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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (UERN)

CAMPUS AVANÇADO DE PAU DOS FERROS (CAPF)


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO (PPGE)
CURSO DE MESTRADO ACADÊMICO EM ENSINO (CMAE)
INSTITUIÇÕES PARCEIRAS:
Universidade Federal Rural do Semiárido (UFERSA)
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN)

MÔNICA SEBASTIANA BRITO DE SÁ

PROJETO INTERDISCIPLINAR ENTRE A GEOGRAFIA DO PIAUÍ E A


LITERATURA PIAUIENSE: PELA IMPLEMENTAÇÃO DA LEI 5.359
DE 2003

PAU DOS FERROS/RN


2020
MÔNICA SEBASTIANA BRITO DE SÁ

PROJETO INTERDISCIPLINAR ENTRE A GEOGRAFIA DO PIAUÍ E A


LITERATURA PIAUIENSE: PELA IMPLEMENTAÇÃO DA LEI 5.359
DE 2003

Projeto de dissertação apresentado ao Programa de


Pós-Graduação em Ensino (PPGE), da Universidade
do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), do
Campus Avançado Prof.ª Maria Elisa de Albuquerque
Maia (CAMEAM), ofertado em parceria com a
Universidade Federal Rural do Semiárido (UFERSA)
e Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN), como
requisito para obtenção do título de Mestre em
Ensino, área de concentração: Educação Básica,
linha de pesquisa: Ensino de Ciências Humanas e
Sociais.

Orientador: Prof. Dr. Rosalvo Nobre Carneiro

PAU DOS FERROS/RN


2020
A dissertação PROJETO INTERDISCIPLINAR ENTRE A GEOGRAFIA DO PIAUÍ E
A LITERATURA PIAUIENSE: PELA IMPLEMENTAÇÃO DA LEI 5.359 DE 2003, de
autoria de Mônica Sebastiana Brito de Sá, foi submetida à Banca Examinadora constituída pelo
PPGE/UERN, como requisito para a obtenção do título de Mestra em Ensino, outorgado pela
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN).

Dissertação defendida e aprovada em 19 de maio de 2020.

BANCA EXAMINADORA

__________________________________________________________________
Prof. Dr. Rosalvo Nobre Carneiro
(Presidente/Universidade do Estado do Rio Grande do Norte - UERN)

__________________________________________________________________
Prof.ª Dra. Diana Maria Leite Lopes Saldanha
(1ª Examinadora/ Universidade do Estado do Rio Grande do Norte - UERN)

__________________________________________________________________
Prof. Dr. Diego Salamão Cândido de Oliveira Salvador
(2º Examinador/ Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN)

__________________________________________________________________
Prof.ª Dra. Simone Cabral Marinho dos Santos
(Suplente/ Universidade do Estado do Rio Grande do Norte - UERN)

__________________________________________________________________
Prof. Dr. Rodrigo Bezerra Pessoa
(Suplente/ Universidade Federal de Campina Grande - UFCG)

PAU DOS FERROS - RN


2020
AGRADECIMENTOS

Ao longo da minha existência muitas pessoas, das mais diversas formas,


ajudaram-me a moldar meu caráter e a alcançar glórias. Nesta dedicatória não irei
poupar palavras, eu gosto de lidar com elas, e farei uso das mesmas para agradecer,
de forma pormenorizada, a todos que estão ou estiveram ao meu lado em momentos
cruciais.
Primeiramente, agradeço à minha família como um todo. Em especial, ao meu
pai, o homem de coração mais puro, de uma bondade inigualável e de um caráter
invejável; um grande homem, que me ensinou a ser grande também! À minha mãe,
uma verdadeira cariátide, que abriu mão de viver sonhos em razão da minha chegada
inesperada. Aos meus irmãos, Renê e João, que, apesar das diferenças de
personalidade, amo-os.
Não posso deixar de agradecer aos meus amigos, que me fizeram entender
que a distância social pode ser o inverso da distância geográfica. Fazendo com que
aquele ditado “longe dos olhos, longe do coração” caísse por terra. Eles que são
pretérito, presente, e, não tenho dúvidas, que farão parte do meu futuro.
Aos meus amigos que compõem um grupo de WhatsApp único e inigualável:
Bruna, Gustavo, Jeremias, Maria de Fátima, Renato e Virna. Vocês por quem nutro
um sentimento muito verdadeiro, duradouro, sincero, o meu MUITO obrigada!
Nessa sessão de amizades verdadeiras, não poderia deixar de mencionar
Jéssica Maria, ela que está sempre ao meu lado, desde 2015, que sempre fez, e faz,
com que eu enxergue todas as minhas lutas até aqui. Agradeço à minha amiga Gaby,
uma amizade que se iniciou ainda nos tempos de colégio, passou por altos e baixos,
mas conseguimos concluir a graduação de Direito assim como entramos:
companheiras!
Laura Fernanda é uma mulher que também merece aqui ser mencionada, uma
grande amizade proporcionada pela UESPI, responsável por plantar em mim a
semente do desejo de cursar o mestrado.
Agradeço às famílias Santiago e Paixão, que, durante a preparação e parte
dessa caminhada me auxiliaram, apoiaram e sempre me fizeram acreditar que eu era
capaz.
Jamais finalizaria essa dedicatória sem agradecer às pessoas maravilhosas
que encontrei na vivência do mestrado, em especial, o meu grupo de amigos: Joyce,
Lázaro, Maria e Reginaldo. Não sei se fui eu quem os encontrou ou eles que me
encontraram, mas isso por importa, o importante é que criamos laços, lá na sala B28.
Pessoas de personalidades e culturas diferentes, cada um de um lugar do Nordeste,
uma verdadeira amálgama, mas posso garantir que foi a heterogeneidade mais
homogênea que eu já vi. Eles que fizeram com que essa experiência se tornasse mais
tranquila.
Ao meu orientador, Rosalvo Nobre Carneiro, agradeço por ter acreditado no
potencial do meu projeto, por toda a paciência até aqui, pelas orientações e conselhos.
Sou muito grata por ter uma pessoa de alma tão grandiosa como meu mestre. Espero
que um dia alguém me admire, enquanto profissional, como eu o admiro.
Não menos importante, agradeço a Deus, responsável por todas as minhas
conquistas, bem como à minha vovó Edite, que partiu de maneira prematura, mas eu
não tenho dúvidas que sempre me acompanhou até aqui.
Vocês foram começo, meio e fim desse trabalho. Começo quando me
inspiraram e me apoiaram. Meio quando foram pouso, enquanto tudo parecia voar;
foram chegada quando tudo parecia partida, foram achados quando tudo parecia
perdido. E fim, quando acreditaram em mim, mesmo quando eu não acreditava.
Concluo esses agradecimentos com os olhos marejados de lágrimas, feliz, por
perceber que tenho ao meu lado pessoas tão únicas, que compreendem essa minha
pressa de viver.
Foi no interior do Piauí
o local onde eu nasci.
Porém, desde muito nova
tive que sair mundo afora.

Não obstante a memória


não me permite esquecer
a razão minha de ter
uma alma de vitória
É que sim, a minha mãe
admirável senhora
era amante da Literatura
clássica, brasileira, piauiense:
cultura de todos os tipos,
de todas as propensões
Amores, desilusões...

Essa fora a minha maior herança


o amor pela leitura
E por essas andanças
cá estou eu, fazendo esta propositura:
Geografia e Literatura
duas paixões
juntas num projeto que é fruto de reflexões
desta criatura

Por fim e não menos importante


o Direito, do qual sou amante
vem arrematar
com uma lei que merece vigorar

Esta é uma proposta


de um projeto interdisciplinar.
Trata-se de uma resposta
para ampliar o conhecimento
que neste triste momento
está a se fragmentar.

(autoria própria)
RESUMO

O ensino da disciplina de Geografia do Piauí é obrigatório no território estadual,


conforme dispõe a Lei Ordinária do Estado do Piauí nº 5.359 de 2003. Entretanto, as
informações coletadas dão conta de que, quase duas décadas desde a sua entrada
em vigor, a referida lei não vem sendo implementada, diante da ausência de material
didático referente à Geografia do Piauí nas escolas geridas pela rede estadual de
ensino. Quanto aos procedimentos realizados, utilizou-se da pesquisa bibliográfica,
exploratória e documental, da Base Nacional Curricular Comum (2017), além do diário
de campo como instrumento de pesquisa. As discussões teóricas tiveram como base
autores que trabalham com a interdisciplinaridade; ensino de geografia e literatura; e
questões que dizem respeito à prática docente. Ainda de ordem reflexiva e discursiva,
foram selecionadas as produções dos dez maiores escritores da literatura piauiense,
que foram analisadas do ponto de vista geográfico. Os resultados demonstram que
esta literatura é marcada por muita geograficidade acerca do Estado do Piauí, sendo,
portanto, um possível recurso no processo de ensino-aprendizagem da disciplina
Geografia do Piauí, através de projetos interdisciplinares que contemplem as trocas
entre as áreas do conhecimento. Esta pesquisa evidencia que é possível a
implementação da Lei nº 5.359/2003 através da utilização de produções literárias
piauienses. Considera-se, assim, um estudo extremamente relevante, por trazer
possível solução para um impasse que perdura há tanto tempo no sistema
educacional piauiense.

Palavras-chave: Geografia do Piauí. Literatura Piauiense. Interdisciplinaridade.


ABSTRACT

The teaching of the discipline Geography of Piauí is mandatory in the state, according
to the Ordinary Law of the State of Piauí No. 5,359 of 2003. However, the collected
information shows that almost two decades later since its entry into force, the
aforementioned law has not been implemented given the absence of didactic material
referring to the Geography of Piauí in schools managed by the state school system.
As for the performed procedures it was used bibliographical, exploratory and
documentary research from the National Common Curricular Base (2017), in addition
to the field diary as a research instrument. Theoretical discussions were based on
authors who work with interdisciplinarity; teaching geography and literature; and issues
related to teaching practice. Still, in a reflective and discursive order, the productions
of the ten greatest writers of Piauí literature were selected, which were analyzed from
the geographical point of view. The results demonstrate that this literature is marked
by a lot of geography about the State of Piauí, being, therefore, a possible resource in
the teaching-learning process of the discipline Geography of Piauí, through
interdisciplinary projects that contemplates the exchanges between the areas of
knowledge. This research shows that it is possible to implement Law No. 5,359 / 2003
through the use of literary productions from Piauí. Thus, it is considered an extremely
relevant study, as it brings a possible solution to an impasse that has persisted for so
long in the state educational system in Piauí.

Keywords: Geography of Piauí. Piauí’s Literature. Interdisciplinarity.


LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Localização Geográfica do município onde se localiza a sede da 16ª GRE


da SEDUC – PI...........................................................................................................23
Figura 2: Localização Geográfica dos municípios que compõem a 16ª GRE da
SEDUC - PI................................................................................................................24
Figura 3: Imagem da planta trepadeira conhecida como jitirana em uma roça na
cidade de Campo Grande do Piauí - PI......................................................................68
Figura 4: Carnaubais de Campo Maior......................................................................75
Figura 5: Imagem da Paróquia Nossa Senhora da Vitória, que faz parte do Conjunto
Histórico e Paisagístico de Oeiras-PI.........................................................................81
Figura 6: Imagem do Casarão das 12 janelas pertencente ao Conjunto Histórico e
Paisagístico de Oeiras................................................................................................82
LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Quantidades de alunos matriculados no ensino médio das escolas que


compõem a 16ª GRE da SEDUC – PI........................................................................21
Quadro 2: Relação das escolas que fazem parte da 16 GRE da SEDUC – PI e ofertam
o ensino de nível médio..............................................................................................22
Quadro 3: As competências gerais da educação presentes na BCNN e a seleção de
produções literárias e proposta para atingi-las............................................................43
Quadro 4: Diretrizes Curriculares da Educação Básica da Rede Estadual de Ensino
do Piauí no tocante à disciplina de Geografia do Piauí..............................................47
Quadro 5: Pontos das dissertações que se distanciam e que apresentam alguma
proximidade com o presente estudo...........................................................................56
Quadro 6: Contexto histórico e escolas literárias das obras analisadas, com o ano em
que foram publicadas e suas abordagens geográficas...............................................59
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

1. GRE - Gerência Regional de Ensino


2. UFPI – Universidade Federal do Piauí
3. UESPI – Universidade Estadual do Piauí
4. ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio
5. SECUC – Secretaria de Educação
6. PI – Piauí
7. NUCEPE – Núcleo de Concursos e Promoção de Eventos
8. UERN – Universidade do Estado do Rio Grande do Norte
9. UFERSA – Universidade Federal do Semiárido
10. IFRN – Instituto Federal do Rio Grande do Norte
11. PPGE – Programa de Pós-Graduação em Ensino
12. UNESP – Universidade Estadual Paulista
SUMÁRIO

O COMEÇO DO FIM..................................................................................................13
1.1. Delimitação da área da pesquisa.......................................................21
1.2. Aspectos metodológicos....................................................................24
CAPÍTULO 2. GEOGRAFIA E LITERATURA: ESTREITANDO LAÇOS ATRAVÉS
DA INTERDISCIPLINARIDADE.................................................................................30
2.1. A fragmentação do mundo contemporâneo e a
interdisciplinaridade......................................................................................35
2.2. Geografia e Literatura: possibilidades de um projeto
interdisciplinar...............................................................................................35
2.2.1. Reflexões sobre Geografia e Literatura..................................36
2.2.2. A contemplação da BNCC num projeto interdisciplinar entre
as disciplinas de literatura e geografia..............................................40
2.2.3. Proposta de projeto interdisciplinar........................................46
2.3 Revisão de Literatura: Geografia e Literatura.......................................52
2.3.1. Banco de dissertações do Programa de Pós-Graduação em
Educação da Universidade Federal do Piauí – UFPI.........................53
2.3.2. Banco de dissertações/teses do Programa de Pós-Graduação
em Geografia da Universidade Federal do Piauí – UFPI....................53
2.3.3 Banco de dissertações do Programa de Pós-Graduação em
Ensino da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte –
UERN....................................................................................................55
CAPÍTULO 3. A TERRA FILHA DO SOL DO EQUADOR, PELA LITERATURA
FRUTO DOS TEUS FILHOS......................................................................................58
3.1 O Vaqueiro do Piauí: o canto de glória do passado da geração que
transportou o gado do litoral pro semiárido............................................... 62
3.2 A terra filha do Sol do Equador ............................................................. 69
3.3 O baloiçar das palmeiras piauienses.....................................................72
3.4 Rio Parnaíba, aqui se aperta; ali, se espraia: a seca e os carnaubais.73
3.5 Oeiras parou no tempo que continua: a primeira capital piauiense....79
3.6 Na beira do Rio Parnaíba, às margens da vida......................................82
3.7 Palha de Arroz: Teresina de antros e de antes......................................84
O FIM..........................................................................................................................87
REFERÊNCIAS..........................................................................................................89
ANEXOS....................................................................................................................95
APÊNDICES.............................................................................................................112
13

O COMEÇO DO FIM

A educação no Brasil se encontra em processo constante de mudanças, e,


desde o início do século XX, passou-se a defender a necessidade de repensar os
papéis dos personagens que atuam no ambiente escolar. O professor, até então
enxergado como transmissor de conhecimentos, considerado o protagonista no
processo de ensino-aprendizagem, nas propostas reformistas passaria a dividir este
protagonismo com os estudantes. Isto é, o estudante deixa de ser um personagem
passivo e passa a ser, também, responsável pela construção dos seus
conhecimentos, enquanto o professor assume o papel de mediador desse
conhecimento.
Dentro dessa perspectiva, hoje entende-se, como defende Alarcão (2013), ser
“fundamental que os alunos abandonem os papéis de meros receptores e os
professores sejam muito mais do que simples transmissores de um saber acumulado”
(ALARCÃO, 2013, p.27). Enquanto mediador do conhecimento, o professor deve
sempre estar em busca de metodologias que ajudem a estimular a criatividade e
criticidade do seu alunado: “criar, estruturar e dinamizar situações de aprendizagem e
estimular a aprendizagem e a autoconfiança nas capacidades individuais para
aprender são competências que o professor de hoje tem de desenvolver” (ALARCÃO,
2013, p.32).
As propostas de mudança na estrutura educacional brasileira, ocorridas na
década de 20 e denominadas de movimento Escola Nova, ou “escolanovismo”,
tiveram início entre o final do século XIX e início do século XX; no primeiro momento,
verificou-se um processo de teorização, mas foi apenas nas décadas de 20 e 30 que
o movimento de fato se firmou e difundiu-se. O movimento preconizava que o
estudante participasse efetivamente da construção do seu conhecimento, incluindo
uma compreensão de interdisciplinaridade no ensino, em que diferentes áreas do
conhecimento “conversam”, superando as barreiras existentes entre elas. O
escolanovismo chega ao Brasil a partir de experiências colhidas em países europeus,
sob influências de um ideal liberal, que rompia com o modelo tradicional educacional.
Sob o impacto inicial do movimento Escola Nova, as práticas educativas brasileiras
foram se transformando, passando a ver os estudantes como sujeitos centrais, numa
escola que ocupe uma função socializadora, o que é fundamental para uma sociedade
democrática (CAMBI,1999).
14

É sob essa perspectiva de ensino democrático, de estudantes como sujeitos


centrais do processo de ensino-aprendizagem, que esta pesquisa propõe a utilização
da literatura piauiense no ensino da Geografia do Piauí, promovendo uma
conversação entre as disciplinas escolares de Geografia e Literatura, em que os
corpos docente e discente trabalhem em conjunto na construção de um conhecimento
consistente e não fragmentado, através de um projeto interdisciplinar. Objetivamos,
com a pesquisa, criar condições para a implementação de uma Lei do Estado do Piauí
(Lei nº 5.359 de 2003) que torna obrigatório o ensino de Geografia do Piauí nos limites
territoriais do Estado, no Ensino Fundamental e Ensino Médio.
A Literatura pode ser de grande relevância para a Geografia, pois através dela
é possível resgatar, valorizar e apreender as diversas experiências humanas que
foram vivenciadas nas obras literárias (OLANDA & ALMEIDA, 2008). Com a literatura
piauiense não é diferente, as produções literárias de autores piauienses podem servir
de fontes para o ensino da Geografia do Piauí, sendo que através de um projeto
interdisciplinar, as disciplinas envolvidas seriam reciprocamente beneficiadas. Além
dessa relação de mutualismo entre as disciplinas Geografia e Literatura, em que
ambas se complementariam, os estudantes também seriam contemplados, tendo em
vista que essa abordagem pode tornar possível um maior entendimento sobre o seu
mundo da vida, compartilhando intersubjetivamente uma realidade complexa, mas ao
mesmo tempo próxima àquela em que se encontram inseridos (HABERMAS,1990).
A preocupação com o ensino da Geografia do Piauí se justifica pelo fato de que
é de suma importância conhecer as raízes históricas e a geografia do lugar onde o
indivíduo se encontra, a fim de que haja o reconhecimento de pertencimento e
consequente valoração. Também pela existência da lei estadual que torna obrigatório
o ensino da disciplina de Geografia do Piauí dentro dos limites territoriais piauienses.
Essa Lei entrou em vigor desde o ano de 2004, devendo ser cumprida, segundo o seu
texto, em escolas de ensino público e privado, nos níveis de Ensino Fundamental e
Ensino Médio. Trata-se da Lei Ordinária do Estado do Piauí nº 5.359, que aqui é
descrita na íntegra:

Lei Ordinária Nº 5.359 de 11/12/2003


Dispõe sobre a obrigatoriedade do ensino de História e Geografia do
Piauí nas escolas públicas e privadas. (*)
O GOVERNADOR DO ESTADO DO PIAUÍ, FAÇO saber que Poder
Legislativo decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
15

Art. 1º Fica instituída a obrigatoriedade do ensino de História e


Geografia do Piauí, nas escolas públicas (estaduais e municipais) e
privadas, em nível de ensino fundamental e médio.
Art. 2º Compete à Secretaria Estadual da Educação e Cultura a
normatização, fiscalização e execução da presente Lei, quando se
tratar de Escola Pública Estadual e escolas da rede privada, e as
Secretarias Municipais de Educação, ou órgãos a elas equiparados,
quando se tratar de Escolas Públicas Municipais.
Art. 3º Esta lei entra em vigor no início do ano letivo de 2004.
PALÁCIO DE KARNAK, em Teresina (PI), 11 de dezembro de 2003.
GOVERNADOR DO ESTADO
SECRETÁRIO DE GOVERNO
(*) Lei de autoria dos Dep. Marcelo Coelho e Homero Castelo Branco
(PIAUÍ, 2003)

Além da Geografia do Piauí, também é obrigatório o ensino de Literatura do


Piauí nas escolas piauienses, conforme dispõe o artigo 226, § 1º, da Constituição do
Estado do Piauí de 1988, que preconiza:

Art. 226. A lei estabelecerá o plano estadual de educação, de duração


plurianual, visando à articulação e ao desenvolvimento do ensino em
seus diversos níveis e à integração das ações do Poder Público que
conduzam:
I - à erradicação do analfabetismo;
II - à universalização do atendimento escolar;
III - à melhoria da qualidade do ensino;
IV - ao conhecimento da realidade piauiense, através de sua literatura,
história e geografia;
V - à preparação do educando para o exercício da cidadania.
§ 1º Será obrigatório, nas escolas públicas e particulares, o ensino de
literatura piauiense e a promoção, no âmbito de disciplina pertinente,
do aprendizado de meio ambiente, saúde, ética, educação sexual,
direito do consumidor, pluralidade cultural e legislação de trânsito.
(PIAUÍ, 2013, p. 224)

Há, ainda, uma Lei Ordinária do Estado do Piauí que vem para reforçar a
obrigatoriedade do ensino de literatura piauiense nas escolas do estado. Trata-se da
Lei Ordinária nº 5464 de 2005, que dispõe:

Lei Ordinária Nº 5.464 de 11/07/2005


Dispõe sobre o ensino de literatura brasileira de expressão piauiense,
no ensino Fundamental e Médio, nas escolas das redes pública
estadual e privada, no Estado do Piauí, e dá outras providencias.
O GOVERNADOR DO ESTADO DO PIAUÍ, FAÇO saber que o Poder
Legislativo decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Fica instituída a obrigatoriedade do ensino de literatura
brasileira de expressão piauiense, no ensino Fundamental e Médio,
nas escolas das redes pública estadual e privada, no Estado do Piauí.
Art. 2º A Secretaria Estadual da Educação e Cultura, através do órgão
competente, definirá o conteúdo programático do ensino de literatura
16

brasileira de expressão piauiense a ser cumprido nas escolas das


redes pública estadual e privada.
Art. 3º O Conselho Estadual de Educação definirá a normatização para
a execução desta Lei, no prazo de noventa dias, a partir da data de
sua publicação.
Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. (PIAUÍ,
2005)

