabado de
debutar, não queria enganá-la, fingindo que estava feliz
com aquele arranjo, quando não estava. Winchester sabia
que estava adiando o inevitável, mas não conseguia agir de
outro modo.
― Esqueço-me que conheces minha noiva através de
Phillipa. Afinal, ela é amiga da Sra.

Williams e costuma visitá-la, pelo que soube. Por falar na


esposa de Henry, estou até preocupado com o fato de ela
ainda não ter vindo me recriminar, por não ter ido visitar
minha noiva. ― O

Marquês riu. Era fácil imaginar a jovem lady fazendo


exatamente aquilo, como se tivesse o direito de se
intrometer em sua vida.

― Ah, mas ela queria. Bem mais que isso. Estava querendo
sua cabeça em uma bandeja por estar negligenciando a
amiga dela ― Copas comentou, ácida. ― Eu insisti que não
o fizesse.

― E por que me defenderia? ― O Marquês ficou confuso


com aquela declaração.

― Eu não o defendi. Mas creio que sua noiva ficaria ainda


mais chateada se soubesse que o homem com o qual se
casará, só ousou visitá-la por causa de Phillipa. ― Copas
puxou mais uma carta em sua rodada e baixou uma trinca.
O que me leva a uma pergunta bastante pertinente: por que
não foi visitá-la ainda?

Winchester puxou uma carta, sete de paus, em seguida,


baixou a sequência que tinha em mãos. Lembrou-se da
bebida que ainda tinha na mesa. Bebeu-a de uma única vez.

― Eu não quero fingir para minha noiva que estou feliz com
o casamento ― comentou, batendo o copo na mesa.

― Essa é a desculpa que dá a si mesmo? ― a jogadora


debochou e puxou uma carta, baixando-a em seguida para
complementar um jogo do Marquês na mesa.
― É a verdade. ― Ele franziu o cenho.

― Se fosse verdade, o senhor já teria visitado sua noiva e


tido uma conversa sincera com ela, sobre não querer
desposá-la ― acusou.

Aquela reprimenda o fez cerrar os dentes. Odiava ser


recriminado. Jogou sua rodada, puxando uma carta e
baixando outras duas.

― Não é tão fácil assim. Vou magoá-la. E ela é tão... Não


sei... Lembro-me dela mais nova... Era uma criança meiga e
carinhosa. Tenho certeza de que ela espera mais que um
casamento por obrigação. E eu, nem mesmo quero me
casar, ela não me desperta nenhum interesse.

Aquelas palavras a enfureceram. Era óbvio que não iria lhe


despertar o interesse, quando ele sequer tentava conhecê-
la, mas o pior era ele pensar que não a visitar estaria
poupando os sentimentos dela, como se ela estivesse
esperando por um maldito príncipe encantado. Maldito
Marquês.

― Esqueces, milorde, que as mulheres, especialmente as do


nível social de sua noiva, são criadas para não se deixarem
levar a ideia de um casamento por amor. Elas são ensinadas
a ver o casamento como ele é. Um contrato. É mais fácil
assim, aceitar a realidade de que não são todos que se
casam tendo esse sentimento como base. Dorset, Norfall e
o Lorde, são exceções e não a regra. Não creio que sua
noiva seja tola a ponto de esperar um casamento por amor.
Clara fez sua jogada, irritada, queria encerrar logo aquele
jogo e se afastar daquele homem e, para sua sorte, a carta
que puxou era exatamente a que precisava. Então, com
uma sequência, ganhou o jogo, baixando as últimas quatro
cartas que tinha em mãos de uma vez.

O Marquês praguejou por ter perdido e Copas recolheu as


cartas, sem mesmo organizá-

las. Em seguida, a jogadora se despediu e se afastou


daquele homem que despertava o pior nela.

Winchester observou-a se afastar, sem entender o que tinha


feito novamente para irritá-la tanto.

No dia seguinte, durante à tarde, Clara se juntou a mãe e as


irmãs na sala de estar. Não estava com a menor vontade de
bordar e, por isso, se direcionou para o piano, enquanto
suas irmãs se sentaram próximas a sua mãe para
trabalharem em seus bordados.

Todas as filhas do Duque eram loiras como o pai, o Duque


de Catterfild, enquanto que a Duquesa, Lady Catterfield,
possuía cabelos e olhos castanhos. Entretanto, apenas Clara
possuía olhos acinzentados, suas irmãs possuíam os
mesmos olhos azuis do Duque e seu irmão era a versão
masculina de sua mãe, com os olhos e cabelos castanhos.
Clara era a mais velha dos filhos de Lorde Catterfield, e por
ser a primogênita, era sua preferida. Quando tinha cinco
anos, as gêmeas nasceram e três anos depois, nasceu o
herdeiro do Ducado, Christopher Dominic Sethwood.

Clara começou a tocar Bach, na tentativa de colocar para


fora a raiva que sentia de seu noivo. Como ele ousava na
noite anterior ter dito que ela não o interessava? Quanto
mais conversava com ele no Rogue’s disfarçada de Copas,
mais ela o odiava. Sua frustração a fez errar uma nota.
Recomeçou a tocar e, então, errou novamente. Frustrada,
largou o piano e sentou-se junto das irmãs, que discutiam.

― Você nunca acerta esse posto. A agulha tem de entrar


aqui, nesse buraquinho, e não nesse ― Cristine repreendia a
irmã. ― Por isso, que seu bordado sempre sai cheio de
espaços e o verso fica deselegante.

― Eu não me importo. Sabe que odeio bordado. Preferia


estar pintando, mas mamãe não me permite trazer a tela
para cá ― Caroline murmurou e olhou para a mãe,
esperando a reprimenda por parte dela.

― Não, senhorita. Não vai trazer sua tela, da última vez que
permiti, foi necessário comprar um tapete novo para cobrir
o estrago que você fez no piso, com aquela tinta amarela. ―

A Duquesa olhou para o tapete persa, que esava embaixo


de uma mesinha ornada com um jarro de flores, para
disfarçar que ali tinha acontecido um desastre natural.

― Clara, quando poderemos conhecer seu noivo? ―


Caroline perguntou, desviando o assunto sobre sua pintura.
Não tinha culpa, se ficava empolgada quando pintava.

Clara se retesou. O que menos queria era falar sobre o seu


noivo naquele momento e, muito menos, com suas irmãs
ali.

― Estou ansiosa para saber se é tão bonito quanto dizem.


Quando ele vai vir nos visitar?

― Cristine endossou a pergunta de Caroline e, ao ver que a


irmã mais velha demorava a responder, continuou a falar. ―
Como ele precisou ir a Willow Castle no dia do jantar de
noivado que oferecemos a ele, creio que devemos fazer
novamente o convite.
― Verdade, acho devemos fazer o jantar, afinal, ainda não
foi dado ― Caroline argumentou. ― Mas foi uma tremenda
falta de educação ele ter mandado uma missiva com tão
pouca antecedência. Estávamos ansiosas para conhecê-lo.
Não sei nem o que faria caso fosse meu noivo a me evitar.

― Não diga isso, Caroline, o Marquês não está evitando sua


irmã. Ele teve mesmo que resolver assuntos seriíssimos em
suas terras. Soube por Lady Goddwuig que a meia-irmã dele
havia adoecido, e por ele ser muito devotado à família, não
pensou duas vezes antes de voltar para casa, ainda que já
tivesse aceitado nosso convite.

― É verdade, Louise comentou a mesma coisa comigo ―


Cristine confirmou a fala da mãe. Louise era a filha de Lady
Goddwuig e uma amiga muito próxima de Cristine. ― Mas
então, quando poderemos oferecer o jantar de noivado?
Lorde Winchester já voltou há algum tempo para Londres.
Ele ainda continua muito ocupado, Clara?

― Eu não fui informada dos planos de meu noivo, Cristine ―


Clara disse, contida.

Odiava ser o alvo da conversa de suas irmãs. Elas eram


afoitas demais para a idade, tinham uma curiosidade acima
do comum e adoravam uma boa fofoca.

― Não sejam curiosas, meninas, o Marquês aparecerá em


breve. Ele deve ter suas razões para não ter vindo até
agora. Devemos dar a ele o benefício da dúvida e não tirar
conclusões precipitadas sobre a ausência de Lorde
Winchester. ― A Duquesa silenciou as filhas mais novas.

― Claro, ele deve estar mesmo tão ocupado que nem


mesmo lembra que tem uma noiva
― Clara comentou, ácida. Não conseguiu segurar o
comentário.

Tentou não se importar. Se tinha um sentimento que nutria


por seu noivo naquele momento, era desprezo. Winchester
sequer havia lhe enviado desculpas formais por não ir visitá-

la, em vez disso, ele a ignorava, como se ela nem mesmo


fosse sua noiva. Clara não se importava com a desculpa que
ele tinha dado na noite anterior, que por sinal era a mais
descabida que já tinha ouvido.

― É verdade que ele é um libertino? ― Cristine perguntou,


curiosa, ignorando o estado de espírito de Clara. ― Ouvi as
moças da cozinha falando que ele era um libertino. O que é
um libertino?

― É um homem que deve ser evitado, pois costumam


corromper donzelas como você ―

a Duquesa explicou, olhando reprovadora para sua filha. ―


E sabe que não deve escutar escondido conversas alheias.

― Mas o noivo de Clara é um libertino, ele vai corrompê-la


também? ― Caroline entrou na conversa. ― Devemos evitá-
lo?

― Deus livre sua irmã de algo assim. E, quanto a evitá-lo,


infelizmente não podemos, pois apesar de não termos sido
nós quem escolhemos o pretendente de sua irmã, e sim o
rei, ele logo fará parte da família e devemos tratá-lo
cordialmente. E não ousem falar sobre libertinos na
presença dele, nem na presença de ninguém. Não é de bom
tom chamar nenhum cavalheiro de libertino. Então,
esqueçam que conhecem essa palavra.

― Mas é exatamente isso que ele é ― Clara se pronunciou,


colocando toda sua irritação nas palavras. ― A fama dele o
precede. Todas as damas sussurram sobre ele nos salões e
nas reuniões femininas. Dizem que ele pode levar uma
mulher à loucura apenas usando a boca. Ele vai mesmo me
deixar louca, mas de tanta raiva que me causa. Aquele
miserável.

― Clara! Controle a língua mocinha. Essas não são palavras


de uma dama educada. Não torne a dizê-las, ainda mais na
frente de suas irmãs.

― Perdão, mamãe ― a filha mais velha de Lady Catterfield


se desculpou, envergonhando-se por ter dito algo tão
impróprio na frente das irmãs. ― Eu vou me retirar para o
meu quarto, com licença.

Clara se retirou apressadamente, antes que não pudesse


mais controlar sua língua e dissesse mais coisas impróprias
na frente de suas irmãs. Mas lembrar-se das conversas que
as Damas de vermelho tinham sobre seu noivo, a deixava
ainda mais furiosa.

O Marquês estava a todo momento em seus pensamentos e


quanto mais ela tentava evitar isso, mais ele se fazia
presente. Definitivamente, odiava-o.

Mais tarde, naquela noite, Clara se arrumava para ir ao


clube. Sua criada sabia sobre o seu segredo e fazia tudo
para acobertá-la durante sua ausência na casa. Além de
Carmelita, apenas o administrador da família sabia sobre a
vida dupla de Clara, era ele quem cuidava para que o
dinheiro entrasse nos cofres da família novamente, sem
parecer suspeito.

― Você não parece animada em ir ao clube esta noite,


criança ― sua criada comentou ao notar o semblante
entristecido de Clara.

Carmelita já era uma senhora de cinquenta anos, que a


conhecia desde criança e tinha sido sua babá. Confiava
naquela mulher mais do que em qualquer outra, até mesmo
sua mãe.

Desde que nascera, via Carmelita como sua segunda mãe, e


a velha senhora sempre esteve presente em sua vida e a
conhecia melhor do que qualquer outra pessoa.

― Ele estará lá. ― Clara suspirou. ― Toda noite ele está lá e,


sempre que me vê, ele sorri e se aproxima, como se ficasse
feliz por ver Copas. E eu que sou sua noiva, sou
abandonada como um objeto sem importância nenhuma. Eu
o odeio por estar me envergonhando dessa forma.

― Você o odeia porque queria que ele estivesse aqui, como


seu noivo, lhe cortejando como deveria ser ― Carmelita
comentou, enquanto ajudava Clara a se vestir como uma
criada.

Era assim que ela saia de casa disfarçada, sempre que ia ao


clube.

― Não sei se eu iria querê-lo me cortejando.

― É claro que quer, menina, você até pode mentir para si


mesma, mas eu a conheço como

a palma da minha mão e sei quando está mentindo e, neste,


momento nunca esteve mais longe da verdade.
― Eu nem deveria me importar com ele. ― Clara bufou,
cruzando os braços.

― Quanto a isso, eu concordo. Preferia que não nutrisse


nenhum sentimento pelo seu noivo, além do respeito que
uma mulher deve ter por seu marido ― a velha senhora
comentou, preocupada.

― Está se referindo à história da mãe dele, não é? É


realmente triste viver o que ela viveu. Mas não se preocupe,
Carmelita, eu não vou me apaixonar, ele não desperta esse
tipo de sentimento em mim.

A criada apenas concordou com a cabeça, terminando de


fazer seu trabalho em silêncio.

Temia por Clara, era claro que a moça sentia algo pelo
Marquês, caso contrário, ele não a afetaria tanto. E isso a
preocupava. Não queria que sua garotinha tivesse o mesmo
fim de Lady Winchester.

Já no clube, Copas foi direto para o escritório de Henry.


Precisava saber como estava a situação de seu pai no clube.
Lorde Catterfield estava em uma das mesas na ala da
Avareza, provavelmente, perdendo mais do que ganhava,
como sempre. Nunca entendeu o que levou o pai a se
afundar nos jogos daquela forma. Desde que tinha
conseguido seu herdeiro, o Duque havia perdido todo o seu
bom senso no que se tratava de jogos. Apostava com
qualquer um que aceitasse o desafio. E sempre perdia. O
que mais a intrigava é que, em vez de ficar triste e furioso,
o Duque continuava jogando, ainda mais animado por ter
perdido a partida.

Seu pai quase não participava mais da vida em família, não


se reunia mais com eles na hora das refeições, pedia que
levassem o alimento para seu escritório, evitava as festas e
vivia recluso em seu escritório, só saindo de lá para dormir
no quarto. O Duque havia mudado tanto que nem parecia o
homem amoroso e bom que um dia tinha sido.

Voltando a focar em seu trabalho como a Dama de Copas,


ela seguiu para o andar o escritório do Lorde e esperou a
permissão para entrar. Como o Lorde estava muito ocupado
com o noivado com Phillipa, era Dmitri quem administrava o
Rogue’s. Assim que sua entrada foi permitida, Copas entrou.

― Em que posso ajudá-la? ― Dmitri perguntou, assim que a


viu.

O russo era um homem grande, cabelos avermelhados e


olhos verdes. Estava sempre com o semblante sério, o que o
fazia parecer intimidante, mas quando sorria sua beleza se
tornava evidente.

― Eu vim ver a situação de meu pai no clube.

― Ah é claro. Sente-se. Pegarei os livros de contabilidade na


minha sala, acabei levando-os para lá mais cedo. Espere
aqui que já retorno.

Dmitri saiu do escritório, deixando-a sozinha.

Copas se sentou na poltrona marrom que havia em frente à


mesa. Diferente de Henry, Dmitri era extremamente
metódico e organizado, não deixando nada fora do lugar. As
cortinas pretas estavam todas abertas, entretanto, isso não
incomodou Copas, ainda que um dos quartos da Luxúria
estivesse sendo utilizado e o casal estivesse completamente
despido.

Havia prostitutas no clube, elas trabalhavam para o Lorde e


eram sempre bem tratadas.
Diferente dos bordeis, onde elas eram maltratadas, o
Rogue’s lhes dava proteção e cuidados básicos, para que
vivessem bem. Nenhuma era obrigada a seguir com aquela
vida, encontrando apoio sempre que decidiam deixar o
ramo.

A primeira vez que viu o trabalho que uma prostituta fazia,


Copas se escandalizou. Mas, aos poucos, foi se
acostumando com a vida que aquelas mulheres levavam.
Sempre as tratou com

respeito, independente do que faziam e, com o passar do


tempo, até havia criado amizades com algumas delas. As
meninas sabiam de sua identidade e todas eram de extrema
confiança. Era uma das regras internas do clube: nunca
revelar a identidade de outro Rogue. O segredo devia ser
levado para o túmulo. Quem o desobedecesse, sofreria
sérias consequências.

Copas se direcionou para a cortina, que se abria para o


casal na Luxúria e a fechou. Não era por que não se
escandalizava mais com a cena, que achava correto
observar alguém em um momento tão íntimo.

Não demorou muito e Dmitri voltou para a sala, com o livro


em mãos e o semblante preocupado.

― Este mês o seu pai perdeu bem mais do que devia ―


Dmitri comentou. ― O valor que você ganhou só quitará
metade do que ele nos deve. Ele tem jogado com outros
nobres e, por isso, está aumentando a dívida não só
conosco.

― A culpa é minha. ― Copas suspirou.

A estratégia que ela normalmente usava era estar em todas


as rodadas que o Duque estivesse participando e assim
fazê-lo perder para ela, pois assim garantiria que o dinheiro
retornasse aos cofres da casa. Uma pequena porcentagem
ficava com o Rogue’s e ambos se ajudavam.

Entretanto, no mês anterior, Copas percebeu que o seu pai


a observava demais. E, por medo de ser descoberta,
diminuiu a frequência de jogos que disputava com ele.

Após ver as anotações no livro de contas do Rogue’s, Copas


desceu para a ala da Gula, precisava de uma bebida para
relaxar um pouco, antes de começar as rodadas daquela
noite.

Ao se aproximar do balcão, reconheceu o Marquês de


Winchester, que estava sentado em uma das cadeiras,
apreciando a sua bebida. Parecia resignado, observando o
copo com atenção, como se ali tivesse todas as respostas
que procurava. Ele devia estar tentando encontrar um modo
de não ser obrigado a se casar com ela.

Aquilo irritou Copas mais do que devia. Então, pediu uma


dose dupla para si e a tomou de uma só vez.

— Você é uma das poucas mulheres que eu vejo bebendo


por aqui — Winchester comentou. — Não que esteja
julgando.

— Eu gosto de beber um pouco, costuma me acalmar ―


Copas explicou, dando de ombros. Não estava disposta a
brigar naquele momento, nem mesmo com o Marquês. Só
queria ficar em paz para decidir o que fazer sobre o seu pai.

— E por que precisa ficar calma? — O Marquês estava


curioso.

—Não é da sua conta, Winchester.


― Está irritada hoje ― comentou.

Copas o ignorou e se levantou, pronta para ir embora, mas


Winchester a deteve.

― Me largue. Preciso trabalhar.

― Eu quero uma partida ― pediu e a guiou para uma das


mesas.

Com um suspiro, Copas o seguiu até a mesa. Não podia


negar um jogo, era seu trabalho, afinal de contas.

― Quanto vai apostar? ― ela perguntou, ao retirar de suas


vestes o baralho e começar a embaralhar as cartas.

― Uma libra.

― Vai precisar subir sua aposta se quiser jogar comigo hoje


― Copas barganhou. ― Dez libras.

― Feito. ― Winchester não iria recuar.

Copas deu as cartas e o jogo se iniciou. Para a sua surpresa,


o Marquês permaneceu calado durante todo o jogo. E a
partida terminou rapidamente, tendo Winchester como
ganhador.

Droga, eu tenho que ganhar dinheiro e não perder ― Copas


ralhou consigo mesma. Não estava concentrada como
deveria no jogo e isso a tinha levado a perder a partida. Ela
retirou de seu bolso as fichas referentes a dez libras, mas o
Marquês negou.

― Pode ficar com as libras, eu quero apenas que me


responda algo.
Copas ficou um pouco apreensiva e agradeceu aos céus por
sua máscara cobrir seu rosto, impedindo qualquer um de
ver suas expressões.

― O que gostaria de saber, Winchester?

― Por que eu a irrito tanto? Quando você me pediu ajuda


para o plano de unir Phillipa e Henry, não me odiava, pelo
contrário, parecia até gostar de minha presença. E agora,
sempre que a vejo, tenta me evitar e me trata com
desprezo, o que foi que eu fiz para merecer isso?

Copas pensou um pouco e decidiu que ele merecia uma


resposta.

― O senhor está noivo.

― Sim, estou. Não sabia que isso era motivo para que me
odiasse tanto. A não ser que estivesse gostando de mim.
Diga-me, Copas, estava gostando de mim?

Clara enfureceu-se com aquela pergunta e levantou-se da


mesa. O Marquês era realmente um cretino.

― Não seja tolo. Eu sei qual é o meu lugar. Ainda mais


agora, que vejo como trata a sua noiva, estou mais convicta
que não há motivos para gostar do senhor. Agora, se me dá
licença, eu tenho que trabalhar.

― Eu quero outra partida. ― Ele sorriu. Copas acabava de


se tornar um desafio para ele.

― Está querendo me irritar, não é? ― A jogadora franziu o


cenho, mas voltou a se sentar.

― Vinte libras desta vez, se quiser jogar comigo.


― Feito ― o Marquês concordou sem hesitar.

Novamente jogaram em silêncio, dessa vez Copas foi a


vencedora.

― Outra partida ― ele exigiu, antes que ela pudesse


guardar as cartas.

― Tudo bem. ― Copas sorriu, arteira. ― Trinta libras.

― Está querendo me fazer desistir, ou apenas me falir?

― Estou apenas jogando, milorde. Se é demais para o


senhor, é só desistir.

― Não, vamos jogar mais essa. ― O Marquês não recuou e


voltaram a jogar.

Copas era realmente uma boa jogadora quando estava


concentrada, então Gabriel decidiu que iria distraí-la.

― Ainda acredito que gosta de mim ― ele comentou, com


um sorriso.

― Acredita em uma mentira, milorde ― respondeu.

― Se fosse mesmo uma mentira, não me odiaria tanto.

― Já disse que não o odeio. Apenas desprezo o que está


fazendo com sua noiva.

― Você só entenderia se estivesse na minha pele, minha


querida. Ser forçado a um casamento que nunca pediu, não
é algo que deixe um homem feliz.

― Muitos casamentos são arranjados entre as famílias,


milorde. O senhor não é o primeiro a se casar por obrigação.
E não vejo nenhum dos outros reclamando de seus
casamentos.

― Então, talvez devesse olhar direito, minha cara. Ao seu


redor mais da metade dos homens são casados e a maioria
frequenta a Luxúria e nenhum deles está com a esposa
aqui. Se estivessem contentes com a mulher com quem se
casaram, estariam neste momento em casa, usufruindo dos
direitos que o matrimônio confere, em vez de se
embriagando e usando as prostitutas para ter um pouco de
felicidade momentânea. E tenho certeza de que se
houvesse algum

clube para as mulheres, essas mesmas distintas damas,


cujos maridos se divertem aqui nesta noite, estariam
também tentando esquecer o casamento fracassado. É
exatamente isso que estou evitando, minha cara, um
casamento fracassado.

Copas entendia o ponto de vista dele, mas não queria


simpatizar com aquele homem que abandonava a noiva de
forma tão cruel.

— Então, o senhor não quer um casamento fadado ao


fracasso. Creio que ninguém quer.

Isso eu compreendo. Entretanto, como sabe que seu


casamento será assim? Pelo que eu soube, nem sequer
conhece a sua noiva. Por que a evita? O que ela pode ter de
tão ruim, para que a despreze dessa forma?

— Eu não a desprezo, apenas não sinto o menor desejo de


visitá-la, ou conhecê-la. Eu jamais a escolheria para ser
minha noiva — ele disse uma das verdades. Não era apenas
por aquele motivo que evitava sua noiva.
Copas tentou segurar a fúria que percorreu seu corpo
naquele momento.

— Qual o problema dela? Faltam-lhe os dentes? É vesga? Ou


aleijada?

— Céus, não. Ela só não é o tipo de mulher que eu costumo


gostar. E um casamento sem atração é o mesmo que ter
que comer comida sem tempero o resto da vida. Come por
estar com fome, mas não sente nenhum prazer com a
comida.

— Esse é o pior argumento que eu já ouvi. ― Copas se


exaltou. ― Não é a beleza física que vai garantir um
casamento promissor. Se assim fosse, o senhor seria um
ótimo marido e, pelo pouco que o conheço, eu chego a ter
pena do destino de sua noiva. Sinceramente, eu desejaria
que esse compromisso fosse desfeito. Sua noiva não
merece alguém como o senhor.

― Eu não me referia à beleza física, mas sim, à atração. Não


é só a beleza física que atrai. Por exemplo, eu nunca vi o
seu rosto, não sei quem você é, mas toda noite eu não
consigo evitar sua companhia e, muito menos, lhe tirar de
meus pensamentos. Algo em você me atrai. E, por isso, eu
sei que um casamento com a senhorita teria mais chance
de dar certo, do que o casamento a qual estou fadado.

Copas sorriu, ácida.

― Um casamento entre nós seria um inferno. Seria tão


fracassado, quanto o da sua noiva, senão mais.

— Creio que não expressei bem o meu ponto de vista.

― Não há nada que diga que me faça odiá-lo menos.


― Então, assume que me odeia.

― Agora sim, definitivamente o odeio.

― Apenas porque não sinto atração por minha noiva?

― Não. Por ser um canalha mesmo.

O Marquês ficou em silêncio por um tempo, observando o


jogo que tinha em mãos. Ouvir aquilo o tinha perturbado
mais do que gostaria. Suspirou, talvez ela tivesse razão. Ele
realmente estava agindo como um canalha ao tratar a noiva
daquele jeito.

― Eu não sou um canalha ― comentou, enquanto colocava


as cartas na mesa, desistindo daquela rodada.

― Suas atitudes mostram o contrário.

― Eu sei ― ele concordou.

Copas o olhou bem e percebeu no olhar do homem à sua


frente, tristeza e resignação, mas não se permitiu amolecer.

CAPÍTULO 2 ― VISITAS
A conversa na noite anterior havia lhe dado o que pensar e,
por esse motivo, tinha decidido fazer a coisa certa. Talvez,
conhecendo sua noiva, pudessem ser, ao menos, amigos e,
com um pouco de sorte, o casamento deles seria um fardo
suportável.

Chegando a Catterfild House, ele bateu à porta e entregou


seu cartão ao mordomo, que lhe guiou para a sala de
espera, enquanto foi avisar aos Catterfild da visita.

Lorde Catterfild foi ao seu encontro e lhe saudou


alegremente. Apesar da fama do Marquês, o Duque estava
mais do que ansioso em ver sua filha casada.

— Winchester que alegria em vê-lo, espero que esteja


melhor de saúde.

— Perdão, milorde. Não lembro de ter estado doente


recentemente.

— Claro que esteve, que outro motivo teria para não ter
visitado sua noiva antes? — O

Duque piscou para o Marquês, como se dissesse para


aceitar a desculpa que havia arranjado para ele.

— Nesse caso, estou muito melhor, obrigado. — O Marquês


deu de ombros. — Imagino que tenha dado essa desculpa
para a minha ausência, quando deveria estar cortejando sua
filha.

— Melhor doente do que desinteressado. As damas não


costumam ser dóceis quando estão se sentindo deixadas de
lado.

— É claro, milorde. Lembrar-me-ei disso. — O Marquês


sorriu, educado — Mas a corte a sua filha foi exatamente o
motivo que me fez vir. Gostaria de passar um tempo com
ela, conhecer minha noiva.

— Que ideia magnífica. Mandarei chamá-la imediatamente.


— O Duque lhe deu um olhar de aprovação.

Lorde Catterfild chamou o mordomo e pediu que ele


mandasse Lady Clara descer para fazer companhia ao
noivo. O homem voltou apenas com uma mensagem.

— Milorde, Lady Clara se recusa a descer.

Clara estava em seu quarto. Tinha tentado ler um livro, mas


por melhor que fosse a história, ela não conseguia se
concentrar.

Maldito Marquês. Era tudo culpa dele.

Na noite anterior, ela tinha descoberto que o único motivo


de Winchester não estar lhe cortejando devidamente, era
porque não se sentia atraído por ela.

Havia divagado durante horas sobre qual podia ser o motivo


que o tinha levado a ignorá-

la durante todo o tempo, mas nunca pensou que fosse por


algo tão superficial e estúpido quanto aquilo.

— A minha noiva não me atrai — Clara imitou a voz dele,


num tom jocoso. — Estúpido, tolo, maldito, crápula,
bastardo.

Ele tinha dito aquilo para Copas na noite anterior. Ela


precisou de todas as forças para

não o mandar para o inferno naquele momento. Se pudesse,


ela mesma iria ao rei cancelar o casamento, mas sabia que
era algo impossível de ser aceito, uma vez que a decisão
era um decreto real e o rei não voltaria atrás.

— Como se desejar a esposa fosse fundamental em um


casamento. Nós temos que nos sujeitar a homens feios,
velhos e malcuidados e temos que ficar felizes com esse
arranjo — Clara murmurou para si, enquanto fechava o livro,
irritada. — Tinha que ser um libertino para basear o
casamento em atração. Ao inferno com sua atração.

A lady sabia que não era feia. Sabia também que não era a
debutante mais bonita da temporada, mas não se
importava com isso. rei poderia ter escolhido uma mulher
muito pior para o Marquês, alguém como Lady Vitória de
Claire. Não que Lady Vitória tivesse feições pouco
agradáveis, mas a mulher era uma víbora interesseira.
Tinha desfeito o quase noivado com o Conde de Malthwood
para aceitar o compromisso com Lorde Theodor Hattsale, o
Duque de Arbex, que era quase quarenta anos mais velho
do que ela, apenas porque o homem era um Duque.

A moça decidiu andar pelo quarto. Ficar sentada estava lhe


deixando ainda mais aborrecida. Ao se aproximar da janela,
percebeu uma carruagem se aproximando e reconheceu o
brasão dos Winchesters.

— Então, meu querido noivo decidiu aparecer? — ela


murmurou, ácida.

Clara se afastou da janela e decidiu voltar a ler. Ou, pelo


menos, tentar. Não iria perder tempo pensando no seu
noivo, mas sabia que logo alguém apareceria ali para
chamá-la.

— Milady, a senhorita tem uma visita — a criada lhe disse,


com um sorriso encantado.
Com certeza, achava que ela tinha sorte por ter um noivo
tão belo. E, para a sua infelicidade, o Marquês de
Winchester era realmente um homem de grande beleza
exterior, mas nenhuma beleza poderia esconder o quão por
dentro era odiável.

Winchester tinha cabelos em um tom claro de castanho. E


os olhos ora verdes, ora castanhos claros eram realmente
fascinantes. O nariz aquilino, rosto harmonioso, traços
firmes e barba sempre bem aparada. Tudo lhe favorecia. Ele
era um belo espécime masculino. Mas a sua beleza não
faria Clara esquecer-se do que tinha dito sobre ela. E se ele
passou um mês ignorando sua noiva de propósito, então,
não se sentiria mal em fazê-lo esperar um pouco mais.

— Diga a minha visita que eu não quero descer.

— A senhorita está indisposta? — a criada perguntou,


ficando um pouco preocupada. —

Quer que lhe prepare algo?

— Não será necessário, estou bem. Apenas me recuso a


descer. — Clara foi sincera com sua criada.

— Mas, milady... Seu noivo...

— Meu noivo encontrará o que fazer com o restante da


tarde livre. — A lady foi categórica.

A criada saiu, lívida. Não era comum que Lady Clara agisse
de forma mal-educada. Mas Clara não poderia descer e
acolher o seu noivo como se não tivesse notado a relutância
dele em lhe fazer a corte e, o mais importante, não fingiria
que o que ele disse não a tinha afetado, ainda que ele não
soubesse quem ela era. Mesmo que, para ele, Clara fosse
uma mulher que possuía feições pouco agradáveis, ela
ainda era uma lady e não merecia ser destratada daquela
forma e nem sequer permitiria.

— Clara, está tudo bem? — Seu pai apareceu em seu


quarto. — Seu noivo está lá embaixo e lhe aguarda.

— Não quero vê-lo. Agradeço que Lorde Winchester tenha


finalmente se lembrado que tem uma noiva. Mas, se ele
passou um mês sem cumprir suas obrigações, posso passar,
pelo

menos, um dia sem cumprir a minha.

— Ele deve ter tido seus motivos. Soube que estava


adoentado e não queria correr o risco de lhe adoecer — o
Duque mentiu. — Não seja geniosa, dê uma chance para
que ele se desculpe com você.

— Não quero as desculpas dele e, muito menos, quero me


casar com ele.

O Duque olhou para ela e beliscou o alto no nariz entre os


olhos. Suspirou, desgostoso.

— Sei que está chateada com ele por não ter aparecido
durante um mês inteiro, e sei também que ele não seria sua
primeira escolha para marido, mas você vai se casar com
ele, não precisa dificultar as coisas. Sabe o quanto este
casamento será vantajoso para nós. Para você. Não
estrague tudo.
— Como se eu pudesse estragar tudo. — Clara bufou. —
Estou tão presa ao Marquês, quanto ele a mim. Só que
diferente dele, não sou eu quem está tentando fugir do
casamento.

— Já chega, Clara, está agindo como uma criança mimada.


Eu lhe arranjei um casamento vantajoso e um dia vai me
agradecer por isso — o Duque falou sério e, após um suspiro
exasperado, ordenou: — Você vai descer agora e vai se
desculpar com Lorde Winchester. Será uma ótima
companhia para ele e desfrutará do passeio. Coloque um
vestido aceitável e desça.

― Me desculpar com ele? ― Clara ficou furiosa. ― Ele é


quem tem que pedir desculpas, implorar o meu perdão. Não
fui eu quem o ignorei durante um mês. Se quer que eu
desça, eu descerei, mas não irei pedir desculpas.

― Clara, abaixe o tom. É uma lady. Faça o seu papel. Eu não


pedirei de novo.

Quando seu pai usava aquela voz com ela, Clara sabia que
era impossível retrucar. O

Duque não aceitava ser desobedecido. Não era a primeira


vez que o escutava usando aquele tom e sabia que se não o
obedecesse, haveria consequências.

Então, seu pai saiu do quarto, a deixando sozinha.

A criada bateu novamente à sua porta e dessa vez ela se


permitiu ser ajudada e se trocou, descendo, em seguida,
para ver seu noivo. Mas, se seu pai pensava que ela seria
dócil e compreensiva com o Marquês, estava muito
enganado. Deixaria claro que ter a ignorado por um mês
teria algumas consequências.
Ouvir que sua noiva não ia descer, fez com que o Marquês
se sentisse desconfortável e um pouco surpreso, nunca
imaginaria que ela seria geniosa. Aquilo era realmente algo
incomum e o surpreendeu positivamente, odiava mulheres
passivas. O Duque o deixou sozinho, mesmo com os
inúmeros protestos de Winchester, e este soube que o
homem iria conversar com a filha e que ela desceria em
seguida, dócil e passiva, por ter que obedecer ao pai.

Winchester não precisou esperar muito. Lady Clara desceu e


foi ao seu encontro. Ela era exatamente como se lembrava,
a única exceção, era o semblante furioso que expressava.

― Milorde ― o saudou, ao se aproximar.

― Lady Clara ― respondeu a saudação, retirando seu


chapéu e fazendo uma mesura elegante.

― A quem devo agradecer por finalmente ter vindo visitar-


me?

Winchester não esperava aquela acidez vindo dela .

As mulheres não tinham que ser dóceis e fáceis de se lidar?


Não era isso que ensinavam

nas escolas femininas?

― Peço o seu perdão pela minha ausência nesses dias. Eu


estive... doente.

Clara ergueu uma sobrancelha e o olhou, sarcástica. E ele


soube que ela sabia que não estava doente realmente.

― Não foi nada grave, imagino ― Lady Clara comentou.


― Não, apenas um resfriado ― explicou-se, desconfortável,
por estar mentindo.

― Claro. Bom, agora que já cumpriu seu dever de bom


noivo, eu vou me retirar ― a jovem alfinetou, desdenhando
a presença do Marquês.

― Eu vim convidá-la a um passeio ― Winchester anunciou,


quando percebeu que ela se dirigia à porta.

A moça parou os passos, mas não se virou.

― Eu não estou interessada. ― Clara estava com as mãos


em punhos. Ele realmente pensava que ao chegar ali ela o
receberia de braços abertos?

Winchester xingou baixinho.

― Está bem. Serei honesto com você. Eu não estava doente


― o Marquês confessou. ―

E peço perdão por não ter vindo antes.

Clara já sabia que ele não tinha estado doente, e o pedido


de perdão dele amenizou um pouco a raiva que sentia. Mas
não toda, ele ainda precisava entender que suas ações
tinham consequências.

― O senhor me ignorou durante um mês e, por mais que


não esteja animado em se casar comigo, assim como eu
também não estou animada em me casar com o senhor,
esse fato trouxe consequências, entre elas, falatórios sobre
o noivado. Acredita mesmo que um passeio me fará
esquecer isso, ou fará que a sociedade se esqueça de que
eu fui negligenciada durante todo esse tempo?
O Marquês ergueu uma sobrancelha, ela só poderia estar
exagerando sobre a sociedade.

Não tinha ouvido falarem sobre a ausência dele.

― Eu não sabia que minhas ações foram a causa de tanto


falatório.

― Claro que não, o senhor não compareceu aos eventos


sociais londrinos durante todo o mês, com exceção, ao baile
da Duquesa, não o vi em mais nenhum outro baile, ou
jantar, ou sarau.

Então, é evidente que não teria ouvido.

― Eu não imaginava que teria essa repercussão ―


defendeu-se. ― Sinto muito que minha ausência tenha lhe
causado constrangimento.

Winchester parecia sincero, mas Clara não se deixou


amolecer. Não podia se permitir perdoá-lo tão facilmente.

― É bom que sinta mesmo. ― Clara ergueu a cabeça.

Aquelas palavras fizeram o Marquês sorrir, divertido, e ele


inclinou a cabeça observando melhor sua noiva.

Ela podia ser comum na aparência, mas sua personalidade


era completamente diferente das ladies que conhecia.
Imediatamente, Copas lhe veio à mente. Elas eram
parecidas nisso, até a voz lembrava a da outra mulher.
Aquilo o fez franzir o cenho. Devia estar se sentindo muito
atraído por Copas para enxergá-la em sua noiva.

― Então, vai aceitar caminhar comigo? ― ele perguntou,


esperançoso.
― Eu não tenho opção. ― Clara suspirou, resignada, sabia
que se voltasse para o quarto, o seu pai veria aquilo como
uma afronta.

― Eu não vou obrigá-la a ir comigo, se é o que teme. ― O


Marquês franziu o cenho.

― O senhor talvez não, mas meu pai não aceitará que eu


faça nenhuma desfeita. Então,

vamos logo.

Clara seguiu para a porta, sem esperar por ele, que


apressou para acompanhá-la.

Uma criada já os esperava na porta para acompanhá-los e,


assim, evitar falatórios. Clara pegou uma sombrinha e o
chapéu que criada segurava e, dessa vez, esperou o
Marquês.

Quando ficou ao lado de Clara, Winchester estendeu a mão


para servir de apoio para a Lady e essa, apesar do desgosto
visível em seu rosto, aceitou o gesto educadamente.

Começaram a caminhar em silêncio.

― O dia está muito bonito ― o Marquês comentou, tentando


diluir o silêncio.

― Está mesmo ― Lady Clara concordou, e o Marquês


percebeu que ainda estava irritada com ele.

― O que posso fazer para que me perdoe e esqueça o que


aconteceu? ― ele perguntou e Clara o observou bem, o
homem parecia mesmo disposto a tentar agradá-la. Era o
mínimo que podia fazer, afinal.
Entretanto, Clara não sabia se queria perdoá-lo. Preferia não
ter que casar com ele.

― Sinceramente, eu não sei. Não há nada que possa fazer


para desfazer este compromisso?

O Marquês sentiu o ego reclamar, não gostou de ver que a


noiva não queria casar com ele.

― Infelizmente, isso não está em meu poder. O rei foi


categórico sobre a realização do nosso matrimônio ― ele
explicou.

― Que pena. ― Clara suspirou.

― Eu não sou tão ruim assim. Prometo que será bem


tratada e que a respeitarei como minha esposa. Não é por
que tenho sido um péssimo noivo, que serei um péssimo
marido.

― Sinto muito, mas suas palavras não me convencem. Não


o conheço bem, Winchester, e o pouco que conheço do
senhor, não me faz acreditar que será um bom marido.

O Marquês se retesou diante daquelas palavras e, apesar de


saber que a lady tinha seus motivos para pensar aquilo, ele
não pode evitar sentir-se ofendido.

― Eu sinto muito. Prometo me esforçar para provar-lhe que


serei um marido à sua altura, milady.

Clara voltou a ficar em silêncio. Sabia que o ego dos


homens era algo frágil e que quando se ofendiam, podiam
se tornar inconsequentes, mas estava muito irritada para se
preocupar em poupar o ego dele.
― Me fale um pouco sobre você ― o Marquês pediu, depois
que se acalmou. Estava mesmo disposto a fazer a coisa
certa, mas Clara não facilitaria.

― Agora decidiu que quer saber sobre mim? ― Clara


debochou, ao lembrar que ele passou um mês fugindo dela.

― Não vai esquecer isso, não é? ― Winchester bufou,


desgostoso.

― Não. ― Clara retirou a mão do braço dele e cruzou os


braços. ― Nem vou perdoá-lo tão facilmente.

― Isso tudo por causa de um mês? ― perguntou,


exasperado.

― Para mim é um bom motivo.

― Eu discordo, milady ― anunciou. ― A senhorita deve ter


algo contra mim, para me odiar tanto.

Era claro que tinha, ele tinha dito que ela não o atraía em
nada e ainda tinha ficado um mês sem cortejá-la.
Absolutamente, tinha tudo contra ele.

― É um libertino, isso é algo que pesa contra o senhor. E um


Winchester ― ela

completou em pensamento. ― Sua fama lhe precede.

― Nunca ouviu dizer que os libertinos dão ótimos maridos?


― Ouvi sim, mas nenhum libertino que tenha se casado, o
fez contra a vontade. E o senhor, milorde, vai se casar
obrigado. Então, eu não estou contando que seja um ótimo
marido.

Nem mesmo, um marido razoável.

― Se é o que pensa sobre mim, que seja. ― O Marquês se


irritou. ― Mas a senhorita também não está sendo uma
companhia agradável, se soubesse que visitá-la seria tão
frustrante, eu nem mesmo teria feito tal esforço.

― O que esperava? Que eu o perdoasse e me jogasse em


seus braços depois de tudo o que fez? Sinto muito, Lorde
Winchester, mas escolheu a noiva errada para ofender, não
espere que eu o perdoe tão facilmente.

― Ótimo, era só o que me faltava, uma mulher rancorosa. ―


O Marquês bufou, frustrado.

― A culpa é inteiramente sua ― Clara respondeu, erguendo


o queixo em desafio. ― Se tivesse cumprido seus deveres
como meu noivo, eu não teria motivos para odiá-lo. O
senhor fez sua cama, Marquês, deite-se nela. Agora, se não
se importa, eu gostaria de ir para casa.

Naquela noite, o Marquês foi ao clube. As atitudes de sua


noiva durante a visita da tarde só o tinham irritado. Um
casamento ao lado dela o levaria à loucura.
Definitivamente, seria um inferno.

Assim que chegou ao clube, se direcionou para a ala da


Gula, precisava beber para esquecer aquele maldito dia.
Winchester ocupou uma mesa mais afastada e pediu uma
dose de conhaque. Uma Dama de branco o serviu e ele
pediu que lhe deixasse a garrafa.
— Pelo que estou vendo, a visita à sua noiva não foi tão boa
quanto esperava — Henry comentou, se aproximando do
amigo.

O Marquês ficou surpreso pelo Lorde saber que tinha


visitado Clara.

— Como soube que eu a visitei? ― ele perguntou, curioso.

— As fofocas correm. — Henry sorriu, sem revelar suas


fontes.

— Percebi isso hoje — Winchester respondeu, com o


semblante aborrecido, ao se lembrar da conversa com sua
noiva.

― Phillipa me contou ― Henry decidiu revelar.

― Imaginei que tivesse sido ela.

— Mas, então, como é sua noiva?

— Irritante, geniosa e petulante — O Marquês respondeu,


bebeu um gole de sua bebida e pediu mais uma carta.

— Sinceramente, você mereceu... — Henry sorriu,


debochando dele. ― Mas ela vai perdoá-lo, ela tem um bom
coração.

— Ela vai me enlouquecer, isso sim. Você acredita que não


aceitou minhas desculpas por não ter aparecido antes?

Henry sorriu ao ouvir aquilo e, em seguida, pediu mais um


copo a uma das Damas que passavam por ali.

— Não esperava menos dela.

― Você fala como se a conhecesse.


― Phillipa fala tanto dela, que é como se eu o fizesse ―
Henry mentiu. Conhecia Copas bem antes da amizade dela
com Phillipa.

O Marquês encheu novamente seu copo.

— E o que vai fazer em relação a sua noiva esquentadinha?


— o Lorde perguntou, obviamente se divertindo com aquela
situação.

— Não há nada a ser feito, apenas continuar a corte, casar


com ela e torcer para que não me enlouqueça antes de
gerar um herdeiro — respondeu, sem humor.

— Como você é otimista — Henry ironizou, debochado.

— Preferia mil vezes casar com Copas... Como que eu nunca


a vi aqui antes de o rei me arranjar esse casamento? —
Winchester perguntou, voltando toda a sua atenção para
Copas. —

Ela está mesmo aqui há dois anos? Eu nunca a tinha notado.

Henry riu com aquilo, mas em seguida, ficou sério, aquilo


podia acabar muito mal.

― Não está falando sério ― Henry inquiriu. ― Gosta de


Copas a ponto de querer se casar com ela?

― Não a conheço tão bem. Depois que você e Phillipa se


acertaram, ela tem me afastado.

Mas não consigo tirá-la dos meus pensamentos.

― Você tem uma noiva, Winchester, não precisa de outra


para complicar ainda mais a sua vida. Sem contar que, o rei
não será clemente caso quebre este compromisso ― Henry
avisou, tentando trazer o amigo à razão.

― Eu sei, inferno. Eu sei do meu compromisso. Não há


nenhum momento que eu não lembre que, em menos de
cinco meses, estarei casado com uma mulher que me odeia.

― Ela não o odeia, apenas está ofendida. Você é um


sedutor, meu amigo, o famoso amante que deixou até as
mulheres mais experientes esgotadas, com tamanho
apetite. ― A risada, ao pronunciar o título, foi inevitável.

― Nem me lembre disso. ― O Marquês se lembrou do dia


em que ganhou esse maldito título e riu junto com Henry. ―
Eu só pedi que ela falasse que eu tinha ido bem, apenas
isso. Meu pai não aceitaria menos que uma proeza de minha
parte. E precisei pagar caro para que ela mentisse para
mim. Nunca imaginei que diria que eu a tinha esgotado com
meu apetite, quando eu nem sequer a toquei.

― Ainda assim. Depois disso, as mulheres se jogavam em


sua cama. Seu autocontrole sempre foi admirável, meu
amigo. Outro homem não teria sido tão casto quanto você
foi.

― Na época, eu odiava prostitutas, lembra? Então, não era


um sacrifício, de fato, evita-las.

Winchester, por muito tempo, as culpou pela morte da mãe.


Mas, ao conhecer Nataly, ele mudou sua visão. Nataly era
uma jovem bela, havia aparecido no castelo pedindo um
trabalho como criada e ele a havia contratado. Não sabia
que ela era uma cortesã e estava fugindo de seu amante
anterior, um conde conhecido por sua crueldade e
mesquinharia.
Ao conhecer a história da jovem, que foi vendida pela tia
para um bordel, ele percebeu que nem todas escolhiam
aquela vida. E, ao saber sobre os maus-tratos que as
mulheres sofriam naquele lugar, mudou sua visão a respeito
das prostitutas. Elas nem sempre tinham outra opção, a não
ser aceitar o que o destino lhes reservava. E, por serem
mulheres, as escolhas eram ainda mais limitadas.

― Sim, você me contou sobre isso quando se tornou meu


sócio e o anjo da guarda das Damas de vermelho.

― Eu precisava garantir que elas seriam bem tratadas aqui.


Muitas não conhecem outra vida senão essa e estão tão
acostumadas, que preferem continuar com isso, enquanto
puderem. Eu sinceramente não as entendo, mas respeito as
suas escolhas.

― Mas não cansa de tentar convencê-las a escolher outra


vida. Voltando ao assunto de sua noiva, apenas deixe que
ela o conheça, você é um bom homem, Winchester, ela logo
verá isso.

Apenas procure ficar longe de Copas e creio que ficará bem.

― Não sei qual das duas me odeia mais. Acredita que Copas
usa a desculpa do meu noivado para justificar seu desprezo
por mim? ― O Marquês bufou, incrédulo.

― Ela deve ter seus motivos. Siga o meu conselho, dê


atenção à sua noiva e cumpra o seu papel. Se não pode
mudar a situação, pelo menos, tire algum proveito dela.
Lady Clara é bem mais do que aparenta ser e você pode se
surpreender com ela.

O Marquês franziu o cenho diante daquelas palavras. Henry


parecia saber mais do que contava, e Winchester não
gostou daquilo. Mas já estava acostumado com o silêncio do
Lorde.

Ele nunca pecava pela língua, então, nem adiantava querer


tirar dele alguma informação que não estivesse disposto a
dar.

― E, então, quando você vai ficar noivo? ― Winchester


perguntou, curioso.

― Após o casamento de Norfall, pedirei a ele que me


permita casar com Phillipa.

― Primeiro o Dorset, depois você e Phillip. Se eu soubesse


que casamento era contagioso, nem teria chegado perto ―
Winchester zombou, enchendo o copo com mais uma dose
de bebida.

― Um casamento não é algo tão ruim quanto parece, meu


amigo. Passar a vida inteira ao lado da mulher que ama
deve ser o paraíso, se ele existir.

― Já chega, por tudo que é sagrado, o que houve com você,


homem? Lady Phillipa estragou você completamente. Eu
vou ficar doente perto de tanta tolice melosa. Essa foi a
coisa mais ridícula que já ouvi você falar. Nem parece o
homem de sempre. Está até sorrindo. Que Deus me livre de
sofrer esse mesmo mal que vocês contraíram.

― Você que me incentivou a isso. ― Henry riu. ― Se não


fosse você e Copas, eu não teria ido atrás de Phillipa. Se
não tivesse me feito ciúme, eu jamais teria percebido que a
amava.

― E me arrependo amargamente, não sabia que o amor iria


transformá-lo em um parvo.
― Winchester estava sendo dramático, não sabia se por
causa da bebida, ou apenas para debochar do amigo.
Provavelmente, os dois. ― Mas alegro-me que, ao menos,
seja um parvo feliz.

― Mal posso esperar para devolver-lhe o deboche, meu


amigo. E, a meu ver, não está longe. Vai cair de amores por
sua mulher, antes mesmo que se dê conta disso.

― Deus me livre dessa má hora.

― Não sabe o que diz, meu amigo. ― Henry sorriu com a


resposta do Marquês, e se levantou. ― Bom, preciso ir.
Tenho que ver como estão os livros de contabilidade.

Quando o Lorde se retirou, Winchester ficou na mesa,


observando Copas, de onde estava.

O seu amigo havia dito para que ele ficasse longe da


jogadora, mas sabia que era uma tarefa impossível de ser
realizada, ainda mais, por ele estar cada dia mais fascinado
por aquela mulher.

Tudo nela o atraía. Seus cabelos avermelhados, seu corpo


pequeno, porém, voluptuoso, sua pele tão branca que
parecia de porcelana, seu gênio forte e, acima de tudo, sua
independência.

Tão diferente de sua noiva.

Clara era uma moça comum, com traços comuns, rosto


comum, tirando o seu temperamento forte, ela dificilmente
chamaria a atenção de qualquer homem. Muito menos, a
dele.

Diferente de Copas, que atraia todos os olharem por onde


passava.
Seria tão bom se sua noiva fosse Copas... Winchester
adoraria seduzi-la.

CAPÍTULO 3 ― COMPENSAÇÃO

Apesar de ainda não gostar de sua noiva, decidiu que


tentaria ter com ela uma amizade.

Faria as coisas da forma correta: a cortejaria como devia ter


feito antes e, quando conquistasse a amizade dela, seria
sincero ao falar para sua noiva que não sentia nada por ela,
mas que honraria o compromisso apesar de tudo, e que
talvez eles pudessem conviver bem.

Não quebraria a promessa que fez a sua mãe. Não trairia


sua noiva, mas também não a enganaria dizendo que a
amava, quando era em outra mulher que ele pensava. Sabia
que quando tivesse que cumprir com seus deveres de
marido, era em uma mulher ruiva que pensaria e isso teria
que ser suficiente.

Mas antes de conquistar a confiança de Clara, teria que


fazê-la perdoá-lo por seu erro. E, por isso, naquela manhã, o
Marquês apareceu em Catterfield House.

Clara se surpreendeu quando ele lhe trouxe flores e a


convidou novamente para um passeio, só que dessa vez
não pelos jardins da propriedade e, sim, pelo Regence Park.
Não tendo outra opção a não ser aceitar o convite, seguiram
de carruagem para o passeio.
― Espero que tenha gostado das flores ― o Marquês
começou, ao perceber que sua noiva não iniciaria por si
mesma a conversa.

― Eram lindas.

― Soube que na sexta haverá uma ópera. Gostaria de ir


comigo?

― Não. Não gostaria, mas terei que ir mesmo assim.

― Você não pode, ao menos, tentar se comportar como as


outras damas enfadonhas e previsíveis? Apenas sorrir
afetadamente e dizer: “Ah, eu adoraria.” ― o Marquês
imitou uma dama, afinando a voz, e isso fez Clara rir e, por
mais que ela estivesse tentando ficar séria, não pode conter
a risada que a cena causou.

― Isso foi ridículo ― ela comentou, quando parou de rir.

― Eu sei. Mas pelo menos agora não me olha como se fosse


arrancar minha cabeça.

― O senhor merece.

― Eu sei. Não devia tê-la abandonado como fiz. Reconheço


que errei, mas estou tentando fazer do modo certo agora.
Um mês atrasado, mas antes tarde do que nunca, não?

― Ainda estou com raiva, só para lembrá-lo.

― Eu sei, mas farei o meu melhor para merecer o seu


perdão.

