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“ Frenectomia lingual em paciente


odontopediátrico: relato de caso
clínico

Karina Sarno Paes Alves Dias Luana Daiane Santos Aragão


FAINOR FAINOR

Milton D’almeida Ferreira Malaine Ribeiro Martins


FAINOR FAINOR

Gabriela de Quadros Ferraz Tainá Mota Ramalho Alves


FAINOR FAINOR

10.37885/201001621
RESUMO

Objetivo: Demonstrar através de um relato de caso clínico as particularidades envolvidas


em um caso de anquiloglossia em paciente odontopediatrico associada à frenectomia.
Metodologia: Paciente do sexo masculino, melanoderma, 14 anos, ASA I, compareceu
à clínica odontológica da Faculdade Independente do Nordeste (FAINOR) com queixa
principal de “língua presa”- (SIC). Através do exame clínico foi constatada a presença de
freio lingual curto e aderido ao assoalho da boca, que limitava a amplitude dos movimen-
tos de língua do paciente. Decidiu-se então realizar a cirurgia interventiva de frenectomia
lingual para reversão do caso. Resultados: A cirurgia foi realizada sem intercorrência
e após trinta dias foi possível observar o movimento de projeção da língua mais efetivo.
Conclusão: Nesse cenário, é possível demonstrar a importância do diagnóstico de an-
quiloglossia e da realização de frenectomia para proporcionar ao paciente uma melhor
qualidade de vida.

Palavras-chave: Freio Lingual, Periodontia, Procedimentos Cirúrgicos Bucais.


INTRODUÇÃO

O frênulo lingual, também conhecido como freio lingual é uma estrutura em forma de
prega que conecta o ventre da língua ao assoalho da cavidadade bucal direcionando a sua
movimentação (OLIVEIRA et al., 2019; BISTAFFA; GIFFONI; FRANZIN, 2017). O frênulo
limita o tamanho, a posição e a forma da língua durante o desenvolvimento do indivíduo e
atua de forma dinâmica modulando os movimentos da língua durante a fala, a deglutição e
a fonação (NETO; MOLERO; GOULART, 2014).
Quando o freio lingual encontra-se fixado muito próximo a ponta da língua, dificultando
a movimentação deste órgão, trata-se de um freio lingual curto, também denominado an-
quiloglossia, anciloglossia, glossopexia ou língua presa (OLIVEIRA et al., 2019; BISTAFFA;
GIFFONI; FRANZIN, 2017). Nesses casos, a ponta da língua encontra-se contraída para
baixo e ao ser estendida para fora da cavidade oral é formada uma depressão em sua ex-
tremidade (VARGAS et al., 2008).
O encurtamento do freio lingual pode alterar a fisiologia mecânica da língua, contribuin-
do para o desenvolvimento inadequado das funções mastigatória, fonológica, bem como
na deglutição (MARQUEZAN; MARTINELLI; GUSMÃO, 2012). Além disso, em casos mais
graves pode limitar o crescimento da mandíbula, quando não é realizada a correção cirúrgica
(MANFRO; MANFRO; BORTOLUZZI, 2010).
Essa variação pode ter sua ocorrência justificada devido a uma porção do tecido residual
não ter sofrido apoptose durante o desenvolvimento embrionário (KNOX, 2010). A alteração
ocorre quando parte desse tecido embrionário é mantido no ventre da língua causando modi-
ficações de inserção e/ou comprimento da mesma (MARQUEZAN; MARTINELLI; GUSMÃO,
2012; GOMES; ARAÚJO; RODRIGUES, 2015).
A anquiloglossia deve ser diagnosticada ainda na infância e a sua correção é realizada
por meio do tratamento cirúrgico chamado frenectomia lingual, indicado quando há limitação
dos movimentos da língua, problemas funcionais e sociais (MELO et al., 2011; OREDSSON;
TÖRNGREN, 2010), uma vez que esse procedimento pode permitir a devolução da liberdade
de movimento da língua e consequentemente a recuperação da execução normal das suas
funções (SILVA; SILVA; ALMEIDA, 2018).
Na técnica de frenectomia o tecido mucoso que compõe o freio é removido, liberando
a língua para realizar todos os movimentos peculiares, como protrusão, elevação até a
papila incisiva, bem como o movimento de lateralidade até a comissura labial (PURICELLI;
PONZONI, 2012; MARQUEZAN; MARTINELLI; GUSMÃO, 2012). O presente trabalho tem
o objetivo demonstrar através de um relato de caso clínico as particularidades envolvidas
em um caso de anquiloglossia em paciente odontopediátrico associado à frenectomia.