É possível constatar, através da análise das leis supracitadas e do artigo


constante na vigente Constituição do Estado do Piauí, também supracitado, que há
uma preocupação, por parte do Poder Legislativo Estadual, quanto à promoção das
disciplinas de Literatura e Geografia do Piauí. No entanto, através de documentos
disponibilizados pela 16ª Gerência Regional de Ensino (GRE) do Estado do Piauí, foi
possível constatar que não é possível o cumprimento da lei supramencionada. Essa
realidade pode ser constatada através do compulsar dos documentos de identificação
do acervo bibliográfico de livros didáticos, paradidáticos e manuais do professor, que
se encontram anexados (Anexo 1). Tais documentos evidenciam que não há
disponibilidade de livros didáticos de Geografia do Piauí nas escolas que fazem parte
da 16ª GRE. Conclui-se, portanto, que fica prejudicado o cumprimento da Lei Ordinária
do Estado do Piauí de nº 5.359 de 2003, diante da ausência de disponibilidade de
material didático nas escolas de Ensino Médio da rede estadual de ensino.
Através da análise dessa relação de livros didáticos disponibilizados para
escolas da 16ª GRE, foi possível se chegar a um entendimento: que o problema de
não disponibilidade de livros didáticos de Geografia do Piauí é uma realidade que se
reflete nas demais 21 (vinte e uma) GREs do Estado do Piauí, já que todas são
mantidas pela Secretaria de Educação (SEDUC) do referido Estado. Constata-se,
portanto, que o Poder Executivo do Estado do Piauí não consegue cumprir aquilo que
fora determinado pelo Poder Legislativo Estadual, ou seja, embora haja normas legais
que determinam o ensino de Geografia do Piauí e Literatura Piauiense nas escolas
piauienses de nível fundamental e médio, os mesmos não são cumpridos.
Diante dessa indisponibilidade de materiais didáticos que possibilitem o ensino
da disciplina de Geografia do Piauí, os professores encontram dificuldades no
momento de trabalhar conteúdos acerca da geograficidade piauiense. Frente a essa
realidade, surgiu nesta pesquisadora uma inquietude, impulsionando-a a pensar em
soluções que fossem capazes de fazer com que a Geografia do Piauí fosse trabalhada
nas salas de aula, mesmo diante da não disponibilidade de livros didáticos da
disciplina. E, devido ao contato que teve, desde muito jovem, com a literatura
17

piauiense, enxergou este potencial literário como uma possível solução: usar a
linguagem literária para o processo de ensino-aprendizagem da Geografia do Piauí.
A literatura piauiense se mostra de grande potencial para o ensino de
Geografia, por ser uma literatura que tradicionalmente retrata a geograficidade do
estado. Nas produções literárias que a compõem há uma retratação muito forte de
características regionais, culturais, descrição de paisagens, dentre outros aspectos
que ajudam a remontar a história e a geografia do espaço vivido nordestino, em
especial, o recorte estadual do Piauí. Assim como acontece nas obras de Rachel de
Queiroz, em que Cavalcante (2019, p. 19) verifica a ligação existente entre o escritor
com o espaço e o tempo nos quais está inserido, que também se reflete no contexto
histórico-cultural vivido pelos seus personagens. As obras muitas vezes refletem as
vivências experenciadas por aqueles que as escrevem, e escritores piauienses
também têm essa característica telúrica, isto é, estando ligados à sua terra e refletindo
essa ligação em suas produções.
Portanto, através da exploração das produções literárias piauienses, com foco
nas características geográficas nelas contidas, proponho ações docentes
interdisciplinares, onde professores das disciplinas de Geografia e Literatura, através
de ações articuladas, agiriam, juntamente com o corpo discente, na busca da
construção de um conhecimento geográfico piauiense que ao mesmo tempo valorize
a literatura regional.
Um projeto interdisciplinar dessa natureza seria de grande valia para a
disciplina de Geografia, assim como para a disciplina de Literatura, já que traria
visibilidade para as produções literárias e proporcionaria o ensino-aprendizagem das
geograficidades piauienses, fortalecendo o sentimento de identidade dos estudantes
com a sua terra natal, com a sua cultura e arte. Nesse ponto ressalto que a literatura
piauiense é de um valor imensurável, muito embora não tenha destaque no âmbito
nacional, e seja pouco reconhecida mesmo no âmbito estadual. Mas acredita-se que
o conhecimento e estudo da literatura piauiense nas salas de aula do estado fariam
com que ela se popularizasse dentro dos limites territoriais do Piauí, podendo essa
popularização expandir por todo o Brasil.
Cabe destacar que, no passado, a literatura piauiense teve maior visibilidade
entre os estudantes do Piauí, pois até o início desta década, o estudante que
almejasse ingressar nas instituições públicas de ensino superior do Estado –
Universidade Federal do Piauí (UFPI) e Universidade Estadual do Piauí (UESPI) –
18

precisava se submeter às seleções realizadas, os vestibulares tradicionais. As


produções literárias piauienses faziam, então, parte da bibliografia obrigatória dos
vestibulares, conforme é possível se verificar através da análise do edital de nº
19/2009 da UFPI (Anexo 2) e do edital de nº 02/2010 do Núcleo de Concursos e
Promoção de Eventos (NUCEPE) da UESPI (Anexo 3). As produções literárias
piauienses foram objeto de estudo dos estudantes do ensino médio das redes de
ensino do Piauí até os anos de 2011 e 2012, na UFPI e UESPI, respectivamente.
Nos documentos mencionados, é possível observar as obras literárias
piauienses que foram cobradas naqueles processos seletivos: “Beira Rio Beira Vida”,
escrita por Assis Brasil; “Terreiro de Fazenda”, de Fontes Ibiapina; “Sangue”, escrita
por Da Costa e Silva; “Roteiro Sentimental e Pitoresco de Teresina”, escrita por H
Dobal; “Raimunda Pinto, sim senhor!”, de Francisco Pereira da Silva; “Vaqueiro e
Visconde”, de José Expedito Rêgo. Algumas delas serão analisadas nessa pesquisa
e, como será possível observar, retratam geograficidades piauienses.
As produções literárias piauienses sempre estiveram previstas nos conteúdos
programáticos dos editais de vestibulares das instituições públicas de ensino superior
piauienses, quando o ingresso nas mesmas ocorria por intermédio dos chamados
vestibulares tradicionais. Isso fazia com que houvesse uma divulgação das produções
literárias que compõem a literatura piauiense, pois era dever do estudante conhecer
aquelas que seriam abordadas nas provas de seleção.
No entanto, a partir do ano de 2011 (na UFPI) e 2012 (na UESPI), ficou definido
que a única forma de ingresso nas referidas instituições se daria através do Exame
Nacional do Ensino Médio (ENEM). Com isso, os vestibulares elaborados pelas
respectivas instituições foram extintos, e como o Exame Nacional do Ensino Médio se
trata de uma prova aplicada a nível nacional, a literatura piauiense deixou de fazer
parte da bibliografia obrigatória para ingresso nas instituições públicas de ensino
superior do Estado do Piauí; desse modo, entende-se que ficou prejudicada a
literatura piauiense.
Portanto, argumenta-se a favor de um projeto interdisciplinar que busca
estreitar os laços existentes entre a Geografia e a Literatura, já que um projeto desse
tipo alimentaria mutuamente as disciplinas envolvidas, favorecendo o conteúdo e os
aspectos pedagógicos. Por outro lado, instigaria o corpo discente a construir, através
do diálogo, o seu conhecimento de forma individual e coletiva. Um projeto
interdisciplinar tal como o proposto aqui auxiliaria ainda, mesmo que indiretamente,
19

todas as outras disciplinas que compõem o currículo escolar, já que, através da leitura,
o estudante leitor desenvolve várias habilidades: cognição, interpretação,
enriquecimento do vocabulário, aguçamento da criticidade e criatividade, dentre
outras. Especificamente do ponto de vista da Geografia, o raciocínio geográfico, a
aprendizagem de princípios geográficos, as categorias e conceitos da área.
Esta proposta de projeto interdisciplinar, onde professores das disciplinas de
Geografia e Literatura trabalhariam conjuntamente em prol do conhecimento da
literatura piauiense e geografia do Piauí, além da visibilidade que se pretende trazer
para a literatura regional, proporcionaria ao estudante a possibilidade de conhecer, de
uma forma dinâmica, a geograficidade do lugar em que está inserido. Logo, permitiria
que fosse possível se nutrir de um sentimento de pertencimento com relação ao seu
espaço de referência. Quando se conhece a geografia e a história do lugar onde se
vive, há uma tendência a se identificar com o lugar, a valorizar o seu processo de
formação e as suas culturas. Como lembra Jurgen Habermas (1990), a cultura
corresponde ao armazém do saber válido construído e transmitido socialmente para
as novas gerações, responsáveis pela reprodução de seus mundos da vida.
Essa interação articulada entre as disciplinas escolares segue a perspectiva da
Interdisciplinaridade, que visa à integração de disciplinas. Disciplinas estas que no
atual contexto acadêmico e de produção do conhecimento muitas vezes “se separam
uma das outras por compartimentos estanques, por fronteiras rígidas, cada disciplina
convertendo-se num pequeno feudo intelectual” (JAPIASSU, 1976, p. 58). Portanto, o
intuito seria a aproximação de disciplinas escolares a fim de que a aprendizagem de
conteúdos geográficos do Piauí fosse alcançada e, concomitantemente, houvesse a
valorização das obras que compõem a literatura piauiense, superando as barreiras
pessoais existentes entre professores e as barreiras disciplinares.
Seguindo esses objetivos, foram formuladas as seguintes questões
norteadoras desta pesquisa: Sendo a Literatura Piauiense uma forma de linguagem
potencializadora do ensino de Geografia do Piauí, de que maneiras as produções
literárias que compõem a Literatura Piauiense poderiam vir a contribuir para o ensino
de Geografia do Piauí nas escolas públicas de ensino médio do estado? Um projeto
interdisciplinar em que as disciplinas escolares de Geografia e Literatura trabalhassem
em conjunto seria capaz de suprir a ausência de livros didáticos de Geografia do Piauí,
e, assim, alcançar a implementação da Lei Ordinária nº 5.359 de 2003 no Estado do
Piauí?
20

São estas questões que me fazem refletir sobre a possibilidade de construir um


diálogo entre as disciplinas escolares de Geografia e Literatura, de maneira que as
áreas do conhecimento envolvidas possam, através de atos de fala, chegar a um
consentimento sobre a melhor maneira de construírem pontes entre os sujeitos
envolvidos.
Portanto, a presente pesquisa tem como objetivo geral analisar produções
literárias de escritores piauienses, a fim de que se alcance informações geográficas,
sociais, econômicas, políticas e culturais nelas contidas. Sugere-se a utilização das
obras através de um projeto interdisciplinar, em que funcionariam como recurso
didático no ensino de Geografia do Piauí. Projeto esse que contribuiria para a
implementação da Lei Ordinária do Estado do Piauí nº 5.359 de 2003 e do artigo 226
da Constituição do Estado do Piauí.
Para tanto, foram, analisadas produções literárias daqueles que são
considerados os 10 (dez) maiores escritores da literatura piauiense; a partir dessas
análises, selecionou-se e foram apresentadas as produções que abordam questões
geográficas e, que assim, podem vir a ser utilizadas no projeto interdisciplinar aqui
apresentado, em que tal literatura será usada como escopo para o ensino de
Geografia do Piauí.
Seguindo esse intuito, organizou-se o texto dissertativo em algumas seções.
Na primeira parte foi feita a introdução, em que se explicam as razões pelas quais se
desenvolveu esta pesquisa, expondo sua delimitação e os seus aspectos
metodológicos. O segundo capítulo trata de uma discussão mais aprofundada sobre
interdisciplinaridade e o estreitamento dos laços entre as disciplinas de Geografia e
Literatura. Neste capítulo, foi feita uma Revisão de Literatura, focando-se na análise
de dissertações de três programas de pós-graduação: Programa de Pós-Graduação
em Educação da Universidade Federal do Piauí; Programa de Pós-Graduação em
Geografia, também da Universidade Federal do Piauí, e o Programa de Pós-
Graduação em Ensino da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, Campus
Avançado de Pau dos Ferros. O intuito foi buscar estudos que se aproximassem da
pesquisa aqui desenvolvida, saber em que pontos elas se aproximam e se
diferenciam. Também no segundo capítulo faz-se a apresentação efetiva da proposta
do projeto interdisciplinar entre a Geografia e a Literatura. Finalmente, o terceiro e
último capítulo trata sobre a análise das produções literárias piauienses, em que são
21

demonstradas quais, dentre elas, podem vir a ser utilizadas no ensino de Geografia
do Piauí.

1.1 Delimitação da área da pesquisa

A pesquisa tem como espaço de investigação a 16ª GRE do Estado do Piauí, que
é composta atualmente por 12 municípios, são eles: (Figura 2)
• Alagoinha do Piauí;
• Alegrete do Piauí;
• Belém do Piauí;
• Caldeirão Grande do Piauí;
• Fronteiras;
• Francisco Macêdo;
• Marcolândia;
• Padre Marcos;
• Pio IX;
• São Julião do Piauí;
• Simões;
• Vila Nova do Piauí.
De acordo com dados do IBGE (2018), os municípios que compõem a 16ª
GRE contam com uma população estimada em 88.548 (oitenta e oito mil quinhentos
e quarenta e oito) habitantes, e este conjunto de municípios se encontra localizado na
região do centro-sul do Estado do Piauí, na Região Nordeste do Brasil. Com relação
ao número de estudantes que foram matriculados na 16ª GRE da SEDUC-PI, em sede
de nível médio, foi feito um levantamento através de dados disponíveis no site da
SEDUC-PI e se chegou aos números que foram organizados no seguinte quadro:

Quadro 1. Número de alunos matriculados na 16ª GRE em sede de ensino médio


regular e ensino médio integrado à educação profissional, entre os anos de 2014 e
2016.

ANO TOTAL
22

2014 3592

2015 3789
2016 3750
2018 3.653
2019 3.466
2020 3.434
Fonte: SEDUC –PI 1

Os dados disponibilizados na referida plataforma digital só estão atualizados


até o ano de 2016. Porém, na sede da 16ª GRE, foi feita uma pesquisa a fim de
levantar informações atualizadas acerca da quantidade de estudantes que a mesma
comporta atualmente. Dados referentes aos últimos três anos, portanto, foram obtidos
através de pesquisa de campo realizada por esta pesquisadora.
Os alunos matriculados na 16ª GRE se encontram distribuídos em 13 (treze)
escolas, nos 12 (dozes) municípios que a compõem, como pode-se verificar no quadro
abaixo:

Quadro 2. Escolas da 16ª GRE que ofertam o ensino de nível médio e os municípios
onde se encontram.
Município Escolas que ofertam o ensino de nível médio
Alagoinha do Piauí U.E. ALENCAR MOTA
Alegrete do Piauí U.E. ANTONIA DE SOUSA ALENCAR
Belém do Piauí CENTRO E. SEBASTIÃO DE SOUSA
Caldeirão Grande do U.E. WALDEMAR DE M. SANTOS
Piauí
Francisco Macêdo U.E. MARIA NEUSA DE SOUSA
Fronteiras COL. EST. FCA. PEREIRA DE S. MORAIS
CEEP FRANCISCO ALVES DE SOUSA
Marcolândia U.E. COSMA RAMOS DE SOUSA
Padre Marcos U.E DR FRANCISCO LUIZ DE MACEDO
Pio IX N. SRA. DO PATROCINIO
São Julião U. E. APRIGIO P. BEZERRA

1
Disponível em https://www.seduc.pi.gov.br/educacenso/ acesso em 04 de junho de 2019.
23

Simões U.E. RAUL SÉRGIO


Vila Nova do Piauí U.E. LUIS UBIRACY CARVALHO
Fonte: SEDUC –PI2

A sede da 16ª GRE fica localizada no município de Fronteiras, Piauí, distante


418km da capital do estado (Figura 1). Através de pesquisa preliminar, foi possível
alcançar documentos (Anexo 1), que demonstram a indisponibilidade de livros
didáticos sobre Geografia do Piauí nas escolas que fazem parte da referida GRE. Foi
realizada, ainda, por esta pesquisadora, uma pesquisa quanto a existência de
bibliotecas públicas nos municípios pertencentes à 16ª GRE de ensino, e, de acordo
com informações coletadas através do site do Sistema Nacional de Bibliotecas
Públicas3, constatou-se que há bibliotecas públicas em todos os municípios que
compõem a 16ª GRE.

Figura 1 - Mapa do Estado do Piauí e em destaque a cidade de Fronteiras, onde fica


localizada a sede da 16ª GRE, referente à área desta pesquisa.

Fonte: Mapa elaborado por Rosalvo Nobre Carneiro (2020).

2
Disponível em https://www.seduc.pi.gov.br/gerencias/1/ acesso em 15 de maio de 2019.
3
Disponível em < http://snbp.cultura.gov.br/bibliotecas-pi/>, acesso em dezembro de 2019.
24

A razão pela qual se deu a escolha desse locus foi pelo fato da pesquisadora
residir em um dos municípios que fazem parte da 16ª GRE, sendo, portanto, um lugar
de valor simbólico para sua vivência.

Figura 2. Mapa do Estado do Piauí onde estão em destaque os doze municípios que
compõem a 16ª GRE.

Fonte: Elaborado por Rosalvo Nobre Carneiro (2020).

1.2. Aspectos Metodológicos

A presente dissertação funda-se numa pesquisa de abordagem qualitativa, em


que foram descritos e interpretados registros obtidos ao longo da pesquisa, daí o seu
caráter descritivo e analítico. Quando se fala em pesquisa qualitativa, fala-se em
pesquisa descritiva, isso porque, segundo Bogdan & Biklen (1994), numa investigação
deste tipo, os dados que acabam por ser recolhidos não são quantificados, não são
números absolutos, mas, sim, dados coletados e qualificados pelo pesquisador, a
partir de diferentes fontes, orais ou escritas.
25

Uma pesquisa de caráter qualitativo implica, segundo Chizzotti (2008), que o


pesquisador tenha um contato intenso com os objetos de sua pesquisa, sejam eles
pessoas, locais ou fatos, com o intuito de que se possa extrair ao máximo significados
visíveis e latentes, que só podem ser alcançados graças a essa intimidade com os
objetos, devido à atenção que lhes é dada. Depois desse processo de aproximação e
convivência, o pesquisador, tendo posse dos dados levantados, os interpreta e os
elabora na forma de um texto, seguindo todo um rigor metodológico, a fim de manter
a competência científica; um texto que apresente e discuta os significados cristalinos,
bem como aqueles mais ocultos do seu objeto de pesquisa.
Para o levantamento dos dados da pesquisa, foram utilizados, como
instrumentos, a análise documental e a construção de um diário de campo, bem como
de um formulário de análise das obras literárias. De acordo com Falkembach (1987),
o diário de campo é um instrumento onde o pesquisador faz comentários e anotações,
bem como reflexões sobre a pesquisa que está sendo realizada, facilitando
posteriormente o trabalho de escrita que será realizado. É um instrumento facilitador
no processo de escrita, funcionando como um diário de bordo.
Nesta pesquisa, o diário de campo foi construído à medida que as produções
literárias selecionadas, que fazem parte da literatura piauiense, foram sendo
analisadas, o mesmo ocorrendo com o preenchimento do formulário de análise das
produções literárias (Apêndice A). Desse modo, o diário de campo serviu para fins
de controle sobre o período de tempo demandado à análise das produções literárias
dos escritores piauienses, enquanto o formulário teve por objetivo registrar os
aspectos das produções literárias analisadas. A análise das obras, construção do
diário de campo e dos formulários de análise das obras, foram realizados durante os
meses de novembro de 2019 a janeiro de 2020. Esta análise consistia em identificar
quais as produções podem vir a ser utilizadas no ensino de Geografia do Piauí, e a
partir daí, demonstrar quais os conteúdos geográficos podem ser trabalhados com os
textos a serem selecionados em cada obra literária.
Os documentos analisados foram fornecidos pela 16ª Gerência de Ensino do
Estado do Piauí. Para este trabalho, foi caracterizada a área da pesquisa, bem como
listados os livros didáticos adotados nas escolas de ensino médio da referida GRE e
a quantidade de estudantes matriculados nas séries de ensino médio.
Sobre a pesquisa documental e bibliográfica, ambas utilizadas nesta pesquisa,
foi acolhido o posicionamento de Gonçalves (2003), para quem o diferencial entre a
26

pesquisa documental e bibliográfica está na natureza de suas fontes: enquanto a


pesquisa bibliográfica parte da perspectiva de que vários autores contribuem para a
discussão de um determinado assunto, sendo, portanto, opiniões formadas sobre
algo, caracterizadas como fontes secundárias, a pesquisa documental já trata de uma
modalidade em que o pesquisador recorre a materiais em seu estado primário, isto é,
que ainda não passaram por nenhum tipo de tratamento, sendo, portanto, o que o
autor chama de fontes primárias.
Acerca dos critérios de inclusão e exclusão das produções literárias que
compõem a literatura piauiense, foi feita uma listagem dos nomes dos 10 (dez)
maiores escritores da Literatura Piauienses. Esses escritores foram elencados pelo
Sr. Prof. Kássio Fernando da Silva Gomes, o mesmo se apresenta como “Defino-me,
com muito orgulho, e pela graça de Deus, como Professor, na acepção plena do
termo. Depois de ter abandonado os cursos de Direito e Jornalismo, ingressei na
licenciatura para cursar História e, em seguida, letras-português. Fiz especialização
nas duas áreas e me arrisquei na pesquisa sobre autores piauienses, em especial,
Permínio Asfora, um dos mais importantes escritores brasileiros, cujo livro de estreia
foi interditado na Era Vargas pelo DIP - Departamento de Imprensa e Propaganda. A
partir dessa pesquisa, recebi a chancela da família Asfora para ser o biógrafo oficial
do autor. Ao longo da minha trajetória com professor, escrevi livros didáticos e de
análises de obras literárias em parceria com os professores Luiz Romero, Jorge
Alberto e Alex Romero, além de obras com conteúdos para o Enem. Fui eleito membro
da Academia de Letras da Confederação Valenciana - ALCV por participações no
meio intelectual do Piauí, inclusive com poemas publicados em antologias poéticas e
esparsos jornalísticos. Em 2017 assumi a Secretaria Municipal de Educação de
Valença do Piauí e fui eleito membro da Diretoria Executiva da UNDIME/PI, tendo sido
eleito ainda como membro do Conselho Nacional de Representantes da instituição em
nível nacional. Como Presidente da Fundação Quixote, fui responsável pelo processo
de interiorização dos salões de livros no Piauí, um trabalho pioneiro e de caráter socio
educacional, cuja principal finalidade é a democratização do acesso ao livro e à leitura,
sobretudo em lugares em que não há sequer uma biblioteca. Continuo no exercício
docente, atuando como professor de linguagens (com foco em Literatura) e História
da Arte em escolas da rede pública e particular de ensino. Atuo ainda como
palestrante e consultor cultural e educacional prestando assessorias para sistemas de
ensino e órgãos públicos e privados ligados à educação.”
27

Durante uma roda de conversa entre este estudioso da literatura piauiense e


participantes do 17º SALIPI, realizado entre os dias 31 de maio e 09 de junho, na
cidade de Teresina – PI, quando indagado sobre quais escritores eram considerados
os de maior relevância do Piauí, foram citados os seguintes nomes:

1. Mário Faustino
2. O G Rego de Carvalho
3. Permínio Asfora
4. H. Dobal
5. Assis Brasil
6. Torquato Neto
7. Da Costa e Silva
8. Alvina Gameiro
9. Francisco Gil Castelo Branco
10. Fontes Ibiapina

