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QUI 139 – Laboratório de Química Orgânica

EXPERIMENTO
EXTRAÇÃO LÍQUIDO-
5 LÍQUIDO

1. INTRODUÇÃO

As substâncias orgânicas obtidas de fontes naturais ou por meio de reações


químicas raramente estão puras. No caso de uma reação química que gerou uma mistura
de substâncias, o produto principal pode ser removido por filtração, caso seja um sólido
insolúvel no meio reacional, ou pode ser destilado, se for um líquido de baixa temperatura
de ebulição. No entanto, esses casos são minoria e o que se observa é a necessidade de
realizar extrações seletivas ou lavagens do meio reacional para remoção das impurezas.
Na maioria das vezes, as impurezas e reagentes inorgânicos solúveis em água
podem ser removidos com facilidade pela lavagem do composto orgânico ou de sua
solução em um solvente orgânico volátil insolúvel em água, que em uma segunda etapa
pode ser eliminado por evaporação.
Alguns compostos orgânicos, apesar da baixa solubilidade em água, podem
facilmente ser transformados em derivados solúveis em meio aquoso. Compostos
contendo grupos ácidos ou básicos, após tratamento com bases ou ácidos inorgânicos,
respectivamente, originam sais solúveis.
Ambos os processos de separação e purificação descritos anteriormente envolvem
a técnica denominada de extração, ou mais precisamente, extração líquido-líquido.

1.1. TEORIA DA EXTRAÇÃO LÍQUIDO-LÍQUIDO

A extração envolve a transferência de um soluto de um solvente para outro. Essa


transferência ocorre porque o soluto é mais solúvel no segundo solvente do que no
primeiro. Os dois solventes devem ser imiscíveis para que ocorra a formação de um
sistema bifásico. Em geral, utiliza-se um funil de separação (Figura 1, p.2) para se
realizar a extração líquido-líquido em escala laboratorial.

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Figura 1. Esquema de montagem para extração líquido-líquido.

A Figura 2 ilustra de maneira geral o processo de extração. No início, as

substâncias hipotéticas A (representada por ●) e B (representada por ) estão

misturadas na fase aquosa. Após a adição de um solvente orgânico imiscível com a água,
serão formadas duas fases e haverá uma migração diferencial da substância B para a fase
orgânica, até o estabelecimento de um estado de equilíbrio. Com a separação das duas
fases, há a consequente separação das substâncias A e B.

Figura 2. Esquema do processo de extração líquido-líquido.

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Portanto, o processo de extração envolve a distribuição de um dado soluto entre


duas fases líquidas imiscíveis (fase orgânica e fase aquosa). Quando as fases se separam
em duas camadas, estabelece-se um equilíbrio tal que a razão das concentrações do soluto
em cada fase é uma constante, chamada de coeficiente de distribuição (ou coeficiente de
partição). O coeficiente de distribuição K é definido como

C2
K=
C1
onde
C1 = concentração (em g.L-1, mg.mL-1 ou outra unidade) de equilíbrio do soluto na fase
aquosa;
C2 = concentração (em g.L-1, mg.mL-1 ou outra unidade) de equilíbrio do soluto na fase
orgânica.

O valor do coeficiente de distribuição é constante para cada soluto e independe


das quantidades dos dois solventes em contato. Entretanto, o coeficiente de distribuição
depende da natureza dos solventes utilizados e da temperatura. Assim, o valor do
coeficiente de distribuição é fixo para um determinado par de solventes a uma dada
temperatura.
Como a concentração em cada fase pode ser expressa pela relação entre a massa
do soluto e o volume do solvente, é possível expressar diretamente a massa do soluto
extraído e a massa restante através do coeficiente de partição (K). Pela equação
apresentada a seguir, verifica-se que quanto maior o volume do solvente extrator, maior
será a quantidade extraída.

m2
C V V 
K= 2 = 2  m2 = m1.K  2 
C1 m1  V1 
V1

O processo de extração não é 100 % eficiente, o que significa dizer que nem todo
soluto será transferido totalmente de uma fase para outra em uma única etapa de extração,
a não ser que o valor de K seja muito elevado. Geralmente, é necessário que várias
extrações sejam realizadas para remover todo o soluto de uma das fases. De fato, o
processo de extração é muito mais eficiente quando efetuado várias vezes com um

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pequeno volume de solvente do que quando efetuado uma única vez com um grande
volume de solvente. O exemplo seguinte procura ilustrar esse aspecto.
Considere que são empregados dois solventes A e B em igual volume, 100 mL,
onde B contém inicialmente um soluto X em concentração de 40 % (m/v). O coeficiente
de partição para este sistema é de 0,8. Observa-se que nas condições descritas, o solvente
extrator A, que inicialmente não continha nenhuma quantidade de soluto dissolvida,
contém agora 17,8 g de X, enquanto no solvente B permaneceram ainda 22,2 g, após o
estabelecimento do estado de equilíbrio. A distribuição do soluto X entre os solventes A
e B é mostrada na Figura 3.