Clara respirou fundo. Não iria conseguir ficar com raiva por
muito tempo, conhecia a si mesma o suficiente para saber
que logo o perdoaria, mas até ele provar que seria um bom
noivo de verdade, não o deixaria saber que ela já estava
perdoando-o.

― Assim espero.

O Marquês sorriu quando percebeu que ela estava dando-


lhe a chance de se redimir.

Talvez conseguisse fazer com que ela não o odiasse. Não


queria um casamento por amor. Nem mesmo esperava isso
dela, mas só em não ter que se casar com alguém que o
odiava, já era um bom começo.

Mais tarde, naquele dia, após deixar Clara em sua casa,


Winchester seguia na carruagem para o cais, com Dorset
afastado dos negócios para cuidar de seu filho que havia
nascido, e Norfall ocupado fazendo os preparativos do
casamento que seria no sábado seguinte, havia sobrado
para ele a responsabilidade de cuidar do negócio no qual
era sócio.

Mas não se importava em assumir aquela responsabilidade


por um tempo. Na verdade, até gostava dela, pois isso lhe
mantinha ocupado e assim não pensava em seu fado.

Conferiu junto ao capitão o estado do navio, agendou o


pagamento da tripulação e aprovou a nova rota que eles
fariam. Descobriu que capitão também estaria no
casamento do Duque de Norfall, que era um amigo muito
próximo de Madame Charlotte e que a modista o tinha em
alta conta.
Muita coisa havia acontecido desde o baile da Duquesa.
Henry e Phillipa se acertaram, o Duque e Charlotte também.
Foi anunciado nos jornais o casamento de Lorde Norfall com
Lady Sophia MacKyle Murray, filha do Duque de Antholl, que
na verdade, era Madame Charlotte.

Winchester jamais teria imaginado que a modista era uma


mulher nobre, mas havia ficado feliz pelo seu amigo, pois
sendo Charlotte uma nobre, seu casamento não causaria
um escândalo qual teria sido se ela fosse uma simples
plebeia.

Dois de seus melhores amigos e sócios estavam


comprometidos e completamente apaixonados por suas
mulheres, ansiando o dia fatídico de seus casamentos,
enquanto que Winchester só queria se livrar do seu.

Após resolver tudo o que tinha planejado no Siren,


Winchester seguiu para o Rogue’s. Ir ao clube tinha se
tornado parte do seu dia e ele sabia o motivo: Copas.

Apesar do conselho de Henry para esquecê-la, o Marquês


não conseguia tirá-la de seus pensamentos. A atração que
sentia por aquela mulher era mais forte do que ele. E, como
sabia que o seu tempo de solteiro estava acabando, se
quisesse ter algo com a jogadora, teria que fazê-lo antes do
casamento. Era o único jeito de não quebrar a promessa
que fez a sua mãe.

Chegando ao clube, Winchester seguiu direto para a sua


mesa preferida e ficou lá observando o ambiente ao seu
redor, ansiando vê-la. E não demorou muito. Logo, a mulher
que ele desejava apareceu embaralhando algumas cartas,
enquanto se direcionava para uma das mesas de apostas.

Lentamente, o Marquês se levantou e seguiu para a mesa


onde a jogadora estava. Ela ergueu a sobrancelha quando o
viu, mas nada falou e ele não viu o costumeiro ódio em seu
olhar.

Aquilo o deixou feliz.

― Qual jogo pretende jogar hoje, milorde? ― ela perguntou,


educadamente.

― O de sempre ― respondeu, com um sorriso e se


acomodou em uma cadeira, colocando as fichas de aposta
sobre a mesa.

Clara deu as cartas e o jogo começou.

― Você não quer minha cabeça em uma bandeja de prata,


hoje.

― Por que diz isso?

― Não me olhou como se quisesse me matar.

― Eu não faço isso ― Copas disse, um pouco desconfiada.


Não gostava da forma como

ele a estava olhando.

― Faz sim. ― Ele lhe sorriu, apreciando aquele momento


pacífico. ― Passou mais de mês fugindo de mim e hoje você
não tentou fazer isso, ainda.

― Eu não tenho culpa se o senhor passou mais de mês


sendo um canalha.

― Eu não era um canalha ― Winchester comentou,


observando as cartas em mãos, e então puxou mais uma.

― Pergunte à sua noiva, ela há de concordar comigo. ―


Copas sorriu, sarcástica. ―
Quer mais uma carta?

― Sim, apenas mais uma carta ― o Marquês pediu e logo


comentou sobre sua noiva. ―

Ela e eu passamos a manhã juntos, hoje. Estamos bem, ela


logo me perdoará por ter sido um estúpido.

― Quanto a sua estupidez, concordamos, mas o que ela


diria se soubesse que o senhor está passando suas noites
aqui no clube, perseguindo uma dama que faz apostas?

― Eu não a persigo ― Winchester fingiu-se ofendido. ― Eu


somente aprecio sua presença.

― Pois é exatamente isso que não deveria fazer. Sua noiva


ficaria desgostosa caso soubesse que aprecia a presença de
outra mulher. ― Clara puxou sua carta.

― Até onde sei, ainda sou solteiro.

― Até onde eu sei, o senhor é um homem comprometido,


milorde.

― Que eu me recorde, não proferi nenhum voto que me


impeça de apreciar a companhia de outras damas, além de
minha noiva.

― Quer dizer que sua noiva pode apreciar a companhia de


outros cavalheiros, além do senhor?

― Claro que pode, desde que apreciar a companhia seja


apenas apreciar a companhia

― Winchester falou, sério. Não gostaria que Lady Clara se


envolvesse com outros homens, não queria ter o mesmo fim
de sua mãe. Não que estivesse apaixonado por sua noiva,
mas a ideia de que ela podia traí-lo ao apaixonar-se por
outro, era tão repulsiva quanto a ideia de traí-la após o
casamento.

― E desde quando o senhor apenas aprecia a companhia


das mulheres? Pelo que eu soube, tais... damas, ficam muito
animadas quando tem a sua atenção... ― Copas riu quando
ele franziu o cenho para aquela frase ― As mulheres
comentam sobre as suas qualidades como amante, milorde.

O Marquês sorriu ao lembrar-se que quase todos os boatos


eram falsos e baixou três cartas de sua mão.

― Não dê ouvidos a boatos, minha cara, nem sempre eles


transmitem a verdade. A maioria delas eu, realmente,
apenas apreciei a companhia.

Copas indignou-se. O Marquês não tinha vergonha de mentir


descaradamente?

― Tudo bem. Deixaremos de lado os boatos. Neste


momento, o senhor está apreciando a minha companhia?

― É claro.

― Então, se eu o convidasse para subir para um dos


quartos, negaria?

― Teria que me convidar para saber a resposta. ― O


Marquês piscou.

Copas o fuzilou com o olhar. Sabia que ele não negaria um


pouco de prazer, caso ela resolvesse dá-lo.

― Tudo, bem dar-lhe-ei outro exemplo. ― Copas pensou por


um momento ― Se sua noiva estivesse sentada no seu
lugar, e aqui onde estou, fosse um dos Rogue’s e ambos
estivessem

conversando da mesma forma que nós estamos


conversando, e com as mesmas intenções que temos, o
senhor se importaria com essa situação?

― Provavelmente sim. Afinal, ela é uma dama. E mais, o


que ela estaria procurando em um local como este? ― o
Marquês tentou explicar, mas Copas o cortou.

― O que o senhor está procurando em um lugar como este?


― Copas usou as palavras do Marquês contra ele.

― Apenas uma bebida, uma partida de cartas e, quem sabe,


uma boa companhia.

― Tudo que sua noiva não poderia procurar, não é mesmo?


― Copas baixou mais duas cartas, após puxar uma.

― Não é que não possa, mas mulheres não costumam


gostar de bebidas, ou apostas.

Em vez de responder àquilo, Clara pegou o copo do Marquês


pela metade e entornou de uma vez e, em seguida, lhe
mostrou o baralho na mesa, indicando que gostava daquilo.

E, para a frustração da jogadora, o Marquês apreciou em


demasia o ato.

― É uma das coisas que mais aprecio na senhorita. Essa


diferença a torna especial. ―

Winchester sorriu para a mulher, enquanto baixava mais


algumas cartas que tinha em mãos.

― Sua noiva pode ter o mesmo hábito.


― Seria até bem-vindo. A bebida talvez não, já que
provavelmente aumentaria ainda mais o gênio forte que ela
tem, mas quanto as apostas, bom, esse eu iria até me
divertir apostando contra ela.

― O que apostaria contra ela? ― Copas perguntou, curiosa.

Naquele momento, o Marquês imaginou algumas apostas


indecentes que poderia fazer, mas era com Copas que ele
gostaria de jogar.

― Não espera que eu converse sobre intimidades sexuais


com a senhorita?

― Então, as apostas seriam sexuais? Agora fiquei ainda


mais curiosa. Como seriam essas apostas? ― Copas tentou
não demonstrar tanto interesse, concentrando-se no seu
baralho, porém, sabia que não tinha atingido o seu
propósito.

― Esse não é um assunto que eu me sinta compelido a


falar, ainda mais com a senhorita.

― Winchester sabia que falar aquilo aguçaria ainda mais a


curiosidade dela. Seria uma conversa interessante caso ela
mordesse a isca.

― Tarde demais para tentar manter a minha inocência,


milorde. ― Copas revirou os olhos. Ela já vira muito do que
acontecia entre um casal na cama. Não seria nenhuma
novidade tocar no assunto.

― Não é porque não é mais inocente, que eu irei


desrespeitá-la com tais assuntos. ― O

Marquês puxou mais uma carta, sorridente, ela tinha sim


mordido a isca. Ficaria curiosa e passaria a noite pensando
sobre tais apostas sexuais.

― Não vejo como um desrespeito. As Damas de vermelho


falam sobre esse assunto constantemente Então, discutir o
assunto com o senhor, não seria nenhuma novidade.

― Está mesmo curiosa sobre esse tipo de apostas. Mas


deixarei o assunto para outra noite, pois está tarde e eu
preciso ir. ― O Marquês sorriu ao perceber que isso a
frustrava e baixou de uma vez as cinco cartas que tinha em
mãos, completando dois dos montes dela e fazendo um
próprio com as outras três cartas. ― Uma boa noite, minha
cara.

Após aquilo, Winchester levantou-se, fez uma mesura


travessa e partiu, deixando Copas ainda mais curiosa.

No dia seguinte, o Marquês novamente foi visitar sua noiva,


dessa vez, pela tarde. Ao chegar na casa de Clara, a
Duquesa o encontrou na entrada de sua casa, enquanto
voltava de uma visita a sua amiga Lady Rockford.

Ambos seguiram para a sala de visitas e Lady Catterfield,


como uma boa anfitriã, lhe fez companhia enquanto
esperavam por Lady Clara.

― Ah, meu querido. Fico feliz que tenha melhorado e agora


possa cumprir com o seu papel de noivo devoto. Eu imagino
a aflição que deve ter sentido por não o fazer durante tanto
tempo. ― A Duquesa levou a mão ao coração, fazendo uma
expressão de tristeza e, então, rapidamente sorriu. ―
Entretanto, agora que está completamente curado,
poderemos finalmente dar o jantar de noivado. Espero que
desta vez nada atrapalhe.

― É claro, milady. Sinto muito por ter adiado tanto o jantar.

― Ah, não por isso, meu rapaz. ― A Duquesa acenou com a


mão, ignorando as desculpas do Marquês. ― Qual data é
melhor para o senhor, dia 12 ou 19?

― Dia 19 é perfeito.

― Maravilha. Lhe enviarei o convite formal esta semana,


para que não esqueça, e convidarei alguns amigos da
família. Gostaria que eu convidasse algum amigo seu, em
particular?

O Marquês pensou. Dorset estava aproveitando o tempo


com seu filho recém-nascido, Norfall estaria em lua de mel,
Henry recusaria o convite, e sua própria família odiava
compromissos com nobres e, tampouco, seria bem-vinda,
portanto, preferia preservá-los de momentos embaraçosos.

― Não se faz necessário. Prefiro um jantar mais discreto,


dessa forma conheço melhor a família da qual farei parte.

― Oh, vendo por esse lado, talvez seja melhor deixar os


convites extras para outra ocasião... Um baile, talvez...
Teremos tempo para mostrar à sociedade como vocês são
perfeitos um para o outro. Faremos um jantar íntimo apenas
para a família.

― É claro, milady.

A abertura abrupta da porta chamou a atenção do Marquês


e de Lady Catterfield, e logo duas moças idênticas entraram
na sala. A Duquesa olhou para as filhas com reprovação no
olhar, mas manteve a postura inalterada ao apresentá-las
ao Marquês.

― Lorde Winchester, estas são minhas filhas do meio. Lady


Caroline Catterfield e Lady Cristine Catterfield.

As donzelas fizeram uma reverência impecável.

O Marquês retribuiu o gesto, se curvando e sorrindo


educado para suas futuras cunhadas.

― Sinto muito por minhas filhas, como o senhor pode ver,


elas são duas jovenzinhas cheias de vigor e ainda não
deixaram completamente as falcatruas características das
crianças.

― Mamãe! ― as duas protestaram, ao mesmo tempo, ao


serem chamadas de infantis. A Duquesa sorriu, vitoriosa.

― Meninas, se querem que eu as trate como moças adultas,


então, tratem de agir como tal.

O Marquês percebeu a mudança instantânea nas gêmeas ao


erguerem a cabeça e estufarem o peito para parecerem
mais altas. Segurou o riso. Elas lhe lembravam Alice quando
mais nova.

― Estávamos ansiosas para conhecê-lo, Lorde Winchester ―


Lady Cristine foi a primeira a falar.

― Oh, sim, deveras ansiosas. Pensamos que nunca iria


aparecer ― Caroline completou e recebeu um olhar
reprovador de sua mãe.

― Sinto muito por deixá-las esperando, miladies.

― Está perdoado.
― Sim, está perdoado ― Cristine imitou a irmã.

― Agradeço a bondade de seus corações, por perdoar-me


com tamanha facilidade.

As gêmeas deram risinhos ao vê-lo ser tão galante com


elas.

― Agora que já conheceram o noivo de sua irmã, saiam


daqui, e aproveitem para chamar Lady Clara. ― A Duquesa
as enxotou da sala e as duas, após fazerem reverências
para o Marquês, deixaram a sala, comentando sobre se
casarem com um libertino como a irmã mais velha.

― Perdoe a falta de educação das meninas, juro, que elas


normalmente costumam ser extremamente polidas.
Acredito que estavam realmente animadas para conhecê-lo,
por isso tamanha euforia.

― Não se preocupe, milady, suas filhas são todas


maravilhosas, com certeza, devem ter puxado a senhora ―
Winchester elogiou e a Duquesa corou.

― O senhor é muito gentil ― Lady Catterfield agradeceu,


com um sorriso.

Poucos minutos depois, Lady Clara entrou na sala e a


primeira coisa que fez foi fuzilar Winchester com o olhar. A
Duquesa não percebeu o humor da filha.

― Mamãe, a senhora se importa se eu levar o meu noivo


para caminhar um pouco pelo jardim? Prometo que
permaneceremos onde podem nos ver.

― Ah é claro. Mas estejam sempre a vista e não se afastem


muito ― a Duquesa permitiu e o casal saiu para os jardins.
Andaram em silêncio até que chegaram a um lugar onde
poderiam conversar com certa privacidade, sem que
ninguém os escutasse.

― Vejo que decidiu me odiar hoje, posso saber o que fiz


desta vez?

― E o senhor ainda pergunta. ― Clara bufou. ― Talvez eu


deva flertar com algum lorde qualquer, como o senhor
estava fazendo por aí.

― Está me acusando de flertar com outro lorde? ― O


Marquês perguntou, ofendido.

― Não com outro homem, mas de flertar com outra mulher.

― Não o fiz, milady.

― E ainda ousa negar.

― Se a senhorita tem tanta certeza do que fiz, por que não


me diz exatamente o que sabe, para que eu entenda do que
está falando.

― Correm boatos de que o senhor está mais interessado em


mulheres de clubes, do que na própria noiva — Clara expôs.

Naquela manhã, ouvira uma das empregadas comentando


quando voltou do mercado, que a prima dela, que trabalha
na mansão do Hossvelt, havia ouvido o filho mais velho de
Lorde Hossvelt dizer que tinha visto o Marquês de
Winchester flertando na mesa de jogos com a Dama de
Copas.

Se não fosse pela fofoca que se alastrou tão rápido quanto


fogo em palha, Clara não estaria tão zangada. Mas ouvir as
empregadas falarem que o Marquês estava em seu direito,
a deixou furiosa.

― Ah, é isso... ― O Marquês passou as mãos no rosto.

― É só o que tem a me dizer? O senhor não se preocupa


com o que falam de mim, não é?

Já estão fazendo apostas de que o senhor irá buscar prazer


em outras camas, antes de eu lhe dar o primeiro varão. O
senhor tem noção do quanto isso é embaraçoso de ouvir?

― Eu sinto muito. Não pretendia que meu divertimento a


constrangesse de tal forma.

― Sempre desculpas, milorde. Se quer ter a mulher do


clube como esposa, é simples, dê um jeito do rei liberar-me
deste acordo e terá quem quiser. Mas, se o senhor pretende
continuar comigo, então sugiro que pare de ser
inconsequente dessa forma e de me causar
constrangimentos desse tipo. Primeiro, fui a noiva
abandonada pelo próprio noivo e, agora, sou a noiva
indesejada.

― Não estou sendo inconsequente. Copas é apenas minha


amiga.

― Amiga... ― Clara ironizou, para a ira de Winchester. ― O


que é uma amiga para o senhor? Porque eu sei que não me
interesso por nenhuma das minhas.

Aquela frase tocou em um ponto fraco do Marquês. Ele


odiava quando duvidavam da palavra dele. Então, sem
pensar, segurou o braço da dama e a fez olhar para ele.

― Você não tem que se preocupar, milady, estarei no


maldito altar no dia de nosso casamento. Não fugirei de
minha obrigação. Mas até lá, não aceito que fale assim
comigo.

― Assim como? Expondo as suas ações?

― Não aceito que fale comigo como se eu fosse um jovem


imaturo, que precisa de sermão para aprender a fazer as
coisas corretamente.

― Se não quer que eu o trate assim, é só não agir como um.


Agora, se me dá licença, sugiro que solte o meu braço antes
que me machuque...

― Por que você tem que deixar tudo mais difícil? ―


Winchester perguntou, soltando-a.

― Quando penso que estamos fazendo progresso, a


senhorita aparece querendo me atirar aos cães.

― Eu não tenho nenhuma culpa se o senhor tem tomado


decisões erradas nos últimos meses. Mas saiba que, uma
vez ligada ao senhor, eu acabo por me tornar o principal
alvo dos comentários daqueles que o cercam.

― Eu sei, inferno. Não gosto desses malditos comentários


tanto quanto você. ― O

Marquês passou a mão pelos cabelos. ― Perdoe-me pelo


linguajar inapropriado.

― Não me importo com o linguajar que o senhor utiliza. Isso


não me constrange.

Entretanto, se puder evitar as ações, eu lhe serei muito


grata.

― Tentarei ser mais discreto em minhas idas ao clube.


― O senhor pretende continuar indo para lá? ― Clara
revirou os olhos.

― Não vejo por que deixar de fazer algo que eu gosto, basta
apenas que seja mais cauteloso, e evitar ser pego
conversando com as damas do clube.

― O senhor é mesmo incorrigível.

― Não espera mesmo que eu me tranque em casa até o dia


do casamento, espera?

― Claro que não. Mas não me agrada ouvir outros falando


que está interessado em outra mulher. Dirão que o senhor
já me traia antes mesmo da data do casamento. Eu não
serei ridicularizada dessa forma.

― E eu, tampouco, deixarei meus negócios. Caso não saiba,


eu também sou um dos sócios do clube que frequento.
Então, não deixarei de frequentá-lo. Conforme-se com isso.

Clara respirou fundo. Odiava aquela sociedade. Se o


Marquês estava com outra mulher, a culpa era dela por não
ser interessante o suficiente para o marido. Se ele não a
visitava, a culpa também era dela por afastá-lo. Tudo era
culpa dela, quer ela estivesse envolvida quer não. As
pessoas que a conheciam, já a olhavam com pena. E ela
odiava aquilo.

― Você está bem? ― ele perguntou, quando viu que ela


estava silenciosa demais.

― Não, mas vou ficar. De qualquer forma, o que estou


passando agora, será apenas uma

amostra do que provavelmente passarei no casamento.


Afinal, ninguém espera fidelidade de um Winchester.
O Marquês viu a tristeza e a resignação no olhar dela, e
odiou-se por ser a causa daquilo.

Nem mesmo havia casado e já se mostrava igual ao seu pai.

― Me perdoe, minha cara. Darei um jeito de acabar com


esses falatórios. Prometo-lhe isso. ― Winchester pegou a
mão da noiva e levou aos lábios. ― Posso compensá-la com
um convite para a ópera esta noite?

Clara sorriu, agradecida. Serem vistos juntos faria com que


os boatos diminuíssem. E

sabia que era exatamente isso que ele queria, convidando-a


para a ópera.

CAPÍTULO 4 ― ÓPERA

Mais tarde naquela noite, o Marquês foi buscar Lady Clara


para juntos irem para a Ópera. Ele tinha um plano. Iria se
mostrar apaixonado por sua noiva e não tinha melhor lugar
para isso que em meio a tantas matronas fofoqueiras, que
rapidamente espalhariam a notícia de que o Marquês não
tinha olhos para outra, senão sua noiva.

Mostrar-se-ia um homem apaixonado por sua noiva. Mas


não diria isso em palavras, apenas deixaria que tirassem
suas próprias conclusões, assim não precisaria mentir.

Lady Clara desceu, animada. Adorava qualquer coisa


relacionada à música. E, apesar do vestido desconfortável,
mas de um azul muito bonito, que sua mãe insistira que
usasse, estava disposta a ter uma noite agradável.

Seu noivo a esperava, impecável e completamente de


preto, com exceção do lenço branco envolta do pescoço. Ele
era realmente muito bonito, precisava admitir. Se não fosse
um libertino e se não odiasse tanto o casamento com ela,
poderia até chegar a gostar dele. Ainda mais, quando ele a
olhava com aquele sorriso.

— Clara, você não pode gostar dele, lembre-se o que


acontece com mulheres que se apaixonam por um
Winchester ― disse para si mesma, quando se aproximou
de seu noivo.

― Estás muito linda, milady ― ele elogiou, enquanto


estendia a mão e pegava a dela, depositando um beijo
casto.

― Obrigada, milorde, o senhor está bastante elegante ― ela


lhe devolveu o elogio, não tinha motivos para ser
desagradável, quando ele era educado com ela.

― Podemos ir? ― Ofereceu-lhe o braço.

― Claro.

Clara entrou na carruagem junto com o Marquês e sua


dama de companhia, que os acompanharia naquela noite.

Seguiram em silêncio durante o trajeto até o teatro, mas por


ser curto, não se fez necessária nenhuma conversação.

Quando a carruagem parou em frente à entrada do Teatro


Real, o Marquês desceu e ajudou Clara a fazer o mesmo, e
estendeu-lhe o braço para que entrassem juntos.
Pararam muitas vezes para cumprimentar algum conhecido
e, mesmo assim, tendo pessoas observando o casal, o
Marquês não a largou em momento algum. Ele lhe segurava
a mão, sempre olhava para ela e sorria, apresentava-lhe
como sendo sua “bela noiva” e não parava de lhe elogiar.

Definitivamente, aquilo era muito suspeito. Mas Clara


decidiu pedir explicações apenas quando estivessem a sós.

Foram para o camarote do Marquês, que ficava do lado


oposto de onde Clara costumava ficar junto com a família. A
visão era quase tão boa quanto o camarote do Duque de
Catterfield.

― A ópera começará em instantes ― o Marquês informou,


lhe entregando uma luneta para que ela pudesse ver melhor
o palco.

― Não vai me dizer o que está tentando fazer?

― Apenas assistindo a ópera com minha noiva. ― O


Marquês sorriu para ela. ―

Acredito que, se as pessoas virem o quanto eu aprecio a sua


companhia, deixarão de lado a ideia de que eu não a quero.

― Entendo. ― Clara conseguiu sorrir. Ele estava fingindo


que gostava dela para que as pessoas parassem com os
comentários ruins a seu respeito. Pelo menos, ele estava
fazendo alguma coisa para corrigir a situação, concluiu em
pensamento. ― Neste caso, fingirei que também aprecio
sua presença.

O Marquês sorriu e, antes que pudesse falar algo, a ópera


começou.
Clara estava absorta na ópera, a mulher no palco era
magnífica, além da maravilhosa voz, possuía uma beleza
fora do comum e conseguia expressar com o corpo em
movimentos perfeitos a essência daquela peça.

Winchester não tirava os olhos de Clara. Era divertido e


encantador acompanhar as expressões que ela fazia,
enquanto assistia a apresentação. Ela estava adorável
naquela noite. O

vestido que usava lhe caia bem e deixava seus olhos mais
azuis do que cinzas.

Os olhos cinzas o fez pensar em Copas, a mulher também


tinha olhos daquela cor, mas na jogadora, aquela cor
chamava bem mais a atenção do que comparado à sua
noiva. Era interessante como Clara lhe fazia lembrar a
Dama de Copas, de um jeito que ele não sabia explicar. Às
vezes, enquanto conversava com sua noiva, quase podia
ouvir Copas falando.

Winchester riu com aquele pensamento e balançou a


cabeça, como se tentasse limpar a mente daquele tipo de
pensamento. O mínimo que podia fazer, era tentar não
pensar em outra mulher enquanto estivesse com sua noiva.

O primeiro ato da ópera encerrou-se, dando vez ao


intervalo, e o Marquês convidou Clara para a área comum.
Assim poderiam ser vistos.

Estendeu-lhe o braço para que ela o usasse de apoio, e


juntos saíram para fora do camarote.

― Está gostando da ópera? ― Winchester perguntou.

― Oh, sim. A voz da soprano é belíssima e a atuação


impecável. Obrigada por ter me convidado. ― Clara sorriu,
sendo sincera. Tinha apreciado bastante o primeiro
momento.

― Fico feliz em ouvir isso. ― O Marquês sorriu e acariciou-


lhe a mão. Estavam em público e via que algumas pessoas
os observavam, por isso, decidiu fazer o gesto carinhoso. ―

Gostaria de beber alguma coisa?

― Ah sim, um refresco, por favor.

Gabriel se afastou para pegar o que Clara havia pedido. E


enquanto estava longe, outro homem se aproximou.

― Lady Clara, que prazer em vê-la. ― O homem sorriu para


a lady, que lhe retribuiu o sorriso com afeto.

― Sr. Callahran ― Clara fez uma mesura para o homem. E


esse lhe fez uma reverência.

― Que alegria. Não sabia que tinha voltado de viagem.

― Voltei essa manhã ― Callahran informou. ― E como


Helena Minecci é uma velha conhecida minha, vim prestigiá-
la.

― Ah sim. Espero que não demore muito em ir nos visitar,


mamãe vai ficar exultante quando souber que o senhor
retornou depois de dois longos anos na Itália.

― É claro, mas, por ora, não diga nada a ela, quero fazer
uma surpresa a minha amiga mais antiga.

― Oh, é claro. Não direi que o vi, mas não demore a


aparecer.

― Pode deixar que não tardarei. Em breve, farei uma visita.


Mas me diga, é verdade que está noiva? ― o homem
perguntou, para ter certeza do boato que ouviu assim que
chegou.

― Ah, sim. É verdade. ― Clara abriu um sorriso enorme.

― Diga-me quem é o felizardo que terá a mão de uma das


mulheres mais maravilhosas

que conheço?

Clara riu com o elogio. Sr. Callahran era sempre assim. Ela o
conhecia desde bebê. Era um grande amigo de sua mãe e
sempre frequentou a sua casa. Ele a vira crescer e ela o
considerava da família.

― Me casarei com Lorde Winchester.

― O Marquês de Winchester? ― Callahran enfureceu-se.


Sabia da fama dos Winchester e não gostava nem um pouco
da ideia de Lady Clara se casando com alguém daquela
família. ―

Onde seu pai estava com a cabeça para permitir um


casamento com um homem daquele?

― Foi ordem do rei ― explicou.

― Não importa, como seu pai, ele deveria ter sido contra
essa união, os Winchester são todos libertinos, nenhum se
salva.

― Não seja maldoso ― Clara defendeu o noivo. ― O meu


noivo é um bom homem.

― Clara, não se apaixone por ele, sabe o que acontece com


mulheres que amam os Winchester, todas elas morrem de
coração partido. Nenhum deles sabe amar.
― Não se preocupe. Não pretendo me apaixonar por ele. ―
Clara bufou. ― Quanto ao casamento, nenhum de nós tem
escolha nesse quesito.

― Queria poder ajudar, mas como sabe, eu só apenas um


homem.

― Não se preocupe, já estou conformada quanto ao


casamento. ― Clara sorriu, na tentativa de mostrar que
estava tudo bem. ― E não é de todo ruim. Ele tem sido
bastante gentil. ―

Desde que finalmente decidiu me visitar após um mês de


esquecimento, Clara completou em pensamento. Callahran
não precisava saber daquele detalhe.

― Só me prometa que tomará cuidado com esse homem.

― Não se preocupe, tomarei cuidado sim ― Clara prometeu,


segurando a vontade de revirar os olhos. Aquela era uma
das desvantagens de tê-lo conhecido na infância, ele
sempre a veria e até a trataria como uma criança.

― Então, agora posso seguir meu caminho em paz.


Obrigado pela conversa, minha cara.

Até breve. ― O homem beijou-lhe a palma e seguiu na


direção do camarim, onde a cantora estava.

De longe, o Marquês observava aquela cena. Não gostava


da alegria e da familiaridade com que o homem conversava
com Lady Clara. E ela parecia muito feliz com a companhia
dele.

Enfureceu-se ao ver sua noiva sorrir tão abertamente para o


homem.
Albert Hoswetle, o Barão de Callahran, era um homem rico,
solteiro, já na casa dos cinquenta anos, não era dado a
vícios e sempre foi um amigo próximo dos Catterfield. Era
apenas isso que sabia sobre o homem. Precisava investigá-
lo melhor.

Assim que o Barão se afastou, Winchester retornou para


junto de sua noiva com as bebidas na mão. Entregou a ela
uma e bebericou a sua, tentando tirar qualquer emoção de
sua voz.

― Era Callahran ali? ― ele perguntou, soando indiferente.

― Sim ― Clara confirmou. ― Ele estava há dois anos na


Itália. Retornou hoje.

― Entendo. Vocês são muito próximos?

― Sim, o conheço desde que nasci, é como se fosse parte


da família. Mamãe o tem em alta estima e papai e ele eram
amigos na universidade.

― Compreendo.

― O senhor está bem? Parece aborrecido.

― Não é nada ― mentiu. ― Vamos. A segunda parte logo


vai começar.

Ainda teriam alguns bons minutos antes que a cantora


subisse novamente ao palco, mas

Clara preferiu não comentar e o seguiu de volta para o


camarote.

― O senhor continua aborrecido. ― Clara não conseguiu


evitar provocá-lo. ― O que tem contra Callahran?
― Não tenho nada contra ele e não estou aborrecido. ―
Winchester semicerrou os olhos para ela e, ao ver o sorriso
travesso que abria nos lábios da moça, entendeu que ela
estava fazendo de propósito. ― Não deveria me provocar,
milady.

― Não o estou.

― E o que fazes, então?

― Apenas converso. Estou tentando manter uma conversa


educada e harmoniosa, mas o senhor se irrita facilmente.

― Isso não é verdade.

Aquela declaração apenas provou que estava certa.


Entretanto, esperou que continuasse.

Não demorou muito.

― Só não gosto da intimidade que ele lhe tratou, a


senhorita agora é uma dama compromissada, não deve dar
liberdades a nenhum outro homem, além de seu noivo.

Clara ergueu uma sobrancelha.

― E o mesmo vale para o senhor? ― Não era justo que


apenas ela devesse evitar intimidades.

― É evidente. Eu não tenho intimidades com outras


mulheres.

― E o flerte com a mulher do clube é o quê? ― Clara irritou-


se, como ele ousava mentir para ela de uma forma tão
descarada? Eles estavam ali por causa dos boatos que ele
estava flertando com outras mulheres e agora ele queria
dar lições de moralidade a ela.
― Não estava flertando.

― O senhor não passa de um mentiroso. ― Clara enfureceu-


se e se afastou dele. ― Eu tenho muitos amigos, Lorde
Winchester, amigos que me dirão exatamente o que viram
naquele clube e eles não mentiram para mim quando me
contaram do seu flerte.

Depois de dizer isso, Clara saiu do camarim, precisava se


acalmar, ou poderia criar uma cena logo ali e tudo que
menos precisavam naquele momento era uma cena. Seguiu
pelo corredor lotado com um pouco de dificuldade, pois
todos estavam andando na direção contrária, já que a
segunda parte da ópera logo teria início. Precisava de um
pouco de ar gelado para acalmar a raiva que fervia seu
sangue. Atravessou as portas duplas e se direcionou ao
jardim, continuou andando até encontrar um banco entre as
árvores, onde poderia se sentar.

Clara odiava o Marquês naquele momento. Precisou


inventar a história sobre os amigos para não expor seu
segredo, mas não era mentira, poderia perguntar a
qualquer Rogue que eles diriam que Winchester estava
mesmo flertando com Copas.

Após sentar-se no banco, Clara respirou compassadamente,


na tentativa de colocar seus pensamentos em ordem. Não
poderia odiá-lo para sempre, ou seu casamento se tornaria
um inferno, e passar a vida toda ao lado de um homem que
não a respeitava e a traia, seria sua maior provação.

Pelo menos, não estou apaixonada por ele. O pensamento a


fez rir nervosamente. Se estivesse apaixonada, com
certeza, teria o mesmo fim da mãe dele.

Segundo os boatos, a Marquesa havia amado tanto o


homem, que adoecera só para lhe chamar a atenção,
ficando louca e definhando até a morte. Clara não queria
aquele mesmo fim para si.

Porque era fácil, muito fácil, se deixar levar por aquele


sorriso malicioso, aqueles olhos castanhos, pelo galanteio,
Winchester sabia ser apaixonante quando queria... Sua
maior missão

seria não se apaixonar por seu marido. Então, quanto mais


raiva ele lhe fizesse, mais fácil seria não o amar.

Clara finalmente estava mais calma. Olhou ao redor,


procurando sua dama de companhia e ficou surpresa ao
perceber que estava sozinha. Levantou-se imediatamente,
precisava retornar para junto dele. Se continuasse ali
sozinha poderia acabar metida em problemas e o escândalo
seria muito maior do que meros boatos.

― Não sabe que é perigoso ficar aqui sozinha durante à


noite? ― o Marquês ralhou, indo ao encontro da lady. Ele
estava visivelmente irritado.

― Eu estou bem, não me aconteceu nada. ― Clara não


permitiria que ele lhe desse nenhuma lição de moral quando
a culpa de ela estar naquela situação era inteiramente dele.
― Já estava retornando.

― Você não tem noção do perigo que correu. Qualquer


homem poderia ter lhe seguido e feito coisas horrendas com
você.

― Como o senhor pode perceber, não houve nada. Mas não


precisava se preocupar, devo ser tão desinteressante para
eles como sou para o senhor. Ninguém ousaria me tocar.

O Marquês cerrou o maxilar. Sentia que ela estava jogando


aquelas palavras contra ele deliberadamente.
― Nunca disse que era desinteressante.

― Então, por que passou um mês sem me visitar?

― Ah, não vamos começar com isso de novo. Já pedi


desculpas.

― Eu sei. Mas não vou esquecer.

― Por que você tem que tornar tudo tão mais complicado?

― Por que o senhor não pode ser um noivo como todos os


outros?

― Defina: como todos os outros.

― O senhor sabe.

― Eu estou fazendo o meu papel, se está tentando insinuar


o contrário, a senhorita que não está fazendo o seu.

― Não estou fazendo o meu? ― Clara irritou-se. ― Eu


deveria fazer o quê? Fingir que não tenho vontade, ou
opinião como toda moça da minha idade? Apenas sorrir
como uma tola e concordar com tudo o que o senhor diz?
Me desculpe, mas não vou mudar quem eu sou para
agradá-lo.

― Então, tampouco eu o farei.

― Era de se esperar. Não se preocupe comigo, vá procurar


um rabo de saia que lhe agrade e me deixe em paz.

― Se é isso que quer, então eu farei, mas não reclame dos


boatos depois.

Clara estava furiosa. Odiava-o com todas as forças. Não


suportaria ficar na presença dele por mais nenhum instante.
Deu um passo para longe do Marquês, mas este a segurou
pelo braço.

― Aonde pensa que vai? ― ele perguntou, irritado.

― Eu vou para casa, não me faz bem ficar aqui.

― Que seja, então, lhe arrumarei a carruagem.

Seguiram juntos e em silêncio até onde as carruagens


estavam esperando e o Marquês a colocou lá dentro.

― Não saia daqui, mandarei sua criada vir.

Clara ficou sentada, vendo-o se afastar e sumir pela porta.


Minutos depois, sua criada vinha em sua direção, parecendo
preocupada.

― Milady, a senhora está bem? Eu a perdi de vista e fiquei


procurando-a dentro do teatro. O que aconteceu?

― Não aconteceu nada. Não se preocupe. Agora, vamos


para casa.

Voltaram para casa e o Marquês seguiu direto para o clube.


Precisava de algo forte.

Agora tinha uma única certeza, seu casamento seria uma


verdadeira tortura.
CAPÍTULO 5 ― PREOCUPAÇÕES

No dia seguinte, Clara esperou que o Marquês fosse lhe


visitar. Em vez disso, recebeu apenas uma missiva,
informando que ele estava partindo para Arondalle, para o
casamento do Duque de Norfall.

Clara suspirou. A briga na noite anterior lhe deixou inquieta.


Não queria realmente que ele fosse atrás de nenhum rabo
de saia. Só de imaginá-lo com outra mulher, sentia vontade
de esganá-lo.

Preferia que ele flertasse com Copas do que com outra


mulher.

Carmelita a tirou dos pensamentos, ao entrar em seu quarto


e lhe ajudar a se vestir. Era noite e ela precisava ir ao clube.
Já não tinha ido na noite anterior e não gostava de perder o
foco, mas não suportaria ver o Marquês fazendo o que lhe
prometeu com outra mulher, ou mesmo com ela, e estava
muito irritada com ele para fingir ser Copas.

― A senhorita parece aborrecida, o que aconteceu, minha


menina? ― a senhora perguntou, enquanto amarrava o seu
corpete.

― Não foi nada. Apenas mais um problema como meu


noivo. Não devia ser tão complicado assim noivar com
alguém.

― Não deve ser complicado, mas também não deve ser


fácil. Vocês dois parecem ser geniosos e ambos dificultam,
não cedendo em suas convicções.

― Eu não estou dificultando nada. Ele que é extremamente


irritante e um libertino!

― Quer me contar o que está acontecendo?

― Não é nada de mais mesmo, é só que sempre que parece


que começamos a nos entender, ele estraga tudo. Acredita
que ele disse que não estava flertando com Copas, sendo
que eu estava lá. Eu vi como ele olhava para ela, como ele
sorria para ela, como ele conversava com ela. Ele está
interessado nela.

― E você queria que ele olhasse assim para você.

― Sim, quero dizer, não. Não me importo que ele goste de


outra mulher, mas não quero mentiras. Se ele gosta, então,
fale a verdade para mim. Sei que ele não será fiel no
casamento, assim como o pai dele, mas não quero que ele
minta, ou tente me enganar. Prefiro que ele seja sincero e
me diga que está interessado em outra mulher, do que dizer
que está feliz ao meu lado e só pensa em mim, quando sei
que não o faz.

Carmelita suspirou. Ficava triste ao ver sua menina tão


abalada daquela forma.

― Então, talvez devesse dizer isso a ele. Mas não se


esqueça de que ele não é o único que está escondendo
algo. Você também não está sendo verdadeira. É injusto
cobrar algo que não se deu. Conte a ele que é Copas.

― Eu vou fazer isso quando ele voltar.

― Tudo bem. Faça isso e então poderá cobrar dele


sinceridade também.
Três dias se passaram e, nesse período, Clara ficou
pensando como seria o momento que contaria a Winchester
que Copas e ela eram a mesma mulher. Imaginava como ele
reagiria. Na pior das hipóteses, a odiaria, e na melhor,
ficaria apenas irritado por ter sido enganado.

Não podia negar, a ideia de contar a ele o seu segredo a


amedrontava. Ele nunca aceitaria uma esposa que
trabalhasse como uma apostadora em um clube de
cavalheiros. Precisaria encontrar o momento e as palavras
certas para lhe revelar algo tão comprometedor.

O casamento do Duque havia sido na manhã anterior e,


segundo a missiva do Marquês, os festejos durariam dois
dias. O que dava a ela mais um tempo para se preparar
antes de encará-lo.

O trabalho naquela noite estava se encerrando. Os clientes


já tinham ido embora em sua maioria e ela estava se
preparando para voltar para casa, quando o viu entrar
rapidamente. Não demorou muito e logo saiu a passos
largos, seguido de perto por Dmitri, uma vez que Henry
também estava no casamento.

Alguns minutos depois, Dmitri retornou sozinho e subiu para


a sala do Lorde. E a curiosidade de Copas ultrapassou todos
os limites possíveis.

Ela decidiu saber o que estava acontecendo.

Bateu na porta do escritório e esperou o convite para entrar.

― Copas, está tudo bem? ― Dmitri perguntou, após mandar


quem estivesse na porta entrar.

― Ah, está sim ― ela respondeu. ― Dmitri, era Winchester,


o homem que há pouco estava com você?
― Sim, por quê? ― o russo indagou.

― Pensei que ele estivesse no casamento de Lorde Norfall.

― E estava, houve alguns contratempos ― Dmitri explicou e


seus olhos ficaram sombrios. O Marquês tinha lhe contado o
que havia acontecido no casamento do Duque e lhe
entregou uma carta de Henry, na qual havia ordens a serem
cumpridas. ― Lorde Norfall foi envenenado.

Aquelas palavras pegaram Copas de surpresa e, apesar de


não conhecer tão bem o Duque quanto conhecia Phillipa, já
o tinha visto várias vezes no clube. Nunca chegaram a
conversar, o Duque sempre estava com o semblante sério,
mas ele sempre a tratou respeitosamente durante algumas
partidas e a defendia quando necessário, como era dever de
todos os sócios fundadores do clube.

― Ele... ele... ― Copas não conseguiu terminar a frase

― Ele ainda vive.

Um sentimento de alívio tomou conta de Copas. Phillipa


ficaria arrasada caso perdesse o irmão.

― Que bom que ele vive. E o que Winchester está fazendo


aqui, pensei que o Duque fosse amigo dele.

― E é, ele está aqui apenas para garantir que a principal


suspeita não fuja.

― Oh. Espero que ela pague pelo que fez, então.

― Ela vai pagar sim.

Quando voltava para casa, Clara pensou em Winchester


com preocupação. Londres estava muito violenta para o seu
gosto. O atentado a Henry, a confusão na casa da Sra.
Willians e, agora, o envenenamento do Duque. Esperava
que seu noivo ficasse bem.

E naquela noite rezou por ele.

Dois dias depois, a notícia da morte de Madame Rosana se


espalhou rapidamente e, até o fim da tarde, todos já
especulavam sobre os motivos para a mulher ter tirado a
própria vida.

Quando chegou à noite, Clara foi ao clube, como sempre.


Após se arrumar e colocar a máscara e o vestido, Copas
adentrou o lugar.

E qual sua surpresa ao encontrar o Marquês lá, sentado em


uma das mesas afastadas. Ele não falou nada, apenas
continuou sentado, perdido em pensamentos e bebendo
durante toda a noite.

Quando todos os membros já haviam saído, Copas decidiu


se aproximar para saber como ele estava.

― Se importa se eu me sentar aqui? ― ela perguntou,


apontando para cadeira em frente ao homem.

― Não me importo. Sente-se. ― Ele estava sério, parecia


cansado e um tanto perturbado.

― Como você está? ― Copas solidarizou-se por entender o


motivo da aflição.
― Não muito bem ― Winchester disse, tomando um gole da
bebida âmbar, mas a habitual alegria em seus olhos havia
desaparecido.

― Eu soube do que aconteceu. O Duque está bem?

― De acordo com a última carta, ele ainda está


inconsciente. Mas se recupera lentamente e o médico está
otimista.

― Ele ficará bem. ― Copas segurou a mão do Marquês em


cima da mesa. Odiava-o vê-

lo daquela forma.

O Marquês surpreendeu-se com o toque. Olhou para aquele


contato e lhe pareceu tão...

íntimo.

Copas não usava luvas e ele, tampouco, apesar do frio. E o


toque de pele com pele era tentador.

― Espero que sim ― ele respondeu, ao se dar conta que ela


esperava uma resposta.

― Vocês são muito amigos, estou certa?

― Sim. Ele costumava cuidar de mim no colégio. Eu adorava


brigar, então, estava sempre metido em confusão. Norfall
que costumava cuidar de meus ferimentos depois das
brigas.

― E por que brigava?

― Era uma forma de extravasar. Normalmente costumavam


implicar comigo e eu não deixava barato.
― Não me admira. ― Copas sorriu ao imaginar o jovem
espevitado que o Marquês um dia foi.

― O que quer dizer?

― O senhor não me parece o tipo de homem covarde.

― Isso é verdade... Não sou covarde. Agora que


mencionou... que tipo de homem eu lhe pareço?

― Do tipo que ri na cara do perigo e que gosta de brincar


com ele.

O Marquês sorriu, gostando daquela classificação. Apesar de


que sabia ceder quando via que era uma luta que ele não
tinha nenhuma condição de ganhar.

― Gosto dessa definição. Mas eu creio que ela se aplique a


você também...

― Por quê?

― Você não parece o tipo de mulher obediente. É bastante


geniosa e transparente a respeito do que está sentindo.

― Não sou tão transparente assim.

― Então, vai dizer que não estava preocupada comigo?

― Sim. Eu não estava preocupada com o senhor.

― Está blefando. ― O Marquês sorriu, tendo certeza daquilo.

― Não seja prepotente ― Clara o desafiou, com um sorriso.

― Isso só prova que eu estou certo. A senhorita estava


preocupada comigo.
― É normal eu me preocupar com o senhor ― Copas soltou
sem querer e gelou. ― Digo, o senhor é um dos sócios do
clube e o Lorde o tem em grande estima, todos nós nos
preocupamos com o senhor, com Lorde Dorset e Lorde
Norfall.

O Marquês observou-a corar e tentar consertar a fala e foi,


então, que ele descobriu o que ela escondia e que agora era
mais que evidente: ela estava interessada nele.

Copas tinha se afastado dele quando descobriu que ele


estava noivo. Estava sempre irritada com ele e tentava
evita-lo. Sempre trazia à tona o noivado dele quando ele
tentava conversar com ela.

― Não acho que seja por isso. ― Winchester sorria ao dizer


aquelas palavras. ― A senhorita gosta de mim.

Copas franziu o cenho e o olhou, séria.

― Não gosto. Na verdade, eu não suporto o senhor. Apenas


tentei ser simpática em um momento delicado. Não seja
tolo a pensar que nutro qualquer sentimento por sua
pessoa.

― Viu, eu tinha razão.

A dama se exasperou. Ele iria continuar insistindo naquela


insanidade?

― Não ouviu nada que eu disse?

Winchester colocou os cotovelos na mesa e apoiou o queixo


com os dedos cruzados.

― Ouvi o que você não disse, minha cara. Sua reação


defensiva anulou cada palavrinha sua. Você gosta de mim,
mas como sabe que estou noivo, prefere me odiar a nutrir o
sentimento que tenta negar.

― O senhor é mesmo um tolo se acredita nisso.

― Não só acredito, como posso provar.

― O que quer dizer?

O Marquês olhou ao redor. No clube restavam apenas alguns


empregados, que organizavam as mesas e as cadeiras e
limpavam o local, mas ainda assim, queria privacidade.

Não ia correr o risco de ser visto com ela.

― Venha comigo, vou lhe mostrar o que quero dizer.

Copas olhou desconfiada o Marquês se levantar e lhe


estender a mão.

― Aonde pretende ir?

― Apenas para um lugar onde não possam nos ver. Não


quero nenhum boato preocupando minha noiva.

― Não sei se é sensato.

― Está com medo de eu provar que está errada?

― Não há essa possibilidade, eu não estou mentindo.

― Então, não deve ter medo, prometo que não farei nada
que não queira.
Copas sabia que aquela era uma péssima ideia. Não devia
deixar que ele a convencesse a ir, mas fazer isso era o
mesmo de concordar que ele estava certo. E ele não estava.
Por esse motivo, se levantou e se deixou guiar para um
quarto onde poderiam ter privacidade.

Para o crédito do Marquês, ele não a levou para um dos


quartos da Luxúria. Em vez disso, foram para o vestiário
que, naquele momento, estava vazio.

― Então, como pretende provar que eu estou errada? ―


Copas desafiou. Por fora, parecia resoluta e confiante, mas
por dentro seu coração estava acelerado.

Winchester sorriu, parecendo saber que aquela segurança


toda não vinha de dentro e se inclinou na direção de Copas,
ficando mais próximo do que devia, mas nada disse. Com
uma mão tocou o rosto dela, indo da orelha até a boca.
Demorou-se com os dedos nos lábios de Copas, observando
as reações que a mulher tinha com aquele toque. E ficando
bastante satisfeito com aquilo.

Em seguida, desceu a mão pelo seu pescoço, ombro e braço


direito, pegou a mão dela e a levou aos lábios. Depositando
um beijo suave, enquanto a olhava profundamente. Beijou a
ponta de cada dedo, depois os nós e. por fim, o dorso e a
palma da mão.

A respiração da lady estava acelerada e seus olhos


arregalados, aqueles simples beijos não deviam lhe fazer
ofegar, mas aquilo era exatamente o que eles lhe
causaram.

E, sem que ela percebesse, o Marquês se inclinou e


sussurrou em seu ouvido.
― Aí está a prova que está errada. Você me deseja. ― Para
completar, ele mordeu o lóbulo da orelha de Copas e
depositou um beijo em seu pescoço, causando um arrepio
dos pés à cabeça da mulher e, em seguida, a deixou
sozinha.

Em casa, o Marquês não conseguia tirar Copas de seus


pensamentos.

Tinha provado que ela o desejava, mas acabara, também,


provando para si mesmo que não era indiferente a ela. Por
isso, tinha saído tão rapidamente. Ao tentar provocá-la, ele
tinha atiçado o próprio desejo de tê-la em sua cama. E se
não a tirasse aquela mulher dos pensamentos, com certeza,
iria se meter em um problema dos grandes.

Ia se casar com Clara, não tinha como fugir de seu destino,


e a promessa que fez na juventude à sua mãe, o impedia de
ter amantes após o casamento.

Ao pensar em seu casamento, lembrou-se de sua noiva. Ele


tinha deixado Lady Clara depois de uma discussão. E
pensou em sua noiva durante toda a viagem a Arondalle.
Precisava visitá-la e resolver os assuntos pendentes entre
eles. Não era bom que entrassem em um casamento
intrigados um com o outro. E nesse caso, preferia ser ele a
ceder e ir ao encontro dela.

Não sabia exatamente como ela o receberia, uma vez que


na última vez que estiveram juntos, acabaram brigando e
Clara havia ido embora muito irritada. Ele também tinha se
exasperado. Mas precisavam conversar e se entender. Claro
que sempre poderia deixá-la no campo e vir para a cidade,
não precisavam conviver todos os dias. Mas até que
conseguissem produzir um herdeiro, era melhor que
permanecessem debaixo do mesmo teto e compartilhassem
a cama.

Clara não conseguiu dormir aquela noite. Seu corpo ainda


se lembrava do toque dele.

Não devia ter permitido que ele agisse com tanta


intimidade, mas não havia conseguido resistir ao desafio
que ele lhe oferecia.

Como eu pude fazer aquilo? Deixar que ele me tocasse


daquela forma?

Se soubesse que ele a tocaria para provar que estava


errada, teria se controlado e jamais reagiria daquela forma.
Ele a pegou despreparada. Apenas isso. E, por esse motivo,
tinha sentido todo seu corpo responder ao toque dele. Algo
que nunca tinha lhe acontecido com nenhum outro homem.

E se isso significa que gosto dele? ― O pensamento a


assombrou. ― Não. Não posso gostar dele, é um erro.

― Não posso gostar dele... Eu não gosto dele... não... ― ela


sussurrou, antes de adormecer. ― ... Gosto dele.

Quando acordou, o sol já estava alto no céu, indicando que


ela dormiu demais. Depois de se arrumar, desceu para
comer alguma coisa, estava faminta.

Após a refeição, decidiu bordar um pouco com suas irmãs.


Por mais que elas fossem irritantes, na maioria das vezes,
naquele momento preferia a companhia delas do que ficar a
sós com seus pensamentos. Então, se juntou a elas na sala.

Assim que entrou no recinto, sua mãe e suas irmãs pararam


o que estavam fazendo e se viraram para ela.

― Oh, sente-se, querida, estávamos falando sobre você.


Precisamos escolher as cores para o casamento. Esta
semana mesmo iremos na modista, já devíamos ter ido,
mas seu pai anda bem ausente, então, demoramos para
falar com o administrador. Faremos uma festa digna de um
rei.

― Mamãe, creio que não seja uma boa hora para um


casamento luxuoso, eu preferiria algo mais simples ― Clara
tentou convencer sua mãe. Sabia que as finanças estavam
baixas e que deixar a Duquesa fazer a festa que estava
planejando, deixaria o Ducado ainda mais endividado.

― Por que não fazemos algo pequeno, apenas para a família


e amigos próximos?

― É claro que não. Irão pensar que estamos falidos. Não


posso concordar com isso.

Você é filha de um Duque, tataraneta de um rei, não


aceitarei nada menos do que um casamento digno de uma
princesa ― a Duquesa desdenhou da preocupação da filha,
com um movimento de mão. ― Convidaremos toda a
aristocracia londrina para este momento único.

Clara gemeu, desgostosa. Não podiam gastar aquela


fortuna. Na verdade, nem sequer tinham aquela fortuna
disponível. Precisava convencer seu pai a impedir que a
Duquesa fizesse aquela loucura.

― Eu acho que deveríamos fazer na capela de Cattermont.


A abadia do Castelo é linda.

Seria um ótimo lugar ― Caroline sugeriu.

― É muito longe, acredito que fazer aqui em Londres é


muito mais interessante. Papai pode falar com o rei para
usarmos a Catedral para o casamento. Seria o lugar
perfeito. O meu casamento terá que ser lá.