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METODOLOGIA

O paciente R. S. M., gênero masculino, 14 anos de idade, pardo, compareceu a clínica


de odontologia da Faculdade Independente do Nordeste (FAINOR) com queixa principal
de “língua presa”.
Na anamnese não foi relatado nenhuma doença sistêmica que contraindicasse a cirur-
gia. No exame clínico intraoral foi possível observar a presença de freio língua curto, aderido
e que limitava a amplitude dos movimentos de elevação da língua (Figura 1). Após a análise
clínica foi indicada a correção cirúrgica desse frênulo anormal.
A frenectomia foi realizada pela técnica convencional. Após paramentação da equipe e
paciente, iniciou-se a antissepsia intra-oral utilizando solução de digluconato de clorexidina a
0,12% e extra-oral com solução de digluconato de clorexidina a 2%. O paciente foi submeti-
do à anestesia local pela técnica infiltrativa regional do nervo lingual, bilateralmente. Foram
utilizados dois tubetes de anestésico, lidocaína à 2% associado a epinefrina 1:100.000.
O freio lingual foi fixado com um fio de sutura para o tracionamento do ápice da língua,
com o objetivo de facilitar a secção do tecido. A incisão do freio foi executada com uma
lâmina de bisturi número 15, paralela à superfície ventral do órgão (Figura 2). Após a fre-
nulotomia (incisão no frênulo lingual) foi realizada a divulsão lateral das fibras musculares
(Figura 3). A hemostasia foi alcançada através da compressão bidigital com o auxílio de
gaze e finalizada com a sutura simples utilizando o fio de seda 4.0 (Figura 4).
A cirurgia foi realizada sem intercorrências e em curto período de tempo. Para pós-
-operatório foi recomendado repouso, dieta líquida e/ou pastosa, bem como, alimentos em
baixa temperatura. Para controle da dor e inflamação foi prescrito Nimesulida de 100mg e
Dipirona Sódica 500mg.

Figura 1. Elevação da língua com limitação da amplitude do movimento.

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Figura 2. Tracionamento da língua com agulha e fio de sutura para secção do tecido do freio.

Figura 3: Divulsão dos tecidos.

Figura 4: Sutura da ferida cirúrgica.

Figura 3.Divulsão dos tecidos.

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RESULTADOS

Após um mês da cirurgia, foram observadas mudanças no frênulo lingual e na mobili-


dade da língua. A protrusão, lateralização e elevação da língua melhoraram em diferentes
graus. No movimento de elevação notou-se o freio centralizado no ventre da língua e não
mais no ápice como antes, concluindo com o sucesso da cirurgia.

Figura 5. Acompanhamento com um mês.

DISCUSSÃO

Anquiloglossia é uma anormalidade, onde o freio lingual encontra-se fixado em posi-


ções muito próximas ao ápice da língua, limitando os seus movimentos e prejudicando a
capacidade de executar suas funções, como a pronúncia de certas letras e ditongos labiais,
bem como acarretando dificuldade de deglutição e mastigação (NEVILLE et al., 2004).
O presente caso clínico reporta-se a um paciente do sexo masculino, corroborando
com a literatura a qual aponta que os homens são mais afetados que as mulheres, em uma
proporção de 1:3 (SANTOS; CONCEICAO; PRESTES, 2018). O diagnóstico de anquiloglossia
tem sido realizado após exame clínico acurado, com avaliação do comprimento e fixação
do freio e mobilidade lingual (SILVA et al., 2016).
Em alguns casos de anquiloglossia o paciente necessita de avaliação e de uma equi-
pe multidisciplinar com fonoaudiólogos e cirurgião-dentista para o diagnóstico diferencial
(MELO et al., 2011). Na avaliação lingual do paciente em questão não houve dificuldade

