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PESQUISA HISTÓRICA E

REFLEXÃO METODOLÓGICA
APLICADA AO ENSINO
SUMÁRIO

Apresentação 4
Autor 5

UNIDADE 1

A História como ciência: a importância das fontes e dos 6


métodos
A comprovação: História como ciência

A crítica histórica

A relação entre fonte e método

UNIDADE 2

Pesquisa histórica e fontes 23


Fontes Materiais

ontes escritas e orais

Fontes audiovisuais
SUMÁRIO

UNIDADE 3

Pesquisa Histórica e Metodologia 40


História Comparada

Micro-História

História Oral

UNIDADE 4

Pesquisa Histórica Aplicada ao Ensino 57


O uso e a relevância das fontes históricas em sala de aula

Pesquisa e compreensão histórica em sala de aula

A pesquisa histórica como ferramenta interdisciplinar


APRESENTAÇÃO

A disciplina Pesquisa Histórica e Reflexão Metodológica Aplicada ao Ensino é essencial


ao estudante de História, tanto para sua formação intelectual como para sua utilização
enquanto ferramenta de ensino.

Por meio dos conteúdos abordados, é possível que você compreenda todo o processo
de construção da História como ciência, reconhecendo e operacionalizando suas
distintas fontes e métodos. Você entrará em contato com as diversas características
e particularidades da formatação do saber histórico. Crítica histórica, fontes escritas
e materiais orais e audiovisuais são alguns exemplos de distintas possibilidades de
formatação e de olhares sobre o passado. Da mesma forma, a História Comparada, a
História Oral e a Micro-história são métodos historiográficos que contribuirão com suas
especialidades. Com efeito, associamos as especificidades da História à prática docente,
ou seja, a compreensão das fontes e dos métodos de construção da História poderá ser
utilizada por você como uma ferramenta de ensino, ponto que dá funcionalidade a todo
o conhecimento trabalhado nesta disciplina.

Enfim, Pesquisa Histórica e Reflexão Metodológica Aplicada ao Ensino é uma disciplina


que alia fundamentos de pesquisa e investigação histórica à sua aplicação em sala de
aula. É fundamental para o professor se compreender, também, como pesquisador na
função de educador.

4
AUTOR

CLEBER EDUARDO KARLS

Doutor em História Comparada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ,


mestre em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS e graduado
em Estudos Sociais – Licenciatura Plena em História pela Universidade de Santa Cruz
do Sul — Unisco. Coordenador, professor e tutor do Curso de História modalidade EAD
da Universidade Veiga de Almeida – UVA. Professor do curso de História (presencial) da
UVA. Professor de História atuando na Educação Básica na rede privada da cidade do Rio
de Janeiro.

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UNIDADE 1

A História como ciência:


a importância das fontes e dos
métodos
INTRODUÇÃO

A História enquanto disciplina científica tem uma origem relativamente recente.


Fruto do contexto cientificista e racionalista do século XIX, foi somente no período
oitocentista que o estudo do passado ganhou ares de “verdade” e aderiu a uma série de
requisitos que o conduziram ao status de ciência. Nesse contexto, torna-se essencial a
compreensão do modo de estruturação do saber histórico. As fontes, ou seja, as marcas
do passado carregadas de informações, aliadas aos diversos métodos de construção do
conhecimento, são essenciais para a compreensão da História, suas potencialidades e
limites.

OBJETIVO

Nesta unidade, você será capaz de:

• Compreender a construção da História como saber científico e sua relação com


fontes e métodos históricos.

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A comprovação: História como ciência

É possível inferir que o registro do passado é uma


prática que perpassa toda a história em suas
mais distintas fases. Desde o início da humanida-
de, essa ação foi comum. No período conhecido
como “pré-histórico”, os homens já assinalavam
suas lembranças por meio das pinturas rupes-
tres, apontando aspectos de seu cotidiano e dei-
xando à mostra tradições, características de um
tempo. Na Antiguidade Clássica, obras que mes-
clavam ficção e realidade conjugavam mitologia Uma das pinturas rupestres em Lascaux,
com “cacos” de um passado carregado de carac- complexo de cavernas considerado
Patrimônio Mundial da Unesco.
terísticas culturais e sociais.

Todavia, a História reconhecida como ciência, elaborada por meio de um processo de


investigação metódica, vista com racionalidade e que procurava retratar e analisar o
passado de uma maneira muito próxima ao real, tem uma origem muito mais recente.

Em que momento, então, a História tornou-se reconhecida como ciência?

Foi somente no século XIX, embalada pela onda cientificista e racional do período, que a
História conquistou o status de ciência e buscou ser a retratação “verídica” do passado,
embasada em fontes e métodos. A História era a comprovação, a verdade, a prova
irrefutável do que aconteceu em tempos pretéritos, legitimada a partir de provas. Essa
questão é bem retratada por Marczal, que aponta:

Ainda hoje, muitas das bases daquilo que comumente se


compreende por história remontam aos alicerces da disciplina
durante o século XIX. Nesse intervalo, uma das principais
preocupações dos historiadores, especialmente aqueles sediados
no Velho Continente, foi de considerar a história como um saber
científico, isto é, assentado sobre procedimentos metodológicos
rígidos capazes de garantir um processo de investigação seguro e
comprovável. Em linhas gerais, os historiadores poderiam investir
firmemente sobre o passado, extrair dele um conhecimento

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verdadeiro e, com isso, elaborar uma narração fidedigna dos
fatos. Tudo isso com base nos vestígios autênticos do passado,
os quais comprovariam os eventos narrados pelos pesquisadores.
(2016, p. 32)

Nesse contexto, assumir o status de ciência era essencial para garantir a credibilidade
no mundo acadêmico e social. Esse novo paradigma se desenvolveu na França e,
especialmente, na Alemanha do século XIX com Leopold von Ranke. Esse é um dos
momentos essenciais do olhar sobre o passado em uma perspectiva científica:

Para a historiografia alemã — e também para a tradição


historiográfica ocidental como um todo —, Ranke foi fundamental
na consolidação de um modelo de fazer história calcado no
rigor metodológico do processo de investigação assim como na
consolidação da disciplina como uma especialidade universitária.
Foi ele, por exemplo, o responsável pela institucionalização do
modelo de seminário empregado nas universidades alemãs e
logo adotado por instituições de outros países. (MARCZAL, 2016,
p. 35)

Contribui com essa discussão Estevão Martins (2010), que destaca que uma série de
correntes de pensamentos historiográficos foram desenvolvidos a partir do período
oitocentista. Todavia, todas elas possuem, pelo menos, um ponto de convergência
basilar: “Deixam de considerar a história como uma crônica baseada nos testemunhos
legados pelas gerações anteriores e entendem-na como uma investigação, pelo que o
termo ‘história’ recupera seu sentido originário em grego” (MARTINS, 2010, p. 11).

9
Importante

Sem levarmos em consideração os debates acerca das especificidades dos distintos


olhares da História sobre o passado, que tiveram uma série de alterações entre os
séculos XIX e XXI, uma base sólida se manteve em todo esse processo, ou seja,
a necessidade científica de análise racional das fontes por meio de métodos que
propiciem essa avaliação. Enfim, a História, mesmo passando por novas roupagens,
agregando novos olhares e objetos, não deixou de carregar um caráter científico,
ainda que atualmente lide de forma mais madura com seus limites e possibilidades,
não tendo mais a ambição de ser a tradução de uma verdade absoluta. A História é,
antes de mais nada, um olhar meticuloso sobre o passado.

Juntamente com esse caráter científico e


racional da História, só é possível que ela seja
desenvolvida a partir de resquícios do passado
que são interpretados pelos historiadores, ou
seja, as fontes. Esses “cacos” são partículas do
passado que contam, com suas características,
especificidades de um tempo, como aponta Carla
Pinsky: “Historiadores trabalham com fontes. Nós
nos apropriamos delas por meio de abordagens
específicas, métodos diferentes, técnicas variadas. [...] Fontes têm historicidade” (PINSKY,
2005, p. 9). Isto é, só possível a escrita de uma História confiável, científica, a partir de
uma análise de fontes, que podem ser de diferentes tipos, como materiais, escritas, orais,
audiovisuais, cada uma com suas características, com suas especialidades.

Com efeitos, não basta interpretar fontes para se fazer História. Para a História atual,
científica, a análise do passado exige método. Cada metodologia é essencial e está
intimamente ligada a um tipo de fonte, a um modo de operacionalizar as marcas do
passado, ou seja, a matéria-prima da História, como destaca Barros:

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Já a metodologia remete a uma determinada maneira de trabalhar
algo, de eleger ou constituir materiais, de extrair algo destes
materiais, de se movimentar sistematicamente em torno do tema
definido pelo pesquisador. A metodologia vincula-se a ações
concretas, dirigidas à resolução de um problema; mais do que ao
pensamento, remete-se à ação. Assim, enquanto a “teoria” refere-
se a um “modo de pensar” (ou de ver), a metodologia refere-se a
um modo de fazer, ou ao campo de atividades humanas que a
filosofia denomina praxis. (2015, p. 80)

Dessa forma, os métodos podem variar de acordo com as fontes e com os objetivos
do pesquisador, passando por História Comparada, Micro-história e História Oral, cada
qual atendendo a distintas demandas. Todos os detalhes acerca das características, das
possibilidades e dos limites das fontes, e das metodologias da História, assim como as
possibilidades de sua aplicação no ensino, serão trabalhados no decorrer desta disciplina.

A História é, portanto, o resultado do estudo de uma imensa variedade


de resquícios do passado, que chamamos de fontes, analisados com cri-
tério, com método, para que a produção desse conhecimento possa ser
legítima, ter validade e servir como fonte de informação e análise confiá-
vel.

MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 1 e veja o conteúdo complementar indicado pelo


professor sobre o conceito de ciência.

11
A crítica histórica

A História é uma ciência

Essa premissa está consolidada e legitimada no universo acadêmico, mesmo que, por
inúmeras vezes, ainda receba ataques daqueles que não percebem uma exatidão nas
afirmações quando o objeto de investigação é o passado em todas as suas variáveis.
Essa questão, no entanto, é amplamente aceita quando percebemos que as próprias
conclusões advindas das mais diversas áreas da ciência têm limite e, de certa forma, em
um amplo contexto, “validade”.

Novas constatações surgem por meio de inéditas pesquisas científicas e refutam


antigas certezas muitas vezes consolidadas. O olhar do cientista sobre o mundo se
refina, e aquilo que parecia certo e absoluto passa a conquistar um status de obsoleto,
ultrapassado, ou seja, as “verdades” científicas ganham novas “realidades” a partir de
inéditas descobertas. Essa afirmação não é uma exclusividade somente da História e
pode ser vinculada a qualquer área do saber, como Química, Física, Biologia, Sociologia,
Geografia, Matemática... Contudo, a História, nesse seu contexto particular, possui
uma especificidade extremamente relevante para que possamos pensar a produção
do conhecimento histórico, assim como sua constante mutação a partir de novas
descobertas e olhares diversos: a crítica, ou “a crítica histórica”.

A princípio, equivocadamente é possível pensarmos que a “crítica histórica” seja um


posicionamento negativo sobre determinado fato ou, simplesmente, a negação de
determinada ocorrência ou pista do passado. Com efeito, a crítica, um dos pilares do
pensamento e da produção historiográfica, refere-se a um processo muito mais amplo e
profundo, em que existe a necessidade de um conhecimento prévio acerca de uma série
de questões que envolvem a própria produção sobre o passado, mas, especialmente, as
próprias marcas do que já aconteceu, ou seja, as fontes históricas.

Por que o olhar crítico da História é necessário?

Olhar, interpretar, perguntar sobre as diversas variáveis que estiveram envolvidas na


produção daquele “caco” do passado é essencial para que possamos saber mais do que
aparentemente nos é apresentado. Isto é, o historiador deve utilizar toda a sua bagagem
de conhecimento para tentar “decifrar” suas fontes.

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Quem escreveu/
produziu/pintou/falou?

O que estava
Qual a intenção? acontecendo naquele
Qual o contexto? local e no mundo
naquele momento?