Essa lista se encontra em consonância com Lima (2007), que, ao listar, de


acordo com sua concepção, os quinze maiores romances de todos os tempos,
relaciona obras de 6 dos 10 escritores acima citados, quais sejam: O.G. Rego de
Carvalho, Assis Brasil, Alvina Gameiro, Permínio Asfora, Fontes Ibiapina e Francisco
Gil Castelo Branco.
Tendo tais nomes como referência da Literatura Piauiense, foi analisada a
produção literária de maior relevância produzida por cada um dos escritores
elencados, fazendo uso do formulário de análise preparado pela pesquisadora
(Apêndice A). A finalidade foi fazer o levantamento de quais produções literárias
seriam mais relevantes para o ensino de Geografia do Piauí. Para considerar a
relevância de uma obra literária foi levado em conta: quais textos ajudam a remontar
a formação territorial do Estado do Piauí; aqueles que trazem os modos de viver e a
cultura piauiense, em diferentes épocas; que abordem os sujeitos sociais que foram
importantes para a construção do contexto social atual do estado do Piauí.
A análise das obras se realizou pela busca de palavras-chave como: Oeiras,
Teresina, Parnaíba, Rio Parnaíba, Carnaúba, Carnaubais, Vaqueiro, Seca, Sertão,
dentre outras, que remetem às geograficidades piauienses. Ainda foi feita uma
periodização das obras, acerca da fase literária em que estavam inseridas e quais os
28

temas geográficos nelas tratados; o objetivo foi analisar se as obras de um mesmo


período literário seguem um padrão quanto aos conteúdos/narrativas nelas
abordadas.
Portanto, o objeto de análise, ou os “sujeitos” centrais dessa pesquisa, foram
as produções literárias e os 10 escritores considerados mais importantes da literatura
piauiense, tendo sido analisadas as obras de maior relevância de cada escritor
supracitado. O critério traçado e alcançado foi extrair aqueles textos literários que são
carregados de informações geográficas e que possam ser utilizados como recurso no
ensino da disciplina de Geografia do Piauí, suprindo assim a falta de livros didáticos
que abordem a geograficidade piauiense.
Foi realizada, ainda, uma Revisão de Literatura, com a finalidade de ter uma
ideia de como vêm sendo produzidas pesquisas que visam aliar as disciplinas de
Literatura e Geografia, através da Interdisciplinaridade, em determinados programas
de pós-graduação, buscando verificar a originalidade desta pesquisa. Foram
analisadas todas as dissertações já defendidas nos programas de pós-graduação dos
programas de Educação e Geografia do Estado do Piauí, e do programa de pós-
graduação em Ensino da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, campus
Avançado de Pau dos Ferros. Fez-se uso dos descritores: Literatura e
Interdisciplinaridade; Geografia e Literatura; Geografia e Interdisciplinaridade; e
Interdisciplinaridade.
A escolha dos referidos programas de pós-graduação se deu por dois motivos.
Primeiramente, como essa pesquisa trata sobre a Geografia do Piauí e a Literatura
Piauiense, seria natural a verificação nos programas de pós-graduação do estado do
Piauí, nas áreas de Ensino e Geografia. Já a análise das dissertações defendidas no
programa de pós-graduação em Ensino da Universidade do Estado do Rio Grande do
Norte, campus Pau dos Ferros, se deu pelo fato de que a pesquisa aqui realizada está
vinculada a este programa.
Espera-se que os resultados desta pesquisa sirvam como norte para
professores de Geografia e de Literatura da rede de ensino do Estado do Piauí, que
atuam sobretudo no nível médio. Que possam se articular interdisciplinarmente,
através de ações coordenadas, onde todos os sujeitos envolvidos no processo de
ensino façam uso de atos de fala, a fim de se chegar a um entendimento de mundo
da vida. O objetivo de um projeto interdisciplinar é derrubar as barreiras existentes
entre as disciplinas, favorecendo o processo de ensino-aprendizagem através da
29

construção de um conhecimento articulado, um conhecimento que dê meios para que


os estudantes consigam entender a realidade vivida e sejam capazes de solucionar
os problemas que lhes são apresentados no dia-a-dia e que se mostram cada vez
mais numerosos e complexos.
A ideia desta pesquisa é, portanto, mostrar caminhos para que professores
das disciplinas escolares de Geografia e Literatura possam elaborar um projeto
interdisciplinar, em que a literatura piauiense venha a ser utilizada como recurso no
ensino de Geografia do Piauí; projeto esse que instiga a participação efetiva de todos
os sujeitos envolvidos no processo de ensino-aprendizado, ou seja, estudantes e
professores.
30

CAPÍTULO 2
GEOGRAFIA E LITERATURA: ESTREITANDO LAÇOS ATRAVÉS DA
INTERDISCIPLINARIDADE

2.1 A fragmentação do mundo contemporâneo e a Interdisciplinaridade

O conhecimento humano transita entre diversos campos do saber e é preciso


discutir as possibilidades de sua construção a partir de um diálogo entre esses
saberes. Há uma fragmentação entre as áreas do conhecimento e até mesmo dentro
das próprias disciplinas, é preciso enxergar que essa fragmentação não é mais capaz
de atender às exigências da complexa realidade atual. É, portanto, necessário um
maior diálogo entre as áreas do conhecimento, para que se possa alcançar uma
melhor compreensão do mundo vivido e, assim, ter condições de lidar e resolver os
problemas apresentados.
Defende-se uma superação da fragmentação do conhecimento, devendo este
estar além de territórios pré-estabelecidos e rigidamente demarcados (JAPIASSU,
1976), respeitando a verdade e a relatividade das disciplinas, reconhecendo as
funções dinâmicas entre elas, aliando-as às questões sociais (FAZENDA, 2011).
Propõe-se, então, a criação de condições para a superação de um saber setorizado
para um conhecimento integrado, sobretudo, pelo viés interdisciplinar. A
interdisciplinaridade contribui para o aguçamento da criticidade, uma vez que todos
os sujeitos envolvidos interagem entre si, através do agir comunicativo, na busca de
um consenso sobre quais os melhores caminhos a serem seguidos para se alcançar
o fim educacional, ou seja, o aprendizado.
Fundada na ideia da interação entre sujeitos e áreas do conhecimento, através
da participação efetiva de todos os envolvidos, a interdisciplinaridade é algo em
evidência nos últimos tempos, “cresce atualmente a consciência da necessidade de
pesquisas interdisciplinares, a qual procura reagir à fragmentação” Siebeneichler
(1989, p. 105). Essa evidenciação da interdisciplinaridade começou a tomar forma,
entre os diversos projetos epistemológicos, a partir da década de 1960. Busca-se,
justamente, superar a fragmentação do saber, derrubar barreiras existentes entre as
disciplinas. Trata-se de um termo bem complexo, uma vez que requer uma reflexão,
não somente em torno dos conteúdos e sua integração entre áreas diversas do
conhecimento, mas também quanto à inter-relação entre sujeitos envolvidos no
31

processo de ensino aprendizagem, alunos/as e professores/as. Para Fazenda


(2001a), a interdisciplinaridade se mostra possível quando há um respeito pelas
disciplinas e sujeitos envolvidos, fazendo-se necessário criar condições de dinamizar
as relações entre as disciplinas e uma aproximação com os problemas sociais.
A Interdisciplinaridade se apresenta necessária no mundo atual, em que é
preciso reconhecer que saberes repassados de forma parcelada não conseguem
formar um indivíduo analítico e crítico, capaz de resolver problemas que lhe são
apresentados pela vivência em sociedade, já que estes se apresentam cada vez mais
complexos. “Essas novas configurações demandam, às várias áreas da ciência, certa
urgência na tarefa de abarcar a complexidade que vem se instaurando no mundo
contemporâneo” (NISHIWAKI, 2017, p.20). E é diante dessa consciência, de que os
saberes parcelados não são capazes de suprir as demandas de um mundo tão
complexo, que se propõe a interdisciplinaridade, pois, por meio dela, os saberes são
repassados de forma articulada, permitindo alcançar um maior entendimento acerca
do mundo vivo e da realidade na qual se está inserido.
Sobre as novas competências exigidas pela sociedade atual, Alarcão (2013)
dispõe que são fatores essenciais para o desenvolvimento pessoal, cognitivo e social,
pois, através de um pensamento independente e crítico, é possível alcançar a
emancipação do ser e a cidadania. É preciso, portanto, reconhecer a complexidade
em que vivemos, e entender, como salienta Pontuschka (2007, p. 143), que “saberes
parcelados não dão conta de resolver problemas que demandam conhecimentos
específicos”. É aí que entra em cena a interdisciplinaridade, pois através dela é
possível construir um conhecimento integrado, profundo, sem barreiras
epistemológicas.
Partindo da ideia de que é tarefa da educação criar meios para a emancipação
dos estudantes, Casagrande (2009) dispõe que há uma necessidade de que o
processo educativo contribua no sentido de formar estudantes que estejam aptos a
participar ativamente da construção da sociedade, e que para isso seriam necessárias
ações de internalizarão das regras sociais vigentes, bem como o desenvolvimento da
moral, a fim de que se isso contribua para uma estruturação da identidade, do Eu
daqueles que participam do processo educacional. A interdisciplinaridade é um meio
pelo qual se pode alcançar esse objetivo, tendo em vista que, num projeto
interdisciplinar, “disciplinas agem”, de forma cooperada, com o intuito de superar as
32

limitações existentes entre as mesmas e assim, construir um conhecimento, na


medida do possível, o mais uno e indivisível possível.
É preciso que os estudantes sejam capazes de compreender a realidade por
eles vivida, a fim de que possam atuar de maneira interativa na vida cotidiana, sendo
capazes de participar dos processos de solução dos problemas que lhes são
apresentados. Nessa esteira, Alarcão afirma que “compreender o mundo,
compreender os outros, compreender-se a si e compreender as interações que entre
estes vários componentes se estabelecem e, sobretudo, isto ser capaz de “linguajar”
é o alicerce da vivência da cidadania” (ALARCÃO, 2013, p. 25).
Nessa mesma perspectiva, entende-se o quão fundamental é abandonar a
ideia de professores como transmissores de saberes acumulados e estudantes como
meros receptores desses saberes. De acordo com a autora supramencionada, e
também fazendo uso das ideias de Habermas (1987), a sala de aula passou a ser um
local de reprodução do mundo vivido, de produção de conhecimento. Portanto, há a
necessidade de que ali seja um espaço onde haja o exercício do ato de pensar e
refletir, pelo qual é possível haver a formação de opinião pública e, assim, a
construção de cidadãos aptos a interferirem de maneira efetiva na edificação do meio
social. É preciso que haja um envolvimento por parte de “alunos e professores em um
processo coletivo de construção dos conhecimentos e de personalidades
comprometidas com o seu contexto social”. (MULH, 2011, p. 1044).
Segundo Raynaut (2014), faz-se necessário ultrapassar as fronteiras do saber,
a fim de que seja possível entender os problemas enfrentados no mundo
contemporâneo. Para o autor, a interdisciplinaridade é fruto de um esforço contínuo
do pensamento científico, que busca renovar a produção e transmissão do
conhecimento; se mostra, portanto, como uma solução eficaz para a produção de um
conhecimento capaz de enfrentar os problemas postos pela contemporaneidade.
Para Japiassu (1976, p.74), “a interdisciplinaridade caracteriza-se pela
intensidade das trocas entre os especialistas e pelo grau de interação real das
disciplinas no interior de um mesmo projeto de pesquisa”; ela valoriza e respeita a
“especificidade de cada área do conhecimento, isso é, a fragmentação necessária no
diálogo inteligente com o mundo e cuja gênese encontra-se na evolução histórica do
desenvolvimento do conhecimento”. É justamente esse o objetivo do projeto
interdisciplinar entre as disciplinas de Geografia e Literatura que ora se apresenta, em
que a literatura piauiense seja utilizada como recurso no ensino de Geografia do Piauí.
33

Visa-se o respeito das áreas do conhecimento que estarão envolvidas, propõe-se o


diálogo entre as disciplinas e sujeitos envolvidos, fazendo uso do agir comunicativo,
tendo como finalidade a construção de um conhecimento acerca de geograficidades
piauienses e a valorização da literatura local. Geograficidade, um conceito
desenvolvido por Dardel (2011), são as relações concretas existente entre o Homem
e à Terra, o amor pela terra natal, sejam essas ligações teóricas, simbólicas ou
afetivas, mas que propiciam o conhecimento do desconhecido, atingir aquilo que se
encontra inacessível.
O “agir comunicativo”, necessário a um projeto interdisciplinar, é um conceito
desenvolvido por Habermas (1989) e pode ser entendido como um processo onde
todos os sujeitos fazem uso de atos de fala, logo, um processo democrático que visa
o entendimento mútuo entre os sujeitos envolvidos no processo de ensino-
aprendizagem, conforme defende-se aqui. No agir comunicativo não deve haver
imposição, é necessário se chegar a um acordo, daí a importância da participação
efetiva de todos os sujeitos envolvidos, que todos se expressem através dos atos de
fala, e que estes sejam reconhecidos como válidos pelos envolvidos.
Em um processo interdisciplinar, o agir comunicativo é de suma importância,
pois valoriza as especificidades das áreas do conhecimento que se encontram em
diálogo, além de capacitar os estudantes comunicativamente, dando suporte para que
estes sejam capazes de fazer questionamentos diante de questões que lhes são
apresentadas. Ou seja, em um projeto dessa natureza é necessário o diálogo entre
os sujeitos envolvidos (professores e estudantes), em que os mesmos façam uso de
atos de fala, em que todos dialoguem e exponham suas opiniões, em prol de um
consentimento sobre quais os melhores caminhos a serem percorridos para o alcance
do que se propõe. Sobre esse processo, Habermas (1989, p.167) expõe que:

Os processos de entendimento mútuo visam um acordo que depende


do assentimento racionalmente motivado ao conteúdo de um
proferimento. O acordo não pode ser imposto à outra parte, não pode
ser extorquido ao adversário por meio de manipulações: o que
manifestamente advém graças a uma intervenção externa não pode
ser tido na conta de um acordo. Este assenta-se sempre em
convicções comuns. A formação de convicções pode ser analisada
segundo o modelo das tomadas de posições em face de uma oferta
de ato de fala. O ato de fala de um só terá êxito se o outro aceitar a
oferta nele contida, tomando posição afirmativamente, nem que seja
de maneira implícita, em face de uma pretensão de validez em
principio criticável.
34

Para validar as ações interdisciplinares, é necessário que exista o processo


comunicativo entre os indivíduos, assim, uma competência comunicativa em que as
pessoas interagem entre si através da utilização da linguagem, organizando-se
socialmente, buscando o consenso sem processos coercitivos. Esse processo de
comunicação que visa ao entendimento mútuo está na base de toda a interação, pois
somente uma argumentação em forma de discurso permite o acordo de indivíduos
quanto à validade das proposições ou à legitimidade das normas. Por outro lado, o
discurso pressupõe a interação, isto é, a participação de atores que se comunicam
livremente (GONÇALVES, 1999).
Em se tratando de interdisciplinaridade aplicada à Geografia, são reconhecidas
três etapas, e uma quarta que vem sendo construída. As três primeiras restaram
frustradas, sendo a primeira delas a interdisciplinaridade clássica. Nesta, as ciências
de geografia e história ainda não se separavam, o objeto de estudo das mesmas não
era bem definido, fazendo com que fossem consideradas, por um longo período de
tempo, “como uma espécie de irmãs siamesas” (SANTOS, 2004, p. 134).
Depois, a ciência geográfica procurou se firmar como disciplina autônoma, que
se ocupa de estudar como o espaço é resultado do tempo e como o tempo, passado
e futuro, concorrem para o funcionamento do espaço atual. Mas essa segunda etapa
não progrediu, pois verificou-se uma recusa por parte dos geógrafos, que se negavam
a se apropriar de conhecimentos oriundos de outras disciplinas e assim aperfeiçoá-
los. O momento histórico em que se figurou essa fase foi marcado por uma
preocupação, por parte dos geógrafos fundadores da Geografia moderna, de
afirmação de que a Geografia era uma disciplina singular e que possuía autonomia.
Essa preocupação em demasia, evitando aproximação com demais áreas do
conhecimento, resultou num esvaziamento da ciência geográfica, fazendo com que
outras ciências surgissem e se apropriassem de aspectos que poderiam ser
igualmente da Geografia. (SANTOS, 2004, p. 135 e 136).
Dois marcos históricos importantes foram responsáveis pela terceira etapa da
interdisciplinaridade na ciência geográfica, o fim do século XIX e o contexto pós
Segunda Guerra Mundial. Nesses períodos, verificou-se a extinção daquela
interdisciplinaridade clássica, fazendo com que houvesse uma evolução da noção de
interdisciplinaridade, como resultado de um progresso científico e econômico.
Naqueles contextos, despontou uma noção de interdisciplinaridade que se relaciona
35

ao aumento da “possibilidade de ajudar as ciências afins a progredir de fora para


dentro com a contribuição de matérias vizinhas”. (SANTOS, 2004, p. 136).
Hoje tem-se a abertura para uma nova ideia de interdisciplinaridade, aplicável
à Ciência da Geografia. Trata-se da ideia de interdisciplinaridade abordada ao longo
deste capítulo, em que as áreas envolvidas progridem conjuntamente, alimentam-se
concomitante, sem haver hierarquia entre disciplinas e nem entre os sujeitos.

2.2. Geografia e Literatura: possibilidades de um projeto interdisciplinar

Para um projeto interdisciplinar proporcionar bons resultados na escola, deve-


se perceber as demandas dos estudantes de acordo com o contexto ao qual estão
inseridos, sendo fundamental, também, que os professores entendam a importância
da inter-relação entre eles na construção coletiva do projeto. Os professores precisam
utilizar diálogos democráticos, sem imposições de ideias, pautados no respeito e
reconhecimento do outro e de suas áreas, além de compreenderem que o objetivo
maior da interdisciplinaridade é a satisfatória aprendizagem dos alunos, numa
educação voltada para a cidadania, que busca aliar as metodologias de ensino
próprias de cada disciplina.
O conceito de interdisciplinaridade ultrapassa a simples ideia de áreas
trabalhando em conjunto, é bem mais que isso, é a integração de disciplinas a fim de
formação de cidadãos críticos e reflexivos, através de um diálogo entre professores,
acerca das questões de cunho filosófico e pedagógico, nunca deixando de analisar a
participação dos estudantes, enquanto também propositores de projetos
interdisciplinares; a ideia é que os estudantes também sejam protagonistas do
processo de ensino-aprendizagem.
De fato, construir e tornar efetivo um projeto interdisciplinar não é uma tarefa
fácil, mas há uma certeza: não é possível o fazer se não houver diálogo entre todos
os integrantes deste fazer; é através do diálogo que se torna possível chegar a um
consenso e, assim, superar barreiras rígidas existentes entre as diversas áreas do
saber.
Propõe-se, na próxima sessão, verificar como se deu a relação entre Literatura
e Geografia ao longo do tempo, além de analisar as possibilidades de as disciplinas
escolares de Literatura e Geografia serem trabalhadas em conjunto, de maneira
36

coordenada, fundadas no consentimento, a fim da construção de um conhecimento


articulado.

2.2.1. Reflexões sobre Geografia e Literatura

Nesse subtópico discute-se as possibilidades de entrelaçamento entre a


Geografia e a Literatura, e quais as contribuições trazidas para as disciplinas e para
os estudantes num projeto interdisciplinar que vise a utilização da literatura piauiense
no estudo da Geografia do Piauí. Para sua construção, fez-se uso das Matrizes
Curriculares da Educação Básica da Rede Estadual de Ensino do Piauí, elaboradas
pela Secretaria de Educação do Estado do Piauí, da Lei Ordinária do Estado do Piauí
nº 5.359 e do art. 226 da Constituição do Estado do Piauí, visando a demonstração
da relevância de um projeto interdisciplinar dessa natureza.
O que se propõe é uma aproximação entre as disciplinas escolares
supramencionadas, através de um projeto interdisciplinar, onde ambas se beneficiem,
considerando-se a literatura piauiense como uma fonte de características geográficas
do Estado do Piauí. A maneira como o escritor percebe os espaços e os lugares, bem
como as relações sociais estabelecidas neles, através do enredo e personagens das
suas obras, ajudam a compreender como ocorreram as dinâmicas entre sociedade e
espaço na temporalidade.
Deve-se ressaltar que o estabelecimento de relações entre a Literatura e
Geografia não é algo inovador, pois antes de a Geografia se firmar como disciplina,
ambas andavam juntas, por terem pontos em comum, como a descrição de paisagens.
Num contexto geral, ainda no século XIX, na obra “Cosmos”, o alemão Alexander Von
Humboldt (1875) já estabelecia relações entre Geografia e Literatura. Porém, foi
apenas na década de 40 do século XX que geógrafos ingleses, franceses e
americanos “começam a indicar em suas análises a pertinência da apropriação da
Literatura em análises geográficas, como é o caso de Paul Vidal de la Blache, H. R.
Mill e J. K. Wright” (SUZUKI, 2017, p. 02).
Partindo da perspectiva de que obras literárias são capazes de facilitar a
compreensão dos fenômenos geográficos do ambiente retratado, a partir da década
de 60 geógrafos passaram a se dedicar, de maneira contínua, aos estudos que
relacionam as ciências geográficas e literárias, pois acreditavam, de acordo com Lima
37