― Pois eu ainda prefiro a abadia de Cattermont, é muito


mais bonita que a Catedral.

― Não é não. A abadia parece um lugar assombrado, todo


aquele castelo parece. Dá azar casar em um lugar assim. Eu
preferia fugir para Gretna Green a me casar na abadia.

As irmãs continuaram falando, mas Clara já não escutava.


Caroline tinha lhe dado ideia para um plano que poderia
servir, caso não aceitassem um casamento sem pompas. Se
sua mãe não fosse dissuadida de realizar uma cerimônia
luxuosa, ela iria fugir e se casar em Gretna Green, precisava
apenas convencer o Marquês a fazer aquilo.

Pensar no Marquês lhe causou nervosismo. Como


conseguiria agir normalmente com ele depois da noite
anterior? Não tinha certeza se poderia fingir que nada tinha
acontecido quando as lembranças ainda eram tão fortes,
mas, de qualquer forma, precisaria tentar.

Ele era seu noivo e, por mais que quisesse, Clara não
poderia se esconder dele para sempre. O que diria quando
lhe sugerisse a fuga seguida de casamento? Ela teria que
lhe contar toda a verdade sobre sua família, mas não
confiava nele o suficiente para isso. Então, o que faria?

Apenas pessoas apaixonadas ou desesperadas casavam e


Gretna Green e ela, definitivamente, não estava
apaixonada. Ou esperava que não estivesse.

― Clara, está me ouvindo? ― a Duquesa chamou-lhe a


atenção.

― Perdão, mamãe, poderia repetir?

― Eu perguntei se Lorde Winchester virá lhe ver hoje. Eu


soube que ele já retornou do casamento.

― Eu não sei, mamãe, ele não me falou nada sobre uma


visita.

― Ótimo. Então, iremos hoje à modista encomendar seu


enxoval.

― Mamãe, não seria melhor esperar Madame Charlotte


retornar da lua de mel? ―

Caroline lembrou à mãe da recente reviravolta na moda


londrina.

― Ah, claro que não. O Duque não irá permitir que ela volte
a trabalhar. Onde já se viu uma Duquesa trabalhando?

― Segundo o jornal, o atelier não foi fechado ― Cristine


apontou.

― Sim, minha filha, mas ela não sairá do lado do marido,


enquanto ele não melhorar.

Iremos procurar outra modista, não podemos perder tempo.


― Mas eu quero que meu enxoval seja feito por ela ― Clara
entrou na conversa. Aquilo adiaria os planos de sua mãe
temporariamente. ― Ela é a melhor de toda Londres. E a
senhora sabe que todos vão falar do meu vestido de noiva,
então, é melhor que falem o quanto ele estava
deslumbrante, não concorda?

― Oh, é claro, tem razão. Acho que podemos esperar um


pouco ― a Duquesa concordou.

― Ainda temos alguns meses antes do casamento. Dará


certo. Você ficará tão linda em um vestido de noiva. Minha
primeira filhinha a se casar e, ainda, com um dos melhores
partidos da Inglaterra.

Que orgulho.

A Duquesa fungou e tinha os olhos marejados, e procurou


um lenço em suas vestes para enxugar uma lágrima que
havia escorrido.

― Senhora, visita para milady. O senhor Callahran ―


mordomo anunciou.

A Duquesa imediatamente se iluminou.

― Oh, mande-o entrar.

Callahran entrou com um sorriso no rosto. Ele


cumprimentou cada dama do recinto e se sentou com elas.

― Tio Callahran, estávamos com saudade. Para aonde o


senhor viajou dessa vez? ―

Caroline perguntou, espevitada como sempre.


― Eu também estava com saudade ― o homem respondeu,
sorrindo. ― Dessa vez eu fui para a Itália.

Por ter estado presente desde sempre na família Catterfield,


e por ser padrinho das gêmeas, elas o chamavam de tio,
ainda que ele não o fosse de fato.

― Trouxe algo para nós? O senhor prometeu que traria ―


Cristine cobrou, ansiosa.

― É claro que sim. Eu prometi, não foi? ― O homem tirou de


seu casaco duas caixinhas idênticas, uma era azul e a outra
com pedras verdes. Era uma caixinha de música, que servia
de porta joias. As meninas olharam o presente maravilhadas
e rapidamente pegaram. Caroline adorava o azul e Cristine,
o verde. Callahran sabia daquilo e, por isso, tinha comprado
uma de cada cor.

― É maravilhoso, tio Callahran. Muito obrigada. ― Caroline


estava com um sorriso imenso no rosto e abraçou o homem,
agradecida.

Callahran já estava há tanto tempo naquela família, que era


considerado parte dela e, por isso, as demonstrações de
carinho não o assustaram. Gostava daquelas meninas como
se fossem dele.

― Sim, é magnífico. Muito obrigada. ― Cristine também se


jogou nos braços do homem e em seguidas as duas subiram
para o quarto, para guardar seu novo presente.

― Sabe que não precisava ter feito isso. ― A Duquesa o


olhou, mas o sorriso dela indicava que tinha amado o que
ele acabara de fazer.

― Sabe que eu não me importo. Não posso ter filhos e


presenteá-las me faz sentir como se elas fossem minhas. E,
além do mais, sou o padrinho delas. É meu dever mimá-las
e cuidar delas.

― Você vai estragá-las, isso sim. ― A Duquesa riu. ― Agora,


toda vez que viajar, elas irão lhe cobrar um presente.

Callahran riu.

― Não me incomoda que elas o façam. ― Ele sorriu para a


Duquesa e em seguida fitou Clara. ― Clara, trouxe algo para
você também ― ele anunciou e retirou do bolso uma
caixinha, um pouco menor do que a das meninas. ― Espero
que goste.

Clara recebeu a caixinha de veludo e a abriu


cuidadosamente. Dentro tinha um delicado colar, com uma
única pedra e uma corrente fina banhada em ouro. A gema
era azul e facetada como um diamante. Linda e delicada.

― É linda. Eu adorei. ― Clara realmente tinha amado o


presente. ― Mas não posso aceitar, deve ter custado uma
fortuna.

― Não me custou nada. Insisto que o aceite. É seu presente


de casamento. O joalheiro me confidenciou que essa pedra
é mágica e tem a capacidade de trazer calmaria e paz. E
como você sempre foi muito espevitada, calma e paz lhe
farão bem.

Clara se levantou e abraçou o homem, agradecendo-o, com


um sorriso divertido.

― Permita-me colocá-lo, sim?

― Oh, é claro. ― Clara estendeu a caixinha e Callahran


pegou a joia, em seguida a lady
se virou e o homem colocou o colar em seu pescoço.

― Ficou perfeito, como eu imaginei que ficaria. ― Ele sorriu.

― Obrigada, de verdade. ― Clara tocava a joia em seu


pescoço, maravilhada.

O mordomo apareceu novamente na porta e após ter a


atenção de todos na sala, anunciou o segundo visitante da
tarde. O noivo de Clara.

Clara se retesou ao escutar o nome do Marquês. Estava


nervosa quando o seu noivo entrou.

A Duquesa tratou de apresentar Winchester a Callahran. Os


dois homens pareciam se estranhar, mas educadamente, se
cumprimentaram.

― Lady Catterfield, a senhora me permite levar sua filha


para um passeio pelo jardim da propriedade?

A lady assentiu. Eles já estavam noivos, e o jardim poderia


ser visto da janela da sala.

― Tem a minha permissão. Ficarei olhando-os pela janela,


para evitar falatórios.

― Obrigado. Vamos, milady? ― O Marquês estendeu o braço


para sua noiva e, quando ela o pegou, ele a guiou em
silêncio para o jardim.

Após alguns minutos caminhando sem trocarem uma


palavra, o Marquês enfim começou.

― Eu sinto muito pelo que aconteceu na última vez que nos


vimos.
Clara corou, e então se lembrou de que ele não estava se
referindo ao encontro no clube e, sim, à briga que tiveram
na ópera. Sua memória não lhe deixava esquecer nada.

― Eu entendo. Acredito que nós dois nos exaltamos aquela


noite. Eu não devia tê-lo acusado de mentiroso.

Winchester suspirou. Era melhor que fosse sincero com sua


noiva.

― A senhorita não estava errada ao me chamar de


mentiroso... ― o Marquês confessou e parecia chateado. ―
Eu realmente flertei com outras mulheres, com uma mulher,
para ser totalmente sincero.

Clara não esperava que ele dissesse aquilo e a sensação


estranha em seu peito também era novidade. Parecia que
algo doía dentro dela e se quebrava.

― Oh. ― Foi tudo que saiu de seus lábios.

― Eu não consigo evitar, ela me fascina. ― O Marquês


passou a mão nos cabelos. ― Eu não quero mentir para
você. Acho que devemos ser sinceros um com o outro, para
esse casamento dar certo. E não estou dizendo isso para lhe
desrespeitar, apenas quero que possamos ser amigos,
confidentes, companheiros. Sei que não está apaixonada
por mim, e isso é o que me deu coragem para lhe falar.

― Você está me comunicando que terá uma amante? ―


Clara perguntou, em um fio de voz.

― Céus, não. Nunca lhe trairia. Depois que nos casarmos,


não terei outra mulher, além de você.

― Então, o que pretende me contando isso?


― Apenas pretendo ter essa mulher antes do nosso
casamento.

― Está me pedindo permissão, ou me comunicando? ―


Clara não conseguia sentir nada ao ouvir aquilo. Parecia
surreal.

― Sinceramente, eu não sei, mas não quero fazer isso às


suas costas, terei cuidado para que não haja nenhum boato,
e continuarei fazendo o meu papel de noivo. Não pretendo
negligenciá-la. Pelo contrário, percebo que a cada dia me
importo mais com a senhorita. E por mais que pareça que
não o faço, ao lhe comunicar sobre o meu interesse por
outra mulher, é justamente por considerá-la tanto que o fiz.

Cada palavra dele só machucava mais. A intenção dele de


ser sincero era boa, mas não devia doer. E se estava
doendo, significava que... estava apaixonada por ele?

Não. Clara negou a si mesma, e negaria sempre. Estava


machucada porque ele era seu noivo e lhe devia respeito e,
em vez disso, estava lhe avisando que a trairia com outra
mulher. Era apenas seu orgulho que estava sendo
machucado, não seu coração.

― Eu também poderei ter um caso antes de nosso


casamento? ― ela perguntou, começando a se irritar. Queria
feri-lo da mesma forma que ele a feria com aquelas
palavras.

O Marquês cerrou o maxilar. Imaginava o terrível gosto que


as palavras teriam na sua boca.

― Desde que não haja... consequências depois. ― O gosto


era pior do que imaginava e isso o irritou, odiou cada
palavra que saiu da sua boca naquele momento. Poderia
dizer a ela que era dever de uma dama casar virgem, mas
sabia que se o fizesse, ela o odiaria e ambos brigariam.

― Não tenho nenhum problema com bastardos, mas não


quero ter dúvidas quanto a paternidade do filho que será
meu herdeiro. Ah, e se for ter um caso, deve estar ciente
que ele deve acabar antes de nosso casamento. Eu não
terei nenhuma amante depois que me unir a você e exijo
que faça o mesmo.

Clara suspirou, ouvir aquilo doeu tanto quanto ele dizer que
teria uma amante. Ele realmente não sentia nada por ela.
Ela levou a mão ao pescoço, parecia que algo a sufocava, e
encontrou o colar. Tocá-lo lhe trouxe um pouco de alívio.
Talvez o joalheiro tivesse falado a verdade e aquela pedra
fosse mágica.

― É um belo colar. ― Ele mudou de assunto ao vê-la


segurando o objeto.

― Obrigada. Presente de casamento de Lorde Callahran ―


ela respondeu, ainda sem olhá-lo.

― Entendo. Ele parece gostar muito de você. ― Winchester


olhou na direção da casa, com os olhos semicerrados e uma
expressão de poucos amigos.

― Sim, tenho sorte por tê-lo. Sempre consegue me trazer


um pouco de felicidade. ―

Clara podia explicar que ele era da família, padrinho das


gêmeas e muito amigo de seus pais, mas não o faria.

― Só me prometa que tomará cuidado com quem decidir ter


como amante. Amigos próximos nem sempre são uma boa
opção, a não ser que não se importe de perder o amigo
após o casamento ― o Marquês avisou, mas já tinha se
decidido que ela não veria mais Callahran se dependesse
dele e, muito menos, receberia presentes de outro homem.

Não devia se sentir possessivo depois do que ele mesmo


falou para ela, mas não pode controlar.

― Não se preocupe, pretendo chegar intacta ao nosso


casamento, mas não o faço por você. ― Clara largou o
colar, resoluta. ― Por favor, não se esqueça do jantar de
noivado daqui a três dias. Agora, se me dá licença, eu
gostaria de entrar e voltar para meus aposentos.

O Marquês concordou com a cabeça e a deixou na porta de


casa, beijando sua mão e se despedindo dela.

Devia estar feliz pela facilidade com que ela aceitou aquilo,
então por que não estava?

Enquanto subia as escadas, Clara passou em frente ao


escritório do pai e encontrou a porta entreaberta. Ela olhou
dentro do cômodo para ver se ele estava ali, mas como
sempre, não estava.

Era sempre assim agora, o Duque de Catterfield quase não


se encontrava em casa.

Provavelmente, estava tentando encontrar novas formas de


gastar ainda mais dinheiro. O que lhe

fazia pensar que ele não iria ficar do seu lado no que se
tratava de economizar nos festejos.

O Marquês havia lhe ocupado tanto os pensamentos nos


últimos dias, que ela tinha esquecido de ficar de olho em
seu pai, o homem responsável por ela ter se tornado a
Dama de Copas.
Clara suspirou, desgostosa, e sentiu uma pontada de dor lhe
apertar o ventre. Aquele era o sinal que suas regras tinham
chegado e, com ela, a tortura das dores no ventre que a
deixavam de cama por três dias.

CAPÍTULO 6 ― JANTARES E SEDUÇÕES

Três dias depois, o Marquês se encontrava a caminho da


mansão dos Catterfield novamente. Como combinado, o
jantar aconteceria naquela noite e ele estava nervoso. Sua
noiva não se comunicava com ele há três dias, desde que
ele havia lhe contado sobre o seu desejo por outra mulher. A
Duquesa tinha lhe dito que eram apenas problemas
femininos e que ela estaria presente no jantar.

Winchester desceu da carruagem e se direcionou para a


porta, que lhe foi aberta antes que ele pudesse bater.

A Duquesa tinha mantido sua palavra ao dizer que reduziria


os convidados à família e amigos mais próximos, para tornar
o jantar mais íntimo, pois além da família, apenas Callahran
fora convidado, mas que por motivos pessoais, precisou
recusar o convite ― Algo que deixou Winchester bastante
satisfeito.

― Bem-vindo, milorde ― a Duquesa o saudou. ― Estávamos


ansiosos por sua chegada.

― Obrigado, milady. ― Winchester tomou a mão envolta


pela luva de Lady Catterfield nas suas e a beijou. ― Estás
muito bela essa noite.
― Obrigada, meu querido. ― A mulher sorriu diante do
galanteio. ― Clara descerá em breve.

Winchester concordou com a cabeça e se direcionou para


onde o Duque estava. O homem parecia extremamente
irritado, e dava ordens a um criado para que fosse apressar
sua filha.

Aquilo pareceu estranho para o Marquês, o jantar estava


planejado há mais de uma semana, não era possível que o
Duque tivesse outros compromissos para aquela noite.

― Sua Graça ― Winchester saudou o homem.

― Não precisa de formalidades, seremos parentes muito em


breve, meu jovem. Então, pode me chamar de Carlos.

― Nesse caso, pode me chamar de Gabriel.

― Fiquei satisfeito com sua nova conduta a respeito do


noivado. Apesar de ser um arranjo, eu realmente quero o
melhor para minha filha. E agora tenho certeza de que se
esforçará para ser o homem que ela merece.

― Agradeço o reconhecimento. Farei o possível para que


tenhamos um casamento agradável e cuidarei bem de sua
filha.

― Ah, isso eu sei. Não teria concordado com este


casamento, caso fosse diferente. Eu sempre estou a par de
tudo. ― O Duque lhe deu um sorriso arrogante e Gabriel não
gostou nada daquilo. ― Inclusive, sei de seu interesse pela
Dama de Copas. Estive observando você no Rogue’s, então,
lhe darei um aviso: se machucar a minha filha, terá que se
ver comigo.
Winchester odiava que o tratassem como uma criança, e
odiava ainda mais que o ameaçassem.

― Eu não gosto de ameaças, milorde. Entretanto, deixarei


essa passar, apenas por se tratar de sua filha.

O Duque o observou um tempo em silêncio e sorriu, parecia


que a tensão anterior nunca havia existido, e então ergueu
os olhos e focou em um ponto atrás do Marquês.

Winchester se virou para ver o que chamava a atenção do


Duque e se deparou com Clara,

em um vestido azul que lhe caia perfeitamente. Ela estava


muito bonita naquela noite.

Com um sorriso no rosto, o Marquês se direcionou para onde


ela estava e lhe estendeu a mão.

Clara não conseguiu evitar retribuir o sorriso. Os dias em


que passou de cama, devido às suas regras, a tinha dado
bastante tempo para pensar, e se o Marquês queria apenas
a amizade dela, não tinha por que tornar as coisas mais
difíceis. Era melhor mesmo que não envolvessem
sentimentos no casamento, assim, ambos seriam
preservados de um destino cruel.

Por esse motivo, estava disposta a dar a ele apenas a


amizade que ele tanto buscava e esperava que aquilo fosse
suficiente. E estava certa daquilo até vê-lo no jantar. A
forma que ele olhava para ela com tanta intensidade, a fez
duvidar se apenas a amizade bastaria.

O jantar foi servido assim que todos estavam distribuídos


em seus lugares, Gabriel sentou-se em frente à Clara, ao
lado de Lady Catterfield e conversava animadamente com a
futura sogra.
Clara observava o quanto ele estava lindo e parecia à
vontade conversando com a Duquesa. Ela corava de vez em
quando, o que deixava Clara curiosa sobre o que ele dizia a
ela.

Provavelmente, era algum galanteio, ele sabia ser


galanteador quando queria.

― Lorde Winchester, por que o senhor não trouxe sua irmã


para jantar conosco? ―

Caroline perguntou, chamando a atenção do homem e


recebendo um olhar reprovador da mãe, pela falta de
educação.

― Minha irmã está em Willow Castle e, desta vez, não pode


vir, mas da próxima com certeza trarei. Acredito que vocês
se dariam muito bem.

― Quando foi erguido o castelo? ― Cristine entrou na


conversa.

― Há mais de setecentos anos.

Aquela informação fez Cristine sorrir.

― Ele é mal-assombrado? ― ela perguntou, animada.

― Cristine... ― a Duquesa advertiu a filha, dando-lhe um


olhar muito significativo.

― Até onde sei, apenas eu, minha irmã e os criados o


assombram. ― Winchester sorriu com a decepção
estampada no semblante de sua quase cunhada.

― Que pena! ― A moça suspirou. ― Cattermont também


não é assombrado, apesar do que pensam. Já procurei
fantasmas por lá.

― Cristine, fantasmas não existem. Apenas tolos acreditam


neles ― Caroline ralhou com a irmã.

― Não é verdade, eles existem sim. E eu não sou tola.

― É tola sim, por acreditar em fantasmas.

― Não o sou.

― Meninas! Já chega ― o Duque interviu, olhando severo


para as filhas.

― Desculpe, papai ― as gêmeas responderam em uníssono


e voltaram a atenção para seus pratos.

O restante do jantar seguiu sem muita emoção e, assim que


terminou, todos seguiram para a sala de música.

― Clara, meu anjo, por que não toca um pouco para nós?
Seu noivo ficaria mais do que feliz em ouvi-la tocar. ― Lady
Catterfield indicou o piano para sua filha, que com um
suspiro, seguiu para o instrumento e se sentou.

Clara escolheu uma música simples e animada de seu


repertório, conseguia tocar todas sem nenhuma dificuldade.
As gêmeas, ao perceberem qual música Clara tocaria, se
animaram, e

logo começaram a cantar em um dueto.


O Marquês observava como sua noiva sorria, envolvida pela
música e pela cantoria das irmãs. Ela era uma boa mulher,
seu casamento talvez não fosse o inferno que ele supunha
que seria. Ainda mais agora, que não havia segredos entre
eles e ela estava ciente de seu desejo por outra mulher.

Apesar de não terem tido tempo para conversarem sobre o


assunto depois daquele dia, o Marquês podia ver que ela
parecia bem com aquela situação, e se sentiu sortudo por
ter uma noiva tão compreensiva.

Ela lhe seria uma ótima amiga e companheira. Sentia que


poderia lhe confidenciar qualquer coisa e ela o entenderia.
Aquele pensamento o fez sorrir, enquanto a olhava tocar
divinamente as teclas do piano.

Após o jantar, o Marquês seguiu para o Rogue’s, tinha


esperança de encontrar a Dama de Copas naquela noite, já
que não a tinha visto em nenhuma das anteriores. Ansiava
vê-la, ainda mais agora que poderia seduzi-la, sem que isso
prejudicasse o seu casamento.

Entrou no Rogue’s e colocou a máscara que lhe foi


entregue, seguiu para a Ala da Avareza procurando a sua
ruiva favorita. Não a encontrou ali. Procurou em cada ala e
nada de ver a jogadora. Por fim, se direcionou à ala da Ira,
sua última esperança e, apesar de estar lotada, pois aquele
era um dia de luta, a Dama de Copas não se encontrava ali.

Temeu que ela não aparecesse também naquela noite.

― Não se preocupe, ela virá hoje ― um homem lhe disse, ao


ver que ele não parava de olhar ao redor.

― Michael ― o Marquês saudou o Rogue responsável pela


ala da Ira. ― Como sabe quem eu procuro? ― perguntou,
curioso. Não tinha comentado a ninguém, além de Henry,
sobre o seu interesse por Copas.

― É evidente para todos que o senhor está fascinado por


nossa Copas. ― Michael sorriu. ― E estamos sempre de olho
em nossas meninas.

― Estou ciente disso ― o Marquês resmungou, precisava de


privacidade com a Dama de Copas. Não queria ninguém de
olho neles.

― Pensei que estivesse noivo.

― Não é da sua conta.

― Mas Copas é. ― O homem não recuou. Michael não era o


melhor lutador do Rogue’s sem motivo, não havia nada que
ele temesse.

― Não é o responsável por ela. ― Winchester cerrou os


punhos. Odiava quando tentavam dar lição de moral nele.
Ele era um lorde e também um dos sócios daquele maldito
clube. Deviam respeitá-lo e não se intrometer na sua vida.
― E, mais uma vez, eu repito: não é da sua conta.

― Eu sei que não, mas saiba que se algo acontecer com ela,
o senhor terá que se ver comigo.

― Não se esqueça com quem está falando, Michael ― o


Marquês advertiu, com um olhar severo para o homem. O
lutador estava passando dos limites. ― Não aceito ameaças.

― Nunca me esqueci, Gabriel, e não foi uma ameaça. ―


Então o homem sorriu, mudando completamente a
expressão. ― Agora, se o senhor me dá licença, preciso
voltar para o ringue e anotar as apostas.
Mesmo depois que o homem saiu, Winchester não relaxou.
Odiava aquela maldita mania dos funcionários se sentirem
família, mas ao mesmo tempo, ele admirava a lealdade que
tinham com cada membro. Aquela era uma família, da qual
ele também fazia parte e, por isso, sabia que se fosse
preciso eles também o defenderiam.

Ao se virar para ir de volta à ala da Avareza, Winchester a


viu. Ela estava adentrando a ala a qual ele se destinava,
imediatamente um sorriu brotou de seus lábios. Ela estava
ainda mais linda.

O Marquês se aproximou e Copas lhe deu um sorriso


singelo.

― Que prazer em vê-la! ― Winchester comentou, assim que


ficou frente à jogadora.

― O senhor parece feliz ― Copas notou o jeito que os olhos


dele sorriam contentes.

― Vê-la me deixa feliz ― flertou.

Copas respirou fundo. Era óbvio que ele não perderia tempo
para flertar com a mulher que desejava.

Como Clara, ela tinha permitido que ele tivesse suas


aventuras românticas até o casamento, mas não estava
preparada para quando ele o fizesse, ainda mais com ela.
Não sabia se devia permitir, ou não. Por um lado, ter a
atenção do Marquês sobre ela lhe dava um frio delicioso na
barriga, por outro, isso tornaria mais complicado a
revelação de seu segredo. Ele a odiaria quando descobrisse
a verdade.

― Mas ficaria ainda mais feliz se pudesse ter a sua


companhia ― o Marquês completou, ao ver que ela não diria
nada.

― Eu tenho que trabalhar ― ela se desculpou, não estava


fugindo dele, realmente precisava jogar, era paga para fazer
isso. ― Mas você sempre pode jogar comigo, sabe disso.

Aquela resposta agradou Winchester e ele concordou com a


cabeça, a seguindo até uma mesa na ala da Avareza. Alguns
jogadores também se aproximaram para jogar e as partidas
se iniciaram.

Winchester não se importou de perder três das quatro


partidas que jogou, ele nem sequer estava pensando nas
jogadas que fazia, ficava admirando a mulher de vermelho à
sua frente e pensando como faria a proposta que tinha em
mente.

Sabia que entre os dois havia desejo. Tinha se certificado


disso na última vez que estiveram juntos. A reação que ela
teve a seu toque só poderia ser descrito como desejo. Ela
não era indiferente a ele, e Winchester usaria isso a seu
favor.

Decidiu que precisaria afastá-la das mesas de jogos para


poder convencê-la, esperaria a jogadora fazer uma pausa
nos jogos e então a abordaria.

Não demorou muito. Aquele era um dia de luta no ringue e


logo os homens se moveram para a ala da Ira, fazendo suas
apostas sobre quem seria o campeão da noite. Gabriel
aproveitou aquele momento para conversar com Copas.

― Eu gostaria de uma partida exclusiva ― ele pediu. ―


Podemos ir a algum quarto onde não seremos
incomodados?
Copas o olhou, desconfiada. Não queria ficar sozinha com
ele e ser seduzida facilmente, mas também não poderia
ficar ali e chamar a atenção dos outros jogadores que
poderiam reconhecê-lo como da última vez. Então, preferiu
correr o risco de ser seduzida.

― Vejamos se Dmitri empresta o escritório dele, já que


Henry ainda está em Arondalle.

Dmitri cedeu o escritório apesar de hesitar, quando o


Marquês pediu para ficar a sós com

Copas. Apenas depois que a jogadora concordou, foi que o


russo saiu, fechando a porta atrás de si.

― O que gostaria de apostar? ― Copas perguntou, antes


que Winchester dissesse qualquer coisa. Ela queria manter
a conversa no nível profissional, mas o homem não estava
inclinado a isso.

― Eu tenho algo importante para lhe contar. ― Gabriel


sorriu, malicioso.

― E o que seria? ― Copas tentou manter a seriedade em


seu semblante, mas sentiu as pernas fraquejarem.

― Quero que seja minha amante até a véspera de meu


casamento.

A fala direta de Winchester a chocou. Ela já esperava que


ele quisesse algo daquele nível, mas não pensou que o faria
de modo tão direto.

― O senhor está noivo ― ela tentou argumentar, mas já


sabia a resposta, pois ela mesma tinha dado.
― Sim, e ela está ciente disso e aceitou que eu tenha a
mulher que eu quiser até o casamento... E eu quero você e
sei que você também me quer. Suas reações a mim são
prova disso.

― Eu... ― Copas pensou no que poderia dizer para afastá-lo,


não podia ser a amante dele. Não quando era a noiva. ―
Não o quero.

― Mentirosa. ― Ele se aproximou, tentando encurralá-la na


parede.

― Eu não posso ser sua amante.

― Por que não?

― Bom, porque... eu não posso. Apenas isso.

Winchester estava próximo a ela e, com uma das mãos,


tocou no rosto da jogadora.

― Não é um motivo suficiente.

A carícia contínua com a ponta dos dedos no rosto de Copas


a impedia de pensar com clareza, mas uma pergunta
pairava em sua mente.

― Por que eu? Há tantas mulheres aqui que adorariam


esquentar a sua cama, por que insistir em mim?

― Porque você é diferente de todas elas, você é fascinante.

― Não devias trair a sua noiva.

Aquelas palavras quebraram qualquer clima que houvesse


entre eles e o Marquês se afastou.
― Eu não estou traindo minha noiva, o faria se estivesse
escondendo dela, mas como não estou, não me acuse de tal
ato vil. Eu jamais a trairei.

― Então, o que está fazendo aqui comigo, quando deveria


estar com ela?

― Eu estou aproveitando os meus últimos momentos como


um homem solteiro. Uma despedida dos bons tempos,
quando eu não estava amarrado a nenhuma mulher e era
um homem livre e feliz.

― Falando assim, parece que está a caminho da forca ―


Copas comentou, sarcástica.

― Depois de casado, eu não poderei fazer as mesmas


coisas que faço como solteiro. Não poderei ter qualquer
mulher que quiser, terei que me prender a uma única e me
satisfazer apenas com ela. Então, não devia se admirar se
não estou extasiado com o meu próprio casamento.

― Não terá amantes depois do casamento? Muitos homens


continuam tendo a mesma vida de solteiro, apesar de
casados.

― Não. Não pretenderei trair a minha esposa depois do


casamento.

Copas percebeu que aquele assunto o incomodava e ficou


curiosa.

― Então, quer dizer que se tivermos algo, acabará na


véspera de seu casamento?

― Sim.
― E se nós dois ainda quisermos um ao outro, não
poderíamos continuar como amantes?

Sua esposa já estaria acostumada com isso.

― Não, não haveria essa possibilidade.

― Por que não? Você não ama sua noiva, por que, então, se
importaria com os sentimentos dela?

― Não faço isso pelos sentimentos dela ― o Marquês


explicou, não podia deixar que Copas pensasse que
poderiam continuar aquilo depois do casamento. ― Eu fiz
uma promessa e sempre cumpro com minha palavra.

― Uma promessa? Que tipo de promessa?

― Prometi que jamais causaria a uma mulher, o que meu


pai causou a minha mãe. Nunca trairei a minha esposa.
Posso nunca chegar a amar Clara, mas não infligirei a ela a
dor de ser traída.

Copas suspirou. O Marquês se mostrava diferente de tudo


que ela conhecia e vivia lhe surpreendendo. Era fácil se
apaixonar quando ele mostrava tantas qualidades, quando
ele a tratava com tanto carinho.

― Eu fui sincero com minha noiva quando disse que você


me fascina ― ele continuou e tocou o rosto dela com a
palma da mão, e pode ver os olhos dela se escurecerem
com aquele contato. ― Eu a quero, Copas. Desejo-a desde o
primeiro dia que a vi entrando no escritório do Lorde, como
uma força da natureza. Não posso lhe prometer casamento,
infelizmente, isso não está no meu poder, mas prometo
cuidar de você caso me aceite como seu amante. Lhe darei
qualquer coisa que pedir, e quando eu me casar, prometo
que farei o possível para lhe manter bem.
Os lábios do Marquês estavam tão próximos que Copas
podia sentir a respiração dele em seu rosto. Ela queria
erguer a cabeça e beijá-lo. Queria aceitar aquilo. Queria ser
a amante dele...

mas não podia. Ah se ele soubesse que ela era a noiva dele.
Seria tão mais simples se render àquele desejo se ele
conhecesse a verdade.

― Por que você não ama sua noiva? Seria tão mais fácil se
você a amasse. Se essa conversa fosse com ela e você a
tivesse convencendo a se entregar antes do casamento ―
Copas desabafou. ― Você não estaria aqui tentando
arrumar uma amante.

Aquilo fez o Marquês dar um passo para trás.

― Às vezes eu me esqueço que são amigas. ― Ele suspirou.


― Eu queria sentir isso por minha noiva, queria mesmo. E
eu até gosto dela, ela é uma boa mulher, mas, quando
estou com você, o que sinto por ela se torna insignificante
perto do sentimento avassalador que você desperta em
mim.

― Eu não sinto o mesmo ― Copas murmurou, as palavras


dele a faziam se sentir confusa, por um lado, ficava triste e,
por outro, queria-o. ― Sinto muito.

O Marquês suspirou e se afastou, triste, sabia que ela


mentia. Ela o queria também, mas algo a fazia insistir em
negar o que sentia por ele. Daria tempo a ela, ainda tinha
alguns meses antes do casamento.

― Tudo bem, não insistirei, mas não desistirei, ainda.


Deixarei que tome um tempo para pensar. Depois desse
tempo, se ainda achar que não me quer, eu a deixarei em
paz. Tem um mês para pensar.
CAPÍTULO 7 ― BEIJO

Três semanas depois...

Copas estava jogando cartas no Clube quando o viu entrar.


Já estava tão comum vê-lo quase todas as noites, que ela o
reconhecia só pela forma de andar.

Todas às noites, ele entrava no clube, dava um sorriso


sedutor para ela e seguia para alguma outra ala diferente
da qual a jogadora estava. Ele realmente cumpria com o
que prometia.

Não voltou a insistir no assunto em nenhum momento e a


deixou em paz para pensar na proposta que ele lhe fizera.

Durante o dia, continuava visitando Clara como sua noiva,


estava ficando difícil não criar algum sentimento por ele. Ele
a tratava com carinho, conversavam sobre qualquer coisa e
ele a considerava uma ótima amiga. Não entravam no
assunto da amante do Marquês, ele, por ainda não ter uma
resposta dela, e Clara, por não querer ouvi-lo falar de outra,
ainda que essa outra fosse ela.

À medida que a amizade dos dois se fortalecia, mais difícil


se tornava revelar ao Marquês que Clara e Copas eram a
mesma pessoa. E esse era um dos principais motivos para
ela ter decidido que Copas não seria amante de Winchester.
Não poderia correr o risco de ele descobrir a sua verdadeira
identidade.
Copas observou Winchester seguir para a ala da Gula, ele
estava lindo como sempre, todo vestido de preto, com
exceção do lenço bege em seu pescoço. Na metade do
caminho, o Marquês foi interceptado por uma Dama de
Vermelho: Layla. O Marquês sorriu, animado, parecia feliz
com o que ela lhe dizia, então, ambos seguiram para um
quarto da Luxúria.

Copas franziu o cenho naquela direção. Layla não era a


primeira Dama de Vermelho a se jogar em cima dele, mas,
desde que tinham noivado, sempre o viu rechaçar todas as
outras mulheres.

Até aquele momento.

A raiva a tomou, ao perceber o quanto fora ingênua em


acreditar que ele se ocuparia apenas com ela .

É claro que ele não se limitaria a tê-la como única amante.


Ele era um homem e um Winchester. Assim que aparecesse
a oportunidade ele a aproveitaria ― ela concluiu em
pensamento.

Se sentia traída, e dessa vez doía, mas estava decidida a


não demonstrar, ali não era hora e nem lugar. Respirou
fundo e voltou sua atenção para o baralho.

Decidida a não deixar aquilo lhe afetar, Copas se


concentrou no jogo de cartas e ganhou aquela partida sem
muito esforço, afinal, seu oponente estava bêbado demais
para prestar atenção no próprio jogo.

— Sua trapaceira — um cavalheiro que estava à mesa a


acusou, quando perdeu a rodada.

— Você não poderia ganhar. Você roubou.


— Joguei limpo, senhor. Não tenho culpa se está tão bêbado
que não pode contar as próprias cartas.

Normalmente, Copas não retrucava e, muito menos,


provocava o oponente, mas o ódio que tinha pelo Marquês
havia transbordado e ela não pode conter a acidez nas
palavras.

— Sua puta trapaceira — o homem xingou, empurrando-a


contra a mesa de jogo. Mas

antes que pudesse encostar nela, Dmitri entrou na frente do


homem e olhou feio para ele, que rapidamente se encolheu
de medo.

— Meu senhor, ela está trapaceando, não tem como ela não
ter passado de vinte e um com cinco cartas — o homem a
acusou.

Dmitri olhou as cartas quase sequenciais com que Copas


ganhou o jogo e depois olhou para a jogadora, que deu de
ombros, indicando que foi apenas na sorte daquela vez. Ao
entender o que tinha acontecido, segurou o homem pelo
colarinho e o ergueu do chão, deixando-o quase com a
mesma altura que ele.

— Peça desculpa à dama. Ela não trapaceou. O senhor


quem não soube perder.

— Me ponha no chão, seu bastardo, você sabe com quem


está falando? — O homem encontrou sua coragem,
provavelmente, no excesso de bebida.

— Estou falando com um bêbado insignificante, que se


disser mais uma palavra será, também, um ex-membro do
clube.
Aquela ameaça foi suficiente para fazer o homem se calar.

— Agora, peça desculpa à Dama de Copas — ordenou.

— Mas...

Um olhar de Dmitri o fez engolir as palavras que diria.

— Me perdoe, Copas, não quis dizer que trapaceou — o


homem se desculpou, sem olhar para ela.

— Agora, dê o fora daqui, antes que eu me irrite e peça para


que o Lorde revogue sua participação no Clube.

O homem se afastou, com ódio no olhar. Não era o primeiro


a acusá-la de trapacear e nem seria o último.

— Copas, ele a machucou? — Dmitri perguntou, preocupado


com a mulher.

— Acertei o braço quando ele me jogou na mesa, mas, fora


isso, estou bem. Vou subir para tomar um ar.

Dmitri concordou com um aceno e a guiou até as escadas


que levavam ao andar de cima e a ala da Luxúria.

Enquanto subia os degraus, Copas esbarrou com o Marquês,


que descia acompanhado de Layla.

A fúria novamente a assolou quando viu o sorriso no rosto


de ambos.

— Que rápido — Copas comentou, ácida, debochando


baixinho quando cruzou com Winchester.

O Marquês olhou para ela após escutar o que tinha dito e


sorriu ao ver a expressão que ela fazia. Isso fez Copas
fechar o semblante para ele e sua acompanhante.
— Com licença. — Layla percebeu o clima entre os dois e se
adiantou para sair dali, já tinha feito o que fora fazer e não
precisava presenciar aquilo. Então, desceu as escadas e
passou por Copas, deixando os dois a sós.

Copas permitiu que ela passasse e ignorando


deliberadamente o Marquês, voltou a subir as escadas, e
apenas quando entrou no quarto, foi que percebeu que ele a
seguia.

— O que pensa que está fazendo? — ela perguntou, quando


ele a seguiu para dentro do quarto.

— Apenas confirmando uma suspeita — Winchester


respondeu, a olhando fixamente.

Aquelas palavras fizeram o sangue de Copas gelar nas


veias. Do que ele suspeitava? Da verdadeira identidade
dela?

— Suspeita? — Copas indagou, nervosa.

— Sim. Suspeita de que o que eu acabei de ver foi ciúme...


— o Marquês respondeu, atento a cada movimento dela e
viu quando ela relaxou diante das palavras para, logo em
seguida, o olhar com exasperação.

— Ciúme? Não seja tolo, apenas me admirei com sua


velocidade para terminar o ato. —

Copas ergueu a cabeça diante dele. Quem ele pensava que


era para insinuar que ela estava com ciúme?

— Então, não está com ciúme? — Ele ergueu uma


sobrancelha e lhe deu um sorriso debochado.
— Claro que não. Você não é nada para mim, para que eu
tenha ciúme — Copas alfinetou.

— Você devia parar de mentir para si mesma. Suas palavras


dizem uma coisa e seu corpo diz outra completamente
diferente — o Marquês apontou, ainda se divertindo com a
situação e Copas percebeu que estava com os braços junto
do corpo, com os punhos cerrados.

— Não estou assim por sua causa. Acabo de ter um


problema lá embaixo. É óbvio que eu ainda estou tensa por
causa disso — Clara mentiu. — Então, pode voltar para a
sua Dama de Vermelho e me deixe em paz.

Copas se virou, esperando que o Marquês entendesse a


deixa e se retirasse. Mas, em vez disso, ela sentiu os braços
dele em sua cintura e o hálito quente em seu ouvido.

— Não é ela quem eu quero. Eu quero você e sabe disso.

Ele tinha a voz rouca e isso, somado à proximidade dos


corpos, fez com que Clara sentisse todo seu corpo
responder àquele estímulo.

Ao perceber o quanto a afetava, o Marquês sorriu e não


resistiu em depositar um beijo no pescoço pálido e delgado
da jogadora. Como queria aquela mulher.

— Eu não o quero — Copas respondeu, tentando manter a


voz firme e falhando miseravelmente quando os dedos de
Winchester começaram a contornar seus braços.

Maldição! Precisava se afastar antes que seu corpo lhe


traísse.

— Mentirosa. ― O sorriso nos lábios dele indicavam que o


Marquês sabia que ela estava mesmo mentindo. ― Não seja
covarde, Copas, você me deseja tanto quanto eu a desejo.

Admita.

Ser chamada de covarde a fez sentir raiva, e ele saber o


que ela sentia e brincar com isso, a deixou furiosa.

— Eu desejo... Desejo que me deixe em paz.

Diferente do que ela pensou, o Marquês não se afastou


diante daquelas palavras, muito pelo contrário, ele segurou
o rosto dela impedindo-a de fugir

— Antes que eu me case, farei com que diga a verdade para


si mesma — o Marquês replicou, não se abalando com o que
ela disse. — Terei que passar um tempo fora da cidade. Mas
antes que eu me vá, lhe darei algo para pensar.

Dizendo isso, ele a beijou.

CAPÍTULO 8 ― WILLOW CASTLE

O Marquês agora tinha duas certezas: a primeira era que


nunca tinha provado lábios tão macios e deliciosos. E a
segunda era que Copas tinha uma mão pesada. O tapa que
ela lhe dera, ainda ardia em seu rosto, mesmo que tivesse
sido desferido na noite anterior.

Ele a tinha beijado. Apenas um roçar de lábios, já que não


tinha aprofundado o beijo.
Mas ainda assim, tinha sido maravilhoso. Pelo menos, até
ela o empurrar e lhe deixar os cinco dedos marcados em
sua bochecha.

A recordação do tapa o fez levar a mão ao rosto e sorrir.


Sim, mesmo que ela o tenha agredido, ele não se
arrependia de nada.

Ela tinha ficado furiosa. E ele tinha adorado aquilo. Mas


agora que estava na carruagem, indo para Willow Castle, a
sede de seu Marquesado, conseguia clarear sua mente e
pensar nas consequências de seus atos.

Sentia que estava preparando a própria cova. Estava


comprometido com Clara, mas era com Copas que queria
estar. E beijá-la na noite anterior só tinha lhe dado mais
vontade de tê-la. A necessidade de prová-la, ainda que uma
única vez, o corroía por dentro. Teria que convencê-la assim
que voltasse, seduzi-la se fosse preciso.

Winchester suspirou desgostoso.

Quem dera que o rei lhe fosse indulgente e permitisse


escolher Copas como sua noiva.

Não que desgostasse de Clara. Ela estava se mostrando


uma mulher maravilhosa. Era compreensiva, inteligente,
perspicaz, companheira... Mas faltava-lhe algo, que ele só
encontrava em Copas. Talvez ousadia e mistério.

A ideia de pedir uma audiência com o rei lhe parecia


tentadora. Não custava nada tentar, quem sabe com um
pouco de sorte ― ou muita sorte ―, o rei se compadecesse
de seu coração apaixonado e lhe permitisse viver o seu
amor.
— Você está bem? — Layla perguntou no banco à sua
frente.

— Estou sim — ele respondeu, com um sorriso e, então,


voltou a olhar para fora.

— Tem certeza de que vão me aceitar neste estado? — A


mulher estava preocupada. —

Eu não poderei ser de muita ajuda nos meses que virão.

— Claro que sim. — O Marquês voltou a atenção para a bela


mulher ao seu lado. — Não é a primeira a chegar assim. Não
se preocupe.

Layla concordou com a cabeça e olhou para a paisagem que


passava pela janela da carruagem.

— Tem certeza de que não quer avisar ao pai da criança


sobre sua gravidez? —

Winchester perguntou, mas até já sabia a resposta.

— Como se ele fosse se importar com o bastardo que


carrego. Não, obrigada. Prefiro não ter mais problemas
dizendo a ele que estou grávida. Ele não ficaria feliz com
isso ― ela comentou, triste, parecia gostar de seu amante.
― E mesmo que eu tenha certeza de que é dele, quem
poderá garantir que não é de qualquer outro homem?
Afinal, eu sou uma prostituta.

— Está bem. Chegaremos amanhã, por volta do meio-dia.

Layla ficou um tempo em silêncio, observando o homem à


sua frente.
— Eu nunca imaginei que o senhor se importasse conosco...
com as prostitutas, no caso.

Sempre ouvi boatos sobre as suas qualidades como amante.


Quando eu contei ao Lorde que estava

grávida e ele me mandou falar com você, eu pensei: o que


diabos o Marquês pode fazer para me ajudar? E aqui
estamos nós, indo para uma casa de... Como você a chama
mesmo?

— Casa de acolhida.

— Magdala... ― Layla murmurou o nome do local que seria


sua nova casa. ― Sempre ouvi falar dela e sempre zombei
das mulheres que decidiam largar o trabalho para se
esconder lá, e olha só onde cheguei... Agora, sou grata que
exista um lugar assim... Mas nunca imaginei que o senhor
seria o contato.

— Quem melhor que um libertino para conhecer as


prostitutas? — Winchester brincou.

— Isso é verdade — Layla ponderou. — E é exatamente isso


que me faz pensar se o senhor é mesmo o libertino que
dizem.

— Nunca acredite nas fofocas. — Winchester sorriu de lado,


misterioso e malicioso.

Adorava a fama que tinha, mesmo que ela não fosse


completamente verdade. — Entretanto, nunca se esqueça
que toda mentira tem um fundo de verdade.

Layla sorriu para o homem à sua frente. Agora entendia por


que ele tinha aquela fama. Só com aquele sorriso, fazia com
que ela sentisse vontade de tirar a roupa. Ele
definitivamente era um homem muito atraente e sedutor e,
quando a olhava daquela forma, fazia-a se sentir quase
única. Quase. Já tinha recebido diversos olhares como
aquele e olhado ainda mais daquela forma.

― Ainda falta muito para chegarmos?

― Passaremos a noite em uma estalagem e chegaremos


pela manhã.

Se seguissem viagem, poderiam chegar naquela mesma


noite em Magdala, mas Winchester conhecia os perigos da
estrada e preferia viajar apenas na luz do dia. Por isso,
decidiu passar a noite em uma estalagem. Estariam na casa
de acolhida pouco depois de amanhecer, lá ele deixaria
Layla e seguiria sozinho para Willow Castle, em Wilborne,
onde chegaria perto do meio-dia.

Quando anoiteceu, pararam em uma estalagem para passar


a noite. Após conversar com o estalajadeiro, que já era um
velho conhecido do Marquês, foram levados para seus
aposentos.

Após tomar um banho para retirar a poeira da estrada, o


Marquês desceu para o salão de refeições da estalagem.
Sentou-se em uma mesa no fundo do salão e pediu que lhe
servissem cerveja e, enquanto esperava a bebida chegar,
aproveitou para pensar sobre o que o tinha feito voltar para
Wilborne.

Tinha recebido uma missiva no dia anterior, lhe informando


que ele tinha assuntos urgentes a serem resolvidos na sua
propriedade. A governanta de sua meia-irmã tinha lhe
escrito e parecia até um tanto desesperada na carta.

Ele já imaginava o que poderia ter acontecido.


Provavelmente, Alice deveria ter se metido em confusão
novamente, talvez, dessa vez, tenha deixado suas aranhas
soltas pelo castelo. Era sempre o mesmo motivo: os bichos
de estimação de Alice.

A sua meia-irmã tinha muito apego pelos animais. O que já


lhe tinha causado muitos problemas e sido a causa da
demissão de seis governantas diferentes, pois nenhuma
conseguia colocá-la nos eixos.

Quando Cecília morava com eles, era mais fácil manter Alice
nos eixos, mas agora que sua irmã havia se casado, tinha
restado a ele o papel de guardião da irmã caçula.

Ele tentou convencer a caçula a não interferir nas caçadas


dos lordes vizinhos, mas ela era teimosa e muito protetora
no que se tratava de seus bichinhos, sempre se metendo
em confusão por invadir as terras alheias e tentar salvar as
raposas que estavam sendo caçadas.

Winchester estava pensando no que faria com Alice e não


notou Layla se aproximando, e

apenas quando ela falou, percebeu a presença da mulher.

— Está novamente com a cabeça longe daqui — Layla


comentou, ao se sentar em uma cadeira ao lado do
Marquês.

— Apenas pensativo sobre a viagem — respondeu.

— Se importaria de me falar um pouco sobre Magdala? Eu


adoraria saber como é lá.

Fica no seu Marquesado, não é?

— Sim. O que gostaria de saber sobre o lugar?


— Quantas garotas moram lá?

— Da última vez que eu soube, havia vinte e duas.

— Vinte e duas? Como o local se mantém? Elas trabalham?

— Não como prostitutas. Na verdade, elas praticamente são


autossustentáveis.

— O que é isso?

— Elas mesmas cultivam seus alimentos e costuram suas


roupas. Não costumam frequentar a cidade, apenas no
domingo, quando vão à igreja.

Ao falar da igreja, Layla fez uma careta desgostosa.


Winchester riu.

— Não se preocupe, vejo que não é religiosa, não é obrigada


a frequentar. Mas o pároco é um dos benfeitores de Magdala
e ele é um bom aliado, vai perceber que por causa dele,
muitos paroquianos tratam bem as moças vivem lá. ― O
Marquês se divertiu com a expressão de incredulidade que
ela fazia. ― Quando o conhecer, vai concordar comigo.

— Um libertino defendendo um homem de Deus... Eis aí


algo que não se vê todo dia —

Layla debochou.

— Se espantaria ainda mais se soubesse que ele é meu


meio-irmão. — A surpresa no rosto de Layla o fez rir. — Não
precisa ficar surpresa, eu sempre fui a ovelha negra da
família.

— Conhecendo a fama de sua família, eu diria que seu


irmão é quem está fora dos padrões— Layla comentou e
percebeu que Winchester se retesou com a brincadeira. —
Sinto muito, não quis ofender.

O Marquês se recuperou e voltou a sorrir para ela.

— Não há o que desculpar. Mas, então, está com fome?

— Faminta. Já estou imaginando que antes desse bebê


nascer, eu vou dobrar de tamanho.

— Continuará linda — o Marquês lhe acalmou os temores.

— Vou cobrar esse elogio quando eu estiver enorme...


Veremos se manterá sua opinião.

— A mulher riu e piscou para ele. — Mas, por ora, aceito


apenas jantar.

CAPÍTULO 9 ― DESCOBERTAS

Era noite quando Clara saiu disfarçada de sua casa.

Entrou na carruagem e tirou do seu bolso a missiva que


tinha recebido mais cedo de seu noivo. Na mensagem, ele
lhe avisava que estava voltando a Willow Castle para
resolver problemas pessoais.

Ele tinha dito a mesma coisa à Copas, na noite anterior,


depois de beijá-la, então, a moça não se surpreendeu
quando soube que ele havia saído da cidade.
O beijo ainda estava fresco na sua memória. E, por mais
que ela estivesse furiosa com Winchester, uma parte de si
estava aquecida pela ternura com que ele a tinha beijado.

Clara balançou a cabeça, tentando limpar a mente daquelas


lembranças que a deixavam em conflito.

— Eu não posso gostar dele. — Ela tentou se conscientizar,


sussurrando em voz alta na carruagem, para ninguém em
particular. — Será meu fim.

Sua carruagem chegou ao Rogue's e ela colocou um capuz


cobrindo seu rosto para descer sem ser reconhecida, mas
antes de sair de seu transporte, outra carruagem passou ao
lado da sua.

Esta tinha o brasão dos Claire. Era o seu pai que estava indo
jogar no clube. Ela esperou a carruagem de sua família
passar por ela e seguir em frente, indo para a entrada dos
sócios, só então desceu de sua própria carruagem.

Clara respirou fundo, aliviada. Ficar tão perto de seu pai


sempre a deixava apreensiva.

Esse era o motivo para, desde a primeira vez que esteve ali,
alterar a voz, impedindo que ele a reconhecesse.

Clara desceu e entrou pela porta dos empregados. Trocou


seu vestido e foi trabalhar, como fazia toda noite.

Jogou algumas partidas, mas logo percebeu que não


conseguia se concentrar no jogo. O

maldito Marquês havia tomado conta de seus pensamentos,


assim como os possíveis motivos que a levaram até aquele
momento.
O casamento deles tinha sido escolhido pelo rei, mas por
que foi ela a escolhida? Havia várias outras ladies
debutando naquela temporada. Por que o rei escolheu logo
ela? Sabia que não tinha sido uma escolha do Marquês, pois
se dependesse dele, nunca estariam se casando.

Gostaria de descobrir o motivo que levou o rei a decidir uni-


la a Winchester.

— Está distraída hoje. — Dmitri se colocou ao lado dela e


sentou-se em um banco e Copas se assustou com a
aproximação repentina. — O que se passa?

— Estava aqui pensando sobre meu casamento. — Clara


suspirou, pensativa. — Gostaria de saber por que o rei me
arranjou esse casamento. Não tem nenhuma vantagem
política para esse enlace, a não ser o casamento de um
Marquês, mas sendo apenas por isso, o rei poderia ter
escolhido qualquer outra moça. Tenho certeza de que ele
encontraria uma que melhor atendesse a seus interesses.

— Entendo. Não estou sabendo sobre as particularidades do


seu casamento, mas talvez o Lorde saiba algo. Seu pai tem
visitado muito o escritório dele desde antes do anúncio
oficial de seu noivado.

— Irei conversar com ele antes de ir para casa. Talvez ele


tenha algumas respostas.

— Mas qual o motivo a levou a pensar em seu casamento?

— Não saberia lhe dizer. É apenas um pensamento


recorrente.

— Ficar próxima de seu noivo deve influenciar. Vê-lo todas


as noites, enquanto esconde a sua identidade atrás da
máscara de Dama de Copas, e ter que agir como se não
fosse a noiva dele. Vê-lo flertar com você, sem saber que é
você... Deve ser bem complicado separar a lady da
jogadora. Não sei como ele ainda não percebeu o que está
bem debaixo do nariz dele. Apesar de todas as mudanças
que faz, dá para notar algumas semelhanças.

— Eu espero que esteja errado, porque se eu for


reconhecida aqui, o escândalo será de tamanho homérico.
Mas, para a minha sorte, as pessoas veem o que é do
interesse delas.

― Mas pretende contar a ele a verdade, não?