Esses são apenas alguns exemplos de perguntas que devem ser feitas às fontes para
que, a partir do conjunto de informações, a História possa ser compreendida, “montada”,
decifrada. É nesse trabalho que se constitui a crítica histórica, em que o historiador,
utilizando o próprio conhecimento histórico, direciona-o no desenvolvimento de mais
considerações sobre o passado. Nesse contexto, o profissional da História faz uma
crítica externa aos documentos, como bem aponta Antoine Prost:

É necessário ser historiador para criticar um documento porque,


no essencial, trata-se de confrontá-lo com tudo o que já se sabe
a respeito do assunto abordado, do lugar e do momento em
questão; em determinado sentido, a crítica é a própria história e
ela se afina à medida que a história se aprofunda e se amplia.
(PROST, 2012, p. 57)

Com efeito, a crítica externa, ou seja, o olhar de fora da fonte sobre ela tem, também, em
um emaranhado muito amplo de atribuições a função de comprovar a veracidade de sua
origem. Tudo o que já você estudou aqui de nada serviria se a origem das informações
não fosse confiável. Nesse caso, todo o processo de produção do saber histórico estaria
comprometido. Essa é mais uma função característica da elaboração da história, da
crítica, de suma importância, apontada por Prost:

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[...] A crítica externa pode discernir os documentos provavelmente
autênticos em relação aos falsos ou àqueles que sofreram
modificações (crítica de proveniência); por exemplo, não há dúvida
sobre a falsidade de um documento, pretensamente do século
XII, se estiver escrito sobre um papel, e não um pergaminho.
Eventualmente, a crítica restabelece o documento original depois
de retirar-lhe os aditamentos ou ter restituído as partes faltantes,
à semelhança do que ocorre, frequentemente, com as inscrições
lapidares romanas ou gregas (crítica de restituição). (2012, p. 57)

Todos esses procedimentos exigem do profissional da História uma


“atitude crítica”.

É interessante perceber que esse olhar apurado, refinado, com critério feito sobre
os documentos e a produção historiográfica deve, ao mesmo tempo, recair sobre o
historiador, ou seja, sobre nós mesmos. Afinal, também somos o resultado de um
contexto histórico, de regionalidades, de individualidades. Temos nossos gostos, nossas
preferências e devemos estar atentos para que essas questões, que são naturais a
todos, não influenciem (ou, pelo menos, o mínimo possível) na interpretação de outras
questões envolvidas no trabalho do historiador. A crítica deve ser tanto à “história” como
ao historiador, que deve se despir de conceitos apriorísticos e perceber a pluralidade de
seu objeto de análise e se aproximar ao máximo da “realidade”, mesmo sabendo que esta
é inatingível em sua plenitude. A realidade/verdade é, também, uma construção individual
que tem distintas interpretações, nas quais, mais uma vez, o protagonismo se dá pelo
olhar do historiador:

Nenhuma hipótese explicativa ou descritiva poderia se furtar ao


confronto com os fatos, instância decisiva dos valores de verdade.
Tal definição de verdade — adequação de enunciados subjetivos
e objetos reais — pressupõe, contudo, a diferença fundamental
entre sujeito e objeto, pois o acordo deles só ocorreria numa
correspondência proporcionada em certos casos e justamente
pelo método. A autenticidade das fontes, a sua análise correta, a
seleção dos fatos individuais relevantes, em todas essas tarefas
do método revela-se uma ideia de verdade que não está garantida
de antemão, na qual a verdade mesma é resultado de operações
e atitudes específicas do historiador. Ela não se entregaria
imediatamente, tendo de ser obtida, arrancada dos dados quase
como uma confissão. (GRESPAN, 2011, p. 292-293)

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De fato, a produção do conhecimento histórico não pode abrir mão de uma série de
variáveis. Para que a História tenha credibilidade, é importante que o cuidado do produtor
desse conhecimento e suas fontes, com sua atenta leitura e crítica própria, sejam
basilares. Contudo, como aponta Jorge Grespan:

[...] não se deve exagerar a importância atribuída ao sujeito aqui.


A história não é definida como uma matéria disforme, a ser
elaborada ou construída pelo método do historiador: embora a
forma não se apresente no início do estudo, ela existe e organiza o
conteúdo do histórico, cabendo ao historiador apenas descobri-la
e assim representar adequadamente o conteúdo. Essa é a ação
propriamente dita do sujeito conforme a Escola Histórica e seus
descendentes. (2011, p. 293)

O processo de construção da História exige uma série de requisitos que a fazem receber
o rótulo de ciência. Nesse conjunto, uma variável se destaca como fundamental: a crítica
histórica. Se as demais ciências possuem, igualmente, métodos, comprovação e teorias,
a História, por ter como matéria-prima as fontes que são, na maioria das vezes, produtos
das próprias relações sociais dos seres humanos, valoriza ainda mais essa característica.
É por essa questão que a crítica às fontes, à escrita e ao próprio historiador são deveras
importantes nessa produção. A sensibilidade do olhar crítico do historiador não pode
sobrepor a marca e a comprovação do passado que é a fonte, assim como esse pedaço
do que já aconteceu também não fala por si só, necessitando do historiador para sua
interpretação.

MIDIATECA

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professor sobre a importância dos trabalhos científicos entre os professores.

15
A relação entre fonte e método

Para iniciar a explicação, vamos entender o que são as fontes históricas?

As fontes históricas são as matérias-primas


essenciais da História. É delas que são extraídas
informações do passado, e são elas que nos
“contam” características de um tempo que não
vivemos, que apresentam números, imagens,
sensibilidades, e que servem de “combustível”
para a História. Praticamente qualquer marca
do passado pode se tornar uma fonte histórica
e contar aspectos pretéritos interpretados sob
o olhar do historiador. Jornais, fotografias, O Museu Imperial de Petrópolis (RJ)
possui um importante acervo relativo ao
literatura, cinema, correspondências, documentos império brasileiro.
governamentais, depoimentos, testamentos e,
mais recentemente, arquivos de internet, entre outros exemplos, são riquíssimas fontes
históricas. O uso desses mesmos documentos pode ser considerado o resultado,
resquício de um tempo, de demandas de um contexto social, político, cultural e econômico,
e devem ser valorizados. Sobre isso, veja o que Pinsky afirma:

O uso das fontes também tem uma história porque os interesses


dos historiadores variaram no tempo e no espaço, em relação
direta com as circunstâncias de suas trajetórias pessoais e
com suas identidades culturais. Ser historiador do passado ou
do presente, além de outras qualidades, sempre exigiu erudição
e sensibilidade no tratamento das fontes, pois delas depende a
construção convincente de seu discurso. (PINSKY, 2011, p. 10)

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Todavia, cada uma dessas marcas do passado tem suas
particularidades, foram produzidas em determinado
contexto, em épocas diversas, e nos contam aspectos
diferentes do tempo ido: a literatura, mesmo que ficcional,
está carregada de sensibilidades, sentimentos; os jornais
carregam os interesses de seus leitores, direção e equipe
editorial; já os relatórios ministeriais do Brasil Império
mostram características de um tempo visto pelo Estado;
e a própria Carta de Caminha, considerada a certidão
de nascimento do Brasil, não é um documento histórico
ingênuo, mas sim um importante relato que, ao mesmo
Uma das páginas da Carta de
tempo em que era informativo, também demostrava os Caminha.
interesses da Coroa Portuguesa e da Igreja Católica. Fonte:
https://digitarq.arquivos.pt/
viewer?id=4185836.

Importante

Enfim, os documentos são diversos, cheios de informações, mas não podem ser
encarados como iguais e uniformes. Cada um carrega consigo marcas, que têm no
historiador o profissional responsável por decifrá-las — marcas muitas vezes não
visíveis.

Nesse sentido, existem relações necessárias entre os tipos de fontes e os métodos


utilizados, ou seja, a maneira como elas serão analisadas. Cada marca do passado tem
características singulares, e estas devem ser contempladas pelos métodos de análise
histórica, que também possuem suas especificidades.

Em uma análise/pesquisa histórica, quais devem ser os pontos de


atenção? Veja a seguir!

É preciso, portanto, estar atento à relação entre a fonte e o método quando propomos
uma análise/pesquisa histórica. A metodologia, tão importante para a pesquisa histórica,
é, ao mesmo tempo, diferente desta, porém complementar e necessária, e deve estar
associada à possibilidade de investigação histórica, como aponta Cervo:

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Em seu sentido mais geral, o método é a ordem que se deve
impor aos diferentes processos necessários para atingir um
certo fim ou um resultado desejado. Nas ciências, entende-se por
método o conjunto de processos empregados na investigação e
na demonstração da verdade.

Não se inventa um método; ele depende, fundamentalmente,


do objeto de pesquisa. Os cientistas cujas investigações foram
coroadas de êxito tiveram o cuidado de anotar os passos
percorridos e os meios que os levaram aos resultados. Outros,
depois deles, analisaram tais processos e justificaram sua
eficácia. Assim, esses processos, empíricos no início, foram
transformados, gradativamente, em métodos verdadeiramente
científicos. (CERVO, 2007, p. 27)

Desse modo, existe a necessidade de uma coerência entre a fonte e seu respectivo
método. É preciso que a documentação, com suas características peculiares, propicie
ou mesmo seja a melhor opção para a utilização do método, que cabe ao historiador, de
acordo com suas sensibilidade e percepção, decidir. São decisões metodológicas que
implicam o rumo que a pesquisa seguirá, como bem aponta Barros:

Uma vez que já nos decidimos a fazer algo, será necessário


escolher os “modos de fazer”, nos municiarmos de instrumentos
necessários a este “fazer”, planejar sistematicamente este “fazer”.
A escolha de um tipo de calçado inadequado, de uma maneira
de caminhar inapropriada, de uma técnica incompatível com
o tipo de solo ou clima — cada uma dessas coisas poderá ser
responsável pelo fracasso da empreitada. Se quisermos atingir
com menos riscos e desacertos uma finalidade, deveremos
buscar conscientemente um conjunto de “metodologias”, de
instrumentos e modos de fazer. A própria necessidade nos obriga
a isto. (BARROS, 2012, p. 81)

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Pesquisa histórica “científica”

A pesquisa histórica “científica” iniciou seu desenvolvimento em torno do século XIX. Do


período oitocentista até o século XXI, alguns paradigmas continuam imutáveis, como
a necessidade de um rigoroso critério para a elaboração da História. Todavia, o mundo
passou por inúmeras mudanças em diversas ordens. Novos documentos sugiram, o
que não era valorizado pelos historiadores passou a ter valor inestimável, e até mesmo
a tecnologia fez com que a função do historiador fosse repensada do ponto de vista das
fontes de pesquisa e das metodologias.

Para refletir

Afinal, arquivos de internet, fotos digitais, blogs e sites diversos são fontes históricas?
E, se são, como utilizá-las com critério e seriedade para que o conhecimento
produzido seja sólido e confiável? Como dar conta da imensidão de material
produzido atualmente? Como lidar com as novas tecnologias? Que metodologia
usar?

Enfim, aos historiadores cabe o desafio de se adaptar a seu tempo e, concomitantemente,


ser capaz de interpretar pedaços do passado de épocas remotas, distantes de sua
realidade atual. Nesse contexto, a relação entre fontes, que são as materialidades do
passado, a maneira de analisá-las, além da própria sensibilidade do olhar histórico do
pesquisador se tornam fatores extremamente relevantes na produção do conhecimento
histórico.

MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 1 e veja o conteúdo complementar indicado pelo


professor sobre o ofício do historiador.

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NA PRÁTICA

O professor de História, ao dominar o processo de pesquisa e produção do


conhecimento sobre o passado, consegue demonstrar, dialogar, problematizar,
enfim, provocar seus alunos a buscar o conhecimento — ela dá vida à matéria e liga
o abstrato às marcas do passado, interrogando-as. Ao reconhecer como se dá a
construção da História, o docente dá significado àquela disciplina e tem capacidade
de propor exemplos de fontes e métodos de pesquisa, pluralidade de informações,
e até mesmo de dialogar sobre quais são os limites que a História possui. Enfim, o
processo de ensino e aprendizagem se torna mais sólido.