(2000), que a Literatura se apresentava como um importante veículo de transmissão


das relações humanas experenciadas em um determinado espaço.
Geógrafos ingleses como Y-Fu Tuan e Salter tiveram destaque nesse período,
contribuindo para a temática com textos que tratam das relações existentes entre a
Geografia e a Literatura, quais os pontos positivos dessa aliança entre as áreas do
conhecimento e chamando atenção para os cuidados que se fazem necessários
quando se estabelece uma relação desse tipo. Havia uma preocupação, por parte
desses geógrafos, quanto à percepção que os autores têm dos lugares e espaços por
eles retratados em suas obras. Segundo Tuan (1983), a arte literária tem como uma
de suas funções a de evidenciar experiências íntimas, pois ela acaba por trazer à baila
experiências que passariam despercebidas de outro modo, sendo, portanto, um meio
que acaba por evidenciar inclusive as experiências com o lugar onde se passa a
narrativa.
Mas “somente a partir da década de setenta que os geógrafos vêm dedicando
mais continuamente seus estudos relacionados com as perspectivas experienciais
descritas na Literatura” (LIMA, 2000, p. 10). No início da década de 80, organizou-se
uma coletânea composta por textos de vários autores, que trataram de dar o seu ponto
de vista acerca das relações entre Literatura e Geografia, que vinham se
estabelecendo. Dentre os temas abordados, verificou-se uma maior incidência de
textos que abordavam a utilização de produções literárias como recursos para a
ciência geográfica. A partir de então, fez-se cada vez mais interessante e relevante o
uso da Literatura pela Geografia, pois a essência dessas duas áreas parte de um
ponto único, que é a narrativa e análise de fatos da vida, das relações humanas, que
acontecem nos espaços (LIMA, 2000, p. 16).
Partindo para o contexto brasileiro, tem-se que na década de 40 do século XX,
Pierre Monbeig, geógrafo francês, recentemente chegado ao Brasil, trouxe consigo
influências da Geografia Humana e Cultural Francesa, enxergando uma possível
aproximação entre a Geografia e Literatura. Monbeig foi responsável por impulsionar,
à época, estudiosos brasileiros, quanto a possibilidade de estabelecer uma ponte
entre as áreas do conhecimento aqui tratadas. Foi publicado no Boletim Geográfico
de julho de 1949 um texto intitulado “Literatura e Geografia”, de autoria de Fernando
Segismundo. Para Segismundo, um romance ou os versos de um poema, podem ser
uma excelente fonte de geograficidades, já que as duas áreas nunca deixaram de
caminhar juntas. Sob influência de Monbeig, Segismundo entende que o fato de a
38

literatura ser um repositório de dados geográficos se explica porque a descrição das


paisagens já revela esse campo comum entre a ciência geográfica e a literária.
(SEGISMUNDO, 1949, p. 327).
O autor não só aponta as possibilidades de interdisciplinaridade entre as
disciplinas como também incentiva a superação de um ensino meramente teórico, que
acaba por causar desinteresse, por ser enfadonho. Instiga o uso de livros de viagens
e aventuras como uma maneira de tornar mais interessante os conhecimentos
geográficos: “É nos livros dos romancistas que melhor podemos conhecer certas
particularidades da flora e da fauna, e as características de determinado grupo étnico”.
(SEGISMUNDO, 1949, p. 328). Desse modo, seria possível alcançar um ensino-
aprendizado de maneira simples, diferenciada e instigante.
Segismundo (1949) cita vários autores que, em textos não geográficos, acabam
por oferecer contribuições de maneira acidental para a Geografia. Explica que as
contribuições são acidentais porque “não houve o desígnio de ‘fazer’ geografia ou de
contribuir para a difusão desta” (SEGISMUNDO, 1949, p. 329). Segundo o estudioso,
a obra “Uma Viagem à Terra Brasil”, de Jean de Lery, permite conhecer o Rio de
Janeiro, em se tratando de sua fauna, flora, clima e até mesmo população. Cita
também “Os Sertões”, de Euclides da Cunha, que traz contribuições pertinentes
acerca da Guerra de Canudos, e da geografia do nordeste brasileiro. Destaca ainda
as grandes contribuições de José de Alencar e Gonçalves Dias, tratando os mesmos
como nacionalistas, visto que se apropriam de temas brasileiros em suas narrativas,
evidenciando o índio e incorporando à literatura nacional o indianismo, como nova
escola literária.
No início da década de 60, Mauro Mota, influenciado por Monbeig e
Segismundo, em um texto intitulado de “Geografia Literária”, retoma a discussão,
destacando a importância de dinamizar o ensino de Geografia, fazendo o uso de
leituras não técnicas, para uma melhor apreensão de conceitos geográficos. (LIMA,
2000, p. 18). Ao falar no uso de leituras não técnicas em Geografia, refere-se à
Literatura Brasileira como recurso autêntico para uma melhor compreensão dos
espaços retratados e as dinâmicas ocorridas neles. Uma década depois, destacou-se
um projeto desenvolvido por Lívia de Oliveira e Lucy Machado, professores do
departamento de Geografia da Universidade Estadual Paulista – UNESP, em que o
poema “Morte e Vida Severina”, de autoria de João Cabral de Melo Neto, é utilizado
39

como recurso; o projeto tratava das “experiências didáticas sobre o ensino do


Nordeste brasileiro” (LIMA, 2000, p. 18).
Infelizmente, os estudos com essa temática acabaram por não se
desenvolverem nas décadas seguintes, e as publicações foram muito tímidas. Mas,
na última década, produções que valorizam as relações entre a Literatura e Geografia
voltaram a ganhar espaço, tendo sido apresentadas em grupos de trabalhos de vários
eventos a nível nacional.
Diante do exposto, fica demostrado que a Literatura pode viabilizar a
dinamização do ensino de Geografia, já que é visível “a possibilidade de ela
intermediar a compreensão da relação do homem com o meio por ele produzido e
valorado” (OLANDA e ALMEIDA, 2008, p. 11), que através da Literatura é possível
compreender o mundo vivido. Segundo a percepção de Lima (2010), a Literatura
Regional tem esse potencial de possibilitar a percepção do espaço onde se passa a
narrativa:
Através das obras de cunho regionalista, podemos analisar o poder de
visualização de um quadro ou situação de um dado momento
mediante a percepção do escritor, fundamentado talvez em suas
memórias. Impressões, observações dos lugares em que viveu ou
simplesmente, atravessou enquanto viajante, chegando então mais
próximo da compreensão do espaço vivido (LIMA, 2000, p.26).

O entrelaçamento entre a Geografia e a Literatura é dado pela evidenciação de


aspectos geográficos através das representações da realidade vivida nas obras
literárias. Sendo, portanto, o trabalho conjunto dessas disciplinas capaz de promover
a construção de um conhecimento pautado na reflexão e no diálogo, visando “o
desenvolvimento crítico, cognitivo, social, humano, psíquico, cultural e ético”,
podendo-se pensar num crescimento de cunho individual e também coletivo. Acerca
do entrelaçamento entre essas disciplinas, Eduardo Marandola Júnior e Lúcia Helena
Batista Gratão assim expressam:

Essa nova aproximação quer mais do que identificar elementos “reais”


nas descrições das paisagens e dos lugares. Quer estabelecer um
entrelaçamento de saberes que tecem também pelos fios de
entendimento da espacialidade e da geograficidade, enquanto
elementos indissociáveis de qualquer narrativa. (MARANDOLA
JÚNIOR; GRATÃO, 2010, p.9)
40

Diante dessa nova perspectiva do ensino, em que professores e estudantes


são protagonistas no processo de ensino-aprendizagem, tendo como foco a
interdisciplinaridade, é que se propõe o estabelecimento de relações entre as
disciplinas escolares de Literatura e Geografia, a fim de que a literatura piauiense
possa ser utilizada como recurso para o ensino de Geografia do Piauí.
Falar em interdisciplinaridade significa também pensar que tanto a disciplina de
Geografia quanto a de Literatura são beneficiadas. Para os estudantes, um projeto de
natureza interdisciplinar, além de promover a construção de um conhecimento
articulado, também promoveria o incentivo à leitura, um contato mais íntimo com a
língua portuguesa, o melhoramento da escrita e da comunicação com seus pares.
Como defende Casagrande (2009), a educação deve exercer o papel de formação de
sujeitos competentes comunicativamente, que estejam aptos a conviver socialmente,
que procurem alcançar entendimentos e a capacidade de coordenar ações.
As contribuições, para a disciplina de Literatura, também se dariam de um
ponto de vista mais amplo, coletivo, uma vez que promoveria a literatura piauiense,
que, de acordo com Lima (2013), trata-se de uma literatura pouco conhecida e
divulgada, mas riquíssima e muito significativa. Escritores e suas produções literárias
seriam trabalhados em sala de aula, como preleciona o artigo 226 § 1º da Constituição
do Estado do Piauí e Lei Ordinária nº 5464 de 2005, que trazem expressamente a sua
obrigatoriedade nas escolas públicas e privadas, dentro dos limites territoriais do
Estado.

2.2 .2 A contemplação da BNCC num projeto interdisciplinar entre as disciplinas


de literatura e geografia

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um documento de caráter


normativo que traz quais são os conteúdos essenciais na formação dos estudantes
da Educação Básica, em todos os seus níveis, e quais habilidades estes devem
desenvolver ao longo da trajetória escolar. A BNCC tem como base legal a
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, o Plano Nacional da
Educação (PNE) e a Lei de Diretrizes e Bases (LDB). Ao longo de dispositivos, a Carta
Magna Brasileira e as leis supramencionadas fundamentam a BNCC e a definem,
como se pode verificar:
A CFRB/88, prevê, em seu Artigo 210, a Base Nacional Comum Curricular:
41

Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental,


de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos
valores culturais e artísticos, nacionais e regionais.
§ 1º O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina
dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental.
§ 2º O ensino fundamental regular será ministrado em língua
portuguesa, assegurada às comunidades indígenas também a
utilização de suas línguas maternas e processos próprios de
aprendizagem. (BRASIL, 2017)

A Lei nº 9.394 de 1996, conhecida como Lei de Diretrizes e Bases, em seu


artigo 23º, determina a construção dos currículos, no Ensino Fundamental e Médio,
“com uma Base Nacional Comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino
e estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características
regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da clientela”. (BRASIL,
1996). Segundo o próprio texto da BNCC, “ao longo da Educação Básica, as
aprendizagens essenciais definidas na BNCC devem concorrer para assegurar aos
estudantes o desenvolvimento de dez competências gerais” (BRASIL, 2017).
O desenvolvimento dessas competências citadas no texto da BNCC se referem
a uma mobilização de um conjunto de conhecimentos, habilidades, atitudes e valores
que permitam que os estudantes possam compreender a realidade vivida e assim
tenham capacidade de resolver os problemas que lhes são apresentados no cotidiano,
fazendo com que seja possível o exercício da cidadania e a preparação para o mundo
do trabalho. “Socializar os indivíduos das novas gerações implica permitir que
desenvolvam as capacidades de que necessitam para participarem ativamente do
processo social” (BOUFLEUER, 1997, p. 82). Isto é, para que seja possível a
participação efetiva dos indivíduos no processo social ao qual estão envolvidos é
necessário o desenvolvimento de habilidades e competências. Trata-se de permitir
que os estudantes estejam preparados para o mundo da vida e suas interações,
mediadas por símbolos linguísticos, e o mundo sistêmico do mercado e da política,
mediadas por símbolos do dinheiro e do poder
Ainda tendo como base a BNCC, esta pontua que é necessário superar o
ensino como um simples processo de acúmulo de informações, posto que se vive em
um mundo cada vez mais complexo, em que são apresentados aos indivíduos
situações mais complexas. Portanto, para a vivência plena numa sociedade complexa
é necessário que os estudantes desenvolvam habilidades, dialoguem, sejam agentes
participativos no seio social. É necessário também que reconheçam o contexto
42

histórico e cultural ao qual estão inseridos, para que sejam produtivos e capazes de
enfrentar as situações que lhes são apresentadas (BRASIL, 2017). Nessa esteira a
BNCC traz como objetivo da Educação Básica:

[...] a Educação Básica deve visar à formação e ao desenvolvimento


humano global, o que implica compreender a complexidade e a não
linearidade desse desenvolvimento, rompendo com visões
reducionistas que privilegiam ou a dimensão intelectual. (BRASIL,
2007)

Para atingir esses esses objetivos, a BNCC enumera competências gerais da


Educação Básica, sendo que algumas delas podem perfeitamente ser alcançadas
com este Projeto Interdisciplinar entre as disciplinas de Literatura e Geografia, em que
o foco é trabalhar a Geografia do Piauí através da utilização de obras literárias
piauienses.
• A primeira competência fala sobre a valorização e utilização de conhecimentos
construídos sobre o mundo físico, cultural e digital para entender e explicar a
realidade. Ligada à essa primeira competência, está a terceira, que trata sobre
a valorização das diversas manifestações artísticas e culturais, das locais às
mundiais.
O Projeto Interdisciplinar contempla essas competências, pois incentiva a
valorização e utilização de obras literárias que são manifestações artísticas de
escritores piauienses, ou seja, manifestações locais, bem como valoriza e incentiva a
utilização de conhecimentos construídos sobre o meio físico e cultural piauiense,
ambos retratados nas obras. As características geográficas encontradas nas obras,
que ajudam a conhecer o espaço piauiense, ajudam também a compreender a
realidade vivida pelos piauienses ao longo dos séculos, desde o período de ocupação
até presente, sua cultura e modos de viver.
• A segunda competência fala no incentivo à exercitação da investigação, da
reflexão, de análise crítica, da imaginação e criatividade, a fim de que os
estudantes sejam capazes de formular e resolver problemas.
Essa competência também seria contemplada, uma vez que o Projeto
Interdisciplinar propõe que os estudantes investiguem e reflitam sobre as obras
literárias, para que alcancem as características geográficas que podem ser
localizadas nas referidas obras. Portanto, também seriam desenvolvidas a imaginação
e a criatividade nesse processo, já que a Literatura é capaz de transportar o leitor para
43

o mundo vivido na trama, vivenciando, de forma imaginativa e criativa, as cenas e


paisagens retratadas. Nessa esteira, Tuan (1983, p. 180) coloca que umas das
funções da arte literária é justamente dar uma visibilidade às experiências íntimas
entre o autor e o lugar vivenciado, e que ela acaba por chamar atenção para lugares
vividos e/ou vivenciados que possivelmente passariam despercebidas de um outro
modo.
A nona competência fala sobre o incentivo ao diálogo, que está na essência deste
projeto interdisciplinar, pelo diálogo profícuo entre a Geografia e a Literatura. O
diálogo entre os envolvidos no processo de ensino-aprendizagem é entendido por
Habermas (2002) como um espaço necessário, em que estudantes e professores
precisam estar “assumindo o papel de falantes e ouvintes, que falam e ouvem através
de processos de entendimento” (HABERMAS, 2002, p.72), partindo do pressuposto
de que os participantes façam uso de atos de fala.

Quadro 3. As competências gerais da educação presentes na BCNN e a seleção de


produções literárias e proposta para atingi-las.
COMPETÊNCIAS GERAIS PRODUÇÕES LITERÁRIAS PROPOSTA
DA EDUCAÇÃO SELECIONADOS

Valorizar e utilizar os Utilizar as produções


conhecimentos literárias de escritores
historicamente construídos Selecionar produções piauienses que retratem
sobre o mundo físico, literárias piauienses que espaços e lugares do Piauí,
social, cultural e digital para retratem que remetam à realidade
entender e explicar a modos de vida da população, dos estudantes,
Realidade; continuar o processo de formação valorizando-os e
aprendendo e colaborar territorial, as dinâmicas contribuindo para a
para a construção de uma sociais e a cultura piauiense. compreensão do mundo
sociedade justa, onde estão inseridos.
democrática e inclusiva.

Exercitar a curiosidade
intelectual e recorrer à
abordagem própria
das ciências, incluindo a Instigar a leitura e análise
investigação, a reflexão, a das produções literárias,
análise crítica, a incentivando a reflexão na
imaginação e a criatividade; Selecionar produções busca de geograficidades
investigar causas, elaborar literárias piauienses que piauienses. Para que,
e testar apresentem conhecimentos posteriormente, essas
hipóteses, formular e geográficos. geograficidades sejam
resolver problemas e criar abordadas de maneira mais
soluções (inclusive ampla.
44

tecnológicas), com base


nos conhecimentos das
diferentes áreas.

Valorizar e fruir as diversas Fazer uso de produções


manifestações artísticas e Selecionar produções literárias daqueles que
culturais, das literárias de autores tiveram contato com a
locais às mundiais, e piauienses ou que abordem cultura, as dinâmicas
também participar de questões geográficas sociais, os espaços e
práticas diversificadas da piauienses. lugares e acabaram por
produção artístico-cultural. transferir isso para suas
obras e versos.

Exercitar a empatia, o
diálogo, a resolução de
conflitos e a cooperação, O objetivo é levar para os
fazendo-se respeitar e estudantes temas do seu
promovendo o respeito ao Selecionar produções cotidiano que possam
outro e aos direitos literárias piauienses que instigar o diálogo, a fim de
humanos; acolher e abordem e valorizem temas que todos possam fazer
valorizar a diversidade de sobre a cultura, questões uso de atos de fala,
indivíduos e sociais e identidades. pautados pelo respeito, a
de grupos sociais, seus fim de que todas as
saberes, identidades, diferenças sejam acolhidas
culturas e potencialidades, sem distinção.
sem preconceitos de
qualquer natureza.

Fonte: Elaborado por Mônica Sebastiana Brito de Sá (2020).


Faz-se necessário ressaltar que é necessária a participação efetiva de todos os
sujeitos, a fim de tornar possível a construção de um conhecimento uno e consistente,
ou seja, professores das disciplinas envolvidas e estudantes devem se empenhar a
fim de que todos os objetivos traçados sejam alcançados. O diálogo deve ir além dos
sujeitos, precisa ser um diálogo entre as áreas do conhecimento envolvidas, para que
seja possível superar as barreiras e fragmentações do conhecimento. Para Japiassu,
as áreas do conhecimento se encontram separadas por fronteiras rígidas, em que
cada disciplina acaba por se converter num pequeno feudo intelectual, onde o diálogo
entre as mesmas não parece ser viável (1976, p. 58), e é preciso, através da
interdisciplinaridade, promover esse diálogo, também entre as disciplinas, e não
apenas entre os sujeitos.
Superadas as competências elencadas na BNCC, passou-se à análise da sessão
da BNCC que trata especificamente do Ensino Médio, tendo em vista que esta
pesquisa se se dirige a esse nível de ensino. O Ensino Médio se preocupa em preparar
45

os estudantes para o mundo do trabalho, oferecendo aos mesmos a capacidade e


competência para adentrar nessa realidade, bem como a aptidão para o cumprimento
do seu papel enquanto cidadão. Portanto, é dever da escola “estar comprometida com
a educação integral dos estudantes e com a construção de seu projeto de vida.”
(BRASIL, 2017, p. 464). A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (1996), em seu art.
35, estabelece as finalidades do Ensino Médio:

I – a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos


no ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos;
II – a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando,
para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com
flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento
posteriores;
III – o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a
formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do
pensamento crítico;
IV – a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos
processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino
de cada disciplina.

Segundo a BNCC (2017, p. 463), é necessário proporcionar experiências e


processos capazes de garantir aos estudantes um processo de aprendizado que seja
capaz de fazer com que os mesmos consigam fazer uma leitura da realidade e que
lhes dê meios necessários para o enfrentamento dos desafios que são postos na
contemporaneidade. Para isso, faz-se necessário formar estudantes críticos,
autônomos, que tenham responsabilidades e sejam criativos. E num projeto
interdisciplinar entre as disciplinas de Literatura e Geografia, como já foi explicitado,
essas habilidades seriam contempladas e no processo de ensino.
Além disso, ainda estaria garantido o protagonismo dos estudantes, como
sugere a própria BNCC, pois seriam os estudantes os maiores responsáveis pela
construção de sua aprendizagem, já que os mesmos estariam imerso num processo
de investigação das produções literárias, a fim de extraírem informações geográficas
nelas retratadas, desenvolvendo assim “suas capacidades de abstração, reflexão,
interpretação, proposição e ação” (BRASIL, 2017, p. 465).
Da análise do texto da BNCC, destaca-se, por fim, a proximidade existente
entre o presente projeto e as finalidades da Base Nacional Curricular Comum. A BNCC
afirma que a escola deve ser um espaço que permita aos estudantes “promover o
diálogo, o entendimento e a solução não violenta de conflitos, possibilitando a
46

manifestação de opiniões e pontos de vista diferentes, divergentes ou opostos”


(BRASIL, 2017, p. 467). Essa visão se assemelha com as ideias da teoria do agir
comunicativo desenvolvida por Jurgen Habermas, pois, para o filósofo, o agir
comunicativo deve ser dirigido para o entendimento, ou seja, os sujeitos envolvidos,
fazendo uso de atos de fala, buscam um entendimento entre eles; a finalidade é a
solução de problemas que lhes são apresentados e resolução de conflitos existentes.
Mas para se falar em agir comunicativo, todos os envolvidos precisam fazer
uso de atos de falas e é preciso haver o respeito de opiniões. De acordo com essa
perspectiva, “os atores participantes tentam definir cooperativamente os seus planos
de ação, levando em conta uns aos outros” (HABERMAS, 2002, p. 72), o que é
considerado um princípio da responsabilidade humana e social. E é o que se procura
atingir com essa proposta de projeto interdisciplinar.

2.2.3. Proposta de Projeto Interdisciplinar

Tendo como base as Leis Ordinárias do Estado do Piauí nº 5.359/2003 e nº


5464/2005, além das normas constantes da Constituição do Estado do Piauí, faz-se
necessária a interdisciplinaridade entre as disciplinas de Literatura Piauiense e
Geografia do Piauí nas escolas de ensino fundamental e médio localizadas dentro dos
limites territoriais do estado. Como demonstrado, a relação entre a Literatura e
Geografia em um projeto interdisciplinar se mostra uma solução eficaz para a
implementação das leis supracitadas, que viria a beneficiar os sujeitos e disciplinas
envolvidos, bem como, de forma geral, o currículo escolar dos estudantes.
Antes, porém, de apresentar a proposta desse projeto interdisciplinar, é válido
proceder à análise das Diretrizes Curriculares da Educação Básica da Rede Estadual
de Ensino do Piauí (2013)4, elaboradas pela Secretaria de Educação do Estado do
Piauí, para melhor compreender como se funda a importância da Geografia do Piauí
na base curricular dos alunos de ensino médio. Essas Diretrizes Curriculares têm por
objetivo estabelecer os padrões básicos do processo de ensino-aprendizagem e
visam a organização do trabalho pedagógico das escolas, a fim de que se alcance um
melhor desempenho por parte do corpo discente. Para a área de conhecimento de

4
Disponível em:
https://www.seduc.pi.gov.br/diretrizes/Curriculares%20da%20Educa%C3%A7%C3%A3o%20Basica%
20SEDUC%20PI/1/. Acesso em 21 de jan de 2020.
47

Ciências Humanas – Geografia, no tocante à Geografia do Piauí, que é o objeto desta


pesquisa, as diretrizes curriculares do ensino médio dispõem o seguinte:

Quadro 4: Diretrizes Curriculares da Educação Básica da Rede Estadual de Ensino


do Piauí no tocante à disciplina de Geografia do Piauí.

Deverão os alunos O que deverá ser ensinado:


ETAPAS DE ENSINO matriculados:

- Compreender a organização - O espaço agrário piauiense


do espaço geográfico os problemas socioambientais
piauiense através da relação resultantes dessa organização;
entre a sociedade e a - Geografia do Piauí e
1ª série do ensino natureza, desvendando as potencialidades turísticas;
médio diversas formas de - O meio natural piauiense em
apropriação do espaço; seus vários componentes:
- Relacionar a estrutura estrutura geológica, relevo,
fundiária piauiense com clima, hidrografia e vegetação,
problemas socioambientais como fonte de patrimônio
dessa organização. ecológico e cultural.
- Entender como se deu o Organização do Espaço
processo de ocupação do piauiense: o meio natural e
espaço piauiense e como se seus vários componentes.
2ª série do ensino encontra organizado, do Estrutura fundiária e a
médio ponto de vista natural, o organização do espaço agrário
território estadual. piauiense;

- Compreender a dinâmica - Organização do espaço


espacial piauiense, do ponto piauiense. Atividades de
de vista de atividades de produção e consumo
produção e consumo, geradoras das transformações
modernização; do espaço piauiense. A
- Reconhecer a importância estrutura de produção
das influências quilombolas piauiense e sua relação com o
na reprodução de culturas e “desenvolvimento” do Estado.
formação territorial. A modernização tecnológica e
3ª série do ensino o processo de urbanização
médio piauiense.
- Comunidades quilombolas do
Piauí. A educação das
relações Étnico-Raciais e o
espaço da Cultura indígena e
Afro-Brasileira. História e
Cultura Africana. A cultura
Afro-brasileira e a formação
social piauiense. História de
lutas e resistência.
Fonte: SEDUC –PI 5

5
Disponível em https://www.seduc.pi.gov.br/arquivos/diretrizes/4-
Matrizes_Disciplinares_do_Ensino_Medio.pdf. Acesso em 15 de maio de 2019.
48

Além da existência de uma lei que torna obrigatório o ensino de Geografia do


Piauí, ainda há esta previsão nas Diretrizes Curriculares da Educação Básica da Rede
Estadual de Ensino do Piauí, dentre os conteúdos que devem ser trabalhados nos
anos de ensino médio.
Essa indicação comum parte do princípio de que conhecer o lugar onde se vive,
entendendo os processos de formação do mesmo, sua cultura, paisagens, dinâmicas
espaciais e sociais, etc., é de suma importância para desenvolvimento de um
sentimento de pertencimento, pois é através da proximidade com o espaço em que se
vive que nasce a identidade. Em consonância com esse pensamento, assim afirma
Andrade (2008):

[...] a identidade representa parte fundamental da experiência das


pessoas com o lugar, sendo que sua construção acontece em
consonância com o surgimento de formas de pertencimentos, e se
desdobra nas práticas culturais, religiosas e socioeconômicas. Estas
servem como meios para se consolidarem os sentidos atribuídos aos
modos de vida (ANDRADE, 2008, p. 175).