― Não sei se contarei. Talvez eu simplesmente faça Copas


sumir depois do casamento.

— Ele não aceitará o sumiço muito bem, parece bastante


interessado em Copas. —

Dmitri a observou atentamente. — E você não gosta disso.


— Ele ergueu uma sobrancelha ao reparar.

— Quem gostaria de saber que seu noivo prefere outra


mulher?

— Mas essa mulher que ele prefere é você.

— Ele não sabe disso, então, na mente dele, é outra.

— Talvez você devesse dizer a ele. Acredito que ele ficaria


menos perturbado se soubesse que a mulher que o
interessa é a sua noiva.

— Saber disso, não o impedira de ser um libertino. Ontem,


ele e a Layla estavam... Você sabe... Ocupando um dos
quartos da Luxúria.
— A Layla está grávida. Ela partiu hoje de manhã com o
Marquês.

— Com o Marquês? — Copas arregalou os olhos. — O filho é


dele?

— Céus, não. — Dmitri riu. — Ela foi com ele para Magdala.

— A casa de acolhida para mulheres da vida?

— Essa mesma.

Copas ficou surpresa e um tanto confusa.

— Por que ela viajou com o Marquês?

— Magdala fica nas terras dele. — Dmitri a observou melhor.


— Você não sabe... — Ele sorriu ao dar-se conta. — Ele é o
contato entre Magdala e as prostitutas. Tenho certeza de
que ele estava apenas conversando com a Layla ontem.

— Oh! — A jogadora se surpreendeu com aquela informação


e então corou ao perceber que aquela notícia a agradara.
Ele não a tinha traído com outra, além dela mesma.

— Pelo seu sorriso, sou levado a acreditar que tinha


pensado o pior. E não a culpo por isso.

— Qualquer um chegaria a mesma conclusão que eu


cheguei.

— Sem dúvidas. — Dmitri se levantou da cadeira e lhe deu


um sorriso cordial. — Bom, devo voltar ao trabalho. Foi bom
conversar com você, Copas.

Com um aceno de cabeça, Dmitri se afastou de Copas, a


deixando sozinha com seus pensamentos.
Por não conseguir se concentrar nas partidas, Copas decidiu
não jogar naquele momento, a curiosidade sobre o motivo e
os termos do acordo do seu casamento ficaram em sua
mente e ela esperou a noite terminar para ir conversar com
o Lorde.

No fim da noite, Copas seguiu para o escritório do Lorde.


Bateu à porta de madeira e esperou.

— Entre. — Ouviu a voz de dentro do escritório lhe


permitindo a entrada.

Copas entrou e fechou a porta atrás de si.

— Está tudo bem? — o Lorde perguntou, assim que a viu.

Normalmente, Copas só ia até ali quando tinha algum


problema para resolver e esses, na maioria das vezes,
envolviam seu pai, ou os maus perdedores.

— Sim, só tenho algumas perguntas, se não se importar.

O Lorde se recostou em sua cadeira e fez sinal para que ela


se sentasse, em seguida, cruzou os braços diante de si.

— De forma alguma. Fique à vontade para perguntar.

Copas agradeceu o gesto para sentar, e se acomodou na


cadeira em frente à mesa.

— O Dmitri disse que meu pai veio aqui com frequência no


mês que antecedeu o anúncio do meu noivado. Qual o
motivo?

— Ah, sobre isso... — O dono do clube pareceu


desconfortável. — Seu pai veio aqui querendo reaver
Rostwell.
Reaver Rostwell? Como assim, reaver?

Copas franziu o cenho. Seu pai sempre tinha sido muito


cuidadoso no que se tratava das terras que ele tinha
prometido colocar no seu dote. Quando ela nasceu, o Duque
havia feito um pronunciamento público a respeito do dote
de sua primogênita, dizendo que Rostwell seria de Lady
Clara.

O Duque de Catterfield era um homem muito severo no que


diz respeito a dar sua palavra. Para ele, um homem que não
cumpria o que dizia, não era digno de sequer ser ouvido, ou
levado em consideração. Então, ele jamais apostaria algo
que o fizesse passar por mentiroso. Ele não poderia correr o
risco de não cumprir sua palavra e, por isso, nunca teria
apostaria o dote de Clara.

Ou, pelo menos, era o que ela pensava.

— Ele apostou e perdeu Rostwell? — Ela ainda não


acreditava naquilo.

— Infelizmente sim. — O Lorde passou as mãos pelos


cabelos negros.

— Você devia ter me contado. — Copas se sentia traída. Seu


pai não poderia ter feito aquilo, e Henry não devia ter
permitido que ele apostasse o terreno contra a casa.

— Não me lembrei de o fazer. — O homem enorme à sua


frente ficou constrangido. —

Sinto muito.

— Tudo bem. Pelo menos, ele perdeu para você.

— Não exatamente.
— Como assim?

— Não foi exatamente para o clube que ele perdeu Rostwell.

— Explique-se melhor, por favor.

— Nesse dia, quem estava apostando contra seu pai, em


nome do Clube, era um dos sócios.

— Então, meu pai perdeu o meu dote para um dos sócios?

Droga, se ele tivesse perdido para Henry seria mais fácil de


reaver o terreno, uma vez que ele era o único que conhecia
seu segredo. Já os outros, suspeitariam do interesse dela
por Rostwell.

— Exatamente — o Lorde confirmou. — Eu sinto muito por


isso. Não estava aqui no dia que ele apostou Rostwell e
apenas Dmitri sabia que não era para permitir que o Duque
apostasse seu dote.

— Para qual dos sócios ele perdeu? — Copas se


movimentou, desconfortável, uma sensação ruim a
envolveu. E ela entendeu o mal-estar quando ouviu o Lorde
pronunciar o nome:

— Winchester.

Clara estava na carruagem. Decidira voltar mais cedo para


casa naquela noite. E

enquanto seguia seu caminho, seus pensamentos


fervilhavam com as descobertas a respeito de seu
casamento.

Tudo agora fazia sentido. Por isso, seu pai tinha dito que era
um casamento vantajoso.

Porque, se o Marquês se casasse com ela, então, o pai não


precisaria entregar aquelas terras ao noivo, uma vez que ele
já as possuía. Copas devia ter previsto que mais cedo, ou
mais tarde, o Duque iria tentar mexer no seu dote.

A fúria ferveu o sangue da moça. Agora entendia por que


tinha sido ela a escolhida. O

casamento dela tinha sido arranjado pelo pai junto ao rei,


apenas para que o Duque conseguisse manter a maldita
palavra, fazendo Rostwell ir para o homem que se casasse
com Clara.

A mulher fechou as mãos em punhos. Naquele momento,


odiava que o pai tivesse feito aquilo com ela. Como se já
não bastasse tentar consertar as dívidas que ele tinha
arrumado, agora ele praticamente a tinha apostado e
perdido.

A carruagem parou, indicando que ela já estava em casa.


Clara colocou o capuz sobre seu rosto e desceu, ainda
furiosa.

Ela entrou pela porta dos criados e seguiu pela escadaria


até o andar de cima, onde ficava seu quarto. Adentrou nos
seus aposentos e trancou a porta atrás de si, se encostando
e escorregando pela madeira, até sentar no chão.

— Está tudo bem?

Clara se assustou, ao perceber que havia mais alguém no


quarto, mas quando reconheceu sua criada através da
pouca iluminação, se acalmou.

— Não muito. — Clara suspirou. Era impossível esconder


algo de Carmelita.

— Aconteceu alguma coisa no clube? — A senhora se


aproximou e estendeu a mão para ajudá-la a se levantar.

Elas seguiram até perto da cama, onde Carmelita havia


deixado as roupas de dormir de Clara. E então começou a
despi-la.

— Descobri que meu pai perdeu Rostwell.

— Mas ele não estava em seu dote? — A criada ficou tão


surpresa que parou de desabotoar a roupa de Clara.

— Sim, mas isso não impediu que papai o apostasse.

— E como fará para recuperá-lo? — A criada retirou o


vestido da lady e o dobrou e Clara se sentou na cama.

— Desta vez, meu pai se adiantou e já ajustou tudo para


que meu marido seja o dono de Rostwell. O Marquês está
em posse das terras. É por isso que eu estou me casando
com ele.

— Minha menina, eu sinto muito — a criada disse, enquanto


desembaraçava os cabelos de Clara.

— Meu pai não tinha o direito de fazer isso. Me oferecer de


bandeja para um homem que mal conhece, apenas para
não ter que voltar atrás com sua palavra. Tenho certeza de
que ele foi até o rei para conseguir esse acordo com o
Marquês. Como ele pôde fazer isso, Carmelita? Que

tipo de pai faz isso?


— Minha menina, mas é assim que são os casamentos. —
Carmelita sentou-se ao lado de Clara e pegou suas mãos. —
Seu pai não fez diferente de nenhum outro pai. Infelizmente,
isso é comum entre as moças nobres, mas tente ver o lado
bom, o Marquês parece se importar de verdade com você. É
bem mais do que muitas encontram em um casamento.

Carmelita tinha percebido que os dois estavam se


entendendo e, ao ver que o Marquês se preocupava com
Clara, decidiu que ele não poderia ser tão ruim quanto
comentavam, entretanto, ainda temia por sua menina, ela
podia não reconhecer, mas já estava nítido que sentia algo
por seu noivo. Bastava ver como ele a afetava.

— Eu sei. Mas não torna mais fácil imaginar minha vida ao


lado desse homem. Ele é tão... ― Clara procurou uma
palavra que o representasse e, ao mesmo tempo, não
expusesse totalmente o que sentia por ele. ― Exasperante.
Eu jamais o escolheria se tivesse essa chance.

— E quem escolheria? — a criada perguntou, curiosa. Tinha


certeza de que se sua menina pudesse escolher, ela
escolheria o Marquês.

— Não sei. Eu nem estava pensando em me casar até que


me vi noiva. Esse casamento só me trouxe complicações,
queria poder cancelá-lo.

Carmelita apertou as mãos de Clara, em um gesto de


empatia e, em seguida, se levantou.

— Por que não descansa um pouco? Já está tarde. — A


criada a cobriu com o lençol quando a jovem concordou. —
Durma bem, querida.

— Obrigada, Carmelita.
Clara ainda demorou um pouco a dormir, mas logo o
cansaço a venceu e o sono a tomou.

CAPÍTULO 10 ― ALICE

O Marquês retornou a Londres no dia seguinte à sua partida


para Willow Castle. Sua irmã estava com ele na carruagem,
olhando-o inocentemente. Alice era uma jovenzinha bela,
tinha os mesmos cabelos castanhos que ele e olhos azuis
bem expressivos e bondosos. Amava tudo que fosse da
natureza, isso incluía qualquer animal que ela considerasse
indefeso. Esse seu amor foi o que levara as suas
governantas a desistirem de seus empregos, porque além
de se meter em confusões, Alice ainda mantinha alguns
bichinhos em casa, o que sempre resultava em uma criada,
ou governanta, acordando com uma raposa, em seus
lençóis, ou um vestido rasgado, ou algum excremento
dentro de seu calçado.

Assim que Winchester entrou no castelo, a governanta foi


embora, sem olhar para trás.

Murmurando algo como: “Moça impossível de disciplinar” e


“Nunca arranjará casamento”.

Agora, Winchester teria que encontrar uma nova


governanta para a irmã, caso contrário, Alice jamais
arrumaria um par. E como nenhuma mulher no Marquesado
aceitou o trabalho, ele estava voltando a Londres com a
irmã a tiracolo.
Gabriel não conhecia nenhuma governanta em Londres,
mas talvez Phillipa pudesse indicar alguma, ou, quem sabe,
sua noiva, lady Clara.

Durante o período que passou longe de sua noiva, o


Marquês se sentiu dividido. Ter beijado Copas lhe despertou
um desejo ainda maior do que já sentia. Mas sua
consciência o acusou de que isso acabaria por machucar
sua noiva, e mesmo que Clara estivesse ciente do que ele
estava fazendo, não amenizava em nada o seu conflito
interno.

De qualquer forma, ele acabou agindo como o pai e se


odiava por isso.

Precisaria resolver sua situação o mais rápido possível, iria


falar com o rei e pediria que ele lhe permitisse casar com a
mulher por quem estava apaixonado. Mas, só faria isso
quando encontrasse uma nova governanta para sua irmã,
por ora, aquela era a sua prioridade. Não deixaria que seus
problemas pessoais interferissem na educação de Alice, sua
família era prioridade para ele.

Eles seguiram até a estalagem, onde passariam à noite, era


a mesma de duas noites atrás, onde havia se hospedado
com Layla. Sempre gostava de ficar no mesmo lugar. De
manhã, após o café, tornariam a pegar a estrada para
Londres.

Assim que a carruagem parou na estalagem, Winchester


desceu e ofereceu a mão para ajudar sua irmã a descer.

— Eu não tive a chance de pedir desculpas pelo que fiz —


Alice disse, enquanto descia da carruagem. Ela estava
nitidamente envergonhada pelo seu comportamento.
— Uma desculpa não seria suficiente para trazer sua
governanta de volta.

— Não é com ela que eu quero me desculpar. Por mim, ela


já teria ido embora há muito tempo. Odiava-a! Ainda mais
depois que ela tentou matar a Sexta-feira.

— Ela disse que não tentou matar a raposa, disse que a


armadilha era para pegar ratos.

— Que mentirosa! Aquela armadilha era nitidamente de


raposa. Dava para saber só em olhar o tamanho.

O Marquês suspirou.

— E sobre o incidente com Lorde Scott-Hasben? Você


invadiu as terras dele novamente.

O homem jurou que da próxima vez, atira em você também.

O Marquês foi informado de todas as peripécias que sua


irmã havia aprontado, e isso

incluía a invasão das terras do nobre vizinho durante uma


caçada.

— Aquele velho decrépito já devia ter morrido. ― Alice


bufou, irritada. ― Velho cruel!

Queria que ele passasse um dia sendo caçado para ver se é


bom.
― A questão não é essa. Sabe que caçar é um esporte
comum aqui, não pode invadir toda caçada que ver.

― Eu não tenho culpa. Sexta-feira tinha sumido e eu estava


preocupada que ela tivesse voltado para as terras de Lorde
Scott-Hasben, sabe como ela gosta de ir para o riacho que
atravessa as terras dele. Eu não podia deixar que ele
caçasse Sexta-feira, como se ela fosse um animal selvagem
e perigoso.

― Ela é um animal selvagem e até perigoso. Pelo menos,


para as galinhas.

― Tenho certeza de que a usam como desculpa para o


desaparecimento das galinhas ―

Alice defendeu sua mascote. ― Ainda irei provar isso.

― Não invente de fazer nada, Alice, essas coisas só


dificultam que consiga um marido.

― Eu não quero um marido.

Winchester olhou descrente para a irmã. Ela, desde


pequena, sonhava com um casamento e não era segredo
para ninguém que era uma romântica incurável.

― Tudo bem, eu quero me casar sim, mas não vou aceitar


um homem que faça caçadas.

— Bom, acho que não é impossível de encontrar, mas sua


mania de irritar os lordes invadindo suas caçadas, acaba por
lhe dificultar e muito as coisas, nenhum homem irá se casar
com você sabendo que todos os nossos vizinhos querem
estrangulá-la. — O Marquês direcionou o olhar para a
raposinha que dormia sossegada nos braços de sua irmã. ―
Será difícil encontrar um homem que não tenha cães, ou
não cace, ou que aceite que a esposa dele tenha uma
mascote pouco convencional.

― Não é verdade, não são todos que me odeiam. Só os que


fazem caçadas. Lorde Snow, por exemplo, me adora.

― Lorde Snow é um homem da ciência, com certeza, é o


único que se solidariza com o seu amor pelos animais ―
Winchester comentou, divertido. ― E também é visto por
todos como um louco.

― Ele não é louco, apenas mal compreendido por aqueles


que não conseguem ver através da ótica dele. Para mim, ele
é um gênio e ainda será reconhecido como um.

― Mas, voltando ao assunto. ― O Marquês viu a irmã revirar


os olhos. Sabia que ela odiava aquele assunto, mas era
necessário falar com ela. ― Você precisa se comportar, ou
nunca vai achar alguém que a aceite.

― Eu não sei se consigo me comportar, é mais forte do que


eu. Nem sempre escolho fazer as coisas conscientemente,
quando pisco, já me meti em confusão. ― Alice suspirou,
triste.

― Creio que terei o título de solteirona, sem nem mesmo


debutar.

Vendo a tristeza no olhar da irmã, Gabriel a abraçou, lhe


acalentando.

— Sei que se esforça. E farei o possível para lhe encontrar


um bom marido. Ainda falta um ano antes do seu debute,
teremos tempo para trabalhar seu comportamento.
Daremos nosso jeito. ― O Marquês sorriu para a irmã e em
seguida entraram na estalagem.
Na manhã seguinte, seguiram para Londres ao raiar do dia.

Alice ficou olhando o centro de Londres e suas ruas


apinhadas de gente e sentiu-se acuada. Parecia um
ambiente hostil. Sexta-feira se mexeu inquieta também em
seu colo, compartilhando o sentimento de sua dona.

— Eu não entendo como você gosta tanto de ficar aqui. Não


tem árvores, o ar é seco e abafado, e tudo é tão barulhento
e sem cor.

— Eu também prefiro o campo, e como tenho muitos


negócios aqui, se faz necessário esse sacrifício.

— Compreendo, afinal, o que melhor que uma cidade


enorme cheia de bordéis para servir de contato para
Magdala? — Alice comentou, distraída, e quando percebeu a
surpresa no semblante do Marquês, viu que ele não
esperava que ela soubesse o tipo de trabalho que fazia.

— Quem contou? — ele perguntou, fechando a cara.

Não queria nenhuma de suas irmãs envolvida com Magdala.

Não que as mulheres de Magdala fossem indignas, ou algo


assim. Mas a sociedade massacraria ainda mais suas irmãs
de soubessem que elas também estavam envolvidas.

Infelizmente, para uma mulher, ser vista na companhia de


uma prostituta, ainda que não se vendessem mais, seria o
suficiente para acabar com qualquer reputação que esta
ainda tivesse.

— Encontrei a Fernanda na igreja, conversando com o


Sammy. E, sem querer, acabei escutando toda a conversa.
Fernanda perguntava onde você estava e o Sam falou de
mim. Disse que a minha governanta tinha mandado uma
carta abandonando o cargo, então, logo você teria que
voltar e traria uma moça para ela. E como eu sei que a
Fernanda mora em Magdala, então, deduzi todo o restante.

— Sammy devia ter tido cuidado ao falar essas coisas perto


de você — o Marquês resmungou, não gostando daquilo.

― Ele não sabia que eu estava lá.

Gabriel ficou um momento em silêncio, pensando em como


abordaria com sua irmã um assunto tão delicado.

— Alice, você sabe que, além de qualquer outra coisa,


precisa ter uma boa reputação para encontrar um marido,
não é?

— Você está dizendo para eu não ser vista com elas. — Alice
ergueu uma sobrancelha, entendendo facilmente o que ele
queria dizer com aquelas palavras.

— Infelizmente, sim. — O Marquês olhou pela janela. Odiava


ter que dizer aquilo. Mas Alice já tinha muitos pontos
negativos contra ela, não precisava de mais um.

— Eu já sou a bastarda esquisita, que invade caçada e cuida


de animais selvagens — ela comentou, sarcástica. — Não
preciso ser a bastarda esquisita que gosta de animais e
anda com prostitutas...

Alice falou aquelas palavras suavemente. Não de forma a


criticar as mulheres de Magdala, mas criticando a si mesma.

— Uma mulher casada não será mal vista caso faça obras
de caridade para ex-prostitutas, então, depois que se casar,
você poderá ajudar as meninas de alguma forma.

— Isso, se meu marido permitir.


— Encontrarei alguém que seja bom para você e que seja
também respeitoso com as mulheres. Será uma missão
quase impossível, mas eu vasculharei toda a Inglaterra, se
for preciso.

Encontrarei esse homem para você, eu prometo.

— Basta que encontre alguém como você, será perfeito. —


Alice abraçou o irmão e em seguida mudou de assunto. —
Vai me apresentar para sua noiva, Lady Clara?

— Claro que vou apresentá-las. Você é minha irmã.

— Me fala um pouco dela. O que ela gosta de fazer? — A


irmã estava bem interessada na futura cunhada.

Aquela pergunta o fez sorrir ao se lembrar das coisas que


fez com Clara.

— Bem, sei que Lady Clara ama música, ela é ótima no


piano, você tem que ouvi-la tocar. Ela toca divinamente. ―
O Marquês sorriu ao lembrar ― Também gosta de
caminhadas, principalmente no Regence Park. É
extremamente temperamental e tem a língua afiada, mas
ao mesmo tempo, é compreensiva e tem um coração
gigante. Você vai gostar muito dela, darei um jantar para
que se conheçam melhor.

— Ela não vai se importar em comer à mesa com uma


bastarda?

— Claro que não. Ela realmente não se importa com essas


coisas. ― O Marquês sorriu.

Nunca tinha entrado no tema com sua noiva, mas algo nela
lhe fazia ter certeza de que Clara receberia sua irmã de
braços abertos. ― Tenho certeza de que será bem-vinda.
— Ela parece ser uma boa mulher. Acho que vou gostar
dela. Ela é bonita?

— Você a verá antes do final do dia. Então, poderá dizer por


si mesma ― respondeu, dando de ombros.

Falar de sua noiva o fez evocar a imagem dela em sua


mente.

Ela era sim muito bonita. Não de uma beleza arrebatadora,


ou incomum, mas de uma beleza calma e delicada, que se
enxerga apenas quando observa os detalhes, como o jeito
que ela sorria, ou o brilho nos olhos quando se irritava, ou o
rubor que cobria as bochechas toda vez que ela ficava
constrangida.

Foi, então, que percebeu que algo tinha mudado. Se


importava com sua noiva e até gostava dela.

Que inferno!

CAPÍTULO 11 ― SENTIMENTOS

Clara estava tocando piano. Uma sinfonia triste e


deprimente que refletia exatamente como ela se sentia.

Tinha conversado com seu pai e aquilo só havia piorado seu


estado de espírito. Seu pai deixou claro que mesmo que não
tivesse perdido Rostwell, o casamento dela seria um acordo
de negócios com outros nobres. E o Duque ainda havia
declarado que ela deveria ser grata por ele ter perdido para
o Marquês e não para outro lorde menos apessoado, uma
vez que ela teria um marido jovem, rico e bonito e que lhe
daria herdeiros fortes e saudáveis.

Depois dessa conversa com o pai, ela tinha evitado o


Duque. Ele sempre fora um bom pai, mas nunca reconhecia
seus próprios defeitos, pelo contrário, sempre encontrava
outros para pôr a culpa, ou fingia que não era um erro e,
sim, um meio para algo mais importante.

E o casamento dela era exatamente o meio que ele tinha


encontrado para não quebrar sua palavra, não se
importando se isso deixaria sua filha feliz, ou não.

Saber que o pai não se importava com a sua felicidade a


deixou bastante deprimida e ela expressava sua dor nas
teclas do piano.

Uma batida na porta a fez parar de tocar.

— Milady, seu noivo está aqui e gostaria de vê-la — uma


criada anunciou, após abrir a porta.

Clara olhou para a criada, enquanto suspirava. Péssima hora


para o Marquês aparecer.

Tudo que ela não queria naquele momento era ter que fingir
que estava tudo bem. E daquela vez, nem sequer poderia
culpá-lo. Ele era tão vítima quanto ela.

— Milady? — A criada esperava uma resposta.

— Peça que me espere na sala de visitas, eu já descerei — a


lady avisou, enquanto se recompunha para poder encontrar
seu noivo.
Respirou fundo algumas vezes e, então, quando suas
emoções estavam devidamente escondidas embaixo de
uma expressão neutra, desceu as escadas.

O Marquês a esperava na sala de visitas e se levantou do


sofá, assim que Clara entrou no ambiente. Winchester
vestia um terno azul marinho, uma camisa branca e um
lenço no pescoço de um branco perolado. Ao lado dele,
estava uma jovenzinha de vestido cor creme, bastante
simples e seu cabelo estava trançado e bem preso na nuca.
A moça olhava para Clara com curiosidade e empolgação.

— Milady. — O Marquês lhe reverenciou, perfeitamente


educado, e Clara retribuiu fazendo uma leve mesura. —
Permita-me apresentar-lhe minha irmã. Senhorita Alice
Melcon.

A garota fez uma perfeita reverência para Clara e lhe deu


um belo sorriso.

— A senhorita parece uma fada — Alice falou, maravilhada.


— Nunca vi cabelos tão claros. São lindos.

Clara corou com o elogio e olhou para o Marquês, mas ele a


olhava de uma forma diferente, absorto à fala da irmã.
Parecia estar vendo-a pela primeira vez.

— Obrigada, senhorita Melcon, é bom saber que não sou tão


sem graça — Clara alfinetou o Marquês, ao lembrar-se das
palavras dele, mas quando olhou para ver se ele tinha
entendido a referência, percebeu que seu noivo nem
mesmo a escutava. — Milorde?

— Ah, me perdoe. Estava perdido em pensamentos. —


Gabriel ficou desconcertado e desviou o olhar do de Clara.
— Minha irmã vai passar alguns dias comigo aqui em
Londres, até encontrarmos uma nova governanta para ela, e
eu ficaria demasiado agradecido se nos ajudasse a
encontrar alguém para o trabalho.

— Ah, é claro que ajudo. Será um prazer. Conheço algumas


que, acredito, serem bem indicadas para lhe preparar para
o debute.

— Ela não pode ter medo ou aversão à raposas — Alice


disse rapidamente, antes que seu irmão a impedisse.

— Raposas? — Clara inclinou a cabeça, curiosa.

— Minha irmã tem uma raposinha de estimação.

— Sim, então, ela não pode ter medo de raposa, ou querer


matá-la —Alice repetiu.

— E, de preferência, que ame todas as criaturas que Noé


colocou na Arca e tenha a paciência de Jó. — Gabriel revirou
os olhos. — Pois nem sempre Alice consegue manter Sexta-
feira no lugar dela, e isso sempre causa problemas com as
governantas.

Clara olhou, espantada para o Marquês, por citar


personagens bíblicos com tanta familiaridade e perguntou,
divertida.

― O senhor leu a Bíblia?

― Meu irmão é um homem da igreja, e sempre me dá um


ou outro sermão, de vez em quando ― ele respondeu, sem
graça. ― Então, acha que pode encontrar uma mulher com
tamanha qualidade?

Clara sorriu com aquilo. Seu noivo sempre a surpreendia.


— Realmente é um problema, não será fácil encontrar uma
governanta que aceite conviver com animais selvagens.

— Você não tem nenhum problema com raposas, tem? —


Alice perguntou, esperançosa.

— Não. Não tenho. Mas, para falar a verdade, nunca vi uma


viva de perto. Então, não sei como reagiria ter um animal
correndo pela casa. — Clara sorriu. — Por isso, prefiro que
fiquem no habitat delas e eu fico no meu. Ninguém
incomoda ninguém e todos vivemos felizes.

— Você devia seguir esse conselho. Deixá-las no seu habitat


— o Marquês provocou a irmã.

— Sexta-feira morreria sem mim. Não sabe sobreviver ao


meio hostil, chamado natureza.

O habitat dela é comigo — Alice replicou. — Não tente me


convencer do contrário.

— A esperança é a última que morre. — O Marquês


suspirou, com um sorriso e, em seguida, olhou para Clara.
— Não vai ser fácil encontrar uma governanta que aceite
tantas especificações.

— Não vai mesmo, mas sei que encontraremos. — Clara


sorriu para Alice. Tinha gostado da jovem. ― Sua raposa se
chama Sexta-feira?

― Sim, eu a encontrei em uma sexta-feira ― Alice explicou.


― Então, acabou que esse ficou sendo o nome dela.

― Entendi. ― Clara segurou o riso. O nome da raposinha a


fazia querer rir.
— Bom, mas se não encontrarmos uma governanta, o jeito
vai ser se livrar de Sexta-feira até Alice encontrar um
marido — o Marquês avisou para Clara, sem olhar para
Alice.

Alice ficou pálida com aquela informação. Não, não


poderiam se livrar de seu bebê.

Clara percebeu a apreensão da jovem.

— Iremos encontrar sim. Não se preocupe. — Clara segurou


as mãos de Alice e olhou irritada para o Marquês. Ele devia
se importar com os sentimentos da irmã.

— É claro que sim. — O Marquês sorriu ao notar a reação de


Clara. — Afinal, só

precisamos encontrar alguém até a temporada. Depois


disso, teremos que nos empenhar em lhe arrumar um
marido e, esse sim, será o desafio.

— Que maldade! Não seja tão cruel com sua irmã. Ela vai
encontrar facilmente um marido.

— Ele não está sendo cruel, apenas realista. Não vai ser
fácil encontrar um homem que queira se casar com uma
bastarda, que gosta de raposas e quer ajudar prostitutas.

— Conheço alguns homens assim. Mas não são nobres —


Clara disse com um sorriso, ao lembrar-se dos homens que
trabalhavam no clube e nem percebeu que aquilo não era
um assunto para uma jovenzinha como Alice falar.
— Conhece? — o Marquês perguntou em uníssono com sua
irmã. Mas, enquanto Alice parecia esperançosa, Winchester
soou irritado.

Clara corou ao perceber que tinha falado demais. Como


explicaria de onde conhecia os homens do Rogue's?

— Vamos primeiro encontrar a governanta, depois nos


preocupamos com o casamento —

Clara mudou o assunto, e percebeu o Marquês


semicerrando os olhos para ela.

Ela ter falado de outros homens tinha chamado a atenção


dele e ele não estava feliz com aquilo.

— Sim, sim. É claro — Gabriel concordou, desgostoso.


Depois iria conversar com ela sobre esses outros homens.
Não havia gostado da possibilidade de Clara ter encontrado
alguém para ser seu amante até o casamento.

Foi, então, que percebeu que não queria que ela


encontrasse um amante.

Droga. Não era para vê-la assim, ele gostava de Copas, não
podia gostar também de Clara. Mas Clara era a sua noiva e
não Copas. Então, ele devia gostar de Clara e não de Copas.

— Você está bem? — Alice perguntou, ao perceber que o


irmão estava estranho. —

Gabriel?

— Sim, sim. Estou. Bom, temos que ir. Obrigado por se


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— É uma alegria poder ajudar. Eu farei uma lista com as
governantas que conheço e pedirei algumas indicações.
Quando tiver a lista pronta, enviarei ao senhor.

O Marquês acenou com a cabeça e se despediu com uma


mesura elegante e, ainda, surpreendeu Clara ao lhe
depositar um beijo no dorso da mão.

E quando o Marquês partiu com sua irmã, Clara ficou se


perguntando o que havia nele de diferente.

Enquanto seguia para sua casa em Londres, Gabriel não


pôde deixar de pensar no que tinha acontecido naquele
breve momento em que passou com sua noiva.

— Eu gostei dela. — Sua irmã tinha lhe avisado assim que


entraram na carruagem. — E

ela não se deixa levar pelo seu charme, então, é perfeita


para você. E o mais importante, ela não tem medo de
raposas.

Gabriel não respondeu à sua irmã. Não era necessário.

Depois de colocar seus pensamentos em palavras, Alice


tinha ficado em silêncio,

observando a cidade pela janela.

Assim, o Marquês ficou sozinho com seus pensamentos,


apesar de acompanhado. E ele lembrou do momento em
que sua irmã disse que Lady Clara parecia uma fada, nesse
momento, ele realmente viu na moça feições míticas. E, por
um breve instante, ela lhe pareceu incomum. O que o
deixou abismado. Como não tinha visto que os olhos eram
tão misteriosos e pareciam esconder segredos como nuvens
carregadas que escondem o sol? E por que lhe pareciam tão
familiares?

E, então, veio a segunda parte e a que mais o incomodou. O


momento em que Clara disse conhecer outros homens.

Quem eram esses homens que não tinham títulos a quem


ela se referiu? Seria algum pretendente que ela estava
pensando em ter como amante? Ou será que já estava
dormindo com eles? Não, era muito improvável, ela não
colocaria um de seus amantes para se casar com Alice.

Então, quem diabos eram esses homens?

Ele não tinha nenhuma resposta para aquilo. Mas logo iria
descobrir. Por enquanto, ia se empenhar em encontrar uma
governanta para sua irmã. Depois resolveria mais esse novo
problema.

Quando a noite chegou, o Marquês decidiu que precisava


ver Copas. Apesar de decidido a colocar sua irmã como
prioridade, não conseguia resistir a vontade de vê-la,
imaginar sua noiva com outro homem, o deixou com
vontade de fazer o mesmo. Se Clara estava tendo o seu
amante, ele também teria a sua.

Mas não era apenas por isso que queria vê-la. Precisava
olhá-la e sentir que era por ela que estava apaixonado.
Afinal, só fazia alguns dias que tinha saído da cidade, seus
sentimentos não poderiam ter mudado em tão pouco
espaço de tempo.
Precisava vê-la, era só o que precisava para pôr em ordem
seus sentimentos. Pois estava apaixonado por Copas, não
estava?

Aquilo que sentiu por Lady Clara, era apenas empatia.


Talvez, no fundo, apenas tivesse parado de culpá-la por algo
que não estava ao alcance de ela escolher e, por isso, não a
via mais como uma inimiga. Se sentia responsável por
Clara, apenas isso.

Sim, só podia ser isso. Não estava apaixonado por sua


noiva, era apenas uma reação à memória de sua mãe. Ter
estado em casa tinha esse efeito nele. Fazia com que todas
as lembranças do passado de sua família o assombrassem e
o lembrassem de sua promessa. O Marquês balançou a
cabeça, afugentando os pensamentos. Não queria pensar
em sua promessa naquele momento, pois isso, o fazia
lembrar-se de sua mãe e consequentemente de seu pai.

Ao chegar ao clube, o Marquês procurou a mulher de seus


pensamentos entre as mulheres fantasiadas dali e não
demorou para encontrá-la. Ver Copas, ainda que de longe,
fez seu coração acelerar. Sim, era apaixonado por aquela
mulher.

Copas estava sentada em uma mesa, jogando cartas,


quando ele sentou-se ao seu lado.

Inicialmente, ficaram em silêncio, afinal, ela estava no meio


de uma partida com alguns outros membros do clube. Mas
assim que ganhara a rodada, Copas se levantou, ignorando
deliberadamente o Marquês.
Depois que ele foi embora de sua casa, Clara tinha pensado
muito sobre aquela tarde.

Talvez ele tivesse mudado. Isso tinha passado por sua


cabeça. Se o Marquês realmente tivesse mudado, talvez seu
casamento não fosse tão ruim e ela pudesse suportá-lo. Mas
ele tinha ido atrás de Copas novamente. Isso provava que
nada estava diferente.

Ali estava ele, fazendo companhia à Copas e a olhando,


completamente apaixonado. Ele nunca olharia desse jeito
para Clara. Winchester nunca beijaria Clara como fez com
Copas.

O pior para ela é que desejava aquilo. Desejava que ele, ou


alguém, a olhasse como ele olhava para Copas. Queria se
sentir desejada...

E, por isso, mesmo sendo Copas, naquele momento, foi


Clara quem assumiu o controle e se afastou dele.

Seguiu, sem saber para onde ia, até que se viu em um dos
quartos da Luxúria. Só queria fugir por um momento, então
bateu à porta e quando ninguém respondeu, ela girou a
maçaneta e entrou.

Escorou-se na porta, erguendo a cabeça, enquanto


respirava devagar. Não podia se permitir perder o controle.
Não no clube e não tendo o Marquês tão próximo.

Ela seguiu até a janela que dava para rua, precisava de ar e


a janela estava fechada, tornando o ambiente
claustrofóbico. Abriu rapidamente, sem nenhuma
dificuldade, e o vento frio açoitou seu rosto. O inverno seria
rigoroso naquele ano, mas ela estava feliz por poder
respirar.
Aos poucos, se acalmou.

— Está fugindo de mim? — A voz masculina atrás dela a fez


se virar, assustada.

O Marquês a olhava com o cenho franzido, tentado entender


o que se passava com aquela mulher.

Copas sentiu seu corpo tremer, culpou o frio, apesar de


saber que o clima não tinha lhe causado isso. Virou-se para
a janela e se apoiou ali, dando as costas para o homem que
aguardava sua resposta.

— Não, milorde. Por que fugiria? — perguntou, ainda de


costas para o Marquês. Assim era mais fácil ignorar o que
ele a fazia sentir.

— Não sei. Talvez porque da última vez que eu a vi, dei-lhe


algo em que pensar.

— Se está se referindo ao beijo, foi um erro. Não volte a


fazê-lo. Eu não desfrutei de sua ousadia. — Tentou manter a
voz firme.

— Está mentindo. — Ele percebeu, com um sorriso


satisfeito.

— Diga-me, o que importa se eu minto? Por acaso, irá pedir-


me em casamento? Não, não vai, porque já tem uma noiva.
E era nela que devia estar distribuindo beijos.

— Você está com ciúme. — Gabriel sorriu, enquanto


diminuía silenciosamente a distância entre eles.

— Não, não é ciúme, é apenas a realidade. Não pode me ter


e, mesmo que pudesse, não me teria. Só me quer para fugir
de sua responsabilidade com sua noiva.
— Eu estou apaixonado por você. — Ele se aproximava
lentamente, ela escutava sua voz cada vez mais perto.

— Paixões passam — replicou.

— A minha por você não. Eu estou disposto a tê-la. Você me


encanta e fascina. Eu ardo por você durante a noite, a
desejo todos os minutos do dia. Eu até pensei que poderia
me casar com Lady Clara, mas ela não merece um homem
apaixonado por outra. Ela é uma boa mulher.

Merece ser feliz. E eu não poderia fazê-la feliz, não quando


quero estar com você. — O Marquês respirou, procurando
palavras para explicar. — Não quero ter você como minha
amante e, com isso, desonrar minha esposa, mas,
tampouco, quero estar com ela pensando em você.

— Eu não posso. — Copas ergueu a cabeça, tentado segurar


as lágrimas.

Como ele podia fazê-la odiá-lo e desejá-lo ao mesmo


tempo?

— Eu quero me casar com você. Só preciso descobrir como.

— E o que dirá a sua noiva? — Copas perguntou, chocada


com a revelação dele, sentia seu coração se partir como
Clara.

— A verdade. Ela me compreenderá. Ela também não


parece muito feliz em se casar comigo. Meu único
empecilho é o rei. Eu não posso romper o noivado sob
acusação de traição...

Mas, talvez, a minha noiva possa me dispensar.


— Um noivado rompido traz consequências. Você não pensa
no que isso significará para sua noiva?

— Não permitirei que ela sofra as consequências do


rompimento. E, quanto a isso, eu tenho uma coisa que
talvez possa ajudar.

— O quê? — Copas perguntou, suspeitando de que ele


falaria das terras do seu dote.

E não estava errada.

— Eu tenho Rostwell. Tenho suspeitas de que o pai dela só


está apoiando esse casamento por causa das terras que
ganhei dele. Talvez, possamos chegar a algum acordo. — O
Marquês estava decidido, não tinha ido ali para isso, mas
não suportou vê-la ir para longe dele. — Eu resolverei tudo
— prometeu.

— E depois de resolver tudo, vai se casar com uma mulher


que nem conhece. — A voz de Copas não passou de um
sussurro.

— Então, me deixe conhecê-la. Eu sei que me apaixonarei


pela mulher por trás da máscara, da mesma forma que me
apaixonei por Copas.

— Você não sabe, você não vai gostar do que verá por trás
desse disfarce — ela apontou, irritada e magoada. Como ele
poderia dizer aquilo? Ele já conhecia a mulher por trás da
máscara e estava rejeitando. Ela não conseguiu evitar uma
lágrima rolar.

Ele ficaria furioso quando descobrisse e, naquele momento,


ela queria que ele ficasse furioso, queria machucá-lo da
mesma forma que a machucava, mas, ao se virar para o
Marquês, percebeu que não podia fazer isso com ele. Ele a
olhava com tanta paixão e desejo que ela sentiu a raiva se
esvair com a mesma velocidade com a qual a tomou.

— Eu não poderia não gostar de você. Quero saber quem é


a mulher por quem me apaixonei. — O Marquês diminuiu o
espaço entre eles e tocou o queixo de Copas, a única parte
que a máscara não cobria e a fez olhar para ele. — Me deixe
conhecê-la.

Copas observou o olhar do Marquês no seu, seus rostos tão


próximos. O toque dele em sua face. Ela sabia que no
momento que ele descobrisse quem ela era, estaria tudo
acabado. Ele não ficaria feliz em descobrir que ela o
enganou todo esse tempo. Tinha certeza disso.

— Eu não posso — sussurrou. — Você me odiaria.

— Eu jamais seria capaz de lhe odiar. — O Marquês se


inclinou na direção dela. — Me

permita mostrar isso. Permita que eu a beije.

Copas nem sequer pensou em rejeitar, pois sua


concentração ficou presa na boca do Marquês, assim como
seus olhos, que fitaram a boca carnuda de Winchester.

— Sim. Beije-me. — Ela se ouviu dizer.

Então, o Marquês uniu seus lábios aos dela, era um roçar


macio de lábios e ela pensou que seria como da última vez.
Apenas um roçar maravilhoso, que a tinha deixado
completamente à deriva. Mas então, ela se viu afundar
quando sentiu o toque molhado da língua dele. Era um
gesto inesperado, o que a deixou surpresa. Não esperava
aquilo. E quando ele pediu passagem pelos lábios dela e ela
o sentiu encostar a língua na sua, um choque percorreu seu
corpo deliciosamente, lhe arrepiando todos os pelos do
corpo.

Ele continuou a explorar aquele lugar nunca antes


conhecido por alguém. Ela era deliciosa. O Marquês a puxou
contra si, aprofundando ao máximo o beijo e explorando-a
intimamente.

E, enquanto a beijava, uma de suas mãos desatava o laço


que prendia sua máscara.

CAPÍTULO 12 ― DESMASCARADA

Copas sentiu a máscara deslizar de seu rosto tarde demais.


O Marquês a tinha removido e agora não tinha mais o que
fazer. Manteve os olhos fechados. Não queria ver a reação
dele. Sentiu os lábios dele se afastarem dos seus,
encerrando o beijo. Logo ele descobriria quem ela era.

Não demorou e ouviu o arfar, surpreso.

— Tire a peruca. — Ela ouviu a voz dele, mas não conseguiu


saber qual era o sentimento presente nela. Ele parecia se
conter.
Hesitante, Clara removeu os grampos de seu cabelo, soltou-
os e retirou a peruca, liberando seus cabelos loiros.

Permanecia de olhos fechados. Temia que quando os


abrisse, não tivesse força para continuar a encará-lo. Ela
não devia ter deixado que ele tirasse daquela forma. Tinha
pensado em se revelar em um momento em que ele não
pudesse usar sua identidade contra ela. Aquilo não havia
sido planejado, e agora ela teria que arcar com as
consequências de ter se escondido atrás de uma máscara.

Clara não ia se acovardar. Nem ela, nem Copas eram


covardes e ambas tinham seus motivos para não se
revelarem. Ela não tinha tido a pretensão de enganá-lo, e
não tinha culpa por ele não gostar de Clara e ter se
apaixonado por Copas.

Iria enfrentá-lo. Não poderia recuar. Entretanto, antes que


pudesse abrir os olhos, ouviu a porta fechar, com força.

Gabriel retirou suavemente a máscara do rosto de Copas.


Encerrou o beijo e se afastou para conhecer a mulher por
quem era apaixonado.

Seu coração perdeu o compasso.

Copas era... Clara?

Não era possível. Não podia. Ele conhecia Clara. Ele falou de
Clara para Copas, a jogadora perguntava de sua noiva.

Ele não queria acreditar.

— Tire a peruca — ele ordenou. Tinha esperanças de ter se


enganado. Mas sabia que, na verdade, só queria confirmar
que era sua noiva.
E quando teve essa confirmação, sentiu a fúria o tomar. Não
aguentaria ficar ali nem mais um segundo, observando
aquela mulher, que agora desconhecia.

Ela continuava de olhos fechados, parecia não querer ver as


consequências de suas mentiras. Então, se direcionou à
saída. E a fúria era tanta que não pode controlar a força ao
fechar a porta.

Seguiu para a ala da Gula. Não podia ir para casa naquele


momento, sua irmã estava lá, e se ela o ouvisse quebrando
os móveis, iria ficar preocupada e tentaria descobrir o que
aconteceu.

Sentou-se em uma mesa e pediu alguma bebida forte.


Enquanto esperava, tentava entender.

Como ela podia ter feito aquilo? Havia se divertido à custa


dele todo esse tempo, fingindo ser uma mulher diferente.

Ele tinha sido um tolo. Era isso que sentia. Tinha sido um
tolo nas mãos dela. Como não tinha percebido que eram a
mesma pessoa? Claro que ela mudava a voz e tinha o
cabelo e a máscara para disfarçarem sua aparência. Mas,
ainda assim... Os olhos eram o mesmo... Ele devia ter
reconhecido.

Não queria enxergar o que estava embaixo do seu nariz. Era


a única explicação. Estava tão encantado com Copas e
desgostoso com Clara, que não queria enxergar que eram a
mesma pessoa. Mas, inconscientemente, sabia. Todas os
gestos parecidos não haviam passado sem que ele notasse,
mas havia ignorado todos os sinais.

A risada veio forçada e debochada. Ele ria de sua própria


tolice.

Ela devia achar que ele era mesmo um tolo. Devia mesmo
ter se divertido à sua custa.

Mas não ficaria assim. Não permitiria que ninguém o


enganasse.

O barulho na ala da Ira lhe chamou a atenção. Precisava


mesmo extravasar, então, poderia pedir uma boa e velha
luta. Ele terminou de beber o conteúdo âmbar de seu copo
de uma só vez e seguiu para a Ira.

Clara terminou de colocar a peruca. Tinha se recomposto.


Não sabia o que o Marquês faria agora, mas a única certeza
era de que aquilo ainda não havia acabado. Daria um tempo
para que ele pudesse absorver as novas informações. E
depois, conversaria com ele.

Assim que estava novamente disfarçada, saiu para


continuar seu trabalho como Copas.

Não podia pensar no Marquês naquele momento. Nem


queria. Ainda bem que ele foi embora.

Desceu as escadas e seguiu para a Ala da Avareza.


Percebeu que a maioria dos jogadores estavam na Ira e,
então, apenas se sentou em uma das mesas e ficou ali.
Tirou um maço de cartas de seu bolso e começou a
organizá-las para passar o tempo.

— Por que o Marquês pediu a Henry para ir para o ringue? —


Uma mulher sentou ao lado de Copas e ela reconheceu
como Phillipa.

— Ele ainda está aqui? — Copas se surpreendeu. — Pensei


que tinha ido para casa.

— Ele pediu uma luta. É o próximo e parecia furioso. —


Phillipa se sentou em uma cadeira ao lado de Copas.

— Imaginei que ele estivesse. — Copas voltou a separar as


cartas.

— Não vai me contar o que aconteceu?

Copas respirou fundo. Precisava mesmo conversar com


alguém e Phillipa era sua amiga.

— Ele descobriu quem eu sou.

— Quando? — Phillipa pareceu surpresa.

— Alguns minutos atrás.

— Ah. Devo supor que, uma vez que ele decidiu ir para a
Ira, a reação dele não foi das melhores — concluiu.

— Eu não saberia dizer. Não consegui olhar para ele,


enquanto retirava minha máscara.

Não quis, na verdade. E então ele saiu, batendo a porta.

— O que pretende fazer agora?


— Não sei. Ainda não planejei exatamente o que fazer. Por
ora, apenas esperá-lo se acalmar.

— Entendo. Por que não vem comigo assistir a luta? Ele


provavelmente precisará de cuidados depois que sair do
ringue. O Michael é o oponente.

— Ele quer mesmo uma briga difícil. — Copas suspirou. —


Ele não vai querer me ver.

Está furioso comigo. E a ideia de vê-lo lutar, não me agrada.

— Depois que ele sair do ringue, a raiva terá ido embora e


restará muitas perguntas. Se vocês não conversarem, ele
pensará o pior.

— Ele já pensa o pior. Com certeza, pensa que estava me


divertindo com isso.

— Mais um motivo para você esclarecer tudo. Vocês vão se


casar, em breve, mesmo que os dois não queiram isso, o rei
o quer, então, não têm escolha. Você não quer se casar com
um homem que lhe odeia e não confia em você, quer?

— Claro que não. Mas não foi culpa minha. Ele que se
apaixonou por Copas.

— Então, mostre a ele o seu lado. Faça-o entender como


você também se sentiu durante todo esse tempo.

Copas suspirou, rendida. Talvez, fosse realmente melhor ter


aquela conversa logo e sabia que ele não ia gostar.

— Tudo bem. Vou conversar com ele — Copas concordou,


apesar de não se sentir feliz com a ideia e, então, juntou as
cartas e as guardou. — Por favor, peça para que o levem
para um dos quartos da Luxúria, depois da luta. Eu
esperarei por ele lá.

Copas acenou com a cabeça e deu a Phillipa um sorriso que


não chegou aos olhos. Em seguida, se levantou e seguiu
para o local combinado.

Phillipa sorriu ao ver a amiga se afastar para um dos


quartos, tinha visto ambos se beijarem antes de tudo dar
errado. E o que viu no olhar do Marquês, não era apenas
paixão, ia muito mais além. E, ao ver a forma como Copas
estava, a fez pensar que ela também gostava dele.

Eles tinham lhe ajudado a conquistar Henry, estava apenas


retribuindo o favor.

Gabriel sentia a adrenalina correr nas suas veias. Tinha


pedido uma luta com Michael, o melhor lutador do Rogue's.
Não pretendia ganhar, apenas não queria uma briga fácil. E
em Michael, ele poderia bater à vontade, sem temer um
nocaute rápido.

Quando a luta começou, ele se permitiu extravasar tudo que


estava dentro de si. A luta não seria fácil e ele contava com
isso.

Michael não pegou leve, mas o Marquês estava furioso e


também era bom de briga. Isso foi suficiente para estender
a luta por mais tempo que o normal.

Os homens que acompanhavam estavam eufóricos, era


difícil dizer quem ganharia, pois, ora era o Marquês que
levava vantagem, ora era o Michael.

Em meio a luta, Gabriel recebeu um chute na lateral do


joelho e foi ao chão. Nesse
momento, Michael aproveitou para aplicar uma chave de
braço no pescoço do Marquês, que não viu alternativa a não
ser se render, dando fim à luta.

Foi levado para uma das salas para ser atendido. Por causa
da proibição de acertar o rosto, ele não tinha hematomas na
face, mas em compensação, seu joelho doía como o inferno,
talvez ficasse sem andar por alguns dias.

Foi levado para uma das salas da Luxúria, onde poderia


receber cuidados. O deixaram em uma cama e saíram, logo
em seguida.

Ele suspirou e se deitou na cama. Agora que a raiva tinha


ido embora, as dúvidas lhe assolaram.

Por que ela não tinha lhe dito? Como ela pudera enganá-lo
daquele jeito? Se ela tinha planejado aquilo, qual era o
motivo? O que ela ganharia ao enganá-lo?

— Winchester? — Clara chamou, saindo do lado de uma


cortina e revelando-se ao Marquês.

Ele sequer tinha percebido a presença dela ali.

— O que você faz aqui? — ele perguntou, sentindo a raiva o


tomar novamente. ― Saia.

Copas caminhou calmamente em direção à porta e a


trancou. Então, retirou a máscara e se aproximou da cama.

— Não. Não vou sair. — A mulher cruzou os braços na frente


do corpo e ergueu o queixo. — Não, sem antes conversar.
Porque você não tem motivos para ficar com raiva de mim
e, mesmo assim, está.
— Eu não tenho motivos? — Ele se apoiou nos braços e
semicerrou os olhos. — Ser enganado não é motivo
suficiente para você?

— Ser chamada de comum, receber a indiferença de seu


noivo e ser traída são motivos maiores, não acha? — a
Dama replicou, não se deixando abater pela fúria dele.

— Não se trai alguém com ela mesma.

— Você não sabia que Copas e eu éramos a mesma pessoa.


Então, me traiu sim — ela apontou. — Você ia terminar o
noivado comigo para ficar com ela.

— Eu fui sincero com a senhorita, ao lhe contar sobre


minhas intenções. E como me retribuiu? Me escondeu a
verdade sobre quem era — Gabriel devolveu. — Você me
enganou.

— Você não me queria — a mulher se defendeu. — Você


deixou bem evidente isso para Copas e para Clara, quando
disse que teria uma amante. Eu não pude lhe contar,
porque sabia que independente do momento, sua reação
seria essa.

— Isso a divertia, não é? Você ria de mim por dentro — o


Marquês a acusou.

Clara deu um passo para trás com a acusação.

— Você acha mesmo que saber que eu não o atraía era


motivo de riso? Que não poder contar isso ao senhor me
divertia? — Clara franziu o cenho, ao perceber que ele
realmente achava aquilo. — Eu queria socá-lo toda vez que
flertava com Copas. E ficava furiosa toda vez que
encontrava defeitos em mim, para justificar seu
desinteresse pelo casamento.
— Eu não tenho culpa por quem me apaixonei. — O
Marquês se sentou na cama e cruzou os braços.

— Não o culpo por isso, mas como pode ter se apaixonado


por ela e, ao mesmo tempo, ter sentimentos tão frios a meu
respeito, quando ela e eu somos a mesma pessoa?

— Eu não tinha sentimentos frios a seu respeito. Eu a


considerava minha amiga.

— Então, por que iria terminar tudo para ficar com ela?
Admita, você nunca gostou da ideia de se casar comigo.

— Admito sim. Eu odiava a ideia de casamento. E sempre


lhe fui sincero sobre tudo. E

ainda assim, você não me contou. E pela sua relutância em


retirar a máscara, nem iria. Estou errado?

— Não. Eu não queria que soubesse.

— Porque queria continuar me enganando — o Marquês


concluiu. ― Gostava de me enganar.

— Não era isso, eu simplesmente não queria que me


olhasse com ódio, como olha agora.

Eu sabia que não ia entender e que iria me odiar.

O Marquês ficou em silêncio e Clara suspirou, cansada. Que


confusão tinha se metido...

— Diga-me, o que ganhava me enganando? — o Marquês


perguntou, a olhando fixamente.

— Eu não queria lhe enganar. Apenas não costumo revelar o


meu segredo a ninguém.
Apenas Henry, Phillipa e alguns dos que trabalham aqui,
sabem minha verdadeira identidade e todos são de
confiança.