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Resumo da Unidade 1

Nesta unidade A História como ciência: a importância das fontes e dos métodos, você
estudou as características que envolvem a construção da História enquanto ciência a
partir do século XIX, especialmente no que se refere à sua relação com as fontes e os
métodos historiográficos. Nesse sentido, no primeiro conteúdo, você pôde compreen-
der a disciplina histórica no contexto científico, sua consolidação, suas especificidades
e seus limites. Complementando, no segundo ponto desta unidade, você conheceu a
relevância da crítica histórica para sua constituição, ou seja, de que maneira o historiador
utiliza seus pensamentos e conhecimentos críticos para, por meio de resquícios muitas
vezes incompletos do passado, remontar cenários, fatos e contextos que já não existem
mais. Por fim, no último conteúdo desta unidade, você entendeu a relevância da relação
entre a fonte e o método, e também aprendeu as distintas possibilidades e a necessidade
de o profissional da História ser coerente na adoção de suas fontes e metodologias, que
devem ser compatíveis e tratar de objetos tão diversos quanto a própria História.

CONCEITO

A História enquanto ciência e disciplina independente teve origem no século XIX, jus-
tamente fruto do contexto de valorização da comprovação científica e da busca pela
“verdade”. Nesse período, aponta Silva (2010) no Dicionário de conceitos históricos
(p. 58), surgiu o cientificismo como forma de saber superior, criado pelo positivismo
no século XIX. Em linhas gerais, ele pensava a ciência como a busca da verdade a
partir da rigorosa observação empírica, sem o uso da imaginação ou das emoções.
Hoje, essa ideologia do progresso ainda existe, mas cada vez mais os pensadores
começam a perceber que a racionalização e o cientificismo não libertam o homem.
No século XX, particularmente a partir de seu final, assim como no século XXI, muito
se tem questionado a visão positivista da ciência. A ideia atual é a de que a ciência é
uma atividade que tem muito de criação e imaginação.

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Referências

BARROS, J. D. O projeto de pesquisa em História: da escolha do tema ao quadro teóri-


co. 8. ed. Petrópolis: Vozes, 2012.

CERVO, A. L. et. al. Metodologia científica. 6. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007.

GRESPAN, J. Considerações sobre o método. In: PINSKY, C. B. (Org.). Fontes históricas.


São Paulo: Contexto, 2005.

MARCZAL, E. S. Introdução à historiografia: da abordagem tradicional às perspectivas


pós-modernas. Curitiba: InterSaberes, 2016.

MARTINS, E. R. (Org.). A História pensada: teoria e método na historiografia europeia do


século XIX. São Paulo: Contexto, 2010.

PINSKY, C. B. (Org.). Fontes históricas. São Paulo: Contexto, 2005.

PEREZ, D. G. et al. Para uma imagem não deformada do trabalho científico. Ciênc. educ.
Bauru, v. 7, n. 2, p. 125-153, 2001. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?scrip-
t=sci_arttext&pid=S1516-73132001000200001&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 22 dez.
2018.

PROST, A. Doze lições sobre a história. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2012.

SILVA, K. V.; SILVA, M. H. Dicionário de conceitos históricos. 3. ed. São Paulo: Contexto,
2010.

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UNIDADE 2

Pesquisa histórica e fontes


INTRODUÇÃO

Esta unidade da disciplina Pesquisa histórica e reflexão metodológica aplicada


ao ensino, que chamamos de Pesquisa histórica e fontes, aproxima o estudante de
História da matéria prima do historiador, ou seja, as fontes históricas. Destacamos que os
vestígios do passado podem ter distintas formas: materiais, escritas, orais e audiovisuais.
Cada um desses “pedaços do passado” traz consigo características e informações
distintas e necessitam de um olhar diferenciado para que possam ser analisados de
maneira correta. Por isso, buscamos destacar especificidades, potencialidades e limites
de diversos tipos de fontes históricas.

OBJETIVO

Nesta unidade, você será capaz de:

• Reconhecer os distintos tipos, características e utilizações das fontes na pesquisa


histórica.

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Fontes Materiais

A correta utilização de fontes no desenvolvimento do conhecimento histórico é tão


fundamental quanto os próprios registros do passado. Ou seja, se cada tipo de fonte tem
suas características, o profissional de História precisa reconhecer as potencialidades de
marcas extemporâneas para que estas lhe deem respostas que representem o contexto
em que foram produzidas. Esse olhar especializado também é influenciado pelo tempo,
já que a sensibilidade, assim como os objetivos dos historiadores no decorrer dos anos,
também se altera. Dessa forma, como depõe Pinsky, é necessário cuidado extremo com
a história das fontes:

O uso das fontes também tem uma história porque os interesses


dos historiadores variaram no tempo e no espaço, em relação
direta com as circunstâncias das suas trajetórias pessoais e
com suas identidades culturais. Ser historiador do passado ou
do presente, além de outras qualidades, sempre exigiu erudição
e sensibilidade no tratamento de fontes, pois delas depende a
construção convincente de seus discursos. (2011, p. 10)

Ou seja, aqueles “testemunhos” do passado são passíveis ao olhar dos pesquisadores,


que devem compreender o contexto no qual eles foram produzidos. O historiador, por mais
complexo que isso seja, deve, mediante seu conhecimento do passado, reconhecer aquela
“marca” no contexto em que foi produzida. Dessa forma, a fonte tem significado e pode
contribuir com preciosas informações. Entre essa variedade imensa de “testemunhos”,
as fontes materiais estão entre as mais antigas e importantes para o estudo do passado.

Mas o que são fontes materiais?

De uma maneira bem simplificada, as fontes


materiais (também chamadas de arqueológicas)
são os resultados da cultura material, que devem
ser entendidas como tudo o que é feito ou utilizado
pelo homem (FUNARI, 2011, p. 85). Ou seja,
materiais produzidos pelo homem e que podem
nos trazer informações são fontes materiais ou
arqueológicas. Nesse caso, o leque de exemplos
Ruínas da antiga cidade de
Pompeia.

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é amplo e inclui edifícios, vasos, esculturas e até mesmo ruas e restos de alimentação. A
cidade de Pompéia, na Itália, devastada pelas lavas do vulcão Vesúvio, também pode ser
considerada um exemplo de fonte histórica material.

O fato é que a cultura material e suas fontes paulatinamente se valorizaram no que se


refere à historiografia. Com o desenrolar do século XX e a consequente valorização de
diversos objetos de estudo, também se ampliaram as possibilidades de utilização de
fontes.

As análises das materialidades deixaram de estar ligadas somente à antiguidade clássica


de Grécia e Roma para perceberem aspectos interessantes de investigação em diversos
momentos históricos, desde os mais distantes aos mais contemporâneos. Nesse
contexto, as fontes materiais conquistaram um espaço privilegiado ao abrirem espaço
para interpretações inéditas em diversas possibilidades interpretativas do passado:

As fontes arqueológicas também encontraram terreno fértil


em diversas correntes historiográficas, preocupadas com a
multiplicidade de quotidianos. Brinquedos de crianças, artefatos
femininos, edifícios escolares, tudo permite ampliar o olhar do
historiador sobre o passado. O estudo das camadas subalternas
muito tem se ampliado e, para isso, as fontes arqueológicas
contribuem de forma notável, com seu caráter anônimo e
involuntário. Cultura espiritual e material revelam-se parte de
um mesmo todo, como discursos a serem interpretados pelo
historiador. Nunca as fontes arqueológicas foram tão difundidas
entre os historiadores e seu êxito só tente a aumentar. (FUNARI,
2011, p. 93-94)

Como interpretar as fontes materiais?

Pesquisar em história, especialmente quando utilizamos fontes materiais, é buscar


informações de materialidades que muitas vezes parecem não emitir significado ou ter
alguma importância histórica. Nesse contexto, apresentaremos algumas possibilidades
que podem ajudar o pesquisador a “traduzir” sua fonte a partir de suas características.
Todavia, não há um método único e imutável.

26
Importante

Toda fonte, assim como o olhar do historiador, é única e pode se moldar de acordo
com as necessidades e particularidades do objeto de estudo.

Com efeito, existem alguns procedimentos que inexoravelmente devem ser executados.
É necessário que as características específicas do tipo de fonte sejam percebidas em
relação ao contexto em que foram produzidas. Ou seja, devemos “interrogar” as fontes
para que possamos recolher o maior número possível de informações sobre o que
estamos pesquisando: Quem fez? Como? Porque? Em que contexto? Qual foi a finalidade?

Outra questão muito importante é o estudo, se houver, de informações já registradas


sobre uma dada sociedade sem escrita, em especial. Mesmo que os povos nativos
brasileiros, por exemplo, não tenham desenvolvido uma linguagem escrita, existem
registros externos acerca desses povos, como os de padres e colonizadores europeus.
Outra possibilidade analítica das fontes materiais é a comparação, como destaca Funari:

Para tempos mais recentes, as fontes arqueológicas devem


ser abordadas tendo em vista a possibilidade da analogia com
outros povos em situação semelhante, no que chamamos de
paralelo etnográfico. Por meio da observação do comportamento
de grupos vivos, formularam-se alguns conceitos que foram
aplicados ao passado da humanidade e ao estudo das fontes
arqueológicas. (2011, p. 96)

De toda a forma, “fontes arqueológicas constituem um manancial extremamente


variado para o historiador de todos os períodos da História, do mais recuado passado
da Humanidade, até os mais recentes períodos e épocas” (FUNARI, 2011, p. 104). É
importante lembrar, no entanto, que, mesmo as materialidades são resultado da ação do
homem, de representantes do pensamento de uma época, moldados em suas crenças,
tradições e relações.

27
MIDIATECA

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professor sobre a importância da preservação de fontes históricas.

28
Fontes escritas e orais

Quando tratamos de fontes escritas e orais estamos nos referindo a questões que,
aparentemente, podem parecer divergentes. No entanto, esses dois tipos de registros do
passado contêm características que os aproximam, embora existam peculiaridades que
precisam ser percebidas. Dessa forma, vamos estudar separadamente as fontes escritas
e orais para que possamos atentar aos detalhes de cada uma.

Fontes escritas

Quando tratamos de “fontes escritas” estamos nos referindo a todo tipo de relato/registro/
documento que pode ser fonte de informação para o historiador ou professor e, ainda, pode
servir como material didático sob orientação do especialista. Fontes históricas escritas
contemplam um enorme leque de opções, que vão desde documentos do Estado, como
relatórios de presidentes de província, discursos parlamentares, relatórios ministeriais e
periódicos (jornais, revistas), até a literatura (romances, poemas etc.). Esses são apenas
alguns exemplos de fontes escritas utilizadas por profissionais da História.

Escritura em grego antigo, encontrada em Herculano, perto de Pompeia.


As duas cidades foram destruídas pela erupção do Vesúvio em 79 d.C.

29
Qualquer registro escrito pode servir como fornecedor de informação sobre o passado,
basta que conheçamos as características de cada fonte. Portanto, é imprescindível fazer
uma análise crítica da fonte, ou seja, perguntar, por exemplo: Quem escreveu? Onde
escreveu? Quando escreveu? Porque escreveu? Quais eram seus os interesses? Quem
leu?