Esse sentimento de pertencimento é importante, tendo em vista que, segundo


Oliveira (2017), quando o sujeito o expressa, acaba por apresentar preocupação com
as relações que ali são desenvolvidas, e, assim, compreende que se trata de um
cenário mutável, onde há a possibilidade de intervenção. Isto é, o sujeito abandona o
estado de consciência de que é apenas mais um personagem efêmero no espaço ao
qual está inserido e passa a entender que tem o poder de protagonizar mudanças
naquele espaço. O pouco conhecimento que a população piauiense tem sobre a sua
história, geografia, cultura artística, fez com que a sociedade atual se formasse sem
valorizá-las, sem construir um sentimento de pertencimento com a sua terra natal.
O ensino da Geografia do Piauí também pode contribuir para desenvolver esse
sentimento de pertencimento, já que através dessa disciplina, por meio da literatura
piauiense, é possível conhecer o processo de formação do território piauiense, suas
paisagens, modos de vida, culturas, dinâmicas sociais, dentre outros aspectos
geográficos estaduais. Tamanha é a importância das referidas disciplinas, que há leis
específicas tornando-as obrigatórias nas escolas de ensino fundamental e médio,
públicas e privadas, do Estado do Piauí. Nessa perspectiva, Bonfim (2003) traz:

A cultura é um elemento decisivo no que concerne à possibilidade de


criar mecanismos de identificação de alguns aspectos cruciais, que
49

nos ajudam a reconhecer os limites e as possibilidades de inserção de


uma sociedade em meio àquilo que se convenciona hoje chamar,
mundo globalizado. (BONFIM, 2003, p. 452, grifo nosso)

Com relação à lei que torna obrigatório o ensino de Geografia do Piauí, a


mesma é fruto da atuação do Poder Legislativo do Estado, de deputados estaduais
eleitos pelo povo para representar seus anseios. No entanto, quando do cumprimento
da lei, dever do Poder Executivo do Estado, este não disponibiliza os meios
necessários para que haja a implementação da normativa nas escolas que são
geridas pelo governo estadual. Como é possível verificar no compulsar dos
documentos (Anexo 1), não são disponibilizados livros didáticos de Geografia do
Piauí na 16ª Gerência Regional de Ensino do Piauí. Subtende-se que essa realidade
se reflete nas demais Gerências Regionais de Ensino, tendo em vista que todas são
mantidas pelo Estado do Piauí, através de sua Secretaria de Estado da Educação
(SEDUC-PI).
Percebe-se, portanto, que os professores do ensino médio da rede estadual de
ensino não devem ser responsabilizados por não ministrarem conteúdos de Geografia
do Piauí nas salas de aula, pois se deparam com a inexistência de material didático,
não possuindo meios e recursos necessários para sua implementação, o que faz com
que a disciplina de Geografia do Piauí acabe sendo prejudicada. Trata-se de uma
omissão por parte do Poder Executivo. No entanto, na busca por maior autonomia no
processo de ensino-aprendizagem, os professores precisam “criar, estruturar e
dinamizar situações de aprendizagem e estimular a aprendizagem e autoconfiança
nas capacidades individuais para aprender, são competências que o professor de hoje
tem de desenvolver” (ALARCÃO, 2013, p.32). E é visando essa dinamização no
processo de ensino-aprendizagem, com a criação de formas que potencializem o
ensino de Geografia do Piauí, que se enxergou a literatura piauiense como um meio
de representação do real, mostrando-se como uma fonte relevante para
demonstração das características geográficas do Estado do Piauí.
A proposta de projeto interdisciplinar que ora se apresenta tem como objetivo
principal a possibilidade de se trabalhar a Geografia do Piauí através de produções
literárias piauienses, num diálogo entre as disciplinas escolares de Literatura e
Geografia, objetivando a construção de um pensamento reflexivo e emancipatório no
corpo discente. Seguindo a perspectiva de outros estados da federação, “o Piauí
investe pouquíssimos recursos e na produção de conhecimento histórico, artístico e
50

cultural e, como raros pesquisadores de outros Estados se interessam em estudar o


Piauí, são os piauienses que devem se interessam em estuda-lo” (DIAS, 2003).
Portanto, essa proposta é uma oportunidade de produção de conhecimento geográfico
piauiense, por parte de professores e estudantes piauienses, através da arte literária,
com a finalidade de suprir as lacunas existentes.
O agir comunicativo tem o papel, num projeto desse tipo, de dar condições
necessárias de diálogos em que todos atos de fala sejam válidos, em que se
desenvolva o poder comunicativo e crítico dos estudantes. Nas palavras de
Casagrande (2009):

Ao resgatarmos o potencial reflexivo e emancipatório da ação


comunicativa para a práxis pedagógica estaremos assegurando
processos amplos de formação e de reconstrução da identidade do
eu, de assimilação e de renovação dos saberes culturais e de
interação e de coordenação de ações sociais (CASAGRANDE, 2009,
p. 154).

A falta de material didático, já mencionada, sobrecarrega a escola e o corpo


docente, especialmente professores da disciplina de Geografia, que acabam tendo
que suprir as lacunas deixadas pelo Estado quanto à reprodução do saber válido
regional, expresso nos conhecimentos geográficos essenciais para a vida cotidiana
dos alunos, que moram e vivem nas diversas regiões do Piauí. Salienta-se que
“estruturas simbólicas do mundo da vida se reproduzem por meio da continuação do
saber válido das tradições, da estabilização da solidariedade dos grupos e da
formação de atores capazes de responder por suas ações” (Habermas, 1988, p. 196).
De acordo com Silva (1996), o livro didático tem uma tradição muito forte no
contexto escolar, e o acolhimento do mesmo, muitas vezes, independe da decisão
dos docentes, fazendo com que se entenda que professores e livros didáticos são
figuras indissociáveis. É muito recorrente, nesse sentido, a imagem que comumente
se reproduz do professor, trazendo um livro didático nas mãos. Mas, como já foi
exaustivamente salientado, há uma deficiência quanto à disponibilidade de livros
didáticos de Geografia do Piauí nas escolas de ensino médio geridas pela rede
estadual de ensino.
É diante dessa realidade e postulando um ensino para além dos métodos
didáticos tradicionais (que inclui o uso do livro didático como manual, além de aulas
monológicas, meramente transmissoras de informação, centralizadas na figura do
51

professor), é que se propõe utilizar a literatura piauiense como aliada no ensino da


Geografia do Piauí, através de um projeto interdisciplinar que venha a ser construído
pelos sujeitos que estarão envolvidos no processo de ensino.
Partindo do princípio de que um projeto interdisciplinar não pode ser imposto
aos professores, a proposta aqui apresentada constitui-se, primeiramente, do
estabelecimento de diálogos entre os professores das disciplinas escolares de
Literatura e Geografia, pois são eles quem têm contato direto com o alunado, sendo
conhecedores das realidades vivenciadas pela escola e comunidade; são eles,
portanto, que têm que elencar os objetivos pretendidos, com base nos conteúdos
geográficos que pretendem trabalhar e selecionar quais as produções literárias que
podem fornecer informações acerca dos temas escolhidos.
Selecionados os conteúdos geográficos a serem trabalhados e as produções
literárias que auxiliarão, propõe-se a realização de grupos de leitura, onde professores
e estudantes discutam quais as narrativas encontradas nas obras literárias que podem
melhor instigar a participação de todos os sujeitos envolvidos.
A partir daí, professores poderiam agir de maneira individualizada. O professor
de Geografia, de posse dos conteúdos geográficos encontrados na produção literária
poderia trabalhá-los, de maneira mais aprofundada em sala de aula. E o professor de
Literatura trabalharia mais incisivamente as obras, podendo situá-las dentre as
escolas literárias, ministrando conteúdos referentes à literatura mundial, nacional e
estadual, quais autores se destacaram e quais produções piauienses estão inscritas
naqueles determinados contextos literários... O discurso literário não é o retrato fiel da
realidade, mas tem muito da realidade nos discursos literários, servindo-se de fatos
históricos e de acontecimentos do cotidiano, bem como do imaginário coletivo, as
produções literárias acabam por preencher as lacunas que são deixadas pelo
esquecimento e silêncio da memória coletiva. (SILVA, 2003)
A partir da leitura e aprofundamento das produções literárias, seria
interessante, também, atividades descritivas acerca das paisagens retratadas, em que
o estudante demonstraria qual a percepção que teve do que foi representado. As
possibilidades de conteúdo e de estratégias pedagógicas são inúmeras.
Metodologicamente, os professores podem ainda fazer uso de recursos audiovisuais
e programas de computador como o Google Earth, que auxiliaria quando estudadas
as geograficidades dos lugares retratados.
52

2.3 Revisão de Literatura: Geografia e Literatura

Tendo por finalidade saber como estão sendo produzidas as pesquisas que
visam aliar as disciplinas de Literatura e Geografia através da Interdisciplinaridade,
entre novembro e dezembro de 2019 procedeu-se à análise das produções de
programas de pós-graduação nas áreas de Educação e Geografia do Estado do Piauí
e na área de Ensino da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, campus de
Pau dos Ferros Utilizou-se como descritores: Literatura e Interdisciplinaridade;
Geografia e Literatura; Geografia e Interdisciplinaridade; Interdisciplinaridade. A partir
desses descritores, selecionou-se as pesquisas já realizadas nos programas de pós-
graduação escolhidos que versassem sobre os temas em questão. Foi possível então
destacar aquelas que apresentavam alguma proximidade, ainda que se
diferenciassem em algum ponto.
A análise dos dois primeiros bancos de dissertação, ambos de programas de
pós-graduação ofertados pela Universidade Federal do Piauí - UFPI, mostrou-se
necessária e relevante pelo fato da pesquisadora responsável por esta dissertação
ser natural do Estado do Piauí, e também pelo recorte geográfico da pesquisa
englobar um conjunto de municípios pertencentes a este estado, trabalhando com a
literatura piauiense e a Geografia do Piauí,
O curso de Licenciatura em Geografia, em sede de universidades públicas
piauienses, é ofertado tanto pela Universidade Federal do Piauí – UFPI, como também
pela Universidade Estadual do Piauí – UESPI. Mas, nesta última instituição superior
de ensino, não há programas de mestrado e/ou doutorado em Geografia, por esse
motivo é que não houve análise de dissertações oriundas da mesma. Já na área do
Direito/Ciências Jurídicas, no Estado do Piauí, a primeira turma de mestrado teve
início no ano de 2018, na Universidade Federal do Piauí, não tendo ainda sido
defendida nenhuma dissertação, portanto, não há dissertações, discutindo a Lei
Ordinária do Estado do Piauí nº 5.359 de 11/12/2003, que é objeto desta pesquisa.
O último banco de dissertações analisado, e não menos importante, é o do
Programa de Pós-Graduação em Ensino da Universidade do Estado do Rio Grande
do Norte - UERN, do Campus Avançado de Pau dos Ferros. Sua análise é
fundamental, pelo fato da presente dissertação ser vinculada a este Programa. É,
portanto, relevante analisar se em algum momento a temática aqui trabalhada já fora
abordada nesse Programa.
53

2.3.1 Banco de dissertações do Programa de Pós-Graduação em Educação da


Universidade Federal do Piauí – UFPI6

Durante o período que compreende o ano de 1997 até o ano de 2019, no


Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGED) da Universidade Federal do
Piauí – UFPI, foram defendidas 387 dissertações sobre os mais diversos temas. Estas
se encontram disponíveis no site da própria universidade, e foram analisados os seus
resumos, a fim de que fosse possível identificar se o tema trabalhado nesta pesquisa
já foi abordado em pesquisas anteriores, e, se foi, demonstrar quais os pontos de
conexão entre as mesmas e em que pontos elas se distinguem.
Não foi encontrada nenhuma pesquisa que tenha trabalhado o tema proposto
nesta pesquisa. Uma única dissertação, apresentada ainda no ano de 2001, tinha um
pequeno elo de conexão, mas a partir de uma análise mais aprofundada foi possível
perceber que em nada se assemelhavam.
A dissertação intitulada “O livro didático, a poesia e o leitor: um estudo das
atividades propostas para alunos de 3ª série do Ensino Fundamental”, de autoria de
Maria da Glória Duarte Ferro Silva, teve como “objetivo verificar se, no livro didático,
o estudo do texto poético privilegia a formação do leitor crítico e criativo”, buscando
discutir “o tipo de poesia que aparece no livro didático, a qualidade estética dos textos,
(...) a proposta didática que orienta a leitura dos textos poéticos e a sua contribuição
no processo de formação do leitor”. Embora trabalhe a sobre a poesia e o leitor, a
dissertação que vem sendo construída se diferencia desta acima citada, que busca
analisar as poesias encontradas nos livros didáticos, enquanto a pesquisa em questão
propõe a utilização da Literatura no ensino de Geografia, através de projeto
interdisciplinar.

2.3.2 Banco de dissertações/teses do Programa de Pós-Graduação em


Geografia da Universidade Federal do Piauí - UFPI7

6
Disponível no link https://www.ufpi.br/dissertacoes-ppged, acesso em 15 de dezembro de 2019
7
Disponível no link https://sigaa.ufpi.br/sigaa/public/programa/defesas.jsf?lc=pt_BR&id=372, acesso
em 15 de novembro de 2019.
54

Todas as dissertações/teses apresentadas no Programa de Pós-Graduação


em Geografia da Universidade Federal do Piauí foram analisadas (entre os anos de
2013 até os dias atuais), sendo que neste período foram defendidas um total de 86
(oitenta e seis) dissertações. A priori, foram analisados os seus títulos, pois se a
temática fosse totalmente alheia à temática aqui abordada, de pronto eram abortadas
análises mais profundas. Se o título apresentasse alguma semelhança, passava-se a
analisar os resumos e, caso fosse uma temática semelhante à temática aqui
abordada, passava-se a analisar o conteúdo da dissertação, focando nos objetivos e
metodologia, para que fosse feito um parâmetro. A seguir, de forma detalhada,
separada pelas datas de defesa, a análise feita:
No ano de 2013 foram defendidas 10 dissertações no referido programa, mas
apenas uma delas apresentou uma temática semelhante à pesquisa que vem sendo
desenvolvida. A dissertação intitulada “Geografia e poesia: Diálogo possível no ensino
de Geografia Escolar” foi defendida no respectivo ano por Maria Francisca Silva de
Oliveira. Esta pesquisa muito se assemelha com a proposta aqui apresentada, pois
também defende o “uso da poesia como um recurso didático não convencional
aplicado à Geografia escolar no ensino Médio, abordando o diálogo interdisciplinar da
ciência geográfica com a literatura”, mas sua análise restringe-se, especificamente,
ao gênero literário poesia, enquanto que a pesquisa aqui desenvolvida não faz esse
tipo de restrição. Além disso, prevê a perspectiva interdisciplinar, mas sem ser
especificamente para o trabalho com a Geografia do Piauí e a literatura piauiense.
No ano de 2014 também foram defendidas dez dissertações, mas nenhuma
delas apresentou uma temática que tivesse pontos de conexão com a temática aqui
trabalhada.
No ano de 2015 foram defendidas dez dissertações, mas apenas uma chamou
a atenção, “A Representação Social da Cidade de Teresina-PI”, de autoria de Marsone
Araújo Cunha, por fazer também uso de obra do autor Yi-Fu Tuan como parte do seu
referencial. Mas, ao se debruçar sobre o texto foi possível perceber que não há pontos
de ligação entre o estudo aqui realizado e a dissertação em questão. Esta última se
preocupa com o perfil da evolução urbana da cidade de Teresina, capital do Estado
do Piauí, elencando as concepções sobre a sua construção. Desse modo, não tem
pontos de ligação com a representação do espaço geográfico em produções literárias,
não existindo pontos de ligação entre as pesquisas.
55

Em 2016 foram defendidas doze dissertações, mas, através de análise das


mesmas, foi possível concluir que nenhuma teve uma temática ligada à temática aqui
desenvolvida.
No ano de 2017 foram defendidas quatorze dissertações. Destaca-se, entre as
produções deste ano, a dissertação intitulada “O Lugar Geográfico Em Beira Rio Beira
Vida De Assis Brasil”, de autoria de Tiago Caminha de Lima. A referida dissertação
propõe um diálogo entre as diversas áreas do conhecimento como condição
necessária para a compreensão do dinamismo do mundo em que se está inserido,
assemelhando-se ao estudo realizado nesta pesquisa. Diferencia-se pela sua
delimitação: analisar o sentido do lugar geográfico, expresso no cotidiano dos
personagens da obra literária “Beira Rio Beira Vida”, a partir da compreensão da
articulação entre o narrador, os personagens, o cais e o enredo da obra. Enquanto a
pesquisa aqui desenvolvida analisou diversas produções literárias piauienses,
investigando quais poderiam vir a ser utilizadas no ensino de Geografia do Piauí, e
quais os conteúdos que podem vir a ser trabalhados a partir delas, sendo, portanto,
mais ampla.
Em 2018 foram defendidas treze dissertações e no ano de 2019 dezessete, no
referido Programa, mas através de análise cuidadosa foi possível constatar que
nenhuma apresentou similaridade temática com a dissertação que vem sendo
construída como fruto desta pesquisa.

2.3.3 Banco de dissertações do Programa de Pós-Graduação em Ensino da


Universidade do Estado do Rio Grande do Norte - UERN8

O Programa de Pós-Graduação em Ensino (PPGE), segundo dados coletados


no site do Programa, foi criado no ano de 2013, e oferece o Curso de Mestrado
Acadêmico em Ensino, dividindo-se em três linhas de pesquisa, quais sejam: Ensino
de Ciências Exatas e Sociais, Ensino de Ciências Humanas e Sociais e Ensino de
Línguas. O programa está vinculado ao Departamento de Educação do Campus

8
Disponível nos links http://propeg.uern.br/ppge/default.asp?item=ppge-disserta%E7%F5es-2016,
http://propeg.uern.br/ppge/default.asp?item=ppge-disserta%E7%F5es-2017,
http://propeg.uern.br/ppge/default.asp?item=ppge-dissertacoes-2018 e
http://propeg.uern.br/ppge/default.asp?item=ppge-dissertacoes-2019, acesso em dezembro de 2019.
56

Avançado de Pau dos Ferros, da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte


(UERN), localizado na cidade de Pau dos Ferros, no alto-oeste potiguar.
A pesquisadora responsável por esta dissertação é vinculada ao referido
Programa, e por essa razão se mostrou importante fazer uma análise das dissertações
ali já defendidas, a fim de apurar se alguma delas se propôs a trabalhar com a
proposta de um projeto interdisciplinar, em que as disciplinas escolares de Geografia
e Literatura trabalhassem conjuntamente, a fim de superar as barreiras do
conhecimento.
Ao todo, desde o início do programa até os dias atuais, já foram defendidas 105
(cento e cinco) dissertações. No entanto, após extensa análise, constatou-se que
nenhuma delas trabalhou a temática à qual essa dissertação se dedicou, portanto,
trata-se de uma pesquisa inovadora para o programa.
Apenas duas dissertações chamaram a atenção, ambas defendidas no ano de
2018, assim intituladas: “A leitura do texto literário no ensino de espanhol como língua
estrangeira: um estudo sobre a formação leitora a partir dos contos de Gabriel García
Márquez” e “O leitor e a leitura literária: entre preferências, experiências e
percepções”. Elas têm, como autoras, respectivamente, Kelvilane Queiroz dos Santos
Celis e Maria Ismelry Diniz.
A primeira pesquisa supracitada, embora trabalhe com textos literários, aborda
a questão da contribuição da leitura desses textos para o desenvolvimento da
habilidade de compreensão dos estudantes, distinguindo-se totalmente, portanto, dos
objetivos desta pesquisa. A outra, embora trabalhe com a Literatura e a percepção,
tem como foco a formação do leitor literário no ensino de nível médio, analisando os
seus gostos literários e como estes influenciam no seu processo formativo,
distanciando-se também dos objetivos do presente estudo. Conclui-se, de fato, que o
tema trabalhado nessa dissertação é realmente inovador entre todos aqueles que já
foram abordados nas dissertações do Programa de Pós-Graduação em Ensino da
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, Campus Avançado de Pau dos
Ferros.

Quadro 5. Pontos das obras que se distanciam da dissertação e que apresentam


alguma proximidade.
57

ANO PROGRAMA TÍTULO PROXIMIDADES DISTANCIAMENTO


DE PÓS-
GRADUAÇÃO

Prioriza o gênero
poético da poesia,
enquanto que essa
Geografia e Defende o uso da pesquisa não se
poesia: diálogo poesia como restringe à poesia.
Programa de possível no recurso no ensino Além disso, não
Pós- ensino de de Geografia foca no ensino de
2013 Graduação em Geografia do Piauí,
Geografia Escolar através da
Geografia da Interdisciplinaridade como nesta
UFPI pesquisa.

Preocupa-se com o
perfil da evolução
urbana da cidade
de Teresina, capital
do Estado do Piauí,
elencando as
concepções sobre a
2015 construção do
lugar. Não tendo,
Programa de Apresenta algumas
portanto, pontos de
Pós- proximidades com
A Representação ligação com a
Graduação em o referencial teórico
Social da Cidade representação do
Geografia da dessa pesquisa
de Teresina-PI lugar em produções
UFPI
literárias.

Embora proponha a
interdisciplinaridade
Propõe a no ensino de
interdisciplinaridade Geografia, fazendo
no ensino de uso de uma obra da
Geografia, Literatura
analisando o Piauiense,
sentido do lugar restringe-se a
geográfico, apenas uma das
Programa de O Lugar expresso no produções literárias
Pós- Geográfico Em cotidiano, na obra
2017 aqui analisadas,
Graduação em Beira Rio Beira literária Beira Rio diferenciando-se,
Geografia da Vida De Assis Beira Vida, de em termos de
UFPI Brasil Francisco de Assis amplitude, da
Almeida Brasil. presente pesquisa.

Fonte: Elaborado por Mônica Sebastiana Brito de Sá (2020).