Figura 3. Distribuição do soluto X em uma extração líquido-líquido em uma única etapa.

Pode-se comparar a eficiência do processo de extração em uma única etapa com


a extração múltipla empregando-se um mesmo volume total. Por exemplo, caso se faça a
extração descrita anteriormente com duas porções de 50 mL serão removidos pelo
solvente A na primeira extração cerca de 11,4 g e na segunda 8,20 g, totalizando 19,6 g
contra 17,8 g com uma única extração, conforme demonstrado na Figura 4 (p.5).
Portanto, as Figuras 3 e 4 demonstram que o processo de extração em várias
etapas é mais eficiente do que o processo de extração realizado em uma única etapa.

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Figura 4. Distribuição do soluto X em uma extração líquido-líquido múltipla.

1.2. ESCOLHA DO SOLVENTE EXTRATOR

Conforme discutido anteriormente, a extração líquido-líquido envolve a


distribuição diferencial de um soluto entre dois líquidos imiscíveis. Em geral, uma das
fases é constituída pela água e, portanto, denominada fase aquosa e a outra fase é
constituída por um solvente que seja imiscível na água, que é conhecido como fase
orgânica ou solvente extrator.
Na escolha do solvente adequado para cada extração devem ser considerados
alguns critérios:
a) O solvente deve apresentar baixa solubilidade na água, possibilitando a formação
de duas fases;

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b) O solvente deve solubilizar consideravelmente a substância que se deseja extrair.


Com respeito a esse aspecto, deve ser levado em conta que “semelhante dissolve
semelhante”, ou seja, para extrair substâncias pouco polares, por exemplo, deve
ser utilizado um solvente de baixa polaridade;
c) O solvente deve ser quimicamente inerte, não reagindo com as substâncias a serem
extraídas;
d) O solvente deve apresentar volatilidade razoável (baixa temperatura de ebulição)
para que possa ser removido facilmente, permitindo o rápido isolamento do
produto desejado;
e) É desejável ainda que o solvente seja de baixo custo e de baixa toxicidade.

Na Tabela 1 estão listados os solventes mais utilizados para extrações líquido-líquido.


Observe que dentre os solventes listados, apenas aqueles que possuem cloro em sua
composição são mais densos que a água. Portanto, apenas quando for utilizado um
solvente clorado para extração, que a fase orgânica será a inferior.

Tabela 1. Propriedades físicas dos solventes mais utilizados para extração.


Massa Molar Temperatura de Densidade a 20 ºC
Solvente
-1
(g mol ) Ebulição (ºC) (g cm-3)
Éter dietílico 74 35 0,714
Pentano 72 36 0,626
Diclorometano 85 41 1,335
Clorofórmio 119 61 1,492
Hexano 86 66 0,659
Tetracloreto de carbono 154 77 1,594
Benzeno 78 80 0,879
Tolueno 92 111 0,867

1.3. ASPECTOS PRÁTICOS DA EXTRAÇÃO LÍQUIDO-LÍQUIDO

A seguir são descritos aspectos práticos relevantes quando se realiza uma extração
líquido-líquido em escala laboratorial.

Funil de separação
Em escala laboratorial, o processo de extração líquido-líquido é geralmente
realizado em um funil de separação (Figura 1, p.2). Deve-se ter o cuidado para que o
volume de líquido no funil de separação nunca ultrapasse ¾ de sua capacidade nominal.

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Deve-se sempre checar se a torneira está fechada e manter um erlenmeyer embaixo do


funil de separação.
O processo de extração inicia-se com a adição da solução a ser extraída e do
solvente extrator ao funil de separação. Tampa-se o funil e realiza-se a agitação, com
movimentos circulares, mantendo o funil em um ângulo de 45º em relação à vertical. Com
uma das mãos, segura-se firmemente a tampa e com a outra a torneira (Figura 5).