— Então, quer dizer que eu não sou de confiança? — o


Marquês, perguntou semicerrando os olhos.

Clara levou os dedos em pinça entre os olhos e suspirou,


tentando se recompor antes que explodisse de raiva
daquele homem.

― Se coloque no meu lugar, Winchester, eu sou uma dama


da sociedade, que trabalha em um clube de cavalheiros,
cuja regra é nunca revelar quem é. Faz dois anos que
trabalho assim, me preocupando em manter meu trabalho
em sigilo, pois tenho uma reputação a zelar. Se eu me
revelasse a você, sendo que mal o conhecia, que garantias
eu teria que não iria me expor? Eu não sabia que tinha se
apaixonado por Copas e, quando fui ver, já era impossível
lhe contar sem invocar o seu ódio.

— Eu jamais teria lhe exposto.

— Eu não tinha essa certeza, o senhor me evitou durante


um mês, quando voltou, eu o odiava pela forma como me
tratou e, então, o senhor mudou, mas eu ainda não confiava
em você.

E quando finalmente comecei a confiar, me contou que


estava apaixonado por Copas e que a teria como amante.
Me diga em que momento eu poderia lhe contar?

— Se quisesse, teria encontrado uma forma de não me


enganar.

― Eu não queria, porque jamais poderia me entender. O


senhor nunca se importou com Clara, comigo, só se
importava com Copas.

Clara estava furiosa e estava perdendo o controle de suas


emoções. Se o Marquês falasse qualquer coisa, tinha
certeza de que explodiria.

— Isso não é verda...

E, então, ela explodiu, de raiva e indignação.

— Não ouse mentir! — ela o cortou, vociferando com o dedo


em riste. — Seja sincero consigo mesmo. Porque essa é
verdade. Se o senhor tivesse se importado comigo, de
verdade, não teria ficado um mês sem me visitar, não teria
flertado com Copas e, nem mesmo, a beijaria. Se tivesse
mostrado que se importava comigo, eu teria lhe contado há
muito tempo, e isso não importaria tanto para o senhor, da
mesma forma que não importa para nenhum Rogue que
sabe a minha identidade. Então, Lorde Winchester, se quer
alguém para culpar, culpe a si mesmo.

Clara recolocou a máscara e seguiu para a porta, a


destrancou e saiu do quarto, pisando duro. Estava furiosa
demais para ficar ali.

Enquanto isso, o Marquês a olhava intrigado e, assim que a


porta fechou, ele se jogou na cama, frustrado e com uma
única certeza: s eu casamento seria um verdadeiro inferno.

CAPÍTULO 13 ― PROPOSTA
Três dias depois...

O dia do casamento de Phillipa tinha chegado e, tanto o


Marquês como Lady Clara, haviam sido convidados. Seria a
primeira vez que se veriam, desde a briga que tiveram no
clube.

Clara tinha passado esses três dias ajudando Phillipa a


organizar os últimos preparativos para o casamento, junto
com a nova Duquesa, Lady Sophia.

A Duquesa-viúva estava trancada em seus aposentos, se


recusando a participar da organização do casamento de sua
filha. E isso tinha causado certo mal-estar na família.

As criadas terminaram de vestir a noiva com o vestido de


casamento. Era lindo. Um azul claríssimo que destacava os
olhos de sua amiga e ainda realçavam o dourado de seus
cabelos.

Ela estava deslumbrante, mas era visível no semblante de


Phillipa que a felicidade dela não era completa. Não por
causa do noivo, pois ambos estavam perdidamente
apaixonados um pelo outro, e sim porque a mãe da noiva se
recusava a estar presente no casamento e dar-lhes sua
benção.

— Então, sua mãe não vai mesmo ao seu casamento? —


Clara perguntou, olhando pela janela do quarto de Phillipa.

— Não, mas eu já estava ciente disso — Phillipa respondeu,


tentando fingir que não se importava. — Ela nem me
considera mais sua filha, então, já esperava.

— Eu espero que ela repense essa decisão, nos casamos


apenas uma vez. É um dos momentos mais importantes
para nós, ou, pelo menos, deveria ser.
— Vamos mudar de assunto. Gabriel ainda não lhe
escreveu? — Phillipa perguntou.

— Não, e acredito que nem vá. Nosso casamento só será


daqui a três meses, ele não está com nenhuma pressa. ―
Clara suspirou ― Ele me odeia.

— Ele não a odeia. — Phillipa pegou nas mãos da amiga. —


Eu vi jeito que ele olhava para você.

— Que ele olhava para Copas, você quer dizer. — Clara se


afastou do toque da amiga.

— Ele a desejava, não a mim. Eu nunca devia ter deixado


que ele descobrisse quem eu era. Fui tão idiota. Comecei a
gostar dele como Copas e como Clara também. Ele era tão
gentil e carinhoso. E sabe o mais ridículo de tudo? Eu sentia
ciúme de mim mesma.

— Se acalme, minha amiga. Logo as coisas entre vocês


estarão resolvidas.

— Eu não tenho tanta certeza disso. Mas espero que sim.


Bom, eu vou dar uma volta pelo jardim, se importa?

— Não, claro que não. Mas cuidado para não se perder no


labirinto.

— Pode deixar. Eu logo retornarei.

Clara deixou o aposento no mesmo momento que a Lady


Sophia, a esposa do Duque, estava se direcionando ao
quarto de Phillipa.

Sophia lhe sorriu amigável.

— Como ela está?


— Triste por não contar com a mãe — Clara confidenciou.

Sophia tinha se tornado uma boa amiga para Clara. Nesses


três dias que passou ali na companhia de Phillipa, fez com
que as três ladies criassem um laço de amizade único e
Copas sentia que seriam boas amigas. Sophia sempre
estava junto de Phillipa e Clara, e conversava

animadamente com elas, muitas vezes lhes confidenciando


sobre suas aventuras em alto mar.

— Vou conversar com ela. Ela pode não ter a Duquesa-


viúva, mas tem a mim. — Sophia abriu a porta e, então,
olhou para Clara, com as bochechas em chamas — Que
Deus me ajude.

Clara riu, sabia exatamente que tipo de ajuda a Duquesa


precisaria. Apesar de que tinha quase certeza de que
Phillipa não precisaria daquela conversa.

Clara seguiu até os jardins, como ficaria à vista de quem


estivesse na casa, dispensou a acompanhante.

O inverno se aproximava e as árvores se preparavam para a


estação. O jardim estava colorido de vermelho e laranja,
resultado da cama de folhas que ornavam o chão.

Ela caminhou um pouco, tentando manter a mente livre de


problemas, mais especificamente, tentando não pensar no
Marquês. Entretanto, quanto mais tentava exorcizá-lo de
sua mente, mais ele insistia em se fazer presente.

E a expectativa de que iria encontrá-lo naquele mesmo dia


a deixava nervosa e um tanto desconfortável. Será que
acabariam brigando novamente? Ou ele fingiria que nada
aconteceu, para evitar que os outros convidados
começassem a fofocar sobre eles? Ele a tiraria para dançar?
Ou a evitaria durante todo o casamento?

Ela olhou para os arbustos, completamente despidos de


suas folhas. Eles pareciam tão frágeis e sem esperança,
mas sabia que seriam fortes para sobreviver ao inverno.
Esperava que ela também fosse forte para isso.

Ficou mais alguns minutos ali, observando a natureza e,


então, decidiu voltar para casa.

Entretanto, ao virar-se para seguir o seu destino, se deparou


com a causa de suas aflições.

Ficaram olhando-se silenciosamente, analisando-se e


criando coragem para ver quem falaria primeiro.

— Milady. ― Winchester fez uma mesura educada e, em


seguida explicou: — Lady Sophia disse-me que a
encontraria aqui. Eu passei esses dias pensando no que
aconteceu entre nós e cheguei à conclusão de que não
posso me casar com a senhorita, nessas circunstâncias. Não
posso me casar com alguém que eu não confie e nem você
deve se casar com um homem que não a tenha respeitado.
Acredito que nós dois agimos mal e isso nos trouxe até este
momento e, infelizmente, não temos outra escolha a não
ser casar. Conversei com o rei e ele disse que não retirará
sua ordem. Portanto, por mais que não queiramos isso, não
precisaremos fazer desse casamento um inferno. Muitos se
casaram por conveniência e são felizes. Não precisamos de
amor para sermos bons parceiros matrimonias. Então, se a
senhorita estiver de acordo, eu gostaria de deixar esses
meses que se passaram para trás e tentar novamente,
começando do início, da forma que deve ser. Irei cortejá-la
como um noivo deve fazer, e confidenciaremos segredos.
Podemos até não casar por amor, mas podemos ser amigos,
nos respeitarmos e saber que poderemos sempre contar um
com o outro. Sem segredos, mentiras e sem traições.
Estávamos criando uma boa amizade, não vejo por que não
voltar a tê-la. Então, milady, o que me diz? Aceitaria
recomeçar comigo? Dar uma nova chance a nosso noivado?

Clara escutou cada palavra que ele disse. Mas sua mente se
focou na frase: "Conversei com o rei". Isso queria dizer que
ele tentou realmente desfazer aquele casamento.

Ela sabia que ele tentaria fazer aquilo. Era fácil imaginá-lo
diante do rei, tentando desfazer o arranjo. Mas seus
instintos diziam que tinha algo mais naquilo.

— O que o rei disse? — Foi a primeira pergunta de Clara.

O Marquês ficou desconfortável. Ele não esperava que ela


perguntasse por sua conversa com o rei e, sim, que ficasse
feliz por ele ter decidido recomeçar.

— Não importa, apenas que o casamento deve acontecer —


ele respondeu, desviando os olhos.

Clara observou bem o Marquês, seus anos como Copas


tinham lhe ensinado a descobrir quando alguém blefava e,
naquele momento, ela sentia que o Marquês não lhe era
completamente sincero.

— O que está escondendo de mim, Winchester? Você me


pede para recomeçar sem mentiras e segredos, mas não
parece disposto a isso — ela apontou, olhando fixamente
para o homem à sua frente.

— Tem razão, me desculpe. — Ele pareceu realmente


envergonhado por ter sido pego na sua omissão. — Eu pedi
uma audiência com o rei no dia seguinte à nossa briga. Ele
me disse que estava satisfeito com o arranjo e que se minha
noiva, no caso você, desistisse de se casar comigo, eu seria
eLivros como um traidor.

— Por isso, veio a mim tentando recomeçar. — Clara não


estava feliz com aquilo e isso transpareceu no seu tom de
voz, assim como a decepção.

— Eu sei que cometi alguns erros, não devia ter deixado


meus sentimentos por Copas chegar tão longe e, muito
menos, lhe tratado com tanta indiferença.

O Marquês deu um passo para ela e lhe segurou as mãos.

— Eu agora estou nas suas mãos, Lady Clara. Se não quiser


se casar comigo, não tem problemas, eu lhe devolvo
Rostwell e você pode ir ao rei cancelar o compromisso. Seu
pai não irá se opor quando souber que Rostwell é
novamente dele.

— E o senhor será eLivros... — ela apontou o resultado


dessa escolha.

— Sim. Minha família perderá o título, que será dado para


alguém da escolha do rei. Mas você será livre desse
casamento e poderá se casar com alguém de seu agrado.

Clara pensou, ele estava em suas mãos, pois cabia a ela


decidir o que seria feito dele.

Queria poder não se importar com ele, mas, ao mesmo,


tempo sabia que não poderia. A ideia de recomeçar tudo era
tentadora.

— E se eu aceitar me casar? — Clara disse cada palavra


devagar e sentiu seu coração se aquecer, sabia que era
aquilo que seu coração queria.
― Eu prometeria fazer o possível para que esse casamento
dê certo. Serei um noivo exemplar, lhe darei flores, a levarei
para passear e não lhe serei infiel. ― O Marquês se
empolgou com a possibilidade de Clara não o odiar e, assim,
tentar desfazer o casamento por vingança. ― Faremos um
casamento com direito tudo que sempre sonhou. Será
memorável. Os jornais passarão semanas comentando
sobre ele. A partir de agora, apenas o melhor para minha
noiva. Conversarei com seu pai para não poupar despesas,
quero fazê-la se sentir única neste dia.

Clara percebeu que não poderia permitir um casamento


enorme e dispendioso. Aquilo acabaria por afundar sua
família em dívidas, já não bastava o dote, que sua família
teria que dar ao Marquês pelo casamento, e nem mesmo
uma vida trabalhando como Copas, seria capaz de restituir
tantos gastos. Não poderia permitir que seu casamento
fosse a ruína de sua família. E o que faria depois de casada?
Precisava garantir que iria continuar como Copas, e aquele
era o melhor momento para uma barganha, ele precisava
dela para não ser considerado um traidor, e ela não poderia
jogar fora todo trabalho que teve para manter o nome da
família intacto.

― Eu me caso com o senhor com algumas condições ― ela


expôs.

— Diga seus termos, milady. ― O Marquês semicerrou os


olhos diante daquilo. O que ela pediria?

― Eu sei que o senhor é um homem de posses e não precisa


do meu dinheiro, então, quero que o senhor abra mão do
meu dote.

Aquilo era estranho, mas Winchester concordou, afinal,


Clara estava certa, ele não precisaria do dote dela.
― Tudo bem ― ele concordou e ela continuou.

— Quero que permita que eu continue trabalhando no


Rogue’s, como Copas.

— O quê? — ele perguntou, incrédulo. — Não posso permitir


que minha esposa continue a trabalhar. Isso está fora de
questão.

— Eu não posso abandonar o Rogue's. ― Ela foi firme. ― Se


o senhor não concordar com isso, terei que recusá-lo como
meu noivo.

― Tudo bem. Eu concordo em permitir que seja Copas, se


assim desejar.

― E tem mais uma coisa. ― Clara respirou fundo. Aquilo


seria mais escandaloso que pedir para continuar como
Copas.

― Diga. ― O Marquês ergueu uma sobrancelha.

― Quero que nos casemos imediatamente em Gretna


Green. Apenas nós dois e a testemunha, não quero
nenhuma celebração de casamento, nenhuma festa
grandiosa.

― Está grávida? ― Ele a olhou, desconfiado

― O quê? Não! Por quê? ― Clara ficou confusa.

― Que outro motivo a levaria a querer se casar


imediatamente comigo, se não fosse por carregar o filho de
outro homem?

― Eu não estou grávida. ― Ela o olhou, furiosa, e em


seguida, ficou vermelha. ― Eu ainda sou intocada, nunca
estive com nenhum outro homem, além de você, nem
mesmo beijei outro homem.

O Marquês a observou por um momento. Ou ela estava


falando a verdade, ou era uma ótima atriz. Descobriria a
verdade na noite de núpcias. De qualquer forma, não tinha
escolha nenhuma, a não ser desposá-la.

― Vai me contar o motivo por querer se casar tão


rapidamente, então?

― Eu quero me casar logo. ― Ela decidiu contar uma meia


verdade. ― Não vejo por que esperarmos tanto para isso. E
eu não quero festa.

Winchester percebeu que ela não iria contar toda a verdade


naquele momento e não podia correr o risco de irritá-la e,
com isso, ela desistir do casamento. Então, decidiu deixar
para descobrir a verdade depois.

― Tudo bem, eu aceito os seus termos.

― Ótimo. Eu me casarei com o senhor. ― Ela sorriu,


parecendo aliviada. Continuaria a cuidar de sua família e
naquele momento era só o que importava para ela.

O Marquês a olhava, desconfiado. Mas estava disposto a


ganhar a confiança dela e descobrir os segredos da mulher
que desposaria e, para isso, faria tudo da maneira correta,
ou quase.

Então, Gabriel pegou a mão de Clara, depositou um beijo no


dorso e abriu um de seus sorrisos mais deslumbrantes.
Depois se ajoelhou e, ali mesmo, a pediu em casamento.
CAPÍTULO 14 ― GRETNA GREEN

Uma semana depois...

Estava tudo pronto para a fuga que resultaria no casamento


em Gretna Green. Winchester estava na carruagem do lado
de fora da mansão Catterfield, esperando Clara. A fuga seria
fácil, já que toda noite a moça saia desacompanhada de
casa. Aquilo fez o Marquês pensar em como faria quando se
casassem, não permitiria que sua esposa corresse nenhum
risco, precisava encontrar um meio de dissuadi-la a ser
Copas, mas para isso precisaria que ela lhe contasse toda a
verdade. E

esperava que aquela noite fosse o momento perfeito para


tais confidências.

Assim que ela entrou, a carruagem começou a andar.

― Tem certeza de que é isso que quer? ― ele perguntou,


ainda tentando entender o motivo para tanta pressa.

― Sim. Tenho certeza.

― Não vai mesmo me contar o motivo disso tudo? O


casamento apressado, continuar como Copas.

— Eu não posso. — Clara mordeu os lábios, indecisa, sobre


contar, ou não. Tinha passado a semana pensando naquilo,
ainda não tinha certeza se devia. Queria, mas temia que ele
não a entendesse novamente.
— Você vai ser minha esposa, pelo amor de Deus! Não
comece com segredos. Eu já concordei com seus termos,
mas não espere que deixe como está. Precisamos ser
sinceros um com o outro, Clara, eu lhe contei tudo, está na
hora de você fazer o mesmo. Não quero mais segredos.

Da última vez, não fez bem para nenhum de nós.

Clara suspirou. Ele tinha razão. Não tinha por que esconder
tudo aquilo dele, em poucos dias ele seria seu marido, não
tinha nenhuma escolha quanto aquele fato. Se contasse a
verdade, ele poderia ser um aliado.

— Prometa que vai tentar, ao menos, entender o meu lado,


desta vez — ela pediu. ― Não quero brigar de novo.

― Eu prometo. Pode confiar em mim.

― É uma longa história. ― Suspirou.

— Que bom que temos tempo. A viagem demorará e eu


adoro histórias longas. — O

Marquês cruzou os braços e se recostou na carruagem,


esperando-a começar. ― Então, qual o motivo de tudo isso?

― Minha família estava planejando uma festa enorme, cheia


de pompas e gastos desnecessários e se eu permitisse que
a festa se realizasse, eles ficariam completamente
endividados.

― Por isso, o casamento apressado e o dote.

― Exatamente.

― E onde Copas entra nisso? ― O Marquês incentivou sua


noiva a continuar. Sentia que havia muito mais que apenas
aquilo. ― Conte-me tudo, Clara.

— Como o senhor já deve ter percebido, meu pai tem uma


certa inclinação por jogos de cartas. Quando eu era
pequena e ele só tinha a mim de filha, costumava jogar
comigo antes do jantar e me ensinou tudo que sabia e todos
os jogos que conhecia. Mas diferente dele, eu

conseguia memorizar todas as cartas que já tinham sido


jogadas. E contar os números era uma tarefa simples. Aos
doze anos, já conseguia ganhar dele nas cartas. Mas, então,
nasceram Cristine e Caroline, gêmeas, e depois,
Christopher. E eu comecei a ser educada para ser uma
dama da sociedade. Já não jogava mais com meu pai e ele
começou a buscar parceiros de cartas no Rogue's, por
influência dos amigos. Uma noite, quando eu tinha
dezesseis anos, ouvi o tesoureiro de meu pai conversar com
ele sobre as dívidas. Meu pai estava falido. Você pode
imaginar isso?

O Duque de Catterfield falido por causa da jogatina. — Clara


revivia aquelas lembranças. — Ele tinha apostado tudo que
podia, joias, terras e dinheiro, tudo que não estava atrelado
ao título. E

havia perdido. Meu pai havia apenas sorrido e dado de


ombros, como se aquilo não fosse nada de mais.

“Eu me desesperei, se ele havia realmente perdido tudo,


então, eu não teria nenhum dote, assim como minhas irmãs
mais novas, e meu irmão iria herdar apenas as dívidas de
jogo. Eu não podia permitir que ele fizesse aquilo. Se tivesse
continuado jogando apenas comigo, não teria perdido nada.
E foi nesse momento que eu tive a ideia de jogar contra ele
e ganhar tudo o que ele ainda pudesse perder. E quem
sabe, eu conseguisse ganhar de outros jogadores também.
Mas para isso, eu teria que ir ao lugar onde ele jogava: o
clube de cavalheiros.

Naquela noite, peguei todo dinheiro que eu tinha no meu


cofre e o segui, escondida. Vi quando ele falou a senha e a
repeti na portaria. Me mandaram entrar pela porta dos
fundos, que era a entrada das mulheres. Eu entrei no clube
pela porta traseira e lá fui informada que teria que me
trocar. Quando eu disse que ia jogar, me entregaram um
vestido preto e uma máscara.

Eu estava muito nervosa, mas sabia que teria que fazer


aquilo, minha família precisaria de mim para proteger o que
nos pertencia, pois se ele perdesse para mim, não estaria
de verdade perdendo nada. Tudo retornaria aos cofres dele.

O vi em uma mesa, jogando com outros homens. Ele estava


bebendo, enquanto jogava.

Observei por um tempo todos os homens jogando e, então,


quando começaram uma nova rodada, eu coloquei umas
moedas na mesa. Os homens olharam para mim,
debochados. E começaram a se recusar a jogar contra mim,
por eu ser mulher. Eu os desafiei, perguntando se estavam
com medo de perder, por sorte, eu tinha me lembrado de
modificar a voz, para não ser reconhecida pelo meu pai. E,
assim, naquela noite, eu joguei contra meu pai e todos
aqueles homens. E, para a minha felicidade, comecei a
ganhar um jogo atrás do outro.

Os homens estavam se sentindo ofendidos por terem


perdido, e logo começaram a me acusar de roubo. E me
chamar de vários impropérios. Entretanto, antes que
pudessem fazer algo contra mim, os homens do Rogue's me
escoltaram para a sala do Lorde. Ele tinha observado meu
jogo naquela noite. E estava bastante interessado em como
eu tinha conseguido ganhar de seus melhores jogadores nas
cartas.

Eu lhe falei que havia sido sorte, mas ele sabia que era uma
questão de probabilidade.

Ele era bom com números. E, depois de me fazer contar a


verdade sobre o porquê eu estava ali, ele me ofereceu um
emprego para que eu pudesse ficar de olho no meu pai.
Claro que eu teria que conseguir ganhar dos outros
jogadores, para que devolvesse ao clube o que eu ganhasse
do meu pai. Assim, tanto eu quanto o clube ganharíamos. E,
então, me chamou de Dama de Copas e, para que eu não
fosse reconhecida, mandou fazer a peruca ruiva. Ele disse
que eu era uma dama e que seria o coração do clube a
partir daquele momento. E assim foi. Me tornei uma das
principais atrações do Rogue’s.

Aos poucos, comecei a ganhar fama dentro do clube e


alguns homens faziam questão de jogar comigo. Eu era boa
em muitos jogos de cartas e nos que eu não era tão boa,
logo me tornava, pois bastava que me ensinassem uma
única vez o segredo do jogo.

Assim que comecei a recuperar o dinheiro de meu pai, eu


contatei o tesoureiro dele, precisaria que aquele dinheiro
fosse para o cofre. E, para isso, teria que ver se o tesoureiro
era de confiança.

Para a minha sorte, o Sr. Forks vinha de uma família


bastante devotada a nossa. E ele prontamente aceitou
ajudar a manter o dinheiro nos cofres e pagar as dívidas,
sem que meu pai desconfiasse de onde estava surgindo o
dinheiro.

Às vezes, eu pedia para um dos outros rapazes do clube


perder parte do meu dinheiro para meu pai, quando o clube
estava prestes a fechar, assim, ele não teria tempo de
perder para mais ninguém naquela noite. E sempre que eu
fazia isso, informava ao tesoureiro para que ele aparecesse
e cobrasse alguma dívida para que meu pai fosse obrigado
a lhe dar o que tinha ganhado no jogo, mesmo que essa
dívida já tivesse sido paga com o meu dinheiro.

Dessa forma, eu consegui tirar minha família da ruína e


tenho tentado mantê-la longe desde então. Espero que o
senhor compreenda que eu não posso parar agora, ele
poderá perder tudo o que eu lutei para conseguir manter.
Meus irmãos ainda dependem de mim e minha mãe
também. Se eu parar de ser Copas agora, minha família
passará dificuldades. Enquanto meu irmão não se tornar o
novo Duque, eu precisarei ser Copas e Christopher só tem
seis anos de idade.”

Clara voltou ao presente. Fitou o Marquês e percebeu que


ele não tinha dito uma palavra desde que ela começou a
falar. Ele a olhava com intensidade, mas ela não conseguia
decifrar o que via naqueles olhos.

— Eu não posso permitir que continue sendo Copas.

— Você não tem escolha, me prometeu que permitiria.


Concordou com isso, antes de nós casarmos. — Clara
semicerrou os olhos, tinha contado toda a verdade a ele e,
ainda assim, ele não a compreendia.

— Me deixe terminar, por favor... — O Marquês a esperou se


voltar a olhar para ele. —

Tudo o que você fez por sua família é incrível. Você é uma
mulher forte, Clara, mas não precisa mais fazer isso
sozinha. Podemos cuidar de sua família juntos, sem que
você precise ser Copas por duas décadas.
— Não, não posso abandonar Copas. Meu pai continuará
perdendo dinheiro e logo estará novamente endividado. Eu
pensei que compreenderia.

— E eu compreendo. E a admiro e a respeito por tudo que


fez. Mas não posso permitir que perca parte de sua vida
consertando os erros de seu pai. Seu pai tem que arcar com
as consequências das próprias escolhas.

— Eu não posso, Winchester. — Clara sentia seu coração


apertado. Não poderia ser a causa da ruína de sua família.
— Você prometeu me deixar ser Copas. Está quebrando sua
promessa? — ela perguntou, acusatória, se ele realmente
quisesse, poderia proibi-la de ser Copas, afinal, seria seu
marido, mas se o fizesse, ela nunca o perdoaria.

— Não, não a proibirei, eu cumpro minhas promessas, mas


me responda: como irá para o Rogue's quando estiver
carregando um filho meu? Como cuidará do nosso
Marquesado, se viver em Londres? Eu preciso que fique
comigo, Clara. Como minha esposa, mãe de meus filhos, e
minha Marquesa. Mas é sua escolha, eu prometi que a
deixaria ser Copas, mas você não precisa ser, se não quiser.

Clara sabia que ele tinha razão, estava no direito dele exigir
aquilo dela, mas tudo que ela tinha feito pela família teria
sido em vão se não concluísse sua tarefa.

— Eu não posso. Eu tenho que cuidar da minha família, eles


são tudo que tenho. — Clara baixou os olhos.

— Não é verdade, você tem a mim agora. — O Marquês


segurou a mão dela. O que a

surpreendeu. Ele não tinha tentado nenhum movimento


ousado com ela, desde que descobrira a verdade sobre
Copas. E, por isso, quando ele falou tão docemente, a
tocando e olhando-a com tanta intensidade, ela sentiu o
coração acelerar. — Me deixe cuidar de você. Me deixe
carregar esse fardo com você. Me deixe cuidar de sua
família, para que você possa cuidar da nossa.

— Eu não sei se devo... Não é sua responsabilidade.

— E, tampouco, é sua. — O Marquês a tocou no rosto com


carinho, fazendo-a suspirar com a suavidade do toque. —
Me deixe tentar, me dê uma chance de lhe mostrar que eu
posso cuidar de você.

Clara olhou dentro dos olhos do Marquês. Sentia que ele a


hipnotizava, não conseguia desviar o olhar. O toque dele era
quente e parecia tão certo. Queria poder dizer sim, mas e se
ele não conseguisse? Seria sua família que pagaria o preço.

— Eu preciso pensar. — Foi a única resposta que ela


conseguiu dizer naquele momento.

— Tudo bem, leve o tempo que precisar. Enquanto pensa, eu


tentarei convencê-la do meu jeito a me deixar cuidar de
você.

Clara mordeu o lábio, era tão tentadora a forma que ele a


olhava. Ele nunca tinha olhado para ela daquele jeito. Só
para Copas. Ela queria tanto que ele a beijasse naquele
momento.

Precisava sentir que ele estava dizendo aquilo para Clara,


que era para Clara que ele olhava tão intensamente.

― Lorde Winchester... ― O nome dele nos lábios da moça


não passou de um sussurro.

― Sim? ― ele respondeu, no mesmo tom.


― Por favor, beije-me.

Ela não precisou pedir duas vezes, Winchester diminuiu


completamente a distância entre eles e, com suavidade,
beijou seus lábios.

CAPÍTULO 15 ― SEGREDOS

Escutar a sua noiva contar como se tornou a mulher que ele


admirava, só o fez entender por que tinha se apaixonado
por Copas. Tinha sido tão idiota. Como não reconheceu
aquele olhar de tempestade? Mesmo que a máscara
cobrisse seu rosto, a voz fosse modificada e uma peruca
cobrisse os cabelos, aqueles olhos deveriam ter sido
facilmente reconhecidos.

Como ele pôde achar aquela mulher, sua noiva, simples,


comum? Como pôde não se sentir atraído por ela?

A única resposta que tinha era a que Phillipa lhe deu no dia
casamento dela com Henry.

— Soube que pediu Clara em casamento — Phillipa lhe


disse, enquanto dançavam na festa do casamento dela.

— Sim, decidi aceitar meu destino. Apesar de nunca ter tido


outra escolha, além dessa.

Não era exatamente o que eu queria, mas nem sempre


fazemos o que queremos.
— Ouça, Winchester, você me ajudou quando precisei abrir
os olhos de Henry, então, permita-me lhe devolver o favor.
Você odiava tanto esse casamento, que passou a odiar tudo
que era relacionado a ele. E, por isso, se apaixonou por
Copas e não queria se casar com Clara. E não conseguiu ver
que a mulher por quem estava apaixonado era sua noiva,
mas agora que sabe, você precisa procurar ver seu
casamento de outra forma. Pare de tentar fugir de seu
destino e o aceite, o ame e verá a diferença. Além do mai,s
o senhor deve saber que tem um tesouro nas mãos, Clara é
uma mulher magnífica, você não sabe a sorte que tem por
tê-la. Pode estar se casando por obrigação, mas não é
obrigado a usar isso como base do seu casamento. Conheça
sua noiva a fundo, conquiste-a e terá uma mulher leal e
valiosa ao seu lado. Mas, acima de tudo, seja um bom
marido para ela. Ela tem sido responsável pela família por
muito tempo, está mais do que na hora de alguém cuidar
dela. E eu sei que você pode fazer isso.

— Responsável pela família? — O Marquês não entendia


como ela era responsável se, ao estar no clube, ela
arriscava a reputação de sua família.

— Ela explicará quando estiver pronta.

Winchester tinha tentado imaginar o que tinha levado Clara


a se vestir de Dama de Copas, e nada do que tinha pensado
havia chegado perto da verdade que sua futura esposa
estava lhe contando.

Phillipa tinha razão, quanto a ela ter sido responsável pela


família. Ela não tinha ido para o clube procurando diversão,
não tinha ido em um ato de rebeldia. Ela tinha ido na
esperança de salvar sua família da ruína, de consertar os
erros de seu pai.
Enquanto ela contava sua história, o Marquês só conseguia
olhá-la. Era como se a visse pela primeira vez. Durante o
noivado, tinha tentado ser gentil e cavalheiro, como ela
merecia, mas foi naquele momento, que percebeu que o
que sentia por Clara não era apenas amizade. Ele era
apaixonado por Copas, mas nunca tinha conversado com
Copas, como fazia durante o dia com Clara, por Copas tudo
que sentia era físico, desejo. Por Clara, era muito mais
profundo, ele se importava de verdade com ela, queria vê-la
bem. Vê-la feliz.

A esperança de que talvez pudessem ter um casamento


baseado em mais do que um arranjo, o aqueceu por dentro.
Algumas vezes, ele a flagrou observando-o, e havia nos
olhos da sua noiva um brilho diferente e um sorriso singelo
em seus lábios. Sentia que ela também se importava com
ele.

Ao ver sua noiva tão aflita, por causa de sua família, o


Marquês sentiu o desejo de protegê-la deles, dessa
responsabilidade que não era dela. Que tipo de homem não
se preocupava em perder tudo em um jogo? O Duque era
quem devia ser o responsável pela família, não ela.

Clara deveria ser responsável apenas por si mesma e agora,


por ele também. Mas não da forma que ela era responsável
pela família e, sim, como sua Marquesa e sua esposa. Ele
queria que ela se preocupasse apenas com ele, que
cuidasse dele, que se importasse com ele. Queria-a
completamente dele.
Não se importava se aquilo era ciúme da família dela.
Queria tirar aquela aflição do olhar dela. Queria desfrutar de
sua noiva ― em breve, esposa ― sem que ela se
preocupasse que seu pai estivesse perdendo tudo no
Rogue's. E, por isso, decidiu que teria que convencê-la a não
ser mais Copas.

A convenceria a deixar que ele a ajudasse, e usaria tudo


que estivesse ao seu alcance para conseguir isso. Sabia que
não seria fácil, mas iria tentar. Ela era leal a sua família. Ele
percebia isso. Não os abandonaria, nem mesmo casada com
ele. Não os deixaria sofrer se pudesse evitar, nem que para
isso, passasse a vida consertando os erros de seu pai.

E, quando ela pediu para ser beijada, ele descobriu como a


convenceria a deixá-lo ajudar. Mas não estava preparado
para a intensidade de desejo que um simples beijo lhe
provocou. Winchester a beijou, e naquele beijo, sentiu o
desejo o tomar. Desejava Clara. Queria tomá-la, possuí-la,
mostrar que ela agora tinha a ele. Mas precisava se
controlar, era praticamente o primeiro beijo dela, não queria
assustá-la, fazendo outras coisas que a constrangesse, iria
com calma, deixaria que ela se sentisse à vontade, além do
mais, algumas coisas não deviam ser feitas em carruagens,
ou antes do casamento.

Já ia se afastar para encerrar o beijo, quando Clara envolveu


seus braços ao redor do pescoço dele. E naquele momento,
o Marquês decidiu que algumas coisas deviam sim ser feitas
na carruagem e já iam se casar mesmo, então, não teria
problema nenhum em aproveitar o que ela tão
generosamente lhe oferecia.

Clara sentiu seu corpo responder a um simples roçar de


lábios. Sabia que queria que ele a beijasse, uma, ou duas
vezes, se viu querendo beijá-lo, mas não imaginava que o
quisesse tanto.

Quando ele beijou Copas, havia sentido desejo, mas a raiva


havia sido maior, e na segunda vez, havia o medo. Dessa
vez, era apenas Clara e Winchester, nenhum medo, ou
raiva, apenas desejo.

E, por isso, seus braços o envolveram, não querendo que o


beijo terminasse tão cedo.

Mas ela não estava preparada para o que veio depois. Nem
passou pela sua cabeça que, ao impedir que o beijo tivesse
fim, o Marquês a puxaria para seu colo. Clara sentiu seu
corpo ser removido do banco, onde estava sentada, e
levado até o colo do Marquês. A posição indecente a fez
abrir os olhos, assustada e envergonhada. Já tinha visto
mais do que isso no clube, mas nada do que viu a preveniu
da vergonha que sentiria quando a cena fosse com ela.

O Marquês percebeu a surpresa de Clara e afastou o rosto,


sorrindo, e encerrando o beijo. Ela olhava para suas saias,
envergonhada. E ela estava tão... Linda. Aquela constatação
fez o Marquês tirar o sorriso do rosto. Como nunca tinha
percebido que seu cabelo era tão macio e brilhoso? E seus
lábios eram pequenos, mas perfeitos e rosados, seu nariz
delicado e perfeito para

seu rosto e seus olhos, seus enormes olhos de tempestade


que a deixavam incrivelmente bela.

Aquela mulher nunca seria comum. Sua irmã estava certa,


ela realmente parecia uma fada.

— Eu cometi um erro enorme, me perdoe. — O Marquês a


fez olhar para ele, tocando seu rosto com carinho. — Eu fui
o mais tolo dos homens, quando não quis ver o quão bela é
a minha noiva. E, por isso, eu peço o seu perdão. Agora eu
vejo que estive cego por muito tempo. Você é uma mulher
extraordinariamente linda...

O Marquês viu quando Clara o perscrutou com o olhar.


Estava desconfiada. Ele sorriu para ela e voltou a alisar seu
rosto, fazendo um caminho da bochecha à nuca e quando
sua mão envolveu a nuca de Clara, ele a puxou novamente,
voltando a beijá-la, dessa vez, com mais intensidade.

O Marquês passou a língua pelos lábios de Clara,


saboreando a maciez deles, e logo invadiu a boca de sua
noiva com a língua.

Céus, precisava senti-la suspirando — ele pensou, enquanto


a explorava com a língua.

Clara sentiu um arrepio percorrer todo seu corpo e instalar-


se em seu ventre. Uma sensação completamente nova
tomava o seu ser. Nunca tinha sentido nada parecido com
aquilo.

Ouviu um gemido e só então percebeu que vinha dela.

O Marquês segurava-a pela nuca com uma mão e, com a


outra, a comprimia contra si. O

desejo o tomava como nunca antes, seu corpo parecia


querer reivindicá-la para si. Possuí-la.

As mãos de Clara agarravam o casaco do Marquês, seus


dedos seguravam com força as lapelas, as amarrotando.
Sentiu que o Marquês endurecia embaixo de si e, sem
pensar, se remexeu para senti-lo melhor. Não sabia o
porquê tinha feito aquilo, mas era delicioso, então, repetiu
mais uma vez e depois mais outra. E quando achou que
pararia, percebeu que seu corpo já não lhe obedecia, ele
tinha vida própria e continuava naquela dança erótica, mas
estava tão bom, que ela não quis parar. Parecia tão certo,
estar ali, nos braços de seu noivo.

Clara estava se remexendo em seu colo. O Marquês sentia a


maciez do traseiro de sua noiva comprimir seu membro. E
maldito fosse, mas aquilo estava fazendo com que ele
perdesse o controle. Ele queria mais. Queria tocá-la. Queria
vê-la. Queria despi-la. O faria.

Direcionou as mãos para o laço que segurava a capa de


viagem que ela usava, quando a tirou, foi a vez do
espartilho, afrouxou os laços lhe permitindo puxá-lo para
baixo. Faltava apenas uma camada de roupa para ter a pele
dela na sua. Entretanto, essa camada havia sido vestida por
cima da cabeça, e o nó estava muito apertado.

O Marquês tentou desatar o nó, mas ele não soltava. A


impaciência o tomou e ele decidiu que não faria nenhum
mal rasgar. Depois daria outra peça à sua noiva.

Clara ouviu o som de um tecido rasgando, mas o beijo


estava tão delicioso que ela não se importou. O Marquês se
afastou de seus lábios, apenas para descer a boca por seu
pescoço, lhe causando sensações ainda mais intensas. A
mão dela lhe agarrou os cabelos. Não queria que ele
parasse. E então os lábios do Marquês desceram ainda
mais, beijando seus... Seios?

Clara olhou para baixo e viu o Marquês abocanhar seus


seios. Deveria afastá-lo, mas que sensação era aquela? O
que ele estava faz... Ela não conseguiu mais pensar, quando
ele mordeu de leve o bico de seu seio. E um gemido rouco
escapou de seus lábios, quando ela se contorceu na boca
dele.
O gemido de Clara fez o Marquês ficar ainda mais excitado.
Os seios dela eram pequenos, não passavam de um botão,
mas eram deliciosos, tão firmes e pontudos. Nunca tinha
visto seios mais duros, belos e rosados. Eram perfeitos,
cabiam em sua boca. E Winchester se deliciava com eles.

Clara se sentia à deriva naquelas sensações. Escutava sons


de prazer, gemidos, arquejos

e respiração entrecortada. Nem mesmo percebia que era


dela que vinham aqueles sons. Seu corpo todo tinha vida
própria. Se contorcia de prazer nos braços experientes do
Marquês. Mas logo aquilo se tornou torturante, ela queria
mais, precisava de mais. Mas Clara, nem mesmo sabia, o
que era o mais.

O Marquês se afastou um pouco para observar sua noiva.


Não tinha tido tempo de admirá-la, tão faminto estava por
ela. E a fome continuava insaciada, mas ele não poderia
possuí-

la em uma carruagem e se continuasse a fazer aquilo, temia


não se controlar. Ainda mais porque os gemidos de Clara o
deixavam cada vez mais desejoso de se afundar nela.

— Não — ela sussurrou, quando se afastou.

— Eu preciso, meu amor — o Marquês respondeu, sorrindo,


ao ver que ela nem se dera conta do que tinha dito e
continuava de olhos fechados, tentando estender o
momento. — Não posso tomá-la em uma carruagem, por
mais que eu esteja tentado a fazer exatamente isso. Não
seria confortável para você ter sua primeira vez assim. E
nem sequer nos casamos ainda.

― Falta muito para chegarmos em Gretna Green? ― Fez a


única pergunta que importava naquele momento.
― Calma, minha fadinha, logo chegaremos e eu prometo
recompensá-la pela espera.

Clara sentia todo seu corpo ansiar pelo toque do Marquês,


não se importando se eram ou não casados. Seus anos no
clube lhe deram certo conhecimento teórico sobre o ato. E
já tinha visto mais de uma vez a cópula entre um homem e
uma mulher. Talvez, por isso, seu corpo tivesse reagido
daquela forma, como se soubesse exatamente o que fazer,
pois era isso que ela via as Damas do clube fazer.

E essa constatação deixou Clara surpresa, tinha acabado de


agir como uma Dama de Vermelho.

― Sinto muito, acabei de agir como uma prostituta. ― Ela


corou, ao perceber o que fizera.

— Não quero que se desculpe por isso e, tampouco, pare de


agir assim quando estiver comigo — o Marquês respondeu,
fazendo-a olhar nos olhos dele. — Em poucas horas, serei
seu marido, e gostar de fazer amor comigo não lhe faz uma
prostituta. Lhe faz apenas a esposa ideal para mim. Eu
gosto da forma que se entrega, não há vergonha nenhuma
nisso. — O Marquês baixou o olhar para os seios dela, que
continuavam expostos. — Inclusive, aprecio muito vê-la
assim.

— Ah, meu Deus. — Ela cobriu sua nudez com as mãos, se


sentindo exposta quando se deu conta que seus seios
estavam visíveis. O que diabos tinha acontecido com ela? —
E-eu sinto muito, isso nunca aconteceu antes, e-eu não sei
por que agi assim. Meu Deus, que vergonha.

Eu não sei o que aconteceu... Eu só não conseguia pensar...

O Marquês riu alto da reação dela. Sua noiva estava tão


linda corada de vergonha. Ele beijou a ponta do nariz de
Clara, fazendo-a se calar.

— Você fica ainda mais linda com as bochechas coradas. E


sobre o que aconteceu, eu não poderia ficar mais satisfeito
com suas reações, porque pretendo repetir infinitas vezes o
que fizemos aqui e ir bem além disso. Muito me alegra que
não tenha feito nada parecido antes, gosto em demasia da
ideia de ser o seu primeiro. E é por isso que eu precisei
parar. Acredite, foi muito difícil, e da próxima vez que o
fizermos, não pararei.

Clara ficou ainda mais vermelha ao ouvir aquilo. Ela tinha se


comportado como uma mulher indecente, devassa. Mas, por
baixo da camada de vergonha, tinha gostado bastante
daquilo.

Ter a boca dele na sua, em sua pele, tinha lhe causado


sensações indescritíveis de tão deliciosas. Ele tinha lábios
tão macios e carnudos, eram deliciosos.

— Se continuar olhando para minha boca desse jeito, eu vou


te beijar novamente e não vou querer parar desta vez.
Então, seja boazinha e colabore comigo. — O Marquês
sorria, divertido, e Clara desviou o olhar, um pouco
constrangida. Ela nem mesmo tinha percebido que estava
olhando a boca dele de um jeito diferente. — Prometo que
logo estaremos casados e você poderá ter o que quiser de
mim.

Clara acenou com a cabeça e olhou para suas mãos, e foi


então que percebeu que ainda estava no colo do Marquês.
Se levantou, depressa, quase se desequilibrando no
processo. Tentou arrumar suas vestes, alisou suas saias e
tentou fechar o espartilho para cobrir os seios e percebeu
que não teria como, pois, justamente o tecido que lhe cobria
os seios, estava rasgado. O espartilho que usava chegava
apenas à metade dos seios, na intenção de dar um pouco
de volume ao empurrá-los para cima, mas agora, com sua
roupa aos pedaços, ele só os deixava mais expostos.

Clara gemeu, desgostosa, a lucidez e o decoro estavam


voltando, agora que o calor do desejo se arrefecia. Estava
extremamente envergonhada com a nudez de seus seios.
Seios esses que o Marquês tinha colocado na boca. Na boca.

Oh, céus! — Se tivesse um nível acima da vergonha


constrangedora, Clara tinha certeza de que o tinha
alcançado.

O Marquês lhe estendeu a capa, ao perceber o


constrangimento de sua noiva e a ajudou a se esconder
embaixo dela. O que foi uma tristeza para ele perder aquela
visão maravilhosa do topo dos seios de sua noiva, tinha
adorado vê-la com eles despidos.

— Eu agi como uma... Uma... Devassa. E-eu sinto muito —


Clara tentou se desculpar novamente, quando se cobriu
com a capa.

— Eu não sinto. E saiba que eu apreciei bastante sua...


Devassidão. Sinta-se à vontade para ser devassa comigo,
sempre que quiser. Prometo que nunca me verá
reclamando. Muito pelo contrário, ficarei imensamente
honrado em ter você assim.

A carruagem parando o fez abrir as cortinas e olhar para


fora. Tinham chegado na estalagem onde passariam a noite.
Chegariam a Gretna Green no dia seguinte.

Gabriel desceu e ajudou Clara a descer. Ela agarrava a capa,


como se sua vida dependesse disso e, apesar do silêncio do
cocheiro, ela percebeu que ele poderia ter ouvido seus
gemidos.
— Winchester — ela chamou em um sussurro e esperou ele
olhar. Ela apontou com a cabeça para o cocheiro e ficou
vermelha novamente. — Será que ele ouviu o barulho?

O Marquês precisou segurar o riso.

— Não se preocupe, fadinha, o barulho da carruagem e dos


cavalos abafavam seus sons, e o Jack é muito discreto. Ele
não ousaria dar uma palavra sobre isso.

— Tudo bem. — Clara ficou mais aliviada e se escondeu na


capa, quando começaram a andar na direção da estalagem.

O local onde passariam a noite já era conhecido de


Winchester, sempre que ele estava indo para Willow Castle,
parava ali. Era limpo, com boas acomodações e a comida
era gostosa, para uma estalagem. Dali, em vez de irem para
o norte, como fazia quando ia para sua casa, o Marquês
seguiria para o oeste

Winchester seguiu até o balcão e pediu dois quartos para o


estalajadeiro.

— Milorde, sentimos muito, mas só temos um quarto


disponível no momento — o homem informou, apreensivo.
— Tivemos bastante movimento esta semana e não
sabíamos que o senhor viria, caso contrário, deixaríamos
outro quarto disponível, como sempre. Mas se o senhor
puder esperar, eu posso liberar algum para o senhor, mas
demorará um pouco para ele estar pronto para o uso.

O Marquês ia dizer que não se incomodaria em esperar,


quando ouviu a voz de Clara responder por ele.

— Não é necessário. Ficaremos no mesmo quarto.


— Meu senhor? — O estalajadeiro fitou o Marquês. Em todos
os anos, o homem jamais vira o seu cliente compartilhar o
quarto com uma mulher.

— Faça como ela diz. — O Marquês entregou ao homem


algumas moedas pela discrição.

— É claro, milorde — O homem estava surpreso, mas logo


tratou de se recompor. — Se me permitem, os levarei
imediatamente até o quarto.

O Marquês seguiu o homem, que os guiou até o quarto onde


eles ficariam. E, logo em seguida, saiu com a promessa que
mandaria alguém com água quente para que eles
pudessem tirar a poeira da estrada, antes de descerem para
o jantar.

— Espero que não se importe em compartilhar o quarto


comigo. Eu não ia ficar confortável em tirar alguém dos
aposentos uma hora dessas.

— Não se preocupe. — O Marquês sorriu para Clara. —


Daqui a pouco eles devem trazer água quente para seu
banho. Acredito que gostará de um pouco de privacidade
para isso.

— Claro. Eu adoraria. — Clara sorriu com a gentileza de


Winchester.

— Quando terminar, basta descer as escadas, eu a


esperarei lá embaixo.

Ouviram uma batida na porta e o Marquês a abriu. Eram os


criados com a água quente.

Gabriel esperou que eles enchessem a tina e saiu junto com


os criados, deixando Clara sozinha.
Winchester desceu para o salão onde eram servidas a
comida e a bebida. Ele até pensou em beber um pouco, mas
sabia que a bebida só iria atrapalhar. Precisaria de todo seu
autocontrole naquela noite.

Ele iria dormir no mesmo quarto que sua noiva, a mulher


que desejava. E se já tinha sido difícil parar na carruagem...
Em uma cama, então, tinha quase certeza de que não
conseguiria. O

jeito seria nem se aproximar dela naquela noite. E que Deus


o ajudasse, estar ao lado de Clara e não a tomar para si, iria
tornar sua noite longa e torturante.

CAPÍTULO 16 ― ENTREGAS

Assim que o Marquês saiu, Clara se permitiu retirar a capa e


olhar a extensão dos danos em seu vestido. Céus, aquela
camada rasgada não teria mais como ser utilizada, pois a
costura do remendo ficaria evidente. Teria que arrumar uma
nova peça, entretanto, não tinha trazido nenhuma outra
consigo na viagem. Não sabia que seria necessário.

Enquanto brigava com os laços e nós de seu vestido, Clara


ralhava consigo mesma, mas por outro motivo mais
preocupante do que a dificuldade que encontrava em abrir o
vestido sozinha. Os seus sentimentos pelo noivo.

Não devia sentir nada do que sentiu pelo Marquês. Era


perigoso. Mas quando ele a olhava, ou a tocava de maneira
tão carinhosa, era difícil se lembrar de manter o coração
longe dele. E quando ele a beijava da forma que fizera mais
cedo, era difícil se manter inerte ao que ele despertava
nela. E se ele continuasse assim, logo ela estaria
apaixonada.

O pensamento lhe causou arrepios.

Não. Não deixaria chegar tão longe. Se ela o amasse,


poderia ter o mesmo fim da falecida Marquesa e não queria
isso.

Tinha que se lembrar de que ele era um libertino, que sabia


exatamente o que fazer para ter uma mulher suspirando por
ele. Precisaria ser forte para não ser apenas mais uma. Sim,
iria cumprir seus votos de esposa quando se casassem e
compartilharia uma cama com ele, mas tentaria manter
suas emoções longe daquele homem.

Ele pode até ter o meu corpo, mas não terá meu coração —
ela pensou, enquanto se direcionava para a tina com água
quente e se abaixava para poder se banhar. — Não vou me
apaixonar por ele. Não é só porque eu gosto dos beijos dele,
que eu já esteja apaixonada.

Assim que começou a se limpar, ela aproveitou para pensar


um pouco sobre os eventos que antecederam o beijo. Tinha
lhe contado tudo sobre si. E ele a tinha surpreendido
quando pediu que ela deixasse ser cuidada por ele. Há um
tempo ela não sabia qual era a sensação de ser cuidada por
alguém.

Tinha prometido a ele que pensaria sobre deixar de ser


Copas e havia percebido que ele realmente estava sendo
sincero sobre aquilo. Mas, o que ele poderia fazer, que ela
não já tinha feito?
Ela queria muito não precisar se preocupar com as dívidas
do pai. Não que não tivesse aprendido a gostar da vida no
Rogue's, mas ela sempre preferia locais calmos, pouco
barulho, pouco movimento. Muitas vezes, voltou para casa
com dor de cabeça, por causa da agitação do clube. Esse
era um dos motivos para que durante o dia, preferisse ficar
em casa, aproveitando o silêncio.

Talvez pudesse deixá-lo tentar quando voltassem a Londres,


se ele não conseguisse, então, não haveria de colocar mais
empecilhos na ideia de continuar como Copas.

Era isso, daria uma chance a ele. Se ele não conseguisse,


ela novamente assumiria a responsabilidade sobre sua
família. Estava decidido.

Mais animada após tomar aquela decisão, Clara decidiu que


já estava na hora de sair da água, mas então se lembrou
que não tinha outra coisa a vestir, além da roupa rasgada
no chão, ao lado da tina. O jeito seria ficar no quarto e não
descer de forma nenhuma. Só teria que avisar a seu noivo.
Pensar nele a aqueceu por dentro e trouxe rubor a sua face.
Era evidente o constrangimento

de Clara, mas ela não poderia evitá-lo, apenas porque ele


esteve com a boca em seus seios.

A moça respirou fundo, criando coragem. Não era nenhuma


covarde e, em breve, eles seriam bem mais íntimos do que
aquilo. Logo eles compartilhariam uma cama, afinal, ele
seria seu marido. Não podia ficar constrangida sempre que
ele lhe visse nua.
Decidida a não pensar mais nisso, se levantou da tina onde
estava sentada e, quando ergueu a vista, deu de cara com o
homem que ocupava seus pensamentos.

Winchester a esperava fazia mais de um quarto de hora. Por


que uma mulher demorava tanto quando precisava se
arrumar? E então se lembrou que ela estava sozinha e que
possivelmente estava tendo dificuldades em se despir,
afinal, algumas peças eram amarradas nas costas.

Decidiu subir e lhe ajudar a, pelo menos, remover as peças


de roupa mais difíceis.

Depois disso, voltaria a descer.

Decidido a ajudar sua noiva, ele subiu de volta para o


quarto onde estavam hospedados e, ao abrir a porta, se
deparou com uma cena que o fez esquecer de tudo o que
tinha planejado.

Sua noiva estava de pé na tina, com os cabelos ainda


presos e completamente nua. Ela tentou se cobrir com as
mãos, mas ele ainda conseguia vê-la por inteiro.

Ele fechou a porta atrás de si. Não queria ninguém


contemplando o corpo de Clara, além dele próprio.

Céus, nunca imaginaria que por baixo dos vestidos, ela


fosse tão curvilínea e branca. Seu quadril era largo para
alguém tão magro, suas pernas eram delgadas e longas,
mas combinavam e eram proporcionais ao resto de seu
corpo, elas se uniam em um emaranhado de pelos loiros,
que escondia seu sexo. Os seios perfeitamente empinados e
duros, fez com que a boca do Marquês salivasse e ele desse
passos inconsciente na direção de sua noiva.
Não conseguiria esperar até o casamento. Sua noiva o
tentava demais para conseguir mantê-la intacta até que
chegasse a hora certa.