58

CAPÍTULO 3. A TERRA FILHA DO SOL DO EQUADOR, PELA LITERATURA


FRUTO DOS TEUS FILHOS
As análises das principais produções literárias daqueles que são considerados
os dez maiores nomes da literatura piauiense consistem em verificar quais delas
podem vir a ser utilizadas no ensino de Geografia do Piauí, demonstrando
detalhadamente como os conteúdos geográficos podem ser trabalhados a partir e
cada produção.
A literatura telúrica, marcada pela ligação entre o autor e a sua terra, é
caracterizada por apresentar várias geograficidades, e essa denominada geoliteratura
piauiense apresenta-se como um recurso metodológico diferenciado para a
apreensão do espaço no ensino de Geografia do Piauí. Da análise das produções
literárias, foi possível verificar a descrição de paisagens, aspectos culturais,
características sobre o processo de formação social e territorial piauiense, dentre
outros aspectos.
Através de um trabalho articulado entre as disciplinas de Geografia e Literatura,
em que professores e estudantes trabalhem em conjunto num projeto interdisciplinar,
há possibilidades de construção de um conhecimento uno e sólido. Os estudantes
piauienses terão a oportunidade de estudar a Geografia do seu estado, fortalecendo
a construção de uma identidade e seu sentimento de pertencimento, além de
conhecerem e fortalecerem a literatura piauiense. Para isso, buscar-se-á elaborar uma
periodização de uma geografia literária do Piauí, tentando entender a abordagem
literária do ponto de vista geográfico, em cada período e obra estudados.
No capítulo introdutório foram listados os dez maiores autores da Literatura
Piauiense, segundo entendimento de estudioso da área. Tendo essa lista como ponto
de partida, foi selecionada a produção literária de maior relevância de cada autor, o
que resultou na seguinte listagem:
Ataliba o Vaqueiro – Francisco Gil Castelo Branco
Hino do Estado do Piauí – Da Costa e Silva
Chico Vaqueiro do Meu Piauí – Alvina Gameiro
Noite Grande – Permínio Asfora
O Tempo Consequente – Hindemburgo Dobal Teixeira
Rio Subterrâneo – Orlando Geraldo Rêgo de Carvalho
O Homem e Sua Hora – Mário Faustino
Beira Rio Beira Vida – Assis Brasil
59

Palha de Arroz – Fontes Ibiapina


A ordem das obras está disposta de acordo com o ano de produção das
mesmas, sendo “Ataliba, o vaqueiro” a mais antiga, dentre as produções literárias
analisadas, e “Palha de Arroz” a produção mais recente. Dos autores selecionados a
princípio, o único que não teve nenhuma obra analisada foi Torquato Pereira Araújo
Neto. O motivo foi pelo fato de ter falecido muito jovem, aos 28 anos, não publicando
nenhum livro em vida. Torquato Neto integrou o movimento tropicalista da Música
Popular Brasileira, movimento este de cunho artístico, político e cultural, e se dedicava
à composição de poemas e letras de músicas, acabando por ganhar destaque no
cenário nacional com suas composições.
“O Homem e Sua Hora”, por sua vez, do escritor Mário Faustino, foi uma obra
selecionada e analisada, mas o texto não se mostrou relevante do ponto de vista da
Geografia do Piauí, por esta razão não figura entre os tópicos de análise. Antes,
porém, desses tópicos, no Quadro 6, a seguir, é apresentada a data das obras
analisadas, o contexto histórico piauiense, a escola literária a que pertencem e as
abordagens geográficas que foram delas extraídas.

Quadro 6: contexto histórico e escolas literárias das produções literárias analisadas,


com o ano em que foram publicadas, e suas abordagens geográficas.
Escola Literária Contexto histórico piauiense

- Fundação de Jornais;
Romantismo - Inauguração do Teatro 4 de Setembro na cidade de
Teresina;
- Período de estiagem: Seca de 1877;
Produção Lit. Autor Ano Abordagens Geográficas
- A figura do vaqueiro e sua
importância no povoamento do
Ataliba, o Francisco Gil 1878 sertão;
Vaqueiro Castelo Branco
- O processo de formação territorial
piauiense;
- O drama da seca e suas
implicações.
Escola Literária Contexto histórico piauiense

- Ponto alto da importância econômica do Rio


Parnaíba no escoamento da produção;
60

Fase Acadêmica - Fundação da Academia Piauiense de Letras;


- Construção da Ponte Metálica que liga as cidades
de Teresina no Piauí e Timon no Maranhão,
separadas pelo Rio Parnaíba.
Produção Lit. Autor Ano Abordagens Geográficas
- Paisagens ao longo do curso do
Rio Parnaíba;
- Localização geográfica e sua
proximidade com a Linha do
Hino do Piauí Da Costa e 1923 Equador;
Silva - O papel dos Bandeirantes na
penetração pelo sertão piauiense;
- Batalha do Jenipapo pelo processo
de independência do Brasil;
Escola Literária Contexto histórico piauiense

- Incêndios criminosos de casas de palha em


Teresina;
- 100 anos da capital Teresina;
Modernismo
- Fundação da Universidade Federal do Piauí;
- Expansão de livrarias;
- Importância econômica da cera de carnaúba.
- Salão do Livro do Piauí – SALIPI.
Produção Lit. Autor Ano Abordagens Geográficas

- A importância do vaqueiro no
processo de povoamento e
formação territorial piauiense;
Chico Vaqueiro Alvina Gameiro 1971 - A pecuária piauiense enquanto
do Meu Piauí atividade econômica;
- A flora do sertão piauiense;
- A culinária e cultura do Piauí.
Produção Lit. Autor Ano Abordagens Geográficas

- A cera dos carnaubais piauienses


e sua importância econômica para o
Noite Grande Permínio 1947 estado do Piauí no início do século
Asfora XX.
Escola Literária Contexto histórico piauiense

- Declínio da exportação de cera de carnaúba;


Geração Meridiano
61

- Circulação da Revista Cadernos de Letras


Meridiano.
Produção Lit. Autor Ano Abordagens Geográficas

- Região do Meio-Norte do estado


do Piauí;
- Os carnaubais;
- O Rio Parnaíba;
O Tempo H. Dobal 1966
Consequente - Referência à importância do
município na produção e
comercialização de ovinos e
caprinos;
- A seca;
- Pecuária extensiva piauiense.
Produção Lit. Autor Ano Abordagens Geográficas
- A vida dos teresinenses às
margens do Rio Parnaíba.
Rio Subterrâneo O. G. Rêgo de 1967
Carvalho - A cidade de Oeiras, primeiro
centro urbano e capital do Piauí;
- A cera de carnaúba.
Escola Literária Contexto histórico piauiense

- Movimento tropicalista;
Vanguardismo - Urbanização das cidades de Teresina e Parnaíba,
os dois maiores centros urbanos do estado.
Produção Lit. Autor Ano Abordagens Geográficas
- Questões sociais na cidade de
Parnaíba;
Beira Rio Beira Assis Brasil 1965
Vida - Dramas vivenciados pela camada
social que vivia às margens da
socie
Produção Lit. Autor Ano Abordagens Geográficas
- O processo de urbanização e
modernização da cidade de
Teresina;
Palha de Arroz Fontes Ibiapina 1968 - Incêndios criminosos ocorridos na
cidade de Teresina durante a
década de 40;
- A tradicional sociedade
teresinense do século XX.
Fonte: Elaborado por Mônica Sebastiana Brito de Sá (2020).
62

3.1 O Vaqueiro do Piauí: o canto de glória do passado da geração que


transportou o gado do litoral pro semiárido

No processo de povoamento do sertão nordestino e, em especial, na formação


territorial do que é hoje o Estado do Piauí, a figura do Vaqueiro foi uma figura de
grande importância. Isso se deu em razão do crescimento da produção açucareira na
região da Zona da Mata Nordestina, responsável pelo surgimento do sistema
econômico pecuário e sua expansão rumo ao sertão nordestino. Assim, no Nordeste
brasileiro, no período colonial, consolidaram-se dois sistemas econômicos, o
açucareiro e o pecuário.
Inicialmente, a cultura açucareira e a pecuária dividiam lugar na Zona da Mata;
no entanto, com a expansão da cultura açucareira e sua crescente importância
econômica, a pecuária, que era uma atividade auxiliar da produção açucareira, teve
que buscar ocupar outros espaços para o seu desenvolvimento.
A pecuária era uma atividade auxiliar dos engenhos porque os rebanhos eram
utilizados como meios de transporte, tração, além de abastecerem os engenhos com
sua carne. Portanto, a pecuária se mostrava necessária, mas como o próprio gado se
transportava, não havia problemas se sua criação se desse longe da Zona da Mata, e
diante da grande disponibilidade de pastos no interior nordestino, a pecuária foi
adentrando o Sertão.
No final do século XVII, os rebanhos de gados, liderados por vaqueiros,
acabaram por ultrapassar o curso do Rio São Francisco, no Estado da Bahia, “dali, o
povoamento segue em direção às chapadas do Araripe e Mangabeiras, (...) onde são
instalados os primeiros currais, (...) é nessa área que vai constituir-se o território
piauiense” (ALVES, 2003, p. 57). A Chapada do Araripe (localizada no então estado
do Ceará, próximo à divisa com o Piauí), e a Chapada das Mangabeiras, foram locais
por onde seguiu a rota do gado depois de superado o curso do Velho Chico, sendo
instalados os primeiros currais de gado nessas regiões, naquelas que viriam constituir
o território piauiense.
Os senhores detentores dos rebanhos, que tinham suas residências fixadas
principalmente nas capitais de Recife e Salvador, por serem os grandes centros de
seus negócios, não acompanharam a progressão dos seus rebanhos rumo ao interior
63

da região do Nordeste, deste modo, vaqueiros ficavam responsáveis por cuidar dos
currais instalados e administrar as fazendas. É o que pontua Alves:

A ausência de proprietários de terras no povoamento piauiense pode


ser explicada pelas precárias condições de vida que apresentavam
aqueles sertões, onde faltava de tudo. O isolamento era o que
predominava, tendo em vista que as comunicações com centros
urbanos do litoral eram quase inexistentes. (ALVES, 2003, p. 61)

O Sertão nordestino, até então era uma área isolada, com precárias condições
de vida e onde a comunicação com outras regiões era praticamente inexistente, pela
distância dos centros urbanos. Por essas razões, diante da ausência dos proprietários
dos rebanhos nos locais onde estão instalados os currais de gado, ficava a cargo de
vaqueiros o trabalho de levar os rebanhos para o sertão. Lá fundavam os currais de
gado, administravam as fazendas e também faziam o translado interior-litoral do gado.
Foi a partir desses primeiros currais de fazendas instalados que se iniciou a
ocupação e povoamento do que hoje é o território piauiense. Como se vê, a figura do
vaqueiro teve grande importância no processo de povoamento e da formação
territorial do Estado do Piauí, bem como de todo o Nordeste brasileiro. Vale ressaltar
que essa profissão tem destaque no estado até os dias atuais, já que o Piauí é uma
das mais pobres unidades da federação, em que a pecuária extensiva ainda
predomina.
Por ser uma figura muito presente na história do estado, o vaqueiro acaba por
ser retratado em produções literárias piauienses, sendo possível a utilização dessas
produções no ensino de Geografia do Piauí, com a finalidade de trabalhar como se
deu o processo de formação territorial do estado. Dentre as obras analisadas nesta
pesquisa, duas se destacam por abordarem a figura do vaqueiro e os seus modos de
vida, são elas: “Ataliba, o Vaqueiro” do escritor Francisco Gil Castelo Branco, e “Chico
Vaqueiro do Meu Piauí” da escritora Alvina Gameiro.
O escritor Francisco Gil Castelo Branco, autor da primeira obra citada, nasceu
no ano de 1848, formou-se em Letras na França, era jornalista e escritor, pertencendo
à escola literária do Romantismo. A sua obra “Ataliba, o Vaqueiro” foi lançada em
1878, e é considerado o primeiro romance da seca, pelo fato de tratar dos dramas
vivenciados em decorrência da seca no nordeste brasileiro. O romance conta a
história do vaqueiro Ataliba, personagem principal, que é responsável pela fazenda
Morro, localizada na fronteira entre os estados do Piauí e Ceará. Como traz Alves:
64

“poucos eram os donos de terras que participavam efetivamente do


povoamento do território piauiense (...) as ditas fazendas foram
arrendadas ou administradas por vaqueiros. O absenteísmo dos
proprietários das fazendas constituiu-se em uma prática comum no
povoamento do Piauí.” (2003, p. 61)

Ataliba era um exemplo dos vaqueiros responsáveis pelo povoamento do


sertão nordestino, sendo o cuidador do rebanho de gado e administrador da fazenda
diante da ausência do fazendeiro. No comando da fazenda Morro, o vaqueiro Ataliba
tinha um ajudante, um escravo de idade já avançada que veio da África ainda muito
jovem. Esse personagem acaba por ser relevante, já que revela que, no processo de
povoamento do Estado do Piauí, com a expansão da pecuária no sertão nordestino,
também se fez uso da mão-de-obra escrava africana. O mais recorrente era o uso da
mão de obra nativa, ou seja, dos índios que ali viviam. No entanto, em algumas
regiões, estes se mostravam resistentes, como pontua Furtado:

O recrutamento de mão-de-obra para essas atividades baseou-se no


elemento indígena que se adaptava facilmente à mesma. Não
obstante a resistência que apresentaram os indígenas em algumas
partes, ao verem-se espoliados de suas terras. (2005, p. 66)

“Ataliba, o Vaqueiro” traz em seu enredo o retrato dessa peculiaridade


piauiense, no seu processo de formação territorial. Demonstrando a utilização de mão
de obra escrava africana na região, algo nem sempre recorrente na historiografia do
período.
Também merece destaque, nessa análise, o caçador Dionísio, personagem
detentor de grande conhecimento empírico sobre a região do Marvão, próxima de
onde se encontrava instalada a fazenda Morro. Como um bom caçador, diante dos
conhecimentos empíricos adquiridos ao longo da vida e da lida, Dionísio conhecia os
sinais de que a seca se aproximara, e foi ele o responsável por alertar sobre a grande
seca que estava por vir, sendo responsável também por guiar alguns dos personagens
na fuga dos sertões.
Essa fuga da seca era bastante comum no sertão nordestino, uma região onde
a população vivia isolada, onde os rios são intermitentes/temporários, ou seja, têm
seu curso interrompido nos tempos de seca, e onde não havia poços tubulares. Para
não morrerem de sede e fome, os moradores do sertão, juntamente com suas
criações, fugiam dessa realidade, em busca de regiões onde pudessem passar os
65

períodos mais severos da seca. Para isso, fazia-se necessário entender os sinais
dados pela natureza quanto à chegada da seca no sertão, como contextualiza Araújo
& Araújo:
O drama da pobreza no mundo rural começa cedo; a luta pela
sobrevivência é transmitida de pai para filho. É preciso saber defender-
se de todo tipo de adversidades, e a infância nasce com a certeza de
que é preciso basear-se na experiência dos adultos (ARAÚJO; 2014,
p. 110)

São estes os principais pontos da análise da obra “Ataliba, o Vaqueiro”, que


podem vir a ser trabalhados no ensino de Geografia do Piauí, quais sejam: a
importância dos vaqueiros no processo de formação e povoamento do território
piauiense, a utilização de mão-de-obra escrava oriunda da África e a questão da seca,
assim como suas implicações. “Ataliba, o Vaqueiro” se mostra uma obra literária de
grande valor do ponto de vista geográfico.
Outra produção literária analisada e que aborda a figura do vaqueiro é “Chico
Vaqueiro do Meu Piauí”, um romance em versos escrito por Alvina Fernandes
Gameiro, em 1971. Alvina Gameiro era natural da cidade de Oeiras, a primeira capital
do Estado do Piauí, que se encontra localizada no centro-sul do estado. Por se tratar
de um romance curto, entendeu-se como válido destacar alguns trechos, a fim de
evidenciar as informações geográficas contidas.

CHICO VAQUEIRO DO MEU PIAUÍ


Fortaleza: Editora Henriqueta Galeno, 1971
VIII
No pátio destocado e de capim batido
ante um lindo pau-d’arco e um pé de tamarindo
ergue-se o casarão, às sombras protegido,
com cem anos ou mais, à família servindo.

Varandas ao redor, como as velhas moradas


de construção rural dos moldes lusitanos,
dos senhores que, ali, fixaram as manadas,
que deram ao Brasil o boi, por muitos anos...
A Fazenda é bonita, a família é distinta,
e é um bem de raiz o vaqueiro e o agregado,
66

têm nas veias também, algum sangue da extinta


geração dos heróis que trouxeram este gado.
(...)

XI
Quando o inverno chegou, alastrou-se a fartura;
o campo se cobriu inteiro de verdura,
e a chuva que fecunda a terra e a planta cria,
no peito pastoril, desabrocha a alegria.

E chove sem parar, e chove noite e dia.


a lavoura crescida ao toque da invernia,
rebenta em floração, e os imensos trançados
cobrem de jitirana as cercas dos roçados.
Emboneca-se o milho, o arrozal cacheia,
e de grandes melões a roça se faz cheia,
maxixe e melancia estendem cabeleiras
na estrada que ficou entre os seios das leiras.
(...)

XIV
(...) Na cozinha, onde alguém resmuninha entre ralhos,
rude mão de pilão, sobre a paçoca, malha.
E do forno de barro, arrastam cinza e brasa
para enfiar ali, muitas flandres de bolo:
cariri, caridade, e os sequilhos de casa,
pamonha, manauê, a peta, o engana-tolo.
(...)
E junho se derrama, alegrando as Fazenda
como o dinheiro do gado após a apartação,
transportando o Divino, a colher oferendas,
trazendo o boi-bumbá na festa de São João.
67

Diante dos versos em destaque, far-se-á uma análise de trechos, buscando-se


perceber as geograficidades que neles podem ser encontradas. Logo na primeira
estrofe destacada há a menção de exemplos da vegetação que tem ocorrência nos
biomas caatinga e cerrado, predominantes no Estado do Piauí, quais sejam: o Pau-
d’arco e o Pé de tamarindo.
A caatinga é um bioma existente apenas no território brasileiro e que cobre
cerca de 7% do território. No Piauí, a caatinga representa cerca de 28,4% da
vegetação do território e envolve 63 municípios, contando com várias espécies
vegetais exclusivas deste bioma. As duas espécies vegetais supracitadas são muito
comuns no sertão piauiense, podendo ser encontradas na caatinga e no cerrado.
Esse trecho merece destaque, pois num passado não muito distante, quando a
população piauiense ainda vivia isolada e a seca castigava bastante, os piauienses
utilizavam aquilo que estava à sua disposição para lutarem pela sua sobrevivência, e
muitas espécies vegetais eram utilizadas para alimentação e medicação, o Pau-d’arco
e o Tamarindo são exemplos. O Pau-d’arco tem sua casca utilizada para fins
medicinais e é também um repelente natural; já o fruto do Pé de Tamarindo é muito
utilizado para produção de sucos e chás, sendo sua polpa comercializada na região.
O título já antecipa e na segunda estrofe destacada é perceptível o
protagonismo do vaqueiro que, assim como no romance “Ataliba, o Vaqueiro”, é
evidenciado. Nessa estrofe o vaqueiro é exaltado, sendo considerado herói por ter
trazido o gado para o interior do sertão nordestino, ocasionando o povoamento da
região e, portanto, importante para a formação territorial do Estado do Piauí.
As estrofes da sessão XI trazem a dinâmica do período chuvoso no sertão,
demonstrando como a vegetação da região se comporta quando as chuvas chegam
e encerram o período de estiagem. Interessante destacar essa estrofe pelo fato da
escritora citar as culturas de milho, arroz, maxixe e melancia; vegetais de ciclo curto
cultivados por pequenos agricultores piauienses no período chuvoso, estando aí
refletida a realidade de grande parte dos piauienses, pois uma grande parcela
populacional ainda se sustenta, principalmente, da agricultura familiar.
Nesse trecho ainda há ainda a retratação da paisagem do interior do sertão
piauiense no tempo chuvoso, quando o texto cita uma planta trepadeira da caatinga,
de nome jitirana, que recobre roças piauienses. A jitirana, tal qual a situação narrada
no texto, recobre as cercas dos roçados, como se pode ver na imagem a seguir:
68

Figura 3: Imagem da planta trepadeira conhecida como jitirana em uma roça na cidade de
Campo Grande do Piauí - PI.

Fonte: Mônica Sebastiana Brito de Sá (2020).

As duas últimas estrofes destacadas fazem parte da sessão XIV, merecendo


destaque por evidenciarem a culinária piauiense. Muitas das comidas ali citadas são
feitas a partir de matéria-prima produzida pelas próprias famílias piauienses, como a
pamonha que é feita a partir do milho, os sequilhos que têm a goma de mandioca
como base, e a paçoca que é feita com a carne do gado e a farinha de mandioca. A
população piauiense, por ser uma população, em sua grande maioria, muito humilde,
pobre, acaba por produzir grande parte do que consome, as comidas citadas no trecho
em questão são exemplos. Essas estrofes ainda destacam as festas de São João,
que são comemoradas no mês de junho, mês esse que marca o final do período
chuvoso e, geralmente, é um período de fartura, sendo motivo para comemorações.
Como é possível verificar, o romance de Alvina Gameiro apresenta muitas
referências geográficas piauienses, principalmente de como se dava a vida no sertão
piauiense à época em que fora escrito e que, em alguns pontos, reflete-se no presente.
69

Sendo assim, é uma produção literária de grande valia do ponto de vista geográfico,
oferecendo material para frutíferas trocas entre as disciplinas de Literatura e
Geografia.

3.2 A terra filha do Sol do Equador

Há uma fase literária piauiense conhecida como Fase Acadêmica, que é assim
chamada por ter sido o período em que foi fundada a Academia Piauiense de Letras
(1917), e por grande parte dos escritores de destaque da época ser responsável pela
sua fundação. Nesta fase, efêmera, que se estendeu do início da segunda década do
século XX até o início da década de 40, misturam-se “várias correntes estéticas:
manifestações tardias do Romantismo, Realismo-Naturalismo; acentuadíssima
presença do Parnasianismo e Simbolismo e, finalmente, formas do Modernismo”.
(COSTA E SILVA, 1917, apud LIMA, 2013, p. 55)
É dessa fase o escritor Antônio Francisco Da Costa e Silva, um dos mais
famosos autores piauienses, tendo destaque nacional. Da Costa e Silva começou a
publicar seus versos desde muito jovem e aos 16 anos já contribuía com a revista do
Grêmio Literário de sua cidade natal, Amarante. Escreveu várias obras e poemas, e é
seu o poema mais conhecido no estado, o “Hino do Piauí”. Embora seja um poema
curto, traz muitas informações geográficas, como é possível verificar através da
análise feita a seguir.