Figura 5. Forma correta de agitar e liberar a pressão de um funil de separação.

Ao agitar a mistura, devido à alta volatilidade do solvente, poderá haver aumento


da pressão interna. Por isso, após o procedimento de agitação, deve-se realizar o “alívio”
de pressão, inclinando-se a parte inferior do funil para cima e abrindo lentamente a
torneira. Ao abri-la, deve-se tomar o máximo de cuidado para não dirigir a saída dos
vapores para si ou para alguém próximo.
O processo de agitação e alívio de pressão é usualmente realizado três vezes e,
então, deve-se colocar o funil de separação em suporte apropriado, retirar a tampa e
esperar a formação das duas fases, para realizar a separação.

Solventes utilizados
Normalmente os solventes utilizados na extração possuem baixa temperatura de
ebulição (Tabela 1, p.6) ou mesmo pode-se realizar uma extração com solvente
quimicamente ativo, como solução de bicarbonato de sódio, que leva à liberação de gases
quando esta solução entra em contato com um ácido. Por isso, é necessário que se faça o

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“alívio” de pressão. Entretanto, isto deve ser feito lentamente, porque os vapores podem
se expandir de forma violenta, projetando o líquido para fora do funil.

Emulsão
Em alguns casos, após o processo de extração, não se observa separação completa
das fases orgânica e aquosa, ficando gotículas de uma fase dispersas na outra. Isto leva à
formação de uma interface não definida, chamada de emulsão, que compromete a
eficiência da separação.
Uma das alternativas para “quebrar” a emulsão (completa separação das fases)
consiste em deixar o funil de separação em repouso por alguns minutos. Entretanto, se
isso não for suficiente, outros métodos podem ser empregados. Por exemplo, a simples
adição de mais solvente orgânico ou água pode ser suficiente. Se a emulsão persistir, a
adição de sais inorgânicos (NaCl, Na2SO4, etc) pode ser uma alternativa eficaz para
desfazer a emulsão. Nos casos mais persistentes, a centrifugação pode ser usada.

Descarte de fases
Um dos enganos mais comuns durante um processo de extração líquido-líquido é
o descarte da fase errada. Como discutido anteriormente, somente quando se utilizam
solventes orgânicos clorados, que possuem densidades maiores que da água (Tabela 1,
p.6), a fase orgânica será a inferior.
Cuidado redobrado deve ser tomado quando se realiza a extração com solventes
quimicamente ativos pois, muitas vezes, a substância de interesse está na fase aquosa na
forma de um sal.
Considerando os fatos acima, é aconselhável que ambas as fases sejam guardas
até que se tenha isolado o produto desejado.

Agentes de secagem
Após o processo de extração e de separação das fases, a fase orgânica, que
usualmente contém o composto de interesse, deve ser seca através da utilização de agentes
de secagem (ou agentes secantes). Isto é necessário, pois qualquer solvente orgânico,
mesmo com baixa afinidade pela água, absorverá água quando agitado com uma solução
aquosa. É claro que a quantidade de água dissolvida irá variar de um solvente para outro.
Os agentes secantes são sais inorgânicos anidros capazes de adicionar água de
hidratação quando expostos à umidade do ar ou às soluções úmidas. Os mais comumente
usados são: sulfato de sódio, sulfato de magnésio, cloreto de cálcio, sulfato de cálcio e

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carbonato de potássio. Estes sais variam em propriedades e aplicações. Assim, eles não
absorvem a mesma quantidade de água em uma dada massa de solvente. A Tabela 2
compara os agentes secantes mais comuns.

Tabela 2. Agentes secantes


Agente Acide Fórmulaa Capacidade Inteireza Velocidade Uso
b c d
z
Sulfato de neutro MgSO4.7H2O alta média rápida geral
magnésio
Sulfato de neutro Na2SO4.7H2O alta baixa média geral
sódio Na2SO4.10H2
O
Cloreto neutro CaCl2.2H2O baixa alta rápida hidrocarboneto
de cálcio CaCl2.6H2O s e haletos de
alquila
Sulfato de neutro CaSO4.1/2H2O baixa alta rápida geral
cálcio CaSO4.2H2O
Carbonat básico K2CO3.1/2H2O média média média aminas, ésteres,
o de K2CO3.2H2O bases, cetonas
Potássio
a
fómula molecular com água de hidratação; bquantidade de água removida pro unidade de agente secante; cquantidade de água em
equilíbrio com o agente secante; dvelocidade de secagem.