Uma das fontes escritas que tem ganhado cada vez mais espaço na produção
historiográfica são os jornais, haja vista que eles contêm uma série de características
de seu tempo e tratam de temas variados. Ainda, carregam a linguagem do cotidiano e
os interesses do público leitor. Dessa forma, servem aos estudiosos do passado como
valiosa fonte de informação, como destaca Karls:

[...] mesmo circunscrita como qualquer outra fonte que pudesse


ser utilizada, a imprensa representa uma leitura de uma época em
determinado local que tem suas peculiaridades e que, ricamente,
contribui para a interpretação de um processo a partir de um tipo
de olhar e um cunho de discurso. [...] A pesquisa histórica passou
a apreciar e considerar novos documentos que não eram mais
os detentores das respostas a todas as perguntas, mas, sim,
representantes de valiosas interpretações e representações de
um tempo. Nesse conjunto, a imprensa se encaixa exatamente,
com suas opiniões, posições, impressões, destaques e tudo o
que faz dela uma riquíssima fonte de informações. (2017, p. 24)

Independentemente de a fonte escrita ter caráter oficial ou ficcional, ela não tem condições
de dar conta da totalidade de uma época ou de um fato. As fontes são, devido a suas
características, portadoras de especificidades. Nesse sentido, um tipo de fonte que tem
conquistado muito espaço na historiografia, justamente por carregar consigo uma série
de sensibilidades que outros registros do passado não têm, é a literatura. Ou seja, mesmo
que a ficção não seja um relato “real” do passado, ela contém traços de uma época.
A partir de romances, poemas, contos etc., é possível reconhecer aspectos que outras
fontes são incapazes de fornecer. A literatura pode nos proporcionar, por meio de suas
metáforas ficcionais e representativas, a possibilidade de uma visão sensível do passado,
como destaca a historiadora Sandra Pesavento:

30
Este mundo de detalhes do cotidiano, este espectro de caracteres e
procederes, revelam-se a nós de maneira cifrada, como máscaras
do social, através da narrativa da ficção. Por meio daquele enredo
imaginário, representação fictícia de um outro tempo, somos
capazes de chegar mais perto do passado, fazendo-o falar sobre
outro ângulo. Apesar da linguagem metafórica, os sinais adquirem
significado quando cruzados com outros dados da passeidade,
que formam o conteúdo de informação que o historiador possui.
(1996, p. 117)

Do registro formal à liberdade poética da literatura, as fontes escritas constituem uma


gama muito grande de opções de registros do passado. Ao historiador cabe fazer as
perguntas corretas a cada uma delas para que o maior número possível de informações
possa ser extraído desses “pedaços” do passado.

Fontes Orais

O processo de legitimação da oralidade como fonte histórica é relativamente recente,


como aponta Verena Alberti:

A história oral é uma metodologia de pesquisa e de constituição


de fontes para o estudo da história contemporânea surgida em
meados do século XX, após a invenção do gravador à fita. Ela
consiste na realização de entrevistas gravadas com indivíduos
que participaram de, ou testemunharam, acontecimentos e
conjunturas do passado e do presente. Tais entrevistas são
produzidas no contexto de projetos de pesquisa, que determinam
quantas e quais pessoas entrevistar, o que e como perguntar, bem
como que destino será dado ao material produzido. (2011, p. 155)

31
A utilização de fontes orais necessita uma série de cuidados e um minucioso método de
produção da pesquisa. Por outro lado, é uma riquíssima possibilidade para se reconhecer
experiências, sensibilidades, impressões de personagens históricos etc., a partir de suas
memórias. Nesse sentido, cada pessoa entrevistada também está inserida em um
contexto e, por vezes, o próprio silêncio em relação a determinado tema é uma resposta
ao historiador. Verena Alberti faz uma interessante análise dessas características:

A análise de um depoimento de História oral — realizada pelo


próprio pesquisador, seja por terceiros — deve considerar a fonte
como um todo. É preciso saber “ouvir” o que a entrevista tem a
dizer, tanto no que diz respeito às condições da sua produção
quanto no que diz respeito à narrativa do entrevistado: o que
nos revela sua visão dos acontecimentos e de sua própria história
de vida acerca do tema, de sua geração, de seu grupo, das formas
possíveis de conceber o mundo, etc. Tomar a entrevista como um
todo significa ouvi-la ou lê-la do início ao fim, observando como
as partes se relacionam com o todo e como essa relação vai
constituindo significados sobre o passado e o presente sobre a
própria entrevista. E atentar também para relatos, interpretações
e pontos de vista “desviantes”, isto é, que não se encaixam nos
significados produzidos. (2011, p. 185)

As peculiaridades concernentes, portanto, aos diversos tipos de fontes históricas,


especialmente as escritas e orais aqui tratadas, não falam por si só. Por mais ricas e
completas que sejam, cada uma tem suas peculiaridades e o responsável por “traduzir”
essas especificidades e produzir a história é, mais uma vez, o historiador ou o professor
de História. Com o olhar apurado, sensibilidade e visão conjuntural, esse profissional tem
a capacidade de extrair de pedaços do passado a história, para guiar seus discentes
nesse mesmo caminho, dando significado e relevância ao estudo do passado.

32
MIDIATECA

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professor sobre o acervo da Biblioteca Nacional como fonte de pesquisa ou de
material para a sala de aula.

33
Fontes audiovisuais

Podemos englobar nesse grupo das fontes audiovisuais uma série de recursos ligados,
na maioria das vezes, ao desenvolvimento tecnológico que possibilitou novos registros,
de diferentes perfis. Filmes e acervos de televisão e música, por exemplo, são fontes
capazes de fornecer riquíssimas informações ao pesquisador ou de servir como material
didático em sala de aula. Estas, no entanto, apesar de sua riqueza, merecem atenção,
como aponta Napolitano:

As fontes audiovisuais e musicais ganham crescentemente


espaço na pesquisa histórica. Do ponto de vista metodológico,
são vistas pelos historiadores como fontes primárias novas,
desafiadoras, mas seu estatuto é paradoxal. Por um lado, as
fontes audiovisuais (cinema, televisão e registros sonoros em
geral) são consideradas por alguns, tradicional e erroneamente,
testemunhos quase diretos e objetivos da história, de alto poder
ilustrativo, sobretudo quando possuem um caráter estritamente
documental, qual seja, o registro direto de eventos e personagens
históricos. Por outro lado, as fontes audiovisuais de natureza
assumidamente artística (filmes de ficção, teledramaturgia,
canções e peças musicais) são percebidas muitas vezes sob o
estigma da subjetividade absoluta, impressões estéticas de fatos
sociais objetivos que lhes são exteriores. A questão, no entanto, é
perceber as fontes audiovisuais e musicais em suas estruturas
internas de linguagem e seus mecanismos de representação
da realidade, a partir de seus códigos internos. Tanto a visão
“objetivista” quanto o estigma “subjetivista” falham em perceber
tais problemas. (2011, p. 236)

O desenvolvimento da tecnologia e a criação de novas maneiras de registro e representação


do passado fazem com que o pesquisador de história tenha, também, de se moldar a
essa nova realidade para reconhecer fontes audiovisuais como resultados de uma época.

34
Curiosidade

Observe o cartaz do famoso filme Tempos


Modernos (1936), interpretado por Charles
Chaplin. O filme é considerado um marco na
história do cinema, ao representar os efeitos do
processo de industrialização desencadeado após
a Segunda Revolução Industrial.

Fonte: https://pt.wikipedia.org/
wiki/Tempos_Modernos

As fontes audiovisuais transitam entre o “objetivo” e o “subjetivo”. Todavia, carregam


consigo aspectos peculiares de uma época, um local, ou pensamento. Fazendo uma
comparação rápida, a literatura (fonte impressa) e o cinema (audiovisual) se aproximam
muito por serem resultado de “invenções” ou reinterpretações. No entanto, o cinema
apresenta uma variável muito importante nesse processo: a imagem. Para o historiador
Roger Chartier, citado por Napolitano (2011, p. 239), “a imagem é, para o historiador, ao
mesmo tempo, transmissora de mensagens enunciadas claramente, que visam seduzir e
convencer, e tradutora, a despeito de si mesma, de convenções partilhadas que permitem
que ela seja compreendida, recebida, decifrável”. Ou seja, esses tipos de fontes são
carregados de informações e de uma tendência que transita livremente entre a evidência
e a representação. Merecerem, por isso, uma série de cuidados em sua utilização.

Cuidados com a utilização de fontes audiovisuais

Existem algumas características dos documentos audiovisuais que devem ser levadas
em consideração. Novamente, cada documento deve ser visto a partir das suas
particularidades. Grifar esse aspecto é necessário, por ser ele essencial à análise. Uma
das mais difundidas fontes históricas audiovisuais é o cinema. Se por um lado ele conta
com acervo relativamente bem cuidado — ainda mais com a popularização da internet,

35
a análise fílmica merece cuidados específicos, já que existem variáveis imensas nas
produções do século XX e nas que vemos se estender até os dias atuais. Por isso, o olhar
do historiador deve ser amplo:

O que importa é não analisar o filme como “espelho” da realidade


ou como “veículo” neutro das ideias do diretor, mas como o
conjunto de elementos, convergentes ou não, que buscam
encenar uma sociedade, seu presente ou seu passado, nem
sempre com intenções políticas ou ideológicas explícitas. Essa
encenação fílmica da sociedade pode ser realista ou alegórica,
pode ser fidedigna ou fantasiosa, pode ser linear ou fragmentada,
pode ser ficcional ou documental. Mas é sempre encenação, com
escolhas predeterminadas e ligadas a tradições de expressão
e linguagem cinematográfica que limitam a subjetividade do
diretor, do roteirista, do ator. É nessa tensão que se deve colocar
a análise historiográfica. (NAPOLITANO, 2011, p. 276)

Ao utilizarmos as fontes televisuais, devemos também fazer perguntas sobre esses


registros, identificando autor(es), público, diretor etc. Todas essas orientações podem
ser utilizadas nos diversos gêneros de registros audiovisuais. Ou seja, é necessário que
o pesquisador compreenda o processo de formação daquela fonte e não a análise em si,
como resultado isolado de um contexto.

Curiosidade

Hoje, especialmente a partir do final do século XX e do início do século XXI, a


internet proporcionou uma série de novas fontes de informações audiovisuais,
como blogs, vídeos, sites diversos e notícias, armazenados em ambientes virtuais.
Se, por um lado, a quantidade de informações à disposição de todos nós cresceu
assustadoramente, elas também se tornaram um tanto volúveis, podendo aparecer
e desaparecer o tempo todo nos ambientes virtuais. Nesse caso, é ainda mais
importante o trabalho de “crítica da fonte” executada pelo historiador. Afinal, o que
está na internet é confiável? A notícia foi apagada? Que site a publicou? É fake
news? Existe uma intenção política?

36
Enfim, o trabalho do historiador está se tornando cada vez mais complexo, mas, ao
mesmo tempo, cada vez mais valioso e necessário. Se uma quantidade cada vez maior
de registros é utilizada como matéria prima para a História, cabe ao historiador refinar
progressivamente seu olhar sobre o passado e sobre suas fontes.

MIDIATECA

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professor sobre a relação entre História e Literatura.

NA PRÁTICA

Na prática docente, por exemplo, ter consciência da importância de fontes históricas


e utilizá-las como material didático ou complementar/ilustrativo é uma das formas
de tornar a matéria mais interessante e de dar um significado mais concreto à
história. Ou seja, existe uma diferença entre abordar um fato histórico em um livro
didático e diretamente na fonte. Por exemplo, pode-se tratar da Revolução de 1930 a
partir de jornais, ou pode-se abordar a ditadura militar no Brasil a partir das músicas
de Chico Buarque e Caetano Veloso, ou ainda, pode-se abordar o genocídio da
Segunda Guerra Mundial a partir do livro Diário de Anne Frank. Dessa forma, as
fontes ganham significado e vida e passam a contribuir para a leitura crítica do texto
histórico, demonstrando a complexidade desse saber.

37
Resumo da Unidade 2

A unidade Pesquisa histórica e fontes faz um apanhado de diferentes perfis de fontes


históricas, destacando suas características, aplicabilidades e apontando possibilidades
de utilização e limites de uso. Os três conteúdos estão divididos em “fontes materiais”,
“fontes escritas e orais” e “fontes audiovisuais”. Em cada um desses pontos, abordamos
o contexto historiográfico de utilização dessas informações, além de destacar exemplos
de cada tipo de fonte.

CONCEITO

Para compreender a potencialidade de algumas fontes, é necessário perceber que


elas são “representações” do passado e não o passado propriamente dito. Por isso,
é tão importante conhecer e analisar esse conceito: a representação é uma con-
strução imagética e discursiva que enuncia ou presentifica o outro — no caso, recria
o real. Nesse processo, a evocação não precisa ter correspondência reflexa com o
objeto representado. Ou seja, a adequação das representações não se mede por
critérios de autenticidade ou veracidade, mas por sua capacidade mobilizadora, de
motivar práticas sociais e de granjear credibilidade, indo ao encontro daquilo que os
indivíduos visam, sonham, esperam, temem (PESAVENTO, 1993, p. 112).