— Eu estava tentando ser cavalheiro — o Marquês foi


dizendo à medida que se aproximava dela. — Queria fazê-la
minha apenas quando estivéssemos casados. Assim, você
poderia ficar mais à vontade e eu faria da forma como deve
ser e como você merece. Não queria lhe tomar em um
quarto qualquer. Com pessoas podendo ouvir claramente o
que estaríamos fazendo. Mas você me tenta, mulher. Com
ainda mais intensidade do que eu tento ser um cavalheiro.
Então, se não quer que eu a possua, aqui e agora, diga.
Porque quando eu começar, só irei parar quando a exaustão
nos tomar.

Clara não conseguia se mexer, não conseguia pensar, muito


menos, falar. Seus olhos estavam hipnotizados nos do
Marquês, que a olhavam escurecidos pelo desejo de possuí-
la. E

nesse momento, Clara esqueceu de tudo que havia pensado


durante a breve ausência dele no cômodo. Seu corpo
formigava por ele, ansiava e respondia a seu olhar. Talvez,
só aquela noite, poderia deixar de lado todos os problemas
e receios e se entregar a seu noivo. Apenas aquela noite.

Quando chegou diante dela, Winchester sorriu.

— Preciso ouvi-la. Sim ou não?

― Sim.
E ,para a devida surpresa de Clara, Winchester a tomou nos
braços e a levou para a cama.

Gabriel pegou Clara em seus braços e a levou para a cama.


Nem sequer pensava no que estava fazendo, apenas queria
tocá-la, beijá-la e se afundar nela. Ele tinha dado à sua
noiva a chance de recusar sua investida, e ficou aflito com a
possibilidade de ela realmente fazê-lo. Mas para seu prazer,
ela tinha dito sim. Um lindo e sedutor sim. A colocou no
colchão e se afastou para admirá-la. Ela corou ao se sentir
observada e tentou se cobrir.

― Não ― ele negou, quando ela tentou puxar o lençol. ―


Não se cubra. Quero vê-la. ―

Ela parou, mas não conseguia olhar para ele. Winchester a


admirou por um tempo, enquanto desamarrava os cordões
de sua própria blusa e retirava suas botas para se juntar a
sua noiva. ―

Tão perfeita.

Clara ouviu o elogio e sentiu-se ruborizar ainda mais.


Entretanto, tomou coragem e olhou para ele e se deleitou
com a visão de seu marido sem roupas da cintura para
cima.

Aquele homem era uma tentação. Em seu peito quase não


havia pelos, assim como em seus braços. Mas a falta de
pelos não o deixava menos masculino, pelo contrário, só
evidenciavam ainda mais seus músculos fortes, rijos e
definidos, que indicavam que ele se exercitava com
bastante frequência. Seu corpo era grande, ombros largos e
cintura estreita. Braços fortes e, pela forma que a calça se
apertava às suas pernas, ela notava que ele era grande em
todos os lugares.
― Gosta do que vê? ― perguntou, ao notá-la analisando seu
corpo e deu passos em direção a ela. Quando Clara
assentiu, Winchester riu e se inclinou sobre ela na cama,
tomando os seus lábios.

Ao ser beijada, Clara esqueceu completamente a vergonha


que sentia. Enlaçou o pescoço de Winchester com os braços
e o puxou contra si, fazendo ambos deitarem na cama.

Winchester deitou por cima dela, a beijando com desejo e


fervor. A desejava como nunca havia desejado outra mulher.
Não entendia o que estava acontecendo, mas seu corpo a
reclamava para si. Queria marcá-la, possuí-la, preenchê-la,
tomá-la. Queria que ela fosse dele.

Com uma de suas pernas, afastou as dela e se colocou ali


no meio. Ainda estava com as calças, não queria acabar tão
depressa. Primeiro, a deixaria pronta para ele. Ansiosa,
pulsante e molhada para quando ele a tomasse.

Sentiu Clara estremecer embaixo de si, quando ele esfregou


seu membro enrijecido na pelve dela. E apenas para
provocá-la, repetiu o gesto.

Apesar de ser uma noite fria, Clara estava se sentindo


aquecida com o corpo seminu do Marquês cobrindo o seu.
Aquela fricção gostosa na junção de suas pernas, a fazia
sentir pequenos choques que se espalhavam pelas suas
pernas. E a forma que ele lhe beijava, fazia com que os
bicos de seus seios doessem.

O beijo dele fazia Clara arquear o corpo e se contorcer,


querendo mais. E quando sentiu as mãos dele cobrir os seus
seios expostos, arranhou as costas dele, instintivamente,
tamanho era o desejo que sentia aflorar em seu corpo.
Sentiu o Marquês descer os beijos por seu pescoço, ele
provava cada pedaço dela e continuava faminto por mais.
Desceu para os seios de Clara, trabalhando habilmente com
a língua em seus mamilos, ela arfava e gemia,
completamente entregue ao momento.

Uma das mãos do Marquês trilhou um caminho pela barriga


da lady, até parar nas dobras do sexo dela, ele desceu até a
entrada dela e a encontrou molhada, mas ainda poderia
ficar mais.

Então, subiu um pouco a mão, procurando o botão que ele


sabia que a faria enlouquecer. E quando o achou, começou
a tocá-lo com maestria.

― Winchester ― Clara sussurrou, em meio a um gemido.

― Gabriel ― ele a corrigiu. ― Eu quero que diga o meu


nome quando gozar, minha fadinha.

― Gabriel... Oh... ― ela repetiu e ele sorriu, ao perceber o


quanto gostava dela lhe chamando pelo nome de batismo.

Ele voltou a sugar e mordiscar os mamilos de sua noiva,


enquanto continuava a tocá-la, levando-a cada vez mais à
beira do abismo.

Clara não sabia o que estava acontecendo com seu corpo.


Que sensação era aquela que a tomava. Sentia todo o seu
ser se comprimir num único ponto, o lugar exato onde o
Marquês a tocava com os dedos, o local entre suas pernas.

Era tão intenso, que quase chegava a doer, era


desesperador, seu corpo pedia por algo que ela nem mesmo
sabia o que era. Ela tentava se prender ao pouco de
consciência que lhe restava.
― Deixe-se levar, Clara. Eu a segurarei. Se solte. Deixe vir.
Apenas sinta.

Aquelas palavras sussurradas em seu ouvido fizeram com


que ela permitisse seu corpo chegar aonde queria. O
Marquês a beijou. E com um grito abafado pela boca do
Marquês, Clara atingiu o ápice de seu prazer.

Seu corpo amoleceu, sua mente ficou em branco, e ela


sentiu uma paz diferente de tudo que já tinha sentido. Uma
plenitude que nem sabia existir.

Que sensação maravilhosa.

Ela ouviu uma risada ecoar no quarto e percebeu que era


sua. Estava rindo. Mas não sabia o motivo. Apenas estava...
Feliz.

― O que... Foi... Isso? ― ela perguntou, ainda com a


respiração entrecortada, quando conseguiu parar de rir.

― Você teve sua liberação, meu amor ― o Marquês


respondeu, orgulhoso de ter sido ele o responsável por
aquilo e a puxou para si, para abraçá-la.

Ela se aninhou em seus braços com um sorriso. Sua


respiração já estava regular novamente. Mas logo ela voltou
a se acelerar quando o Marquês começou a tocá-la
novamente.

Beijou seu pescoço, enquanto as mãos passeavam livres


pelo corpo de sua noiva. Decorando a textura e cada curva.
Ele mal podia esperar para se afundar nela. Seu membro
latejava dolorido e ansioso.

Ele se levantou da cama e retirou as calças rapidamente.


Clara viu quando o sexo dele ficou livre e não conseguiu
desviar o olhar daquela parte da anatomia de seu marido.

Algumas vezes, Clara tinha visto a anatomia masculina pela


janela do escritório do Lorde, e por mais que ele tenha
tentado preservá-la de tais cenas, ela tinha vislumbrado
uma boa dúzia de homens nus. Na primeira vez, tinha ficado
assustada. Mas acabou por ignorando as imagens que via.
Porém ter o seu marido ali, completamente nu diante dela,
com seu membro rijo e apontando para cima, ela não pode
deixar de admirá-lo. Não porque ele fosse enorme no
comprimento, pois não era tão grande, quando comparado
com alguns dos que havia visto,

tampouco, era pequeno. O tamanho parecia ideal para ele.


Proporcional, o que o deixava ainda mais perfeito. Sua
admiração se deu porque ele era grosso, bem mais que a
maioria dos que tinha chegado a ver escondido. A
extremidade era avermelhada e ela podia ver as veias na
extensão do membro de seu noivo.

― Não precisa ter medo, não vou te machucar ― o Marquês


disse, quando percebeu que ela estava quieta demais.

― Eu sei. ― Clara sorriu. ― Sei que vai doer, mas não


porque você quer me machucar.

― Eu jamais a machucaria de propósito. ― Gabriel juntou-se


a ela na cama, se posicionando em cima dela e voltando a
beijá-la com carinho.

Sua mão desceu para tocá-la mais um pouco e confirmar se


ela estava pronta para recebê-lo. E ao constatar que sim,
ele gemeu em sua boca.

― Eu preciso que me diga quando doer. Tentarei ir devagar


e serei cuidadoso, não há como evitar a dor, mas podemos
tentar amenizá-la.

Clara concordou e sentiu o Marquês colocar seu membro


nela. Sentiu quando ele a penetrou um pouco, até então
não havia sentido nenhuma dor. O Marquês se retirava e
voltava a entrar novamente sempre um pouco mais que na
vez anterior.

Ela sentiu quando ele rompeu sua barreira, porque seu


corpo se retesou com a pequena pontada de dor. Mas não
foi tão ruim quanto pensou que seria. Apenas uma pontada
leve e a dor já tinha ido embora. E senti-lo completamente
dentro de si a fez arfar.

Clara estava tão úmida, apertada, quente e escorregadia,


que ele temeu não conseguir parar, todo seu corpo queria
entrar em um ritmo frenético e se aliviar dentro dela. Mas
ele se obrigou a permanecer parado, enquanto ela se
acostumava com seu volume.

― Você está bem? Está doendo muito? ― ele perguntou,


preocupado e se esforçando para permanecer parado.

― Não dói ― ela lhe assegurou e ele sorriu, podendo, então,


voltar a se movimentar.

Clara ia lhe dizer para continuar quando ele se retirou e


voltou a invadi-la completamente.

Ela sentiu-se arfar com a sensação intensa que o


movimento lhe causou e se agarrou ao Marquês. Ele parou
novamente, preocupado que a estivesse machucando.
― Não pare ― ela pediu, remexendo o quadril e procurando
sentir novamente aquela sensação.

― Não vou mais ― ele concordou e voltou a beijá-la,


enquanto a enlaçava com os braços e a penetrava.

Ele começou a se movimentar no ritmo que seu corpo


necessitava. Estar dentro de Clara era sublime, sentiu que
não era apenas desejo ali. Tinha algo mais. Não eram
apenas dois corpos se entregando ao prazer, mas duas
pessoas se unindo da forma mais íntima que existia.

Ele não ousou pensar em uma palavra para definir aquilo.


Nem mesmo pensava em nada, a única coisa que passava
em sua mente era a sensação de ter encontrado algo raro e
precioso.

E essa sensação não o abandonou, nem mesmo quando ele


alcançou o próprio prazer e derramou sua semente dentro
dela, após Clara ter alcançado novamente sua liberação,
sussurrando o nome dele.

Clara estava deitada no peito de Winchester. Tinham


acabado de fazer amor e ela tinha gostado muito do ato. O
Marquês lhe afagava as costas nuas, em silêncio. Nenhum
dos dois queria quebrar aquele momento mágico.

Depois de alguns momentos, o Marquês se levantou da


cama completamente nu e sem nenhuma vergonha. E Clara
teve uma bela visão de seu traseiro e ficou admirando
aquele homem que logo seria seu marido. Ele seguiu até a
tina para pegar o pano limpo que estava lá e que Clara não
havia usado para se secar.

Depois caminhou até ela e sentou-se na cama ao seu lado.

― Permita-me limpá-la.
― Ah, não precisa. Eu mesma faço isso mais tarde ― Clara
respondeu, constrangida em imaginá-lo olhando para algo
tão íntimo.

― Está bem. ― Ele sorriu ao ver que ela estava corada. ―


Mas se é para que eu não a veja, permita-me que eu a deixe
avisada que eu não apenas olharei, como provarei cada
cantinho quando você estiver se sentindo melhor.

Clara arregalou os olhos diante daquela afirmativa, o que


fez o Marquês sorrir. Ele gostava de provocar a noiva.

Ele deixou o pano em uma cadeira ao lado da cama. E ia


voltar a deitar com sua noiva, quando ouviu o estômago de
Clara roncar.

― Vejo que está com fome ― o Marquês comentou,


divertido. ― Vou buscar algo para você comer, assim não
tem que descer e pode se limpar e descansar um pouco.

― É muito gentil. Obrigada.

Winchester assentiu e pegou suas roupas espalhadas pelo


chão. Se vestiu rapidamente e logo estava completamente
apresentável.

Antes de sair pela porta, ele se inclinou e beijou os lábios de


Clara.

― Eu retornarei em instantes.

Assim que a porta se fechou atrás do Marquês, Clara


percebeu que corria sérios riscos de se apaixonar por
aquele homem.

Talvez, se conseguisse se afastar dele, de seus carinhos e


atenção, o que começava a sentir, passaria. Precisava ser o
mais fria possível com ele.

Clara olhou para o teto e suspirou.

O que faria? Não podia se apaixonar por seu marido. Seria


seu fim.

Queria alguma resposta, mas em vez disso, lembranças


recentes do que fizeram a tomaram e ela corou ao recordar
o momento em que ele a tomou para si.

Ele tinha sido tão carinhoso, cuidadoso e preocupado com


ela. Tinha sido gentil. Tinha tornado o ato maravilhoso. Só
em lembrar do que haviam feito, seu corpo voltava a
desejá-lo. Ele era tão maravilhoso...

Clara, pare. Você não pode se apaixonar por ele ― ela


brigou consigo mesma, mas no fundo, sabia que era uma
guerra perdida, pois já estava quase apaixonada.

Precisaria encontrar um jeito de afastá-lo.

Resignada, ela se levantou para se limpar, como o Marquês


tinha falado e sentiu algo escorrer por suas pernas, fazendo
cócegas.

Em vez de usar o pano ela, foi novamente até a tina. A água


estava fria, mas ela não se importou. Se lavou rapidamente
e então saiu se enxugando com o pano limpo e seco.

Após se enxugar, voltou para cama e se enrolou com alguns


lençóis.
Assim que terminou de se enrolar, Winchester regressou.

― Pedi que nos tragam algo para comer. A Mary subirá em


instantes ― ele avisou sorrindo e retirando o casaco.

― Tudo bem. Obrigada ― Clara agradeceu, se direcionando


para a cama e se cobrindo.

― Você está dolorida? ― ele, perguntou preocupado.

― Eu estou bem. Não está doendo ― ela respondeu, sem


olhar para ele e virou-se na cama, ficando de costas para
Winchester.

O Marquês observou sua noiva ignorá-lo. E se perguntou o


que tinha feito de errado.

― Você está bem? ― ele perguntou.

― Sim, acabei de dizê-lo ― ela respondeu, ríspida. Não


queria tratá-lo de modo tão ruim, mas, talvez se o
afastasse, ele parasse de ser tão gentil.

― O que você tem? ― Winchester perguntou, ao perceber


que ela parecia pensativa e estava mais silenciosa que o
normal.

― Não é nada.

― Por que vocês nunca admitem o que realmente está


acontecendo? ― O Marquês cruzou os braços diante do
peito e franziu o cenho.

― Se algo tivesse acontecendo eu diria, mas não está. ―


Clara o olhou, séria. ― Eu estou bem.

O Marquês suspirou, frustrado.


― Então por que está agindo dessa forma?

― Eu não estou agindo de forma nenhuma. Apenas não


tenho nada para falar. Não posso querer ficar em silêncio,
ou sozinha com meus pensamentos? ― ela revidou,
cruzando os braços na frente do corpo.

Sentiu quando atingiu o Marquês com aquelas palavras.


Toda a alegria, que antes estava em seu olhar, agora havia
sido substituída pela raiva e irritação.

― Como quiser ― ele respondeu e se direcionou para a


porta. ― Deixarei, então, que fique sozinha. Jantarei lá
embaixo.

O Marquês fechou a porta atrás de si. Estava furioso porque


sabia que algo estava acontecendo com sua noiva e ela
preferia afastá-lo do que contar a ele o que era.

Ele devia respeitar a vontade dela. Deveria deixá-la em paz,


mas estava cansado de segredos, e sabia que se permitisse
que ela o afastasse, dessa vez, não conseguiria fazê-la
confiar nele. E ele não podia permitir isso.

Por isso, em vez de descer e deixar sua noiva em paz,


voltou para o quarto. Precisava saber o que tinha
acontecido.

Ela se assustou quando ele entrou, bruscamente.

― Quero que me conte o que está acontecendo. E não diga


que não é nada. Porque se isso está te aborrecendo, então,
é sim alguma coisa. Está arrependida do que fizemos?

― Não. ― Ela não foi capaz de mentir sobre aquilo, então


deu as costas novamente para ele. Não queria olhá-lo nos
olhos. ― Eu já disse que não é nada.
― Então, por que está tão aborrecida? ― O Marquês se
aproximou da cama e se sentou.

― Não estou aborrecida.

― Eu estou tentando ajudar ― o Marquês tentou explicar.


Estava fazendo o possível para manter a calma. Não iria
permitir que ela o afastasse e só a deixaria em paz quando
descobrisse o que ela tinha.

― Eu não quero sua ajuda.

O Marquês bufou.

― Clara, olhe para mim. ― Ele esperou alguns minutos, até


ela se virar para olhá-lo. ―

Eu fiz algo errado?

Olhando nos olhos do Marquês, ela não conseguiu mentir.

― Não.

― Então por que me afasta? Por que está fazendo isso? Eu


me importo com você, Clara.

Quero que seja feliz. Não me afaste, me deixe ser seu


amigo, seu confidente novamente.

O Marquês pegou na mão de sua noiva e o toque a


desestabilizou.

O coração pedia para confiar nele. E ela se lembrou de


como ele ficou furioso quando ela havia falado sobre os
boatos sobre a mãe dele. Talvez, a verdade o afastasse de
vez. Ele se irritaria com ela e então iria se afastar por
vontade própria.
― Não posso aceitar sua ajuda, Winchester, se eu deixar
que seja meu amigo, logo será mais que isso e eu não quero
definhar como sua mãe, por amar um libertino e não ter de
volta o seu amor.

O Marquês se afastou como se ela o tivesse queimado.


Novamente aquela história de sua mãe ter morrido porque
amou um homem. Ele já estava farto de todos culparem sua
mãe por tudo que aconteceu. Como se a culpa fosse dela e
ela tivesse escolhido aquele caminho. Mesmo que sua mãe
não amasse seu pai, ela teria adquirido a doença, pois ela
tinha que aceitá-lo em sua cama. E ele, mesmo estando
com outras, ainda a procurava. A culpa tinha sido apenas de
seu pai, mas insistiam em justificar o comportamento dele,
por ser homem e poder ter amantes e colocar a culpa na
sua mãe, por simplesmente ter se apaixonado por um
libertino. Ele contaria a verdade à sua noiva, explicaria,
porque da próxima vez que ela usasse aquilo para justificar
algo, ele não a perdoaria. Ninguém mancharia a imagem de
sua mãe na frente dele.

― Você não conheceu minha mãe ― ele falou, entredentes,


e com uma seriedade que ela nunca havia visto. ― Não
sabe a mulher que ela foi, caso contrário, iria querer ser
exatamente como ela. Minha mãe foi uma mulher
excepcional, Lady Clara. Bondosa, altruísta e a melhor mãe
do mundo. Sempre tratou a mim e meus irmãos com amor.
Mesmo que meus irmãos não tenham saído do seu ventre,
ela acolheu a todos como se fossem seus próprios filhos.

Clara sentiu o coração apertar o vê-lo tão sentido com suas


palavras. Iria se desculpar por ter falado aquilo, mas ele
voltou a falar, antes que ela pudesse articular o pedido de
desculpa.
― A história que contam sobre minha mãe não é totalmente
verdade. Ela morreu sim, amando o meu pai. E só Deus
sabe por que ela ainda o amava em seu leito de morte. Ele
não a merecia. Mas o que a matou foi uma doença que ele
trouxe para ela. Ele adquiriu a doença de uma de suas
amantes e passou para minha mãe. Não foi o fato de ela
amá-lo que a matou, e sim a traição dele. Se ele fosse fiel a
seus votos, ela ainda estaria viva. Então, não se preocupe
com isso, você tem a garantia de que não vou traí-la, se é
apenas com isso que se preocupa.

Clara não sabia o que dizer. Sempre tinha ouvido falar que o
amor tinha matado a Marquesa. Sua mãe contou-lhe isso
quando ela ficou noiva do Marquês. Todos comentavam
sobre o fado que ela teve. Mas se tinha sido uma doença
que a matou, então, ela não tinha o que temer ao se
apaixonar pelo marido, que lhe prometia fidelidade.

― Então, eu vou pedir apenas uma vez. Nunca mais fale da


minha mãe como se ela fosse

a culpada de sua própria morte. E pare de usar a história


dela contra mim. Eu não sou e nunca serei como meu pai,
eu cumprirei com todos os meus votos de casamento.

― Por favor, me perdoe.― Clara pediu, ao perceber que


tinha cometido um grande erro.

― Tudo bem. Você não sabia ― o Marquês respondeu, mas


continuava sério e seus olhos estavam tristes.

― Eu fui uma tola. ― Clara suspirou, triste consigo, por ter


machucado o Marquês.

― Sim, foi ― Winchester concordou e isso fez Clara olhar


para ele, ofendida. Não devia concordar com ela.
― Você devia dizer que eu não fui. E me justificar, falando
coisas bonitas. ― Clara fez um bico. ― Onde está seu
cavalheirismo?

― Sou um libertino, lembra? ― Ele piscou para ela.

― Já que disse que pretende cumprir todos os seus votos,


acho que não merece mais esse título.

― Ah, mas eu sempre posso ser um libertino com a minha


futura esposa, na nossa cama.

Clara revirou os olhos. Devia ter esperado por isso. Mas não
se importou realmente. O

clima entre eles estava leve novamente e era apenas isso


que importava. Sorriu com aquilo e sentiu seu coração se
aquecer, mas dessa vez, ela não reprimiu a sensação.

Naquele momento, uma batida na porta encerrou


momentaneamente a conversa. O

Marquês abriu a porta e Mary entrou com a comida, para a


alegria de Clara, que estava realmente com muita fome.

Durante todo o jantar, Clara observou seu marido. Ele comia


em silêncio, e aquilo começou a incomodá-la, queria
conhecer aquele homem melhor. Por esse motivo, decidiu
tomar a palavra.

— Me fala um pouco de você. Percebi que não o conheço


tão bem quanto deveria —

Clara pediu, enquanto levava um pedaço de pão à boca.

— O que gostaria de saber? — Winchester perguntou, após


mastigar e engolir um pedaço de carne junto com vinho.
Clara pensou por um momento. A conversa anterior foi
sobre a mãe dele, e ele não tinha ficado muito feliz com o
tema, então, era melhor não falar sobre isso.

— Como é a vida em Willow Castle? — Ela bebericou seu


vinho. Não estava misturado com água, mas não precisaria
se preocupar, pois sabia que não ficaria bêbada só com
aquele copo.

— Acredito que você vá gostar. Lá tem terras abundantes


que são ótimas para passear a cavalo, tem uma lagoa no
meio do bosque, a vila mais próxima é bem festiva, o que
garante diversão durante várias épocas do ano. A igreja de
St. John é linda, meu irmão a conserva muito bem. Quando
chegarmos, eu gostaria de lhe mostrar tudo — o Marquês
falava e era visível o brilho em seus olhos, que mostravam o
quanto ele gostava do seu lar.

Clara sorriu. Não tinha outra reação, além de sorrir, quando


via o seu marido daquela forma. Vê-lo feliz lhe deixava feliz.

— Eu vou amar conhecer suas terras.

Gabriel fitou Clara com intensidade.

— Em breve, serão nossas terras — o Marquês comentou,


sorrindo para ela. — Você será minha esposa e minha
Marquesa. Tudo o que eu tenho, será seu e tudo o que tem,
será meu.

Clara sorriu encantada com aquela declaração.

Não falaram nada por alguns minutos, apreciando o sabor


da comida que, apesar de simples, estava bem saborosa.

Clara observou que seu noivo já tinha comido quase tudo


que tinham servido. A carne assada, os pães, a sopa, e
agora estava comendo a torta de carne.

— Estava com fome, pelo visto. — Clara sorriu debochada.

— Um pouco sim — O Marquês respondeu, olhando seu


prato e ficando um pouco...

vermelho?

A luz da vela não iluminava tanto para que ela pudesse


distinguir se ele tinha, ou não, corado. Mas ele tinha ficado
encantador constrangido.

— Para aonde vai essa comida? — Clara perguntou,


debochada.

— Como assim? — O Marquês ergueu o rosto, confuso, e


Clara riu.

— Tirando o que está no meu prato, você comeu quase tudo


— Clara comentou. — Não aparenta ser alguém que se
excede na comida.

— Bom, eu não costumo comer tanto, mas estava com


fome, e também preciso de muita energia para o exercício
que pretendo fazer esta noite — Winchester comentou,
olhando maliciosamente para sua noiva e bebendo de sua
taça.

— Exercício esta noite? — Clara perguntou, sem entender. —


Pretende sair?

— Não, minha fadinha, me refiro a um exercício delicioso


que você e eu faremos ali, naquela cama. — Gabriel
apontou para a cama desarrumada e sorriu quando viu o
entendimento nos olhos da lady.
— Nesse caso, acho que devo terminar minha refeição
também.— Clara comentou, um pouco constrangida com as
palavras que saiam de sua boca.

— Isso muito me alegra. — O Marquês se recostou na


cadeira e passou a observar sua noiva comer. Ele mesmo já
estava satisfeito.

Clara começou a comer rapidamente. Não sabia


exatamente por que tinha se apressado, mas com certeza
não seria pela promessa do que fariam depois da refeição.
Ou seria?

O silencio novamente havia tomado o ambiente e Clara


decidiu voltar a conversar.

— Me fale mais sobre você. Assim fica entretido, enquanto


eu como e não passa o tempo todo olhando para mim. —
Clara havia parado de comer ao se sentir observada.

— Mas eu gosto de olhar para você — ele confidenciou.

Dessa vez, foi Clara quem ruborizou.

— É estranho comer com alguém olhando — Clara


comentou.

— Tudo bem. — O Marquês colocou os braços atrás da


cabeça e ergueu os olhos para fitar o teto. — Melhorou?

— Sim. Obrigada. — Ela voltou a comer. — Me fale sobre


você — pediu, entre uma garfada e outra.

— O que quer saber? Seja específica.

— O que gosta de fazer no seu tempo livre... O que gosta de


comer... Coisas assim —
Clara sugeriu.

— Bem, no meu tempo livre descobri que gosto de fugir


com minha noiva para nos casarmos, e vou descobrir se
gosto de comê-la na sobremesa — o Marquês respondeu e
Clara quase se engasgou com o vinho, começando a tossir.
— Desculpe, acho que não era sobre esse tipo de atividade
que gostaria de saber.

Clara o fitava, incrédula, e ele devolvia o olhar com a mais


inocente das feições.

— Não era realmente sobre isso que eu queria saber —


Clara comentou e em seguida empurrou o prato para frente,
apesar de não ter terminado de comer e entornou o vinho
de uma vez.

— Já está satisfeita? — Winchester perguntou.

— Sim.

— Pedirei que removam os pratos. — Winchester levantou-


se e tocou um pequeno sino ao lado da porta, para chamar
um criado.

Assim que os pratos foram removidos, o Marquês trancou a


porta. Não iriam sair tão cedo daquele quarto e não queria
nenhuma intromissão.

Clara estava em pé ao lado da cama, constrangida. Era


estranho e constrangedor saber o que fariam logo em
seguida, ela não sabia o que fazer ali em pé, enquanto
esperava por ele.

Devia ficar sentada, ou em pé, devia estar nua, ou esperar


que ele a despisse? Devia ficar parada, ou ir ao encontro
dele?
Normalmente, as meninas do clube entravam no quarto
agarradas a seus clientes, mas não dava para fazer aquilo
naquele momento, pois já estavam no quarto e seu marido
estava longe dela.

Eles já tinham feito uma vez. Isso era um fato e o lençol


sujo, estava embolado em um canto do chão, para provar
que agora não era mais virgem. Mas já ter feito uma vez
não mudava o fato de que ainda era inexperiente naquilo.

O Marquês percebeu que ela estava desconfortável e


decidiu logo se aproximar, para evitar mais
constrangimento por parte de sua noiva.

— Relaxe. Você parece tensa. Venha, deixe que eu a ajude.


— O Marquês a levou até a cama e a colocou sentada. Em
seguida, sentou-se atrás dela e a fez soltar o lençol, que
caiu embolado ao redor de sua cintura.

Clara sentiu a peça deslizar pelo ombro e as mãos de


Gabriel ocupar o lugar e começar a massagear
delicadamente.

— Você está tensa, relaxe — ele repetiu. — A parte ruim já


passou. De agora em diante, só haverá prazer para nós
dois.

— Não estou com medo da dor — Clara explicou. — Eu só


não sei bem o que fazer.

— Não se preocupe, eu lhe ensinarei tudo que precisa saber


e um pouco mais — ele sussurrou em seu ouvido e lhe
beijou suavemente o pescoço. — Lhe darei todo o prazer
que estiver ao meu alcance, Clara. Minha fada encantadora.

Clara se sentiu relaxar nas mãos do Marquês. Parecia que


cada centímetro de pele o reconhecia e se deleitava com o
toque dele. Era incrível o que ele fazia com seu corpo. Um
gemido de prazer emergiu dos lábios da lady.

Winchester desceu as mãos pelo ombro de Clara e se


encaixou perfeitamente nos seios expostos. Os mamilos de
Clara se retesaram, se tornando de dois botões escurecidos
pelo frio.

Não demorou muito e as mãos hábeis do Marquês


começaram a fazer maravilhas nos seios da dama, e a boca
do lorde se ocupou com o pescoço dela, aumentando os
gemidos e fazendo-a se contorcer com as sensações.

Gabriel continuou fazendo aquela deliciosa tortura por


alguns minutos e então pediu que ela se erguesse da cama.
Assim que ela o fez, Winchester arrancou o lençol a
deixando completamente nua.

Clara instintivamente se cobriu e o Marquês se levantou,


ficando na frente dela e a beijando, até que percebeu que
ela relaxara novamente.

— Linda — ele a elogiou. — E só minha. Diga que é minha.

— Eu sou sua — Clara respondeu, um pouco enrubescida


pela exposição e pelas palavras.

— E eu sou seu.

O Marquês removeu as roupas com pressa. Mal podia


esperar para sentir sua noiva novamente em torno dele. Só
de lembrar de como ela era apertada, sentia-se endurecer
ainda mais.

Assim que ficou nu, Gabriel sentou-se na cama e estendeu


uma mão para que Clara se aproximasse. Queria que ela
ficasse por cima dessa vez. Queria vê-la cavalgando nele,
até alcançar seu próprio prazer.

— Venha, coloque um joelho de cada lado. — Winchester a


puxou, ajudando-a a colocar-se na posição que ele queria.

Por estar sentado, os seios dela ficaram exatamente na


altura de sua boca, e ele não perdeu tempo em abocanhá-
los. As mãos de Gabriel puxavam Clara para mais perto e as
mãos dela afundavam em seus cabelos castanhos.

Depois de saborear os seios de Clara, Winchester voltou a


possuir a boca de sua noiva e deitou-se com ela por cima.
Ele estava duro e louco para possuí-la. Mas seria cuidadoso,
pois até poucas horas atrás ela ainda era virgem e poderia
estar dolorida.

Para saber se ela estava pronta, o Marquês a tocou com os


dedos, medindo sua umidade.

E ao senti-la escorregadia, gemeu, empurrando um de seus


dedos dentro dela.

Clara se arqueou com o prazer da invasão, sentia seu ventre


pulsar de desejo. Procurou os lábios do Marquês e o beijou.
Sentiu quando ele retirou o dedo de dentro dela e quando a
segurou pelo quadril, a guiando para baixo com uma mão,
em direção a seu membro rígido.

Clara sentiu um pouco de desconforto quando ele a


penetrou, mas nada comparado à primeira vez que o teve
dentro de si. Ela só ainda estava um pouco dolorida, mas a
excitação deixava a dor em segundo plano.

—Você está bem? Posso continuar? — Winchester


perguntou, quando notou que ela franzia o cenho.
— Estou. Não dói — ela o confortou. — Pode continuar.

— É você quem dita o ritmo, meu amor. Cavalgue em mim,


sou apenas um mero servo do seu prazer.

— Oh. — A surpresa de Clara era genuína e ela corou. — O


que eu devo fazer?

— Erga um pouco seu corpo e solte-o em mim. — O Marquês


a segurou pela cintura e a ajudou a fazer o movimento. —
Isso, como se estivesse mesmo cavalgando.

Clara rapidamente pegou o ritmo e começou a se


movimentar em cima do futuro marido.

A posição permitia que o membro do Marquês fosse bem


fundo dentro dela, lhe fazendo sentir sensações
completamente novas. Não demorou muito e Clara começou
a gemer com o prazer, cada vez mais crescente que o
Marquês lhe proporcionava.

Em poucos minutos, a lady alcançou sua liberação, sendo


seguida de perto por Winchester, que se derramou nela ao
chegar ao ápice de seu prazer.

Clara caiu no peito de seu noivo, completamente sem


forças. Estava saciada e um sorriso em seus lábios mostrava
o quanto tinha desfrutado daquele momento.

Ficou ali, aninhada no corpo aquecido de Winchester. Não


tinha palavras e nem era preciso.

Gabriel puxou as cobertas por cima de si e de Clara,


cobrindo-os para mantê-los aquecidos. Não demorou muito
e logo o leve ressonar de Clara mostrou ao Marquês que sua
noiva dormia.
Winchester ainda ficou alguns minutos observando-a dormir
em seu peito. Ela parecia um anjo, com os cabelos soltos,
espalhados nele. Manter a promessa que fez a sua mãe não
seria tão difícil, afinal. Se todas as noites fossem como
aquela, então, não precisaria buscar em outras

camas o que sua futura esposa poderia dar.

Com aquele pensamento animador, o Marquês também


adormeceu, sentindo o calor de sua noiva lhe aquecer o
coração

No dia seguinte, partiriam ao amanhecer para Gretna


Green. Passariam a manhã inteira na carruagem, parariam
para alguma refeição e depois seguiriam viagem até
escurecer. Parariam em uma estalagem para passar a noite
e chegariam ao seu destino na noite do dia seguinte. Agora
que sabia o motivo da pressa, o Marquês não via motivos
para correr riscos, viajando também durante à noite.

Quando Clara acordou, o Marquês já havia providenciado o


desjejum e um vestido para ela. Ele não estava no quarto,
provavelmente, organizava tudo para a partida deles.

Clara sorriu ao ver o cuidado que ele tinha com ela. Vestiu-
se sem dificuldades, uma vez que o vestido era mais
simples que o que usava quando saia de casa para
trabalhar como Copas.

Assim que estava saciada, pegou os pãezinhos que havia


sobrado, assim como o queijo e um pedaço de carne e
enrolou em um lenço, guardando em seguida em seu bolso.
O dia seria longo, e ter algo para comer ajudaria quando a
fome se fizesse presente.

O Marquês apareceu na porta e sorriu, ao perceber que ela


já estava pronta para partir.

― Desculpe pelo vestido não ser novo, espero que não se


importe.

― Não me importo. ― Ela sorriu para seu noivo, e se juntou


a ele para seguirem viagem.

― Você dormiu bem? ― ele perguntou, ao dar o braço a ela


como apoio.

― Oh, sim, divinamente. ― Ela corou ao lembrar que no


meio da noite tinha se aconchegado a ele por causa do frio.
Ele a tinha abraçado ternamente e beijado os cabelos dela
em um gesto protetor.

― Eu amo isso. ― Ele tocou as bochechas avermelhadas de


sua noiva e ela corou ainda mais. ― Mal posso esperar para
estar casado com você.

A declaração a pegou de surpresa. Aquilo sim era novidade.

― O que mudou? ― ela perguntou, curiosa.

― Descobri que não será nem um pouco ruim tê-la como


minha esposa. Há desejo e amizade, e acredito que posso
dizer: confiança. Uma combinação perfeita para um bom
casamento. Temos tudo que precisamos para sermos um
casal feliz.

― Eu espero mesmo que sim ― Clara concordou.

Na noite daquele dia, deitada novamente nos braços do


noivo, Clara sentia-se feliz, apesar de estar preocupada com
o que sua família estaria pensando do seu sumiço. Havia
deixado um bilhete em sua escrivaninha informando que
estava bem e que logo retornaria para Londres,

mas ainda assim, temia pelo que lhe esperaria quando


retornasse à sua casa. Sua mãe nunca lhe perdoaria, disso
tinha certeza. Mas fazia aquilo unicamente por eles, sua
consciência e seu coração indicavam que aquela era a coisa
certa a fazer.

Sabia que a fuga seria um escândalo enorme, mas era


melhor esse escândalo, do que um que expusesse a falência
de sua família. Suas irmãs teriam menos chances de se
casar caso os pretendentes descobrissem que elas não
tinham nenhum dote, do que por ter uma irmã taxada de
louca apaixonada, que fugiu com o noivo para se casar
rapidamente.

O que era até engraçado, fugir com o próprio noivo apenas


para adiantar o casamento.

Poderia ter dito que estava grávida e precisaria se casar às


pressas para evitar um escândalo maior, poderia dizer que
preferia um casamento simples. Mas sabia que nada
impediria a sua mãe de fazer algo grandioso, se ela
estivesse a par dos planos. Então, para evitar os gastos, era
melhor fazer daquele jeito.

No dia seguinte não seria mais Clara Catterfield, e sim Clara


Winchester e aquilo lhe parecia bom. Sua família não
poderia desfazer o casamento e, com o tempo, talvez
aceitassem.

Seus temores tinham sido aliviados pelo seu noivo.


Conseguia ver que ele era um homem bom, talvez não
tivessem começado bem, mas agora se entendiam
maravilhosamente, tanto na cama quanto fora dela.
Esperava mesmo que tudo desse certo entre eles, mas o
medo de ele continuar como um libertino a preocupava,
pois sentia que seu coração já batia mais forte por
Winchester.

CAPÍTULO 17 ― CASAMENTO

O casamento aconteceu como previsto, na manhã do


terceiro dia de viagem desde que saíram de Londres. Gretna
Green era um lugar muito bonito e os casamentos entre os
apaixonados, tinha feito com que a cidade se desenvolvesse
em cima disso. Haviam várias lojas de vestidos e ternos
para casamento, flores para todos os lados e de todas as
cores, alojamentos para os amantes, igrejas e sacerdotes da
bigorna em cada esquina. Famílias todas trabalhavam para
tornar aquele dia especial para os noivos.

Winchester e Clara passaram a noite em uma estalagem, e


o dono indicou o primo para ser o celebrante do casamento.

Seguiram, então, ao local indicado pelo estalajadeiro, como


sendo a casa do ferreiro.
― Sua noiva já tem um vestido para o casamento? ― o
ferreiro perguntou, assim que fecharam a celebração.

― O de viagem servirá. ― O Marquês tentou ser prático e


olhou para Clara para confirmar, essa assentiu com a
cabeça, indicando que estava de acordo. O vestido não era
tão importante assim para ela. E nem era tão feio, não se
importaria em casar-se com ele.

― Mas casar sem um vestido apropriado dá azar no


casamento ― o homem comentou, assustado. ― Minha
prima, Antonine, se casou com um vestido comum, e seu
primeiro filho nasceu morto.

O Marquês não era supersticioso, sabia que o homem


apenas estava tentando vender seus produtos, tinha quase
certeza de que indicaria alguém da família para cuidar do
vestido, mas ao ver Clara se impressionar com a história,
decidiu que compraria para deixá-la despreocupada.

― Tudo bem, o senhor me convenceu, onde posso comprar


um vestido para minha noiva?

― Se comprar na loja da minha esposa, o senhor consegue


um valor bem abaixo do normal, pois consigo lhe dar um
desconto.

― Tudo bem, então ― concordou.

― Maria! ― O homem deu um grito, chamando a mulher,


que apareceu na sala quase imediatamente.

― Sim, querido?

― Essa bela jovem vai precisar de uma de suas melhores


confecções ― o ferreiro explicou, e a mulher sorriu.
― Magnífico. ― A mulher sorriu, animada. ― Acredito que
tenho o vestido perfeito para você. Venha, querida, deixe-
me levá-la a minha loja de vestidos. ― A esposa do ferreiro,
que era costureira, lhe guiou para fora, deixando assim os
homens cuidando do pagamento pelo serviço.

― Espero também que tenha se lembrado do buquê ― o


ferreiro comentou, assim que as mulheres desapareceram
de vista. ― Não existe noiva sem o seu buquê. Dá muito
azar casar sem um. A prima de minha cunhada se casou
sem e acabou sofrendo um acidente quando voltava para
casa com seu marido. Por pouco, não ficou aleijada, a
coitadinha.

― Tudo bem, onde eu encontro um local para comprar


buquê?

― Para a sua sorte, minha filha mais nova é muito boa


nisso, pedirei que ela faça um para o senhor. E darei um
bom desconto.

― Perfeito.

― E alguém para preparar a noiva para o grande dia?

― Vai dizer que dá azar não se casar penteada? ― O


Marquês franziu o cenho, mas agora que tinha começado,
sabia que o homem só pararia quando oferecesse todos os
serviços.

― Claro que não, mas eu creio que toda mulher deseja estar
linda no dia do seu casamento. Afinal, só se casa uma vez.

E para a “sorte” do Marquês, o ferreiro tinha outra filha que


era muito talentosa em fazer penteados em noivas.
― Está faltando mais alguma coisa? ― o Marquês
perguntou, cínico, era óbvio que o homem tinha inventado
tudo aquilo para poder tirar dinheiro do Marquês.

― Apenas as testemunhas... Já as tem?

― Não, mas acredito que o senhor deva ter algum filho, ou


parente, que sirva para esse propósito.

O homem sorriu para o Marquês, debochado.

― É claro que tenho. Não seria o melhor sacerdote da


bigorna da Escócia, se não tivesse tudo que um casal
apaixonado precisa para se casar.

― Ótimo, coloque tudo na mesma conta.

― Perfeito.

Após acertarem tudo para o dia seguinte, Winchester e


Clara voltaram para a estalagem.

Dormiriam no mesmo quarto novamente, o que não foi


surpresa nenhuma para o estalajadeiro, que conhecia a
história de vários amantes. Ali, as regras sociais eram mais
brandas, desde que terminasse em casamento.

No dia seguinte, o casamento aconteceu pela manhã. A


ferraria tinha se transformado em igreja, a filha do ferreiro
tinha feito um singelo, mas muito bonito, buquê de flores
silvestres para Clara, que combinava com o vestido, feito
pela esposa do ferreiro.

Foi uma cerimônia simples e rápida. O ferreiro os declarou


marido e mulher e mandou o noivo beijar a noiva. O
Marquês a beijou, sem hesitar, enquanto Clara corou por
estarem em público.
A mulher do ferreiro ainda derramou umas lágrimas de
alegria e abraçou a noiva, lhe parabenizando pelo
casamento.

― Já estamos casados? ― Clara perguntou, confusa, por ter


sido extremamente rápido.

― Sim, estamos casados. ― O Marquês riu.

― Os casamentos ingleses costumam demorar bem mais


que isso ― ela comentou, se lembrando do casamento de
Henry e Phillipa.

― Mas essa é uma das vantagens de se casar aqui ― o


ferreiro explicou para Clara. ―

A cerimônia é rápida o suficiente para garantir que ninguém


a impeça.

― Oh, é claro ― Clara concordou, se recordando que apenas


os apaixonados, desesperados por ficarem juntos do seu
amado, recorriam a Gretna Green para se casarem, então,
era lógico que a cerimônia fosse rápida.

― Você está pronta para ir para casa? ― o Marquês


perguntou, quando já estavam de volta à estalagem,
organizando as coisas.

― Claro! Minha família vai me odiar por isso, mas não tem
problema, será melhor resolver logo essa situação,
ficaremos em sua casa em Londres?

― Sim, e logo em seguida partiremos para Willow Castle.

― Eu não posso ficar muito tempo fora de Londres, sabe


disso, meu pai perderá tudo, se eu não estiver lá para
amenizar os gastos dele.
― Eu sei. Mas temos tempo para resolvermos o problema de
seu pai, eu vou te ajudar, prometi, lembra? Quando
passarmos em Londres, podemos falar com Henry para ficar
de olho nele por algum tempo e, quando retornarmos,
pensaremos em um plano para pará-lo de uma vez.

― Copas concordou com a cabeça, mas ainda não estava


gostando da ideia de ficar muito tempo distante do seu
trabalho, e então o Marquês decidiu usar outra abordagem.
Se aproximou lentamente dela e começou a massagear
seus ombros, enquanto sussurrava em sua orelha. ―

Acabamos de nos casar, fadinha, necessito tê-la


comprometida em nossa lua de mel. Ainda a tanto a te
mostrar... Tanto desejo para saciar...

A cada frase, ele beijava o pescoço de Clara e ela suspirava


com as sensações. O
Marquês estava apelando, mas que mal teria em tirar umas
semanas para aproveitar as vantagens do seu casamento?

― Tudo bem, mas passaremos apenas duas semanas em


Willow Castle.

― Perfeito. ― O Marquês a abraçou por trás. ― Mas tem que


me prometer que não vai se preocupar com nada, apenas
comigo e mais ninguém.

― Acredito que posso concordar com esses termos.

CAPÍTULO 18 ― ESCÂNDALO

Londres não sabia falar outro assunto que não fosse a fuga
de Lady Clara Catterfield para se casar em Gretna Green
com o seu noivo, há pouco mais que cinco dias. As
matronas especulavam o motivo de tal atitude, uma vez
que ela já estava prometida em casamento ao homem com
o qual fugira. Nenhuma delas chegou a uma conclusão
satisfatória. Apesar da maioria dos comentários girarem em
torno de uma gravidez antes do casamento, nenhuma
chegou perto do real motivo que os levou a fugirem
rapidamente para se casar na Escócia.

Nem mesmo os Catterfild sabiam o motivo da fuga. E


estavam aflitos, aguardando o retorno da filha, que segundo
a carta que havia deixado, voltaria em alguns dias. Como
não havia como impedir o casamento, não adiantava
mandar buscá-los em Gretna Green, até porque já estariam
casados quando os encontrasse, o mais sensato era
aguardar o retorno de Lady Clara e exigir explicações.

A Duquesa não tinha concordado com aquilo, para ela,


deveriam ter mandado homens imediatamente para evitar o
escândalo, mas o Duque foi contra e deixou que a filha
fizesse o que decidira fazer, pois sabia que em breve ela
estaria de volta.

Lorde Catterfield passava o máximo de tempo fora de casa.


Naquele momento, estava no Rogue’s bebendo e jogando,
enquanto que a Duquesa chorava desconsolada a fuga da
filha, sendo acalentada por Callahran em Catterfield House.

― Callahran, como ela pôde fazer isso conosco? ― ela


choramingava, enquanto apertava a mão do amigo e era
consolada pelas filhas mais novas. ― Por que causar um
escândalo apenas para se casar antes? Eu teria adiantado o
casamento, se fosse necessário, mas ela preferiu fugir...

Como ela pôde fazer isso? O que será das irmãs dela agora?
Como conseguirão casamento com um escândalo desses
sujando nosso bom nome?

― Calma, milady, tente se acalmar, toda essa preocupação


não faz bem à senhora. Tenho certeza de que Lady Clara
terá uma ótima explicação quando regressar.

Callahran tinha suas especulações e em todas elas, a culpa


era apenas do Marquês. Tinha quase certeza de que o
homem tinha seduzido a filha de Lady Catterfield e a
engravidado, por isso, o casamento rápido. E, por ser um
covarde, Winchester não tinha tido peito suficiente para
enfrentar a família da moça e fugiu com ela para se casar,
para não ser preciso confrontar os Catterfield. Quando o
maldito Marquês colocasse os pés naquela casa, ele iria
fazê-lo pagar por aquela desonra causada a Lady Clara.

A noite mal tinha caído quando o mordomo entrou na sala,


anunciando o regresso dos recém-casados. Clara e Gabriel
entraram apreensivos no recinto e um silêncio tenso tomou
conta do ambiente.

― Por quê? ― a Duquesa murmurou, olhando desolada para


a filha. ― Por que nos envergonhou desse jeito? Eu tinha
planejado um casamento grandioso para você.

Clara respirou fundo. Ver a mãe tão triste daquele jeito a fez
sentir-se culpada, mas não poderia permitir continuar
daquela forma.

― Eu sinto muito, mamãe. Não quis envergonhar a família.


A senhora sabe disso.

― Eu sei? Eu a desconheço, Clara. Desde que noivou, eu


não a reconheço mais. Acredito que esse noivado tenha sido
a pior coisa que lhe aconteceu. ― A mulher olhou com ódio
para o Marquês. ― É tudo culpa sua! O senhor a seduziu e a
levou por esse caminho vergonhoso! Nós

abrimos as nossas portas para o senhor, e é assim que nos


retribui? Desonrando nossa filha?

― Eu me casei com ela, não há desonra alguma em um


casamento.

― Em Gretna Green! ― A Duquesa falou o nome como se


fosse um insulto.

― Não deixa de ser um casamento.

Lady Catterfield voltou-se novamente para a filha.


― Ele a seduziu, forçou-a a isso, Clara?

― Na verdade, eu o forcei a isso ― Clara explicou, sentindo-


se corar. ― Queria me casar o mais rápido possível.

― Você está grávida? ― Callahran se pronunciou pela


primeira vez, estava de punhos cerrados e só não tinha
avançado em cima do Marquês ainda, porque Lady
Catterfield usava o seu braço como apoio.

― Não é da sua conta ― Winchester respondeu, fuzilando o


outro homem com o olhar.

― Clara, está, ou não? ― Callahran ignorou


deliberadamente o Marquês.

― Não, até onde sei, ainda não estou grávida ― ela


explicou, para evitar um estranhamento ainda maior entre
os dois.

― Então, por que, minha filha? ― a Duquesa voltou a


perguntar, tentando entender.

― Eu não queria um casamento grandioso. Não queria uma


festa. Queria apenas me casar com ele e nada mais.

― Poderia ter me dito isso, eu teria aceitado fazer uma


cerimônia menor e mais reservada.

― Eu não queria nada disso. Eu fiz o que acreditei ser a


coisa certa.

― A coisa certa? Você enlouqueceu? Fugir para se casar


nunca será a coisa certa. Não pensa na sua família? Nas
suas irmãs? Seu escândalo as deixará vulneráveis para
qualquer outro homem que pense que elas também farão a
mesma coisa que você. Isso, sem contar, no escândalo que
reduzirá ainda mais as chances de elas de se casarem com
alguém importante. Você as arruinou com seu egoísmo tolo.

Aquelas palavras apunhalaram Clara diretamente no peito.


Tudo que ela tinha feito havia sido pela família e ser
chamada de egoísta a fez querer chorar.

O Marquês percebeu o quanto aquelas palavras


machucaram Clara, e a abraçou protetoramente, enquanto
lançava um olhar de fúria para a Duquesa.

― Eu não fiz isso ― Clara murmurou, triste.

― O Duque e eu estamos desapontados com sua atitude.

― Eu não. ― O Duque entrou na sala nesse momento e se


adiantou para onde Clara estava, ignorando todos os outros.
― Meus parabéns pelo seu casamento, minha querida,
estou muito feliz por você.

Ele a abraçou paternalmente e sorriu para ela.

― Seja bem-vindo à família, filho. ― O Duque estendeu o


braço para o Marquês e em seguida também se abraçaram.

Todos naquela sala estavam surpresos com o


comportamento do Duque, inclusive, Clara e o Marquês.

― O senhor não está furioso comigo?

Lorde Catterfield tocou gentilmente o rosto da filha e


enxugou a lágrima que escorria pela face da moça.

― Pelo quê? Por estar tão apaixonada que não pôde esperar
mais para se casar com o homem que ama? Eu ficaria
furioso se tivesse se casado com outro homem, mas como
se casou com seu noivo, eu não tenho nenhuma objeção.
Quanto ao escândalo que sua conduta causará, não

há por que se preocupar, há escândalos bem piores do que


se casar com o noivo a quem está prometida. ― O Duque
então se virou para o Marquês. ― Cuide bem da minha
menina, a honre e cumpra seus votos de casamento. É só o
que peço.

― Pode deixar, senhor.

― Vocês acabaram de se casar, acredito que queiram ir


para Willow Castle. Tem a minha benção. Não percam mais
tempo aqui.

Winchester concordou com a cabeça e após uma reverência


e um cumprimento ao Duque, levou Clara para fora.

Durante a breve viagem de Catterfild House até Winchester


House, Clara permaneceu em silêncio. Ainda estava
fragilizada pelas palavras da sua mãe.

― Eu sinto muito ― o Marquês começou. Odiava ver sua


esposa daquele jeito.

― Não foi sua culpa, eu que pedi que fizesse isso. Você não
me forçou a me casar em Gretna Green.

― Sua mãe irá lhe perdoar com o tempo. Ela estava


preocupada com você, tenho certeza, por isso, agiu daquela
forma.
― Não sei. Ela parecia realmente preocupada que minha
atitude interferisse nos debutes de Caroline e Cristine. E se
ela tiver certa? E se o que eu fiz foi um erro?

― Se arrepende de ter se casado comigo?

― Não de ter me casado, e sim da forma como me casei.


Talvez, se eu tivesse contado a ela sobre as finanças, ela
teria feito algo simples e não precisaríamos fugir para
Gretna Green.

― Talvez sim... Talvez não. Você não pode se culpar por isso,
fadinha. ― Tocou-lhe o rosto com afeto. ― E nem deve, pois,
sentir culpa não vai mudar o que aconteceu. Você fez a sua
escolha, e para você ela é a correta, então, pare de se julgar
pelos padrões alheios. Apenas você sabe o quanto cada
escolha lhe custou, não permita que desvalorizem tudo que
fez.

Aquelas palavras associadas ao olhar do Marquês, que


estava fixo no dela, fez Clara sorrir.

― Você é incrível, sabia? ― Deitou-se no ombro de seu


marido. ― Obrigada por estar comigo

― Sempre.