2. OBJETIVOS

O presente experimento tem como objetivos a aprendizagem da técnica de


extração líquido-líquido bem como a sua utilização na extração do ácido propanóico, a
partir de uma solução aquosa, empregando-se dois solventes extratores diferentes: éter
dietílico e diclorometano.

3. MATERIAL E REAGENTES

- anel para funil - suporte com hastes e garras


- balão volumétrico de 100 mL - ácido propanóico
- bureta de 25 mL - diclorometano
- 5 erlenmeyers (125 mL) - éter dietílico
- funil de separação de 125 mL - solução indicadora de fenolftaleína
- funil de vidro - solução padronizada de hidróxido de
sódio 0,15 mol L-1
- pipetas volumétricas (10 mL e 2 mL) - ácido propanóico

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- proveta (100 mL)


4. PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL

4.1. Preparo de uma solução aquosa de ácido propanóico

a) A um balão volumétrico de 100 mL, adicione 2 mL de ácido propanóico e complete


com água destilada. Agite até a homogeneização da solução resultante (solução A).
b) Pipete uma alíquota de 10 mL da solução A e transfira para um erlenmeyer de 125 mL.
Adicione 3 gotas de solução indicadora de fenolftaleína.
c) Encha a bureta com solução padronizada de NaOH (0,15 mol L-1) e titule a solução. O
ponto final da titulação é alcançado quando surge e permanece a cor rósea. Anote o
volume consumido de solução de NaOH. Complete o volume da bureta e titule uma nova
amostra de solução de ácido propanóico (10 mL). Anote o volume consumido da solução
de NaOH. A massa de ácido propanóico presente na solução aquosa será calculada
utilizando-se a média das duas medidas obtidas na titulação.

4.2. Extração simples empregando-se como solvente extrator éter etílico

Pipete 10 mL da solução ácida (solução A) e transfira para um funil de separação.


Adicione 30 mL de éter dietílico. Agite a mistura, conforme ilustrado na Figura 5 (p.7),
tomando o cuidado para aliviar a pressão interna no funil. Esta operação deve ser realizada
no interior de uma capela de exaustão, uma vez que o éter dietílico é muito volátil. Deixe
o sistema em repouso até a separação completa das fases. Recolha a camada aquosa (fase
inferior no funil de separação) em um erlenmeyer de 125 mL e adicione 3 gotas de solução
indicadora de fenolftaleína. Complete o volume da bureta com solução padronizada de
NaOH (0,15 mol L-1) e titule a solução do ácido até que surja e permaneça a cor rósea.
Anote o volume consumido de solução de NaOH.

4.3. Extração simples empregando-se como solvente extrator diclorometano

Repita o procedimento descrito no item 4.2, porém utilize como solvente extrator
diclorometano. O processo de extração também deverá ser realizado em capela de
exaustão.

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EXPERIMENTO 5
RELATÓRIO/QUESTIONÁRIO

Nome Matrícula

1) Calcule a massa (em gramas) de ácido propanóico presente na solução aquosa, que foi
titulada no item 4.1. Deixe indicados os seus cálculos de modo a explicitar o seu
raciocínio.

2) Calcule a massa (em gramas) de ácido propanóico restante nas soluções aquosas, após
as extrações realizadas nos itens 4.2 e 4.3. Deixe indicados os seus cálculos de modo a
explicitar o seu raciocínio.

3) Calcule a porcentagem do ácido propanóico que foi extraída nos itens 4.2 e 4.3. Com
base nas porcentagens de ácido propanóico calculadas, o que é possível concluir sobre a
eficiência dos dois tipos de extração? Deixe indicados os seus cálculos de modo a
explicitar o seu raciocínio.

4) Calcule a massa (em gramas) de ácido propanóico restante nas soluções aquosas, após
as extrações realizadas no item 4.3. Considerando os solventes éter dietílico e
diclorometano, qual possui maior eficiência para a extração do ácido propanóico? Deixe
indicados os seus cálculos de modo a explicitar o seu raciocínio.

5) Calcule o coeficiente de partição para o ácido propanóico utilizando os resultados


obtidos nas extrações simples com éter dietílico (procedimento 4.2) e com diclorometano
(procedimento 4.4). Deixe indicados os seus cálculos de modo a explicitar o seu
raciocínio.

6) O que se deve fazer quando há dúvida sobre qual das fases é a orgânica em um
procedimento de extração?

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