38
Referências

ALBERTI, V. Fontes orais: histórias dentro da história. In: PINSKY, C. B. (Org.). Fontes his-
tóricas. São Paulo: Contexto, 2011.

FUNARI, P. P. Os historiadores e a cultura material. In: PINSKY, C. B. (Org.). Fontes histó-


ricas. São Paulo: Contexto, 2011.

KARLS, C. E. Modernidades sortidas: o esporte oitocentista em Porto Alegre e no Rio


de Janeiro. 2017. Tese (Doutorado em História). UFRJ - Programa de Pós-Graduação em
História Comparada. Rio de Janeiro, 2017.

NAPOLITANO, M. Fontes audiovisuais: a história depois do papel. In: PINSKY, C. B. (Org.).


Fontes históricas. São Paulo: Contexto, 2011.

PESAVENTO, S. J. Com os olhos de Clio ou a literatura sob o olhar da História a partir do


conto O Alienista, de Machado de Assis. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 16,
n. 31-32, 1996.

______. Imagens da Violência: o discurso criminalista na Porto Alegre do fim do século.


Humanas: IFCH – UFRGS, Porto Alegre, v. 16, n. 2, jul./dez., 1993. p. 109-131.

PINSKY, C. B. (Org.). Fontes históricas. São Paulo: Contexto, 2011.

39
UNIDADE 3

Pesquisa Histórica e Metodologia


INTRODUÇÃO

Para a compreensão da pesquisa histórica e da própria percepção da História enquanto


ciência, torna-se imprescindível o reconhecimento de distintos métodos de investigação
que têm conexões com o estudo do passado. Para isso, destacamos três, que julgamos
essenciais para a profissão do historiador assim como para a prática docente:

• História Comparada.
• Micro-História.
• História Oral.

Com isso, pretendemos destacar as diversas possibilidades, as particularidades e


aplicabilidades dos olhares metodológicos, assim como a riqueza do estudo do passado
e seus limites.

OBJETIVO

Nesta unidade, você será capaz de:

• Compreender as características e possibilidades de utilização de distintos métodos


de pesquisa histórica.

41
História Comparada

A História Comparada é um método de pesquisa histórica que começou a se destacar


no campo da historiografia especialmente a partir das primeiras décadas do século XX,
com o historiador francês, componente da escola dos Annales, Marc Bloch. O intelectual
aponta que “aplicar o método comparativo no quadro das ciências humanas consiste [...]
em buscar, para explicá-las, as semelhanças e diferenças que apresentam duas séries de
natureza análogas” (1930, p. 31). Com o desenrolar do século XX e a consolidação cada
vez maior das ciências humanas e seus métodos de pesquisa, a comparação conquistou
lugar privilegiado na pesquisa, ampliando cada vez mais sua atuação:

Se a História Comparada fora na época de Marc Bloch pouco


mais do que uma estimulante promessa, ou uma tímida e bem-
intencionada tentativa de melhor compreender os vários povos do
planeta, hoje ela pode ser considerada um campo interdisciplinar
bem-sucedido e com direito a uma rubrica própria. De resto, suas
potencialidades vão bem além da simples intenção de comparar
nações ou povos, e mesmo a História Regional pode se beneficiar
eventualmente de uma posição estreita com as abordagens
propostas pela História Comparada. Os historiadores do
imaginário, por fim, podem até mesmo colocar universos fictícios
ou imaginários em uma composição historiograficamente
conduzida, se quisermos levar mais adiante a enumeração das
trilhas que hoje se abrem para o comparativismo histórico. A lista
não termina certamente aí: “histórias de vida” paralelas (sejam
biografias individuais ou coletivas), práticas culturais específicas,
ou o próprio pensamento historiográfico em diferentes culturas
ou sob a perspectiva de distintos autores — seria certamente um
interessante exercício de imaginação estabelecer a miríade de
universos de observação que podem ser contrapostos com vistas
à comparação historiográfica, ou que já foram contemplados em
trabalhos específicos realizados por historiadores ou cientistas
sociais interessados no comparativismo histórico. Eis aqui um
mundo de possibilidades (BARROS, 2014, p. 9).

42
Mas qual o diferencial da História Comparada?

Segundo o historiador Cleber Eduardo Karls (2017), embora a comparação seja uma
prática comum e importante na historiografia, ela se diferencia e se coloca como uma
modalidade historiográfica fortemente marcada pela complexidade, assim como uma
forma específica de propor e pensar questões em situações diferenciadas. Neste mesmo
ensejo, Barros (2007, p. 5) destaca que “A comparação neste momento — diante de um
desafio ou da necessidade — impõe-se como método. Trata-se de iluminar um objeto ou
situação a partir do outro, mais conhecido, de modo que o espírito que aprofunda esta
prática comparativa dispõe-se a fazer analogias, a identificar semelhanças e diferenças
entre duas realidades, a perceber variações de um mesmo modelo”.

A história comparada permite que aproximações sejam feitas entre regiões que
pareciam isoladas, uma esperança de comunicação entre as várias histórias nacionais
que aparentavam ser soltas e desconectas. A comparação permite, portanto, que o
historiador esteja apto a identificar semelhanças, bem como diferenças, no seu objeto de
análise, partindo de múltiplos campos de observação (BARROS, 2007). Como também
“é o método de pesquisa que convida a uma mudança de atitude no modo de fazer
história; é uma nova perspectiva dos pesquisadores como sujeitos em relação ao objeto
de pesquisa” (BUSTAMENTE; THEML, 2007, p. 16). Desta forma, o método comparativo “é
justamente o que permite estabelecer o estranhamento, a diversificação, a pluralização e
a singularidade daquilo que parecia empiricamente diferente ou semelhante, posto pelo
habitus e reproduzido pelo senso comum” (BUSTAMENTE; THEML, 2007, p. 15).

43
Quais os cuidados necessários em uma pesquisa que utiliza a História
Comparada como método?

Karls (2017), em sua tese de doutorado que utilizou a comparação como método, frisa
que uma série de cuidados são necessários, (pré)conceitos devem ser excluídos e a
adoção de uma nova postura é fundamental. Além disso, deve existir uma coerência
entre o que será comparado.

Para Lima e Rust (2008), “um exame epistemológico mais cauteloso dos fundamentos
da História Comparada revela a impossibilidade de ‘comparar o incomparável’: sempre
se compara o humanamente comparável”. Cuidados devem ser tomados, visto a
singularidade da comparação histórica, como destacam Bustamante e Theml:

É necessário afastar-se de todo tipo de hierarquização de


culturas e sociedades, de níveis de realidades estanques ou de
supremacia de um domínio sobre o outro pois existem diversas
redes de imbricações, quando se tratam de fenômenos sociais,
que não são necessariamente lineares, causais e evolutivas. Estas
redes têm mais condições de serem percebidas e elucidadas
quando se tornam objeto de uma abordagem comparativa pela
construção de um conjunto de problemas, que perpassam as
pesquisas da equipe disposta a trabalhar comparativamente.
Logo, não há preocupação com hierarquias pois não se objetiva
formular modelos abstratos, leis gerais, relações de causalidades,
origem nem essência dos fenômenos, mas sim descobrir formas
moventes e múltiplas com as quais as sociedades se depararam,
as representaram e se transformaram (2007, p. 11).

Ao mesmo tempo em que se realiza um trabalho de História Comparada, concordamos


com Barros (2007), que destaca a importância da interação com outros campos
historiográficos, numa tentativa de ampliar o modelo de observação e complementar a
sua atuação:

Uma outra questão importante para o delineamento de um


trabalho de história comparada é a sua interação com outros
campos historiográficos. Definida por uma abordagem, isto é,
por questões que se relacionam a aspectos metodológicos, o

44
historiador que utiliza as abordagens da História Comparada
deve fazer também suas escolhas relativas a certas perspectivas
que já se referem às dimensões da sociedade que são trazidas a
primeiro plano pela análise historiográfica — a História Cultural,
a História Política, a História Econômica, a História Demográfica,
as mentalidades — e a certos campos do interesse que já são da
ordem dos domínios temáticos (BARROS, 2007, p. 17).

Enfim, a História Comparada é uma metodologia riquíssima ao dispor do historiador e


do próprio professor de História, que pode utilizar a sua especialidade para construir
o conhecimento histórico em sala de aula a partir da utilização de fontes, olhares,
comparando objetos, casos, enfim, praticamente tudo o que está envolvido com a
História. A comparação surge como uma possibilidade de impor critérios, reconhecer
possibilidades e uma série de especificidades e questões comuns a muitos processos
históricos. Enfim, é uma importantíssima ferramenta para o desenvolvimento do
conhecimento acerca do passado.

MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 3 e veja o conteúdo complementar indicado pelo


professor sobre História Comparada.

45
Micro-História

A Micro-História é um campo recente da historiografia e gera inúmeros impasses em


relação a sua utilização, visto as suas particularidades. Da mesma forma, nascido
de um grupo de historiadores italianos, o método da Micro-História ou o olhar micro-
historiográfico, pode ser conectado aos mais distintos aportes teóricos, dando uma
abrangência relevante assim como uma enorme variedade de atuação, que veremos a
seguir.

Por que “micro-história”?

O historiador José D’Assunção Barros destaca muito bem a relação do nome “Micro-
História” com as características e a abrangência das suas análises:

Antes de tudo, é preciso deixar claro que a Micro-História não se


refere necessariamente ao estudo de um espaço físico reduzido
ou delimitado, embora isto possa até ocorrer. O que a Micro-
História pretende é uma redução na escala de observação do
historiador com o intuito de se perceber aspectos que, de outro
modo, passariam despercebidos. Quando um micro-historiador
estuda uma pequena comunidade, ele não estuda propriamente
a pequena comunidade, mas estuda através da pequena
comunidade (não é, por exemplo, a perspectiva da História local,
que busca o estudo da realidade microlocalizada por ela mesma).
A comunidade examinada pela Micro-História pode aparecer,
por exemplo, como um meio para se atingir a compreensão de
aspectos específicos relativos a uma sociedade mais ampla. Da
mesma forma, pode-se tomar para estudo uma “realidade micro”
com o intuito de compreender certos aspectos de um processo de
centralização estatal que, em um exame encaminhado do ponto
de vista da macro-história, passariam certamente despercebidos.
O objeto de estudo do micro-historiador não precisa ser, desta
maneira, o espaço microrrecortado. Pode ser uma prática social
específica, a trajetória de determinados atores sociais, um núcleo
de representações, uma ocorrência (por exemplo, um crime) ou
qualquer outro aspecto que o historiador considere revelador em
relação aos problemas sociais ou culturais que está disposto a

46
examinar. Se ele elabora a biografia ou a “história de vida” de um
indivíduo (e frequentemente escolherá um indivíduo anônimo)
o que o estará interessando não é propriamente biografar este
indivíduo, mas sim os aspectos que poderá perceber através do
exame micro-localizado desta vida. (2007b, p. 169)

Para além dessas questões, de uma forma muito simples e metafórica, “a Micro-História
propõe a utilização do microscópio ao invés do telescópio. Não se trata, neste caso, de
depreciar o segundo em relação ao primeiro. O que importa é ter consciência de que cada
um destes instrumentos pode se mostrar mais apropriado para conduzir à percepção
de certos aspectos do universo” (BARROS, 2007b, p. 170). A Micro-História busca,
portanto, analisar em uma perspectiva de menor escala aspectos da macro-história. Ou
seja, a partir do que poderíamos chamar de “amostragem”, a Micro-História analisa um
contexto maior, verificando aspectos que dificilmente poderiam ser investigados numa
investigação macro.