Hino do Estado do Piauí


(Antônio Francisco da Costa e Silva)

“Salve a terra que aos céus arrebatas


Nossas almas nos dons que possuis
A esperança nos verdes das matas
A saudade das serras azuis

Piauí, terra querida


Filha do Sol do Equador
Pertencem-te a nossa vida
Nosso sonho, nosso amor!
As águas do Parnaíba
70

Rio abaixo, rio arriba


Espalhem pelo sertão
E levem pelas quebradas
Pelas várzeas e chapadas
Teu canto de exaltação”

Esse trecho, o refrão do hino, é o que merece mais destaque, já que aborda a
localização do estado do Piauí, próxima à Linha do Equador, e destaca elementos
naturais como o Rio Parnaíba e as chapadas, que são destaque no relevo piauiense.
O Estado do Piauí é conhecido nacionalmente por suas altas temperaturas ao
longo do ano; essas altas temperaturas se justificam pelo estado se encontrar
localizado próximo à Linha do Equador, e, por essa razão, receber uma maior
incidência dos raios solares. Da Costa e Silva destaca essa característica geográfica
e nomeia a terra piauiense como Filha do Sol do Equador.
Ainda tem destaque, nessa estrofe, o Rio Parnaíba, rio este que é o mais
importante do estado e o segundo maior da região Nordeste, depois do Rio São
Francisco. Vale destacar que o Rio Parnaíba é o maior rio exclusivamente nordestino,
tendo em vista que o Rio São Francisco tem sua nascente localizada no estado de
Minas Gerais, região Sudeste.
O Rio Parnaíba tem protagonismo na história do país, devido sua importância
econômica, cultural, social, também pelos contatos estabelecidos em suas margens
(GANDARA, 2010, p.16). Os estados do Maranhão e Piauí são diretamente
beneficiados pelo Rio Parnaíba, isso porque o rio traça todo o limite entre os referidos
estados, e é um rio perene, localizado numa região onde a grande maioria dos rios
são intermitentes/temporários, importante para o abastecimento das cidades e
localidades por onde passa.
Acerca do curso do Rio Parnaíba, sua nascente está localizada numa região
de chapadas, de onde espalha-se pelo sertão até chegar à sua várzea. É na Chapada
das Mangabeiras, na divisa entre os estados do Piauí e Maranhão, em um trecho
denominado como o Alto Parnaíba, que se estende até a Barragem de Boa
Esperança, que se encontra a nascente do rio. Essa região é conhecida como
Chapadões do Sul do Piauí, por ser um conjunto de extensos planaltos tabulares.
(ARAÚJO et al., 2006, p. 57).
71

A Barragem de Boa Esperança fica localizada no município de Guadalupe – PI;


sua construção e funcionamento favorece não só a dinâmica de cidades do Estado do
Piauí, mas também do Estado do Maranhão, estado limítrofe. “A Usina Hidrelétrica
Presidente Castelo Branco, posteriormente nomeada como Boa Esperança, fez parte
de um conjunto de políticas intervencionistas de fomento à modernização industrial no
período da Ditadura Militar.” (KALUME, 2012, p. 27).
O Médio Parnaíba corresponde ao trecho do curso do rio entre a Usina
Hidrelétrica de Boa Esperança até a foz do Rio Poti, localizada na cidade de Teresina,
capital do Estado do Piauí. Por fim, o Baixo Parnaíba se inicia na foz do Rio Poti e vai
até o seu desague no oceano Atlântico. Nesse desague, o Rio Parnaíba forma o único
Delta das Américas, sendo um importante ponto turístico do Estado do Piauí. “Está
localizado entre os estados do Maranhão e Piauí tendo em Parnaíba sua porta de
entrada. É um raro fenômeno da natureza que ocorre também no Rio Nilo, na África,
e em Me Kong, no Vietnã.” (SILVA, 2004, p. 30). Devido a essa peculiaridade e o fato
de ter um grande ecossistema, o Delta do Parnaíba é um grande atrativo turístico do
Rio Parnaíba.

“Desbravando-te os campos distantes


Na missão do trabalho e da paz
A aventura de dois bandeirantes
A semente da pátria nos traz”

Este trecho faz referência a Domingos Jorge Velho e Domingos Afonso


Mafrense, bandeirantes portugueses responsáveis por “frentes de penetração nos
Sertões do Piauí, tornando-se um dos primeiros colonizadores daquelas terras”
(ALVES, 2003, p. 59). Responsáveis pelo desbravamento das terras que hoje
correspondem ao território do Estado do Piauí, foi a partir dessa penetração que
fazendas foram fundadas no território piauiense e, a partir da fundação, vaqueiros
passaram a administrá-las.

“Sob o céu de imortal claridade


Nosso sangue vertemos por ti
Vendo a pátria pedir liberdade
O primeiro que luta é o Piauí
72

(...)”

Esse trecho do Hino do Piauí remete a uma batalha sangrenta ocorrida em 13


de março de 1823, tendo como finalidade a expulsão das tropas portuguesas que
tentavam manter a região subordinada a Portugal, depois da declaração de
independência de 1822. A batalha conhecida como Batalha do Jenipapo ocorreu no
atual município de Campo Maior, onde “às margens do Riacho Jenipapo, em Campo
Maior, piauienses, maranhenses e cearenses lutaram pela independência do país
contra as tropas portuguesas comandadas pelo major João José da Cunha Fidié”
(CÂMADA DOS DEPUTADOS, Piauí)9. É por esta razão que Da Costa e Silva
menciona nos versos que, diante de um pedido de liberdade feito pela pátria, “o
primeiro que luta é o Piauí”. A batalha tem grande importância histórica para o Estado,
tanto que:

“[...] transcorridos 83 anos, desde a aprovação dos símbolos originais,


eis que a Assembleia Legislativa, no ano de 2005 aprova, por
unanimidade, a inclusão da data 13 de março de 1823, dia da Batalha
do Jenipapo, na bandeira do Piauí. (...) corresponde a um anseio
antigo da comunidade de historiadora e da população conhecedora do
fato, o reconhecimento da data e de sua importância com relação à
Independência do Brasil.” (PIAUÍ, 2010)

Embora seja uma estrofe curta, há uma grande referência acerca da


historicidade do Estado do Piauí no processo de Independência. Podendo vir a ser um
aporte para que estudantes tenham contato com o tema e assim possam aprofundá-
lo. Como clarificado, as referências geográficas e históricas encontradas no Hino do
Piauí remetem ao relevo, vegetação, localização geográfica, hidrografia, povoamento,
formação territorial e a história do processo de independência do Brasil. E por ser um
poema muito acessível, já que é o hino do estado, pode facilmente ser utilizado no
ensino de Geografia do Piauí, e, não menos importante, no ensino da História do Piauí.

3.3 O baloiçar das palmeiras piauienses


Os carnaubais piauienses serviram como tema para a obra literária “Noite
Grande”, de autoria de Permínio de Carvalho Asfora. O escritor nasceu em território
piauiense, em local que hoje corresponde ao município de Pimenteiras. Filho de uma

9
Disponível em: https://www.camara.leg.br/radio/programas/483071-no-dia-13-de-marco-de-1823-
ocorreu-a-batalha-do-jenipapo/ Acesso em 20/4/2020.
73

piauiense e um imigrante árabe, Permínio Asfora fez parte do Modernismo piauiense


e escreveu o romance “Noite Grande” no ano de 1947. Esta obra retrata a história de
um árabe que se fixa no território piauiense e acaba por se envolver em conflitos com
coronéis da região; um romance que se passa durante o século XX e aborda os
latifúndios de carnaubais piauienses.
Os carnaubais, ou carnaubeiras, são palmeiras comuns no semiárido do
nordeste brasileiro, verificadas, principalmente, na região Meio Norte do estado do
Piauí, onde há uma área denominada como Região dos Carnaubais, mas também
podem ser vistas, em menor escala, na região do sertão do estado. Devido à sua
importância na composição das paisagens do estado, a palmeira Carnaúba encontra-
se representada no Brasão do Piauí.
“Noite Grande” pode ser utilizada como referência no estudo da importância
econômica dos carnaubais para a economia piauiense durante o século XX,
principalmente entre as décadas de 1930 e 1940, quando os preços da cera de
carnaúba apresentaram uma elevação no mercado internacional, e sua
comercialização movimentou a economia piauiense. No entanto, logo depois, a partir
de 1947, houve uma desvalorização da cera neste mercado, o que “levou as áreas
daquele Estado onde se vivia dependendo economicamente da extração de tal
produto, a retornarem às precárias condições de vida anteriores” (ARAÚJO, 2008,
p.198).
Mas é válido destacar que a carnaubeira teve grande importância no processo
de colonização do Piauí, pois “fornecia palhas para cobertura e paredes das casas,
além de possibilitar a confecção de elevada gama de utensílios para uso pessoal e/
ou para casa” (CASTELO BRANCO, 1970, p. 126). Além disso, a madeira das
canaubeiras era utilizada para a construção de moradias e currais de gado, prática
que ainda pode ser verificada em moradias e currais de gado do interior do estado.

3.4 Rio Parnaíba, aqui se aperta; ali, se espraia: a seca e os carnaubais

O “Tempo Consequente” é uma obra literária datada de 1966, seu escritor é o


teresinense Hindemburgo Dobal Teixeira, ou simplesmente H. Dobal, como é
popularmente conhecido. O escritor é da fase literária Geração Meridiano, assim
conhecida por ter vindo a circular, no final da década de 40, a importante revista
Meridiano, da qual H. Dobal atuou como diretor. Foi premiado com o importante
74

Prêmio Jorge de Lima do Instituto Nacional do Livro e pertenceu à Academia


Brasiliense de Letras e Academia Piauiense de Letras,
A obra é dividida em duas partes, a primeira delas é que traz maiores
contribuições para essa análise, abordando temas como a região Meio Norte do
Estado do Piauí e seus carnaubais, o Rio Parnaíba e a Seca, como será possível
verificar nos poemas que foram destacados. O primeiro em destaque é o poema
intitulado “Campo Maior”, que, como o próprio título sugere, traz informações
geográficas da macrorregião do município.

Campo Maior
Ai campos do verde plano
todo alagado de carnaúbas.
Ai planos dos tabuleiros
tão transformados tão de repente
num vasto verde num plano
campo de flores e de babugem.
Ai rios breves preparados
de noite e nuvem. Ai rios breves
amanhecidos na várzea longa,
cabeças d’água do Surubim
no chão parado dos animais,
no chão das vacas e das ovelhas.
Ai campos de criar. Fazendas
de minha avó onde outrora
havia banhos de leite. Ai lendas
tramadas pelo inverno. Ai latifúndios.

A cidade de Campo Maior, localizada no norte do Estado do Piauí, encontra-se


localizada na sub-região nordestina conhecida como Meio Norte. Na região que
compreende Campo Maior e cidades circunvizinhas é possível notar tabuleiros
repletos de carnaubais, que, nos períodos chuvosos, acabam por ficar alagados,
paisagem esta que é retratada no poema em destaque. Na imagem a seguir é possível
ver um exemplo da paisagem ali retratada:
75

Figura 4: Carnaubais de Campo Maior.

Fonte: Lailson Bandeira10

Há menção também dos rios breves, referindo-se aos rios intermitentes, que
são maioria no Estado do Piauí. Na região Meio Norte, esses rios intermitentes são
responsáveis pelo alagamento dos campos limpos na época chuvosa, onde há
predominância de uma vegetação rasteira e carnaubais, como é possível observar na
imagem acima.
O poema ainda cita a criação de ovelhas, pois a macrorregião de Campo Maior
se destaca a nível estadual por ser referência na produção e comercialização de
ovinos e caprinos. Embora seja um poema curto, apresenta geograficidades
importantes de uma parte da região norte do Piauí.

10
Disponível em: https://www.flickr.com/photos/lailsonbm/299111649/in/photolist-sr2tp-6HWEgN-
6DnGKA-aSK8Bi-6R5Php-4tqeYv-6DnvYj-8z9Ep2-nwyDdY-8z8Vsr-8z8Smr-8zcH2b-8zc5Ph-8z91BR-
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8z92bv-sr2w7-d4dws5-8zc8Gm-8z93PB-8z8YvK-8zbRvS-8zc8hA-8zczAE-8zcwzS-aSK8px. Acesso
em 29 de fevereiro de 2020.
76

Alguns poemas da obra mencionam o rio Parnaíba, dentre eles destaca-se o


poema intitulado “O Rio”, que abaixo se apresenta.
O RIO
Meu rio Parnaíba feito lembrança
não corre mais entre barrancos.
É um fio na memória um rio esgotado
no recreio de muitas manhãs, rio risco rio tatuado
na deriva de um dia perene.
(...)
Meu rio largo de água doce de brejo
jaz o seu curso entre coroas e canaranas
e de outros meninos consumidos
no sol de suas águas
num delta escuro dividido
rola o dia perene

O Rio Parnaíba é um tema recorrente na literatura piauiense, muito relevante


dentro do objetivo de identificar geograficidades em produções literárias, diante da
sua grande importância para a constituição geográfica do estado. O poema “O Rio”
informa ao leitor sobre o caráter perene que tem o Rio Parnaíba, e menciona a sua
foz em Delta, a única das Américas, com que deságua no Oceano Atlântico.
Outros dois poemas destacados são “Introdução e rondó sem capricho” e
“Relatório”. Foram destacados porque abordam a pecuária piauiense, importante
atividade econômica do estado no seu processo de formação territorial. Graças as
avanço da pecuária pelo sertão nordestino em busca de pastos para o rebanho é que
se fundaram os primeiros currais de fazenda no território que hoje compreende o
Estado do Piauí, e ainda é uma atividade de subsistência de muitas famílias
piauienses. O primeiro deles, o poema “Introdução e rondó sem capricho”, retrata o
drama vivenciado pelo homem e o seu gado diante das consequências do período da
seca, além de mencionar as chapadas, a flora e fauna do sertão piauiense, como é
possível verificar:

INTRODUÇÃO E RONDÓ SEM CAPRICHO


Os novilhos do agreste
77

só têm chifre e culhões


Os boizinhos do agreste
estão na pele e nos ossos.

Ai terras pobres do Piauí


Capina cupins. Nestas chapadas
corcoveadas de cupins,
o capim do agreste não dá sustança,
o gado magro mal se mantém.

Nestas trilhas de areia e seriema


Procuram cobras. E cantam
os seus dias de fogo. Dão de faveiras
sua sombra aos formigueiros.
E os dias magros ao homem
sua quota de vida

Em terras piauienses se criava o gado que mais tarde seria levado para
abastecer de carne e couro o litoral da região Nordeste. Os principais destinos do
gado produzido no Piauí eram as capitais dos estados de Pernambuco e Bahia, que
eram os maiores centros urbanos da época. O poema retrata essa realidade, quando
fala da comercialização do gado pé-duro, ou seja, sem raça, oriundo do Piauí,
enfatizando o fato de o gado ter poucas arrobas. Isso ocorria porque o gado piauiense
tinha que percorrer grandes distâncias até chegar aos grandes centros urbanos
mencionados, e nesse translado, entre o sertão e o litoral, o gado acabava perdendo
parte de seu peso. Vejamos:

RELATÓRIO
Nas feiras de Pernambuco
o gado pé-duro do Piauí
baixa o preço da carne.
Não é mais boi
são tassalhos
e a faca na carne
78

corta macia.
Macia era a vida
sob as faveiras
antes da faca
dividir o boi
em novas glebas.
Antes que o tempo
fosse cortado
e o gado bravo
fosse levado
no macio andar
dos caminhões.
Boi morto couro
entregue às varas.
Mais outros virão
do Piauí mais pobre
do que estes bois
de poucas arrobas.

O último poema destacado dessa obra para análise, intitulado Réquiem, aborda
um outro tema que também já esteve em pauta neste trabalho, que é a seca. A
situação narrada no poema se passa no mês de outubro, que corresponde ao período
mais crítico da estiagem, que se estende entre agosto e dezembro. Durante o período
de estiagem, no sertão, as chuvas são praticamente inexistentes e são verificadas as
temperaturas mais elevadas, o que ocasiona a interrupção dos cursos dos rios, a
vegetação acaba por murchar e animais morrem de fome e sede.
O poema cita ainda as “obras-de-arte” do DNOCS, Departamento Nacional de
Obras Contra a Seca, que teve grande atuação no século passado, sendo responsável
por obras faraônicas no sertão nordestino, como açudes para o represamento de água
das chuvas, como forma de combate à seca. O DNOCS também foi responsável pela
criação de estradas, implantação de energia elétrica, pontes, etc. Vejamos como o
poema aborda essas temáticas:
RÉQUIEM
Nestes verões jaz o homem
79

Sobre a terra. É a dura terra


Sob os pés lhe pesa. E na pele
Curtida in vivo arde-lhe o sol
destes outubros. Arde o ar
deste campo maior desta lonjura
onde entanguidos bois pastam a poeira
E se tem alma lhe arde o desespero
De ser dono de nada. Tão seco é o homem
Nestes verões. E tão curtida é a vida,
Tão revertida ao pó nesta paisagem
Neste campo de cinza onde se plantam
Em meio às obras-de-arte do DNCOS
O homem e outros bichos esquecidos

Todos os poemas destacados nesse tópico se encontram na primeira parte da


obra literária “O Tempo Consequente”; da segunda parte não foi destacado nenhum
poema, pelos assuntos ali abordados serem mais gerais, sem tratarem incisivamente
de temas relacionados à geograficidade piauiense. Mas a primeira parte da obra,
denominada de Campo de Cinza, é de grande valia, pois, como foi demonstrado,
aborda várias geograficidades do território piauiense.

3.5 Oeiras parou no tempo que continua: a primeira capital piauiense

Uma das produções literárias piauienses analisada foi a obra “Rio Subterrâneo”
do escritor Orlando Geraldo Rêgo de Carvalho. O. G. Rêgo de Carvalho, como é
conhecido, nasceu e viveu sua infância na cidade de Oeiras, que foi a primeira capital
do Estado do Piauí, entre os anos de 1972 e 1852. O romance “Rio Subterrâneo”,
segundo Lima, além de ser o mais importante do escritor, é “uma das obras-primas
da moderna ficção da língua portuguesa, (...) um romance autobiográfico, enigmático
e labiríntico” (2013, p. 150 e 151).
No primeiro dos seis capítulos da obra, é contada a estória de Lucínio, filho de
José e Marieta. Lucínio tem um pai doente, e esse estado doentio do pai acaba por
ser algo perturbador para o personagem principal. Por esse motivo, Lucínio vaga pelas
margens do Rio Parnaíba. O Rio Parnaíba é um marco da fronteira entre os estados
80

do Piauí e Maranhão, separando as cidades de Teresina, no Piauí, da cidade de


Timon, no estado do Maranhão. E assim como faz parte da vida dos teresinenses e
timonenses, o Rio Parnaíba fazia parte da vida de Lucínio, que ao percorrer suas
margens, contemplando-o, punha-se a pensar sobre a doença do pai e suas
desventuras amorosas, sendo enamorado por uma moça e prometido em casamento
para outra.
No segundo capítulo do romance é contada a história de Hermes, que se dedica
à arte de desenho, sendo filho de um empresário do ramo da cera de carnaúba. Mais
uma vez a cera de carnaúba, que no início no século XX teve grande importância para
a economia piauiense, é aqui retratada, sendo mais um exemplo literário que faz
referência a esse importante momento econômico do estado.
No terceiro capítulo a prometida de Lucínio, Helena, vinda da cidade de Oeiras,
chega à cidade de Timon, onde vive a família de seu noivo. Ao longo desse capítulo
é retratada a cidade de Oeiras, o primeiro centro urbano do Piauí, que, por esse
motivo, acabou se tornando a primeira capital do estado. Em pleno século XXI, Oeiras
ainda preserva parte da arquitetura da época, mantendo viva a historicidade da
cidade, o que é importante para a preservação da memória e identidade do lugar.
Segundo Tuan, olha-se para o passado por diversas razões, mas a mais comum é a
necessidade de ter um sentimento de identidade e um sentido do eu. (1983, p. 206).
Ao preservar paisagens, é possível, através delas, compreender um pouco do
passado, entender a história e, assim, fortalecer o sentimento de pertencimento
àquele lugar.
É importante retornar aos primórdios do desbravamento e povoamento do
território piauiense. Como já mencionado, o povoamento do território que hoje
compreende o Estado do Piauí se deu em razão da expansão da pecuária pelo sertão
nordestino, que proporcionou a instalação de currais de fazenda. Devido às
circunstâncias do povoamento, um “caráter rústico, extensivo e disperso, contribuía
para o isolamento da população piauiense” (LIMA, 2003, 62). Pela realidade rural e
pecuária, na vida das fazendas, quase se verificava a existência de vilas no que viria
a ser o território piauiense, sendo a Vila Mocha, que futuramente se chamaria Oeiras,
a primeira aglomeração urbana. Lima comenta essa situação e faz uma síntese da
trajetória da cidade de Oeiras:
81

Tal situação teve como consequência à quase ausência de núcleos


urbanos nos anos iniciais do povoamento daquela área. Somente no
final do século XVII surge a primeira povoação no Piauí, a freguesia
de Nossa Senhora da Vitória, elevada à categoria de vila na segunda
década do século XVIII. A vila da Mocha, como foi batizada, localizava-
se em terras de uma das fazendas de Mafrense, às margens do rio
Piauí. É ela que mais tarde, quando o Piauí torna-se uma capitania
autônoma, vai transformar-se na sede do governo, recebendo o nome
de Oeiras. (2003, p. 63)

Oeiras é, portanto, uma cidade de grande importância histórico-geográfica para


o Estado do Piauí, a partir dela que começou a ser traçada a história do estado, sendo
importante a população conhecer a história e a geograficidade da cidade. Uma obra
como “Rio Subterrâneo”, acaba por despertar no leitor a curiosidade de conhecê-la,
e, se já conhece, instiga a um conhecimento mais aprofundado. Oeiras é uma cidade
que, por preservar a parte de sua arquitetura colonial, com paisagens que transitam
entre o passado e o presente, acabou sendo tombada, no ano de 2013, pelo Instituto
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), como patrimônio cultural
nacional, devido a sua importância cultural, tanto a nível estadual quanto nacional,
sendo então denominado como Conjunto Histórico e Paisagístico de Oeiras-PI.

Figura 5: Imagem da Paróquia Nossa Senhora da Vitória, que faz parte do Conjunto Histórico
e Paisagístico de Oeiras-PI.
82

Fonte: Iphan11

Figura 6: Imagem do Casarão das 12 janelas pertencente ao Conjunto Histórico e


Paisagístico de Oeiras.

Fonte: Iphan12

Esta análise priorizou focar a cidade de Oeiras na narrativa de O. G. Rêgo de


Carvalho, já que é uma cidade que ajuda a remontar o processo de povoamento e os
primórdios da urbanização no Piauí. Até 1720, Oeiras foi única vila, primeiro centro
urbano do estado, o que demonstra como é importante que os piauienses a
conheçam, também através da literatura, e compreendam sua participação nesse
processo de urbanização do estado.

3.6 Na beira do Rio Parnaíba, às margens da vida

11
Disponível em: < http://www.ipatrimonio.org/?p=20396#!/map=38329&loc=-7.017472999999991,-
42.131344,17> Acesso em 28 de fevereiro de 2020.