CAPÍTULO 19 ― WILLOW CASTLE


Tinham passado a noite em Winchester House. Durante a
manhã, pouco antes de seguirem viagem, receberam a
visita de Carmelita. Ela tinha deixado Catterfield House para
ir junto com Clara, como sua criada pessoal. Ordem do
Duque. Lorde Catterfield tinha mandado junto com
Carmelita, alguns pertences pessoais de Clara, já que na
fuga ela não tinha levado nenhum.

Os recém-casados seguiram em uma carruagem, enquanto


que Carmelita seguiu em outra, junto dos pertences de
Clara.

Clara estava mais conformada com a situação de sua


família, mas não pensou muito no assunto, Winchester a
manteve ocupada a maior parte do dia, entre conversas,
beijos e carícias bastante ousadas na carruagem. Quando a
noite caiu, pararam na estalagem para passarem à noite.

Era a mesma estalagem que sempre parava quando ia para


casa. Assim que entrou, o dono da estalagem o saudou
animadamente.

― Boa noite, Lorde Winchester. Bem-vindo novamente.


Deixei o quarto de sempre preparado para o senhor.

― Agradeço.

O homem ficou confuso ao ver as duas mulheres que o


acompanhavam. Elas não pareciam como as outras que
costumavam viajar com o Marquês.

― Permita-me apresentar-lhe, Lady Clara Winchester, minha


esposa ― o Marquês explicou, ao ver a surpresa estampada
no rosto do ancião.

― Oh, mas que notícia maravilhosa. Muito bem-vinda,


milady! Minhas felicitações pelo casamento. ― O
estalajadeiro sorriu, realmente feliz com aquela notícia.
Sempre tinha gostado do Marquês e saber que agora estava
casado, o encheu de alegria.

― Obrigada ― Clara respondeu, educada.

O estalajadeiro voltou-se para Winchester.

― Milorde, nesse caso, permita-me realocá-lo para um


quarto mais apropriado onde terá mais conforto.

O Marquês concordou com a cabeça e o homem o guiou


pelas escadas para um quarto no final do corredor, que era
bem maior do que aquele no qual o Winchester costumava
ficar.

― Você costuma sempre vir aqui? ― Clara perguntou, assim


que ficaram a sós.

― Sim, é praticamente parada obrigatória quando não


quero viajar à noite, ou quando estou acompanhado com
alguma moça para Magdala.

― Você costuma dividir o quarto com elas? ― Clara nem


sabia por que estava perguntando aquilo, pois não queria
saber da resposta.

― Não, minha fadinha, eu nunca durmo com elas. ― O


Marquês sorriu ao ouvir o ciúme na voz de Clara. ― Sempre
peço dois quartos separados.

― Que bom, então. ― Clara sorriu, mais aliviada.

― Gosto do seu ciúme.

― Não estou com ciúme.


Winchester se aproximou da esposa e tocou-lhe a mão,
depois começou a retirar a luva que ela usava e beijou-lhe
os dedos, um de cada vez.

― Uma pena, então, pensei que precisaria lhe mostrar que


não precisa sentir ciúme de

mim, pois só desejo você... ― O Marquês se afastou um


pouco de sua esposa ― Mas como não está com ciúme,
creio que podemos apenas descansar.

Dessa vez, Clara se aproximou do Marquês, segurando nas


lapelas de seu casaco e ficando na ponta dos pés, para
beijar-lhe os lábios.

― Acredito ter sentido um pouco de ciúme sim ― admitiu


entre um beijo e outro. ― Na verdade, estou muito
enciumada. Terá que provar-me várias vezes que não há
nenhum motivo para tal sentimento.

― Será um prazer, Lady Winchester.

Clara sorriu e deixou que o marido a levasse nos braços


para a cama.

Na manhã seguinte, Clara acordou antes do Marquês.


Winchester dormia como um anjo.

Seu marido tinha um sono pesado. Ambos estavam nus,


embaixo da grossa coberta, e mantinham-se aquecidos pela
lareira que foi acesa na noite anterior, e agora estava quase
apagada. Mas como o sol já surgia no horizonte, o frio não
persistiria por muito tempo.

Clara decidiu então observar um pouco o marido antes de


acordá-lo. Ele era mesmo muito belo, o corpo bem
desenvolvido, braços e peito fortes, algumas cicatrizes leves
e outras não tão leves, recorrentes de algumas brigas que
ele deve ter tido na juventude.

Um movimento do Marquês fez o lençol que o cobria


deslizar para o lado e deixou exposto o quadril e boa parte
de suas coxas, que eram grossas e firmes.

Clara mordeu o lábio diante da nudez do marido. Havia visto


muitas mulheres colocar o membro do homem na boca e
assim fazê-lo crescer. Será que ela conseguiria fazer aquilo?

Antes que perdesse a coragem, se ergueu da cama e,


tentando não acordar seu marido, se inclinou para poder
tocar aquela parte que tanto dava a ela prazer. Inicialmente,
tocou apenas com a mão, mas a imagem das Damas de
Vermelho usando a boca, não lhe saia da mente e ela
decidiu tentar fazer o mesmo.

Beijou o membro de seu marido e o pôs na boca.


Winchester gemeu, mas não acordou.

Ela sentiu a confiança crescer. Havia reconhecido aquele


gemido das vezes que ele a tinha penetrado, então,
significava que ele tinha gostado. Voltou a colocá-lo na boca
e a sugar levemente. Sentiu que o membro crescia e ficava
maior a cada movimento. Isso a deixou excitada e confiante.

Olhou para o rosto do marido e o viu acordar aos poucos. A


mão dele afastou os cabelos de Clara do rosto e ele sorriu,
maravilhado, para a esposa.
― Maldição, fadinha, vou querer acordar assim todo dia.
Que boca maravilhosa, não pare ― ele a elogiou e gemeu
logo em seguida, quando ela intensificou os movimentos.

Clara nada disse, não era preciso. Continuou a repetir os


movimentos, até que sentiu a mão do Marquês em sua
cabeça guiando-lhe num ritmo mais acelerado, e logo o se
marido investia em sua boca também com a pelve.

― Se continuar assim, eu jorrarei na sua boca. Venha,


sente-se em mim, quero derramar minha semente dentro de
você.

Clara o obedeceu e se ergueu, Winchester a tocou para ver


se ela estava molhada o suficiente para poder penetrá-la e
gemeu quando constatou que sim.

― Sente-se em mim, fadinha. ― Ele guiou o quadril de sua


esposa para se encaixar no seu e Clara começou a se
movimentar em um ritmo acelerado.

Winchester alcançou o êxtase rapidamente e se derramou


dentro de Clara. Esta continuou se movimentando, até que
conseguiu sua liberação.

― Você é uma mulher incrível. ― Winchester sorriu, saciado


e feliz.

E Clara ficou encantada com o elogio.

― O sol já nasceu, vamos continuar nossa viagem. ―


Gabriel se levantou, apesar da vontade de permanecer
deitado com sua mulher. ― Vou descer e pedir que
preparem o nosso café e aproveito e mando Carmelita subir
para lhe ajudar com o vestido.

― Obrigada.
Após tomar o café no quarto, Clara desceu para se juntar ao
Marquês, que tinha terminado de comer antes dela e
aproveitou para ajudar no carregamento das carruagens e,
assim, adiantarem sua partida.

Enquanto passava pelo corredor junto com Carmelita, ela


ouviu duas criadas conversando, enquanto arrumavam um
dos quartos que estava vazio. Ao ouvir o nome de seu
marido na conversa, ela parou ao lado da porta aberta e
escutou.

Carmelita olhou para Clara, confusa, e ela pediu um pouco


de paciência e silêncio, queria escutar o que as mulheres
falavam.

― Você o viu?

— Eu vi! Ele é tão lindo e aquele sorriso dele... fico quente


só de olhar. Pena que agora se casou — uma delas disse e a
outra riu. — Você chegou a vê-la?

— Não. Quando fui deixar a comida, quem atendeu a porta


foi o Marquês. E eu até me esqueci de tentar olhar para
dentro do quarto. Aquele homem é uma tentação.

― Quanto tempo você acha que ele vai demorar para levar
outra mulher, que não seja a esposa, para a cama? — a
outra perguntou.

Clara cerrou os punhos. Não estava gostando daquela falta


de respeito para com seu marido. Estava prestes a ir
embora quando a outra mulher respondeu à pergunta.

— Eu não dou um mês, afinal, ele é um Winchester, e nós


sabemos que um homem como ele não se contenta com
uma única mulher, logo vai se cansar da esposa. Você via a
forma que as mulheres olhavam para ele, bastava ele
estalar os dedos e elas se jogariam em sua cama, até eu me
jogaria na cama dele se ele quisesse. Essa aí pode até ser a
esposa, afinal, é uma lady, mas a vida dele será ao lado de
muitas mulheres, assim como o pai dele.

Assim que ouviu passos se aproximando da porta, Clara e


Carmelita apressaram-se em sair. A lady estava furiosa com
aquelas mulheres, com seu marido e consigo.

― Que ele é um libertino, já sabíamos. ― Carmelita tentou


amenizar o que tinha escutado. ― Mas não acredito que ele
vá lhe trair. Ele a olha como um homem apaixonado, minha
criança. Não deixe que a conversa dessas duas tolas lhe
façam duvidar do seu marido.

― Acha que ele está apaixonado por mim? ― Clara


perguntou, esperançosa.

― Tenho quase certeza que sim. Mas creio também que ele
lhe dirá em breve.

A lady encontrou o marido no balcão conversando com o


dono da estalagem. Assim que ela ficou ao lado dele, ele
passou os braços por sua cintura em uma demonstração
pública de afeto e sorriu para ela.

Quando ele a olhava daquele jeito, era impossível não


querer acreditar em todas as promessas que ele fez.

Não demorou muito e ambos já estavam na carruagem a


caminho de Willow Castle. Lady

Clara observava seu marido. Era engraçado como agora ele


parecia diferente aos seus olhos. Ele parecia mais feliz e
despreocupado, como se um peso tivesse saído de seus
ombros. Ele realmente parecia feliz com o casamento. E
quando sorria para ela e a olhava como se fosse a única
mulher do mundo, podia jurar que Carmelita estava correta
em suas especulações.

— Você está silenciosa hoje — ele chamou a atenção da


esposa.

— Estou apenas apreciando a vista. Você está bem


animado. ― Ela sorriu para seu marido.

— Eu estou — ele confirmou, abrindo um sorriso matreiro.

— Posso saber o motivo? — Clara inclinou a cabeça,


esperando a resposta de seu marido.

Ele ficou um tempo pensativo. Parecia estar medindo as


palavras, o que a deixou curiosa.

— Eu pensava que meu casamento seria um fardo. A pior


coisa que me aconteceria.

Esperava isso, na verdade. E agora que estou casado com


você, eu não gostaria de estar em nenhum outro lugar,
senão nesta carruagem a caminho de nossa casa. — O
Marquês inclinou a cabeça, imitando sua esposa. — Acho
que gosto de você, Lady Winchester. Você é o motivo de
minha felicidade.

A confissão do Marquês a deixou muda. Ele parecia tão


sincero ao expor seu sentimento, que Clara sentiu o coração
acelerar.

Ele estava apaixonado por ela? Era isso? Ou queria tanto


que fosse verdade, que estava vendo sentimento onde não
tinha?

— Eu... eu.... — Clara gaguejou e o Marquês riu.


— Não precisa dizer nada. Não falei esperando que
repetisse as palavras para mim.

— Você gosta de mim? — a lady perguntou novamente para


se certificar.

— Gosto sim. — Winchester repetiu, com um sorriso que a


deixou aquecida. ― Não acredita?

Era tão surreal que ele tivesse mudado tanto em tão pouco
espaço de tempo. Na verdade, ele sempre tinha tratado
Copas daquela forma, com flertes e agrados, mas ter a
mesma atenção como Clara ainda era novidade para ela,
pois ele tinha lhe reservado apenas a educação e a
amizade.

— É que até pouco tempo atrás o senhor tentava cancelar o


casamento, porque amava outra mulher — Clara comentou,
lembrando o passado. — E agora gosta de mim...

Aquelas palavras tiraram o sorriso do rosto do Marquês e ele


ficou novamente pensativo.

— Tem razão, deve ser confuso o fato de eu ter me


apaixonado pela mulher forte e independente que Copas
era, ao mesmo tempo, ter lhe odiado e agora dizer que
gosto de você.

Mas se você pensar um pouco, o fato de eu gostar de você é


porque você é Copas. Eu nunca parei de gostar dela, ou
talvez, eu nunca tenha lhe odiado de verdade.

Aquelas palavras doeram em Clara, ainda que não


devessem.

— Então, durante tudo o que passamos, você pensava em


Copas e não em mim?
— Não. Para mim as duas são a mesma pessoa... e
realmente são. Copas é a mulher determinada e independe
que há em você, enquanto Clara, é a mulher altruísta e que
se doa pelo que acredita, sem se importar com o preço que
vai pagar. E eu descobri que gosto das duas, tanto da lady
quanto da jogadora. ― O Marquês suspirou, audivelmente.
Apesar das noites maravilhosas ao lado dela, apesar de
terem ardido de desejo um pelo outro, parecia que nada do
que sentiram poderia compensar o que ele havia dito e feito
no passado. Isso o entristeceu. ― Eu não queria ver o que
estava diante de meus olhos. Eu estava cego. Só pensava
em fugir do casamento, não queria me casar com ninguém.
Eu teria odiado qualquer mulher que me fosse dado

como noiva, porque eu teria que fazer aquilo que eu menos


desejava.

— Por quê? — Clara tentava entender seu marido. — Por


que era tão avesso ao casamento?

Por uns instantes, o Marquês ficou em silêncio, e Clara


pensou que ele não responderia.

— Quando eu era criança, eu vi minha mãe definhar e


morrer na minha frente, por causa de meu pai. Ele não
honrava o casamento que tinha com minha mãe, e não a
respeitava. Ele era um libertino antes de casar e havia
continuado a agir como um após o casamento. Minha mãe o
amava.

E pouco antes de ela morrer, me fez prometer que nunca


faria a mesma coisa que meu pai fez. Ela me fez prometer
nunca trair minha esposa, pois foi isso que a fez pegar a
doença que a matou. Eu passei a vida temendo me tornar o
homem que meu pai queria que eu fosse, temia me tornar
um libertino como ele, e acima de tudo, tinha medo de que
quando me casasse, meu sangue Winchester falasse mais
alto. Todos esperam que eu seja igual ao meu pai, e ao pai
dele, todos me julgam um libertino, por apenas eu ser um
Winchester. Mas eu não sou como eles. E se depender de
mim, nunca serei. ― Winchester se abriu com a esposa, não
iria guardar nenhum segredo dela.

― Eu não sabia de nada disso. Sempre acreditei que era


realmente um libertino. ― Clara se lembrou das vezes que o
tinha acusado de ser um libertino, ou um canalha ― Eu
disse palavras horríveis para você. Peço o seu perdão.

― Não precisa pedir perdão, você não sabia, e eu já estou


acostumado com isso. Todos vêm apenas o que querem ver.
Eu não quero ter segredos com você. Quero que me
conheça como eu realmente sou.

Clara sorriu. Definitivamente, seu marido era diferente de


todos que conhecia. Ele era fascinante.

― Então, o senhor não é um libertino? ― Ela sorriu ao falar,


mais em tom de afirmativa do que de indagação.

―Temo que não. ― Ele sorriu, ao perceber o clima ficar mais


leve.

― Com quantas mulheres esteve?

― Antes de você? Apenas uma.

― Está falando sério? ― Clara surpreendeu-se.

― Sim. Eu não mereço nem um décimo da fama que tenho.


Todas são boatos infundados, a maioria deles e os mais
atuais, criados pelas prostitutas que ajudo. Elas gostam de
fazer inveja umas às outras, dizendo que já estiveram
comigo na cama.
Clara sorriu ao saber daquilo e sentiu-se compelida a beijá-
lo naquele momento. Estava sentada no banco em frente ao
marido, e em uma onda de ousadia, ela se levantou e
sentou-se no colo de Winchester, que sorriu malicioso para
a esposa.

― Agora, só terão inveja de mim, pois serei a única mulher


a provar da sua libertinagem.

― Sim, sou todo seu ― ele sussurrou no ouvido dela,


enquanto beijava-lhe o pescoço e mordiscava-lhe a orelha.
― E você é só minha. Não quero saber dos outros homens
que conhece e, muito menos, de Callahran lhe dando
presentes. Se bem que agora que é minha esposa, ele não
terá mais essa ousadia.

Clara gargalhou diante do ciúme evidente de seu marido.

― Milorde, não há o que temer vindo de Lorde Callahran, ele


é padrinho das gêmeas e é como se fosse o nosso tio. Ele
não pode ter filhos e nos têm como família. Não há motivos
para se preocupar, isso eu lhe garanto.

― Acredito em você. ― Winchester beijou a clavícula de


Clara. ― Mas continuo não gostando dele.

― Ele é um bom homem ― garantiu.

― Está bem. Não quero mais falar de Callahran, quando


posso fazer coisas mais interessantes com a boca.
A chegada do Marquês e sua esposa em Willow Castle
causou grande alvoroço entre os criados, que se
organizavam na frente da casa para acolher seu senhor e
sua nova senhora.

Estavam curiosos a respeito da nova Marquesa. E


murmuravam entre si, especulando como ela seria. Assim
que a carruagem parou em frente a eles, silenciaram em
expectativa e olhavam atentos Gabriel descer da carruagem
e estender a mão para ajudar Lady Clara.

Lady Winchester sentia todos os olhares sobre ela. E apesar


de serem apenas os criados, ela se sentiu nervosa. Os
criados de sua família eram leais e competentes, e ela não
esperaria menos dos que agora lhe serviriam.

Winchester a pegou pela mão e se postou na frente de seus


criados.

― Conheçam Lady Clara Campbell Deen Anbrock, Marquesa


de Winchester, minha esposa e sua senhora.

O mordomo deu um passo à frente e a saudou. O homem


era alto e magro, seu cabelo estava puxado para trás o que
evidenciava a sua calvície. Ele tinha um nariz bem
proeminente e um semblante extremamente sério e focado.

― Seja bem-vinda, milady, estamos honrados em


finalmente conhecer tão distinta dama e estar aos seus
serviços. Eu sou Antoine Vasson, o mordomo ― o homem se
apresentou com um leve sotaque francês.

Em seguida, o mordomo apresentou cada membro


masculino da criadagem, indicando sua função. E logo, foi a
vez da governanta se apresentar. Ela era uma senhora
rechonchuda, com cabelos grisalhos e rosto corado e era
muito simpática, desde que Clara tinha chegado, ela não
havia tirado o sorriso do rosto nem por um segundo.

― Eu sou a governanta, Sra. Prayt ― a mulher se


apresentou e em seguida apresentou as outras mulheres
sob seu comando. ― Assim que a senhora estiver
descansada da viagem e quiser, eu ficarei honrada em lhe
mostrar o castelo.

― Pode deixar que eu mesmo mostrarei o castelo para


minha esposa, Sra. Prayt ―

Winchester anunciou e, em seguida, dispensou os criados.


— Podem voltar para seus afazeres agora.

Os criados se curvaram e voltaram para seus postos,


entretanto, alguns permaneceram para descarregar as
carruagens e levar as bagagens para os dormitórios do
Gabriel e de Clara.

— Venha, quero mostrar-lhe nosso quarto. — O Marquês a


tomou pela mão e a guiou pelo castelo, fazendo-a sorrir.

― Acredito que poderíamos conhecer apenas o quarto


hoje... Teremos tempo para o restante da casa amanhã, e
depois de amanhã e depois de depois de amanhã ― Clara
comentou, quando ele a guiava pelas escadas e corredores,
em direção ao quarto principal.

― Está mais que certa, esposa. O que acha de testarmos a


cama para ver se lhe agrada?

― Essa é uma ideia formidável, meu marid... ― ela


concordou, perdendo as palavras entre um beijo e outro e
assim ele fez.
Winchester a fez testar a cama em várias posições
possíveis.

E quando Clara estava nos braços do Marquês, quase


adormecida, Gabriel percebeu o quanto ela era perfeita para
ele. E estava decidido a fazê-la se apaixonar, assim como
ele já estava apaixonado.

Mais tarde naquele dia, Clara acordou sozinha na cama. O


sol estava se pondo, o que significava que ela devia ter
dormido bastante e perdido parte do dia, mas não se
importou, estava feliz e descansada da viagem.

Carmelita apareceu na porta para ver se ela tinha acordado,


e assim que a viu, entrou no quarto.

― Minha senhora, seu marido pediu para informá-la quando


acordasse que ele precisou sair, mas logo retornará. Ele
pediu também que o espere para o jantar.

― Tudo bem. ― Clara sorriu. ― Acho melhor eu me banhar e


esperar meu marido para o jantar.

― É claro. ― A criada se animou ao receber a ordem. ―


Pedirei que tragam água quente e voltarei para ajudá-la a se
despir.

― Creio já estar despida. ― Clara corou e Carmelita riu.

― Fico feliz ao vê-la tão sorridente assim ― a criada


comentou, com um sorriso maternal no rosto.
― Ele me faz feliz. ― Clara suspirou, apaixonada.

Durante o banho, Clara voltou a pensar no Marquês. Ele era


tão maravilhoso quando estavam compartilhando a cama,
fazia com que ela se sentisse tão perfeita que não queria
sair nunca de seus braços. Era tão delicioso ouvir a
respiração ofegante dele, senti-lo a apertar em seus braços,
enquanto a preenchia com seu sexo. E senti-lo derramar-se
dentro dela a deixava extasiada.

Será que já estaria esperando um filho dele?

Automaticamente, ela levou a mão à barriga, e seus


pensamentos se encheram com a imagem de um garotinho
de cabelos castanhos como o pai e olhos acinzentados
como os da mãe.

Ou talvez, tivesse os cabelos e olhos do pai. Qualquer que


fosse a aparência que tivesse, ela sabia que ele seria
perfeito, seria o filho deles.

Nunca tinha pensado em filhos, mas agora que a


possibilidade era real, sentia o desejo de ser mãe aflorar
como se sempre tivesse estado ali. E, para sua surpresa,
Clara ficou esperançosa com a possibilidade: queria muito
um filho de Gabriel.

― Quando tiver esperando um bebê, saberá ― Carmelita


comentou emocionada ao vê-la tocar o ventre. ― Tenho
certeza de que será uma mãe maravilhosa.

Saiu da tina com um enorme sorriso e, com a ajuda da


criada, se vestiu. Em breve saberia se os momentos que
passaram juntos havia dado frutos. Mulheres grávidas não
tinham suas regras.
Era isso que as prostitutas diziam e muitas temiam ficar
sem as suas, mesmo que odiassem tal período, justamente
por saber que era sinônimo de gravidez.

Quando terminou de se arrumar, Carmelita guiou Clara para


o salão onde seria servida a refeição e ali ficou esperando o
Marquês.

Não precisou esperar muito, pois o seu marido logo


retornou, tendo ao seu lado uma mulher que carregava em
seu colo uma criança, que possuía os mesmos cabelos e
olhos castanhos tão característicos da família Winchester.

E o Marquês olhava a criança com tanto carinho, que Clara


pensou que poderia ser filha bastarda de seu marido. Clara
observava o marido se aproximar da mesa com a mãe e a
criança.

Não sabia por que, mas pensar que aquela era filha dele,
lhe deixou com o coração apertado.

Mas se tivesse uma filha, ele teria dito, não? Teria


mencionado a criança em algum momento, ele era muito
protetor com a família, não abandonaria sua filha de modo a
nem sequer lembrar-se de sua existência e informar sua
noiva.

Constatou que estava esperando o pior de seu marido. Não


era assim que queria o seu casamento. Precisava confiar
nele e aquele pensamento era injusto com o Marquês.
Deixaria que ele se explicasse, em vez de tirar conclusões
precipitadas e errôneas. Respirou fundo, para colocar seus
pensamentos em ordem e abriu um sorriso para os recém-
chegados e, à medida que eles se aproximavam da mesa,
ela sentiu que realmente havia sido uma tola ao suspeitar
que a criança pertencesse a seu marido, apenas por ter
certa semelhança. Era realmente uma tola.
O Marquês segurava a mãozinha da garota e assim que
pararam em frente à Clara, a garotinha ergueu os olhos e
abriu um sorriso enorme, mostrando o buraquinho que
tinha, por causa da falta de um dos dentes. Agora que a via
mais de perto, percebeu que ela tinha cabelos de um
castanho mais escuro que o do Marquês e as mechas de
cabelo faziam cachinhos ao redor de seu rosto arredondado.

— Lady Clara, gostaria de lhe apresentar Alinn Geovana


Candel.

A criança fez uma reverência rápida e animada. E então fez


uma careta, olhando para Gabriel.

— Eu também sou uma lady. Uma princesa.

— Mil perdões, alteza. — Gabriel fez uma reverência e


voltou a anunciá-la como a garotinha queria. — Sua alteza
real, a princesa Alinn Geovana Candel.

Clara olhou para o Marquês e ele lhe deu uma piscadela e


um sorriso que a fez esquecer qualquer dúvida que ainda
houvesse sobre a paternidade. Então, voltou-se para a
garotinha e fez exatamente o que ela queria, para o fascínio
do Marquês e da garota.

— Estou encantada, Majestade. — Clara fez uma pequena


reverência, achando graça com a garotinha.

Alinn arregalou os olhos ao ver a lady lhe cumprimentando.


Normalmente, os adultos a ignoravam, ou a olhavam com
indiferença. Exceto, Lorde Winchester. Era por isso que
gostava tanto dele.

Gabriel chamou a atenção de Clara, que ainda sorria para a


pequena Alinn, ao dar um passo para onde estava a mãe da
criança.
— Lady Clara, esta é...

— Sou Fernanda Candel — a mulher se adiantou, impedindo


que o Marquês a apresentasse, e Clara percebeu uma troca
de olhar entre ambos, o Marquês estava com a mandíbula
cerrada, como se não tivesse gostado da intromissão.

Fernanda era um pouco mais baixa que Clara. Possuía


cabelos lisos, curtos e loiros, quase amarelos e, para a
surpresa da Marquesa, estavam completamente soltos e
sem nenhum adorno. A mulher ainda tinha o rosto em
formato de coração e era muito bonita.

— É um prazer, senhora. Seja bem-vinda — Clara saudou,


com um sorriso. Seria uma anfitriã exemplar.

— Não sou casada, milady. — A mulher ergueu o nariz,


mostrando que não se importava

com sua situação. — Então, pode me chamar pelo meu


nome de batismo mesmo. Pois também não me adequo ao
senhorita, afinal, já tenho uma filha.

Clara sorriu com aquilo. Tinha convivido tempo suficiente


com as Damas de Vermelho para deixar de lado qualquer
preconceito que um dia tivera em relação à mulheres da
vida. O

clube havia lhe ensinado a vê-las apenas como mulher e


nada mais. E, por isso, não se importou que ela não fosse
casada. Se chegasse a antipatizar com Fernanda, não seria
por ela ser uma prostituta e, sim, por faltar-lhe caráter ou
respeito.

— Tudo bem. O jantar será servido em breve, junte-se a nós


— Clara convidou.

— Será um prazer, milady. — A mulher a olhava surpresa e


desconfiada com a atitude da nobre.

— Vou levar Alinn para o quarto. — Ann se aproximou e


segurou a mão da pequena.

— Mas eu quero ficar com a mamãe. — A criança olhou para


a mãe e em seguida para Gabriel, suplicante, e o Marquês
respirou fundo e se abaixou para falar com ela.

— Eu sei, pequena, mas nós teremos uma conversa chata


de adulto e você vai ficar cansada rapidinho. Além de que,
já está tarde e você precisa dormir. Então, seja uma boa
menina e vá com a Ann. Amanhã você toma o desjejum
conosco, combinado?

— Mas eu queria ficar. — Alinn fez um bico com os lábios.

— Eu sei. Mas se ficar, não vai conseguir acordar a tempo


do desjejum e vai perder a torta que a senhora Jenny fará.

— Torta de maçã?

— Exatamente.

— Nesse caso, acho melhor eu ir dormir. — A garotinha


pegou a mão da criada e a puxou na direção das escadas,
enquanto comentava com Ann que a torta da senhora Jenny
era a melhor torta do mundo.
Assim que o Marquês se pôs à mesa, a janta foi servida.
Clara não pôde deixar de notar os modos impecáveis da
mulher.

— Sua filha é uma menina muito doce — Clara comentou,


tentando iniciar uma conversa e quebrar o silêncio. — E
muito linda também.

— Obrigada, milady — a mulher agradeceu e em seguida


voltou a atenção para o seu prato. Ao que parecia, não era
muito dada à conversas.

Dessa forma, Clara teve que deixar a conversa para o seu


marido, já que a mulher não parecia disposta a dialogar com
ela.

Assim que Lady Clara se levantou, após o término da janta,


e seguiu para o andar de cima, Winchester suspirou e olhou
para Fernanda.

— Eu sei o que vai dizer. Quer contar a verdade a ela. Mas


eu só consegui me manter escondida até agora, justamente
por manter em segredo minha identidade. Se começar a
contar a um e a outro, não terá servido de nada mudar meu
sobrenome ou minha aparência.

— Eu confio na minha esposa e você sabe que eu protegerei


você. Frederick não colocará a mão em você. Mas sabe que
poderia contar também com a ajuda de Montress, você
devia tentar uma reconciliação com ele, eu sei que ele a
ama e a protegeria, tanto quanto eu.

— O que um barão poderia fazer contra um conde? E nós


dois sabemos que Frederick nunca me deixará em paz.
Ficando longe dele, eu também mantenho Bernardo longe
de confusão.
Eu nunca poderei voltar para casa como ele quer, estaria
levando desonra para os Montress.

— Tenho certeza de que ele preferiria tê-la de volta à


segurança de seu lar, a manter o nome da família
imaculado. E a culpa não foi sua, não devia se envergonhar.
Frederick a enganou.

— Eu acreditei nele. Então, a culpa também é minha. Eu


devia ter imaginado que ele não iria cumprir suas
promessas.

O Marquês suspirou, sentindo o peso da culpa lhe apertar o


coração.

— Eu me arrependo amargamente de tê-la apresentado a


ele.

— Não foi culpa sua. Ninguém imaginava que ele seria


capaz de fazer isso.

— Sim, mas eu sabia que ele estava noivo. Só isso já era


motivo suficiente para não ter apresentado você, quando
ele pediu. Não pensei que ele fosse enganá-la como fez.

— Não adianta se martirizar por algo que não pode ser


mudado. Apenas sofrerá em vão.

Não pensemos mais nisso.

Winchester respirou fundo e passou os dedos nos cabelos.

— Eu preciso subir para ver minha esposa. Sinta-se à


vontade para ficar pelo tempo que precisar, junto com a
Alinn.
— Eu agradeço, mas retornarei ao nascer do sol para
Magdala, as meninas precisam de mim lá. E eu soube que
Frederick voltará para casa dentro de uma semana, quando
terminar a festa de Lorde Guilis, caso ele decida aparecer
por lá, eu poderei lidar com ele mais aliviada, sabendo que
Alinn está segura aqui. Assim, ele não poderá usá-la para
me atingir.

— Ele não ousará vir aqui. Deixei bem claro, há quatro anos,
que ele não é bem-vindo.

— Eu sei, por isso que a trouxe. Aqui é o único lugar onde


ele não pisaria, nem mesmo para felicitar o primo pelo seu
casamento recente.

— Espero mesmo que ele não venha testar minha paciência.


Mas, por via das dúvidas, deixarei meus criados cientes que
ele não é bem-vindo e também enviarei alguns homens
para Magdala. Apenas por precaução.

Fernanda assentiu e, após um momento de silêncio, disse:

— Eu agradeceria se não contasse sobre mim à sua esposa,


ou, pelo menos, omitisse o máximo possível sobre minha
família, sem causar prejuízo ao seu casamento. Não quero
que me associem a irmã do Barão de Montress, não quando
tentei ao máximo esconder isso de todos.

— Tentarei falar a verdade, sem te expor. Não posso e nem


quero mentir para a minha esposa.

— Eu agradeço. — Fernanda se levantou da mesa. — Agora,


se me permite, vou ver minha filha.

A mulher se retirou do salão e, em seguida, foi a vez do


Marquês fazer o mesmo.
Ele subiu as escadas, apreensivo, estava temeroso do que
sua esposa podia estar pensando dele. Mas não tinha
escolha.

Quando havia acordado, depois de fazer amor com Clara,


um criado o esperava com uma mensagem urgente de
Magdala e ele precisou partir. Clara estava dormindo
profundamente e ele não quis acordá-la, apenas para
informar seu paradeiro. Acreditava que estaria de volta
antes que ela despertasse. Se tivesse levado a carruagem
dele, talvez tivesse retornado antes, mas não imaginava
que teria que voltar com Fernanda e Alinn a tiracolo. E não
teve outra opção a não ser acompanhar o ritmo da carroça
delas que, para a sua infelicidade, era puxada por uma
velha égua e precisava seguir em um ritmo lento. Por esse
motivo, acabou levando mais tempo do que o necessário.

Quando chegou, sua esposa já o esperava e ele viu a


surpresa e até uma desconfiança no semblante dela. E por
estarem na frente da visita, ele sabia que ela havia
segurado as perguntas que passavam por sua mente.

Gabriel as responderia com prazer, só esperava que ela não


tivesse tirado conclusões precipitadas a respeito de Alinn.
Não poderia culpá-la por achar que Alinn era sua filha e
Fernanda sua amante, afinal, as características de Alinn a
faziam se passar facilmente por uma Winchester, uma vez
que Frederick Winleave era seu primo e ambas as famílias
carregavam características físicas muito semelhantes.

Winchester entrou no quarto, sem bater. Sua esposa estava


sentada na penteadeira escovando seus cabelos. Já tinha
vestido o roupão, que usaria para dormir, e parecia uma
ninfa sedutora em frente ao espelho.

Os cabelos dela eram longos e pareciam brilhar sob a luz


das velas. E ele se esqueceu momentaneamente por que
estava ali, hipnotizado pelos movimentos que sua esposa
fazia.

Winchester permaneceu observando-a em silêncio, até que


ela o viu pelo espelho. Clara respirou fundo e voltou-se para
ele.

― Ela é a outra amante que teve? ― Clara perguntou, mas


não havia julgamento em sua voz, apenas curiosidade e
ciúme.

— Oh, não. Ela nunca foi minha amante. — Winchester


sorriu ao notar o ciúme na voz e no semblante de Clara. — E
já adianto que Alinn também não é minha filha.

A Lady corou por ter cogitado essa possibilidade.

— Eu sei. Quando os vi ao longe percebi certa semelhança,


e até pensei que pudesse ser, mas depois eu percebi que
você não teria escondido algo dessa magnitude de mim e,
muito menos, deixado uma filha, mesmo que bastarda,
longe de sua vida ― Clara expôs. ― E também teriam
rolado mexericos a respeito disso. E nenhuma fofoca relata
a existência de um filho seu.

— Tem razão, eu jamais esconderia de você algo assim, e


está certa, eu teria assumido a criança se ela fosse minha.
Mas nunca tive, ou sequer, pensei em Fernanda como minha
amante.

— Eu fico feliz em ouvir isso. — Clara deu passos na direção


do marido e o abraçou. —
Não quero que se canse de mim. Não quero que tenha
amantes.

— Eu nunca me cansarei de você, fadinha. Nunca. Você é


minha para todo sempre.

Após essas palavras, o Marquês a beijou e a levou para


cama. Jamais se cansaria de perder-se nela. Disso, tinha
certeza.

Clara estava deitada no braço do Marquês. Estava feliz por


ter confiado em seu marido, mas ainda tinha muitas
perguntas sobre a criança e sua mãe.

― Então, se você não é o pai, de quem ela é filha?

― De um primo meu.

― Oh. Por isso, a semelhança física.

― Sim. Infelizmente, somos parecidos.

― Ele não quis assumir a criança?

― Frederick não sabe que é o pai da Alinn. A Fernanda


conseguiu esconder isso dele por quatro anos. E agora está
nas redondezas, na casa de um amigo e ela teme que ele
descubra. Como

Frederick não é bem-vindo no castelo, ela sempre deixa


Alinn aqui quando ele está por perto.

― Entendi. Você se importa muito com ela ― Clara


comentou, um pouco enciumada.

O Marquês sorriu ao perceber o ciúme na voz da esposa.


― Não precisa sentir ciúme, meu amor, Fernanda é apenas
uma amiga muito querida e me preocupa o bem-estar dela,
uma vez que sinto-me responsável por sua situação.

― Como assim?

― É uma longa história. E não posso te falar muito sobre


Fernanda, pois não cabe a mim contar. Mas contarei o que
eu posso.

Clara assentiu e esperou o marido contar a história de


Fernanda, o que podia revelar, na verdade.

― Eu conheço Fernanda há algum tempo. O irmão dela e eu


éramos melhores amigos. Eu dei uma festa aqui no castelo,
que duraria uma semana e a convidei, mas seu irmão não
pôde vir, entretanto, confiava em mim e mandou-a junto
com uma dama de companhia. Meu primo, Frederick,
também tinha sido convidado, e assim que ele viu Fernanda,
pediu que eu os apresentasse. E eu o fiz. Me arrependo até
hoje de tê-lo feito. Eu não sabia que nessa semana ele a
seduziria e tiraria a sua virtude. Ela voltou para casa, sem
dar uma palavra, e eu só soube que alguma coisa tinha
acontecido quando, um mês depois, eu amigo me procurou
para dizer que ela tinha fugido de casa. Foram meses de
procura, em vão.

“Eu ajudei a procurar por todos os lugares. Mas ela tinha


sumido. E quando pensei que jamais a encontraríamos, o
meu irmão me procurou e disse que sabia onde ela estava.
Ele pediu que eu não avisasse ao irmão dela, porque
Fernanda não queria voltar para casa e era preciso respeitar
a vontade dela. Eu concordei em não contar nada, até que
ela permitisse e, então, Samuel me levou até ela.

Quando a encontrei, ela não me permitiu contar seu


paradeiro para o seu irmão, pois não queria que ele se
envergonhasse dela e nem que a odiasse, porque estava
grávida. Não queria dar esse desgosto para o irmão que a
tinha criado como um pai. E quando perguntei sobre o bebê,
ela relutou em me dizer. Só me respondeu, quando prometi
não matar o pai da criança. Então, me contou que Frederick
tinha lhe enganado, disse estar apaixonado por ela e
prometido casamento, havia a enganado da forma mais vil
que um homem poderia fazer. Tinha dito que a amava e que
não suportava ficar longe dela, roubou-lhe um beijo no
primeiro dia, carícias no segundo, conquistou a confiança no
terceiro dia, depois roubou seu coração e, por fim, sua
virtude. Ela tinha acabado de debutar, era uma jovem doce
e inocente. Quando fugiu, tinha procurado meu primo
Frederick para dizer que estava grávida. Mas o encontrou
em sua festa de noivado com outra mulher, isso lhe partiu o
coração. Sem poder voltar para casa, ela acabou parando
em um vilarejo. Lá conheceu pessoas boas e ruins. E contra
tudo que acreditava, quem a ajudou foi uma ex-prostituta,
enquanto que as pessoas mais abastadas lhe viraram as
costas. A mulher que a tinha acolhido era repudiada na
cidade por causa de sua profissão na juventude e também
porque estava doente.

Eu conversei com essa senhora, seu nome era Madalena,


tinha crescido em uma família simples, mas perdeu todos os
familiares para o tifo. Sozinha na vida, se tornou um alvo
fácil para pessoas ruins e acabou sendo levada para um
bordel e quando deu por si, já não tinha outra escolha a não
ser continuar como prostituta. Com o passar dos anos, ela
foi juntando tudo o que podia para sair daquela vida. Com
muito esforço e a ajuda de Samuel, conseguiu. Meu irmão é
um homem da igreja, e quando viu que ela estava tentando
sair da vida de pecado, a ajudou no que pôde. E foi por
confiar nele, que a senhora disse que estava cuidando de
Fernanda em sua casa.
Fernanda não aceitou voltar para a casa do irmão. E eu não
podia deixar a situação do

jeito que estava. A casa onde Madalena morava era simples


e estava caindo aos pedaços. Eu conversei com a senhora, e
a convenci a me deixar ajudar a reformar o lugar, como
agradecimento por estar cuidando de Fernanda.

Apesar de Fernanda dizer que não queria ver o irmão, eu


contei a ele onde ela estava.

Não podia deixar meu amigo sofrer sem saber se a irmã


estava bem, ou não. Ele foi encontrá-la e ambos brigaram
feio. Ele queria saber quem era o pai, mas ela não contou
para proteger o irmão, pois sabia que ele exigiria retratação
e ela não queria isso. Ele ficou furioso com ela por não
querer voltar para casa e acabou que deu um ultimato a ela,
ou voltava com ele, ou não seria mais parte da família. Ela
escolheu ficar.

Eu não pude desampará-la. Ela não tinha mais ninguém e,


se não fosse por mim, ela não estaria naquela situação.
Então, eu fiz o que podia para ajudá-la.

Estive com ela quando Alinn nasceu, ajudei com provisões e


sempre que podia, ia visitá-

la. E então, Fernanda encontrou outra mulher em uma


situação parecida com a dela. Abandonada e grávida. E
depois outra ex-prostituta, conhecida de Madalena,
apareceu lá pedindo abrigo. E aos poucos, lá se tornou uma
casa de acolhida. Madalena coordenava tudo e quando
faleceu, Fernanda continuou seguindo os passos da mulher,
mesmo sendo a mais nova entre elas, era a única que sabia
ler e fazer contas. Então, as outras confiavam nela.
A casa pertencia à igreja, e depois da morte de Madalena,
eu decidi comprá-la para garantir que as meninas
continuariam tendo onde morar. Não que a igreja
pretendesse fazer algo na área, mas uma das prostitutas
que foi morar lá, tinha tido um caso com alguém do clero e
podia causar problemas. Para manter Fernanda segura, eu
comprei o lugar.”

O Marquês silenciou, quando terminou de contar. Tinha


contado bem mais do que deveria, mas sabia que podia
confiar na esposa. E em nenhum momento havia revelado a
identidade de Fernanda e nem do irmão dela. Não tinha
quebrado a promessa de manter a identidade de Fernanda
segura.

― E assim, surgiu Magdala ― Clara comentou, olhando para


o Marquês com orgulho.

Seu marido era maravilhoso.

― Sim, e assim surgiu Magdala ― ele confirmou. ― E


sempre que uma prostituta quer uma vida nova, ou uma
mulher grávida não tem para onde ir, ela é acolhida em
Magdala. A casa de Madalena.

― Você é um homem maravilhoso por cuidar dessas


mulheres. ― Clara acariciou o peito de seu marido. ― E por
cuidar de Fernanda e da filha dela. Só acho que o irmão de
Fernanda não deveria ter virado às costas para ela.

― Ele não virou. A Fernanda acha que lá não é mais a casa


dela, porque ela só trará mais vergonha para o nome da
família. E ele jamais imploraria novamente que ela voltasse
para casa.

Ele é orgulhoso demais para voltar a tentar uma


aproximação. Mas ele cuida dela de longe e no anonimato.
Todo mês, manda por mim, uma soma considerável para
ajudar a manter a casa de acolhida.

― Compreendo. Família é sempre complicado. ― Clara


sorriu, compreensiva. ― Mas fico feliz por ele não ter a
abandonado.

― Eu também ― o Marquês comentou, girando na cama e


ficando por cima de Clara. ―

Agora, vamos mudar de assunto, antes que eu acabe


falando demais e contando o que não cabe a mim.

Clara fitou os olhos do Marquês. Nunca imaginou que um


homem pudesse ser tão caridoso e gentil. Mas tinha
encontrado tudo isso no seu marido. Esse tempo todo não
tinha enxergado o que havia sob a fachada de libertino, mas
agora o via como ele realmente era. E se

apaixonava por cada nova faceta que conhecia. Não tinha


como não amar aquele homem.

Ela o puxou para um beijo. Não queria mais nenhuma


palavra naquele momento. Só queria amá-lo com seu corpo
e sua alma.

CAPÍTULO 20 ― MAGDALA
A semana se passou rapidamente. Clara e Gabriel estavam
cada vez mais próximos um do outro. Era um casamento
feliz. Alinn havia se apaixonado por Clara, que, por sua vez,
também tinha se apaixonado pela criança.

No fim da semana, Fernanda voltou para buscar a filha e


Clara decidiu que queria conhecer Magdala. Se aquele lugar
era tão importante para seu marido, seria importante para
ela também. E após insistir, Winchester a levou para
conhecer o lugar.

Magdala ficava há umas boas quatro horas de viagem, mas


nem mesmo a ideia de ficar tanto tempo assim viajando,
retirou o interesse de Clara. Ela queria entender o marido,
queria conhecê-lo melhor e sentia que conhecer Magdala
ajudaria.

Na carruagem, Clara entreteu-se com a pequena Alinn e


nem viu o tempo passar, enquanto Gabriel manteve uma
conversa sobre o andamento de Magdala com Fernanda.

O Marquês observava sua esposa brincar com a criança. Ele


pôde ver que Clara seria uma ótima mãe, quando eles
tivessem filhos. Ela era carinhosa, paciente e tinha jeito com
crianças. Mal podia esperar para vê-la carregando um filho
seu.

O pensamento o fez sorrir. Sua esposa ficaria linda quando o


ventre ficasse arredondado por carregar uma criança. Ele
tomaria conta dela, a trataria com todo cuidado do mundo e
a faria se sentir linda e amada.

— Você a ama muito, não é? — Fernanda comentou


baixinho, para que só o Marquês ouvisse.

— Sim — Gabriel respondeu, sem nem pensar duas vezes.


— Eu sonhava em encontrar um homem que olhasse para
mim, da mesma forma que você olha para sua esposa.
Então, espero que ela saiba a sorte que tem. A propósito,
você está consciente da algazarra que vai ser quando
chegar em Magdala? As meninas sabem de seu casamento,
mas se recusam a acreditar que perderam você para
sempre. Infelizmente, nenhuma delas sabe de seu voto de
fidelidade.

— Então, vai ser melhor eu deixar bem claro que a única


mulher que vai esquentar minha cama, será minha esposa.

— Não se preocupe, farei elas se comportarem. Ou isso, ou


eu as expulso de minha casa.

— Fernanda sorriu para o Marquês.

— Fernanda? — A voz de Lady Clara interrompeu a conversa


dos dois. — Eu acho que ela dormiu...

Alinn estava encolhida no colo de Clara, tinha se cansado de


brincar e adormecido no colo da lady.

— Perdão, milady, deixe-me pegá-la para que ela não


amasse seu vestido.

— Não, por favor, deixe-a dormir, temo que, se movimentá-


la, ela pode acordar. E, por favor, me chame de Clara, não
precisa de formalidade.

Ao ver que Clara insistiria em ficar com a criança, Fernanda


decidiu não dizer que o sono de sua filha era pesado. E
apenas retirou um pano de sua bolsa e colocou perto da
cabeça de Alinn, para evitar que ela babasse no vestido da
lady.
— A senhora tem jeito com crianças — Fernanda elogiou, ao
ver o carinho sincero que a mulher tinha por sua filha.

— Tenho alguns irmãos mais novos, entretanto, nunca tinha


segurado nenhum no colo. E

não me lembro de minha mãe segurar também, a não ser


quando eram bebês ainda, mas sempre por pouco tempo,
pois quando começavam a chorar, minha mãe logo os
entregava para a babá.

— Nesses momentos que agradeço por não ser mais


obrigada a seguir as convenções sociais.

— A senhorita é uma lady?

— Não uma lady, eu era apenas a filha de um barão —


Fernanda comentou, baixando a guarda e logo se retesou,
ao perceber que tinha falado demais.

— Não se preocupe, seu segredo irá comigo para o túmulo


— Clara prometeu, mas Fernanda não relaxou.

— A Clara é boa em guardar segredo. Você acredita que ela


escondeu de mim que tinha uma dupla identidade? — O
Marquês tentou dissipar a tensão que a revelação da
posição social de Fernanda causou.

— Dupla identidade? — Fernanda perguntou, curiosa.

O Marquês então contou a sua história e de Clara, sendo


interrompido de vez em quando pela esposa, que contava a
Fernanda as coisas que Gabriel havia feito, uma vez que ele
contava a história omitindo algumas coisas vergonhosas
que fizera.
Quando terminou de contar, Fernanda olhava para ele,
divertida.

— Você o perdoou muito fácil, Clara. Ele merecia ter sofrido


mais.

— Você é minha amiga, deveria ficar do meu lado — o


Marquês fingiu ofensa.

Na verdade, seu plano havia dado certo. Fernanda tinha


criado um laço com Clara ao saber da história.

— Exatamente por ser sua amiga, que eu afirmo que agiu


como um tolo com sua esposa.

Nem acredito que ela se casou com você.

— Ele só estava com medo de se casar — Clara o defendeu.


— Afinal, ele adorava a vida de solteiro.

— Adorava mesmo, mas se eu soubesse que casar-me com


você seria tão maravilhoso, nem precisaria da interferência
do rei. Eu já teria lhe procurado há muito tempo.

Clara não esperava aquela declaração de seu marido. E


corou dos pés à cabeça por estar na frente de Fernanda.

— Está constrangendo a pobre moça. — Fernanda deu um


tapa no braço de Winchester.

— Deixem as declarações de amor para quando estiverem


sozinhos no quarto.

— Eu sou um homem perdidamente apaixonado, não posso


evitar. — O Marquês pegou a mão de Clara e beijou a palma.

Clara corou novamente com a demonstração de afeto. Seu


coração estava acelerado. Seu marido sabia ser galante
quando queria. E ela descobriu que gostava quando ele o
era. Sentia-se linda, desejada e feliz.

O Marquês se inclinou para perto dela e sussurrou:

— Mas a Fernanda tem razão, é melhor que eu deixe essas


declarações quando estivermos a sós, pois olhá-la me faz
querer voltar para casa imediatamente com você nos
braços, deitá-la na nossa cama e fazer amor várias vezes,
até cansar.

Clara arregalou os olhos ao ouvir aquilo, o desejo percorreu


suas veias, mas o bom senso a fez olhar para Fernanda e se
certificar que ela não tinha ouvido aquelas palavras.

Ao ver que a mulher olhava a paisagem e os ignorava,


respirou aliviada.

— Não se preocupe. Ela não ouviu — o Marquês garantiu.

— Você não pode falar essas coisas em público. Alguém


poderia ouvir.

— E se ouvisse, diria apenas que eu sou o marido mais


apaixonado de toda Inglaterra. —

Gabriel sorriu para a esposa, mas se endireitou e se


manteve comportado o restante da viagem.

Chegaram em Magdala pouco tempo depois. A casa tinha


dois andares, estava pintada de azul com várias janelas
brancas e a porta da mesma cor. Parecia um lugar simples,
mas aconchegante.

O cheiro gostoso de comida sendo preparada fez com que


eles percebessem que estavam com fome e suas bocas de
encheram de água.

Fernanda se levantou e abriu a porta da carruagem, assim


que ela parou. Desceu os degraus e se inclinou para dentro.

— Deixe-me pegar Alinn, para colocá-la na cama — ela


pediu, estendendo as mãos na direção de Clara.

— Permita-me, sim? — o Marquês se ofereceu e desceu da


carruagem, se posicionando para receber a criança.

Clara lhe entregou Alinn, ainda adormecida, e Winchester


não encontrou nenhuma dificuldade em segurá-la. A criança
era leve como uma pluma.

O Marquês seguiu para a casa, enquanto o cocheiro ajudava


Lady Clara a descer da carruagem e as duas mulheres
seguiram lentamente atrás dele.

— Que casa mais agradável — Clara comentou, apreciando


a vista.

— Ela é mesmo muito charmosa — Fernanda concordou,


com um sorriso.

— O Gabriel me contou um pouco sobre Magdala. Eu já


conhecia a existência deste lugar, mas não sabia a origem
dele. Fiquei comovida.

— Agradeço, milady, mas não preciso de sua pena, nem da


pena de ninguém. — Fernanda recuou, odiava que as
pessoas a tivessem como uma coitadinha, ou olhassem para
ela como se ela fosse digna de pena.

— Sua história não é digna de pena e, sim, de admiração.


Você é uma mulher de muita coragem.

Aquelas palavras deixaram Fernanda confusa. Não pensava


que Clara pensaria isso dela.

Estava preparada para a compaixão e não para a


admiração. Era a primeira vez que alguém falava aquilo
dela e não soube o que fazer, além de olhar embasbacada
para a lady, que seguia andando e fingia não perceber a
surpresa que suas palavras causou.

O som de gritos animados vindos de dentro da casa, fez


Clara parar a caminhada e tirou Fernanda do torpor em que
se encontrava.

— Que gritaria é essa?

— As mulheres que encontrará aqui não são educadas,


milady. São espalhafatosas, exageradas e tendem a fazer
estardalhaço sempre que aparece um homem bonito. Ainda
que casado. Velhos hábitos são difíceis de largar —
Fernanda explicou, segurando riso e, então, percebeu que
Clara estava preocupada com a quantidade de mulher que
podia estar ao redor de seu marido. — Mas não se
preocupe, mesmo solteiro, Gabriel nunca deu liberdade a
nenhuma delas. Sempre foi muito cavalheiro com todas,
mas sempre foi firme na sua recusa.

Apesar de Fernanda lhe assegurar que o Marquês não daria


liberdades àquelas mulheres,

Clara sentiu algo estranho se mover por seu corpo e, antes


que percebesse, já andava apressadamente para Magdala e
entrava pela porta. Não permitiria que seu marido fosse
assediado.

Assim que entrou, encontrou seu marido com os dois braços


ocupados com uma mulher de cada lado e mais três o
rodeando, animadas. A do lado direito era uma loira
voluptuosa e a da esquerda era uma morena bastante
bonita também, esta parecia mais velha que a loira.

— Oh, quem é essa jovenzinha? — perguntou a morena, que


estava agarrada ao braço de seu marido.

Mas antes que o Marquês pudesse responder e apresentar a


esposa, a outra mulher se adiantou.

— Deve ser mais uma que encontrou, querendo se


regenerar, não foi, Gabriel? Você é tão bondoso. O que teria
sido de mim, se não fosse você?

— Por favor, Miranda, você poderia fazer a gentileza de


soltar meu braço? Ainda preciso dele — Winchester pediu,
educadamente.

— Claro que não. Não sei quando poderei tocar em outro


braço assim tão forte quanto o seu... E agora que se casou,
terei ainda menos chances de fazer isso, pois nos visitará
menos.