É possível que a mais famosa obra que utilize a


Micro-História como método de análise seja o
livro O Queijo e os Vermes, do historiador italiano
Carlo Ginzburg. Nessa produção é possível
verificar a complexidade social que pode ser
atingida por meio da Micro-História. Quando
os documentos autorizam, é inteiramente
permitido explorar, como se por uma lente de
aumento, a maneira como um homem do povo
pode pensar e usar os elementos intelectuais
esparsos da cultura literária que o alcançam
por meio de seus livros e da leitura que ele
Fonte:
faz deles. A partir de um processo inquisitorial https://www.
companhiadasletras.com.br/
do século XVI (o microcosmo social) em que
detalhe.php?codigo=80009
constavam os registros de um humilde moleiro
de nome Menocchio, o historiador consegue
perceber características macro-históricas que
perpassavam pela compreensão de mundo do trabalhador braçal. Ou seja, de um
depoimento de um homem que não pode ser nomeado como “letrado”, o historiador
consegue, por intermédio do seu conhecimento conjuntural, realizar uma série de
relações e produzir significados, percebendo, até mesmo, aspectos da formação
intelectual da população medieval. Neste aspecto, é o próprio Ginzburg que expõe essa
relação:

47
”Matéria”, “natureza”, “unidade”, “elementos”, substância; a origem
do mal; a influência dos astros; a relação entre criador e criatura.
Exemplos como esses poderiam ser facilmente encontrados.
Alguns conceitos cruciais e alguns dos temas mais discutidos
na tradição cultural da Antiguidade e da Idade Média chegaram
até Menocchio através de um pobre e desordenado compendio,
o Fioretto della Bibbia. É difícil supervalorizar sua importância.
Antes de mais nada, deu a Menocchio instrumentos linguísticos
e conceituais para que ele elaborasse e exprimisse sua visão de
mundo. Além disso, com um método expositivo a maneira dos
escolásticos — enunciação e subsequente refutação de opiniões
errôneas —, contribuiu certamente para desencadear sua voraz
curiosidade intelectual. O patrimônio doutrinal que o pároco de
Montereale apresentava como um edifício compacto e inatacável
revelava-se sujeito as interpretações mais contrastantes no
Fioretto (GINZBURG, 2006, p. 106).

Todavia, não significa que a Micro-História seja sinônimo de uma história


pequena.

Ao analisarmos um caso específico, estamos buscando algo que a “grande” história é


incapaz de responder. As análises micro-históricas não estão restringindo a investigação,
mas, sim, buscando aspectos peculiares, dificilmente perceptíveis em uma larga escala. O
individual serve como portal para a compreensão do coletivo, como aponta o historiador
francês Jacques Revel:

Mas é também possível ler nela (micro-história) o esboço de


outra modalidade de análise social, própria de uma história que
almejasse atentar para a experiência dos indivíduos captada
nas relações que eles mantêm com outros indivíduos. A escolha
do individual não era considerada, no caso, contraditória com a
apreensão do social: o que se esperava dela era que tornasse
possível a inclusão de uma trajetória individual (a de um homem
ou de um grupo de homens) numa multiplicidade de espaços e de
tempos sociais, pelo novelo de relações sociais que se criam em
volta dessa trajetória e dão-lhe sua significação (REVEL, 2010, p.
438-439).

48
Assim, a Micro-História é uma forma de abordagem historiográfica, ou mesmo uma
metodologia de análise histórica interessante frente às possibilidades de análise do
passado. Por meio de aspectos particulares, fontes que registram “pedaços” de relações
pessoais ou mesmo muito específicas ou individuais, uma complexidade de relações
se abre aos olhos do historiador que é o responsável por desbravar e interpretar esse
emaranhado de aspectos e variáveis que é o passado.

MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 3 e veja o conteúdo complementar indicado pelo


professor sobre Micro-História.

49
História Oral

A História Oral é um riquíssimo método de pesquisa histórica, pois permite que o


historiador, por intermédio de depoimentos, de oralidades, de memórias, construa o
conhecimento histórico, abundante de sensibilidades, de especificidades, sentimentos,
ou seja, de humanidade, na complexa construção do passado.

Como podemos definir a História Oral?

Para Verena Alberti,

A História Oral é uma metodologia de pesquisa e de constituição


de fontes para o estudo da história contemporânea surgida em
meados do século XX, após a invenção do gravador a fita. Ela
consiste na realização de entrevistas gravadas com indivíduos
que participaram de, ou testemunharam, acontecimentos e
conjunturas do passado e do presente. Tais entrevistas são
produzidas no contexto de projetos de pesquisa, que determinam
quantas e quais pessoas entrevistar, o que e como perguntar,
bem como que destino será dado ao material produzido (2011,
p. 155).

Ao mesmo tempo, a historiadora depõe que o desenvolvimento da História Oral


possibilitou o registro da vivência de grupos que até então dificilmente eram alvos
de estudos pela história. Essa metodologia permitiu que novas abordagens fossem

50
elaboradas nas análises do passado. Grupos diferenciados, assim como olhares sobre
assuntos inéditos foram seu diferencial. Nesse sentido, a oralidade é carregada de
memórias, outra questão de complexa análise para o historiador:

A memória, principal fonte dos depoimentos orais, é um cabedal


infinito, onde múltiplas variáveis — temporais, topográficas,
individuais, coletivas — dialogam entre si, muitas vezes
revelando lembranças, algumas vezes, de formas explícitas,
outras vezes de forma velada, chegando em alguns casos a
ocultá-las pela camada protetora que o próprio ser humano cria
ao supor, inconscientemente, que assim esta se protegendo das
dores, dos traumas e das emoções que marcaram a sua vida
(DELGADO, 2010, p. 16).

Com efeito, ao mesmo tempo que a História Oral é fascinante é, também, uma área
muito delicada, que exige uma série de cuidados por parte do historiador, visto as
inúmeras variáveis e peculiaridades inerentes a ela.

Que cuidados deve ter o historiador ao utilizar a História Oral?

As fontes orais são muito diferentes entre si. Não há uma normatização das respostas
aos questionamentos, mesmo que estes sejam elaborados cuidadosamente. São
aspectos, peculiaridades da oralidade, como destaca Alberti:

O trabalho com história oral tem um alto grau de


imponderabilidade. Nem todas as entrevistas “rendem” o que se
poderia esperar, do mesmo modo que nem todos os documentos
de um arquivo textual são suficientemente “prolixos” em relação
ao passado. Pode acontecer de só descobrirmos a riqueza
de um depoimento após algum tempo [...]. uma pesquisa de
história oral produz entrevistas diferentes em qualidade e
densidade, e muitas vezes isso depende dos entrevistados. Há
pessoas que, por mais representativas que sejam para falar
sobre determinado assunto, simplesmente não se interessam
por, ou não podem explorar de modo extensivo sua experiência
de vida e discorrer sobre o passado, como talvez sua posição
estratégica o fizesse crer (ALBERTI, 2011, p. 172-173).

51
Essa quantidade de aspectos sensíveis da oralidade se dá, pois, a relação entre
o entrevistador e entrevistado é uma relação humana, cheia de sentimentos e
desconfianças. Por isso, o historiador deve ter todo o cuidado com a interpretação
desses documentos, que podem ser percebidos enquanto “monumentos”, ou seja,
obras elaboradas com objetivos, intencionalidade. Essas especificidades devem ser
analisadas cuidadosamente pelos especialistas, como destaca o francês Jacques Le
Goff quando trata dessas relações (in)conscientes contidas nos documentos:

É antes de mais nada o resultado de uma montagem, consciente


ou inconsciente, da história, da época, da sociedade que o
produziu, mas também das épocas sucessivas durante as quais
continuou a viver, talvez esquecido, ainda que pelo silêncio. O
documento é uma coisa que fica, que dura, e o testemunho, o
ensinamento que ele traz deve ser em primeiro lugar analisado
desmistificando-lhe o seu significado aparente. O documento
é monumento. Resulta do esforço das sociedades históricas
para impor ao futuro — voluntária ou involuntariamente —
determinada imagem de si próprias. No limite, não existe um
documento-verdade. Todo documento é mentira. Cabe ao
historiador não fazer o papel de ingênuo. [...] um monumento é
em primeiro lugar uma roupagem, uma aparência enganadora,
uma montagem. É preciso começar por desmontar, demolir
esta montagem, desestruturar esta construção e analisar as
condições de produção dos documentos-monumentos (LE
GOFF, 1984).

Aí está a riqueza da história oral. Ao mesmo tempo em que abre oportunidades de análise
até então inatingíveis para o historiador, impõe cuidados extras no tratamento do seu
documento/monumento. Cabe ao profissional de história cada vez mais complexificar
o seu pensamento e sua análise sobre a sua matéria-prima, as fontes. A oralidade
é uma riquíssima nascente de informações, ao mesmo tempo que é extremamente
complexa e necessita de um olhar apurado daqueles que a interpretam.

52
MIDIATECA

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professor sobre História Oral.

NA PRÁTICA

A utilização da História Oral é um excelente método para a percepção da


construção do conhecimento histórico na educação básica. Técnicas de aplicação
de questionários, assim como de análises desse material podem servir como
ferramenta para o reconhecimento de uma série de variáveis que influenciam no
desenvolvimento do saber histórico, assim como, a partir da práxis, os discentes
podem verificar vários níveis da atuação da análise do historiador, desde grandes
relações macro-históricas, até especificidades familiares. Nesse sentido, também
a relação entre o micro, o macro, o objetivo e o subjetivo podem ser trabalhada de
forma muito satisfatória e os estudos de História Oral são, para isso, instrumentos
riquíssimos.

53
Resumo da Unidade 3

A unidade 3 da disciplina Pesquisa Histórica e Reflexão Metodológica Aplicada ao Ensino


tratou da complexidade da elaboração do conhecimento histórico associado a diversas
metodologias de pesquisa. Ao analisarmos as características da História Comparada, da
Micro-História e da História Oral, pudemos tratar das distintas possibilidades analíticas
disponíveis ao historiador. Da mesma forma, buscamos relacionar essas metodologias
com os diferentes tipos de fontes, objetos e abordagens, identificando possibilidades e
limites, não somente para a produção do conhecimento, mas também para o ensino da
História.

CONCEITO

Uma das habilidades inerentes e necessárias aos historiadores é a capacidade de


perceber as nuances nos seus objetos de pesquisa. Reconhecer aspectos especiais,
cheios de subjetividade, por vezes. Essas significações contidas nas fontes foram
muito bem analisadas por uma das maiores historiadoras da cultura, a professora
Sandra Jatahy Pesavento, que destacava especial importância às sensibilidades,
que ela conceitua como:

[...] operações imaginárias de sentido e de


representações do mundo, que conseguem tornar
presente uma ausência e produzir, pela força do
pensamento, uma experiência sensível do acontecido.
O sentido faz perdurar a sensação e reproduz esta
interação com a realidade. A força da imaginação, em
sua capacidade tanto mimética quanto criativa está
presente no processo de tradução da experiência
humana. (PESAVENTO, 2004, p. 3)

54
Referências

ALBERTI, V. Fontes orais: Histórias dentro da História. In. PINSKY, C. B. (Org.). Fontes
Históricas. 3. ed. São Paulo: Contexto, 2011.

BARROS, J. D. História Comparada. Petrópolis: Vozes, 2014.

__________. História comparada: um novo modo de ver e fazer a história. Revista de


História Comparada, Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, junho/2007.

__________. Sobre a feitura da micro-história. OPSIS, v. 7, n. 9, jul.-dez. 2007b.

BLOCH, M. Comparaison. In: Reveu de Synthèse Historique. LXIX, 1930, boletim anexo,
p. 31-39.

BUSTAMENTE, R. M. da C.; THEML, N. História comparada: olhares plurais. Revista de


História Comparada, Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, junho/2007.

DELGADO, L. de A. N. História oral: memória, tempo, identidades. 2. ed. Belo Horizonte:


Autêntica, 2010.

GINZBURG, C. O queijo e os vermes: o cotidiano e as ideias de um moleiro perseguido


pela inquisição. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.

KARLS, C. E. Modernidades sortidas: o esporte oitocentista em Porto Alegre e no Rio de


Janeiro. Tese de Doutorado. UFRJ - Programa de Pós-Graduação em História Comparada.
Rio de Janeiro, 2017.