12
Disponível em: < http://www.ipatrimonio.org/?p=20396#!/map=38329&loc=-7.017472999999991,-
42.131344,17> Acesso em 28 de fevereiro de 2020.
83

Francisco de Assis Almeida Brasil, natural da cidade de Parnaíba – PI, nascido


em 1932, escritor piauiense conhecido nacionalmente, teve duas de suas obras
premiadas no Prêmio Nacional Walmap, sendo elas: “Beira Rio Beira Vida” e “Os Que
Bebem como os Cães”. O Prêmio Nacional de Walmap é considerada a maior
premiação da literatura brasileira durante as décadas de 60 e 70.
Assis Brasil se destaca por ser mais um escritor com obras marcadas pelo
regionalismo. Muito ligado à sua terra natal, Assis Brasil traz para as suas obras as
suas vivências, as paisagens que percorreu, sendo responsável por uma literatura
telúrica. Sua obra “Beira Rio Beira Vida” é a mais conhecida de todas, portanto, objeto
de análise desta pesquisa.
“Beira Rio Beira Vida” foi escrita em 1965, ganhando o Prêmio Nacional de
Walmap daquele ano. É uma obra de destaque na Literatura Piauiense e também no
cenário nacional, descrevendo a vida das prostitutas no cais do Rio Parnaíba, na
cidade de Parnaíba – PI.
O romance se passa em meados do século XX e retrata a divisão social
existente entre aqueles que vivem na cidade, e aqueles que, literalmente, vivem às
margens, do Rio Parnaíba e da sociedade. A obra destaca as disparidades sociais
existentes entre distintas camadas sociais, a marginalização urbana, a pobreza, a
exploração da mão de obra e a exclusão social.
No trecho da obra abaixo destacado, pode-se notar a “distância” existente entre
as camadas sociais que viviam no centro da cidade de Parnaíba e aqueles que viviam
na margem do Rio Parnaíba. O progresso só chegava para as camadas sociais mais
privilegiadas, ou seja, aquelas que residiam no centro da cidade, já os que viviam no
cais do rio estavam alheios aos resultados positivos do progresso, afastados
geograficamente e excluídos socialmente.

“O silêncio vinha do rio.


– Parnaíba está crescendo.
– Só cresce lá pra cima, na parte mais plana. Estão até construindo uma nova
Parnaíba.
– Daqui a alguns anos como será tudo isso?
– Eu queria ver, eu queria ver.”
(ASSIS BRASIL, 2012, p.41)
84

A cidade de Parnaíba, no extremo norte do Estado do Piauí, distante 345 km


da capital Teresina, é hoje a segunda maior cidade do Estado do Piauí, bastante
conhecida por ser uma das cidades litorâneas do estado, destino dos turistas. Nas
décadas de 30 e 40 do século XX, Parnaíba passava, segundo Souza (2014), por um
processo de reformulação urbana, mas esse processo se restringia ao centro da
cidade, gerido pra atender aos anseios de uma elite parnaibana, enquanto que os
pobres viviam às margens da cidade, no chamado cais de porto.
Esse processo de urbanização, verificado em Parnaíba, partia de uma
realidade que se aflorava por quase todo o território brasileiro. Para Santos (2013), foi
resultado de condições políticas e organizacionais, juntamente como um crescimento
demográfico, resultando num processo de urbanização mais envolvente e presente
por todo o território brasileiro.
A urbanização é um dos temas abordados na obra de Assis Brasil, mas não o
único, são diversas as geograficidades da cidade de Parnaíba que podem ser
extraídas, Souza diz que:

Assis Brasil apresenta o cais, a pobreza e a preocupação dos citadinos


com essa realidade. A cidade portuária recebia com frequência
comerciantes, artistas e visitantes e a situação dos pobres e doentes
nas ruas não agradava os habitantes de uma cidade em pleno
crescimento econômico. (SOUZA, 2014)

O Rio Parnaíba, a marginalização social da população mais pobre da cidade


de Parnaíba, o processo de urbanização no início do século XX, e, mais incisivamente,
o drama vivenciado pelas prostitutas que viviam no cais daquele rio, são temas da
obra e que podem vir a ser explorados em sala de aula; literária, geográfica e
historicamente. É uma obra que apresenta um ótimo substrato para a disciplina de
Geografia do Piauí, principalmente de como o Rio Parnaíba fazia e ainda faz parte da
vida dos moradores de cidades por ele cortadas.

3.7 Palha de Arroz: Teresina de antros e de antes

O livro “Palha de Arroz”, escrito em 1968, é um romance ambientado na cidade


de Teresina, capital do Estado do Piauí, na década de 40. É obra do escritor
vanguardista João Nonon de Moura Fontes Ibiapina, natural da cidade de Picos,
nascido em 1921. Fontes Ibiapina fez parte da Academia Piauiense de Letras e traz
85

nessa obra os costumes e o modo de vida da sociedade teresinense durante meados


do século XX.
A cidade de Teresina foi a primeira cidade planejada do Brasil, fundada ainda
no final do século XIX, já nascendo com o intuito de que fosse a sede do poder
administrativo e político, idealizada pelo então Governador da província do Piauí, José
Antônio Saraiva. Até então, a capital piauiense era a cidade de Oeiras, localizada no
sertão do estado, isolada e distante de outros centros urbanos, dificultando assim as
relações comerciais e a comunicação.
Almejando-se proximidade com demais centros urbanos, e na busca de um
centro político que ficasse às margens do Rio Parnaíba, o que facilitaria o escoamento
de produção, no ano de 1852 Oeiras deixa de ser a capital do Piauí e Teresina se
torna oficialmente capital, assim permanecendo até os dias atuais.
Entre as décadas de 40 e 60 do século XX, em todo o Brasil notou-se esse
processo de inversão, quanto aos locais em que se concentrava a maior população;
ocorreu uma evolução do perfil populacional urbano, sendo que a taxa de urbanização
passou de 26,35% para 45,08%. (SANTOS, 2013)
O Romance Palha de Arroz é um mix de ficção e realidade, retratando o
cotidiano da sociedade teresinense na década de 40 do século XX. A obra documenta
o processo de urbanização e modernização vivenciado por Teresina, que seguia a
linha dos demais centros urbanos brasileiros na mesma época. A realidade é
imprimida no texto literário, que “produz ao mesmo tempo um efeito de realidade e um
efeito de ficção, privilegiando ora um, ora outro, interpretando um pelo outro e
inversamente, mas sempre na base desse par.” (SILVA, 2003)
Com o processo de urbanização e modernização na capital, as camadas mais
pobres da sociedade teresinense acabaram sendo empurradas para as regiões mais
periféricas da cidade, fazendo com que surgissem bairros mais afastados do centro,
como o bairro Palha de Arroz, que dá nome a essa obra. No bairro Palha de Arroz
havia incêndios criminosos constantes, que são denunciados por essa obra.
O bairro abrigava as camadas mais desfavorecidas, vítimas da sociedade,
esquecidas pelo poder público. Fontes Ibiapina denuncia essa realidade da capital
piauiense no século XX, narrando literariamente o abandono das classes sociais mais
pobres. O escritor denuncia a miséria e injustiças sociais vivenciadas pelos
desafortunados e menos favorecidos da sociedade piauiense, abordando a opressão
86

que essas classes sociais sofriam por parte da parcela social detentora de maior poder
aquisitivo. (SILVA, 2003)
O personagem principal era Pau de Fumo, homem oriundo de família tradicional
da capital, mas que, por azar do destino, acabou se entregando à vida criminosa, indo
por fim morar no bairro Palha de Arroz. Pau de Fumo passou a praticar os furtos
depois que ficara órfão, praticando os delitos para a subsistência dele e de sua família,
retrato de muitos que naquele bairro residiam. Em um de seus delitos, Pau de Fumo
acaba preso, e, quando passava a noite na cadeia, viu, pela janela da sua cela, mais
um dos incêndios criminosos que frequentemente aconteciam no bairro. Quando
enfim é libertado, o protagonista acaba por descobrir que as chamas que avistara da
sua cela consumiram o barraco onde ele e sua família residia, e sua filha caçula não
havia sobrevivido.
Dentre outros temas denunciados por Fontes Ibiapina no romance, é abordado
o quão tradicional era a sociedade teresinense à época, permeada por muitos valores
patriarcais e preconceituosos, que buscavam normatizar a sexualidade feminina e
corroborar com a injustiça social praticada contra a vida daqueles que viviam
marginalizados, às margens do Rio Parnaíba.
Palha de Arroz é uma obra muito rica, por aliar ficção e realidade. É também
uma fonte histórica, geográfica, que denuncia a violação de direitos de uma parcela
da sociedade teresinense do século XX, podendo ser utilizada como metodologia de
ensino em várias áreas do conhecimento.
87

O FIM

Diante da existência da Lei Ordinária nº 5.359 que entrara em vigor desde o


ano de 2003, o ensino de Geografia do Piauí tornou-se obrigatório, estando essa lei
em consonância com as Constituições da República Federativa do Brasil e do Estado
do Piauí, bem como com as Diretrizes Curriculares para o Ensino Médio. No entanto,
quase duas décadas desde a promulgação da referida lei, a mesma ainda não é
implementada nas escolas de nível médio geridas pela Secretaria de Educação do
Estado do Piauí SEDUC-PI; essa realidade se dá pelo fato de que não é
disponibilizado material didático que viabilize o ensino da disciplina.
Ao perceber que as produções literárias de autores piauienses eram marcadas
pelo regionalismo, sendo possível verificar, nessas produções, a representação de
lugares e espaços piauienses, a cultura, processos históricos, sociais e de formação
territorial, enxerguei a literatura piauiense como um recurso que viabilizaria o ensino
de Geografia do Piauí. Portanto, este trabalho se propôs a analisar obras literárias
piauienses, a fim de evidenciar que as mesmas estão carregadas de informações
geográficas, e propor um projeto de interdisciplinaridade entre as disciplinas escolares
de Geografia e Literatura, que viria a facilitar a implementação da lei
supramencionada.
Diante das reflexões suscitadas ao longo deste trabalho, quis-se destacar a
importância de lançar mão de estratégias de ensino que visem uma construção do
conhecimento de forma articulada, onde os diversos campos do saber trabalhem em
conjunto, na busca de um processo de ensino-aprendizagem que permita um
desenvolvimento crítico e emancipatório dos estudantes.
A interdisciplinaridade foi destacada como meio pelo qual é possível a
construção de um conhecimento uno e fortalecido, que visa a eliminação de barreiras
entre disciplinas, instigando a cooperação entre as ciências na busca da construção
de saberes.
A intenção desta pesquisa foi mostrar que através da interdisciplinaridade, com
as disciplinas de Literatura e a Geografia trabalhando em conjunto, é possível que não
apenas se cumpram as legislações estaduais, mas favorecer a construção de um
saber que elimine as barreiras existentes entre as áreas do conhecimento, que
produza um conhecimento de caráter emancipatório.
88

Propõe-se, portanto, a cooperação entre os professores das disciplinas


escolares de Geografia e Literatura e estudantes, através de um projeto de cunho
interdisciplinar, em que as produções literárias piauienses sejam uma fonte dos
conhecimentos geográficos do estado, uma solução para a superação da
indisponibilidade de material didático relativo à Geografia do Piauí nas escolas
estaduais.
Incentivar e dar caminhos para o desenvolvimento desse projeto interdisciplinar
traria muitas contribuições, tanto para as disciplinas de Literatura e Geografia, quanto
para os estudantes. Além de fazer com que haja uma promoção das obras, textos e
poemas que compõem a literatura piauiense, ainda haveria o incentivo da leitura,
possibilitando que estudantes desenvolvessem um sentimento de identidade com sua
terra natal. Seriam atingidos, assim, os objetivos da interdisciplinaridade, que é a
superação de barreiras entre as disciplinas e um enriquecimento mútuo.
Revela-se, portanto, a relevância deste trabalho, pois um projeto interdisciplinar
dessa natureza, inovador e original, traria uma dinamização ao processo de ensino-
aprendizagem, fugindo dos modelos tradicionais, proporcionando aos estudantes
meios para que se tornem sujeitos mais ativos na construção do saber. Diante do
exposto, reitera-se a importância do ensino da Geografia do Piauí e a rica contribuição
oportunizada pela utilização da Literatura como fonte de geograficidades piauienses.
89

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TUAN, Yi-FI. Espaço e Lugar: a perspectiva da experiência. São Paulo: DIFEL,


1983.
94

ANEXOS
95

ANEXO I: RELAÇÃO DOS LIVROS DIDÁTICOS E PARADIDÁTICOS UTILIZADOS


PELA 16ª GRE DA SEDUC-PI NO ANO DE 2019
96
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106

ANEXO II: Conteúdo programático referente à disciplina de Língua Portuguesa do


Edital nº 19/2019 – UFPI, relativo à realização do Programa Seriado de Ingresso na
Universidade – PSIU, do ano de 2009.

ANEXO I – CONTEÚDOS PROGRAMÁTICOS

LÍNGUA PORTUGUESA1

Objetivos Gerais:
Apreender textos (verbais e não verbais) em diferentes níveis de compreensão,
demonstrando a capacidade de analisá- Ios em seus aspectos formais, lógico-semânticos e
Iinguísticos.
Analisar textos literários relacionados a seu contexto histórico-cultural, demonstrando a

1ª SÉRIE
capacidade de identificar os seus elementos formais, estéticos e estilísticos.
1. LEITURA
Tipologia de Texto: descritivos, narrativos, dissertativos (expositivos e argumentativos).
Gêneros de Texto: Ficcionais: gêneros jornalísticos (entrevista, notícia, reportagem,
artigo, ensaio, crônica, anúncio, charge, etc) e gêneros virtuais (blog, flog, e-mail, chat,
hipertexto). Não-ficcionais: notícias, reportagens, artigos, crônicas, propagandas, charges,
textos informativos.
Competência textual: Análise e compreensão, interpretação de textos verbais e não
verbais; informações centrais e periféricas dos textos; inferência; fatores de coesão e
coerência; relações lógico-semânticas no texto; recursos expressivos do texto; modos de
elaboração e articulação do texto; efeitos de sentido das funções e figuras de linguagem;
intertextualidade e análise comparativa entre textos.
Linguagem e gramática: Linguagem oral versus linguagem escrita; funções da
linguagem; variações linguísticas. Fonologia/Fonética: aplicação dos conhecimentos de
fonética e fonologia na ortografia, na distinção entre as modalidades oral e escrita, na
variação linguística e em recursos expressivos da língua.
Morfossintaxe: estrutura e formação da palavra; flexão nominal e verbal; concordância
nominal e verbal (casos regulares); classes de palavras (com ênfase no verbo, substantivo,
adjetivo e advérbio) emprego e função.
Sintaxe: Estruturas sintáticas: palavra, sintagma, frase,
107

oração e período. Semântica: denotação, conotação,


polissemia, homonímia, sinonímia, antonímia. Escrita:
pontuação, ortografia e acentuação gráfica.
2. LITERATURA BRASILEIRA (para as três séries)
O objeto de estudo são obras selecionadas. Os gêneros, a periodização e a teoria literária,
somente devem ser abordados em função das obras, e, à medida que forem úteis para a sua
compreensão.
Análise e compreensão de obras literárias: Abordagem da obra literária em função do seu
momento cultural e de sua situação na história da literatura e enquanto realização estética,
em função dos gêneros e estilos de época. Comparação entre obras com estilos literários
diferentes.

OBRAS INDICADAS PARA ESTUDO OBRIGATÓRIO. Não significando


exclusividade.
a) Sermão da Sexagésima, Sermão pelo Bom Sucesso das Armas de Portugal contra
as de Holanda e Sermão do Bom Ladrão – Pe. Antonio Vieira.
b) Terreiro de Fazenda – Fontes Ibiapina.
c) Inocência – Visconde de Taunay.
d) Espumas Flutuantes – Castro Alves.

2ª SÉRIE
1. LEITURA
Tipologia de texto: descritivos, narrativos, dissertativos (expositivos e argumentativos).
Gêneros de Texto: Ficcionais: gêneros jornalísticos (entrevista, notícia, reportagem,
artigo, ensaio, crônica, anúncio, charge, etc) e gêneros virtuais (blog, flog, e-mail, chat,
hipertexto). Não-ficcionais: notícias, reportagens, artigos, crônicas, propagandas, charges,
textos informativos. Não-ficcionais: correspondências, editoriais, notícias, reportagens,
artigos, crônicas, propagandas, charges; textos informativos; discurso político e religioso.
Competência Textual: Análise e compreensão, interpretação de textos verbais e não
verbais; informações centrais e periféricas dos textos; inferência; fatores de coesão e
coerência; relações lógico-semânticas no texto; recursos expressivos do texto; modos de
elaboração e articulação do texto; relação entre tese e argumentos; paráfrases e resumos de
textos; efeitos de sentido das funções e figuras de linguagem; aspectos ideológicos
presentes nos textos; intertextualidade e análise comparativa entre textos;
108

Linguagem e gramática: Linguagem oral versus linguagem escrita; funções da


linguagem; variações linguísticas (sociais, geográfica, registros). Avaliação e justificativa
de uso de expressões linguísticas das modalidades não hegemônicas; avaliação do uso de
estruturas linguísticas quanto a sua adequação ao padrão formal da língua.
Fonologia/Fonética: aplicação dos conhecimentos de fonética e fonologia na ortografia,
na distinção entre as modalidades oral e escrita, na variação linguística e em recursos
expressivos da língua.
Morfossintaxe: estrutura e formação da palavra; flexão nominal e verbal; concordância e
regência nominais e verbais; classes de palavras - ênfase no verbo: emprego apropriado de
tempos e modos; formas pessoais e impessoais, 17

1 Está-se empregando a nova denominação da disciplina, segundo as Diretrizes Curriculares.

Considera-se. Entretanto a Literatura como conteúdo da referida disciplina


simples e compostas. Aplicação da morfossintaxe à leitura e à produção de textos.
Sintaxe: Estruturas sintáticas: sintagma nominal e sintagma verbal; processos sintáticos
(coordenação e subordinação entre termos e orações). Correlação entre forma e sentido.
Aplicação da sintaxe à leitura e produção de texto.
Semântica: denotação, conotação, polissemia, homonímia, sinonímia, antonímia,
hiperonímia e hiponímia. Ambigüidade
Escrita: parágrafo, pontuação, ortografia e acentuação gráfica.
2. LITERATURA BRASILEIRA
O objeto de estudo são obras selecionadas. Os gêneros, a periodização e a teoria literária,
somente devem ser abordados em função das obras, e, à medida que forem úteis para a sua
compreensão.
Análise e compreensão de obras literárias: Abordagem da obra literária em função do seu
momento cultural e de sua situação na história da literatura e enquanto realização estética,
em função dos gêneros e estilos de época. Comparação entre obras com estilos literários
diferentes.
OBRAS INDICADAS PARA ESTUDO OBRIGATÓRIO. Não significando
exclusividade.
a) O Cortiço - Aluísio Azevedo.
b) Lira dos Vinte Anos - Álvares de Azevedo.
c) Sangue - Da Costa e Silva
109

d) O Crime do Padre Amaro - Eça de Queiroz.

3ª SÉRIE

1. LEITURA
Tipologia de Texto: Descritivos, narrativos, dissertativos. (expositivos e argumentativos).
Gêneros de Texto: Ficcionais: gêneros jornalísticos (entrevista, notícia, reportagem,
artigo, ensaio, crônica, anúncio, charge, etc) e gêneros virtuais (blog, flog, e-mail, chat,
hipertexto). Não-ficcionais: notícias, reportagens, artigos, crônicas, propagandas,
charges, textos informativos. Não·ficcionais: correspondências, editoriais, notícias,
reportagens, artigos de divulgação científica, propagandas, charges, textos instrutivos e
normativos; discurso político e religioso.
Competência textual: Análise e compreensão, interpretação de textos verbais e não
verbais; informações centrais e periféricas dos textos; inferência; fatores de coesão (a
substituição através de pronomes e a conexão através de conjunções) e coerência; relações
lógico-semânticas no texto; recursos expressivos do texto; modos de elaboração e
articulação do texto; indução e dedução; relação entre tese e argumentos; paráfrases,
paródias e resumos de textos; efeitos de sentido das funções e figuras de linguagem;
aspectos ideológicos presentes nos textos; intertextualidade e análise comparativa entre
textos, incluindo textos de épocas diferentes.
Linguagem e gramática: Linguagem oral versus linguagem escrita; funções da
linguagem; variações linguísticas (sociais, geográficas, temporais e registros). Avaliação
e justificativa de uso de expressões linguísticas das modalidades não hegemônicas;
Avaliação do uso de estruturas linguísticas quanto a sua adequação ao padrão formal da
língua. Fonologia/Fonética: aplicação dos conhecimentos de fonética e fonologia na
ortografia; na distinção entre as modalidades oral e escrita; na variação linguística; e em
recursos expressivos da língua.
Morfossintaxe: estrutura e formação da palavra; flexão nominal e verbal; concordância
e regência nominais e verbais; classes de palavras - quadro geral. Aplicação da
morfossintaxe à leitura e à produção de textos.
Sintaxe: Estruturas sintáticas: sintagma oracional; período; processos sintáticos
(coordenação e subordinação entre termos e orações, paralelismo sintático, inversão,
intercalação). Em prego das conjunções e pronomes relativos. Correlação entre forma e
110

sentido. Aplicação da sintaxe à leitura e produção de texto.


Semântica: denotação, conotação, polissemia, homonímia, sinonímia, antonímia,
hiperonímia e hiponímia. Ambigüidade. Campos semânticos presentes em textos.
Escrita: parágrafo, pontuação, ortografia e acentuação gráfica.
2. LITERATURA LUSO-BRASILEIRA
OBRAS INDICADAS PARA LEITURA OBRIGATÓRIA. Não significando
exclusividade.
a) São Bernardo – Graciliano Ramos
b) Romanceiro da Inconfidência – Cecília Meireles
c) Beira Rio Beira Vida – Assis Brasil
d) Memorial do Convento – José Saramago

METODOLOGIA DE ABORDAGEM: (para as três séries)


a) Devem-se utilizar textos completos ou fragmentos com unidade de sentido. Indicar
sempre o autor e a fonte.
b) As questões sobre linguagem e gramática devem avaliar a capacidade reflexiva do
candidato.
c) Os fatos linguísticos devem ser abordados em função do texto, levando-se em conta a
sua relevância para a construção do sentido.
d) Deve-se observar que o conteúdo das três séries obedece a uma sequenciação
progressiva, com retomadas facultativas, de acordo com as realidades específicas.
111

ANEXO III: Conteúdo programático referente à disciplina de Língua Portuguesa do


Edital nº 02/2010 do Núcleo de Concursos e Promoção de Eventos (NUCEPE) da
UESPI, relativo à realização do Processo Seletivo de ingresso na referida instituição
de ensino superior, para o ano de 2011.
112

APÊNDICES
113

APÊNDICE A: FORMULÁRIO DE ANÁLISE DAS PRODUÇÕES LITERÁRIAS


PIAUIENSES

I. ASPECTOS GERAIS:
a) Título da produção literária:
______________________________________________________________
b) Autor(a):
______________________________________________________________
c) Editora:
_______________________________________________________________
d) Ano de publicação:
_______________________________________________________________
e) Período literário ao qual a produção literária pertence:
_______________________________________________________________

II. PERSONAGENS:
a) Personagem principal e/ou personagens principais.
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
b) Personagens secundários:
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________

III. TEMPO:
a) Quando ocorrem os acontecimentos narrados?
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
114

b) O narrador apresenta os fatos na ordem em que aconteceram ou houve


inversão temporal?
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________

IV. ESPAÇO:
a) Onde se passam os acontecimentos narrados?
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________

V. ASPECTOS GEOGRÁFICOS EVIDENCIADOS NA OBRA


a) A produção literária apresenta aspectos geográficos em sua narrativa?
( ) Sim ( ) Não

b) Se a resposta para o item anterior for positiva, os aspectos geográficos são


relevantes ao ponto de a produção literária vir a ser utilizada como recurso em
aulas de Geografia do Piauí? Se sim, quais são as geograficidades
encontradas na obra?
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
115

_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________

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