O sangue de Clara ferveu ao ver a mulher esfregar os seios


no braço de seu marido. Para o crédito do Marquês, ele
tentava se desvencilhar da mulher, sem sucesso.

— E se continuar agarrada ao braço dele, ele não virá aqui


de jeito nenhum — Clara respondeu, tentando não
demonstrar a raiva que sentia e fazê-la entender que não
estava gostando daquela cena.
A mulher que tinha se agarrado ao lado esquerdo, entendeu
o recado e se afastou, assim como as outras mulheres que o
rodeavam. Mas a loira continuou agarrada a ele.

— Virá sim — a mulher replicou, sem entender o que Clara


quis dizer. — Não virá, querido?

— Minha senhora, sugiro que tire as mãos e outras partes


de cima de meu marido, antes que eu me esqueça que sou
uma lady e arranque-a daí com minhas próprias mãos. —
Clara enfatizou a palavra marido para que a mulher
entendesse com quem falava.

— Seu marido? — A mulher pareceu confusa, e então, seus


olhos se iluminaram. —

Vocês já se casaram? Já tiveram a noite de núpcias? Ele é


tão bom na cama quanto dizem?

— Miranda, acho que está na hora de se recolher para seu


quarto — Fernanda se adiantou, antes a mulher causasse
ainda mais confusão. Com calma, agarrou o braço dela e a
levou para os andares superiores, apesar dos incontáveis
murmúrios que esta emitia.

— Desculpe por isso, querida, a Miranda é um pouco...


especial — uma das mulheres se adiantou, essa parecia a
mais sensata das que estavam ali e também a mais velha.
— Ela não faz por mal. Apenas não sabe se conter e nem
reconhece nenhum limite. Ela é fascinada pelo Gabriel e,
por isso, age dessa forma.

— Ah céus, eu quase briguei com ela. — Clara se


envergonhou ao perceber que tinha ameaçado uma mulher
que mal conhecia e que, provavelmente, não estava em
posse de sua sanidade.
— Ah, não se preocupe com isso, querida, todas nós já
brigamos com a Miranda. Ela fica triste, mas logo esquece.
O coração dela não guarda rancor. E outra, se eu tivesse um
marido como o seu, eu nem teria avisado, tinha era me
jogado logo em cima da atrevida e a arrancado de lá com os
dentes. A propósito, eu sou Rebeca — a morena, que tinha
estado agarrada ao braço do Marquês, se apresentou. —
Peço desculpas pela empolgação ao rever o Marquês, mas é
que todas nós o temos em grande estima.

— Mas não se preocupe, minha querida, prometemos nos


comportar a partir de agora.

Afinal, não queremos que nosso Lorde preferido fique em


maus lençóis com sua esposa. — Outra mulher prometeu, se
aproximando de Clara e lhe pegando as mãos, com carinho.
— Estávamos loucas para lhe conhecer. Ouvimos falar muito
de milady, desde que ficou noiva de nosso Lorde
Winchester. Queremos saber de tudo.

Clara se viu rodeada pelas mulheres que perguntavam


coisas sobre sua vida, todas ao mesmo tempo. Ela se sentiu
perdida ali, até que sentiu uma mão em sua cintura e uma
presença em suas costas.

— Elas estão fascinadas por você, assim como eu — o


Marquês sussurrou em seu ouvido e ficou ali parado,
abraçado com sua esposa, para o suspiro coletivo de todas
as mulheres que os observava. E, então, Clara começou a
responder algumas das perguntas menos indiscreta das
mulheres.
Winchester tinha ficado apreensivo quando se viu rodeado
de mulheres, imaginava o que Clara diria quando entrasse
pela porta e o visse sendo agarrado por todos os lados.

Sempre tinha sido muito receptivo com as moradoras de


Magdala, pois elas lembravam as mães de seus meios-
irmãos e, assim como elas, as mulheres daquela casa
tinham escolhido a vida que tiveram por falta de opção.
Então, ele tentava tratá-las com a mesma dignidade que
teria ao se deparar com qualquer outra mulher.

Entretanto, muitas vezes, confundiam sua gentileza com


liberdade e, toda vez que ele ia visitá-las, elas se ofereciam
para ele descaradamente, e com ainda mais afinco, depois
de uma nova recusa.

Vê-las todas aglutinadas ao redor dele, lhe causou certo


pânico dessa vez, pois havia algo maior em jogo: seu
casamento. Se Clara o visse naquele estado, com certeza,
pensaria que ele tinha dado mais liberdade do que devia
àquelas mulheres. Ainda mais, se visse como elas se
ofereciam a ele. Muitas delas apenas por força do hábito,
outras, por real interesse em ter algo ao que se agarrar.

E qual foi sua surpresa quando sua esposa mandou que as


mulheres o largassem. E ele precisou segurar o riso e a
vontade de beijá-la, quando ela disse que tiraria Miranda de
perto dele com as próprias mãos.

Ele nunca a vira agir daquela forma, e soube, no momento


em que ela pareceu surpresa com a própria atitude, que
nunca tinha feito aquilo antes. E saber que ela enfrentaria
aquelas mulheres com as próprias mãos, como se para
salvar a honra dele, o fez sorrir apaixonado.

Clara era uma caixinha de surpresas.


Agora, voltavam para Willow Castle, ela havia encostado a
cabeça em seu ombro e dormia, embalada pelo sacolejar da
carruagem.

Winchester mal se movimentava com medo de despertá-la.


Ela estava tão serena em seu braço, que ele apenas
apreciava o momento.

Amava aquela mulher, seu coração se aquecia com essa


certeza, só esperava que ela retribuísse o sentimento e, às
vezes, ele quase podia dizer que sim.

Acordar todos os dias com o sorriso dela, apesar do rosto


inchado por causa do sono,

fazer amor com ela todas as noites e senti-la se entregar a


ele sem medo, ele não queria mais nada a não ser poder
viver muitos anos ao lado dela.

― Espero que você me ame, porque todo meu amor já lhe


pertence ― ele murmurou no cabelo dela, depositando um
beijo suave na sua cabeça.

Clara estava dormindo, mas era um sono tão gostoso, que


nem mesmo o sacolejado da carruagem seria capaz de
acordá-la. E ela até sonhava.

Sonhava com seu marido lhe abraçando e declarando seu


amor, depois a cena mudava e sua barriga estava enorme,
indicado os meses já adiantados da gravidez. E depois o
sonho mudou para ela na carruagem com o seu marido de
um lado e em seu colo um bebê lindo, com cabelos
castanhos como o do Marquês e os olhos cinzas que ela
possuía. E então o sonho se tornou um pesadelo, pois
homens paravam a carruagem e lhe puxavam o filho nos
braços, dizendo que o pai dela tinha apostado o neto e
perdido.

Assustada, Clara acordou, mas a sensação de agonia


causada pelo sonho não lhe abandonou.

― Está tudo bem? ― Winchester perguntou, preocupado.

― Foi só um pesadelo. Um pesadelo horroroso ― ela


respondeu, tentando se recompor.

― Já passou ― Winchester a confortou, abraçando-a de


forma protetora. ― Eu estou aqui, não deixaria nada de
ruim lhe acontecer.

Clara sorriu e sentiu, aos poucos, a angústia lhe deixar. Seu


marido a tranquilizava e ela se sentia protegida naquele
abraço.

― Falta muito para chegarmos? ― ela perguntou,


percebendo que não sabia exatamente onde estavam, já
que já havia anoitecido.

― Creio que apenas meia hora de viagem ― o marques


estipulou, deviam estar atravessando as colinas em direção
ao castelo naquele exato momento.

― Que bom, mal posso esperar para chegarmos em nossa


casa ― Clara comentou, entre um bocejo e outro, e o
Marquês sorriu ao ouvir o pronome possessivo ser dito com
tanta naturalidade.

― Sim, logo estaremos em nossa casa.


Em exatos trinta e dois minutos, a carruagem parava em
frente à porta de entrada do castelo. Winchester desceu e
ajudou Clara a fazer o mesmo. Seguiram direto para seus
aposentos, mas ao passar pela porta, o mordomo os
interceptou.

― Milady, hoje de manhã chegou uma correspondência para


a senhora.

A carta de cor preta foi entregue nas mãos dela e havia seu
nome escrito em um dos lados. A carta estava selada e o
selo pertencia ao Rogue’s, o que fez Clara franzir o cenho.
Henry nunca tinha lhe escrito em uma carta oficial como
essa. Ao abrir, deu-se conta que não havia sido Henry e,
sim, Phillipa que havia escrito.

Clara leu a carta rapidamente, era um texto breve e direto


e, então, leu novamente apenas para se certificar que lera
corretamente na primeira vez.

“Lady Clara, saudações.

É com o coração apertado que lhe trago uma essa notícia,


mas creio que gostaria de ser informada o mais rápido
possível a respeito de tão inoportuna situação e, portanto,
vi-me na obrigação de lhe escrever, para explicar o que
aconteceu.

Sinto ser eu a lhe informar, mas ontem seu pai se envolveu


em uma confusão relacionada à apostas no Rogue’s e essa
confusão o levou a retirar a máscara e revelar-se aos outros
membros.

Como sabe, a remoção da máscara leva à expulsão do


membro, e infelizmente o Henry não teve outra escolha, a
não ser fazer cumprir as regras da casa.
Seu pai já não é mais um membro do Rogue’s. Infelizmente,
não poderíamos ter tomado nenhuma outra medida
relacionada a esse infortúnio.

Sinto muito.

Lady Phillipa Williams”

Ao ver o rosto preocupado da esposa, o Marquês se


adiantou e tomou-lhe a carta da mão, para ver o conteúdo
daquilo que tinha deixado sua mulher tão aflita.

Não precisou mais que uma lida na carta para que


entendesse toda a situação: agora que o Duque não era
mais membro do clube, Clara não tinha como remediar as
consequências do vício do pai.

― Ele vai perder tudo que eu consegui salvar nesses anos.


Christopher herdará apenas dívidas e nem sei o que será de
Caroline e Cristine, quando chegarem em idade de casar e
não terem nenhum dote. ― Clara estava aflita, sentia tudo
ao seu redor desabar, tudo que tinha conseguido construir
agora ruía e ela sentia-se impotente. ― Ele não vai parar,
Gabriel. Não vai parar até perder tudo, como quase
aconteceu, ele não sabe a hora de parar, nunca vai saber.
Nunca entendi a verdadeira causa que o fez se entregar ao
vício, mas ele não é mais o homem que eu conheci. E eu
não sei mais o que fazer.

Gabriel a envolveu nos braços e a acalentou, enquanto ela


chorava. Precisava fazer alguma coisa. Não permitiria que
sua esposa sofresse por causa do pai. Uma imensa fúria o
invadiu. Não se importava que o homem fosse o Duque, ou
o pai de sua esposa. Ele pagaria pelo sofrimento que causou
a ela.
― Vai ficar tudo bem, meu amor ― Gabriel sussurrou em
seu cabelo. ― Uma hora ele vai parar.

― Não vai ― Clara respondeu, chorosa. ― Ele parece


determinado a perder tudo. Tudo o que eu fiz esse tempo
todo como Copas, terá sido em vão. Vai perder tudo em
uma maldita mesa de jogo. Pode até acabar morto em uma
viela qualquer, por causa das dívidas.

― Não perca a esperança, meu amor. Amanhã retornaremos


a Londres e veremos de perto a situação. Nós vamos dar um
jeito nisso.

― Não tem jeito. Ele é orgulhoso demais para ouvir e seu


vício só tem aumentado. Ele não se importa de perder tudo
o que tem, não se importa com o que será de sua família.

Ver a sua esposa tão desolada, o encheu de uma


determinação imensa. Ele daria um jeito de resolver aquele
problema. Nem que, para isso, ele mesmo precisasse tomar
sobre si toda responsabilidade.

― Então, que perca. Eu cuidarei do dote de suas irmãs. E,


quanto ao seu irmão, há propriedades que não podem ser
perdidas por estarem atreladas ao título, então, ele apenas
terá que saber administrá-las, para que com elas, tenha
recurso suficiente para se reerguer. Eu o ajudarei no que for
preciso.

― Isso não está certo ― ela comentou, mas já não chorava


mais, as palavras dele tinham lhe trazido um pouco de
alento e esperança. Que os atos impensados do pai não
desgraçassem a vida de seus irmãos ― Não é
responsabilidade sua cuidar da minha família.

― Mas é minha responsabilidade cuidar de você, e se você


se preocupa com sua família, eu me preocupo também. ― O
Marquês ergueu o rosto dela, para que pudesse olhar em
seus olhos. ― Eu te amo, Clara, amo-te com tudo o que
tenho e sou. E a sua felicidade é a coisa mais importante
para mim. Então, confie em mim quando digo que vai ficar
tudo bem.

Clara ouviu aquela declaração e sentiu o coração se


aquecer e encher-se de esperança.

Confiava no seu marido e também o amava, não tinha como


não amar. Ele era um homem maravilhoso. Já não havia
nenhuma dúvida em seu coração sobre o sentimento que
tinha pelo seu marido.

― Eu confio ― ela respondeu, voltando a abraçá-lo. ― E o


amo também.

― Você me ama? ― Ele sorriu ao ouvir aquelas palavras.

― Sim. ― Ela se afastou do abraço para poder olhá-lo nos


olhos. ― Eu amo você, Gabriel Campbell Deen Anbrock,
Marquês de Winchester. Meu coração sempre foi seu,
mesmo quando eu insistia em não o entregar a você.

A felicidade que Gabriel sentiu ao ouvir aquelas palavras, foi


tão intensa, que ele não pôde conter-se e abraçou a esposa,
a beijando e rodopiando com ela no ar.

― Agora sim, posso dizer que minha felicidade é completa.


Tinha medo que nunca me amasse ― Winchester falou, sem
afastar os lábios dos de Clara.
― Era só uma questão de tempo, até eu me dar conta que o
amava ― Clara respondeu, sorrindo, e mordiscou o lábio do
marido, o provocando, e esqueceu-se da carta, quando as
mãos do Marquês desceram lentamente por suas costas.

― Eu vou cuidar de você, prometo que nunca mais terá que


se preocupar com seu pai.―

jurou.

― Eu sei. ― Ela sorriu para ele, sentindo o peso que


carregou por tanto tempo ser tirado de suas costas. De
alguma forma, seu coração sentia que com o marido ao seu
lado, tudo ficaria bem, ainda que o mundo desabasse ao
seu redor. ― Gabriel, por favor, leve-me para a nossa cama,
preciso sentir você dentro de mim.

Winchester não esperou um segundo a mais, subiu as


escadas com a esposa nos braços em direção ao quarto do
casal, iria fazer amor com ela naquela noite, e dessa vez
poderia dizer que a amava quando se derramasse dentro
dela.

Mais tarde, naquela noite, enquanto Clara dormia,


Winchester estava pensando no que poderia fazer para que
o Duque não perdesse tudo que tinha para outros nobres,
pois alguns poderiam nunca vender de volta as
propriedades que ganhariam com as apostas.

E, então, a ideia tomou forma em sua mente. Ele tentaria


comprar de volta tudo o que o Duque perdeu com as
apostas, usaria o que fosse preciso para reaver tudo o que
fora perdido, ainda que isso levasse anos, ou o fizesse
gastar muito dinheiro, o que tinha certeza que faria.

Mas, antes de qualquer coisa, precisaria encontrar algo para


impedir que seu sogro continuasse a jogar.
CAPÍTULO 21 ― TUDO FICARÁ BEM

No dia seguinte, eles partiram cedo para Londres. Clara


estava serena, seu olhar tinha perdido o brilho aflito que a
leitura da carta havia causado e ela tinha se acalmado. Ela
confiava no seu marido, sabia que ele a protegeria.

Na noite anterior, ele a tinha acalentado e tinha dado


esperanças a seu coração. Ele cuidaria de tudo e ela não
precisava ter medo. E, pela primeira vez, ela se sentiu
protegida de verdade e o peso que tinha carregado todos
esses anos em que fora Copas, havia sido retirado de suas
costas e seu marido era o responsável por aquilo.

Chegaram a Londres um dia depois do esperado, pois a


carruagem em que o Marquês e sua esposa estavam,
acabou quebrando, e eles precisaram esperar que a roda
fosse consertada.

― Acho mais prudente enviar uma carta à sua mãe, apesar


de nosso casamento ainda não deve ser muito bem aceito
por ela, está na hora de contar à sua família a verdade,
precisaremos da cooperação deles para diminuir os gastos.
Escreva uma missiva e eu pedirei que alguém a entregue
em sua antiga casa, convidando-a para uma visita. ―
Winchester tomou a iniciativa e Clara concordou, não podia
continuar sozinha nessa empreitada, sua família teria que
saber dos gastos do pai.

Clara respirou fundo. Estava realmente aflita com aquela


situação, e sabia que seu marido estava certo. Iria contar a
verdade.

― Tudo bem, eu irei escrever a carta. Espero que ela aceite


o convite.

Winchester puxou sua esposa para um abraço e lhe beijou a


fronte.

― Vai dar tudo certo, meu amor. Confie em mim.

― Eu confio ― Clara respondeu, beijando os lábios de seu


esposo. Se não fosse por ele, naquele momento estaria
desesperada. ― Obrigada por me ajudar com isso.

― Sempre, meu amor.

Assim que Clara subiu para escrever a carta, Winchester


seguiu para o seu escritório.

Tinha passado esses dois dias pensando em um plano para


que os irmãos de Clara não perdessem tudo, e, para isso,
precisaria visitar o Rogue’s o quanto antes, precisaria da
ajuda de seus sócios.

Naquela mesma noite iria lá.

Iria comprar todas as dívidas que o Duque tinha com o


Rogue’s e com outros nobres.

Apesar de saber que não conseguiria comprar tudo, tentaria


adquirir o máximo possível.
Depois disso, teria uma séria conversa com Lorde
Catterfield, não permitiria que o homem continuasse a ser a
causa da infelicidade de sua esposa.

Naquele dia, o Marquês enviou não uma, mas duas cartas


para a casa Catterfield. E, em seguida, foi até o clube
executar a primeira parte de seu plano.

A resposta para ambas as cartas não tardou a chegar. A


Duquesa havia respondido, anunciando que no dia seguinte
faria uma visita a sua filha para um chá, parecia disposta a
fazer as pazes e saber o que a filha queria contar com tanta
urgência.

E, no mesmo horário em que Clara estaria conversando com


sua mãe, o Lorde Winchester receberia o Marquês em sua
casa.

Gabriel não havia contado à Clara sobre seu plano, pois não
queria que ela se decepcionasse, caso não desse certo,
então deixaria que sua esposa conversasse com sua mãe
em particular, assim ficariam mais à vontade.

Assim que a Duquesa chegou, Winchester seguiu para a


casa Catterfield. Esperava que o Duque o ouvisse, mas
caso, apenas conversar não resolvesse, então, iria
barganhar.

Vinte minutos depois, o Marquês era recebido pelo


mordomo dos Catterfield e direcionado para o escritório do
Duque. O homem estava sentado analisando alguns papéis,
e assim que o Marquês entrou no escritório, Lorde
Catterfield ergueu os olhos e se recostou na cadeira.

― Feche a porta, Hamilton ― ordenou ao mordomo e


apontou uma cadeira para o Marquês, para que se sentasse.
― Em que posso ajudá-lo, Winchester? Sua carta ontem
pedia urgência e me deixou bastante curioso.

― Obrigado por me receber, Vossa Graça. Mas temo que


não vá gostar do motivo de minha vinda aqui.

O Duque apenas ergueu a sobrancelha loira, curioso pelo


motivo da visita. O Marquês continuou, sem se permitir
vacilar.

― Soube que foi expulso do Rogue’s ― o Marquês começou.


Tentando entrar no assunto de forma direta.

― Sim, acabei me excedendo um pouco na bebida. Por falar


em beber... Gostaria de algo? ― O Lorde se levantou da
cadeira, na qual estava acomodado e se direcionou para
uma estante à sua direita, onde guardava algumas bebidas.

― Aceito sim.

― Tenho martini, conhaque e whisky.

― Aceito whisky.

― Boa escolha. ― O Duque silenciou, enquanto servia duas


doses, uma para si e outra para o Marquês.

― Não está preocupado com a expulsão? ― o Marquês o


instigou a continuar.

― Não. O clube serviu a meus propósitos, já estava na hora


de sair de lá, apesar de não ser daquela forma que eu
pretendia.

― Então, não pretende reaver sua entrada? ― O Marquês


ficou confuso com aquela notícia.
― Foi por isso que veio aqui? Para me fazer um novo
convite? ― O Duque o observou por um tempo. ― Não, não
pretendo voltar lá.

― E quanto às suas dívidas? As posses que perdeu, não irá


tentar resgatá-las? ― O

Marquês estava cada vez mais confuso.

― Não.

― Não?! ― Winchester franziu o cenho. ― O senhor está


endividado de propósito?

― Não creio que isso te diga respeito, Winchester, não é


porque é casado com minha filha, que te dá direito de se
intrometer em minha vida, garoto.

Aquilo deixou o Marquês irritado.

― É justamente por estar casado com Clara, que eu estou


aqui. O senhor sabe o quanto sofrimento infligiu à sua filha,
por causa dessa sua loucura?

― Sofrimento? Ela sempre teve do bom e do melhor. Garanti


que ela se casasse, dei-lhe um belo dote. O que mais ela
poderia querer?

― Um pai que não fosse viciado em jogos, seria um bom


começo.

― Cuidado, Winchester, não ouse me insultar em minha


casa, ou eu o jogo para fora, sem me importar que seja meu
genro. Fiz o melhor para minha filha, assim como estou
fazendo para as outras, o senhor não ouse querer me dar
lição de moral, quando não conhece os fatos.
― O senhor está cuidando das outras filhas? Perdendo tudo
que poderia mantê-las em segurança nas mesas de jogos?
Como pretende casar as suas filhas, quando não sobrar nem
mesmo o dinheiro do dote delas?

― Isso é problema meu. Não interfira em coisas que não é


de sua incumbência.

― É claro que é de minha incumbência. A partir do


momento que minha esposa se desespera por ver o pai
perdendo tudo o que ela conseguiu recuperar com anos de
trabalho, é óbvio que eu preciso interferir. Não permitirei
que ninguém a entristeça, nem mesmo o senhor.

― O que está dizendo? Minha filha não trabalha. Está louco?

― O senhor, nem ao menos, desconfia como ainda não


conseguiu falir completamente?

― Explique-se, Marquês ― o Duque exigiu.

― Por que acha que ela quis se casar tão rapidamente? Por
que acha que não vim aqui exigir o dote, e em vez disso nos
casarmos em Gretna Green? Como acredita que ainda tem
dinheiro nos cofres? Foi ela. Enquanto o senhor se esforçava
para perder tudo, sua filha se esforçava para não deixar a
família sofrer as consequências de seus atos egoístas. E ela
nem mesmo imagina que está fazendo isso de propósito.
Apenas sabia que não poderia deixar a família sofrer com a
falta de recursos. E para isso, colocou sua vida e sua
reputação em risco, para tentar consertar os seus erros.

― O que está querendo dizer? ― O Duque parecia incrédulo.

― Clara trabalhava no Rogue’s, para tentar diminuir o


estrago que o senhor fazia nas finanças. Ela era a Dama de
Copas.
Aquilo pareceu fazer sentido para o Duque.

― Sempre achei que ela me era familiar ― o Duque


comentou, com um sorriso. ― Deve ser por isso que eu
ganhava, mesmo tendo certeza de que devia ter perdido.

A tranquilidade do Duque irritou Winchester. Que tipo de pai


não se importava com a que sua filha fazia?

― O senhor não se importa com o que ela fez? Não se


importa por todas as vezes que ela chegou perto de ser
agredida por sua causa? Sinceramente, o senhor me enoja.
Ela não merece um pai como você. E você não merece a
preocupação dela, quando nem sequer se importa com o
futuro de seus filhos.

― É claro que eu me importo. Ela se casou com você, não


foi?

O Marquês se levantou da cadeira. Estava furioso com


aquele homem, precisava ir embora antes que fizesse algo
que se arrependeria.

― Não venha dizer que o nosso casamento foi orquestrado


por você ter pensado nela.

Você só pensou em si mesmo. Não queria ser tachado de


mentiroso por ter perdido Rostwell e, por isso, apelou ao rei
para que nos casássemos, assim cumpriria sua palavra e
Rostwell pertenceria a quem se casasse com Clara.

― É aí que se engana, Winchester. Sim, eu apostei Rostwell


no calor do momento, mas eu podia ter reavido ele, sem
precisar que ela se casasse com o você, e era isso que
inicialmente iria fazer. Mas quando comecei a coletar
informações sobre sua pessoa, eu percebi que seria um
marido excelente para ela, e quando soube que o rei estava
querendo lhe arrumar uma esposa, o convenci a escolher
Clara para se casar com você. Assim, eu resolvi dois
problemas de uma única vez.

― E você quer que eu acredite nisso, quando


deliberadamente está perdendo tudo? Ou vai dizer que
também arranjou casamento para suas outras filhas?

― Sim, Caroline e Cristine estão com os casamentos


arranjados e os dotes pagos, apenas aguardam a idade de
debutar para poderem se casar. Então, sim, eu já cuidei do
casamento das duas.

― E, quanto a Christopher, o seu filho? Suas dívidas serão


herdadas por ele.

O Duque ficou sério quando seu filho foi mencionado, aquilo


deixou o Marquês pensativo e logo entendeu o que estava
acontecendo.

Todas as filhas do Duque eram loiras, assim como o pai,


exceto o Christopher, que tinha cabelos castanhos iguais
aos da mãe. Não havia nada que delatasse que não era filho
dos dois, mas Gabriel conhecia muitos bastardos para saber
que nem sempre era a aparência que indicava, e sim o
tratamento. E a expressão que o homem fez, quando
Gabriel tocou no nome do filho, deixou claro para ele que
Christopher era bastardo.

― Ele não é seu filho ― o Marquês expôs o que havia


concluído.

― Não ― o Duque respondeu, depois de um tempo. ― Mas


irá herdar mesmo assim, pois, nem eu, nem você, iremos
espalhar essa informação. Eu não tenho outro herdeiro, e
não permitirei que o título saia da família, seria uma
desonra ainda maior.
― Por isso, está apostando tudo. Não quer que ele receba o
que conquistou.

― Exatamente. Meu suor. Eu fiz Catterfield prosperar como


nenhum outro Duque conseguiu em toda a história de
minha família. E eu deixaria tudo isso para o meu herdeiro
com prazer, se ele realmente fosse meu.

― Mas que culpa o seu filho tem por ter nascido? ― o


Marquês perguntou. Ele entendia que o Duque estava
arrasado por causa da traição da esposa, mas não entendia
por que Catterfield faria o filho pagar pelos erros da mãe. ―
Ele não escolheu de quem seria filho.

― Ele é a lembrança constante da traição de minha esposa.


Toda vez que ele me chama de pai, me enoja. Eu mal posso
olhar para ele. E aquela mulher, muito menos. E o pior é
que ela sabe que eu descobri, e nem sequer veio implorar
meu perdão.

― Entendo o ódio que tem de sua esposa, e ele é


justificado, mas seu filho não tem nada a ver com isso. Ele é
uma vítima nisso tudo, ainda mais que você.

― Você não entende, jamais entenderia, não foi você que foi
traído.

― Eu não fui traído e rezo para que nunca seja, mas eu


cresci vendo a traição de meu pai, observei de perto a dor
que minha mãe sentia por ter que aceitar aquilo calada.
Mas ela jamais culpou nenhum dos filhos de meu pai, pelo
contrário, cuidou de todos eles como se fossem seus.

Mesmo que isso a lembrasse sempre que eles eram filhos


de uma traição. E não foi apenas uma vez, meu pai teve 3
filhos fora do casamento. ― Winchester viu que o Duque
estava irritado, mas ainda assim, continuou. ― O que estou
querendo dizer, é que não precisa ter o mesmo sangue para
ser filho. Seu filho não tem culpa alguma.

― Ele não é meu filho! Saia da minha casa ― o Duque


ordenou, perdendo a compostura.

― Eu não preciso de um moleque me dando lição de moral.

― Com prazer ― o Marquês respondeu, altivo. Não se


importaria em se afastar daquele homem. ― Mas antes,
quero que saiba que estou em posse de mais da metade de
suas dívidas, e logo conseguirei o restante delas. O senhor
pode perder tudo e eu darei um jeito de ser o dono de cada
centímetro de terra que vender. Prometi à Clara que não
permitiria que os irmãos dela sofressem por causa de sua
loucura e cumprirei minha palavra. Se depender de mim,
Christopher não herdará suas dívidas.

― Eu não vou repetir. ― O Duque apontou para a porta,


furioso.

Winchester saiu, sem mais delongas. Tinha uma missão


longa e árdua, mas faria tudo que prometeu, pelo bem de
sua esposa.

Enquanto seguia na carruagem, outra carruagem passou


por ele, apressadamente, e de relance, pode ver que dentro
estava sua esposa. Aquele dia estava só começando.

Clara não queria acreditar nas palavras que sua mãe havia
lhe confidenciado. Não podia ser verdade.
Mas que outro motivo teria para o seu pai agir daquela
forma?

O fato de a Duquesa tê-lo traído, responderia muitas das


perguntas que ela não queria fazer para seu pai, mas, nesse
momento, precisava. Não conseguia acreditar que ele
estava fazendo tudo aquilo para se vingar da traição.

Para tirar aquela história a limpo, Clara pegou uma


carruagem para a casa Catterfield.

― Clara, não faça isso ― a mãe havia implorado,


preocupada com a reação do marido.

― Ele nunca me perdoará pelo que fiz.

― Esse tempo todo, mamãe, eu me arriscava para


minimizar as consequências dos erros do papai, e nunca
tinha conseguido entender por que ele havia mudado tanto
da água para o vinho, depois do nascimento do Christopher.
E a senhora sempre soube. Na verdade, tudo isso foi tanto
culpa da senhora, quanto do papai. E quem está pagando
pelos erros de vocês, somos nós. Não é justo.

Clara não conseguia acreditar que a mãe havia tido


coragem de trair o marido.

― Você pensa que poderá mudar alguma coisa, mas não


pode. Você é só uma mulher, Clara, seu pai jamais vai lhe
dar ouvidos. Não seja tola de acreditar nisso. Sairemos nós
duas prejudicadas.

― Até a senhora nos trair, nós éramos uma família amorosa


e feliz, papai nos amava e nos protegia. Ele está fazendo
tudo isso por causa da senhora.
― Eu sei, eu estraguei tudo, e eu sinto muito, mas
conversar com seu pai não vai mudar nada. Ele é um
homem orgulhoso, e odiará você por dizer a ele que está
errado por agir da forma que tem agido.

― Alguém precisa fazê-lo, mamãe, e creio que a senhora


não está apta para ser essa pessoa.

Essas haviam sido suas últimas palavras, antes de subir na


carruagem e deixar sua mãe para trás.

Quando já se aproximava de Catterfield, outra carruagem


passou por ela, mas ela estava tão absorta em
pensamentos que não reconheceu a carruagem, ou o
homem que ia dentro.

Seu foco todo era no que diria a seu pai quando o


encontrasse. Tentaria convencê-lo a parar com aquela
loucura, não poderia viver sua vida preocupada com sua
família. Ela precisava que seu pai parasse de agir
inconsequentemente, precisava que ele a ouvisse. E
imploraria a ele para parar se fosse preciso.

Assim que chegou em frente à casa, respirou fundo e se


dirigiu para a porta, o mordomo a abriu antes que ela
batesse e Clara não esperou que o homem a guiasse e
anunciasse, pois sabia

exatamente onde o pai estava.

Abriu a porta do escritório do pai, sem sequer bater. O


Duque estava bebendo e parecia irritado, mas ela não se
importou.

― Me diga que não é verdade? ― ela implorou, quando ele


olhou para ela. ― Me diga que não está fazendo isso tudo
por causa da traição da mamãe.
O Duque a fuzilou com os olhos. Não precisava de mais uma
lição de moral naquele momento. Já odiava o suficiente o
homem que via no espelho toda a manhã. A traição da
única mulher que ele amou, tinha doído muito mais do que
ele deixava transparecer. Seu coração havia se partido
quando soube o que a mulher fazia na sua ausência,
quando presenciou o ato, escondido na antessala que unia
os quartos. Jurou que a mulher pagaria por aquela dor.
Tentou cuidar das filhas, as únicas que tinham o sangue
dele, mas para a mulher, tentaria não deixar nada, além de
dívidas, assim como para o filho dela com o amante.

Ao ver que seu pai permanecia calado, Clara continuou.

― Eu entendo que esteja furioso com ela, eu também estou,


não acredito que ela nos traiu desse jeito, mas o que tem
feito, perdido seus bens dessa forma, é algo que não
consigo entender.

Por que nos culpa pelos erros dela? Nos odeia também?

― Eu não culpo nenhuma de vocês. Amo vocês com todo


meu coração, as únicas coisas boas que saíram daquela
mulher ― o Duque declarou, passando as mãos no rosto. ―
Jamais as odiaria.

― Então por que está fazendo isso?

― Você não entenderia, é apenas uma mulher.

― Eu entendo bem mais do que imagina, mas não consigo


ver nenhum motivo para o senhor fazer os filhos pagar pelo
erro da mãe.

― Eu não estou fazendo vocês pagarem por nada. Tenho


cuidado de vocês durante todos esses anos, mesmo depois
de descobrir a traidora que sua mãe é.
Aquilo irritou Clara. Ele realmente não via o infortúnio que
causou à família por causa de sua vingança imbecil.

― Não. O senhor não tem feito nada disso. Há anos nos


virou às costas. Sua vida consiste em perder sua fortuna
nas casas de apostas e, se não fosse por mim, já teria
conseguido.

O senhor tem noção de tudo que eu passei para impedir que


fosse à falência? ― Clara já não continha a raiva, e ela fez
seus olhos se encherem de água. ― Eu precisei trabalhar,
colocando minha reputação e minha vida em risco, para
poder vigiá-lo de perto, corri ainda mais riscos apostando
contra nobres como o senhor, e até já fui agredida por um,
ou outro mau-perdedor. É

isso que o senhor chama de cuidar de nós? As gêmeas


estão próximas de debutar e, nem sequer, terão um dote, e
Christopher só herdará dívidas. É assim que cuida de seus
filhos?

― Suas irmãs já estão com os casamentos marcados, eu já


cuidei disso. E, quanto a seu irmão, eu não me importo com
ele.

― Como pode dizer isso? Ele é seu filho.

O Duque explodiu pela segunda vez naquele dia.

― Ele não é meu filho. Não ouse dizer que aquele bastardo
é meu filho. Sua mãe me traiu com o Callahran.

Aquilo pegou Clara de surpresa. Sabia que sua mãe tinha


traído, mas não que Christopher era fruto de uma traição.
Seu pai estava enganado. Christopher não era filho de Lorde
Callahran, era dele.
― Papai, o senhor está enganado, a mamãe me contou que
começou a ter o caso com o Callahran quando já estava
grávida do Christopher. O senhor estava viajando e ela se
sentiu

sozinha... E, por isso, o traiu. Não estou justificando os atos


dela. Mas Christopher é seu filho, não de Lorde Callahran.

― É claro que é, sua mãe mentiu, ela não iria lhe dizer que
o filho dela é um bastardo. O

caso dela com o Callahran é bem mais antigo. Não seja tola.

― Não, papai. Eu tenho certeza ― Clara informou. ― Uma


vez a mamãe me contou que Callahran não podia ter filhos.
Esse é o motivo de ele nunca ter se casado.

Aquelas palavras fizeram o Duque franzir o cenho.

― Ele não pode ter filhos, mas ter um caso com a minha
esposa ele pôde.

― Eu não entendo como funciona. ― Clara corou. ― Mas ela


realmente comentou que ele não podia ter filhos, e na
época eu perguntei a ele, e ele confirmou.

― Me nego a acreditar nessa mentira. Ele nunca falou isso


quando éramos amigos ― o Duque expôs. ― Você sempre
gostou muito dele, por isso, o defende.

― Não estou defendendo-o. Não foi certo o que ele e a


mamãe fizeram com o senhor.

Mas o Christopher é seu filho.

O Duque não parecia saber o que dizer, aquela notícia era


novidade para ele. Tinha mesmo acreditado que o
Christopher era fruto da traição. Mas e se tivesse se
enganado? Estaria destruindo o futuro de seu filho, por
culpa de sua esposa.

Clara via a confusão no rosto do pai. O conflito que ele


estava passando. O homem parecia tão perdido, que ela se
condoeu.

― Papai, eu sinto muito. Entendo o que o senhor deve


estar...

― Não, Clara! Não entende. E eu rezo para que nunca


entenda ― o Duque a cortou.

Ninguém seria capaz de compreender que seus atos foram


resultado da fissura em seu coração. Ele tinha amado a
Duquesa antes de se casar com ela, e quando a teve como
esposa, se sentia o homem mais realizado, por ter o objeto
de seu desejo para sempre em sua vida. Mas o amor
quando não retribuído, só gera dor, e essa dor se enraíza,
cega, destrói. Por anos, o Duque alimentou aquela dor, por
anos, ele a remoeu, e aquilo o destruiu completamente, a
ponto de enxergar em seu filho, o fruto do pecado de sua
esposa.

― Eu a amei, amava todos vocês. E ela me destruiu, tudo


que eu tinha de bom foi arrancado de mim. Você não
entenderia isso. Não sabe o que é ter o seu coração feito
em pedaços a cada dia. Saber que faria tudo, e daria a sua
vida por uma pessoa que não se importa e que, ao fazer
isso, seria para outro homem sua gratidão e seu amor. Eu
dei tudo que estava ao meu alcance para a sua mãe e,
ainda assim, não foi suficiente para ela me amar. Eu a
idolatrei, e nessa idolatria eu neguei a mim mesmo, neguei
a minha felicidade em prol da dela e para quê? Para ser
traído!
Não, filha. Não diga que me entende, porque para me
entender, você teria que passar por isso. E

eu realmente não desejo isso para ninguém, por pior que


seja. Sei quem é o homem que eu me tornei, e não me
orgulho dele. Ainda mais agora sabendo que na minha ira
eu posso ter ferido o meu próprio filho. Nenhum de vocês
merece pagar pelo erro de sua mãe, eu não permitiria. Mas
eu não a podia deixar impune pelo que fez, e por isso, eu
estava me tornando tudo o que ela mais odiava, pois ela
não merecia o homem bom que eu era. Eu tentei traí-la,
devolver na mesma moeda, mas não conseguia ser igual a
ela. Não conseguia quebrar meus votos. Por isso, eu me
endividei, para que ela não pudesse manter a vida de luxo,
meu ausentei porque não suportava vê-

la. Eu fugi de meus problemas na bebida. Eu fiz tudo errado,


mas o fiz para tentar abrandar a dor de meu coração.

Clara não conseguia segurar as lágrimas que caiam em


sintonia com as lágrimas de seu pai. Ver um dos homens
que mais amava na vida daquela forma tão frágil, lhe partia
o coração.

― Ah, papai. Eu sinto muito. ― Clara o abraçou, tentando


consolá-lo. ― Eu realmente

sinto muito.

O Duque chorou nos braços da filha. E em sua cabeça se


lembrou das vezes que era ela quem corria chorando para
seus braços, para ser consolada. Sua garotinha tinha
crescido e ele nem mesmo viu isso acontecer.

Depois de alguns minutos o Duque a afastou, recuperando


um pouco o orgulho e a dignidade que ainda possuía.
Enxugou as lágrimas e Clara percebeu que ele tinha uma
nova resolução no olhar.

― O senhor está bem? ― ela perguntou, ainda preocupada.

― Não, mas vou ficar quando corrigir meus erros ― o Duque


prometeu. ― Tenho muito a que conversar com sua mãe,
com Callahran e também com seu marido, acredito que
temos alguns assuntos a tratar.

― Com o Gabriel? ― Clara indagou, curiosa.

― Ele comprou a metade de minhas dívidas, para impedir


que o Christopher não tivesse o que herdar ― o Duque
explicou.

― Oh. ― Clara sorriu ao entender o que o marido tinha feito.

― Ele é um bom homem, e claramente a ama ― o Duque


começou a falar e Clara notou preocupação nos olhos dele.

― Eu o amo também, papai, ele me faz feliz como há muito


tempo não sou. O senhor havia dito que eu iria lhe
agradecer por me obrigar a casar com ele, e o senhor tinha
razão. ―

Clara segurou a mão do pai entre as suas. ― Muito obrigada


por dar-me em casamento a ele.

― Muito me alegra que, mesmo de uma forma errada, eu


tenha feito algo correto. Saiba que nunca deixei de amar
você e as suas irmãs. Espero que o Christopher um dia me
perdoe, por não o ter amado.

― Ele vai entender, ainda é uma criança. E dá tempo de


amá-lo. ― Clara abraçou o pai.
― Agora, eu preciso ir. O senhor ficará bem?

― Sim, eu ficarei bem. ― O Duque suspirou.

Clara se direcionou para a saída e, então, se lembrou de


algo.

― Ah, papai, depois precisamos conversar sobre o


casamento das gêmeas. Não acho que elas devem ser
obrigadas a casar. Sei que devem ser homens bons, mas
acho que elas gostariam de poder ter a decisão final sobre o
homem com quem passarão o resto da vida.

― Tudo bem. E também quero saber como conseguiu se


tornar a Dama de Copas.

Clara franziu o cenho, não tinha revelado a seu pai quem


era, então, como ele sabia?

― Como descobriu? ― perguntou, curiosa.

― Seu marido.

Clara se surpreendeu com a resposta, mas não sentiu raiva


por Gabriel ter revelado seu segredo. Muitas coisas tinham
acontecido naquele dia para se irritar com esse detalhe, que
nem era tão relevante, dado a situação. Mas uma pergunta
a intrigava. Quando foi que o seu marido conversou com
seu pai?

― Quando...?

― Hoje, mais cedo ― o Duque respondeu. ― Ele saiu poucos


minutos antes de você chegar, é um milagre que não
tenham se encontrado.
Clara se lembrou que uma carruagem tinha passado por ela
quando se aproximava da mansão. Só podia ter sido o seu
marido.

― Então, eu devo ir. Meu marido pode ficar preocupado por


não me encontrar em casa quando não lhe avisei sobre
minha saída. ― Clara se despediu de seu pai com um
abraço e se direcionou para a saída.

Ao sair da mansão, se surpreendeu ao encontrar o marido


esperando-a, ao lado de uma carruagem. O sorriso foi
impossível de segurar. E, sem se importar com quem
pudesse estar vendo-a naquele momento, se jogou nos
braços do Marquês.

― Eu a vi passar na carruagem e decidi esperá-la ― o


Marquês se explicou, quando ela se desvencilhou de seu
abraço para olhar para ele. ― Vamos para casa?

― Sim, vamos para casa ― ela respondeu, sorrindo.

― Obrigada ― ela agradeceu, quando a carruagem


começou a se mover.

― Pelo quê? ― ele perguntou, sem saber a que ela se


referia exatamente.

― Por tudo. Por cuidar de mim. Por ter vindo mais cedo
tentar resolver as coisas com meu pai.

― Não me agradeça por isso, não consegui resolver muita


coisa com o Duque. Pelo contrário. Acho que ele me odeia
agora. ― Gabriel suspirou, triste.

Clara sorriu e aproveitou que a carruagem era fechada para


tomar a boca de seu marido na sua.

― Você é um homem incrível, Gabriel ― ela disse, depois


que encerraram o beijo. ―

Meu pai falou que esteve lá mais cedo e que havia


comprado algumas dívidas dele para que meu irmão não
herdasse apenas dívidas.

― Foi a melhor solução que eu encontrei, dada as


circunstâncias ― Gabriel respondeu, sentindo seu peito se
encher de orgulho, ao ver a gratidão estampada nos olhos
de sua esposa. Em seguida, ficou triste ao lembrar que
havia remediado apenas parte da situação e não resolvido o
problema como um todo. ― Mas se ele continuar gastando
tudo, eu não terei muitos recursos para comprar as dívidas
dele.

― Ah, não se preocupe com isso. Ele não vai mais se


endividar. ― Clara contou-lhe toda a conversa com o pai e o
Marquês a ouviu, atento.

― A história de seu pai é como a da minha mãe. Amar sem


ser correspondido. Fico feliz que não tenhamos que carregar
esse fardo que eles carregaram. Tive muito medo de ser
igual a sua mãe, ou a meu pai, e não sei o que faria se você
não me amasse, só sei que seria o homem mais infeliz do
mundo. Temi que me odiasse para sempre, por tudo o que
eu fiz e disse sobre você.

― Eu nunca consegui lhe odiar de verdade, e mesmo


quando o odiava, eu já estava apaixonada por você. ― Clara
parou de falar, quando Winchester a beijou. E assim que ele
se afastou, ela continuou com um sorriso. ― Eu cheguei a
sentir ciúme de mim mesma.

― Eu já a amava mesmo quando não sabia quem você era.


Sempre foi você, e quando eu dizia que não a queria, era
apenas medo. No fundo, eu sempre a quis. Você sempre foi
e sempre vai ser a mulher da minha vida. Eu te amo, Lady
Winchester.

― E eu amo você, Lorde Winchester.

O casal, então, se perdeu entre os beijos. Agora, com a


certeza de que o amor que sentiam, era correspondido e
que tudo ficaria bem.

EPÍLOGO

Dez meses depois...

Naquela manhã, o Marquês saiu da casa do Duque, com um


sorriso no rosto. Finalmente, Lorde Catterfield tinha
comprado a última dívida que ele possuía.

Pegou a carruagem e voltou para Winchester House, onde


sua esposa o esperava, com um sorriso no rosto.

Eles partiriam naquela mesma manhã para Willow Castle. E


estavam ansiosos para irem para casa. O castelo tinha se
tornado um lar novamente. Alice morava com eles e, agora,
na companhia de Clara, ela fazia visitas regulares a Magdala
e tinha criado um vínculo especial com a pequena Alinn,
que, para o desespero de Fernanda, estava criando gosto
por animais estranhos e não domesticados.

Lady Catterfield estava há nove meses morando no campo,


ela mesma tinha tomado a decisão de não ficar mais na
presença do Duque. Catterfield não a tinha exposto
publicamente, mas tinha contado o que havia acontecido
para os filhos, e todos ficaram do lado do pai.

Cristine e Caroline, quando debutassem, seriam


amadrinhadas pela irmã, Lady Clara Winchester, que as
ajudaria a escolher um bom marido, caso não se
interessassem pelos homens que seu pai havia arrumado. E
foi confirmado por um médico, que Callahran realmente não
podia ter filhos. Isso tinha feito o Duque de Catterfield se
dedicar integralmente ao herdeiro, na tentativa de reparar
os anos perdidos.

Com a ajuda de Clara e Phillipa, Winchester tinha


conseguido encontrar uma nova governanta para Alice. A
Sra. Taylor parecia uma mulher bastante paciente e não
tinha nada contra as criaturas de Deus, desde que elas não
a atacassem.

Na carruagem, Clara observava o marido olhar a paisagem


pela janela. Ela era loucamente apaixonada por aquele
homem. Nunca pensou que fosse amá-lo tanto. Mas a cada
dia que passava, se sentia cada vez mais abençoada por tê-
lo como marido.

Ele era um homem extremamente carinhoso e fazia tudo


para vê-la feliz. E ela o retribuía na mesma intensidade.
Eram um casal feliz.
― Cada dia que passa, eu o amo um pouco mais, sabia? ―
ela comentou, se inclinando para beijar-lhe os lábios.

― É recíproco, meu amor. Amo-te infinitamente ― ele


declarou, puxando-a para seu colo.

Clara pôde sentir o desejo dele espelhando o seu e sorriu.


Adorava fazer amor com seu marido. Em qualquer lugar.
Isso a fez lembrar de um detalhe que estava escondendo
dele. Suas regras estavam atrasadas novamente.

Elas não costumavam ser regulares e, vez ou outra,


atrasavam. Mas já fazia quase um mês que não vinham e
elas nunca se atrasaram tanto. Estava esperançosa que
dessa vez estivesse grávida. Mas só contaria para ele
depois que um médico a examinasse. Porque não sentia
nenhum sintoma de gravidez que as mulheres costumavam
se queixar. Nada de enjoos, ou sonolência.

Sentia-se bem. Exceto pelos seios doloridos, mas isso podia


ser apenas sintoma da proximidade de suas regras.

― O que está pensando? ― o Marquês perguntou, ao


percebê-la absorta em pensamentos.

― Apenas que eu gostaria muito de ter um filho seu ― ela


lhe confidenciou.

― Eu espero que já esteja esperando nosso bebê. Suas


regras não vieram este mês ainda, não é?

Aquela pergunta surpreendeu Clara.


― Eu pensei que você não tivesse notado. Não é a primeira
vez, então, pode não ser nada. ― Ela baixou a cabeça,
tentando não demonstrar o quanto queria que fosse um
bebê. Temia dar a ele esperança e decepcioná-lo ― Eu não
sinto nada diferente, é provável que não esteja esperando
um filho.

― Eu estou com um bom pressentimento sobre esse atraso.


― O Marquês lhe sorriu. ―

Seus seios estão maiores, meu amor.

― Estão? ― Ela o fitou, incrédula.

― Estão sim. Você não repara neles como eu ― ele


comentou, puxando o corpete do vestido dela, para
observá-los.

― Mesmo assim, não acho que seja sintoma de gravidez ―


ela respondeu, cruzando os braços e com isso, fazendo-o
largar o corpete e escondendo os seios da vista dele.

― Não há por que se preocupar, minha fadinha. Se não


estiver grávida, continuaremos tentando, até que minha
semente brote no seu ventre. Aliás, não me importo de
continuar tentando por mais alguns meses, então, não
precisa de pressa. Vamos desfrutar as tentativas, que na
hora certa, teremos nosso bebê.

Winchester voltou a beijá-la, impedindo, assim, que ela


continuasse pensando naquele assunto. E a manteve
ocupada durante todo o restante da viagem.

Seis meses depois...

Winchester estava em seu escritório repassando algumas


contas da propriedade, quando seu mordomo veio lhe
anunciar que ele tinha uma visita. Sir Bernard Sulmore, o
Barão de Montress, pedia uma audiência com ele. Aquilo o
intrigou. O Barão não falava com o Marquês desde que
descobriu sobre a gravidez de Fernanda.

O que o homem poderia querer dele?

Pediu que o mordomo o deixasse entrar.

Montress entrou com o semblante sério e decidido. O amigo


sempre tinha sido reservado com as palavras e um pouco
recluso, enquanto Gabriel era o oposto disso. Aquele fato
tinha feito deles bons amigos no passado.

― Há quanto tempo, Montress.― o Marquês saudou o


homem. ― Em que posso ajudá-

lo, velho amigo?

― Obrigado por me receber. Peço desculpas por não ter


avisado de minha visita com antecedência. Mas gostaria de
lhe pedir um enorme favor, em nome dos velhos tempos.

Mesmo tento passados tantos anos, o Marquês não poderia


virar às costas para uma

amizade tão antiga quanto aquela. Montress era seu amigo


desde que ele era um menino. E

passaram por muitas coisas juntos. Talvez, estivesse na


hora de retomar a amizade e deixar os problemas que os
afastaram no passado. Um favor talvez ajudasse.

― Diga. Se estiver ao meu alcance, o ajudarei ― o Marquês


concordou e viu um brilho de esperança brotar nos olhos do
amigo.
― Quero que me ajude a me reaproximar de minha irmã.

O Marquês sorriu com aquela informação. Há muito tempo


esperava ver Fernanda e Bernardo fazerem as pazes.

― Fico feliz que, finalmente, tenha tomado essa decisão.


Tentarei ajudá-lo no que for preciso, mas precisamos ir com
calma, não será fácil, precisará ter paciência.

― Eu sei. Não teria vindo se não estivesse realmente


disposto a isso.

― O que mudou? ― Winchester perguntou, curioso.

― Uma mulher me fez ver que a família é um bem precioso


demais para perder, por coisas triviais.

O Marquês sorriu. Estava feliz com a decisão do amigo.


Esperava apenas que Fernanda desse uma chance para o
Barão se desculpar. Ambos mereciam uma segunda chance
de consertar os seus erros.

― Será um prazer ajudar.

Assim que o Barão se retirou, Lady Winchester entrou no


escritório do marido. Estava no sétimo mês de gravidez e
ambos não podiam estar mais felizes.

― Quem era o homem que acabou de sair? ― Clara


perguntou, curiosa. O homem lhe pareceu vagamente
familiar.

― Era irmão da Fernanda.

― O Barão de Montress?

A lady ficou em frente ao marido, usando a mesa de mogno


como encosto. Ficar muito tempo em pé lhe deixava
cansada e seus pés estavam sempre inchados.

― Sim, ele mesmo ― Winchester respondeu e se inclinou


para beijar a barriga de sua esposa.

― O que ele queria?

― Fazer as pazes com a irmã.

― Ah, mas isso é maravilhoso.

― Concordo, família é a coisa mais importante do mundo ―


o Marquês disse, em tom de adoração, enquanto fitava sua
esposa e acariciava o ventre arredondado.

― Com certeza, meu amor. ― Clara sorriu, devolvendo o


olhar devotado que seu marido lhe dava. Amava aquele
homem e a família que tinha com ele, que em breve, se
multiplicaria. ―

Com toda certeza.


Document Outline
COMO NÃO ODIAR UM MARQUÊS
SINOPSE
PRÓLOGO
CAPÍTULO 1 ― CASAMENTO INDESEJADO
CAPÍTULO 2 ― VISITAS
CAPÍTULO 3 ― COMPENSAÇÃO
CAPÍTULO 4 ― ÓPERA
CAPÍTULO 5 ― PREOCUPAÇÕES
CAPÍTULO 6 ― JANTARES E SEDUÇÕES
CAPÍTULO 7 ― BEIJO
CAPÍTULO 8 ― WILLOW CASTLE
CAPÍTULO 9 ― DESCOBERTAS
CAPÍTULO 10 ― ALICE
CAPÍTULO 11 ― SENTIMENTOS
CAPÍTULO 12 ― DESMASCARADA
CAPÍTULO 13 ― PROPOSTA
CAPÍTULO 14 ― GRETNA GREEN
CAPÍTULO 15 ― SEGREDOS
CAPÍTULO 16 ― ENTREGAS
CAPÍTULO 17 ― CASAMENTO
CAPÍTULO 18 ― ESCÂNDALO
CAPÍTULO 19 ― WILLOW CASTLE
CAPÍTULO 20 ― MAGDALA
CAPÍTULO 21 ― TUDO FICARÁ BEM
EPÍLOGO

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