LE GOFF, J. Documento/Monumento, Enciclopédia Einaudi, v. 1: Memória – História, s/1


(Portugal), Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1984.

LIMA, M. P.; RUST, L. D. Ares pós-modernos, pulmões iluministas: para uma epistemologia
de história comparada. Revista de História Comparada, Rio de Janeiro, v. 2, n. 1,
junho/2008.

PESAVENTO, S. J. Sensibilidades no tempo, tempo das sensibilidades. In: Noveau monde-


Mondes noveaux, Paris, n. 4, 2004.

55
REVEL, J. Micro-história, macro-história: o que as variações de escala ajudam a pensar
em um mundo globalizado. Revista Brasileira de Educação, v. 15, n. 45, set./dez. 2010.

56
UNIDADE 4

Pesquisa Histórica Aplicada ao


Ensino
INTRODUÇÃO

A unidade Pesquisa Histórica aplicada ao ensino busca aproximar e relacionar aspectos


da investigação histórica e sua relevância como ferramenta de ensino. Sendo assim, você
estudará o seguinte:

1. Aspectos relevantes e especificidades relacionadas à utilização das fontes históricas em


sala de aula, suas possibilidades, seus limites e os cuidados a serem tomados.
2. Características relativas à relevância da pesquisa nos ensinos fundamental e médio para
a construção do conhecimento histórico desses alunos.
3. Relevância do tratamento interdisciplinar da História frente à complexidade social
contemporânea e a interdependência da disciplina frente a outras áreas do saber.

OBJETIVO

Nesta unidade, você será capaz de:

• Reconhecer as possibilidades e a relevância da utilização da pesquisa histórica,


suas fontes e os métodos aplicados ao ensino

58
O uso e a relevância das fontes históricas
em sala de aula

Não há dúvidas de que as fontes históricas são essenciais para a produção do conhecimento
histórico. São relatos, pedaços, “cacos” do passado que, sob a análise especializada dos
historiadores, são investigados, criticados, interpretados, contextualizados e se tornam a
base para a produção da própria história.

No entanto, quando se trata da Educação Básica, do Ensino Fundamental e Médio, é


possível e relevante a utilização de fontes históricas em sala de aula? A complexidade
do documento histórico pode ser empregada como material didático? Essas e outras
questões serão analisadas a seguir.

O professor José Antonio Vasconcelos (2012) defende veementemente a utilização de


novas possibilidades de ferramentas para o ensino de História, entre elas, as fontes
históricas de determinados tipos, que vão desde os tradicionais documentos oficiais até
entrevistas, fotografias, cadernos de anotações, recortes de jornais etc. Enfim, marcas
do passado que podem contribuir, com suas especificidades, para a compreensão
do passado, evidentemente, com o intermédio especializado do professor de História,
conforme complementa Vasconcelos (2012, p. 76-77):

Assim como o uso do documento é importante na pesquisa


histórica, no ensino de História a sua utilização é igualmente
imprescindível. O texto didático e o documento histórico são
complementares. O primeiro é necessário para abordagem
de temas abrangentes em uma linguagem mais acessível ao
aluno. Já o documento, embora sem a abrangência ou a clareza
do texto didático, pode propiciar o “prazer da descoberta” por
meio de uma maior proximidade do aluno com os vestígios do
passado. É importante lembrar que o contato com as fontes
históricas não significa um acesso imediato aos eventos do
passado. O documento não é mais do que um mediador entre a
nossa consciência histórica presente a esses eventos, não mais
acessíveis a percepção imediata. Toda leitura de documentos,
portanto, produz uma reconstrução do passado pela imaginação
humana.

59
Além dessa relevante argumentação, o documento histórico utilizado na formação
básica tem, também, a função de auxiliar na compreensão da própria construção da
história. Além disso, ao utilizarmos fontes históricas, estamos dando significado a um
passado que, por diversas vezes, pode ser visto como distante e sem destaque na vida
dos estudantes. Com isso, a história ganha vida, sentimento, sentido. Por meio dos
documentos, uma variedade enorme de leituras do passado é possível. Assim, eles
constituem um instrumento de enriquecimento da própria disciplina.

Em Didática e prática de ensino de História: experiências, reflexões e aprendizados,


Selva Guimarães (2015) aponta a tendência dos livros didáticos de se adaptarem a essas
valorizações, utilizando, em sua elaboração, diferentes pontos de vista, assim como
novas fontes para as interpretações, como imagens, obras de ficção, imprensa e filmes.
Ou seja, essa nova roupagem dos livros de História vem auxiliar o professor mediante
uma grande variedade de “testemunhos do passado”, olhares e interpretações, o que vem
a complementar e contribuir para a utilização de fontes em sala de aula.

Os livros didáticos avaliados pelo PNLD (Programa Nacional do


Livro e do Material Didático) do MEC são representativos desse
processo, pois incorporam essa tendência. O conhecimento
histórico escolar é abordado por meio de várias fontes e
linguagens.

Trata-se de uma opção metodológica que amplia simultaneamente


o olhar do historiador, de professores e alunos, e o campo de estudo,
fazendo com que o processo de produção de conhecimentos se
torne interdisciplinar, dinâmico, flexível. As fronteiras disciplinares
são questionadas; os saberes são religados e rearticulados
em busca da inteligibilidade da História. Isso requer de nós,
professores e pesquisadores, um aprofundamento dos nossos
conhecimentos acerca da constituição de diferentes linguagens.
(GUIMARÃES, 2015, p. 257-258).

60
Com a percepção dos limites e, ao mesmo tempo, da riqueza e das possibilidades
analíticas das diversas fontes históricas, as possibilidades de uso no ensino se ampliaram.
Torna-se, portanto, praticamente unânime entre historiadores e professores de História
a importância da utilização de fontes como materiais de ensino. Sua vasta possibilidade
interpretativa, suas ricas informações acerca do passado, estão entre os principais
preceitos que fazem desses documentos ferramentas que se tornaram tendências
contemporâneas de ensino de História, como aponta Nicolazzi Júnior (2018, p. 31-32):

Além dos historiadores, as fontes históricas também podem


ajudar, e muito, os professores de História, bem como seus
alunos. A diversidade de aplicação de fontes históricas e seu
emprego em sala de aula refletem as mudanças históricas pelas
quais a disciplina passou nas últimas décadas do século XX e nas
primeiras do século XXI.

Se, ao longo do tempo, algumas fontes perderam status, outras


ganharam maior notoriedade (como no caso das fontes orais
e audiovisuais). Algo semelhante ocorreu nas salas de aula: as
aulas expositivas, que outrora gozavam de posição favorável
nas escolas, passaram a ser substituídas por outros formatos;
o estudante passivo, que apenas recebia informações, passou a
sujeito ativo, interagindo com o professor.

Nesse processo de mudanças, que inclui novas formas de abordar


o ensino de História, é preciso reorganizar a maneira de se estudar
e de se ensinar História. O aluno não pode ser mero observador:
ele deve ser sujeito ativo na construção do conhecimento.

Enfim, a utilização de fontes em sala de aula, ao mesmo tempo que representam um


novo desafio aos professores, apresenta novas possibilidades de ensino. As fontes
mostram uma história viva, cheia de significados, cores, sotaques, conflitos. Ao utilizar
esses testemunhos do passado, o aluno se torna parte fundamental da construção do
conhecimento histórico e o docente, o responsável por revelar ligações, conjunturas,
aproximações e distanciamentos. O olhar receptivo dos estudantes dá lugar a uma
participação crítica, contribuinte especial do saber sobre o passado.

61
MIDIATECA

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professor sobre inovação em sala de aula.

62
Pesquisa e compreensão histórica em sala
de aula

Como pudemos perceber, a utilização de fontes e documentos históricos em sala de aula é


tendência contemporânea que tem mostrado excelentes possibilidades de diversificação
e enriquecimento do ensino de História. Fotografias, monumentos, cinema, literatura,
artigos e notícias jornalísticas constituem valiosas fontes de informação e trabalho para
os historiadores e para os professores de História.

Qual a relevância da pesquisa para o ensino de História?

A pesquisa, como ferramenta de ensino e, consequentemente, de produção de


conhecimento histórico, tendo como principais atores alunos do ensino fundamental e
médio, é um tema um tanto controverso. Ora valorizada, ora banalizada, a investigação
tem partidários que saem em sua defesa, enquanto outros desvalorizam a sua prática,
colocando-a em um campo de ações que não podem ou não são executadas de
maneira satisfatória, e por isso não obtêm os resultados esperados. Segundo alguns
pesquisadores, são práticas que se tornaram vulgarizadas. Nesse sentido, aponta Selva
(2015, p. 205-206):

Essa vulgarização, em muitos casos, é traduzida no velho “faz de


conta”: um dos momentos em que o professor finge que ensina
e o aluno finge que prende. Geralmente, isso ocorre quando o
professor seleciona os temas e solicita aos alunos que façam um
“trabalho”, “valendo” certo número de pontos, mas não fornece
um roteiro nem tampouco as fontes, a bibliografia. Os alunos, em
grupo ou individualmente saem no desespero à “caça” de alguma
obra, e muitos copiam trechos de livros, sem aspas. Com a difusão
da internet, também tornou-se comum a prática da impressão
de textos prontos de sites. Nesses casos não ocorre esforço de
investigação, análise ou síntese. Os estudantes entregam esses
textos aos professores, que, geralmente, não tem tempo ou
dispõe de pouco tempo para lê-los, haja vista a carga horária

63
daqueles que atuam nas escolas públicas brasileiras. Acabam
avaliando pela estética, pelo tamanho do trabalho, pela
participação dos alunos nas aulas ou pelas simpatias pessoais.
As notas atribuídas, em geral, são muito boas, altas, muitas vezes,
notas integrais, o que agrada aos alunos, especialmente aqueles
menos produtivos.

Desta forma, a aplicação desses tipos de “pesquisas” sem profundidade ou complexidade


alguma em sala de aula acaba sendo sinônimo de boas notas e “descanso” para os
professores, mas não de produção de conhecimento, devido ao que foi apontado na
citação. De acordo com Selva (2015, p. 206), essas práticas são nocivas ao ensino de
História e à formação dos jovens, pois “contribuem para a desvalorização social da
disciplina”.

Para que a pesquisa surta os efeitos desejados nos alunos, ou seja, o desenvolvimento
da criticidade, o empenho, o debate e, especialmente, a produção do conhecimento
histórico, uma série de cuidados deve ser tomada. Especialmente, o ensino de História
requer o olhar atento do professor, que tem a função de orientar a correta busca por
materiais, fontes e produções e ressaltar as especificidades de cada uma das peças
desse “jogo” de reconstrução do passado histórico.

Importante

Mesmo que a produção do conhecimento, nas escolas, tenha um perfil difer-


enciado frente às universidades, e isso é justo e legítimo, ao utilizar a pesquisa
como metodologia de ensino de História, o docente tem o dever de estabelecer
os critérios investigativos.

Confira a seguir alguns desses critérios:

• Aspectos essenciais às pesquisas acadêmicas, como confiabilidade das


fontes e sua crítica (Quem a fez? Onde? Como? Por quê? Qual a intenção?)
são fundamentais para a própria construção do saber acerca do passado,
mesmo que seja por alunos do nível fundamental e médio.
• Uma pesquisa requer método: O que investigar? Qual o motivo? Como in-
vestigar? Qual o recorte temporal? Qual o recorte espacial? Que tipo de fon-
tes usar?

64
O objetivo, nesses casos, é aguçar a curiosidade e estabelecer fazer relações com
aspectos contextuais pretéritos da própria História ou mesmo transdisciplinares que
se relacionam com a questão pesquisada. Ou seja, para que o aluno perceba toda a
complexidade do saber histórico, é preciso problematizar, e não facilitar, como apontam
Pereira e Seffner (2008, p. 126):

O problema de certos procedimentos didáticos é que eles


procuram arrumar formas de tornar o conhecimento histórico
cada vez mais “acessível”, submetendo o conhecimento a outros
objetivos como, por exemplo, a necessidade de tornar a sala de
aula de História mais atraente ou tonar o distante mais próximo.