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para realizar o diagnóstico definitivo, uma vez que o mesmo era adolescente e relatou suas
próprias dificuldades, constatadas após o exame clínico.
Existem evidências limitadas de que o freio curto representa um co-fator no desenvol-
vimento de má oclusão, especialmente classe III (CHAUBAL e DIXIT, 2011). No entanto,
mais ensaios controlados multicêntricos são necessários para estabelecer uma correlação
clara entre anquiloglossia e maloclusão.
Cabe ressaltar que tal condição pode gerar consequências relevantes e de impactos
físicos e sociais, como desconforto local, diastema entre dentes incisivos inferiores, impe-
dimentos na manutenção da higiene oral, impossibilidade de realizar tarefas simples, como
tocar instrumentos de sopro, e problemas de comportamento que podem potencializar a
geração de constrangimento social durante a infância e adolescência, devido ao desenca-
deamento de episódios de bullying (VIERA, 2012).
Neste caso clínico, adotou-se a técnica cirúrgica convencional iniciada pela técnica
anestésica infiltrativa no nervo lingual bilateralmente. De acordo com Hupp (2009), o blo-
queio do nervo lingual bilateral e anestesia infiltrativa local na região anterior promovem
uma adequada anestesia para a frenectomia lingual. Com o paciente anestesiado pode-se
transfixar com um fio de sutura a ponta da língua, o que confere um melhor controle por
tração da elevação do órgão. No entanto, alguns autores preferem que o auxiliar promova a
elevação segurando a ponta língua com o auxílio de uma gaze. Outros lançam mão de um
instrumento chamado tentacânula, com o mesmo objetivo.
Após a elevação da língua, procedeu-se a secção do freio com lâmina 15, com a incisão
atingindo a inserção do tecido conjuntivo fibroso da base da língua em forma transversal, o
que corrobora com Hupp (2009) e Puricelli e Ponzoni (2012). Em seguida, é aconselhável
realizar a dissecção das bordas da incisão para depois executar a sutura com pontos simples
(PURICELLI E PONZONI, 2012).
O manejo adequado de anquiloglossia com terapia cirúrgica oportuna oferece bons re-
sultados, em um período de tempo mais curto do que o normalmente esperado (JUNQUEIRA
et al., 2014), como verificado no caso apresentado.
A intervenção cirúrgica oportuna para corrigir anquiloglossia em idade precoce reduz a
longo prazo complicações. Várias abordagens cirúrgicas são usadas, dentre elas a frenoto-
mia, a qual envolve a realocação de o frênulo lingual e a frenectomia que é a completa excisão
do freio. Por outro lado, frenuloplastia envolve qualquer um dos vários métodos usados para
liberar a língua e corrigir a sua anatomia. No entanto, a literatura tem poucas informações
para favorecer qualquer uma destas três principais técnicas (JUNQUEIRA et al., 2014).
Uma frenectomia, como a realizada neste paciente, apresenta resultados previsíveis
e com menor taxa de recidiva. A literatura carece de parâmetros conclusivos em relação ao

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tempo de se realizar uma frenectomia (JUNQUEIRA et al., 2014). No entanto, o momento
ideal para a cirurgia ser realizada é anterior ao desenvolvimento de fala anormal e padrões de
deglutição. Quando realizado em indivíduos mais velhos, o encaminhamento para um fonoau-
diólogo é importante para ajudar a estabelecer as funções normais da língua, (MARTINELLI
et al., 2012), o que foi feito no caso apresentado.
No presente caso clínico, verifica-se que a posicionamento, mobilidade da língua e as
funções orofaciais melhoraram em diferentes graus após a frenectomia, independentemente
da fonoterapia. Esses resultados certificam que a frenectomia deve ser realizada na maior
parte dos casos.
Outras terapias usadas para corrigir a anquiloglossia são o uso de lasers, o qual vem
se tornando cada vez mais frequente, dispensando a utilização de rafias para contenção
da língua, uso de bisturi e suturas finais, proporcionando um maior conforto durante o ato
operatório. E, a terapia orofacial miofuncional (SEO et al., 2014).

CONCLUSÃO

A técnica de frenectomia é eficiente para melhorar a mobilidade e a postura da língua,


assim como suas funções, incluindo a fala. A técnica cirúrgica é efetiva, rápida e pouco trau-
mática. É possível demonstrar a importância do diagnóstico de anquiloglossia e da realização
da cirurgia para proporcionar ao paciente uma melhor qualidade de vida.

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21. VIEIRA JIMP. Tecnologia Laser em Medicina Dentária–Frenectomia em Foco. Dissertação


(Monografia em licenciatura em Medicina Dentária) - Universidade Fernando Pessoa, Faculdade
de Ciências da Saúde, Porto, 2012.

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