Da mesma forma, tratar de pesquisa em sala de aula inclui, indubitavelmente relacionar


o aluno com as fontes históricas, no entanto, com método e um olhar atento que vai aliar
o conhecimento prévio a novas perguntas e constatações. Ao aliar a própria curiosidade
à crítica histórica, o aluno tem contato com um inédito conjunto de significações
promovidas pelos documentos e por sua busca por novas informações. Nesse complexo,
mas riquíssimo, conjunto de variáveis que se relacionam ao ensino de História, está o
professor, com sua importantíssima função de incentivador e mediador:

A produtividade do uso das fontes está na possibilidade de


mostrar às novas gerações a natureza e a especificidade do
conhecimento histórico. Nosso objetivo, ao ensinar História às
novas gerações utilizando fontes, não consiste em ensinar a ler
documentos, separá-los por séries, descrever suas regularidades,
não se trata de tornar ou querer tornar o estudante um micro-
historiador, como se ele tivesse condições intelectuais de fazer
o mesmo que historiadores fazem. Ensinamos os estudantes a
ler o relato histórico e ensinamos a ler as representações sobre
o passado que circulam na sua sociedade. Ensinar utilizando
fontes não quer dizer ensinar a produzir representações através
das fontes, mas ensinar como os historiadores produzem
conhecimento sobre o passado a partir das fontes disponíveis
e quais os problemas implicados nessa produção. (PEREIRA;
SEFFNER, 2008, p. 126-127).

65
A pesquisa histórica, a análise de fontes, sua crítica, sua interpretação e sua
contextualização são a base para o conhecimento histórico. Todavia, essa metodologia
pode servir, também, como ferramenta preciosíssima para o ensino de História. Quando
o aluno da educação básica percorre os caminhos da investigação histórica, busca suas
fontes, as seleciona e interpreta, ele também entra em contato com a própria essência da
História, que é a complexa função de montar um diverso quebra-cabeça do passado (sem
ter todas as peças à disposição). Com isso, o estudante passa a ser ator na produção do
conhecimento. De simples receptor, ele se torna produtor do conhecimento, atuando de
diversas formas e com diferentes ferramentas (fontes históricas) para a construção do
conhecimento.

MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 4 e veja o conteúdo complementar indicado pelo


professor, que fala sobre o filme como ferramenta de ensino de História.

66
A pesquisa histórica como ferramenta
interdisciplinar

A História, por natureza, é uma disciplina interdisciplinar. Ao analisar qualquer objeto


de estudo do passado, ela está tratando de algo com um contexto muito amplo e que
envolve uma série de variáveis das mais distintas áreas do saber.

Exemplo

Ao abordar as grandes navegações, por exemplo, inevitavelmente a História deve


levar em consideração aspectos científicos, filosóficos, sociais e econômicos
de uma época, que propiciaram que todo um contexto se formasse e tornasse
possível que os homens se lançassem ao mar.

Imagem de um dos mapas presente no Theatrum orbis terrarum (edição de


1570), de Abraham Ortelius. Esta obra é considerada o primeiro atlas mundial,
e sua elaboração teve como base as explorações marítimas.

Fonte: loc.gov

67
Mas o que é a interdisciplinaridade?

De uma maneira muito simples, interdisciplinaridade pressupõe áreas de ligação ou


aproximação entre duas ou mais disciplinas. Conteúdos interdisciplinares são aqueles
que podem ser tratados, cada um a sua maneira, com as especificidades de sua área do
saber. Um exemplo muito conhecido é a Segunda Guerra Mundial. Por motivos óbvios,
é um tema popular para a História, através de seus diversos olhares, fontes, métodos
etc. Todavia, também é um objeto de estudo que pode, tranquilamente, ser abordado de
forma interdisciplinar por outras áreas do saber:

• A dita superioridade racial, pela Biologia.


• As armas nucleares, pela Química.
• As novas tecnologias bélicas, pela Física.
• Os movimentos migratórios decorrentes do conflito, pela Sociologia.
• Os relatos de campos de concentração e diários, pela Literatura.

Esses são apenas alguns exemplos das várias possibilidades que um trabalho
interdisciplinar que envolva a História permite.

Nesse sentido, essa concepção ampliada do saber, que admite e valoriza o contato e a
colaboração entre as diversas áreas, só foi possível com uma nova percepção acerca do
papel social da escola. Um novo olhar sobre a instituição e sobre a educação permitiu
novas interações pedagógicas, como aponta Guimarães (2015, p. 164):

A construção de novas propostas para o ensino de História


pressupõe, a meu ver, a fundamentação nessa concepção de
escola como instituição social, lugar plural, onde se estabelecem
relações sociais e políticas, espaço social de transmissão de
saberes e valores culturais. É o lugar onde se educa para a vida,
onde se formam as novas gerações para o exercício pleno da
cidadania. Por isso, fundamentalmente, é um lugar de produção e
socialização de saberes, valores, ideias, identidades.

Para que essa real integração ocorra, existe a necessidade de pensarmos novos modelos
nos quais a separação pedagógica e didática, mas artificial, entre as áreas do saber se
dilua cada vez mais. Ou seja, para que o saber seja pensado como um grande conjunto
de complexas engrenagens que atuam concomitantemente na obscura sociedade

68
contemporânea (ou mesmo em qualquer outro período histórico), é necessário um
esforço entre os educadores. Evidentemente, essa análise ampliada e mais complexa
exige especialização e conhecimento por parte do professor, todavia, torna o saber
histórico o fator de ligação entre os processos e fatos históricos. Para que isso ocorra, a
interdisciplinaridade é relevante:

Nesse contexto sociocultural e educacional processa-se de


forma intensa o debate acerca dos paradigmas, das relações
entre os padrões e níveis de conhecimento, das concepções de
educação e da escola, o que evidencia a necessidade permanente
de repensar os modos de conceber e construir saberes e práticas
no interior dos diferentes espaços educativos. Há continuidades e
rupturas. No entanto, há sim algo permanente e ao mesmo tempo
novo nessa discussão: a abordagem das formas e relações entre
sujeitos, saberes e práticas. A meu ver, é aí que ganha força a ideia
da interdisciplinaridade e da transdisciplinaridade. (GUIMARÃES,
2015, p. 164).

Com efeito, a interdisciplinaridade no ensino de História se mostra uma ferramenta


relevante para a compreensão do próprio saber histórico, além de contribuir para
a percepção da complexidade social, que abarca uma série de variáveis que são, por
muitas vezes, analisadas de forma individual, mas que agem concomitantemente. A
interdisciplinaridade não pode se furtar da disciplinaridade, pois é sua dependente e deve,
sim, “alimentar-se dela”.

Na conjuntura atual, a interdisciplinaridade não pode mais ser renegada. Ao contrário, deve
ser valorizada como aspecto fundamental a uma nova escola, que deseja se reinventar e
dar contar de todo um complexo conjunto de relações sociais (e, nesse caso, históricas).
Essa é a proposta de Fazenda (2016), que destaca a “nova” relação contemporânea da
escola com os conteúdos e a educação, que já não admite mais a “aplicação” de saberes
isolados. Para a pesquisadora, “interdisciplinaridade” é a palavra de ordem na educação:

Passa-se, na escola, a denunciar concepções unilaterais de


educação. Mas essa denúncia já começa a se fazer anúncio
— ainda em poucos, em muito poucos educadores, somente
naqueles nos quais o ciclo da alteridade já se instalou como
processo. Muitos já falam na mudança, chegam até a vislumbrar

69
a possibilidade dela, porém, conservam na sua forma própria de
ser educador, de ser pesquisador, de dar aulas um patriarcado que
enquadra, que rotula, que modula, que cerceia, que limita. Poucos
são os que se aventuram a viver alteridade, por que é caro o preço
que se paga pela mudança de ciclo. É preciso ser nisso um pouco
de Fênix, morrer para renascer das cinzas; e morrer é assumir a
consciência da ruptura, e a ideia da morte traz em si mesma uma
ideia de finitude. (FAZENDA, 2016, p. 42-43).

Ou seja, a interdisciplinaridade pressupõe a alteridade, o reconhecimento de que todas


as áreas do saber e todo ser humano, interagem e são interdependentes. Dessa forma,
nenhuma disciplina pode ser, realmente, fator de inovação se não for considerada como
parte de uma complexa estrutura. Portanto, a História, que, como já foi mencionado,
tem uma natureza interdisciplinar, pois é o resultado das relações humanas com todo
o contexto onde vive, não pode se limitar somente a si mesma. A História deve se
reconhecer como um produto interdisciplinar e assim relacionar seus conteúdos. Dessa
forma, teremos um conhecimento ampliado e conectado a todas as outras disciplinas,
contribuindo para o desenvolvimento do conhecimento e para a própria significação do
conhecimento histórico.

MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 4 e veja o conteúdo complementar indicado pelo


professor sobre interdisciplinaridade.

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NA PRÁTICA

O professor de História tem o mundo ao seu dispor! Em sala de aula, uma atividade
bem planejada pode envolver a realização de pesquisa histórica, análise de fontes
históricas e, ainda, considerações interdisciplinares. Converse com seus colegas
professores de diversas áreas e reconheça uma matéria que possa ser abordada
por duas ou mais disciplinas. Oriente uma pesquisa histórica, apontando métodos,
recorte temporal, recorte espacial, enfim, critérios. Em conjunto com as outras
disciplinas envolvidas, realize trabalhos, apresentações, seminários, produzindo
conhecimento por meio de uma perspectiva interdisciplinar. Trabalhe a alteridade e
a relação da História com as outras áreas do saber.

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Resumo da Unidade 4

Na unidade Pesquisa histórica aplicada ao ensino, você pôde verificar que as fontes
históricas, “pedaços” do passado dos mais diversos padrões, são possibilidades
riquíssimas quando utilizadas com critério como ferramentas de ensino, complementares
ao material didático. Todavia, associada a essa questão, a pesquisa histórica orientada
de forma competente também pode auxiliar na compreensão, por parte do aluno, de
toda a complexidade que envolve o passado e, por consequência, a formação do saber
histórico. A História, deve ser vista, também, como uma possibilidade interdisciplinar por
excelência, pois é o resultado das relações sociais em um amplo contexto. Dessa forma,
uma educação que contemple várias áreas do conhecimento e, por consequência, os
processos históricos, tem a capacidade de reconhecer e analisar toda a complexidade
que a acompanha.

CONCEITO

Um conceito caro à História, tanto para seu estudo como para sua pesquisa, é o
conceito de “alteridade”. De acordo com o Dicionário Priberam, “alteridade” significa
“qualidade do que é outro ou do que é diferente”. Ou seja, para que se pesquise,
se compreenda e se entenda o objeto de estudo dentro de um complexo contexto
histórico, é necessário que tenhamos certo distanciamento, ao mesmo tempo em
que devemos tentar reconhecer as especificidades do que está sendo estudado e
sua função social como produto de uma conjuntura social e produtor de novos fatos.

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Referências

DICIONÁRIO DA LÍNGUA PORTUGUESA. Alteridade. Lisboa: Priberam Informática, 2019.


Disponível em: <https://dicionario.priberam.org/alteridade>. Acesso em: 24 mar. 2019.

FAZENDA, I. C. A. Interdisciplinaridade: história, teoria e pesquisa. Campinas: Papirus,


2016. [Biblioteca Virtual]

GUIMARÃES, S. Didática e prática de ensino de História: experiências, reflexões e


aprendizados. Campinas: Papirus, 2015. [Biblioteca Virtual]

NICOLAZZI JÚNIOR, N. Prática profissional no ensino de História: linguagens e fontes.


Curitiba: Intersaberes, 2018. [Biblioteca Virtual]

PEREIRA, N. M.; SEFFNER, F. O que pode o ensino de História? Sobre o uso de fontes na
sala de aula. Anos 90: revista do Programa de Pós-Graduação em História. Porto Alegre,
v. 15, n. 28, p. 113-118, dez. 2008.

VASCONCELOS, J. A. Metodologia do ensino de História. Curitiba: Instersaberes, 2012.


[Biblioteca Virtual]

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